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Teologia

Dogmática Ortodoxa.
Protopresbítero Michael Pomazansky (1888—1988)

Tradução: Rev. Pedro Oliveira Junior.

Conteúdo:

Introdução.
A. As Fontes da Doutrina Cristã.
A preocupação da Igreja com a pureza do ensinamento Cristão. Dogmas. As fontes dos
dogmas. Sagrada Escritura Tradição Sagrada. A Consciência Católica da Igreja. Dogmas
e Canons. Os Trabalhos dos Santos Padres. As verdades da fé nos Ofícios Divinos.
B. Exposições do Ensinamento Cristão.
Os livros simbólicos. Sistemas dogmáticos.
C. Teologia Dogmática.
Dogmáticas e fé. Teologia, Ciência e Filosofia.

Parte I. Deus em Si Próprio.


1. Nosso conhecimento de Deus.
O dogma da fé. Crença ou fé como um atributo da alma. O poder da fé. A fonte da fé.
A natureza de nosso conhecimento de Deus
A essência de Deus. Os atributos de Deus. Sagrada Escritura concernente aos atributos de
Deus. Deus é Espírito. Eterno. Boníssimo. Onisciente. Justíssimo. Todo Poderoso
(Onipotente) Onipresente. Imutável. Auto-suficiente e todo bem-aventurado. A unidade
de Deus.
2. O dogma da Santíssima Trindade.
Introdução. Indicações da Trindade no Velho Testamento. O ensinamento da Santíssima
Trindade no Novo Testamento. O dogma da Santíssima Trindade na Igreja Antiga Os
atributos pessoais das Pessoas Divinas. O nome da Segunda Pessoa — O Verbo. Sobre a
Processão do Espírito Santo. A igualdade da Divindade das Pessoas da Santíssima
Trindade. A Unicidade da Essência; a Igualdade da Divindade; e a Igualdade de Honra de
Deus, o Filho, com Deus o Pai. A Igualdade de honra e a Divindade do Espírito Santo.
Transição para a Segunda Parte da Teologia Dogmática.

Parte II. Deus Manifestado no Mundo.


Deus e a Criação.
Introdução. O modo de criação do mundo. O motivo para a criação. A perfeição da
criação.
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O Mundo Angélico.
Anjos na Sagrada Escritura. A criação dos Anjos. A natureza dos Anjos. O grau de
perfeição angélica. O número e os graus dos Anjos. O ministério dos Anjos.
Homem — A Coroa da Criação.
A alma como uma substância independente. A origem das almas. A imortalidade da alma.
Alma e espírito. A imagem de Deus no homem. O propósito do homem.
Da criação à majestade do Criador.
3. A Providência de Deus.
A providência de Deus sobre o mundo. A Providência de Deus sobre o homem antes da
queda.
5. A Respeito da Malignidade e do Pecado. Malignidade e pecado no mundo. A queda
do mundo Angélico: os espíritos Malignos Queda do homem no pecado.
Porque a queda do homem no pecado foi possível? A história da queda no pecado. O que
foi o pecado ao comer o fruto. As conseqüências morais da queda. As conseqüências
físicas da queda. Infortúnios e morte como castigo pedagógico de Deus. A perda do
Reino de Deus. A misericórdia de Deus para com o homem decaído.
6. Deus e a Salvação do Homem.
A economia de nossa salvação.
A preparação para receber o Salvador. A encarnação do Filho de Deus.
O Senhor Jesus Cristo: Deus verdadeiro. A natureza humana do Senhor Jesus Cristo. Os
erros a respeito das duas naturezas de Jesus Cristo. As duas naturezas em Jesus Cristo. A
natureza humana sem pecado de Jesus Cristo. A adoração una de Cristo. Sobre o culto
latino do “Coração de Jesus.”
Dogmas à respeito da Santíssima Virgem Maria.
A. A Perene Virgindade da Theokotos. B. A Santíssima Virgem Maria é Theotokos. O
Dogma Católico Romano da Imaculada Conceição. O culto do “Imaculado Coração” da
Santíssima Virgem.
O dogma da Redenção.
O Cordeiro de Deus.
A economia geral da salvação.
A. A condição do mundo antes da vinda do Salvador. B. A salvação do mundo em Cristo.
O renascimento pessoal e a nova vida em Cristo. A palavra “redenção” no uso dos
Apóstolos. Uma nota sobre o ensinamento Católico Romano.
O triplo ministério do Senhor.
A. Cristo o Sumo Sacerdote. B. Cristo o Evangelizador (Seu ministério profético). C.
Cristo o Rei do mundo (Seu ministério real). A deificação da humanidade em Cristo.
A Ressurreição de Cristo. Os frutos salvíficos da Ressurreição de Cristo.
A. A vitória sobre o inferno e a morte. B. O Reino de Cristo e a Igreja triunfante. C. O
estabelecimento da Igreja.
7. A Igreja de Cristo.
O conceito da Igreja de Cristo na terra. O início e o propósito da Igreja. A Cabeça da
Igreja. A ligação íntima entre a Igreja na terra e a Igreja no céu.
Atributos da Igreja.
Sua unidade. Sua santidade. Sua catolicidade. A Igreja Apostólica.
A hierarquia da Igreja.

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Apóstolos. Bispos. Presbíteros (padres). Diáconos. Os três degraus da hierarquia. Os


Concílios da Igreja. A ininterruptibilidade do episcopado. O aspecto pastoral da Igreja.
8. Os Santos Mistérios ou Sacramentos. A vida da Igreja no Espírito Santo.
A nova vida. A graça Divina. A providência de Deus e a graça.
Os Mistérios ou Sacramentos.
Batismo.
O estabelecimento do Mistério do Batismo. O significado do Mistério. Os meios de
realização do Mistério. A indispensabilidade do Batismo. Batismo: a porta para a
recepção de outros dons.
Crima.
Os meios originais de execução desse Mistério. Crisma e santificação.
A Eucaristia.
As palavras do Salvador sobre esse Mistério. O estabelecimento do Mistério e sua
execução nos tempos apostólicos. A mudança do pão e vinho no Mistério da Eucaristia.
A maneira pela qual Jesus Cristo permanece nos Santos Dons. A Eucaristia e a Cruz. O
significado da Eucaristia como um sacrifício. Conclusões de um caráter litúrgico. A
necessidade da Comunhão.
Arrependimento.
A Instituição do mistério. Epitimia (Penitência). A visão Católica Romana.
Sacerdócio.
Cheirotonia (na Igreja Antiga). “Eleição” e “Ordenação” na Igreja Antiga. A Essência e
as Palavras da Efetuação do Mistério. O celibato dos Bispos.
Matrimônio.
O Propósito da Família Cristã. O Significado do Mistério. O Momento Central do
Mistério. Matrimônio como Instituição Divina. A Indissolubilidade do Matrimônio.
Santa Unção.
A Essência do Mistério. A Divina Instituição do Mistério. Unção Entre os Protestantes e
Católicos Romanos.
9. Oração Como Expressão da Vida na Igreja.
A Ligação Espiritual dos Membros da Igreja. Orações Para os Mortos. Comunhão com os
Santos. O lado exterior da Oração. A veneração dos ícones. A veneração das santas
relíquias.
O Caminho do Cristão.
A cruz de Cristo: O caminho e poder da Igreja.
10. Escatologia Cristã.
O futuro do mundo e do genro humano. O destino do homem após da morte. Sobre as
Questões dos “Pedágios.” Aqui nos aproximamos do assunto dos pedágios.
Os sinais da Segunda Vinda do Senhor.
A segunda vinda do Filho do Homem.
A ressurreição dos mortos.
O erro do quiliasmo. O final do mundo. O julgamento final. O Reino da Glória.

Apêndices.
Novas correntes no pensamento filosófico-teológico Russo.

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A questão do desenvolvimento dogmático. Filosofia e Teologia. Sobre o sistema


religioso-filosófico de Vladimir S. Soloviev. O ensinamento da Sabedoria de Deus na
Sagrada Escritura.
A glorificação dos Santos.
Introdução. Testemunhos do Início da Igreja. Mártires e Ascetas. Prática Russa.
Necessidade de Alta Autoridade. Conclusão.

Introdução.
As fontes da doutrina Cristã. A preocupação da Igreja com a pureza do ensinamento Cristão.
Dogmas. As fontes dos Dogmas. Sagrada Escritura. Tradição sagrada. A consciência católica da
Igreja. Dogmas e canons. Os trabalhos dos Santos Padres. As verdades da fé nos ofícios Divinos.
Exposições dos ensinamentos Cristãos. Os livros simbólicos. Sistemas dogmáticos. C. Teologia
dogmática. Dogmáticas e fé. Teologia, Ciência e Filosofia.

A. As Fontes da Doutrina Cristã.

A preocupação da Igreja com a pureza do ensinamento Cristão.


Desde os primeiros dias de sua existência, a Santa Igreja de Cristo tem se preocupado
sem cessar que seus filhos, seus membros, permaneçam firmes na pureza da fé.
“Não tenho maior gozo do que este: o de ouvir que os meus filhos andam na verdade”
escreve o santo Apóstolo João, o Teólogo (3 Jo 4). “...escrevi abreviadamente, exortando e testi-
ficando que está é a verdadeira graça de Deus, na qual estais firmes” (1 Pe 5:12) diz o santo A-
póstolo Pedro concluindo sua epístola católica. (“Católica” significado “universal,” é o nome a-
plicado para as Epístolas do Novo Testamento (as de Tiago, Pedro, Judas e João) que foram en-
dereçadas, não para indivíduos ou Igrejas locais (como são todas as Epístolas de São Paulo), mas
para toda a Igreja ou para fiéis em geral.)
O Santo Apóstolo Paulo relata a respeito de si próprio que, tendo pregado por quatorze
anos, ele foi para Jerusalém, por revelação, com Barnabé e Tito, e lá ele ofereceu — especial-
mente para os cidadãos mais renomados — o evangelho que ele pregava, “para ele que de manei-
ra alguma não corresse ou não tivesse corrido em vão.” “Conduz-nos pelos Teus caminhos, a fim
de que caminhemos em Tua Verdade,” — é a primeira petição nas orações dos padres (orações
que são lidas em silêncio pelo padre em frente às Portas Reais enquanto o Salmo 104 é cantado)
durante o Primeiro Ofício do ciclo diário, Vésperas.
O verdadeiro caminho da fé que foi sempre cuidadosamente preservado na história da
Igreja, é de há muito tempo chamado de direto, reto, em grego, orthos — isso é, “ortodoxia.” No
Saltério — do qual como nós sabemos da história nos divinos Ofícios Cristãos, a Igreja foi inse-
parável desde o primeiro o primeiro momento de sua existência — nós achamos frases como as
seguintes — “e tenho andado na Tua verdade” (Sl 26:3); “Saia a minha sentença diante do Teu
rosto” (Sl 17:2); “aos retos convém o louvor” (Sl 33:1); e existem outras. O Apóstolo Paulo ins-
trui Timóteo a apresentar-se perante Deus “como obreiro que não tem do que se envergonhar,
dividindo justamente a palavra da verdade (isto é, cortando justamente com um cinzel, do grego

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orthotomounta; 2 Ti 2:15). Na literatura Cristã dos primeiros tempos há uma constante menção a
se manter a “regra da fé,” a “regra da verdade.” O próprio termo “ortodoxia” foi largamente usa-
do mesmo na época anterior aos Concílios Ecumênicos, a seguir na terminologia dos próprios
Concílios Ecumênicos, e nos Padres da Igreja tanto no Oriente quando do Ocidente.
Lado a lado com o caminho direto, ou reto da fé sempre existiram aqueles que pensaram
diferentemente (heterodoxountes, ou “heterodoxos” na expressão de Santo Inácio, o Teóforo),
uma palavra usada para maiores ou menores erros entre os Cristãos, é as vezes mesmo para sis-
temas completamente incorretos que tentaram explorar no meio dos Cristãos Ortodoxos. Como
resultado da procura pela verdade ocorreram divisões entre os Cristãos.
Tornando-nos familiarizados com a história da Igreja, e da mesma forma observando o
mundo contemporâneo,vemos que os erros que guerrearam contra a Verdade Ortodoxa aparece-
ram e aparecem a) sob a influência de outras religiões, b) sob a influência da filosofia, e
c)através das fraquezas e inclinações da natureza humana decaída, que procura os direitos e justi-
ficativas dessas fraquezas e inclinações.
Os erros criam raízes e se tornam obstinados mais freqüentemente por conta do orgulho
daqueles que os defendem, por causa do orgulho intelectual.

Dogmas.
Assim para guardar o reto caminho da fé, a Igreja teve que forjar formas restritas para a
expressão das verdades da fé: ela teve que construir as fortalezas da verdade para o repúdio de
influências estranhas à Igreja. As definições da verdade declaradas pela Igreja tem sido chama-
das, desde os dias dos Apóstolos, dogmas. Nos Atos dos Apóstolos nós lemos sobre os Apósto-
los Paulo e Timóteo que “quando iam passando pelas cidades, lhes entregavam, para serem ob-
servados, os decretos (Dogmas) que haviam sido estabelecidos pelos apóstolos e anciãos em Je-
rusalém” (At. 16:4; aqui a referência é para os decretos do Concílio Apostólico que é descrito no
capítulo quinze dos Atos dos Apóstolos). Entre os antigos gregos e romanos a palavra dogmat
era usada para se referir a a) conceitos filosóficos, e b) diretivas que deveriam ser precisamente
atendidas. No entendimento Cristão, “Dogmas” são o oposto de “opiniões,” que são concepções
pessoais inconstantes.

As fontes dos dogmas.


Em que são baseados os dogmas? É claro que os dogmas não são baseados nas concep-
ções racionais de indivíduos separados, ainda que esses sejam Padres e Professores da Igreja,
mas sim nos ensinamento das Sagradas Escrituras e na Sagrada Tradição Apostólica. A verdades
da fé que estão contidas nas Sagradas Escrituras e na Sagrada Tradição Apostólica dão a totali-
dade do ensinamento que foi chamada pelos antigos Padres da Igreja de “fé católica,” de “ensi-
namento católico” da Igreja. (Em tais frases a palavra “católica” significa “universal,” referindo-
se à Igreja de todos os tempos, povo e lugares, “onde não há grego nem judeu, circuncisão nem
incircuncisão, bárbaro, cita, servo ou livre, mas Cristo é tudo em todos” (Cl 3:11). Uma célebre
definição de “católica” na Igreja dos primeiros tempos foi dada por São Vicente de Lerins, o Pa-
dre monástico da Gália no século quinto, que em seu Communitorium disse: “Todo cuidado deve
ser tomado para mantermos firmes aquilo que foi creditado em todos os lugares, sempre e por
todos. Isso é verdadeiramente e propriamente “católico” como indicação pela força e etimologia
da palavra em si que compreende tudo que é verdadeiramente universal” (capítulo 2, Fathers of
the Church edition, p. 270). O nome de “católica” foi mantido desde os primeiros tempos na I-
greja “católica romana,” mas os ensinamentos da Igreja do início foram preservados na Igreja

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Ortodoxa, que mesmo até os dias de hoje pode ser e ainda é chamada de “católica” em muitos
lugares desse livro, Padre Michael estará contrastando os ensinamentos do Catolicismo Romano
com aqueles da verdadeira Igreja católica ou Ortodoxa). As verdades da Escritura e Tradição,
harmoniosamente fundidas em um único todo, definem a “consciência católica” da Igreja, uma
consciência que é guiada pelo Espírito Santo.

Sagrada Escritura
Por “Sagrada Escritura” entende-se os livros escritos pelos santos Profetas e Apóstolos
sob a ação do Espírito Santo; assim eles são chamados de “divinamente inspirados.” Eles são di-
vididos em livros do Velho Testamento e livros do Novo Testamento.
A Igreja reconhece 38 livros do Velho Testamento segundo o exemplo da Igreja do Velho
Testamento (Apesar da Igreja no estrito senso ter sido estabelecida somente com a vinda de Cris-
to (ver Mt. 16:18), existiu num certo sentido uma “Igreja” também no Velho Testamento, com-
posta por todos aqueles que olhavam com esperança para a vinda do Messias. Depois da mote de
Cristo na Cruz, quando ele desceu ao inferno e “. ..pregou as espíritos em prisão” (1 Pe 3:19),
Ele levou para cima os justos do Velho Testamento com Ele para o Paraíso, e nesse dia a Igreja
Ortodoxa celebra os dias de festa dos Santos Pais do Velho Testamento, dos Patriarcas e dos pro-
fetas igual celebra os dias de desta dos santos no Novo Testamento), muitos nesses livros são
reunidos para formar um só, fazendo o número cair para vinte e dois livros, de acordo com o
número de letras do alfabeto hebreu. (Os 22 livros “canônicos” do Velho Testamento são: 1. Gê-
nesis, 2. Êxodo, 3. Leviticos, 4. Números, 5. Deuteronômio, 6. Josué, 7. Juizes e Ruth, conside-
rado como um só, 8. Primeiro e Segundos Reis (chamados de primeiro e segundo Samuel na ver-
são de King James),9. Terceiro e Quarto Reis (Primeiro e Segundo Reis na versão de King Ja-
mes) 10. Primeiro e Segundo Paralipomena (Primeira e segunda Crônicas na versão de King Ja-
mes), 11. Primeiro Esdras e Neemias, 12. Éster, 13. Jô, 14. Salmos, 15.Provérbios, 16. Eclesias-
tes, 17. Cantares de Salomão, 18.Isaias, 19. Jeremias, 20. Ezequiel, 21. Daniel, 22. Os Doze Pro-
fetas (Oséias, Joel, Amos, Obadias, Jonas, Miquéias, Naum, Habacuque, Sefonias, Ageu, Zacari-
as, Malaquias). Esta é a lista dada por São João Damasceno na Exact Exposition of the Christian
faith, p 375). Esses livros, que entraram em algum tempo no cânon hebreu, são chamados de
“canônicos” (A palavra “canônico” aqui tem um significado específico com referencia aos livros
das Escrituras e assim deve ser distinguido do uso mais usual da palavra na Igreja Ortodoxa, on-
de ela não se refere ao “cânon” da Escritura, mas sim aos “canons” ou leis proclamadas nos Con-
cílios da Igreja. Nesse sentido, “canônico” significa somente “incluído no canon hebreu” e “não
canônico” significa somente “não incluído no cânon hebreu” (mas ainda aceito pela Igreja como
Escritura). No mundo Protestante os livros “não canônicos” do velho Testamento são normal-
mente chamados de “Apócrifos,” freqüentemente com uma conotação pejorativa, ainda que eles
tenham sido incluídos nas primeiras impressões da versão de King James, e uma lei de 1615 na
Inglaterra até mesmo proibiu que as Escrituras fossem impressas sem esses livros. Na Igreja Ca-
tólica Romana desde o século XVI os livros não-canônicos tem sido chamados de “Deuteroca-
nônico” — isto é — pertencendo a um “segundo” ou tardio cânon da Escritura. Na maioria das
traduções da Bíblia que incluem os livros “não-canônicos,” eles são colocados juntos dos livros
canônicos; mas em impressões antigas em países ortodoxos não há distinção entre livros canôni-
cos e não canônicos, veja-se por exemplo a Bíblia Eslavônica impressa em São Petesburgo em
1904, e aprovada pelo Santo Sínodo). A eles são juntados um grupo de livros “não-canônicos”
— isto é, aqueles que não foram incluídos no cânon hebreu porque eles foram escritos após o
fechamento do cânon dos Livros Sagrados do Velho Testamento. (Os livros “não-canônicos” do

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Velho Testamento aceitos pela Igreja Ortodoxa são aqueles do “septuaginto” — a tradução grega
do Velho Testamento feita pelos “setenta” eruditos que, de acordo com a tradição foram envia-
dos de Jerusalém para o Egito atendendo a pedido do rei egípcio Ptolomeu II no terceiro século
B.C. para traduzir o Velho Testamento grego. Os originais hebreus da maioria dos livros, e a
maioria dos livros foram compostos somente nos últimos séculos antes de Cristo. Os livros “não-
canônicos” do Velho Testamento: Tobias, Judith, Sabedoria de Salomão, Eclesiástico ou a Sabe-
doria de Josué o filho de Sirach, Baruch, três livros dos Macabeus, a Epístola de Jeremias, Salmo
151, e as adições aos Livros de Éster, de duas Crônicas (a Oração de Manasses), e de Daniel (a
Canção dos Três Meninos, Suzana e Bel e o Dragão) A Igreja aceita esses livros mais tardios
como úteis e instrutivos e antigamente indicava-os para leitura instrutiva não só nos lares mas
também nas Igrejas, por isso é que eles foram chamados de “Eclesiásticos.” A Igreja inclui esses
livros num só volume junto com os livros canônicos. Como uma fonte de ensinamento na fé, a
Igreja os coloca em posição secundária e olha-os como um apêndice aos livros canônicos. Al-
guns deles estão tão perto em mérito dos livros devidamente inspirados que, por exemplo no 85º
cânon apostólico (os Canons Apostólicos, dos Santos Apóstolos são uma coleção de 85 canons
Eclesiásticos ou leis vindas dos Apóstolos e seus sucessores e aos quais foi dada a provação ofi-
cial pela Igreja no Concílio de Quinsexto, em Trullo em 692, e no primeiro cânon do Sétimo
Concílio (787). Alguns desses canons foram citados e aprovados em Concílios Ecumênicos a
começar pelo Primeiro Concílio em 325, mas a coleção completa de todos os canons juntos pro-
vavelmente não foi completada antes do 4º século. O nome apostólico não necessariamente sig-
nifica que todos os canons ou a coleção deles foram feitas pelos próprios Apóstolos, mas somen-
te que eles estão de acordo com a tradição legada pelos Apóstolos (assim como nem todos os
“Salmos de Davi” foram na verdade escrito pelo profeta Davi). Para o texto dos 85 cânon, ver
Eerdemans Seven Ecumenical Councils, p. 594-600. O cânon Apostólico nº 85 lista os livros ca-
nônicos do Velho e Novo Testamento). Os três livros de Macabeus e o livro de Josué o filho de
Sirach são listados juntos com os livros canônicos, e, a respeito de todos eles juntos, é dito que
são “veneráveis e santos.” No entanto, isso só significa que eles eram respeitados na Igreja anti-
ga; mas uma distinção entre os livros canônicos e os não-canônicos do Antigo Testamento foi
sempre mantida na Igreja.
A Igreja reconhece 27 livros canônicos do Novo Testamento. (Esses livros são: os 4 E-
vangelhos de Mateus, Marcos, Lucas e João; os Atos dos Apóstolos; as Sete Epístolas Católicas
(uma de Tiago, duas de Pedro, três de João e uma de Judas); catorze Epístolas do Apóstolo Paulo
(Romanos, Primeira e Segunda aos Coríntios, Gálatas, Efésios, Filipenses, Colossensses, Primei-
ra e Segunda Tessalônica, Primeira e Segunda Timóteo, Tito, Filemon, Hebreus); e o Apocalipse
(Revelação) de São João Teólogo e Evangelista). Como os livros sagrados do Novo Testamento
foram escritos em vários anos da era apostólica e foram enviados pelos Apóstolos para vários
pontos da Europa e Ásia, e alguns deles não tiveram uma designação refinada para nenhum lugar
específico, o ajuntamento deles em uma única coleção ou código não poderia ser um assunto fá-
cil; foi necessário manter uma vigilância estrita entre os livros de origem apostólica pois poderi-
am haver entre eles alguns dos assim chamados livros “apócrifos,” que em sua maior parte foram
compostos em ciclos heréticos. Por isso, os padres e professores da Igreja, durante os primeiros
séculos do Cristianismo mantiveram uma precaução especial em distinguir esses livros ainda que
eles portassem o nome dos Apóstolos. Os padres da Igreja freqüentemente introduziram certos
livros em suas listas com reservas, com incertezas e dúvidas, ou ainda por essa razão deram uma
lista incompleta dos Livros Sagrados. Isso foi inevitável e serve como memorial para essa pre-
caução excepcional nesse assunto santo. Eles não confiaram em si próprios mas esperaram pela

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voz universal da Igreja. O Concílio de Cartago que foi local, em 318, em seu cânon 33, enumera
todos os livros do Novo Testamento sem exceção.
Santo Atanásio, o Grande nomeia todos os livros do Novo Testamento sem a mínima dú-
vida ou distinção, e em uma das suas obras ele concluiu sua lista com as seguintes palavras:”
Prestem atenção no número dos livros canônicos do Novo Testamento. Eles são, como foram, o
começo, as ancoras e pilares da nossa fé, porque eles foram escritos pelos próprios Apóstolos de
Cristo, o Salvador que estiveram com Ele e por Ele foram instruídos (da Synopsis de Santo Ata-
násio). Da mesma forma São Cirilo de Jerusalém também enumera os livros do Novo Testamen-
to sem o mais leve reparo ou qualquer tipo de distinção entre eles na Igreja. A mesma lista com-
pleta encontrada entre os escritores eclesiásticos ocidentais, por exemplo Santo Agostinho. As-
sim, o cânon completo dos livros do Novo Testamento da Sagrada Escritura foi confirmado pela
voz católica da Igreja toda. Essa Sagrada Escritura, na expressão de São João Damasceno, é o
“Paraíso Divino” (Exact Exposition of the Ortodox Faith, Livro 4, Cap 17, Eng. Tr. p. 374).

Tradição Sagrada.
No significado original preciso da palavra, Tradição Sagrada é a tradição que vem da an-
tiga Igreja dos tempos Apostólicos. Do segundo ao quarto século isso foi chamado de “A Tradi-
ção Apostólica.”
Deve-se ter em mente que a Igreja primitiva guardava cuidadosamente a vida interior da
Igreja daqueles que estavam fora delas; seus Santos Mistérios eram secretos, mantidos fora dos
conhecimentos dos não-cristãos. Quando esses Santos Mistérios eram realizados — Batismo ou a
Eucaristia — aqueles que não eram da Igreja não estavam presentes; a ordem dos ofícios não era
escrita mas só transmitida oralmente; e no que era preservada em segredo estava contido o lado
essencial da fé. São Cirilo de Jerusalém (4º século) nos apresenta isso de maneira especialmente
clara. A respeito de instruções Cristãs para aqueles que ainda não tinham expressado a decisão
final de se tornarem Cristãos, o hierarca precede ensinamentos com as seguintes palavras:
“Quando o ensinamento catequético é pronunciado, se um catecúmeno te perguntar, ‘O que o
instrutor disse?’ tu não deves repetir nada para aqueles que estão sem (Igreja). Pois nós estamos
te dando um mistério e esperança da era futura. Mantenha o Mistério Daquele que é o doador de
recompensa, que ninguém diga a ti ‘Qual é o mal se nós descobrimos também?’ Pessoas doentes
também pedem por vinho, mas se lhes for dado na hora errada ele produz desordem na mente, e
existem duas conseqüências malignas; o doente morre e o médico é difamado” (Prologue to the
Catechetical Lectures, cap. 12).
Em uma de suas homilias seguintes São Cirilo de novo observa: “Incluímos o ensinamen-
to completo da fé em poucas linhas, E eu desejaria que vocês lembrassem dele palavra por pala-
vra e deveriam repeti-lo entre vocês com todo fervor, sem escreve-lo em papel, mas anotando-o
por memória no coração. E vocês deveriam precaver-se pelo menos durante o tempo de vossa
ocupação com esses estudos para que nenhum dos catecúmenos venha a ouvir aquilo que foi pas-
sado para vocês” (Fifth Catechetical Lecture, ch. 12). Nas palavras introdutórias que ele escreveu
para aqueles que iriam ser “iluminados” — isto é, aqueles que já estavam para o batismo — e
também para aqueles prestes que eram batizados, ele dá o seguinte aviso: “Esta instrução para
aqueles que estão sendo iluminados é oferecida para ser lida por aqueles que estão vindo para o
Batismo, e também pelos fiéis que já receberam o batismo; mas de modo nenhum não a dêem
nem para catecúmenos nem para qualquer outro que ainda não se tornara Cristão, senão terão que
responder ao Senhor. E se vocês fizerem cópia dessa leitura catequética, então, como diante do
Senhor, copie isso também” (isso é, o aviso).(fim do Prologue para Catechetical Lectures). (Es-

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sas três citações são encontradas nas Catechetical Lectures, Eerdmans ed. pes. 4, 32, 5. Esse ri-
gor com respeito a revelação dos Mistérios Cristãos (Sacramentos) para estranhos a Igreja não é
mais preservada em tal nível na Igreja Ortodoxa. A exclamação “Retirai-vos catecúmenos!” an-
tes da Liturgia dos fiéis ainda é proclamada, é verdade, mas dificilmente em qualquer lugar do
mundo ortodoxo os catecúmenos ou não ortodoxos são instruídos a deixar a Igreja nesse instante.
(Em algumas Igrejas eles são somente solicitados a ficar no fim da Igreja, no nartex, mais ainda
porém observar o ofício). O ponto fulcral dessa ação perdeu-se no nosso tempo, quando todos os
“segredos” dos Mistérios Cristão estão prontamente disponíveis para quem consegue ler, e o tex-
to de São Cirilo Catechetical Lectures foi publicado em muitas línguas e edições. No entanto, a
grande reverência que a Igreja antiga mostrava pelos Mistérios Cristãos, preservando-os cuida-
dosamente do olhar daqueles que eram meramente curiosos, ou daqueles que, sendo de fora da
Igreja e, descompromissados com o Cristianismo, poderiam interpretar mal ou desconfiar deles
— é ainda mantida pelos Cristãos Ortodoxos de hoje em dia, que ainda são sérios acerca de sua
fé, mesmo hoje em dia não devemos “dá pérolas aos porcos” — falar muito dos Mistérios da Fé
Ortodoxa para aqueles que só curiosos sobre eles mas que não procuram juntar-se a Igreja).
Nas palavras que se seguem São Basílio, o Grande dá-nos um claro entendimento da Sa-
grada Tradição Apostólica: “Dos dogmas e sermões preservados na Igreja, alguns nós temos por
instrução escrita, e alguns nós recebemos da Tradição Apostólica, passados em segredo. Tanto
um quanto outro tem a mesma autoridade para a piedade e ninguém ainda que seja o menos in-
formado nos decretos da Igreja contradirá isso. Pois se nós ousarmos subverter os costumes não
escritos como se eles não tivessem grande importância, nós estaremos assim fazendo impercepti-
velmente mal aos Evangelhos em seus pontos mais importantes. E ainda mais, nós seremos dei-
xados como o nome vazio na pregação Apostólica sem conteúdo. Por exemplo, prestemos aten-
ção especialmente na primeira e mais comum das coisas que aqueles que esperam no nome de
Nosso Senhor Jesus Cristo devem se assinalar com o Sinal da Cruz. Quem ensinou isso nas Es-
crituras? Que Escrituras instrui-nos a rezar voltados para o leste? Qual dos santos nos deixou em
forma escrita as palavras da invocação durante a transformação do pão da Eucaristia e a benção
do Cálice? Pois não estando satisfeitos com as palavras que são mencionadas nas Epístolas e E-
vangelhos, mas antes e depois delas nos pronunciamos que também tem uma grande autoridade
para o Mistério, tendo-as recebido por ensinamento não escrito. Por qual Escritura, da mesma
forma, abençoamos a água do Batismo e o óleo da unção? Não é isso a silenciosa e secreta tradi-
ção? E o que mais? Que palavra escrita nos ensinou essa unção com óleo? (Isso é, a unção da-
queles que estão sendo batizados; a unção do Sacramento da Unção, de outro lado, é claramente
indicado nas Escrituras (Tes 5:14) Aonde é encontrada a tripla imersão e todo o resto que tem a
ver com o Batismo, a renúncia a Satanás e seus anjos? De que Escrituras são tomadas? Não é
desse ensinamento não publicado e não falado que nossos padres preservaram em silêncio ina-
cessível a curiosidade e escrutínio, porque eles foram inteiramente instruídos a preservar em si-
lêncio a santidade dos Mistérios? Que propriedade teria proclamar por escrito um ensinamento
referente aquilo que não é permitido para os não batizados sequer contemplar? (On The Holy
Espirit, cap. 27).
Dessas palavras de São Basílio, o Grande devemos concluir: primeiro, que a sagrada tra-
dição do ensinamento da fé é aquela que pode ser rasteada até o período mais antigo da Igreja, e
segundo, que tenha sido cuidadosamente preservada e unanimente reconhecida entre os padres e
professores durante a época dos grandes padres e o início dos Concílios Ecumênicos.
Apesar de São Basílio ter dado uma série de exemplos da “tradição oral,” ele próprio nes-
se mesmo texto deu passos na direção de “gravar” essas palavras orais. Durante a era de liberda-

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de e no triunfo da Igreja no quarto século, quase toda tradição em geral recebeu uma forma escri-
ta e está agora preservada na literatura da Igreja, e que resulta num suplemento da Sagrada Escri-
tura.
Nós encontramos essa antiga sagrada Tradição

no mais antigo texto da Igreja, os canons dos Santos Apóstolos; (Ver páginas
anteriores nota sobre Canons dos Santos Apóstolos);
nos símbolos da fé (Credo) das antigas Igrejas locais;
nos antigos Atos dos mártires Cristãos. Os Atos dos mártires não entravam em uso pe-
los fiéis até que eles tivessem sido examinados e aprovados pelos bispos locais; e eram
lidos em reuniões públicas de Cristãos sob a supervisão dos líderes das Igrejas. Neles
nós vemos a confissão da Santíssima Trindade, a Divindade do Senhor Jesus Cristo,
exemplos de invocação de santos, a crença na vida consciente daqueles que haviam
repousado em Cristo, e muito mais;
nos registros antigos da história da Igreja especialmente no livro de Eusébio Pamphilo,
Bispo de Cesareia (Tradução inglesa: Eusebius: The History of Church from Christ to Constantine,
tradução por G. A. William, Peguin Books, Baltimore, 1965) onde estão reunidas muitas tradi-
ções antigas de rito e dogma — em particular, ali é dado o cânon dos livros sagrados
do Antigo e Novo Testamento;
nos trabalhos dos antigos padres e professores da Igreja;
e finalmente, no verdadeiro espírito da vida da Igreja, na preservação da fidelidade a
todas as suas fundações que vem dos Santos Apóstolos.

