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Semana de Arte Moderna

Laura Aidar
 
Arte-educadora e artista visual
A Semana de Arte Moderna foi uma manifestação artístico-cultural que
ocorreu no Theatro Municipal de São Paulo entre os dias 13 a 18 de fevereiro
de 1922.

O evento reuniu diversas apresentações de dança, música, recital de poesias,


exposição de obras - pintura e escultura - e palestras.

Os artistas envolvidos propunham uma nova visão de arte, a partir de uma


estética inovadora inspirada nas vanguardas europeias.

Juntos, eles buscavam uma renovação social e artística no país, evidenciada na


"Semana de 22".

O evento chocou parte da população e trouxe à tona uma nova visão sobre os
processos artísticos, bem como a apresentação de uma arte “mais brasileira”.

Houve um rompimento com a arte acadêmica, contribuindo para uma mudança


estética e para o Movimento Modernista no Brasil.

Mário de Andrade foi uma das figuras centrais e principal articulador da Semana
de Arte Moderna de 22. Ele esteve ao lado de outros organizadores: o escritor
Oswald de Andrade e o artista plástico Di Cavalcanti.
Catálogo e cartaz da Semana de Arte Moderna, produzidos pelo artista Di Cavalcanti
Veja também: Modernismo no Brasil
Características da Semana de Arte Moderna
Uma vez que o intuito desses artistas era chocar o público e trazer à tona outras
maneiras de sentir, ver e fruir a arte, as características desse momento foram:

 Ausência de formalismo;
 Ruptura com academicismo e tradicionalismo;
 Crítica ao modelo parnasiano;
 Influência das vanguardas artísticas europeias (futurismo, cubismo, dadaísmo,
surrealismo, expressionismo);
 Valorização da identidade e cultura brasileira;
 Fusão de influências externas aos elementos brasileiros;
 Experimentações estéticas;
 Liberdade de expressão;
 Aproximação da linguagem oral, com utilização da linguagem coloquial e
vulgar;
 Temáticas nacionalistas e cotidianas.

Veja também: Arte Moderna


A Semana de 1922: Resumo
Em 1922, quando a Independência do país completava cem anos, o Brasil
passava por diversas modificações sociais, políticas e econômicas (advento da
industrialização, fim da Primeira Guerra Mundial).

Surge então a necessidade de recorrer a uma nova estética, e daí nasce a


"Semana de Arte Moderna".

Ela esteve composta por artistas, escritores, músicos e pintores que buscavam
inovações. O intuito era criar uma maneira de romper com os parâmetros que
vigoravam nas artes em geral.

A maioria dos artistas era descendente das oligarquias cafeeiras de São Paulo,
que junto aos fazendeiros de Minas, formavam uma política que ficou
conhecida como “Café com Leite”.

Esse fator foi determinante para a realização do evento, uma vez que foi
respaldado pelo governo de Washington Luís, na época governador do Estado
de São Paulo.

Além disso, a maioria dos artistas - que tinha possibilidades financeiras para
viajar e estudar na Europa - trouxe para o país diversas tendências artísticas.
Assim foi se formando o movimento modernista no Brasil.

Com isso, São Paulo demonstrava (em confronto com o Rio de Janeiro) novos
horizontes e uma figura de protagonismo na cena cultural brasileira.

Para Di Cavalcante, a semana de arte:

Seria uma semana de escândalos literários e artísticos, de meter os estribos na


barriga da burguesiazinha paulista.

Foi assim que durante três dias (13, 15 e 17 de fevereiro) essa manifestação
artística, política e cultural reuniu jovens artistas irreverentes e contestadores.

O evento foi inaugurado pela palestra do escritor Graça Aranha: “A emoção


estética da Arte Moderna”; seguido de apresentações musicais e exposições
artísticas. O evento estava cheio e foi uma noite relativamente tranquila.

No segundo dia, houve apresentação musical, palestra do escritor e artista


plástico Menotti del Picchia, e a leitura do poema “Os Sapos” de Manuel
Bandeira.

Ronald de Carvalho fez a leitura, pois Bandeira encontrava-se em uma crise de


tuberculose. Nesse poema, a crítica à poesia parnasiana era severa, o que
causou indignação do público, muitas vaias, sons de latidos e relinchos.
Por fim, no terceiro dia, o teatro estava mais vazio. Houve uma apresentação
musical com mistura de instrumentos, exibida pelo carioca Villa Lobos.

Nesse dia, o músico subiu ao palco vestindo casaca e calçando em um pé


sapato e no outro um chinelo. O público vaiou pensando que se tratasse de
uma atitude afrontosa, mas depois foi explicado que o artista estava com um
calo no pé.

