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F228 20 Calor
F228 20 Calor
F228 20 Calor
1
CONCEITOS
2
1.1. INTERAÇÕES TÉRMICAS 3
Nós utilizamos os termos quente e frio, calor e temperatura baseados em nossa experiência
cotidiana. Sabemos que para aumentar a temperatura da água até o seu ponto de ebulição é
preciso aquece-la e isso requer energia. O ramo da fı́sica que lida com esses conceitos, deno-
minado termodinâmica (do grego, therme significa “calor” e e dunamis, que significa “força”),
foi desenvolvido no inı́cio do século 19 para descrever o funcionamento das máquinas a va-
por. Os conceitos de entropia e temperatura absoluta introduzidos no capı́tulo 19 do livro
texto ou capı́tulo 8 das notas de aula foram desenvolvidos como consequência desse trabalho.
Neste capı́tulo, conectamos as idéias estatı́sticas do capı́tulo 8 aos conceitos macroscópicos
de temperatura, pressão e volume.
Figura 1.1: Quando um forno a gás aquece uma panela de água, a energia flui do local com
temperatura mais alta para o com temperatura mais baixa.
4 CAPÍTULO 1. CALOR (ENERGIA TRANSFERIDA TERMICAMENTE)
Figura 1.2: Quando uma panela de água é aquecida, o diagrama de energia de um sistema
que compreende apenas água é desequilibrado.
Como podemos contabilizar esse aumento na energia do sistema? Embora existam forças
externas exercidas sobre a água - a força da gravidade e uma força normal exercida pela
panela na água - nenhuma das forças causa qualquer deslocamento e, portanto, não realiza
trabalho no sistema.
Consequentemente, o diagrama de energia da Figura 1.2 está desequilibrado: As mudan-
ças de energia não são iguais ao trabalho feito no sistema. A razão para esse desequilı́brio
é que esse diagrama de energia não leva em consideração a energia transferida para o sis-
tema pelo aquecimento. Para fazer o diagrama completo, precisamos adicionar uma barra
que representa a energia transferida para o sistema pelas interações térmicas entre a chama,
a panela e a água. A quantidade de energia transferida por interações térmicas (“termica-
mente”) é denotada pela letra Q (Figura 1.3). A lei da conservação de energia exige que
a mudança na energia do sistema seja igual à energia transferida para ele, então a altura
da barra que representa Q na Figura 1.3 deve ser igual à altura da barra que representa o
aumento da energia térmica.
Figura 1.3: Para completar o diagrama de energia da Figura 1.2, devemos adicionar uma
barra para contabilizar o calor transferido para o sistema (representada pelo sı́mbolo Q).
1.1. INTERAÇÕES TÉRMICAS 5
Figura 1.4: Quando gases de diferentes temperaturas são colocados em contato, há uma
transferência de calor do gás mais quente para o mais frio até que as temperaturas dos dois
gases sejam iguais.
Vamos examinar em mais detalhes a diferença entre transferir energia para um sistema
realizando trabalho nele (isto é, através de interações mecânicas) e pela transferência de
calor para ele. Na Figura 1.5 (a) um pistão com mola comprime um gás ideal em um vo-
lume menor, realizando trabalho no gás. Devemos ignorar qualquer atrito entre o pistão e
as paredes do recipiente. O gás ideal é isolado termicamente; ou seja, não está interagindo
termicamente com seus arredores. Um processo que não envolve nenhuma transferência de
calor é chamado de processo adiabático (Q = 0).
Figura 1.5: Um pistão realiza trabalho em um gás ideal isolado termicamente, aumentando
a temperatura do gás.
Figura 1.6: Um pistão estacionário não muda a velocidade de uma partı́cula do gás que colide
com ele, mas um pistão em movimento sim.
Observe que na 1.5 (a) o volume diminui. Durante essa diminuição, a força exercida pelo
pistão no gás e o deslocamento da força estão na mesma direção. Assim, o trabalho feito no
gás é positivo. Se o pistão tivesse se movido na direção oposta (expandindo o volume), o
trabalho feito no gás teria sido negativo.
Resumindo as informações das Figuras 1.4 e 1.5, vemos que existem duas maneiras de
transferir energia para um sistema: mecanicamente (fazendo trabalho no sistema) e termi-
camente. Ambos os tipos de transferência podem ocorrer simultaneamente. Nesse caso a
mudança na energia do sistema ∆E é igual a soma do trabalho realizado no sistema, W, e o
calor Q trasnferido para ele.
Vamos agora voltar nossa atenção para a transformação de um sistema de um macroes-
tado para outro. Tal transformação é chamada de processo, e se o processo for realizado
de forma que o sistema permaneça muito próximo do equilı́brio em todos os instantes do
processo, diz-se que o processo é quase-estático.
A Figura 1.7 (a) mostra a expansão de um volume de gás em um cilindro. Para tornar
a expansão quase-estática, o pistão é movido lentamente para que o gás sempre preencha
uniformemente todo o espaço disponı́vel, e cada partı́cula tem sua cota de equipartição da
energia térmica. Em cada quadro mostrado no desenho, o gás está em um estado diferente,
mas cada estado é um estado de equilı́brio. Em um processo quase-estático, portanto, a
pressão pode mudar durante o processo, mas em qualquer instante a pressão tem um valor
uniforme e bem definido em todas as localizações do volume de gás. O mesmo é verdade para
a temperatura: A temperatura final pode ser diferente da inicial, mas a qualquer momento
a temperatura tem um valor uniforme e bem definido em todos os locais do volume de gás.
Não há locais onde a pressão seja maior e não há pontos mais quentes do que outros. Na
Figura 1.7 (a), a entropia muda conforme o gás se expande (porque a entropia de um gás
ideal muda com o volume e a temperatura), mas a cada instante tem o valor máximo para
esse estado de equilı́brio.
8 CAPÍTULO 1. CALOR (ENERGIA TRANSFERIDA TERMICAMENTE)
Figura 1.7: Um pistão estacionário não muda a velocidade de uma partı́cula do gás que colide
com ele, mas um pistão em movimento sim.
Suponha, no entanto, que o pistão se move com uma velocidade rápida, conforme ilus-
trado na Figura 1.7 (b). O movimento do pistão é tão rápido que o gás não consegue acom-
panhar. No quadro 2, por exemplo, o gás ainda ocupa uma grande parte do volume original.
Consequentemente, a pressão na parte inferior do cilindro é quase a mesma que era no qua-
dro 1, embora seja quase zero no topo, onde ainda temos vácuo. Apesar do pistão atingir sua
posição final no quadro 3, o gás demora outros três quadros antes de ser uniformemente dis-
tribuı́do e estar em equilı́brio. Nos quadros 2-5 da Figura 1.7 (b), o gás não está em equilı́brio
e, portanto, a entropia não é máxima. Como as partı́culas em um gás normalmente se mo-
vem em velocidades muito grandes, elas se redistribuem rapidamente. Assim, na prática,
mesmo que um pistão se mova rapidamente como na Figura 1.5, o processo resultante ainda
pode ser quase-estático.
