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MÁRIO FERREIRA - Prova cega com vinho do

Porto em órbita
por PEDRO VASCO OLIVEIRA, fotografia HERNÂNI PEREIRA

DN, 2010-01-24

http://dn.sapo.pt/revistas/ns/interior.aspx?content_id=1476183

Turismo de luxo. É sobre este filão que Mário Ferreira tem construído o
seu império empresarial. Pioneiro, há 17 anos que traz o mundo a
conhecer a beleza do rio Douro. Ambicioso, prepara-se para ir fazer
cruzeiros no Amazonas. E porque o mundo é uma aldeia global, o passo
seguinte, visionário, é explorar o espaço em órbita da Terra. Para já, tem
viagem marcada na nave SpaceShipTwo, com uma garrafa de Porto na
bagagem.
O que destaca no seu percurso de vida que o fez chegar onde está hoje?
Foi o ter saído de Portugal quando tinha 16 anos. O ter saído cedo e começar a
trabalhar com 16 anos no estrangeiro deu-me uma visão do mundo totalmente
diferente daquela que teria se tivesse ficado em Portugal. As pessoas não viajarem,
não verem o mundo logo cedo e não conhecerem novas culturas, novas pessoas,
novos países, ficam limitadas no pensamento e isso condiciona a sua actuação futura
e até a sua performance em termos profissionais e empresariais.

Deixou de estudar cedo. Tem tentado colmatar essa lacuna?


Tem sido muito importante, porque é difícil crescer como empresário à moda antiga,
em que se andava com um molho de notas no bolso, uma caneta atrás da orelha e
um bloco para tomar apontamentos… Acho que é importante e não tenho parado de
me preparar. Fiz um curso (Advanced Management Program) na IESE da Universidade
de Navarra, que funciona em Barcelona, e agora ando no segundo ano de Gestão de
Empresas Turísticas, na Universidade Lusófona. Para se evoluir e continuar a crescer,
e para que as empresas não estagnem, as pessoas devem procurar modernizar-se e
actualizar-se com as novas técnicas de marketing, de vendas e até de gestão, que
são áreas em constante evolução.

O rio Douro é uma mina turística?


Se o Douro for bem aproveitado e se se souber canalizar toda esta energia e este
reconhecimento que está a começar a ter – porque só agora está a ter
reconhecimento e exposição mediática –, pode ser um excelente destino turístico.
Neste momento, o Douro é um potencial destino turístico, mas ainda não é um
destino turístico. Isto, por vezes, faz confusão às pessoas, mas o Douro ainda não é
nada comparado com o Algarve, a Madeira e Lisboa. Este triângulo é o verdadeiro
destino turístico do nosso país e é para lá que vai a maior parte das receitas
turísticas.
Mas tem qualidades para poder competir com esses destinos?
Claro, isto não quer dizer que o Douro, que vai do Porto até Salamanca, não tenha
tanto ou mais potencial que as outras regiões, tem é de ser desenvolvido. É
necessário criar meios para que possa desenvolver-se. Neste momento, o único
produto turístico que está à frente em termos de consolidação e de realce são os
cruzeiros, porque é um trabalho que está a ser bem feito, mas não houve ninguém
que, em paralelo, acompanhasse com a mesma força, intensidade e crescimento, por
exemplo, na parte hoteleira, na gastronómica, na da animação… Todos esses
elementos são fundamentais para que o destino turístico se complete e consolide.

Mesmo assim não tem razões de queixa?


Alguns dos meus colegas da área empresarial costumam dizer que sou o único que
não me queixo… Não me queixo porque faço pela vida: em 2009, que toda a gente
esperava que fosse um ano mau, preparámo-nos para um ano mau, não íamos estar
à espera de um ano mau para depois nos queixarmos. Preparámo-nos e continuamos
a fazê-lo. O ano de 2010 já está feito e, neste momento, o meu plano de trabalho é
2011-2015. E já ando a preparar outro plano, que é 2011-2016, em que gostava de
internacionalizar a Douro Azul e levar o conhecimento consolidado que temos,
utilizando as pessoas-chave da empresa e os mercados internacionais com que
trabalho e criar novos destinos, muito concretamente na Amazónia, onde não há
ninguém a fazer o que faço aqui. Isto é algo que ando há anos a tentar fazer, mas
tem de ser desta porque, com o Mundial de Futebol em 2014 e os Jogos Olímpicos em
2016, ou começo em 2012 com um barco, outro em 2014 e outro em 2016, ou não
chego a tempo. Mas para fazer isso tenho de conseguir angariar dinheiro suficiente.
Entre Manaus (Brasil) e Iquitos (Peru) são dois mil quilómetros de rio para explorar. E
já tenho acordo com algumas tribos para que possam fazer-se visitas turísticas.

