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Ginecologia Baseada em Problemas - Maria Magalhães 2011
Ginecologia Baseada em Problemas - Maria Magalhães 2011
ginecologia
baseada em problemas
Fortaleza – CE
2011
Ficha Técnica
Organizadores
Maria de Lourdes Caltabiano Magalhães
Paulla Vasconcelos Valente
Luciano Silveira Pinheiro
Francisco das Chagas Medeiros
Coordenação editorial
Antônio Miguel Furtado Leitão
Revisão ortográfica
Antônio Edson de Alencar Libório
Ana Luisa Nunes Timbó Castro
Editoração eletrônica
Sheila Peixoto dos Santos Furtado
Coordenação de design
Jônatas Barros – John
Catalogação na fonte
Tusnelda Maria Barbosa Coutinho - CRB-3 nº 423 /79
ISBN 978-85-99562-15-4
1. Ginecologia
2. Ginecologia - Problemas
I. Título
II. MAGALHÂES, Maria de Lourdes Caltabiano – Org.
III. MEDEIROS, Francisco das Chagas – Org.
IV. PINHEIRO, Luciano Silveira – Org.
V. VALENTE, Paulla Vasconcelos – Org.
VI. LEITÃO, Antônio Miguel Furtado – Coord.
CDD 618.1
Impressão:
GRÁFICA E EDITORA LCR
Tel. 85 3272.7844 | Fax. 85 3272.6069
Rua Israel Bezerra, 633 | Dionísio Torres | Fortaleza | CE
atendimento01@graficalcr.com.br | www.graficalcr.com.br
Agradecimentos
Uma das grandes preocupações da Instituição Christus tem sido, ao longo do tempo, manter
elevado nível no que tange à instrução e educação dos seus alunos. Com a publicação de atuali-
zado livro-texto de Ginecologia, a responsabilidade dos autores de capítulos, dos organizadores e
do editor se tornou muito grande, por constituir tarefa nada fácil de ser cumprida. Não obstante os
óbices inerentes a esse procedimento e que foram pouco a pouco superados, inclusive com a ativa
participação dos alunos, o livro chegou ao lumen.
Este livro-texto Ginecologia Baseada em Problemas, resultante da experiência pedagógica,
clínica e cirúrgica de docentes da Faculdade Christus, curso de Medicina, certamente deve apresen-
tar falhas despropositadas e que deverão ser sanadas nas edições vindouras.
Agradecemos à direção dessa Instituição e à Gráfica LCR, por terem tornado realidade os
sonhos e os objetivos dos participantes da elaboração de mais um livro-texto que fará parte da
literatura ginecológica brasileira.
Organizadores
Dedicatória
Como estudantes e profissionais, dedicamos esse livro aos nossos pais, pelo incentivo cons-
tante ao crescimento pessoal e profissional e aos nossos esposos, esposas, filhos e filhas, pelo cari-
nho e pela compreensão nos momentos de privação do convívio e do lazer.
Maria de Lourdes Caltabiano Magalhães
Paulla Vasconcelos Valente
Luciano Silveira Pinheiro
Francisco das Chagas Medeiros
Autores
ÂNGELA CLOTILDE RIBEIRO FALANGA E LIMA
Graduada em Medicina. Título de Especialista em Ginecologia e Obstetrícia pela FEBRASCO. Título
de Habilitação em Ultrassonografia na área de ginecologia e obstetrícia conferido pela FEBRASGO
e Colégio Brasileiro de Radiologia. Mestre em Tocoginecologia pela Faculdade de Medicina da Uni-
versidade Federal do Ceará. Professora do Curso de Medicina da Faculdade Christus.
CAPÍTULO 1
ANATOMIA APLICADA AO EXAME GINECOLÓGICO .......................................................................................... 23
Antônio Miguel Furtado Leitão, Antônio Ribeiro da Silva Filho, José de Arimatea Barreto, Tayná de Lima Freire
CAPÍTULO 2
SEMIOLOGIA GINECOLÓGICA .................................................................................................................................... 35
Francisco das Chagas Medeiros, Rálison Yure Soares Melo
CAPÍTULO 3
FARMACOLOGIA PARA GINECOLOGIA APLICADA À PRÁTICA GINECOLÓGICA ..................................... 45
Manoel Cláudio Azevedo Patrocínio, Paulla Sátiro Timbó, Thiago Emannoel Nogueira Ramos
CAPÍTULO 4
CRESCIMENTO, DESENVOLVIMENTO E O EIXO NEUROENDÓCRINO ........................................................ 57
João Marcos de Meneses e Silva, Maria de Lourdes Caltabiano Magalhães, Luana Pontes Vasconcelos Lima,
Sara Lourinho Firmino
CAPÍTULO 5
ENDOCRINOLOGIA DO CICLO MENSTRUAL.......................................................................................................... 63
Maria de Lourdes Caltabiano Magalhães, Paulla Vasconcelos Valente, Liana Capelo Costa, Luiz Gustavo
Lucena Augusto Lima
CAPÍTULO 6
A FLORA VAGINAL NORMAL NAS DIVERSAS FASES DA VIDA ...................................................................... 69
Maria de Lourdes Caltabiano Magalhães, Paulla Vasconcelos Valente, Giovana Araújo Borges
CAPÍTULO 7
A IMPORTÂNCIA DA CITOLOGIA ONCÓTICA E SUA INTERPRETAÇÃO COLPOSCÓPICA...................... 73
Maria de Lourdes Caltabiano Magalhães, Paulla Vasconcelos Valente, André Luis Nunes Albano de Meneses,
Carla Franco Costa Lima
CAPÍTULO 8
COALESCÊNCIA DE PEQUENOS LÁBIOS ................................................................................................................. 81
Maria de Lourdes Caltabiano Magalhães, Ângela Clotilde Ribeiro Falanga e Lima, Samantha Cavalcante de Brito
CAPÍTULO 9
VULVOVAGINITES NA INFÂNCIA ............................................................................................................................... 85
Maria de Lourdes Caltabiano Magalhães, Gabriella Girão Campos de Barros, Maria Thereza da Frota
Quinderé Ribeiro
CAPÍTULO 10
VULVOVAGINITES NA ADOLESCÊNCIA ................................................................................................................... 93
Maria de Lourdes Caltabiano Magalhães, Lívia Mara Almeida Silveira, Marta Gabriela Silvestre Coelho Carvalho
CAPÍTULO 11
VULVOVAGINITES NO MENACME ............................................................................................................................. 97
Maria de Lourdes Caltabiano Magalhães, Juliana Costa Alencar
CAPÍTULO 12
VULVOVAGINITES NO CLIMATÉRIO .......................................................................................................................101
Maria de Lourdes Caltabiano Magalhães, Raoni Carlos Madeiro
CAPÍTULO 13
ÚLCERAS GENITAIS ........................................................................................................................................................103
Olga Vale Oliveira Machado, Maria de Lourdes Caltabiano Magalhães, Maria do Livramento Leitão Vilar,
Ana Mônica Pinto Moreira, Antônio Pierre Aguiar Júnior
CAPÍTULO 14
DOENÇAS SEXUALMENTE TRANSMISSÍVEIS ......................................................................................................113
José Nivon da Silva, Augusto Saboia Neto
CAPÍTULO 15
HPV ......................................................................................................................................................................................121
Olga Vale Oliveira Machado, Maria de Lourdes Caltabiano Magalhães, Marcella Costa Maia Nogueira,
Yuri Oliveira Machado
CAPÍTULO 16
DOENÇA INFLAMATÓRIA PÉLVICA .........................................................................................................................127
José de Arimatea Barreto, Dandara Costa Santos
CAPÍTULO 17
DOR PÉLVICA CRÔNICA ..............................................................................................................................................133
João Marcos de Meneses e Silva, Lígia Helena Ferreira e Silva, Caroline Franco Machado, Thâmia Martins Marques
CAPÍTULO 18
ENDOMETRIOSE .............................................................................................................................................................141
Francisco das Chagas Medeiros, Diego Lima Vasconcelos
CAPÍTULO 19
DISMENORREIA ..............................................................................................................................................................149
Ângela Clotilde Ribeiro Falanga e Lima, Alysson Sales Melo, Thays Mendes da Silva
CAPÍTULO 20
MASSAS PÉLVICAS ........................................................................................................................................................155
Francisco Edson Ximenes Gomes Pereira, Guilherme de Holanda Cota, Sarah Portella Costa
CAPÍTULO 21
ABDOME AGUDO GINECOLÓGICO ........................................................................................................................161
Francisco das Chagas Medeiros, José Albuquerque Landim Junior, Rômulo Cesar Costa Barbosa Filho
CAPÍTULO 22
TENSÃO PRÉ-MENSTRUAL .........................................................................................................................................169
Lígia Helena Ferreira e Silva, João Marcos de Meneses e Silva, Aline Chaves Freire, Lia Maria Bastos Peixoto Leitão
CAPÍTULO 23
TELARCA E PUBARCA PRECOCE ...............................................................................................................................173
Maria de Lourdes Caltabiano Magalhães, Adriano Saboia de Andrade
CAPÍTULO 24
PUBERDADE PRECOCE .................................................................................................................................................179
Miguel Nasser Hissa, Maria de Lourdes Caltabiano Magalhães, Priscila Luna da Silva, Rafaela Benevides Rodrigues
CAPÍTULO 25
PUBERDADE TARDIA .....................................................................................................................................................185
Maria de Lourdes Caltabiano Magalhães, Paulla Vasconcelos Valente, Aline Moreira do Vale Mota,
Nathalia Fernandes Rebouças
CAPÍTULO 26
SÍNDROME DOS OVÁRIOS POLIMICROCISTOS
(Síndrome da Anovulação Crônica Hiperandrogênica) ..................................................................................195
Francisco das Chagas Medeiros, Idália Luzia Fortaleza Chaves Pedrosa, Valcler Antônio Cabral Rodrigues
CAPÍTULO 27
SÍNDROMES HIPERANDROGÊNICAS .....................................................................................................................203
Miguel Nasser Hissa, Maria de Lourdes Caltabiano Magalhães, Ádila Mitzi Oliveira Costa, Camylla Felipe Silva
CAPÍTULO 28
PERDA SANGUÍNEA GENITAL NA INFÂNCIA ......................................................................................................209
Maria de Lourdes Caltabiano Magalhães, Paulla Vasconcelos Valente, Germana Bastos Pontes, Suelen Rios de Melo
CAPÍTULO 29
SANGRAMENTO UTERINO ANORMAL NA ADOLESCÊNCIA ........................................................................213
Maria de Lourdes Caltabiano Magalhães, Paulla Vasconcelos Valente, Rebeca Santiago Duarte
CAPÍTULO 30
SANGRAMENTO GENITAL NO MENACME ...........................................................................................................219
Maria de Lourdes Caltabiano Magalhães, Paulla Vasconcelos Valente, Ana Cecília de Sousa Silva
CAPÍTULO 31
SANGRAMENTO GENITAL NO CLIMATÉRIO .......................................................................................................225
Maria de Lourdes Caltabiano Magalhães, Paulla Vasconcelos Valente, Roberta Vieira da Nóbrega
