Você está na página 1de 14

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE GOIÁS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU EM LETRAS

Uma análise semiótica e o processo de intratextualidade contida no livro Profugus


de Miguel Jorge

Goiânia,
2022.
Uma análise semiótica e o processo de intratextualidade contida no livro Profugus
de Miguel Jorge

Trabalho apresentado à disciplina


Literatura e outras Linguagens
artisiticas: Relações Intersemióticas, no
Programa de Pós-Graduação Stricto
Sensu em Letras da Escola de Formação
de Professores e Humanidades da
Pontifícia Universidade Católica de
Goiás, como requisito para a composição
de nota - 2022/2, sob a orientação da
Professora Dr.ª Custódia Annunziata
Spenciere de Oliveira.
Goiânia,
2021.
RESUMO:
A leitura de textos literários sempre foi tratada como algo complexo, pois muitos
leitores por produzirem leituras rasas acabam por não compreender a obra em sua
totalidade fazendo com que a busca pela leitura de obras literárias, sejam restritas a
escolas e alunos de universidades. Um dos principais papeis da literatura e libertar os
homens através das palavras, dessa forma a leitura dos livros Miguel Jorge, mais
precisamente o Profugus não pode ser confundida com uma literatura regional, o que
não seria desprezo, a citação do livro nos remete aos poemas épicos de Eneida, assim
sendo o poeta modernista/contemporâneo explora em seus poemas os problemas que
afligem a humanidade e são anunciações de tempos sóbrios, como na citação de Bertolt
Brecht que inicia o segundo capítulo.
objetiva-se com a presente pesquisa, a partir da análise semiótica e da
semanálise de Julias Kristeva, analisar e aprofundar a função do uso do signo objeto
lacrado, e depois os seus sinais significativos, livro premiado em 1989 com o Prêmio
“Hugo de Carvalho Ramos”, a pesquisa aplica a metofologia da semanálise sendo a
crítica da crítica propõe uma teoria que busca esfacelar e esmiuçar a obrar não só para
revelar os significados nas palavras e figuras, mas sim mostrar a importância dos
espaços, colocações de palavras e tamanho de letras.
Ao lançar o olhar semiótico sobre o texto há uma profunda busca em analisar o
Profugus, que na essência da palavra: “fugidio” mostra o homem fugitivo de seu
destino, dessa forma será analisado os três capítulos contido no livro: I- Do homem E
do Rio, II- Do Corpo do Homem, III-Do homem e seus Pertences, além dessa análise
semiótica, a intertextualidade e metalinguagem serão mecanismos que corroborarão
para a análise do referido livro, assim como o elemento água presente em seus poemas e
em muitos textos literários brasileiros.
Os resultados dessa pesquisa poderão servir de base para futuras análises de
textos, não somente de poemas, pois segundo Julias Kristeva a semiótica/semanálise
pode ser utilizada na compreensão de qualquer gênero literário

Palavras–Chave: Semanálise. Signo. Intertextualidade


INTRODUÇÃO

Ao se defrontar com o livro de poemas, Profugus de Miguel Jorge, inúmeros


questionamentos surgem: desde o título, - Fugidio -_ até a forma de apresentação do
livro. Miguel Jorge é um autor, cuja escritura é reconhecidamente polissêmica,
altamente semiótica, no sentido de explorar as possibilidades da língua em processo de
semiose, na organização de um discurso rico e produtivo. Ao se encarar Profugus, essas
caraterísticas são mais fortes, pois elas se estabelecem desde o gênero – a lírica – até a
própria forma de apresentação do livro. Assim, o chamamento a uma análise centrada
na produtividade desse discurso é muito forte.
A semiótica é a ciência dos signos, é a ciência das representações e ela
estabelece as bases teóricas que dão suporte para este olhar sobre a produtividade do
signo linguístico, matéria prima do discurso verbal. É um olhar centrado na lógica, mas
no reconhecimento das possibilidades de produção de raios que iluminam em várias
direções. Pierce afirma sobre sua posição de reconhecer a lógica como sinônimo de
semiótica e da capacidade do signo de produzir interpretantes.

