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UNIVERSIDADE ANHANGUERA-UNIDERP

ANA CLAUDIA MARQUES

O SÍTIO ARQUITETÔNICO DA ESTRADA DE FERRO NOROESTE DO


BRASIL E SUAS FUNÇÕES SOCIAIS NA CIDADE DE CAMPO
GRANDE – MS.

CAMPO GRANDE – MS
2013
ANA CLAUDIA MARQUES

O SÍTIO ARQUITETÔNICO DA ESTRADA DE FERRO NOROESTE DO


BRASIL E SUAS FUNÇÕES SOCIAIS NA CIDADE DE CAMPO
GRANDE – MS.

Dissertação apresentada ao Programa de


Pós-Graduação em nível de Mestrado
Acadêmico em Meio Ambiente e
Desenvolvimento Regional da Universidade
ANHANGUERA–UNIDERP, como parte dos
requisitos para a obtenção do título de
Mestre em Meio Ambiente e
Desenvolvimento Regional.

Orientação: Prof. Dr. Gilberto Luiz Alves

CAMPO GRANDE – MS
2013
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca Anhanguera – Uniderp

Marques, Ana Claudia.


M315s
O sítio arquitetônico da estrada de ferro Noroeste do Brasil e suas funções

sociais na cidade de campo Grande-MS. / Ana Claudia Marques. -- Campo

Grande, 2013.

89f.

ii
iii
Dedico a presente dissertação à
minha mãe, fiel e insistente no meu
progresso, e ao meu irmão Octávio,
pois sem o seu incentivo, essa
conquista não seria possível.

iv
AGRADECIMENTOS

À minha família tão querida, razão maior da minha força e existência.


As minhas amigas de curso pelo curto, mas prazeroso tempo que passamos e
aprendemos juntas, como também, é claro, das boas risadas que demos.
A todos que contribuíram para minha pesquisa, como os órgãos públicos
PLANURB, o IPHAN. Aos moradores do sítio da ferrovia, em especial a historiadora
Maria Madalena Dib Mereb Greco, pelo tempo que dedicou me recebendo no
Instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso do Sul.
Aos professores que, ao longo de minha educação, fizeram grande diferença
na formação do meu intelecto. Sem poder citar todos, dou meu singelo
agradecimento a Celilza Esley Fernandes, Heloisa Messias Mesquita e Gogliardo
Vieira Maragno.
Ao meu orientador Gilberto Luiz Alves, por acreditar em mim e me guiar neste
trabalho tão importante para minha formação, me apresentando o mundo de uma
forma ainda desconhecida por mim e me ensinando a desenvolver um gosto pela
história e pelos livros.
Ao Prof. Dr. Sandino Hoff e a Profa. Dra. Silvia Helena Andrade de Brito, pois
foram grandes colaboradores para a melhoria do meu trabalho.
À Aline, que sempre me auxiliou em toda e qualquer dúvida que tive ao longo
do curso, sempre pronta a me ajudar.
À Universidade Católica Dom Bosco, pois me deu a chance de iniciar meu
aprendizado na carreira docente.
Agradeço a Deus por me permitir essa caminhada, como também pelos
encontros e desencontros que tive na vida, formando a minha história e me tornando
uma pessoa melhor.

iv
“Feliz aquele que transfere o que sabe e
aprende o que ensina.”

(Cora Coralina)

v
RESUMO

O presente trabalho tem por objeto as funções sociais do Sítio Arquitetônico da


Estrada de Ferro Noroeste do Brasil em Campo Grande, MS e integra a linha de
pesquisa Sociedade, Ambiente, e Desenvolvimento Regional Sustentável. Descreve
historicamente a importância desse Sítio Arquitetônico, desde a chegada da NOB,
em 1914, até sua decadência, e avalia as transformações ocorridas, as funções
sociais desempenhadas por ele, o processo de tombamento da área e de que forma
está sendo tratado. Respalda teoricamente a investigação os estudos de ALVES
(1986) e MARX e ENGELS (2007). A revisão bibliográfica levantou informações
relevantes no que concerne aos assuntos ligados à ferrovia, ao urbanismo e à
expansão da cidade. O levantamento de dados se fez a partir de documentos, de
mapas e de entrevista aplicada aos técnicos e dirigentes de órgãos responsáveis
pelo bem tombado, como o PLANURB e o IPHAN, e aos residentes do Sítio
Arquitetônico. Diante dos dados obtidos percebe-se que o processo de
refuncionalização daquele espaço ainda não se completou. Processo lento e
gradativo, ele vem decorrendo de iniciativas governamentais e parcerias público-
privadas. No passado, ele foi expressão do domínio da NOB, que centralizou e
polarizou o desenvolvimento da cidade, enquanto suas unidades arquitetônicas, no
presente, são restauradas e refuncionalizadas para servir a projetos
predominantemente da área cultural.

Palavras-chave: Desenvolvimento urbano; Ferrovia; Patrimônioarquitetônico.

vi
ABSTRACT

The object of this work is the social functions of the Site Architectural Railroad
Northwest Brazil in Campo Grande, MS and integrates online research Society,
Environment, and Regional Sustainable Development. Describes the importance of
such historically Architectural Site, since the arrival of NOB in 1914, until its decay,
and evaluates the changes occurred, the social functions performed by him, the
process of overturning the area and how they are being treated. Theoretically
supports the research the study of ALVES (1986) and Marx and Engels (2007).The
literature review raised relevant information in respect of matters pertaining to the
railroad, urban planning and expansion of the city. The data collection was made
from documents, maps and interviews to coaches and officials responsible for organ
fallen well as the PLANURB and IPHAN, and residents Architectural Site. From the
data obtained it is clear that the process of refunctionalisation that space is not yet
completed. Slow and gradual, it comes derive from government initiatives and public-
private partnerships. In the past, it was the expression domain of the NOB, which
centralized and polarized the city's development, while its architectural units at
present are restored and refuncionalizadas projects predominantly to serve the
cultural area.

Keywords:Urban Development; Railroad; Architectural heritage.

vii
LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Campo Grande: ínicio do século XX. .......................................................22


Figura 2 - Campo Grande: Primeira igreja construída em taipa, ano de 1879. .........25
Figura 3 - Rio de Janeiro: capital do Brasil, área central da cidade, início do século
XX. ............................................................................................................................27
Figura 4 -Santos: área próxima ao Porto de Santos, ano de 1902............................27
Figura 5 - Corumbá: vista do Porto, início do século XX. ..........................................28
Figura 6 - Campo Grande: ainda Vila, início do século XX. ......................................28
Figura 7 - Campo Grande: vista de um rodeio de gado, início do século XX. ...........29
Figura 8 -Campo Grande: Hotel Democrata, construído em taipa. Servia de parada
para os compradores de gado, antes da chegada do trem (início do século XX). ....29
Figura 9 - Campo Grande: Estação Ferroviária da NOB, construída em alvenaria,
ano de 1920 ..............................................................................................................35
Figura 10 –Fazenda Capão Bonito: propriedade da Brazil Land, a construção fazia
uso de telha de barro, material construtivo ainda não produzido na região, (década
de 20). .......................................................................................................................38
Figura 11 -Campo Grande: planta do plano de alinhamento de ruas e praças, ano de
1909 ..........................................................................................................................40
Figura 12 - Campo Grande: vista aérea da estação e a visualização da paisagem
urbana com alterações claras; várias casas, calçamento e ruas bem delimitadas
(década de 30). .........................................................................................................42
Figura 13 - Campo Grande: análise da ocupação da cidade e distribuição de
serviços e bairros, (década de 30). ...........................................................................43
Figura 14 - Campo Grande: primeira rodoviária, construída pelos irmãos Laburu,
expressa as necessidades criadas pelas rodovias, anuncia a decadência das
ferrovias, (década de 60). .........................................................................................58
Figura 15 - Campo Grande: destinos e horários de partida para os trechos que a
Ferrovia realizava no ano de 1992. ...........................................................................60
Figura 16 - Campo Grande: foto aérea com a área de tombamento do Sítio da
Estrada de Ferro Noroeste do Brasil. ........................................................................63
Figura 17 - Campo Grande: vista aérea de toda a extensão do Sítio da Estrada de
Ferro Noroeste do Brasil e suas principais setorizações...........................................69

x
Figura 18 - Campo Grande: Estação Ferroviária transformada em Armazém Cultural
após sua revitalização...............................................................................................70
Figura 19 - Campo Grande: Primeira casa de alvenaria a ser construída para o
Chefe da Estação, está em processo de recuperação e fica no espaço da Orla
Ferroviária. ................................................................................................................71
Figura 20 – Projeto Parque Esplanada: zoneamento das propostas de reutilização do
Sítio Arquitetônico do Brasil. .....................................................................................72
Figura 21 - Campo Grande: Croqui do Parque Esplanada e suas propostas para
novo uso do espaço .................................................................................................73
Figura 22 - Bauru: Casa do Engenheiro Chefe já restaurada e com esquadrias e
toldos que não pertencem ao projeto original. ..........................................................77
Figura 23 - Bauru: Casa do Engenheiro Chefe já restaurada e com esquadrias e
toldos que não pertencem ao projeto original. ..........................................................77
Figura 24 - Campo Grande: Casa de Pouso dos dirigentes que passavam pela
cidade, esquadrias e portão ainda de madeiras........................................................78
Figura 25 - Bauru: Casa de Pouso para altos cargos que passavam pela cidade,
alterações no gradil. ..................................................................................................78

xi
SUMÁRIO

RESUMO
ABSTRACT
INTRODUÇÃO ..........................................................................................................01
1 REVISÃO DE LITERATURA .................................................................................05
1.1 FONTES TEÓRICAS...........................................................................................05
1.2 FONTES HISTORIOGRÁFICAS .........................................................................09
2 MATERIAL E MÉTODOS ......................................................................................12
3 RESULTADOS E DISCUSSÃO .............................................................................15
CONCLUSÃO ...........................................................................................................81
REFERÊNCIAS.........................................................................................................84
ANEXO 1...................................................................................................................87
ANEXO 2...................................................................................................................88
ANEXO 3...................................................................................................................89

xii
INTRODUÇÃO

Este trabalho tem como objeto de estudo a Estrada de Ferro Noroeste do


Brasil – NOB e sua influência para a história, formação e economia da cidade de
Campo Grande. Essa importância se explica devido ao fato de, antes de 1914, ano
de chegada da NOB, os habitantes terem a região como uma área isolada e
abandonada pelas instâncias governamentais.

As pessoas que habitavam Campo Grande, na época, viviam situadas umas


junto às outras, mas sem maiores ligações a não ser a amizade ou o
parentesco. Inexistia uma integração maior, por falta de presença do
governo, do contato com o capital da província e mesmo pela ausência de
lideranças mais ativas. A Região sentia-se abandonada, dona do próprio
destino, sem disciplina, sem conforto, inteiramente balda dos mais
elementares recursos. (MACHADO, 2008, p. 38).

A instalação da NOB em 1914 transformou Campo Grande, trouxe novas


ideias e novas necessidades, mudou as relações dos homens que aqui viviam.
Então a população cresceu, o comércio expandiu e sua importância econômica e
política começou a tomar vulto em todo o estado.

A Criação de novos centros de população, na Noroeste, sobre o percurso


da via férrea, e a espantosa rapidez com que se povoavam, constituem um
dos mais interessantes fenômenos provocados pela construção da estrada
e tão surpreendente e tantas vezes repetidos que a fundação das cidades
apareceu nessa região, como um corolário da estrada de ferro. (AZEVEDO,
1950, p. 76).

O crescimento das cidades por onde o trilho passou foi patente. Lugares
antes sem perspectiva alguma tiveram sua realidade e futuro completamente
modificados.
Para se ter uma ideia do impulso que tomou, em um quarto de século, de
1914 a 1940, o povoamento dessas regiões, bastará observar que a
população dos quatro municípios, de Três Lagoas (15.378 hab), Campo
Grande (49.629), Aquidauana (20.949) e Miranda (14.126) ascendeu, nesse
período, a mais de cem mil habitantes ou mais do quíntuplo da população
estimada antes da construção da estrada de ferro. (AZEVEDO, 1950, p. 83).
2

Os trilhos da Noroeste do Brasil transformaram profundamente a estrutura


econômica de Mato Grosso, colocando por terra a hegemonia das casas comerciais
dos portos, pelo qual Campo Grande passou a assumir a função de grande
entreposto comercial do Estado.

Essa rede de transporte, que correspondeu ao assalto final contra as casas


comerciais, teve seu momento culminante quando da inauguração da
Noroeste do Brasil, mas consolidou-se com as estradas de rodagem que
alimentavam essa ferrovia. Dentre elas merece destaque a rodovia que
ligou Cuiabá a Campo Grande, cuja instalação resultou na progressiva
sustação do movimento fluvial entre a capital do Estado e Corumbá. Campo
Grande transformou-se, a partir de então, no grande entreposto comercial
de Mato Grosso, capturando uma função que vinha sendo exercida por
Corumbá desde a abertura dos rios da bacia do Prata à navegação. A
ferrovia e as estradas de rodagem venceram os rios. Expressão material da
vitória da ferrovia foi o desenvolvimento intenso de Campo Grande,
enquanto a decadência em que se afundou Corumbá foi o reflexo dramático
da derrota dos rios.(ALVES, 1984, p. 70).

As relações com o estado de São Paulo ficaram cada vez mais estreitas e,
tudo e todos que faziam o percurso de trem para, em seguida, se dirigir ao Norte do
Estado, tinham que passar por aqui. A cidade recebeu, como imigrantes, não só
brasileiros de outras regiões, mas, também, contingentes de paraguaios, japoneses
e árabes.
A Noroeste do Brasil fez, sobretudo, a extensa região mato-grossense orbitar
economicamente em torno do eixo São Paulo-Santos, retirando-a da influência
platina. Daí a importância de se discutir a história, a cultura e a economia antes e
depois da chegada do trem, para compreender a importância do patrimônio histórico
e cultural que fez de uma Vila Entroncamento, a Capital do Estado de Mato Grosso
do Sul e um dos maiores centros de exportação de gado de corte do país.

Campo Grande foi a cidade que mais “avultou”, no SMT, com a chegada da
ferrovia. Entretanto, deve ser dito que essa afirmação apresenta-se
incompleta: o problema, de fato, não consiste simplesmente em
determinadas localidades haverem obtido maior ou menor vulto, mais
importante que essa constatação parece ser o fato de que Campo Grande
concentrou, notavelmente, os impactos gerados pela Noroeste – de tal
modo que muitos dos efeitos alvissareiros, detectados no âmbito de nossa
“área da NOB”, correspondem a eventos limitados, em considerável medida,
ao município de Campo Grande. (QUEIROZ, 1999, p. 497).
3

A partir dos anos 30 a Ferrovia Noroeste do Brasil, sofreu déficits por conta da
queda do café, que foi a mercadoria que mais rendeu lucros para a NOB durante
seu funcionamento. A região do Sul de Mato Grosso não pagava seus próprios
custos, devido à estrutura deficitária e às baixas tarifas por força das longas
distâncias. A partir do incentivo do governo de Juscelino Kubitschek para a criação
das rodovias e a instalação de indústrias automobilísticas no país, gradativamente o
fluxo de uso da ferrovia diminuiu.
Campo Grande teve através dos trilhos, o fortalecimento de suas relações
comerciais, intensificou o seu contado com São Paulo e investiu na criação de gado,
tanto em quantidade, como em qualidade. Mesmo os vagões tendo auxiliado, e
muito, no trajeto do gado negociado com outros estados, deixou a desejar pois não
investiu em momento algum em vagões frigoríficos.
Com a chegada das rodovias, os caminhões foram tomando conta dos
transportes. A Ferrovia, deixou de funcionar para transporte de pessoas em 1995 e
foi privatizada no ano seguinte, quando também conseguiu ser reconhecida como
Patrimônio Histórico Municipal.
Para compreender melhor este processo o presente estudo analisou o espaço
que a NOB ocupa na cidade, seu corredor, a vila dos ferroviários, as ruas e como a
cidade se desenvolveu ao redor de uma área, outrora tão importante e que depois
de uma longa fase de decadência do transporte ferroviário, se tornou Patrimônio
Histórico e se encontra em processo de revitalização.
O objetivo geral deste trabalho é a análise do espaço correspondente ao sítio
arquitetônico da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil em Campo Grande, no intuito
de compreender a função social desse espaço no desenvolvimento da cidade.
Para tanto, como objetivos específicos, busca: a) Analisar, a partir de
levantamentos documentais, bibliográficos e em periódicos, o processo de produção
do sítio arquitetônico da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil em Campo Grande; b)
Apreender, através da história, como se estabeleceram as relações sociais neste
espaço, tanto no processo de maior influência da Noroeste, como no momento de
sua decadência.
O trabalho foi dividido em capítulos de forma que cada um deles consiga
explicitar claramente as etapas do trabalho e a sua linha de estudo. A revisão de
literatura, traz as fontes teóricas que fundamentaram a linha de pesquisa e as
4

principais fontes historiográficas, que permitiu a obtenção de dados cronológicos e


significativos no que tange o objeto desta pesquisa.
Em materiais e métodos, se esclareceu como foram obtidos todos os dados
citados neste estudo, seja em livros, entrevistas ou documentos levantados em
orgãos competentes.
O cápitulo de resultados e discussão traz a interpretação de todos os dados
da pesquisa combinados, na busca de atender os objetivos deste trabalho. A
conclusão do projeto apresenta uma leitura geral das análises feitas ao longo da
pesquisa.
1 REVISÃO DE LITERATURA

Esta revisão teve como objetivo analisar estudos que auxiliassem a


compreensão da história e das relações sociais, pertinentes ao tema proposto. Em
um primeiro momento, foram buscadas as obras que serviram de fundamentação
teórica, em especial ao estudo da gênese e desenvolvimento da cidade moderna. E
em um segundo momento foram levantadas as fontes historiográficas que
permitiram enriquecer o estudo do objeto.

2.1 FONTES TEÓRICAS

Essas fontes foram a base de desenvolvimento desta pesquisa, a qual teve


como principal foco o desenvolvimento da cidade, por meio da chegada da Ferrovia.
Estudar a formação da cidade, sua política, economia e suas origens, é entender as
suas relações sociais, levando-se em consideração também, o espaço e o período
em que se insere na história geral.
Ao tratar de relações sociais dentro da sociedade moderna, é imprescindível
fazer uma análise da obra de Marx e Engels que,em se tratando deste trabalho,
serviu de fonte teórica. Desta forma, foi avaliada a formação da cidade e seu
progresso, com busca por autores relevantes dentro das ciências sociais, que se
encaixassem no período estudado, sendo este o período moderno.
A chegada dos trilhos na Vila de Campo Grande traz a ideia do progresso que
segundo muitos autores nada mais é do que evoluir nas suas relações econômicas,
onde o homem possa conquistar sua vida de forma mais produtiva e satisfatória,
ultrapassando vários limites e etapas, seja na busca de alimentos, do pastoreio, da
agricultura, do comércio, até chegar à etapa industrial.
Segundo Marx e Engels (2007, p. 75)

A maior divisão do trabalho físico e intelectual é a separação entre a cidade


e campo. O antagonismo entre campo e cidade começa com a passagem
da barbárie à civilização, do regime tribal ao Estado, da localidade à nação,
e se mantém ao longo de toda a história da civilização até chegar aos dias
6

de hoje (anti-corn-law-league)[...]Com a cidade, aparece a necessidade da


administração, da policia, dos impostos e assim por diante, em suma da
organização política em comunidade (Gemeindewssen) e, portanto, da
política em geral. Nisso se manifestou pela primeira vez a separação da
população em duas grandes classes, baseadas diretamente na divisão do
trabalho e nos instrumentos de produção. A cidade já é obra da
concentração da população, dos instrumentos de produção, do capital, do
desfrute e das necessidades[...].

Quando foi avaliado o desenvolvimento local desta região, antigo Mato


Grosso, estávamos falando de um período de transição do Brasil república, e de um
período de muito investimento de capitais estrangeiros em território nacional.
Veremos que apesar de o estudo de Marx e Engels ser bem anterior as datas que
foram apresentadasneste trabalho, ele é bastante eficaz,até mesmonos dias atuais.
O estudo e o desenvolvimento de um país colônia é retardatário diante das
grandes potências como Europa e América do Norte. Mas, gradativamente, as
influências da Revolução Industrial e das máquinas a vapor e usinas vão chegando
ao Brasil. Nacionalmente, Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais estavam em
constante contato com esses investidores estrangeiros e foi através de contatos
políticos e acordos econômicos que se iniciou o processo de concessão das
construções de Ferrovia no País.
Neste caminho, temos dois períodos acontecendo dentro do Brasil:a região de
São Paulo que já havia passado do período da agricultura e agora chega a receber
suas primeiras indústrias e, no Sul de Mato Grosso, Campo Grande ainda
completamente rural que, com o trem,ainda vai entender o que é cidade.
E como está na citação acima, é a cidade que vem concentrar a população,
produzir o capital, gerar as necessidades. Começam assim a se estabelecer
relações que antes não existiam e isso modifica a estrutura urbana, o homem e o
seu modo de pensar.

Pode-se diferenciar os homens dos animais através da consciência, através


da religião, através do que se quiser. Eles mesmos começam a produzir
seus viveres, um passo que é condicionado pela organização corporal. Ao
passo que produzem seus viveres (Lebensmittel), os homens também
produzem indiretamente na sua vida material (materielles Leben). [...} O que
os indivíduos são, portanto, depende das condições materiais de sua
produção. (MARX and ENGELS, 2007, p. 43)
A chegada do progresso e o contato com outros Estados mais desenvolvidos,
modificaram o pensamento e as relações sociais locais. Os imigrantes, os
profissionais liberais, o comércio e os serviços que foram se concentrando na cidade
7

atraíram cada vez mais investimentos para o setor de destaque local, a pecuária.
Através dessa produção e dos interesses gerados pelo capital monopolista, essa
produção passa a atender a demanda do setor industrial do estado de São Paulo
que, como consequência, passou a firmar parcerias de exportação deste mesmo
produto.
Outro autor que estuda as relações sociais em Mato Grosso, nesse período,
através do progresso do mundo capitalista, é Alves. No ensaio que realizou sobre a
transição do domínio econômico da casa comercial para a hegemonia do capital
financeiro, consegue explanar, através de dados econômicos, as mudanças que
aconteceram do período anterior a este estudo, onde Corumbá era o grande
entreposto comercial através do Porto. E finda com a chegada da Ferrovia que veio,
então, a fazer da cidade de Campo Grande a cidade de maior ligação comercial com
o eixo São Paulo – Santos.
Este ensaio contribuiu muito para o entendimento das questões políticas da
região, da mudança das formas de negociação e dos que possuem o poder do
capital. Em um primeiro momento as Casas Comerciais eram determinantes nas
relações de comércio e exportação.

