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NOTÍCIAS SOBRE A ABCA JORNAL DA ABCA AICA – INTERNATIONAL

EDIÇÃO ATUAL n° 27 ­ Ano XI ­ Junho de 2013 → VOLTAR

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Artes visuais na Paraíba: 1900­2010.


Dyógenes Chaves

As primeiras ações para a criação de um museu ou “galeria de retratos” na Paraíba datam de


1913 quando o pintor paraibano, Aurélio de Figueiredo, irmão do neoclássico Pedro Américo,
aqui chegou com algumas pinturas em sua bagagem, por sugestão e convite do presidente do
Estado, Castro Pinto. Anos depois, veio o pintor Antônio Parreiras (Niterói­RJ, 1860­1937),
com carta de recomendação de Epitácio Pessoa ao então presidente da Parahyba, Camilo de
Holanda, para execução de uma pintura sobre a Revolução de 1817, obra hoje pertencente ao
acervo do Palácio da Redenção, em João Pessoa. Segundo o professor Gabriel Bechara, citado
pelo artista, Chico Pereira: “a partir daí algumas exposições começaram a acontecer na
Capital, contribuindo para que se formasse a nossa primeira geração de artistas, composta
por Olívio Pinto, Frederico Falcão, João Pinto Serrano, Amelinha Theorga e Voltaire D’Ávila.
Em 1924, estes artistas realizaram uma grande coletiva com 118 obras. A mostra, de forte
tendência regionalista, foi denominada Salon Felippéa em resposta à exposição do artista
pernambucano Joaquim do Rego Monteiro, irmão do também pintor Vicente do Rego
Monteiro, que acabara de trazer à Paraíba os primeiros exemplos de pintura moderna.” 1

E, de fato, o que predomina neste Salon Felippéa é a paisagem ao invés de algum sopro
modernista que já surgia na vizinha Recife. O mar e seus coqueirais, além das cenas urbanas,
refletem a opção por temas bucólicos e atesta o isolamento vivido pelas artes plásticas da
província, o que vai perdurar até a década de 50. Realmente, “a Paraíba não participou do
ideário modernista a não ser na literatura com a presença de José Américo de Almeida e José
Lins do Rego.” 2

Neste período o retrato também se torna algo comum entre as famílias mais abastadas. A
fotografia é amplamente utilizada, em especial na revista, Era Nova (anos 1920), que tratava
da vida social às amenidades político­culturais da elite paraibana e vai “fornecer as imagens
necessárias dos modelos, ao mesmo tempo, passam a ser colorizadas e tratadas como
pintura.” 3

Tanto que, na época, os pintores Frederico Falcão, Pedro Tavares, Olívio Pinto, Pinto Serrano
e, anos mais tarde, José Lyra, tiveram destacada atuação como fotógrafos, mesmo caso do
desenhista suíço, Eduardo Stuckert, estabelecido na cidade desde 1900. Outro pioneiro, o
fotógrafo, Walfredo Rodriguez, profundo conhecedor da nossa cultura, publicou livros sobre
a cidade, realizou exposições e documentou os acontecimentos sociais, com destaque para o
filme, Sob o céu nordestino (1924­28), um verdadeiro marco do cinema paraibano.

Outra categoria – a caricatura – teve grande aceitação na Paraíba e noutros estados, surgia
em mostras de grande popularidade e eram publicadas em jornais e revistas da época. Rubem
Diniz e Hernani Sá, entre outros artistas nordestinos que aqui atuaram, eram os paraibanos
mais reconhecidos. “A importância social desse movimento artístico que tinha à frente
jornalistas e trabalhadores da imprensa, ainda necessita de um estudo à parte para avaliar a
sua significação, nesse período de declínio da arte acadêmica e início da consolidação do
modernismo no Brasil.” 4

O Centro de Artes Plásticas da Paraíba­CAP, instalado em 1947, em um prédio na rua Barão


do Triunfo, no centro de João Pessoa, tinha como proposta o ensino livre das artes que, mais
tarde, continuaria com o grupo Tomás Santa Rosa e o Departamento Cultural da UFPB. “O
CAP, entidade sem fins lucrativos, recebia algum apoio financeiro do Governo para sua
manutenção, graças a um projeto do então deputado e colecionador, Dr. João Lélis. Foram
esses artistas – José Lyra, Olívio Pinto, Pinto Serrano e Hermano José – responsáveis pela
modernização tardia das artes plásticas no Estado, com as primeiras tentativas de ruptura
com o academismo sem, contudo, deixar alguns deles a tradição da pintura da cena urbana e
marítima, suas contribuições mais importantes à história da arte na Paraíba.” 5