Veja também: Características do Modernismo


Principais Artistas

Comissão Organizadora da Semana de Arte Moderna. Da esquerda para a direita:


Manuel Bandeira é o segundo e Mário de Andrade, o terceiro; Oswald de Andrade
aparece em primeiro plano.
Alguns artistas que participaram da Semana de Arte Moderna de 1922:

 Mário de Andrade (1893-1945)
 Oswald de Andrade (1890-1954)
 Graça Aranha (1868-1931)
 Victor Brecheret (1894-1955)
 Plínio Salgado (1895-1975)
 Anita Malfatti (1889-1964)
 Menotti Del Picchia (1892-1988)
 Ronald de Carvalho (1893-1935)
 Guilherme de Almeida (1890-1969)
 Sérgio Milliet (1898-1966)
 Heitor Villa-Lobos (1887-1959)
 Tácito de Almeida (1889-1940)
 Di Cavalcanti (1897- 1976)
 Guiomar Novaes (1894-1979)
 Zina Aita (1900-1967)

Veja também: A Linguagem do Modernismo


Repercussão da Semana de 22
A crítica ao movimento foi severa, as pessoas ficaram desconfortáveis com tais
apresentações e não conseguiram compreender a nova proposta de arte. Os
artistas envolvidos chegaram a ser comparados aos doentes mentais e loucos.

Com isso, ficou claro que faltava uma preparação da população para a recepção
de tais modelos artísticos.

Monteiro Lobato foi um dos escritores que atacou com veemência as ações da
Semana de 22.

Anteriormente, ele já havia publicado um artigo criticando as obras de Anita


Malfatti, em uma exposição da pintora realizada em 1917.

Há duas espécies de artistas. Uma composta dos que vêem normalmente as


coisas (..) A outra espécie é formada pelos que vêem anormalmente a natureza e
interpretam-na à luz de teorias efêmeras, sob a sugestão estrábica de escolas
rebeldes, surgidas cá e lá como furúnculos da cultura excessiva. (...) Embora eles
se dêem como novos, precursores de uma arte a vir, nada é mais velho do que a
arte anormal ou teratológica: nasceu com a paranóia e com a mistificação(...)
Essas considerações são provocadas pela exposição da senhora Malfatti onde se
notam acentuadíssimas tendências para uma atitude estética forçada no sentido
das extravagâncias de Picasso e companhia.

Desdobramentos da Semana de 22
Após a Semana de Arte Moderna, considerada um dos marcos mais importantes
na história cultural do Brasil, foram criadas inúmeras revistas, movimentos e
manifestos.
A partir disso, diversos grupos de artistas se reuniam com o intuito de
disseminar esse novo modelo. Destacam-se:

 Revista Klaxon (1922)


 Revista Estética (1924)
 Movimento Pau-Brasil (1924)
 Movimento Verde-Amarelo (1924)
 A Revista (1925)
 Manifesto Regionalista (1926)
 Terra Roxa (1927)
 Outras Terras (1927)
 Revista de Antropofagia (1928)
 Movimento Antropofágico (1928)

Capa do primeiro exemplar da Revista Klaxon, publicada em maio de 1922


Podemos também citar outros desdobramentos culturais que inspiraram-se nas
ideias dos modernistas, como o Tropicalismo e a geração da Lira Paulistana, nos
anos 70, e inclusive a Bossa Nova.

Veja também: Modernismo no Brasil

Essa revista foi inovadora em vários sentidos:

• Seu projeto gráfico era inovador;


• Seu conteúdo bem diversificado, pois nelas eram publicados os artigos e
poemas de autores nacionais como Sérgio Milliet e Manuel Bandeira.

• Quanto a sua organização podemos dizer que foi muito diferente de outros
jornais e revistas daquela época, pois ela não tinha um diretor, secretário e
redator-chefe, ou seja, todos participaram das fases de sua produção, por isso
era considerada um órgão coletivo.

Vídeo sobre a Semana de Arte Moderna

Quiz da História da Arte

Veja também: História da Arte: definição, aspectos e períodos

Laura Aidar
Arte-educadora, artista visual e fotógrafa. Licenciada em Educação Artística
pela Universidade Estadual Paulista (Unesp) e formada em Fotografia pela
Escola Panamericana de Arte e Design.
 
Veja também
 Oswald de Andrade
 Mário de Andrade
 Anita Malfatti
 Graça Aranha
 Arte Moderna
 Vanguardas Europeias
 Heitor Villa-Lobos
 Victor Brecheret

Manifesto Regionalista

Márcia Fernandes
 
Professora licenciada em Letras
O Manifesto Regionalista de 1926 é um dentre os manifestos publicados na
Primeira Fase do Modernismo no Brasil (1922-1930). Além dele merecem
destaque:
 Manifesto da Poesia Pau-Brasil (1924)
 Manifesto Antropófago (1928)
 Manifesto Nhenguaçu Verde-Amarelo (1929)

Características
Embora chamado de manifesto, este foi, na verdade, um conjunto de
declarações que foram feitas pelo Grupo modernista-regionalista de Recife.

À semelhança de outros grupos, ele era formado por escritores em virtude das
opiniões concordantes acerca da renovação cultural que estava sendo vivida no
nosso país.

O grupo modernista-regionalista de Recife era liderado pelo destacado


sociólogo pernambucano Gilberto Freyre (1900-1987).