Ponto de verificação 20.3: Suponha que você reproduzisse os dois filmes mos-
trados na Figura 1.7 para trás. Os processos resultantes seriam possı́veis?
Vamos agora examinar como a entropia muda quando a energia é transferida para um
sistema em um processo quase-estático. Primeiro considere o processo mostrado na Figura
1.4, onde calor é trocado entre dois gases. O calor recebido pelo gás A é positivo (Q > 0).
A temperatura do gás A aumenta. Portanto, a entropia do gás aumenta. O inverso ocorre
para o gás B. Q é negativo para o gás B, a temperatura de B diminui e, portanto, sua entropia
diminui. Conseqüentemente, o sinal da mudança de entropia de um sistema é o mesmo que
o sinal de Q para esse sistema:
Vamos agora determinar o que acontece com a entropia de um sistema quando o trabalho
é feito na ausência de qualquer troca de calor (Q = 0). Considere, por exemplo, a compressão
quase-estática do gás isolado termicamente na Figura 1.5 novamente. Como o pistão realiza
trabalho no gás, a energia térmica do gás aumenta, mas ao mesmo tempo o volume diminui.
No capı́tulo anterior vimos que um aumento na energia térmica de um sistema aumenta
sua entropia. Uma diminuição no volume do sistema, no entanto, diminui a entropia, de tal
forma que não podemos dizer imediatamente o que acontece com a entropia do gás à medida
que é comprimido.
Vamos então considerar o sistema da Figura 1.5 (a) fechado. Diferente do que ocorre
quando as temperaturas se igualam na Figura 1.4, que é um processo irreversı́vel, a com-
pressão do gás e a expansão da mola são reversı́veis. Como o processo é quase-estático, o
sistema permanece em equilı́brio em todos os instantes durante a compressão e, portanto, a
lei da entropia nos diz que a entropia do sistema (fechado) não muda: ∆S = 0.
Como estamos interessados no processo (que ocorre no gás), dividimos o sistema em
duas partes: o gás e o pistão com mola (ou só pistão para abreviar). Como a entropia é
uma quantidade extensiva, podemos escrever a mudança da entropia do sistema como ∆S =
∆Sgas + ∆Spistao = 0.
No pistão, a energia potencial é convertida em energia cinética. Independentemente da
velocidade do pistão e da configuração da mola, há apenas uma maneira de distribuir a
energia. Portanto, a qualquer momento, o número de microestados do pistão com mola é 1,
e assim a entropia do pistão com a mola não muda: ∆Spistao = 0.
Se ∆Spistao = 0, então a entropia do gás também não pode mudar: ∆Sgas = 0. Assim,
podemos concluir que em um processo quase-estático durante o qual realizamos trabalho
em um gás sem transferir calor para ele (Q = 0), a entropia do gás não muda. Generalizando
essa ideia para qualquer tipo de sistema passando por um processo adiabático quase-estático,
podemos afirmar:
Ponto de verificação 20.4: Qual dos seguintes sistemas passa por um processo
quase-estático? (a) Um balão contendo gás estoura dentro de um recipiente a
vácuo. Sistema: recipiente, gás e balão. (b) Uma xı́cara de café esfria. Sistema:
café. (c) Uma amostra de gás comprimido em um cilindro equipado com um
pistão pesado começa a expandir, empurrando o pistão para fora. Sistema: gás.
(d) Um cubo de gelo derrete em um copo de água quente. Sistema: água e cubo
de gelo.
Figura 1.8: Processo de calibragem de um termômetro de gás imergindo seu bulbo no gelo e
depois em água fervente.
ou seja, é válido desde que a pressão, o volume e a temperatura absoluta sejam tais que pos-
samos ignorar a estrutura das partı́culas que compôe o gás e as interações entre elas (exceto
colisões). Nenhum gás é ideal, mas muitos gases podem se aproximar do comportamento
ideal. Para um gás diluı́do de átomos de hélio, por exemplo, as condições para o comporta-
mento ideal são satisfeitas mesmo em temperaturas muito baixas.
A Figura 1.9 ilustra o princı́pio básico de um termômetro de gás ideal, que mede a
pressão em uma amostra de gás mantida fechada em um volume fixo. Um recipiente cheio
de um gás a baixa pressão é conectado a um tubo fino e flexı́vel em forma de U que contém
mercúrio. A extremidade do tubo oposto ao recipiente cheio de gás é tampada e evacuada. A
diferença na altura entre os nı́veis de mercúrio nos dois braços do tubo determina a pressão
do gás no recipiente. Para um valor fixo de V, a lei do gás ideal, P = N kB T /V , nos diz que a
pressão P é proporcional à temperatura absoluta T.
Desde que o nı́vel de mercúrio no braço esquerdo esteja sempre mantido na marca de
referência, o volume V do gás permanece fixo e altura h do mercúrio no braço direito mede
a pressão no gás em um volume constante. Nessas condições, a altura h é uma medida direta
da pressão e, portanto, da temperatura absoluta T. A lei dos gases ideais nos diz que em
T = 0 a pressão é zero, o que significa que há um vácuo acima de ambos os braços do tubo
em forma de U. Então sabemos que em T = 0 a altura h deve ser zero.
Para calibrar o termômetro e definir a unidade de temperatura absoluta, precisamos en-
contrar algum fenômeno térmico reprodutı́vel e atribuir a ele um valor fixo. O padrão atual
de temperatura absoluta é baseado no ponto triplo da água - as condições únicas sob as quais
a água na forma lı́quida, na forma de gelo sólido e na forma de vapor (um gás) coexistem em
equilı́brio. Para relacionar a temperatura absoluta com definições históricas de temperatura,
a temperatura absoluta no ponto triplo da água é definida em 273,16 K:1
Ttp ≡ 273.16K
Uma vez que a altura da coluna de mercúrio em um termômetro de gás ideal foi medida
no ponto triplo da água, podemos traçar uma linha reta entre a origem em T = 0, onde
sabemos que h deve ser zero, e o ponto triplo. Com isso podemos determinar qualquer outra
temperatura absoluta simplesmente lendo a temperatura absoluta correspondente à altura
medida (Figura 1.11). Vale destacar que a curva é linear: desde que o gás se comporte como
um gás ideal e seja mantido em volume constante, a pressão (e portanto, a altura da coluna
de mercúrio) é diretamente proporcional à temperatura absoluta.
1 O ponto triplo da água ocorre a uma temperatura de 0,01◦ C (aproximadamente 32◦ F) e a uma pressão de
610 Pa (cerca de um centésimo da pressão atmosférica).
1.2. MEDIDAS DE TEMPERATURA 13
Figura 1.11: O gráfico de altura por temperatura é linear para um termômetro de gás ideal.