CAPÍTULO 32
AMENORREIA PRIMÁRIA ............................................................................................................................................229
Maria de Lourdes Caltabiano Magalhães, João Henrique Pinheiro de Menezes Barreto, Karolinne Saraiva de Araújo
CAPÍTULO 33
AMENORREIA SECUNDÁRIA .....................................................................................................................................237
João Marcos de Meneses Silva, Maria de Lourdes Caltabiano Magalhães, Patrícia de Freitas França, Paula Soares
de Mattos Carneiro
CAPÍTULO 34
SÍNDROME CLIMATÉRICA ..........................................................................................................................................243
Francisco das Chagas Meneses, Ane Larissa Barreto Martins
CAPÍTULO 35
MENOPAUSA ...................................................................................................................................................................249
Francisco das Chagas Meneses, Rodrigo Francisco Magalhães Barbosa
CAPÍTULO 36
MIOMATOSE UTERINA .................................................................................................................................................255
José de Arimatea Barreto, Leonardo Rodrigues de Morais, Lívia de Freitas Gurgel Alves
CAPÍTULO 37
CÂNCER DO COLO UTERINO ....................................................................................................................................261
Luciano Silveira Pinheiro, Lucas Lima Albuquerque
CAPÍTULO 38
CARCINOMA DE ENDOMÉTRIO ...............................................................................................................................269
Luciano Silveira Pinheiro, Danilo Santos Guerreiro, Sanna Roque Pinheiro
CAPÍTULO 39
SARCOMA UTERINO......................................................................................................................................................279
Luciano Silveira Pinheiro
CAPÍTULO 40
MASTALGIA ......................................................................................................................................................................285
Paulla Vasconcelos Valente, Daphinis Diana Brito Cavalcante
CAPÍTULO 41
DERRAME PAPILAR .......................................................................................................................................................289
Paulla Vasconcelos Valente, Fernanda Luna Neri Benevides, Germana Barros Oliveira de Freitas Albuquerque
CAPÍTULO 42
NÓDULOS BENIGNOS DA MAMA ...........................................................................................................................293
Paulla Vasconcelos Valente, Chiári Teixeira de Mendonça, Fernanda Luna Neri Benevides
CAPÍTULO 43
TUMORES MALIGNOS DA MAMA ..........................................................................................................................299
Paulla Vasconcelos Valente, Helena Nogueira Brasil, Liana Capelo Costa
CAPÍTULO 44
PROLAPSO DOS ÓRGÃOS PÉLVICOS .....................................................................................................................307
Luciano Silveira Pinheiro, Leonardo Pereira Cabral
CAPÍTULO 45
INCONTINÊNCIA URINÁRIA ......................................................................................................................................317
Luciano Silveira Pinheiro, Lia Pontes de Melo
CAPÍTULO 46
INFECÇÃO URINÁRIA NA MULHER (GRÁVIDA E NÃO GRÁVIDA) ...............................................................327
Tereza de Jesus Pinheiro Gomes Bandeira, Antônio Enéas Vieira Filho
CAPÍTULO 47
CONTRACEPÇÃO HORMONAL ................................................................................................................................337
Francisco das Chagas Medeiros, Livia Cintra Medina
CAPÍTULO 48
CONTRACEPÇÃO DE EMERGÊNCIA ........................................................................................................................345
Francisco das Chagas Medeiros, Rebeca Mendes de Paula Pessoa
CAPÍTULO 49
INICIAÇÃO SEXUAL E SEXO SEGURO .....................................................................................................................341
Dirlene Mafalda Idelfonso da Silveira, Ítalo Mendonça Lima, Mariana Rodrigues Landim
CAPÍTULO 50
SEXUALIDADE NA INFÂNCIA ....................................................................................................................................359
Maria de Lourdes Caltabiano Magalhães, Paulla Vasconcelos Valente, André Pinho Sampaio, Rebeca Dourado
Porto Figueiredo
CAPÍTULO 51
SEXUALIDADE NA ADOLESCÊNCIA ........................................................................................................................365
Maria de Lourdes Caltabiano Magalhães, Paulla Vasconcelos Valente, Marcelo Labanca Delgado Perdigão,
Sara Menezes Pinheiro
CAPÍTULO 52
SEXUALIDADE NO MENACME ..................................................................................................................................373
Maria de Lourdes Caltabiano Magalhães, Paulla Vasconcelos Valente, Larissa Xavier Santiago da Silva, Paula
Neves Pimentel Gomes
CAPÍTULO 53
SEXUALIDADE NO CLIMATÉRIO ...............................................................................................................................377
Maria de Lourdes Caltabiano Magalhães, Paulla Vasconcelos Valente, Guilherme Alencar de Medeiros,
Renata Cavalcante Lima
CAPÍTULO 54
SEXUALIDADE NA GESTAÇÃO ..................................................................................................................................383
Maria de Lourdes Caltabiano Magalhães, Paulla Vasconcelos Valente, Fernando Sérgio Mendes Carneiro Filho,
Larissa Vasconcelos Bastos
CAPÍTULO 55
ASSISTÊNCIA À CRIANÇA E À ADOLESCENTE, VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA .................................................391
Helena Maria Barbosa Carvalho, Maria de Lourdes Caltabiano Magalhães, Francisco Nilson Fernandes Cardoso
Filho, Raquel Fernandes Garcia
CAPÍTULO 56
ASSISTÊNCIA À MULHER VÍTIMA DE VIOLÊNCIA .............................................................................................399
Maria de Lourdes Caltabiano Magalhães, Eulália Diógenes Almeida, Gabriela Nasser Louvrier
CAPÍTULO 57
INFERTILIDADE CONJUGAL: PRINCIPAIS CAUSAS E IMPLICAÇÕES ...........................................................409
Francisco das Chagas Medeiros, Liana Ferreira Alencar Silva
CAPÍTULO 58
EXAMES DE IMAGEM NA CLÍNICA GINECOLÓGICA ........................................................................................415
Randal Pompeu Ponte, José de Arimatea Barreto, Rodrigo Randal Pompeu Sidrim, Tiago Toscano Cavalcante
CAPÍTULO 59
HISTEROSCOPIA – INDICAÇÕES ..............................................................................................................................421
Francisco das Chagas Medeiros, Igor Siqueira Cavalcante, Rodrigo Carvalho Barroso
CAPÍTULO 60
VIDEOLAPAROSCOPIA EM GINECOLOGIA ...........................................................................................................427
Francisco das Chagas Medeiros, Priscila Lopes Studart da Fonseca
CAPÍTULO 61
OBESIDADE NA CLÍNICA GINECOLÓGICA ...........................................................................................................437
Maria José Araújo Gomes Cerqueira, Adriana Paiva Marques Lima, Camilla Viana Goes Arrais
CAPÍTULO 62
PROGRAMA DE PREVENÇÃO DA OSTEOPOROSE ............................................................................................441
Sheila Márcia de Araújo Fontenele, Andréa Edwirges Pinheiro de Menezes Barreto
CAPÍTULO 63
PROGRAMA DE PREVENÇÃO DO CÂNCER DE MAMA ...................................................................................449
Paulla Vasconcelos Valente, Diego de Queiroz Tavares Ferreira, Raissa Quezado da Nóbrega
CAPÍTULO 64
PROGRAMA DE PREVENÇÃO DO CÂNCER DE COLO DO ÚTERO ..............................................................455
Luciano Silveira Pinheiro, Denise Neiva Santos de Aquino
CAPÍTULO 65
VACINAS NA ADOLESCÊNCIA....................................................................................................................................463
Olga Vale Oliveira Machado, Maria de Lourdes Caltabiano Magalhães, Aline Tereza Carneiro Montenegro
Prefácio
Os cursos de Medicina tradicionais e aqueles surgidos nas duas últimas décadas no Brasil
têm vivido uma verdadeira profusão de novas metodologias e modelos pedagógicos consequen-
tes, tanto ao desenvolvimento da tecnologia (e da informática, em particular), como da necessida-
de de “ajustar” a formação médica ao modelo de saúde pública adotado no nosso país, tudo isso
acrescido da necessidade de formar bons profissionais dentro de um prazo limitado (seis anos) a
partir de um conhecimento científico que cresce em proporções exponenciais.
Os novos modelos pedagógicos propostos para a graduação em Medicina têm procurado
“otimizar” a interconexão das disciplinas básicas com as várias disciplinas aplicadas à clínica e
à cirurgia, facilitando a integração do conhecimento e a abordagem do binômio saúde-doença
com ênfase na pessoa a partir dos seus aspectos social, psíquico, físico e econômico. Tais avan-
ços, entretanto, não se fizeram acompanhar pela editoração de compêndios que contemplassem
essa nova realidade.
O livro Ginecologia Baseada em Problemas representa um marco nesse novo paradigma do
ensino médico – aborda os principais temas da Ginecologia de forma objetiva, estruturada e atual,
a partir dos objetivos de aprendizagem extraídos dos problemas que simulam as situações mais
prevalentes relacionadas à saúde da mulher brasileira. Indispensável registrar a relevância dos ca-
pítulos que abordam a sexualidade nas várias fases da vida, bem como aqueles que enfocam um
grave problema de saúde pública – a violência contra a mulher.
O livro é igualmente inovador em um outro aspecto marcante – cada capítulo foi editado
por professores experientes em coautoria com estudantes de Medicina que já haviam cursado a
disciplina de Ginecologia – o que ensejou o surgimento de um texto com fácil assimilação sem a
perda da qualidade e da adequada profundidade necessárias para a boa formação de um médico
generalista de excelência.
24 Faculdade Christus
Capítulo 1
sacroilíacos interósseos e posteriores fazem jacentes unindo os corpos dos ossos púbis no
parte da massa de tecido fibroso responsável plano mediano. O ligamento púbico superior
pela transferência do peso do esqueleto axial une as faces superiores dos corpos do púbis e
para os dois ílios e destes para esqueleto apen- disco interpúbico, estendendo-se lateralmente
dicular. Os ligamentos iliolombares são acessó- até os tubérculos púbicos. O ligamento púbico
rios desse mecanismo. inferior (arqueado) une as faces inferiores dos
componentes articulares.
