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PROJETO DE EXTENSÃO DO CURSO DE LICENCIATURA E BACHARELADO

EM HISTÓRIA

NEOLIBERALISMO E TRANSPORTE PÚBLICO: A RELAÇÃO ENTRE


PRECARIZAÇÃO DOS SERVIÇOS PÚBLICOS E SOFRIMENTO PSÍQUICO DOS
ESTUDANTES UNIVERSITÁRIOS NA REGIÃO DO GRANDE ABC

Gabriel Osmar dos Santos1


Giovanna de Oliveira Santos2
Marli Vizim3

Resumo
Com o avanço do neoliberalismo, os serviços públicos sofrem uma crescente
precarização, resultando na deterioração da qualidade de vida da população e,
consequente adoecimento geral. Nesse cenário, o transporte público surge como mais
um elemento que fortalece o sofrimento psíquico, pois, para além de viagens
exaustivas com alta tarifa, lotação, longa distância, espera, falta de estrutura e
segurança gerarem picos de estresse na ida ao trabalho, ainda tais fatores ocasionam
em privação do direito de ir e vir; restrição de acesso à cidade e privação ao lazer,
esporte, cultura, saúde, elementos essenciais para a promoção do bem-estar. Assim,
esta Ação Curricular de Extensão (ACEX) teve como objetivo geral estudar a possível
relação entre precarização do transporte público e saúde mental. Como objetivos
específicos, analisar o impacto do neoliberalismo no transporte público e identificar a
ramificação desses impactos no acesso à cidade. Para execução deste trabalho, a
metodologia de cunho quantitativo e qualitativo, teve a formulação e aplicação de um
questionário com vinte (20) perguntas fechadas sobre os impactos do transporte
público na vida de estudantes universitários do Grande ABC, acerca das condições
de mobilidade em seu cotidiano. Participaram vinte e seis (26) entrevistados pelo
google forms link: https://forms.gle/y9i5eFDvZ9sgdEDw8 . Foi possível avaliar com
base nos resultados que a precarização do transporte público pode ser um gerador
de sofrimento psíquico, porque pudemos traçar certas condicionantes a partir do
recorte do questionário, mesmo sem uma relação causal direta. Em boa parte das

1
Graduando em Licenciatura e Bacharelado em História pela Fundação Santo André.
2
Graduando em Licenciatura e Bacharelado em História pela Fundação Santo André.
3
Coordenadora e orientadora da disciplina de Ação Curricular de Extensão.
2

respostas elas apontaram para empecilhos tanto ao acesso do transporte à cidade


fora dos dias úteis, quanto pela percepção e experiência de um transporte precário no
cotidiano, além de haver um reconhecimento sobre a precarização deste serviço
público, como também, a confirmação de um mal-estar gerado após a utilização desse
serviço, sendo os sintomas de cansaço e estresse os mais frequentes.

Palavras Chaves: transporte público; neoliberalismo; saúde mental.

ÁREA TEMÁTICA: Educação


ODS – Saúde e bem estar – Cidades e Comunidades sustentáveis

Introdução

A partir dos anos 70, com o avanço do neoliberalismo, os serviços públicos têm
sofrido uma crescente precarização e, com isso, a qualidade de vida da população é
cada vez mais afetada. O resultado desse processo tem sido um forte adoecimento
geral. Nesse cenário, o transporte público surge como mais um serviço precarizado,
com alta tarifa, lotação, distância, espera, falta de estrutura, gerando picos de
estresse; e ainda, resulta na privação de acesso ao lazer, esporte, saúde e entre
outros elementos essenciais para o bem-estar da sociedade.
Assim, como objetivo geral deste projeto, pretendemos estudar a possível
relação entre precarização do transporte público e saúde mental. Como objetivos
específicos, vamos analisar o impacto do neoliberalismo no transporte público e
identificar a ramificação desses impactos no acesso à cidade. Faremos, em um
primeiro momento, um levantamento teórico sobre neoliberalismo, acesso à cidade e
a relação do transporte público e saúde; em um segundo momento, como
metodologia, iremos formular e aplicar um questionário sobre os impactos do
transporte público na vida das pessoas, com ênfase no meio universitário.
A ação de extensão se insere nas seguintes diretrizes temáticas da política de
extensão dentro dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da União das Nações
Unidas (ODS/ONU): 06 - saúde e bem-estar4, no objetivo 3.4, que defende: “Até 2030,
reduzir em um terço a mortalidade prematura por doenças não transmissíveis via
prevenção e tratamento, e promover a saúde mental e o bem-estar”; e 11 - Cidades