No livro, Os anos 60 – Revisão das artes plásticas da Paraíba, Raul Córdula afirma que “antes
da intensificação do movimento de artes plásticas que caracterizou os anos 60 houve, em
João Pessoa, um aglomerado de artistas de cavalete que, reunidos no Centro de Artes
Plásticas da Paraíba, assumiu a pintura de paisagem e retratos da cidade daquela época. A
esses artistas, envolvidos no bucolismo da Felipéia, leitores de Rainer Maria Rilke e Marcel
Proust, decupadores dos tons de verde vegetal e marinho, seguidores dos pintores franceses,
de Monet a Matisse, os jovens artistas dos anos 60 devem o sereno exemplo da humildade.
Foi no Centro de Artes Plásticas que Ivan Freitas, Archidy Picado e Breno Mattos iniciaram­
se através da orientação de José Lyra, Olívio Pinto, Pinto Serrano e Hermano José. Ivan
Freitas deixou a Paraíba em 1957, mas continuou aqui o seu gesto criador como lenda que
servia de apoio às novas atitudes dos então ‘enumerados’ artistas jovens advindos da Geração
59. Archidy Picado, desde cedo rompeu com a norma vigente e, entre viagens ao Rio de
Janeiro, frequentou o ateliê de Ivan Serpa no MAM [Museu de Arte Moderna] onde conheceu
artistas atuantes e novas realidades. De volta à João Pessoa, Archidy instalou em sua casa, no
bairro de Jaguaribe, seu ateliê que foi frequentado por Antônio Cândido, Marconi Beniz e por
mim.” 6

A década de 60 se caracterizou por uma maior dinamização das artes plásticas, através da
ação dos novos artistas que passaram a ocupar o Theatro Santa Roza: um ateliê coletivo na
mesma ideia do CAP. Foi uma época de inúmeras exposições, realizadas onde fosse possível,
para apresentar as recentes produções da arte moderna. Nesse momento, a Biblioteca Pública
[rua General Osório] era o ponto de encontro das artes. A UFPB, em 1962, cria o seu
Departamento de Artes, a partir da colaboração dos artistas do grupo Tomás Santa Rosa. O
setor de artes plásticas, com Archidy Picado na organização, passou a funcionar no Casarão
de Azulejos, em frente à Praça Dom Adauto, no centro da cidade. E, em 1963, abriu inscrições
para seus cursos de artes plásticas, contabilizando mais de 300 interessados. Destes cursos,
surgiram artistas que se destacariam no panorama local, como Flávio Tavares, Régis
Cavalcanti e Celene Sitônio.

Os professores, artistas ainda sem o devido preparo, necessitavam de aprimoramento. Aí


entra em cena José Simeão Leal, na época Diretor do Serviço de Documentação do Ministério
da Educação e Saúde, que enviou à Paraíba – através do Governo Pedro Gondim, e sob a
supervisão de Virgínius da Gama e Melo – o pintor italiano abstracionista, Domenico
Lazzarini, para orientar os artistas locais nas antigas técnicas da pintura e sua preservação,
além de ter criado, em 1963, a primeira galeria de arte “contemporânea” na cidade.

Em 1966, já tendo consolidado a implantação do Museu de Arte de São Paulo, o empresário e


jornalista paraibano, Assis Chateaubriand, criador e patrocinador da Campanha Nacional de
Museus Regionais, decidiu instalar um museu de arte em Campina Grande. Criado
inicialmente como Museu Regional de Arte Pedro Américo, foi inaugurado em 20 de outubro
de 1967, numa festa memorável, com a presença de autoridades, artistas e críticos como
Mário Pedrosa, Mário Barata, Antonio Dias, Solange Escosteguy, Rubens Gerchman, Anna
Maria Maiolino, Yanis Gaitis, Jean Boghici, além de artistas paraibanos e de estados vizinhos.

O curador da mostra, Museu de Arte Assis Chateaubriand (CCBB, Brasília, 2001), Marcus
Lontra, em seu texto de apresentação, diz: “A década de 1960 foi extremamente rica e
conturbada; nas artes, tanto na Europa como no Brasil, a nova figuração, influenciada pela
arte pop norte­americana, inseria­se nas discussões comportamentais que caracterizaram
esta época. Entre nós, o período marcado entre o golpe militar de 1964, e a definitiva
implantação da ditadura, em dezembro de 1968, foi de intensa movimentação: a figuração
brasileira investiu nos aspectos políticos, e o Brasil passou a produzir uma arte tipicamente
urbana, violenta e sexualizada, em que se destaca o artista paraibano Antonio Dias, ainda
hoje referência fundamental na produção estética brasileira contemporânea. É essa arte pop,
política, irônica, crítica, apaixonada, que incorpora elementos da arte povera italiana e
termina por desembocar no tropicalismo, que constitui um núcleo destacado na coleção do
Museu de Campina Grande.”