O termômetro é calibrado no ponto triplo da água. Qualquer temperatura pode então ser
lida no gráfico.
Na Figura 1.11 assumimos que podemos extrapolar a relação linear entre pressão e tem-
peratura da lei dos gases ideais até zero. Na prática, é impossı́vel para qualquer gás atingir
essa temperatura porque como a temperatura diminui, o gás condensa em um lı́quido. De
todos os gases, o hélio se torna lı́quido na temperatura mais baixa (4,22 K, que corresponde
a -269◦ C ou -452◦ CF), e assim seu alcance útil se estende abaixo de qualquer outro gás. A
temperatura zero (T = 0) é chamada de zero absoluto. Qualquer sistema no zero absoluto
tem entropia zero (ou seja, tem apenas um microestado disponı́vel), e sua energia térmica é
mı́nima. O zero absoluto, portanto, é o limite da temperatura baixa.
14 CAPÍTULO 1. CALOR (ENERGIA TRANSFERIDA TERMICAMENTE)
Ponto de verificação 20.5: (a) Durante um certo dia, a temperatura externa varia
entre 60◦ F e 80◦ F. Qual é o intervalo correspondente em graus Celsius e em
Kelvins? (b) A temperatura do filamento de uma lâmpada incandescente é de
cerca de 2.800 K. Qual é a temperatura correspondente em graus Celsius e em
graus Fahrenheit? (Suponha apenas dois dı́gitos significativos em 2800 K.)
Ponto de verificação 20.6: Qual é maior em cada par: (a) a energia térmica
de uma piscina de água ou de um copo de água à mesma temperatura, (b) a
capacidade térmica de uma piscina de água ou de um copo de água na mesma
temperatura, (c) a energia térmica de um copo com água fria morna?
2 Estritamente falando, essa quantidade é a capacidade térmica média. Entretanto, como a capacidade térmica
não depende muito da temperatura, podemos omitir a palavra “média”.
1.3. CAPACIDADE TÉRMICA 15
Por que os valores da Tabela 1.13 são tão diferentes uns dos outros? O que determina o
calor especı́fico de um material? Lembre-se do capı́tulo anterior que quando um objeto está
em equilı́brio térmico, sua energia térmica é igualmente distribuı́da entre todas as partes
do objeto que podem armazenar energia. Claramente, diferentes materiais têm diferentes
habilidades para armazenar energia térmica. Para entender essas diferenças, vamos primeiro
examinar a capacidade térmica de um gás ideal.
No capı́tulo anterior descobrimos que a energia térmica de um gás monoatômico ideal
é dada por Eth = 32 N kB T . Cada um dos N átomos de gás ideal, portanto, tem uma quan-
tidade média de energia térmica igual a 23 kB T , onde kB = 1, 381 × 10−23 J/K é a constante
de Boltzmann. Nós chegamos a esse resultado considerando a energia cinética associada
ao movimento de um átomo do gás ideal ao longo das direções x, y, e z. O movimento ao
longo de cada eixo é chamado de grau de liberdade. Como são três eixos independentes
para translação, existem três “graus de liberdade translacionais”. Em equilı́brio térmico, a
equipartição de energia faz com que cada grau de liberdade translacional de cada átomo
contribua com uma energia de 12 kB T , de tal forma que temos 23 kB T por átomo.
Se aumentarmos a temperatura de um gás ideal em 1 K, a a energia térmica do gás au-
menta em 23 N kB (1K) e em 32 kB (1K) para cada átomo. Se essa energia for transferida termica-
mente para o gás, esperamos que a capacidade térmica por átomo seja igual a 32 kB .
A Tabela 1.14 lista as capacidades térmicas por partı́cula, denotadas pela letra C maiúscula,
em unidades de kB para várias substâncias. Como você pode ver, é de fato 3/2 para gases mo-
16 CAPÍTULO 1. CALOR (ENERGIA TRANSFERIDA TERMICAMENTE)
noatômicos, como hélio e argônio, mas se desvia desse valor para gases poliatômicos. Para
o hidrogênio, por exemplo, o valor é mais perto de 5/2 do que de 3/2, sugerindo que uma
molécula de hidrogênio tem dois graus de liberdade adicionais que podem armazenar ener-
gia.
A razão para essa discrepância é que tratamos cada partı́cula do gás ideal como um átomo
que possui apenas energia cinética associada ao movimento translacional ao longo de três
eixos independentes. Uma molécula de hidrogênio em forma de haltere (Figura 1.15 (a)),
no entanto, também tem energia associada ao movimento rotacional. A molécula pode gi-
rar em torno de três eixos independentes (Figura 1.15 (b)). A rotação em torno do eixo z
não armazena nenhuma energia apreciável, porque a inércia rotacional sobre esso eixo é
desprezivelmente pequena.3 Assim, cada molécula de hidrogênio tem dois “graus de liber-
3 Embora os átomos tenham um diâmetro de cerca de 10−10 m e sejam separados por quase a mesma distância,
quase toda a massa está concentrada no núcleo, que tem um diâmetro de cerca de 10−15 m. Portanto, a “barra”
conectando os dois átomos no final do haltere H2 é cerca de 105 vezes maior que o diâmetro dos átomos, e assim
a inércia rotacional sobre o eixo que atravessa o comprimento da barra do haltere é essencialmente zero.
1.3. CAPACIDADE TÉRMICA 17
dade rotacionais” adicionais para, totalizando cinco (três translacionais e dois rotacionais).
Se cada grau de liberdade armazena 1/2kB T , devemos obter uma energia por molécula de
5/2kB T . Conseqüentemente, esperamos uma capacidade térmica por partı́cula de 5/2kB , em
bom acordo com o valor experimental de 2,47 kB.
Figura 1.15: Uma molécula diatômica tem energia associada com rotações em torno de dois
eixos, assim como energia associada com translações ao longo de três eixos.
A Figura 1.17 mostra como, para um gás de moléculas diatômicas de hidrogênio, a ca-
18 CAPÍTULO 1. CALOR (ENERGIA TRANSFERIDA TERMICAMENTE)
pacidade térmica por partı́cula em unidades de kB varia com a temperatura. Observe como
a capacidade térmica por partı́cula em unidades de kB é próximo a 2,5 (o valor listado na
Tabela 1.14) apenas em torno da temperatura ambiente. À medida que a temperatura é re-
duzida para cerca de 50 K, a capacidade térmica por partı́cula em unidades de kB diminui
para 1,5 ou (3/2). Por que o gás hidrogênio se comporta como um gás monoatômico ideal
em baixas temperaturas? Perguntando de outra forma, por que o argumento dos graus de
liberdade rotacional apresentado acima para o hidrogênio não se mantem em baixas tem-
peraturas? Os dados experimentais sugerem que, em baixas temperaturas, os movimentos
rotacionais das moléculas não contribuem para sua energia térmica.