Essas declarações foram apresentadas no "1.º Congresso Regionalista do


Nordeste". Em suma, seu conteúdo, expressava a necessidade de restituir a
cultura regional nordestina, e por esse motivo, o manifesto recebe esse nome.

Dessa valorização da cultura regional, surgem brilhantes nomes a partir de


1930. São eles: Graciliano Ramos, José Lins do Rego, José Américo de Almeida,
Rachel de Queiroz, Jorge Amado, Érico Veríssimo e Marques Rebelo.

Em 1930, tem início a Segunda Fase do Modernismo no Brasil, a chamada Fase


de Consolidação. Nesse momento, os modernistas alcançam grande êxito e se
destacaram especialmente na poesia, bem como no romance.

Confira a obra na íntegra, fazendo o download do PDF aqui: Manifesto


Regionalista.

Leia também:

Movimento Pau-Brasil

Márcia Fernandes
 
Professora licenciada em Letras
O Movimento Pau-Brasil é um entre os movimentos modernistas - Verde-
Amarelismo ou Escola da Anta e Movimento Antropofágico - que tomou lugar
na Primeira Fase do Modernismo no Brasil, conhecida como a “Fase Heroica”,
fase que apresentou diferentes formas de abordagem patriótica.

Este movimento teve início em 1924 a partir da publicação do livro “Pau-Brasil”,


da autoria de Oswald de Andrade (1890 -1954) e ilustração da sua esposa, a
artista plástica Tarsila do Amaral (1886 -1973).

Capa do Livro Pau-Brasil

Resumo
Influenciado pelas vanguardas europeias decorria a Semana de Arte Moderna,
em 1922 e com ela várias formas de expressão artística inovadoras vieram à
tona.

Na sua sequência, Oswald de Andrade publica o “Manifesto da Poesia Pau-


Brasil”, que viria a ser criticado pelo grupo que veio a seguir, o Movimento
Verde-Amarelo, de 1926.

O Movimento do Pau-Brasil é um movimento nativista, que defendia a poesia


brasileira de exportação. Tal como o pau-brasil foi o primeiro produto brasileiro
a ser exportado, Oswald de Andrade desejava que a poesia brasileira se
tornasse um produto cultural de exportação; daí a escolha do nome do
movimento.

Oswald de Andrade ficou conhecido pela figura de irreverência e de crítica ao


academicimo e à burguesia. Assim, defendia, ao mesmo tempo que criticava, o
nacionalismo a sua maneira, a qual veio a ser alvo de julgamento pelo
Movimento Verde-Amarelo formado por Menotti del Picchia (1892-1988), Plínio
Salgado (1895-1988), Guilherme de Almeida (1890-1969) e Cassiano Ricardo
(1895-1974).

O patriotismo defendido pelo Verde-amarelismo contrapunha o do Pau-Brasil,


dado que é especialmente ufanista, bem como racista.
Saiba mais sobre esse movimento em: Movimento Verde-Amarelo e a Escola da
Anta.

A seguir, Oswald de Andrade revida o movimento da Escola da Anta, dando


origem a um novo movimento - o Movimento Antropofágico, em 1928, de
modo que o primeiro movimento modernista pode ser considerado a raiz deste
último, e um legado para a arte moderna.

Leia também o artigo: Movimento Antropofágico.

Principais Características
O “Manifesto da Poesia Pau-Brasil” é um dos textos mais importantes de
Oswald de Andrade, escritor que, como temos visto, destacou-se na literatura
modernista brasileira.

O primitivismo é a principal característica desse movimento, em que o


patriotismo enveredou por caminhos de valorização do passado histórico
brasileiro desprovido dos apelos ufanistas do Movimento Verde-Amarelo.

"A poesia existe nos fatos. Os casebres de açafrão e de ocre nos verdes da Favela,
sob o azul cabralino, são fatos estéticos.
....
O lado doutor. Fatalidade do primeiro branco aportado e dominando
politicamente as selvas selvagens. O bacharel. Não podemos deixar de ser doutos.
Doutores. País de dores anônimas, de doutores anônimos. O Império foi assim.
Eruditamos tudo. Esquecemos o gavião de penacho.”

(Trecho do “Manifesto da Poesia Pau-Brasil”)

Em dezembro de 2021, o cantor e compositor baiano Caetano


Veloso, atualmente com 80 anos, disse em entrevista ao
programa Roda Viva: “A Semana de 22 não era nada quando
eu era estudante”. A fala do artista pode deixar muita gente
confusa, mas a agora centenária Semana de Arte Moderna,
realizada nos dias 13, 15 e 17 de fevereiro de 1922, no Teatro
Municipal de São Paulo, tardou a causar um impacto na Bahia
– e em grande parte do Brasil.

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O evento que reuniu artistas plásticos, escritores, músicos e
arquitetos, e que foi marcado pela vontade de contestar a
estética e o modo de fazer arte que vigorava no Brasil até
aquele momento, ficou restrita, a princípio, aos artistas do eixo
Rio-São Paulo. O objetivo desses artistas era romper com as
normas da arte como conhecíamos, mirando no propósito de
uma liberdade criativa para todos.