4
ONU – Organização Nacional Das Nacionais Unidas. Os objetivos de desenvolvimento sustentável no Brasil.
Disponível em: https://brasil.un.org/pt-br/sdgs/3
3

e comunidades sustentáveis5, com ênfase nos objetivos 11.2 “Até 2030, proporcionar
o acesso a sistemas de transporte seguros, acessíveis, sustentáveis e a preço
acessível para todos, melhorando a segurança rodoviária por meio da expansão
dos transportes públicos, com especial atenção para as necessidades das pessoas
em situação de vulnerabilidade, mulheres, crianças, pessoas com deficiência e
idosos.” e 11.7 “Até 2030, proporcionar o acesso universal a espaços públicos
seguros, inclusivos, acessíveis e verdes, particularmente para as mulheres e
crianças, pessoas idosas e pessoas com deficiência.”
Acerca da metodologia de cunho qualitativo, produziremos o questionário
destinado à comunidade acadêmica, no que se refere à forma, optaremos por um
questionário com perguntas fechadas, quanto as tarifas, tempo de deslocamento,
variáveis de congestionamento urbano, utilização para trabalho, formação
educacional, lazer etc. Assim, busca-se conexões possíveis com a potencialização e
o agravamento do sofrimento psíquico. Abrem-se também novos caminhos para as
questões a partir de diálogos prévios com as organizações de atuação política na área
de transporte, estudantes e/ou profissionais de psicologia, urbanismo e outras áreas
relacionadas ao tema.

Fundamentação Teórica

Neoliberalismo e sofrimento psíquico

Heribaldo Maia, (2022), estudioso da teoria crítica com ênfase na relação entre
sofrimento psíquico e capitalismo, em seu texto “Neoliberalismo e sofrimento psíquico:
o mal-estar nas universidades”6, define o neoliberalismo não só a partir de um prisma
econômico e político, mas como racionalidade geradora de um novo sujeito que será
moldado para atender às demandas dessa nova fase de expansão do capital.
Desse modo, se outrora, no capitalismo industrial, com a demanda de uma
sociedade altamente disciplinada vigoravam doenças psíquicas como histeria e surtos
psicóticos, nessa nova fase, em que o indivíduo sofre com sobrecargas de

5
ONU – Organização Nacional Das Nacionais Unidas. Os objetivos de desenvolvimento sustentável no Brasil.
Disponível em: https://brasil.un.org/pt-br/sdgs/11
6
Maia, Heribaldo. Neoliberalismo e sofrimento psíquico: o mal-estar nas universidades. Recife: Ruptura, 2022.
4

