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RESUMO:
Notícias sobre os trabalhos arqueológicos de emergência realizados durante a construção da
Creche Nossa Senhora da Atalaia, localizada nas imediações da Igreja da Atalaia (monumento
classificado como de Interesse Público), no centro histórico desta localidade.
As autoras referem a presença de indícios da Necrópole ainda existente no Adro e no interior
da Igreja da Atalaia, bem como, identifica algumas estruturas e artefactos arqueológicos que
ajudam a compreender parte da História deste monumento religioso com reminiscências desde
o século XV/ XVI.
ABSTRACT:
News about the archaeological work carried out during construction of the kindergarden of
Nossa Senhora da Atalaia, located near the Church of Atalaia (classified as a monument of
public interest), in a historic center of this town.
The authors mentions the vestiges of a necropolis still existing in the churchyard and inside the
church of Atalaia, and identifies some structures and archaeological artefacts, that help to
understand some of the history of this religious monument with reminiscences from the fifteenth
and the sixteenth centuries.
RÉSUMÉ:
Nouvelles sur les travaux archéologiques réalisés pendant la construction de la crèche Nossa
Senhora da Atalaia, situé près de l'église de la Atalaia (classifié monument d'intérêt public) dans
le centre historique de cette ville.
Les auteurs disent avoir des preuves de la nécropole qui existent encore dans le cimetière et
l’intérieur de l’église de Atalaia et identifie certaines structures et des objets archéologiques qui
aident à comprendre un peu l’histoire de ce monument religieux avec des réminiscences du
XVe et XVIe siècle.
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1. Introdução: Razões da Intervenção
Na sequência das obras de construção da Creche Nossa Senhora da Atalaia, e após ter sido
detectado espólio osteológico na abertura de uma vala para a instalação do sistema de
saneamento do edifício, o Serviço de Arqueologia do Museu Municipal de Montijo, a pedido do
Centro Social e Paroquial da Nossa Senhora da Atalaia, deslocou-se a este sítio na segunda-
feira, dia 4 de Maio de 2009, para avaliar o local.
Este serviço, desde logo, aludiu à necessidade do acompanhamento arqueológico desta obra
localizada numa área particularmente sensível do ponto de vista patrimonial, e integrada na
Zona de Servidão Administrativa da Igreja da Atalaia, imóvel classificado como de interesse
público em 2009.
Após verificar que toda a zona do subsolo já estava revolvida e as construções anexas já
tinham sido demolidas sem o respectivo acompanhamento arqueológico, a signatária,
considerando o carácter de emergência de que estes trabalhos se revestiam, e de acordo com
as indicações recebidas pela Direcção Regional de Cultura de Lisboa e Vale do Tejo e o
IGESPAR, I.P., sugeriu que se parasse a obra até à entrada efectiva da equipa de arqueologia,
que iria assegurar o acompanhamento e a monitorização de todos os trabalhos futuros.
A análise que nos foi possível efectuar in loco leva-nos a pensar que, no decorrer da obra,
provavelmente, se terão destruído antigas fases de ocupação do núcleo antigo da Atalaia.
Passamos a descrever a análise que nos foi possível efectuar:
- No pátio interno, entre a parede Sul da Igreja da Atalaia e o novo edifico em construção, o
subsolo estava muito revolvido, com um nível de aterro considerável, cujos cortes
estratigráficos, deixados ao acaso, eram frugais indicadores da realidade estratigráfica do local.
- Foi detectado um muro sem fundações, anteriormente conexo à parede Sul da Igreja da
Atalaia que, possivelmente, terá tombado quando as movimentações no subsolo se
multiplicaram no pátio comum entre a Igreja da Atalaia e o novo edifício da Creche Nossa
Senhora da Atalaia.
- Junto à actual torre sineira da Igreja, numa área particularmente sensível mas já parcialmente
revolvida, foi detectada a presença de espólio osteológico humano constituído, inicialmente,
por uma diáfise de um perónio e a extremidade distal de um fémur. O espólio descrito não
aparentava, nesta primeira observação, estar em conexão anatómica.
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Face à situação descrita anteriormente, a signatária limitou-se a realizar o registo fotográfico
exaustivo da realidade observada e a desenvolver um Plano de Trabalhos Arqueológicos de
emergência a fim de assegurar a respectiva salvaguarda e protecção do património, ainda
possível de ser resgatado, através do acompanhamento arqueológico.
- O registo das valas abertas ao longo da parede sul da Igreja da Atalaia (zona de entulho), só
poderá ser executado aquando da deslocação do muro tombado e da remoção do entulho
presente neste local.
Fig.1 – Zona mais sensível da obra Creche Nossa Senhora da Atalaia, observada antes dos trabalhos
arqueológicos.
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O Plano de Trabalhos Arqueológicos foi aprovado pela Direcção Regional da Cultura e Vale do
Tejo e pelo Instituto de Gestão do Património Arquitectónico e Arqueológico, IGESPAR. I.P.,
através do ofício n.º. 2009/1 (319). Os trabalhos iniciaram-se no dia 18 de Maio de 2009.