Na ocasião, não houve artistas baianos. O evento dificilmente


contou com a participação de artistas de outros estados, mas
por conta de uma coincidência, quando o estado de
Pernambuco despachou um navio para São Paulo com alguns
intelectuais em busca das novidades, a Semana de Arte
Moderna acontecia.

“Alguns teóricos inclusive afirmam que os ventos mais velozes


e demolidores da primeira fase do modernismo chegam na
Bahia por influência de Pernambuco”, afirma o doutor em
Difusão do Conhecimento e mestre em Literatura, Gildeci Leite.
Essa chegada, no entanto, não significa que os ideais
propostos na Semana tivessem sido bem aceitos no estado
logo de cara.

O historiador, poeta e membro da Academia de Letras da


Bahia, Fernando da Rocha Peres, associa essa resistência ao
conservadorismo em que o estado vivia. Segundo ele, os
grupos conservadores eram “extremamente articulados e
poderosos”, e estavam presentes em todas as posições da
sociedade, desde o governo até as instituições privadas de
cultura, como as redações de jornais. “Foi preciso conquistar os
suplementos culturais para que pudesse haver uma discussão
e uma divulgação da arte moderna baiana”, afirma Rocha
Peres.

Ao mesmo tempo, naquele período, a Bahia estava navegando


nos mares do “tradicionismo dinâmico”, movimento encabeçado
pelo médico, poeta, acadêmico, colunista e crítico do jornal A
TARDE, Carlos Chiacchio. “O tradicionismo dinâmico não vai
ter a perspectiva demolidora que tem a Semana de Arte
Moderna de São Paulo, mas sim uma perspectiva de renovar
sem destruir a tradição”, conta Leite. Essa seria a primeira
forma baiana de recepcionar o modernismo.

E é com Chiacchio que algumas coisas começam a mudar,


quando no ano de 1928, ao lado de Pinto de Aguiar, Eurico
Alves, Godofredo Filho, Carvalho Filho e outros, fundam a
revista Arco & Flexa. Esse movimento inspira o surgimento de
outras revistas, como a Távola e, mais tarde, a Samba e a
Meridiano, essa última resultando no surgimento do grupo
Academia dos Rebeldes. Só então os ventos começaram a
mudar. “Antes disso, a Bahia não conhecia o modernismo. Não
podemos nem dizer que ela a recusava, porque desconhecer é
mais grave do que recusar”, diz Rocha Peres.
Os poetas e amigos Godofredo Filho e Carvalho Filho na Rua Chile|  Foto: Arquivo A
TARDE
  

Entre os membros da Academia dos Rebeldes estavam


Pinheiro Viegas, Sosígenes Costa, Edison Carneiro, Dias da
Costa e Jorge Amado. São essas pessoas que implementam o
“modernismo à moda baiana”, como conta Gildeci Leite.
Segundo o professor, o grupo lança a possibilidade de um
olhar mais interessante para a cultura negra, trazendo um outro
aspecto para o debate modernista.

Leite também conta que o que compõe esse modernismo à


moda baiana é o olhar para a cidade, algo que vai de encontro
com a ideia original da Semana de São Paulo. “Eurico Alves e
Godofredo Filho vão olhar especificamente para Feira de
Santana e Salvador, mas, de maneira geral, todos eles vão
olhar para as grandes cidades negras do país”, afirma o
professor.

Para Luiz Freire, doutor em História da Arte e professor da


Escola de Belas Artes da Universidade Federal da Bahia
(Ufba), o membro da Academia dos Rebeldes, Jorge Amado,
foi parte decisiva para o modernismo decolar na Bahia: “Suas
histórias traziam personagens identificados com a vida popular,
da linguagem que essa população utilizava, e isso foi uma
grande revolução que ele fez”.

Mas nas artes plásticas, o modernismo ainda patinava. Os


parâmetros artísticos que vigoravam até aquele momento eram
mais voltados para a representação da realidade, sempre com
uma tônica do figurativismo e na representação mais verídica
possível, como lembra Freire. “O público estava acostumado
com o artista reproduzindo a realidade”, explica. Mas em 1928,
alguém tentou mudar esse cenário.

Naquele ano, José Guimarães, um aluno da Escola de Belas


Artes ganhou um prêmio de viagem à Europa para frequentar a
Académie Julian, em Paris. Foi lá que o jovem artista conheceu
os valores da arte moderna. Em 1932, quando retornou,
Guimarães realizou em Salvador, no andar térreo do edifício do
jornal A TARDE, na Praça Castro Alves, uma exposição com as
obras que produziu durante sua passagem pela Europa.

No entanto, as obras não foram bem aceitas pelo público.


Segundo Freire, a crítica foi favorável ao artista, mas a negativa
dos professores de Guimarães, em especial a do mestre dele,
Presciliano Silva, fez com que o jovem artista decidisse migrar
de Salvador para o Rio de Janeiro, na tentativa de continuar
trabalhando com sua arte. Mesmo assim, o trabalho dele não
repercute no local, que tinha uma cena muito dinâmica.