responsabilização, prevalece a sociedade dos ansiosos e depressivos privados de


seus direitos e cercados por um ambiente instável.
Maia (2022) reforça que tais condições estão intrinsecamente ligadas ao meio
social em que o indivíduo está inserido. Uma vez que, tanto o processo de ser
reconhecido enquanto sujeito quanto o próprio sofrimento não se configuram
enquanto fenômenos a históricos, dissociados da cultura e sociedade da época em
que vivemos.
Assim, para fortalecer tal argumento, este autor se baseia na Teoria do
Reconhecimento do filósofo e sociólogo alemão Axel Honneth, em que o indivíduo
depende de três esferas para se reconhecer enquanto ser social: “1) cabendo à família
a experiência afetiva do amor; 2) ao Estado o reconhecimento jurídico; e 3) à
sociedade civil a experiência de solidariedade.” (MAIA, 2022, p.36).
Nesse sentido, com a reconfiguração do papel do Estado como promotor de
políticas de incentivo à competitividade, busca incessante por lucro, alta
produtividade, transpondo ao indivíduo problemas sociais que só podem ser
solucionados coletivamente, com o objetivo de reproduzir uma lógica empresarial,
nega-se diretamente o reconhecimento jurídico desse sujeito. E, como consequência,
isso afeta as demais esferas de reconhecimento, haja vista que, ao ser privado de
seus direitos, o indivíduo tem dificuldades de reconhecer os direitos do outro tanto em
um contexto de solidariedade na sociedade de modo geral, quanto na esfera
doméstica. Nas palavras de Maia:
O Direito é a segunda esfera de reconhecimento, sendo mais complexa que
a primeira por haver uma ampliação fundamental do campo relacional,
ultrapassando a barreira da família [...] a) para desenvolvermos a capacidade
que reforce a confiança de assumirmos nossa identidade, dependemos de
um conjunto de normas e direitos [...] Assim, aprendemos a reconhecer os
outros e a nós mesmos enquanto membros iguais da comunidade e
portadores de direitos, havendo uma pressão intersubjetiva por reciprocidade
e respeito pela igualdade humana [...] a esfera do reconhecimento jurídico é
fundamental para que os sujeitos se percebam enquanto iguais na relação
com o outro. (2022, p.40).

Ainda, este autor ressalta que tal processo:

[...] destrói o social para mercantilizar qualquer aparato institucional de


solidariedade como saúde, educação, seguridade social, políticas públicas de
moradia e emprego, além de retirar quaisquer proteções ao trabalhador; 2)
sem políticas de proteção e com tudo mercantilizado, apenas o mercado é
capaz de prover as necessidades das pessoas, cujo acesso elas só têm, no
entanto, mediante dinheiro, recurso cada vez mais difícil de obter sem as leis
trabalhistas, formando um cenário de precarização indiscriminada das
relações de trabalho; 3) sem as leis trabalhistas e sem políticas de incentivo
ao pleno emprego, há o crescimento do desemprego, da precarização e da
5

miséria, fazendo com que cada vez mais pessoas aceitem quaisquer
condições sociais [...] há um ambiente constante de ansiedade [...] depressão
[...] violentas cargas sobre a vida psíquica dos seres humanos [...]” (2022,
p.186)

Dessa forma, cria-se um cenário em que ser reconhecido enquanto sujeito


fica condicionado ao poder financeiro que se tem na sociedade. Tal poder financeiro
torna-se cada vez mais inacessível à maioria da população, posto que a nova
configuração de Estado no neoliberalismo promove políticas que fortalecem o
desemprego e subempregos e, consequentemente, o reconhecimento enquanto
sujeito também se torna inacessível.
Nesse contexto, a própria transformação do transporte em mercadoria se
configura enquanto política de incentivo ao desemprego e subemprego, visto que
ocasiona em privação de acesso ao emprego diretamente. Mas também, a outros
serviços básicos necessários ao bem estar e vida em sociedade, tais como educação,
saúde, lazer.

Mobilidade urbana e acesso à cidade


Esta seção da fundamentação teórica será norteada pelo artigo Transporte
público coletivo: discutindo acessibilidade, mobilidade e qualidade de vida 7. Um
primeiro ponto a ser ressaltado é a noção de garantia à mobilidade, em que se
relaciona com o deslocamento diário da população em um espaço urbano.
Aprofundando esse conceito, o deslocamento envolve dois componentes: a
performance do sistema de transporte em relação à infraestrutura, horários, rotas; e
as características e necessidades do indivíduo que utiliza o transporte, como a posse
de um carro próprio ou uma renda para utilizar o transporte desejado.