Em Mato Grosso o capital financeiro manifestou-se por duas vertentes. A


primeira delas utilizou como canal a própria casa comercial, quando esta se
erigiu em representante de bancos nacionais e estrangeiros. Do crédito à
produção a casa comercial retirou a maior força de seu domínio econômico
e político no Estado nessa fase. A sua ação implacável, porém refletida
especialmente em elevadas taxas de juros sobre empréstimo e
financiamentos, gerou nos capitalistas mato-grossenses ligados à produção
o anseio pela presença de bancos na região. (ALVES, 1986, p. 39)

Com a vinda dos bancos as relações comerciais mudam e isso também afeta
todo um ciclo de acontecimentos, tanto nas alianças políticas, quanto econômicas.
Alvesapresenta em seus levantamentos que antes mesmo da chegada da Ferrovia,
havia um próspero investimento na pecuária. Com as instalações de frigoríficos no
estado de São Paulo, este interesse pela área Sul de Mato Grosso como produtora
de gado se intensifica e ao mesmo tempo a vinda da NOB só contribuiu para
acelerar esse processo.

Os rios da bacia do Prata, enquanto vias naturais de comunicação e


transporte, foram substituídos pela ferrovia, que encarna, por excelência,
uma relação social. Igualmente, foram promovidos o melhoramento
qualitativo do rebanho e a substituição de pastagens naturais etc. etc.
(ALVES, 1986, p. 67)
8

Em vista disso é possível entender que essa transição econômica afetou as


pessoas e também a paisagem local, ou seja, novas pessoas foram atraídas e, com
elas, vieram novos investimentos, fazendas, cidades, pelos quais chega o progresso
para uns e a estagnação ou decadência para outros. É o domínio daqueles que
possuem o poder de decisão, naquele determinado tempo e espaço.

As ideias da classe dominante são as ideias dominantes em cada época,


quer dizer, a classe que exerce o poder objetal dominante na sociedade é,
ao mesmo tempo, seu poder espiritual dominante. A classe que tem à sua
disposição os meios para a produção material dispõe ao mesmo tempo,
com isso, dos meios para a produção espiritual, o que faz com que lhe
sejam submetidas, da mesma forma e em média, as ideias daqueles que
carecem dos meios necessários para produzir espiritualmente. (MARX and
ENGELS, 2007, p. 71)

Ao utilizar o trabalho de Marx e Engels como base, fica muito mais claro
entender as relações que se formaram durante todo o processo de inserção desta
Ferrovia, a sua vida útil e sua decadência. Em suma, pode-se afirmar que
pertencemos a uma sociedade capitalista, uma vez que o Brasil desde o século XVI
foi incorporado como colônia portuguesa e assim a um mundo capitalista.
Para uma análise focada no urbano, levou-se em conta a cidade moderna e
suas formas de organização, seus zoneamentos e desta forma a divisão de classes.
O trabalhador, como o grande produtor da energia ou de capital, esteve sempre
limitado pelo capital monopolista e seus interesses. Campo Grande se formou
através da NOB, mas, antes mesmo, já era um ponto de produção de gado e
estabelecia relações com grandes compradores de Minas Gerais e São Paulo. Na
verdade os acontecimentos foram gradativos e intencionais, para atender a
interesses de fundo econômico.
Alves (1986) deixa explícito em sua obra que o interesse na pecuária foi o que
determinou a mudança do poder de Corumbá para Campo Grande. Esclarece
também o porquê, até os dias de hoje, o Mato Grosso do Sul tem a pecuária como
sua principal fonte de renda, com destaque nacional e internacional na produção de
carne.
Dentro do ponto de vista de Marx e Engels, o estudo de Alves (1986),se
baseou em relatórios de compra e venda de mercadorias, exportação e demanda de
mercado, ele abordou claramente todas as relações políticas e foi através delas que
9

se tornou possível entender como as transações comerciais daquele período


acabaram determinando o futuro da região.
Baseado no estudo da sociedade e na maneira de sua organização, evolução
e desenvolvimento intelectual, Marx e Engels fizeram um estudo sobre o trabalho e
as implicações que trazem ao indivíduo, quando passa a fazer parte de um grupo,
ou seja, o indivíduo em sociedade e suas relações.
A implantação daquele Sítio foi o que propiciou o desenvolvimento local e
trouxe investimentos e mão-de-obra que antes não existia. As pessoas que
participaram da construção e depois se estabeleceram em Campo Grande, foram
frutos de acordos e negociações políticas e econômicas, utilizando da força efetiva
que é o trabalhador.
O traçado da ferrovia chega até a região por interesses políticos e
economicos, visto que essa região do país, sul de Mato Grosso, era muito mais
favorável a um futuro desenvolvimento, que o norte de Mato Grosso e a região do
extremo leste da Bolívia. O período aureo desse investimento acompanhou o auge
do café, mercadoria que devido ao grande rendimento conseguiu cobrir os déficits
que o trecho de Mato Grosso tinha.
Após a queda do café a ferrovia não consegue mais cobrir seus gastos e
durante a década de 50 e 60 já se encontrava em um processo de decadência, que
se intensifica com o incentivo do governo à abertura de estradas.
Estudar a formação da cidade, sua economia e política é entender o seu
processo de evolução de uma sociedade, sua diversidade. O trabalho é o que
constrói através do homem, que é o agente principal do desenvolvimento, das
relações humanas e do tão esperado progresso.

1.2 FONTES HISTORIOGRÁFICAS

A literatura levantada sobre a Noroeste do Brasil é bastante rica.Mas grande


parte dela serve como coletora de dados, pois se baseia em relatórios expedidos ou
diários de bordo de pessoas que participaram da criação da ferrovia. Sãolivros muito
importantes e que possuem focos específicos, de onde se pode levantar o processo
histórico da NOB.
10

Em Azevedo (1950) é possível resgatar toda a ideia inicial do projeto da


Ferrovia e as diversas mudanças que ocorreram antes e durante essa construção.
Aborda bastante as relações políticas da época e as implicações que isso trouxe, na
qualidade do serviço aplicado, nos anos de construção dos trilhos. Cita as
dificuldades que se tinha em cortar a mata e o sufoco que enfrentaram com as
malárias e a leishmaniose.
Cita a Marcha para o Oeste e a intenção que se tinha de povoar o oeste do
país. Aborda ainda a grande fronteira terrestre que o Brasil tem com o Paraguai e a
importância de se instalar um fluxo constante de gente no local, na tentativa de
proteger o país de invasões. E em seus relatos, chega a citar Campo Grande como
um dos fenômenos de desenvolvimento, graças aos trilhos.

A Criação de novos centros de população, na Noroeste, sobre o percurso


da via férrea, e a espantosa rapidez com que se povoavam, constituem um
dos mais interessantes fenômenos provocados pela construção da estrada,
e tão surpreendentes e tantas vezes repetidos que a fundação das cidades
apareceu, nessa região, como um corolário da estrada de ferro. (AZEVEDO,
1950, p. 76)

Além dos dados importantes que trás da criação da Ferrovia, é uma leitura
bastante enriquecedora, pois foi escrita no ano de 1950, quando a NOB ainda
estava em funcionamento. Azevedo acreditava que seria possível manter o avião, o
carro e o trem funcionando ao mesmo tempo, sem que um tomasse o espaço do
outro. Chegou a considerar como exemplo alguns países Europeus.Hoje concluímos
que as políticas do país não propiciaram este equilíbrio, e que o trem, em grande
parte, foi inutilizado.
Em Queiroz (1999) foi exposto, através de levantamentos bibliográficos e
relatórios anuais da NOB, um paralelo entre a atuação e o rendimento da Ferrovia
no estado de São Paulo e no Sul de Mato Grosso. Nesta pesquisa são apontados
vários fatores, retirados desses relatórios, que concluem que na verdade a Ferrovia
rendeu lucros apenas em São Paulo e que os trilhos do Estado de Mato Grosso
foram mantidos por esses rendimentos.
Houve um empenho muito grande na busca de informações que deixassem
claros os motivos da Ferrovia ter entrado em decadência. Enfatiza as dificuldades
que se teve para a construção dos trilhos, o sucateamento dos vagões, a grande
influência política dos militares no comando da NOB e as influências das revoluções
11

a partir de 1924. Mas deixa claro que o grande vilão dos déficits da Ferrovia era o
Sul de Mato Grosso. Deixa claro, assim como Azevedo (1950), que a NOB valorizou
as terras do Mato Grosso e contribuiu para a formação de cidades, reconhecendo o
movimento do progresso.
Em Congro (1920), tem-se uma espécie de relatório de acontecimentos na
cidade de Campo Grande, no período em que foi escrito. O autor faz um
levantamento de todas as condições físicas deste município. Fica evidente como
principal interesse a questão da pecuária local, pois além de realizar visitas nas
principais fazendas da região, faz uma memória fotográfica desse material. É uma
leitura muito rica e restrita a Campo Grande, ou seja, é bem específica. Mas, como
em Azevedo (1950), é bastante enriquecedor o fato de ter sido escrita quando a
Ferrovia ainda estava em funcionamento, pois havia várias expectativas econômicas
para o espaço físico da cidade.
Em todos os autores aqui citados, Alves (1986), Azevedo (1950) e Queiroz
(1999), há, através de análise de determinados acontecimentos, o estudo das
relações sociais. A todo o momento, mesmo durante o fornecimento de dados, se
evidenciam os interesses, e por fim entende-se que todo o desenvolvimento de uma
sociedade e o futuro que ela toma, depende das relações humanas e da força de
trabalho que é o homem.
2 MATERIAL E MÉTODOS

Nestesegundo capítulo, foram apresentados os materiais e os procedimentos


realizados para apropriação do objeto de pesquisa. Assim, ao realizarmos todo o
levantamento histórico, pudemos entender como a Ferrovia serviu para o
desenvolvimento econômico e as relações sociais que vieram a se estabelecer neste
espaço.
Foi efetuado o levantamento bibliográfico, tanto sobre a Noroeste do Brasil,
quanto sobre a cidade de Campo Grande, no intuito de entender a proporção da
influência deste evento. Desenvolveu-se o estudo de forma cronológica, avaliando-
se sempre os acontecimentos concomitantemente, do antigo estado de Mato Grosso
e do país.
Neste levantamento historiográfico as obras de Azevedo (1950) e Queiroz
(1999), discorrem sobre a ferrovia em uma visão nacional. Na obra de Alves (1986),
foram levantados dados das condições em que o estado se encontrava até a
chegada da ferrovia, como também as mudanças dos interesses econômicos e
políticos da época. No relatório feito por Congro(2003), foi possível obter dados mais
específicos, uma vez que em toda a obra se encontra dados e imagens do município
de Campo Grande no período de 1920. Na obra de Greco (2011), há uma visão mais
intimista e enfoca as relações sociais de dentro do Sítio, sendo, dessa forma, um
relato bem específico da vida e dos acontecimentos dentro do espaço da Noroeste.
Outro autor que realizou levantamentos sobre as obras do sítio foi Arruda (2000),
com uma proposta mais voltada para a arquitetura do sítio e suas características
construtivas, o que também é um reflexo do desenvolvimento econômico e das
relações políticas do período em questão.
Com as bibliografias de apoio, foi possível entender a cidade de Campo
Grande e o seu desenvolvimento antes e depois da chegada da ferrovia, e assim
elaborar um mapeamento (figura 14), pelo qual se investigou as primeiras formas de
ocupação do espaço urbano e de sua organização. Foi possível avaliar o traçado, as
atividades e serviços que a população local desenvolvia, e delimitar, através dos
limites de ruas e manchas, a organização e vida da cidade com a instalação da
Estação.
O levantamento de imagens fotográficas, das principais cidades, durante a
chegada da Ferrovia e a comparação do grau de desenvolvimento desses espaços
13

com o material fotográfico da Vila de Campo Grande, encontrado no Álbum Gráfico


de Mato Grosso (2011), deu a dimensão exata de quão importante foi a instalação
da NOB neste espaço. A integração visual com o levantamento bibliográfico, não
deixa dúvidas de que o desenvolvimento local, atraído por criadores de gado, se
solidifica após a chegada do trem, e só assim se alcançou o posto de cidade.
Campo Grande teve suas relações comerciais consolidadas com São Paulo e, desta
forma, acesso ao desenvolvimento e ao progresso.
As imagens de outras Estações, que também pertenceram a Noroeste, como
a Estação de Bauru, servirampara fazer comparaçõescom as condições do
Patrimônio,uma vez que, tanto o Sítio da NOB em Campo Grandecomo o Sítio da
NOB de Bauru eram considerados Patrimônios Históricos e possuíam os mesmos
tipos de construções, da mesma época. Ao avaliarmos a manutenção e as
alterações, percebemos, inclusive, que o nosso Sítio possui muito mais fidelidade
aos projetos originais do que de outros estados, como São Paulo.
Sobre o levantamento realizado no Instituto Municipal de Planejamento
Urbano – PLANURB, pode-se afirmar que é o órgão responsável pelo Sítio e que
participa dos projetos que venham a ser feito dentro da área do patrimônio histórico
local. Foi possível o acesso às propostas de projeto do Programa Reviva Centro, do
qual o Sítio da Ferrovia faz parte. Este projeto foi realizado a partir de um incentivo
cedido pelo PAC – Cidades Históricas. Dentreas noventa e quatro propostas feitas
para o Centro Antigo da cidade,destaca-se a Orla Ferroviária, que envolve todo o
traçado do trilho que corta a região central – obra que foi entregue em dezembro de
2012. O Sítio da Ferrovia, que envolve o pátio dos ferroviários, a rotunda e oficinas,
estão dentro deste novo projeto.
Sobre o levantamento junto ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico
Nacional – IPHAN, não foi possível marcar entrevista. O que foi possível levantar
sobre o parecer do IPHAN em relação ao espaço do Sítio, foi uma entrevista do seu
atual superintendente, cedida ao jornal local da cidade que deu algumas
informações de relevância para o trabalho.
Ainda no IPHAN foi possível ter acesso ao Decreto Lei n°25 de novembro de
1937, onde se estabelece todas as diretrizes do Patrimônio Histórico e Artístico
Nacional, seja ele material ou imaterial. Essas leis julgam os bens que foram
14

relevantes para a história nacional e quais os procedimentos para que este bem seja
protegido.
Foi possível o acesso ao documento de registro do patrimônio, que é um
relatório de condições do bem tombado que o IPHAN realiza logo que avalia as
condições do espaço. Neste material, fiscais do IPHAN fazem um estudo do espaço
e em que estado de conservação se encontram os bens. Este documento e datado
ano de 2009 e avalia todos os bens inclusos no tombamento da Estação Ferroviária,
escritórios, oficinas, armazém, rotunda de manutenção, casas para operários, casas
para funcionários intermediários, casas para funcionários graduados, caixa d’água e
escola, o conjunto de 135 edificações, ocupa 22,3 hectares. Após essa avaliação foi
realizada a inscrição dos mesmos, no livro do Tombo Histórico Arqueológico,
Etnográfico e Paisagístico. E ainda registra que a importância deste patrimônio se dá
pela participação que a Ferrovia teve na integração e na modernização nacional.
As entrevistas feitas no espaço do sítio, iniciaram em julho de 2012 e durante
as visitas ao Intituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso do Sul, que tem suas
instalações na antiga casa de pouso da NOB, foi possivel obter o endereço de
moradores que participaram da ferrovia antes de sua privatização. Gradativamente
se deu o contato com essas pessoas que até hoje residem em casas dentro do sítio.
Ao todo buscou-se por aproximadamente 14 moradores que fizeram parte da
ferrovia e ainda residem naquele espaço, desse número apenas 10 se
disponibilizaram a dar entrevista.
15

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO

Neste terceiro capítulo foram apresentados os resultados da pesquisa a partir


dos levantamentos das fontes teóricas, historiográficas, entrevistas e documentos.
Do mesmo modo, também serão apresentadas a descrição do processo histórico da
instalação e da decadência da NOB, e as funções sociais que ela exerceu na cidade
de Campo Grande.
Para entender a proporção da influência da EFNOB na região de estudo,
precisamos conhecer quais as condições locais antes da chegada de seus trilhos. O
espaço territorial do Estado de Mato Grosso no início do século XVIII despertou
interesses em decorrência da descoberta de ouro na área norte, em Cuiabá,
atraindo vários portugueses para a região.
Em 1775 o governo manda construir o Forte Coimbra, no distrito de Corumbá,
um vilarejo na época chamado Vila de Nossa Senhora da Conceição de
Albuquerque. Essa construção era uma forma de manter o domínio sobre a fronteira
e evitar as invasões Espanholas.Acabou como palco da guerra do Paraguai.
Após a Guerra da Tríplice Aliança, o Estado de Mato Grosso passa a ter livre
acesso pelas rotas fluviais e se livra das grandes viagens cruzando o estado de
Goiás. A bacia do Prata fica livre de obstáculos para suas navegações, após a
derrota do Paraguai.

A circulação intensa de mercadorias inglesas na bacia do Prata, afastados


os obstáculos à livre concorrência, ultrapassou as fronteiras do Paraguai,
alargando seus limites para o interior de Mato Grosso. Com isso foram
reduzidas sensivelmente as dificuldades de acesso à excêntrica Província
brasileira, até essa época restrita ao caminho terrestre de Goiás.
O barateamento das mercadorias, viabilizado pela redução dos custos de
transporte, fixou em definitivo a nova rota fluvial do comércio, tendo sido
relegada ao abandono a antiga alternativa terrestre. Mato Grosso libertava-
se, enfim, das limitações impostas pelo longo e tortuoso caminho de Goiás.
(ALVES, 1984, p. 11).

Corumbá era o ponto de maior destaque na região sul do estado. O porto, as


relações comerciais e a ocupação militar, fizeram deste povoado um dos mais
significativos na história de Mato Grosso. A chamada Cidade Branca abastecia toda
16

a região com suas mercadorias através de suas Casas Comerciais.

Pela sua condição de principal porto fluvial da região, Corumbá erigiu-se,


nessa fase, no centro nervoso do comércio mato-grossense. As
embarcações de médio calado, provenientes de Buenos Aires, Montevidéu
e Assunção despejavam mercadorias nos depósitos das casas comerciais
corumbaenses, ou suas cargas eram transferidas, para embarcações
menores, que se dirigiam para o norte da Província, especialmente Cuiabá.
Enquanto principal entreposto comercial de Mato Grosso, não é
surpreendente que em pouco tempo Corumbá tenha alcançado um grau de
desenvolvimento ímpar na região. (ALVES, 1984, p. 22).

Instalaram-se ali, vários estrangeiros e grandes casas comerciais como a


Casa Vasquez e a Casa Bais & Wanderley. A cidade possui, até os dias de hoje,
construções e monumentos que podem nos remeter ao período áureo do local e
assim entendermos quão grande foi o poderio econômico da mesma.

Mercadorias eram trazidas, frequentemente, em carros de bois, da Vila


Nova, mas provenientes de Corumbá ou do Paraguai, Tecidos, calçados,
chapéus, especiarias e até alguns artigos de luxo importados, pois
Corumbá, nessa época, era excelente praça importadora de artigos
europeus. Ali, no seu velho e arruinado porto, ainda é possível sentir hoje a
opulência de seus grandes dias, examinando a faustosa arquitetura das
maiores casas comerciais da época, como a Casa Vasquez, a Casa
Cavassa, a Casa Bais & Wanderley. (MACHADO, 2008, p. 42)

O papel que as Casas Comerciais desempenhavam na época era de suma


importância no entendimento do desenvolvimento econômico e político da região.
Possuíam poder sobre as importações e exportações, além de controlarem as rotas
fluviais, se apoderando de grande parte da riqueza.
Segundo Alves (1984, p. 28)

[...] todos os produtores regionais, sem exceção, dependeram da casa


comercial para efeito de abastecimento e escoamento de mercadorias, o
que os colocou sob o controle irrestrito desta. Também insinuou-se
claramente, nesse momento em que a casa comercial era a principal
incentivadora da diversificação da produção mato-grossense, a presença de
um novo mecanismo, que passava a mediar as relações entre comerciantes
e produtores: o crédito.

Os produtores da região tinham nas Casas Comerciais um sistema de conta


corrente, onde tudo que era retirado era relacionado para controle tanto da casa
quanto do comprador. Era muito comum fazer retirada de produtos durante todo o
ano e no findar do mesmo fazer o acerto. Essas Casas Comerciais também
funcionavam como bancos na região. Esses comerciantes detinham a renda e o
17

domínio sobre as informações.Eles conseguiam saber o que acontecia nas regiões


do interior, quais os prováveis investimentos a serem feitos e acabavam dominando
além das informações, a riqueza da região, através da compra, venda e estocagem
de mercadorias.

Tem-se, enfim uma ideia do que era a casa comercial mato-grossense no


ocaso do século XIX: monopolizava a navegação e o comércio de
importação e exportação de mercadorias; através do crédito, financiava a
exploração de novas atividades econômicas em Mato Grosso ou a
expansão das existentes, aproximando-se, em seu funcionamento, do
próprio banco; finalmente começava a participar diretamente da produção,
arrendando e comprando terras para extrair borracha e explorar a pecuária
extensiva. Esse arrolamento reflete, por sí só, o alto grau de concentração
do capital levado a cabo pela casa comercial na região. (ALVES, 1984, p.
31 - 32).

Muitas dessas casas comerciais se expandiram para outras vilas no estado, a


própria Casa Wanderley Baís & Cia., fundada em Corumbá teve filiais em
Aquidauana e Campo Grande. Outras tinham sua sede em Cuiabá e vinham agente
da Brasil Land, Cattle and Packing Co., pertencente ao Sindicato Farquahr, grupo de
grande influência na história da econômica e política do estado. No ano de 1889,
chega a ser proposto a transferência da Capital do estado, que era Cuiabá, para
Corumbá.
Durante esses acontecimentos na principal cidade da região sul do estado de
Mato Grosso, outras regiões começaram a explorar a erva-mate, produto também de
suma importância para a vida econômica e social do sul do estado. A Companhia
Matte Larangeira, inicialmente comandada por Thomaz Larangeira (1882) e depois
em parceria com os Irmãos Murtinho (1891), recebeu a concessão do governo para
explorar a área onde a erva-mate era nativa.
Esta companhia sempre teve grande força política no estado, pelo fato de
Thomaz Larangeira possuir contato com o presidente de estado e outras figuras
políticas. A ele foi assegurado o direito de ser o único arrendatário legal na
exploração da erva-mate, entre outras obrigações estabelecidas pelo estado.