“Entender o modernismo, os pressupostos dos modernistas,


não era fácil. Exigia uma reeducação do olhar, exigia uma
reeducação do conceito de arte. A arte estava muito ligada à
habilidade manual, artesanal e de uma certa forma o
modernismo vai quebrar com isso”, explica Freire.

O professor conta que, diferentemente de São Paulo, aqui não


houve um grupo de artistas interessados em mudanças que
pudessem se associar a Guimarães, como houve em função de
Anita Malfatti e sua decisiva exposição de 1917, quando ela foi
duramente criticada por Monteiro Lobato. O resultado dessa
associação de artistas em defesa de Malfatti foi o que resultou
na Semana de 22.

Mudanças

Mesmo depois da investida modernista de Guimarães, muitos


anos se passaram até que a Bahia pudesse ter um grupo de
artistas e condições culturais para entender e fomentar essas
mudanças. Freire conta que isso só vai acontecer entre o final
da década de 1940 e o início da década de 1950. Entre os
pioneiros estão Carlos Bastos, Mario Cravo Junior, Genaro de
Carvalho e Lygia Sampaio, apoiados mais tarde com a
chegada dos estrangeiros Carybé e Pierre Verger.
“Vai se criando toda uma geração de artistas entre a década de
1950 e 1960 que vão lançar as bases da baianidade
modernista, que tem uma grande característica, que é a
representação dessa paisagem cultural afro-baiana com as
cores e as formas simplificadas, assumindo a
bidimensionalidade da tela e do desenho”, conta Freire.
A Escola Paarque possui painéis modernistas como 'O Átomo', de Carybé|  Foto: Olga
Leiria | Ag. A TARDE
  

Esses artistas passam a utilizar a mesma forma de interpretar a


arte como os artistas populares faziam, sendo que a maioria
deles tinham passado por alguma formação e outros eram
autodidatas. Sobre isso, Freire lembra que esse primeiro grupo
era formado por burgueses, filhos de comerciantes e de
fazendeiros, que puderam bancar o estudo dos filhos fora do
país, tanto na França quanto no Estados Unidos.

Enquanto esse grupo podia escolher livremente qual ateliê do


mundo frequentar, colocando suas preferências à frente, foi
mais fácil para eles conhecer os artistas de vanguarda,
enquanto os bolsistas, que iam com dinheiro público através da
Escola de Belas Artes, eram obrigados a frequentar apenas a
Académie Julian.

Nesse período, a Semana de Arte Moderna de 22 já não


interferia em como o modernismo era visto. A literatura baiana
já estava em plena produção e havia um grupo de artistas
plásticos modernistas se estabelecendo. Agora, se falava nos
desdobramentos causados pela Semana de 22. Com a
fundação da Universidade Federal da Bahia, em 1946, atrelada
à visão do reitor Edgar Santos com uma política em que
educadores e intelectuais estavam à frente, como Anísio
Teixeira, a cena baiana esteve em completa transformação.

É nesse período que críticos passam a publicar em jornais


textos sobre a arte moderna, surgem outras exposições – como
a organizada por Jorge Amado, juntamente com o artista
Manoel Martins e com o jornalista Odorico Tavares, e a do
escritor carioca Marques Rebelo – e a primeira galeria
especializada em artistas modernos, a Oxumaré.

“Foi se criando o que se chama Sistema das Artes, que é a


chegada do próprio Museu de Arte Moderna, no início da
década de 1960, e toda uma movimentação com muito apoio
público”, conta Freire. O professor lembra que, nesse
momento, se consubstanciou encomendas de murais para os
prédios públicos e no incentivo para que as empresas
contratassem artistas modernistas para realizar murais nos
seus halls de entrada, em ambientes, e na produção de
monumentos.
Ao mesmo tempo, arquitetos foram chamados para a capital
com a proposta de criação de prédios públicos dentro da
estética modernista. Entre essas pessoas está o amargosense
Diógenes Rebouças e o arquiteto Gilbert Chaves, que projetou
a Casa do Rio Vermelho, onde moraram Jorge Amado e Zélia
Gattai, e é considerada a primeira casa moderna da Bahia.
Tudo isso porque uma das condições para haver o modernismo
está muito ligada à modernização da própria cidade, atrelado a
uma vida urbana dinâmica.

“A gente não pode nem minimizar a Semana e toda a militância


artística do eixo Rio-São Paulo, mas também não podemos
maximizar. Houve aqui toda uma rede de transformações que
vão desde o campo econômico, como a vinda da Petrobrás, o
posto de petróleo do Lobato, até as propostas educacionais de
ponta, como a de Anísio Teixeira, que gerou a Escola Parque,
onde foi a primeira iniciativa da implantação de murais de
artistas modernistas”, lembra Freire.

E essa modernização segue por mais alguns anos, com o


surgimento de outras gerações de artistas, cada um se
firmando no seu modo próprio de interpretar a realidade – ou
criar uma nova realidade. Até que entre 1969 e 1970 surge um
novo grupo de artistas, o Etsedron, em que todas as
linguagens se diluem, desde a dança, o teatro e as artes
plásticas.

