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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

INSTITUTO DE QUÍMICA DE SÃO CARLOS


Departamento de Físico-Química

Laboratório de Físico-Química

Prof. Dr. Edson Antonio Ticianelli

RELATÓRIO DA PRÁTICA – PROPRIEDADES MOLARES PARCIAIS DAS


SOLUÇÕES

São Carlos
24 de agosto de 2017
1 – INTRODUÇÃO
Propriedades que são independentes da quantidade de material são
chamadas de propriedades intensivas. Por sua vez, as propriedades que são
proporcionais à quantidade do material em questão, elas são chamadas de
extensivas.
Na termodinâmica, há existência de grandezas tanto intensivas quanto
extensivas. É possível citar como exemplo de grandezas intensivas a pressão e
temperatura de um sistema e, como exemplo de grandezas extensivas, o volume
ou até mesmo os valores de entalpia e energia de Gibbs.
Das propriedades intensivas existentes na termodinâmica, aquela que
apresenta elevada importância é a quantidade parcial molar, a qual é definida
como a Equação 1.
𝛿𝑄
𝑄´ = (𝛿𝑛𝑖) 𝑝, 𝑇 Equação 1

Onde Q pode ser qualquer propriedade extensiva citada anteriormente.


Naturalmente, as quantidades molares parciais se igualam as
quantidades molares quando o sistema se encontra fechado e constituído por
apenas um único componente. No caso de soluções ideias de gases ou
líquidos, algumas quantidades parciais molares (Vi, Ei, Hi) são iguais às suas
respectivas quantidades molares das espécies puras. Entretanto, no caso de
soluções não ideais, todas as quantidades parciais molares diferem da
correspondente quantidade molar.
O volume parcial molar é a propriedade parcial molar mais fácil de
visualizar, o qual é definido como sendo a contribuição que um componente da
mistura faz para o volume total da mistura. Um reflexo, devido às interações
intermoleculares, a medida do volume total resultante da mistura de dois líquidos
reais como, por exemplo, etanol e água, desvia-se do volume total calculado a
partir dos volumes adicionados de cada espécie. Nesse caso, ocorre uma
contração do volume total. O volume parcial molar é definido segundo a Equação
2.
𝛿𝑉
𝑉´ = (𝛿𝑛𝑖) 𝑝, 𝑇, 𝑛 Equação 2
Entretanto, a grandeza parcial molar mais importante do ponto de vista
termodinâmico é a energia de Gibbs molar, Gj, de uma espécie ‘j’, que é a
contribuição por mol de ‘j’ para a energia de Gibbs da mistura. Ela possui o
mesmo significado que o volume parcial molar, apesar de receber um nome e
símbolo especial por sua importância. Denomina-se a energia de Gibbs molar
como potencial químico, representado por μ.
O presente trabalho trata-se apenas da relação dos volumes parciais de
água e etanol, em diferentes misturas, com o volume total da mistura. Não se
entra no mérito de energia de Gibbs molar, apesar de sua grande importância
fundamental.

2 – OBJETIVOS
Determinar a densidade de diferentes soluções constituídas por frações
molares de etanol em água distintas, partindo de suas massas e volume ocupado
em um picnômetro, além de investigar a propriedade molar parcial volumétrica
do etanol nas soluções.

3 – PROCEDIMENTO EXPERIMENTAL

3.1 – Calibração do volume do picnômetro


O picnômetro foi secado e pesado em uma balança analítica e, então,
preenchido com água destilada, tomando-se novamente o valor de sua massa.
Esse procedimento foi realizado três vezes para cada um dos três picnômetros
disponibilizados.

3.2 – Determinação da densidade das soluções


Os picnômetros foram preenchidos com a solução de etanol/água,
realizando-se a ambientação de cada picnômetro previamente, e, então,
pesados. A solução foi descartada devidamente e uma nova alíquota foi
realizada. Esse procedimento foi realizado apenas uma vez para cada solução
de etanol.
4 – RESULTADOS E DISCUSSÃO

4.1 – Calibração do volume dos picnômetros

A densidade da água a 20ºC (temperatura ambiente no dia da prática) é


0,998207 g cm-1 e sua fórmula é dada pela Equação 3.

𝑚
ρ= Equação 3
𝑣
Em que:
ρ = densidade, 𝑚 = massa da solução, 𝑣 = volume da solução.
Sendo assim, podemos calcular o volume real do picnômetro obtendo-se a
massa de água presente no mesmo e aplicando na Equação 3.
As massas obtidas dos picnômetros vazios e com água estão na Tabela
1.

Tabela 1: Dados obtidos para calibração do volume do picnômetro.