Em seu sentido geral, a lógica é, como acredito ter mostrado,


apenas um outro nome para semiótica, a quase necessária ou
formal, doutrina dos signos. [...] um signo ou representamen é
aquilo que, sob certo aspecto, ou modo representa algo para
alguém. Dirige-se para alguém, cria na mente dessa pessoa, um
signo equivalente, ou talvez um signo mais desenvolvido.
(PEIRCE, 2017, p.45-46)

Desde a apresentação do livro, o processo de semiose, o processo de formação


de interpretantes se faz de forma quase voraz, pois a capa com a foto de uma gravata,
cuja estampa forma a trama do tecido, numa profusão de homens emaranhados, já incita
a buscar os sentidos “fugidios” ou desviantes. Em seguida, na primeira página, uma
caricatura do autor e, continuando, o índice, a página de abertura com a divisão dos
capítulos, uma série de imagens – fotografias de quadros – novamente a gravata da capa
e só então, o prefácio seguido dos poemas. Só a apresentação inusitada, já sugere uma
profusão signica intersemiótica e com alta produção do processo de semiose. Já aí surge
o questionamento: se a lírica já é uma forma de construção discursiva de significados
desviantes, se o título do livro Profugus remete a algo fugidio, em que direção ou
direções o olhar do leitor deverá se dirigir em Profugus? Ou melhor, qual será a porta de
entrada? Há uma reflexão metalinguística na construção do livro?
O livro traz como centralidade temática, o Homem, os capítulos o divide em Ser,
Corpo e Pertences. Na abertura do primeiro e do segundo capítulos, há algumas
epígrafes importantes, para as quais se pergunta; estarão mesmo indicando um
caminho? Profugus é constituído por imagens que surgem sem que sejam anunciadas
no índice e separadas nos capítulos, essa forma de abordagem mostra a genialidade do
autor e seu processo de construção pós modernista1¹. Profugus é constituído de três
capítulos: o primeiro capítulo I- Do homem E do Rio. No capítulo II Do corpo do
Homem e o III capítulo- Do Homem E seus Pertences. Antes de analisar o poema é
necessário entender o que é a semiótica? Qual seu papel na sociedade?

1
Miguel Jorge foi um dos fundadores do GEN (Grupo de Escritores Novos) e seu presidente por duas
vezes, apesar de fazer parte de um grupo com ideias modernistas, seu discurso avança para o pós-
modernismo.
2 REFERENCIAL TEÓRICO

2.1 Orientações gerais do referencial teórico

"A semiótica é a ciência que estuda os signos, portanto, seu campo de estudo é
amplo, pois abarca todas as linguagens (verbais e não verbais), já que cada linguagem é
formada de signos que permitem a comunicação entre os indivíduos. Isso porque os
signos estão associados a algum tipo de representação.
Dentre os canais que constituem o ato da comunicação, figura-se o discurso. Ele
é o meio pelo qual se transmite uma ideia, se expõe uma opinião, quer na fala ou na
escrita.
Dessa forma, em se tratando do texto narrativo, todo o desenrolar dos fatos, em
consonância com a ação dos personagens, está condicionado ao propósito do narrador
em materializá-lo por meio de uma mensagem discursiva. Tal registro se dá de formas
distintas, caracterizando-se de forma direta e indireta ou, em alguns casos, ocorre a
fusão de ambas.
Referindo-se a qualquer tipo de ação do signo, a semiose gera e produz um
interpretante de si mesmo, isto é, a semiose consiste na ação de determinar um
interpretante. Todo ato de linguagem, seja ela artística ou não, enquanto ato de
significação, implica uma semiose, que equivale à função semiótica, propriamente dita.
Várias foram as questões levantadas quando do enfrentamento do objeto de
estudo: o que quereria Miguel Jorge em estimular seu leitor ao misturar dois sistemas
semióticos, a imagem e o texto verbal? Seria apenas demonstração de modernidade?
Onde Miguel Jorge encontra a capacidade de semiose do seu texto? O que o poeta busca
mostrar em relação aos três capítulos?
Miguel Jorge começa a forçar o pensamento do leitor a partir da capa, capa esta
constituída por uma gravata cortada na altura da amarração no pescoço, uma obra prima
feita por Deck. Já na capa é possível perceber que o poeta a aparência das aderências do
homem, perfeita harmonia entre o título e a imagem essa mistura de sistemas já e bem
representada na charge de Jorge Braga, onde o poeta é retratado com sobrancelhas
arguidas no sentido de indagação e com óculos providos por letras embaraçadas, numa
referência a reflexo dos sistemas semióticos vislumbrados pelos homens que a partir do
momento que sai da mente pode irradiar vários signos, desprovido de qualquer pré-
estabelecido, deflagrando assim um postura livre de criação e assim apresentando traços
modernistas de seu poema.