Todas essas linguagens se integram na proposta social do


grupo Etsedron de mostrar para o mundo uma realidade que a
oficialidade brasileira escondia naquela época de repressão por
conta do golpe militar de 1964. Eles tinham como principal
objeto jogar luz na realidade do sertão nordestino, em especial
ao sertão baiano. “Considero que a modernidade se transforma
em contemporaneidade neste momento, com esse grupo
formado a partir da Escola de Belas Artes”, afirma Freire.

Para o professor, muito do que se faz atualmente ainda é fruto


do que os modernistas plantaram e fomentaram, do que eles
representam na luta pela liberdade de expressão e direito da
experimentação contínua. Segundo Freire, eles garantiram lá
em 1922 que isso seja infinito e elevado a uma superpotência,
que é o que temos na arte contemporânea.

Grandes nomes que beberam do modernismo ainda praticam


essa liberdade em suas artes, como Juarez Paraíso, Ieda
Oliveira, Fábio Magalhães, Bel Borba, Arthur Escovino, Virginia
de Medeiros e tantos outros. “Temos muitos artistas, e a Bahia
é muito ingrata. Eles não aparecem como poderiam aparecer.
Sobretudo não são representados nos acervos dos museus
que deveriam estar”, afirma o professor da Escola de Belas
Artes.