A Tradição Apostólica que tem sido preservada e guardada pela Igreja pelo simples fato que ela
tem sido mantida pela Igreja, torna-se a própria Tradição da Igreja, “pertence” a ela, e testifica
sobre ela, e, em paralelo à Sagrada Escritura é chamada pela Igreja, “Sagrada Tradição.”
O testemunho da Sagrada Tradição é indispensável para nossa certeza que todos os livros
da Sagrada Escritura nos foram entregues vindos dos tempos Apostólicos e são de origem apos-
tólica. A Sagrada Tradição é necessária para o correto entendimento de passagens separadas das
Sagradas Escrituras, e para refutar interpretações heréticas, e, em geral, para evitar interpretações
superficiais, unilaterais, e às vezes até mesmo prejudiciais e falsas.
Finalmente, a Sagrada Tradição é também necessária porque algumas verdades da fé são
expressas numa forma completa e definitiva nas Escrituras, enquanto outras não estão claras e
precisas e por isso precisam confirmação pela Tradição Apostólica Romana.
O Apóstolo comanda: “Então, irmãos, estais firmes e retende as tradições que vos foram
ensinadas, seja por palavra, seja por epístola nossa.”
Além de tudo isso, a Sagrada Escritura é valiosa porque dela nos vemos como a ordem
completa da organização da Igreja, os canons, os Ofícios Divinos e ritos são enraizados no modo
de vida da Igreja dos tempos antigos. Assim, a preservação da “Tradição” expressa a sucessão da
verdadeira essência da Igreja.

A Consciência Católica da Igreja.


A Igreja Ortodoxa de Cristo é o Corpo de Cristo, um organismo espiritual cuja cabeça é o
Cristo. Ela tem um único espírito, uma única fé comum, uma única e comum consciência católi-
ca, guiada pelo Espírito Santo; e seus raciocínios são baseados nas concretas e definidas funda-
ções da Sagrada Escritura e da Sagrada Tradição Apostólica. Essa consciência é expressada nos

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Concílios Ecumênicos da Igreja. Desde uma profunda antigüidade Cristã, concílios locais de I-
grejas separadas reuniam-se duas vezes por ano, de acordo com o 37º cânon dos Santos Apósto-
los. A mesma forma, freqüentemente na história da Igreja existiram concílios de bispos regionais
representando uma área mais ampla do que a de Igrejas individuais e, finalmente concílios de
bispos de toda a Igreja Ortodoxa tento do Oriente quanto do Ocidente. Tais Concílios Ecumêni-
cos a Igreja reconhece em número de sete. Os Concílios Ecumênicos também formularam nume-
rosas leis e regras governando a vida pública e privada da Igreja Cristã, que são os chamados ca-
nons da Igreja, e que requeriam sua observância universal e uniforme. Finalmente, os Concílios
Ecumênicos confirmaram decretos dogmáticos de numerosos concílios locais e também regras
dogmáticas compostas por certos padres da Igreja — por exemplo a confissão de fé de São Gre-
gório, o Taumaturgo, Bispo de Neo-Cesareia (Para o texto das “Epístolas Canônicas” de São
Gregório, ver Seven Ecumenical Councils, p. 602, Eedermans), o cânon de São Basílio, o Grande
(O texto dos canons de São Basílio é encontrado no mesmo livro de Eedermans nas p. 604-611),
e assim por diante.
Quando na história da Igreja, aconteceu que concílios de bispos permitiram pontos de vis-
tas heréticos serem expressos em seus decretos, a consciência católica da Igreja foi perturbada e
não foi pacificada até que a autêntica verdade Cristã fosse restaurada e confirmada por meio de
outro concílio (concílios verdadeiros — aqueles que a verdade Ortodoxa — são aceitos pela
consciência católica da Igreja; concílios falsos — aqueles que ensina heresia ou rejeitam algum
aspecto da Tradição da Igreja — são rejeitados pela mesma consciência católica . A Igreja Orto-
doxa é a Igreja não de concílios como tais, mas dos verdadeiros concílios, inspirados no Espírito
Santo, e que se conformam coma consciência católica da Igreja). Deve-se lembrar que os concí-
lios da Igreja fizeram seus decretos dogmáticos: a) depois de um cuidadoso, perfeito e completo
exame de todas as passagens da Sagrada Escritura que tocassem em um determinado assunto, b)
então verificando que a Igreja Ecumênica tivesse entendido as citadas passagens da Sagrada Es-
critura de modo preciso. Desse modo os decretos dos concílios concernentes à fé expressam a
harmonia da Sagrada Escritura e a Tradição católica da Igreja. Por essa razão esses decretos tor-
naram-se, por sua vez em uma autentica, inviolável, autorizada, Ecumênica e Sagrada Tradição
da Igreja, baseada em fatos da Sagrada Escritura e na Tradição Apostólica.
Certamente, muitas verdades da fé são tão imediatamente claras na Sagrada Escritura que
não foram sujeitas a interpretações heréticas; por isso a respeito delas não há decretos específicos
dos concílios. Outras verdades no entanto foram confirmadas por concílios.
Entre todos os decretos dogmáticos dos concílios, os próprios Concílios Ecumênicos re-
conhecem como primário e fundamental o Símbolo da Fé de Nicéia-Constantinopla (O “Credo”
(“creio em um só Deus...) que é cantado em toda Divina Liturgia da Igreja Ortodoxa e lido em
diversos outros lugares nos Divinos Ofícios diários) e eles proibiram qualquer modificação que
fosse, nele, por adição ou subtração (decreto do Terceiro Concílio Ecumênico, repetido pelo
Quarto, Quinto, Sexto e Sétimo Concílios).
Os decretos relativos a fé que foram feitos por inúmeros concílios locais e também certas
exposições de Fé pelos Santos Padres da Igreja, são reconhecidos como guias para toda a Igreja e
são enumerados no segundo cânon do Sexto Concílio Ecumênico (em Trullo; O “Quinsext”
Concílio em Trullo (642) foi de fato reunido onze anos depois do Sexto Concílio Ecumênico,
mas seus decretos são aceitos na Igreja Ortodoxa como a continuação dos Canons do Sexto Con-
cílio Ecumênico. O texto desses canons pode ser lido no Seven Ecumenical Council, p. 361, e os
canons dos concílios locais e exposições dos Santos Padres que foram aprovados nesse “cânon”
estão impressos no mesmo volume p. 409-519, 584-645).

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Dogmas e Canons.
Na terminologia eclesiástica dogmas são as verdades do ensinamento Cristão, as verdades
da fé, e canons são as prescrições: relacionadas com a Igreja, governo da Igreja, obrigações da
hierarquia e do clero da Igreja e de todo o Cristão, que fluem do embasamento moral do ensina-
mento evangélico e Apostólico. Cânon é uma palavra grega que significa literalmente “uma vara
reta, uma medida de direção precisa.”

Os Trabalhos dos Santos Padres.


Para orientação em questões de fé, para o correto entendimento da Sagrada Escritura, e de
maneira a distinguir a autêntica tradição da Igreja dos falsos ensinamentos, nós apelamos para os
trabalhos dos Santos Padres da Igreja, reconhecendo que a concordância unânime de todos os
padres e professores da Igreja ao ensinar a fé é um indubitável sinal de verdade. Os Santos Pa-
dres permaneceram na fé, não temendo nem ameaças, nem verdades da Fé: 1) dão precisão à ex-
pressão das verdades do ensinamento Cristão e criam a unidade da linguagem dogmática; 2) a-
crescentam testemunhos dessas verdades com a Sagrada Escritura e a Sagrada Tradição e tam-
bém trazem argumentos baseados na razão. Em teologia, atenção é dada também para certas opi-
niões particulares (em grego: theologoumenaI) dos Santos Padres ou professores da Igreja em
questões que não foram precisamente definitivas e aceitas por toda a Igreja. No entanto, essas
opiniões não devem ser confundidas com dogmas no sentido preciso da palavra. Existem algu-
mas opiniões particulares de certos padres e professores que não são reconhecidas como estando
de acordo com a fé católica geral na Igreja, e não são aceitas como guias da fé. (Com exemplo de
tais “opiniões particulares,” pode-se tomar a opinião errada de São Gregório de Nissa que o in-
ferno não eterno e que todos — inclusive os demônios — serão salvos no fim. Essa opinião foi
rejeitada decisivamente no Quinto Concílio Ecumênico por contradizer a “consciência católica
da Igreja,” mas o próprio São Gregório é ainda aceito como santo e Santo Padre na Igreja Orto-
doxa e seus outros ensinamentos não são questionados. Sobre a atitude Ortodoxa para com tais
“opiniões particulares” erradas dos padres, e especificadamente, a respeito dos ensinamentos de
Padres como São Photius, o Grande e São Marcos de Éfeso, ver o artigo “The Plave of Blessed
Augustine na Igreja Ortodoxa” em The Orthodox Word, 1978, nºs. 79 e 80, é impresso também
como um livrete separado, São Herman do Alasca Brotherhood, 1983).

As verdades da fé nos Ofícios Divinos.


A consciência Católica da Igreja, quando ela se preocupa com o ensinamento da fé, tam-
bém é expressa nos Divinos Ofícios Ortodoxos que nos foram passados pela Igreja Ecumênica.
Entrando-se profundamente no conteúdo dos livros dos Divinos Ofícios nós nos tornamos mais
firmes no ensinamento dogmáticos da Igreja Ortodoxa. (Deve-se notar que os compositores e
compiladores dos Ofícios Divinos foram freqüentemente grandes teólogos. Por exemplo, o Octo-
echos ou livro dos ofícios diários nos Oito Tons, é essencialmente obra de São João de Damas-
ceno, o Santo Padre do 8º século que reuniu a teologia Ortodoxa da grande era patrística).

B. Exposições do Ensinamento Cristão.

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Os livros simbólicos.
As interpretações do Símbolo da Fé, ou os “Guias Simbólicos” (do grego symballo, signi-
ficando “unir”; symbolom um sinal unitivo ou condicional) da Fé Ortodoxa, no significado co-
mum desse termo, são aquelas exposições de fé Cristã que são dadas no Livro de Canons dos
Santos Apóstolos, nos Santos Concílios Locais e Ecumênicos, e nos Santos Padres. A teologia da
Igreja Russa também faz uso, como livros simbólicos, daquelas duas exposições de fé que em
tempos mais recentes foram evocadas pela necessidade de apresentar o ensinamento Cristão Or-
todoxo contra ensinamentos de confissões não-ortodoxas no segundo milênio. Esses livros são:
A Confissão da Fé Ortodoxa compilada pelo Patriarca de Jerusalém, Dositeus, que foi lida e a-
provada no Concílio de Jerusalém em 1672 e, cinqüenta anos depois, em resposta a uma inquiri-
ção recebida da Igreja Anglicana, foi enviada para essa Igreja em nome do todos os Patriarcas
Orientais e por isso ficou mais conhecida pelo nome de “A Encíclica dos Patriarcas Orientais
Sobre a Fé Ortodoxa.” Também incluída nessa categoria está a Orthodox Confession de Peter
Mogica, metropolita de Kiev, que foi examinada e corrigida em dois concílios locais, o de Kiev
em 1640 e o de Jassy em 1643, e então aprovada por quatro Patriarcas Ecumênicos e pelos Patri-
arcas russos Joaquim e Adrian. O Catecismo Cristão Ortodoxo do Metropolitan Philaret de Mos-
cou goza de importância similar na Igreja Russa, particularmente a parte que contem a exposição
do símbolo da fé. Esse catecismo foi “examinado e aprovados pelo Santo Sínodo e publicado pa-
ra instrução nas escolas e para o uso de todos os Cristãos Ortodoxos.”

Sistemas dogmáticos.
À tentativa de se ter uma exposição compreensiva de todo ensinamento cristão nós cha-
mamos de “sistema de teologia dogmática.” Um sistema dogmático completo, muito valioso para
a teologia Ortodoxa, foi compilado no século oitavo por São João Damasceno sob o título de E-
xact Exposition of the Orthodox Faith. Nesse trabalho, pode-se dizer, São Damasceno reuniu to-
do o pensamento teológico dos Padres do Oriente e professores da Igreja até o século oitavo.
Entre os teólogos russos os trabalhos mais completos de teologia dogmática foram escri-
tos no século dezenove pelo Metropolita Macário de Moscou (Orthodox Dogmatic Theology,
dois volumes), por Philaret, Arcebispo de Chernigov (Orthodox Dogmatic Theology, em duas
partes), pelo Bispo Silvestre, reitor da Academia Teológica de Kiev (Essay in Orthodox Dogma-
tic Theology, with a Historical Exposition of the Dogmas, cinco volumes), pelo Arcipreste N.
Malinovsky (Orthodox Dogmatic Theology, quatro volumes e A Sketch of Orthodox Dogmatic
Theology, em duas partes), e pelo Arcipreste p. Svietlov (The Chistian Teaching of Faith, na
Apologetic Exposition). (Esses “sistemas” russos de teologia do século dezenove estiveram fora
de moda entre os teólogos acadêmicos Ortodoxos nos anos recentes, e alguns os criticaram por
supostas “influências orientais” que eles mostrariam. Essa crítica, enquanto de uma certa maneira
parte justificada, em sua maior parte é unilateral e injusta, e conduziu alguns a uma confiança
cega nos teólogos ortodoxos de hoje como não contaminados pela “influência ocidental.” A ver-
dade do assunto é que a divisão da teologia em “categorias,” sua “sistematização” (que o próprio
livro presente segue) é um dispositivo bem moderno emprestado do Ocidente, mas como somen-
te uma organização externa do sujeito-assunto da teologia. Padre Michael, ele próprio, defendeu
em outro texto esse sistema de teologia pela sua utilidade no ensino da teologia nas escolas con-
tra acusações de “escolaticismo” que são totalmente injustas. Em intenção, esses sistemas são só
uma tentativa no século dezenove de fazer o que São João Damasceno fez no século oitavo, e
ninguém pode negar que o conteúdo básico desses trabalhos é Ortodoxo).

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C. Teologia Dogmática.
O trabalho dogmático da Igreja sempre foi dirigido para a confirmação na consciência dos fiéis
das verdades da Fé, que foi confessada pela Igreja desde o começo. Esse trabalho consiste em
indicar que modo de pensamento tem aquele que segue a Tradição Ecumênica. O trabalho de ins-
trução da Igreja tem sido, batalhar contra as heresias: achar uma forma precisa de expressão das
verdades da fé como recebidas da antigüidade e confirmar a correção do ensinamento da Igreja,
fundamentando-o na Sagrada Escritura e na Sagrada Tradição. No ensinamento da fé, é o pensa-
mento dos Santos Apóstolos que foi e permanece sendo o padrão da totalidade e da completude
da visão Cristã do mundo. Um Cristão do século vinte não pode desenvolver mais completamen-
te ou ir mais fundo nas verdades da fé do que os Apóstolos. Por isso, qualquer tentativa que é
feita — seja por indivíduos ou em nome da própria teologia dogmática — em revelar novas ver-
dades Cristãs, ou novos aspectos dos dogmas que nos foram passados, ou um novo entendimento
sobre eles, é completamente fora de propósito. O objetivo da teologia dogmática como um ramo
do aprendizado é apresentar, com embasamento firme e provado, o ensinamento Cristão Ortodo-
xo que nos foi passado.
Certas obras completas de teologia dogmática apresentam o pensamento dos Padres da
Igreja em uma seqüência histórica. Assim, por exemplo, o acima mencionado Essay in the Or-
thodox Dogmatic Theology pelo Bispo Silvestre é arrumado desse modo. Deve-se compreender
que tal método de exposição em teologia Ortodoxa não tem o propósito de investigar o “desen-
volvimento gradual do ensinamento Cristão”; seu objetivo é inerente: é mostrar que a apresenta-
ção completa, em seqüência histórica das idéias dos Santos Padres da Igreja em todas as épocas
ensinaram o mesmo acerca das verdades da fé. Mas, porque alguns deles viram o assunto de um
lado, e outra do outro lado, e alguns deles trouxeram argumentos de um tipo, e outros de outro
tipo, por isso a seqüência histórica dos ensinamentos dos Padres dá uma vista completa dos
dogmas da fé e a completude das provas de suas verdades.
Isso não significa que a exposição teológica dos dogmas deva tomar uma forma inalterá-
vel. Cada época coloca seu modo de ver, modo de compreender, questões, heresias e protestos
contra a verdade Cristã, ou ainda repete coisas antigas que haviam sido esquecidas. A teologia
naturalmente leva em consideração as questões de cada época, e coloca as verdades dogmáticas
de acordo com isso. Nesse sentido, pode-se falar acerca do desenvolvimento da teologia dogmá-
tica como um ramo do aprendizado. Mas não há espaço suficiente para se falar sobre o desenvol-
vimento Cristão da própria fé.

Dogmáticas e fé.
Teologia dogmática é para o Cristão que crê. Nem mesmo ela não inspira fé. Mas pressu-
pões que a fé já exista no coração. “Cri, por isso falei” diz um homem justo no Velho Testamen-
to (Sl 116:10). E o Senhor Jesus revelou os mistérios do Reino de Deus a Seus discípulos depois
que eles acreditaram Nele: “Senhor, para quem iremos nós? Tu tens as palavras da vida eterna, E
nós temos crido e conhecido que Tu és o Cristo, o Filho de Deus (Jô 6: 68-69). Fé, e mais preci-
samente fé no Filho de Deus que veio ao mundo, é a pedra fundamenta da teologia.” “Estes po-
rém foram escritos para que creais que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e para que, crendo, te-
nhais vida em Seus Nome” (Jo. 20:31), escreve o Apóstolo João no fim do seu Evangelho e ele
repete o mesmo pensamento muitas vezes em suas Epístolas: e essas palavras dele expressa a

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idéia principal de todo os escritos dos Santos Apóstolos: Eu creio. Todo Cristão teologicamente
deve começar com essa confissão. Sob essa condição teologizar não é um exercício intelectual
abstrato, nem uma dialética intelectual, mas uma morda dos pensamentos nas verdades divinas,
um direcionamento da mente e coração para Deus, e um reconhecimento do amor de Deus. Para
um descrente teologizar é algo sem efeito, pois Cristo, para descrentes é “uma pedra de tropeço e
rocha de escândalo” (1 Pe 28; ver Mt 21:44).

Teologia, Ciência e Filosofia.


A diferença entre teologia e ciências naturais, que estão baseadas em observação e expe-
riências é tornada clara pelo fato que a teologia dogmática é baseada em viva e santa fé. Aqui o
ponto de início é fé, e lá, experiência. No entanto, as maneiras e métodos de estudo são um só e o
mesmo em ambas as esferas; o estudo dos fatos, e dedução deles tirada. Só que, nas ciências na-
turais as deduções são derivadas de fatos coletados através da observação da natureza, o estudo
da vida dos povos, e criatividade humana; enquanto em teologia as deduções do estudo da Sa-
grada Escritura e da Sagrada Tradição. As ciência naturais são empíricas e técnicas, enquanto
nosso estudo é teológico.
Isso esclarece também a diferença entre teologia e filosofia. Filosofia é erigida sobre ba-
ses puramente racionais e sobre ciências experimentais, na extensão que essas últimas seja capa-
zes de serem usadas para elevadas questões da vida; enquanto teologia é baseada na Revelação
Divina. Elas não devem ser confundidas; teologia não é filosofia mesmo quando mergulha nosso
pensamento em profundos ou elevados assuntos da fé Cristã que são difíceis de entender.
A teologia não nega nem as ciências experimentais nem a filosofia. São Gregório, o Teó-
logo considerou que o mérito de São Basílio, o Grande foi dominar a dialética à perfeição com a
cuja ajuda ele derrotou as construções filosóficas dos inimigos do Cristianismo. Em geral, São
Gregório não simpatizava com aqueles que mostravam falta de respeito por aprendizado exterior
aos assuntos de Igreja, no entanto, em suas renomadas homilias sobre a Santíssima Trindade, ele
assim se coloca: “Assim, tão brevemente quanto possível, eu vos apresentei nosso amor pela sa-
bedoria, que é dogmática e não dialética, na maneira dos pescadores e não de Aristóteles, espiri-
tual e não engenhosamente tramada, de acordo com as regras da Igreja e não do mercado” (Ho-
milia 22).
O curso de teologia dogmática é dividido em duas partes básicas: no ensinamento 1) So-
bre Deus em Si próprio e 2) sobre Suas manifestações de si mesmo como Criador, Providência,
Salvador do mundo e Aperfeiçoador do destino do mundo.

Parte I.
Deus em Si Próprio.
O dogma da fé. Crença ou fé como atributo da alma. O poder da fé. A fonte da fé. A natureza de
nosso conhecimento de Deus. A essência de Deus. Os atributos de Deus. Sagrada Escritura con-
cernente aos atributos de Deus. Deus é Espírito. Eterno. Todo Bondade. Onisciente. Todo Justo.
Poderoso (Onipotente). Onipresente. Imutável. Auto- Suficiente e Todo Bendito. A unidade de
Deus

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1. Nosso conhecimento de Deus.

O dogma da fé.
A primeira palavra do Símbolo da Fé Cristã é “creio.” Toda a nossa confissão Cristã é
baseada na fé. Deus é o primeiro objeto da crença Cristã. Assim, nosso reconhecimento Cristão
da existência de Deus é fundada não em bases racionais, nem em provas tomadas na razão ou
recebido de experiências de nossos sentidos exteriores, mas em uma interna e alta convicção que
tem uma fundação moral.
No entendimento Cristão, acreditar em Deus significa não só aceitar Deus com a mente,
mas também empenhar-se na direção Dele como coração.
Nós cremos naquilo que é inacessível à experiência exterior, à investigação cientifica,e
não pode ser recebido pelos órgãos de sentido. São Gregório, o Teólogo distingue entre crença
religiosa — “eu creio em alguém, em alguma coisa” — e uma simples crença pessoal — “Eu a-
credito em alguém, em alguma coisa.” Ele escreve: “Não é a mesma coisa crer e acreditar.” Nós
cremos na Divindade, mas simplesmente acreditamos em qualquer coisa ordinária (“On the Holy
Spirit,” parte III, pg 88 na edição russa de suas Complete Works; p. 319 no texto inglês do E-
erdmans).

Crença ou fé como um atributo da alma.


A fé Cristã é uma revelação mística da alma humana. Ela é maior, mais poderosa, mais
próxima da realidade que o pensamento. É mais complexa que sentidos separados. Ela contem
em si mesma os sentimentos de amor, medo, veneração, reverência e humildade. Também não
pode ser chamada de manifestação da vontade, pois apesar de mover montanhas, o Cristão re-
nuncia à sua própria vontade quando ele crê, e dá-se inteiramente à vontade de Deus: “Seja feita
a Sua vontade em mim, um pecador.” O caminho da fé está no coração; é inseparável do amor
puro, sacrificial, “operando por caridade” (Gl. 5:6)
Logicamente, o Cristianismo é ligado também ao conhecimento da mente, e dá uma visão
do mundo, mas se permanecer só uma visão do mundo, seu poder de mover se desvanece. Sem fé
não existiria o vínculo vivo entre o céu e a terra. A crença Cristã é algo muito maior que as “hi-
póteses persuasivas” que é o tipo de crença usualmente encontrado na vida.

O poder da fé.
A Igreja de Cristo é fundada sobre a fé como sobre uma rocha que não treme sob ela. Por
fé os santos conquistaram reinos, realizaram obras justas, fecharam as bocas de leões, extingui-
ram o poder do fogo, escaparam do fio da espada, foram reforçados na enfermidade (Hb 11:38).
Sendo inspirados pela fé, Cristãos foram torturados e morreram em júbilo. A fé é uma rocha, mas
uma rocha que impalpável, livre de peso, que nos dirige para cima e não para baixo .
“Quem crê em mim, como diz a Escritura, rios d’água viva correrão do seu ventre,” disse
o Senhor (Jô. 7:38); e a pregação dos Apóstolos, uma pregação no poder da palavra, no poder do
Espírito, no poder dos sinais e milagres, foi um testemunho da verdade nas palavras do Senhor.
Esse é o mistério da fé Cristã viva.

A fonte da fé.
“... Se tiverdes fé e não duvidardes... se a este monte disserdes: Ergue-te e precipita-o no
mar, assim será feito” (Mt. 21:21). A história da Igreja de Cristo é cheia de milagres dos santos

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em todas as épocas. No entanto, milagres não são realizados por fé em geral, mas pela fé Cristã.
Fé é uma realidade não pelo poder da imaginação e não por auto-hipnose, mas pelo fato que ela
nos liga com a fonte de toda vida e poder — com Deus. Na expressão do hieromartir Irineu, Bis-
po de Lion, a fé é um vaso que pode ser preenchido com água; mas é necessário que se esteja
perto a água e que se ponha o vaso nela : esta água é a graça de Deus. “Fé é a chave para a casa
de tesouros de Deus,” escreve São João de Kronstadt (My Life in Christ, Vol. I, p. 242, edição
russa).
A fé é reforçada e sua verdade é confirmada pelos benefícios de seus frutos espirituais
que são conhecidos pela experiência. Por isso o Apóstolo nos instrui, dizendo: “Examinai-vos a
vós mesmos, se permaneceis na fé, provai-vos a vós mesmo. Ou não sabeis quanto a vós mes-
mos, que Jesus Cristo está em vós? Se não é que já estais reprovados” (2 Co 13:5).
Ainda assim é difícil dar uma definição que é a de fé. Quando o Apóstolo diz “Ora, a fé é
o firme fundamento das coisas que se esperam, é a prova das coisas que se não vêem “ (Hb
11:1), sem tocar aqui na natureza da fé, ele indica somente no que o olhar da fé está dirigido para
o que é esperado, para o invisível; e assim ele indica precisamente que é a fé é a penetração da
alma no futuro (“a substância das coisas esperadas”) ou no invisível (“a evidencia das coisas não
vistas). Isso testemunha o caráter místico da fé Cristã.

A natureza de nosso conhecimento de Deus


Deus em Sua essência é incompreensível. Deus habita “...na luz inacessível; a quem nenhum
dos homens viu nem pode ver;...” instrui o Apóstolo Paulo (1 Tm 6:16).
Em suas leituras catequéticas São Cirilo de Jerusalém nos instrui: “Nós não explicamos o
que Deus é, mas candidamente confessamos que nós não temos um conhecimento exato a respei-
to Dele. Pois com respeito a Deus, confessar a nossa ignorância é o melhor conhecimento” (6ª
Catechetical Lecture, Eedrmans p. 33).
Eis aí porque não existe valor dogmático a ser encontrado nos vários tipos da vasta e a-
brangente lista de concepções e buscas racionais sobre o assunto da vida interior de Deus, e da
mesma forma nos conceitos fabricados por analogia com a vida da alma humana. A respeito dos
“companheiros — inquiridores” de seu tempo, São Gregório de Nissa, o Irmão de São Basílio, o
Grande escreve: “Homens, tenho deixado de “... deleitar-se no Senhor...” (Sl 37,4) e de rejubilar-
se na paz da Igreja, entram em refinadas buscas a respeito de alguns tipos de essências e medem
magnitudes, medindo Filho em comparação com o Pai, concedendo uma maior medida ao Pai.
Quem dirá à eles, que aquilo que não é sujeito a números não pode ser medido; o que é invisível
não pode ser avaliado; que o que é sem carne não pode ser comparado não pode ser entendido
como maior ou menos, porque nós sabemos que alguma coisa é “maior,” comparando-o com ou-
tras coisas, mas com alguma coisa que não tem fim, a idéia de “maior” é impensável. “Grande é
o Nosso Senhor, e de grande poder; o Seu entendimento é infinito” (Sl 147:5). O que isso signi-
fica? Numere como foi dito e tu compreenderas o mistério.
O mesmo hierarca escreve adiante: “Se alguém está fazendo uma viagem no meio do dia,
quando o sol com seus raios quentes queima a cabeça, e por seu valor seca toda coisa líquida do
corpo, o sob seus pés está a terra dura que torna difícil o caminhar e é ressecada; e então tal via-
jante encontra uma fonte com jatos saindo esplendidos, transparentes, agradáveis e refrescantes e
mais ainda abundantes, ele se sentará na água e começara a raciocinar sobre sua natureza, procu-
rando de onde ela vem, como, do que, e todas as outras coisas como tais, que oradores preguiço-
sos estão acostumados a julgar; por exemplo: é uma certa mistura que existe nas profundezas da

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terra que vem à superfície sob certa pressão e torna-se água, ou são canais indo através de longos
lugares desérticos e que descarregam água assim que ela acha uma abertura para si? O viajante
ao invés não dirá adeus a todas deliberações racionais, inclinará sua cabeça para o jato e pressio-
nará seus lábios contra ele, aplacará sua sede, refrescará sua língua, satisfará seu desejo, e dará
agradecimentos Aquele que deu esta água? Assim, imitai vós também esse sedento” (São Gregó-
rio de Nissa, “Homily ih His Ordination,” de suas obras em russo, vol IV).
No entanto, até certo ponto nós temos conhecimento de Deus, conhecimento até o ponto
que ele mesmo revelou, para os homens. Deve-se distinguir entre a compreensão de Deus, o que
em essência é impossível, e o conhecimento Dele, ainda que incompleto, como diz o Apóstolo
Paulo, “Porque agora vemos por espelho em enigma ...e agora conheço em parte” (I Co 13:12).
O grau desse conhecimento depende da habilidade do próprio comem em conhecer (Essa distin-
ção entre aquilo que se pode chamar de “absoluta” incognoscibilidade de Deus e a “relativa”
cognoscibilidade Dele é apresentada por São João Damasceno no Livro I, capítulo I da Exatc
Exposition oh the Orthodox Faith).