O ligamento sacroespinhal insere-se na es-
pinha isquiática. Superiormente à espinha, a inci- As vértebras L5 e S1 articulam-se na sín-
sura isquiática maior é transformada em forame fise intervertebral anterior e nas duas articula-
pelo ligamento sacroespinhal que dá passagem ções dos processos articulares; os ligamentos
ao músculo piriforme, aos vasos e nervos glúteos iliolombares fortalecem essas articulações.
superiores e inferiores, aos nervos isquiático e
A articulação sacrococcígea é formada
cutâneo posterior da coxa, aos vasos e nervos pu-
por uma fibrocartilagem e os ligamentos sacro-
dendos internos, e aos nervos para o obturatório
coccígeos anteriores e posteriores.
interno e quadrado do fêmur. Inferiormente à es-
pinha, a incisura isquiática menor é transformada Até os 10 anos de idade existe um único
pelos ligamentos sacrotuberal e sacroespinhal em tipo de pelve para ambos os sexos, a antropói-
forame que dá passagem ao tendão do obturató- de. Após essa idade, iniciam-se as diferenças
rio interno, ao nervo que supre este músculo e aos sexuais, que se tornam evidentes entre 16 e 18
vasos e nervos pudendos internos. anos. Geralmente, nos homens, a pelve se torna
antropoide ou androide e nas mulheres forma-
A sínfise púbica consiste em um disco
-se a pelve ginecoide.
interpúbico fibrocartilagíneo e ligamentos ad-
Faculdade Christus 25
Capítulo 1
26 Faculdade Christus
Capítulo 1
Faculdade Christus 27
Capítulo 1
28 Faculdade Christus
Capítulo 1
Faculdade Christus 29
Capítulo 1
30 Faculdade Christus
Capítulo 1
pálidas e úmidas devido à secreção das glândulas canal pudendo e chegando ao períneo abaixo do
de Bartholin e das parauretrais de Skene. túber isquiático, onde se ramificam.
A artéria pudenda interna, ramo da artéria Os linfáticos estão distribuídos em dois
ilíaca interna, é a principal artéria da vulva, dividin- grupos: o superior, que recolhe a linfa do clitóris e
do-se em ramos perineais, perianais, retais inferio- do vestíbulo, drenando para os linfonodos femo-
res, dorsal do clitóris e labiais posteriores. A iner- rais, e o inferior que abrange fúrcula, grandes lá-
vação provém principalmente do nervo pudendo, bios, pequenos lábios e vestíbulo, drenando para
que acompanha os vasos pudendos internos por os linfonodos inguinais superficiais e femorais.
baixo do ligamento sacrotuberal, passando pelo
Faculdade Christus 31
Capítulo 1
32 Faculdade Christus
Capítulo 1
Faculdade Christus 33
Capítulo 1
34 Faculdade Christus
Capítulo 2
SEMIOLOGIA GINECOLÓGICA
Francisco das Chagas Medeiros
Rálison Yure Soares Melo
entre a satisfação da paciente com os médi- Após o exame físico comece o contato tera-
cos que demonstram capacidade e vontade pêutico somente quando a paciente estiver
de se comunicar com elas. completamente vestida.
b) Benefícios para a prática: As estraté-
gias para melhorar a comunicação com a
1.5. Monitore sua linguagem corporal
paciente podem produzir uma maior efi-
cácia na prática. Por exemplo, perguntar Uma boa comunicação contém elemen-
às pacientes sobre suas preocupações e tos verbais e não verbais. A linguagem corporal
permitir que elas concluam suas declara- geralmente tem mais significado para o pacien-
ções, aumenta em pouco tempo a con- te do que a linguagem falada.
sulta, enquanto aumenta enormemente Mantenha a área do peito aberta e os braços des-
a possibilidade de adquirir informações cruzados para evitar a formação de uma barreira
dos pacientes. à comunicação, assim como o corpo relaxado.
c) Uma melhor retenção de informação pelos Olhe sempre para a paciente.
pacientes e as reduções nas queixas de ne- Mantenha uma postura fletida em direção à
gligência são benefícios adicionais das prá- paciente e uma distância apropriada.
ticas que têm sido associadas com a comu- Evite olhar para a paciente por cima dos olhos,
nicação eficaz médico-paciente. pois pode demonstrar superioridade; retirar
os óculos pode demonstrar interesse.
1.3. Estratégias práticas para o ambiente clí- Continue focado na paciente que pode lhe estar
nico atual falando algo importante para o caso em questão.
36 Faculdade Christus
Capítulo 2
Faculdade Christus 37
Capítulo 2
38 Faculdade Christus
Capítulo 2
tro quadrantes, esses são limitados por duas O exame inicia-se com a inspeção estática; para
linhas imaginárias que passam pelo mamilo de isso, a paciente deve estar sentada com os bra-
forma perpendicular, formando-se assim o qua- ços paralelos ao corpo; é necessário que as duas
drante superior externo e interno e o quadrante mamas estejam descobertas, pois é fundamen-
inferior externo e interno. tal a comparação de uma mama com a outra. O
médico descreve as mamas quanto à forma, ao
volume, a simetria, aos contornos, a cor, ao pa-
drão venoso, a presença de mamas supranume-
rárias e edema. Os mamilos e aréolas são des-
critos quanto ao tamanho, à forma, à simetria, à
inversão, à eversão e a descargas. Inicia-se en-
tão a inspeção dinâmica; nessa etapa solicita-se
à paciente que pressione suas mãos contra o
quadril; com essa manobra podemos perceber
melhor se há alguma retração mamária. Depois,
pede-se à paciente para levar as mãos até a ca-
Figura 1- Frequência de câncer mamário beça; com isso podemos perceber melhor se há
nos respectivos quadrantes. alguma massa; a paciente é orientada a ficar em
uma posição fletida com o intuito de deixar as
Para iniciar o exame clínico das mamas é mamas pêndulas; com isso, veem-se melhor as
necessário explicar o procedimento a paciente. retrações, caso existam.
5.1.1. Exame dos linfonodos culo peitoral. A palpação começa na região mais
inferior e à medida que o médico movimenta o
A paciente deve ser informada sobre o
braço da paciente mais para medial, a palpação
procedimento e permanecer sentada de fren-
vai subindo para uma posição mais superior. As
te para o médico; para palpar a axila esquerda
regiões supra e infraclaviculares também são
o médico deve segurar o antebraço esquerdo
palpadas. Essa palpação busca principalmente a
da paciente com a mão esquerda enquanto a
presença de linfonodos, tendo em vista que a
direito palpa a região, esse tipo de posiciona-
região axilar é um sítio frequente de metástase
mento facilita a palpação porque relaxa a mús-
de cânceres mamários.
Faculdade Christus 39
Capítulo 2
40 Faculdade Christus
Capítulo 2
Profunda: é realizada a fim de identificar áreas 5.4.2. Inspeção do meato uretral e vestíbulo
dolorosas e massas. Percussão: é uma forma de vaginal
complementar a palpação; com ela, é possível
O médico avalia a presença de pus ou
distinguir tumores sólidos, lesões císticas ou
secreção; se estiver presente busca a fonte. O
alças intestinais através dos sons maciços ou
material deve ser colhido e espalhado sobre
timpânicos. Por fim, a ausculta visa identificar
uma lâmina para posterior análise. Massas e si-
os ruídos hidro-aéreos assim como sopros. Na
nais flogísticos também são pesquisados, assim
ginecologia, pode ser utilizada ainda para dife-
como pólipos ou fístulas.
renciar uma massa de uma gravidez.
Para a realização do exame pélvico, é O médico deverá estar utilizando luvas lu-
necessário que o médico trate a paciente com brificadas. A glândula do lábio direito deve ser
respeito. O médico deve ter o cuidado de expli- palpada com a mão direita, o dedo indicador
car como será o procedimento. Para a realiza- é colocado na vagina e o polegar fica fora; a
ção desse exame, a paciente pode ficar em uma glândula esquerda deve ser palpada com a mão
mesa ginecológica na posição litotômica, essa esquerda. O normal é que elas não sejam vistas
posição é obtida da seguinte forma, solicita-se nem palpadas, qualquer sensibilidade na região
à paciente que fique em decúbito dorsal com deve ser notada e caracterizada. O médico após
os glúteos próximo ao fim da mesa, os pés são palpar a glândula deve pedir à paciente que
colocados nos apoios, as coxas fletidas sobre o aperte o óstio vaginal contra seus dedos com o
quadril com o intuito de reduzir a tensão dos intuito de avaliar a musculatura vaginal.
músculos abdominais; os joelhos são fletidos e
afastados o máximo possível.
5.4.4. Distopias genitais
Enquanto o médico deprime o períneo e
5.4. Genitália externa separa os grandes lábios, solicita-se à pacien-
Na inspeção, o médico atenta para os te que tussa ou faça força para baixo; com isso,
pelos pubianos em relação a sua distribuição pode-se notar se há abaulamento nas paredes
(androide ou ginecoide), a quantidade e as suas vaginais em decorrência da descida de algum
características. Inspeciona e palpa os grandes e órgão; por exemplo, um abaulamento na pare-
pequenos lábios, descrevendo a cor, simetria, de vaginal anterior pode ser decorrente de que-
tamanho, forma, se há descarga, corrimento, si- da da bexiga. Nesse caso, temos uma cistocele,
nais flogísticos e escoriações. outros exemplos são: uretrocele, retocele.
5.4.5. Inspecione o períneo e o ânus
A inspeção busca identificar tumores, ci-
catrizes, sinais flogísticos, fissuras e fístulas. Já
no ânus buscam-se hemorróidas, sinais flogísti-
cos e fissuras. É necessário descrever as caracte-
rísticas da pele de ambas as estruturas.
Faculdade Christus 41
Capítulo 2
maioria das mulheres), e o de Pedersen, em que enquanto os dedos esquerdos indicador e médio
as valvas são mais estreitas e achatadas, esse tipo separam os lábios e deprimem o períneo. O espé-
é utilizado em mulheres com o introito vaginal pe- culo é inserido fechado e calmamente até o fundo
queno. Há também o espéculo feito de plástico, da vagina; quando chegar nessa posição, o espé-
mas que são pouco utilizados no Brasil. culo deve ser rodado de volta à horizontal de tal
forma que o cabo fique apontando para baixo. O
médico vai abrindo calmamente o espéculo; com
5.5.2. Inserindo o espéculo isso, é possível visualizar a cérvice e a vagina.
O médico deve falar com a paciente ex-
plicando o procedimento que irá realizar, deve
5.5.3. Inspeção do colo uterino
apresentar-lhe o espéculo e encostá-lo na perna
dela, para que ela possa sentir a temperatura do A inspeção do colo uterino verifica a cor, posi-
instrumento. O médico deve inserir o espéculo ção, tamanho, características da superfície, ulcerações,
em um ângulo de 45 graus em relação à vertical; massas, sinais flogísticos, corrimento, tamanho e for-
o espéculo deve estar na mão direita do médico, ma do orifício externo do colo. Colher papanicolaou.