O ESCRITOR GOIANO MIGUEL JORGE É UM QUERIDO. RECONHEÇO


ENTRE SEUS TRAÇOS MAIS MARCANTES A ELEGÂNCIA NO
CONVÍVIO, A ATENÇÃO INDORMIDA COM OS AMIGOS E SUA
INTENSA LIGAÇÃO E INTERESSE POR TUDO QUANTO SE REFERE À
CULTURA.
CONHECI-O AINDA NA PRIMEIRA EDIÇÃO DO FESTCINEGOIÂNIA,
EM 2005, IMPORTANTE FESTIVAL DE CINEMA BRASILEIRO QUE
IDEALIZOU AO LADO DA AGITADORA CULTURAL
E PRODUTORA DÉBORA TORRES, OUTRA QUERIDA DE QUEM O
CINEMA ME FEZ IRMÃ.
A PARTIR DE ENTÃO, COMECEI A “DESCOBRIR” MIGUEL JORGE,
ESCRITOR DOS MAIS ATUANTES EM SOLO GOIANO.
O POETA É NATURAL DE CAMPO GRANDE (MS) E AINDA GAROTO
MUDOU-SE COM OS PAIS PARA INHUMAS (GO), ONDE FEZ OS
PRIMEIROS ESTUDOS.
É FORMADO EM FARMÁCIA E BIOQUÍMICA PELA UFMG, DIREITO E
LETRAS VERNÁCULAS PELA UCG, LECIONOU FARMACOTÉCNICA
NA FACULDADE DE FARMÁCIA DA UFG E LITERATURA BRASILEIRA
NO DEPARTAMENTO DE LETRAS DA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE
GOIÁS.
FOI UM DOS FUNDADORES DO GEN (GRUPO DE ESCRITORES NOVOS)
E SEU PRESIDENTE POR DUAS VEZES. TAMBÉM FOI POR DUAS
VEZES PRESIDENTE DA UBE, SEÇÃO DE GOIÁS. DIRIGIU TAMBÉM
POR DUAS VEZES O CONSELHO ESTADUAL DE CULTURA E INTEGRA
OS QUADROS DE CRÍTICOS DE ARTE DA ABCA E  AICA, OCUPANDO
A CADEIRA NÚMERO 8, NA ACADEMIA GOIANA DE LETRAS.
SEUS TEXTOS TAMBÉM JÁ GANHARAM AS TELAS DE CINEMA, SEJA
ATAVÉS DE CURTAS OU LONGAS-METRAGENS. É DELE, POR
EXEMPLO, O ROTEIRO DE WATAÚ  (PRÊMIO DE INCENTIVO
CULTURAL DO MINISTÉRIO DA CULTURA), FILMADO ÀS MARGENS
DO RIO ARAGUAIA, SOB A DIREÇÃO DE DÉBORA TORRES.
COM O CINEASTA JOÃO BATISTA DE ANDRADE, ROTEIRIZOU O
LONGA VEIAS E VINHOS, BASEADO EM SEU ROMANCE HOMÔNIMO,
FILMADO EM SÃO PAULO, TENDO NO ELENCO SIMONE
SPOLLADORE, LEONARDO VIEIRA, EVA WILMA, JOSÉ DUMONT,
CELSO FRATESCHI, MARCELA MOURA E AILTON GRAÇA, SOB A
DIREÇÃO DO PRÓPRIO JOÃO BATISTA, SEU AMIGO DE LONGA
DATA, QUE ESTE ANO REALIZOU UM DOC EM HOMENAGEM AO
AMIGO ESCRITOR.
O NOME DE MIGUEL JORGE CONSTA DO THE DICTIONARY OF
INTERNATIONAL BIOGRAFHY (TENTY-THIRD EDITION), ENGLAND.
E É DE MIGUEL JORGE O BELO LIVRO DE POEMAS QUE TENHO EM
MÃOS – DE OURO EM OURO.
PUBLICADO PELO INSTITUTO CASA BRASIL DE CULTURA, O LIVRO
VEM EM BELA CAIXA CONTENDO AINDA 15 GRAVURAS ORIGINAIS
DO ARTISTA ROOS E UM CD COM OS POEMAS INTERPRETADOS
PELO PRÓPRIO AUTOR.
E POR TÃO INSTIGANTE O PRESENTE QUE RECEBI DE MIGUEL,
CONVIDO VOCÊ, LEITOR AMIGO, A PARTILHAR UM POUCO DA
VASTA OBRA DO POETA COMIGO. VAMOS AO POEMA…
NO MAR, NENHUM BARCO
OS AMORES SÃO LARGOS E LONGOS E CABEM NAS CARTAS.
A NOITE LENTA FERE DE FACA A LUZ CEGA DO MEDO.
INDIFERENTES, AS BORBOLETAS SÃO ANJOS VESTIDOS DE PRATA..
ASSIM, OS MUSGOS VÃO COBRINDO DE VERMELHO OS MOLUSCOS
DENTRO DAS CAIXAS.
SÃO DO DOMINGO OS ESCARGOTS, LENTAS FLORES, COLOCADAS
SOBRE BANDEJAS DE PRATA.
TALVEZ NÃO SE POSSA EVITAR A FALTA DE PÃO, OS REFLEXOS DA
IRA,
A DOR QUE NÃO SE QUER DAR AOS FILHOS.
DORMEM AS NAVES SOBRE AS JANELAS DO MAR, TALVEZ UM BARCO,
IGUAL A   UM BARCO,  INDO ALÉM DO MAR, BRASA DA ALMA (BACO
NUM RISO  IGUAL A UM RISCO DE LÍNGUA NAS BOCAS).
IGUAL A UM CASACO DE FRIO QUE SE PENDURA DETRÁS DA PORTA.
IGUAL ÀS ONDAS A TESTEMUNHAR AS ROSAS SE DESFAZENDO NO
BRANCO LAÇO DAS ÁGUAS.
(A NOITE CARREGA OS DIAMANTES NO IMPACTO DO CHÃO QUE SE
FAZ CINZA).
SE VIAM ROUCAS AS AMÉRICAS, A CONSTITUIÇÃO DOS VENTOS
COBRINDO
LÁBIOS MUITO FINOS. ESTRELAS OSTENTAM UM FESTIM AMENO DE 
VOZES.
OS RATOS, OS GATOS, O NOJO ANUNCIADO. O GOZO DESFEITO EM
NADA, SE PÕE DE LADO, AINDA MAIS QUANDO DO CÉU SE TOMA LEI E
POSSE DE SECRETOS CÓDIGOS.
ESTE É UM DOS BELOS POEMAS ONDE GOIÂNIA ME RENASCE EM
SAUDADES… NO MAR, NENHUM BARCO…
DA LAVRA DE MIGUEL JORGE, ESTE QUASE GOIANO CUJA POESIA
NOS ENCANTA TANTO QUANTO SUA MANEIRA DE SER E ESTAR
PLENA DE LUZ, SENSIBILIDADE, REFINAMENTO DE GESTOS E
AÇÕES COTIDIANAS.
COMO A SUA POESIA QUE SE ANINHA FÁCIL EM NOSSA EMOÇÃO,
TÃO NATURALMENTE TOCANTE QUANTO CONCISA, BELA,
OBJETIVAMENTE CLARA.

A POESIA de MIGUEL JORGE é assim: mesmo


que não se saiba explicar porquês, prontamente
ela consegue nossa adesão.
O resto é DE OURO EM OU
Ermos e Gerais”. Contos. Goiânia: Bolsa de Publicações de Goiânia, 1944.

O célebre escritor traçou suas primeiras linhas aos 12 anos, inspirado em


“Assombramento”, de Afonso Arinos. Em 1934, se dedicou a composição de poesias,
enviando colaborações de cunho modernista para os jornais de Goiânia. No Rio de
Janeiro, Bernardo Élis (1915-1997) tentou a carreira literária, mas, devido à falta de
interesse das editoras por seus originais, voltou a Goiânia, fundando a revista “Oeste”.
Sua primeira publicação se deu por meio de uma Bolsa de Publicações de Goiânia, que
ganhou em 1944. O livro de contos recebeu comentários elogiosos da crítica literária.

O romancista, contista, dramaturgo poeta e crítico de arte Miguel Jorge nasceu em


Corumbá, Mato Grosso. Mas é considerado como autor goiano, pois instalou-se em
Goiânia há décadas em em Goiás firmou seu múltiplo talento literário. Ele participou da
criação do Grupo de Escritores Novos (GEN), que contribuiu, por assim dizer, para a
“modernização” da literatura brasileira escrita em Goiás. “O caminho de publicação do
primeiro livro nunca é fácil, mas eu tive sorte. Eu estava confiante e seguro de que
queria seguir a carreira de escritor. Entrei em contato com a editora e o livro logo foi
publicado. Recebi boas críticas, o que validou e consolidou meu estilo, o surrealismo. O
primeiro livro é sempre uma experiência, uma chama que queima, para ver o depois.”