A vinculação entre Larangeira e políticos mato-grossenses, particularmente


com aqueles que estão no poder, garante-lhe as primeiras concessões e o
Decreto 520, faculta-lhe o monopólio da exploração da erva-mate. Esse
Decreto autoriza a Empresa Larangeira “a zelar e fazer zelar por seus
prepostos as matas e ervais de modo que fossem conservados no melhor
estado possível, não permitindo que estranho alí se estabelecessem sem
autorização legal [...] (WEINGARTNER, 1995, p. 70)
18

Desta maneira a Companhia Mate Larangeira passa a ter a responsabilidade


de controlar a entrada de estranhos nos ervais e por consequência autorizar esse
acesso. Ela também tinha livre direito a formulação de contrato para com terceiros
na prestação de serviços e autorização para manter uma guarda policial. Outra
resolução estabelecida pelo governo, Resolução n° 76 de 1894, também a isentava
do pagamento de impostos. Obteve assim, o monopólio de exploração da erva-mate
nas áreas que a ela foram concedidas.
O poder dado pelo Estado à Cia. Matte Larangeira concede a esta grande
poder político e econômico. Enriquecendo-se, chega a fazer empréstimos para o
próprio estado. Ela passa a controlar o governo estadual, a decidir como as terras e
as ocupações acontecem nesse espaço.

Para os outros moradores desses ervais, ela impõe sua lei, de forma que
todos devem prestar serviços à Matte Larangeira, porque, pelos contratos
de arrendamento, só ela tem direito de autorizar a fixação de migrantes na
região. Aqueles que não aceitam ser empregados da Companhia e tentam
tornar-se proprietários são considerados estranhos, perturbadores da ordem
e, assim, a Companhia ficava autorizada a expulsá-los dos ervais e dos
Campos de Vacaria. (WEINGARTNER, 1995, p. 73).

Por um bom período a Cia. Matte Larangeira funcionou como um vigia da


região sul de Mato Grosso e desta forma sempre teve domínio político sobre grande
parte da população. As relações comerciais com os moradores colaboravam para
esse poder. Os produtores das áreas de plantio, ao fazerem a venda do mate,
recebiam o pagamento em produtos como sal, tecido e ferramentas, no preço que a
mesma estabelecia, sempre criando créditos para a companhia e débitos para o
produtor.
Segundo Centeno (2008, p. 140):

[...] carta redigida por Thomas Larangeira, em 1879, na qual informava ao


Barão de Maracaju sobre seus primeiros trabalhadores que iria introduzir
nos ervais de Mato Grosso. Tendo se iniciado nessa atividade no Paraguai,
nos anos 1870, e possuindo experiência para administrá-la, sabia de
antemão que, para contar com esse trabalhador, era preciso adiantar seu
pagamento, ou melhor era necessário fazer com que ficasse endividado
para que não abandonasse o trabalho.

O trabalhador ervateiro era em maior parte de nacionalidade paraguaia, pois


já estavam adaptados com o tipo de cultivo que a Matte Laranjeira precisava e, por
19

que não dizer, “domesticados” ao modo de trabalhar da companhia. Outro fator de


destaque para essa migração dos paraguaios é o pós-guerra, que deixou muitos
deles sem perspectiva alguma em seu país de origem e buscaram, assim, no país
vizinho, novas fontes de sobrevivência. Povos de outros estados migraram para a
região, mas nem todos conseguiram terras para plantio disponíveis ou se adaptaram
as regras que o monopólio impunha.

Como se vê, a economia do mate atraiu muitos imigrantes na esperança de


que pudessem vir a melhorar suas vidas no sul do Estado. Contudo, foram
poucos os imigrantes que conseguiram lotes de terras explorando o mate e
criando gado. Chegando a fronteira, deparavam-se com o monopólio
exercido pela Companhia Matte Larangeira que os impossibilitava de ter
acesso às terras. (CENTENO, 2008, p. 168).

É com a vinda de mineiros, após a independência, que se dá a ocupação da


área Sul do Estado de Mato Grosso, por meio da criação extensiva de gado. Os
grandes campos deram a possibilidade do uso dessa terra para a exploração
pastoril.

Em busca não mais do desconhecido, mas de uma região habitada apenas


por tribos selvagens e animais ferozes, se pôs a caminho a caravana dos
modernos bandeirantes, dos audazes pioneiros da civilização em tão belas,
porém incultas paragens. (CONGRO, 2003, p. 25).

Nota-se em estudos de historiadores da região, que os bandeirantes


paulistas, que empobreceram depois de frustradas buscas ao ouro em Minas e no
Mato Grosso, se fixaram por essas terras e assim começaram a desenvolver a
pecuária no sul do Mato Grosso. Passaram a desbravar a terra que estava arruinada
devido a Guerra do Paraguai ou até mesmo ainda inexplorada, fugindo da pobreza
em que se encontravam. Os mineiros também vieram em busca dessas terras para
explorar a pecuária.

Em meados do século XIX, essa região começa a ser habitada por


imigrantes mineiros e paulistas atraídos pelos vastos campos favoráveis à
criação de gado, e militares responsáveis pela defesa do território brasileiro.
(CENTENO, 2008, p. 153).

A ocupação da região sul ocorreu, portanto, por meio de duas vertentes: uma
advinda do norte de Mato Grosso, que se instala no pantanal, baixo-paraguai; e a
segunda, constituída por mineiros e paulistas que ocuparam parte da fronteira com o
20

Paraguai e a Serra de Maracajú. Esses povos possuíam costumes distintos e isso


influenciou muito na constituição de uma cultura universal, de diferentes costumes e
de descendentes singulares.
Segundo Alves (2004, p. 30):

Por outro lado, baseado na historiografia especializada, colocou em relevo a


origem fidalga desses bandeirantes, também eles descendentes de uma
nobreza empobrecida, [...] mesmo pobres, esses homens jamais deixaram
de revelar atitudes aristocráticas que traíam sua origem social.[...] a
valorização dos estudos foram traços de comportamento que evidenciaram
sua ascendência nobre e os tipificaram socialmente.[...] Muito diferente era
a atitude dos pecuaristas instalados no planalto da Serra de Maracaju,
originários de Minas Gerais e do Rio Grande do Sul, cuja prática era a de
incorporar os filhos imediatamente às lides do campo, assegurando-lhes
pouco mais do que os estudos das primeiras letras. Na Nhecolândia, muito
rapidamente, os pecuaristas descendentes dos pioneiros foram tornando-
se, quase todos eles, “doutores”.

Instalavam-se, inicialmente, em ranchos que eles mesmos construíam, e as


benfeitorias de pasto ou do que precisassem para o serviço, era retirado da mata
local. Depois de algum tempo, e de renda acumulada, iam melhorando as condições
de moradia, pasto e controle, marcação de gado.
No início, ainda sem um capital significativo, os fazendeiros instalados na
região da Nhecolândia, ao precisarem de mercadorias, como remédio e sal, tinham
de fazer o charque e transportar esse produto até Corumbá, para fazerem trocas
com as casas comerciais. Mas em Corumbá não era dado o devido valor a esse
produto, pois as casas comerciais eram as únicas compradoras, tornando o preço
pago insignificante. Isso gerou, historicamente, um mal-estar nessa relação, que
perdurou por tempos e impediu qualquer acordo político depois disto.

Eis a origem econômica das divergências e do rancor do pecuarista contra o


comerciante corumbaense. Este, por seu lado, não via o pecuarista como
um cliente importante, daí uma certa desconsideração por aquele homem
rude que raramente se dirigia ao seu estabelecimento. (ALVES, 2004, p.
43).

Na realidade, o que o pecuarista realmente precisava, era manter seu contato


com os tropeiros e boiadeiros que vinham do Triângulo Mineiro, Uberada e São
Paulo. Era com eles que as negociações aconteciam,e através deles que chegavam
as informações sobre as novidades do mercado e a descoberta por novas raças e
do aprimoramento do plantel.
21

Após a chegada da NOB e o poder do capital financeiro atingir Corumbá, as


casas comerciais foram perdendo progressivamente o poder e as relações
comerciais passaram a ser priorizadas por São Paulo e pelas extensões dos trilhos
da Noroeste. A chegada dos bancos na região também tirou um dos principais
serviços das casas comerciais, que era a concessão de créditos.
A expansão pastoril se intensificou, atingiu várias áreas de Mato Grosso pela
NOB e Campo Grande foi uma delas.

A expansão pastoril semeia posses e fazendas na região propiciando o


aparecimento de arraias e cidades, entre eles, Nioaque, Entre Rios,
Aquidauana, Campo Grande [...]. (WEINGARTNER, 1995, p. 19).

Campo Grande fora apenas um campo de vacaria e, no ano de 1872, chegou


até essa região um sertanista chamado José Antônio Pereira. Um mineiro que
organizou uma expedição a Mato Grosso, que ao chegar averiguou que a terra era
boa para a lavoura, terra vermelha e abundante em água, estabeleceu aqui seu
ponto de parada e colocou em pé o primeiro rancho. Deixou Nepomuceno, um
caboclo vindo de Camapuã, para cuidar da benfeitoria e retornou para Minas Gerais.
Em 1875 retorna para este arraial com toda sua família, empregados e carros de boi,
e se tornou o fundador desta cidade.

A enorme extensão de terras não ocupadas, a sua ótima qualidade para


cultura e criação e, sobretudo o clima ameníssimo, elementos seguros de
prosperidade, fizeram atração de inúmeras pessoas vindas não só de
Minas, como de São Paulo, Rio Grande do Sul e outras províncias.
(CONGRO, 2003, p. 28).

Logo à margem do córrego, hoje chamado Prosa, se estabeleceram vários


ranchos com pessoas que buscavam um futuro promissor tirado da terra. Esses
ranchos se instalaram na chamada Rua Velha, atual 26 de agosto e em 1887 surge,
neste mesmo local, a primeira casa comercial, que era abastecida pela compra de
mercadorias no Porto de Corumbá.

Era possível, na aprazível cidade de Corumbá, comprar-se manteiga “de


Many”, da França, biscoitos e queijos da Suíça, casimiras inglesas,
calçados de legítimo cromo alemão, conservas, bebidas finas e tudo o mais
que produzia a indústria europeia. Poucas dessas coisas chegavam á
pequena freguesia de Campo Grande, ainda pobre e caipira. (MACHADO,
2008, p. 42-43).
22

Figura 1 - Campo Grande: início do século XX. Fonte: Corrêa, 2006.

Campo Grande era chamada por Arraial de Santo Antônio, devido a


construção pelo seu fundador em 1879, da primeira igreja local que tinha como
padroeiro o santo casamenteiro. Os costumes, já nesse primeiro período, sofriam
influências mineiras, gaúchas e fronteiriças. Um povo onde a miscigenação formou
uma cultura singular, um somatório de várias culturas. Uma região que, até os dias
de hoje, não tem um tipo étnico definido, mas por conta disso adquiriu condições
peculiares.
Os paraguaios que vieram, em grande parte por conta da erva-mate, acabam
encontrando parada e outros tantos de mineiros e gaúchos que vem em busca dos
campos imensos e propícios a um fácil desenvolvimento da pecuária. É a partir
desse período que se percebeu a força que este ramo da produção possuiria na
economia local. Data de 1750 a introdução dos primeiros rebanhos em Mato Grosso,
mas é após a fundação da Vila de Santo Antônio que se intensifica a relação de
comércio desse gado com o Triângulo Mineiro, com destaque para Uberaba.

Como disse o Dr. Trajano Balduino de Souza em primoroso artigo, “tornou-


se o lugar preferido dos boiadeiros, dos viajantes, dos negociantes de toda
espécie, pela sua colocação próxima aos centros produtores do gado, pela
amenidade do seu clima, pela sua surpreendente fertilidade, e daí a grande
fama de riqueza que se irradiou por todo o país, tornando-se o lugar quase
fantástico, onde, dizia-se, o dinheiro corria a rodos, tendo havido de fato
grande acúmulo de capitais trazidos pelos boiadeiros. (CONGRO, 2003, p.
28).

A atração dos chamados “mudanceiros” na expectativa do novo e assim


novas oportunidades de vida, atraiu muitos trabalhadores, mas também muitos
bandidos e desocupados. A vila ainda não possuía nenhum tipo de autoridade local
que pudesse reprimir crimes e, dessa forma, muita gente ficou impune.
Os crimes eram coisas normais para os padrões da época, fossem elas por
preço do boi, disputa de mulheres, bebida ou honra. O bandido não se espantava e
tinha justificativas e motivos para o ocorrido.
23

Segundo Machado (2008, p. 265), o bandido:

Aqui desligou-se do patrão e fez proezas incríveis. Baixo, grosso, sempre


de botas e esporas de roseta grande, chapéu de abas largas, quebrado na
frente, guaiaca cheia de balas e o inseparável 44 na cintura. Montava um
cavalo tordilho pedrês, fogoso e bem tratado. Era temido por toda gente.
Atribuíam-lhe diversos delitos nos anos que aqui viveu e quando a
1
impunidade era regra.

A vila começa a se preocupar em estabelecer alguma ordem no ano de 1889,


quando se instala o distrito de paz por uma lei provincial. Passou a ter um juiz de
paz e um subdelegado, mas ainda assim a manutenção da ordem era difícil. Por
muito tempo é reivindicado para a capital, Cuiabá, maior atenção à segurança da
vila, mas por muitas vezes não obtiveram retorno. Em alguns momentos era enviado
um soldado de Nioaque, pois lá se instalava o 7° Regimento de Cavalaria, mas não
era suficiente e o subdelegado local acabou reunindo alguns ajudantes locais.
Mas a vinda de novos povoadores não se resumia a bandidos e pistoleiros,
como já citado anteriormente, os chamados “mudanceiros”.Eram italianos,
espanhóis, portugueses, árabes e até mesmo brasileiros de outros estados. A
pecuária era o que vinha praticar a grande maioria, e o comércio acontecia a partir
da vinda de compradores, em sua maioria da cidade de Uberaba. A cidade passou a
ser conhecida, nos centros de engorda e abate, como o melhor local para gado de
corte e isso só acelerou o progresso local.

A formação desse empório de gado cresceu na medida da demanda, de tal


forma que todos os boiadeiros faziam aqui seu quartel-general, exatamente
na Rua 26 de agosto, mesmo quando Campo Grande já dispunha de outras
ruas. As pensões da 26 é que abrigavam os ádvenas. As comitivas
acampavam nos arredores, nas chácaras preparadas para isso com pasto
para a tropa e galpões para a peonada. (MACHADO, 2008, p. 59).

Outra fonte de trabalho era o comércio e a instalação de casas comerciais,


que aconteceu em maior parte pelos povos estrangeiros. Os árabes tinham grande
destaque nessa função, e o sistema usual da região, era a base de troca de
mercadoria.

1
Machado se referia a Antônio Brabo, um pistoleiro da época, que se encontrava na rua Alegre, hoje
7 de setembro, uma das zonas de baixo meretrício, área pobre da vila.
24

A Casa Verde vendia aos fazendeiros pelo sistema usual da região.


Fornecia as mercadorias durante todo o ano para receber a conta em
novembro, na venda das boiadas. Como pagamento recebia também
galinhas, ovos, erva-mate, couro, frutas e vendia sal de Cadiz, arame
Gorgon da Bélgica, mantimentos, tecidos, calçados, chapéus. Tudo era
lançado em conta corrente para o acerto final. Não era costume fazer
qualquer documento das operações e nunca houve calote. Bons tempos.
(MACHADO, 2008, p. 105).

Analisando dessa forma a maneira como o comércio acontecia nesse período,


podemos também entender como funcionavam os sistemas de negociação. Nessa
época o que importava era a capacidade matemática que esse comerciante possuía
para realizar as transações e obter lucro.
Segundo Alves (1984, p. 14):

Já foi assinalada a peculiaridade da operação de compra e venda no


período manufatureiro – em quaisquer condições tal operação só se
efetivava mediante a presença física da mercadoria -, mas é indispensável
destacar duas questões a ela ligadas. A primeira é que o pagamento só se
fazia contra a entrega do produto, daí por que operações a crédito eram
desconhecidas, ou destituídas de maior importância face ao seu
insignificante volume. A segunda questão é que a peculiaridade da
operação estava estreitamente associada à qualidade do produto, que ainda
não apresentava nessa fase maior unidade. Logo, o preço acertado na
compra e na venda estava sempre na dependência da qualidade da
mercadoria, o que tornava indispensável sua presença física. Compreende-
se com maior precisão, dessa forma, por que o comerciante não era dado à
abstração nesse mundo tangível, onde somente a materialidade das coisas
tornava passíveis de consideração.

A vila foi crescendo e em 1898 a população urbana se aproximou de


trezentas pessoas, todas morando praticamente no mesmo local: a Rua Velha, hoje
chamada rua 26 de agosto. No ano de 1899 o Arraial de Santo Antônio foi elevado a
Vila de Campo Grande.
25

Figura 2 - Campo Grande: primeira igrejaconstruída em taipa, ano de 1879.Fonte:


Congro, 2003.

Surgiu neste período a Câmara Municipal e com os cargos de presidente, vice


e os primeiros vereadores. É quando começam a surgir alguns códigos de postura e
cobrança de impostos pelas operações comerciais, que muitas vezes eram feitas por
mascates, os quais estabeleciam preços exorbitantes às suas mercadorias.
Em 1906 a vila busca ordenar o espaço de convivência, alinhar as ruas e
estabelecer uma planta que previsse o crescimento da cidade e o surgimento de
novas ruas, consequência de uma expansão urbana. O cemitério local ficava na
Praça Ari Coelho (hoje é assim chamada) e neste período acreditava-se que o
crescimento da vila aconteceria para a zona norte.
Emilio Rivasseau era um agrimensor francês que assinou várias plantas de
demarcações de terra no estado de Mato Grosso e foi chamado para fazer esse
estudo da Vila. Ele foi designado para este projeto no ano de 1906, mas não chegou
a realizar o plano de expansão. Em 1909 é que o engenheiro Nilo Javari Barém faz
um plano para a cidade e este é aprovado.

Depois que elaborou a primeira planta foi que começou o crescimento de


Campo Grande, obedecendo a um traçado inteligente, organizado,
funcional, dentro dos parâmetros urbanísticos das cidades modernas, com
ruas largas, bem direcionadas, que fizeram de Campo Grande a bela cidade
de tantas vezes elogiada por semelhantes predicados. (MACHADO, 2008,
p. 127).
26

No ano de 1907, a Vila de Campo Grande recebe a visita do engenheiro


Emílio Schnoor em conjunto com uma equipe. Eles procuravam pelas autoridades
locais, queriam conhecer a vila promissora nas transações comercias pecuárias.
Vieram realizar pesquisas para a ferrovia Itapura-Corumbá, pois precisavam saber
se a Vila de Campo Grande poderia receber uma estação intermediária.

E foi desta forma que Emílio Schnoor consolidou o novo traçado, que em
lugar de tomar o rumo de Cuiabá seguiu para Corumbá, em demanda da
Bolívia, e, por decisão de Schnoor, iria passar também por Campo Grande.
(MACHADO, 2008, p. 66).

No dia 28 de maio de 1914, os trilhos que partiram do Porto Esperança


atingiram a Vila de Campo Grande. Junto com eles chegaram vários trabalhadores
para a construção desta ligação. A Estrada de Ferro Noroeste do Brasil tem sua
inauguração oficial na vila no dia 14 de outubro de 1914. A influência da chegada
dos trilhos trouxe novos parâmetros sociais para a vila. A influência foi tão grande
que, em 1918, a vila é elevada a cidade, confirmando a chegada do progresso.
Para se ter uma ideia da proporção de desenvolvimento em que Campo
Grande se encontrava antes da chegada da ferrovia, as imagens seguintes deste
período, esclarecerão bastante. Ao comparar as fotos dos grandes centros
econômicos da época, verificou-se o quanto eram ainda precárias as infraestruturas
locais,como também o pouco povoamento. É notável a diferença no fluxo de
pessoas nas ruas e na arquitetura, tanto na proporção das obras quanto nos
materiais e acabamentos utilizados.
27

Figura 3 - Rio de Janeiro: capital do Brasil, área central da cidade, início do século
XX. Fonte: Agenda Piracicabana. Disponível em:
<http://agendaculturalpiracicabana.blogspot.com.br/2012/04/joaquim-manuel-de-
macedo-um-olhar.html> Acesso em: setembro de 2012.

Figura 4 – Santos: área próxima ao porto, ano de 1902.Fonte: Brasil Antigo.


Disponível em: <http://brasilantigo1.blogspot.com.br/2007/04/fotos-antigas-da-
cidade-de-santos.html> Acesso em: agosto de 2012.
28

Figura 5 - Corumbá: vista do Porto, início do século XX.Fonte: Ayala, 2011.

Figura 6 - Campo Grande: ainda Vila, início do século XX.Fonte: Ayala, 2011.

Diante das imagens podemos ter ideia do que acontecia antes da chegada da
Noroeste em Campo Grande. As construções de taipa começam ser substituídas por
alvenaria. A ferrovia atraiu para a cidade, emigrantes e entre eles alguns
construtores. O acesso a materiais vindos de São Paulo, como tijolos e telhas,
mudou o perfil das construções. A localização da cidade e seus campos propiciaram
a instalação de investidores e pecuaristas para esta região e isso atraiu interesses
econômicos dos grandes frigoríficos paulistas.
29

Figura 7 - Campo Grande: vista de um rodeio de gado, início do século XX.Fonte:


Ayala, 2011.

Figura 8 - Campo Grande: Hotel Democrata, construído em taipa. Servia de parada


para os compradores de gado, antes da chegada do trem (início do século
XX).Fonte: Ayala, 2011.