Colo padrão, normal, com Exame especular mostran- Colo uterino eliminando Câncer de colo uterino
muco límpido periovulatório do pólipo cervical pus, sugestivo de cervicite (NIC 3)
42 Faculdade Christus
Capítulo 2
A palpação bimanual então ocorre da seguinte Com exceção dos ovários, as outras estruturas
forma: a mão direita empurra os órgãos e a es- anexiais não são dolorosas à palpação, após ter-
querda apalpa. minar um lado, apalpe o outro lado. Palpe os
ligamentos uterosacrais e o fundo de saco de
Douglas no fórnice posterior. Após retirar as lu-
vas, o médico deve analisar se há alguma secre-
ção ou sangue na luva.
O médico empurra a cérvice superior e LÓPEZ, M. Anamnese. In: MARIO LÓPEZ, MEDEI-
posteriormente, dessa forma ele é mais bem ROS, J.L. Semiologia médica as bases do diag-
palpado. O útero é então sentido entre as duas nóstico clínico. Rio de janeiro: Revinter, 2004.
mãos e é descrito quanto à localização, ao ta- p. 23-38.
manho, a forma e contornos, a consistência, a
MACHADO, L.V. Ginecologia. In: MARIO LÓPE-
mobilidade e a sensibilidade.
ZA, MEDEIROS, J.L. Semiologia médica as ba-
ses do diagnóstico clínico. Rio de janeiro: Re-
5.6.3. Palpação dos anexos vinter, 2004. p. 958-976.
A mão direita é dirigida para o fórnice es- MEDEIROS, J.L. Exame físico. In: MARIO LÓPEZ,
querdo ou direito e a mão esquerda é dirigida MEDEIROS, J.L. Semiologia médica as bases
para o quadrante inferior esquerdo ou direito, do diagnóstico clínico. Rio de janeiro: Revinter,
dependo de qual lado será palpado primeiro. A 2004. p. 49-55.
palpação busca a presença de massa; no entan-
SILVA, M.J.P. O papel da comunicação na huma-
to, é necessário descrever o tamanho, a forma,
nização da atenção à saúde. Bioética, v.10 n.2,
a consistência, a mobilidade e a sensibilidade.
p.73-88, 2002.
Faculdade Christus 43
Capítulo 2
44 Faculdade Christus
Capítulo 3
FARMACOLOGIA APLICADA À
PRÁTICA GINECOLÓGICA
Manoel Cláudio Azevedo Patrocínio
Paulla Sátiro Timbó
Thiago Emannoel Nogueira Ramos
a todos os β-lactâmicos. Bactérias gram-nega- tos. A penicilina G atinge rapidamente sua con-
tivas também podem reduzir a penetração dos centração máxima no plasma, porém também
β-lactâmicos por meio da redução do número é rapidamente excretada. Então, para prolongar
de porinas por onde o fármaco penetra ou por sua permanência no corpo e reduzir o número
meio de bombas de efluxo que transportam de aplicações são utilizadas as preparações de
β-lactâmicos do periplasma de volta à mem- depósito, que incluem as penicilinas procaína e
brana externa. Os β-lactâmicos não têm efeito benzatina que têm administração intramuscular
em bactérias que não possuem peptidoglicano (IM) e são formuladas para retardar sua absor-
como Mycoplasma e Chlamydia e como não pe- ção, resultando em concentrações sanguíneas
netram bem no interior das células não afetam relativamente mais baixas, porém persistentes.
micro-organismos que são parasitos intracelu- A penicilina G procaína quando administrada
lares como Rickettsia e Legionella. em grandes doses pode levar a concentrações
tóxicas de procaína no plasma.
O espectro de ação inclui cocos gram-po-
XX Penicilinas
sitivos e negativos sensíveis como estreptoco-
As penicilinas consistem em um anel tia-
cos (mas S.pneumoniae e S. viridans resistentes
zolidina ligado a um β-lactâmico modificado por
à penicilina estão se tornando mais comuns),
cadeia lateral variável que confere propriedades
estafilococos não produtores de β-lactamases,
farmacológicas e espectro de ação variável en-
espécies de enterococos (mas é cada vez mais
tre as penicilinas. Possuem ampla distribuição
comum enterococos resistentes a β-lactâmicos)
nos tecidos e líquidos corporais e geralmente
e meningococo (a N. gonorrhoeae que no pas-
têm absorção rápida atingindo sua concentração
sado era sensível, hoje tem a maioria das cepas
máxima no plasma usualmente dentro de uma
resistentes). Também têm ação contra bastone-
hora e meia-vida curta entre 30-90min e a dose
tes gram-positivos, anaeróbios gram-positivos
deve ser ajustada de acordo com a função renal
(exceto C.difficile) e gram-negativos não produ-
(também com a função hepática caso haja insu-
tores β-lactamases (a maioria das cepas de B.
ficiência renal). A absorção via oral (VO) de peni-
fragilis é resistente) e espiroquetas.
cilinas é afetada por alimentos os quais devem
ser administradas por esta via 1-2 horas antes Na prática ginecológica a penicilina G
ou depois de o paciente se alimentar (exceto a benzatina administrada por via IM é a droga de
amoxicilina). São classificadas de acordo com seu escolha contra a sífilis.
espectro de atividade antimicrobiana em: Penici-
lina G, Penicilinas antiestafilocócicas, aminopeni-
cilinas e Penicilinas de espectro expandido. Penicilinas antiestafilocócicas
São representantes dessa classe a oxacili-
As reações adversas são relativamente
na, cloxacilina, dicloxacilina, nafcilina, meticilina
comuns, estimando-se que 3 a 10% das pesso-
(esta não é mais utilizada). Essa classe tem re-
as são alérgicas a esses agentes. Pessoas alér-
síduos volumosos em suas cadeias laterais que
gicas a uma penicilina devem ser consideradas
evitam sua ligação com as β-lactamases. As indi-
alérgicas a todas as penicilinas, e alergia cruza-
cações clínicas limitam-se ao tratamento de in-
da pode se estender a outros β-lactâmicos. Os
fecções ocasionadas por estafilococos produto-
efeitos adversos mais comuns são reações de
res de β-lactamases (grande maioria das cepas),
hipersensibilidade. As manifestações de alergia
porém já existem cepas de S. aureus e S. epider-
à penicilina incluem: febre, distúrbios hema-
midis que são resistentes ao grupo da meticili-
tológicos, doença do soro, nefrite intersticial,
na. Caso o antibiograma indique que o agente
erupções cutâneas de todos os tipos, vasculites,
é susceptível à penicilina G este deve ser usado
dermatite esfoliativa, eritema multiforme exsu-
como agente preferencial. Em infecções graves
dativo, angioedema e anafilaxia. Destas, a mais
por estafilococos, estas penicilinas devem ser
temida é a anafilaxia; contudo, é rara.
administradas apenas por via endovenosa (EV).
Essa classe apresenta excreção hepática não ne-
cessitando de ajuste na insuficiência renal.
Penicilina G
Possui três apresentações: cristalina, pro- Na pratica ginecológica, são utilizadas no
caína e benzatina. Devido à instabilidade em pH tratamento de mastites, infecções de tecidos mo-
ácido, não há apresentação oral destes compos- les, pele e sepse causadas por S. aureus sensíveis.
46 Faculdade Christus
Capítulo 3
Faculdade Christus 47
Capítulo 3
vas e a cada geração se tem uma atividade mais fluenzae. A cefoxitina deve ser utilizada apenas
ampla contra bactérias gram-negativas. profilaticamente, pois pode induzir a produção
de β-lactamases cromossômicas que podem hi-
As cefalosporinas têm como atrativo sua
drolisar outras cefalosporinas de segunda e ter-
pequena toxicidade. Os efeitos colaterais mais
ceira gerações.
comuns são reações de hipersensibilidade a ce-
falosporinas, idênticas às das penicilinas, mas Na prática ginecológica, as cefalospori-
raramente estes agentes causam reação de hi- nas de primeira e segunda geração podem ser
persensibilidade imediata (exantema, urticária utilizadas no tratamento de ITUs, no tratamen-
e a reação adversa mais temida a anafilaxia). to de infecções de pele ou de tecidos moles
Cerca de 5% dos indivíduos alérgicos à penici- e na profilaxia cirúrgica. A cefalexina também
lina também têm reação às cefalosporinas, de pode ser usada no tratamento ambulatorial da
forma que indivíduos com história de reação mastite. As cefamicinas podem ser utilizadas
de hipersensibilidade imediata grave à penicili- associadas à doxiciclina no tratamento paren-
na não devem ser tratados com cefalosporinas. teral da DIP.
Cefotetano e cefoperazona podem causar hipo-
proteinemia, distúrbios hemorrágicos e quando
usados com álcool podem causar reações gra- Terceira geração
ves do tipo dissulfiram. Esse grupo inclui cefoperazona, cefota-
xima, ceftazidima, ceftizoxima, ceftriaxona, ce-
fixima, cefpodoxima proxetil, cefditoreno, cef-
Primeira geração tibuteno e moxalactama. Apresentam maior
Esse grupo inclui cefadroxil, cefazolina, ce- resistência à β-lactamases e têm maior pene-
falexina, cefalotina, cefapirina e cefradina. Essas tração na membrana externa das bactérias. Re-
drogas são muito ativas contra cocos aeróbios têm atividade significativa contra estreptoco-
gram-positivos como estreptococos e estafiloco- cos e em comparação com cefalosporinas de
cos, mas têm atividade limitada contra as bacté- segunda geração apresentam maior atividade
rias anaeróbias e contra as gram-negativas, ape- e espectro de ação contra bactérias gram-ne-
sar disso algumas cepas de E. coli, K. pneumoniae gativas, incluindo muitas enterobactérias. Tam-
e Proteus mirabilis são susceptíveis. Dentre as de bém possuem atividade contra espiroquetas. A
administração parenteral, a cefazolina é preferi- ceftizoxima e o moxalactama são os únicos que
da, pois pode ser administrada com menor fre- apresentam atividade contra um número sig-
quência. A cefalotina e a cefapirina causam dor nificativo de bactérias anaeróbias (incluindo B.