A “euforia” na Borborema é também o momento ideal para o surgimento do grupo Equipe 3


[Eládio Barbosa, Chico Pereira e Anacleto Elói], que agitou a cena campinense com
happenings e ações de vanguarda, inspirados na Nova Objetividade e incursões no
Tropicalismo e Poesia Processo. Os artistas deste grupo, isoladamente, participam da Bienal
de São Paulo [Eládio Barbosa] e Bienal Nacional da Bahia, além da “expedição cultural” que
empreenderam por várias cidades do país, em 1968.

Na esteira do boom econômico dos anos 70, surge uma classe média interessada num gosto
bem “decorativo” e proliferam galerias pelo país. Na Paraíba, no entanto, algumas poucas
ações de mercado começam a investir mais no artista local, na ideia de formar colecionadores
e exibir os artistas emergentes. Daí surge a Galeria Batik, misto de galeria e escritório das
arquitetas, Conceição Serra e Madalena Zaccara, que existiu até 1979.

Em 1976 a Universidade Federal da Paraíba, tendo à frente o Reitor Lynaldo Cavalcanti, volta
a desempenhar papel importante para o desenvolvimento das artes plásticas no Estado, como
havia sido na década anterior. Ainda funcionavam os cursos livres de arte, sob a supervisão
da Coordenação de Extensão Cultural, setor que substituíra o antigo Departamento Cultural,
instalada num edifício na Praça Rio Branco, centro da capital, e onde lecionavam os artistas
Gilvan Samico, Montez Magno, João Câmara Filho, Arthur Cantalice, Roberto Lúcio, Alfonso
Bernal, Euclides Sá, entre outros.

E em 1977, finalmente, era criado, com a ajuda da educadora Laís Aderne, o curso de
Educação Artística na UFPB, e Chico Pereira explica: “A nova dinâmica imposta por Lynaldo
Cavalcanti nas áreas da ciência e tecnologia passou a exigir também, no campo da cultura, a
mesma postura. Foi criado o Departamento de Artes e de Comunicação, para a formação de
arte­educadores, jornalistas e relações públicas.” (...) “No mesmo período, foram criados os
atuais núcleos artísticos e de pesquisas culturais, entre eles o Núcleo de Arte Contemporânea­
NAC, este com o objetivo de estabelecer uma ponte entre a Paraíba e centros nacionais e
internacionais, bem como promover internamente uma atualização crítica do ponto de vista
teórico e prático com as outras disciplinas universitárias. Para a criação deste Núcleo, a UFPB
convidou o artista Antonio Dias e o crítico Paulo Sérgio Duarte, que se responsabilizaram
pelo projeto do NAC, o qual teve também a participação do artista plástico Raul Córdula e do
sociólogo Silvino Espínola. O Núcleo de Arte Contemporânea foi marco divisor no panorama
da arte local. Apesar do processo de modernidade acontecido desde décadas passadas, o NAC
produziu no cenário da arte local um questionamento importante, que foi o de romper a
ditadura da hegemonia do eixo Rio­São Paulo. Até então, era impossível acontecer
movimento significativo de arte contemporânea fora dessa engrenagem. Logo depois da
instalação do NAC, a UFPB criou o Departamento de Artes do Campus II, em Campina
Grande, com a finalidade de expandir o ensino das artes. Apesar de ser um departamento,
funciona até hoje como extensão artística. Terminado o Reitorado Lynaldo Cavalcanti, as
administrações posteriores não emprestaram ao NAC a mesma atenção quando da fase da
sua criação, até porque os recursos também se tomaram escassos e as sucessivas mudanças
ocorridas na direção desse Núcleo concorreram para o seu declínio.” 7