De onde nós derivamos o conhecimento de Deus?

a) É revelado ao homem do conhecimento da natureza, o conhecimento de si próprio, é o conhe-


cimento de toda criação de Deus em geral. “Porque as Suas coisas invisíveis, desde a criação do
mundo, tanto o seu eterno poder, como a Sua divindade se entendem, se entendem e claramente
se vêem pelas coisas que estão criadas ...” (Rm 1:20); isso é, o que é invisível Nele, Seu eterno
poder e Sua divindade, é tornado visível pela criação do mundo através da observação das coisas
criadas. Por isso, estão sem desculpa aqueles homens que tendo conhecido Deus, não O glorifi-
cam como Deus e não dão graças, mas se desvanecem em seus discursos (Rm 1:21). “O mundo é
o reino do pensamento divino” (São José de Kronstadt).

b) Deus manifestou-se ainda mais em revelações sobrenaturais e através da encarnação do Filho


de Deus, o Deus “havendo falado antigamente muitas vezes e de muitas maneiras, que aos pais,
pelos profetas, a nós falou-nos nestes últimos dias pelo Filho” (Hb 1:1). “Deus nunca foi visto
por alguém. O Filho unigênito, que esta no seio do Pai, Este o fez conhecer” (Jo 1:18).
Assim, o próprio Salvador ensina a respeito do conhecimento de Deus. Tendo dito “To-
das as coisas Me foram entregues por meu Pai: e ninguém conhece o Filho, senão o Pai; e nin-
guém conhece o Pai, senão o Filho, e aquele a quem o Filho O quiser revelar” (Mt 11:27). O A-
póstolo João escreve em sua Epístola: “E sabemos que já o Filho de Deus é vindo, e nos deu en-
tendimento... para que conheçamos o Deus verdadeiro ...” (1 Jo 5:20).
A Revelação Divina nos é dada em toda Sagrada Escritura e na Sagrada Tradição. E a
preservação, instrução e interpretação verdadeira dessa revelação divina é obrigação e preocupa-
ção da Santa Igreja de Cristo.
Mas mesmo dentro dos limites que nos são dados à luz da Divina revelação, devemos se-
guir a guia naqueles que purificam suas mentes por uma vida Cristã elevada e fizeram suas men-
tes capazes de contemplar verdades exaltadas, isto é a respeito disso, São Gregório, O Teólogo
nos instrui: “Se desejas ser um teólogo e digno do divino, mantenha as leis; por meio das leis di-
vinas vá para um objetivo elevado; pois atividade é a ascensão para a visão” (“atividade” aqui é
um termo técnico freqüentemente encontrado nos textos ascéticos Ortodoxos; ele se refere aos
meios (mantendo os mandamentos, disciplina ascética, etc) que conduz alguém ao fim da vida
espiritual (“visão ou “contemplação” de Deus).

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É isso, empenha-se e atinge a perfeição moral, pois só esse caminho dá a possibilidade de


ascender às alturas de onde as verdades divinas são contempladas (homilia de São Gregório, o
Teólogo).
O próprio Salvador proferiu: “Bem aventurados os puros de coração, porque eles verão a
Deus” (mt 5:8).
A impotência de nossa mente para compreender Deus é expressa na Igreja, nos Ofícios
Divinos: “Por não termos palavras para expressar o significado de Tua incompreensível Tri-
radiante divindade, como nossos corações nós Te glorificamos, ó Senhor” (do cânon do Ofício
de Meia-noite do Domingo, tom 7, cânon 4).
Na antigüidade certos heréticos introduziram a idéia de que Deus é totalmente incompre-
ensível, inacessível ao entendimento. Eles construíram suas afirmações sobre a idéia de que Deus
é uma Essência simples, que não tem conteúdo interior ou qualidades. Por isso foi suficiente, dar
Nomes a Deus — por exemplo Theos (Deus — “Aquele que vê”), ou Jeová (“aquele que é”), ou
indicar Sua característica singular, Sua “não-origem,” de maneira a dizer tudo que pode ser dito a
respeito de Deus. (alguns dos gnósticos raciocinavam dessa maneira, por exemplo, Valentino no
século segundo, e os Anomoenses no século quarto, pensaram nessa maneira). Os Santos Padres
responderam a essa heresia com um protesto fervoroso, vendo nisso uma destruição da essência
da religião. Respondendo aos heréticos, eles esclareceram e provaram, tanto pelas Escrituras
quanto pela razão: 1) que a simplicidade da essência de Deus é unida com a completude de Seus
atributos, a completude do conteúdo da vida divina, e 2) e que os próprios Nomes de deus na Di-
vina Escritura — Jeová, Eloim, Adonai e outros — expressão não a verdadeira essência de deus,
mas primeiramente mostras as relações de Deus com o mundo e com o homem.
Outros heréticos na antigüidade, por exemplo os Marcionitas,a firmaram que Deus é
completamente desconhecido e inacessível à nossa compreensão. Por essa razão, os Padres da
Igreja mostraram que existem graus do nosso conhecimento de Deus, o que é possível, útil e ne-
cessário para nós. São Cirilo de Jerusalém, em suas Leituras Catequéticas, ensina: “Se alguém
diz que a essência de Deus é incompreensível, então porque nos falamos a respeito Dele? No en-
tanto, é verdade que por que eu não posso tomar o rio inteiro eu não tomarei água dele com mo-
deração para meu benefício? É verdade que porque meus olhos não podem enxergar tudo que o
sol ilumina, eu sou então incapaz de contemplar aquilo que é possível e necessário para mim? E
se vou a um grande pomar, e não consigo comer todas as frutas dali, tu querer que eu vá embora
do pomar completamente faminto?” (Catechetical Lectures, VI, 5).
É bem conhecido como o abençoado Agostinho, quando andando em uma praia pensan-
do acerca de Deus, viu um menino sentado a beira d’água tirando água do mar com uma concha
e colocando-a num buraco na areia. Essa cena inspirou-o a pensar na desproporção entre nossa
mente rasa e a grandeza de Deus. É tão impossível ter-se uma concepção de Deus em toda Sua
grandeza, quanto esvaziar-se o mar com uma concha.

A essência de Deus.
“Se tu desejas falar ou ouvir a respeito de Deus,” teologiza São Basílio, o Grande, “re-
nuncia a teu próprio corpo, renuncia a teus sentidos corporais, abandona a terra, faz com que o ar
esteja abaixo de ti; passa sobre as estações do ano, seu arranho ordenado, os adornos da terra,
coloca-te acima do éter, atravessa as estrelas, seu esplendor, grandeza, e os benefícios que elas
provem para o mundo todo, sua boa ordem, brilho, arranjo, movimento e o vínculo ou distância
entre elas. Tendo passado através de tudo isso em tua mente, vá para o céu e postando-se acima
dele, só com teu pensamento, observa as belezas que lá estão, os chefes arcanjos, a glória dos

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Domínios, a presidência dos Tronos, os Poderes, Principados, Autoridades. Tendo passado por
tudo isso e deixado para trás toda criação em teus pensamentos, elevando tua mente acima dos
limites dela, apresenta tua mente a essência de Deus, imóvel, imutável, inalterável, desapaixona-
da, simples, complexa, indivisível, luz inaproximável, poder inexplicável, magnitude infinita,
glória resplandecente, infindável bondade, beleza incomensurável que golpeia poderosamente a
alma ferida, mas que não pode ser validamente descrita em palavras.”
Tal exaltação de espírito é demandada de alguém que quer falar com Deus! No entanto,
ainda que nessa condição os pensamentos humanos são capazes somente de permanecer nos atri-
butos da divindade e não na verdadeira essência da divindade.
Há na Sagrada Escritura palavras concernentes a Deus que “tocam” ou “chegam perto”
da idéia de Deus em Sua verdadeira essência. São expressões que são compostas de tal modo
que, na sua forma, elas respondem não só a questão “que tipo” — isto é, quais são os atributos de
Deus mas elas parecem também responder a questão “quem” — isto é, “quem é Deus?”
Tais expressões são:
“Eu sou Aquele que é” (em hebreu, Jeová; Ex 3:14)
“Eu sou o Alfa e o Omega, o principio e o fim, diz o Senhor, que é, e que era, e que há de
vir, o Todo-Poderoso” (Ap 1:8)
“Mas o Senhor Deus é a Verdade” (Jer 10:10)
“Deus é espírito” — As palavras do Senhor para a mulher samaritana (Jo 4:23)
“Ora o Senhor é Espírito” (2 Co 3:17)
“Deus é luz, e não há Nele trevas nenhuma” (1 Jo 1:5)
“Deus é amor” (1 Jo 4:8,16)
“Nosso Deus é um fogo consumidor” (Hb 12:29)

No entanto, tais expressões também não podem ser entendidas como indicações da verdadeira
essência do Deus único e com relação ao nome “aquele que é” os Padres da Igreja disseram que
ele “de alguma forma” (a expressão é de São Gregório, o Teólogo) ou, “como parece” (São João
Damasceno) é um nome da essência. Apesar de mais raramente, esse mesmo significado foi dado
aos nomes “bem” e “Deus,” na língua grega — Theos, significando “ele que vê.” Distinto que
todas as coisas “existentes” e criadas, os Padres da Igreja aplicaram para a existência de Deus o
termo “Ele que é acima de todos os seres,” como no kontakion, “a virgem agora dá a luz a Ele
que é acima de todos os seres.” A expressão do Velho Testamento “Jeová,” “aquele que é,” que
foi revelada por Deus ao Profeta Moisés, tem justo tal significado profundo. (Isso quer dizer:
quando dizemos que Deus é “aquele que é,” nós dizemos que Ele “é” num sentido superlativo e
não da maneira que toda sua criação” é “; isto é o mesmo que afirmar que Ele é o único” que está
acima de todos os seres” (Kondakion da Natividade de Cristo)).
Assim, pode-se falar somente nos atributos de Deus, mas não da verdadeira essência de
Deus. Os Padres se expressam só indiretamente a respeito da natureza da divindade, dizendo que
a essência de Deus é “uma, simples, não complexa.” No entanto, essa simplicidade na é algo sem
distinguir características ou contendo; ela contem em si própria a totalidade das qualidades da
existência; “Deus é um mar de ser, incomensurável e ilimitado” (São Gregório, o Teólogo);
“Deus é a completude de todas as qualidades e perfeições em sua mais alta e infinita forma” (São
Basílio, o Grande); “Deus é simples e não complexo; Ele é inteiramente sentimento, inteiramente
espírito, inteiramente pensamento, inteiramente mente, inteiramente fonte de todas as coisas bo-
as” (Santo Irineu de Lyon).

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Os atributos de Deus.
Falando dos atributos de Deus, os Santos Padres indicam que sua multiplicidade conside-
rando a simplicidade da essência, é o resultado de nossa própria inabilidade de encontrar um mís-
tico e único modo de ver a divindade. Em Deus, um atributo é um aspecto de outro. Deus é justo;
isso implica que Ele é também bendito e bom e Espírito. A múltipla simplicidade em Deus é co-
mo a luz do sol, que se revela em várias cores que são recebidas pelos corpos na terra, por exem-
plo as plantas.
Na enumeração dos atributos de Deus nos Santos Padres e nos textos dos Divinos Ofí-
cios, há uma preponderância de expressões que estão gramaticalmente na forma negativa. No
entanto deve-se observar que, esta forma negativa indica uma “negação de limites.” Assim, a
forma negativa é na verdade uma afirmação de atributos que são sem limite. Por exemplo, não
criado indica a inexistência do limite na criação. Encontramos um modelo de tais expressões na
Exact Exposition of the Ortodox Faith por São João Damasceno: “Deus é não originado, inter-
minável, eterno, constante, não criado, imutável, inalterável, simples, não complicado, incorpó-
reo, invisível, intangível, indescritível, ilimitado, inacessível a mente, incontestável, incompreen-
sível, bom, justo, o Criador de todas as criaturas, o Poderoso Pantocrator, o que olha todos de
cima, cuja Providência está sobre todas as coisas, que tem domínio sobre tudo, o juiz.”
Nossos pensamentos acerca de Deus em geral falam: 1) acerca de Sua distinção do mun-
do criado (por exemplo, Deus é não originado, enquanto que o mundo tem uma origem; Ele é
sem fim, enquanto o mundo tem um fim; Ele é eterno, enquanto o mudo existe no tempo; ou 2)
acerca das atividades de Deus no mundo e a relação do Criador para suas criações (Criador, Pro-
vidência, Misericordioso, Juiz Justo).
Indicando os atributos de Deus, nem por isso damos uma “definição do conceito de
Deus,” tal definição é essencialmente impossível, porque toda definição é uma indicação de “fi-
nitude” (Em russo Padre Michael está indicando aqui a derivação da palavra opredeleniye (“de-
finição”) de predel (“limite”)). No entanto, em Deus não há limites, e portanto não pode haver
uma definição do conceito da divindade: “Pois um conceito é em si uma forma de limitação”
(São Gregório, o Teólogo, homilia 28, de sua Segunda Oração Teológica).
Nossa razão demanda o reconhecimento em Deus de uma serie completa de atributos es-
senciais. A razão nos diz que Deus tem uma existência racional, livre e pessoal. Se no mundo
imperfeito nós vemos seres racionais, livres e pessoais, não podemos deixar de reconhecer uma
existência livre, racional e pessoal no próprio Deus, que é a Fonte, Causa e Criador de toda a vi-
da.
A razão nos diz que Deus é o Ser mais perfeito. Toda falta e imperfeição são incompatí-
veis com o conceito de “Deus.”
A razão nos diz que Deus é um Ser auto-suficiente, porque nada pode ser a causa ou con-
dição da existência de Deus.

Sagrada Escritura concernente aos atributos de Deus.


Os atributos de Deus, tomados diretamente do Verbo de Deus, são apresentados no Lon-
go Cristão Catechism of the Orthodox Church do Metropolita Philaret (Tradução inglesa (reim-
pressa de 1901) no The Catechism of the Orthodox Church, Eastern Orthodox Books, Willits,
Califórnia, 1971, p. 19). Ali se lê: “Pergunta: Que idéia da essência e dos atributos essenciais de
Deus devem ser derivadas da revelação Divina? Resposta: Que Deus é Espírito, eterno, boníssi-
mo, onisciente, justo, poderoso, onipresente, imutável, auto-suficiente.” Paremos para pensar a-
cerca desses atributos apresentados no catecismo.

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Deus é Espírito.
“Deus é Espírito” (Jo 4:24; as palavras do Salvador na conversa com a mulher Samarita-
na). “O Senhor é Espírito, e onde está o Espírito do Senhor, ai há liberdade” (2 Co 3:17). Deus é
alheio a todo tipo de natureza corpórea ou materialidade. Ao mesmo tempo que a espiritualidade
que pertence ao seres espirituais criados e a alma do homem, que manifesta em si somente uma
“imagem” da natureza espiritual de Deus. Deus é um Espírito que é o mais elevado, mais puro,
mais perfeito. É verdade que na Sagrada Escritura nós encontramos muito, muitos lugares onde
alguma coisa corpórea é simbolicamente atribuída a Deus, no entanto, concernente à natureza
espiritual de Deus, a Escritura começa falando com as primeiras palavras do livro da Gênesis, e
ao Profeta Moisés, Deus se revela como Aquele que é, como a pura, espiritual e mais elevada
existência. Assim, por símbolos corpóreos a Escritura nos ensina a compreender os atributos es-
pirituais e as ações de Deus.
Tememos aqui as palavras de São Gregório, o Teólogo. Ele diz: “De acordo com as Es-
crituras Deus dorme, Ele desperta, torna-se irritado, Ele ativa, Ele tem os Querubins como seu
trono mas quando Ele teve uma enfermidade? Além disso, alguma vez ouviste que Deus é um
corpo? Alguma coisa é apresentada aqui, que não existe na realidade de acordo com o nosso pró-
prio entendimento, nós demos nomes para as características de Deus, que são derivadas de nós
próprios. Quando Deus, por razões que só Ele conhece, abandona seus cuidados, como estava
tendo, e não se preocupa mais conosco, isso significa que Ele está “dormindo” — porque nosso
dormir é uma falta similar de atividade e cuidado. Quando, ao contrário, Ele subitamente começa
a fazer o bem, isso significa que Ele “acordou.” Ele castiga e por isso, nós imaginamos que Ele
está “raivoso” pois castigo entre nós é com raiva. Ele age às vezes aqui, ás vezes Ele repousa e
como se Ele morasse em santos poderes nós chamamos isso de “sentar-se” e Ele “senta-se em
um trono,” que é uma coisa característica nossa. Também, pois a divindade não repousa em lugar
algum, nem entre os santos. Um movimento veloz nós chamamos “Vôo.” Se há uma contempla-
ção, nós falamos uma “face”; se há um dar e receber, nós falamos de uma “mão.” De outra for-
ma, e uma maneira tomada das coisas corpóreas “ (homilia 31, Fifht Teological Oration “On the
Holy Spirit,” ch 22; Eerdmann’s Nicene Fathers, Series Two, vol VII, pg 324-325).
Ligado com os relatos das ações de Deus, no segundo e terceiro capítulos do Livro da
Gênesis, São João Chrisóstomo nos instrui: “Não passemos sem atenção, amados, pelo que é sito
pela Divina Escritura, e não olhemos só para as palavras, mas pensemos que simples palavras
são usadas por conta de nossa enfermidade, e que tudo é feito do jeito mais adequado para a nos-
sa salvação. Depois de tudo, diga-me, se quisermos aceitar as palavras num sentido literal e não
entendermos o que é comunicado de modo adequado a Deus, tudo isso então não se tornaria mui-
to estranho? Olhemos no começo da leitura presente. Ela diz: “E ouviram a voz do Senhor Deus,
que passeava no jardim pela viração do ai... e estavam com medo” (Gn 3:8). O que tu dizes:
Deus anda? Tu atribuis pés a Ele? Não deveríamos entender isso num sentido mais elevado?
Não, Deus não anda — nem pense nisso! Como, de fato, poderia Ele que está em tudo e enche
tudo, cujo trono é o céu e a terra o escabelo de seus pés — como poderia Ele andar no Paraíso?
Que pessoa racional diria isso! No entanto o que significa: “Eles ouviram a voz de deus andando
no Paraíso na viração do dia?” “Ele quis criar neles um tal sentimento (de proximidade de deus)
que deveria fazer com que eles ficassem preocupados com o que de fato havia acontecido. Eles
sentiram isso e tentaram se esconder de Deus que estava se aproximando deles. O pecado havia
ocorrido, e transgressão e vergonha caíram sobre eles. O juiz não hipócrita que é a consciência,
tendo sido acordada, clamou com alta voz, recriminando-os, e exibindo diante de seus olhos o

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peso da transgressão. O Mestre criou o homem no começo e nele colocou um acusador que nun-
ca se cala e que não pode ser seduzido ou enganado.”
A respeito da imagem da criação da mulher, São João Crisóstomo ensina, “É dito,: ‘e to-
mou uma de suas costela’ (Gn 2:21). Não entendam essas palavras de maneira humana, mas en-
tenda que a crua expressão usada é adaptada à fraqueza humana. Pois, se a Escritura não tivesse
usado essas palavras, como poderíamos entender tais mistérios inexprimíveis? Não olhemos só
para as palavras mas recebamos tudo de maneira ajustada, ao que se refira a Deus. Essa expres-
são “tomou” e todas as expressões similares são usadas em função de nossa fraqueza.” De ma-
neira similar São João Crisostomo se expressa com respeito as palavras: “E formou o Senhor
Deus o homem do pós da terra, e soprou em seus narizes” (Gn 2:7; Works of St. John Chrisos-
tom, Vol IV, parte um). (Não se deve pensar que o Padre Michael está afirmando aqui que São
João Crisostomo era em geral opositor a “interpretações literais” da Escritura; quando o sentido
literal era necessário, São João Crisostomo era bastante literal na sua interpretação. Seu ponto e o
do Padre Michael era que toda interpretação da Escritura deve ser “ajustada a Deus” e isto as ve-
zes requer uma interpretação literal, às vezes uma interpretação metafórica. No mesmo Comentá-
rio do livro da Gênesis, por exemplo, São João Crisostomo escreve: “Quando vos ouvis que
“Deus colocou o Paraíso no Éden no leste, acrediteis precisamente que o próprio Paraíso foi cri-
ado no exato lugar que a Escritura assegurou que foi” (Homilies on Gênesis, XIII, 3). Ele tam-
bém, proibiu uma interpretação alegórica de “rios” e “águas” do Paraíso, insistindo que “os rios
são rios na realidade e as águas são precisamente águas” (XIII, 4). Assim, quando São João Cri-
sostomo afirma que a palavra “tomou” na Gênesis deve ser entendida numa maneira ajustada a
Deus (isto é, não deve ser entendida literalmente, porque Deus não tem “mãos”). Ele não nega
que Eva foi realmente criada de uma das costelas de Adão, ainda que precisamente como isso foi
jeito, permaneça um mistério para nós (Homilies on Gênesis, XV, 2-3).)
São João Damasceno decota um capítulo a esse tema em sua Exact Exposition of the Or-
thodox Faith. Esse capitulo é chamado “Sobre as coisas que se afirma de Deus como como se Ele
tivesse um corpo,” e ali ele escreve: “Como encontramos na Divina Escritura muitas coisas que
são ditas de Deus como se Ele tivesse um corpo, nós devemos saber que é impossível para nós
que somos homens que estamos vestidos com essa crua carne, pensar ou falar sobre as imponen-
tes e imateriais ações de divindade, a não ser que usemos similaridade, imagens e símbolos que
correspondam a nossa natureza.” Além disso, as expressões a respeito dos olhos, ouvidos, mãos e
similares de Deus, ele conclui: “Para dizer de modo simples, tudo que é afirmado de Deus como
se Ele tivesse um corpo contem um certo significado escondido” (Exact Exposition oh the Or-
thodox Faith, part one, Ch11; The Father of the Church Traslation, p 191-193).
Hoje em dia tornamo-nos bastante acostumados com a idéia de que Deus é puro Espírito.
No entanto, a filosófica do panteísmo (que significa “Deus é tudo”), que está bem espalhado no
nosso tempo, procura contradizer essa verdade. Por isso, ainda hoje no Rito da Ortodoxia canta-
do no Domingo da Ortodoxia o, primeiro domingo da Grande Quaresma, nós ouvimos “para a-
queles que dizem que Deus não é Espírito mas carne — Anathema! (o Rito da Ortodoxia é cele-
brado depois da Liturgia no primeiro Domingo da Grande Quaresma em Igrejas Catedrais aonde
um bispo presida. Nelas, anátemas são proclamados contra heréticos dos tempos antigos e mo-
dernos que tentaram destruir as bases dogmáticas da Ortodoxia. Em muitas jurisdições Ortodo-
xas nas missas hoje, no entanto, sob a influência de idéias “ecumênicas,” esse ofício tem sido
abolido e substituído por uma celebração “Pan-ortodoxa,” ou por uma celebração “ecumênica”).

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Eterno.
A existência de Deus é fora do tempo, pois tempo é somente uma forma de seres limita-
dos, seres mutáveis. Para Deus não há nem passado, nem futuro; só há o presente. “Desde a anti-
güidade fundaste a terra: e os céus são obra das Tuas mãos. Eles perecerão, mas Tu permanece-
rás: todos como um vestido envelhecerão: como roupa os mudaras e ficarão mudados. Mas Tu és
o mesmo, e os Teus anos nunca terão fim” (Sl 102:25-27).
Alguns Santos Padres indicam uma diferença entre o conceito de “eternidade” e “imorta-
lidade.” “Eternity é uma existência viva sempre e esse conceito de “eternidade” é aplicado usu-
almente para a uma natureza não originada, em que tudo é sempre uno e o mesmo. O conceito de
imortalidade de outro lado pode ser atribuído para alguém que foi trazido para ávida como ser e
não morre, como por exemplo um anjo ou uma alma. Eterno em seu significado preciso pertence
a Divina Essência por isso é que o termo é aplicado usualmente só para Adorável e Reinante
Trindade” (Santo Isidro de Pelusium). Sob esse aspecto ainda mais expressiva é a expressão “O
Deus pré-eterno” (como no Kontakion na Natividade de Cristo).

Boníssimo.
“Misericordioso e piedoso é o Senhor; longânime e grande em benignidade” (Sl 103;8).
“Deus é amor” (1 Jo 4:16). Bondade de Deus estende-se não a uma região limitada do mundo, o
que é característico no amor entre seres limitados, mas ao mundo todo e a todos os seres que nele
existem. Ele é amoroso em relação a vida e as necessidades de cama criatura, não importa quão
pequena e, que possa parecer insignificante para nós, São Gregório, o Teólogo escreve: “se al-
guém nos perguntasse o que é que nós reverenciamos, e o que nós veneramos, nós temos uma
rápida resposta: “o amor” (homilia 23).
Deus dá a suas criaturas tantas coisas boas quanto cada uma pode receber de acordo com
sua natureza e condição e tanto quanto corresponda com a harmonia geral do universo, mas é
para o homem que Deus revela uma bondade particular.” Deus é como uma mãe-passáro que viu
o seu filhote cair do ninho, e voa para baixo para traze-lo de volta, e então vê o filhote em perigo
de ser devorado por uma serpente, então ela grita ansiosamente e voa ao redor desse e dos outros
filhotes, não sendo capaz de ficar indiferente a perder um só deles (Clemente de Alexandria “E-
xhortations to the Pagans,” cap 10). “Deus nos ama mais do que um pai ou uma mãe ou um ami-
go, ou que qualquer outro que possa amar, e ainda mais do que nós podemos amar a nós mesmo,
porque Ele está preocupado com a nossa salvação do que com Sua própria glória. Um testemu-
nho disso é que Ele enviou para o mundo para sofrer e morrer (na carne humana) Seu Filho Úni-
co Gerado, somente para nos revelar o caminho da salvação e da vida eterna” (São João Crisos-
tomo, comentário sobre o Salmo 114). Se o homem freqüentemente não entende o poder comple-
to da bondade de Deus, isso ocorre porque o homem concentra seus pensamentos e desejos de-
masiadamente no seu bem-estar terreno. No entanto, a Providência de Deus une dar-nos coisas
terrenas e temporais junto com o chamado para adquirir para si, para sua alma, coisas boas eter-
nas.

Onisciente.
“...Todas as coisas estão unas e patentes aos olhos de Deus” (Hb 4:13). “Os Teus olhos
viram o meu corpo ainda informe...” (Sl 139:16). O conhecimento de Deus é visão e imediato
entendimento de tudo, tanto no que existe e do que é possível, o presente, o passado e o futuro.
Pré conhecimento do futuro é, estrito senso, visão espiritual, porque para Deus o futuro é como o
presente. O pré conhecimento de Deus não viola o livre arbítrio das criaturas, como a liberdade

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de nosso vizinho não é violada pelo fato de vermos o que ele faz. O pré conhecimento de Deus
com respeito ao mal no mundo e os atos dos seres livres é como se ele fosse coroado pelos pré
conhecimento da salvação do mundo, quando “Deus será tudo em todos” (1 Co 15:28).
Outro aspecto da onisciência de Deus é manifestado na sabedoria de Deus: “Grande é o
Nosso Senhor, e de grande poder; o seu entendimento é infinito” (Sl 147:5). Os Santos Padres e
professores da Igreja, seguindo a palavra de Deus, sempre indicaram com grande reverencia a
grandeza da sabedoria de Deus na ordenação do mundo visível, dedicando a esse assunto obras
completas, como por exemplo as Homilias sobre os seis dias (Hexaemeron), que é, a história da
criação do mundo escrita por padres, tais como São Basílio, o Grande, São João Crisostomo, São
Gregório de Nissa. “uma folha de grama ou um grão de poeira é suficiente para ocupar sua vossa
mente inteira, contemplando a arte com que foram feitos” (Basílio, o Grande). Ainda mais, refle-
tiram os padres sobre a sabedoria de Deus na economia de nossa salvação na encarnação do Fi-
lho de Deus. A Sagrada Escritura do Velho Testamento concentra sua atenção primariamente
sobre a sabedoria de Deus no arranho ordenado do mundo: “Todas as cousas Fizeste com sabe-
doria” (Sl 104:24). No Novo Testamento, de outro lado, a atenção está concentrada na economia
da salvação, em conexão com a qual o Apóstolo Paulo clama: “Ó profundidade das riquezas, tan-
to da sabedoria quanto da ciência de Deus” (Ro 11:33). Pois é pela sabedoria de Deus que toma
existência do mundo é dirigida para um único propósito — a perfeição e transfiguração para a
glória de Deus.

Justíssimo.
Justiça é entendida na palavra de Deus e no seu uso geral como tendo dois significados:
a) santidade e, b) justiça.
Santidade consiste não só na ausência da malignidade ou pecado: santidade é a presença
de valores espirituais mais elevados, juntos com a pureza em relação ao pecado. Santidade é co-
mo a luz, e santidade de Deus é como a mais pura das luzes. Deus é “um só santo” por natureza.
Ele é a fonte da santidade para anjos e homens. Os homens podem atingir a santidade somente
em Deus “ não por natureza, mas por participação, por luta e oração” (São Cirilo de Jerusalém).
A Escritura testifica que os anjos rodeiam o trono de Deus sem cessar declaram a santidade de
Deus clamando um para os outros: “Santo, santo, santo é o Senhor dos exércitos: toda a terra está
cheia de sua glória” (Is 6:3). Como mostrado na Escritura a luz da santidade enche tudo que vem
de deus ou serve a Deus: “Seu santo Nome” (Sl 33:21; 103:1; 105:3); “Sua santa palavra” (Sl.
104:42); “A lei é santa” (Ro 7:12); “...trono da sua santidade” (Sl 47:8); “escabelo de seus pés,
porque ele é santo” (Sl 99:5); “Justo é o Senhor em todos os Seus caminhos, e santo em todas as
Suas obras” (Sl 145:17); “...o Senhor nosso Deus é santo” (Sl 99:9).
A justiça de Deus é outro aspecto a ser considerado: “Ele julgará os povos com retidão”
(Sl 9:8); “...recompensará cada segundo suas obras; porque para com Deus, não acepção de pes-
soas” (Ro 2:6 e 11).
Como podemos harmonizar o amor divino com a justiça de Deus, que julga estritamente
por pecados e pune os culpados? Sobre esta questão muitos Padres falaram. Eles assemelha a
raiva de Deus à raiva de um pai que, com o objetivo de trazer um filho desobediente a seu senso,
recorre aos meios paternos de punição ao mesmo tempo se afligindo, simultaneamente ficando
triste com a atitude sem sentido de seu filho e simpatizando com ele pela dor que lhe está infli-
gindo. Eis ai porque a justiça de Deus é sempre misericordiosa, e sua misericórdia é justiça, de
acordo com as palavras: “A misericórdia e a verdade se encontraram: a justiça e a paz se beija-
ram” (Sl 85:10).

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A santidade e a justiça de Deus estão intimamente ligadas uma a outra. Deus chama cada
um para a vida eterna Nele, no Seu reino e isso significa em Sua santidade. No entanto, no Reino
de Deus nada impuro pode entrar. O Senhor nos limpa por seus castigos, assim como por seus
atos providenciais, que previnem e corrigem pelo seu amor para com sua criação; pois nós de-
vemos passar pelo julgamento de justiça, um julgamento que para nós é terrível: como podere-
mos entrar no reino da santidade e luz, e como nos sentiremos lá, estando impuros, escuros e não
tendo em nós nenhuma semente de santidade, não tendo em nós nenhum tipo de valor espiritual
ou moral?

Todo Poderoso (Onipotente)


“Porque falou, e tudo se fez; mandou, e logo tudo apareceu” — assim o salmista expres-
sou o poderio de Deus (Sl 33:9). Deus é o Criador do mundo. É Ele que cuida do mundo em Sua
providência. Ele é o Pantocrator. Ele é Aquele “Que só Ele faz maravilhas” (Sl 72:18). No entan-
to, se Deus tolera a maldade e pessoas maldosas no mundo, isso não é porque Ele não pode ani-
quilar a maldade, mas porque Ele nos deu liberdade aos seres espirituais e dirige-os para que eles
possam livremente, com seu livre arbítrio, rejeitar a maldade e voltar-se para o bem.
Com respeito a questões casuísticas a respeito de deus “não pode” fazer, deve se respon-
der que a onipotência de Deus é entendida que é agradável ao Seu pensamento, à Sua bondade.

Onipresente.
“Para onde me irei do Teu Espírito, ou para onde fugirei de Tua face? Se subir ao céu, Tu
ai estás, se fizer no sol a minha cama, eis que Tu ali estás também. Se tomar as asas da alva, se
habitar nas extremidades do mar. Até ali a Tua mão me guiará e a Tua destra me susterá” (Sl
139:7-10)
Deus não é sujeito a nenhuma limitação doe espaço, mas Ele preenche tudo. Preenchendo
tudo Deus, como um simples ser, está presente em todo lugar, não como se Ele estivesse com
alguma parte Sua, mas como todo o Seu ser; e Ele não é confundido com aquilo onde está pre-
sente. “A divindade penetra tudo sem se misturar com nada, mas nada pode penetra-lo” (São Jo-
ão Damasceno). “Esse Deus está presente em tudo que conhecemos, mas como nós não enten-
demos, porque nós só podemos compreender uma presença sensorial, e não é dado a nós com-
preender inteiramente a natureza de Deus” (São João Chrisostomo).