quando administradas por via IM, portanto cos- fragilis). A ceftazidima e a cefoperazona são as
tumam ser administradas via EV. únicas cefalosporinas de 3º geração que apre-
sentam atividade contra P. aeruginosa, porém
apresentam atividade limitada contra gram-
Segunda geração -positivos em comparação com outras cefalos-
Esse grupo inclui cefaclor, cefamandol, porinas de terceira geração. A cefoperazona e a
cefonicida, cefuroxima, cefprozil, loracarbef, ceftriaxona não necessitam de ajuste da droga
ceforanida e as cefamicinas (o que inclui ce- de acordo com a função renal e a ceftriaxona é
foxitina, cefmetazol e cefotetano). As cefalos- notável por sua longa meia-vida.
porinas de segunda geração em geral são tão
Na prática ginecológica, as cefalospori-
ativas quanto os agentes de primeira geração,
nas de terceira geração são utilizadas no tra-
enquanto que as cefamicinas têm atividade li-
tamento de ITU complicadas, na sepsemia, e
mitada contra este grupo de bactérias, contudo
quando associadas à doxiciclina no tratamento
são mais ativas contra bactérias anaeróbicas,
ambulatorial da DIP. A ceftriaxona também é
especiamente B. fragilis. As cefalosporinas de
utilizada contra cancro mole, infecção de fa-
segunda geração, em comparação com as de
ringe, cérvice, uretra, reto e disseminada por
primeira, têm maior atividade contra bactérias
gonococo, e é uma alternativa no tratamento
aeróbias gram-negativas, de forma que além
da sífilis. A cefixima também pode ser utilizada
de maior potência contra enterobactérias que
contra cervicites e uretrites por gonococo. O
poderiam ser susceptíveis as de primeira gera-
ministério da saúde recomenda tratar simulta-
ção, também têm ação contra Neisseria spp e as
neamente gonorreia e chlamydia.
cefalosporinas também são ativas contra H. in-
48 Faculdade Christus
Capítulo 3
Faculdade Christus 49
Capítulo 3
molécula é grande (mas bem menor que a da administração desse fármaco no final da gravidez
vancomicina, conseguindo passar pelos poros da pode resultar em seu acúmulo no plasma fetal e
membrana externa de gram-negativos) e polar, a no líquido amniótico, de forma que durante a gra-
carga positiva permite que ele se ligue à mem- videz devem ser usados apenas em situações es-
brana externa (que tem carga negativa) causan- peciais. Recomenda-se que sejam administrados
do orifícios transitórios através dos quais o an- em dose única e que sua concentração plasmática
tibiótico se movimenta. Para atingir seu alvo, o seja monitorada, devido aos efeitos adversos que
ribossomo bacteriano, ele ainda precisa penetrar podem causar. São quase totalmente excretados
a membrana citoplasmática da bactéria, proces- pelos rins de forma que a dose deve ser ajustada
so que depende do transporte de elétrons que de acordo com a função renal.
gera um potencial de ação (com eletronegativi-
Todos os aminoglicosídeos podem induzir
dade no interior da membrana) que impulsiona
toxicidade renal, vestibular e coclear, sendo que
o transporte deste fármaco. Situações de anae-
a toxicidade dos aminoglicosídeos tem maior
robiose ou acidez (como ocorre em abscessos)
probabilidade de ocorrer quando houver con-
comprometem a capacidade da bactéria de
centrações persistentemente elevadas no plas-
manter o potencial de membrana e assim com-
ma, quando administrados com fármacos que
prometem o transporte do antibiótico.
também sejam tóxicos para essas estruturas, em
Os aminoglicosídeos estão entre os an- pacientes com comprometimento pré-existente
tibióticos mais antigos, mas ao contrário da dessas estruturas e em pacientes idosos.
penicilina têm mantido sua eficácia. Quando
A ototoxicidade é em grande parte irrever-
ocorre resistência pode ser resultado de: acú-
sível. Quando a lesão é coclear, cursa com zumbi-
mulo diminuído na bactéria (provavelmente
do e perda auditiva. Quando a lesão é vestibular,
devido a bombas de efluxo), alteração da es-
cursa com vertigem, perda de equilíbrio e ata-
trutura do ribossomo de forma que o amino-
xia. O comprometimento renal é quase sempre
glicosídeo não consegue mais se ligar (esse
reversível após a suspensão da droga e decorre
mecanismo é comum para a estreptomicina,
da concentração de aminoglicosídeos nas células
mas é raro para os outros membros da classe) e
tubulares renais. A toxicidade renal é mais prová-
a produção de enzimas que modificam a droga
vel quando administrada em cursos mais prolon-
de forma que ela não mais consegue se ligar
gados. Reações de hipersensibilidade são raras.
ao ribossomo, que é o mecanismo mais im-
portante. Eles têm excelente atividade contra Na prática ginecológica, utiliza-se os
bacilos gram-negativos aeróbicos (incluindo P. aminoglicosídeos associados a outros agentes
aeruginosa e enterobactérias), mas têm ação li- para infecções graves por bactérias aeróbicas.
mitada contra gram-positivos aeróbicos e não A gentamicina associados à ampicilina nas ITUs
têm ação contra anaeróbicos. Recomenda-se complicadas e associadas à clindamicina no tra-
que os aminoglicosídeos sejam utilizados com tamento hospitalar de DIP.
outros agentes ativos mesmo contra cepas
bacterianas sensíveis. Estreptomicina, amicaci-
na, neomicina são ativas contra algumas mi- XX Clindamicina
cobactérias. Gentamicina e tobramicina têm A clindamicina, introduzida em 1966, é
o mesmo espectro de ação. Enterococos são um derivado sintético da lincomicina. Apresenta
resistentes à tobramicina e à amicacina (mes- estrutura distinta das penicilinas, com um ami-
mo quando combinadas a agentes sinérgicos). noácido ligado a um açúcar amino.
A amicacina e netilmicina são mais resistentes A clindamicina liga-se à subunidade 50s
às enzimas inativadoras de aminoglicosídeos, dos ribossomos bacterianos e inibe a síntese de
sendo utilizadas em infecções graves por baci- proteína. Dependendo do microorganismo, age
los gram-negativos resistentes à gentamicina. como bactericida ou bacteriostática. O mecanis-
Por serem cátions polares não são absor- mo de ação é semelhante aos dos macrolídeos
vidos pelo TGI. Quando instilados em cavidades e do cloranfenicol.
com superfícies serosas ou quando aplicados to- O espectro de atividade inclui bactérias
picamente por período prolongado sobre solu- gram-positivas aeróbicas, como muitos estrep-
ções de continuidade muco-cutâneas pode ocor- tococos e estafilococos, e bactérias anaeróbicas
rer absorção rápida e toxicidade inesperada. A tanto gram-positivas e gram-negativas, incluin-
50 Faculdade Christus
Capítulo 3
do B. fragilis e C. perfringens. Não apresenta uti- local, mas tem um aquilaril adicional que se liga
lidade para gram-negativos, pois sua membra- ao outro local diferente no ribossomo.
na externa não permite a penetração da droga.
São agentes de amplo espectro de ação
Níveis séricos adequados são atingidos sendo eficazes contra alguns estafilococos e
após administração oral, IM ou EV. Atravessa estreptococos, bactérias atípicas e algumas mi-
rapidamente a barreira placentária. Apresenta cobactérias e espiroquetas. Bacilos gram-nega-
metabolização hepática e excreção na urina, tivos aeróbicos são resistentes, mas algumas ce-
na bile e em pequena quantidade nas fezes. A pas de Haemophilus, Neisseria e Bordetella são
dose oral de clindamicina para adultos é de 150 suscetíveis. A telitromicina é ativa contra cepas
a 300mg, a cada 6 h e para tratamento de infec- de S. pneumoniae, S. aureus e S. pyogenes resis-
ções graves é de 300 a 600mg a cada 6h. tentes a macrolídeos.
A principal toxicidade da clindamicina é o Apresenta absorção incompleta no intesti-
desenvolvimento de colite pseudomenbranosa no delgado, podendo ser retardada pelo alimen-
causada pelo C. difficile, pois essa destrói mui- to que aumenta a secreção de suco gástrico. A
tos componentes da flora normal do intestino, principal forma de eliminação é a biliar. A dose
permitindo o crescimento do agente causador. oral de eritromicina para adultos varia de 1 a 2g/
Seu uso está associado também à diarreia não dia fracionadas em 4 doses e a administração IM
causada por C. difficile e à erupções cutâneas mais é contra-indicada pela dor no local da injeção.
frequentes em pacientes HIV positivos. Outras
Os macrolídeos são considerados drogas
reações menos comuns são síndrome de Ste-
seguras, causando apenas algumas reações ad-
vens-Johnson, elevação dos níveis de enzimas
versas leves como febre, eosinofilia, erupções
hepáticas (ALT e AST), granulocitopenia, trom-
cutâneas e sintomas gastrointestinais. A hepa-
bocitopenia, reações anafiláticas e tromboflebite
tite colestática é o efeito colateral mais notável.
local quando há administração intravenosa.
O uso clínico em ginecologia é indicado
A clindamicina não constitui uma droga
para portadores de C. trachomatis, H. ducreyii e
de primeira escolha, mas uma opção terapêu-
uma alternativa para tratamento da sífilis.
tica para pacientes alérgicos à penicilina. Na
prática ginecológica, é utilizada no tratamento
de vaginose bacteriana, vaginite inflamatória e XX Tetraciclinas e Glicilciclinas
doença inflamatória pélvica. Este grupo é composto pela tetraciclina,
doxiciclina e minociclina e a estrutura quími-
ca consiste em quatro anéis fundidos com seis
XX Macrolídeos e cetolídeos
elementos. A tigeciclina é um membro de uma
O grupo dos macrolídeos consiste na eri-
classe relacionada com estrutura semelhante
tromicina descoberta em 1952 e na claritromi-
apenas com a diferença da adição de um grupo
cina e azitromicina, seus derivados semissintéti-
glicilamido ao anel terminal de seis elementos
cos. Possuem uma estrutura química, diferente
no núcleo das tetraciclinas.
das cefalosporinas e das penicilinas, com um
anel lactona macrocíclico. A telitromicina é um São antibióticos bacteriostáticos, pois
novo fármaco disponível de uma classe estrutu- agem inibindo a síntese de proteínas bacte-
ralmente relacionada os cetolídeos, entretanto rianas através de sua interação a subunidade
com espectro de ação aumentado. 30s do cromossomo bacteriano na qual impe-
dem a ligação de moléculas RNAt carregadas
Os macrolídeos são bacteriostáticos que
de aminoácidos.
impedem síntese de proteínas através da liga-
ção à subunidade 50s no cromossomo bacteria- A resistência às tetraciclinas pode ocorrer
no. A resistência a esse grupo está se tornando por diminuição do acúmulo do antibiótico, por
comum e resulta de um dos mecanismos: efluxo aquisição de genes que codificam bombas de
do fármaco por um mecanismo ativo de bom- efluxo, por genes que codificam proteínas prote-
ba; produção de enzimas que alteram o local de toras de ribossoma ou por inativação enzimática.
