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Família e Adolescentes Com Anorexia Nervosa 2023
Família e Adolescentes Com Anorexia Nervosa 2023
Abstract
This article aims to understand the role of the family in the treatment of anorexia nervosa in female
adolescents. This study is part of the search for solutions for the diagnosis and treatment of anorexia
nervosa, which has been little studied within the Mozambican community. This work uses a
qualitative approach and the phenomenological method. Adolescence is a phase characterized by
“discoveries” and attempts (sometimes obsessive) to please pre-established social standards. This was
the case of Ana (a fictitious name to preserve the teenager's identity) who, in an attempt to acquire an
ideal body to have a contract with a modeling agency, ended up acquiring anorexia nervosa.
Therefore, fashion agencies constitute risk factors for the development of anorexia. It was found that
this situation reached this extreme because the family had no idea about the disorder. With this, we
highlight the importance of the family in the diagnosis and treatment of anorexia. This study is
organized into three parts, namely, the context (which included the introduction and review of the
literature on anorexia nervosa and family involvement in treatment), the methodologies, main results
and final considerations.
Keywords: Adolescence; Fashion Agencies; Nervous Anorexia; Family; Eating disorder.
INTRODUÇÃO
1
Este texto é resultado da disciplina de Participação em Conferência leccionada no curso de Psicologia Clinica,
na Universidade São Tomás de Moçambique, no ano lectivo de 2023.
Com o desenvolvimento económico, novos desafios começam a surgir para a medicina
moçambicana. Em tempos atrás, não se falava muito sobre a anorexia nervosa no nosso país,
talvez por causa do desconhecimento da doença ou pelo facto da mesma não ser muito
frequente. Entretanto, com o passar do tempo, principalmente com o avanço da tecnologia e
com o desenvolvimento dos mass médias, a anorexia tornou-se algo que começa a se fazer
sentir em nossas famílias.
A anorexia nervosa (AN) faz parte dos denominados por transtornos alimentares e afectam,
nos dias de hoje, todas as culturas, orientações sexuais, idades entre outros aspectos. De
acordo com Santos (2021), estima-se que mais de 70 milhões de pessoas no mundo sejam
afectadas por um transtorno alimentar. Os transtornos alimentares, em especial, a Anorexia
Nervosa, estão associadas a complicações que podem concorrer para êxito letal.
Quase por unanimidade, diversos autores concordam com a ideia segundo a qual, a
adolescência é o período em que se constroem personalidades. A principal característica desta
fase é a transição para a vida adulta. Neste cenário, de acordo com Costa, et. al. (2019), na
adolescência ocorrem “transformações físicas, psicológicas, emocionais e sociais. O processo
de solidificação da personalidade, o desejo de melhorar a aparência física e a inserção em
grupos de mesma faixa etária, com interesses semelhantes ocorrem na adolescência”. Desse
modo, os adolescentes sentem necessidade de serem aceitos e, para isso, acabam seguindo os
preceitos de beleza expostos nos meios sociais e de comunicação, que são adoptados pelos
grupos nos quais se inserem.
Este estudo ter por objectivo principal, compreender o papel da família no tratamento da
anorexia nervosa em adolescentes do sexo feminino. O estudo é realizado na cidade de
Maputo, em Moçambique. Optamos pelo sexo feminino porque entendemos que este é
público mais afectado quando se trata deste transtorno alimentar. Mulheres têm tendência de
se preocuparem mais pela aparência física em relação aos homens. A faixa estudada é a
adolescência porque é, como mostramos acima, o momento de descobrimentos.
REVISÃO DA LITERATURA
Nossos tempos são estranhos. Na nossa sociedade contemporânea temos assistido situações
em que somos obrigados a seguir padrões de vida estabelecidos que podem causar diversas
psicopatologias como é o caso da anorexia nervosa. As pessoas estão subjugadas à padrões
que poem em risco a sua integridade física e emocional.