Imutável.
No “Pai das luzes, não há mudança. Nem sombra de variação” (Tg 1:17). Deus é perfei-
ção, e toda mudança é um sinal de imperfeição e portanto é impensável no mais perfeito ser, em
Deus concernente a Deus pode-se dizer que nenhum processo está acontecendo Nele que seja de
crescimento, mudança de aparência, evolução, processo ou qualquer coisa parecida.
No entanto, imutabilidade em Deus não é algum tipo de imobilidade; não é um ser fecha-
do dentro de Si mesmo, Mesmo enquanto sendo imutável, Seu ser é vida, preenchido com poder
e atividade. Deus em Si mesmo é vida, e vida é o Seu ser.
A imutabilidade de Deus, não é violada pela geração do Filho e pela processão do Espíri-
to, pois para o Deus o Pai, pertence a paternidade, e para seu Filho, a filiação, e para o Espírito
Santo, a processão que é “eterna, interminável e incessante” (São João Damasceno). As palavras,
cheias de mistério, “A geração do Filho” e a “processão do Espírito,” não expressam nenhum
tipo de mudança na vida divina ou nenhum tipo de processo; para nossas mentes limitadas, “ge-

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ração” e “processão” são simplesmente colocadas em oposição à idéia de “criação” e falam da


única Essência das pessoas ou de Deus. A criação é alguma coisa externa em relação Àquele que
cria enquanto que a “filiação” de Deus é uma unidade interna, a unidade da natureza do Pai e do
Filho; tal é também a “processão” da Essência de Deus, a processão do Espírito do Pai que a
causa.
A Encarnação e o torna-se homem, do Verbo, do Filho de Deus, não viola a imutabilida-
de de Deus. Só criaturas em suas limitações perdem o que elas tem, ou adquirem o que elas não
tem; mas a divindade do Filho de Deus permanece depois da Encarnação sendo a mesma que era
antes da Encarnação. Ela recebeu em sua Hipóstase, na unidade da Divina Hipóstase, natureza
humana da Virgem Maria mas ela não formou disso nada novo, natureza misturada, mas preser-
vou sua Natureza Divina sem mudança.
A imutabilidade de Deus não é contraditada, da mesma forma, pela criação do mundo. O
mundo é uma existência, que e externa em relação à natureza de Deus. Por isso Ele não muda
nem a essência nem os atributos de Deus, pois a origem do mundo é só uma manifestação do po-
der e pensamento de Deus. O poder e pensamento de Deus são eternos e são eternamente ativos,
mas nossa mente de criatura não consegue entender o conceito dessa atividade na eternidade de
Deus. O mundo não é co-eterno com Deus; ele é criado. No entanto, a criação do mundo é a rea-
lização do pensamento eterno de Deus (Bem Aventurado Agostinho). O mundo é como Deus em
sua essência e assim ele tem que ser mutável e não é sem um começo; mas esses atributos do
mundo não contradizem o fato que seu Criador é imutável e sem começo (São João Damasceno).

Auto-suficiente e todo bem-aventurado.


Essas duas expressões são próximas em significado.
Auto-suficiente não deve ser entendido no sentido de “satisfeito consigo próprio.” Mais
apropriadamente significa a completude da possessão, bem-aventurança completa, a completude
de todas as coisas boas, Assim, nas orações antes da comunhão lemos: “Senhor, não sou digno
que entre em minha moradas...” (Segunda Oração). De novo “Não sou digno de contemplar e ver
as alturas do céu...” (Oração de São Simeão, o Tradutor). “Suficiente” significa aqui “Espiritu-
almente adequado,” “espiritualmente rico.” Em Deus está a suficiência de todas as coisas boas.
“Ó, profundidade das riquezas tanto da sabedoria quanto da ciência de Deus!” Exclama o Após-
tolo Paulo, “porque Dele e por Ele, e para Ele são todas as coisas” (Ro 11:33 3 36). Deus não
tem necessidade de coisa alguma “pois é ele mesmo quem dá a todos a vida, e a respiração, e to-
das as coisas” (At 17:25). Assim Deus é Ele mesmo a fonte de toda vida e de toda coisa boa; dele
todas as criaturas derivam sus suficiência.
Todo Bendito. O Apóstolo Paulo chama duas vezes Deus em suas Epístolas de “Bem A-
venturado” conforme o Evangelho da glória de Deus bem aventurado... (1 Tm 1:11). “A qual a
seu tempo mostrará o bem-aventurado, e único poderoso Senhor, Rei dos reis e Senhor dos se-
nhores” (1 Tm 6:15). A palavra “todo bem-aventurado” deve ser entendida não no sentido que
Deus, tendo tudo dentro Dele, seja indiferente aos sofrimentos do mundo criado por Ele; mas sim
no sentido de que Dele e Nele, suas criaturas derivam suas bem-aventuranças. Deus não “sofre”
mas Ele é “misericordioso.” Cristo “sofreu como mortal” (Cânon da Páscoa) não em Sua Divin-
dade, mas em Sua Humanidade. Deus é a fonte de bem-aventurança. Nele está a completude de
alegria, doçura, e júbilo para aqueles que o amam como é dito no Salmo “...na Tua presença há
abundância de alegrias: à Tua mão direita há delicias perpetuamente” (Sl 15:11).
A Bem—aventurança de Deus tem seu reflexo na incessante louvação, glorificação e a-
gradecimento, que enche o universo, e quem vem dos altos poderes — os Querubins e Serafins

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que rodeiam o Trono de Deus, flamejando-o com fragrante amor por Deus. Essas louvações são
oferecidas por todo mundo angélico e por todas as criaturas do mundo de Deus: “ O sol canta
Tuas louvações; a lua Te glorifica; as estrelas suplicam diante de Ti: a luz Te obedece; as pro-
fundezas estão temerosas na Tua presença; as fontes são Tuas servas” (Oração da Grande Benção
de Água, Jan.5, Festal Menaion, p. 356).

A unidade de Deus.
“Por conseguinte, nós acreditamos em um Deus: um princípio, sem começo, incriado, não
gerado, indestrutível e imortal, eterno, ilimitado, incircunscritível, irrestrito, infinito em poder,
simples não composto, incorporal, imutável, desapaixonado, constante, invisível, fonte de bon-
dade e justiça, luz intelectual e inacessível: poder que não está sujeito a qualquer medida, mas
que é medido somente por sua própria vontade, pois Ele pode fazer todas as coisas que O agra-
dem; uma essência, um domínio, um reino, conhecido em três hipóstases perfeitas, e conhecido e
adorado com uma adoração” (São João Damasceno. Exact Exposotion oh the Orthodox Faith,
1:8; tradução inglesa, p 177).
A verdade da unicidade de Deus é agora tão evidente para a consciência humana que ela
não necessita de provas da palavra de Deus ou simplesmente da razão. Foi um pouco diferente
no inicio da Igreja Cristã, quando essa idéia teve que ser colocada contra a idéia do dualismo —
o reconhecimento de dois deuses, o do bem e o do mal — e contra o politeísmo dos pagãos, que
era popular naquele tempo.
Creio em um só Deus. Essas são as primeiras palavras do símbolo da fé (o Credo). Deus
possui toda completude de ser prefeito, A idéia de completude, perfeição, infinito, onipotência de
Deus não nos permite pensar Nele como sendo outro que o Um, isto é, singular e tendo uma es-
sência em Si mesmo. Essa exigência da nossa consciência é expressada por um dos antigos escri-
tores nas palavras : “Se Deus não é um, então não existe Deus” (Tertuliano). Em outras palavras,
uma divindade limitada por outro ser perde sua divina dignidade.
A Sagrada Escritura do Novo Testamento toda, é cheia de ensinamentos sobre o Deus
único. “Pai nosso que está no céu,” oramos na palavra da Oração do Senhor (Mt 6:9). “Não há
outro Deus, senão um só” é como o Apóstolo Paulo expressa essa verdade fundamental da fé (1
Co 8:4).
A Sagrada Escritura do Velho Testamento é inteiramente penetrada com o monoteísmo.
A historia do Velho Testamento é a historia da batalha pela fé em um verdadeiro Deus contra o
politeísmo pagão. O desejo de alguns historiadores da religião de encontrar traços de um suposto
“politeísmo original” no povo hebreu em certas expressões, por exemplo, o numero plural de no
nome de Deus — “Elohim” — ou achar uma fé em um “Deus nacional” em frases como “O
Deus dos deuses,” “o Deus de Abrahão, Isaac e Jacó” — não corresponde ao significado autenti-
co dessas expressões.
1. Elohim. Para um judeu simples essa é uma forma de reverência e respeito (um exem-
plo disso pode ser visto na língua russa e outras línguas européias * onde a segunda pessoa no
plural, “vós” em oposição a “tu,” é usada para demonstrar respeito). Para o escritor divinamente
inspirado, o Profeta Moisés, o número plural da palavra contem sem dúvida, em acréscimo, o
profundo significado mínimo de uma antevisão das Três Pessoas de Deus. Ninguém pode duvi-
dar que Moisés fosse um puro monoteísta, conhecendo o espírito na linguagem hebréia. Ele não
usaria um nome que contradissesse sua fé no Deus único.

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2. O Deus dos Deuses é uma expressão que coloca fé no verdadeiro Deus contra adora-
ção de ídolos; aqueles que adoravam os ídolos os chamavam de “Deus” mas para os judeus, es-
ses eram falsos deuses. Essa expressão é usada livremente no Novo Testamento pelo Apóstolo
Paulo; depois de dizer “Não há outro Deus, senão um só,” ele acrescenta:” Porque ainda que haja
também alguns que se chamem deuses, quer no céu quer na terra (como há muitos deuses e mui-
tos senhores). Todavia para nós há um só Deus, o Pai, de quem é tudo e para quem nós vivemos;
e que há Senhor, Jesus Cristo, pelo qual são todas as coisas, e nós por Ele” (1 Co 8:4-6)
3. O Deus de Abrahão, Isaac e Jacó é uma expressão que se refere só ao povo judeu
escolhido como o “herdeiro das promessas” feitas a Abrahão, Isaac e Jacó.”
A verdade Cristã da unicidade de Deus é aprofundada pela verdade da unidade trihipósta-
tica.

2. O dogma da Santíssima Trindade.

Introdução. Indicações da Trindade no Velho Testamento. O ensinamento da Santíssima Trinda-


de no Novo Testamento. O dogma da Trindade na Igreja Antiga. Os tributos das Pessoas Divi-
nas. O nome da Segunda Pessoa — o Verbo. Sobre a processão do Espírito Santo. A igualdade
da Divindade das Pessoas da Santíssima. Transição para a Segunda Parte da Teologia Dogmáti-
ca.
_______________________________________________________________

Introdução.
Deus é uno em Essência e triplo em Pessoas. Uma série completa de grandes dogmas da
Igreja estão baseados imediatamente sobre ele, começando primeiro com o dogma de nossa Re-
denção. Por causa de sua especial importância, a doutrina da Santíssima Trindade constitui o
conteúdo de todo os Símbolos da Fé foram usados e que são usados agora na Igreja Ortodoxa,
assim como de todas as confissões privadas de fé escritas em várias ocasiões pelos Padres da I-
greja.
Porque o dogma da Santíssima Trindade é o mais importa dos dogmas Cristãos, ele é o
mais difícil de ser compreendido pela mente humana limitada. Por essa razão é que nenhuma ba-
talha na história da Igreja Antiga foi tão intensa quanto a que existiu sobre esse dogma e as ver-
dades que são imediatamente ligadas a ele.
O dogma da Santíssima Trindade inclui em si duas verdades fundamentais:
A. Deus é uno em Essência, mas triplo em pessoa. Em outras palavras, Deus é Tri-único, é Tri-
Hipostático, é Trindade Una em Essência.
B. As hipóstases tem atributos pessoais ou hipostático: Deus é não gerado, o Filho é gerado pelo
Pai; o Espírito Santo procede do Pai.
N[os adoramos a Santíssima Trindade com única e inseparável adoração. Na Igreja, San-
tos padres e Ofícios Divinos, a Trindade é freqüentemente chamada de Unidade na Trindade, U-
nidade Tri-Hipostática. Em sua maioria, as orações dirigidas a uma pessoa da Trindade termina
com a glorificação ou doxologia de toda as Três Pessoas (por exemplo em uma oração para o
Senhor Jesus Cristo: “Pois glorificado és Tu, junto com Teu Pai não originado, e o Espírito San-
to, agora e sempre .... Amém.”

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A Igreja, dirigindo uma oração à Santíssima Trindade, invoca-a no singular e não no plu-
ral. Por exemplo “por Ti” (e não Vós) louvam todos os poderes celestes, e para Ti (não Vós) nós
damos glória ao Pai, ao Filho e ao Espírito Santo, agora e sempre e pelos séculos dos séculos.
Amém.”
Reconhecendo a natureza mística desse dogma, a Igreja de Cristo nele vê uma grande re-
velação que exalta a fé Cristã incomparavelmente acima de qualquer confissão de simples mono-
teísmo, tais como podem ser encontradas em religiões não Cristãs.. O dogma das Três Pessoas
indica a completude da mística vida interior em Deus, pois Deus é amor e o amor de Deus não
pode ser meramente estendido para o mundo criado por Ele; na Santíssima Trindade esse amor é
dirigido também para o interior da vida divina. O dogma das Três Pessoas nos indica ainda mais
claramente a proximidade de Deus com o mundo: Deus acima de nós, Deus conosco, Deus em
nós e em toda criação.
Acima de nós está Deus o Pai, a eternamente e fluente Fonte, como é expressado na ora-
ção da Igreja, a Fundação de todos os seres, o Pai misericordioso que nos ama e cuida de nós,
Sua criação pois nós somos Seus filhos por graça.
Conosco está Deus o Filho, gerado pelo Pai, que pelo Seu divino amor se manifestou para
os homens como Homem para que pudéssemos saber e ver com nossos próprios olhos que Deus
está conosco muito intimamente, partilhando a carne e o sangue conosco (Hb 2:14) do modo
mais perfeito.
Em nós e em toda criação — por Seu poder e graça — está o Espírito Santo, que enche
tudo, é o Doador da vida, Confortador, tesouro e Fonte de coisas boas. Tendo uma existência e-
terna e pré-eterna, as Três Pessoas Divinas foram manifestadas ao mundo com a chegada e En-
carnação do Filho de Deus, “sendo um Poder, uma Essência, uma Divindade” (Estiqueria de
Pentencostes, Glória ao Pai dos salmos no Lucernário)
Porque Deus em sua verdadeira Essência é totalmente consciência e pensamento, cada
uma das três manifestações eternas de si mesmo pelo Deus uno tem auto consciência, e por isso
cada um é uma Pessoa. Além disso, essas Pessoas não são simplesmente estão contidas na pró-
pria unidade da Essência de deus. Assim, quando na Doutrina Cristã nós falamos da Tri-Unidade
de Deus, nós falamos da mística vinda interior escondida nas profundezas da Divindade, revelam
ao mundo em tempo, no Novo Testamento pela descida do Filho de Deus, do Pai, ao mundo e
pela atividade, do miraculoso, vivificante, e poder salvador do Confortador, o Espírito Santo.

Indicações da Trindade no Velho Testamento.


A verdade da Tri-Unidade de Deus só é expressada de maneira velada no Velho Testa-
mento, só meio revelada. Os testemunhos do Velho Testamento da Trindade são revelados e ex-
plicados na luz da Fé Cristã, como o Apóstolo Paulo escreveu a respeito dos judeus: “E até hoje,
quando é lido Moisés, o véu está posto sobre o coração deles. Mas quando se converterem ao
Senhor, então o véu se retirará... será tirado em Cristo” (2 Co 3:15-16).
As principais passagens no Velho Testamento que testemunham a Trindade de Deus são
as seguintes:
Gênesis 1:1 e os seguintes versículos: o nome de Deus (“Elohim”) no texto hebraico tem
a forma gramatical de número plural.
Gênesis 1:26: “E disse Deus: façamos o homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança.”
O número plural indica aqui que Deus não é uma só pessoa.

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Gênesis 3:22: “Então disse o Senhor Deus: Eis que o homem (Adão) é como um de nós, sabendo
o bem e o mal” (essas são as palavras de deus antes do banimento de nossos ancestrais do Paraí-
so).
Gênesis 11:6-7: Antes da confusão de línguas no prédio da torre de Babilônia, o Senhor
disse: “Eis, desçamos e confundamos ali a sua língua.”
Gênesis 18: 1-3: A respeito de Abrahão: “Depois apareceu-lhe o Senhor nos carvalhos de
Manre ... e (Abrahão) levantou os olhos, e olhou e eis que três varões estavam em pé junto a ele
... e inclinou-se à terra e disse: Meu Senhor, se agora tenho achado graça nos teus olhos, rogo-te
que não passes de Teu servo.” O bendito Agostinho diz nessa passagem: “Vós vedes que Abra-
hão encontra Três mas prostrasse só para Um ... Tendo contemplado Três, ele compreendeu o
mistério da Trindade, e tendo se prostrado para Um, ele confessa Um Deus em Três Pessoas.
Além dessas passagens, os Padres da Igreja vêem uma referencia indireta à Trindade nas
seguintes:
Números 6:24-26: A benção sacerdotal indicada pôr Deus através de Moisés está em
forma tripla: “O Senhor te abençoe... o Senhor faça resplandecer o Seu rosto sobre ti... o Senhor
sobre ti levante o Seu rosto....”
Iscais 6:13: A doxologia dos Serafins que estavam acima do Trono de Deus é em forma
tripla: “Santo, Santo, Santo é o Senhor dos Exércitos”
Salmo 33:6: “Pela palavra do Senhor foram feitos os céus, e todo o exercito deles pelo
Espírito em Tua boca.”
Finalmente, pode-se indicar aquelas passagens no Velho Testamento onde o Filho de
Deus e o Espírito Santo são referidos separadamente. Pôr exemplo a respeito do Filho:
Salmo 2:7: “...Tu és meu Filho, eu hoje te gerei.”
Salmo 110: 1 e 3: “Disse o senhor ao meu Senhor... como vindo do seio da alva, será o
orvalho da Tua mocidade.”
A respeito do Espírito Santo:
Salmo 143:10: “...guie-me o Teu bom Espírito pôr terra plana.”
Isaias 48:16: “...e agora o Senhor Jeová me enviou o seu Espírito.”

O ensinamento da Santíssima Trindade no Novo Testamento.


A Trindade das Pessoas em deus foi revelada no Novo Testamento na vinda do Filho de
Deus e na descida do Espírito Santo. O envio para a terra pelo Pai do Deus Filho e do Espírito
Santo constitui o conteúdo de todos os escritos do Novo Testamento. Logicamente, esta manifes-
tação para o mundo de Deus Tri-único não é dada aqui em formula dogmática, mas como relatos
das manifestações e feitos das pessoas da Santíssima Trindade.
A manifestação de Deus na Trindade foi completada no Batismo do Senhor Jesus Cristo,
razão pela qual esse Batismo é chamado de “Teofania” ou “manifestação de Deus.” O Filho de
Deus, tendo se tornado homem, aceitou o batismo por água; o Pai testemunhou-o; e o Espírito
Santo confirmou a verdade falada pela voz de Deus, pela sua vez na manifestação de uma pom-
ba, como é expresso no tropário dessa festa: “Senhor, em teu batismo no Jordão foi revelada a
adoração devida à trindade pois a voz de Deus Pai deu testemunho em Ti, chamando-Te Filho
Bem- Amado; e o Espírito, sob a forma de uma pomba confirmou esse testemunho inabalável. O
Cristo nosso Deus, que apareceste entre os homens e iluminaste o mundo, glória a Ti!”
No Novo Testamento existem expressões a respeito de Deus Tri-único; em elas, a maioria
de modo condensado mas ao mesmo tempo de forma precisa expressam a verdade da Trindade:

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Mateus 28:19: “Portanto ide, ensinai todas as nações, batizando-as em nome do Pai, e do
Filho, e do Espírito Santo”; desse trecho, Santo Ambrósio de Milão comenta: “O Senhor disse,
“em nome” e não “Nos nomes,” porque Deus é um. Não há muitos nomes; por isso não há dois
ou três deuses.”
2 Co 13:13: “A graça do Senhor Jesus Cristo, e o amor de Deus, e a comunhão do Espíri-
to Santo, seja com vos todos. Amém.”
Jo 15:26: “Mas quando vier o Consolador, que eu da parte do pai vos hei de enviar, aque-
le Espírito de verdade que procede do Pai, ele testificará de mim.”
1 Jo 5:7: “Porque três são os que testificam no céu: o Pai, o Verbo, e o Espírito Santo; e
esses três são um” (Esse versículo não existe nos antigos manuscritos gregos que foram preser-
vados e está presente só nos manuscritos ocidentais latinos).
Além disso, Santo Atanásio, o Grande, interpreta como referencia À Trindade o seguinte
texto da Epístola aos Efésios (4:6): “Um só Deus e Pai de todos, o qual é sobre todos (Deus Pai)
e em todos (Deus o Espírito Santo).” Na verdade, toda a Epístola do Apóstolo Paulo aos Efésios
— especialmente os três primeiro capítulos dogmáticos — é uma revelação da verdade da “eco-
nomia trinitária” da nossa salvação.

O dogma da Santíssima Trindade na Igreja Antiga


A Igreja de Cristo em toda a sua completude confessou a verdade da Santíssima Trinda-
de desde o seu início. Por exemplo, Santo Irineu de Lyon, um discípulo de São Policarpo de Es-
mirna, que foi instruído pelo Apóstolo João, o Teólogo, fala claramente da universalidade na fé
na Santíssima Trindade: “Apesar da Igreja estar dispersa pelo mundo habitado inteiro, aos con-
fins da terra, ela recebeu fé em um Deus o Pai Todo Poderoso... e em um Senhor Jesus Cristo o
Filho de deus, que foi encarnado para nossa salvação e no Espírito Santo que proclamou a eco-
nomia de nossa salvação através dos Profetas... tendo recebido essa pregação e essa fé, a Igreja
apesar de estar espalhada pelo mundo inteiro, como já dissemos, preserva cuidadosamente essa
fé como se estivesse morando em uma só casa. Ela acredita nisso (em todo o lugar) identicamen-
te, como se tivesse uma só alma e um só coração, e prega isso com uma só voz, ensinando e
transmitindo como se fosse uma só boca. Apesar de existirem muitos dialetos no mundo, o poder
da Tradição é o mesmo. Nenhum dos líderes das Igrejas contradirá isso, nem ninguém, seja po-
deroso em palavras ou não instruído, enfraquece a Tradição.”
Defendendo a verdade católica da Santíssima Trindade contra os heréticos, os Santos Pa-
dres não só citaram como prova o testemunho da Sagrada Escritura mas eles também confiaram
no testemunho dos primeiros cristãos. Eles indicaram : 1) o exemplo dos mártires e confessores
que não tiveram medo de declarar sua fé no Pai, no Filho e no Espírito santo; e eles citaram 2) os
escritos dos Padres Apostólicos,e em geral, os escritores cristãos antigos, e 3) as expressões que
são usadas nos Ofícios Divinos. Assim São Basílio, o Grande cita a Pequena Doxologia. “Glória
ao Pai, ao Filho no Espírito Santo”; e outra: “A Ele (Cristo) com o Pai e o Espírito Santo seja
dada honra e glória pelos séculos dos séculos.” E São Basílio diz que essa doxologia era usada
nas Igrejas desde o tempo em que o Evangelho foi anunciado. Ele também aponta para a o Ora-
ção de Agradecimento no acender das luzes, ou o Hino de Véspera, chamando-o de hino “anti-
go” legado “pelos padres” e, ele cita as palavras “Nós cantamos o Pai e o Filho e o Espírito Santo
de Deus,” de modo que a mostrar a fé dos antigos Cristãos no louvor igual do Espírito santo com
o Pai e com o Filho.
Existem igualmente muitos testemunhos dos antigos padres e professores da Igreja a res-
peito do fato que a Igreja desde os primeiros dias de sua existência fez os batismos em nome do

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Pai e do Filho e do Espírito Santo., como três Pessoas Divinas, e acusou os heréticos que tenta-
ram batizar ou em nome somente do Pai, considerando o Filho e o Espírito santo serem poderes
inferiores ou em nome do Pai e do Filho, e mesmo do Filho sozinho, minimizando assim o Espí-
rito Santo (ver os testemunhos de Justin, o Mártir, Tertuliano, Irineu, Cipriano, Atanásio, Hilário,
Basílio, o Grande e outros).
A Igreja, no entanto, experimentou grandes perturbações e passou por uma grande bata-
lha na defesa do dogma da Santíssima Trindade. A batalha foi travada principalmente me dois
pontos: primeiro na afirmação da verdade da unicidade de louvor do Espírito Santo com Deus
Pai e Deus Filho.
No período antigo, o objetivo dogmático da Igreja foi achar palavras precisas para esse
dogma que pudessem melhor proteger o dogma da Santíssima Trindade contra as reinterpreta-
ções dos heréticos. Desejando trazer o mistério da Santíssima Trindade um pouco mais perto dos
nossos conceitos terrenos, trazer o que está alem da compreensão um pouco mais perto daquilo
que é compreensível, os Padres na Igreja usaram comparações na natureza. Entre elas estão: a) o
sol, seus raios e a luz; b) a raiz, o tronco e a fruta de uma arvore; c) a nascente d’água, a fonte e o
rio que dela sai; d) três velas que queimam simultaneamente e que dão uma luz única e insepará-
vel; e) o fogo, e a luz e o calor que vem dele; f) mente, vontade, memória; g) consciência, conhe-
cimento e desejo; e assim por diante. Mas eis que diz São Gregório, o Teólogo a respeito dessas
tentativas de comparação: “Eu examinei cuidadosamente essa questão em mima mente, e a olhei
sobre todos os pontos de vista, de modo a encontrar alguma semelhança com o mistério, mas fui
incapaz de encontrar qualquer coisa na terra que pudesse ser comparada à natureza da divindade.
Pois mesmo que eu percebesse alguma pequena parecença, esta me escapava em sua maior parte,
e me derrubava junto com eu exemplo. Eu pintei para mim uma nascente, uma fonte e um rio,
como outros haviam feito antes, para ver se a primeira poderia ser análoga ao Pai, a segunda ao
Filho e o terceiro ao Espírito Santo. Pois para as Três Pessoas não há distinção no tempo, nem
Elas são tiradas de suas conexões com a cada uma das outras, apesar Delas parecerem estar par-
tidas em três personalidade, No entanto, eu estava em primeiro lugar temeroso de ter que apre-
sentar um fluxo da divindade, incapaz de permanecer imóvel; e segundo lugar, que por essa figu-
ra fosse introduzida uma unidade numérica. Pois a nascente, a fonte e o rio são numericamente
um, apesar de formas diferentes.”
“Novamente, eu penso no sol, no raio e na luz. No entanto, aqui também houve um temos
que no mínimo as pessoas viessem a ter idéia de composição na incomposta natureza, tal como
se existe no sol e as coisas que estão no sol. E alem disso nós estaríamos dando Essência ao Pai e
negando personalidade aos Outros fazendo-os somente poderes de Deus, existindo Nele e não
pessoalmente. Pois nem o raio nem a luz é outro sol, mas eles são só emanações do sol, e quali-
dades de sua essência. E assim, finalmente, seguindo com a ilustração nós estaríamos atribuindo
a Deus tanto ser quanto não ser, o que é ainda mais monstruoso... Em uma palavra, não há nada
que apresente um ponto firme nessas ilustrações do qual eu possa considerar o Objeto que eu es-
tou tentando representar para mim, a menos que se possa indulgentemente aceitar um ponto na
imagem enquanto rejeitando o resto. Finalmente, parece melhor para mim que eu deixe que se vá
a imagem e também a sombra, por serem enganosas e muito distantes da verdade, e inclinando-
me para a concepção mais reverente, e apoiando-me em algumas palavras, usando a orientação
do Espírito Santo, mantendo até o fim como minha genuína camarada e companheira iluminação
que eu recebi Dele, e passando por esse mundo a persuadir outros com o melhor do meu poder a
adorar o Pai, Filho e o Espírito Santo, a Divindade e Poder Uno” (São Gregório, o Teólogo, Ho-

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Holy Trinity Orthodox Mission

milia 31, “On the Holy Spirit” seções 31-33; tradução inglesa em Nicene and Post-Nicene Fa-
thers, second series, Vol. VII, p. 328; Eederman).

Os atributos pessoais das Pessoas Divinas.


Os atributos pessoais, ou hipostáticos da Santíssima Trindade são designados assim: O
Pai é não-gerado; o Filho é gerado pré-eternamente; o Espírito Santo procede do Pai.
“Apesar de termos sido ensinados que existe uma distinção entre geração e progressão,
no que consiste essa distinção, e o que é a geração do Filho e a processão do Espírito Santo do
Pai — isso nós não sabemos” (São João Damasceno).
Nenhum tipo de cálculo lógico a respeito do geração e processão significam é capaz de revelar o
mistério interior da vida divina. Concepções arbitrarias podem até mesmo conduzir a distorções
do ensinamento Cristão. As expressões que o Filho é “gerado pelo Pai” e que o Espírito “procede
do Pai” são simples e precisas transmissões das palavras da Sagrada Escritura. Do Filho é dito
que ele é “O unigênito do Pai (único gerado)” (Jo 1:14, 3:16 e outros lugares); da mesma forma
“O Senhor me disse: Tu és meu Filho, hoje eu te gerei” (Sl 2:7; as palavras desse Salmo são
também citadas na Epistola aos Hebreus, 1:5; 5:5). O dogma da processão do Espírito Santo re-
pousa sobre a direta e precisa expressão do Salvador: “Mas quando vier o Consolador, que eu da
parte do Pai vos hei de enviar, aquele Espírito de verdade que procede do Pai, ele testificará de
mim” (Jo 15:26). Na base das expressões citadas acima, as do Filho são usualmente ditas no ver-
bo passado, isto é que Ele é “gerado” e as do Espírito Santo no presente, isto é que Ele “proce-
de.” No entanto, essas validações de forma gramatical não indicam qualquer relação com o tem-
po de maneira alguma. Ambas “geração” e “processão” são “desde toda eternidade,” “fora do
tempo.”
O dogma da geração do Filho pelo Pai e a processão do Espírito Santo do Pai mostram as
místicas relações interiores das pessoas em Deus e a vida de Deus Nele mesmo. Deve-se clara-
mente distinguir essas relações que são pré-eternas de toda eternidade, e fora do tempo, nas ma-
nifestações da Santíssima Trindade no mundo criado, das atividades e manifestações da provi-
dencia de Deus no mundo como elas foram expressas em tais eventos como a criação do mundo,
a vinda do Filho de Deus para a terra, Sua Encarnação, e o envio do Espírito Santo. Essas mani-
festações e atividades providenciais foram realizadas no tempo. No tempo histórico o Filho de
deus nasceu da Virgem Maria pela descida sobre Ela do Espírito Santo: “Descerá sobre ti o Espí-
rito Santo, e a virtude do Altíssimo te cobrirá com a sua sombra, pelo que também o Santo, que
de ti há de nascer, será chamado de Filho de Deus” (Lc 1:35). No tempo histórico, o Espírito
Santo desceu sobre Jesus Cristo no tempo do Seu batismo por João. No tempo histórico o Espíri-
to Santo foi enviado para cá pelo Filho, vindo do Pai, aparecendo na forma de línguas de fogo. O
Filho veio para a terra através do Espírito Santo. O Espírito é enviado para cá pelo Filho de acor-
do com a promessa “o Consolador... que da parte do Pai, vos hei de enviar” (Jo 15:26).
A respeito da pré-eterna “geração” do Filho de deus e da “Processão” do Espírito, pode-
se perguntar: “Quando foram essas geração e processão?” São Gregório, o teólogo responde: “E-
las foram antes delas mesmo. Vós ouvistes sobre a geração;não fiquem curiosos para conhecer
de que forma essa geração foi. Vós ouvistes que o Espírito Santo procede do Pai; Não fiquem
curiosos par saber como Ele procede.”
Apesar do significado das palavras “geração” e prestarem além de nós, isso não diminui a
importância dessa concepções do ensinamento Cristão a respeito de Deus. Elas indicam a totali-
dade de divindade da Segunda e Terceira Pessoa. A existência do Filho e do Espírito é colocada
em oposição a qualquer tipo de criatura, a qualquer coisa que foi criada e foi chamada pela von-

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tade de deus só pode ser divina e eterna; por isso a palavra de Deus diz do Filho que veio para a
terra: “O Filho unigênito, que está no seio do Pai” (Jo1:18); a respeito do Espírito Santo: “Que eu
vos hei de enviar ... que procede do Pai...” (Jo 15:26). (aqui o presente gramático significa eter-
nidade).
Aquele que é gerado é sempre da mesma essência que o que gera. Mas o que é criado e
feito é de outra e inferior essência, e é externo em relação ao Criador.

O nome da Segunda Pessoa — O Verbo.