cabe assinalar que o escritor pós-moderno Miguel Jorge


“(...)
não se restringe à busca de novidades temáticas ou de facetas
singulares dos temas tradicionais, mas insiste na “revisitação”
desses temas e dessas facetas. Ele insiste na reescrita por
“perlaboração” — designação a que já fizemos referência —
segundo Linda Hutcheon, em Poética do pós-modernismo (Rio
de Janeiro, Imago, 1991. p. 331), como modo de o homem se
libertar de mecanismos repetitivos. Assim, Miguel Jorge
consegue ser plenamente um criador atualizado com o seu
tempo, tal como o demonstra no correr de sua obra, sobretudo
no instigante livro Calada nudez.”   MOEMA DE CASTRO E SILVA
OLIVAL Celebração: quarenta anos de literatura.   Prefácio,
seleção e notas Moema de Castro e Silva Olival.  Goiânia, GO: Editora UFG,
2009.  164 p.  ilus. p&b  ISBN 978-85-7274-287-0   Ex. bibl. Salomão
Sousa.“V     DEOCLÉCIO SCHERER.
Essa mistura de sistemas, porém não pode ser considerada apenas uma
demonstração de modernidade, pois o poeta em suas produções mostra-se um homem a
frente de sua época. Alguns elementos no decorrer do texto se sobressaem em relação a
modernidade; a imagem de um carro no retrovisor mostrando a evolução das maquinas
associando-se ao Belle Époque, assim sendo o fato da imagem do carro mostrado no
retrovisor pode ser considerado que a máquina quando foi descoberta já estava atrasada
ou podemos nos referir ao atraso do nosso país em relação aos países europeus que era
exorbitante.
Por analogia a linguagem, as misturas das figuras mostram um homem moderno
que constroem maquinas, bombas e aviões assim como será desvelado em seus poemas,
porém as utilizam de maneira errônea. O Homem criou mecanismo para sua liberdade,
mas não conseguiu libertar sua mente.

“Miguel Jorge realiza uma articulação entre o silêncio e a palavra,


desnudando (se) (n)o cerne de sentimentos, sob três aspectos: o pessoal, o
social e o estético-filosófico, inquirindo os valores fundamentais do homem
sob a capa de exercícios lúdicos que confrontam o visual e o verbal.” 
FERNANDO PY

Diante de tantos aspectos levantados sobre a produção do poeta Miguel Jorge,


pode-se observar a importância da lírica em seus poemas. A lírica moderna dos poemas
de Profugus é oposta a postura escapista do lirismo romântico, sua lírica e aquela em
que os pensamentos estão presos a vida e não pode deixar de enfrenta-la, pois é
necessário denunciar suas contradições e suas desigualdades.
A lírica moderna tem suas características enraizadas no Romantismo, momento
em que os poetas tomam consciência de que a vida não poderia ser explicada pelo
mecanismo próprio de uma ciência exata, como um relógio, pois “o universo não era
uma máquina, mas algo mais misterioso e menos racional”, como assinala Edmund
Wilson, mas encontrou sua plenitude com o Simbolismo. Conforme Wilson, a história
do Simbolismo inicia quando um romântico tardio – Charles Baudelaire – leu, pela
primeira vez, Edgar Allan Poe em 1947.
Ao procurar outros escritos de Poe, Baudelaire encontrou poemas e contos que ele
havia pensado “vaga e confusamente” em escrever. Os poetas simbolistas consideram o
símbolo como o recurso para expressar o vago e multiforme mundo interno do ser
humano, bem como as indagações sobre os mistérios cósmicos, para Peirce (1958, CP,
2.273), representação é a apresentação de um objeto a um intérprete de um signo ou a
relação entre o signo e o objeto,
Nesse sentido, a linguagem simbólica na lírica moderna é o recurso que institui,
simultaneamente, como presença e ausência, algo inapreensível e misterioso, cuja
realidade só pode ser pressentida, assim sendo na poesia além de se observar a palavra,
não se pode deixar de serem analisados os espaços entre elas, além do próprio espaço
ocupado na folha, em detrimento ao espaço do homem ocupado na sociedade.
Para os românticos, e em seguida para os simbolistas, o símbolo é inseparável do
mistério; o poeta Stéphane Mallarmé considerará que a riqueza do símbolo está no fato
de que ele pode evocar um objeto para mostrar um estado de alma ou escolher um
objeto para dele abstrair um estado anímico. Referindo-se a Mallarmé, Hugo Friedrich,
em A estrutura da Lírica Moderna, sublinha também a origem romântica do
Simbolismo: “a
lírica de Mallarmé pertence a uma estrutura poética cujas articulações isoladas têm sua
origem no Romantismo e que foi se definindo cada vez mais a partir de Baudelaire”
Aprender diz respeito essencialmente aos signos. Os signos são objeto de um
aprendizado temporal, não de um saber abstrato. Aprender é, de início,
considerar uma matéria, um objeto, um ser, como se emitissem signos a
serem decifrados, interpretados. Não existe aprendiz que não seja
"egiptólogo" de alguma coisa. Alguém só se torna marceneiro tornando-se
sensível aos signos da madeira, e médico tornando-se sensível aos signos da
doença. A vocação é sempre uma predestinação com relação a signos. Tudo
que nos ensina alguma coisa emite signos, todo ato de aprender é uma
interpretação de signos ou de hieróglifos. DELEUZE, Gilles (2003) Proust e
os signos. 2.ed. trad. Antonio Piquet e Roberto Machado. Rio de Janeiro:
Forense Universitária, 2003

