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Internet, juventude e futilidade.

Já se pegou assistindo vídeos e mais vídeos do Youtube... e, no fim de uma


hora, não ter se lembrado nem do tema do primeiro vídeo clicado? Ou
totalmente cooptado pela "espionagem" da vida dos outros no Orkut? Vamos
pensar sobre? Acredito que a molecada precisa produzir mais na Internet.

Inversão de valores na atualidade? O verso do verso do reverso.

Qual seria sua reação ao ver sua correspondência exposta (cartas de


seus amigos, telegramas de felicitações e pêsames, mensagens de texto do
seu celular, aquele lembrete do imã da geladeira que seu marido colocou
para que você se lembrasse de passar no mercado, pois o creme dental
havia acabado)? Toda sua comunicação impressa e afixada no poste em
frente à sua casa ou na portaria de seu prédio ou condomínio? Atualmente, o
que a juventude tem feito com alguns canais de comunicação não se difere
muito deste cenário de disparate. Não, querem que seja bem escancarado
cada dedo de prosa.
Uma das mudanças de maior impacto nos últimos tempos foi a forma
com que trocamos informações uns com os outros. Não mais do que dois
séculos atrás, para uma informação ligar dois pontos no espaço, levava-se
muito tempo. Hoje, indissolúveis da velocidade, espaço e tempo são
instâncias que se ligam por todo momento e em todo lugar. O tempo para
que saibamos dos desabrigados em Santa Catarina é indiferente ao espaço
que nos separa de Santa Catarina. O espaço que nos separa do Hotel Taj
Mahal na Índia não interfere para que saibamos, em tempo real, o que se
passa no Hotel Taj Mahal na Índia.
Ok. Mas o que temos feito, dos retalhos de comunicação individual que
produzimos? Se olharmos para os sites de relacionamento da Internet, me
questiono o que realmente se aproveita de produtivo.
Sou um assumido crítico da forma como jovens têm usado canais –
potenciais promotores de bem-estar e fraternidade – para disseminar idéias
vazias, futilidades e muitos, vários, erros de português em uma linguagem
própria. Pouca coisa gira fora do raio de dois palmos em torno do próprio
umbigo... receitas para malhação, fofoca (muita fofoca) das amigas, dos
meninos, auto-retratos no banheiro, na praia, em meio a muita maquiagem e
chats de paquera clichês. E não me venham dizer que a adesão massiva à
“Comunidade” de luto pela menina Eloah (morta em desastrosa operação
policial neste segundo semestre) é demonstração do contrário! Viver em
“Comunidade” é totalmente diferente disso.
Na pós-modernidade, ligada por um sem número de conexões banda-
larga, muitas delas sem um único fio (humano ou de cobre), vê-se
claramente uma inversão das dimensões público-e-privado, privado-e-
público. O que se escreve para um indivíduo poderá ser lido por um planeta
inteiro! Mesmo que não haja uma linha que preste de conteúdo. Em um
espaço onde são ditas apenas parcelas da verdade, a verdade não se
constrói hora nenhuma! Vivendo das meias-verdades de si e dos outros,
pessoas são cooptadas a uma vivência de si e da realidade cada vez mais
irreal: 15 bytes de fama e a aquisição de um bocado de neuroses.
É fato que todo o aparato de comunicação que se tem criticado foi
feito para unir e aproximar ainda mais as pessoas. Na atualidade, mesmo
com a prerrogativa de uma centena de amigos nos sites de relacionamento,
nunca se viveu tanta angústia, tanta falta de sentido e tanta solidão –
mesmo com duzentos amigos ou mais no Orkut! Trancados, nas células
individuais que se tornaram os quartos de dormir da molecada, jovens
padecem de sofrimento psíquico real, irrisoriamente amainados pela imensa
quantidade de amigos irreais. “M ad ae, blz?!”
Em andanças psicológicas por escolas particulares da classe média de
Contagem/MG, percebi que a juventude sabe muito pouco das lutas de
gerações anteriores. Não há ditadura mais, realmente, nem os Atos
Institucionais, nem tanques do Exército controlando a liberdade dos civis...
Mas será que já não nos bastam aquecimento global, a corrupção nos
parlamentos, as medidas provisórias, a fome, a violação dos direitos
humanos – do Camboja às vilas e aglomerados de Belo Horizonte? Será que
não temos contra o que lutar?
No espaço livre que se tornou a Internet, a marca, que a grande
maioria da juventude tem inscrito, é vazia e perene. O cantinho escuro das
festinhas não é mais cobiçado como antigamente. Um lugar bacana para
uma paquerinha, para uma boa conversa ao pé do ouvido, foi deixado às
traças e teias de aranha. Bom mesmo é dar algum sinal de braço e de mão
(e como se inventam sinais desses) para os fotógrafos dos sites de festa. Um
beijinho em frente a essas câmeras então... Assunto para se surfar nas rodas
de conversas virtuais por aí afora. O que se cria, o que se realmente obtém
disso? Para muitos, “sei lá, não importa”.
Quando da hora de conferir sua quantidade de amigos virtuais? Dê
uma olhada na quantidade de vítimas catarinenses que precisam de sua
ajuda, que se beneficiariam de um bom fórum político virtual sobre
catástrofes e políticas públicas. Não sabe o que ocorreu no Hotel Taj Mahal
na Índia?... Ops, já passou da hora de você fechar a janela do Orkut. Dê
uma olhada em um bom site de notícias.
Ah, sugiro também uma boa ligada para pessoas que, de verdade, te
importam. Quem sabe você não precisa de uma boa conversa com alguma
delas? Problemas são vividos na realidade e, até hoje, não vi ninguém com
cara de deprê nos álbuns de foto.

Um abraço.

J. 01/12/2008.
Jairo Stacanelli Barros.
Psicólogo clínico pela UFMG.
Mestre em Intervenções Clínicas e Sociais pela PUC Minas.
Pós-graduado/Especialista em Psicologia da Educação pela PUC Minas.
Consultor em Educação e Psicologia para o SBT / Alterosa e para a Rádio
América.

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