Massa do Massa média do picnômetro com água
Picnômetro picnômetro vazio (g) (g)
1 17,9091 48,5167
2 20,1171 50,3813
3 22,6990 46,5641

Através das massas obtidas foi possível calcular o volume real dos
picnômetros e pode-se observar um exemplo de cálculo abaixo:

𝑚
ρ=
𝑣
48,5167 − 17,9091
0,998207 =
𝑣

𝑣 = 30,6626 𝑐𝑚3

Os volumes reais obtidos para os picnômetros está na Tabela 2.


Tabela 2: Volumes reais obtidos para os picnômetros.

Picnômetro Volume real (cm3)


1 30,6626
2 30,3186
3 23,9080

4.2 - Determinação das densidades das soluções


A partir dos volumes reais dos picnômetros e das massas das soluções de
etanol foi possível calcular as densidades das mesmas. Cada grupo de alunos
obteve uma medida de densidade para cada concentração da solução,
totalizando 9 medidas por concentração. Assim, para calcular as densidades
médias, os valores que estavam discrepantes dos demais foram retirados. Os
valores estão apresentados na Tabela 3.

Tabela 3: Densidades médias para as diferentes concentrações das soluções de


etanol.

Concentração da solução (%) Densidade média (g cm3)


0 0,9982
2 0,9902
4 0,9839
6 0,9783
8 0,9743
10 0,9697
12 0,9651
14 0,9621

16 0,9678
18 0,9554
20 0,9488
4.3 - Volume molar aparente e volumes molares parciais
O cálculo da molalidade (m) foi feito por meio da Equação 4. Já, o cálculo
do volume molar aparente foi feito a partir da Equação 5.

massa de etanol (em g)


m= Equação 4
MMetanol×massa de água (em Kg)

1000 MMetanol
ϕv = mρρ (ρ1 − ρ) + Equação 5
1 ρ

Os dados utilizados para tal cálculo estão na Tabela 4.

Tabela 4: Massa de componentes da solução, molalidade e volume molar aparente.

Concentração Massa de Massa de Molalidade do Volume molar


da solução (%) etanol (g) água (g) etanol (mol aparente ϕv
Kg-1) (cm3 mol-1)

2 108,72 2124,50 1,11 53,82


4 213,75 1999,32 2,32 53,10
6 287,31 1872,78 3,33 53,21
8 369,98 1812,06 4,43 52,83
10 419,94 1647,78 5,53 52,83
12 459,92 1499,42 6,66 52,90
14 581,92 1623,68 7,78 52,72
16 604,04 1470,60 8,92 52,89
18 690,42 1500,42 9,99 52,71
20 693,38 1354,28 11,11 53,25

A partir dos dados da Tabela 5, construiu-se um gráfico de volume molar


aparente em função da molalidade (ϕv vs. m), representado na Figura 1.
valores experimentais
54,0 Polinômio de ordem 3
y = Intercept + B1*x^1 + B2*x^2 + B3*x^3
Equation

53,8 Plot volume molar aparente


Weight No Weighting
Intercept 54,1521
volume molar aparente

B1 -0,43982
53,6 B2 0,03903
B3 -7,02612E-4
Residual Sum of Squares 0,19123
R-Square(COD) 0,81337
53,4 0,72005
Adj. R-Square

53,2

53,0

52,8

52,6
0 2 4 6 8 10 12
molalidade

Figura 1: Gráfico de volume molar aparente (ϕv) em função da molalidade (m).

A curva apresentada no gráfico é descrita pela expressão polinomial de


ordem 3, segundo a Equação 6.

𝑦 = −0,000702612𝑥 3 + 0,03903𝑥 2 − 0,43982𝑥 + 54,1521 Equação 6

Derivando-se a expressão polinomial de ordem 3 (Eq. 6) obteve-se a Eq.


7.

dϕv
= −0,002107836𝑥 2 + 0,07806𝑥 − 0,43982 Equação 7
dx

Como mostrado na Figura 1, o eixo x corresponde à molalidade, então:


dϕv dϕv
=
dx dm
Os volumes molares parciais de etanol e água puderam ser calculados a
partir das equações 8 e 9, respectivamente.
̅𝒆𝒕𝒂𝒏𝒐𝒍 = ϕv + m ∙ (dϕv)
𝐕 Equação 8
dm

̅𝒆𝒕𝒂𝒏𝒐𝒍 = ϕv + m. (−0,002107836𝑥 2 + 0,07806𝑥 − 0,43982)


∴𝐕

1 dϕv
̅á𝑔𝑢𝑎 =
V ̅10 − 𝑚2 (
[n1 V )] Equação 9
n1 dm

1
̅á𝒈𝒖𝒂 =
∴𝐕 ̅ 0 − 𝑚2 (−0,002107836𝑥 2 + 0,07806𝑥 − 0,43982)]
[n V
n1 1 1

Em que:

̅10 = volume
𝑚 = molalidade do etanol, n1 = molalidade da água (55,55 mol Kg-1), V
̅10 para água a 25ºC = 18,0 g cm-1).
molar do solvente puro (V

Os valores de dϕv/dm, ̅̅̅


V2 e V̅1 calculados para as soluções de diferentes
concentrações são apresentados na Tabela 5.