A razão para esse comportamento é que, de acordo com a mecânica quântica, a ener-
gia vibracional e rotacional vem em pequenas quantidades fixas, chamadas quanta. Abaixo
de cerca de 100 K, a parcela de equipartição 21 kB T é menor que o quantum de energia ne-
cessário para fazer uma molécula girar em torno de um dos possı́veis eixos de rotação. Por-
tanto, quando uma molécula colide com outra, a quantidade de energia transferida durante
a colisão não é grande o suficiente para provocar uma rotação em nenhuma das moléculas
(Figura 1.18 (a)). Acima de 100 K, as moléculas de hidrogênio têm energia cinética suficiente
para provocar rotações umas nas outras (Figura 1.18 (b)). Em temperatura ambiente (cerca
de 298 K), o valor 21 kB T é igual a vários quanta rotacionais, e assim a equipartição de energia
inclui as duas rotações independentes das moléculas de hidrogênio, conforme descrito no
texto que precede o Ponto de Verificação 20.7.
1.3. CAPACIDADE TÉRMICA 19
Figura 1.18: Colisões entre moléculas de hidrogênio. (a) Em baixas temperaturas (T < 100K),
as moléculas não têm energia cinética suficiente para causar quaisquer alterações no movi-
mento rotacional. (b) Em temperaturas mais altas, as moléculas pode ser colocadas em mo-
vimento rotacional.
A Figura 1.17 mostra que em temperaturas acima de 1000 K, a capacidade térmica por
partı́cula aumenta ainda mais. Nessas temperaturas, a quota de equipartição torna-se com-
parável com o quantum associado a outro tipo de grau de liberdade: vibração dos dois
átomos de hidrogênio ao longo do eixo da molécula (Figura 1.19). Embora haja apenas um
eixo para este tipo de movimento na molécula de hidrogênio, esse movimento vibracional
contribui com dois graus de liberdade porque envolve energia potencial e cinética, com cada
uma podendo armazenar uma quantidade de energia 12 kB T . Assim, o número de graus de
liberdade para a molécula de hidrogênio é sete (três translacionais, dois rotacionais e dois vi-
bracionais). Se cada grau de liberdade contribui com 12 kB T , esperamos uma energia térmica
por molécula de 27 kB T . Na verdade, os experimentos mostram que a capacidade térmica por
molécula de hidrogênio se aproxima de 27 kB em torno de 3000 K. Para resumir:
Assim, para um gás em que cada partı́cula tem d graus de liberdade, esperamos que a
capacidade térmica por partı́cula seja igual a d2 kB .
20 CAPÍTULO 1. CALOR (ENERGIA TRANSFERIDA TERMICAMENTE)
Podemos aplicar o mesmo tratamento para as vibrações dos átomos em um cristal sólido.
Considere, por exemplo, o arranjo cúbico simples de átomos mostrados na Figura 1.20. Cada
átomo é “preso” no lugar por ligações elásticas com os átomos vizinhos, de tal forma que não
há graus de liberdade translacionais e rotacionais. No entanto, cada átomo pode vibrar ao
longo de três eixos independentes do cristal. Como vimos, cada vibração contribui com
dois graus de liberdade e, portanto, cada átomo contribui com seis graus de liberdade, cada
um armazenando 21 kB T de energia térmica. Assim, esperamos uma capacidade térmica por
átomo de 3kB em bom acordo com os valores para uma série de sólidos cristalinos simples
(ver Tabela 1.14).
Figura 1.20: Cada átomo em um cristal pode vibrar ao longo de três eixos.
A Figura 1.21 mostra a dependência da capacidade térmica por átomo em função da tem-
peratura para vários sólidos. Novamente vemos que os efeitos quânticos afetam a capacidade
térmica. Abaixo de certas temperaturas, a capacidade térmica de cada sólido diminui para
zero porque 21 kB T é menor que o quantum de energia associado com as vibrações.
1.4. DIAGRAMAS PV E PROCESSOS 21
Figura 1.21: Dependência da capacidade térmica por átomo em função da temperatura para
uma série de sólidos.
Vimos que um sistema pode trocar energia com seu ambiente de duas maneiras: por trabalho
feito nele e por uma transferência de calor. A troca de energia muda o estado do sistema.
Como vimos na primeira seção, o sistema pode ficar mais quente, ou expandir ou a pressão
pode aumentar. Nessa seção vamos examinar a interação entre as trocas de energia e as
mudanças no estado de um gás ideal.
O estado de equilı́brio de um gás pode ser completamente especificado por quatro gran-
dezas macroscópicas mensuráveis que discutimos no capı́tulo anterior: a pressão P do gás,
seu volume V, sua temperatura T, e o número de moléculas N naquele volume. Geralmente,
devemos considerar amostras que consistem em um número N fixo de partı́culas, então po-
demos representar o estado de equilı́brio de um gás pelo tripleto de valores (P, V, T).
Como vimos no capı́tulo anterior, para um gás ideal, as quatro variáveis macroscópicas
22 CAPÍTULO 1. CALOR (ENERGIA TRANSFERIDA TERMICAMENTE)
estão relacionadas umas às outras pela equação: P = (N /V )kB T .4 Isso significa que se o
número de partı́culas em um gás é fixo, precisamos apenas de duas variáveis para especificar
completamente o estado de equilı́brio de um gás. Se escolhermos P e V, então o estado de
equilı́brio de uma quantidade fixa de gás ideal pode ser representada por um ponto em um
diagrama PV, como os mostrados na Figura 1.22.
Podemos ler o par de valores (P, V) no diagrama e determinar a temperatura a partir da lei
dos gases ideais (assumindo que sabemos N). Depois de sabermos a temperatura, podemos
calcular a energia térmica e a entropia do gás.
A lei dos gases ideais implica que todos os estados de equilı́brio (P, V) a uma temperatura
fixa encontram-se em uma curva tal que o produto PV é constante ou, para expressar essa
informação de outra forma, P ∝ 1/V . Essas curvas são chamadas de isotérmicas. A Figura
1.22 (a) mostra uma série de isotermas, cada uma correspondendo a um temperatura fixa e,
portanto, uma energia térmica fixa do gás. As isotermas que são mais altas no diagrama PV
representam temperaturas mais altas e maior energia térmica.
Outra famı́lia importante de curvas associadas ao diagrama PV para um gás ideal é mos-
trada na Figura 1.22 (b). Cada curva nessa famı́lia conecta todos os pontos que correspondem
a estados de equilı́brio que têm a mesma entropia. Tais curvas são chamados de isentrópicas.