Freqüentemente nos Santos padres e nos textos dos Ofícios Divinos o Filho de deus é
chamado de Verbo (ou Palavra) ou Logus. Isso tem sua base no primeiro capitulo do Evangelho
de João, Teólogo.
O conceito ou nome “Verbo” nós encontramos em se significado exaltado muitas vezes
nos livros do Velho Testamento. Eis algumas expressões dos Salmos: “Para sempre, ó Senhor,
Tua Palavra permanece no céu” (Sl 119:09); “Enviou a sua Palavra e os sarou” (Sl 107:20) —
um versículo que se refere ao Êxodo dos Hebreus do Egito; “Pela palavra do Senhor, foram fei-
tos os céus” (Sl 33:6). O autor da Sabedoria de Salomão escreve: “Tua poderosíssima Palavra
saltou do céu, do trono real, para o meio da terra que estava condenada, um severo guerreiro car-
regando a afiada espada do autentico comando e parou e encheu todas as coisas com morte, e
tocou o céu enquanto estava na terra” (Sabedoria 18:15-16).
Com o auxilio deste Divino nome, os Santos Padres tentaram explicar um pouco do mis-
tério do relacionamento do Filho com o Pai. São Dionísio de Alexandria (um discípulo de Origi-
nes) explica a relação do seguinte modo: “Nosso pensamento profere dele mesmo a palavra se-
gundo que o Profeta disse: “O meu coração ferve com palavras boas” (Sl 45:1). Pensamento e
palavra são separados, e cada um ocupa seu lugar especial e separado: enquanto o pensamento
permanece e move-se no coração, a palavra fica na língua e nos lábios. No entanto, eles são inse-
paráveis, nem por um momento um deles é privado do outro. O pensamento não existe sem a pa-
lavra, uma palavra escondida dentro, e palavra é o pensamento que veio para fora. Pensamento é
transformado em palavras, e palavra transmite o pensamento para os ouvintes. Desse modo, o
pensamento com o auxilio da palavra, é instilado nas almas dos ouvintes, entrando nelas junto
com a palavra. O pensamento, vindo de si próprio, é como se fosse o pai da palavra; e a palavra é
como se fosse o filho do pensamento. Antes do pensamento, a palavra era impossível, e a palavra
não vem de nenhum lugar fora, mas sim do próprio pensamento. Assim também, o Pai, o maior e
abrangente pensamento, tem um Filho, o verbo seu primeiro interprete e Heraldo” (citado em De
sentent Dionis, nº 15 de Santo Atanásio).
Essa mesma semelhança, a relação da palavra e pensamento, é muito usada por São João
de Kronstadt em suas reflexões sobre a Santíssima Trindade, em suas reflexões, em Minha Vida
em Cristo.
Na citação acima de São Dionísio de Alexandria, o Salmo mencionado mostra que as i-
déias dos Padres da Igreja estavam baseadas no uso do termo “palavra” (Verbo), na Sagrada Es-
critura não só no Novo Testamento mas no Velho Testamento também. Assim não há razão para
afirmar que o termo “Logos” ou “palavra (Verbo)” foi tomado emprestado pelo Cristianismo da
filosofia, como certos interpretes ocidentais afirmam.
Com certeza, os Padres da igreja, assim como o Apóstolo João, o Teólogo, não estavam
desinformados do conceito de “logos” como era interpretado na filosofia grega e também no filo-
sofo judeu, Philo de Alexandria (o conceito logos como um ser intermediário entre Deus e o
mundo, ou como um divino poder impessoal); mas eles constataram esse entendimento do logos

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com o entendimento Cristão do Verbo — o Filho Unigênito de Deus, um em Essência com o


Pau, e igual em Divindade ao Pai e ao Espírito Santo.

Sobre a Processão do Espírito Santo.


O antigo ensinamento Ortodoxo dos atributos do Pai, do Filho e do Espírito santo foi dis-
torcido na Igreja latina pela criação do ensinamento da processão, fora do tempo e por toda a e-
ternidade do Espírito Santo, do Pai e do Filho — o Filioque . A idéia que o Espírito santo proce-
de do Pai e do Filho originou-se em certas expressões do Bem-Aventurado Agostinho. Tornou-se
obrigatório no Ocidente no século nono, e quando missionários latinos chegaram na Bulgária em
meados do século nono, o Filioque estava sem seu símbolo da fé.
Tornando-se as diferenças entre o Papado e a Ortodoxia Oriental mais agudas, o dogma
latino tornou-se crescentemente reforçando no Ocidente; finalmente ele foi reconhecido no Oci-
dente como dogma universal obrigatório! O Protestantismo herdou esse ensinamento da Igreja
Romana.
O dogma latino do Filioque é um desvio substancial e importante da verdade Ortodoxa.
Esse dogma foi sujeito a um exame detalhado e acusado, especialmente pelos Patriarcas Photius
(século nove) e Michael Cerularius (século onze), e também por São Marcos de Éfeso, que to-
mou parte no Concílio de Florença (1439). Adam Zernikav (século dezoito), que se converteu do
Catolicismo para a Ortodoxia, cita cerca de mil testemunhos dos escritos dos Santos Padres da
Igreja em favor do ensinamento Ortodoxo sobre o Espírito Santo em seu trabalho, Concerning
the Procession of the Holy Spirit.
Em tempos recentes, a Igreja Romana, com objetivos “missionários” tem dissimulado a
importância da diferença entre ensinamento Ortodoxo e o ensinamento Romano sobre o Espírito
Santo. Com isso me mente, os Papas mantiveram o antigo texto Ortodoxo do símbolo da fé, sem
as palavras “e do Filho” para as Uniatas do “Rito Oriental.” No entanto, isso não pode ser olhado
como um tipo de meia rejeição por Roma de seu próprio dogma. No máximo, é só uma dissimu-
lação para a visão romana que o Oriente Ortodoxo voltou a estar em desenvolvimento dogmáti-
co, e que é preciso ser condescendente com essa volta, e que o dogma expresso no Ocidente nu-
ma forma desenvolvida (Explicita, de acordo com a teoria Romana do “desenvolvimento de
dogmas”) está oculto no dogma Ortodoxo numa forma ainda não desenvolvida (implícita). No
entanto, em trabalhos dogmáticos latinos, destinados a uso interno, encontrado um tratamento
bem definido do dogma Ortodoxo na processão do Espírito Santo como uma “heresia.” No traba-
lho dogmático latino do doutor em teologia, A. Sanda, nós lemos:”Oponentes (do atual ensina-
mento Romano) são os gregos cismáticos, que ensinam que o Espírito procede só do Pai. Já no
ano de 808, monges gregos protestaram contra a introdução pelos latinos da palavra Filioque no
Credo... quem foi o originador dessa heresia, não se sabe é desconhecido” (Sinopsis Theologiae
Dogmaticae Specialis, por Dr. A. Sanda ., vol I, pg 100; Herder Edition, 1916)
Porém o dogma latino não concorda nem com as Sagradas Escrituras nem com a Sagrada
Tradição universal da Igreja ; e ele não concorda sequer com as mais antigas tradições da Igreja
local de Roma.
Em sua defesa, os teólogos romanos, citam uma série de passagens na Sagrada Escritura
onde o Espírito santo é chamado de “de Cristo,” onde é dito que Ele é dado pelo Filho de Deus;
daí eles concluem que ele procede também do Filho. As passagens mais importantes citadas pe-
los teólogos romanos são: as palavras do Salvador para seus discípulos a respeito do Espírito
Santo, o Consolador: “Ele há de receber do que e meu, é vos anunciará...” (Jo 16:15); as palavras
do Apóstolo Paulo, “Deus enviou aos nossos corações o Espírito de Seu Filho...” (Ga 4:6); as

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palavras do mesmo Apóstolo: “Mas se alguém não tem o Espírito de Cristo, esse tal não é Dele”
(Ro 8:9); e no Evangelho de João, “assoprou sobre eles e disse-lhes: Recebei o Espírito Santo”
(Jo 20:22)
Da mesma forma, os teólogos romanos acham nos trabalhos dos Santos Padres da Igreja
passagens onde freqüentemente é mencionado o envio do Espírito Santo “através do Filho” e às
vezes até um “processão através do Filho.”
No entanto nenhum arrazoado de qualquer tipo pode obscureceras perfeitamente precisas
palavras do Salvador: “O Consolador, que eu da parte do Pai vos hei de enviar, ... e imediata-
mente depois, ...que procede do Pai” (Jo 15:26).. Os Santos Padres da Igreja não poderiam possi-
velmente colocar as palavras “através do Filho” se elas não estivessem contidas na Sagrada Es-
critura.
No caso presente, os teólogos católicos romanos estão ou confundindo dois dogmas —
isto é, o dogma da existência pessoal das hipóstases e o dogma da unicidade da essência que está
imediatamente ligado com ele, ainda que seja um dogma separado — ou então eles estão con-
fundindo as relações internas das hipóstases da Santíssima Trindade com as ações e manifesta-
ções providenciais do Pai, do Filho e do Espírito santo, que são dirigidas ao mundo e à raça hu-
mana. Que o Espírito Santo é Um em Essência com o Pai e o Filho, e que portanto Ele é o Espíri-
to do Pai e do Filho, é uma verdade inquestionável do Cristianismo, pois Deus é uma Trindade
Uma em Essência e Indivisível.
Essa idéia é claramente expressada pelo Bem Aventurado Teodoreto: “A respeito do Es-
pírito Santo, é dito não que Ele tenha existência do Filho ou através do Filho, mas sim que Ele
procede do Pai e tem a mesma natureza que o Filho, é de fato o Espírito do Filho sendo Um em
Essência com Ele” (B. A. Theodoret, “On the Third Ecumenical Council”).
Nos Divinos Ofícios também, com freqüência ouvimos essas palavras endereçadas ao
Senhor Jesus Cristo: “Pelo Teu Espírito Santo,iluminai-nos, instrui-nos e preserva-nos.” A ex-
pressão “o Espírito do Pai e do Filho,” é igualmente em si própria inteiramente Ortodoxa. Mas
essas expressões referem-se aos dogmas da Unicidade da Essência, e é absolutamente essencial
distinguir este de outro dogma, o dogma da geração e processão, no qual, como os Santos Padres
expressam, é mostrada a causa da existência do Filho e do Espírito Santo. Assim, quando certos
Padres da Igreja usam a expressão “através do Filho” eles estão, precisamente por meio dessa
expressão preservando o dogma da processão do Pai e a inviolabilidade da formula dogmática,
“procede do Pai.” Os padres falam em relação ao Filho “através” para defender a expressão “do
Pai,” onde só se refere só ao Pai.
A isso dever-se-ia juntar a expressão “através do Filho,” que é encontrada em certos Pa-
dres da Igreja, na maioria dos casos referem-se definitivamente às manifestações do Espírito
Santo no mundo, isto é, às ações providenciais da Santíssima Trindade, e não à vida de Deus em
Si próprio. Quando a Igreja Oriental notou uma distorção do dogma do Espírito Santo no Oci-
dente e começou a recriminar os teólogos ocidentais por suas inovações, São Máximo, o Confes-
sor (no século sete), desejando defender os ocidentais, justificou-os precisamente dizendo que
pelas palavras “do Filho” eles pretendiam indicar que o Espírito Santo é dado para as criaturas
através do Filho, que Ele é enviado — mas não que o Espírito Santo tem Sua existência do Filho.
São Máximo, o Confessor manteve estritamente o ensinamento da Igreja Oriental a respeito da
processão do Espírito Santo do Pai e escreveu um tratado especial sobre esse dogma.
O envio providencial do Espírito pelo Filho de Deus é referido nas palavras, “que Eu da
parte do pai vos hei de enviar.” Também nós rezamos: “Senhor, Tu que, à terceira hora, fizeste
nascer o Espírito Santo sobre teus Apóstolos, pela Tua misericórdia não O afastaste de nós, mas

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renova-nos a nós que humildemente te apresentamos as nossas súplicas” (Tropário da Terceira


Hora da Grande Quaresma também dito pelo padre antes da Consagração da sagrada Liturgia).
Confundindo os textos da Sagrada Escritura que falam de “processão” com outros que falam do
“envio” do Espírito Santo, os teólogos romanos transferiram o conceito das relações providenci-
ais para a própria existência da divindade, para as relações lá entre as pessoas da Santíssima
Trindade.
À parte do lado dogmático, ao introduzir um novo dogma a Igreja Romana violou o De-
creto do Terceiro e dos subseqüentes Concílios Ecumênicos (4º ao 7º), que proibiram a introdu-
ção de qualquer tipo de mudança no Símbolo da Fé de Nicéia, depois que deu o Segundo Concí-
lio Ecumênico deu sua forma final. Assim a Igreja Romana cometeu uma séria violação canôni-
ca.
Mas quando os teólogos romanos tentam dizer que a completa diferença entre o Catoli-
cismo Romano e a Ortodoxia no ensinamento do Espírito Santo é que eles ensinam a processão
“também do Filho” enquanto nós ensinamos a processão “através do Filho,” e que nessa afirma-
ção existe escondido lá no fundo um mal entendido (ainda que as vezes alguns escritores de nos-
sa Igreja seguem os Católicos e permitem-se repetir essa idéia), deve-se antepor que a expressão
“através do Filho” em hipótese alguma constitui-se num dogma da Igreja Ortodoxa, mas é só um
modo explanatório de certos Padres em seu ensinamento da Santíssima Trindade, e que portanto
o verdadeiro significado do ensinamento da Igreja Ortodoxa é em essência completamente dife-
rente do ensinamento do Catolicismo Romano.

A igualdade da Divindade das Pessoas da Santíssima Trindade.


As Três Pessoas da Santíssima Trindade tem a mesma Essência; cada uma das hipóstases
tem a totalidade da divindade intacta e incomensurável; as Três hipóstases são iguais em honra e
adoração.
A respeito da completude da divindade da Primeira Pessoa da Santíssima Trindade, não
houveram heresias na historia da Igreja de Cristo que a tivessem negado ou diminuído. No entan-
to, nós encontramos afastamentos do ensinamento Cristão autentico a respeito de Deus Pai. As-
sim, na antigüidade sob a influencia dos Gnósticos, e mais recentemente, sob a influencia da as-
sim chamada filosofia do idealismo na primeira metade do século 19 (principalmente Schelling),
surgiu um ensinamento que considera Deus como o Absoluto, Deus desligado de tudo que seja
limitado e finito (a própria palavra “absoluto” significa “desligado”) e em decorrência não tendo
contato com o mundo, requerendo um intermediário. Assim, o conceito do Absoluto foi ligado
com o nome de Deus Pai e o conceito de intermediário com o nome do Filho de Deus. Essa con-
ceituação esta em total desarmonia com o entendimento Cristão e como o ensinamento da pala-
vra de deus. A palavra de Deus nos ensina que Deus está perto do mundo, que Deus é amor,e que
deus — Deus o Pai — amou tanto o mundo que deu o Seu Filho Unigênito para que todos que
acreditem Nele tenham a vida eterna. Para Deus Pai, inseparavelmente do Filho e do Espírito,
pertence a criação do mundo e da providencia incessante sobre o mundo. Se na palavra de deus o
Filho é chamado de intermediário, isto é, algum principio de ligação entre Deus o Pai, que estaria
infinitamente remoto do mundo, e do finito mundo das criaturas.
Na historia da Igreja, o principal trabalho dogmático dos Santos Padres, foi dirigido à a-
firmação da verdade da Unicidade da Essência, da completude da Divindade, e da igualdade de
honra das Segundas e Terceiras Hipóstases da Santíssima Trindade.

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A Unicidade da Essência; a Igualdade da Divindade; e a Igualdade de Honra de


Deus, o Filho, com Deus o Pai.
Nos primeiros tempos Cristãos, até que a fé da Igreja na Unicidade da Essência e na I-
gualdade das Pessoas da Santíssima Trindade tivesse sido precisamente formulada em termino-
logia estritamente definida, aconteceu que mesmo aqueles escritores da Igreja que eram cuidados
em estar de acordo coma consciência universal da Igreja, e que não tinham nenhuma intenção de
viola-la com nenhuma visão pessoal, ás vezes, junto com pensamento claramente Ortodoxos, u-
saram expressões relativas à Divindades das Pessoas da Santíssima Trindade que não foram in-
teiramente precisas e que não afirmaram claramente a igualdade das Pessoas.
Isso pode ser explicado, na sua maior parte, pelo fato que para o mesmo termo alguns
pastores da Igreja colocavam um significado e outros, outro significado. O conceito “essência”
foi expresso na língua grega pela palavra ousia, e essa palavra foi em geral entendida por todo
mundo da mesma forma. No entanto, uma falta de clareza foi introduzida pelo uso de uma tercei-
ra palavra, “hipóstase.” Alguns entenderam por esse termo as “Pessoas” da Santíssima Trindade,
e outros a “Essência.” Essa circunstância impediu mutuo entendimento. Finalmente, seguindo o
exemplo autorizador de São Basílio, o Grande, tornou-se aceito entender-se pela palavra Hipós-
tase os atributos Pessoais na Divindade Triúnica.
No entanto, alem desses casos, existiram heréticos no período Cristão antigo que consci-
entemente negaram ou diminuíram a Divindade do Filho de Deus. Heresias nesse tipo foram
numerosas e de tempos em tempos causaram fortes perturbações na Igreja. Eis alguns exemplos
desses heréticos:
1. Na Época Apostólica — os Ebionistas (do nome do herético Ebion). Os Santos Padres
testemunham que o Santo Evangelista João Teólogo escreveu seu Evangelho contra eles.
2 . No terceiro século, Paulo de Samosata foi acusado por dois Concílios de Antioquia no
mesmo século.
3. O mais perigoso de todos os heréticos foi Ario, o presbítero de Alexandria, no quarto
século. Ario ensinou que o Verbo, ou o Filho de Deus, recebeu o começo de sua existência no
tempo, apesar de ter sido antes de qualquer outra coisa; que Ele foi criado por Deus, apesar de
subseqüentemente Deus ter criado tudo através Dele; que Ele é chamado de Filho de Deus só
porque Ele é o mais perfeito de todos os espíritos criados, e tem uma natureza que, sendo dife-
rente da do Pai, não é divina.

Esse ensinamento herético de Ario perturbou o mundo Cristão todo, porque ele puxou atrás de si
muita gente. Em 325 o Primeiro Concílio Ecumênico foi chamado contra esse ensinamento, e
nesse Concilio 318 dos hierarcas chefes da Igreja unanimemente expressaram o antigo ensina-
mento da Ortodoxia e condenaram o falso ensinamento de Ario. O Concílio triunfante pronun-
ciou Anátema contra aqueles que existiu um tempo em que o Filho de deus não existiu, contra
aqueles que afirmaram que Ele foi criado, ou que Ele era diferente essência que a do Deus Pai. O
Concílio compôs um Símbolo da Fé, que foi confirmado e completado mais tarde no Segundo
Concilio Ecumênico. A unidade e igualdade de honra do Filho de Deus com o Deus Pai foi ex-
pressa por esse Concílio no Símbolo da Fé com as palavras : “de Uma Essência com o Pai.”
Depois do Concilio, a heresia ariana dividiu-se em três ramos e continuou a existir por
algumas décadas. Ela foi sujeita a outras refutações em seus detalhes em vários concílios locais e
nas obras dos grandes Padres da Igreja do século 4º e parte do século 5º (Santos, Atanásio, o
Grande; Basílio, o Grande; Gregório, o Teólogo; João Crisostomo, Gregório de Nissa; Epifânio;
Ambrósio de Milão; Cirilo de Alexandria; e outros). No entanto, o espírito nessa heresia mesmo

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mais tarde encontrou lugar para si em vários ensinamentos falsos na idade média quanto nos
tempos modernos.
Ao responder às opiniões dos heréticos Arianos, os Padres da Igreja não encontraram
uma só passagem na Sagrada Escritura que tivesse sido citada pelos heréticos em justificativa de
sua Idea de desigualdade do Filho com o Pai. A respeito de expressões na Sagrada Escritura que
parecem falar da desigualdade do Filho com o Pai, deve-se ter em mente o seguinte: a) que o Se-
nhor Jesus Cristo não é só Deus, mas também tornou-se homem, e tais expressões podem se refe-
rir à Sua humanidade; b) que em adição, Ele, como nosso Redentor, durante os dias de Sua vida
terrena estava em voluntária diminuição “...humilhou-se a si mesmo, sendo obediente até na
morte” (Fp 1:8). Mantendo essas palavras do Apóstolo, os Padres da Igreja expressam essa con-
dição pelas palavras ekkenosis, kenosis que significam esvaziamento, diminuição, rebaixamento
“antevendo teu divino auto-esvaziamento na cruz, Hababuque clamou maravilhando-se “ (Cânon
das Matinas do Grande Sábado). Mesmo quando o Senhor fala de Sua própria Divindade, Ele,
tendo sido enviado pelo Pai e tendo vindo para preencher na terra a vontade do Pai, colocando-se
em obediência ao pai, sendo Um em Essência e igual em honra com Ele como Filho, nos dá um
exemplo de obediência.
Esse é o significado preciso, por exemplo, das palavras do Salvador no Evangelho de Jo-
ão : “ Porque o Pai é maior que eu” (Jo 14:28). Deve-se notar que essas palavras são ditas a Seus
discípulos em sua conversa de despedida depois das palavras que expressem a completude de
Sua divindade e a Unidade do Filho com o Pai: “Se alguém me ama, guardará a minha palavra, e
meu Pai o amará, e viremos para Ele, e faremos nele morada” (Jo 14:23). Nessas palavras o sal-
vador junta o Pai e Ele próprio na única palavra “nós,” e para igualmente em nome de Seu Pai e
em Seu próprio nome; mas, como Ele foi mandando pelo Pai para o mundo (Jo 14: 24), Ele se
coloca em uma relação de submissão ao Pai (Jo14:28).
Um exame detalhado de passagens similares na Sagrada Escritura (por exemplo, Marcos
13:32; Mat 26:39; Mt 27:43; João 20-17) é encontrado em Santo Atanásio, o Grande (em seus
sermões contra os Arianos), em São Basílio, o Grande (em seu quarto livro contra Eunomius),
em São Gregório, o Teólogo, e em outros que escreveram contra os Arianos.
No entanto, se existem tais expressões pouco claras na Sagrada Escritura sobre Jesus
Cristo, existem muitas, pode-se até dizer inumeráveis passagens que testemunham a Divindade
do Senhor Jesus Cristo. Primeiro, o Evangelho como um todo O testifica. Quanto as passagens
separadas, indicaremos só algumas das mais importantes. Algumas dessas passagens dizem que o
Filho de Deus é Deus verdadeiro; outras afirmam que Ele é igual ao Pai; outras ainda dizem que
Ele é Um em Essência com o Pai.
É essencial ter em mente que chamar o Senhor Jesus Cristo de Deus — theos — é em sim
falar da plenitude da Divindade Nele. Falando do Filho, o Apóstolo Paulo diz que “Nele habita
corporalmente toda a plenitude da divindade” (Col 2:9).
As passagens seguintes mostram que o Filho de Deus é Deus verdadeiro: a . Ele é direta-
mente chamado de Deus na Sagrada Escritura:
“No principio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o verbo era deus. Ele estava no
principio com Deus. Todas as coisas foram feitas por Ele, e sem Ele nada do que foi feito se fez”
(Jo 1:13)
“Grande é o mistério da piedade; Deus se manifestou em carne” (Tim. 3:16)
“E sabemos que já o Filho de Deus é vindo, e nos deu entendimento para conhecermos o
que é verdadeiro; e no que é verdadeiro estamos, isto é em Seu Filho Jesus Cristo. Este é o ver-
dadeiro Deus e a vida eterna” (1 Jo 5:20)

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“...e dos quais é Cristo segundo a carne, o qual é sobre todos, Deus bendito eternamente.
Amem” (Ro 9:5).
“Meu Senhor e meu Deus” — a exclamação do Apóstolo Tomé (Jo 20:28)
“Olhai pois por vós, e por todo o rebanho sobre que o Espírito Santo vos constitui bispos,
para apascentar a Igreja de Deus, que ele resgatou com o seu próprio sangue” (At. 20:28)
“vivamos.. sóbria, e justa, e piamente. Aguardando a bem aventurada esperança e o apa-
recimento da glória do grande Deus e Nosso Senhor Jesus Cristo” (Tt 2: 12-13) — Que o título
de “grande Deus pertence aqui a Jesus Cristo é tornado claro para nós pela construção da senten-
ça em grego (um artigo comum para as palavras “Deus e Senhor.” Assim como pelo contexto
desse capitulo.

b. Ele é chamado de “Unigênito”


“E o verbo se fez carne, e habitou entre nós, e vimos a sua glória, como a glória do Uni-
gênito do Pai” (Jo 1:14 e 18).
“Porque Deus amou o mundo de tal maneira que deu o Seu Filho Unigênito, para que to-
do aquele que Nele crer não pereça, mas tenha a vida eterna” (Jo 3:16)
c. Ele é igual em honra ao Pai:
“Meu Pai trabalha até agora, e eu trabalho também” (Jo 5:17)
“Porque tudo quanto Ele faz, o Filho o faz igualmente” (Jo 5: 19)
“Pois, assim como o Pai ressuscita os mortos, e os vivifica, assim também o Filho ter a
vida em Si mesmo” (Jo 5:21)” (Jo
“Para que todos honrem o Filho, como honrem o Pai” (Jo 5: 23)
d. Ele é Um em Essência com o Pai:
“Eu e o pai somos Um” (Jo 10:30) — em grego, em esmen, um em essência.
“Eu estou no Pai, e o Pai em Mim” (Jo 14:11; 10:38)
“E todas as minhas coisas são tuas, e as tuas coisas são minhas” (Jo 17:10)
e. A palavra de deus da mesma forma fala da eternidade do Filho de Deus:
“Eu sou o Alfa e o Omega, o principio e o fim, diz o Senhor, que é, e que era, e que há de
vir” (Ap 1:8)
“E agora glorifica-me Tu, ó Pai, junto de Ti mesmo, com aquela Glória que tinha contigo
antes que o mundo existisse” (Jo 17:5)
f. Sobre sua Onipresença:
“Ora ninguém subiu ao céu, senão o que desceu do céu, o Filho do homem, que está no
céu” (Jo 3:13)
“Porque onde estiverem dois ou três reunidos em Meu nome, ai estou Eu no meio deles”
(Mt 18:20)
g. O Filho de Deus como o Criador do mundo:
“Todas as coisas foram feitas por Ele, e sem Ele nada do que foi feito se fez” (Jo 1:3).
“Porque nele foram criadas todas as coisas que há nos céus e na terra, visíveis e invisí-
veis; sejam Tronos; sejam Dominações; sejam Principados; sejam Potestades; todas as coisas fo-
ram criadas por Ele e para Ele; e Ele é antes de todas as coisas, e todas as coisas subsistem por
Ele” (Cl 1:16-17).
A palavra de Deus fala similarmente dos outros atributos Divinos do Senhor Jesus Cristo.
Como Sagrada Tradição, ela contem testemunhos inteiramente claros da fé universal dos
Cristãos dos primeiros séculos da verdadeira Divindade do Senhor Jesus Cristo. Nós vemos a
universalidade dessa fé:

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Nos Símbolos da Fé que foram usados antes do Concilio de Nicéia em toda Igreja local.
Os Símbolos da Fé que foram compostos em Concílios ou em nome de concílios pelos Pastores
da Igreja antes do 4º século.
Os escritos dos Padres Apostólicos e professores da Igreja durante os primeiros séculos.
O testemunho de homens que não pertenciam ao Cristianismo e relataram que os Cristãos adora-
vam “Cristo como Deus” (por exemplo, a carta de Plínio, o Jovem ao Imperador Trajano; o tes-
temunho do escritor Celsius, que era um inimigo dos Cristãos; e outros)

A Igualdade de honra e a Divindade do Espírito Santo.


Na historia da antiga Igreja, sempre que os heréticos tentaram diminuir a Divina dignida-
de do Filho de deus, isso era acompanhado por uma diminuição da dignidade do Espírito Santo.
No segundo século, o herético Valentinus ensinou falsamente que o Espírito Santo não
era distinto em Sua natureza dos anjos. Os Arianos ensinaram a mesma coisa. Porém, o chefe dos
heréticos que distorceu o ensinamento Apostólico a respeito do Espírito Santo foi Macedônio,
que ocupou a cátedra de Constantinopla como Arcebispo no 4º século e encontrou seguidores
entre prévios Arianos e semi-arianos. Ele chamava o Espírito Santo de uma criação do Filho, e
um servo do Pai e do Filho. Acusadores dessa heresia foram Padres da Igreja como São Basílio,
o Grande; Gregório, o Teólogo; Atanásio, o Grande; Gregório de Nissa; Ambrósio, Anfilocius;
Diódoro de Tarso; e outros, que escreveram trabalhos contra os heréticos. O falso ensinamento
de Macedônio foi refutado primeiramente numa série de concílios locais e finalmente no, Segun-
do Concilio Ecumênico, de Constantinopla, em 381. Preservando a Ortodoxia, o Segundo Conci-
lio Ecumênico completou o símbolo da fé de Nicéia com estas palavras: “E no Espírito Santo,
Senhor e fonte de vida, que procede do Pai, e com o Pai e o Filho recebe a mesma adoração e a
mesma glória. Foi Ele que falou pelos Profetas,” assim como os artigos do Credo que seguem a
esse no Símbolo da Fé de Nicéia —Constantinopla.
Dentre os numerosos testemunhos da Sagrada Escritura a respeito do Espírito Santo, é
especialmente importante ter-se em mente as passagens que a) confirmam o ensinamento da I-
greja de que o Espírito Santo não é um poder divino impessoal, mas sim uma Pessoa da Santís-
sima Trindade, e b) que afirmam a Sua Unicidade em Essência e igual dignidade divina com a
Primeira e com a Terceira Pessoa da Santíssima Trindade.
a) Um testemunho do primeiro tipo — Que o Espírito Santo é uma Pessoa — nós temos
nas palavras do Senhor em Sua conversa de despedida com Seus discípulos, na qual Ele chama o
Espírito Santo de “Consolador” “que eu da parte do Pai vos hei de enviar aquele Espírito de ver-
dade, que procede do Pai, ele testificará de mim” (Jo 15:26). “E quando Ele vier, convencerá o
mundo do pecado, e da justiça e do juízo; do pecado porque não crêem em mim; da justiça, por-
que vou para meu Pai, e não me vereis mais; e do juízo porque já o príncipe desse mundo está
julgado” (Jo 16:18-11)
b) O Apóstolo Pedro fala do Espírito como Deus nas palavras dirigidas a Ananias, que
havia escondido o preço de sua propriedade: “porque encheu Satanás o teu coração para que
mentisses ao Espírito Santo ... Não mentiste aos homens, mas a Deus” (At 5:3-4)
A respeito da igualdade de honra e Unicidade da Essência do Espírito Santo como Pai e
o Filho existe o testemunho de passagens como “Batizando-os em nome do Pai, do Filho e do
Espírito Santo” (Mt 28-19).
“A graça de Nosso Senhor Jesus Cristo, o amor de Deus Pai, e a comunhão do Espírito
Santo seja com vós todos” (2 Co 13:13). Aqui todas as três Pessoas da Santíssima Trindade são
mencionados como iguais. E nas seguintes palavras o próprio Salvador expressa a dignidade Di-

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vina do Espírito Santo: “E. se qualquer disser alguma palavra contra o Filho do homem, ser-lhe-á
perdoado, mas, se alguém falar contra o Espírito Santo, não lhe será perdoado nem neste século
nem no futuro” (Mt 12:32).

Transição para a Segunda Parte da Teologia Dogmática.


Quando a mente do homem é dirigida para a compreensão da vida de Deus em Si próprio,
Seu pensamento se perde em sua impotência e só pode se dar conta da incomensurável e inatin-
gível grandeza de Deus, e a interminável e insondável diferença entre a criatura e Deus — uma
diferença tão grande que é impossível compara-la.
Mas quando a mesma mente do homem volta-se para co conhecimento de Deus no mun-
do, para atividades de Deus no mundo, ela vê em todas as coisas e em todos os lugares o poder, a
mente, a bondade e a misericórdia de Deus: “ ... as suas coisas invisíveis, desde a criação do
mundo, tanto o seu eterno poder, como a sua divindade, se entendem e claramente se vêem pelas
coisas que estão criadas” (Ro 1:20)
Mais além, voltando-se para sua própria alma, olhando fundo dentro de si mesmo, con-
centrando-se em oração, estando na Igreja de Cristo, no grau de seu próprio crescimento espiritu-
al — um homem torna-se capaz de entender o que é inexplicável em palavras: a proximidade de
Deus à sua criação, e especialmente sua proximidade ao homem.
Ainda mais adiante, diante dos olhos espirituais de um crente cristão lá está um abismo: o
ilimitado e brilhante, insuperável a tudo amor de Deus por cada um de nós, como revelado pelo
envio para o mundo, e a morte na cruz do Filho de Deus para nossa salvação.
O objetivo final da Teologia Dogmática em sua segunda parte é o reconhecimento da sa-
bedoria e bondade de Deus, a proximidade de Deus, o amor de Deus; e de nosso lado, o reconhe-
cimento do que é necessário para o homem para receber salvação e chegar perto de Deus.

