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‘aos Itracerais de Catdegaeo na Piao (IP) {Gare Brasiora 0 Uva, 8, ers ‘oosinho Sar, apo de pone, 956450. © twesroivo / Sato Ageia; braduedo, organzact, iodo @ sates Nave hans Cita; revsto Hondo Dabesoo] Sia Pau: Pau, 1865. (Pateea) Ison 05.50.0056 1. Lare-arivie«detemineno 2. Lirearive «determine — Ensine- mena bilan | Olver, Na Ass. Tl. Si ozo con2ss7 indeas para cag stares: ‘Ubedade rene bin“ Dewting crt 288.7 2 Uwe ars Ensno belo = Dovna csi 28.7 Colegio PATRISTICA 1. Paes Aposoios 2 Paares Apoogsiss 5 Sutin de Rom 2 Vou ge Uso Samo Agta, 4 Tondace Sante Agosto, Olea 7 ATandase 8. Roost 2 Olea, © agosinte ‘98; Comantro aoe Saios (Saios 1.50 S. Agostaho 52 Comentine aos Samos (Stes 57-100), 8, Agena 813. Comentin a Samos (Samos 107-10), 8. Mgostaho "0. Conasbes, 8. Agostino. 1 Sonus wt ft, 8. Agestone 12.A Grp) Sato Agosto. 13,4 Gaga. Apo (n el) SANTO AGOSTINHO O LIVRE-ARBITRIO 2 edigao Paulus “Tonga Better ato “radu doc! tino coed com vores em ance @em espanol ‘rae, organzagio esto @notas Tatas sans Olvera Hons Dabesco Diegto Esto Pes ktana! Gua ePAUIUS— 1095 os rancace Cun, 229 bett7 201 to Paci (Gras Fax 011) 709627 ‘al 1) ase9068 Ips sla br Groserakgpaiusone PAULUS ada ce S80 Palo 2885 apearto Porias) Fae (0) 9460078 | Tal on ssras 152 05 19-0558 APRESENTACAO ‘Surgiu, pelos anos 40, na Europa, especialmente na Franca, um movimento de interesse voltado para os anti- 4g0s escritores cristaos e suas obras, conhecidos, tradicio- rnalmente, como “Padres da Igreja” ou “Santos Padres”. Esse movimento, liderado por Henri de Lubac e Jean Daniélou, dew origem ts colegdo "Sources Chrétiennes’ ‘hoje com mais de 300 titulos, alguns dos quais com vdrias ‘edigées. Com 0 Coneilio Vaticano II, ativou-se em toda a Igrejaodesejo eanecessidadede renovagao da liturgia, da cexegese, da espiritualidade e da teologia a partir das fontes primitivas. Surgiu a necessidade de “voltar as fontes” do cristianismo, ‘No Brasil, em termos de publicapao das obras destes. autores antigos, pouco se fez. Paulus Bditora procura, ‘agora, preencher este vazio existente em lingua portugue- ssa. Nunca é tarde ou fora de época para rever as fontes da {fécrista, 0s fundamentos da doutrina da Igreja, especial- ‘mente no sentido de buscar nelas a inspiragao atuante, transformadora do presente. Nao se propde uma volta ao pasado através da leitura e estudo dos textos primitivos ‘como remédio ao saudosismo. Ao contrdrio, procura-se oferecer aquilo que constitui as “fontes” do cristianismo Para que leitor as examine, as avaliee colha oessencial, © espirito que as produziu. Cabe ao leitor, portanto, a APRESENTACAO 6 tarefa: do discernimento. Paulus Editora quer, assim, oferecer ao puiblico de lingua portuguesa, leigos, clérigos, religiosos, aos estudiosos do cristianismo primevo, uma série de titulos, ndo exaustiva, cuidadosamente traduzi- dos e preparados, dessa vasta literatura erista do periodo ristico. Pair ara no sobrecarregar o texto eretardar@ letra, ‘procurou-se evitar anotagdes excessivas, as longas intro- dugées estabelecendo paralelismos de versdes diferentes, ‘com referéncias aos empréstimos da literatura paga, filo: ‘séfica, religiosa, juridica, as infindas controversias sobre determinados textos e sua autenticidade. Procurou-se fa~ zercom que resultado desta pesquisa original se tradu: ‘isse numa edigdo despojada, porém séria. Cada autor e cada obra terdo uma introdugdo breve com os dados biograficos essenciais do autor e um comen- ‘rio sucinto dos aspectos literdrios e do contetido da obra suficientes para uma boa compreensao do texto. O que interessa é colocar o leitor diretamente em contato com 0 texto, O leitor deverd ter em mente as enormes diferengas de géneros literdrios, de estilos em que estas obras foram redigidas:cartas, sermées, comentérios btblicos, pardfra- ses, exortasées, disputas com os heréticos, tratados