Nesta subjugação, a indústria da moda tem sido um dos mais afectados uma vez como o termo
já diz, moda, que se traduz em hábitos que vigoram numa determinada região. Entretanto, o
que “está na moda” é o que foi socialmente estabelecido. Esta sociedade, que se tornou
líquida, vivendo num constante vai e vem, hoje concebe as magras como sendo as ideias para
fazerem parte da indústria da moda. Essa situação causa doenças psicossomáticas como a
anorexia, o nosso objecto de estudo.
De acordo com Santos (2021) as doenças psicossomáticas, como a Anorexia nervosa, são
fruto de uma interacção entre o corpo e a mente. São projecções físicas dos anseios, angústias,
preocupações e questões mal resolvidas a nível psicológico. Assim sendo, essa é a origem do
desencadeamento da doença e não uma reacção do organismo a factores externos.
O transtorno que pretendemos discutir, afecta mais adolescentes e jovens do sexo feminino
em relação aos do sexo masculino. Isso também é resultado dos padrões do “corpo da moda”
estabelecidos tanto para as mulheres assim como a dos homens. Sendo assim, para as
mulheres, o corpo mais perfeito é o magro, por isso o grande esforço das raparigas em atingir
os corpos da moda.
Como já adiantamos acima, a anorexia nervosa afecta mais adolescentes e jovens, com
destaque para os do sexo feminino. Este cenário se verifica neste período porque é aqui onde
se manifestam mudanças/transformações físicas e psicológicas. Neste cenário de mudanças, o
adolescente se encontra em um vários dilemas como o da aceitação social tendo em conta os
padrões em vigor (a moda).
A anorexia entra em cena quando buscamos perder constantemente o nosso peso. Dito isto,
Rossato, Silva & Richter (2019) referem que a anorexia nervosa (AN) é um transtorno
alimentar caracterizado pelo medo intenso de ganhar peso manifestado através da restrição
calórica e comportamentos compensatórios tais como exercícios extenuantes, laxativos,
diuréticos e indução de vômitos. Etimologicamente, provém no grego an (privação, ausência)
+ orexis (apetite), apesar do termo não ser necessariamente adequado, visto que a maioria dos
pacientes nega a fome ao invés de perderem o apetite.
A origem dos TAs é multifatorial, envolvem aspectos biológicos (obesidade e sexo feminino),
personalidade e socioculturais (culturas, ambiente em meio no qual o adolescente está
inserido). Com isso, a conduta de pacientes acometidos por algum TA é delicada, bem como
não apresenta um bom prognóstico, devido muitas vezes à falta de entrega do paciente ao
tratamento, assim levando a altas taxas de recorrências e a elevados índices de mortalidade
devido a casos de suicídio, e casos de broncoaspiração, desequilíbrios hídricos e àcido-base
causados em decorrência da bulimia nervosa. (Gonzalez et al., 2019, cit. em Gomes, et. al.
2021).
Segundo Costa, et. al. (2019), desse modo, os adolescentes sentem necessidade de serem
aceitos e, para isso, acabam seguindo os preceitos de beleza expostos nos meios sociais e de
comunicação, que são adoptados pelos grupos nos quais se inserem.
Ainda na linhagem dos autores, a procura pelo corpo perfeito e a necessidade de obter
aceitação podem gerar uma dissociação do corpo real e do corpo objecto de desejo,
provocando a diminuição da auto-estima e a insatisfação com a imagem corporal, o que
concorre para o surgimento de transtornos psicológicos.
Torna-se importante trazer, numa primeira fase, a etimologia da palavra anorexia. O termo
deriva do grego “an” que se traduz em deficiência/ausência e “orexis” significando apetite. A
origem do termo nos remete à simples falta de apetite. Entretanto, com o desenvolvimento dos
transtornos psicológicos, observou-se que a anorexia ia além de simples falta de apetite.