Parte II
Deus Manifestado no Mundo.
Deus e a Criação.

Introdução. O modo de criação do mundo. O motivo para a criação. A perfeição da Criação. O


Mundo Angélico. Anjos da Sagrada Escritura. A criação dos Anjos. O ministério dos Anjos.
Homem — A coroa da criação. A alma como uma substância independente. A origem das almas.
A imortalidade da alma. Alma e espírito. A imagem de Deus no homem. O propósito do Homem.

Introdução.
No princípio criou Deus os céus e a terra (Ge 1:1). O relato divinamente inspirado da cri-
ação do mundo por Moisés, mostrado na primeira pagina da Bíblia, mostra-se em exaltada gran-
deza, bem independente das antigas lendas mitológicas sobre a origem do mundo, bem como vá-
rias hipóteses, constantemente substituindo uma as outras, a respeito do começo e desenvolvi-

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mento da ordem do mundo. Ela é apresentada como o auxilio da mais elementar linguagem; com
um vocabulário consistente e somente algumas centenas de palavras e inteiramente destituído das
idéias abstratas tão necessárias para a expressão de verdades religiosas. Mas apesar de sua ele-
mentar natureza ela tem um significado eterno.
O propósito direto do visionário de Deus Moisés foi — por meio de um relato da criação — ins-
tilar em seu povo, e através dele em toda humanidade, as verdades fundamentais de Deus, do
mundo e do homem.

A. De Deus. A principal verdade expressa na Gênesis é a de Deus como a Única Essência


Espiritual independente do mundo. As primeiras palavras do livro da Gênesis, “No principio cri-
ou Deus,” nos conta que Deus é o único extra-temporal, eterno, auto-existente ser, a fonte de to-
do ser, e o Espírito acima desse mundo, Porque Ele existia também antes da criação do mundo,
seu ser e fora do espaço, não limitado nem pelo céu, porque o céu foi criado junto com a terra.
Deus é Um, Deus é Pessoal, Essência Intelectual.
Depois de apresentar em ordem os estágios da criação do mundo, o escritor da Gênesis
conclui seu relato com as palavras, “E viu Deus tudo quanto tinha feito, e eis que era muito
bom...” (Ge 1:31)
B. Do Mundo. Do magnífico esquema dado por Moisés para a origem do mundo, segue-
se uma série de conclusões diretas a respeito do mundo, nomeadamente:
(1) Como o mundo levantou-se
(a) O mundo não existe eternamente, mas apareceu no tempo.
(b) Ele não se formou, mas é dependente da vontade de Deus.
(c) Ele não apareceu em um único instante, mas foi criado em seqüência do mais
simples para o mais complexo.
(d) não foi criado por necessidade, mas pelo livre desejo de Deus.
(e) Ele foi criado pelo Verbo de Deus, com a participação do Vivificante Espírito.

(2) O que a natureza do mundo é:


(a) O mundo em sua essência é distinto de Deus. Ele não é
(1) Parte de Essência de Deus.
(2) Nem uma emanação Dele,
(3) Nem seu corpo
(b) Ele não foi criado de nenhum material existente eternamente mas foi trazido a ser vindo
do completo não-ser
(c) Tudo que está na terra foi criado dos elementos da terra, foi “trazido” pela água e pela
terra ao comando de Deus, exceto a alma do homem, que carrega em si mesma a imagem e a se-
melhança de Deus.

(3). Quais são as conseqüências da criação


(a) Deus permanece em Sua natureza distinta do mundo, e o mundo de Deus.
(b) Deus não sofreu nenhuma perda e não adquiriu nenhum ganho para si pela
criação do mundo.
(c) No mundo não há nada incriado, à parte o próprio Deus.
(d) Tudo foi criado muito bom — o que significa que a malignidade não apareceu
junto com a criação do mundo

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C. Do homem. O homem é a mais alta criação de Deus na terra. Reconhecendo respeito no seu
Criador, O glorificando, dando graças a Ele, e lutando para ser merecedor de Sua misericórdia!
Mas essas coisas — glória, graças, oração p são possíveis somente sobre as bases que fo-
ram dadas no relato de Moisés sobre a criação do mundo. Sem o conhecimento de um Deus Pes-
soal, nós não poderíamos nos voltar para Ele: nós seriamos órfãos, não conhecendo nem pai nem
mãe.
Se fosse para nós reconhecermos que o mundo é co-eterno com Deus, de alguma forma
independente de Deus, de algum modo igual a Deus, ou ainda nascido de uma emanação de
Deus, então isso seria o mesmo que dizer que o mundo é igual a Deus em dignidade, e que o ho-
mem, como a mais desenvolvida manifestação da natureza do mundo, deveria ser capaz de se
considerar como uma divindade que não teria obrigação diante de um princípio mais elevado.
Tal conceito conduziria às mesmas conseqüências negativas e penosas, para a queda moral dos
homens, como o faz o simples ateísmo.
Mas o mundo tem um inicio. O mundo foi criado no tempo. Existe um mais Elevado, E-
terno, Sapientíssimo, Poderoso e Bom poder acima de nós, por Quem o espírito de um homem
crente alegremente luta e para quem ele se inclina, clamando com amor: “Ó Senhor, quão har-
moniosos são as tuas obras! Feitas todas com sabedoria, a terra está repleta das Tuas riquezas...
A glória do Senhor seja para sempre” (Sl 104:24 e 31).

O modo de criação do mundo.


O mundo foi criado do nada. Na verdade, melhor dizer que ele foi trazido para o ser vin-
do do não-ser, como os Padres normalmente se expressam, porque se dizemos “do,” nós estamos
evidentemente já pensando em algo material. Mas “nada” não é material. No entanto, é condi-
cionalmente aceitável e inteiramente permissível usar essa expressão por sua simplicidade e
brevidade.
Essa criação é um trazer para o ser vindo do completo não-ser e é mostrada em muitas
passagens nas palavras de Deus: por exemplo “Deus as fez (as coisas) de coisas que não existem
(2 Macabeus 7:28); “aquilo que se vê não foi feito do que aparente (Hb 11:3); “e (Deus) chama
as coisas que não são como se já fossem” (Ro 4:17).
O próprio tempo recebeu seu começo na criação do mundo; até então existia somente e-
ternidade. A Sagrada Escritura diz também: “por Ele (Seu Filho) foram feitos os séculos.”
A respeito dos dias da criação, o Bem Aventurado Agostinho, em seu trabalho, A Cidade
de Deus, disse: “Que tipo de dias foram eles é extremamente difícil diz ou talvez impossível para
nós conceber, e quanto mais explicar!” (livro 11, cap. 6, Modern Library Editora, New
York,1950, pg 350).
“Nós vemos, de fato, que nossos dias comuns só tem anoitecer pelo se pôr-do-sol e só
tem amanhecer pelo levantar do sol. Mas nos três primeiros dias da criação não existiu sol, já que
é relatado que ele foi feito no quarto dia. E primeiro de tudo, a luz foi feita pela palavra de Deus,
e Deus, nós lemos, separou a luz das trevas, e chamou a luz de dia, e as trevas de noite; mas que
tipo de luz era, e por qual movimento periódico era feito o anoitecer e o amanhecer está além do
alcance dos nossos sensos; nem podemos entender como era, e no entanto devemos acreditar sem
hesitação nisso” (City of God, livro 11, cap 7, pg 351).
Deus criou o mundo por Seu pensamento, por Sua vontade, por Sua palavra, ou comando.
“..., pois mandou e logo foram criados” (Sc 148,5). Pela “palavra” de Deus, os padres da Igreja
notam que devemos entender aqui nenhum tipo de som articulado ou palavra como nossas. Não,

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essa palavra criadora significa somente o comando ou a expressão da toda poderosa vontade de
Deus, que trouxer o universo para a existência do nada.
São Damasceno escreve: “Agora, o bom e transcendental bom Deus não estava satisfeito
em contemplar a Si mesmo, mas por uma superabundância de bondade viu ser bom que deveriam
existir algumas coisas para se beneficiarem e participarem em Sua bondade, então ele trouxe to-
das as coisas do nada para o ser e as criou, tanto visíveis quanto invisíveis, e também o homem
que é feito de ambas. Por pensar Ele criou, e com o Verbo preenchendo e o espírito aperfeiçoan-
do, o pensamento tornou-se ação” (Exact Exposition, Livro 2, cap.2, Fathers of The Church, tr.
Pág 205).
Assim, apesar do mundo ter sido criado no tempo, Deus tinha o pensamento de Sua cria-
ção por toda a eternidade (Agostinho, Against Heresies). No entanto, nós evitamos a expressão
“Ele criou o mundo de seu pensamento” para não dar ocasião a que se pense que ele criou o
mundo de Sua Essência. Se a palavra de Deus não nos dá o direito de falar do “ser pré-eterno” do
mundo inteiro, assim também, na mesma base deve-se reconhecer como inaceitável a idéia da
“existência pré-eterna da humanidade,” uma idéia que tem tentado penetrar na nossa teologia a-
través das correntes filosóficas-teológicas contemporâneas.
A Santa Igreja, sendo guiadas pelas indicações da Sagrada Escritura, confessa a partici-
pação de todas as pessoas da Santíssima Trindade na criação. No símbolo da fé nós lemos:
“Creio em um só Deus, Pai Todo Poderoso, Criador do céu e da terra,e de todas as coisas visíveis
e invisíveis; creio em um só Senhor Jesus Cristo, Filho Único de Deus...por Quem todas as coi-
sas foram feitas ... creio no Espírito Santo, Senhor e Fonte de Vida.” Santo Irineu de Lyon escre-
ve: “O Filho e o Espírito Santo são, como se fossem as mãos do Pai” (Against Heresies, Livro 5,
cap. 6). A mesma idéia é encontrada em São João de Kronstadt (My Life in Christ).

O motivo para a criação.


A respeito do motivo para a criação na mente de Deus, a Confissão Ortodoxa e o Longo
Catecismo Ortodoxo expressam-se assim: O mundo foi criado por Deus “para que outros seres
glorificando-O, possam ser participantes em Sua bondade.” A idéia de misericórdia e bondade de
Deus, como expressar na criação do mundo, é encontrada em muitos salmos como nos Salmos
103 e 104 (“Bendize, ó minha alma, ao Senhor”) que chamam à glorificação do Senhor, e dão
graças à própria existência e por todas as providências de Deus. O mesmo pensamento é expres-
so pelos Padres na Igreja. O Bem Aventurado Teodoreto escreve: “O Senhor não tem necessida-
de de ninguém que O louve; mas só por Sua bondade Ele concedeu existência aos Anjos, Arcan-
jos, e para toda a criação.” Além disso, “Deus não tem necessidade de nada; mas Ele, sendo um
abismo de bondade dignou-se dar existência a coisas que não existiam.” São João Damasceno
diz (como vimos logo atrás): “O bom e transcendentemente bom Deus não estava satisfeito em
contemplar a Si mesmo, mas por uma superabundância de bondade viu ser bom que deveriam
existir algumas coisas para se beneficiarem e participarem em Sua bondade.”

A perfeição da criação.
A palavra de Deus e os Padres da Igreja ensinam que tudo que foi criado por Deus foi
bom, e eles indicam a boa ordem do mundo como criado pelo Bom. A criação irracional, não
tendo em sim nenhuma liberdade moral, é moralmente nem boa nem má. A criação racional e
livre torna-se maligna quando ela se inclina para longe de Deus; isso é seguindo sua atração pe-
caminosa e não porque ela foi criada assim. “E viu Deus que era bom” (Gen 1;4, 10, 12, 18, 21,
25). “E eis que era muito bom” (Ge 1:31).

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Deus criou o mundo perfeito. No entanto, o Apocalipse não diz que o mundo presente era
perfeito em tal extensão que não teria necessidade de, ou seria incapaz de, um aperfeiçoamento,
fosse nos dias de sua criação ou nas suas condições mais tardias e presentes. O mundo terreno
em seus mais altos representantes — o gênero humano — eram predestinados para uma forma de
vida nova e mais elevada. A Revelação Divina nos ensina que a presente condição do mundo se-
rá substituída em algum momento por uma melhor e mais perfeita, quando existirá “novos céus e
nova terra” (2 Pe 3:13), e a própria criação “será libertada da servidão da corrupção” (Ro 8:21).
A Questão: como a vida de Deus procedia antes da criação humana do mundo, o Bem
Aventurado Agostinho responde, “minha melhor resposta é: eu não sei.” São Gregório, o Teólo-
go reflete: “Ele contempla a amada radiancia de Sua própria bondade... visto que não se pode
atribuir a Deus inatividade ou imperfeição, então o que ocupava o pensamento divino antes que o
Todo Poderoso reinando na ausência do tempo, criasse o universo e o adornasse com formas?
Ele contemplava a amada radiosa divindade conhecida só pela divindade e para quem Deus A
revelasse. A Mente criadora do mundo igualmente contemplativa, em suas grandes concepções,
as formas do mundo divisadas por Ele, que, mesmo que fossem trazidas subseqüentemente, para
Deus já estavam presentes. Com Deus, tudo está diante de Seus olhos: o que será, o que foi, e o
que não é” (São Gregório, o Teólogo, Homilia 4, On the World).
Para a questão, como era expressa, a onipotência de Deus, antes que existissem o mundo,
São Metódio de Patara diz: “Deus Onipotente está fora de qualquer dependência das coisas cria-
das por Ele.”

O Mundo Angélico.
O primeiro e mais alto ligar na inteira escada dos seres criados é ocupado pelos espíritos puros
e imateriais. Eles são seres não só comparativamente mais elevados e mais perfeitos, mas eles
também tem uma influência muito importante na vida dos homens, apesar de serem invisíveis
para nós.
O que foi revelado para nós a respeito deles? Como e quando eles vieram para a condição
de ser? Que natureza lhes foi dada? São todos de igual estatura? Qual é o seu propósito e a forma
de sua existência?

Anjos na Sagrada Escritura.


O nome “anjo” significa “mensageiro.” Essa palavra caracteriza bem o seu serviço para a
raça humana. O gênero humano conheceu sobre sua existência desde os primeiros dias do Paraí-
so. Nós vemos um reflexo desse fato também em outras religiões antigas, não só no Judaísmo.
Depois que o gênero humano caiu no pecado e foi banido do Paraíso, um Querubim com
uma espada flamejante foi posto para guardar a entrada o Paraíso (Ge 3:24). Abrahão, quando
enviando seu servo para Naor, encorajou-o com a convicção de que o Senhor enviaria seu anjo
com ele e orientaria seu caminho (Ge 24:7). Jacó viu Anjos, tanto durante o sono (na visão da
escada mística, no caminho para a Mesopotâmia; Ge 28:12) quanto acordado (no caminho de
volta para o lar para Esaú, quando ele viu um “exército” dos Anjos de Deus; Ge 32:1 e 2). Nos
salmos, os anjos são falados freqüentemente: “Louvai-o, todos os seus anjos” (Sl 148:2).”...Aos
seus anjos dará ordem a teu respeito, para te guardarem em todos os teus caminhos” (SL 91:11).
Similarmente, nós lemos acerca dos anjos no livro de Jó e nos Profetas, o Profeta Isaias viu Sera-

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fins rodeando o trono de deus (cap 6). O Profeta Ezequiel viu Querubins na visão da Casa de
Deus (Cap. 10).
O Novo Testamento contem muita informação e muitas menções de anjos. Um anjo in-
formou Zacarias da concepção do Precursor. Um anjo informou a Santíssima Virgem Maria do
nascimento do Salvador e apareceu a José enquanto este dormia. Uma multidão numerosa de an-
jos cantou a glória da Natividade de Cristo. Um anjo anunciou a boa nova do nascimento do Sal-
vador aos pastores. Um anjo preveniu os Magos para não retornarem a Herodes. Anjos serviram
Jesus Cristo depois de Suas tentações no deserto. Um anjo apareceu para dar força a Ele no jar-
dim de Getsemani. Anjos informaram as mulheres Miróforas sobre a Sua Ressurreição. Os Após-
tolos foram informados por eles sobre a Sua segunda vinda, na hora de Sua Ascensão ao céu..
Anjos libertaram Pedro e outros Apóstolos (At 5:19), e Pedro sozinho (At 12:7-15). Um anjo a-
pareceu para Cornélio e deu instrução a ele para chamar o Apóstolo Pedro e instrui-lo na palavra
de Deus (At 10:3-7). Um anjo informou o Apóstolo Paulo que ele tinha que se apresentar diante
do César (At 27:23-24). Uma visão de anjo é a base das revelações dadas a São João Teólogo no
Apocalipse.

A criação dos Anjos.


No Símbolo da Fé nós leos, “Creio em um só Deus, . Criador do céu e da terra, e de todas
as coisas visíveis e invisíveis.” O invisível, mundo angélico foi criado por Deus, e criado antes
que o mundo visível. “Quando as estrelas foram feitas, todos meus anjos me louvaram com alta
voz, disse o Senhor a Jó” (Jo 38:7, Septuaginta). O Apóstolo Paulo escreve: “Porque nele foram
criadas todas as coisas que há nos céus e na terra, visíveis e invisíveis, sejam tronos, sejam do-
minações, sejam principados, sejam potestades...” (Col 1:16). Os Padres da Igreja entendem que
a palavra “céu” no começo do livro da Gênesis (“No começo criou Deus os céus e a terra”), não
como sendo o céu físico, que foi formando depois, mas o céu invisível, o ligar de morada dos
poderes do alto. Eles expressaram idéia de que Deus criou os anjos muito antes de ter criado o
mundo visível. (Santos Ambrósio, Jerônimo, Gregório o Grande, Anastácio do Sinai) e que na
criação do mundo visível os anjos já estavam diante da face do Criador e O serviam. São Gregó-
rio o Teólogo reflete sobre isso: “Desde que, para a bondade de Deus não era suficiente estar o-
cupada só com a própria contemplação, mas era necessário que o bem se estendesse mais e mais,
para que o número daqueles que viessem a receber graça fosse tão grande quanto possível (por-
que essa é a característica da mais elevada bondade) — então, Deus divisou primeiro de tudo os
poderes angélicos celestiais; e o pensamento tornou-se ação, que foi executada pelo Verbo, e a-
perfeiçoada pelo Espírito... e assim que as primeiras criaturas estavam agradando a Ele, Ele divi-
sou outro mundo, material e visível, a composição ordenada do céu e da terra, e daquilo que está
entre eles.” São João Damasceno segue também o pensamento de São Gregório Teólogo (Exact
Exposition, Livro 2, cap 3).

A natureza dos Anjos.


Por sua natureza, anjos são espíritos ativos que tem inteligência, vontade e conhecimento.
Eles servem Deus, preenchem Sua vontade providencial, e O glorificam. Eles são espíritos ima-
teriais e, porque eles pertencem ao mundo invisível, eles não podem ser vistos por nossos olhos
corporais. Anjos, instrui São João Damasceno, “não aparecem exatamente como eles são mas
sim como Deus quer que eles apareçam. Eles aparecem nas mais diferentes formas como pode
ser visto por aqueles que os contemplam” (Exact Exposition, livro 2, cap. 3, trad. Inglesa,pag
206). No relato do livro de Tobias, o anjo que o acompanha e ao seu filho conta a ele de si pró-

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prio: “Todos esses dias eu simplesmente apareci para vocês e não comi ou bebi, mas vocês esta-
vam vendo uma visão” (Tobias 12:19). Agora, como São João Damasceno expressa, “comparado
conosco, o anjo é dito ser incorpóreo e imaterial, apesar de em comparação com Deus, que só Ele
é incomparável, tudo prova ser grosseiro e material — pois só a divindade é verdadeiramente
imaterial e incorpórea “ (Ibid, pg 205).

O grau de perfeição angélica.


Os anjos são espíritos prefeitos. Eles ultrapassam o homem pelo seu poder espiritual. No
entanto, eles também, como seres criados, carregam em si o selo da limitação. Sendo imateriais,
eles são menos dependentes que os homens de espaço e lugar, e por assim dizer, passam através
de vastos espaços com extrema rapidez, aparecendo aonde quer que seja necessário que eles a-
jam. No entanto, não se pode dizer que eles sejam inteiramente independentes de espaço e lugar,
nem que eles estejam presentes em todo lugar. A Sagrada Escritura às vezes mostra anjos des-
cendo do céu para a terra, ás vezes subindo da terra para o céu, e assim deve-se supor que eles
estejam tanto no céu quanto na terra ao mesmo tempo. (Os Santos Padres ensinam isso bastante
explicitamente. Assim, São Basílio escreve: “Nós cremos que cada um (dos poderes celestes)
tem um lugar definido. Pois o anjo que estava frente a Cornélio não estava ao mesmo tempo com
Felipe (At 10:3; 8:26); e o anjo que falou Zacarias não estava ao mesmo tempo ocupando seu
próprio lugar no céu” (On the Holly Spirit, cap 23, edição russa de Soikin, São Petesburgo, 1911,
vol 1, pág. 622). Da mesma forma São João Damasceno ensina: “Os anjos são circunscritos, pois
quando eles estão no céu eles não estão na terra, e quando eles são mandados para a terra por
Deus, eles não permanecem no céu” (Exact Exposition, Livro 2, cap. 3, tradução inglesa, pág.
206).
Imortalidade é um atributo dos anjos, e é claramente testificada pelas Escrituras, que en-
sinam que eles não podem morrer (Lc 20:36). No entanto, sua imortalidade não é uma imortali-
dade divina; isso é algo auto-existente e incondicional. Ao contrário ela depende, assim como a
imortalidade da alma humana, inteiramente da vontade e misericórdia de Deus.
Como espíritos imateriais, os anjos são capazes de autodesenvolvimento interno até o
mais alto grau. Suas mentes são mais elevadas que a mente humana. De acordo com a explana-
ção do Apóstolo Pedro, em sua força e poder eles ultrapassam todos os governos e todas as auto-
ridades terrenas (2 Pe 2:11). A natureza de um anjo é mais elevada que a natureza de um homem,
como o Salmista diz quando, para exaltar o ser humano, ele mostra que o homem é pouco inferi-
or aos anjos (Sl 8:5). Porém, os exaltados atributos dos anjos tem seus limites. A Escritura indica
que eles não conhecem as profundezas da Essência de Deus, que é conhecida somente pelo Espí-
rito de Deus: “Assim ninguém sabe as coisas de Deus, senão o Espírito de Deus” (1 Co 2:11).
Eles não conhecem o futuro, o qual também é conhecido somente por Deus: “Mas daquele dia e
hora ninguém sabe, nem os anjos que estão no céu” (Mc 13:22). Da mesma forma eles não en-
tende completamente o mistério da Redenção, apesar de quererem nele penetrar: “para as quais
coisas os anjos desejam bem atentar” (1 Pe 1:12). Eles nem mesmo conhecem todos os pensa-
mentos humanos (3 Reis 8:39). Finalmente, eles não podem por si próprios, sem a vontade de
Deus, fazer milagres: “Bendito seja o Senhor Deus, o Deus de Israel, que só ele faz maravilhas”
(Sl 72:18).

O número e os graus dos Anjos.


A Sagrada Escritura apresenta o mundo angélico como extraordinariamente grande.
Quando o Profeta Daniel viu o Ancião dos Dias em uma visão, foi revelado para seu espanto que

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“milhares de milhares O serviam e milhões de milhões estavam diante Dele” (Daniel 7:10). “U-
ma multidão dos anjos celestiais, louvou a vinda para a terra do Filho de deus” (Lc 2:13).
“Calculem,” diz São Cirilo de Jerusalém, “quantas são as nações romanas; calculem
quantas tribos bárbaras vivem agora, e quantos morreram nos últimos cem anos; calculem quan-
tas nações foram enterradas durante os últimos mil anos; calculem todos de Adão até hoje. Na
verdade é uma grande multidão; mas ainda é pouco, porque os anjos são muito mais. Eles são as
noventa e nove ovelhas, mas o ser humano é a uma” (Mt 18:12). Pois de acordo com a extensão
do espaço universal, nós devemos calcular o número de seus habitantes. A terra inteira não é se-
não um ponto no meio do céu, e mesmo assim contem tão grande multidão; que multidão deve
conter o céu que envolve a terra? E o céu dos céus não devem conter números inimagináveis? E
está escrito, milhares e milhares O serviam e milhões de milhões estavam diante Dele; não que a
multidão fosse só desse tamanho, mas o Profeta não conseguiu expressar mais do que isso” (São
Cirilo de Jerusalém, Catechetica Lectures, 15:24, tradução Eerdmans, pg 111-112).
Com tal multidão de anjos é natural supor-se que no mundo dos anjos assim como no
mundo material, existam vários degraus de perfeição, e portanto vários estágios, ou graus hierár-
quicos, dos poderes celestes. Assim, a palavra de Deus chama alguns deles de “anjos” e outros
de “arcanjos” (1 Ts 4:16; Judas 1:9).
A Igreja Ortodoxa, guiada pela visão de antigos escritores da Igreja e dos Santos Padres,
e em particular pelo trabalho, A Hierarquia Celeste, que leva o nome de São Dinis, o Aeropagita,
divide o mundo angélico em novos coros ou categorias, e esses nove em três hierarquias, com
três categorias em cada. Na primeira hierarquia estão aqueles que estão mais perto de Deus: os
Tronos, os Querubins e os Serafins. Na segunda, hierarquia média, estão os Poder, Potestade e
Domínio. Na terceira, mais próximas de nós, estão os Anjos, Arcanjos e Principados. (The Or-
thodox Confession).
Nós encontramos essa enumeração dos noves coros de anjos nas Constituições Apostóli-
cas (As “Constituições Apostólicas” são uma coleção de textos do 4º e 5º séculos sobre a doutri-
na, louvação e disciplina Cristã que dão muita informação sobre a vida da Igreja nos primeiros
tempos — apesar de não necessariamente no tempo dos Apóstolos. Tendo algum respeito por ser
um texto Cristão antigo, mais devido a algumas adições feitas a ele em diferentes épocas, não
tem autoridade da Igreja que é gozada por outros textos dos primeiros tempos. Ele tem que ser
distinguido dos “Canons Apostólicos” que foram aceitos pelo Quinisext Concílio (692) como
autorizado para a Igreja, e ressalte-se que esse mesmo Concílio rejeitou as Constituições Apostó-
licas como um todo por conta de “material adúltero” que foi acrescentado a elas (Canon 2, E-
erdmansSeven Ecumenical Concils, p. 361), em Santo Inácio, o Teóforo, Gregório Teólogo e
Crisostomo; mais tarde em São Gregório Dialoguista, João Damasceno e outros. Aqui estão as
palavras de São Gregório Dialoguista sobre esse assunto: “Nós aceitamos nove categorias de an-
jos, porque por testemunho da palavra de Deus nós conhecemos sobre Anjos, Arcanjos, Potesta-
des, Autoridades, Principados, Dominações, Tronos, Querubins e serafins. Assim, a respeito da
existência de Anjos e Arcanjos, quase todas as páginas da Sagrada Escritura testemunham; dos
Querubins e Serafins como é bem conhecidos, os livros proféticos falam freqüentemente; o A-
póstolo Paulo enumera outras quatro categorias em sua Epístola aos Efésios, dizendo que Deus
(o Pai) colocou seu Filho “acima de todo o principado, e poder, e potestade, e domínio” (Ef
1:21). E em sua Epístola aos Colossenses ele escreve: “Nele foram criadas todas as coisas que há
no céu e na terra visíveis e invisíveis, sejam Tronos, Dominações, sejam Principados, sejam Po-
testades” (Cl 1:16). E assim, quando juntamos Tronos para esses quatro do qual fala aos Efésios,
isto é, Principado, Poder, Potestade e Domínio nós temos cinco categorias separadas, e quando

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juntamos a elas os Anjos, Arcanjos, Querubins e Serafins, está claro que existem nove categorias
de anjos.
Na verdade, voltando aos livros da Sagrada Escritura, nós encontramos os nomes das no-
ve categorias mencionadas acima; mais do que nove não são mencionadas. Assim, nós lemos o
nome “Querubim” no livro da Gênesis (3:24), nos Salmos 80 e 99 e em Ezequiel (cap 1 e 10).
“Serafim” nós encontramos em Isaias (cap. 6); “Poderes” nós encontramos na Epístola aos Efé-
sios (cap. 1) e em Romanos (cap. 8); “Trono,” “Principado,” Domínios,” Potestades” em Colos-
senses (cap. 1), e Efésios (cap 1 e 3)); “Arcanjos” em 1 Ts (cap 4) e Judas (vers. 9); e “anjos” em
1 Pe (cap 3), Romanos (cap 8) e outros livros. Sobre essa base o número de categorias dos anjos
é usualmente limitado no ensinamento da Igreja a nove.
Certos Padres da Igreja expressam sua pia opinião privada que a divisão dos anjos em
nove categorias inclui somente aqueles nomes e graus que não foram revelados na palavra de
Deus, mas não incluem muitos outros nomes e graus que não foram revelados a nós nesta vida
presente mas que serão conhecidos somente na vida futura. Essa idéia é desenvolvida por São
Crisostomo, Bem Aventurado Teodoreto e Bem Aventurado Teofilacto. “Existem,” diz Crisos-
tomo, “na verdade existem outros poderes cujos nomes nós não conhecemos ... Anjos, Arcanjos,
Tronos, Domínios, Principados, Potestades não são os únicos habitantes dos céus; existem tam-
bém inumeráveis outros tipos, e inimaginavelmente muitas classes que palavras não são capazes
de descrever. E como é evidente que existem poderes além daqueles mencionados acima e pode-
res cujos nomes nós não conhecemos? O Apóstolo Paulo tendo falado de uns, menciona os ou-
tros quando ele testemunha de Cristo “...pondo-o à Sua direita nos céus, acima de todo o Princi-
pado, e Poder e Potestade e Domínio, e de todo nome que se nomeia, não só nesse século mas
também no vindouro” (Ef 1:20-21). Vêem que existem certos nomes que só serão conhecidos
então, mas que são desconhecidos agora? Assim, ele também diz: “... de todo o nome que se no-
meia, não só nesse século mas também no vindouro” Essa opinião é tomada pela Igreja, como
opinião privada.
Em geral, os antigos pastores consideravam a doutrina da hierarquia celeste, mística.
“Quantas categorias de seres celestes existem” reflete São Dinis na Hierarquia Celeste, “de que
tipo elas são, e de que modo os mistérios de sua sacra ordem são executados só é conhecido pre-
cisamente por Deus, que é a Causa da hierarquia deles. Da mesma forma, eles mesmo conhecem
seus próprios poderes, luz e ordem além desse mundo. Mas nós podemos falar disso somente até
o grau que Deus revelou para nós através dos próprios poderes celestes, como os únicos que co-
nhecem a si próprios” (Hierarquia Celeste, cap. 6). Similarmente, o Bem Aventurado Agostinho
reflete, “que há Tronos, Domínios, Principados e Potestades nas mansões celestes, eu creio sem
hesitação e eles são distintos, uns dos outros, disso não tenho dúvidas; mas de que tipo são eles, e
em que precisamente eles são distinguidos entre si, eu não sei.”
Na Sagrada Escritura, para alguns dos anjos mais elevados são dados nomes próprios.
Existem dois de tais nomes nos livros canônicos: Michael (que significa “quem é igual a Deus”?
Daniel 10:13, 12:1; Judas 1:9; Apocalipse 12:7-8) e Gabriel (“Homem de Deus”; Daniel 8:16,
9:21; Lucas 1:19,26). Três anjos são mencionados por nome nos livros não canônicos: Rafael
(“Ajuda de Deus,” Tobias 3:17,12:12-15); Uriel (“Fogo de Deus”; III Esdras 4:1, 5-20) e Salatiel
(“Oração para Deus” III Esdras 5:16). A parte esses a pia tradição atribui nomes para dois outros
anjos: Jegudiel (“Louvação de Deus”) e Barachier (“Benção de Deus”); esses nomes não são en-
contrados nas Escrituras. Além disso, no segundo livro de Esdras há menção ainda a um outro:
Jeremiel (“a Altura de Deus” 2 Esdras 4:36); mas julgando o contexto dessa passagem, esse no-
me é o mesmo de Uriel.

