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Desmobilização nacional

O gabinete da ditadura de Ernesto Geisel refletia a nova conjuntura


política na disputa pelo poder na sociedade nacional No âmbito militar,
a maioria seguia com vinculações com a ESG, mas refletindo as tensões
do processo de coesão ideológica entre liberais-conservadores e
antiliberais-conservadores durante a fase de “desmobilização nacional”
da doutrina da ESG: do “estado de guerra” para o retorno à
“normalidade” com “salvaguardas”.
• O tema da mobilização é tão importante que recebe uma doutrina e
um sistema específico, com o devido planejamento estratégico. A
etapa final da mobilização é a desmobilização, ou seja, o processo
inverso, de retorno “à normalidade”. Novamente, todos os poderes
estão mobilizados, destacando-se: na expressão política, suspensão
progressiva das restrições sobre a liberdade individual e coletiva,
readaptação da estrutura político-administrativa; na expressão
econômica, retorno à iniciativa privada de atividades produtivas e
absorção dos excedentes de produção; na expressão psicossocial,
reintegração da força de trabalho, criação de clima de compreensão
interna; na expressão militar, redução do poder militar, reinserindo
civis e reconversão de indústrias de interesse militar.
É nesse cenário de estabilidade dinâmica da Ordem de Segurança
Nacional que ocorrem as disputas pela sucessão do poder político em
1984. Entretanto, o processo de desmobilização nacional se deparou
com uma ampla mobilização da sociedade civil e da oposição política
que tomava as ruas para exercer a soberania popular.
Com a dissidência governista, Tancredo encabeçou a chapa
oposicionista, com José Sarney de candidato a vice Do lado da ditadura,
Paulo Maluf venceu a disputa com Andreazza e disputou a eleição
indireta com Flávio Marcílio, ex-governador do Ceará (1958-1959) e
deputado federal (Arena-PDS/CE) O resultado foi a vitória da
oposição com 70% dos votos válidos Entretanto, com o falecimento de
Tancredo antes da posse, a primeira presidência civil desde Goulart em
1964 seria exercida pelo dissidente da Arena, José Sarney, o vice-
presidente eleito indiretamente
Normalização do legado de segurança nacional

Nessa direção, apesar do governo civil de Sarney, os militares permaneceram ocupando postos
estratégicos no gabinete do Poder Executivo E, dos oito ocupantes, seis haviam passado pela
ESG No EMFA, a chefia foi exercida por três militares com formação no CSG/ESG: almirante
José Maria do Amaral Oliveira, egresso da turma de 1981; o almirante Valbert Lisieux Medeiros
de Figueiredo, egresso da turma de 1978; e o general Paulo Campos Paiva, egresso da turma
de 1977 e veterano da FEB, que chegou a fazer um curso de guerra revolucionária na Argentina
(1961), além de ter comandado o 1º Batalhão do Regimento Escola de Infantaria na República
Dominicana em 1966 Depois que saiu do governo, Paiva foi para a reserva e trabalhou na
Confederação Nacional dos Transportes, em Brasília (1987-1990).
• Nos ministérios das Forças, que foram mantidos, apenas o brigadeiro
Octávio Júlio Moreira Lima, comandante do Ministério da Aeronáutica, não
havia se formado pela ESG Primeiro ministro da pasta totalmente formado
na Força − era da turma de 1945 da Escola de Aeronáutica –, Moreira Lima
causou repercussão na imprensa ao substituir, das paredes de seu
gabinete, os retratos oficiais do presidente João Batista Figueiredo, e do
ministro da Aeronáutica, brigadeiro Délio Jardim de Matos, pelos do
patrono da Aviação, Santos Dumont, e do único civil a ocupar o Ministério
da Aeronáutica, Joaquim Salgado Filho A Marinha foi comandada pelo
almirante Henrique Saboia, egresso da turma de 1974 do CSG/ESG, e no
Exército assumiu o general Leônidas Pires Gonçalves, egresso da turma de
1977 do CSG/ESG.
• A principal disputa do período foi o processo constituinte, com a
definição de uma nova carta política. Nesse cenário de ausência de
ruptura entre os governos e, mais, de uma certa continuidade, o
resultado foi a normalização da autonomia dos militares pelos civis,
com a definição de Forças Armadas e de suas funções, recebendo
praticamente a mesma redação de 1967.
Apesar dessas pequenas modificações, as Forças Armadas preservaram sua
função política de “garantes” das instituições democráticas, assim como a
separação entre a “lei” e a “ordem” Por sinal, essas previsões estão inscritas
no título da “defesa do Estado e das instituições democráticas”, posteriores
ao Estado de Defesa e ao estado de sítio, duas situações excepcionais que
suspendem ou restringem direitos políticos e civis Ademais, a possibilidade
que um dos poderes convoque a instituição normaliza a dubiedade de sua
finalidade, que pode inclusive se voltar contra um desses poderes, como foi
a história dos golpes de Estado no país Desse modo, mantiveram a
obediência discricionária, uma vez que será o militar “o intérprete da
Constituição”, fazendo de seu modo próprio o crivo de legalidade da
subordinação a cada poder constitucional.

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