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2. Enquadramento Geológico e Geográfico
O centro histórico da Atalaia, situado num monte, dominante sobre a secção nascente do
estuário do Tejo (CÂMARA, 2008, 105), do qual se avista a Sul o castelo de Palmela, a Norte
Alcochete, e a Este o Rio Frio, está implantado sobre uma cota de 60 metros e encontra-se
integrado numa das formações sedimentares do Pliocénico de Santa Marta. Esta formação,
resultou de um pequeno mar que parece ter coberto a maior parte da península de Setúbal,
entre Lisboa e a Arrábida, formando um golfo que avançava desde o Montijo até ao Pinhal
Novo (ZBYSZEWSKI & FERREIRA, 1968, 8).
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3. Enquadramento Histórico do local
Neste sentido, do núcleo Ocidental fazem parte as freguesias de Montijo, Afonsoeiro, Sarilhos
Grandes, Alto Estanqueiro/Jardia e Atalaia, e do núcleo Oriental fazem parte as freguesias de
Santo Isidro de Pegões, Pegões e Canha, formando um total de oito freguesias.
A Igreja de Nossa Senhora da Atalaia apresenta uma implantação estratégica, com vista
privilegiada sobre todos os pontos cardiais – a Oeste para o Estuário do Tejo, a Este para o Rio
Frio, a Norte para Alcochete e a Sul para o Castelo de Palmela. A sua origem poderá remontar
ao século XV (MARQUES, 2005, 41), embora a sua pormenorizada descrição esteja
confirmada desde o século XVI (visitações da Ordem de Santiago a este templo religioso, em
1512, 1525, 1609 e 1613). Remotamente conhecida como Ermida de Santa Maria da Atalaia,
este templo religioso poderá ter tido dimensões inferiores às observadas actualmente. Este
imóvel parece ter sofrido diferentes campanhas de obras. Da campanha seiscentista resta uma
lápide, colocada no pavimento interior da igreja, que confirma um revestimento azulejar anterior
ao que actualmente subsiste (CÂMARA, 2008, 107). Reedificado no século XVIII, esta
campanha conferiu as características artísticas que hoje possui.
Tornando-se num local de culto logo no início de quinhentos, a Atalaia é, desde então, palco de
festividades e de visitas de peregrinos de vários círios.
O Santuário não se limita e circunscreve ao templo religioso, mas é constituído por três
cruzeiros, por uma “Fonte Santa” e pelo casario que ladeia a escadaria, que se estende da
Igreja até ao terreiro, e cuja função de algumas casas era de albergar os círios.
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Dos três cruzeiros, o que mais se destaca é o quinhentista de pedra lioz, mandado construir
pela confraria de Lisboa, em 1551, que se encontra no terreiro. Acha-se coberto por um cúpula
e com a representação da Pietá e da crucificação de Cristo.
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4. Descrição dos Trabalhos Arqueológicos
4.1. Sondagem 1
A sondagem 1 foi implantada entre a parede Sul da Igreja da Atalaia e o edifício da Creche de
Nossa Senhora da Atalaia, no local onde se detectou espólio osteológico humano
aparentemente desconexo. A sondagem seguiu o sistema de georreferenciação nacional,
fixando-se numa malha quadriculada irregular, pois o espaço entre a parede Sul da Atalaia e o
novo edifício da creche apresentava dimensões muito reduzidas, tendo sido a quadriculagem
ajustada ao local. Desta forma, a sondagem 1, com cerca de 1 metro de largura por 2 metros
de comprimento, está subdividida em 4 quadrículas, a V7, V8, V9 e a V10. Para a adopção da
quadriculagem, convencionou-se seguir uma referência mista de letras, no sentido Oeste-Este,
e de números, no sentido Norte-Sul.
A estratigrafia deste local evidenciou a distinção de duas áreas. Uma localizada a Sul, junto à
parede do edifício da Creche, caracterizada pela presença de níveis de aterro, e outra, a Norte,
junto à parede da Igreja da Atalaia, com níveis arqueológicos preservados.
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Podemos detectar duas estruturas de fundação, tais como:
- Parede de alvenaria de pedra (u.e. [110]), composta por aparelho de pedra calcária e arenito,
com a inclusão, ocasional, de mármore, de pedra basáltica e de cerâmica de construção,
ligados por uma argamassa de coloração bege amarelada. Poderá ter pertencido, na época
Moderna, à fundação da antiga Casa do Coro, anteriormente anexa à Igreja da Atalaia, através
do aproveitamento desta, para a construção da actual torre sineira.
Fig.4 – Anterior Casa do Coro localizada a Sul da Igreja da Atalaia. Local da actual torre sineira da Igreja
da Atalaia. Cópia se um desenho original de Barbosa Lima. Fonte: (L.MARQUES, 1996, 79).