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Assim, nomes foram dados para sete dos anjos maiores, correspondendo às palavras do
Apóstolo João, o Teólogo no Apocalipse: “Graça e paz seja convosco de parte Daquele que é, e
que era, e que há de vir, e da dos sete espíritos que estão diante do Seu trono” (Apocal. 1:4).

O ministério dos Anjos.


Qual finalmente é o propósito dos seres do mundo espiritual? É evidente que eles foram
originados por Deus para serem o mais perfeito reflexo de Sua grandeza e glória, com insepará-
vel participação em Sua beatitude. Tem sido dito a respeito dos céus visíveis que “os céus decla-
ram a glória de Deus,” então muito mais é o objetivo dos céus espirituais. É por isso que São
Gregório, o Teólogo chama-os “reflexos da luz perfeita,” ou luzes secundárias.
Os anjos das classificações que estão próximos da raça humana são apresentados na Sa-
grada Escritura como arautos da vontade de Deus, guias dos homens, e servos de sua salvação. O
Apóstolo Paulo escreve: “Não são porventura todos eles espíritos ministradores, enviados para
servir a favor daqueles que hão de herdar a salvação?” (Hb 1:14).
Não só os anjos cantam hinos à glória de Deus, mas também O servem nos trabalhos de
Sua providência para o mundo material e sensível. Desse serviço os Santos Padres falam fre-
qüentemente: “Alguns deles ficam em frente o grande Deus; outros por sua cooperação, susten-
tam o mundo inteiro” (São Gregório, o Teólogo, “Mystical Hymns,” Homilia 6). Os anjos “são
indicados para a governança dos elementos e dos céus, do mundo e de tudo que está nele” (Ate-
nágoras). “Deles, diferentes indivíduos abraçam diferentes partes do mundo, ou são indicados
para diferentes distritos do universo, pois Ele sabe quem ordenou e distribuiu tudo; combinando
todas as coisas em uma, somente com o consentimento do Criador de todas as coisas” (São Gre-
gório, o Teólogo, Homilia 28, tradução Eerdmans, pg 300).
Em alguns escritores da Igreja é encontrada a opinião de que anjos especiais são coloca-
dos sobre aspectos separados do reino da natureza — o inorgânico, o orgânico, e o animal (Ori-
genes, Bem Aventurado Agostinho). Essa opinião tem sua fonte no Apocalipse, onde é feita
menção a anjos, que de acordo com a vontade de Deus, estão encarregados de certos elementos
da terra. O Visionário dos mistérios, São João, escreve no 16º capítulo, versículo 5, do Apocalip-
se, “E ouvi o anjo das águas que dizia:.” Em Apocalipse 7:1 ele diz”...vi quatro anjos que esta-
vam sobre os quatro cantos da terra, retendo os quatro ventos da terra, para que nenhum vento
soprasse sobre a terra, nem sobre o mar, nem contra árvore alguma” e em Apocalipse 14:18 “E
saiu do altar outro anjo, que tinha poder sobre o fogo e clamou.” Na visão do Profeta Daniel e-
xistem anjos a quem Deus confiou o cuidado com a sorte dos povos e reinos que existem sobre a
terra (Mt 18:10).
A Igreja Ortodoxa acredita que todo homem tem seu próprio anjo da guarda, se ele não o
afastou de si próprio por uma vida ímpia. O Senhor Jesus Cristo disse: “Vede, não desprezeis
alguns desses pequeninos, porque Eu vos digo que os seus anjos nos véus sempre vêem a face de
meu Pai que está nos céus” (Mt. 18:10).

Homem — A Coroa da Criação.


Na escada da criação terrena, o homem é colocado no degrau mais alto, e em relação a todos os
seres terrestres ele ocupa a posição reinante. Sendo terreno, de acordo com seus dons ele se a-
proxima os seres celestes, pois ele é “pouco menor que os anjos” (Sl 8:5). E o Profeta Moisés
descreve a origem do homem desse modo: “Depois que todas as criaturas da terra foram criadas,

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e Deus disse, Façamos o homem à Nossa imagem, conforme nossa semelhança, e que ele tenha
domínio sobre os peixes do mar sobre as aves dos céus... e sobre toda a terra ... E criou Deus o
homem à Sua imagem; à imagem de Deus o criou” (Ge 1:26-27).
1. O conselho de Deus, que não é indicado na criação das outras criaturas da terra, fala
por si próprio claramente do fato que o homem era para ser uma criação especial, distinta das
outras, a mais alta, a mais perfeita na terra, tendo também um propósito mais elevado no mundo.
2. O conceito do alto propósito do homem e seu especial significado é enfatizado ainda
mais pelo fato que o conselho de Deus ordenou que o homem fosse criado “à imagem e seme-
lhança de Deus” e que de fato ele foi criado á imagem de Deus. Toda imagem necessariamente
pressupõe uma similaridade com seu arquétipo; consequentemente, a presença da imagem de
Deus no homem testemunha sobre a reflexão dos atributos de Deus na natureza espiritual do ho-
mem.
3. Finalmente, certos detalhes da criação do homem que são dados no segundo capítulo
da Gênesis enfatizam mais uma vez a proeminência especial da natureza humana. Para ser preci-
so é dito ali: “E formou o Senhor Deus o homem do pó da terra, e soprou em seus narizes o fôle-
go da vida. E o homem foi feito alma vivente” (Ge 2:7). Duas ações, ou dois aspectos das ações,
são distinguidos aqui, e elas devem ser entendidas como simultâneas: a formação do corpo, e a
doação de vida para ele. São João Damasceno nota: “O corpo e a alma foram formados ao mes-
mo tempo, não um antes e o outro depois, como os delírios de Orígenes consideravam” (Exact
Exposition, livro 2, cap. 12 “On man”). De acordo com a descrição do livro da Gênesis, Deus
criou o corpo do homem de já existentes elementos terrestres, e Ele o criou de um modo muito
especial: não por seu comando ou palavra somente, como foi feito na criação de outras criaturas,
mas por sua ação direta. Isso mostra que o homem, mesmo em sua organização corporal, é um
ser que ultrapassa todas as outras criaturas desde o começo de sua existência. Além disso, é dito
que Deus soprou em sua face o sopro da vida e que o homem tornou-se alma vivente. Como al-
guém que recebeu o sopro da vida, nessa expressão figurativa, da boa do próprio Deus, o homem
é então uma união viva e orgânica do terreno com o celeste, do material com o espiritual.
4. Daí recorre a visão exaltada do corpo humano como é mostrada geralmente na Sagrada
Escritura a visão exaltada do corpo humano como é mostrada geralmente na Sagrada Escritura.
O corpo deve servir como companheiro, órgão e mesmo companheiro trabalhador da alma. De-
pende da alma rebaixar-se tanto que se transforme numa escrava do corpo, ou, sendo guiada por
um espírito iluminado, tornar o corpo seu obediente executor e companheiro trabalhador. Depen-
dendo da alma, o corpo pode ser um vaso de impureza pecaminosa e loucura ou transformar-se
num templo de Deus, participando com a alma na glorificação de Deus. Isso é ensinado na Sa-
grada Escritura (Rom 13:14; Gl 3:3; 1 Co 9:27; Gl 5:24; Jo 7-9; 1 Co 3:16-17; 1 Co 6:20). Mes-
mo com a morte do corpo, a ligação da alma com o corpo não é cortada para sempre. Virá o tem-
po quando os corpos dos homens se levantarão numa forma renovada e serão unidos de novo
com suas almas, agora para sempre, para tomar parte em eterna benção ou tormento, correspon-
dendo às boas ou más obras realizadas pelos homens com a participação do corpo no curso da
vida terrena (2 Co 5:10).
Uma visão ainda mais exaltada é instilada em nós pela palavra de Deus com respeito à
natureza da alma. Na criação da alma Deus não tomou nada da terra, mas concedeu-a ao homem
somente pelo Seu próprio sopro criativo. Isso mostra claramente que, na concepção da palavra de
Deus, a alma humana é uma essência completamente separada do corpo e de todo material e
compostos de elementos, tendo uma natureza não terrena, mas acima do mundo, celeste. A ele-
vada proeminência da alma do homem, comparada com tudo que é terreno foi expressa pelo Se-

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nhor Jesus Cristo nas palavras: “Pois que aproveita ao homem ganhar o mundo inteiro, se perder
a sua alma? Ou que dará o homem em recompensa da sua alma?” (Mt 16:26). O Senhor instrui
seus discípulos : “E não temais o que matam o corpo, e não podem matar a alma” (Mt 10:28).
A respeito da exaltada dignidade da alma, São Gregório, o Teólogo se expressa assim: “A
alma é o sopro de Deus, e sendo celeste, ele suporta ser misturada com aquilo que é do pó. É
uma luz fechada numa caverna, mas ainda é divina e inextinguível... O Verbo falou, e tendo to-
mado uma parte da terra recém-criada, com Suas mãos imortais firmou minha imagem e conce-
deu a ela a Sua vida; porque Ele mandou para ela o espírito, que é um raio da invisível divinda-
de” (Homilia 7, “On the Soul”)
Apesar disso, não se pode tornar tais exaltadas expressões figurativas dos Santos Padres
em base para ensinar que a alma é “divina” no sentido completo da palavra, e que consequente-
mente, ela teve uma existência eterna própria antes de sua encarnação num homem terreno em
Adão! (essa visão é encontrada nas correntes teológicas-filosóficas contemporâneas que seguem
V. S. Socoviev). O posicionamento correto de que a alma é de origem celeste não significa que
ela é divina em essência. “Ele soprou o fôlego da vida” (Ge 2:7) é uma expressão antropomórfi-
ca, e não há base para se entende-la como significando que Ele deu alguma coisa de Sua substân-
cia divina. Lembremo-nos que o respirar do homem não é um “expirar” elementos da própria
natureza humana, nem mesmo de sua essência física. Da mesma forma da expressão Bíblica não
se pode tirar a conclusão de que a alma procede da Essência de Deus nem que é um elemento da
Divindade. Crisostomo escreve: “Certos insensatos, sendo levados por suas próprias concepções,
sem pensar em nada de um modo que se ajuste à maneira de Deus, e sem prestar qualquer aten-
ção à adaptação das expressões (das Escrituras), ousam dizer que a alma procedeu da Essência de
Deus. Ó frenesi! Ó loucura! Quantos caminhos de perdição o demônio abriu para aqueles que
querem servi-lo! Para se entender isso, contemplem os caminhos opostos pelos quais vão essas
pessoas: algumas, centram na frase, “Ele soprou,” dizem que as almas procedem da Essência de
Deus; outros, ao contrário, afirmam que as almas são convertidas na Essência das mais baixas
criaturas irracionais. O que pode ser pior do que tal loucura?” (comentário sobre o livro da Gêne-
sis).
Que São Gregório, o Teólogo falou da divindade da alma não no estrito senso da palavra
é evidente em outra Homilia sua: “A natureza de Deus e a natureza do homem não são idênticas;
ou para falar mais genericamente, a natureza do divino e a natureza do terreno não são idênticas.
Na natureza divina, tanto a existência em si quanto tudo nela que tem existência são imutáveis e
imortais; pois naquilo que é constante; tudo é constante. Mas o que é verdade na nossa natureza?
Ela flui, é corrupta, e sofre mudança após mudança” (Homilia 19 “On Julian).
Nós já falamos no capítulo sobre os Atributos de Deus (sobre Deus como espírito) das
questões sobre como se deve entender expressões antropomórficas acerca de Deus. Citemos aqui
só o argumento do Bem Aventurado Teodoreto: “Quando ouvimos no relato de Moisés que Deus
tomou pó da terra e formou o homem, e quando nós procuramos o significado dessa frase, nós
nela descobrimos uma especial boa disposição de Deus para com a raça humana. O grande Profe-
ta nota, em sua descrição da criação, que Deus criou todas as outras criaturas por Sua palavra,
enquanto o homem foi criado por suas próprias mãos. Mas assim como nós entendemos pela “pa-
lavra” não um comando, mas só a vontade, assim também na formação do corpo, (nós devería-
mos entender) não a ação das mãos, mas a grande atenção para com esse trabalho. Pois do mes-
mo modo que agora, por Sua vontade, o fruto é gerado num ventre materno, e a natureza segue
as leis que Ele lhe deu desde o início — assim também então, por Sua vontade foi formado o
corpo humano da terra e pó virou carne.” Em outra passagem o Bem Aventurado Teodoreto ex-

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pressa de modo geral: “Nós não dizemos que a divindade tem mãos ... mas nós afirmamos que
cada uma nessas expressões indica um muito maior cuidado da parte de Deus para com o ho-
mem, do que para as outras criaturas” (citado em Dogmatic Theology do Metropolitan Macarius,
vol I, p. 430-431).

A alma como uma substância independente.


Os antigos Padres e professores da Igreja, seguindo estritamente a Sagrada Escritura no
ensinamento sobre a independência da alma e seu valor nela própria, explicaram e revelaram a
distinção da alma e do corpo para refutar a opinião materialista que a alma é só uma expressão da
harmonia dos membros do corpo, ou é o resultado da atividade física do corpo, e que ela não tem
sua própria substância ou natureza particular. Apelando para a simples observação, os Padres da
Igreja mostram:
a) que é característico da alma governar as lutas do corpo, e característica do corpo acei-
tar a essa governança. (Atenagoras e outros).
b) que o corpo é, como foi, uma ferramenta ou instrumento de um artista, enquanto a al-
ma é a artista (Sts Irineu, Gregório de Nissa, Cirilo de Jerusalém e outros).
c) que a alma não é incondicionalmente sujeita aos impulsos do corpo; ela é mesmo capas
de entrar em guerra com os esforços do corpo como com alguma coisa estranha e hostil a ela, e é
capaz de ganhar uma vitória sobre o corpo, mostrando assim que ela não é a mesma coisa que ele
mas é uma essência invisível, é de natureza diferente, superando toda natureza corpórea (Oríge-
nes).
d) que ela é intangível e intocável, e não é nem sangue, nem ar, nem fogo mas um princí-
pio auto-movente (Lactantius).
e) que a alma é um poder que pões todos os membros do organismo em completa harmo-
nia e total unidade (Sts Atanásio o Grande, e Basílio o Grande).
f) que a alma possui razão, auto-consciência, e livre arbítrio. (Orígenes e outros).
g) que o homem, enquanto está em seu corpo na terra, mentalmente pensa naquilo que é
celeste e o contempla; sendo mortal em seu corpo, ele raciocina sobre imortalidade e freqüente-
mente, sem amor pela virtude, ele traz para si mesmo sofrimento e morte; tendo um corpo que é
temporal, com sua mente ele contempla o eterno e luta por ele, desprezando aquilo que está sob
seus pés. O corpo nunca imaginaria tais coisas (Santo Atanásio, o Grande).
h) que falando na verdadeira natureza da alma, os Padres e professores da Igreja apontam
para a simplicidade e imaterialidade da alma, como opostas à complexidade e crueza material do
corpo; eles indicam a sua invisibilidade e completa ausência de forma, e em geral para o fato de
que ela não está sujeita a nenhuma medição (espaço, peso, etc) a que o corpo está sujeito (Oríge-
nes e outros).
Com relação ao fato que as condições do corpo são refletidas nas atividades da alma, e
que essas condições podem enfraquecer ou até corromper a alma — por exemplo durante doen-
ças, idade avançada, ou bebedeira — os Padres da Igreja freqüentemente comparam o corpo a
um instrumento usado em pilotagem. Os diferentes graus das manifestações da alma no corpo
testemunham só a instabilidade do instrumento — o corpo. Essas condições do corpo que são
desfavoráveis para a manifestação da alma podem ser comparadas a uma súbita tempestade no
mar que impede o piloto de manifestar sua arte mas não prova que ele está ausente. Um outro
exemplo, pode-se pegar uma harpa desafinada, da qual nem o melhor musicista pode tirar sons
harmônicos (Lactantius). Assim também, cavalos fracos não dão oportunidade para um cavaleiro
demonstrar suas habilidades (Bem Aventurado Teodoreto).

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Certos Padres antigos (Stos. Ambrósio, Papa Gregório o Grande, João Damasceno), en-
quanto reconhecendo a espiritualidade da alma como distinta da do corpo, ao mesmo tempo atri-
buem uma certa materialidade ou corporalidade comparativa, à alma. Por esse suposto atributo
da alma eles tem em mente distinguir a espiritualidade da alma humana, assim como dos anjos,
da mais puríssima espiritualidade de Deus, em comparação com a qual tudo parece ser material e
cru.

A origem das almas.


Como a alma de cada homem se origina não é completamente revelada na palavra de
Deus; é “um mistério conhecido só por Deus” (São Cirilo de Alexandria), e a Igreja não nos dá
um ensinamento estritamente definido sobre esse assunto. Ela decididamente rejeita a visão de
Orígenes, que foi herdada da filosofia de Platão, a respeito da pré-existência das almas e segundo
tal teoria as almas vêm para a terra de um mundo mais elevado. Esse ensinamento de Orígenes e
os Origenistas foram condenado pelo Quinto Concílio Ecumênico.
No entanto, esse decreto conciliar não estabelece se a alma é criada das almas dos pais de
um homem e só nesse sentido geral constitui uma nova criação de Deus, ou se cada alma é criada
imediatamente e separada por Deus, sendo juntada em um momento definido ao corpo que está
sendo ou já foi formado. Na visão de certos Padres da Igreja (Clemente de Alexandria, João Cri-
sostomo, Efrém o Sírio, Teodoreto), cada alma é criada separadamente por Deus, e algumas ve-
zes se referem à união delas com o corpo como ocorrendo no quadragésimo dia da formação des-
te (a teologia católico-romana é decididamente inclinada à visão de que cada alma é criada sepa-
radamente; essa visão tem sido apresentada dogmaticamente em várias bulas papais, e o Papa
Alexandre VII ligou com essa visão da Imaculada Concepção da Santíssima Virgem Maria).
Na visão de outros professores e Padres da Igreja (Tertuliano, Gregório o Teólogo, Gre-
gório de Nissa, Macarius o Grande, Anastácio o Presbítero), alma e corpo recebem seu início si-
multaneamente e amadurecem juntos; a alma procede das almas dos pais assim como o corpo
procede dos corpos dos pais. Dessa forma a “criação” é entendida aqui num sentido amplo como
a participação do poder criativo de deus que está presente e é essencial em todo lugar, para todo
tipo de vida. A base dessa visão é o fato que na pessoa do nosso antepassado Adão, Deus criou a
raça humana: “ E de um só fez toda a geração dos homens” (At 17:28). Disso segue que em A-
dão a alma e o corpo de cada homem foram dados potencialmente. Mas o decreto de Deus é tra-
zido à realidade de modo tal que Deus segura toda as coisas em Sua mão: “... pois Ele mesmo é
quem dá a todos a vida, e a respiração, e todas as coisas” (At 17:25). Deus, tendo criado, “conti-
nua a criar.”
São Gregório, o Teólogo diz: “Assim como o corpo, que foi originalmente formado em
nós do pó, tornou-se subseqüentemente a corrente dos corpos humanos e não foi cortado da raiz
primeiro-formada, em um homem incluindo outros — assim também a alma tendo sido soprada
por Deus, desde aquele tempo vem junto na composição formada pelo homem, nascido há pou-
co, e o da semente original (São Gregório evidentemente se refere aqui a semente espiritual) sen-
do atribuída a muitos e sempre preservando uma forma constante em membros mortais... Assim
como o sopro em uma flauta musical produz sons dependendo da largura da flauta, assim a alma,
aparecendo sem força em um corpo enfermo, torna-se manifesta conforme o corpo ganha forças
e reveza então toda sua inteligência” (Homilia 7, “On the Soul”). São Gregório de Nissa tinha e
mesma visão.
Em seu diário, São João de Kronstadt tem essa observação: “O que são as almas huma-
nas? Ela são uma e a mesma alma, um e o mesmo sopro de Deus, que Deus soprou em Adão, que

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de Adão até agora está disseminado em toda raça humana. Por isso todos os homens são o mes-
mo como só um homem, ou uma árvore da humanidade. Disso decorre o mais natural manda-
mento baseado na unidade de nossa natureza: “Amarás o Senhor teu Deus (Teu protótipo, Teu
Pai)de todo coração, e de toda a tua alma, e de todas as tuas forças, e de todo o teu entendimento,
e ao teu próximo (pois quem é mais próximo a mim do que um homem que é como eu e do
mesmo sangue que eu?) como a ti mesmo” (Lc 10:27). Há uma necessidade natural de cumprir
esse mandamento (My Life in Christ).

A imortalidade da alma.
A fé na imortalidade da alma é inseparável da religião em geral, e ainda mais, compreen-
de um dos objetos fundamentais da Fé Cristã.
Essa idéia também não é estranha ao Velho Testamento. Ela é expressa nas palavras do
livro Eclesiastes: “E o pó volte à terra, como era e o espírito volte a Deus, que O deu” (Ec 12:7).
O relato completo nos segundos e terceiros capítulos da Gênesis — das palavras de alerta de
Deus: “Mas da árvore da ciência do conhecimento do bem e do mal, dela não comerás; porque
no dia em que dela comeres, certamente morrerás” (Ge 2:17) — e a resposta para a questão da
aparência de morte no mundo, e assim mesmo é em si uma expressão da idéia de imortalidade. A
idéia de que o homem foi pré ordenado à imortalidade, que imortalidade é possível, é contida nas
palavras de Eva: “Do fruto da árvore que está no meio do jardim, disse Deus: Não comereis dele,
nem nele tocareis, para que não morrais” (Ge 3:3). O mesmo pensamento é expresso pelo Sal-
mista nas palavras do Senhor: “Eu disse: Vós sois deuses, e vós outros sois todos filhos do Altís-
simo. Todavia, como homens morrereis e caireis como qualquer dos príncipes” (Sl 82:6-7).
Deve-se enfatizar o fato de que a idéia de imortalidade está presente sem nenhuma dúvida
no Velho Testamento, porque existe uma opinião de que os Judeus não tinham fé na imortalidade
da alma! Nos relatos de Moisés existem indicações de Fé na imortalidade da alma. A respeito de
Enoch, Moisés remarca que “não se viu mais; porquanto Deus para si o tomou” — isto é, ele foi
para Deus sem passar pela morte (Ge 5:24). Das expressões bíblicas referentes as mortes de A-
brahão (Ge 25:8), Aarão e Moisés (Dt 32:50), “e se recolheu a seus povos,” é ilógico entender-se
que isso significa que eles foram postos no mesmo túmulo ou lugar, ou ainda na mesma terra on-
de estava seu povo, porque cada um desses justos do Velho Testamento morreu não na terra dos
seus ancestrais mas em novos territórios de seus reassentamentos (Abrahão) ou de suas viagens
(Aarão e Moisés). O Patriarca Jacó, tendo recebido notícias que o seu filho tinha sido feito em
pedaços por bestas feras, diz: “... com choro hei de descer ao meu filho até a sepultura...” (Ge
37:35 Septuaginta). “Sepultura” aqui significa claramente não o túmulo mas o ligar onde as al-
mas moram. Essa condição da alma após a morte foi expressa no Velho Testamento como uma
descida ao mundo inferior; isto é, uma condição triste onde até a oração do senhor não é ouvida.
Isso é expresso em numerosas passagens no livro de Jó e nos Salmos.
Mas já no Velho Testamento, especialmente quando a chegada do Salvador se aproxima,
e ouvindo a esperança de que a alma dos homens justos venham a escapar dessa condição triste.
Por exemplo, na Sabedoria de Salomão nós encontramos: “As almas dos justos estão na mão de
Deus, e nenhum tormento neles tocará...Os justos vivem para sempre, e sua recompensa é com o
Senhor” (3:2 ; 5:15). A esperança da futura libertação do Hades, das almas dos justos é expressa
nas palavras do Salmista: “... a minha carne repousará segura. Pois não deixarás minha alma no
inferno, nem permitirás que Teu santo veja corrupção” (Sl 16:9 e 10; ver também Sl 49:15).
O Senhor Jesus Cristo com freqüência aponta para a imortalidade da alma como a base de
uma vida piedosa, e Ele acusa os Saduceus, que negavam a imortalidade. Em Sua conversa de

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despedida com Seus discípulos o Senhor conta a eles que Ele estava indo preparar um local para
eles para que eles pudessem estar onde Ele próprio estaria (Jo 14:2-3). E para o bom ladrão Ele
disse: “Em verdade te digo que hoje estarás comigo no Paraíso” (Lc 23:43).
No Novo Testamento, falando-se genericamente, a verdade da imortalidade da alma é o
objeto de uma completa revelação, constituindo-se numa das partes fundamentais da Fé Cristã.
Essa verdade inspira um Cristão, enchendo sua alma com a jubilosa esperança de vida eterna no
Reino do Filho de Deus. São Paulo escreve: “...para mim o morrer é ganho ... tendo o desejo de
partir, e estar com Cristo...” (Fp 1:21 e 23). Porque sabemos que, se a nossa casa terrestre deste
tabernáculo se desfizer, temos de Deus um edifício, uma casa não feita por mãos, eterna, nos
céus. E por isso também gememos, desejando ser revestidos da nossa habitação, que é do céu” (2
Co 5:1-2).
Nem é necessário dizer que os Santos Padres e professores da igreja pregaram unânimes a
imortalidade da alma somente com a seguinte distinção: alguns reconheciam ser a alma imortal
por natureza, enquanto outros — a maioria — diziam ser a alma imortal por graça de Deus.
“Deus quer que a alma viva” (São Justino, o Mártir); “a alma é imortal pela graça de Deus que a
fez imortal” (São Cirilo de Jerusalém e outros). Os Santos Padres enfatizam assim a diferença
entre a imortalidade do homem e a imortalidade de Deus, que é imortal pela Essência de sua na-
tureza sendo por isso “Aquele que tem Ele só a imortalidade” de acordo com as Escrituras (1 Tm
6:16).
A observação mostra que a fé na imortalidade da alma sempre foi intrinsecamente ligada
na fé em Deus, em tal extensão que o grau da primeira é determinado pelo grau da última. Mais
viva, a fé em Deus, mais firme e sem dúvidas é a fé na imortalidade da alma. E, ao contrário
mais fraca sem em vida a fé em Deus, maiores são as ondas de dúvidas que se levantam contra a
verdade da imortalidade da alma. Alguém que perdeu ou abafou completamente a fé em Deus
usualmente cessa de acreditar na imortalidade da alma ou na vida futura. Isso é facilmente com-
preendido. Um homem recebe o poder da fé da própria fonte de vida, e se ele conta sua ligação
com essa fonte, ele perde esse fluxo de poder vivo, Ai nenhuma prova racional ou persuasão será
capaz de enfiar o poder da fé nele.
Pode-se também concluir o oposto. Nas confissões e visões do mundo — ainda que sejam
Cristãs — onde o poder da fé na existência ativa da alma além do túmulo ficou ofuscada, onde
não há orações em lembrança dos mortos, a própria fé Cristã está em condição de declínio. Al-
guém que acredita em deus e reconhece o amor de Deus não pode se permitir o pensamento que
o seu Pai celestial queria cortar completamente sua vida e priva-lo da ligação com Ele, como
uma criança que ama sua mãe e é amada por ela, por sua vez, não acredita que a mãe não queira
que ela, a criança, tenha vida.
Pode-se certamente dizer que na Igreja Ortodoxa Oriental a aceitação da imortalidade da
alma ocupa um lugar central no sistema de ensinamento e na vida da igreja. O espírito do Typi-
con da Igreja, o livro que contem os Ofícios Divinos e as orações separadas suporta inteiramente
e anima nos fiéis essa consciência, essa crença na vida além-túmulo para as almas de nossos pró-
ximos que morreram, assim como na nossa imortalidade pessoal. Essa crença espalha um raio de
luz no trabalho na vida inteira de um Cristão Ortodoxo.

Alma e espírito.
O princípio espiritual no homem que é oposto ao corpo é designado na Sagrada Escritura
por dois termos que são quase iguais em significados: “espírito” e “alma.” O uso da palavra “es-
pírito” em lugar de “alma,” ou ambos os termos usados com exatamente o mesmo significado é

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encontrado especialmente no Apóstolo Paulo. Isso é tornado evidente, por exemplo, colocando-
se lado a lado os dois textos seguintes: “glorificai pois a Deus no vosso corpo e no vosso espírito,
os quais pertencem a Deus” (1 Co 6:20); e “...purifiquemo-nos de toda imundície da carne e do
espírito” (2 Co 7:1).
Além dessas, existem duas passagens nos escritos desse Apóstolo onde alma e espírito
são mencionados lado a lado, e isso cria a oportunidade de se perguntar: Não estaria o Apóstolo
indicando que, além da alma, existe também um “espírito” que é uma parte essencial da natureza
humana? Da mesma forma, nos escritos de certos Santos Padres particularmente nos escritos as-
céticos, é feita uma distinção entre alma e espírito. A primeira passagem no Apóstolo Paulo é na
Epístola aos Hebreus: “Porque a palavra de deus é viva e eficaz, e mais penetrante do que espada
alguma de dois gumes, e penetra até a divisão da alma e do espírito, e das juntas e medulas, e é
apta para discernir os pensamentos e intenções do coração” (Hb 4:12). Outra passagem do mes-
mo Apóstolo está na Epístola aos Tessalonissensses: “e todo o vosso espírito, e alma e corpo,
sejam plenamente conservados irrepreensíveis para a vinda de Nosso Senhor Jesus Cristo” (1 Ts
5:23). Não é difícil, no entanto, ver que na primeira passagem o espírito é para ser entendido não
como uma substancia que é separada e independente da alma, mas só como um lado mais interno
e escondido da alma. Aqui a relação da alma e do espírito é feita paralela à relação entre os
membros do corpo e cérebro, e assim como o cérebro é a parte interna da natureza corporal, ou é
um conteúdo quando comparado com seu conteúdo, assim também o espírito é evidentemente
considerado pelo Apóstolo como a parte escondida da alma do homem.
Na segunda passagem por “espírito” é evidentemente significada aquela especial alta
harmonia da parte escondida da alma que é formada pela graça do Espírito Santo em um Cristão:
o “espírito” no qual o Apóstolo fala em outro lugar: “Não extingais o Espírito” (1 Ts 5:19); e
“...fervorosos no espírito” (Rom 12:11). Assim, o Apóstolo não está pensando aqui em todos os
homens em geral, mas só nos Cristãos. Nesse sentido o Apóstolo contrasta o homem “espiritual”
com o homem “natural” ou carnal (1 Co 2:14-15). O homem espiritual possui uma alma, mas
sendo renascido, ele cultiva em si as sementes da graça; ele cresce e gera frutos no espírito. No
entanto, por falta de cuidados com sua vida espiritual ele pode descer ao nível do homem natural
ou carnal: “Sois vos tão insensatos que, tendo começado pelo Espírito, acabeis agora pela car-
ne?” (Ga 3:3). Por isso, não há terreno para supor que o pensamento do Apóstolo Paulo não este-
ja de acordo com o ensinamento que a natureza do homem consiste em duas partes.
Essa mesma do espírito como a mais alta e dada por graça forma de vida da alma humana
é evidentemente o que é significado pelos Padres e professores da Igreja nos primeiros séculos
que distinguiram no homem um espírito assim como uma alma. Essa distinção é encontrada em
São Justino, o Mártir, Tatiano, Irineu, Tertuliano, Clemente de Alexandria, Gregório de Nissa,
Efrém o Sírio, e da mesma forma em escritores e ascetas posteriores. Porém, uma maioria signi-
ficativa dos Padres e professores da Igreja reconhecem diretamente que natureza do homem tem
duas partes: corpo e alma (Santos Cirilo de Jerusalém, Basílio o Grande, Gregório o Teólogo,
João Crisostomo, Bem Aventurado Agostinho, João Damasceno). Bem Aventurado Teodoreto
escreve: “De acordo com o ensinamento de Apolinário (o Herético) existem três partes no ho-
mem: o corpo, a alma animal, e a alma racional, que ele chama de mente. Mas a Escritura aceita
só uma alma, não duas, e isso é claramente indicado pela história da criação do primeiro homem.
Deus, tendo formado o corpo do pó e soprado uma alma nele, mostrou que há duas naturezas no
homem, e não três.”

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A imagem de Deus no homem.