Assim, a DMS-V (2003) (citado por Ramos, et. al, 2018) coloca como um dos diversos
transtornos alimentares.
Dentre as categorias de TA, a Anorexia Nervosa (AN) e Bulimia Nervosa (BN) destacam-se
na contemporaneidade em detrimento de uma incidência progressiva. Uma das principais
características observadas entre as pessoas acometidas é a obsessão massiva pelo conceito
deperfeição que se sintoniza em uma população sistematicamente preocupada com a estética
corporal (Santos, et. al. 2019).
A AN apresenta dois subtipos: o tipo restritivo, quando a principal estratégia para emagrecer é
a restrição alimentar, por meio de jejuns ou exercícios físicos em excesso e o tipo compulsão
periódica purgativa ou bulímica, que ocorre quando há utilização de métodos purgativos,
como vómitos auto induzidos e uso de laxantes ou diuréticos. É considerada patologia grave,
com alto grau de morbidade principalmente na adolescência, quando geralmente os sintomas
se iniciam, sendo raro antes da puberdade ou depois dos 40 anos (DSM-V, 2013, citado por
Ramos, et. al, 2018).
Dito isto, a anorexia é um transtorno alimentar. De acordo com Costa et. al. (2019), os
transtornos alimentares são reconhecidos por causarem alterações no comportamento
alimentar com influência da distorção da imagem corporal. Possuem como causas múltiplos
factores, tais como biológicos, socioculturais e psicológicos. Assim, a anorexia nervosa é
caracterizada pela obsessão em perder peso e pela busca infindável de emagrecer. Durante
esse processo, ocorre a diminuição e a restrição do consumo de alimentos considerados
calóricos ou sem valor nutricional, distorção da imagem corporal e recusa da condição
patológica.
De acordo com Macedo, et. al (2023) no cerne da anorexia nervosa, reside uma imagem
distorcida do corpo, na qual a percepção da própria aparência é severamente alterada, levando
a uma autocrítica implacável. Sendo assim, ela não se restringe apenas às complexidades
mentais, e emocionais; ela exerce um impacto profundo no corpo físico.
Ajuda a entender, um pouco mais sobre a anorexia, uma vez que, segundo Saltos, et. al.
(2019), “pessoas com AN possuem características como obsessividade, perfeccionismo,
introversão e altos níveis de ansiedade, costumam ser extremamente rígidas e exigentes com
sua alimentação, e possuem um intenso desejo de dominar o próprio corpo, escondendo um
conflito subjacente, que seria a busca pelo controle em sua totalidade. Dificilmente expressam
sentimentos como raiva e tristeza, pois, em sua concepção, seriam formas de apresentar
fraquezas ou imperfeições”.
Podemos, então, sintetizar a anorexia nervosa como sendo um transtorno alimentar que é
caracterizado por limitação no acto de ingerir alimentos no organismo com a intenção de
emagrecer e pelo medo de ganhar peso. Esta situação nos colocou no dilema de ir atrás da
indústria da moda contemporânea que é um dos principais causadores da anorexia em
adolescentes e jovens.
O envolvimento familiar
A abordagem acima demostra que a família tem contribuído negativamente para que a
adolescente se torne anoréxica. Entretanto, existem casos em que a família não é culpada pela
causa da anorexia na adolescente, mais não consegue notar que a sua filha (por exemplo) se
encontra em situação semelhante. O relato que iremos contar, é de uma adolescente que teve a
psicopatologia a partir das “ordens” que o seu namorado (também adolescente) impunha.
METODOLOGIA
Contamos, inicialmente, com o levantamento bibliográfico. Este processo foi necessário para
a construção da fundamentação teórica no que toca ao levantamento de textos científicos
ligados ao fenómeno da anorexia. Estes textos estão situados no intervalo entre 2018 a 2023.
Artigos que não estão dentro deste intervalo de tempo, foram excluídos.