4 Para um gás não ideal, as quatro variáveis macroscópicas também estão relacionadas, mas a relação é mais
complicada do que aquela expressa pela lei dos gases ideais.
1.4. DIAGRAMAS PV E PROCESSOS 23
Processos que não são quase-estáticos não podem ser representados em um diagrama
PV. Para tais processos, podemos apenas mostrar os pontos que correspondem aos estados
de equilı́brio inicial e final.
5 Para simplificar, devemos omitir a palavra equilı́brio ao nos referirmos a estados apresentado por pontos
especı́ficos em diagramas PV. Por exemplo, “estado 1” significa “o estado de equilı́brio representado pelo ponto
1.”
24 CAPÍTULO 1. CALOR (ENERGIA TRANSFERIDA TERMICAMENTE)
Existem infinitas maneiras de mudar o estado de um gás. A Figura 1.24 mostra dois pro-
cessos quase-estáticos que transformam um gás do mesmo estado inicial i para o mesmo es-
tado final estado f. Como os dois processos têm os mesmos estados inicial e final de equilı́brio
e como cada estado tem uma energia térmica e entropia bem definidas, a mudança nessas
duas quantidades são independentes do processo. Para um gás ideal cujo centro de massa
está em repouso, não há mudanças na energia cinética, energia potencial ou na fonte de ener-
gia. Assim, a mudança na energia do gás é igual à mudança da energia térmica e podemos
afirmar:
Observe que essa declaração é válida mesmo para processos que não sejam quase-estáticos
ou processos irreversı́veis entre estados de equilı́brio. As mudanças na energia térmica e en-
tropia dependem apenas dos estados inicial e final - o que acontece entre não importa. Se
a mudança na energia térmica é independente do processo, então a energia transferida para
o sistema (W + Q) também deve ser independente do processo. W e Q, cada um, também
independem do processo?
Figura 1.24: Dois processos quase-estáticos que transformam um gás de um estado inicial i
para um estado final f.
Figura 1.25: O trabalho feito em um gás durante um processo quase-estático é igual à área
sob o caminho no diagrama PV que representa esse processo.
Compararando as áreas hachuradas nas partes (a) e (b) da Figura 1.25, vemos que a quan-
tidade de trabalho realizado em um gás é diferente nos dois gráficos. Esses gráficos repre-
sentam os processos A e B da Figura 1.24, nos dizendo que é necessário mais trabalho para
realizar o processo B do que o processo A. Diferentemente do que ocorre com mudanças de
calor durante o processo, a quantidade de trabalho realizada depende do caminho percor-
rido.
Ponto de verificação 20.10: (a) Para qual dos dois processos quase-estáticos
mostrados na Figura 1.24 há uma maior mudança na entropia? O calor transfe-
rido para o gás é o mesmo ao longo dos dois caminhos?
Como o Ponto de Verificação 20.10 deixa claro, o calor Q transferido para o sistema e o
trabalho W feito dependem do caminho percorrido.
A Figura 1.26 mostra quatro processos quase-estáticos importantes em gases ideais que
estudaremos na segunda parte deste capı́tulo. Quando a pressão do gás é mantida constante
durante um processo quase-estático, o caminho no diagrama PV é uma linha horizontal com
pressão fixa P; tal processo é chamado de isobárico. Quando o volume é mantido fixo, o
caminho é uma linha vertical, e o processo é denominado isocórico. Como o o volume não
muda, nenhum trabalho é feito no (ou pelo) gás em um processo isocórico (Figura 1.25 (d)).
Quando a temperatura é mantida fixa, o caminho segue ao longo de uma isotérma, e o pro-
cesso é denominado isotérmico. Como vimos no capı́tulo anterior, a energia térmica de um
gás ideal é proporcional à temperatura do gás e, portanto, em um processo isotérmico, a
energia térmica não muda. Quando a entropia é constante durante um processo, o cami-
nho encontra-se ao longo de uma curva isentrópica e o processo é denominado isentrópico.
Como vimos na primeira seção, a entropia de um sistema permanece constante durante pro-
cessos adiabáticos quase-estáticos e, portanto, esses processos são isentrópicos. Caminhos ao
longo de curvas isentrópicas, portanto, representam processos para os quais não há trocas
de calor no sistema (Q = 0). Curvas isentrópicas também são chamadas de adiabáticas, e
processos isentrópicos também são chamados de processos adiabáticos.6
6 Note que processos adiabáticos não são isentrópicos. Apenas processos quase-estáticos adiabáticos são
isentrópicos.
26 CAPÍTULO 1. CALOR (ENERGIA TRANSFERIDA TERMICAMENTE)
Figura 1.26: Quatro tipos de processos em que uma grandeza macroscópica é mantida fixa.
27
28 CAPÍTULO 1. CALOR (ENERGIA TRANSFERIDA TERMICAMENTE)
∆E = W + Q. (1.1)
Lembre-se de que essa lei é uma consequência direta da conservação de energia: a única
maneira pela qual a energia de um sistema pode mudar é pela transferência de alguma forma
de energia de ou para os arredores. Vamos primeiro considerar apenas situações em que o
sistema é um gás ideal e onde a energia cinética translacional, a energia potencial e a energia
da fonte do gás permanecem constantes (∆K = ∆U = ∆Es = 0). A lei da energia então se
reduz a
∆Eth = W + Q (gás ideal). (1.2)
A Equação ?? nos diz que a energia térmica de um gás monoatômico ideal consistindo de
N átomos é
3
Eth = N kB T (gás monoatômico ideal). (1.3)
2
Como vimos na Seção 3 deste capı́tulo, no equilı́brio térmico cada grau de liberdade de uma
partı́cula de gás ideal contribui com 12 kB T para a energia térmica da partı́cula. Para um gás
monatômico ideal, cada átomo tem três graus de liberdade, resultando no fator 3 na Eq. 1.3.
Generalizando esse resultado para um gás ideal com d graus de liberdade, temos
d
Eth = N k T (gás ideal). (1.4)
2 B
Quando a temperatura de uma amostra de gás ideal que contém um número fixo N de
partı́culas muda, a Eq. 1.4 nos diz que a energia térmica da amostra muda em um valor
d
∆Eth = N k ∆T . (1.5)
2 B
Como observamos na Seção 20.4, essa mudança na energia térmica depende apenas dos es-
tados de equilı́brio inicial e final e é independente do caminho percorrido do estado inicial
ao estado final. Para calcular o trabalho realizado em um gás, considere a situação mostrada
na Figura 1.28, com um pistão com área de superfı́cie A comprime quase estaticamente um
c . O trabalho
gás em um cilindro. O componente x da força exercida pelo pistão no gás é Fpgx
realizado por esta força externa no gás é
Z xf
c
W= Fpgx dx (1.6)
xi
A magnitude da força exercida pelo pistão no gás está relacionada à pressão P do gás pela
equação:
c
Fpg
P= (1.7)
A
1.5. MUDANÇA DE ENERGIA E TRABALHO 29
c = P .A. Se tomarmos o eixo x positivo para a direita como na Figura 1.28, teremos
ou Fpg
c c = −P A. Quando o pistão se move por uma distância dx, o volume do gás muda
Fpgx = −Fpg
em uma quantidade dV = A dx, e assim o trabalho feito no gás é
Z xf Z Vf
W =− P A dx = − P dV . (1.8)
xi Vi
Figura 1.28: Um pistão que possui uma área superficial A exerce uma força sobre um gás,
comprimindo-o.