Deleuze assinala em relação a sensibilidade da observação dos signos, pois esse


aprendizado de início que é considerar a matéria, um ser, um objeto que emite signos a
serem decifrados é uma das abordagens em relação a semiótica Jorgiana.
Para Hugo Friedrich:
“A cognição da lírica Moderna encontra-se diante da tarefa de procurar
categorias com as quais se possa descrever essa lírica. Não se pode fugir ao
fato- e toda a crítica o confirma- de que se apresentam categorias
predominantemente negativas. É decisivo, no entanto, que elas vêm
empregadas não para depreciar, mas para definir. Ora, este uso com o
propósito de definir, em vez de depreciar, é já uma consequência daquele
processo histórico pelo qual a lírica moderna desprendeu-se daquela
precedente”. Friedrich, H, Estrutura da Lírica Moderna, Duas Cidades, São
Paulo 1978, página 19 e 20.

A obra de Miguel foi analisada a partir da teoria de Charles S. Peirce, A.J


Greimas e Julias Kristeva
A semiótica surgiu nos estudos linguísticos e teve auge na década 1960 com a
pesquisa do Lituano Algirdas Julius Greimas (1917-1992) contudo a palavra semiótica
foi utilizada pela primeira vez pelo filósofo e linguista americano Charles Sanders
Peirce. Semiótica originou-se da linguística e só se firmou quanto ciência da
significação no século XX. Antes do termo “semiótica” ser adotado por eles, Ferdinand
Saussure utilizou-se do termo semiologia.

... o problema linguístico é, antes de tudo, semiológico, e todos os nossos


desenvolvimentos emprestam significação a este fato importante. Se se quiser
descobrir a verdadeira natureza da língua, será mister considerá-la
inicialmente no que ela tem de comum com todos os outros sistemas da
mesma ordem; ... com isso, não apenas se esclarecerá o problema linguístico,
mas acreditamos que, considerando os ritos, os costumes etc. como signos,
esses fatos aparecerão sob outra luz, e sentir-se-á a necessidade de agrupá-los
na Semiologia e de explicá-los pelas leis da ciência (SAUSSURE, 2006, p-
25).

Ferdinand Saussure ao usar o termo semiologia, busca mostrar algo que vai além da
linguística; a semiologia é a ciência que estuda os signos no seio da vida social. Já o
termo posteriormente utilizado por Peirce e Greimas, semiótica é a ciência geral dos
signos, que inclui os signos de natureza não humana, e a ciência da significação. Ela
tem como objeto de estudo o texto/discurso e não a palavra solta ou a frase, seu objetivo
é explicar os mecanismos, os procedimentos do plano de conteúdo e do plano da
expressão.
Considerado um teórico contemporâneo Algirdas Julius Greimas estuda a relação do
plano de expressão e do plano de conteúdo através do texto, mas afinal o que seria o
plano de expressão e o plano de conteúdo?
Segundo Hernandes “O plano de conteúdo é o lugar dos conceitos ou “onde o texto
diz o que diz”. O plano de expressão é o “lugar de trabalho das diferentes linguagens
que vão, no mínimo carregar, os sentidos do plano de conteúdo” (HERNANDES, 2005,
p. 228).
Algirdas Julius Greimas em Ensaios de semiótica Poética parte desse princípio,
ao analisar o discurso poético, Greimas na página 18, fala sobre o Isomorfismo da
Expressão e do Conteúdo, assim como o progresso da linguística.
“o progresso fundamental da linguística no período entre as duas guerras
constituiu em estabelecer a evidência de que a análise, iniciada no plano de
signos morfemas, palavras, frase, discursos) só poderia prosseguir e explicar
o fenômeno linguístico operando a disjunção dos dois planos simples da
linguagem- o da expressão e o do conteúdo- submetendo cada um deles
isoladamente a uma segmentação e a uma sistematização, não mais dos
signos e sim, para usar o termo Hjelmlesviano, das figura, isto é, em
unidades- agora construídas e não manifestadas- do dois planos”. Como
vemos a palavra como destruição do signo não ficou a espera do
aparecimento de uma nova geração de críticos literários (Ensaios de
Semiótica Poética, Editora Cultrix, página 18)