No começo da década de 80, as atividades do NAC ganhavam corpo e espaço na mídia


nacional por causa da vinda de artistas seminais da arte contemporânea brasileira – Tunga,
Marcelo Nietsche, Cildo Meireles, Anna Maria Maiolino, Paulo Roberto Leal, Paulo Klein,
Antonio Dias, entre outros –, para “experimentações” até mesmo inéditas em outras capitais
nordestinas. O NAC também promoveu ações de artistas locais como, Um dia de sol,
intervenção urbana de Chico Pereira, e, Cenografia e adereços da donzela Joana, do escultor e
cenógrafo, Breno Mattos. Em 1984, com o fim do programa desenvolvido pelos criadores do
NAC, o seu retorno, dois anos depois, em nada correspondia ao vanguardismo inicial
proposto. Assim também confirma Raul Córdula, um dos coordenadores do NAC ao lado de
Chico Pereira, “como sua equipe inicial, concebeu, nasceu, cresceu e morreu entre 1978 e
1984, quando foi fechado para reformas e, ao reabrir dois anos depois, suas ideias
renovadoras e contemporâneas do futuro estavam desgastadas pela falta de apoio que
sucedeu. Ele existe ainda com o mesmo nome, mas não passa de uma galeria de arte
convencional que, embora tenha apresentado ao público algumas exposições, é apenas espaço
conveniente para as relações públicas da UFPB.” 8

E a curta vida ativa do NAC acaba por influir na criação de uma associação de artistas
plásticos, visto que os artistas locais, em sua maioria “artistas de cavalete”, não consideravam
a programação do NAC como algo a ser levado a sério. Há até rumores de atitudes xenófobas
que criticava a presença dos artistas da vanguarda da época, convidados por Antonio Dias e
Paulo Sérgio Duarte, com suas “esquisitas” ações de “arte contemporânea”, termo já
incompreensível para a modernidade local.
Neste período, o Governo Burity construiu o Espaço Cultural José Lins do Rêgo, projeto de
Sérgio Bernardes e inaugurado em 1983, no bairro de Tambauzinho. Ali se instalava a
Fundação Espaço Cultural da Paraíba­Funesc, cujo setor de artes plásticas – sob a orientação
dos artistas Hermano José, Régis Cavalcanti e, depois, Arthur Cantalice – foi dos primeiros a
desenvolver suas atividades com a oferta de cursos livres e a realização de mostras de novos
artistas. Archidy Picado, Unhandeijara Lisboa, Dyógenes Chaves, Fred Svendsen, Chico
Ferreira, Chico Dantas e Alcides Ferreira, eram alguns dos professores. Logo após abrigar a
gigantesca mostra de arte neo­expressionista alemã [Momentaufnen, 1987], seguida de
workshops entre brasileiros e alemães, a Funesc organizou, por solicitação da classe artística
e empenho direto do governador Tarcísio Burity, duas grandes mostras, Arte atual paraibana,
I e II, em que se apresentava um panorama da arte local produzida naquele momento. Em
1987 a UFPB cria a sua Pinacoteca, em um espaço provisório na Biblioteca Central, “com
obras de artistas que atuaram como professores do Departamento Cultural nos anos sessenta
e que tiveram importante papel na formação de uma geração que vai emergir neste mesmo
período e nas gerações subseqüentes”, como relata a professora Rosires Andrade, ex­diretora
da Pinacoteca.
Fazendo uma análise sobre a tradição da pintura na Pinacoteca da UFPB, afirma Rosires: “A
produção artística, nas primeiras décadas, esteve mais ligada à figuração mais próxima da
Escola Pernambucana, a um repertório regional no sentido do apego às tradições e ao
imaginário popular nordestino, presentes de maneira exemplar, na obra de João Câmara,
Roberto Lúcio, Miguel dos Santos e Flávio Tavares. Por outro lado, nota­se a reação de um
grupo de artistas liderados por Raul Córdula, em que a figuração cede lugar a uma expressão
em que os elementos visuais, cores e formas são o tema e o assunto.” (...) “A corrente
figurativa tem continuidade nas décadas seguintes através de uma diversidade de propostas
embasadas no expressionismo, representadas pela produção dos artistas: Alice Vinagre,
apresentando uma visão ontológica do homem mergulhado nas contradições do mundo atual;
Chico Dantas, revelando uma obsessão pela anatomia humana apresentando de maneira
velada a nebulosidade do ser contemporâneo; Fred Svendsen, compondo figuras bestiais de
um mundo taciturno; José Crisólogo, mostrando o imaginário do povo sertanejo na sua força
para vencer as adversidades; e Sérgio Lucena, reiterando uma face mascarada e espectral do
imaginário, povoado de figuras sinistras.”

