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TEORIAS DA TRADUÇÃO

As primeiras reflexões sobre tradução


• As primeiras considerações sobre a tradução que chegaram até nós:

• - fragmentadas, resultantes da observação da própria prática tradutiva.

• - como tal, não formam sistemas organizados de observações ou de


preceitos, muito menos se constituem em teorias da tradução.

• Mesmo assim, estas opiniões influenciaram as gerações seguintes de


tradutores e continuam ainda a ser consideradas um marco iniciador
das teorias da tradução.
• Cícero
(Marco Túlio Cícero, advogado, orador e escritor romano, século I a. C.):

“Se traduzo palavra por palavra, o resultado soará estranho; se, levado
pela necessidade, altero algo na ordem das palavras, parecerá que me
afastei da função do tradutor .” (in Bassnett 2003: 82)

Assim, Cícero afirma traduzir “não como intérprete, mas como orador”,
ou seja, como se escrevesse o texto traduzido em primeira mão.
• S. Jerónimo
• (clérigo, tradutor da Bíblia, séculos IV - V)

• “non verbum e verbo, sed sensum exprimere de sensu”


• Ou seja,
• “não traduzo palavra por palavra, mas sentido pelo sentido”

Acrescenta ainda:
“Não considerei necessário verter palavra por palavra, mas de todas as palavras
conservar o valor e a expressividade. Julguei, no entanto, conveniente reproduzir
para o leitor não tanto o seu número quanto o seu peso.”
• (tradução de Joaquim Félix de Carvalho)
• Destas primeiras observações (e de outras ainda, como as de Horácio
na sua Arte Poética), decorre uma consideração semelhante:

• - a distinção entre tradução literal e tradução pelo sentido.

• Num caso como no outro, a preferência parece ser a tradução pelo


sentido, na medida em que evita a estranheza e aproxima o texto do
novo leitor.
• A partir do Renascimento, com o advento da imprensa e consequente
aumento da difusão de obras escritas, proliferam por toda a Europa
traduções em várias línguas.
• Os séculos XVI e XVII veem também surgir reflexões cada vez mais
organizadas sobre a tradução, sistematizadas em prefácios do próprio
tradutor.
• De modo geral, continua a traduzir-se as obras clássicas gregas e
latinas, não só no intuito de preservar esses “monumentos”
linguísticos canónicos, mas também com o objetivo de dar às línguas
da época novas possibilidades expressivas e estilísticas.
• Em Inglaterra:
• John Dryden (1631-1700)
• No “Prefácio” à sua tradução das Epístolas de Ovídio (1680):

• três tipos de tradução:


• - Metáfrase (Metaphrase)

• - Paráfrase (Paraphrase)

• - Imitação (Imitation)
• Metáfrase: tradução palavra a palavra, ou verso a verso;

• Paráfrase: tradução mais livre, a partir do sentido e sem exigências de


ordem formal;

• Imitação: o original é apenas um ponto de partida; o tradutor pode


adaptá-lo ou transformá-lo como quiser.
• (Como é óbvio, este terceiro tipo pode pôr em causa a própria noção de tradução tal
como hoje a entendemos.)
• Problema da metáfrase, segundo Dryden: não é possível traduzir ao
mesmo tempo literalmente e bem, pois duas línguas não têm
correspondência exata.

• “É como se se dançasse numa corda com as pernas atadas: o homem pode


evitar a queda à força de cautela; mas não podemos esperar que os seus
movimentos sejam graciosos.”

(in Steiner 2002: 292; tradução de Miguel Serras Pereira)


• Problema da imitação, segundo Dryden:
• Ainda que possa ser um brilhante exercício de criatividade, uma imitação
exige um tradutor ao mesmo nível de génio do autor. O tradutor terá de se
colocar na pele do autor e reescrever (na nova língua) a sua obra, como se
este vivesse na época e no contexto presente.

• De outro modo, sem genialidade, uma imitação será


“o maior dano que pode ser feito à memória e reputação dos mortos.”
• (in Steiner 2002: 293)
• Assim, para Dryden a prática tradutiva mais aconselhável será a
paráfrase, entendida como

• “tradução com latitude, na qual o autor é mantido sob o olhar do tradutor,


jamais sendo perdido de vista, mas sem que as suas palavras sejam seguidas
tão estreitamente como o seu sentido, podendo este também ser alargado,
mas não alterado.”
• (in Steiner 2002: 294)

• Dryden utiliza a metáfora do tradutor-pintor de retratos: o retrato tem de se


parecer escrupulosamente com o seu modelo, embora sendo outra realidade.
• Um século depois:
• Alexander Fraser Tytler, The Principles of Translation (1791)

• Três princípios básicos:


• 1- A tradução deve ser uma transcrição completa das ideias da obra original.

• 2- A tradução deve manter o estilo e o modo de escrita da obra original.

• 3- A tradução deve ter uma expressão tão natural como a obra original.
• No século XIX:
• Friedrich Schleiermacher (1768-1834)
• “Sobre os diferentes métodos de tradução” (1813)

• - Dois tipos de tradução:

• - a “tradução genuína”, entendida como arte e relativa a obras literárias;

• - a “simples interpretação”, entendida como uma “atividade mecânica”.


• Os dois caminhos que o tradutor pode seguir:

• “Ou o tradutor deixa o escritor o mais tranquilo possível e faz com que o leitor
vá ao seu encontro, ou então deixa o mais tranquilo possível o leitor e faz com
que o escritor vá ao seu encontro.”

• No primeiro caso, o tradutor permite ao leitor aceder ao autor original e à


sua obra através de uma língua sua conhecida.
• No outro caso, é o autor que se aproxima do leitor, pois o tradutor faz com
que o primeiro pareça ter escrito originalmente na nova língua e pertencer
ao mundo contextual do segundo.
• Em conclusão,

• Estas reflexões sintéticas lançam já alguns pontos fundamentais das


futuras Teorias da Tradução que se constituirão e consolidarão ao
longo dos séculos XX e XXI:

• - tradução literal / tradução pelo sentido


• - tradução literária / tradução técnica
• - tradução estrangeirizadora / tradução domesticadora

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