ligação do fármaco; mutação do local de liga- A diferença estrutural da tigeciclina evita que ela
ção no ribossomo e hidrólise dos macrolídeos sofra a ação de bombas de efluxo bacterianas,
por enzimas produzidas por determinadas bac- tornando seu espectro de ação bastante amplo.
térias. A telitromicina age também no mesmo
Faculdade Christus 51
Capítulo 3
A classe é ativa contra algumas bactérias A classe apresenta boa absorção após ad-
gram-positivas aeróbicas, gram-negativas aeró- ministração oral, sofrendo influência do alimento.
bicas e espiroquetas, mas sua maior atividade é São excretadas predominante pelo rim, entretan-
contra bactérias atípicas. to moxifloxacino e pefloxacino são metaboliza-
dos pelo fígado. Em adultos, as doses orais são
A absorção da maioria das tetraciclinas
de 200 a 750 mg a cada 12hs dependendo da
é incompleta, sendo sua maior parte no estô-
droga utilizada e norfloxacino e cirofloxacino
mago e na parte superior do intestino delgado
apresentam meia-vida de 3 a 5 horas.
ocorrendo mais em jejum. Atravessam a placen-
ta e são encontradas na circulação fetal e no O uso terapêutico na prática ginecológica
leite materno. A principal via de eliminação é é para pacientes com N. gonorrhoeae, C. tracho-
renal, mas também biliar. matis e H. ducreyi, sendo utilizada também para
uretrite e cervicite.
Todas as tetraciclinas apresentam como efei-
to adverso irritação gastrintestinal. A colite pseudo- Em geral, são drogas de baixa toxicidade,
menbranosa é uma complicação potencialmente sendo seus efeitos adversos mais comuns sinto-
fatal. Podem ocasionar fotossensibilidade e toxici- mas gastrointestinais. Pode apresentar também
dade hepática e renal. Não devem ser administra- como efeitos colaterais cefaléia leve e tonteira
das a mulheres grávidas e a crianças menores de 8 e, raramente, alucinações, delírios e convulsões
anos, pois levam a pigmentação dos dentes. em pacientes que recebiam teofilina ou AINEs.
Podem ocorrer exantema e, em idosos, há re-
Na clínica ginecológica é muito utilizada no
latos de ruptura do tendão de Aquiles. É con-
tratamento de infecções C. trachomatis e N. gonor-
traindicado o uso em grávidas e crianças, pois
rhoea e terapêutica alternativa para T. pallidum.
em animais jovens causam anomalias cartilagi-
nosas. O uso foi associado também a prolonga-
XX Quinolonas mento do intervalo QT.
A primeira quinolona disponível foi o
ácido nalidíxico, um subproduto da síntese da
XX Sulfonamidas e Sulfametoxazol-trimetropima
cloroquina. Todos os representantes da clas-
As sulfas foram um dos primeiros qui-
se apresentam uma estrutura química com um
mioterápicos utilizados para tratamento de in-
núcleo com estrutura dupla, no qual foi adicio-
fecções no homem no início do século XX. O
nada uma fluorina propiciando um aumento da
surgimento de novos antibióticos e o desenvol-
potência, surgindo assim as fluorquinolonas,
vimento crescente de resistência levaram as sul-
como ciprofloxcina, levofoxacina, ofloxacina,
fas a ocupar um lugar discreto no arsenal tera-
monofloxacina e gemifloxacina.
pêutico do médico. A utilização da combinação
Atuam inibindo a DNA-girase e a topoi- de trimetropima com sulfametoxazol, contudo
somerase IV, enzimas essenciais no processo de incrementou o uso das sulfonamidas.
replicação do DNA bacteriano, portanto levam à
As sulfonamidas impedem a síntese de
rápida morte celular.
acido fólico, visto que são análogos estruturais
Mostram-se eficientes contra amplo es- e antagonistas competitivos do ácido para-
pectro bacteriano, sendo altamente ativas con- -aminobenzóico (PABA); e a trimetropima é um
tra E. coli e várias espécies de Neisseria, Salmo- poderoso inibidor competitivo seletivo da en-
nella, Shigella, Enterobacter e Campylobacter. zima que reduz o diidrofolato a tetraidrofolato,
Apresentam atividade contra alguns estafiloco- a forma ativa do ácido fólico. A combinação
cos, entretanto não contra os resistentes à me- dos agentes, cotrimoxazol, inibe o crescimento
ticiclina e alguns antibióticos dessa classe agem bacteriano. A resistência a esse grupo reside no
contra estreptococos. São ativos também con- fato de bactérias produzirem formas alteradas
tra bactérias atípicas e algumas micobactérias. de suas enzimas-alvo ou alterarem sua permea-
Muitas bactérias podem apresentar resis- bilidade ou formarem PABA em excesso.
tência às quinolonas por mutações espontâneas O espectro bacteriano das sulfas é amplo,
nos genes que codificam a DNA-girase e topoi- mas por terem sido utilizadas por longo período
somerase ou por expressão de bombas de eflu- enfrentam o problema da resistência. São efeti-
xo. O desenvolvimento de resistência justifica a vas in vitro contra S. pyogenes, S. pneumoniae, H.
não utilização do medicamento. influenzae, H. ducreyi, Nocardia, Actinomyces, C.
52 Faculdade Christus
Capítulo 3
XX Metronidazol
O metronidazol, um derivado 5-nitroimi- 2. Hormônios
dazólico, descoberto nos anos 50, apresentava XX Estrógenos
ampla atividade contra protozoários anaeróbi- São hormônios esteroides originários do
cos, sendo posteriormente observado que tinha folículo ovariano em maturação e corpo lúteo,
atividade clínica contra bactérias anaeróbicas. do córtex da suprarrenal, da conversão perifé-
Possui em sua estrutura um grupo nitro rica de androgênios no tecido gorduroso e, na
que precisa ser reduzido, ou seja, aceitar elé- gravidez, do trofoblasto e placenta.
trons para que o metronidazol torne-se ativo. Agem através de dois receptores ER
Os patógenos anaeróbicos e microaerófilos que existem no núcleo das células-alvo. Têm
possuem pequenas proteínas Fe-S com baixo metabolismo primariamente hepático e de-
potencial redox de transporte de elétrons, capa- pois renal.
zes de doar elétrons ao fármaco, sendo susce-
Apresentam diversos efeitos fisioló-
tíveis ao metronidazol. Pode ocorrer resistência
gicos, sendo necessários para o amadureci-
por comprometimento da capacidade de remo-
mento sexual e crescimento normal da mu-
ver oxigênio que diminui a ativação redutiva do
lher, atuam no desenvolvimento da vagina,
fármaco ou por menores níveis de proteínas ca-
do útero, das trompas uterinas, do estroma e
pazes de doar elétrons.
no surgimento dos caracteres sexuais secun-
O metronidazol é eficaz contra ampla va- dários. Na puberdade, são responsáveis pelo
riedade de anaeróbios tanto protozoários para- crescimento acelerado e fechamento das epí-
sitos como bactérias gram-positivas e gram-ne- fises, estimulam a pigmentação da pele, prin-
gativas. É efetivo contra T. vaginalis, E. histolytica cipalmente, em aréolas e na região genital.
e G. lamblia. É clinicamente eficaz em infecções Possuem efeitos endometriais, pois atuam no
causadas por bactérias aeróbicas como Bacte- ciclo menstrual e levam a hiperplasia do en-
riodes e Clostridium e bactérias microaerófilas dométrio associada a sangramentos anormais
como Helicobacter e Campylobacter spp. quando há exposição contínua e prolongada.
Faculdade Christus 53
Capítulo 3
Têm efeitos metabólicos e cardiovasculares, ca, propiciando retenção hídrica e ação anabo-
visto que diminuem a taxa de reabsorção ós- lizante. Os efeitos dependem de receptores da
sea, estimulam a produção de lepitina pelo progesterona, cuja expressão depende da ação
tecido adiposo, agem no colágeno, mantendo de estrógenos. Como a metabolização da pro-
as características da pele jovem, aumentam gesterona por via oral é muito rápida reduzindo
as lipoproteínas de alta densidade, diminuem sua ação, utiliza-se na prática clínica, hormônios
discretamente as de baixa densidade e dimi- sintéticos com ação progestagênica mais dura-
nuem os níveis plasmáticos de colesterol. Têm doura, que são denominados progestágenos.
efeitos também no aumento da coagulabili-
Os progestágenos são classificados em 2
dade do sangue e induzem à síntese de re-
grupos: os derivados de progesterona e os da
ceptores de progesterona.
testosterona. O único efeito comum para todos
Possuem muitas vias de administração e os progestágenos é a habilidade de induzir a
as mais utilizadas por ordem de frequência são fase secretória em endométrio estrogenizado,
a oral, a transdérmica, percutânea, vaginal, im- mas dependendo de sua origem podem ter
plante e intramuscular. A via oral é a de maior além dos efeitos progestagênicos (em graus
aceitabilidade devido à facilidade e ao tempo variáveis), também efeitos androgênicos, estro-
de uso, sendo preferida em pacientes dislipidê- gênicos, antiandrogênicos e antiestrogênicos.
micos. Deve-se ter cuidado com a via vaginal Os derivados da progesterona não têm efeitos
que apresenta absorção sistêmica. Independen- androgênicos, enquanto os derivados da testos-
te do tipo e da via administração, há variação terona têm atividade androgênica e forte ativi-
na concentração sérica individualmente, pois dade progestagênica e androgênica.
depende de alterações hepáticas, alimentação,
Os progestágenos reduzem os receptores
estado da pele e trânsito intestinal.
de estrógeno e transformam E2 em E1, que é um
Existem tanto estrógenos naturais quan- estrógeno mais fraco. Assim os progestágenos
to sintéticos. Os naturais são estradiol (E2), es- estão indicados em patologias que têm seu de-
trógenos conjugados, sulfato de estrona (E1), senvolvimento estimulado por estrógenos. As-
valerianato de estrona, estriol, promestrieno e sim, o emprego ocorre na puberdade precoce,
esteres de estradiol, sendo indicados na puber- síndrome climatérica, endometriose, síndrome
dade atrasada constitucional ou patológica, na dos ovários policísticos, hiperplasia endome-
terapia de reposição hormonal em menopausa- trial, anticoncepção hormonal, carcinomas de
das, na prevenção e tratamento de osteoporo- mama e endométrio. Também são indicados
se, na prevenção da atrofia urogenital senil e em quando há falta de progesterona endógena.
doenças cardiovasculares, na regularização do
Podem apresentar muitos efeitos colate-
ciclo menstrual na menacme ou na perimeno-
rais como aumento de peso, diminuição da li-
pausa e no retardo no desenvolvimento dos ca-
bido, cansaço, depressão, acne ou seborreia, hi-
racteres sexuais secundários. Os sintéticos são
surtismo discreto, mastalgia, edema, monilíase
etinil-estradiol, mestranol, quinestrol e dietiles-
e secura vaginal.
tilbestrol, sendo utilizados quase exclusivamen-
te na anticoncepção hormonal.