Em relação ao plano de expressão, Greimas afirma que não há empecilho algum no


empréstimo do conceito de isotopia2 ao plano de conteúdo, para ele a isotopia semântica
de natureza sememica é que permite superar os obstáculos postos à leitura pelo caráter
polissêmico do texto manifestado. E que o destinatário de um discurso qualquer
consegue eliminar até 40% das redundâncias fêmicas desnecessárias à apreensão dos
sentidos.
A mensagem poética poderia ser interpretada, pelo contrário, como uma valorização
das redundâncias, com uma nova isotopia sonora, mas agora não mais no sentido
denotativo e sim no conotativo, pois o que autoriza a falar numa gramática da expressão
poética, em sentido não simplesmente metafórico, não é apenas o postulado do
isomorfismo, mas também certas considerações a respeito da musicalidade da poesia,
surgindo o discurso poético em seu plano de expressão como uma linguagem ao mesmo
tempo de ruídos e sons
Em relação ao plano de conteúdo para Greimas invertem-se as dificuldades, quando
se pretende falar, pois não se fala em expressão e sim em conteúdo poético, no primeiro
caso decorriam dos fatos de saber pouco sobre estruturas fonêmicas expressivas, no
segundo caso elas se devem talvez pelo fato de saber demais.

Expliquemo-nos: considerado isoladamente, o significado poético não se


distingue de maneira alguma dos outros discursos- literários, místicos,
oníricos- que possam ser elaborados, sobre os mesmos assuntos. Nossos
conhecimentos e nossas ignorâncias se veem em todos eles igualmente
distribuídos, e consiste numa massa de estudos parciais e de pontos de vista
múltiplos, assim como na ausência de uma teoria homogênea do discurso, por
conseguinte, é apenas a necessidade de encaminhar conjuntamente dois
discursos paralelos, projetando as coerções da expressão sobre o desenrolar
dos conteúdos, e vice e versa, que determina em grande parte as opções

2
Segundo Greimas é a interação sintagmática de membros significativos idênticos ou semelhantes que
originam um plano homogéneo de leitura textual. Rastier alargou o conceito englobando não só o nível do
conteúdo, como Greimas, mas também o nível da expressão. Explicou assim a definição como uma
recorrência ou repetição de qualquer elemento linguístico.
referentes estas ou aquelas formas de organização do texto poético. Neste
sentido, seria possível afirmar que o poético seleciona as suas formas nos
inventários que lhes são apresentados pela poética (Greimas, A. J, Ensaios
de Semiótica Poética, traduzido por Dantas, H. L, Editora da universidade de
São Paulo, Cultrix, 1975 página 23)

Um dos problemas em relação ao plano de conteúdo apontado por Greimas é a


possibilidade da leitura pluri-isotópica, deixando bem claro que a pluri-isotopia não tem
nada a ver com as “infinidades de leituras possíveis” expressão muito em voga e que
tende a negar qualquer possibilidade de análise científica de obras literárias. Para ele,
embora seja admitido um projeto de gramática discursiva e reconhecida a necessidade
de distinguir os níveis “gramaticais”, ainda estaríamos longe de concepções de formas
canônicas que devem ser atribuídas a esses níveis. Há ainda que se destacar no plano de
conteúdo, o plano semântico, onde o enunciado dito enunciação aparece como uma
isotopia possível do discurso poético, onde então distingue-se três planos de conteúdo: o
sujeito falando do seu próprio ser, de seu fazer, que pertence à ordem do seu dizer ou da
finalidade do seu dizer.
Em análise a linguagem na forma do discurso faz-se necessário a compreensão da
mesma como um processo interação mediada por diálogo e não apenas como um
sistema autônomo, Mikhail Bakhtin foi o que se destacou na forma de estudar a
linguagem, para o filósofo a língua seria um objeto abstrato todavia como atividade
social, fundadas na necessidade de comunicação, sendo assim a natureza da língua seria
essencialmente dialógica e ainda como realidade da linguagem a matéria linguística é
apenas uma parte do enunciado, pois existe a parte não-verbal que corresponde ao
contexto de comunicação.