Antes da chegada da linha férrea ao estado de Mato Grosso, as viagens


duravam meses. Pessoas que saíam do Rio de Janeiro para Cuiabá, faziam o trecho
navegando dias e dias pela Argentina e Paraguai. Era uma região isolada
30

geograficamente, com grande extensão de divisa com países vizinhos ao Brasil e


por isso de difícil controle de invasões e domínios de outros povos.
Na segunda metade do século XIX ocorreu a Guerra do Paraguai (1864 à
1870), também chamada Guerra da Tríplice Aliança, que envolvia interesses
ingleses, os quais chegaram a financiar os gastos do conflito através de seus
bancos. Foi o maior conflito armado que ocorreu na América do Sul, envolvendo
quatro países, Paraguai, Argentina, Uruguai e Brasil. Preocupados com o
crescimento do Paraguai, com o monopólio que ele tinha das navegações pelos rios
do Prata e pelo domínio que ele teria nos ramos de importação e exportação, fez-se
a guerra.

A Tríplice Aliança realizou, portanto, uma guerra providencial para a


Inglaterra, consolidando seu domínio, antes precário, sobre a Argentina e o
Uruguai, e colocando sob controle o outrora arredio e perigoso Paraguai.
Aos vencedores, terminado o conflito e já assegurado o direito de consumir
as maquinofaturas inglesas e exportar basicamente matérias-primas,
caberia, completamente, saldar dívidas. Seus feitos guerreiros só se
realizaram merçê dos financiamentos propiciados pelas casas Bharing,
Rothschild e pelo Banco de Londres, todos ingleses não por acaso.
(ALVES, 1984, p. 11).

Com o fim da Guerra, a preocupação para ter maior controle desta fronteira
terrestre era constante. Ao final da disputa foi possível ter acesso, através da Bacia
Platina, à fronteira de Mato Grosso, que antes só poderia ser feito de forma terrestre
pelo estado de Goiás. O estado passa a ter um grande investimento por conta da
livre navegação, e Corumbá passa a ter destaque com as casas comerciais e o
ramo de importação e exportação, como citado anteriormente.
A ideia de vias mais rápidas para chegar até o estado de Mato Grosso já
acontecia antes mesmo da guerra, mas nada foi feito para que efetivamente algo
acontecesse. No entanto, só depois da guerra e de Mato Grosso ter sido invadido, é
que se teve a ideia de quão grande era a dificuldade de enviar reforços para defesa.
Diante disto, o governo imperial resolveu tratar o assunto com maior interesse,
organizando estudos sobre a ligação ferroviária do estado de São Paulo com o
estado do Mato Grosso.

A partir do ano de 1851 tiveram início as primeiras discussões em torno das


necessidades de um meio mais rápido e seguro de transporte que ligasse
Mato Grosso ao litoral do Brasil, para se evitar o então obrigatório e longo
caminho fluvial do Prata e do Paraguai, cujo percurso chegava em certas
31

épocas do ano a demorar mais de 30 dias, face às dificuldades de


navegação. (BOLETIM, 1975)

As construções de ferrovias no Brasil estavam autorizadas desde 1835,


porém as ferrovias eram concessões que o governo cedia através de contrato com
pessoas ou firmas que oferecessem vantagens de interesse da Corte em São Paulo
e Minas Gerais. No ano de 1854, o Barão de Mauá tinha acabado de inaugurar a
primeira ferrovia do país, Estrada de Ferro Petrópolis ou Estrada de Ferro Mauá,
mediante concessão. Realizou estudos da área e investiu na construção dos
primeiros 14 quilômetros de ferrovia do país.
No ano de 1904 instalou-se uma empresa com o nome de Companhia
Estrada de Ferro Noroeste do Brasil, no intuito de conseguir a concessão da Estrada
Uberaba-Coxim, que era inicialmente do Banco União de São Paulo. Esta estrada
tinha como traçado sair de Bauru, estado de São Paulo, e acabar em Cuiabá, Mato
Grosso.

De qualquer forma, definido aparentemente o traçado Baurú-Cuiabá já em


novembro de 1904 tinham início em Baurú, os trabalhos de reconhecimento
do trecho até Itapura [margem leste do Rio Paraná]. Efetuado o
reconhecimento, a construção propriamente dita veio a ser iniciada em julho
de 1905. A partir daí as obras prosseguiram em ritmo regular. (QUEIROZ,
1997, p. 22).
De capitais mistos, brasileiro e franco-belga, com concessão de garantia de
juros baixos pelo governo federal, a construção da Noroeste se iníciou em
1905. Terminados os estudos para a locação da linha férrea, a Companhia
de Estradas de Ferro Noroeste do Brasil e a companhia empreiteira dos
serviços mandaram para Bauru os primeiros engenheiros, técnicos e
operários que se encarregariam da construção. Muitos morreram de várias
moléstias (como a leishmaniose e a malária) e no confronto com os índios
caingangues. Em 2 de dezembro de 1908, os trilhos chegavam ao
quilômetro 281, onde futuramente se fundaria a cidade de Araçatuba. (BINI,
2011,p. 10)

Em 1907 esse traçado inicial sofreu alteração e a ferrovia passou a ter novo
rumo. O seu término, que se daria em Cuiabá, se deu em Corumbá. No ano seguinte
1908 já começou a construção partindo do Porto Esperança, no município de
Corumbá. As duas linhas, saindo de Bauru e a outra de Corumbá, se encontram, em
1914, próximo a Vila de Campo Grande e esse encontro faz a estação local ser
chamada de “Ligação”. A Noroeste ficou com seu ponto terminal em Porto
Esperança por muitos anos. Só a partir de 1938 é que se deu início ao trecho que
atingiria Corumbá e Ponta Porã, o qual só foi concluído totalmente em 1952.
32

A Noroeste do Brasil que, ao ser iniciada em Bauru, em 1905, se destinava


a Cuiabá, Capital do Mato Grosso, segundo traçado de Gonzaga de
Campos, teve de introduzir as primeiras modificações na sua orientação, em
conformidade com os estudos anteriores e o projeto (de 1903) de Emílio
Schnoor, que o governo resolveu adotar em 1907, e no qual se sugeria o
deslocamento dessa linha para Corumbá, a fim de atender melhor ao nosso
convênio político com a Bolívia e ao plano continental de um ferro-carril do
Atlântico ao Pacífico. (AZEVEDO, 1958, p. 70).

A ferrovia veio como fruto da industrialização mundial, pois os trilhos traziam


junto com eles as estações, suas construções, profissionais de grande respeito
como engenheiros e médicos. No ínicio do século do século XX isso era, para todos
os habitantes da região, a chegada do progresso.

[...] de acordo com esta perspectiva, que via nas ferrovias uma das
manifestações mais evidentes do progresso ao qual indivíduos e países
deveriam se sujeitar, cumpria, acompanhar o movimento determinado pela
própria história. Não saber andar junto com ela podia significar o
enfraquecimento e a perda de posição, entre as demais nações.
Inscrevendo-se o progresso na própria história e sendo as ferrovias um de
seus mais poderosos elementos, elas passaram a ser consideradas
fundamentais para garantir a força e o poder de uma nação. (CASTRO,
1992, p. 26)
Acresce que o valor estratégico de uma estrada de ferro não se mede
apenas pela sua capacidade de transporte de tropas e de seu
abastecimento, mas pela função civilizadora (econômica, comercial, política
e cultural) que exerce, transformando as regiões percorridas que, de terras
de ninguém, no man’s lands, desertas ou quase desabitadas, passaram a
ser poderosos centros de produção agrícola e industrial. É que, não apenas
os caminhos em si mesmos, mas povoamento, produção e circulação
constituem elementos essenciais de defesa das fronteiras de um país.
(AZEVEDO, 1958, p. 91)

As ferrovias no Brasil eram a projeção de um futuro promissor, a ideia de uma


integração nacional e o zelo de terras do país, de suas fronteiras que, por serem
enormes, eram muito onerosas de serem feitos. O ideal em conseguir modernizar o
país e alcançar o desenvolvimento de países europeus, era um ideal da república. A
partir de 1889, a República Velha emerge com o ideal da industrialização. O
comando político da burguesia agrária do período era formada por mineiros,
paulistas e cariocas. Nesse momento o Brasil era grande exportador de café e a
indústria teve bom crescimento.

Os republicanos partem de um diagnóstico da monarquia como o sistema


de governo que tem vícios, não satisfaz ás necessidades do presente, que
funciona mal e comprime o organismo social [...]. Ao realizarem esse
diagnóstico da monarquia, [...] os republicanos, simultaneamente,
[outorgavam-se] o estatuto de sujeitos da história, ao se proporem combater
33

um sistema de governo que está em descompasso com o tempo histórico.


(SALLES, 1986, p. 62)

O governo federal, com participação de figuras do império como Barão do Rio


Branco, tinha a ideia de constituiruma nação moderna. Pode-se observar que os
ideais de ordem e progresso desse pensamento se encaixavam muito bem nos
acontecimentos que se deram após a instalação da ferrovia e o que ela mudou com
sua chegada.

Voltado para a estabilidade interna e a concorrência externa, seus três


principais movimentos são a ação integradora e constrictora sobre o próprio
território; a ação social traduzida em sistemas de benefício e seguro social
que lhe garantissem apoio e flexibilidade; e o desenvolvimento da força
militar marítima e terrestre. Seu objetivo seria propiciar a máxima
racionalidade ao desenvolvimento do sistema econômico e a oferta continua
de novas oportunidades de inserção e incremento social. (SEVCENKO,
1983, p. 73).

O ideal de progresso que se esperava na chegada dos trilhos, envolve muito


mais do que um território melhor para todos. Os interesses políticos e econômicos
da classe dominante deste período vinham muito mais fortes. O investimento de
várias potências internacionais em conjunto com a classe dominante do país é que
fazia acontecer esse progresso que, para chegar até seu destino, tinha um preço.

Nesta fase, surge mundialmente o imperialismo com sua política


neocolonialista, que encontra no Brasil, o caminho para intervenção do
capital estrangeiro através de vários canais, com, as companhias de
Colonização o que na Noroeste será respaldado, pois esta região
encontrava-se numa fase de expansão e início de colonização e
povoamento devido aos trilhos da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil que
avançava até a região onde fica hoje Araçatuba. (MANFREDI NETO, 1999,
p. 25).

Para a construção da ferrovia foram necessárias muitas lutas com o próprio


território, ainda inóspito, cheio de malárias, muita mata a ser derrubada e muitos
combates com os nativos. Os índios ficaram por muito tempo temidos pelo povo;
eram os selvagens que atacavam os acampamentos e não entendiam a invasão de
suas terras por uma máquina de ferro. Morreram muitos homens, tanto por conta das
doenças como por conta de lutas contra os nativos, em grande parte os chamado
Kaingang. Trabalhar na construção da Noroeste era ato de coragem.
34

Por toda parte, como vimos com o povoamento e a exploração desses


sertões, romperam e se expandiram as atividades produtivas,
agropecuárias, fundaram-se cidades e colônias, e a Noroeste transformou-
se numa terra de Promissão. (AZEVEDO, 1958, p. 109).
A Estrada de Ferro Noroeste do Brasil lançar-se-á no sertão desconhecido,
trazendo a vida que gerará a morte e dentro dela outra vez a vida, que trará
a semente do progresso capitalista. (MANFREDI NETO, 1999, p. 25).

Investir no setor ferroviário era uma forma de aplicar capitais estrangeiros, já


muito comuns nesse período. Como dirigente desse grupo estava Percival Farquhar,
um grande investidor de capitais estrangeiros no Brasil, que posteriormente passou
a ter o controle de várias outras empresas, como a belga Brazil Land, Cattle and
Packing Co., que pertencia ao grupo Farquhar e veio a investir na pecuária no
estado de Mato Grosso, com criação de gado de engorda em Campo Grande e Três
Lagoas.

Essa ferrovia foi financiada por capitais franco-belgas, exatamente num


momento em que especialmente grupos belgas tinham grandes interesses
econômicos localizados em Mato Grosso. A Brazil Land and Cattle Packing
Co. presta-se a uma ilustração mais expressiva; essa empresa invernava
gado em suas fazendas de Campo Grande e Três Lagoas, ambos os
municípios servidos pela Noroeste do Brasil, e exportava para São Paulo,
através da via férrea, gado gordo destinado ao abate no Frigorífico de
Osasco. (ALVES,1984 ,p. 69).

O estado de São Paulo, neste período, já possuía um grande destaque


político, por conta do investimento no café. O Brasil era dono de oito pés de cafés, a
cada dez pés mundiais.Seu poder de exportação sobre esse mercado foi muito
grande e só veio a cair em 1929, junto com o quebra da bolsa de Nova Iorque. O
estado dominava por muito tempo a exportação de café, couro e algodão. E essas
manufaturas, muitas vezes, vinham de outros estados, como no caso de Mato
Grosso, que criava o gado e o vendia para frigoríficos em São Paulo.A partir desse
momento, a carne e o couro seriam beneficiados e comercializados com maior lucro
ou valor agregado.
As terras ao sul do estado valorizam-se e o dinamismo com que se formam
cidades ao longo do trilho é notório. Foi resultado de uma estratégia geopolítica e
territorial conduzida pelo Estado, e uma integração econômica com o polo São Paulo
– Santos. Um período em que a burguesia paulista assumiu a economia nacional e
procurou formar laços comerciais com diversos territórios brasileiros e, por
consequência, acabou determinando a divisão regional de trabalho no país.
35

A chegada dos trilhos à comarca de Campo Grande, em 1914, fez muita coisa
mudar. A vila passa a servir de ligação entre duas grandes pontas de mercado e de
capitais do país: o estado de São Paulo e o Porto de Corumbá. O fluxo de pessoas
que começou a acontecer por conta da estação local era muito grande. A vila
começa a receber povos de todos os tipos, de todas as culturas de forma muito
acelerada. Passa a conhecer novas tecnologias, mercadorias finas, trazidas por
mascates e novos comerciantes. Com o aumento do movimento local e o trânsito de
pessoas, a vila passa a ter a preocupação de organizar seu espaço urbano. Foram
criadas novas ruas, deram-se nome a elas. Esse desenvolvimento traz em 1918 a
elevação de vila de Campo Grande a município de Campo Grande.
Assim, “a 14 de outubro seguinte teve lugar a inauguração oficial da Estrada
de Ferro Noroeste do Brasil, datando da sua chegada o extraordinário
desenvolvimento, o vertiginoso progresso da localidade.” (CONGRO, 2003, p. 35).

Figura 1 - Campo Grande: Estação Ferroviária da NOB, construída em alvenaria,


ano de 1920. Fonte: Congro. 2003.

A cidade começa a se organizar, novas ruas surgem ao redor da ferrovia. A


chegada do trem na gare cria um ponto de encontro na cidade e as pessoas se
reúnem nas proximidades da ferrovia para passar o dia, conversar. Percebendo o
movimento no local, muitos comerciantes se mudam para a proximidade, ou seja,
para a Rua 14 de julho.
No final da década de 10, a cidade já possuía algumas construções com uso
de alvenaria de tijolos e telhas de barro. A primeira casa foi construída na Rua
Velha, 26 de agosto. Com a Estrada de Ferro vem uma quantidade muito grande de
migrantes, muitos portugueses, espanhóis, árabes, italianos, japoneses. Entre esse
36

pessoal havia alguns construtores e isso vem mudar a caracterização visual da


cidade, as casas começaram a aparecer com alguns traços de uma arquitetura
clássica e novas técnicas construtivas.
Com o advento da Estrada de Ferro Noroeste e a localização de sua gare
ao norte da cidade, a rua passou a ser a mais comprida de todas as
existentes e era caminho para a estação, por onde trafegavam os carros de
praça, puxados a cavalos e perambulavam os pedestres, que se divertiam
com o movimento da chegada dos trens, numa vila de poucas distrações.
Fácil entender que os comerciantes passaram a preferir esse logradouro
para a instalação de suas lojas. (MACHADO, 2008, p. 134).

As antigas ruas, como a Rua Velha, hoje 26 de agosto e a Rua Alegre, hoje 7
de setembro, começam a ficar relegadas ao esquecimento e a cidade passa a
acontecer próxima à ferrovia. Os moradores da Rua 26 de agosto começam a
procurar lugares mais altos para suas novas moradias, e começam a ocupar a Rua
15 de novembro e a nova Avenida Marechal Hermes, hoje Afonso Pena.2 A Rua 7 de
setembro passou a ser usada apenas para cabarés de baixo nível, chamada por isso
de Boca do Lixo.
Estar próximo das instalações da ferrovia trazia ares de nobreza a tudo que
se estabelecia por ali. Havia, nas ruas Dom Aquino e Maracaju, os cabarés de luxo e
esses locais eram conhecidos como “Baixadinha de Ouro”. A Rua 14 se tornou a rua
principal para o comércioe para o tráfego de pedestres, com os carros de praça que
atendiam aos viajantes recém chegados na cidade. Todas as características de uma
urbe e seus setores começam a ser delimitados de forma bem precisa nesse
período.

A ferrovia aparece como fecundadora do desenvolvimento da cidade, na


constituição de sua importância política-econômica nos anos seguintes.
Teria ocorrido então, uma espécie de ruptura. Antes da estrada de ferro,
Campo Grande não passava de uma pequena aglomeração de pessoas,
perdida no “sertão” e encoberta pela poeira da história. Depois, eis a cidade
surgida do limbo e já como promissor núcleo urbano, centro comercial
econômico e político, estratégico para a circulação de mercadorias e ao
processo de acumulação do capital monopolista. (ARRUDA, 1995, p. 30 -
31).

A cidade então tem como coração o Sítio da Estrada de Ferro Noroeste do


Brasil. É ao redor daquele corredor da estação ferroviária, das casas de funcionários
e de respeitosos engenheiros da ferrovia que a cidade passa a orbitar. Muitos

2
Nome dado em homenagem ao presidente que estava no governo, quando se decidiu instalar a
NOB em Campo Grande.
37

imigrantes vindos para a construção dos trilhos acabaram ao final da obra ficando
pela cidade e se instalando por aqui. Os árabes com a formação de casas
comerciais, italianos, japoneses com a área de plantio e hortas, espanhóis,
paraguaios, com sua comida e música, entre outros.

Grande e operosa é a população estrangeira, destacando-se as colônias


síria, italiana e portuguesa, que se dedicam ao seu intenso comércio, e a
japonesa, vinda empregada na construção da ferrovia e agora dedicada,
nas redondezas da cidade, à pequena agricultura, abastecendo diariamente
o mercado consumidor. (CONGRO, 2003, p. 38).

Junto com essas novas culturas vinham novos costumes, comidas, danças e
acabaram fazendo dessa pluralidade, uma cultura singular, que se revelava através
da mistura de várias etnias em um mesmo território. Dentro da ocupação econômica,
muitos delas se dedicaram ao comércio e outros resolveram investir na pecuária,
que era algo de bastante importância para Campo Grande.
Com o trajeto do trem acontecendo periodicamente, ficou muito mais fácil o
acesso de compradores de gado à região. A pecuária passa a crescer muito
rapidamente e, em meados de 1920, Congro (2003, p. 54) já previa maior evolução:

Diariamente afluem os compradores de gado e de terras, entre estes muitos


ingleses e americanos-do-norte, e não está longe o estabelecimento de
frigoríficos em Campo Grande, dentro de toda a grande e magnífica zona
pastoril do sul mato-grossense.

Neste mesmo estudo que Congro realizou sobre a pecuária, dá destaque a


Fazenda Capão Bonito, cujo proprietário é a Brazil Land Cattle & Packing Co.,
expressão da entrada de capital estrangeiro na região. Junto com ela ainda se
somavam mais seis outras propriedades, envolvendo em torno de 158.873 hectares.
Esta empresa é citada como um marco do desenvolvimento da pecuária moderna do
município de Campo Grande. Traziam bois de outros países para apurar as cruzas e
possuir gado de qualidade. Segundo Queiroz (1999), o ano de 1927 foi um período
de grande destaque para a pecuária no Sul de Mato Grosso devido aos
investimentos da Brazil Land Cattle e isso fez com que o preço do gado começasse
a subir.

Povoam as campinas de Capão Bonito cerca de quarenta mil bovinos e, nas


longas excursões através das mesmas, somente num retiro ainda podem
ser vistos alguns touros indianos, tendo sido espalhados pelas planuras,
38

introduzidos nos rebanhos crioulos mais de mil reprodutores Hereford e


Shorthorn, raças de corte, de carne excelente, principalmente a primeira,
mais conhecida e apreciada em todo o mundo pela sua precocidade, peso
vivo e rendimento de carne, além de sua rusticidade, que a torna mais
3
resistente. (CONGRO, 2003, p. 62).

No ano de 1922 se instala o primeiro banco, Banco Nacional do Comércio.

Figura 10 - Fazenda Capão Bonito: propriedade da Brazil Land. A construção fazia


uso de telhas de barro, material construtivo ainda não produzido na região, (década
de 20). Fonte: Congro, 2003.

Com a instalação, em seguida, de mais dois bancos, incluindo o Banco do


Brasil, começa uma fase de transição, quando as casas comerciais passam a perder
seu domínio financeiro da região.
Segundo Alves (1984, p. 38):

No plano substantivo do geral, a passagem do século XIX para o século XX


testemunhou também a “viragem do velho capitalismo para o novo”, a
transição “da dominação do capital em geral para a dominação do capital
financeiro. Em outros termos, a livre concorrência, que na sua realização
levou a uma progressiva concentração do capital, foi, ela própria, superada
numa determinada etapa da evolução histórica desse processo de
concentração ao ser gerado o monopólio. Dessa forma, o capitalismo
atingiu sua “fase superior”, o imperialismo.
Nessa nova etapa os bancos passaram a exercer uma nova função. Já não
eram meros intermediários nos pagamentos, pois a concentração bancária
havia permitido que dispusessem de somas gigantescas de capital e que
aumentassem significativamente seus movimentos. Liberaram-se, dessa
forma, para novas modalidades de operações, passando a encarnar não
mais o capital bancário, mas sim o capital financeiro.

3
Raças que posteriormente foram substituídas pelo Nelore.
39

Com a queda do poder das casas comerciais e o desenvolvimento da cidade


de Campo Grande por conta da chegada da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil, a
cidade de Corumbá começa seu processo de decadência.
O período em questão compreende inclusive a primeira guerra mundial, que
apesar de causar uma grande crise nos países envolvidos no conflito, deu a Mato
Grosso a possibilidade de exportar o charque, o couro e a erva-mate.
Foi comoreconheceu Congro (2003, p. 38), a saber:

A despeito da dificultosa situação geral criada pela grande guerra e da falta


de materiais, vindos de longe por preços fabulosos, foi verdadeiramente
febricitante o crescimento da urbes, notando-se ainda, continuadamente
dezenas de prédios em construção.