Além do mais se adiciona à mobilidade os fatores de renda e de quantidade de


viagens relacionadas com as necessidades e decisões do indivíduo, em que se
adentra fatores externos como a estrutura física da cidade, áreas de uso público,
ofertas de meio de transporte etc. Com isso, o artigo apresenta um segundo eixo de
análise a questão do acesso à cidade a partir da acessibilidade ao sistema de
transporte, em que perpassa por duas categorias de acessibilidade: ao sistema de
transporte coletivo em sua região de moradia, trabalho, lazer etc., e a acessibilidade

7
ARAÚJO, M. R. M., OLIVEIRA, J. M., JESUS, M. S., SÁ, N. R., SANTOS, P. A. C., e LIMA, T C. Transporte público
coletivo: discutindo acessibilidade, mobilidade e qualidade de vida. Psicologia & Sociedade, 23(3), 2011. 574-
582.
6

a destinos, mensurados a partir do acesso ao sistema de transporte, a facilidade de


se chegar ao destino desejado. Assim, anula-se o uso do sistema que garante a
mobilidade, se não há possibilidade de acesso ao local de chegada. (ARAÚJO, et
al.,2011, p.577)

Um terceiro fator relacionado à mobilidade é a qualidade de vida:

Pensar qualidade de vida sem pensar em mobilidade e acessibilidade é


impossível, pois são elas que garantem à autonomia ao cidadão, são também
elas que se tornam presentes no movimento de ir e vir, seja ao deslocar-se
para o emprego, seja na busca de uma forma alternativa de entretenimento
fora de seu bairro. É indispensável promovê-las com autonomia e segurança,
melhorando, consequentemente, a qualidade de vida de todos os usuários do
espaço urbano e garantindo o exercício de uma real cidadania (ARAÚJO,
M.R.M et al., 2011 p.577).

Logo, o acesso à cidade se relaciona com a acessibilidade à mobilidade urbana


garantindo acesso à saúde, lazer aos finais de semana e feriados e à educação.
Pensar na mobilidade nesse sentido é pensar a acessibilidade para além do
deslocamento ao trabalho nos dias úteis da classe trabalhadora.

Posto isso, o transporte coletivo se apresenta como um serviço essencial no


contexto urbano, pois horizontaliza, no sentido de classes, a mobilidade. No entanto
se apresentam fatores que privam o acesso aos serviços de transporte coletivo pelas
classes mais pobres: as altas tarifas dos serviços que não acompanham a renda dos
mais pobres e a inadequação da oferta dos serviços, principalmente nas áreas
periféricas da cidade (ARAÚJO, et.al. 2011, p.580). Esses fatores se relacionam
intimamente com a concessão do serviço de transporte público à iniciativa privada, na
qual as empresas operadoras raramente são submetidas aos processos de
concorrência pública sob critérios de eficiência, como recomenda a legislação de
concessões de serviços públicos. Logo, para que se materialize a qualidade do serviço
de transporte coletivo às diferentes populações, se conjugam fatores como o número
de linhas disponíveis, frequência e destinos das linhas, necessidades de
deslocamento da população, além do custo da tarifa relativo à renda da classe
trabalhadora.

Assim nas considerações finais do artigo é ressaltado que:

É com pesar que constatamos que, hoje em dia, o objetivo do planejamento


de transporte tem se limitado a propiciar uma ampla mobilização de força de
trabalho. O papel principal do sistema de transportes coletivo urbano passa a
ser o de disponibilizar a força de trabalho ao capital, nas diferentes regiões
produtivas da cidade, deixando de lado necessidades básicas do trabalhador
7

como escola, saúde e lazer. Isso é feito através da prioridade que o poder
público confere ao transporte coletivo urbano em determinadas regiões e pela
distribuição da frequência dos ônibus principalmente nos horários de ida e
volta ao trabalho, enquanto as empresas subsidiam passagens para garantir
a presença do trabalhador nas indústrias e comércio. (ARAÚJO, M.R.M et al.,
2011, p.581).