A integral à direita do sinal de menos nesta expressão representa a área sob o caminho
percorrido no diagrama PV, como discutimos na Seção 20.4 (consulte a Figura 1.25). Se o pro-
cesso estiver na direção de aumentar o volume (expansão), a integral na Eq. 1.8 é positiva,
tornando o trabalho feito no gás negativo (Figura 1.25a e b). Se o processo for no sentido
de diminuir o volume (compressão), o trabalho realizado no gás é positivo (Figura 1.25c).
Quando a pressão é constante (ou seja, durante um processo isobárico quase-estático), pode-
mos extrair a pressão da integral, e o trabalho realizado no gás é
Z Vf
W = −P dV = −P (Vf − Vi ) = −P ∆V (processo isobárico quase-estático). (1.9)
Vi
Do ponto de verificação 20.13, vemos que o trabalho feito em um gás depende da maneira
como o gás é transformado de seu estado inicial para seu estado final.
30 CAPÍTULO 1. CALOR (ENERGIA TRANSFERIDA TERMICAMENTE)
Como vimos, a mudança na energia térmica para um gás ideal passando por algum pro-
cesso quase-estático é independente do processo e é dada pela Eq. 1.5. O ponto de verificação
20.13 e o Exemplo 20.5, entretanto, mostram que o trabalho feito no gás e o calor transferido
dependem do processo.
d
Q= N k ∆T (processo isocórico). (1.12)
2 B
Q
CV ≡ constant volume, (1.13)
N ∆T
onde aqui adicionamos um V subscrito para nos lembrar que este resultado é obtido em
volume constante. Substituindo a Eq. 1.12 nesta definição:
d
CV = k (1.14)
2 B
Observe que este resultado prediz que a capacidade de calor por partı́cula é determi-
nada pelo número de graus de liberdade, de acordo com os resultados experimentais que
discutimos na Seção 3.
32 CAPÍTULO 1. CALOR (ENERGIA TRANSFERIDA TERMICAMENTE)
Figura 1.32: Dois processos de gás ideais. O processo A é isocórico; o processo B não é.
Embora usemos a Eq. 1.5 para chegar à Eq. 1.15 para ∆Eth em condições isocóricas,
Eq. 1.15 é válida para todos os processos de gases ideais, não apenas os isocóricos. Para
ver por quê, considere duas amostras de N partı́culas de gás ideal passando pelos dois pro-
cessos da Figura 1.32. Ambas as amostras estão inicialmente na temperatura Ti e terminam
na temperatura Tf . O processo A é isocórico; o processo B é algum processo arbitrário.
Como a mudança de temperatura é a mesma para os dois processos, a Eq. 1.5 nos diz que
a mudança de energia térmica também deve ser a mesma. Isso significa que podemos usar
a Eq. 1.15 para calcular ∆Eth para qualquer processo, dada a mudança na temperatura ∆T
no processo e conhecendo o CV para o gás. Em contraste com a Eq. 1.5, que expressa a
mudança de energia térmica em termos do número de graus de liberdade de cada partı́cula
de gás ideal, Eq. 1.15 dá a mudança de energia térmica em termos de grandezas medidas
macroscopicamente.
de areia jogados no pistão para garantir que o processo seja quase-estático. O gás é isolado
termicamente de modo que Q = 0. O aumento da força exercida no pistão aumenta a pressão
no gás e diminui seu volume. O diagrama de energia correspondente para o volume de
gás ideal é mostrado na Figura 1.33b. O trabalho realizado pelo pistão no gás é positivo,
aumentando a energia térmica do gás. Porque Q = 0, Eq. 1.2 torna-se
O aumento da energia térmica significa que a temperatura do gás sobe mesmo que o gás
não esteja sendo aquecido. Durante uma compressão isentrópica, o trabalho realizado no
gás aumenta a temperatura do gás. Você deve ter notado este efeito ao usar uma bomba de
bicicleta: se você bombear vigorosamente, o ar na bomba - e, portanto, a bomba e a câmara
do pneu - fica visivelmente mais quente.
do gás e, de acordo com a lei do gás ideal, a pressão aumentaria. Como o pistão pode se
mover livremente, a pressão permanece constante e o gás se expande. Portanto, o gás atua
em seu ambiente. O diagrama de energia para o volume do gás ideal durante esse processo é
mostrado na Figura 1.34b. O aquecimento transfere energia para o gás (Q > 0), parte da qual
vai para o aumento da temperatura (e, portanto, a energia térmica do gás: ∆Eth > 0), e parte
da qual é usada pelo gás para fazer o trabalho em seu ambiente (W < 0).
Como esse processo está em pressão constante, podemos definir a capacidade de calor
por partı́cula em pressão constante em analogia à Eq. 1.13:
Q
CP = (pressão constante), (1.20)
N ∆T
A partir da lei dos gases ideais (Eq. ??), P V = N kB T , temos para os estados inicial e final
P Vi = N kB Ti e P Vf = N kB Tf . A mudança no volume é, portanto, ∆V = Vf − Vi = N kB ∆T /P , o
que significa que o trabalho feito no gás é, da Eq. 1.9,
W = −P ∆V = −N kB ∆T (1.22)
Agora temos todos os três termos na lei da energia para um gás ideal, ∆Eth = W + Q. A
Equação 1.15 fornece a mudança na energia térmica ∆Eth , Eq. 1.22 fornece o trabalho re-
alizado no gás W, e a Eq. 1.21 dá o calor Q transferido para o gás. Podemos usar essas
38 CAPÍTULO 1. CALOR (ENERGIA TRANSFERIDA TERMICAMENTE)
informações para obter uma expressão para CP para gases ideais. Substituindo as Eqs. 1.15, 1.21
e 1.22 na lei da energia para um gás ideal, obtemos
Dividindo por N ∆T , vemos que para um gás ideal, as capacidades térmicas por partı́cula
estão relacionadas pela expressão
Usando as Eqs. 1.14 e 1.25, podemos agora escrever a relação da capacidade de calor como
d
CP 2 + 1 kB 2
γ≡ = d
= 1+ (gás ideal). (1.26)
CV kB d
2
Para um gás ideal monoatômico, para o qual d = 3, a razão entre as capacidades térmicas é
γ = 5/3.