teol6- agicos vazados em esquemas ¢ categorias filoséficas de tendéncias diversas, hinos littirgicos. Tudo isso inclui, necessariamente, uma disparidade de tratamento e de esforgo de compreensio a um mesmo tema, As constantes, por vezes longas, eitagdes biblicas ou simples transcri- ‘900s de textos escrituristicos devem-se ao fato de que os padres esereviam suas reflexes sempre com a Biblia numa das méos. Julgamos necessério um esclarecimento a respeito dos termos pairolagia,paristiea ¢ padres ou pats da Igreja. O termo patrologia designa, propriamente, 0 estu- do sobre a vida, as obras ea doutrina dos pais da Igreja 7 APRESENTAGAO Ela se interessa mais pela historia antiga incluindo tam- ‘bém obras de escritores leigos. Por patristca se entende 0 estudo da doutrina, as origens dessa doutrina, suas de- pendéncias e empréstimos do meio cultural, floscfico ¢ ‘pela evolugéo do pensamento teoldgico dos pais da lgreja Foi no séeulo XVI que se criow a expresséo “teologia atristica” para indicar a doutrina dos padres da Igreja, distinguindo-a da ‘“teologia biblica’, da “teologia escoldstica”, da “teologia simbélica” e da ‘teologia especulativa”. Finalmente, “Padre ou Pai da Igreja" se refere a um leigo, sacerdote ou bispo, da antiguidade crista, onsiderado pela tradigao posterior como testemu- nko particularmente autorizado da fé. Na tentativa de eliminar as ambighidades em torno desta expresstio, 08 ‘estudiosos convencionaram em receber como “Pai da Igre- Ja” quem tivesse estas qualificasées: ortodoxia de doutri- nna, santidade de vida, aprovacaoeclesidsticaeantiguida- de, Mas os préprios conceitos de ortodoxia, santidade ¢ antiguidade so ambiguos. Nao se espere encontrar neles doutrinas acabadas, buriladas,irrefutdveis. Tudo estava ‘ainda em ebuligdo, fermentando. O conceito de ortodoxia 4 portanto, bastante largo. O mesmo vale para o conceito de santidade. Para o conceito de antiguidade, podemos ‘admitir, sem prejutzo para a compreenséo, a opinido de ‘muitos especialistas que estabelece, para o Ocidente, Igre- Ja latina, o pertodo que, a partir da geragao apostélica, se ‘estende até Isidoro de Sevilha (560-636). Para o Oriente, Igreja grega, a antiguidade se estende um pouco mais até a morte de s. Jodo Damasceno (675-748). Os "Pais da Igreja” sao, portanto, aqueles que, ao longo dos sete primeiros séculos, foram forjando, cons- truindo.edefendendo a fe, aliturgia, adisciplina, os costu- ‘mes e 08 dogmas cristaos, decidindo, assim, os rumos da Igreja. Seus textos se tornaram fontes de discussoes, de inspiragdes, de referéncias obrigatérias ao longo detodaa [APRESENTAGKO 8 tradigdo posterior. O valor dessas obras que agora Paulus Editora oferece ao puiblico pode ser avaliado neste texto: “Além de sua importancia no ambiente eclesidstico, 08 Padres da Igreja ocupam lugar preeminente na literatura «, particularmente, na literatura greco-romana. Sado eles ‘osultimos representantes da Antiguidade, cwjaarteliteré- ria, néo raras vezes, brilha nitidamente em suas obras, tendo influenciado todas as literaturas posteriores. For- mados pelos melhores mestres da Antiguidade cldssica, ‘lem suas palavras e seus escritos a servigo do pensamen- to cristdo. Se excetuarmos algumas obras retéricas de cardter apologético, oratorio ou apuradamente epistolar, ‘0s Padres, por certo, ndo queriam ser, em primeira linha, literatose, sim, arautosda doutrinae moral cristas. Aarte adquirida, nao obstante, vem a ser para eles meio para alcangar este fim, (...) Hd de se thes aproximar oleitor com ‘0 coragdo aberto, cheio de boa vontade e bem disposto & verdade crista. As obras dos Padres se the reverteréo, assim, em fonte de luz, alegria e edificagao espiritual” (B. Altaner; A. Stuiber, Patrologia, S. Paulo, Paulus, 1988, pp. 21-22). A Editora “Prometi mostrar que hd um Ser, ‘muito mais sublime do que 8 nots expinto ‘a nose rasdo, Bile: propria Verdade!