Bakhtin expõe bem a necessidade de uma abordagem marxista da filosofia da


linguagem, mas ele aborda, ao mesmo tempo, praticamente todos os
domínios das ciências humanas, por exemplo, a psicologia cognitiva, a
etnologia, a pedagogia das línguas, a comunicação, a estilística, a crítica
literária e coloca, de passagem, os fundamentos da semiologia moderna.
Aliás, ele possui de todos esses domínios uma visão notavelmente unitária e
muito avançada em relação a seu tempo. Contudo, e nesse aspecto o subtítulo
Tentativa de aplicação do método sociológico em linguística é muito
revelador; trata-se, principalmente, de um livro sobre as relações entre
linguagem e sociedade, colocado sob o signo da dialética do signo, enquanto
efeito das estruturas sociais. (Volochínov Bakhtin, M Marxismo e a
filosofia da linguagem, editora Hucitec, 2006, página 6)

Saussure o representante mais eminente da semiologia ,pois entendia a linguística


como um ramo mais geral dos signos, chamou o objetivismo de abstrato, assim como
para Bakhtin a língua é um fato social, cuja sua existência se funda na necessidade de
comunicação, porém ao contrário de Saussure, Bakhtin valoriza a fala, a enunciação e
reafirma sua natureza social, não individual, para ele a fala estaria indissoluvelmente
ligada as condições de comunicação que por sua vez estão sempre ligadas ás estruturas
sociais.
O semiologista francês Roland Barthes também parte do pressuposto de que a
linguagem é eminentemente social. Em seu livro o Grau zero da escritura (1953) Roland
Barthes inicia sua primeira parte com um questionamento. O que é a escritura?

Sabe-se que a língua é um corpo de prescrições e de hábitos comum a todos


os escritores de uma época. Isso quer dizer que a língua é como uma natureza
que passa inteiramente através da fala do escritor, sem, contudo, dar-lhe
forma alguma e nem sequer alimentá-la: é como círculo abstrato de verdades,
fora do qual – somente fora dele – começa a depositar-se a densidade de um
verbo solitário...não é um lugar de engajamento social, mas somente um
reflexo sem escolha, a propriedade indivisa dos homens e não dos escritores;
ela permanece fora do ritual das letras; é um objeto social por definição, não
por eleição ( Barthes, R, O Grau zero da escritura, tradução de Dantas, H.L,
Arnechand, A e Lorencine,A, editora Cultrix, São Paulo,1953.página121)

Na segunda parte, Triunfo e Ruptura da Escritura Burguesa, Roland Barthes fala


sobre a literatura pré-clássica e a aparência da pluralidade das escrituras, segundo o
autor essa variedade parece bem menor se colocarmos os problemas de linguagem em
termo de estrutura, e não mais em termos de arte. Para ele, um leitor moderno, a
impressão de variedade é tanto mais forte quanto a língua parece ainda ensaiar as
estruturas instáveis e não fixou definitivamente o espírito de sua sintaxe e as leis de
aumento de seu vocabulário. A singularidade da escritura burguesa correspondia a
pluralidade de retóricas, no momento que os tratados de retórica, deixou de interessar
em meados do século XIX a escritura clássica deixa de ser universal
Roman Jakobson também foi um dos contribuintes para o processo da semiótica
quando tratou sobre a proposta da comunicação do ser humano. Em relação ao modelo
linear de comunicação foi inserido mais três funções: função fática, metalinguística e
poética, assim como ao esquema que Bühler desenvolveu para explicar como
funcionava o ato comunicativo: função expressiva, apelativa e representativa. Jakobson
defendia a teoria de que a linguagem deve ser examinada em toda a variedade de suas
funções
Em “Introdução da Semanálise” de Julia Kristeva, no primeiro capítulo o Texto e sua
Ciência, incide em novos questionamentos. Qual é o objeto específico dentre as
multiplicidades das práticas significantes? Quais são as leis de seu funcionamento?
Qual seu papel histórico e social? Todas essas perguntas são colocadas a ciência das
significações à Semiótica. Novamente o objeto de pesquisa se concentrará nesse último
questionamento por outrora. Assim como nos linguistas anteriores o papel social da
língua que persiste mais e mais firmemente seu domínio próprio.

“Mergulhado na língua, o texto é, por conseguinte, o que ela tem de mais


estranho: aquilo que a questiona, aquilo que a transforma, aquilo que a
descola de seu inconsciente e do automatismo de seu desenvolvimento
habitual. Assim, sem estar na origem da linguagem1 e eliminando a própria
questão de origem, o texto (poético, literário ou outro) escava na superfície
da palavra uma vertical, onde se buscam os modelos dessa significância que a
linguagem representativa e comunicativa não recita, mesmo se os marca.
Essa vertical, o texto a atinge à força de trabalhar o significante: a imagem
sonora que Saussure vê envolver o sentido, um significante que devemos
pensar aqui também no sentido que lhe deu a análise lacaniana”. (Introdução
da Semanálise- Julia Kristeva- página 9)