O professor, Gabriel Bechara, também analisa o embate entre figuração­abstração na


Paraíba: “Se a figura era ainda a dominante na pintura no Nordeste, mesmo que longe de
padrões acadêmicos e rica em descobertas, havia, porém, a resistência de alguns que se
opunham a ela na Paraíba, como Raul Córdula e Chico Pereira. A estes últimos juntaram­se
depois Rodolfo Athayde e Cláudio Santa Cruz que formam hoje um grupo mais
comprometido com a arte não­figurativa. Roberto Lúcio, artista paraibano radicado no
Recife, aos poucos abandona a figuração, detendo­se numa pesquisa sutil de formas e
gradações cromáticas que ainda se reportam à paisagem. O final dos anos setenta viu surgir
também uma nova pintura representativa, menos comprometida com o regional e seu
imaginário e mais voltada para o grotesco, malgrado a diversidade dos artistas. Chico Dantas,
Chico Ferreira, Fred Svendsen e Lacet são exemplos deste novo expressionismo ao qual se
juntariam depois Alice Vinagre, e mais recentemente, Wagner, Roró de Sá e Sérgio Lucena.” 9

Dentre as galerias de arte surgidas neste período, em João Pessoa, destaca­se a Galeria
Gamela, de Roseli e Altemir Garcia, no centro da cidade [rua Almirante Barroso, nº 144], que
desde 1980 tem se consolidado no comércio de obras de artistas já consagrados e/ou de
novos talentos locais. Em maio de 1985 é inaugurada a Galeria Archidy Picado, nas
dependências da Funesc, em homenagem a este artista falecido no início do ano, com
objetivos de apoiar os novos artistas e as tendências menos comerciais. No começo da década
a arquiteta, Madalena Zaccara, criou a MZ Artearquitetura (manteve­se até 1982) que
realizou mostras dos artistas Rubens Gerchman e Claudio Tozzi (em contatos estabelecidos
através do NAC), Maurício Arraes, Raul Córdula, Flávio Tavares, José Lucena e sua filha
Letícia, Tota e seu filho Temílson Régis. Outros espaços que funcionavam na cidade: o Hall
da Biblioteca Central da UFPB, dedicada a alunos e professores do curso de Educação
Artística e, no Theatro Santa Roza, a Galeria José Américo de Almeida (criada anteriormente
com o nome de Galeria Tomás Santa Rosa), que, sob a direção do artista Hermano José,
realizou o Salão A presença do mar nas artes plásticas; e, a Galeria Visual, do artista
campinense Antonio Rocha.

A década de 90 é marcada pelos intercâmbios internacionais entre artistas da Paraíba e de


países como a Alemanha, França e Suíça. Esse fenômeno difere das décadas passadas quando
os artistas locais migravam para o eixo Rio­São Paulo. A criação do Centro de Artes Visuais
Tambiá­CAVT (1994), pela família Almeida (Antonio Augusto, Marlene e José Rufino) e das
associações Le Hors­Là e Rede para o movimento de artistas visuais (Raul Córdula, Chico
Pereira e Dyógenes Chaves), culminaram com viagens de estudo à Europa dos artistas
Rodolfo Athayde, Rosilda Sá, Otávio Maia, Luiz Barroso, Dyógenes Chaves, Chico Pereira,
Alice Vinagre, Sérgio Lucena, Fabiano Gonper, Murilo Campelo e Marcos Veloso. Em 1998 a
Rede recepcionou um grupo de 12 artistas franceses e suíços para uma estadia de dois meses
em João Pessoa (projeto Laboratoire), por meio da Fundação Pro Helvetia e com apoio oficial
local, na perspectiva de trocas de experiência. Apesar do Sudeste não ser mais a única
alternativa para os jovens talentos da terra, ainda estava claro que havia necessidade de
reconhecimento além fronteiras.
Além do surgimento de outras galerias na cidade – Athaendy (Giovanna Germoglio e Pepita),
Escritório de Arte da Paraíba (Suzete Forte), Artenossa (Maristela Mendonça), Transarte (Lu
e Júnior), Falcone Arte&Objetos (Fernando Falcone), entre outras – há a consolidação dos
salões regionais: o Salão Municipal de Artes Plásticas­SAMAP (da Prefeitura de João Pessoa),
e o Salão de Novos Artistas Paraibanos­SNAP (Sesc João Pessoa), que passam a abrigar a
novíssima geração de artistas locais.
Ainda em 1989, o Departamento Cultural da Prefeitura de João Pessoa, promove a mostra,
Paixão de Cristo em Art­Door, com obras realizadas por artistas locais representando as 15
estações da Via Sacra, e exibidas em placas de out­door no anel externo da Lagoa do Parque
Solon de Lucena. A ideia tinha como referência a Exposição Internacional de Art­Door,
ocorrida no início dos anos 80, em Recife, organizada por Paulo Bruscky e Daniel Santiago. O
projeto logo foi abortado na sua 4ª edição em função das polêmicas causadas por algumas
obras que suscitavam “provocação” à religiosidade da população de João Pessoa.