Tabela 5: dϕv/dm e volumes molares parciais dos componentes das soluções.


Concentração da dϕv/dm ̅𝒆𝒕𝒂𝒏𝒐𝒍
𝐕 ̅á𝒈𝒖𝒂
𝐕
solução (%) (cm3 mol-2 Kg- (cm3 mol-1) (cm3 mol-1)
1)

2 -0,356 53,425 18,187


4 -0,270 52,473 18,191
6 -0,203 52,533 18,192
8 -0,135 52,230 18,191
10 -0,073 52,428 18,187
12 -0,013 52,810 18,182
14 0,040 53,030 18,174
16 0,089 53,682 18,166
18 0,130 54,005 18,156
20 0,167 55,108 18,146
4.3 - Avaliando as incertezas do experimento anterior

Primeiramente foi calculado o volume total (V) de cada solução quando


preparada em 1000 g de H2O de acordo com a Equação 10.

(𝑚1 + 𝑚2 )
𝑉= Equação 10
ρ

Em que: 𝑚1 = 1000 g de H2O, 𝑚2 = massa de etanol usada para preparar


soluções contendo 1000 g de H2O e ρ = densidade da solução.
Então, a partir do volume total da solução foi possível calcular Y, como
mostrado na Equação 11.
(𝑉−1000)
𝑌= Equação 11
ρ1

Em que: 𝑉 = volume total da solução e ρ1 = densidade da água.

Através de um gráfico de Y em função de m (molalidade), mostrado na


dY
̅𝒆𝒕𝒂𝒏𝒐𝒍, uma vez que
Figura 2, podemos obter 𝐕 ̅𝒆𝒕𝒂𝒏𝒐𝒍 .
=𝐕
dm

600
Y
Polinômio de ordem 3
500

400
Y

300
y = Intercept + B1*x^1 + B2*x^2 +
Equation B3*x^3
Intercept -5,86404
200
B1 61,1372
B2 -1,88351
B3 0,11104
100 Residual Sum of Squares 153,79728
R-Square(COD) 0,99945
Adj. R-Square 0,99918

0
0 2 4 6 8 10 12
molalidade

Figura 2: Gráfico de Y em função da molalidade.

O polinômio de ordem 3 pode ser dado pela Equação 11.


𝑦 = 0,11104𝑥 3 − 1,88351𝑥 2 + 61,1372𝑥 − 5,8604 Equação 12

dY
̅𝒆𝒕𝒂𝒏𝒐𝒍 =
𝐕 = 0,33312𝑥 2 − 3,76702𝑥 + 61,1372
dm

Tabela 6: Valores de volume total da solução, volume molar parcial de etanol, Y e dY/dx.
Concentração 𝐕 (volume total 𝐕 − 𝟏𝟎𝟎𝟎 𝐝𝐘
̅𝒆𝒕𝒂𝒏𝒐𝒍
𝐘= = 𝐕
𝛒𝟏 𝐝𝐱
da solução (%) da solução (cm3))
(cm3 g-1) (cm3 mol-1)

2 1061,578 61,68846 57,36372


4 1125,024 125,2488 54,18913
6 1178,998 179,3194 52,28676
8 1235,940 236,3639 50,9851
10 1294,062 294,5903 50,49252
12 1353,986 354,6219 50,82337
14 1411,907 412,6469 51,99249
16 1457,681 458,5033 54,03173
18 1528,314 61,68846 56,74553
20 1593,583 125,2488 60,41683

̅𝑒𝑡𝑎𝑛𝑜𝑙 calculados a partir do gráfico da Figura


Para comparar os valores de V
1 e os calculados com o gráfico da Figura 2, realizou-se o cálculo do desvio
percentual (Equação 12).

̅ 𝑒𝑡𝑎𝑛𝑜𝑙 −V
|V ̅ 𝑒𝑡𝑎𝑛𝑜𝑙 |
2 1
𝐷(%) = ̅
× 100% Equação 13
V𝑒𝑡𝑎𝑛𝑜𝑙 1

̅𝑒𝑡𝑎𝑛𝑜𝑙 = volume molar parcial de etanol calculado a partir do gráfico


Em que: V 1
̅𝑒𝑡𝑎𝑛𝑜𝑙 = volume molar parcial de etanol calculado a partir do gráfico
da Figura 1, V 2

da Figura 2. Os valores calculados são apresentados na Tabela 7.