O diagrama de energia para o volume de gás ideal durante este processo isotérmico é
mostrado na Figura 1.36b. O pistão está trabalhando no gás (W > 0) e o calor é transferido do
gás (Q < 0). Como a temperatura é constante, não há alteração na energia térmica. Portanto,
a lei da energia para um gás ideal é 0 = W + Q, o que significa
O trabalho feito no gás pode ser encontrado substituindo P = N kB T /V da lei do gás ideal
na Eq. 1.8:
Z Vf Z Vf
N kB T dV
W =− dV = −N kB T (processo isotérmico) (1.29)
Vi V Vi V
Vf
!
W = −N kB T (ln Vf − ln Vi ) = −N kB T ln (processo isotérmico). (1.30)
Vi
Vf
!
Q = −W = N kB T ln (processo isotérmico). (1.31)
Vi
Figura 1.35: tabela 20.6: Lei da energia para um gás ideal e processos de gás ideal confinados
40 CAPÍTULO 1. CALOR (ENERGIA TRANSFERIDA TERMICAMENTE)
Ponto de verificação 20.18: Considere um gás ideal submetido aos dois proces-
sos representados na Figura 1.37 entre os mesmos estados inicial e final que se
encontram em uma isotérmica. No processo A, o gás é levado por meio de um
processo isocórico a um estado intermediário 1 e, então, por meio de um pro-
cesso isobárico, ao estado final. No processo B, o gás sofre uma transformação
isentrópica para um estado intermediário 2 e, em seguida, uma transformação
isobárica para o estado final. Qual processo tem o maior valor para (a) o traba-
lho feito no gás e (b) a magnitude do calor transferido para o gás?
Nesta seção, examinamos as mudanças de entropia que ocorrem para os quatro processos
quase-estáticos confinados discutidos nas duas seções anteriores. Lembre-se do capı́tulo
anterior que a entropia de um gás ideal monoatômico é determinada completamente pelo
volume e a temperatura do gás (Eq. ??):
3
S = N ln V + N ln T + constante (gás ideal monoatômico). (1.32)
2
42 CAPÍTULO 1. CALOR (ENERGIA TRANSFERIDA TERMICAMENTE)
Obtivemos essa expressão para um gás ideal monoatômico em que cada átomo tem três
graus de liberdade (Seção 3). O fator 3 em 3/2 nesta expressão vem das três dimensões do
espaço de velocidade entre as quais equiparticionamos a energia (Eq. ??). No caso mais geral
de um gás ideal com d graus de liberdade, substituı́mos o 3 por d:
d
S = N ln V + N lnT + constante (gás ideal). (1.33)
2
Durante um processo no qual o gás sofre uma transformação a partir de um estado inicial
de equilı́brio (Vi , Ti ) para um estado de equilı́brio final (Vf , Tf ), a entropia muda em uma
quantidade
Vf Tf
! !
d
∆S = N ln + N ln (gás ideal). (1.34)
Vi 2 Ti
1.8. MUDANÇA DE ENTROPIA EM PROCESSOS DE GASES IDEAIS 43
Para um processo isotérmico, Ti = Tf , e assim o segundo termo à direita é zero porque ln(1) =
0. A Equação 1.34 torna-se então
Vf
!
∆S = N ln (processo isotérmico ), (1.35)
Vi
um resultado que já obtivemos no capı́tulo anterior. Comparando este resultado com a
Eq. 1.31, vemos que podemos expressar a mudança de entropia para um processo isotérmico
como
Q
∆S = (processo isotérmico). (1.36)
kB T
Esta expressão nos permite calcular a mudança na entropia diretamente, uma vez que sabe-
mos a quantidade de calor transferido, permitindo-nos contornar a Eq. 1.34. A Equação 1.36
é aplicável apenas quando a temperatura é constante, entretanto. Para qualquer outro pro-
cesso, a Eq. 1.34 fornece a abordagem mais simples para calcular a mudança de entropia.
Para um processo isocórico, Vf = Vi , e assim a Eq. 1.34 se reduz a
Tf
!
d
∆S = N ln (processo isocórico) (1.37)
2 Ti
ou, substituindo da Eq. 1.14,
Tf
!
N CV
∆S = ln (processo isocórico) (1.38)
kB Ti
Ponto de verificação 20.19: Você pode usar a Eq. 1.36 calcular a mudança na
entropia para um processo isocórico?
Em um processo isobárico, ambos V e T mudam, mas os dois estão relacionados pela lei
dos gases ideais, P V = N kB T . Como P é constante em qualquer processo isobárico, temos
Vi = (N kB /P )Ti e Vf = (N kB /P )Tf . Portanto
Vf (N kB /P )Tf Tf
= = (processo isobárico). (1.39)
Vi (N kB /P )Ti Ti
Tf
! !
d
∆S = N 1 + ln (processo isobárico). (1.40)
2 Ti
Tf
!
N CP
∆S = ln (1.41)
kB Ti
a entropia aumenta. De fato, a partir do diagrama PV na Figura 1.34c, vemos que o estado
final deve estar em uma curva isentrópica mais alta do que o estado inicial, indicando que
a entropia do estado final é maior do que a entropia do estado inicial. Em um processo
isentrópico, a entropia não muda, então
∆S = 0 (processo isentrópico). (1.42)
Esse resultado implica que, durante um processo isentrópico, as mudanças no volume e
na temperatura são tais que os dois termos da Eq. 1.34 cancelam um ao outro. Em outras
palavras, as mudanças de volume e temperatura são correlacionadas de forma a manter a
entropia do sistema constante.
Ponto de verificação 20.20: Suponha que duas combinações diferentes de pro-
cessos quase-estáticos confinados levem dois gases ideais idênticos do mesmo
estado de equilı́brio inicial para o mesmo estado de equilı́brio final. A mudança
na entropia é a mesma ou diferente nos dois casos?
A tabela 20.7 (figura 1.38) resume as mudanças de entropia para os quatro processos de
gases ideais confinados. Como você viu no Ponto de Verificação 20.20, o valor da mudança
de entropia é independente do processo e depende apenas das temperaturas e volumes dos
estados de equilı́brio inicial e final. Para qualquer processo, podemos usar a Eq. 1.34 para
calcular a mudança de entropia. As expressões resumidas na Tabela 20.7, entretanto, forne-
cem uma maneira rápida de obter as mudanças de entropia para os quatro processos básicos
de gases ideais confinados. Lembre-se de que nesses processos o sistema não é fechado e,
portanto, a mudança de entropia pode ser positiva, negativa ou zero.