O escritor sagrado do relato da criação do homem diz: “E disse Deus: Façamos o homem
à nossa imagem, conforme à vossa semelhança ... E criou Deus o homem à sua imagem; à ima-
gem de Deus o criou; macho e fêmea os criou” (Ge 1:26-27).
No que consiste a imagem de deus em nós? O ensinamento da Igreja nos conta somente
que no geral o homem foi criado “à imagem,” mas precisamente que parte de nossa natureza ma-
nifesta essa imagem não é indicada. Os Padres e professores da igreja responderam essa questão
de várias maneiras: alguns vêem a imagem na razão, outros no livre arbítrio, ainda outros na i-
mortalidade. Se juntarmos essas idéias, obtemos uma concepção completa do que a imagem de
Deus no homem é, de acordo com o ensinamento dos Santos Padres.
Antes de tudo, a imagem de Deus deve ser vista só na alma, não no corpo. De acordo
com Sua natureza, deus é o mais puro Espírito, não vestido com qualquer tipo de corpo e não
participante de qualquer tipo de materialidade. Assim a imagem de deus só pode-se referir à alma
imaterial — muitos Padres da Igreja consideraram necessário dar esse alerta.
O homem carrega a imagem de deus nas mais elevadas qualidades da alma, especialmen-
te na imortalidade dela, no seu livre arbítrio, sua razão e em sua capacidade de um amor puro
sem pensamento de ganho.
a. O Deus deu imortalidade à alma do homem, ainda que alma seja imortal não por natu-
reza, mas somente pela bondade de Deus.
b. Deus é completamente livre em Suas ações, e Ele deu aos homens livre arbítrio e a ha-
bilidade de agir livremente dentro de certos limites.
c. Deus é sapientíssimo, e Ele deu ao homem a razão que é capaz de não ser limitada às
coisas terrenas, necessidades animais e ao lado visível das coisas, mas também ser capaz de pe-
netrar nas profundezas das coisas, e reconhecer e explicar seu significado interior. A razão do
homem é capaz de subir ao nível daquilo que é invisível e de se esforçar em pensamento para a
verdadeira Fonte de tudo que existe — Deus. A razão do homem torna sua vontade consciente e
autenticamente livre, por que ela pode escolher aquilo que corresponde a mais alta dignidade do
homem ao invés daquilo para o quando sua natureza inferior o inclina.
d. Deus criou o homem em Sua bondade e Ele nunca deixou nem nunca o deixará sem
Seu amor. O homem, recebendo sua alma do sopro de Deus, esforça-se para a direção do seu
primeiro Princípio, Deus, como para a direção de algo similar a ele, procurando e sentindo sede
pela união com Ele. Isso é especificadamente mostrado na postura reta e em pé do seu corpo, e
seu olhar, que se volta para o céu. Assim, esse esforço para e o amor por Deus expressa a ima-
gem de Deus no homem.

Em resumo, pode-se dizer que todas as qualidades e capacidades boas e nobres da alma são uma
expressão da imagem de Deus no homem.
Existe uma distinção entre a “imagem” e a “semelhança” de Deus? A maioria dos Santos
Padres e professores da Igreja respondem que existe. Eles vêem a imagem de Deus na natureza
da alma, e a semelhança no aperfeiçoamento moral do homem em virtude e santidade, na aquisi-
ção dos dons do Espírito Santo. Consequentemente, os recebemos a imagem de Deus de Deus
junto com a existência, mas a semelhança nós devemos adquirir nós mesmos, tendo recebido a
possibilidade de fazer isso, de Deus.
Tornar-se “semelhante” depende de nossa vontade; e adquirida conforme nossa própria
atividade. Por isso, a respeito do “conselho de Deus” é dito: “Façamos o homem à Nossa ima-

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gem, conforme a Nossa semelhança” (Ge 1:26). Mas a respeito do ato da criação em si é dito:
“Por “conselho” de Deus, nos foi dado o potencial de ser “à sua semelhança.”“

O propósito do homem.
Tendo elevado o homem acima do mundo terreno, tendo dado a ele razão e liberdade,
tendo o adornado com sua própria imagem, o Criador assim indica ao homem o seu especialmen-
te alto propósito. Deus e o mundo espiritual estão diante do olhar espiritual do homem; diante do
seu olhar corporal está o mundo material.
a. O primeiro propósito do homem é a glória de Deus. O homem é chamado a permanecer
fiel a sua ligação com Deus, a esforçar-se para a direção dele, a reconhece-lo como seu Criador,
a glorifica-lo, a rejubilar-se em união com Ele, a viver Nele. “Ele os enchei de conhecimento e
compreensão,” diz o mais sábio filho de Sirac com respeito aos dons que Deus deu para o ho-
mem. “Ele pôs Seu olho em seus corações para mostrar a eles a majestade de Suas obras” (Sirach
17:6-10). Pois se a toda a criação é chamada, de acordo com suas habilidades, a glorificar o Cri-
ador (como é colocado por exemplo no Salmo 148), então logicamente o homem, como a coroa
da criação, é o mais capacitado a ser consciente, racional, constante e o mais perfeito instrumento
de Deus na terra.
b. Para esse propósito, o homem deveria ser digno de seu Protótipo. Em outras palavras,
ele é chamado a se aperfeiçoar, a aguardar sua semelhança com Deus, a restaura-la e reforça-la.
Ele é chamado a desenvolver e aperfeiçoar seus problemas morais por meio de boas obras. Isso
requer que o homem tome conta de sua própria bondade, e sua verdadeira bondade está na ben-
ção de Deus. Por essa razão deve-se dizer que a benção de Deus é o objetivo da existência de
Deus.
c. O Olhar físico imediato do homem é dirigido para o mundo. O homem foi colocado
como a coroa da criação terrena e o rei da natureza, como é mostrado no primeiro capítulo do
livro da Gênesis. De que maneira isso deveria ser manifestado? O Metropolita Macário fala isso
em sua Orthodox Dogmatic Theology: “Como a imagem de Deus, o filho e herdeiro na casa do
Pai Celestial, o homem foi colocado como uma espécie de intermediário entre o Criador e a cria-
ção terrena: em particular ele foi predeterminado a ser um profeta para essa criação proclamando
a vontade de Deus no mundo em palavras e obras; é para ser o sacerdote chefe, de maneira a ofe-
recer um sacrifício em louvor e agradecimento a Deus em nome de todos os nascidos na terra,
trazendo assim para a terra as bênçãos dos céus; ele é a cabeça e o rei de modo que concentrando
os objetivos de todas as criaturas visíveis existentes em si, ele possa através de si unir todas as
coisas com Deus, e assim manter a cadeia toda das criaturas terrenas em uma harmoniosa ligação
e ordem.”
Assim foi criado o primeiro homem, capaz de atingir seu propósito e fazer isso livremente,
voluntariamente, em júbilo, de acordo com a atração de sua alma, e não por compulsão. A idéia
da posição soberana do homem na terra faz o Salmista louvar o Criador, extasiado: “Ó, Senhor,
Senhor nosso, quão admirável é o Teu Nome em toda a terra, pois puseste a Tua glória sobre os
céus... Quando vejo os Teus céus, obras dos Teus dedos, a lua e as estrelas que preparaste: Que é
o homem mortal para que te lembres dele? E o filho do homem, para que O visites? Contudo,
pouco menor o fizeste do que os anjos, e de glória e de honra O coroaste. Fazes com que ele te-
nha domínio sobre as obras das Tuas mãos... Ó Senhor, Senhor nosso, quão admirável é o Teu
nome sobre toda a terra!” (Sl 8:15).

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Da criação à majestade do Criador.


O Apóstolo instrui, ..”as suas coisas invisíveis, desde a criação do mundo... claramente se
vêem... tanto o Seu divino poder quanto a Sua divindade” (Ro 1:20). Isto é, as coisas invisíveis
de Deus são vistas pela contemplação da criação. Em tosas as épocas da humanidade, as melho-
res mentes, refletindo profundamente sobre o mundo pararam atônitas diante da majestade, har-
monia e racionalidade da ordem do mundo, e foram elevadas disso para pensamentos reverentes
sobre a bondade, majestade e sabedoria do Criador. São Basílio, o Grande, em suas homilias so-
bre os seis dias (Hexaemeron), examina as primeiras palavras do livro da Gênesis. “No princípio
Deus criou os céus e a terra” — então chama seus ouvintes: “Glorifiquemos o soberbo artista que
criou o mundo com sapiência e habilmente; e da beleza daquilo que é visível, compreendamos
aquele que ultrapassa tudo em beleza; da majestade desses corpos sensíveis e limitados tiremos a
conclusão em relação a Ele que é sem fim que ultrapassa toda majestade, e na multiplicidade de
Seus poderes ultrapassa todo entendimento.” E então, indo para a segunda homilia, como se esti-
vesse em pausa e sem esperança de penetrar mais profundamente nas profundezas da criação, ele
profere essas palavras: “Se a entrada do sagrado é assim, e a entrada do templo é tão louvável e
majestosa... então o que dizer do Santo dos santos? E quem é digno de entrar no lugar sagrado?
Quem dirigirá seu olhar para o que está escondido?”

4. A Providência de Deus.

A providência de Deus sobre o mundo.


“Meu Pai trabalha ate agora, e eu trabalho também” (Jo 5:17). Nessas palavras do Senhor
Jesus Cristo está contida a verdade do constante cuidado e da constante providência para com o
mundo. Apesar de Deus ter descansado no sétimo dia de todos os seus trabalhos (Ge 2:2-3), Ele
não abandonou o mundo. Deus “é quem a todos a vida, e a respiração, e todas as coisas ... Nele
vivemos, nos movemos e existimos” (At 17:25 e 28). O poder de Deus mantém o mundo em e-
xistência e participa de todos as atividades da vontade viva de Deus; por elas mesmas essas
“leis” seriam impotentes e não efetivas.
A Providência de Deus abarca tudo no mundo. Deus provê não só para o grande e imen-
so, mas também para o menos e aparentemente insignificante; não só sobre o céu e a terra anjos e
homens, mas também sobre as menores criaturas; pássaros, grama, flores, árvores. A Sagrada
Escritura toda é preenchida com a infatigável e providencial atividade de Deus.
Pela boa vontade de Deus o Universo se mantém e todo o imenso espaço do mundo Deus
enche os céus e a terra (Jer 23:24); “Escondes o teu rosto, e ficam perturbados” (Sl 104:29).
Pela Providência de Deus o mundo vegetal vive na terra: “Ele é que cobre o céu de nu-
vens, que prepara a chuva para a terra e que faz produzir erva sobre os montes: que dá aos ani-
mais o seu sustento” (Sl 147:8-9). Nem Ele deixa sem cuidados os lírios do campo, adornando-os
e a outras flores com uma beleza que nos deixa atônitos (Mt 6:29).
A Providência de Deus estende-se para todo reino animal: “os olhos de todos esperam em ti, e tu
lhes dás o seu mantimento a seu tempo, Abres a tua mão, e satisfaz os desejos de todos os viven-
tes” (Sl 14:15-16). Deus cuida até mesmo do menor passarinho: “... nem um deles cairá em terra
sem a vontade de nosso Pai” (Mt 10:29).
Porém e o homem que é esse objeto principal da Providência de Deus na terra. Deus co-
nhece os pensamentos de cada homem (Sc 139:2), seus sentimentos (Sl 7:9) e até os seus gemi-

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dos (Sl 38:9). Ele provê o que “é necessário mesmo antes que lhe percam” (Mt 6:32) e inclina
seus ouvidos à súplica daqueles que pedem (Sl 86:1), atendendo o que é pedido somente se a re-
quisição vem de uma fé sincera e viva (Mt 6:33). Deus dirige os passos do homem que não sabe
seu próprio caminho (Prov 20:24). Ele torna pobre e enriquece, Ele derruba e levanta, Ele causa
feridas e Ele mesmo as cura (Jó 5:18). Amando os justos. Ele poupa os pecadores também: “Não
repreenderá perpetuamente, vem para sempre conservará a Sua ira” (Sl 103:9). Ele é tolerante, de
modo que por meio de Sua benignidade ele conduz os pecadores ao arrependimento (Ro 2:4).
Essa abarcadora e incessante atividade de Deus no mundo é expressa no Símbolo da Fé quando
nós chamamos Deus de “Todo-Poderoso.”
Como para as aparentes injustiças da vida, quando nós vemos homens virtuosos sofrerem
enquanto os ímpios são prósperos, Crisóstomo nos exorta com as seguintes palavras: “Se o Reino
dos Céus está aberto para nós e uma recompensa nos é mostrada na vida futura, então não vale a
pena investigar porque os justos sofrem mágoas aqui enquanto os malignos vivem em conforto.
Se uma recompensa está esperando lá por todos de acordo com seus justos méritos, porque deve-
ríamos sermos perturbados pelos eventos presentes, se eles são afortunados ou desafortunados?
Por esses infortúnios Deus exercita aqueles que são submissos a Ele como resolutos guerreiros; e
os mais fracos, negligentes, e aqueles incapazes de suportar qualquer dificuldade, Ele exorta
mais à frente no tempo a realizar boas obras” (“To Stagirius the Ascetic,” homilia I, 8, em sua
Collected Works em russo, vol. I, Pt 1, p. 194). De fato nós mesmos com freqüência vemos que
as melhores experiências instrutivas e elevadoras são os infortúnios a que o homem é submetido.
Essencialmente, a Providência de Deus sobre o mundo é uma atividade incessante e inse-
parável, ainda que decido a nossas mentes limitadas recebamos essa atividade de Deus no mundo
variável e mutável sob diferentes formas e aparências. A atividade da Providência de Deus não é,
pode-se dizer, uma interferência no curso da vida dada ao mundo em sua criação; não é uma sé-
rie de intrusões privadas da vontade de Deus na vida do mundo. A vida do mundo está constan-
temente na mão direita de Deus; “O mundo não se manteria por um instante se Deus removesse
Sua Providência dele” (Bem Aventurado Agostinho). “O Todo—Poderoso e Santíssimo Verbo
do Pai, estando no meio de todas as coisas e manifestando Seus poderes por toda a parte, ilumi-
nando todas as coisas visíveis e invisíveis, abarca e contem tudo em si, de modo que nada é sem
a participação em Seus poderes; mas tudo em tudo, toda criatura separadamente e toda criatura
junta, Ele dá vida e preserva” (Santo Atanásio, o Grande, “Against Pagans,” cap. 42).
A esse respeito deve-se notar ainda que faz o homem para reverentemente atônito. É o
fato que, enquanto o Criador contem tudo em Sua mão direita, desde o primeiro dia da criação,
Ele deu a todos os seres orgânicos, até mesmo para o reino vegetal, uma liberdade de crescimen-
to e desenvolvimento, o uso de seus próprios poderes e do ambiente circundante, a cada um em
sua própria medida e de acordo com sua natureza e organização. Uma liberdade ainda maior o
Criador deu ao homem sua criação racional e moralmente responsável — a criação mais elevada
na terra. Com essa variedade de esforços — natural, instintivo, e no mundo racional também mo-
ralmente livre — a Providência de Deus vem junto de maneira que todos eles são mantidos em si
e dirigidos de acordo com o plano providencial. Todas as imperfeições, sofrimentos e doenças
que procedem dessa colisão de esforços separados do mundo, são corrigidas e curadas pela be-
nignidade de Deus. Essa benignidade acalma as hostilidade e dirige a vida do mundo todo para o
objetivo bom que foi para ele estabelecido lá me cima. Além disso, para as criaturas racionais de
Deus, essa benignidade abre caminho para a incessante glorificação de Deus.
Não importa quanto a humanidade viole seu propósito no mundo, não importa quanto ela
caia, não importa quanto a humanidade viole seu propósito no mundo, não importa quanto ela

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caia, não importa quanto a massa humana, conduzida por seus lideres malignos, esteja inclinada
a renunciar aos comandos de Deus, como vemos no tempo presente, a história do mundo ainda
assim culminará no objetivo estabelecido para ela pela Providência de Deus: o triunfo da justiça
de Deus em seguida ao qual haverá o Reino de Glória, quando “Deus será tudo em todos” (1 Co
15:28).
Contemplando a majestade, sabedoria e benignidade de Deus no mundo, o Apóstolo Pau-
lo clama: “Ó profundidade das riquezas, tanto da sabedoria, como da ciência de Deus! ... Porque
quem compreendeu o intento do Senhor? Ou quem foi seu conselheiro ou quem compreendeu o
intento do Senhor/ Ou quem foi seu conselheiro? Ou quem lhe deu primeiro a Ele, para que lhe
seja recompensado? Porque Dele e por Ele e para Ele, para que lhe seja recompensado? Porque
Dele e por Ele e para Ele, são todas as coisas, glória pois a Ele eternamente. Amém” (Rom
11:33-36).

A Providência de Deus sobre o homem antes da queda.


Tendo sido criado o homem, o Criador não deixou os primeiros criados sem Sua Provi-
dência. A graça de Deus habitou constantemente em nossos primeiros ancestrais e, na expressão
dos Santos Padres, serviu como uma espécie de roupa para eles. Eles tinham um prefeito senti-
mento de proximidade de Deus, o próprio Deus era seu primeiro Instrutor e Professor e concedeu
revelações imediatas a eles. Aparecendo para eles, Ele conversou com eles e revelou Sua vontade
para eles.
Os capítulos dois e três do livro da Gênesis pinta para nós a vida desse primeiro povo.
Deus colocou Adão e Eva no Paraíso, o Jardim do Éden, o “Paraíso de Delícias,” onde crescia
toda árvore que era agradável a vista e boa para comida, comandando que o mantivessem. O Jar-
dim do Éden era um lugar tão esplendido que as primeiras pessoas devem ter sido involuntaria-
mente elevadas para um sentimento de júbilo e suas mentes dirigidas para o mais perfeito artista
do mundo. O próprio trabalho deve ter facilitado o desenvolvimento tanto do poder físico quanto
do poder espiritual.
Como o escritor da Gênesis nos informa, Deus trouxe todas as características vivas para o
homem para que este lhes desse nome, É claro que de um lado isso deu ao homem a oportunida-
de de tomar conhecimento da saúde e variedade do reino animal, e do outro lado, facilitar o de-
senvolvimento de suas capacidades mentais dando-lhe um mais completo conhecimento próprio
por comparação com o mundo que pairava diante dos seus olhos, e uma consciência de sua real
superioridade sobre toda as outras criaturas da terra.
Compreensivelmente, a condição original das primeiras pessoas era de uma infantilidade
e simplicidade espiritual juntadas à pureza moral. Mas essa condição continha a oportunidade de
um desenvolvimento rápido e harmonioso e crescimento de todos os poderes do homem, dirigido
para uma semelhança com Deus e a mais íntima união com Ele!
A mente do homem era pura, brilhante e sadia. Mas ao mesmo tempo era uma mente li-
mitada e não testada pela experiência da vida, como foi revelado na hora da queda no pecado. A
mente do homem ainda tinha que ser desenvolvida e aperfeiçoada.
Moralmente, o primeiro homem era puro e inocente. As palavras :”E ambos estavam nus,
o homem e sua mulher; e não se envergonhavam” (Ge 2:25). Interpretadas por São João Damas-
ceno como “o pináculo da despaixão.” No entanto, pode-se compreender essa pureza nas primei-
ras pessoas como sendo que desde o inicio eles já possuíam todas as virtudes e não estavam ne-
cessitados de aperfeiçoamento. Não, Adão e Eva, apesar de terem vindo das mãos do Criador
puros e inocentes, ainda tinham que ser confirmados no bem, como expressa Santo Irineu, “tendo

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recebido existência, tinha que crescer e amadurecer tornando-se então forte, e, atingindo a matu-
ridade, tinha que crescer e amadurecer, tornando-se então forte, e, atingindo a maturidade plena
seria glorificado e, sendo glorificado, ser-lhe-ia concedido ver Deus.”
O homem veio das mãos do Criador sem faltas também no corpo, Seu corpo, tão notável
em sua organização, sem duvida recebeu nenhum erro ou defeito interno ou externo do Criador.
Ele possuía faculdades que elas eram frescas e não corrompidas. Ele não tinha em si a menor de-
sordem e estava apto a estar livre de doenças e sofrimentos. Na verdade, doenças e sofrimentos
são apresentados no livro da Gênesis como conseqüências da queda de nossos primeiros ances-
trais e como castigo para o pecado. Adicionalmente, o livro da Gênesis dá uma indicação mística
da Árvore da Vida cujo fruto estava acessível aos primeiros ancestrais antes da queda no pecado,
fruto esse que os preservaria na morte física. A morte não era uma necessidade para o homem:
“Deus criou o homem nem completamente mortal nem completamente imortal, mas capaz de ser
ou um ou outro” (Teófilo de Antioquia; ver em Bispo Sylvester, Na Essay in Orthodox Dogmatic
Tehology, vol 3, p. 379).
Mas não importa quão perfeito eram os poderes do homem, pois sendo uma criatura limi-
tada ele requeria mesmo assim um constante reforço na fonte de toda vida, de Deus, assim como
fazem todos os seres criados. Meios apropriados para o reforço do homem no caminho do bem
eram necessários. Assim um meio elementar foi o comanda para não comer do fruto da arvore do
conhecimento do bem e do mal. Esse foi um comando de obediência. Obediência livre é o cami-
nho para o avanço moral. Onde existe obediência voluntária existe (a) o corte do caminho para a
auto-estima, (b) respeito e confiança para aqueles que estão acima de nós, e (c) continência. A
obediência age beneficamente sobre a mente, humilhando o orgulho; sobre os sentimentos limi-
tando o amor-próprio; e sobre a vontade, dirigindo a liberdade do homem para o bem. A graça de
Deus coopera e reforça alguém nesse caminho. Esse era o caminho que estava diante das primei-
ras pessoas, nossos primeiros ancestrais.
“Deus fez o homem sem pecado e dotou-o de livre arbítrio. Por sem pecado eu não quero
dizer incapaz de pecar, pois só a divindade é incapaz de pecar, mas tendo a tendência tendo o
poder de perseverar e progredir no bem com a jura da graça divina, assim como tendo o poder de
afastar-se na virtude e cair no vício” (São João Damasceno, Exact Exposition, II, 12, tradução
inglesa, p. 235).
Em geral, é difícil, se não impossível para o homem contemporâneo imaginar a verdadei-
ra condição do homem no Paraíso, uma condição que punha junto pureza moral, claridade da
mente, a perfeição da primeira natureza criada, proximidade de Deus, com uma infantilidade es-
piritual geral.. Mas de qualquer maneira deve ser notado que as tradições de todos os povos fa-
lam precisamente de tal condição, que os poetas chama de “idade de ouro” da humanidade (a
tradição dos chineses, índios, persas, gregos e outros). As grandes mentes da antigüidade pagã
expressaram a certeza que os antigos eram mais puros que os homens que vieram depois (Sócra-
tes); que as mais antigas tradições religiosas e suas concepções eram mais perfeitas que as con-
cepções posteriores, porque os primeiros homens estavam mais perto de Deus e o conheciam
como seu Criador e Pai (Platão e Cícero).

5. A Respeito da Malignidade e do Pecado.


Malignidade e pecado no mundo, A queda do mundo angélico; Maus espíritos. A queda do ho-
mem no pecado. Porque a queda do homem no pecado foi possível? A história da queda no pe-
cado. O que foi o pecado ao comer o fruto? As conseqüências físicas da queda. Infortúnios e

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morte como castigo de Deus. A perda do Reino de Deus. Misericórdia de Deus para com os ho-
mens caídos.

Malignidade e pecado no mundo.

Malignidade e Infortúnio. “Mal,” em nosso uso ordinário de palavras, é o nome de dois tipos
de manifestação. Freqüentemente entendemos por essa palavra qualquer coisa em geral que evo-
ca infortúnio e causa sofrimento, Mas num sentido mais direto e preciso, o Mal é o nome para
manifestações negativas da ordem moral que procede da direção maligna da vontade e da viola-
ção das leis de Deus.
É claro que infortúnios no mundo físico — por exemplo, terremotos, tempestades, en-
chentes, avalanches e assim por diante — são em si nem bons nem maus. No sistema geral do
mundo eles são o que as sombras são para as cores brilhantes na arte dos pintores, o que sons
grosseiros são para sons suaves em musica, etc. Esse é o modo pelo qual Santos Padres como o
Bem Aventurado Agostinho e São Gregório tratam essas manifestações. Não se pode negar que
tais manifestações dos elementos são freqüentemente a causa de infortúnios e sofrimentos para
criaturas sensíveis e para o homem; mas só se pode inclinar em reverencia diante da sapiente or-
dem do mundo, onde o interminável, variado e mutuamente esforço de parte dos cegos poderes
elementares e as criaturas orgânicas, produzem colisões entre uns e as outras a todo momento,
mas estão em mutuo acordo e são postos em harmonia, tornando-se fonte de constante desenvol-
vimento e renovação do mundo.

Sofrimento e Pecado. Até um certo ponto, o lado desagradável, sombrio da vida humana paz
com que nós valorizamos e sintamos mais os lados jubilosos da vida. Mas a palavra de Deus nos
conta que sofrimentos físicos difíceis, angustias e aflições não podem ser reconhecidas como
manifestações que estão completamente de acordo com a lei e por isso, são normais; ao contrario
elas são um desvio normal. Os sofrimentos da raça humana começaram com o aparecimento da
moral maligno e são as conseqüências do pecado, que entraram na nossa vida naquele tempo.
Disto as primeiras paginas da Escritura testemunham “Multiplicarei grandemente a tua dor e a
tua conceição; com dor terá seus filhos” (palavras dirigidas a Eva depois da queda no pecado);
“Maldita é a terra por causa de ti; com dor comerás dela todos os dias de tua vida” (palavras ditas
a Adão; Ge 3:16-17). Sofrimentos são dados ao homem como meio de castigo, iluminação e cor-
rupção. De acordo com São Basílio, o Grande, sofrimentos e a própria morte “cortam o cresci-
mento do pecado.” Numerosos exemplos da consciência da ligação entre sofrimento e pecado
nos são dados pelas palavras de Deus: “Foi-me bom ter sido afligido, para que aprendesse os teus
estatutos” (Sl 149:71). A observação cuidadosa mostra que as causas de doenças e sofrimentos,
na grande maioria dos casos, são os próprios homens, que criaram condições artificiais e sub-
normais para sua existência, introduzindo uma cruel batalha mutua enquanto caçando seu próprio
e egoísta bem-estar físico; e as vezes essas coisas são o resultado de uma certa atitude demoníaca
— orgulho, vingança, malícia.
Como a palavra de Deus nos instrui, as conseqüências da moral malignas se espalham nas
pessoas para o mundo animal e para toda criação: “Pois sabemos que toda criação geme e está
juntamente com dores de parto até agora,” escreve o Apóstolo Paulo, e ainda explica: “Porque a
criação ficou sujeita à vaidade, não por sua vontade, mas por causa do que a sujeitar, na esperan-

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ça de que também a mesma criatura será libertada da servidão da corrupção, para a liberdade da
glória dos filhos de Deus” (Ro 8:22, 20-21).

A Essência da Moral Malígna. Os Santos Padres indicam que o mal não é algum tipo de essên-
cia que tem qualquer existência independente real, como os elementos e poderes do mundo que
foram criados por Deus. O mal é só um desvio dos seres vivos da condição original na qual Deus
os colocou, para uma condição que é oposta a ela. Por isso não é Deus que é a causa da moral
maligna; ao contrário, ela procede com a vontade de Deus. A essência do mal consiste na viola-
ção da vontade de Deus, dos comandos de Deus, e da lei moral que está escrita na consciência
humana. Essa violação é chamada pecado.

A Origem do Mal. Mas de onde então surgiu a moral maligna? Deus criou o mundo puro, per-
feito, livre do mal. O mal entrou no mundo como uma conseqüência da queda, que ocorreu, de
acordo com a palavra de deus, originalmente no mundo dos espíritos sem carne, e então na raça
humana, e que foi refletido em toda natureza viva.

A queda do mundo Angélico: os espíritos Malignos


De acordo com o testemunho da palavra de Deus, a origem do pecado vem do diabo: “Quem
comete pecado é do diabo — porque o diabo peca desde o princípio” (1 Jo 3:9). A palavra “dia-
bo” significa “caluniador”! Trazendo junto a evidencia da Sagrada Escritura, nós vemos que o
diabo é um dos espíritos racionais ou anjos que se desviaram para o caminho do mal. Possuindo,
como todas as criaturas racionais a liberdade que lhe foi dada para tornar-se perfeito no bem, ele
“não se firmou na verdade” e caiu para longe de Deus. O Salvador disse dele: “ele foi homicida
desde o principio, e não se firmou na verdade, porque não há verdade nele; quando ele profere
mentira, fala do que lhe é próprio, porque é mentiroso, e pai da mentira” (Jo 8:44). Ele carregou
outros anjos com ele na queda. Nas epistolas do Apóstolo Judas e do Apóstolo Pedro, nós lemos
sobre os anjos. “E os anjos que não guardavam o seu principado, mas deixaram a sua própria ha-
bitação” (Ju 1:6, comparar com 2 Pe 2:4).
Qual foi a causa da queda no mundo angélico? Da mesma Revelação Divina nós pode-
mos concluir que a razão foi orgulho: “o começo do pecado é o orgulho” diz o filho de Sirach (Si
10-13). O Apóstolo Paulo, prevenindo o Apóstolo Timóteo contra o fazer bispos entre aqueles
convertidos recentemente, acrescenta, “... para que, ensoberbecendo-se, não caia na condenação
do diabo” (1 Tm 3:6).
Os espíritos malignos são mencionados só em algumas passagens na revelação do Velho
Testamento. Nós lemos da “serpente,” a tentação da primeira pessoa no terceiro capítulo do Li-
vro da Gênesis. As atividades de “satan” na vida do justo Jó são relatadas no primeiro capítulo
do livro de Jó. No Primeiro Reis é dito a respeito de Saul que um espírito maligno o perturbou
depois que o Espírito do Senhor, partiu dele (1 Re 15:14 = 1 Sam. em KJ). No primeiro Parali-
pomenon (Crônicas), capítulo 21, nós lemos que quando veio um pensamento a Davi para fazer
um censo do povo, foi porque “Satanás se levantou contra Israel, e incitou Davi a numerar Isra-
el.” No livro do Profeta Zacarias é dito, a respeito do sumo sacerdote Joshua, que Joshua resistiu
“ao diabo” (“satan” em KJ; Zacha 3:1). No livro da Sabedoria de Salomão é dito que “pela inveja
do diabo a morte entrou no mundo” (Sab 2:24). Da mesma forma em Deuteronômio 32:17 é dito:
“Eles sacrificaram aos diabos, não a Deus”; e no Salmo 105:36 “E sacrificaram... aos demônios.”

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Uma incomparável e mais completa representação da atividade de satan e seus anjos está
contida na Revelação do Novo Testamento. Por ele sabemos que satan e os espíritos malignos
estão constantemente atraindo mais pessoas para o mal. Satã ousou tentar o próprio Senhor Jesus
Cristo no deserto. Os espíritos malignos investem contra a alma e mesmo contra o corpo dos
homens; disso há o testemunho de vários eventos nos Evangelhos e nos ensinamentos do Salva-
dor. A respeito da habitação dos espíritos malignos nos homens. Nós conhecemos os numerosos
casos de cura pelo Salvador de possuídos pelos demônios. Espíritos malignos olham para os des-
cuidos do homem para atrai-lo para o mal. “E, quando o espírito imundo tem saído do homem,
anda por lugares áridos, buscando repouso, e não o encontra. Então diz: Voltarei para a minha
casa de onde sai. E, voltando, acha-a desocupada, varrida e adornada. Então vai e leva consigo
outros sete espíritos piores do que ele, e, entrando habitam ali, e são os últimos atos desse ho-
mem piores do que os primeiros” (Mt 12:43-45). A respeito da cura da mulher curvada, o Salva-
dor disse para o príncipe da sinagoga, “E não convinha soltar desta prisão, no dia de sábado, esta
filha de Abrahão, a qual há dezoito anos Satanás tinha presa?” (Lc 13-16).
A Sagrada Escritura chama os espíritos malignos “espíritos imundos,” “espíritos do mal,
“diabos,” “demônios,” “anjos do diabo,” e “anjos de satã.” Seu chefe, o diabo, também é chama-
do de “tentador,” “satan,” “Belzebu,” “Belial,” “o príncipe dos demônios,” é outros nomes como
“Lúcifer” (a estrela da manhã).
Tomando a forma de serpente, do diabo foi o tentador e a causa da queda no pecado das
primeira pessoas, como é relatado no terceiro capitulo do livro da Gênesis. No Apocalipse ele é
chamado de “o grande dragão, a velha serpente” (Apoc 12:9).
O diabo e seus anjos são privados de permanecer nas celestes moradias de luz. “Eu via