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A ANOREXIA NERVOSA E A ADOLESCÊNCIA

Renato Campos*

28 de novembro de 2022
* Bacharel em Tecnólogo em Processamento de Dados nas Faculdades Integradas Anglo-Americano
em 1991, Curso de extensão em Epignética, Nitrigenética e Nutrigenômica pelo SENAC em 2018, Pós-
Graduação em Docência do Ensino Superior na Estácio de Sá em 2018, discente do curso de Nutrição
da Faculdade Veiga de Almeida, e-mail renatocamp65@gmail.com.
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A Anorexia Nervosa e a Adolescência

Introdução

A anorexia nervosa (AN) é um transtorno alimentar (TA) que acomete


predominantemente adolescentes do sexo feminino e tem origem multifatorial envolvendo
aspectos psicológicos, biológicos, socioculturais, genéticos e familiares. Os adolescentes são
os mais afetados pelos TAs, devido a características relacionadas à idade, como comparar-se
com adolescentes do mesmo gênero e idade e a necessidade de aceitação social. A AN
caracteriza-se pela recusa do indivíduo em manter o peso adequado à sua altura, medo intenso
de engordar, recusa alimentar associada à imagem corporal distorcida, negação de sua condição
patológica, busca incansável pela perda de peso e amenorreia. As distorções da imagem
corporal são exacerbadas de tal forma que os sujeitos se sentem "gordos" mesmo quando muito
magros. Este artigo, tem como objetivo elucidar os desafios inerentes ao atendimento dos
adolescentes no tratamento da AN.

A AN e a Necessidade dos Profissionais de Saúde Manterem uma Postura Ética

A AN apresenta a maior taxa de mortalidade dentre todos os distúrbios psiquiátricos no


mundo, em torno de 0,56% ao ano, cerca de 12 vezes maior que a mortalidade das mulheres
jovens na população em geral (APA, 2000).
Teixeira et al (2009) afirma que a anorexia nervosa é um transtorno alimentar
expressivamente mais comum em mulheres (90%) do que em homens (10%), relaciona-se com
a maneira como o sujeito vivencia seu corpo e (re)organiza sua imagem corporal.
Relacionar a ocorrência e suscetibilidade desta doença ao sexo feminino e minimizar a
sua expressão no sexo masculino deve ser considerado com cautela. Por ser incomum em
meninos, os profissionais de saúde devem estar atentos ao detectar desnutrição grave sem causa
aparente, pois o início rápido do tratamento é fundamental para um bom prognóstico (SANTOS
et al, 2012).
A NA surgiu a partir da segunda metade do século XIX, quando a magreza foi
estabelecida como um sinal de prestígio e status social, e o corpo gordo e pesado de vulgaridade
(DARMON, 2006).
Os adolescentes que sofrem de NA muitas vezes vivenciam conflitos domésticos, e
assim, passam a buscar apoio em comunidades pro-ana on-line (ana é o apelido dado à AN em
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comunidades da internet), que descrevem sua identidade de forma positiva e são mais
resistentes à recuperação (BOERO; PASCOE, 2012).
Nos serviços de saúde, além do despreparo para atender os adolescentes, há também o
julgamento de valor da equipe em relação a esse grupo, que é percebido como "mal-educado"
e " permissivo " entre os pares, aumentando as dificuldades de relacionamento e formação de
vínculos (FERRARI et al, 2006). Independentemente do posicionamento pessoal ou
incapacidade de ouvir e respeitar os adolescentes, é necessário reforçar a necessidade de manter
uma postura ética como profissional de saúde (CROMACK et al, 2004). O Manual de Atenção
à Saúde do Adolescente da Secretaria de Saúde da cidade de São Paulo define as
“Características do profissional e a relação médico-adolescente”:
“Atender adolescentes requer interesse, tempo e experiência profissional. Para obter uma
consulta frutífera, é fundamental o bom relacionamento médico/adolescente, unicamente possível se o
médico gostar de trabalhar com jovens, pois estes têm uma sensibilidade apurada e logo percebem falta
de interesse ou empatia. O profissional deve mostrar competência, firmeza e autoridade sem, no entanto,
parecer autoritário. O médico deve escutar mais do que falar e não julgar ou dar palpite. Mas deve
esclarecer e informar onde for necessário, sempre com retidão, honestidade e veracidade, o que é diferente
de advertir. [...] O adolescente deve identificar-se como sendo ele o cliente, mas, por outro lado, pais e/ou
responsáveis não poderão permanecer à margem do atendimento, pois poderão beneficiar-se com
informações e esclarecimentos (SÃO PAULO CAPITAL, 2006).”
A contradição da realimentação hospitalar é que ela impede o objetivo de os portadores
de AN tenham um comportamento alimentar “normal” (BOUGHWOOD; HALSE, 2012).
Portanto, a alimentação não pode ser rigorosa, mas leve e natural, porém rica em nutrientes,
mais parecida com que a paciente terá ao sair do hospital.

Conclusão
Às vezes é difícil para os profissionais de saúde entender os conflitos inerentes à
adolescência, que podem acabar prejudicando seus relacionamentos. Por estarem em busca de
autonomia, receber ajuda dos adultos pode ser interpretado pelos adolescentes como
incapacidade de resolver seus problemas sozinhos. Também acontece que os adultos costumam
achar que os problemas na vida dos adolescentes não necessariamente são um incômodo para
eles. Em vez disso, as queixas dos adolescentes podem ser percebidas pelos adultos como
secundárias, subjetivas e sem importância, resultado de uma "fase difícil" do ciclo de vida.
Reconhecer as diferenças individuais entre os pacientes e respeitar o significado que eles
atribuem à sua condição são fundamentais para o tratamento da AN em uma aliança terapêutica
nutricionista-paciente, e a "transformação" de nutricionistas em antropólogos.
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Referências

American Psychiatric Association (APA). Practice guidelines for the treatment of patients
with eating disorders (revision). Work Group on Eating Disorders. Am. J. Psychiatr. 2000;
157(1 Supl):1-39.

Boero N.; Pascoe, C.J. Pro-anorexia communities and online interaction: bringing the Pro-
ana body online. Body Soc. 2012; 18(2):27-57.

Boughtwood, D.; Halse, C. Other than obedient: girls’ constructions of doctors and
treatment regimes for anorexia nervosa. J. Appl. Soc. Psychol. 2010; 20:83-94.

Cromack L.; et al. A consulta do adolescente e jovem. In: Gomez A, Chalub S,


organizadores. Adolescência e Aids: experiências e reflexões sobre o tema. Brasília:
Ministério da Saúde; 2004. (Edição Especial Saber Viver Profissionais de Saúde). p. 12-15.

Darmon, M. Variations corporelles. L’anorexie au prisme des sociologies du corps.


Adolescence. 2006; 24(2):437-452.

Ferrari, R.A.P.; et al. Atenção à saúde dos adolescentes: percepção dos médicos e
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Santos K.J.; et al. Anorexia nervosa no adolescente do sexo masculino: uma revisão.
Adolesc. Saude 2012; 9(2):45-52.

São Paulo capital. Coordenação de Desenvolvimento de Programas e Políticas de Saúde


(CODEPPS). Manual de atenção à saúde do adolescente. São Paulo: CODEPPS; 2006.

Teixeira P.C.; et al. A prática de exercícios físicos em pacientes com transtornos


alimentares. Rev. psiquiatr. Clín 2009; 36(4):145- 152.

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