Departamento de Geografia / Instituto de Agronomia
A PRAÇA ONZE NEGRA TERRITORIALIDADE E RESISTÊNCIA CULTURAL
Joyce Silva Pereira
INTRODUÇÃO
Praça Onze, enquanto espaço cultural e de ocupação do negro
(territorialidade e expressões culturais). Abordar a representatividade de um povo que muito contribuiu para a formação socioespacial brasileira. Necessidade de compreender como os negros foram afetados e remanejados pelas reformas urbanas que atingiram a Praça Onze e em especial a que deu fim à praça. Período considerado: final do século XIX até aproximadamente a metade do século XX. Olhar geográfico a partir das reformas urbanas/urbanísticas e do conceito de território e suas especificidades. “VÃO ACABAR COM A PRAÇA ONZE”: UM ESPAÇO NO TEMPO
Localiza-se na Zona Central da cidade do Rio de Janeiro e pertence
ao bairro Cidade Nova. Nome em homenagem a Batalha de Riachuelo (Guerra do Paraguai), em 11 de junho de 1865. O nome Cidade Nova remete ao período do reinado de Dom João VI, na década de 1850. Reconhecimento da área após a instalação da realeza na Quinta da Boa Vista. Fim da Praça Onze devido à construção da Avenida Presidente Vargas. Figura 1 – Delimitação atual do bairro Cidade Nova (RJ). Fonte: Google Maps (2019). Figura 2 – Rio de Janeiro antes da Avenida Presidente Vargas. Fonte: Site História do Rio . Figura 3 – Avenida Presidente Vargas (1945). Fonte: Site HardMob. “VÃO ACABAR COM A PRAÇA ONZE”: O BAIRRO COMPARTILHADO Praça Onze como um espaço intercultural, de convivência compartilhada com outras representatividades. Presença de negros e judeus, seguidos de portugueses e italianos. A presença de judeus no Brasil é datada desde o final do século XIX, por volta de 1880, mas foi intensificada no século XX, entre as décadas de 1920 e 1930. No entanto, pouco se sabe sobre as relações entre negros e judeus, pois as produções literárias sobre a praça geralmente abordam somente um dos grupos, em detrimento dos demais. Figura 4 – Policlínica Israelita (1939). Fonte: Livro Recordando a Praça Onze – Samuel Malamud (p.87). NOTA: todos os membros da fotografia foram devidamente identificados, menos a única enfermeira negra presente no canto esquerdo da fotografia. “VÃO ACABAR COM A PRAÇA ONZE”: A PRAÇA ONZE SOBREVIVENDO ÀS REFORMAS
Surgimento, modificação e demolição da Praça Onze durante a
remodelação urbana do Rio de Janeiro entre os séculos XIX e XX. A partir das alterações na configuração e funções da cidade, torna- se possível compreender como se deu a “adaptação” do povo negro a essas reformas e como se realocaram após essas mudanças urbanas realizadas. No século XIX a cidade do Rio de Janeiro era limitada geograficamente por morros e brejos. O surgimento da Cidade Nova, através das obras de aterro, permitiu uma intensa urbanização A Reforma Passos foi responsável por realizar modificações expressivas na malha urbana da cidade do Rio de Janeiro. Figura 5 – Cidade do Rio de Janeiro (1817). Fonte: Livro Evolução Urbana do Rio de Janeiro – Mauricio de Almeida Abreu (p.36). NOTA: A área que viria a ser a Cidade Nova ainda não existia. Figura 6 – Município do Rio de Janeiro: as freguesias do Rio de Janeiro no século XIX. Fonte: Livro Evolução Urbana do Rio de Janeiro – Mauricio de Almeida Abreu (p.38). Figura 7 – Localização do Rocio Pequeno (1831). Fonte: Site Instituto de Arqueologia Brasileira (IAB). Figura 8 – Localização da Praça Onze (1858). Fonte:Site Library Of Congress. Figura 9 – Localização da Praça Onze (1900). Fonte: Site Library Of Congress Figura 10 – Localização da Praça Onze (1941). Fonte: Site Library Of Congress. Figura 11 – Praça Onze antes da reforma de 1927. Fonte: Livro Recordando a Praça Onze – Samuel Malamud (p.12).