Os livros são mais comentados de Miguel Jorge são o best seller “Veias e Vinhos”
(baseado numa história real) e “Avarmas” (um texto experimental, altamente inventivo).

Miguel Jorge também é crítico de arte e foi editor do Opção Cultural, que, sob sua
gestão, ganhou prêmio da Academia Brasileira de Letras (ABL) tanto pela qualidade do
material publicado quanto pela qualidade do texto em si. Ele é um dos mais produtivos
escritores de Goiás — tanto em termos de qualidade quanto de quantidade. Seu trabalho
é estudado no exterior, por exemplo na Itália.

“Estávamos no governo Otávio Laje [década de 1960]. O Departamento de Cultura da


Secretaria de Educação e Cultura era dirigido pelo jornalista Domiciano de Faria (foi
diretor de Jornalismo do Grupo Jaime Câmara). Ele foi o grande responsável por
facilitar a publicação de inúmeros livros de escritores goianos, inclusive o meu. Eu
fiquei satisfeito com a oportunidade, mas isso não facilitou minha vida. A publicação do
primeiro livro não significa muita coisa para os próximos, só para quem faz fama em
alguma editora grande do país. Goiás, infelizmente, não tem esse poder de promoção de
escritores. Achar que, a partir daí, fica mais fácil é um erro. A responsabilidade
aumenta.”

Heleno Godoy é autor de uma poesia e de uma prosa modernista — experimental — e,


ao mesmo tempo, um crítico literário agudo (também deu aulas no curso de Letras da
Universidade Federal de Goiás). Ele é doutor em literatura pela Universidade de São
Paulo (a dissertação de mestrado foi apresentada nos Estados Unidos) e especialista em
autores de Língua Inglesa, notadamente em autores irlandeses. É um dos artífices do
Grupo de Escritores Novos (sua história como “orientador” cultural de uma geração de
criadores literários ainda está por ser contada).

Nas reuniões dos GEN, escritores discutiam a literatura moderna, como a prosa de
James Joyce e Guimarães Rosa e a poesia de Eliot, Pound, João Cabral de Melo Neto,
Mário Chamie, brothers Campos (a poesia práxis, de Chamie, era “adversária” do
concretismo), para citar apenas alguns, e contribuíram para criar uma literatura local
modernista e refinada (não no sentido de pomposa, e sim de inventiva, de criar novas
linguagens).

Há ecos da prosa de Joyce (quiçá Beckett) na literatura de Heleno Godoy (como no


romance “As Lesmas”, por sinal elogiado por Bernardo Élis), mas, claro, apresenta sua
própria contribuição — não se trata de simulacro. Heleno Godoy assimilou bem o
modernismo e pode chamá-lo de “seu”, no sentido de que tem um lugar entre os
modernistas, não como epígono, e sim como criador, um par dos grandes, como
Guimarães Rosa e João Cabral de Melo Neto.

Um dos críticos mais perspicazes da poesia de Heleno Godoy é o crítico Luiz Costa
Lima.

Nascida em Tigipió, no sertão pernambucano, Yêda Schmaltz (1941-2003) veio ainda


criança para Goiás, onde adotou o Estado em seu coração. De Ipameri para Inhumas e
de Inhumas para Goiânia, aqui a poeta se consagrou e viveu, até o fim de sua vida.

Na orelha de “Rayon” (1997) — um de seus últimos livros —, a poeta declara: “Eu não
sou poeta não, este lirismo todo é só reclamação. Goiana sou: é só observar o não
repetido na frase anterior”.

O seu primeiro livro nasceu de maneira singela, numa edição modesta, feita nas oficinas
gráficas da antiga Escola Técnica Federal de Goiás. O ano da publicação não poderia
ser mais emblemático: 1964. Ano do golpe militar, que encerrou o governo do
presidente João Goulart, dando início à ditadura militar, que duraria 21 anos.

Yêda Schmaltz, poeta sofisticada, conhecia a tradição poética e inclusive as teorias. Era
uma poeta tão poderosa que, quando escrevia, parecia tão “natural” — tão inspirada —
que os “andaimes” de sua criação artística raramente são visíveis. Sua poesia era
altamente trabalhada, de uma finura rara e inescapável. Como Miguel Jorge e Heleno
Godoy, participou do Grupo de Escritores Novos (GEN). Sua poesia era modernista,
altamente técnica, mas sem perder um lirismo tão atento quanto, por vezes, irônico.

Ao lado de Maria Lúcia Felix, poeta de rara finura e de linguagem de precisão cirúrgica,
Yêda Schmaltz merece ser incluída entre as maiores poetas do Brasil. Merece ter sua
poesia reeditada por editoras do calibre da Iluminuras, da Companhia das Letras, da
Record e da Todavia.

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