Disse que foi o primeiro a acreditar no Douro mas continua a faltar muita
coisa. É por isso que está a entrar em algumas áreas complementares?
Estou e já estive mais. Na altura estive envolvido com o Solar da Rede e com a
Vintage House, que vendi à CS Hotéis, porque não havia nenhum hotel de qualidade
na região e precisávamos de ter um como apoio e complemento. A determinada
altura vi que havia pessoas interessadas e desliguei-me para me concentrar e fazer
crescer aquele que é o nosso negócio principal e do qual percebo melhor e que mais
gozo me dá, que são os cruzeiros de luxo. Entretanto, tinha o projecto Douro Marina
Hotel, para Mesão Frio, que ficou finalmente aprovado ao fim de nove anos. Esse
projecto envolve o que penso que será uma revolução e uma chave importante para o
Douro, que é um campo de golfe.

Porque é assim tão importante?


Não é que não existam já campos de golfe bonitos e em grande número em Portugal,
mas um campo de golfe aqui no Douro vai permitir que se quebrem dois tipos de
sazonalidade da região, a da semana e a do Inverno. Como é que isso se consegue
ultrapassar? Atraindo o turismo de negócios, que vem se houver uma grande unidade
hoteleira, com uma boa capacidade de salas de reunião, um bom anfiteatro para
trezentas ou quatrocentas pessoas, para que o turismo de negócios funcione no Douro
durante a semana e de Inverno. E o Douro não precisa de uma, precisa de duas ou
três âncoras dessas para que todas as outras unidades à volta possam viver de
maneira diferente. Aos fins-de-semana, de Maio a Outubro, as poucas unidades que
existem funcionam bem, mas isso não dá para ganhar dinheiro, para isso precisam de
ter aquilo cheio durante a semana e fins-de-semana, de Verão e Inverno…

E o Norte tem clima para albergar um campo de golfe capaz de atrair esse
tipo de turistas?
A essa pergunta costumo responder com outra: sabe onde fica o campo de golfe mais
famoso do mundo? O mais caro, mais conhecido e mais famoso fica na Escócia [Saint
Andrews]. E não me digam que a Escócia tem melhores condições climáticas que o
Porto. As condições ambientais do Algarve são mais adversas para um campo de golfe
do que as do local onde está idealizado implantar este, por causa da água. Quando o
[Severiano] Ballesteros veio cá e olhou para o terreno disse que aquilo seria um
campo de golfe de sonho. E idealizou, fez um anteprojecto, desenhou-o e não me
cobrou um cêntimo só pelo gozo de o desenhar e de ser ele a fazê-lo.

Tem sido o agarrar de oportunidades que fizeram o seu sucesso empresarial?


Penso que sim, foi assim que também comecei a empresa de turismo espacial, que foi
a segunda no mundo e a primeira na Europa e uma das primeiras especializadas em
turismo espacial. Neste momento, pode ainda não dizer nada às pessoas, mas quando
começarem a perceber o que vai ser o futuro do turismo espacial nos próximos dez
anos, verão a importância desta empresa.

Já tem clientes nacionais para as viagens espaciais?


Quatro já pagos há muito tempo e temos umas dezenas de interessados que estão à
espera de que o programa comece. Actualmente, sou o único português no grupo dos
cem fundadores e os quatro a quem vendemos o bilhete integram o grupo de cem
pioneiros. Mas posso dizer-lhe que há muita gente interessada e gente conhecida.

Qual é o valor de uma viagem ao espaço?


O valor é sempre o mesmo, duzentos mil dólares [140 mil euros].

E quando pensa que irá finalmente ver a Terra do espaço?


Não há uma data marcada, porque depende da certificação da nave. Estamos sempre
a acompanhar o evoluir dos testes, mas está para muito breve porque a nave está
pronta. Poderá ser no final deste ano ou no início do próximo, mas não temos pressa
porque temos vários eventos por ano em que nos encontramos e convivemos todos.
Não temos pressa porque queremos que na altura de ir possamos ter a certeza, como
vamos ter, de que a nave está perfeitamente testada e é segura.

Qual a razão desses encontros?