Em 1993, durante a gestão da artista Marlene Almeida na coordenação de artes plásticas da


Funesc, foi realizada a mostra, Xilogravura: do cordel à galeria, sob a curadoria de Leonor
Amarante, que, um ano depois levava a mostra para o MASP, em São Paulo. Sem dúvida, foi a
maior exposição sobre xilogravura já realizada no país e que, além de seminários e debates,
ocupou todo o mezanino, praça e auditórios do Espaço Cultural José Lins do Rêgo. No ano
seguinte, por iniciativa de seu presidente, Antônio Alcântara, a Funesc cria o Festival
Nacional de Arte­Fenart, com objetivos de promover ações artísticas, de entretenimento e de
formação, em todas as áreas da cultura. Apesar do desuso do modelo “festival” (os festivais de
arte estavam cada vez mais se especificando em determinadas áreas), o Fenart emplacou pela
simples razão de dispor de um espaço gigantesco (talvez o maior do país) totalmente
equipado para atender um festival completo. Em 12 de suas 13 edições, coordenadas por este
autor, a programação de artes plásticas do Fenart homenageou vários artistas plásticos –
Simeão Leal, Jackson Ribeiro, Raul Córdula, José Lyra e Archidy Picado –, realizou cinco
mostras bienais de Desenho e de Gravura, além de ter oferecido workshops dedicados à
artistas iniciantes e ministrados por Maria Bonomi, Raul Córdula, Leda Catunda, Paulo
Bruscky, Gil Vicente, José Rufino, Leda Watson, Edgar Vasques, Uiara Bartira, Ester
Grinspun, Jean Stern (Suíça), Carlos dos Reis e Luísa Gonçalves (Portugal).

Com o encerramento das atividades do Centro de Artes Visuais Tambiá, em 2000, alguns dos
seus ex­alunos buscam no associativismo a solução ideal para continuar as experiências já
iniciadas com os professores, Flávio Tavares, Marlene Almeida, Alice Vinagre, Dyógenes
Chaves, Chico Ferreira e José Rufino. Surge, assim, o grupo Grilo (Alena Sá, Neuma Sales,
Antonio Coutinho, Hilda Andrade, Eimar Fernandes, Noemi D’Ávila e Everaldo Alves), que se
instalou em um prédio no Centro Histórico; e, a Associação de Artistas Plásticos da Paraíba­
Associart, uma Ong que, apesar do nome, não é a mesma associação de artistas plásticos que
vingou até final dos anos 1980. A Associart, instalada nas dependências da Funesc, é formada
por mulheres, em sua maioria, com objetivos de continuar estudando e exibir suas obras,
neste caso, às vezes, mostras de caráter mais social que comercial, mais amador que
profissional. Isso, talvez, em função da falta de orientação em suas atividades. Mesmo assim,
criou o Festival de Artes Visuais da Paraíba­FAVI, que se tornou, a cada mês de maio, o
evento ideal para os sócios exibirem sua produção. Mesmo pouco consistente, já foi
reconhecido oficialmente como parte da programação cultural da cidade.

Em 2003, após a aquisição da Saelpa, empresa concessionária de energia elétrica no Estado,


o grupo Cataguazes instala a Usina Cultural Energisa em um prédio da primeira metade do
século XX, recém restaurado e próximo à Praça da Independência, e em pouco tempo, torna­
se uma das principais instituições culturais da Paraíba, notadamente após a realização do 3°
Cineport, festival de cinema dedicado aos países de língua portuguesa. Desde sua
inauguração, já realizou mais de 50 exposições de artistas paraibanos, brasileiros e
estrangeiros, e firmou parcerias com Funarte, Instituto Itaú Cultural, UFPB e vários órgãos
oficiais da cultura para a realização de projetos e oficinas de arte contemporânea.