™ 138,38) “Ser sabedoriaoutra coisa ndo ser "2 Verdade, na qual se contempla es possi ‘sumo Bem? 128) “0 Sabedora! Luz suavissima da ‘mente purificada.® 138,85) INTRODUCAO, 1. Dados e ocasido da obra Apés sua conversio, em Milo, no ano 386, Agostinho viveu alguns meses na feliz tranguilidade da chécara de Cassiciaco, com sua mae, familiaresediminutomtimerode diseipulos. Dedicavam-se ai aos trabalhos campestres, & contemplacio ea reflexiofilossfica. Colhemos os frutos de seus coléquios, nos famosos dislogos: “Contras Académi- 03", “A vida feliz", “A Ordem” e nos “Solildquios”. "Na Pascoa de 387, ele ecebeu a graga do batismo das ios do bispo de Milao, santo Ambrésio. Propunha-se retornara sua terra natal,em Tagaste,na Africa doNorte, para ai consagrar-se com seus amigos a uma vida de oragio e estudo, como monges. Enquanto aguardavam a partida da embareagdo, em Gctia, porto de Roma, no més de outubro, sua santa mie Ménica falece, apés breve enfermidade. Passada a como- cdo do desenlace, Agostinho decide permanecer em Roma 6 inverno de 387 e todo o ano de 388. Preocupado como estava de defender-se do mani- quefsmo e alertar a seus amigos, compés diversos trata- dos, entre outros: “Demoribus Beclesiae Catholicae” e“De moribus maniquaeorum”, e a presente obra: “De libero arbitrio". Aredagdo desta tltima, porém, iniciada em 388, rio péde ser terminada. Apés o regresso a Tagaste, continuou-a, mas naohavia ainda sido concluida, quando, em 391, foi constrangido a ser ordenado padre, por insis- téncia do povo de Hipona. Somente ai, como presbitero, Agostinho conseguiu pér termo ao trabalho, entre 394 € 396. ernopucio 2 Como prova dessa data, temos uma carta sua 20 ‘amigo Paulino, bispo de Nola (carta 31,7), doinfciodoano 396, Junto’ missiva, enviava um exemplardos és livros de“O livre-arbitrio", reeém-terminado, 2. Boédio A obra, em forma dialogada, é em grande parte 0 relato das conversas de Agostinho com Evédio, seu amigo econterriineo. Era este jé homem formado, quando conh ceu Agostino. Fora a principio militar, tendo depois dedicado as Letras. Convertido em Milao, recebeu obat ‘mo pouco antes de Agostinho. Ficou a seu lado, apés a mortedeMénica,em Roma, eem seguida oi para Tagaste, participar da primeira comunidade de monges. Mai tarde, em 396, tornou-se bispo de Upsala, perto de Utica, na Africa proconsular. Neste dialogo como em outro, igualmente mantido com Agostinho, o“De quantitate animae” (Sobre a gran- deza da alma”), vemo-lo sempre ser tratado com muita deferéncia e respeito. Suas insisténcias contribuem a trazer aosdidlogos mais vida, mais igor nas provas e, por vezes, mais complexidade e desenvolvimento. Acontece que no livro II da presente obra, Evédio, a partir do eap. 5,12, aparece apenas brevemente uma \iniea vez, no cap. 12,46, Deverse essa auséncia pelo fato de ele no ter acompanhado seu amigo até Hipona. Entre as epistolas agostinianas, conservam-se 4 car- tas por ele dirigidas a Agostinho. A essas, deve-se acres- centar uma, descoberta hé apenas alguns anos por Dom Bruyne. Saoasdemimeros: 158, 160, 161¢ 163, E dobispo de Hipona a ele, conservaram-se apenas trés cartas: riimeros 159, 162 ¢ 164. Morreu Evédio seis anos antesde seu mestreeamigo, em 424, 13 ntRODUGAO 8. Formagao ideolégica do livro Esta importante obra tem como tema o problema da liberdade humana e o da origem do mal moral. Desde a suaadolescéncia, Agostinho preocupava-secomtais ques- tes, uma das causas de sua adesao a0 maniqueismo foi a esperanca de af encontrar uma solugio para as suas duvidas. Contudo, as fébulasheréticas nao osatisfizeram or muito tempo. Teve que prosseguir a angustiante busca da verdade. Essa fase é bem deserita em suas “Confiasdes". Leia-se 0 . I, caps. 3 ¢ 7. ‘Nao podia Agostinho suportaraidéia de que Deus fosse causa do mal. Enfim, em Miao, enquanto a eloguéncia de Ambrésio trazia-o de volta ao catolicismo, a leitura do neoplaténioo Platine trouxe-Ihe alus tdodesejada. Todavia, ainda ndo