Figura 12 – Praça Onze após
reforma de 1927. Fonte: Site Biblioteca Nacional Digital. A PRAÇA ONZE NEGRA: TERRITORIALIDADE Segundo Rogério Haesbaert (2004), a concepção de território está associada ao poder. O território apresenta-se como um espaço-tempo específico e vivenciado, sempre múltiplo e dotado de diversidade e complexidade. Configura-se como um espaço de identidade cultural. A territorialidade, uma particularidade do território, manifesta-se também através de questões políticas e estende-se às questões culturais, pois está associada à forma como os grupos sociais utilizam a terra e se organizam espacialmente, dando significado aos lugares. É a territorialidade quem dá sentido à existência do próprio território. A PRAÇA ONZE NEGRA: TERRITORIALIDADE Assim como a zona portuária inicialmente, a Praça Onze foi escolhida como local de moradia e reprodução das práticas culturais africanas. Praça Onze negra e as migrações Salvador – Rio de Janeiro. Benefícios estatais aos abastados, em detrimento dos pobres – negros recém-libertos em sua maioria. A “Pequena África”, abrigou os impactos sociais, econômicos e culturais decorrentes das mudanças políticas que atravessaram o país. A territorialidade negra na Praça Onze foi, portanto, construída a partir da resistência étnico-cultural desse povo. A PRAÇA ONZE NEGRA: REPRESENTATIVIDADE E RESISTÊNCIA CULTURAL Desmembramentos familiares e perda de relações pessoais causados pela escravidão. Religiões africanas em sincretismo com o Catolicismo. Imposição de novas relações sociais, políticas e econômicas tanto aos escravos. Readaptação à nova lógica vigente após o fim da escravidão. Reorganização familiar através da figura matriarca. Grupos de apoio realizados entre os negros após alforria e também na migração para o Rio de Janeiro. Reorganização familiar através da figura matriarca. Religião, capoeira, carnaval e samba como símbolos de resistência cultural. Tia Ciata, Hilário Jovino Ferreira e João da baiana como figuras relacionadas à representatividade negra. RETERRITORIALIZAÇÃO O território possui características que são construídas socialmente ao longo de sua história. É também um instrumento de poder político e configura-se como um espaço de identidade cultural. Segundo Haesbaert (2004), tanto as desterritorializações quanto as reterritorializações são especificidades do território estão relacionadas, de forma abrangente, à construção, destruição e reconstrução de vínculos e identidades espaciais. Cada desterritorialização terá um caráter diferente porque as questões que as compõem são distintas. As migrações deixam marcas tanto nos países de origem quanto nos países de destino dos que migram, voluntariamente ou não. Criação de novas identidades culturais a partir da reterritorialização. Reterritorialização como movimento de resistência cultural. Realocação dos negros em subúrbios e favelas após a gentrificação da cidade do Rio de Janeiro. Os meios de transporte (séculos XIX e XX) permitiram maior segregação espacial entre as classes sociais. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Concomitante à ocupação da Cidade Nova, em especial nos arredores
da Praça Onze, o negro também já habitava os subúrbios e as favelas. Esses espaços se fortaleceram como resposta à intensificação do processo de urbanização excludente da cidade do Rio de Janeiro. Mesmo com a remoção dos negros do centro da cidade, a resistência cultural foi responsável por imortalizar práticas e costumes associados à identidade negra. Afasta-se o pobre da cidade revitalizada, mas ainda assim sua força de trabalho é necessária. Generalização das culturas africanas, negligenciando identidades territoriais, de forma a “reconhecer” os indivíduos como negros apenas. REFERÊNCIAS
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