Em João Pessoa, como noutros centros mais avançados (no quesito mercado de arte), o
marchand dá lugar ao decorador e ao arquiteto, que passam a ditar o gosto e a obra que
“combina” com o projeto de interiores. A prova é a extinção de muitas galerias na cidade,
permanecendo apenas, heroicamente, a Galeria Gamela (agora com filial na praia de
Tambaú), e a recente Galeria Louro&Canela, adequadamente instalada no escritório de seu
proprietário, o artista e arquiteto, Jonas Lourenço, na avenida Edson Ramalho (a “nossa”
Oscar Freire), em Manaíra.
Na verdade, não existe colecionismo na cidade e saíram de cena nossos poucos
colecionadores – Antônio de Pádua, Odilon Ribeiro Coutinho, Walter Cunha etc. – o que,
talvez, tenha influenciado que alguns artistas locais deixassem a cidade para se aventurar em
centros com um mercado de arte mais consolidado, como fizeram Alice Vinagre (Recife),
Verdeee, Sérgio Lucena e Fabiano Gonper (São Paulo), Murilo Campelo (Genebra/Suíça) e
Flauberto Queiroz (Berlim/Alemanha). Já outros, como José Rufino, Júlio Leite e Martinho
Patrício, mesmo residindo na “terrinha”, estão representados em galerias do Rio e São Paulo,
e por essa condição de visibilidade tem participado das principais bienais e feiras
internacionais, como as de Havana, São Paulo, Mercosul, Vento Sul, Cuenca, do Fim do
Mundo, e ARCO de Madri.

Em paralelo, e mesmo com altos e baixos, os governos oficiais apresentaram à classe artística,
novo formato de mecenato: as leis de incentivo à cultura – o FIC Augusto dos Anjos (do
Governo do Estado) e o FMC (da Prefeitura de João Pessoa). Infelizmente, as comissões de
avaliação não contam com especialistas em todas as áreas, daí que o resultado ser, na
maioria, um verdadeiro fiasco para o setor de artes visuais. Na verdade, a maior culpa disso
está na desmobilização dos artistas plásticos para a indicação, como representantes da
sociedade civil, de seus pares para compor estas comissões. Com a união da classe talvez
houvesse melhores resultados nestes editais.

Entretanto, alguns poucos artistas já conseguiram emplacar seus projetos editoriais e


publicar um “catálogo”, tão necessário para a divulgação da sua obra. Dentre os beneficiados
estão José Pagano, Gustavo Moura, Flávio Tavares, Hermano José, Fred Svendsen, Clóvis
Júnior, Alberto Lacet, Elpídio Dantas, Alice Vinagre, Chico Ferreira, Alena Sá, Analice Uchôa,
Antonio David, Margarete Aurélio, João Lobo, Sérgio Lucena, Gabriel Bechara, entre outros.

Desde os anos 90, outro fenômeno “nacional” atinge as artes plásticas: o desaparecimento da
crítica de arte nos periódicos. Até pouco tempo, este autor mantinha coluna semanal no
jornal O Norte (2005­2010), em que usava o espaço muito mais como divulgação das
atividades que aconteciam na cidade que um lugar para a “crítica de arte”. É compreensível
até reconhecer que o jornal diário não seja, nos dias de hoje, o melhor lugar para um ensaio
técnico – muitas vezes hermético – sobre artes visuais (já foi o tempo que havia, nos jornais
da cidade, três ou quatro colunistas escrevendo sobre cinema). Ainda mais, o avanço da
tecnologia fez surgir um novo “espaço” – a internet – para exibição da produção artística e
intelectual. Proliferam os sites e blogs pessoais e as revistas eletrônicas. Na contramão, o
lançamento da revista Pessoa (editorias de Fábio Queiroz, William Costa e Dyógenes Chaves),
foi uma resposta à falta de espaço para artigos e ensaios sobre artes visuais. Com custo
popular e projeto gráfico simples (impressão em preto sobre papel jornal), a revista tinha o
propósito de atingir um público mais especializado, de dentro e de fora da universidade.

Já no final da década de 2000, algumas notícias sugerem uma temporada de boa colheita
para o setor de artes visuais. O MEC finalmente aprova o Mestrado em Artes Visuais da UFPB
(num “consórcio” com a UFPE) e não há dúvida de que vai movimentar a discussão e reflexão
da produção contemporânea local. Até vem coroar a chegada, em boa hora, da artista e
professora, Marta Penner, para coordenar o NAC/UFPB (desde 2006), dando novo impulso
às atividades deste equipamento universitário ao reintegrá­lo ao curso de Artes Visuais, como
já ocorreu na gestão inicial (1978­1984), quando se desenvolviam ações de arte­educação e
pesquisa, hoje tão em moda como fruição e mediação na arte contemporânea.