No ano de 1921 foi transferido, de Corumbá para Campo Grande, a


Circunscrição Militar. Acreditava-se que essa transferência era por conta da
instabilidade da posse de terras na região ou possíveis invasões e pela importância
econômica que a cidade estava assumindo.
Em 1920, Campo Grande passou a ter planejamento, haja vista o estado já
serconsiderado como o quarto maior rebanho bovino do país. Com a chegada de um
promissor progresso, a cidade planeja seu primeiro bairro e passa a pensar
seriamente sobre o seu crescimento e suas projeções urbanísticas. “A regularidade
da malha urbana, usando a trama ortogonal, com uma grande avenida central,
evidenciava a utilização de um traçado europeu das cidades do século passado.”
(ARRUDA, 1997, p. 3).
A chegada da ferrovia e a instalação da Circunscrição Militar influenciaram
muito a criação de organismos importantíssimos para o funcionamento de uma
cidade, como seu Código de Posturas e o hospital.

Com o rocio implantado a cidade foi se estruturando com edifícios públicos,


instalações militares, (quartéis, hospital) e, no ano de 1921, foi aprovado um
novo Código de Posturas contendo requisitos urbanísticos importantes, tais
como, a continuidade de vias com a mesma faixa de domínio e implantado o
primeiro bairro de Campo Grande o Amambaí, criado para interligar o sítio
urbano aos quartéis do Exército que se instalaram na parte oeste da cidade.
(ARRUDA, 1997, p. 4),
40

Figura 11 - Campo Grande: planta do plano de alinhamento de ruas e praças, ano


de 1909.Fonte: Arruda, 1997.

Suas edificações começam a seguir alguns padrões da época e fazer uso da


arquitetura do estilo eclético e art decó.Começaram a aparecer hotéis, cinemas,
edifícios. Nos relatórios levantados por Cimó, foi encontrada a nota de Ubaldo de
Medeiros, que dizia: “De um modo geral, verifica-se grande surto de progresso na
zona servida pela estrada, especialmente no trecho mato-grossense. (R56, 1957, p.
4 apud QUEIROZ, 1999, p. 389).”

Também Zardo afirma esse fato, a saber:

Com a construção dos quartéis, das moradias dos militares, da diretoria da


ferrovia e das residências dos ferroviários, dos hotéis, das casas comerciais
e dos lares dos fazendeiros e de outros trabalhadores, houve um grande
desenvolvimento da indústria da construção civil, com implantação de
olarias, pedreiras, marcenarias, serralherias, etc. [...] Como sede da
Circunscrição Militar e da Diretoria da Companhia Noroeste do Brasil,
Campo Grande teve grande crescimento populacional somado com a
chegada de imigrantes das mais variadas profissões. (ZARDO, 1999, p. 63).

Os militares tinham grande influência na vida cultural, política e


socioeconômica da cidade, além de muitas vezes exercerem a função de
professores para alguns grupos, contribuindo assim para a educação local. Com a
41

participação dos militares locais no golpe dado ao governo em 1930, sob o comando
de Getúlio Vargas, fortaleceu aqui a ideia de divisão do Estado.
Em 1926 é inaugurada a ponte ferroviária Francisco de Sá, que sai do estado
de São Paulo e cruza o Rio Paraná, atingindo Três Lagoas. A ponte era um projeto
ousado e oneroso, pois foi construída com materiais importados belgas, material que
não se tinha disponível no Brasil. O trajeto que antes era feito por balsas e atracava
no Porto de Parnaíba acabou e deu lugar a ponte, aumentando e facilitando o
tráfego da linha ferroviária. Apesar de todos os problemas e desgastes enfrentados
pela Noroeste nesse período, de acordo com levantamentos feitos por Queiroz, foi o
período de maior rendimento da ferrovia e, em 1927, ele também encontra um
relatório onde enfatiza o seguinte: “A exportação de gado em pé do Estado de Mato
Grosso, após a inauguração da Ponte do Paraná, vem se desenvolvendo de modo
animador.” (R.27, 1928, p. 17 apud QUEIROZ, 1999, p. 392).
Até 1930 a Ferrovia saía de Bauru, estado de São Paulo, e terminava no
Porto Esperança. A partir da década de trinta se dá início ao trecho que atingirá o
ponto final da estrada, que é Corumbá, que só veio a terminar realmente em 1953. E
no final da década de 30 começa a ser construída também, a Estrada de Ferro Brasil
- Bolívia.
Durante esse período de 1930 a 1945, Getúlio Vargas criou um movimento
que incentivava a ocupação do centro-oeste e levou o nome de Marcha para o
Oeste. A intenção era preencher os vazios demográficos. A região centro-sul estava
com um excedente populacional e, por conta disso, era melhor que migrassem para
outras regiões, servindo também de mão de obra para aumentar o fornecimento de
matéria-prima e promover as indústrias que viriam a se implantar na região sudeste.
Os principais estados que serviram para essa política foram Goiás, Paraná e Mato
Grosso, todos encarregados da produção de alimentos.

Em pouco mais de 25 anos, sua população ascendeu de cêrca de 7.000


habitantes em 1914 a 23.054, em 1940; e mais ainda do que a paisagem
urbana, em que se erguem, sem, no entanto, dominá-la, numerosas casas
confortáveis e prédios de cinco andares, se transfigurou a sociedade que
lhe empresta, pelo seus hábitos, alguns dos aspectos mais amáveis das
cidades modernas. (AZEVEDO, 1950, p. 83)
42

Figura 12 - Campo Grande: vista aérea da estação e a visualização da paisagem


urbana com casas, calçamento e ruas bem delimitadas (década de 30).Fonte:
ARCA, s.d.

No mesmo período, final da década de 30, Campo Grande só tinha o bairro


Amambaí, que foi criado na década de 20 e o Cascudo, posteriormente. Neste
período é que o engenheiro Saturnino de Brito é chamado para fazer o plano de uso
do solo da cidade. No mapa a seguir será possível entender como a cidade se
distribuiu, com áreas de comércio, prestação de serviços e áreas residenciais.
O traçado da cidade em xadrez,sendo sua organização (inicialmente) com as
costas voltadas para os rios, é um caráter muito presente em todas as colônias de
descendência portuguesa, pelo qualse visava apenas o urbano e a área natural das
margens dos rios e os próprios rios, acabavam sendo vistos como local para dejetos.
43

Figura 13 - Campo Grande: análise da ocupação da cidade e distribuição de


serviços e bairros, (década de 30). Fonte: Arruda, 2001. Adaptado pela autora, 2012.

As manchas do mapa se dividem em ocupação 1 e ocupação 2.Isso


corresponde a etapa de ocupação do espaço. A ocupação 1 foi a parte onde se
instalaram os primeiros moradores e onde se concentravam todas as atividades da
Vila, antes da chegada da ferrovia. A ocupação 2 veio a posteriori, com a chegada
da ferrovia,pelo qual todas as atividades econômicas da cidade se transportaram
para perto da estação.
O que anteriormente acontecia nas Ruas 26 de agosto e 7 de setembro,
subiram ao norte, sendo substituído pela Av. Calógeras, a qual era uma prestadora
44

de serviços, com pensões e carros para traslados dos recém chegados a Campo
Grande. A Rua 14 concentrou toda a área de comércio e cafés. A maior parte
desses comércios era pertencente a emigrantes que aqui acabaram ficando após a
chegada do trem. Construíam seu comércio e, em um piso superior, suas
residências.
A área coberta por uma mancha verde, área de hortas, foi ocupada grande
parte por emigrantes japoneses. Vinham com um grande número de familiares em
busca de serviço e por disponibilizar da força braçal acabaram se dedicando ao
plantio. Atividade muito significativa, pois veio a atender a demanda do número de
moradores que aumentou consideravelmente após a chegada da NOB.
A mancha em cinza escuro, denominada por área militar, foi onde se instalou
o exército na década de 20, pertencente assim a ocupação 2. Para atender as
famílias desses militares, foi que se criou o primeiro bairro residencial de Campo
Grande, o bairro Amambaí. Era um local distante da área central da cidade e onde, a
maioria dos seus moradores se dedicava ao trabalho. Não havia nenhum
planejamento de convívio ou lazer, um bairro realmente criado dentro do ideal
modernista, das cidades pós-revolução industrial, bairro de trabalhadores.
O bairro Cascudo foi o segundo bairro a ser projetado e ficou ao Norte do
mapeamento, ladeando a Estação Ferroviária. Foi um bairro também criado para
abrigar trabalhadores; nele se instalaram prestadores de serviços, que
exerciamtrabalhos de olaria, barbearia, sapataria, açougue, ferraria, como também
residiam no mesmo local em que trabalhavam. O bairro abrigou também a Santa
Casa e o Colégio Dom Bosco.
A grande mancha em cinza claro foi onde se acomodaram os profissionais
liberais, médicos, advogados. As grandes casas dos fazendeiros da região também
ocuparam essa área. Ficou como uma área nobre da cidade, onde se instalaram as
pessoas de maior poder aquisitivo. A área contava com duas praças e também com
um clube, onde aconteciam todas as festas e reuniões desse mesmo público. O
Rádio Clube era um ponto de encontro e recreação dessas famílias que residiam em
suas proximidades e de acesso restrito.
A Estação Ferroviária teve muitas de suas casas construídas nesse mesmo
período. Outra parte delas, a mais antiga, acabou sendo refeita, pois as primeiras
instalações não eram nem de alvenaria. É possível, através de arquivos do IPHAN,
identificar os moradores das casas, as diferenças dos materiais empregados em
45

suas construções. Dentro do Sítio da Ferrovia, as casas e suas ornamentações


eram construídas de acordo com o cargo que a pessoa residente exercia dentro da
hierarquia ferroviária.
Em 1941 a cidade passa a ser dividida por zonas: zona central ou comercial,
que é a área onde se encontrava o Sítio da NOB; zona industrial, zona residencial e
zona mista e, ainda neste período, encontramos registros de mais bairros como o
Boa Vista e o Vila Alba, praças, matadouro, curtume, quartéis. Em 1948 é criada
uma comissão para planejamento da cidade, com a função de melhorar e
desenvolver o urbanismo local.
O Sul de Mato Grosso até então era um grande exportador de erva-mate e
com a chegada da Ferrovia, muitos se animaram para realizar a exploração da
mesma. Em 1915 foi lançada uma lei estadual que garantia direitos de compra de
área de ervais, preferencialmente àqueles que já estavam estabelecidos ali, os
posseiros. A ideia de desfazer o monopólio da Cia de Matte Larangeira, parecia
próxima, se outros produtores de erva-mate conseguissem realizar transações
comerciais dessa possível produção, ela seria transportada pela NOB e isso traria
grande rendimento. Porém o monopólio permaneceu e a Matte Larangeira, acabava
comprando e revendendo a produção desses posseiros.
A Cia Matte Larangeira possuía todo tipo de transporte para realizar suas
próprias transações comerciais e utilizou poucas vezes o serviço da ferrovia. Na
década de 30 notou-se um aumento nos transportes de ervas pela Noroeste.No ano
de 1940 começaram a realizar embarques de erva-mate por Ponta Porã, devido a
proximidade com a fronteira, pois grande parte da erva era exportada.
Em 1943 Vargas cria o Território Federal de Ponta Porã, ação que não
agradou o governo do estado e muito menos a Matte Larangeira. Era o período da
Segunda Guerra Mundial e, para melhor comando de fronteira, criaram vários
territórios federais, onde militares assumiam a presidência temporária. Até os dias de
hoje a cidade de Ponta Porã é conhecida por princesinha dos ervais e, naquele
período, era a região de grande produção de erva-mate em Mato Grosso. A ferrovia
chegou em 1946 a Dourados e, em Ponta Porã, divisa com o Paraguai, em 1952. A
Matte Larangeira tem seu contrato com o estado de Mato Grosso findado em 1947,
quando as terras que antes ela dominava, gradualmente vão sendo ocupadas por
outras pessoas.
46

Pelo visto, o Estado Novo imprimiu uma diretriz estatal, centralizada e


nacionalista, nos seus ambiciosos projetos de ocupação dos “espaços
vazios” do oeste e da Amazônia. Tal opção era politicamente orientada para
criar, no “novo” espaço do país, uma nova ordem social, lastreada no fazer
coincidir as fronteiras políticas com as econômicas e no estabelecimento de
uma ordem original de relações sociais, ancoradas na pequena propriedade
e na organização cooperativista dos associados – uma realidade nova e
oposta às formas sociais da exploração do trabalho e do trabalhador do
campo. (LENHARO, 1986, p. 46)

Neste mesmo período começa a haver incentivo à agricultura. Em 1943 dá-se


início a um projeto de reforma agrária e em Dourados é criada a Colônia Agrícola
Nacional de Dourados (CAND). Neste projeto foram doados lotes, em média 30
hectares a 10.000 famílias. Uma boa parte era de nordestinos e japoneses. Em seu
diário sobre a ferrovia, Figueiredo (1950) chega a citar que, em 1947, muitas
pessoas abandonaram a agricultura pela pecuária nos territórios “aquém – Paraná”,
devido à dificuldade do plantio e do clima, às vezes muito seco.
A ferrovia teve uma boa renda no trecho paulista e no trecho Sul Mato
Grossense, frequentemente, fechava seu orçamento com débitos. Durante todo o
período áureo do café, no estado de São Paulo, a ferrovia o teve como principal
fonte de lucro. O carregamento de café nos vagões era proveitoso, com muitas
sacas por vagão, aproveitando toda a capacidade. Com a crise do café a ferrovia
fica com o transporte do gado e do charque, que não sanavam os frequentes déficits
com que o trecho Sul-mato-grossense fechava anualmente.

Levando-se em conta que no grande Estado Central a quilometragem de


linha é maior duas vezes que a da “Noroeste” paulista, em face das
conclusões citadas, chega-se a conclusão geral que, sob o ponto de vista
econômico, a exploração industrial do transporte ferroviário em Mato Grosso
é altamente deficitário e impossível de ser mantida, se o Governo Federal
não indenizar a Estrada de Ferro, anualmente dos prejuízos sofridos,
levando-se em conta o seu caráter eminentemente estratégico.
(FIGUEIREDO, 1950, p. 42)

Segundo dados do próprio Figueiredo, no ano de 1935 a NOB já havia feito


seu fechamento com débito e isso se seguiu nos anos posteriores. Em 1943
conseguiu fechar com algum lucro.No ano seguinte, os lucros e as despesas são
apenas pagos, mas em 1945, volta a ter déficit. O ano de 1948, que é o último ano
de análise, a quantidade de despesas chega a alcançar um quarto do lucro.
Enquanto o café manteve sua hegemonia os déficits da ferrovia eram
sanados, mas após a queda do café as outras mercadorias não conseguiam cobrir
47

esses déficits, nem trazer rendimento semelhante. Dessa forma, era muito
importante que os locais onde a ferrovia estivesse instalada conseguissem gerar
renda que cumprisse com os gastos da ferrovia. Mas nem todos os povoados tinham
esse potencial. A maioria não tinha, principalmente no sul do Mato Grosso.

Os demais produtos, despachados na Noroeste, pagam de 30% até 68%


menos que o café, enchem o vagão em volume e não o lotam em peso. O
amendoim, por exemplo, paga um frete inferior ao do café em 58% e só
ocupa, quando muito, peso correspondente à metade da lotação do vagão,
apesar de enchê-lo em volume [...]. É um transporte duplamente
desfavorável para a Estrada: no frete baixo atribuído pelas tarifas em vigor e
no mau aproveitamento dos veículos. (R47, 1948, p. 148 apud QUEIROZ,
2004, p. 255)

O sul de Mato Grosso tinha agora a pecuária como principal produção e fonte
de negociações com os estados vizinhos. A erva-mate e o charque atendiam países
vizinhos, e a cidade de Corumbá passou a focar mais suas relações com países
como a Bolívia. Seu porto continuou em funcionamento e ainda era a fonte de
ligação com Cuiabá.
Campo Grande se expandia cada vez mais e grandes criadores de gado
acabaram se estabelecendo na cidade, construindo suas casas e acomodando suas
famílias. O transporte do gado, em Mato Grosso, era feito em grande parte para
Minas Gerais e São Paulo, locais onde estavam os grandes compradores;mesmo
com a chegada da ferrovia, ainda era levado em comitivas. Os vagões, para o
transporte desse gado, eram poucos e o fato de o boi ser levado em pé, acabava
ocupando muito espaço.
A ferrovia facilitou o transporte de gado, principalmente nas épocas de chuva,
pois as estradas ficavam empossadas e muito ruins de serem trafegadas. Mas há
vários registros de que eram ineficientes a quantidade de vagões e, a maneira como
o gado era acomodado, não era satisfatória de acordo com a demanda que havia.
Segundo Machado, (2008, p. 66):

Mesmo depois de inaugurada a Noroeste, em 1914, as coisas não mudaram


muito para o boiadeiro no tocante ao transporte dos bois, que continuou por
muito tempo a ser feito na base das comitivas, que conduziam as grandes
boiadas para Minas, depois São Paulo e também para o Paraguai, sempre à
procura de melhores preços e condições de negócio.

Outro parecer bastante interessante é o de Queiroz (2004, p. 404);


48

A própria ponte da NOB sobre o Rio Paraná parece haver contribuído não
só para o aumento dos transportes de gado pela ferrovia como, também,
para a saída de animais em pé. Numa demonstração desse fenômeno,
noticia-se em 1929 a execução de serviços visando a “adaptação”; tais
serviços, que consistiam no assoalhamento da ponte e na instalação de um
gradil de ferro em ambos os seus lados, foram concluídos em 1930 (R29,
1930, p. 15 – 16; R30, 1931, p. 15) – cabendo recordar que nessa época já
havia uma estrada boiadeira entre Três Lagoas e Araçatuba, a qual era
provavelmente percorrida por esse gado.

Além das questões de transporte desse gado, é importante entender o que


acontecia na negociação do mesmo. Lima Figueiredo, que era coronel e foi diretor
da ferrovia por cinco anos seguidos, declarou a necessidade de se construir um
frigorífico em Aquidauana, região que ele julgava ser equidistante dos principais
pontos de criação de gado do sul do estado de Mato Grosso. Assim seria produzida
uma carne mais descansada para o consumidor, evitando as longas viagens para
engorda e abate e trazendo maior lucro aos produtores.
Segundo Figueiredo (1950, p. 99-100);

O criador arca, pelo processo atual, com todos os ônus e é o que menos
ganha. O invernista compra-lhe o boi, leva-o para suas pradarias bem
formadas e, no fim de um ano apenas, o revende rachando de gordo.
Ganha boa soma. O industrial, geralmente estrangeiro, em seu frigorífico
recebe o bovino e o aproveita integralmente. Paga apenas o preço da
carne, mas aproveita tudo: matambre, chifre, osso, casco, couro, sangue,
pêlo e até o estrume. Quando póde exportar carnes frigorificadas ou
enlatadas é um Deus nos acuda de dinheiro.[...] Por essa rápida exposição
todo o mundo póde averiguar a desigualdade entre o ganho dos que criam e
dos que negociam o animal bovino.

Segundo Azevedo (1950, p. 101),

[...] a solução do problema estaria antes na formação, em cada um dos


centros de pastoreio, das diversas indústrias ligadas à criação de gado, e na
instalação de grandes armazéns frigoríficos para depósito e conservação de
carnes congeladas, provenientes de reses abatidas nessas regiões.
Armazéns frigoríficos, junto aos matadouros locais; vagões frigoríficos, para
o transporte de carnes congeladas, pela viação férrea até os centros
principais de consumo; a exploração industrial dos produtos da pecuária, e ,
portanto, a coordenação, para o mesmo fim das atividades da indústria
pastoril e da indústria de transportes ferroviários, constituem um conjunto
sistemático de medidas, mediante cuja execução não só estaria resolvido o
problema dos criadores e da elevação de nossos rebanhos [...] em
quantidade como em qualidade [...]

A luta por muitos anos da criação de um matadouro em Campo Grande,


nunca saía efetivamente do papel. Foi assim que alguns fazendeiros locais se
49

reuniram, organizaram e construíram o matadouro com financiamento próprio.


Figueiredo (1950) chega a mencionar a admiração pelo esforço do povo local na
execução do projeto do matadouro e diz que espera que esse esforço seja
reconhecido pelo governo federal, de forma que venha a investir em veículos
frigoríficos para o transporte da carne congelada pela ferrovia. A possibilidade de
levar a carne já abatida, cortada, traria muito melhor rendimento para esse trajeto. O
número de mercadorias que embarcaria por vagão seria muito maior do que o gado
transportado em pé.

[...] Apelando para o General Eurico Dutra, mato-grossense de boa cepa,


estou certo de que em breve, teremos os veículos frigoríficos, para não
atrasar o funcionamento do M.I., levado a cabo a golpes de audácia e de
entusiasmo por pecuaristas desejosos de ajudar a independência
econômica da terra dos capitães-generais. (FIGUÊIREDO, 1950, p. 105)

Os pecuaristas locais reivindicavam por mais vagões, melhores taxas.


Segundo Queiroz (2004, p. 405),

Tratando desses assuntos, os relatórios dos diretores noticiam uma


realidade bastante contraditória, na qual se sobressaíam os seguinte
aspectos: as pressões dos pecuaristas mato-grossenses, exigindo
transporte, por um lado; e o caráter francamente deficitário desse serviço,
por outro.[...] o transporte do gado mato-grossense representava, para os
dirigentes da Noroeste, uma grande complicação.