Portanto, percebemos que se apresenta uma relação entre transporte, estrutura


urbana e poder público, na qual as concessões às empresas privadas e a fiscalização
delas, são ineficazes ao oferecer o serviço de transporte coletivo que atenda à maioria
da população, afetando o acesso à cidade por meio da mobilidade em que reduz o
acesso da classe trabalhadora ao lazer, saúde e educação, tendo uma relação
profunda com a potencialização do sofrimento psíquico apresentados no item anterior.

Metodologia de Pesquisa

A metodologia para a formulação do questionário terá como base o artigo de


Manzato e Santos8. A pesquisa de cunho qualitativa e quantitativa, teve apenas
perguntas fechadas em que se mediu o impacto do transporte público no cotidiano da
população, focando na utilização para se deslocar ao trabalho, universidade, e na
utilização aos finais de semana em que o uso se volta majoritariamente ao lazer.

Acerca do problema guiado pela pesquisa, o eixo central foi as impressões dos
entrevistados sobre a qualidade das frotas do transporte público, o tempo de
deslocamento a partir de variáveis como o engarrafamento, quantidade de linhas
utilizadas até o destino, o preço das tarifas, a oferta de linhas e o tempo de espera
durante dias úteis e aos finais de semana, além da relação entre a utilização e o
sentimento de stress, nervosismo e outros sintomas que podem levar ou potencializar
o sofrimento psíquico.

O público-alvo do questionário foram os estudantes das seguintes


universidades da região do ABC de São Paulo: FDSBC; FSA; USCS; UFABC;
UNIFESP Diadema; Faculdade ENAU; Faculdade Mauá; São Judas SBC. A obtenção
dos dados foi a partir da plataforma de questionário Google Forms, link
https://forms.gle/y9i5eFDvZ9sgdEDw8 .

8MANZATO, Antônio José; SANTOS, Adriana Barbosa. A elaboração de questionários na pesquisa quantitativa.
Departamento de Ciência de Computação e Estatística–IBILCE–UNESP, v. 17, 2012.
8

Acerca da hipótese inicial, tivemos como perspectiva que a constante


precarização a partir de políticas neoliberais no transporte, enquanto serviço público,
teve um grande impacto em uma quantidade de horas excessivas de deslocamento
não apenas no cotidiano produtivo, mas também no acesso à cidade nos dias de
descanso. E com isso, o impacto deste serviço em suas mais diversas ramificações,
pode potencializar o sofrimento psíquico.
APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS

Seguirá as perguntas do seminário com as respostas em gráficos gerados pelo


Google Forms e a análise das respostas ancoradas na fundamentação teórica.
Gráfico nº 1 – De qual cidade do ABC você é?

Fonte: acervo dos autores

Ao total 26 estudantes responderam ao questionário, buscou-se de início situar


o local de moradia e apenas uma resposta (3,8%) não reside na região.
Gráfico nº 2 – Em qual faculdade do Grande ABC você estuda?
9

Fonte: acervo dos autores

Fonte: acervo dos autores

Em seguida, as principais universidades da região, em que se predominou


estudantes foi a Fundação Santo André com 61,5%, e uma parcela considerável de
estudantes da Universidade Federal do ABC, 23,1%. Todas as outras faculdades
envolvidas os participantes foram poucos.
Gráfico nº 3 – Qual a soma da renda na sua casa?

Fonte: acervo dos autores


10

Gráfico nº 4 – Quantas pessoas dividem essa renda?

Fonte: acervo dos autores

Verifica-se que 61,5 % dos participantes estão na faixa de 2 a 6 salários


mínimos, contudo a média mensal de gastos em transporte público variou
significativamente, ou seja o menor indicador nenhum gasto foram 15,4, o gasto
posterior entre R$ 1 e R$ 60 reais, 15,4% também e, o maior gasto R$ 240 reais foi
30,8%.

Gráfico nº 5 – Você tem acesso ao passe livre estudantil?