uma resposta definitivae plena Bem diregdo a Deus que Plotino condusiu Agosti- ho, para levéclo a certeza de um Criador bom e podero- 40, fonte de toda realidade. Desse modo, o mal nao po- dia ter lugar entre os seres, nem prejudicar a exceléncia 4a obra divina. Tampouco poderia o mal impedir ao ho- mem que quisesse, encontrar em Deus a paze a felicide- de. O problema jé fora por Agostinho tratado em seu didlogo“A Orden". Mas. temiveldificuldade quem Cas- siclaco ele ndo ousara enfrentar, consistia na existéncia do“pecado”. Com efeito, é bastante facil demonstrar que ‘mal fisico resolve-se com a Providéneia divina laso por- que o mal visto no conjunto néo é mais um malefcio, mas sim uma contribuigdo eo bem comum eabeleza da rdem, ‘Atéesse onto, atese neoplatinicaosatisfazia. Mas po- deria ser ditoo mesmo do mal moral, que se opie diretamen- tea vontade de Deus? Plotino dava resposta inadmissivel a essa questio perturbadora.Alegava ser amatériaessencial- ‘mente mé, ea esponsével pelomal. Agostinhonao levouer consideracdotal resposta. Mas, guiadopor seu génioe gragas TRoDUCAO 4 ‘as preciosa retifcagies que af eatlica Ihe proporcionava, ‘le propde, com coragem, uma solugéo racional. Oiintento geral de 0 livre-arbitrio aparece assim com clareza, desse ponto de vista, Segundo os dados da fé, Deus todo-poderoso.e Bem supremo criou todas as coisas por meio deseu Verbo,e nada pode escapar a ordem de sua Providén- cia, Todas as suas obras tio boas. O pecado nao pode lhe ser imputado, nem ficar fora da ordem providencial. Diz. Agos- ‘inho: “B' preciso compreender aquilo em que cremos” (12,4; 1,26). Ble procura explicar pela razao a origem do pecado e seu papel na obra de Deus. Em conclusio, chega a ‘afirmar em sintese a fonte do mal moral, o pecado, est no ‘abuso da liberdade, mas esta é um bem. Insiste nisso com ‘tamanhaforga queospelagianos, mais tarde, invocardo, em ‘azo, suas afirmagSes para sustentar as préprias teses. 4, Breve sintese das idéias fundamentais Antes de tudo, para descobrir a origem do pecado, 6 preciso saber qual a sua esséncia. Ora, cometer omal néo ‘nada mais do que submeter sua vontade as paixdes, ou preferir aos bens propostos pela fé eterna uma satisfagéo pessoal. E isso 86 & posstvel pela livre opgao de nossa vontade (livro I). OlivroIl 6ocoragoda obra. Num método ascensional, ‘Agostinho prova a existéncia de Deus, autor de todo bem. Ea vontade livre, mesmo fraca, nao se pode recusar um lugar honroso entre os bens criados. O livro III é complemento e esclarecimento dos livros anteriores. Trata da Providéncia de Deusem face ao seres, livres. Portanto, sempre louvar a Deus por ter criado a vontade livre, mesmo pecadora, como um elemento da ordem universal. Por certo, 0 pecado no depende da presciéncia divina, e nao é necessério & ordem. Sua pre- senca, porém, ndo consegue tornar aordem atual indigna 6 NTRODUCAO de Deus. A ultima palavra a respeito do pecado, como do ‘mal fisico, sera sempre: “Louvores a Deus!” ‘Tal 6 a trama essencial, simples e poderosa de “O livee-arbitrio’ 5. Andlise do andamento dos trés livros Note-se que a divieio em capitulos e ntimeros est conforme o original latino. Todavia, as divisies em partes, fe seegdes, assim como os titulos dados, para melhor com- preensio da leitura, é de autoria da tradutora. ‘Nas Notas complementares encontrar-se-io sinteses dos assuntos tratados, & medida do decorrer dos temas. 6. O livre-arbitrio e 0 maniquetsmo Sem diivida alguma, este diélogo foi especialmente escrito contra os erros dos maniqueus, sem todavia cons- tituir uma obra polémica. Tendo-se convertidoesentindo- ‘se no caminho da verdade, Agostinho sentia necessidade de recuperar-se, a sie aos amigos. Eis uma breve sintese da teoria maniquéia: Para os ‘maniqueus, havia duas divindades supremas a presidiro universo: 0 prinefpio do Bem eodoMal—aluzeastrevas. ‘Como conseqiiéncia moral, afirmavam ter o homem duas almas. Cada uma presidida por um desses dois prine‘pios. Logo, o mal é metafisico e ontolégico. A pessoa nao é livre nem responsdvel pelo mal que faz. Este lhe é imposto. 