E segue ainda um relatório de 1936, escrito por Marinho Lutz:

Vem tendo grande incremento a pecuária, no Estado de Mato Grosso,


principalmente na parte em que o mesmo é servido pela Noroeste. O
crescente aumento da criação de gado está exigindo melhor aparelhamento
do material rodante e de tração da Estrada, a fim de que sejam satisfeitas
as justas exigências dos criadores, no concernente ao transporte desse
produto. Apesar de ser essa a principal fonte de riqueza daquele Estado,
ainda não pudemos de maneira satisfatória resolver o problema do
transporte desse gênero, em virtude da deficiência do nosso material, e
muitas vezes nos deparamos com dificuldade de tal natureza que se produz
verdadeiro colapso do transporte de gado (R36,1937, p. 86 apud
QUEIROZ, 2004, p. 405)

O sistema funcionava da seguinte maneira: o gado saía do sul de Mato


Grosso magro, era transportado para o oeste paulista e lá ele ia para engorda e em
seguida era destinado através da própria ferrovia para os frigoríficos em São Paulo.
Segundo Alves (1984, p. 71),
50

A Noroeste do Brasil permite verificar, ainda como o capital monopolista


pensou e utilizou o transporte em função de seus interesses materiais. Essa
ferrovia foi financiada por capitais franco-belgas, exatamente num momento
em que especialmente grupos belgas tinham grandes interesses
econômicos localizados em Mato Grosso. A Brazil Land and Cattle Packing
Co. presta-se a uma ilustração mais expressiva; essa empresa invernava
gado em suas fazendas de Campo Grande e Três Lagoas, ambos os
municípios servidos pela Noroeste do Brasil, e exportava para São Paulo,
através da via férrea, gado gordo com destino ao abate no Frigorífico de
Osasco. É essencial relembrar que tanto aquela empresa como este
matadouro industrial pertenciam ao espólio Farquhar nesse momento. Logo,
a Noroeste do Brasil era o tentáculo que articulava, para um mesmo grupo
monopólico, neste caso, as fontes de matéria-prima e os estabelecimentos
industriais que a transformavam. Exatamente nessa interdependência das
regiões econômicas repousava a concepção de divisão regional do trabalho,
e neste exemplo a vemos em plena realização.

Podemos avaliar que a ação do capital monopolista é que determinou todos


os tipos de transações econômicas em Mato Grosso. Isso modifica o tráfego do
Porto de Corumbá que atendia aos Países Platinos para o eixo São Paulo – Santos,
com a ferrovia e o Porto de Santos, o estado de Mato Grosso se encarrega de
atender a produção de gado em pé.
A Ferrovia sofreu desde sua criação com questões de manutenção e
eficiência do seu corpo físico. Foram constantes os relatos de descarrilhamento de
trens, devido a problemas nos trilhos. Devido a má execução da obra, feita às
pressas, correndo da Leishmaniose, dos índios kaingangues para alcançar o fim de
seu traçado, as obras ficaram precárias. O trecho que percorre a parte paulista foi
um dos mais deficientes, mas trechos próximos a Campo Grande também tiveram
problemas e foram vagarosamente reformados. Problemas como a falta de
empedramento do leito da linha e falta de equipamento de tração para novos vagões
também foram relatados.

Dadas todas essas circunstâncias, ainda na década de 20 teve início uma


série de extensos trabalhos de melhoramentos do trecho paulista da NOB.
Na verdade pode-se dizer que, nesse trecho, ao longo do nosso período, a
estrada foi quase totalmente reconstruída – com novo traçado, novos trilhos,
novas obras-de-arte, etc. [...] mas outros problemas também prejudicaram o
avanço dos trabalhos, particularmente na variante Araçatuba-Jupiá – era o
caso, por exemplo, da Leishmaniose, doença que grassava na região [...].
(QUEIROZ, 2004, p. 50)

A falta de maquinário como o vaga-guindaste era muito difícil, pois ao


descarrilhar um vagão, ou qualquer outro acidente ao longo da linha, o
51

atendimentodemorava muito, pois precisavam realizar empréstimo desse vagão em


outras ferrovias vizinhas. O fato de muitos insumos para a operação normal dos
vagões serem importados fazia muitos trechos ficarem com vagões parados,
esperando peças que demoravam dias para chegar, fora o custo que era muito alto.
Só a partir de 1940 que começaram a produzir esses produtos no país,facilitando o
acesso e diminuindo o custo das compras. Ao longo da vida da Ferrovia, vários
fatores dessas questões operacionais foram desgastando e onerando a manutenção
geral da NOB.
Os relatórios anuais da NOB relatam o alto custo que a ferrovia tinha com a
manutenção de seu pessoal. As despesas eram muito grandes com hospitais,
médicos e dentistas, que eram contratados para atender aos próprios funcionários, e
contratações de mão de obra civil, principalmente durante o período de construção
da Ponte Barão do Rio Branco, que cruza o Rio Paraguai, só pioraram a situação
deficitária.
O número de funcionários foi bastante reduzido depois da alteração do tipo de
combustível que se utilizava para o funcionamento do trem, que por muito tempo
funcionou à lenha, o que gerou problemas decorrentes de desmatamento. O preço
da lenha subiu e tiveram de reavaliar o uso deste tipo de combustível. Um fator que
já incomodava era o número de acidentes que as fagulhas da lenha causava durante
o trecho da viagem. Do ano de 1932 a 1947 foram encontrados relatórios que
constantemente reclamavam sobre os ocorridos.

Por outro lado, a queima da lenha produzia graves e indesejados efeitos


colaterais, já mencionados neste estudo, a saber, os incêndios provocados
pelas fagulhas emitidas pelas chaminés das locomotivas. A magnitude
desse problema, no que respeita aos prejuízos financeiros causados à
Estrada sob a forma de indenizações pagas a terceiros, pode ser
parcialmente avaliada pelos dados referentes ao serviço de atendimento às
reclamações dos usuários. (QUEIROZ, 2004, p. 220).

A primeira tentativa na troca do combustível ocorreu no período em que Lima


Figueiredo esteve no comando da ferrovia. Ele optou pelo uso do carvão mineral,
mas concluíram que se gastava muito material para pouca energia gerada. Logo
depois, durante o comando de Marinho Lutz, a ferrovia passa a usar o óleo
combustível e o uso deste trouxe conclusões interessantes de custo, pois diminuía o
número de acidentes, não fazia a sujeira que a fumaça da lenha fazia, não era
necessário vagões a mais para carregamento de lenha e reduzia o número de
52

funcionários. Não era mais necessário tantas pessoas para o auxílio constante de
abastecimento de lenha, o que diminuía parte dos déficits da Ferrovia.

[...] a substituição da Maria Fumaça pela locomotiva a diesel, foi o fator


responsável por essa perda: a maquina diesel requeria menos número de
trabalhadores para sua operação e manutenção, e assim, com a diminuição
do número de operários, os políticos não mais faziam seus comícios com
menção especial aos ferroviários. (QUEIROZ, 2004, p. 231)

O avanço de outros meios de locomoção acabou influenciando o


funcionamento da linha férrea. Já no ano de 1920, o Brasil começou a investir na
aeronáutica, no treinamento de pessoal para a formação de pilotos, e passou a
sobrevoar o litoral, como forma de defesa nacional de fronteiras. Durante as
revoluções de 1924 e 1926, ficaram suspensos alguns voos no Brasil, e, em 1930,
os aviões que estavam no Brasil eram então de responsabilidade da Escola Militar.
Depois da Revolução Constitucionalista de 1932, o Brasil adquiriu novos aviões e,
com a Guerra do Chaco, resolveu instalar campos em outros lugares, como Minas
Gerais e Mato Grosso, para maior controle de fronteira. Há relatos, em 1953, de
voos para o sul de Mato Grosso.
Segundo Buainain (2006, p. 33),

A decisão de se construir a pista foi tomada no governo de Getúlio e o


contrato assinado por Nero de Moura, que era Ministro da Aeronáutica. A
Camargo foi a encarregada de construí-la. Em seguida, foi feito o aeroporto
civil, separando-se, então, as atividades da aeronáutica civil da militar. Eu
era prefeito e estive presente à inauguração, realizada pelo Getúlio, do
aeroporto Internacional de Campo Grande, ainda sem a parte de
4
passageiros, em fevereiro de 54.

A maioria dos serviços realizados na área de aviação em Mato Grosso era


para atender ao correio, ligando as cidades umas as outras. Outra informação que
ficou clara é que o trajeto de São Paulo a Campo Grande de trem durava, em média,
2 a 3 dias; e de avião reduzia muito, pois o trecho poderia ser feito em 2 horas e
meia. Em 1954, com a inauguração da pista de concreto na Base Aérea, a cidade se
transforma em um importante aeroporto da América do Sul.

4
Depoimento feito pelo ex-prefeito de Campo Grande Dr. Wilson Fadul no ano de 1999, ele governou
Campo Grande de 1953 a 1955. Graduado médico no Rio de Janeiro em 1945, foi Deputado Federal
e chegou ao cargo de Ministro da Saúde no governo de João Goulart, veio a falecer em 2011.
53

No grande Estado mediterrâneo a distância aterra e o povo está adquirindo


uma mentalidade aeronáutica. Não há fazenda que não tenha seu campo
de pouso e nos aeroclubes há aviões pequenos que são empregados como
taxis aéreos com excelentes resultados. [...] Mercê do avião as distâncias
mínguam naquela região onde a grandeza de chão apavora. (FIGUÊIREDO,
1950, p. 18)

O setor rodoviário também era explorado por muitas pessoas, já na década


de 20 eram encontradas algumas carretas entre o interior do estado e a Vila
entroncamento de Campo Grande. As estradas que faziam ligação entre Campo
Grande e as vilas próximas e as estradas de grande distância como as que eram
percorridas pelos boiadeiros das comitivas até Minas Gerais e São Paulo, são muito
antigas. As estradas eram frequentadas em maior parte por boiadeiros a cavalo,
bois, mascates, carros de boi, carretas, caminhões.
As cidades de Campo Grande, Aquidauana e São Paulo eram as principais
fontes de abastecimento do comércio regional. Havia muitas críticas à Noroeste na
qualidade de transporte de cargas. Reclamavam do tempo que a mercadoria levava
para chegar, do estado em que ela era transportada chegando com más
condiçõesou, até mesmo, sofrendo perdas e extravios de mercadorias.
O frete feito pelos caminhões no interior do sul de Mato Grosso era muito
caro, saía mais caro um frete de Campo Grande a Dourados do que de São Paulo a
Campo Grande.Mas era uma entrega mais pontual do que a do trem, e a maioria
dos comerciantes das vilas acabavam preferindo. Em 1948 os caminhões
predominaram no abastecimento do interior do sul de Mato Grosso.“O fato é que
caminhões acabaram predominando. Em 1948, é criado o Distrito Rodoviário do Sul,
com sede em Campo Grande, reforçando o transporte rodoviário.” (QUEIROZ, 1999,
p. 453)
Nacionalmente, a ideia de rodovias surgiu já em 1920 com Washington Luiz,
pois ele tinha como lema que governar era abrir estradas. Assim, acabou projetando
e modernizando várias estradas do interior de São Paulo. No final da década de 50,o
presidente Juscelino Kubitschek implementou o projeto de rodovias, com dois
objetivos em mente. A primeira ideia era a de integrar o país, mudando a capital
para o centro do Brasil, hoje Brasília, e conseguir povoar e criar relações comerciais
em regiões mais afastadas, como o Centro-Oeste e a região Norte. A segunda
intenção era política e econômica, ampliando a malha rodoviária, que atrairia
empresas do ramo automobilístico para o Brasil.
54

Às estradas carroçáveis que se abriram à circulação de carros de tração


animal e ainda se encontram em quase todas as regiões do país, vão
sucedendo, em planos cada vez mais largos e de construção cada vez mais
perfeita, as estradas de rodagem ou as rodovias destinadas ao tráfego de
automóveis. O impulso que, em consequência da invasão dos autos, de
passageiros e de carga tomaram as iniciativas e atividades rodoviárias, foi
tão extraordinário e tão vigorosamente sustentado (“governar é abrir
estradas”) que, no Brasil, já se registraram, em 1930, mais de 113 mil
quilômetros de rodovias em tráfego [...]. (AZEVEDO, 1950, p. 25 – 26).

Muito conhecida a frase de JK, “50 anos em 5”, seu lema era investir no
desenvolvimento de indústrias no país, acelerar a economia e atingir as regiões mais
distantes. Foi eleito em 1955 a presidente e terminou seu trabalho em 1961.
Conseguiu, com essa ideia de rodovias, atrair grandes indústrias como a
Volkswagen, Ford e General Motors.Abriu a economia brasileira para o capital
estrangeiro, abriu rodovias transregionais, ajudou no povoamento do Brasil Central,
construiu Brasília em tempo recorde, mas acabou deixando o país com uma grande
dívida externa. Em nome da estratégia de atrair investimentos e gerar empregos, as
ferrovias, que tiveram tanta importância no ciclo do café, foram sucateadas e
desprezadas em favor da rodovia.
Segundo Azevedo (1950, p. 32), havia a ideia de que poderíamos ter diversos
tipos de meios de transporte e que cada um deles desempenharia uma função,
chegando a um equilíbrio, de forma que nenhum anularia o outro. Assim,

A era do trem de ferro não passou: o automóvel e o avião não fizeram mais
do que ressaltar as “aptidões particulares” de cada um dêsses meios de
locomoção, seja qual fôr a fôrça motriz vitoriosa ou dominante, em vastos
planos de viação e de transportes, em cada país ou na esfera internacional.

Azevedo acreditava que, na civilização moderna, cada um deles teria tarefas


específicas: o avião teria a vantagem da velocidade vencendo grandes distâncias
em pouco tempo; o automóvel seria para locomover poucas pessoas e mercadorias
em distâncias breves e; a ferrovia seria o meio mais inteligente de levar pessoas em
massa e escoar grandes cargas por um preço bastante reduzido.
No mesmo período em que estava em voga o crescimento das rodovias, a
década de 50, começou no governo de Wilson Barbosa Martins, prefeito de 1959 a
1963, a discussão sobre a construção de uma rodoviária em Campo Grande. A
55

rodoviária foi construída, mas não com recursos públicos, pois a prefeitura não os
tinha. Ela foi construída pelos irmãos Laburu.
Até 1948 os embarques e desembarques para transportes intermunicipais ou
interestaduais eram feitos em pontos que se distribuíam entre as ruas 14 de julho
(Rua Principal), Antônio Maria Coelho (Y Juca Pirama) e Avenida Afonso Pena
(Marechal Hermes). Depois de 1948 até a construção desta rodoviária, os
embarques e desembarques aconteciam nas proximidades do Hotel Gaspar, que
ainda se localiza próximo à Estação Ferroviária, na esquina da Avenida Mato Grosso
com a rua Calógeras.
Na década de 50 as ruas não tinham pavimentação e apenas o trecho
próximo à Estação era coberto por paralelepípedos. Foi implantada a Base Aérea
neste mesmo período e, logo depois, para atender essa região, construíram mais um
na Vila Alba. A região leste da cidade era onde a maior parte da economia local
acontecia: as transações comerciais e as prestações de serviço. Ao norte, a
prefeitura foi criando loteamentos que atendessem a demanda de crescimento da
cidade.
No ano de 1950 a cidade tinha 31.708 habitantes e uma década depois
atingiu 64.934. Isso atraiu muitos investidores, até mesmo de fora do estado, que
começaram a comprar grandes chácaras e loteá-las na intenção de vender a preços
bem elevados, devido a valorização local e o grande número de pessoas que atraía
anualmente. A prefeitura teve de assumir, após um tempo, o controle sobre essas
ações, pois não conseguia atender às medidas de saneamento, luz, asfalto para
cada novo lote que surgia.
Nesta mesma época se tornou frequente a reclamação da população sobre a
presença dos trilhos no centro da cidade, alegando que devido ao aumento do fluxo
de pessoas no local, os acidentes por atropelamento, e até mesmo óbito, por conta
da linha, eram corriqueiros. O prefeito deste período5 chegou a relatar que o
caminho feito pelos trilhos não foi realmente planejado,

A Noroeste foi feita com carroças e burros. Nós não tínhamos máquinas. Foi
feita na pá, no enxadão e o transporte de materiais em carrocinhas ou no
lombo de burro. Então, toda vez que se encontrava uma forma de desviar
de um aclive, de desviar de um pântano, se desviava e foram fazendo a
estrada ao sabor da linha mais favorável ao trânsito da ferrovia. (BUAINAIN,
2006, p. 81).

5
O prefeito em questão era Dr. Wilson Barbosa Martins.
56

O pedido da retirada do trilho era por conta dos acidentes. Mas ainda neste
momento a ferrovia tinha seu funcionamento ativo e frequente, pois servia de
entroncamento para as cidades próximas e a ligação com outros estados brasileiros
e a Bacia Platina. Mesmo assim, atendendo às reinvindicações da população, surge
uma proposta para fazer outra estação distante do centro.
O atual diretor superintendente da Estrada de Ferro Noroeste, engenheiro
Pedro Pedrossian, objetivando de maneira concreta, positiva e real o que
representa para o progresso da cidade a retirada dos trilhos do centro da
cidade, resolveu construir a variante de Campo Grande, deixando a cidade
livre dos trilhos da via férrea, eliminando assim as perigosíssimas
passagens de níveis que muitos e lamentáveis desastres têm dado e
continuam sendo o perigo constantes dos motoristas imprudentes. Esta
variante, que saíra das proximidades da Base Aérea Militar[...].(CORREIO
DO ESTADO, p. 1, 17 de maio, 1962 apud BUAINAIN, 2006, p. 82)

A cidade estava em intenso crescimento e o número de pessoas que


migravam para procurar novas oportunidades de emprego e de acesso à terra, era
grande. Com este fluxo de migrantes, a cidade foi criando outros bairros e começou
a sofrer, já em 1962, com especulações imobiliárias. Pessoas com maior poder
aquisitivo compravam grandes chácaras e as loteavam para venda, com preços
altíssimos. Até mesmo pessoas que nem residiam aqui, sabendo da valorização do
espaço urbano, começaram a adquirir terrenos para especulação.

E, desde que me investi no cargo me dei conta de que a cidade precisava


de uma reforma administrativa. Saíamos de um estado de vila para um
estado de cidade, que requeria uma administração mais complexa e que
6
tivesse uma organização moderna. ” (BUAINAIN, 2006, p. 85)

Ainda com Wilson Barbosa Martins como prefeito, foi criado o Conselho de
Planejamento. Este órgão tinha como função estudar a cidade e ajudar a prefeitura a
saber quais investimentos deveriam ser priorizados. Houve também a criação de leis
para realização de loteamentos e um código de posturas e de obras para a cidade.
O crescimento da urbes era tão intenso que já, à beira dos córregos, apareciam as
primeiras favelas de Campo Grande.
Durante todo esse período foi também discutida a ideia da chegada da
indústria, pois preocupava a possibilidade de Campo Grande ficar sempre
6
Relato de Wilson Barbosa Martins no ano de 1999, foi prefeito de Campo Grande de 1959 a 1963 e
se elegeu governador do estado de Mato Grosso do Sul em 1982. É advogado por formação, foi
presidente da OAB e deputado federal.
57

economicamente ligada ao setor primário. Acreditava-se que se a indústria chegasse


até aqui, a cidade se desenvolveria muito mais, atrairia mais gente, geraria mais
empregos.
O problema dos trilhos na área central só se agravava. No ano de 1964,
muitos alegavam que os trilhos estrangulavam o crescimento da cidade. A cidade
não conseguia se expandir para além do trilho. As duas principais avenidas que
cortavam a cidade acabavam morrendo no encontro com a ferrovia. Além dos trilhos
o estrangulamento da expansão da cidade era devido aos córregos que a cortavam.
Era necessário realizar a ligação da cidade para além dos córregos. Em princípio, a
ligação da área central com a porção oeste da cidade, se fazia por um pontilhão na
rua 26 de Agosto e na rua Cândido Mariano.
Para tanto, o diretor da ferrovia, na época, se reuniu com o prefeito, que neste
momento era Humberto Canale, para discutir como seria feita a retirada desses
trilhos. Segundo o Jornal O Matrogrossense (1964, apud BUAINAIN, 2006, p. 115)

[...] Vê-se, assim, marchando para a concretização a promessa [...] de dotar


a nossa Campo Grande de uma estação à altura de seu progresso, bem
como de livrar a nossa cidade do estrangulamento de sua parte central,
cortada que é pela paralela de aço de nossa ferrovia.

Campo Grande era um grande entroncamento ligando cidades, estados e


países. Em 1970 foi cogitada a possibilidade de manter os trilhos de forma que os
adaptasse para um metrô de superfície, mas a cidade não tinha população suficiente
para tamanho investimento. Houve também a ideia de fazer no espaço dos trilhos
uma avenida que teria início no cruzamento da Avenida Mato Grosso.
Nos anos de 1970, a rodoviária local começa a ser construída e as estradas
de rodagem vão cortando o país. Campo Grande passa a ter dividido o fluxo das
viagens entre ferroviárias e rodoviárias, o que manteve a Ferrovia funcionando por
um bom tempo. Neste período a cidade atingiu uma população de 131.110
habitantes e o crescimento dobrava a cada década.
58

Figura 14 - Campo Grande: primeira rodoviária, construída pelos irmãos Laburu,


expressa as necessidades criadas pelas rodovias e anuncia a decadência das
ferrovias, (década de 60). Fonte: Campo Grande News. Disponível em:
<.http://www.campograndenews.com.br/entretenimento/rodoviaria-encerra-este-mes-
37-anos-de-historia-01-22-2010. Acesso em: agosto de 2012.

No ano de 1975 é iniciada a construção do primeiro núcleo industrial de


Campo Grande, o Indubrasil. A intenção era gerar empregos e naquela região já
havia acesso da ferrovia e da rodovia. As saídas rodoviárias da cidade receberam
investimentos e uma parte delas foi duplicada. O governo estadual se preocupou
com o investimento em rodovias, pois o crescimento do meio de transporte
correspondente, federal, era de fluxo intenso.
Os relatos reforçam a impressão de que o Governo Federal nunca enviava
recursos para essa região e se a própria região não investisse, ficaria isolada,
esquecida economicamente, não escoaria sua matéria prima e reduziria suas
relações comerciais.

Quando as estradas chegaram, Corumbá foi perdendo, cada vez mais a sua
importância de distribuidor dos produtos vindos do exterior ou do próprio
Brasil. Então, a Noroeste foi entrando em decadência exatamente no
período em que nós estivemos na Prefeitura e, embora se discutisse o
problema dos trilhos, não havia condições de investimento para realizar a
59

mudança que naquela ocasião, não era importante aos olhos do Governo
7
Federal. (BUAINAIN, 2006, p. 238).

A importância então do Sítio da Estrada de Ferro é indiscutível e, entender


aquele espaço como patrimônio, foi uma luta constante em todos os governos
municipais. No período em que Marcelo Miranda foi prefeito da cidade, houve os
primeiros manifestos para que começasse a se preservar o patrimônio histórico da
cidade. Mas o prefeito em questão disse que, naquele momento, Campo Grande era
uma cidade jovem e seu passado não era ainda histórico. Os únicos bens que
julgava ter importância para preservação seriam a Pensão Baís e a Ferrovia, mas os
dois ainda estavam em uso.
Em 1979 foi eleito prefeito Albino Coimbra Filho, que chegou a mencionar
novamente sobre o patrimônio histórico local. Mostrou-se contra a retirada do trilho
do centro da cidade, fez um estudo e averiguou que os países desenvolvidos
acabaram fazendo de seus trilhos, metrôs de superfície. Esse metrô cruzaria a
cidade e ajudaria o fluxo de pessoas do centro para a periferia no dia-a-dia,
diminuindo a lotação dos ônibus.