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O esqueleto exumado estava orientado à maneira tradicional cristã, Oeste-Este (cabeça-pés),
num covacho simples e encontrava-se deposto em decúbito dorsal. Os antebraços
encontravam-se cruzados e o crânio apresenta-se por debaixo da parede de alvenaria,
observando-se apenas dois fragmentos do mesmo. O esqueleto poderá corresponder a um
indivíduo adulto, cuja diagnose sexual não foi possível apurar devido, por um lado, ao estado
de conservação em que os elementos ósseos se encontravam, por outro, devido à fragilidade
dos ossos depois da destruição acidental, aquando da aplicação de duas soleiras de porta por
parte do empreiteiro da obra.
4.2. Sondagem 2
A sondagem 2 foi implantada na zona Este da Igreja, no pátio externo posterior, junto à parede
Este da antiga torre sineira. Esta seguiu um sistema de georreferenciação nacional, fixando-se
numa malha quadriculada regular de 2 metros de largura, por 2 metros de comprimento e foi
subdividida em quatro quadrículas A1, A2, B1 e B2. Para além da estrutura de fundação da
torre sineira, não foram detectados níveis arqueológicos preservados, decorrendo os trabalhos
em níveis de aterro.
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4.3. Acompanhamento Arqueológico
A escada, trata-se de uma unidade estratigráfica complexa, com diferentes fases construtivas,
possíveis de observar através do aparelho que a compõe. A mesma é constituída por blocos de
calcário, arenito e tijolo, sem furos, ligados por argamassa de areia e cal, de coloração
amarelada. A parte superior desta estrutura, apresenta um degrau principal, seguido de
degraus em pedra, reaproveitados de outros locais. A segunda camada é composta por tijolo,
ligado por argamassa e finalmente, a terceira composta por blocos de arenito, ligados por
argamassa amarelada.
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Fig.6 - Escada Identificada junto à Casa do Coro, u.e. [900] desenho original à escala de 1/10.
Para além desta estrutura, também foi possível, com a remoção do entulho existente no sector,
a detecção de uma escada contemporânea, composta por aparelho de alvenaria de tijolo de
quatro furos, ligada por argamassa, cujas extremidades foram rematadas com
reaproveitamento de alguns blocos de calcário e mármore branco, trabalhados e alisados.
Tratam-se, provavelmente, de elementos construtivos de anteriores construções neste local. A
sua destruição estava prevista tendo, a equipa, monitorizado esta acção.
No acompanhamento destes trabalhos foi possível reconhecer que o enchimento da mesma foi
preenchido com entulho variado composto, maioritariamente, por fragmentos de cerâmica de
construção, nódulos de argamassa, fragmentos de faiança e, em grande quantidade, azulejos
azuis e amarelos do século XVII, similares aos existentes na Capela-mor da Igreja de São
Braz, no Samouco (Alcochete).
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Fig.7 – Prato em faiança da segunda metade do século XVII, identificado na vala 3.
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5. Breves Considerações sobre o Conjunto Artefactual
- Fragmentos de faianças dos séculos XVII e XVIII, com decoração em semicírculos, florais e
de linhas contíguas, em azul de cobalto, onde predominam as formas de pratos, taças e
alguidares;
3,20%
6,50% 12,90%
Cerâmica Comum Contemp.
3,20%
Cerâmica de Construção Contemp.
3,20%
Amostra de Madeira
Botão
41,90%
19,40% Amostra de fósseis
Amostra de Argamassa
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Os materiais arqueológicos identificados na Sondagem 2 foram recolhidos em contexto de
aterro, compostos, essencialmente, por fragmentos de azulejos; fragmentos de cerâmica
comum e vidrada; fragmentos de loiça em faiança da época Moderna; fragmentos de cerâmica
de construção; fragmentos de vidros; alfinetes; pregos; amostras de cal; amostras de
argamassa; amostras de estuque; fragmentos madeira e um numisma do Século XIV – dinheiro
de D. Pedro I (1357-1367)1.
1% 1%
1% 6%
8%
2%
Frag. Azulejo
1%
17% Cerâmica Comum
5% Cerâmica Vidrada
Frag. Faiança
5% Cerâmica de Construção
Frag. Vidro
5% Amostra de Argamassa
Numisma
Alfinetes
Pregos
Amostra de Cal
15%
Frag. Estuque
Madeira
33%
1
Anverso: Cruz cantonada por crescentes e estrelas; Legenda: . P REX PORTUGL. Reverso: Cinco
escudetes carregados de besantes, dispostos em cruz; Legenda: AL / GA / RB / II. Classificação realizada
pelo Dr. José Ruivo e processo de conservação e restauro realizado pelo Laboratório de Conservação do
Museu Monográfico de Conímbriga.
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Considerações Finais
O facto de esta inumação ter sido identificada por debaixo das fundações da actual torre sineira
poderá confirmar que a ermida, anteriormente existente neste local, era de menor dimensão
que o edifício religioso actual e, consequentemente, a área de necrópole seria proporcional à
anterior medida da Ermida.
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