São contraindicados em doença hepática XX Andrógenos
grave ou aguda, câncer de mama, sangramen- São hormônios esteroides originários do
to uterino não diagnosticado e alguns autores estroma ovariano, da teça interna dos ovários,
contra-indicam em no câncer de endométrio. das células do hilo e do córtex da suprarrenal.
A testosterona pode ter efeitos diretos
na genitália interna onde produz os canais de
XX Progestágenos
Wolf durante a gestação e no músculo esque-
A progesterona é um hormônio este-
lético onde aumenta a força e a massa muscu-
roide produzido pelo corpo lúteo, placenta e
lar durante a puberdade. Pode, entretanto, ser
suprarrenal e tem ação sobre o eixo hipotála-
transformada em outros esteroides ativos como
mo-hipofisário (feedback negativo), mamas (re-
a diidrotestosterona que age na genitália exter-
ação secretória) e endométrio (fase secretória).
na levando à diferenciação, maturação e doen-
Apresenta ação antagonista do estrogênio e
ças prostáticas no adulto e nos folículos pilosos
desempenha secundariamente ação androgêni-
acentuando o crescimento durante a puberda-
54 Faculdade Christus
Capítulo 3
INDICADOR TERAPÊUTICO
Patologia Droga e posologia
Metronidazol VO 500mg a cada 12 h durante 7 dias (recomendada na gravidez).
Metronidazol a 0.75% via intravaginal, aplicador cheio (5g), 1 vez ao dia durante 5 dias.
Vaginose bacteriana Clindamicina VO 300mg a cada 12 h durante 7 dias (recomendada na gravidez).
Creme de clindamicina a 2% via intravaginal, aplicador cheio (5g), ao deitar, durante 7
dias
Metronidazol VO 2g em dose única (categoria B para gestação)
Tricomoníase
Tinidazol VO 2g em dose única (categoria C para gestação)
Ceftriaxona IM 125mg dose única
Cefexima VO 400mg dose única
Ciprofloxacina VO 500mg dose única ou Ofloxacina VO 400mg dose única ou Levoflo-
Gonococia
xacina VO 250mg dose única (contraindicados na gravidez)
Gestantes que não tolerem cefalosporinas devem ser tratadas com Espectinomicina IM
2g dose única
Infecção por Chlamydia Doxiciclina VO 100mg a cada 12hs por 7 dias (contraindicada na gravidez)
trachomatis Azitromicina VO 1g dose única
Penicilina benzatina IM 2,4 mi UI dose única (sendo 1,2 mi UI em cada nádega)
Sífilis primária, secundária Doxiciclina VO a cada 12h por 14 dias (contraindicada na gravidez)
e latente recente Tetraciclina VO a cada 6h por 14 dias (contraindicada na gravidez)
Gestantes alérgicas à penicilina devem ser dessensibilizadas e tratadas com penicilina
Penicilina benzatina IM 2, 4 mi UI por semana durante 3 semanas
Sífilis latente tardia e sífilis Doxiciclina VO a cada 12h por 28 dias (contraindicada na gravidez)
terciária Tetraciclina VO a cada 6h por 28 dias (contraindicada na gravidez)
Gestantes alérgicas à penicilina devem ser dessensibilizadas e tratadas com penicilina
Penicilina cristalina EV 18 a 24 mi UI por dia, sendo administrado por infusão contínua
ou 3 a 4 mi UI a cada 4 h, durante 10 a 14 dias
Penicilina procaína IM 2,4 mi UI uma vez ao dia mais probenecida VO a cada 6 horas,
Neurossífilis
ambos por 10-14 dias
Ceftriaxone EV ou IM 2g uma vez ao dia por 10-14 dias
Gestantes alérgicas à penicilina devem ser dessensibilizadas e tratadas com penicilina
Azitromicina VO 1g dose única
Ceftriaxona IM 250mg dose única
Cancro mole
Ciprofloxacina VO 500mg a cada 12 h durante 3 dias (contraindicada na gravidez)
Eritromicina VO 500mg a cada 8 h durante 7 dias
Doxicilina VO 100mg a cada 12 h durante 21 dias (contraindicada na gravidez)
Linfogranuloma venéreo
Eritromicina VO 500mg a cada 6 h durante 21 dias (droga de escolha na gravidez)
Doxicilina VO 100mg a cada 12 h pelo menos por 21 dias (contraindicada durante
gravidez)
Ciprofloxacina 750mg ou Sulfametoxazol-trimetropim VO 800/160mg a cada 12 h por
Donovanose pelo menos 21 dias (contraindicadas na gravidez)
Azitromicina VO 1g uma vez por/semana por pelo menos 3 semanas
Eritromicina base VO 500mg a cada 6 h por pelo menos 21 dias (droga de escolha na
gestação)
Faculdade Christus 55
Capítulo 3
56 Faculdade Christus
Capítulo 4
CRESCIMENTO, DESENVOLVIMENTO E
O EIXO NEUROENDÓCRINO
João Marcos de Meneses e Silva
Maria de Lourdes Caltabiano Magalhães
Luana Pontes Vasconcelos Lima
Sara Lourinho Firmino
58 Faculdade Christus
Capítulo 4
Faculdade Christus 59
Capítulo 4
60 Faculdade Christus
Capítulo 4
MARINHO, M. V. F. W. Desenvolvimento e
Crescimento. In: MAGALHÃES, M. L. C.; REIS,
J. T. L. Ginecologia Infanto- juvenil – Diag-
nóstico e tratamento. 1ed. Rio de Janeiro:
Medbook, 2007.
Faculdade Christus 61
Capítulo 5
ENDOCRINOLOGIA DO
CICLO MENSTRUAL Maria de Lourdes Caltabiano Magalhães
Paulla Vasconcelos Valente
Liana Capelo Costa
Luis Gustavo Lucena Augusto Lima
64 Faculdade Christus
Capítulo 5
Faculdade Christus 65
Capítulo 5
ção ao LH, ou seja, negativo em baixos níveis e negativo sobre a hipófise e pode ser crucial para
positivo em níveis elevados. O desenvolvimento o desenvolvimento monofolicular.
dessa resposta positiva sinaliza a maturação do
Passados o período pré-natal e a infân-
eixo córtex-hipotálamo-hipófise-ovário.
cia, em que a atividade ovariana é pontuada
pela redução do número de folículos através da
apoptose, o ovário da adolescente responde ao
XX Foliculogênese e esteroidogênese
estímulo inicial do FSH por meio do crescimen-
Giordano divide didaticamente, o ciclo ova-
to de um número pequeno de folículos antrais
riano em três fases: folicular, ovulatória e lútea.
que escaparam da atresia apoptórica. Poucos
Fase folicular folículos pré-antrais eventualmente alcançam o
Segundo Machado, a maturação comple- estágio pré-ovulatório e ovulam em resposta ao
ta de um folículo primordial leva pelo menos pico pré-ovulatório do LH.
85 dias; sob influencia do FSH, há crescimen-
Sabe-se hoje que o LH (com outros hor-
to e maturação dos folículos ovarianos. O início
mônios e proteinas) estimula, nas células da
do crescimento folicular ocorre continuamente,
teca a síntese e a liberação de androgênios (ba-
e os folículos são selecionados aleatoriamen-
sicamente androstenodiona e testosterona). Es-
te. O primeiro estágio da fase de crescimento
tes últimos transitam por difusão para as células
envolve o aumento no tamanho do oócito e
da granulosa contíguas, onde serão aromatiza-
a proliferação das camadas de células da gra-
dos (ação da enzima aromatase). Surge, então,
nulosa que o envolvem, para formar o folícu-
o conceito de dupla célula ovariana (síntese de
lo primário. Após desenvolver seu suprimento
androgênios na teca e transformação em estro-
sanguíneo próprio, o estroma perifolicular se
gênios nas células da granulosa)
diferencia, formando a camada da teca interna.
Este estágio de desenvolvimento, denominado Também, de maneira didática, divide-se a
folículo secundário, é ainda caracterizado pela fase folicular em inicial (dias 1 a 4), média (dias
expressão dos receptores para o LH nas célu- 5 a 9) e tardia (dia 10 até a ovulação). A duração
las da teca interna. As células da granulosa, por média da fase folicular humana varia de 10 a
sua vez, começam a expressar receptores para 14 dias, e a variabilidade nesta duração é res-
o FSH quando inicia a formação da cavidade ponsável pela maioria das variações na duração
antral. Apesar de o crescimento inicial do folí- total do ciclo.
culo ser regulado independente da estimulação
gonadotrófica, os estágios finais do desenvol-
vimento são FSH-dependentes. Somente nos Fase ovulatória
estágios mais avançados de desenvolvimento É de conhecimento universal que índice
folicular é que as células da granulosa tornam- inferior a 0,1% das células germinativas pre-
-se sensíveis ao FSH. sentes nos ovários consegue alcançar o pleno
desenvolvimento e, na idade adulta, é extruído
Evidencia-se que, com a secreção aumen-
pelo fenômeno ovulatório.
tada de FSH nesta fase, ocorre o desenvolvi-
mento de vários folículos, mas acredita-se que Segundo Machado, a ovulação constitui
o mais bem aquinhoado com receptores de FSH o epifenômeno da fisiologia reprodutiva e tem
seja o predestinado à ovulação e que os 99% como objetivo final a perpetuação da espécie.
restantes sofrerão involução. Em paralelo ao Para que ela aconteça, é necessária uma fun-
amadurecimento folicular, há síntese aumenta- ção ovariana adequada, na qual a ovulação e a
da de estrogênios (atividade esteroidogênica). A secreção de esteroides sexuais ocorram de ma-
diminuição do FSH, coincidindo com a seleção neira regular, pulsátil e finamente sincronizada.
e o desenvolvimento do folículo, pode ser devi- Estes eventos dependerão da presença de uma
do ao efeito de feedback negativo do estradiol população folicular adequada, que obedecerá
sobre o eixo hipotálamo-hipófise. Coadjuvado a estímulos específicos de outros centros que
pela grande elevação de inibina B, observada na integram o chamado eixo córtex-hipotálamo-
fase folicular. Esse rápido aumento da inibina B -hipófise-ovário.
ocorre logo após a elevação do FSH, entre os Este eixo, por sua vez, é modulado e sin-
ciclos. Foi proposto que a inibina B limita a du- cronizado por delicados mecanismos de integra-
ração da elevação do FSH através do feedback ção, que envolvem emoções; neurotransmisso-
66 Faculdade Christus
Capítulo 5
Faculdade Christus 67
Capítulo 5
D- Referências Bibliográficas
BYDLOWSKI, S.P. Fisiologia da gônada feminina.