7.A solugdo do problema do mat na interpretagao de Agostinho Ao grande problema do mal, conseguiu Agostinho apresentar uma explicagao que se tornou ponto de referés cia durante séculos e ainda hoje conserva a sua validade. muTRoDUCKO 16 —Se tudo provém de Deus, que é 0 Bem, de onde provém o mal? Depois de ter sido vitima da explicagao ualista maniquéia, como vimos, ele encontra em Plotino a chave para resolver aquestio: o mal nio é um ser, mas deficigncia e privagao de ser. B ele aprofunda ainda mais a questio. Examina 0 problema do mal em trés niveis: a) metafisico-ontalégico; ) moral; fisio. — a) Do ponto de vista metafisico-ontoligico, nao existe mal no cosmos, mas apenas graus inferiores de ser, em relagio a Deus, graus esses que dependem da finitude do ser eriado e dos diferentes niveis dessa finitude. Mas mesmo aquilo que, numa consideracao superficial, parece “defeito"(e portanto poderia parecer mal), na realidade, na ética do universo, visto em seu conjunto, desaparece. ‘As coisas, as mais infimas, revelam-se momentos articu- lados de tum grande conjunto harménico. —b) O mal moral é 0 pecado. Esse depende de nossa mé vontade. E'a ma vontade nao tem “causa eficiente’, sim muito mais, “causa deficiente”. Por sua natureza, a vontade deveria tender para o Bem supremo. Mas, como cexistem muitos bens eriadose finitos, a vontade pode vir a tender a eles e, subvertendo a ordem hierérquica, preferiracriatura a Deus, optandopor bens nferiores,em ver dos hens superiores. Sendo assim, omel derivado ato dequeniohé um inicobem, sim muitos bens, con do precisamente o pecado na escalha ineorreta entre es- sos bens. O mal moral, portando, é ‘aversio a Deo” e ‘conversio ad ereaturam”. O fato de se ter recebido de Deus uma vontade live é para nés grande bem. O mal é ‘o mau uso dese grande ber. —€) 0 mal fisico, como as doencas, os sofrimentos ‘¢a morte, tem significado bem preciso para quem reflete na fé: 6 a consequéncia do pecado original, ou seja, 6 conseqiiéncia domal moral. Acorrupsiodo corpoque pesa ” eTmoDuGao sobre a alma no éacausa, masa pena do primeiro pecado (cf.G.Reale,D. Antiseri, “Hist. da Filosofia", Paulus, pp. 455. 456). 8. As “Retractationes” ¢ a resposta aos pelagianos No precioso livro de revisio de suas obras, tio con: cienciosamente elaborado pelo bispo de Hipona, no nal de sua vida, a noticia a respeito de *O livre-arbitrio” 6 das mais longas e importantes. Encontramo-la. no LI,9,16. ‘A posicao de Agostinho é muito clara. Bxplica le que setratavaentdo, naquelaccasiao,derefutaros maniqueus, 8 quais negam o livre-arbitrio da vontade e pretendem fazer recair em Deus a responsabilidade pelo mal e pelo pecado. E contra eles que o tratado insiste,valorizando grandemente 0 papel da liberdade humana. A tal ponto que, na controvérsia pelagiana, advinda anos apés, Pelé- gio nao hesitou em se servir do “De libero arbitrio” para atacar a doutrina eatélica do pecado original. Pretendeu até tirar da obra argumentos de certas férmulas antima- niguéias de Agostinho. O doutor de Hipona assinala 13 passagens das quais os pelagianos poderiam abusar con- tra ele, Mas em ver de responder sucessivamente as dificuldades apresentadas por essas passagens, ele prefe- re lembré-las em bloco. No final, toma resolutamente a ofensiva para explicar em que sentido falou sobre a li berdade. E lembra, vitoriosamente, que, pelo menos em quatro lugares, fez mengio da acio indispensével da graga de Deus. Na verdade, nao se pode argumentar do mesmo ‘modo contra a doutrina dos maniqueus ea dos pelagianos... Leiam-se as notas complementares desta edigdo: —no |. In, 28(12, 26), 30(13,28); 33(14,80); nol In, 20,2); 60(18,47); —no | Il: n. 82(18,50); 84(18,52); 40(20,58).

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