São encontros em que recebemos informação sobre a evolução da nave e sobre a
viagem, fazemos alguns testes médicos, físicos e de gravidade zero, assistimos às
apresentações da nave-mãe e da nave mais pequena e, depois, tem toda uma parte
social muito interessante, pois já somos todos amigos…

Onde se encontram?
Os locais têm variado muito. Os mais repetidos são Los Angeles, porque a nave está a
ser construída lá perto, no deserto do Mojave, mas já nos encontrámos em muitos
sítios: no hotel de gelo na Suécia, na ilha privada de Richard Branson nas Caraíbas,
aqui em Portugal, em Londres e noutros locais…

Tem uma experiência muito especial para realizar nessa primeira viagem ao
espaço...
Tenho de levar vinho do Porto Taylor’s dentro de uma garrafa especial para fazer a
experiência de a submeter àquelas pressões e à ausência de gravidade para ver se o
vinho se altera ou não no espaço. Depois vamos fazer uma prova cega para o testar…

A viagem ao espaço exige-lhe grandes cuidados físicos e muita preparação?


Exige, acima de tudo, que uma pessoa não tenha grandes fobias. Tem de estar bem
de saúde, não ter tensão alta nem problemas de coração e que os exames médicos
sejam normais, mas não é preciso ser super-homem. O mais difícil é o regresso, em
que vamos atingir 6,5 G (seis vezes e meia a força da gravidade), o que requer treino
e preparação.

PERFIL

Do Douro para as estrelas


Aos 42 anos, feitos no passado dia 15 deste mês, Mário Nuno dos Santos Ferreira, pai
de três filhos (7 e 15 anos e 20 meses) e casado em segundas núpcias, encontrou no
rio Douro a mina a partir da qual desenvolveu um negócio de milhões.
Aos 16 anos foi para um campo de férias em Inglaterra e decidiu ficar em Londres,
começando por trabalhar na hotelaria. Aos 20 anos foi trabalhar para o paquete de
luxo Vistafijord e deu a sua primeira volta ao mundo. Regressou a Portugal em 1992,
estabelecendo-se com um restaurante. Em 1993, depois de uma «experiência
horrível» num passeio de barco junto ao Porto, lançou-se na organização de cruzeiros
fluviais, sendo actualmente proprietário da empresa Douro Azul.

Em 2006 aposta no turismo espacial e constitui a empresa Caminho das Estrelas, que
tem como actividades principais a venda de viagens espaciais da Virgin Galactic, de
visitas à NASA, de experiências em ambiente com gravidade zero e de brinquedos
sobre a temática espacial. Está a «tentar negociar as primeiras viagens para os
resorts orbitais que irão abrir nos próximos cinco, seis anos», revela.

Fora da área turística, ergueu a Quinta da Avenida, um empreendimento residencial


de luxo na Avenida da Boavista, no Porto, que tem assinatura do arquitecto Souto
Moura, e adquiriu o espólio da Foto Beleza, uma das mais antigas casas de fotografia
da cidade Invicta. É cônsul honorário da Estónia no Porto desde 2003. Apaixonado por
fotografia e viagens, quer ser o primeiro português no espaço.

Com Richard Branson na Maratona de Londres

«É mais uma maluqueira do Richard Branson, mas é salutar.» É desta forma que
Mário Ferreira se refere à sua participação na Maratona de Londres, no próximo dia 25
de Abril.
Após adquirir os direitos, por cinco anos, da prova inglesa por 17 milhões de libras
(quase vinte milhões de euros), o patrão da Virgin decidiu «como desafio aos seus 60
anos» fazer pela primeira vez uma maratona. Para tal, criou uma equipa que
denominou Mission: Possible para o acompanhar na tentativa de chegar ao fim dos
42,195 quilómetros pelas ruas londrinas. «Desafiou gente das várias empresas do
grupo Virgin e alguns amigos a participarem», conta Mário Ferreira, explicando como
surgiu a sua participação: «Escolheu cinco dos fundadores da Virgin Galactic que
considerou preencherem os requisitos necessários: capacidade para chegar ao fim,
independentemente do tempo, perseverança, ou seja, que acreditassem que
conseguiam terminar, e que angariassem no mín imo vinte mil libras (22 700 euros).»

A equipa Mission: Possible, que terá uma partida em separado dos restantes
maratonistas, inclui, além do quinteto de fundadores da Virgin Galactic, em que está
integrado Mário Ferreira, e de funcionários das empresas de Branson, a cantora
Natalie Imbruglia e o actor Christian Slater, entre outros.
Mário Ferreira leva a preparação a sério: já emagreceu 18 quilos e treina
afincadamente entre quarenta a cinquenta quilómetros por semana.

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