Faz o levantamento de quantas pessoas morreram nos trilhos de Campo


Grande, ao longo de 50 anos, Se foi mais de 10... Então, tem que tirar o
carro da cidade, esse monstro que mata todo dia. O trem não mata
ninguém. É só colocar os equipamentos de sinalização necessários que não
8
haverá nenhum problema. (BUAINAIN, 2006, p. 262).

O projeto deste mandato acreditava que o traçado do trilho de Campo Grande


era muito proveitoso, pois percorria a cidade com vistas muito bonitas e passava por
pontos importantes. A sua retirada seria um grande gasto de dinheiro, sendo que ele
poderia ser reutilizado. Cogitou-se também a proposta de fazer no espaço do sítio
um grande parque verde e o restauro do património físico. Houve críticas na questão
da retirada do antigo relógio da Rua 14 de julho e de parte dos paralelepípedos da
Rua Y-Juca Pirama, durante o mandato do prefeito anterior. É possível notar que, a
partir de 1979, começava o entendimento sobre o que é patrimônio histórico e o
valor do espaço urbano construído.

7
Relato de Marcelo Miranda Soares no ano de 1999, prefeito de Campo Grande no período de 1977
a 1979. Era engenheiro e chegou a Governador do Estado em 1982.
8
Relato de Albino Coimbra Filho no ano de 2000. Odontólogo e advogado, foi prefeito de Campo
Grande de 1979 a 1982.
60

A partir de 1983, a cidade cria novas leis para o uso do solo e o seu
zoneamento. A retirada dos trilhos do centro da cidade volta a ser a programação do
governo, como também a criação de uma nova rodoviária na saída para Três
Lagoas. Chegou a se pensar em fazer do sítio da ferrovia e de seus barracões um
local para bares e restaurantes. Mas nem uma coisa nem outra foram feitas.
Planejava-se, discutia-se o assunto, mas efetivamente nada era realizado.
Em 1990 a ferrovia já estava com o movimento bem deficitário, seu
rendimento era muito fraco para manter seu funcionamento. Em 1994 o prefeito
tentava ainda a negociação com a rede Ferroviária Federal para a retirada dos
trilhos da área central da cidade.

[...] A proposta da Prefeitura Municipal é estabelecer um convênio entre o


município e a RFFSA para os estudos de meios que minimizem os
transtornos das passagens de nível. A prefeitura criaria uma comissão para
trabalhar junto com técnicos da Rede Ferroviária Federal vendo a
possibilidade de inclusive retirar os trilhos do centro de Campo Grande.
Para tanto, seria necessário o cálculo do patrimônio da RFFSA em questão
e os gastos com as obras [...].(CORREIO DO ESTADO p. 5, 1994 apud
BUAINAIN, 2006, p. 374)

Figura 15 - Campo Grande: destinos e horários de partida para os trechos que a


Ferrovia realizava no ano de 1992.Fonte: Jornal Correio do Estado, 1992.

Em 1995 aconteceu o último translado de passageiros e assim extinguiram-se


os trens de passageiros da NOB. No mesmo ano, o prefeito Juvêncio Cesar da
Fonseca moveu ações para a preservação do sítio da NOB como património
histórico e em 13 de maio de 1996 sai no Diário Oficial a Lei n° 3249, que trata do
tombamento do sítio histórico da Vila Noroeste.
Com a privatização, no ano de 1996, a Ferrovia Novoeste S.A arremata a
ferrovia. A partir deste momento, o que já estava sem cuidado algum, só piorou.
Muitos funcionários foram demitidos, outros coletivamente se demitiram e a maioria
61

das casas do sítio acabou indo a leilão, sendo que parte delas foram compradas
pelos próprios ferroviários e outras por particulares9.
O relato de Juvêncio Cesar da Fonseca, ex-prefeito, avalia a privatização:
Tudo fica na mão de terceiro e terceiro quer só lucro. Veja a Estrada de
Ferro Noroeste do Brasil. A Novoeste desativou o ramal para Ponta Porã,
retirando os dormentes para fazer manutenção de outra linha,
simplesmente, por economia. E acabou deixando toda aquela região,
Maracaju, Ponta Porã, uma região produtiva, sem o transporte ferroviário
que é o mais barato. Preferiu destruir um ramal para não gastar dinheiro em
manutenção de outro ramal.(apud BUAINAIN, 2006, p. 364).

Em 1998 houve a fusão da Ferronorte e da Ferraban e depois, em 2002, se


juntou com outros trechos ferroviários paulistas e se tornou Novoeste Brasil. No ano
de 2000 foi determinada a construção de um contorno ferroviário, para que o trem
pudesse passar por fora da cidade e os trilhos, que desde 1950 estavam tentando
remover do centro, fossem, então, definitivamente retirados. Sobre a área do sítio da
NOB, o município entrou com pedido de permuta com a RFFSA, já que ela estava
com muitas dívidas de IPTU atrasadas.

[...] O prefeito André Puccineli, disse ontem, durante a votação da câmara,


que essa foi a alternativa encontrada para garantir que a RFFSA pague os
impostos devidos. Além disso, o projeto de lei tem o objetivo de preservar o
patrimônio histórico. Segunda etapa. Puccineli ressaltou que a próxima
etapa, depois que a permuta foi oficializada com a rede, que já demonstrou
interesse, será a análise dos imóveis.[...] (Correio do Estado Online, Campo
Grande, 11 de set. 2001, apud BUAINAIN, 2006, p. 425)

Fica clara que as intenções nesse período era a de restaurar o sítio e remover
os trilhos da região central. O PLANURB é o órgão que a prefeitura designou a partir
deste momento como responsável pelo estudo da proposta de revitalização da área.
A medida de retirada do trilho e limpeza daquela área, já valorizaria a região do
centro velho, que estava há anos em decadência, descaso e marginalizada.
Desde 2001, quando o patrimônio histórico já estava tombado pelo governo
federal, os moradores, antigos ferroviários ou descendentes dos mesmos, em
conjunto com a Câmara de Vereadores, fizeram reivindicação de que, qualquer
proposta que viesse a ser feita naquela área fosse, antes de mais nada, discutida
com os ferroviários que continuaram a morar no sítio, com a participação dos
moradores nas decisões.
9
Maneira como os ferroviários ou descendentes deles denominam as pessoas que compraram as
casas no leilão e não fizeram parte efetiva da história da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil.
62

Concomitantemente, o prefeito André Puccineli programou que os projetos


sairiam em 2002 e o PLANURB, em conjunto com a Companhia Brasileira de
Transporte Urbano seria consultada sobre a viabilidade do projeto. Este projeto tinha
inicialmente dois objetivos: a retirada do trilho do centro da cidade e urbanizar todo o
corredor existente.
Segundo Jornal Correio do Estado Online (2001, apud BUAINAIN, 2006, p.
425),

A reutilização dos trilhos urbanos da Rede Ferroviária Federal com apelo


turístico e cultural, após sua desativação para transporte de carga com a
construção do contorno ferroviário, é um projeto viável e terá o apoio da
prefeitura se este for o desejo da sociedade. O compromisso foi assumido
pelo prefeito André Puccineli com os membros da ONG Ferroviva, que
defende a preservação da malha como interesse histórico e alternativa de
transporte de massa. A obra do contorno, cuja conclusão está prevista para
meados de 2002, foi projetada para retirar os trilhos da área central de
Campo Grande, como chegou a ser anunciado pelo município. Essa meta
mobilizou ferroviários, arquitetos, historiadores e saudosistas, todos
contrários a destruição de uma parte histórica da cidade. Resultado: Dos
debates, nasceu uma contrapropostas para revitalizar o corredor ferroviário
e os prédios abandonados da antiga estação, O prefeito André Puccineli
não apenas acenou seu apoio ao movimento – assinou, inclusive, ficha de
sócio da ONG -, como anunciou um projeto arquitetônico para transformar o
complexo da estação ferroviária em um centro artístico-cultural com teatro,
museu do trem, oficinas de arte e restaurante, Os imóveis, num total de 15,
serão adquiridos através de um encontro de contas com a Rede Ferroviária
Federal (RFFSA), que deve IPTU e ISS ao município – o valor não foi
divulgado[...].

Em 2002 já se discutia a ideia de inserir a Feira Central no espaço da ferrovia,


de forma que tiraria a feira da condição que estava há muitos anos e faria um projeto
para sua implantação, com maior organização, higiene e conforto. As negociações e
os estudos para essa mudança se concretizaramem 2004 e, desde então, a Feira
ocupa um grande espaço no pátio da antiga estação. Neste mesmo ano, a obra do
contorno ferroviário, o qual faria o trem passar na estação do Indubrasil e não mais
pelo centro da cidade, foi concluída. Com a conclusão do contorno, a Novoeste se
retirou da esplanada e a prefeitura se comprometeu a fazer a restauração do
Armazém de Cargas para que ele então se tornasse um Armazém Cultural, um
espaço para eventos.Já a Feira Central foi instalada no pátio de embarque e
desembarque da Ferrovia, em uma área de 13 mil m².
Em relação ao funcionamento da Novoeste, em 2006 ela e a Brasil Ferrovias
fizeram uma fusão com a ALL – América Latina Logística.Essas concessões eram
todas para transportes de carga, como já citado. O transporte de passageiros foi até
63

1995. Poucas estações na Noroeste são usadas, com grande parte das instalações
estão sem nenhum cuidado e a maioria dos trechos está em abandono total, caso do
trecho de Ponta Porã.

Figura 16 - Campo Grande: foto aérea com a área de tombamento do Sítio da


Estrada de Ferro Noroeste do Brasil.Fonte: PLANURB, 2010.
64

Partindo do princípio da urbanização moderna, encontraremos uma influência


muito grande da Revolução Industrial na formação das cidades. O fluxo muito
grande de pessoas do campo para a cidade acelerou o crescimento das urbes e,
para sistematizar a organização do espaço físico, surgem os zoneamentos. A cidade
foi dividida em setores e serviços, com surgimento das vilas de trabalhadores.
Limitou o trabalhador a conviver socialmente com seus colegas de trabalho fora e
dentro do serviço.
A Vila dos Ferroviários é uma dessas propostas da cidade moderna, a
sistematização da vida de um povo através de seus empregos e suas respectivas
funções, limitaram suas relações externas aos interesses do capital. As setorizações
organizam o espaço, mas segregam, limitam e condicionam o cidadão a uma vida
que o sistema escolheu para eles.
Na visão dos antigos ferroviários, eles vieram no intuito de trazer o progresso
local e hoje estão esquecidos pela cidade. É muito difícil para eles terem vivido em
uma comunidade fechada e hoje serem inseridos na cidade, com outras funções. A
vila era onde eles trabalhavam, viviam, estudavam, faziam suas amizades e tinham
seu lazer. Era um mundo a parte para eles, criado pelo sistema da Noroeste o qual
viveram condicionados por anos e anos. É inegável que o espaço do Sítio
Arquitetônico da Noroeste é parte importante na formação da cidade, e que seus
funcionários contribuíram para o progresso local, o que leva ao merecido
reconhecimento como Patrimônio Histórico.
Em entrevista com um dos moradores e ex-ferroviário, que é como um porta
voz do restante, ele afirma que tem registrado ali, 135 casas tombadas e que agora
apenas 40% delas pertencem a pessoas que participaram de alguma maneira da
Ferrovia. São ex-funcionários, viúvas, filhos de pessoas que trabalharam, pessoas
que tiveram, de certa maneira, alguma ligação com o espaço, quando ainda
funcionava. O restante dos moradores, eles denominam como “particulares”. Eles se
referem dessa forma, pois, no entendimento deles, são pessoas estranhas, que
compraram sua casa no leilão, mas não participou da Ferrovia, nem do cotidiano
daquele espaço.
É bastante forte, nesses moradores, o saudosismo sobre o passado da
Ferrovia. Há uma espécie de ressentimento entre alguns dos moradores a respeito
65

do processo de decadência pelo qual a Vila passou. Ver o espaço sem uso,
marginalizado, foi um impacto muito grande para eles. O Entrevistado 2 chega a
dizer:

“O povo diz que a Ferrovia tá no meio da cidade, mas é a cidade que tá no


meio da Ferrovia.” (informação verbal)10

Isso nada mais é do que um reflexo da ideia de exclusão que eles têm, após
este processo evolutivo pelo qual a cidade passou, pelo qual o Centro Antigo, em
processo de decadência há anos, hoje tenta se renovar, buscar novas funções.
O processo da privatização, e depois de tombamento do Sítio, fez com que
muitos Ferroviários se aposentassem. Mesmo não estando explícito, muitos se
sentiram sem rumo ao perder o emprego e precisaram buscar, fora daquele espaço,
uma ocupação e um auxílio financeiro. Eles não perdem a esperança de,
futuramente, surgirem novas possibilidades de emprego dentro do próprio espaço da
Ferrovia.

Segundo o Entrevistado 4:
“Projetaram um restaurante na Estação; queremos participar do processo de
seleção. Seria muito bom se pudéssemos trabalhar novamente neste espaço.”
(informação verbal)11

Os moradores querem ser inseridos nas propostas que o município venha a


oferecer dentro do Sítio. Mas a participação entre esses moradores e as tomadas de
decisões do Poder Público sobre aquele espaço, não ocorrem há um bom tempo. Ao
perguntar a eles se têm conhecimento sobre o Projeto Parque Esplanada, a maioria
não sabe do que se trata.

Segundo o Entrevistado 2:
“O projeto desse parque, nunca chegou até nós. A única coisa que estamos
sabendo é da Orla.” (informação verbal)12

10
Entrevista realizada com um dos aposentados da NOB, que ainda reside no sítio, em agosto de
2012.
11
Entrevista realizada com um descendente de funcionário da NOB que reside no sítio, em agosto
de 2012.
66

Quando perguntados sobre o motivo de algumas das casas não terem


passado por alguma restauração, muitos alegaram que para fazer o projeto é
oneroso e tem que passar por vários processos de aprovação, que muitos
desconhecem. Outro morador disse que na verdade a falta de diálogo entre os
órgãos públicos e os proprietários, às vezes prejudica o andamento de preservação
do espaço. De acordo com o Entrevistado 1:

“O Patrimônio e a fiscalização melhorou muito desde 2008, mas é preciso um


maior esclarecimento aos moradores sobre seus direitos. São deficientes as
informações entre o IPHAN e o morador. O morador pensa que o IPHAN é só
fiscalizador.” (informação verbal)13

Quando ele se refere ao IPHAN, fala sobre uma possível busca de


financiamento que o governo dá para a realização de restauro, e que este órgão
pode auxiliar o morador em como proceder, mas muitos nem sabem disso. Há
também a hipótese de uma parceria público-privada e talvez fosse ainda mais fácil
se os órgãos responsáveis e os moradores juntassem forças.
A vinda da Feira, a reforma da Estação, que hoje é usada para alguns
eventos culturais, feiras de artesanato e até mesmo casamentos, faz com que Sítio
gradativamente vá saindo do esquecimento e da marginalização. Sobre o espaço
atual, muitos dizem ter sido contra a instalação da Feira Central, por ela não
pertencer ao complexo. Porém, hoje, reconhecem que a vinda dela para a Estação
ajudou na manutenção local.

Segundo o Entrevistado 1:

“Agora aquela parte de mato do pátio da Ferrovia, sempre está sendo mantida
limpa; as ruas de acesso também, até o esgoto que vazava por dias, hoje recebe
auxílio imediato. Com o passeio do City Tour pela feira toda semana, eles precisam

12
Entrevista realizada com um dos aposentados da NOB, que ainda reside no sítio, em agosto de
2012.
13
Entrevista com um morador do sítio, descendente de ferroviário e aposentado da NOB, em julho
de 2012.
67

manter a ordem, pois acaba servindo de cartão postal para os turistas.” (informação
verbal)14

Os moradores estão sempre dispostos a permanecer naquele espaço em


favor das suas histórias e é assim que aquele local sobrevive ao tempo. Acreditam
que as melhorias feitas até o momento, divulgaram o espaço à população local e
está dando vida nova ao lugar, conclui assim o Entrevistado 3:

“Hoje a gente sente que há mais respaldo dos civis sobre o espaço da
Ferrovia.” (informação verbal)15

Uma das preocupações, entre alguns moradores é a respeito do que será


feito com a antiga Rotunda, pois o local está bem degradado, desmoronando e vive
servindo para abrigo de drogados, indigentes e criminosos. É uma obra bastante
grande e está inclusa, segundo o projeto do Parque Esplanada, dentro das
propostas de revitalização que o PLANURB tem para o Sítio. Há intenção de, a partir
de abril de 2013, a prefeitura abrir edital de licitação para a concessão da rotunda
ferroviária. O vencedor da licitação terá que investir R$ 10 milhões na restauração
do parque ferroviário e terá direito a exploração do espaço por 30 anos, podendo ser
renovável este contrato.
As entrevistas levantadas serviram para entender o que está sendo feito por
aquele local e qual a importância do mesmo em diferentes pontos de vistas. O
Centro Antigo passa por um processo de adaptação, uma vez que hoje a cidade
está muito maior e, com a chegada dos shoppings, ela se dividiu em vários centros.
A cidade se desenvolveu com a chegada da Ferrovia e no decorrer do tempo,
das ações políticas e dos interesses econômicos, as coisas mudaram. A Ferrovia foi
substituída pela rodovia e Campo Grande não podia parar, continuou em busca do
progresso. Ao fazer esse levantamento histórico, verificamos que a Ferrovia foi, por
um bom tempo, a grande atração da cidade e, com ela, toda a área central, Rua 14
de julho e arredores que se destinaram ao comércio e ao footing de domingo.

14
Entrevista com morador do sítio, descendente de ferroviário e aposentado da NOB, em julho de
2012.
15
Entrevista com morador do sítio, descendente de ferroviário da NOB, em agosto de 2012.
68

A primeira rodoviária, ao ser construída nos anos de 1970, foi considerada o


primeiro shopping da cidade. Ela reunia lojas, cinemas, restaurantes, e isso
contribuiu para a queda do movimento da área central da cidade. Nos anos de 1980
chega o Shopping Marrakesh e novamente muda o fluxo de pessoas para outro
ponto comercial.Ele entrou em decadência nos anos 90, quando foi construído o
Shopping Campo Grande, que está em funcionamento até os dias atuais.
Após a chegada dos shoppings, a cidade teve uma marginalização de sua
área central. O espaço ficou sem maiores cuidados, degradado e isso incluiu o Sítio
da Ferrovia, a antiga Rodoviária, que hoje está sem uso certo. Os espaços possuem
uma vida útil dentro da cidade capitalista, ou seja, conforme mudam os interesses
econômicos, muda-se o foco. A cidade tem como renda principal a pecuária, e o
comércio tem também uma boa parcela na economia, pois apesar de possuir vários
parques, a maior parte do lazer se faz nos shoppings centers.
O crescimento da cidade continua atendendo a interesses políticos e de
especulações imobiliárias. Os zoneamentos do solo para áreas residenciais,
comerciais, industriais e mistas permanecem e com eles, a inegável existência de
“zoneamentos por classes sociais”, de forma implícita. Pode-se levar em conta
ainda, aquele mapa apresentado dos anos de 1930, pois as ocupações continuam
semelhantes, se dividirmos a cidade em um eixo cartesiano norte, sul, leste e oeste.
Há ainda irregularidades nas ocupações de áreas de mata ciliar e o alto índice de
impermeabilização do solo, tem contribuído para alagamentos.
A partir de 1996, devido a um movimento feito por moradores, vereadores,
estudiosos locais, foi levado até o prefeito da época, Juvêncio Cesar da Fonseca, o
pedido para tombamento do sítio da Ferrovia. O movimento teve resultado e a partir
de então o sítio foi considerado patrimônio do município. No ano seguinte o sítio
consegue o aval para tombamento estadual e durante muitos anos ficou a espera do
tombamento federal, que só veio a acontecer no ano 2000.
O sítio da EFNOB em Campo Grande tem 135 edifícios em alvenaria e
madeira e uma área total de 22,3 hectares. Entre os imóveis encontramos as casas
dos operários, dos funcionários intermediários e dos graduados, as oficinas, os
escritórios, uma escola, a caixa d’água e a estação, construída a partir de 1914 e
que sofreu ampliações nos anos de 1924 e 1930. A estação tinha áreas para bar,
bilheteria, administração de cargas, apoio, depósito, serviços e médicos.
69

Figura 17 - Campo Grande: vista aérea de toda a extensão do Sítio da Estrada de


Ferro Noroeste do Brasil e suas principais setorizações. Fonte: Arruda, arquivo
pessoal do autor, 2005.

Em 2006, a primeira iniciativa efetiva de restauração, que veio do Ministério


do Turismo, que participou com R$500 mil reais e que o FUNDAC (Fundação
Municipal da Cultura) acompanhou, foi o restauro de dois imóveis. Um deles a antiga
casa do chefe da estação, que faz parte da Esplanada Ferroviária, na esquina da
Avenida Mato Grosso com a Avenida Calógeras. Hoje estão instalados nestes
imóveis o Gabinete do Prefeito e o Instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso
do Sul.
Em 2011 foi entregue revitalizado o antigo armazém, que agora é chamado
de Armazém Cultural. Isso se deu através de uma iniciativa do PLANURB junto ao
IPHAN e com o apoio da União através do PAC (pacote de aceleração do
crescimento) das cidades históricas, que participou com R$ 2,6 milhões de reais
somados aos recursos de participação do governo e da prefeitura, chegando ao
valor de R$ 101 milhões de reais, no ano de 2010.
70

Figura 18 - Campo Grande: Estação Ferroviária transformada em Armazém Cultural


após sua revitalização.Fonte: CG Notícias, 2011.

Segundo jornal eletrônico da própria prefeitura de Campo Grande (2010, p. 1),

A inserção de Campo Grande acontece devido ao PAC das Cidades


Históricas, pelo tombamento do complexo ferroviário, no âmbito federal, por
meio do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN. As
intervenções começam no prédio da Estação e incluem ainda
reestruturações no Armazém Cultural, nos galpões de manutenção dos
trens, na rotunda da ferroviária e em outros prédios do complexo.