Tabela 7: Diferença Percentual dos valores de 𝑉̅2 calculados por diferentes métodos.
Concentração ̅𝒆𝒕𝒂𝒏𝒐𝒍 (cm3)
𝐕 ̅𝒆𝒕𝒂𝒏𝒐𝒍 (cm3)
𝐕 𝑫(%)
𝟏 𝟐
da solução (%)
2 53,425 57,364 7,372
4 52,473 54,189 3,270
6 52,533 52,287 0,469
8 52,230 50,985 2,383
10 52,428 50,492 3,692
12 52,810 50,823 3,762
14 53,030 51,992 1,956
16 53,682 54,032 0,651
18 54,005 56,745 5,074
20 55,108 60,417 9,633
𝑫(%) Médio 3,826

Nota-se que os valores de desvios percentuais entre os dois métodos diferem


relativamente pouco. O desvio percentual médio calculado foi de 3,826%.
Observa-se que os valores obtidos a partir do gráfico da Figura 1 apresentam
uma variabilidade menor do que os valores obtidos a partir do gráfico da Figura
2, onde não se observou variação com o aumento da molalidade de etanol.
Assim, as variações no volume molar dos componentes de uma mistura são mais
bem observadas quando se considera a quantidade molar parcial.
̅𝒆𝒕𝒂𝒏𝒐𝒍 e 𝐕
4.4 - Comparação entre 𝐕 ̅á𝒈𝒖𝒂 obtidos experimentalmente e dados

encontrados na literatura

18,20 55,5
Vágua
Vetanol
55,0
18,19

54,5
18,18
54,0

Vetanol
Vágua

18,17
53,5

18,16 53,0

52,5
18,15

52,0
18,14
0,00 0,02 0,04 0,06 0,08 0,10 0,12 0,14 0,16 0,18 0,20 0,22
Fração molar

Figura 3: Gráfico de volume molar parcial vs. fração molar da mistura de água e etanol
a 20ºC.

Os quadrados pretos representam os volumes parciais molares relativos ao


solvente (água) e os quadrados azuis os volumes parciais molares relativos ao
soluto (etanol). Nota-se a diferença na escala do eixo das abscissas. O intervalo
de fração molar de etanol na mistura, nas condições experimentais, é limitado
até, aproximadamente, 0,20, diferentemente daquele observado no gráfico da
literatura (Figura 4).
Dessa maneira, o comportamento dos volumes molares dos constituintes
da mistura não é favorável. Observa-se, sim, um padrão nos pontos
determinados, o qual está de acordo com o visto na literatura: enquanto o volume
molar de água tende a diminuir com o aumento da fração molar de etanol, o
volume molar de etanol, por sua vez, tende a aumentar. Entretanto, não há
efetivamente o aumento, um tanto quanto significativo, nos valores iniciais de
fração molar de etanol. Já o padrão apresentado para água apresenta uma
relativa semelhança com a literatura.
Acredita-se que, por ser um experimento extremamente sensível,
considerando que todos os valores explorados durante as passagens
matemáticas são dependentes das massas pesadas e, consequentemente, do
manuseio correto das vidrarias, os operadores apesar de todo cuidado o
experimento podem não ter tomado o devido cuidado e atenção.

Figura 4: Gráfico de volume molar parcial vs. fração molar da mistura de água e etanol
a 25ºC. Fonte: ATKINS, Peter; PAULA, Júlio de. Físico Química. 8 ed. Rio de Janeiro:
LTC, 2006. V. 1.

5 - CONCLUSÃO
A partir da preparação de misturas de dois ou mais componentes, o
volume final da solução não necessariamente é a simples soma dos volumes
parciais de cada componente. O comportamento é observável no estudo do
volume molar parcial dos componentes de uma mistura. Que pode se estender
para outras propriedades parciais molares.
As variações no volume molar dos componentes (água/etanol) em uma
mistura com diferentes frações molares de etanol foram mais bem observadas
quando se considera o volume molar parcial (𝑉̅ ).
Os dados coletados apresentam um padrão nos pontos determinados, o
qual está de acordo com o visto na literatura, de modo que o comportamento da
água e do etanol em uma mistura pode ser descrito com o experimento realizado.

6 - REFERENCIAS
[1] TICIANELLI, Edson A.; MOTHEO, Artur J.; VARELA, Hamilton. Laboratório
de Físico Química 2017. São Carlos, 2017.

[2] ATKINS, Peter; PAULA, Júlio de. Físico Química. 8 ed. Rio de Janeiro: LTC,
2006. V. 1.

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