A pratica da pesquisa da semiótica moderna e aprimorada por Julia Kristeva que


estudará no texto a significância e seus tipos, atravessará o significante com o sujeito e o
signo e a organização do discurso para atingir os germes do que significará na presença
da língua, foi denominada semanálise e/ou crítica do seu próprio método.
O texto como produtividade associado ao conceito de texto, foi formulado por
Julia Kristeva, porém esse termo já existia nas relações capitalistas e era utilizado como
mecanismo de controle do tempo e do trabalho do operariado.
A sociedade industrial moderna baseou-se nesse princípio da “produtividade”
que guarda ainda uma especificidade maior, essa medição é cronológica, rigorosa,
maquinal em relação ao trabalho do operariado. Seu trabalho é alienado e seus
movimentos repetitivos, que não necessitam de esforços mentais, o homem-máquina.
Já o texto como produtividade está associado a contradição, pois faz parte de
práxis humana, a produtividade de um texto pode ter o papel de alterar uma língua e
torna-la repetitiva.

O texto faz por aflorar o consciente e o inconsciente da língua. O alvo da


produtividade do texto é a significação, a produtividade inscreve-se não é inscrita pela
contradição que marca o todo social.
Segundo Kristeva, A produtividade do texto - esse trabalho translinguístico com a
língua - não é valorizada socialmente. A sociedade só valoriza o efeito, o produto - a
mercadoria que se consome, que obedece às leis estabelecidas pelo mercado. Para ela
cabe ao trabalho crítico a recuperação dessa variante social não valorizada que é o texto.
Mas que o recupere enquanto prática não fechada.

“A ciência literária reconhece assim duas limitações: 1- A impossibilidade de


considerar uma prática semiótica que não seja em suas relações com uma
verdade discursiva (semântica ou sintática); 2- A amputação (abstração
realista) da totalidade atuante numa de suas partes: em resultado consumido
por um determinado sujeito. O consumo literário e a ciência literária passam
ao lado da produtividade textual; só atingem um objeto modelado segundo
seu próprio modelo (sua própria programação social e histórica) e nada
conhecem além do conhecimento (de si mesmos) ”.

Para Kristeva o verossímil (o discurso literário) é o segundo grau de relação


simbólica sendo autentico o quere dizer verdadeiro, a verdade seria um discurso
semelhante ao real, o verossímil é tudo o que, sem contrassenso não está limitado ao
saber, à objetividade

2.2 Aspectos conceituais

A partir desse processo parte-se princípio da organização intratextual e


intratextualidade no livro Profugus de Miguel Jorge. A intratextualidade é capacidade
do autor em criar elos em seu contos e poesias, pode ser entendida também como a
citação de uma obra literária produzida pelo próprio autor, além dessas definições pode-
se ser feito pela aproximação de temática. Uma temática corrente nas produções de
Miguel Jorge é o Rio, tema que inicia o primeiro capítulo desse objeto de estudo e
corpus da análise, o livro Profugus.
Miguel Jorge produz quatro obras em versos que são: Os frutos do rio (1974),
Profugus (1990), Calada nudez (1999) e Marbrasa (2004), nelas a água e matéria
versada em quase todos os poemas,
O objetivo dessa pesquisa é avançar na análise de textos poéticos, pois a poesia
sempre foi um terreno movediço, que gera instabilidade de entendimento. A semanálise
por seu compromisso com o constante processo de renovação poderá auxiliar no
conhecimento e no entendimento de diversas obras literárias.
A produtividade semiótica do texto no plano de expressão e no plano de
conteúdo trata-se de uma teoria da significação tal qual se manifesta em qualquer texto,
seja ele expresso por linguagem verbal ou não-verbal. De certo modo a possibilidade
desse trabalho advém da produtividade do conceito greimasiano de “texto” segundo o
qual é formado por um plano de conteúdo, constituídos por estruturas semio-narrativas e
discursivas, com o plano de expressão, em que temos uma mobilização da linguagem
verbal e não-verbal.
Embora os estudos preconizassem o texto com objeto de estudo, formado pelo
plano de expressão e o plano de conteúdo, a ênfase recairia sempre no plano de
conteúdo, mas como no poema de Miguel Jorge a uma produção magnifica aliada ao
texto não verbal pode-se analisar assim como Floch analisou outros textos no século XX
a produção com ênfase no plano de expressão, pois essa não se limita mostrar o
conteúdo criando novas relações: semi-símbolo.
Dividimos a pesquisa em dimensão teórica e dimensão prática, no campo teórico
serão abordados os aspectos que embasam esta pesquisa, por meio deste será analisado
por base a semiótica e o processo de semiose contido nos poemas do livro Profugus de
Miguel Jorge, em continuidade será trabalho o plano de expressão e o plano de
conteúdo nos dois tipos de linguagem presente na obra.
Por observar a obra Profugus, baseada em sistemas semióticos, o verbal e o não-
verbal, não se pode deixar de analisar a obra a partir do processo de intersemiose. A
intersemiose também denominada tradução interartes consiste em transpor signos para
outros signos, trata-se de um movimento e processo que paradoxalmente faz equivaler
significados através de um sistema signico diferente, ou seja, a tradução intersemiótica
reconhece a especificidade das várias linguagens semióticas. Para Jakobson (1984, p 6),
na poesia, as categorias gramaticais têm valor semântico elevado e, por isso, a tradução abre
um debate importante. Nessas condições, a poesia é intraduzível, sendo possível a ela
apenas a “transposição criativa”. Jakobson promove um diálogo com Peirce ao relembrar
que todo signo pode ser traduzido por outro signo, no qual ele pode ser mais completamente
desenvolvido de forma mais explícita (Jakobson,1984, p. 5).
A intratextualidade contida no livro Profugus será analisada não com o viés de
tradução, mas como um processo de intratextualidade em função da semiótica, pois com a
centralidade apresentada na obra pelo verbal e não verbal, não se pode deixar de analisar as
imagens que fazem parte da obra Jorgiana, pois o homem e seus questionamentos realizados
na linguagem verbal através dos versos e dos espaços, também será fortemente questionado
pelo sistema não verbal.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A intertextualidade está presente no livro de poema Profugus, essa referência pode