Seguidamente, realizamos um estudo de caso. Este estudo foi possível mediante a elaboração
de um guia de entrevista que contou com 5 perguntas. Todas as perguntas foram abertas o que
se traduziu numa entrevista estruturada onde os participantes tinham o direito de responder de
modo como quisessem. Por meio de relatos, fomos construindo uma ideia sobre o que
devíamos transcrever no nosso texto. No guia de entrevista, descartamos as perguntas
fechadas pelo facto delas não se identificarem com os objectivos que havíamos traçado.
O estudo de caso contou com duas fases. Na primeira fase, fomos ao encontro da agência de
moda Elegance Models localizada no distrito de Maputo, em Moçambique. Lá fomos atrás
dos requisitos necessários para que um jovem se torne Modelo. Seguidamente, fomos ao
encontro de uma jovem que desenvolveu anorexia na tentativa de adquirir um corpo que
estivesse dentro dos padrões exigidos pela agência acima referida.
Material e procedimentos
No que toca aos procedimentos de análise de recolha e análise de dados, podemos afirmar que
pedimos a autorização para colectar informações, apresentamos os objectivos do estudo,
marcamos a data para irmos colectar informações. Como o guia da entrevista teve perguntas
abertas e consequentemente mereceram análise da nossa parte, definimos um conjunto de
categorias que ajudou na interpretação dos resultados. Na análise de resultados, iremos apoiar
a nossa interpretação com alguns extractos de respostas colectados no campo.
APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DE RESULTADOS
Os resultados do estudo vão ser divididos em duas fases. Na primeira, far-se-á a descrição
sobre a compreensão da adolescente sobre a anorexia (o que é e que levou ela a passar pela
anorexia), bem como os desafios que teve no momento de tratamento. Na segunda fase,
destacar-se a visão que ela tem sobre a família, com enfoque para o papel que a mesma teve
sobre o tratamento da anorexia.
Ter um corpo que está dentro dos padrões da moda actual tem sido um dos grandes desafios
de adolescentes e jovens de modo geral e do sexo feminino em particular.
Segundo Faria, et. al. (2021), a busca pelo corpo ideal em curto período de tempo tem
alavancado o alcance das dietas da moda, que são dietas sem orientação nutricional e
avaliações adequadas, apresentadas via de regra nas mídias sociais por blogueiros, youtubers,
influenciadores que utilizam a internet e suas redes sociais para divulgar resultados rápidos de
chás, ervas, ou de um determinado cardápio, que se realizado por uma parcela significativa da
sociedade não apresentará os benefícios, colocando em risco a pessoa que a segue sem
orientação nutricional.
Assim, os jovens vão se sacrificando por aquilo que acreditam ser o bem para eles e para seus
corpos. Esta tentativa de ter um corpo perfeito, pode levar a morte. De acordo com Conti, et.
al. (2018) o individuo com TA pode ter uma morte social, antes da morte física. Para os
indivíduos que desenvolvem os TA, observamos um processo lento e gradativo no
comprometimento de sua saúde física, emocional e social. O transtorno não se instala de
imediato, há um ritual diário reforçado pela necessidade desse indivíduo e não identificado
pelas pessoas que o rodeiam. Esse ritual o distancia de um elo saudável consigo próprio e com
o seu meio e, não havendo qualquer intervenção, pode se “cronificar”, levando em casos
extremos à morte física. Mas esse caminho trilhado é longo, repleto de sofrimento, perdas e
rupturas.
Nota-se aqui que a perda vai além de questões físicas e rompe o território emocional, social e
cognitivo.
Para fazer parte de uma agência de moda é preciso ter padrões de beleza pré-estabelecidos e
isso pode causar um modo de vida que pode provocar um transtorno alimentar. Santos (2021),
traz uma lista enorme daquilo que ela chama de “dietas da loucura” que tendem a ser
amplamente difundidas pelas mídias e pelas agências de moda para fazer com que os modelos
atinjam o tal almejado corpo perfeito que no nosso entender só residem nas nossas mentes.