Nesta mesma empreitada da UFPB, anuncia­se novo prédio para sua Pinacoteca (que ainda
funciona provisoriamente na Biblioteca Central), no mesmo instante que o Governo do
Estado deseja instalar o Museu de Arte Contemporânea da Paraíba­MAC, na Funesc. Este
museu, que já conta com acervo razoável, existe no “papel” (Decreto nº 20.696, de
05/11/1999, assinado pelo então governador José Maranhão), e tem todas as condições de se
tornar realidade para a sociedade paraibana e a classe artística, ainda sem um espaço
museológico que abrigue a arte contemporânea, apesar da reconhecida importância dos
nossos artistas. O único impasse é a falta de compromisso e despreparo dos dirigentes
culturais, em sua maioria, nomeados por interesses políticos.

Outra obra, a Estação Cabo Branco (Prefeitura de João Pessoa), mais um múltiplo da série de
projetos de Oscar Niemeyer e instalada em área polêmica no topo da barreira do Cabo
Branco, talvez seja o lugar mais visitado da cidade. A inexistência de um programa curatorial
antenado com a arte contemporânea, faz da Estação Cabo Branco apenas um “mirante” para
os turistas, com vista privilegiada para o litoral da cidade. E isso atesta a ineficiência da
política cultural da Prefeitura para o setor de artes visuais, que carece de orientação e rumo.

Na contramão das curadorias pouco preparadas, ao final, destaco duas ações: a Galeria
Cilindro [site specific], criada pelo artista Júlio Leite na Praça da Bandeira (Campina
Grande), que utiliza as instalações externas de um caixa eletrônico do Banco do Brasil e o
transforma em espaço para lambe­lambe e outras intervenções; e, o programa JTP (Jovens
Talentos da Paraíba), promovido pela Aliança Francesa João Pessoa desde 2009, que utiliza
método simples e eficaz: uma curadoria – formada pelos artistas e professores Bertrand Lyra,
Dyógenes Chaves e Marta Penner – seleciona (e acompanha) alguns jovens artistas que ainda
não realizaram exposição individual, para uma exibição solo em seu prédio [rua Bento da
Gama, nº 396, Torre]. No final do ano é publicado um catálogo bilíngüe com todas as
exposições. Estas, talvez sejam ações isoladas e despretensiosas, mas, se utiliza de uma
fórmula típica da contemporaneidade: poucos recursos, boa capacidade técnica e
investimento no novo. Aliás, curioso é que essa fórmula é a mesma de vitoriosos projetos e
ideias do passado, tipo: NAC, CAP, Geração 59, SAPP, Equipe 3, Centro de Artes Visuais
Tambiá... Por isso, eu ainda acredito.

Fontes Bibliográficas das Notas:


1 SILVA JÚNIOR, Francisco Pereira da. Artes Plásticas na Paraíba I: primórdios e evolução.
In: História da Paraíba em Fascículos nº 23. João Pessoa: A União/Governo da Paraíba, 1997.
2 ZACCARA, Madalena de F. Pekala. Anotações sobre as artes visuais na Paraíba. João
Pessoa, Ideia, 2009.
3 SILVA JÚNIOR, Francisco Pereira da. Artes Plásticas na Paraíba II: a era dos artistas. In:
História da Paraíba em Fascículos nº 24. João Pessoa: A União/Governo da Paraíba, 1997.
4 BECHARA FILHO, Gabriel. O movimento das artes plásticas na Paraíba: 1930­1945.
Intervenções, artes visuais em debate – Revista do Departamento de Artes Visuais da UFPB.
João Pessoa: Universitária/UFPB, nº 2, 2007/2008.
5 SILVA JÚNIOR, Francisco Pereira da. Artes Plásticas na Paraíba II: a era dos artistas. In:
História da Paraíba em Fascículos nº 24. João Pessoa: A União/ Governo da Paraíba, 1997.
6 CÓRDULA, Raul; SILVA JÚNIOR, Francisco Pereira da. Os anos 60: revisão das artes
plásticas da Paraíba. João Pessoa: Funarte/UFPB, 1979.
7 SILVA JÚNIOR, Francisco Pereira da. Artes Plásticas na Paraíba II: a era dos artistas. In:
História da Paraíba em Fascículos nº 24. João Pessoa: A União/ Governo da Paraíba, 1997.
8 CÓRDULA, Raul. Fragmentos: comentários sobre artes plásticas. João Pessoa: Funesc,
1998.
9 BECHARA FILHO, Gabriel. Arte paraibana. In: Arte atual paraibana. João Pessoa:
Funesc/Governo da Paraíba, 1988.

n° 27 ­ Ano XI ­ Junho de 2013 → VOLTAR

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