Figura 1.38: tabela 20.7 A mudança de entropia em processos com gás ideal
A Equação 1.33 pode ser reescrita de uma forma que nos permite derivar relações úteis
entre a pressão, volume e temperatura de quaisquer dois estados, (Pi , Vi , Ti ) e (Pf , Vf , Tf ), que
se encontram em uma curva isentrópica. Começamos combinando o primeiro e o segundo
termos à direita na Eq. 1.33, o que nos dá
S = N ln(T d/2 V ) + constante. (1.43)
Como a entropia é constante, a quantidade T d/2 V deve ser constante também para uma
amostra que consiste em um número fixo N de partı́culas: Tid/2 Vi = Tfd/2 Vf . Elevando a
quantidade constante T d/2 V para a potência 2/d, e substituindo 2/d = γ − 1 da Eq. 1.26,
vemos que:
γ−1 γ−1
T i Vi = Tf Vf (processo isentrópico). (1.44)
1.9. MUDANÇA DE ENTROPIA EM PROCESSOS DE GASES NÃO IDEAIS 45
Esta expressão fornece a relação entre o volume e a temperatura ao longo de uma curva
isentrópica. Usando a lei dos gases ideais, podemos obter expressões que relacionam outras
quantidades ao longo de uma curva isentrópica. Multiplicando a lei dos gases ideais, P V =
N kB T , por V γ−1 , obtemos:
P V γ = N kB T V γ−1 . (1.45)
Da Eq. 1.44 vemos que o lado direito da Eq. 1.45 é constante para um processo isentrópico
e, portanto, a quantidade P V γ também deve ser constante:
γ γ
Pi Vi = Pf Vf (processo isentrópico). (1.46)
Da lei dos gases ideais, sabemos que V é proporcional a T /P , o que significa que P V γ =
P 1−γ T γ , é constante para um processo isentrópico. Elevando esta quantidade à potência
1/γ, obtemos (P 1−γ T γ )1/γ = P (1/γ)−1 T , e assim em um processo isentrópico,
(1/γ)−1 (1/γ)−1
Pi Ti = Pf Tf (processo isentrópico). (1.47)
Q = mcV ∆T . (1.49)
Como o volume é constante, nenhum trabalho é feito e a lei da energia se reduz a ∆Eth =
Q, então a energia do sistema muda is
Para uma mudança infinitesimalmente pequena na temperatura, Eq. 1.50 torna-se dEth =
mcV dT , e assim a Eq. 1.51 torna-se
mcV dT
dS = . (1.52)
kB T
Para determinar a mudança de entropia para uma mudança finita de temperatura, integra-
mos esta expressão para uma mudança de temperatura ∆T = Tf − Ti :
Z Tf Tf
!
mcV dT mcV
∆S = = ln (1.53)
kB Ti T kB Ti
Também podemos usar a Eq. 1.51 para obter uma expressão mais geral para a mudança
de entropia de um processo isotérmico. Deixe o calor transferido ser Q. Em temperatura
constante, a mudança de entropia é então
Q
∆S = (processo isotérmico). (1.54)
kB T
Observe que esta expressão é idêntica à que obtivemos anteriormente para um gás ideal
(Eq. 1.36). Vamos determinar a seguir o que acontece com a energia e entropia de um sis-
tema durante uma transição de fase. Na Seção 20.3, definimos a energia de transformação
especı́fica como o calor transferido para uma substância passando por uma transição de fase
dividida pela massa da substância:
Q
L≡ (transição de fase comQ > 0). (1.55)
m
Como a quantidade L é sempre positiva e Q pode ser negativa ou positiva, a Eq. 1.55 vale
apenas para fusão e vaporização. Para solidificação e condensação, Q é negativo e então
temos
−Q
L≡ (transição de fase com Q < 0). (1.56)
m
Como a temperatura é constante, podemos usar a Eq. 1.54 para calcular a variação de entro-
pia correspondente
Q mL
∆S = = (fusão ou vaporização). (1.57)
kB T kB T
Para solidificação e condensação, a variação da entropia é de sinal oposto:
mL
∆S = − (solidificação ou condensação). (1.58)
kB T
1.10 Problemas
1.10. PROBLEMAS 47
Figura 1.39
Exercı́cio 1.2 Uma amostra de 1,00 mol de um gás diatômico ideal em que as
partı́culas de gás transladam e giram está inicialmente a 600 K. Energia é então adi-
cionada termicamente à amostra até que sua temperatura seja de 1000 K. A esta tem-
peratura, as partı́culas também vibram. A amostra é então aquecida a 1200 K. Quanta
energia térmica a amostra absorve?
Exercı́cio 1.3 Vapor a 120 ° C e 101,3 kPa é adicionado a uma lata de aço oca que é
então selada e deixada esfriar. (a) Qual é a pressão dentro da lata a 101 ° C? (b) A lata
tem 0,20 m de altura e 0,10 m de diâmetro. Qual é a magnitude da força exercida pela
atmosfera nas partes curvas e planas do exterior da lata? (c) Assim que o vapor esfria
a 100 ° C, ele começa a se condensar em água lı́quida e a lata colapsa para dentro. Por
que a lata manteve sua forma até 101 ° C, mas não abaixo de 100 ° C? (Dica: Pesquise
“lata de refrigerante em colapso” em seu site de vı́deo favorito da Internet.)
Exercı́cio 1.4 Uma bolha de ar esférica em um lago se expande conforme sobe len-
tamente à superfı́cie. No ponto em que começa a subir, a pressão é de 2,00 atm, a
temperatura da água é de 10,0 ° C e o raio da bolha é de 5, 00 × 10−3 m. Na superfı́cie,
a pressão é de 1,00 atm e a temperatura da água é de 20,0 ° C. (a) Qual é a relação
entre o volume final e o inicial da bolha em expansão? (b) Qual é a variação na energia
térmica dabolha?
48 CAPÍTULO 1. CALOR (ENERGIA TRANSFERIDA TERMICAMENTE)
Exercı́cio 1.6 Como parte de uma experiência de fı́sica, ar sob alta pressão é permitido
expandir para fora isentropicamente de uma lata de metal e em um saco de plástico va-
zio. Quando a expansão é concluı́da, a bolsa e o conteúdo estão à pressão atmosférica.
O ar dentro da lata está inicialmente a 5,0 atm e 25 ° C. Qual é a temperatura do ar
depois de entrar no saco plástico?
Problema 1.1 A lei dos gases ideais é válida para um gás quando, entre outras coi-
sas, quaisquer interações entre as partı́culas são ignoradas. Ummais realista modelo-
foi proposto por Johannes Diderik van der Waals em 1873, pelo qual ele recebeu um
Prêmio Nobel em 1910. Avan der equação de estado deWaals é
an2
!
P + 2 (V − nb) = N kB T
V
onde a e b são constantes e n é a densidade numérica das partı́culas de gás. Use esta
equação para determinar o trabalho realizado em um gás submetido a um processo
isotérmico. Verifique se o seu resultado reduz para o caso de gás ideal quando a = b =
0.