Passamos a citar algumas.
Este exercício leva com que o desenvolvimento da anorexia seja algo que ira acontecer de
forma natural. Stein (2021) destaca, por exemplo, que os/as “Modelos de passarela” devem
ter cuidado com o corpo porque elas são manequins vivas. Assim, o cuidado está em
equilibrar saúde, bem-estar e dieta para permanecer dentro dos padrões exigidos e aguentar o
pique das viagens e a correias sem, no entanto, ficar doente.
Na Elegance Models, localizada na Cidade de Maputo, avenida Emília Dausse com a Esquina
do Jardim dona Berta existem critérios claros de selecção de candidatos que devem ser tidos
em conta. Dentre eles, a agência nos forneceu os seguintes dados que são os requisitos no
processo de selecção para modelos de passarela (Internacionais):
Mais do que isto, as candidatas passam por 3 fazes de selecção, onde são submetidas a testes
rigorosos e de extrema exigência e a concorrência tem sido bastante alta.
Estes padrões definidos podem se constituir num problema, porque como sabemos, o nosso
corpo sobre mudanças físicas em diversas ocasiões. Podemos ter uma doença em que
precisamos mudar a nossa dieta para que melhoremos e isso pode influenciar neste factor.
É nesse contexto que se insere a nossa adolescente Ana 2, residente em Mafalala. De princípio,
é preciso referir que a adolescente já se encontra em tratamento, com a ajuda da família e de
psicólogos clínicos. A primeira coisa que procuramos saber dela é que se já havia ouvido falar
da anorexia, antes do contacto com os médicos. Ana nos relatou o seguinte: “Eu nunca tinha
ouvido falar da anorexia antes do contacto com os médicos. A única coisa que sabia é que
existia bulimia”. Perguntamos a ela sobre o que tivera causado o distúrbio e ela contou o
seguinte:
Quando era mais nova, via muitas novelas. Lá ouvi falar que haviam jovens que eram
consideradas modelos e eu comecei a me inspirar nelas. Sentia uma emoção profunda quando
via elas na televisão e adoptei aquilo como se fosse um sonho que eu devia realizar em algum
dia. Passado algum tempo, com 18 anos, fiz plano de ingressar à agência de moda. Procurei
pela cidade e achei a Elegance Models e me forneceram as exigências necessárias para que eu
fosse aceite naquela instituição. Eu comecei primeiro por fazer dietas simples, até começar a
me alimentar de forma muito irregular. Chegou uma fase que praticamente já não comia nada.
Eu tinha que adquirir o corpo perfeito. (relato de Ana).
A primeira interferência que se nota no relato de Ana é dos mídias. Sobre este facto, Brittar e
Soares, (2020) fundamentam que o aumento ao acesso á mídia na adolescência tem sido
associado ao aumento de peso e á menor aptidão física na vida adulta, comportamentos de
risco para transtornos alimentares e inabilidade em controlar o peso do corpo. Portanto,
estudar o comportamento alimentar em adolescentes envolve indagações mais complexas que
2
Esse é um pseudónimo que inventamos para proteger a identidade da jovem que nos forneceu informações
sobre como havia adquirido anorexia e como sua família havia interferido.
vão além do ato biológico, pois estão relacionadas ao contexto psicossocial (Bittar & Soares,
2020).
Esta situação nos fez perceber que o desejo de agradar o namorado, foi a raiz da qual brotou a
anorexia em Ana. Ela também contou que chegou uma fase em que se olhava no espelho e se
sentia “gorda”. Esta é uma das características-chave desse distúrbio. Conti, et. al, (2019), em
Anorexia e bulimia: corpo perfeito versus morte referem que os principais distúrbios
alimentares “Caracterizam-se por um padrão de comportamento alimentar gravemente
perturbado, distúrbios da percepção do formato corporal e consequente controlo patológico do
peso”.