Fonte: acervo dos autores

As perguntas buscaram identificar a renda e a divisão da renda no mesmo


domicílio, pois temos, enquanto hipótese, que a renda tem um peso considerável na
maneira em que os sintomas afetam o usuário do transporte público, no qual uma
11

renda menor potencializa e se soma com outros sintomas de tensão e de agravamento


ou geradores de sofrimento psíquico. No terceiro gráfico podemos notar que 30,8%
das respostas gastam mensalmente mais de R$240, ao passo que no quarto gráfico
46,2% têm acessado ao passe livre estudantil. Esta contradição aparente, na verdade
reflete tanto uma maioria das respostas que não tem acesso ao passe livre estudantil
ou os que pagam meia tarifa, somados aos gastos com transporte para ir ao trabalho,
quanto uma parcela de pessoas que têm o passe livre, mas utilizam transporte público
aos finais de semana e feriados e, também para o percurso nos dias úteis para o
trabalho.

Gráfico nº 6 – Com qual frequência você usa o transporte público?

Fonte: acervo dos autores

Gráfico nº7 – Quais os meios de transporte público você utiliza em dias úteis?
12

Fonte: acervo dos autores

Podemos notar que 65% das repostas (17 das 26) utilizavam diariamente o
transporte público, seja para se deslocar ao trabalho e/ou faculdade, além de utilizar
para lazer aos finais de semana. Apenas nos dias úteis 23,1% das repostas (6 das
26) utilizavam para se deslocar ao trabalho e/ou faculdade, apenas duas respostas só
empregavam quando muito necessário, e apenas uma fazia uso pelo menos uma vez
por semana. No gráfico seguinte, em que as três opções podiam ser assinaladas,
notamos que o ônibus é o meio de transporte mais utilizado por estudantes na região
do ABC, podendo ser municipais ou intermunicipais, o trem aparece como segundo
mais utilizado, já que na região do grande ABC passa a linha 10-Turquesa da CPTM,
e por último, apenas 7 pessoas utilizavam o metrô, em que esses utilizadores podiam
morar na região mas trabalhar na região metropolitana de São Paulo, ou não residiam
no ABC mas estudavam em uma universidade na região.
Gráfico nº8 – Qual a sua média diária em horas gasta em transporte público?
13

Fonte: acervo dos autores


Gráfico nº9 – Qual o intervalo médio de espera do transporte público que você
utiliza?

Fonte: acervo dos autores


No gráfico nº 8 há uma maioria de respostas no intervalo de uma hora a 3 horas
em média diárias no transporte público, tanto para utilizar para ir ao ensino superior,
quanto para trabalhar, o que se relaciona com diversos problemas relacionados ao
transporte e a cidade, como baldeações, trânsito, distância do trabalho e/ou faculdade
do ponto de partida etc. Já no gráfico nº 9 há uma maioria de respostas no intervalo
de espera de 10 a 20 minutos, o que também se relaciona com os problemas da
cidade e da infraestrutura dos transportes. Há de se notar os casos mais agravantes
nos intervalos de 25 minutos a 1 hora de espera os quais se relacionam também aos
mesmos problemas já citados.
Gráfico nº 10 – No transporte público ou em algum ambiente em seu entorno, quais
as situações de tensões que você já vivenciou.
14

Fonte: acervo dos autores

Gráfico nº11 – No transporte público selecione situações de falta de estrutura que


você já vivenciou.

9
Leia-se: Linha 3 – Conflitos entre passageiros ou entre funcionários; Linha 4 – Conflitos entre passageiros e
funcionários; Linha 7 – Paralisação dos transportes devido a enchentes
15

Fonte: acervo dos autores


Gráfico nº 12 – Você já teve dificuldade ou foi impossibilitado pelo transporte público
de ir para algum lugar?

Fonte: acervo dos autores

Gráfico nº 13 – Sintomas recorrentes no seu dia a dia, após o uso do transporte


público.

