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TEMA 11.

Identificação do Processo no Sistema Constitucional de Direitos e Garantias


Fundamentais. O processo constitucional como instrumento de interpretação de institutos
jurídicos.

O processo, no sistema constitucional de direitos e garantias fundamentais, pode ser


observado sob dois pontos de vista: de um lado, o processo funciona como um meio para
concretização dos direitos fundamentais; e do outro, existe um direito fundamental ao
processo justo (no qual, os direitos são efetivados), previsto na Constituição Federal.

O processo, enquanto conjunto de atos praticados pelas partes, teve a sua concepção
modificada pela promulgação da Constituição Federal de 1988 e pela instituição do estado
democrático de direito.

O estado democrático de direito, segundo Marco Antonio Marques da Silva 1 “tem


como fundamentos a soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa humana, os valores sociais
do trabalho e da livre iniciativa e o pluralismo”, e a Constituição Federal, enquanto norma
fundamental e superior deste estado, traz no seu corpo normativo valores e normas que visam
a efetivação desses preceitos em todo o ordenamento jurídico nacional. Assim, a Constituição
ao ser promulgada, não só modificou a carta que regia o estado nacional, como também
impôs uma reinterpretação das normas, conceitos e institutos jurídicos já existentes.

Assim, o ordenamento jurídico nacional foi reinterpretado sob o viés constitucional. E


o processo, por sua vez, passou ter como direcionamento a busca pela concretização dos
preceitos constitucionais, passando por uma reinterpretação de seus principais institutos.

O processo, nesse contexto, conforme preceitua o professor Marco Antonio Marques


da Silva2, deve ser compreendido como a ponte por excelência entre o cidadão e o poder
jurisdicional, devendo ser concebido como um “instrumento de atuação política, como um
modo de provocar a atuação do Estado ou de particulares para uma efetivação dos objetivos

1 DA SILVA, Marco Antonio Marques. O processo como ponte entre o cidadão e o poder
jurisdicional. Cadernos Jurídicos, São Paulo, ano 17, nº 44, p. 9-18, Julho-Setembro/2016. p.9.
2 DA SILVA, Marco Antonio Marques. O processo como ponte entre o cidadão e o poder
jurisdicional. Cadernos Jurídicos, São Paulo, ano 17, nº 44, p. 9-18, Julho-Setembro/2016. p.11.
politicamente definidos pela comunidade”, expressos na constituição, não procurando apenas
promover o acesso ao poder jurisdicional enquanto instituição pertencente ao estado, mas
sobretudo como forma de efetivação de uma ordem jurídica justa. Assim, compete ao poder
jurisdicional assegurar, por meio do processo, o cumprimento das normas constitucionais
buscando sempre manter e promover a proteção da dignidade da pessoa humana.

Compreendida a atual conformação do processo, faz-se necessário compreender o


direito fundamental a um processo justo. O artigo quinto, inciso LIV preceitua que “ninguém
será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;” e o inciso XXXV
prevê que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”
instituindo expressamente um direito fundamental ao processo justo no direito brasileiro.

Segundo Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero, o direito fundamental ao


processo justo “constitui princípio fundamental para organização do processo no Estado
Constitucional”3. Trata-se de um direito de natureza processual, que direciona a aplicação das
normas pelo magistrado, o comportamento das partes envolvidas no processo, a produção
legislativa e a organização judiciária, bem como que versa sobre a forma de interpretação das
normas.

E em que consistiria o devido processo legal? Segundo Luiz Guilherme Marinoni e


Daniel Mitidiero4, o devido processo legal é aquele pautado pela colaboração do juiz para
com as partes, em regime de igualdade, e, sobretudo um processo:

“capaz de prestar tutela jurisdicional adequada e efetiva, em que as partes


participam em pé de igualdade e com paridade de armas, em contraditório,
com ampla defesa, com direito à prova, perante juiz natural, em que todos os
seus pronunciamentos são previsíveis, confiáveis e motivados, em
procedimento público, com duração razoável e, sendo o caso, com direito à
assistência jurídica integral e formação de coisa julgada”.

Fixadas estas premissas, o processo se apresenta como um instrumento para


concretização de direitos e interpretação de institutos. No que tange à concretização de

3 SARLET, Ingo Wolfgang; MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Curso de direito
constitucional. 8. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019. Acesso online.
4 SARLET, Ingo Wolfgang; MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Curso de direito
constitucional. 8. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019. Acesso online.
direitos, Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero 5 explicam que “no Estado
Constitucional, o processo só pode ser compreendido como o meio pelo qual se tutelam os
direitos na dimensão da Constituição”, uma vez que por meio de um processo justo é possível
concretizar o direito fundamental eventualmente atingido e cuja tutela foi requerida perante o
judiciário.

Assim, o processo assume um caráter instrumental de concretização dos direitos


fundamentais e aplicação das normas jurídicas. Cândido Dinamarco 6 defende a
instrumentalidade do processo, o qual pode ser compreendido como um instrumento de tutela
jurídica, social e política dos indivíduos - ou seja, o processo para o jurista é destinado a
tutela das pessoas no escopo (contexto) jurídico, social e também político (escopos) - sendo
estes objetos de tutela que o legitimam enquanto instituição.

Nesse sentido, defende Cândido Dinamarco que: " a perspectiva instrumentalista do


processo é teleologia por definição e o método teleológico conduz invariavelmente à visão do
processo como um instrumento predisposto à realização dos objetivos eleitos" 7. Objetivos,
conforme supracitado, que estão dispostos na Constituição Federal, sobretudo nos valores e
princípios constitucionais. Assim, a compreensão do processo enquanto instrumento
teleológico permite/facilita o direcionamento do sistema processual e a adequação dos seus
institutos para concretização dos preceitos constitucionais.

Referências
DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo. 14 ed. Editora Malheiros:
São Paulo, 2009.

SARLET, Ingo Wolfgang; MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Curso de


direito constitucional. 8. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019. Acesso online.

DA SILVA, Marco Antonio Marques. O processo como ponte entre o cidadão e o poder
jurisdicional. Cadernos Jurídicos, São Paulo, ano 17, nº 44, p. 9-18, Julho-Setembro/2016.

5 SARLET, Ingo Wolfgang; MARINONI,Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Curso de direito


constitucional. 8. ed. São Paulo : Saraiva Educação, 2019. Acesso online.
6 DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo. 14 ed. Editora Malheiros: São
Paulo, 2009.
7 DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo. 14 ed. Editora Malheiros: São
Paulo, 2009. p. 178

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