O nosso foco na entrevista, foi perceber como a família lidou com a situação em que se
encontrava Ana. Ana nos relatou que de princípio os país não conseguiam perceber o que se
passava com ela porque alegavam que eram “coisas de adolescentes”. Devemos lembrar que
em sociedades como a nossa (nos referimos de Moçambique) a anorexia é pouco conhecida e
por alguns, tratada como uma “mentira”. De acordo com Ana,
“Eu não sabia que estava tendo um distúrbio alimentar e muito menos a minha família. Meu
pai chegou até á me colocar de castigo por eu estar frequentemente rejeitando me alimentar.
Minha mãe na altura estava viajando e meus irmãozinhos só se colocavam a chorar. Era uma
situação complicada, acrescentou”
Com o passar do tempo, o cenário foi se agravando até um momento em que ela desmaiou.
Segundo ela, foi a partir dessa situação que a família teve conhecimento que a filha era
anoréxica e que precisava de apoio e orientação. Disse Ana:
“Só me lembro de ter estado na cama do hospital e ver meu pai e minha mãe falando com o
médico. Segundo me contaram, eu havia adquirido anorexia nervosa e já convivia com a
doença por muitos meses. Foi por meus param de negar que eu havia desenvolvido um
distúrbio alimentar”.
Depois desta fase, Ana nos contou que os médicos pretendiam organizar secções de
tratamento, que envolvessem todos os intervenientes da sua família.
O namorado, talvez pelo medo, negou fazer parte dessas secções e optou por se mudar para
outro distrito. Assim, só ficou a família. Ana nos disse que os pais dela e os irmãos, foram
fundamentais para a superação do distúrbio, sem deixar de enaltecer a ajuda dos médicos. Isso
nos dá a entender que é preciso incluir a família em casos semelhantes.
Conti, et. al, (2019) referem que “A inclusão e a participação efectiva da família é uma peça
fundamental na eficácia terapêutica, já que a psicodinâmica familiar, isto é, a maneira como a
família funciona, é um elemento central na determinação, manutenção e desenvolvimento dos
TA”. Assim, se a família ficar atenta e conhecer os primeiros sintomas, pode solucionar,
família faz alguém se sentir protegido.
Este resultado é consequência daquilo que foi enunciado sobre os dados acima. Entretanto,
um estudo sobre “Anorexia Nervosa: Quando a Beleza se torna Obsessão”, realizado por
Santos (2021), concluiu que o tratamento familiar mais eficaz é a Terapia de família
Maudsley ou Abordagem Maudsley. Esse tratamento baseado na família pode prevenir a
hospitalização e auxiliar o adolescente na recuperação, desde que os pais sejam vistos como
um recurso e tenham permissão para desempenhar um papel activo no tratamento.
Fase I: restauração do peso. Nessa fase, ocorre a conscientização dos perigos relacionados à
desnutrição causada pela Anorexia Nervosa. O terapeuta empreenderá todos os esforços para
ajudar os pais em sua tentativa conjunta de restaurar o peso do adolescente.
Fase II: devolvendo ao adolescente o controle sobre a sua alimentação. Esta fase do
tratamento prioriza instrumentalizar os pais a devolverem a seus filhos o protagonismo sobre
a alimentação. Também podem ser abordadas outras questões da vida diária, cuja resolução
havia sido postergada devido à urgência do transtorno alimentar.
Fase III: estabelecer uma identidade adolescente saudável. A fase III tem início quando o
adolescente atinge aproximadamente 95% do peso ideal e as questões secundárias à
desnutrição foram superadas. O foco da terapia passa a ser a análise do impacto que a doença
causou na vida da jovem, visando a construção de uma identidade considerada saudável, e
simultaneamente aborda a delicada questão dos limites parentais.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este estudo teve como propósito compreender o papel da família no tratamento da anorexia
nervosa em adolescentes do sexo feminino. Entretanto, após as constatações encontradas no
decorrer do estudo, denota-se que a família é o primeiro centro social e a mesma deve estar
atenta as alterações comportamentais das adolescentes no seu todo e nas alterações de
cardápio em particular.