Fonte: acervo dos autores


Em perguntas direcionadas nos gráficos de números 10 a 13 identificou-se
possíveis sofrimentos psíquicos por parte dos usuários de transporte público, a
totalidade dos entrevistados confirmou ter passado por pelo menos uma situação de
16

tensão e uma situação de falta de estrutura. Desse modo, entre as situações de tensão
dentro do transporte, 88,5% dos entrevistados confirmaram ter presenciado conflitos
entre passageiros ou entre funcionários, 65,4% conflitos entre passageiros e
funcionários e paralisação devido a enchentes, seguido a isso, 61,5% afirmaram ter
vivenciado acidente de trânsito, 42,3% assédio moral, 34,6% assédio sexual, 30,8%
roubo ou furto. Quanto a situações de falta de estrutura, atraso, lotação e trânsito
estão entre as situações mais recorrentes, embora, outros problemas de precarização
listados pelos entrevistados tenham recebido confirmação superior a 40%, com
exceção de “deslocar-se a pé por falta de transporte público” com 38.5% e “ausência
de linha municipal no bairro onde mora” com 15.4%.
Além disso, entre os sintomas recorrentes, gráfico nº 13 no dia a dia dos
usuários após a utilização do transporte público, o cansaço se destaca como o mais
frequente, haja vista que todos os entrevistados marcaram a opção, em segundo lugar
por estresse com 92.3%, em terceiro lugar o desânimo, com 69.2%, sendo seguidos
por sintomas de ansiedade com 57.7% e tristeza com 38.5%. Concomitante a isso,
66.7% dos usuários de transporte que responderam à pesquisa, confirmaram ter tido
dificuldades de ir a algum lugar a fim de evitarem situações desgastantes que
envolvessem o deslocamento. Ademais, a redução de itinerário é também razão que
dificulta o deslocamento para 47.6% e o preço elevado das tarifas para 33.3%.
Gráfico nº 14 – Você consegue utilizar o transporte público para além das
obrigações (trabalho, estudos)?

Fonte: acervo dos autores


17

Gráfico nº 15 – Falta de estrutura do transporte público à alta tarifa são empecilhos


para o acesso ao lazer (...) bem estar?

Fonte: acervo dos autores

Gráfico nº 16 – Nos finais de semana, há redução de circulação do transporte que


você costuma utilizar?

Fonte: acervo dos autores

Os gráficos anteriores números 14, 15 e 16 se relacionavam com a questão do


transporte público enquanto um condicionante ao acesso à cidade por meio da
mobilidade urbana. O gráfico nº 14 demonstrou uma noção de utilização do transporte
público aos finais de semana ou feriados para acessar a cidade com a finalidade ao
acesso ao lazer, saúde etc., assim 11,5% das respostas não conseguem utilizar o
18

transporte público para fins que não sejam destinados à esfera produtiva nos dias
úteis. No gráfico nº 15 notou-se que a maior parcela dos entrevistados considera que
os fatores operacionais do transporte público ao lado da questão financeira para as
passagens são empecilhos para o acesso à cidade nos dias não-úteis, podendo
significar uma exclusão de mobilidade para a classe trabalhadora acessar as áreas
centrais da cidade em que há uma estrutura mais desenvolvida nas áreas de lazer,
saúde, esporte etc. Por fim, no gráfico nº 16 a questão demonstrou que a maioria dos
entrevistados atestam a redução de linhas nos dias não-úteis, somando mais um fator
de dificuldade de mobilidade urbano e acesso à cidade.

Gráfico nº 17 – Você considera ações propositais por parte do Estado ou das


empresas que ofertam o serviço do transporte para que a sua eficiência seja
diminuída?

Fonte: acervo dos autores

Gráfico nº 18 – Você acha que a implementação da tarifa zero, seria um fator de


melhoria no transporte público?
19

Fonte: acervo dos autores

Gráfico nº 19 – A melhoria do transporte público resultaria em menor uso de


transporte particular?

Fonte: acervo dos autores


20

Gráfico nº 20 – O que você acha da privatização do transporte público?