observada e compreendida como um diálogo de vozes. Um texto produzido por outro poeta
pode servir de inspiração para parte da produção de alguns poemas do livro Profugus. É
perceptível e será desnudado ao leitor a intertextualidade não somente com outros poetas e
filósofos, mas também com a própria criação do autor, termos, objetos e lugares são
cenários marcantes na composição dos livros que tem como elemento chave o rio.
Analisar aspectos linguísticos da semiótica, analisar as figuram que compõem o
livro de poemas assim como sua abordagem sendo colocadas no início do livro sem que
haja indicação no sumário.
Outros aspectos relevantes também serão analisados, com a questão da
linguagem, na forma do discurso, como centralidade do estudo, para mostrar o poder de
semiose e significância do texto poético no livro Profugus. A intertextualidade e a
intratextualidade dos poemas, que preconiza a capacidade de o poeta criar elos entre os
poemas, podendo ser analisado pelo elemento “Rio”.
A produtividade associada por Kristeva em relação ao homem e seus pertences e
no aspecto da semanálise como sendo a crítica da crítica em detrimento ao “ser” do
homem.
Para compor essa análise partira-se do objeto de estudo, o livro Profugus, através
de elementos e base teórica. Os livros de poemas para muitos críticos são temorosos, e
essa preocupação em produzir um trabalho que seja capaz de auxiliar na construção do
entendimento dos poemas, angariar uma teoria que seja capaz de analisar poemas sem
que haja prejuízo ao processo produção do poeta em relação ao objeto estudado é
motivador da presente pesquisa.
Parametrizar dados de produções anteriormente analisadas por pesquisadores
nacionais e internacionais em relação aos poemas e demais elementos norteadores da
pesquisa, coletar dados e produzir embasamentos teóricos para analise supracitada.

REFERÊNCIAS

GREIMAS, A.J. Ensaios de Semiótica Poética, São Paulo, Cultrix, Ed. Da Universidade
de São Paulo, 1975.

DE BRITO, Matheus, Semiótica ou Estética: considerações sobre a epistemologia das


Letras, ESTUDOS LINGUÍSTICOS, São Paulo, 44 (3): p. 1409-1419, set.-dez. 2015.

KHOTE, F.R. Estética e Semiótica. In: Literatura e Sistemas intersemióticos. São


Paulo: Cortez, 1981.p.1-8.

KHOTE, F.R. A obra e a Crítica. In: Literatura e Sistemas intersemióticos. São Paulo:
Cortez: Autores associados, 1981.p.9-31.

KIRCHOF, Edgar Roberto. Umberto Eco e a Estética Semiótica. Prâksis do ICHLA,


2007.

KRISTEVA, Julia. Introdução à semanálise. São Paulo: Perspectiva, 1979.

SAUSURRE, Ferdinand de. Escritos de lingüística geral. Trad. Carlos Augusto Leuba
Salum; Ana Lucia Franco. São Paulo: Cultrix, 2002.

BARTHES, Roland. Inéditos. São Paulo: Martins, 2004 [1993].

BAKHTIN, Mikhail. Estética da criação verbal. Trad. Paulo Bezerra. São Paulo:
Martins Fontes, 2003 [1979].

Você também pode gostar