O restauro das casas principais e do Armazém Cultural, já fez uma grande


diferença no espaço do sítio. A iluminação, a limpeza dos prédios e os novos usos
vão afastando gradativamente o espaço do esquecimento e da marginalização em
que se encontrava. Porém, ainda se encontram várias casas na Vila que precisam
de reformas, algumas até suportadas por escoras. Os forros e madeiramento de
telhados precisam de atenção, pois estão desmontando. Mas muitos moradores
desconhecem as normas para restauro, outros não possuem renda para fazer o
investimento e uma grande parte desconhece as possibilidades de financiamento
que podem ser feitos para realizar este processo de restauro.
71

Figura 19 - Campo Grande: Primeira casa de alvenaria construída para o Chefe da


Estação; está em processo de recuperação e fica no espaço da Orla Ferroviária.
Fonte: Campo Grande News. Disponível em:
<http://www.campograndenews.com.br/lado-b/arquitetura/primeira-casa-de-
alvenaria-da-vila-dos-ferroviarios-vai-passar-por-reforma> Acesso em: setembro de
2012.

A parte da Ferrovia que se encontra restaurada pertence ao município e


utilizou de financiamento público para isso. As outras casas foram compradas por
pessoas particulares durante o leilão e cabe a eles buscar recursos para fazer a
restauração de seu bem. Ao dialogar com os moradores podemos notar que existe
um desconhecimento dos direitos e auxílios que o governo pode dar a proprietários
de patrimônios históricos. É necessária uma maior interação entre o IPHAN, o
PLANURB e os moradores da Vila Ferroviária.
O Sítio da Ferrovia foi incluído no programa Reviva Centro, que é responsável
pela revitalização do centro da cidade e outras áreas, como o Museu José Antônio
Pereira, a Comunidade Quilombola Tia Eva, a Escola Estadual Maria Constança de
Barros Machado, entre outros. Dentro da proposta realizada pelo PLANURB, a área
da Esplanada Ferroviária se tornaria uma área de Lazer Cultural, com uma parte
72

reservada para um museu, que conte a história e exponha antigos objetos da


ferrovia e, ao longo de todo o espaço do Sítio, parques, praças, áreas de esporte e
de cultura para a população da região, que é carente desse tipo de lazer.

Figura 20 - Projeto Parque Esplanada: zoneamento das propostas de reutilização do


espaço do Sítio Arquitetônico da NOB.Fonte: PLANURB, 2010.
73

Figura 21 - Campo Grande: Croqui do Parque Esplanada e suas propostas para


novo uso do espaço.Fonte: PLANURB, 2010.

O Parque Esplanada, que aqui está brevemente exposto, é um projeto que


passou por algumas etapas de criação. O projeto mencionado foi definido pelo
PLANURB em conjunto com a Prefeitura Municipal de Campo Grande. A data da
discussão dessa proposta é de dezembro de 2010 e nela está explicitada a
importância da participação maciça dos moradores do Sítio para que, além de
discutir essa refuncionalização, seja possível, em conjunto, moradores e município,
encontrarem incentivos financeiros, recursos, que possibilitem também a
recuperação das casas do entorno da Esplanada Ferroviária.
Segundo entrevista cedida por um dos dirigentes do Planejamento Urbano, o
Parque Esplanada faz parte de um plano diretor de uso e ocupação do solo. Será
uma área de uso coletivo, dando ao centro uma área de lazer, cultura e
contemplação. Cita a carência que o centro tem em áreas de lazer para seus
moradores e acredita que este projeto venha a atender os residentes, não só da Vila
Ferroviária, mas também de uma parcela das pessoas da área central.
O Dirigente explica que dentro desta verba cedida pelo PAC – Cidades
Históricas foram efetuadas as obras da Orla Ferroviária e o Projeto do Parque
Esplanada, o que se pode confirmar em suas palavras:

“A verba cedida pelo PAC, atendeu várias intervenções feitas na área central
da cidade. São 94 ações de reconversão de uso e ao longo do trilho temos a Orla
Morena 1 e 2, uma parte do centro e outra fora da zona de interesse cultural. O que
74

foi feito até o momento, relacionado a Ferrovia, e que está incluso nesta verba, foi o
Projeto do Parque Esplanada e a obra da Orla Ferroviária que deverá ser entregue
até fim de 2012.” (informação verbal)16

Ao questionar sobre a possível execução do Projeto do Parque, o dirigente


disse que, por se tratar apenas de um projeto, fica a cargo dos próximos
governantes a decisão de executar o projeto como foi proposto e buscar o
financiamento para a execução do mesmo ou se realiza um novo projeto para daí
então buscar o financiamento.
Ainda no PLANURB, foi possível ter acesso ao procedimento pelo qual deve
passar qualquer reforma a ser feita nas casas que estão inclusas como patrimônio
no Sítio. Assim um dos dirigentes do IPHAN explica:

“O proprietário interessado em fazer qualquer intervenção ou restauração,


deverá procurar um arquiteto para que este execute um levantamento da área e um
projeto que atenda as normas de Patrimônio Histórico. Com o projeto em mãos,
deve-se procurar a Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Desenvolvimento
Urbano – SEMADUR. Após a aprovação, este pedido vai para o PLANURB, que
dará ou não o aval da obra e este, passa ao Instituto do Patrimônio Histórico e
Artístico Nacional – IPHAN, para que este tenha conhecimento do projeto e
acompanhe toda a obra durante sua execução.” (informação verbal)17

Dentre as propostas do projeto para o Parque Esplanada, há o projeto para a


busca do reconhecimento do Patrimônio Imaterial. O intuito é fazer um levantamento
da história e dos costumes através da memória dos Ferroviários que ainda vivem na
Vila. Mas, por estar incluso no projeto, ainda não é possível afirmar que isso venha a
se concretizar.
O objetivo desta obra, segundo o PLANURB, que é quem realizou a proposta
de intervenção é de “Elevar os níveis da qualidade de vida social, cultural,
urbanística e ambiental da área central, tanto para moradores e usuários daquela
região, quanto para os visitantes e turistas que passam pela cidade.” (Plano
Urbanístico de Uso e Ocupação da Esplanada Ferroviária - 2010).

16
Entrevista realizada com um dos dirigentes do IPHAN em agosto de 2012.
17
Entrevista realizada com um dos dirigentes do IPHAN em agosto de 2012.
75

A restauração do bem tombado deve ser de interesse coletivo, a sociedade


precisa entender o que está acontecendo com sua história. Momentaneamente este
projeto não está em execução.O que se espera é que o próximo governo, que
assumirá o cargo no ano de 2013, possa dar continuidade. Por muito tempo o Sítio
sofreu com a ação do tempo e da degradação humana, lentamente tem sido inserido
no cotidiano da cidade, começando pela instalação da Feira Central.
Ainda assim há uma constante preocupação com a circulação de marginais e
o abandono principalmente na parte norte do sítio, onde se encontra a rotunda. O
espaço inútil acaba dando espaço a desocupados, marginais e pontos de droga.
Essa sistemática vem se desfazendo, mas ainda atormenta boa parte dos
moradores locais.
O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional foi criado no governo
de Getúlio Vargas em janeiro de 1937 pela Lei n°378. Divide o Patrimônio em duas
categorias principais: o Patrimônio Material e o Patrimônio Imaterial.
O Patrimônio Material é composto por um conjunto de bens culturais,
classificados segundo sua natureza, dentre um dos quatro Livros do Tombo. Eles se
dividem em etnográficos, arqueológicos, paisagísticos e históricos, dentre eles ainda
temos os bens imóveis que envolvem os núcleos urbanos, como o Sítio da Ferrovia
e sítios arqueológicos ou paisagísticos. Tem também os bens individuais móveis,
que são as coleções, bibliografias e etc.
O Patrimônio Imaterial é transmitido de geração para geração. É composto
pelos costumes, expressões e técnicas associadas à cultura de um povo. A
valorização desse patrimônio promove o respeito à diversidade de culturas e a
criatividade humana.
O Tombamento é um procedimento administrativo que registra aquele bem a
um Livro de Tombo, próprio, dentro das três instâncias, municipal, estadual e
federal. Após a avaliação e o levantamento da importância daquele patrimônio
dentro da história de uma comunidade e avaliação dos órgãos competentes, é feito o
tombamento. Uma vez determinado Patrimônio Histórico, seja esse bem público ou
privado, qualquer alteração a ser feita no mesmo deverá passar por diversos
processos administrativos para que seja avaliada a possibilidade de execução ou
não.
No caso do Sítio da Ferrovia Noroeste do Brasil, todas aquelas casas que
foram a leilão após a privatização da Ferrovia, são patrimônio histórico material,
76

mesmo pertencendo a pessoas civis em sua maioria, apenas uma das casas é da
União. Independente de quem seja o proprietário, ele terá responsabilidade de zelar
por aquela propriedade. E qualquer mudança a ser feita no corpo daquele patrimônio
passará por várias instâncias:a primeiramente é levar a proposta para o SEMADUR,
depois PLANURB e então IPHAN. É necessário que todos eles autorizem qualquer
que seja a alteração ou restauração a ser feita no bem, já que agora é um bem de
interesse público.
O bem não deve ser descaracterizado, isso corresponde a intervenções
inadequadas a obra em questão. A obra tombada pertence a um período
arquitetônico e tem de ser restaurada de forma que condiza com suas
características reais. Demolições, mutilações ou acréscimos sem consulta aos
órgãos competentes é considerado ato de infração e os proprietários que o fizerem
sem autorização poderão pagar multas sobre o feito.
O Sítio da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil está como Patrimônio
Histórico e o IPHAN determinou que todas aquelas propriedades devem ser
mantidas da mesma forma que estavam antes do período de 2009. Por tanto
qualquer alteração a ser feita, deve ser antes comunicada as autoridades já citadas
acima. Em entrevista ao Campo Grande News, o Superintendente do IPHAN
comenta:

“O IPHAN recebe cerca de 5 solicitações por semana de reformas em


imóveis, todas são avaliadas, mas não se pode informar quantas são aprovadas, já
que muitas recebem alvará parcial do projeto.”(CG NEWS, 2012)

O superintendente esclareceu que o tombamento é do Complexo, por isso o


que mais importa é o visual conjunto do local, para que algum visitante, passeando
pela área, possa visualizar as características da época em que foi construída a
ferrovia. Sendo assim, modificações na parte interna dos prédios serão permitidas,
desde que não alterem a estrutura do imóvel.
As casas da área tombada são isentas do IPTU e o morador também pode
deduzir do Imposto de Renda, parte do que gastar em reformas na casa. O IPHAN
também informou que estão sendo criadas linhas de crédito específicas para os
proprietários. Mas todos os benefícios exigem a contrapartida do morador em
77

manter o imóvel em plenas condições de uso e sem descaracterizar o projeto


original.
Segundo o Superintendente (CG NEWS, 2012):

“É obrigação do proprietário, cuidar do imóvel, não deixar que ele fique


tomado de cupim ou outro tipo de abandono”.

Muitos governantes desse município planejaram soluções para aquele


espaço, centros de gastronomia, museu, centro cultural, reutilização dos trilhos para
trem de superfície, mas nada efetivamente foi definido. O restauro da Estação, do
Armazém e das duas Casas de Chefia, foram bastante significativos, o espaço
precisa de cuidados construtivos, de restauração e manutenção.
Ao comparar a situação patrimonial do Sítio da NOB de Campo Grande com o
Sítio da NOB de Bauru, se verificou que a manutenção dos prédios está bastante
parecida. Por serem projetos construídos na mesma época, com estilos e até

Figura 22 - Bauru: Casa do Engenheiro Chefe


já restaurada e com esquadrias e toldos que
não pertencem ao projeto original. Fonte:
Salcedo, 2004 Figura 23 - Campo Grande: Casa do Engenheiro
Chefe já restaurada, esquadrias originais.Fonte:
Google earth, 2012.

mesmo plantas semelhantes, fica muito mais fácil realizar um comparativo. As


construções do Sítio em Campo Grande, apesar de precisar de manutenção,
conseguem se manter com poucas alterações de projeto. Já o de Bauru sofreu
várias descaracterizações de projeto.
Outro fator de suma importância é que dentro das áreas de tombo, há
também uma área de tombo de influência. Essa área percorre o entorno de todo o
patrimônio tombado, evitando que seja construído naquele perímetro objetos que
78

obstruam ou reduzam a visibilidade do bem tombado, preservando a ambiência do


espaço. Cabe ao IPHAN fiscalizar esses tipos de eventos e avaliar se é ou não
prejudicial a instalação de novos elementos naquele entorno.

Figura 25 - Bauru: Casa de Pouso dos dirigentes


Figura 24 – Campo Grande: Casa de Pouso dos que passavam pela cidade, alterações no
dirigentes que passavam pela cidade, esquadrias gradil.Fonte: Salcedo, 2004.
e portão ainda de madeiras.Fonte: Google earth,
2012.

Durante a pesquisa de campo, ao dialogar com os moradores que


trabalharam na ferrovia, ficou muito evidente a existência de um patrimônio imaterial
naquele espaço, pois os ferroviários criaram seus próprios costumes, hábitos,
vocabulários, que com o fim da ferrovia, talvez não passem de geração para
geração e desapareçam com o passar do tempo.
Segundo Greco (2011, p. 17), os costumes e a organização social
diferenciava os ferroviários do restante da cidade, em seu hábitos e até mesmo no
linguajar, a saber:

[...] pois se compõe de um território delimitado, com cultura própria,


incluindo particularidades na linguagem coloquial: termos, palavras que são
usadas na vida diária, distinguindo esta comunidade ferroviária dos demais
habitantes da cidade. Faz parte da cultura ferroviária.

Sem sombra de dúvidas os ferroviários fizeram parte da história e é


imprescindível que este patrimônio faça parte da memória de todos os Campo
Grandenses, para que permaneça vivo também no espaço urbano. Não existe a
possibilidade de retrocesso, uma vez que a evolução e a rapidez com que as coisas
acontecem no mundo moderno, não nos guia para a volta do funcionamento da
Ferrovia. É preciso entender a história e valorizar o patrimônio, dando a ele vida
79

nova, sem descaracterizá-lo. Para isso é necessário que a população local se


conscientize, busque a melhoria e valorização de seu bem e os descendentes
efetivos dessa ferrovia, também se adaptem a uma nova realidade sem perder sua
memória e suas raizes.
80
CONCLUSÃO

A cidade moderna é fruto do capital que, após a Revolução Industrial, atraiu


grande fluxo de pessoas. Esse crescimento alterou a maneira de entender a urbes.
O urbanismo não pode mais se preocupar só com o belo, precisa entender as
transformações na estrutura social, econômica e humana.
Com o crescimento das cidades, surgem novas áreas nobres e serviços,
avenidas, parques, condomínios. As áreas degradadas que tomam tanto áreas de
ocupação irregular quanto imóveis abandonados, muitas vezes ficam sem atenção.
Os investimentos privados e públicos, estão sempre ligados a interesses para o
progresso e esquece do que já existe. Para que gere algo nesse sentido é
importantissima a participação da população local e a organização de um processo
de recuperação dessas áreas.
O Sítio Arquitetônico da NOB se tornou Patrimônio Municipal assim que foi
privatizado e esta reinvindicação partiu da união de moradores e simpatizantes da
causa. Se este fato não houvesse ocorrido de imediato, como foi em 1996, talvez ele
teria sido completamente demolido para atender a interesses privados. As leis que
regem o patrimônio nacional são claras e guardam aquele espaço como bem da
sociedade. Hoje está estabelecido como Patrimônio Histórico nas três esferas, ou
seja, nas esferas Municipal, Estadual e Federal. E é de responsabilidade do IPHAN
realizar fiscalizações periódicas ao espaço e propostas de restauro, em conjunto
com os órgãos competentes de planejamento urbano do município, para manter o
patrimônio vivo.
A partir do incentivo financeiro do Programa de Aceleramento do Crescimento
das Cidades Históricas do Governo Federal (PAC), em conjunto com o Instituto do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) e a Prefeitura Municipal de Campo
Grande, se deu início à obra de restauração do prédio da Antiga Estação Ferroviária
em 2010. Em 2011 passou a se chamar Armazém Cultural.
82

Inclui ainda reestruturações nos galpões de manutenção dos trens, na


rotunda e em outros prédios do complexo. O projeto para o Sítio Arquitetônico da
NOB é chamado de Parque Esplanada, um projeto proposto em 2010 pelo
PLANURB que visa integrar o Patrimônio Histórico à vida cotidiana da cidade.
O projeto contempla ações para cultura, parques e área verde, gastronomia
(Feira Central), Casa da Memória da Ferrovia e passeio cultural sobre trilhos ao
longo do Parque, além de espaços para exposições periódicas, eventos e
atendimento ao turista. Todas as ações partem do princípio da valorização cultural
local, diversão e interação do visitante com o espaço.
Ao redor do projeto para o Parque Esplanada haverá o projeto Orla
Ferroviária, composto por um calçadão em toda a extensão por onde passavam os
antigos trilhos e as casas dos ferroviários, que fazem parte do patrimônio. A maioria
data de 1935. É um dos expoentes da arquitetura de um período áureo de Campo
Grande. Toda a área central, que foi construída simultaneamente com a ferrovia,
está participando desse projeto e pertence ao programa criado pela prefeitura
chamado Viva Centro.
O investimento naquela área traz boa visibilidade à cultura local e cria
atrativos econômicos ligados ao turismo. Espera-se que haja real investimento e que
o projeto proposto seja concretizado, pois a cultura e a sociedade só têm a ganhar
quando investem em sua história.
Quando uma obra arquitetônica deixa de servir para o uso do homem, ela
perde a sua principal razão de ser e vai sendo consumida pelo tempo. As paredes,
que antes tremiam ao silvo das locomotivas, não escutam mais nada além de um
murmurinho de buzinas ao longe; estão à espera de novas histórias. O espaço, ao
ser sentido, conta para que veio, sem precisar falar uma palavra. Isso acontece
quando pisamos nos paralelepípedos daquelas ruas, quando avistamos aquelas
casas.
A importância de criar uma consciência ambiental nas próximas gerações, de
educar o cidadão para uma sociedade de valores, de história e não imediatista,
muda o conceito social. É sabido que o processo é lento, mas é preciso dar início e
pode partir da própria população, alianças com iniciativas privadas, dependendo
assim de uma sociedade civil organizada.
As políticas públicas para o desenvolvimento da cidade deveriam ser
discutidas e trabalhadas nas questões sociais, ambientais e urbanísticas. Todas as
83

mazelas dentro do espaço urbano, em grande parte, são consequência de ações


inadequadas, mal resolvidas. Isso se refere tanto aos vazios urbanos, periferias e
favelas, segregações sociais quanto o mau uso do solo e degradação do meio
ambiente. Para que haja o equilíbrio dos espaços, é preciso pensar o ambiente em
toda sua amplitude, tenha sido ele construído pelo homem ou não.
O Sítio Arquitetônico da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil é um ambiente
histórico, bem da sociedade e deve ser mantido. Dar a ele novo uso, de forma a
incentivar a cultura local e o turismo, o torna participativo dentro da economia da
cidade. A restauração da Estação e a instalação da Feira Central foram fortes ações
para tirar aquele espaço da marginalidade em que se encontrava, e aindapode
melhorar.
A participação da sociedade na evolução do espaço urbano, grande parte das
vezes é apenas uma intenção. A busca por uma cidade melhor, organizada e
saudável é um processo árduo,deve fazer parte de uma política de formação da
cidadania e partir da sociedade local. Deve gerar discussões, pesquisa e
planejamento continuo, isso pode ser aplicadotanto nos projetos do Sítio
Arquitetônico da NOB, numa visão micro, como na cidade em uma visão macro.
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Campo Grande: Matriz Editora, 1999.

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88

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nascimento da estrada de Ferro Noroeste do Brasil. Campo Grande: Editora UFMS,
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QUEIROZ, Paulo Roberto Cimó. Uma ferrovia entre dois mundos: a Estrada de
Ferro Noroeste.Tese de Doutorado em História, USP. São Paulo, 1999.

QUEIROZ, Paulo Roberto Cimó. Uma ferrovia entre dois mundos: a Estrada de
Ferro Noroeste: a E.F. Noroeste do Brasil na primeira metade do século 20.Campo
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REVISTA HISTÓRIA VIVA. São Paulo: Caminhos do trem, apogeu, decadência e


retomada da ferrovia no Brasil. Vol. I, II, III, IV, V e VI, 2007 e 2008.

SALCEDO, Rosio Fernández Baca et al. A importância da representação gráfica na


documentação do patrimônio arquitetônico como instrumento de análise para o
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SALLES, Iraci Galvão. Trabalho, progresso e a sociedade civilizada.São Paulo:


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SEVCENKO, Nicolau. Literatura como missão. São Paulo: Brasiliense, 1983.

WEINGARTNER, Alisolete Antônia dos Santos. Movimento Divisionista No Mato


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ZARDO, Edgard. Tributo ao Centenário - De Prosa e Segredo Campo Grande


segue o seu curso. Campo Grande: Edição FUNCESP/Fundação Lions, 1999.
89

ANEXO 1
ROTEIRO – ENTREVISTA

PARECER SOBRE O SÍTIO DA ESTRADA DE FERRO NOROESTE DO BRASIL E


A EXPANSÃO DA CIDADE DE CAMPO GRANDE.

Número _____________________

Técnico - PLANURB - Instituto Municipal de Planejamento Urbano

1. O que está sendo feito pelo Sítio da Estrada de Ferro Noroeste do


Brasil?
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ANEXO 2
ROTEIRO - ENTREVISTA

PARECER SOBRE O SÍTIO DA ESTRADA DE FERRO NOROESTE DO BRASIL E


A EXPANSÃO DA CIDADE DE CAMPO GRANDE.
Número _____________________

Técnico - IPHAN - Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional


1. O que está sendo feito pelo Sítio da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil ?
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ANEXO 3
ROTEIRO – ENTREVISTA

PARECER SOBRE O SÍTIO DA ESTRADA DE FERRO NOROESTE DO BRASIL E


A EXPANSÃO DA CIDADE DE CAMPO GRANDE.
Número _____________________

Funcionário que prestou serviço à Noroeste do Brasil ou descendente do


mesmo que reside no sítio.
1. Qual a sua ligação com a ferrovia?
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2. Como veio residir nesse espaço?


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3. Qual seu parecer sobre o sítio?


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