Fonte: acervo dos autores


Nos gráficos de números 17,18,19 e 20 acima, buscou-se analisar a
compreensão dos entrevistados sobre os impactos do neoliberalismo em um serviço
público, neste caso, o transporte. A priori, no gráfico nº 17, de maneira mais direta,
perguntamos se consideravam ou não que havia, por parte do Estado ou de empresas
privadas, ações propositais para diminuir a eficiência do transporte, ao que 84,6%
consideram que sim. Com relação ao gráfico nº 18, 88,5% dos entrevistados
consideraram que a implementação da tarifa zero seria um fator de melhoria e no
gráfico nº 19, 100% dos entrevistados concordaram que a melhoria do transporte
público impactaria na redução do uso dos transportes individuais, diminuindo o trânsito
nas cidades. Ademais, no gráfico 20, 76,9% se colocaram desfavoráveis à
privatização dos serviços públicos, 15,4% a favor e 7,7% não tinham uma opinião
formada.

Considerações finais
A precarização dos serviços públicos ocasionada pela nova configuração de
Estado em uma nova fase do sistema capitalista denominada como “neoliberalismo”
fez também surgir uma nova configuração de sujeito. Este, condicionado ao excesso
de responsabilização para problemas coletivos e à ausência de reconhecimento de
seus direitos, é submetido a uma alta carga de sofrimento psíquico.
Nesse sentido, esta pesquisa teve como propósito a identificação da
especificidade da precarização do transporte público enquanto serviço público e o que
21

o permeia e a sua possível relação com o sofrimento psíquico da população, dando


enfoque aos universitários que estudam na região do Grande ABC. Ademais, é preciso
ressaltar novamente que nos baseamos nos Objetivos de Desenvolvimento
Sustentável da União das Nações Unidas, em que temas como saúde mental e
melhoria do transporte e acesso à cidade estão pautados.
Assim, a partir da aplicação de formulário de pesquisa, buscamos compreender
a relação dos estudantes com a utilização do transporte, primeiramente, traçando um
perfil social baseado em local de moradia, faculdade e renda; mais adiante, questões
cotidianas vivenciadas pelos estudantes usuários de transporte foram importantes
para relacionarmos a situações de tensão, falta de estrutura, sintomas recorrentes
após a utilização do transporte até a restrição mais direta de deslocamento, como
causas de sofrimento psíquico.
Ademais, buscamos direcionar perguntas sobre o acesso à cidade e, por fim,
ao perguntar sobre o processo de privatização dos serviços públicos, projetos como
tarifa zero e ações propositais por parte do Estado ou empresas privadas, tivemos
como propósito entender a compreensão de neoliberalismo por parte dos estudantes.
Com isso, a partir da hipótese inicial de que a precarização do transporte
público pode ser um gerador de sofrimento psíquico, conseguimos traçar certas
condicionantes a partir do recorte do questionário, mesmo sem uma relação causal
direta, em que boa parte das respostas apontam para empecilhos tanto ao acesso à
cidade fora dos dias úteis, quanto pela percepção e experiência de um transporte
precário no cotidiano, além de haver um reconhecimento sobre a precarização deste
serviço público, como também, a confirmação de um mal-estar gerado após a
utilização desse serviço, sendo os sintomas de cansaço e estresse os mais
frequentes.
Futuramente, pretendemos que este artigo possa colaborar para pesquisas que
aprofundem o tema, visto que pensar qualidade de vida e bem-estar da população no
cotidiano perpassa pelas melhorias no transporte público. Outrossim, para além da
produção acadêmica, o mais importante é que possa contribuir para a atuação política
de sindicatos, comitês, frentes e outras organizações que pautem e lutem pelo acesso
ao transporte público de qualidade, saúde mental e o acesso à cidade.
22

Referências bibliográficas

ARAÚJO, M. R. M., OLIVEIRA, J. M., JESUS, M. S., SÁ, N. R., SANTOS, P. A. C., e
LIMA, T C. Transporte público coletivo: discutindo acessibilidade, mobilidade e
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MAIA, Heribaldo. Neoliberalismo e sofrimento psíquico: o mal-estar nas


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MANZATO, Antônio José; SANTOS, Adriana Barbosa. A elaboração de questionários


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desenvolvimento sustentável no Brasil. Disponível em: https://brasil.un.org/pt-
br/sdgs/11

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