Percebeu-se que este transtorno alimentar é pouco conhecido no nosso meio, apesar da mesma
causar mortes confirmadas por vários profissionais de saúde. Dentre as causas da anorexia
nervosa no nosso contexto, fica claro a grande influência mediática que coloca padrões
idealizados de beleza e coloca, também, em consequência disso, adolescentes num dilema de
alcançar aquele padrão estabelecido. Com este facto, denotamos que os padrões de beleza da
indústria da moda (como foi o caso do presente estudo) são um dos grandes factores de risco
para a aquisição deste transtorno.
Com estudo, percebemos que um dos factores importantes para a recuperação da adolescente
Ana, foi o facto da família, inclusive o pai, estarem dispostos a cumprir com as
recomendações medicas e não faltarem em todas as secções de tratamento.
A anorexia pode ser tratada, mas para isso, é preciso um envolvimento familiar não só no
tratamento, mais também no diagnóstico que é vital para a descoberta da mesma. Este
transtorno vive no seio de muitas adolescentes, apesar de não terem conhecimento do mesmo.
Promoção de palestras nas escolas poderia ser uma medida a ser tomada pelas instituições de
saúde.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Bittar, C., & Soares, A. (2020). Mídia e comportamento alimentar na adolescência. Cadernos
Brasileiros de Terapia Ocupacional.
Conti, M. A. et al, (2019). Anorexia e bulimia : corpo perfeito versus morte. O Mundo da
Saúde.
Costa, J. R. S. et. al. (2019). Conhecimento e comportamento de risco para anorexia e bulimia
em adolescentes. Rev. Baiana.
Faria A. L., Almeida, S. G., & Ramos, T. M. (2021). Impactos e consequências das dietas da
moda e da suplementação no comportamento alimentar. Research, Society and
Development, p.1-13.
Júnior, E. L. S. et. al. (2023). Distúrbios Alimentares e seus Factores Genéticos : Revisão da
Literatura. Arquivos de Ciências da Saúde da UNPAR, Umuarama. p. 3464-3483
Santos, C. A. (2021). Anorexia Nervosa: quando a beleza se torna obsessão. 1ª Ed. São José
dos Pinhais: ESP.
Apêndice
Guião de entrevista
Este guião contém duas partes. A primeira parte contém apenas uma pergunta que consistiu
em ter permissão para a colecta de informações na empresa Elegance Models. Aqui, a nossa
pretensão era saber sobre os critérios de selecção disponíveis na instituição. A segunda parte,
a mais aprofundada, tinha como objectivo, ter informações sobre a vida de uma adolescente
que teve anorexia e como a família lidou com esta situação.
I parte
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II parte
Caro/a adolescente, este questionário é destinado a ti, e pretende colectar informações sobre o
Papel da Família no Tratamento da Anorexia Nervosa. Este trabalho é resultado da disciplina de
Participação em conferência na Universidade São Tomas de Moçambique no curso de Psicologia
Clínica. Este trabalho não tem fins lucrativos. Garantimos a confidencialidade e o anonimato
durante o tratamento das informações aqui colectadas. Queremos desde já, pedir que esteja
sereno/a e livre de responder o que achar convincente. Estas perguntas são abertas e pode
responder como quiser.
DADOS SOCIODEMOGRAFICOS
Idade _______
ASPECTOS DO QUESTIONÁRIO
3. Quando e como é que a sua família descobriu que você sofria desta doença?
4. Qual foi a atitude que a sua família teve quando descobriu que você tinha está doença?
5. Qual é o conselho que dá para as meninas que tem um desejo obsessivo de perder peso?