In: DOUGLAS, C.R. Tratado de Fisiologia Apli-
cada às Ciências Médicas. 6.ed. Rio de Janeiro:
Guanabara Koogan, 2006.
68 Faculdade Christus
Capítulo 6
A FLORA VAGINAL NORMAL NAS
DIVERSAS FASES DA VIDA
Maria de Lourdes Caltabiano Magalhães
Paulla Vasconcelos Valente
Giovanna Araújo Borges
uma microbiota mista de bactérias não-patogê- descamação celular pelo estrógeno passam a
nicas. Após, aproximadamente, 48 horas, sob a ser responsáveis pela formação do conteúdo
influência dos hormônios estrogênicos mater- vaginal fisiológico que possui uma coloração
nos, o epitélio vaginal se torna rico em glico- branco-amarelada, não tem odor e seu aspec-
gênio e ocorre a colonização por lactobacilos. to é “mucóide”. Nessa faixa etária, é de suma
Nesse período, pode-se observar a chamada importância orientar e tranquilizar não só a pa-
“leucorréia fisiológica da recém-nata” que ten- ciente como principalmente a genitora ou pes-
de a desaparecer até a 6ª semana de vida; ge- soa responsável, a fim de prevenir tratamentos
ralmente na 3ª ou 4ª semana. Ela é mucóide desnecessários para uma suposta vulvovagi-
e de coloração esbranquiçada e se exterioriza nite. Na pré-púbere, a frequência relativa dos
através do orifício himenal. O epitélio vaginal vários germes da flora vaginal normal é dife-
se apresenta semelhante ao da mulher adulta; rente daquela observada em adolescentes e na
o pH é ácido; permanece entre 4 e 5. O conteú- mulher adulta. Como também, as lesões cervi-
do vaginal é composto de muco endocervical e cais, que frequentemente são responsáveis por
células epiteliais cervicovaginais descamativas. sintomas depois da puberdade, são raras vezes
À medida que os níveis de estrógeno caem, o observadas na infância.
conteúdo vaginal diminui.
Com o aparecimento dos ciclos ovulató-
rios, observam-se variações no conteúdo va-
ginal e na flora, de acordo com as diferentes
Infância
fases do ciclo. A quantidade e o tipo de lac-
Em torno de 1 mês de vida e durante toda tobacilos variam durante o ciclo menstrual. Os
a infância, com o desaparecimento dos estróge- lactobacilos aeróbicos predominam no meio
nos maternos, cessa a produção de glicogênio, do ciclo, e os anaeróbicos, no período pré-
o epitélio vaginal se atrofia, torna-se adelgaça- -menstrual. Durante a menstruação e no pe-
do, desaparecem os lactobacilos e o pH torna- ríodo pós-menstrual, existe grande diversida-
-se alcalino (6 – 7,5). A flora vaginal normal da de de microrganismos, com uma distribuição
menina passa a ser constituída por uma série de equilibrada entre aeróbicos e anaeróbios.
microrganismos (flora polimicrobiana normal)
Zeiguer descreve uma alteração de pH
que são inócuos e permanecem em equilíbrio
ao longo da vagina, sendo este mais alcalino
entre si: difteróides, estreptococos alfa hemo-
no intróito e mais ácido nos fundos-de-saco,
líticos, Escherichia coli, Klebsiella, estafilococos
com exceção do fundo-de-saco posterior, que
coagulase positivo, entre outros. O aspecto pré-
é alcalinizado pelo muco endocervical. A auto-
-puberal da vagina continua até que a produção
ra refere também que essas diferenças de pH
de estrógenos nos ovários se inicie.
levam a variações da flora em suas diferentes
porções, maior desenvolvimento de Mycoplas-
Adolescência / Menacme ma hominis na vagina do que no colo e maior
concentração de Streptococcus agalactiae no
Com a produção de estrógeno, recome- terço inferior da vagina.
ça a síntese de glicogênio, o que torna o meio
favorável à colonização por lactobacilos, que
passarão a ser os principais micro-organismos Climatério
presentes durante todo esse período. O pH
Nessa fase, os níveis de estrogênio vol-
volta a baixar (3,5 – 4,5) e a vagina passa a ser
tam a diminuir e o epitélio vaginal se torna
colonizada também por outros microorganis-
atrófico. O pH do meio vaginal sofre aumento,
mos: difteróides, Micrococcus, Streptococcus
em decorrência da menor liberação de glico-
epidermidis, Streptococcus faecalis, Streptococ-
gênio e da drástica diminuição da população
cus microaerofilus, anaeróbios, ureoplasmas,
de bacilos de Doederlein. A redução da acidez
leveduras e outros.
do meio vaginal favorece o aparecimento de
Após a telarca, o estímulo da produção microrganismos patogênicos.
do muco cervical, da transudação vaginal e da
70 Faculdade Christus
Capítulo 6
D- Referências Bibliográficas
ELEUTÉRIO JÚNIOR, J. Elementos Normais em
Esfregaços Cervicovaginais. In: ______. Noções
Básicas de Citologia Ginecológica. São Paulo:
Santos, 2003. cap. 4, p. 23-26.
Faculdade Christus 71
Capítulo 7
A IMPORTÂNCIA DA CITOLOGIA
ONCÓTICA E SUA INTERPRETAÇÃO
COLPOSCÓPICA
Maria de Lourdes Caltabiano Magalhães
Paulla Vasconcelos Valente
Carla Franco Costa Lima
André Luis Nunes Albano de Meneses
74 Faculdade Christus
Capítulo 7
Caetano et al. (2005) revelou taxas de exames • Satisfatória para avaliação: descrever pre-
insatisfatórios com a citologia em meio líqui- sença ou ausência de componentes endo-
do de 1,4%, comparada a 10,4% dos espécimes cervicais, de zona de transformação e de
avaliados pelo método de Papanicolaou. quaisquer outros indicadores de qualidade
(p. ex. parcialmente obscurecido por san-
Para preservar a sensibilidade e a especi-
gue, inflamação etc.)
ficidade do teste de Papanicolaou, a Sociedade
Insatisfatório para avaliação
Norte-americana de Câncer recomenda:
• Amostra rejeitada/não processada (especifi-
Utilizar espéculo não lubrificado car o motivo)
Visualização de colo e vagina no exame • Amostra processada e avaliada, mas insatis-
Não realizar o exame durante o período fatória para avaliação de anormalidade epi-
menstrual telial (especificar o motivo)
Não realizar a coleta cervicovaginal antes de 72 Categorização geral (opcional)
horas após a prática de relações sexuais, uso • Negativo para lesão intra-epitelial ou malig-
de medicamentos tópicos ou quaisquer proce- nidade
dimento que possam alterar o meio vaginal • Outras: (p.ex. células endometriais em mu-
Obter a amostra preferencialmente no perío- lher de idade igual ou superior a 40 anos)
do ovulatório • Alteração celular epitelial (especificar se es-
Identificar a lâmina antes de fixá-la imediata- camoso ou glandular, quando apropriado)
mente após a coleta Interpretação/resultado
Preencher o pedido de exame colpocitológico • Negativo para lesão intra-epitelial ou maligni-
com os dados pertinentes: dade: quando não existir evidência celular de
• idade; neoplasia, deve-se descrever o fato na catego-
• data da última menstruação; rização Geral e/ou na seção de Interpretação/
• antecedentes de doenças ginecológicas, resultado do laudo, e se existem ou não or-
principalmente do trato genital inferior; ganismos ou outros achados não neoplásicos.
• tratamentos realizados; Organismos
• medicações em uso. • Trichomonas vaginalis
• Organismos fúngicos morfologicamente
1.2. Interpretação e laudos dos achados ci- consistentes com Cândida spp
tológicos • Desvio de flora sugestivo de vaginose bac-
teriana
Segundo Focchi (2009), a interpretação • Bactérias morfologicamente consistentes
dos achados citológicos baseia-se no sistema com Actinomyces spp
de Bethesda (2001), que avalia essencialmente • Alterações celulares consistentes com vírus
os seguintes dados: herpes simples (HSV)
Qualidade da amostra e presença de fatores • Outros achados não-neoplásicos (descrição
limitantes para a avaliação oncótica. opcional; relação não inclusiva)
Amostragem da zona de transformação (célu- • Alterações celulares reativas associadas à
las metaplásicas e endocervicais). inflamação (incluindo reparo típico), irradia-
Organismos relevantes presentes. ção ou dispositivo intra uterino (DIU)
Alterações (reativas, reparativas ou atipias) em • Estado de células glandulares pós-histerectomia
células escamosas e glandulares (uterinas ou • Atrofia
genitais extra-uterinas). Outros
Atipias em outras células do trato genital (não epi- • Células endometriais em mulheres com ida-
teliais) e neoplasias secundárias (extra-genitais). de igual ou superior a 40 anos. Especificar se
negativo para lesão intra-epitelial
Alterações das células epiteliais
O diagnóstico citológico cervicovaginal, se-
• Células escamosas
gundo o sistema de Besthesda é o que se segue:
• Células escamosas atípicas
Tipo de amostra −De
− significado indeterminado (ASC-US)
• Esfregaço convencional −Não
− é possível excluir lesão intra-epite-
• Citologia em meio líquido lial escamosa de alto grau (ASC-H)
Qualidade da amostra • Lesão intra-epitelial escamosa de baixo grau
Faculdade Christus 75
Capítulo 7
−Efeito
− citopático do HPV/displasia leve/ câncer; em condições não adequadas, sua sen-
neoplasia intra-epitelial cervical grau 1 sibilidade reduz para 38%.
(NIC 1)
• Lesão intra-epitelial escamosa de alto grau
−Displasia
− moderada e acentuada e carci- 2. Colposcopia
noma in situ/NIC 2 e NIC 3) Hinselmann em 1925 foi o primeiro a
−Características
− suspeitas de invasão descrever o equipamento colposcópico básico
• Carcinoma espinocelular invasivo e seu uso, estabelecendo os fundamentos para
• Células glandulares a prática da colposcopia. Um colposcópio é um
• Típicas microscópio de campo estereoscópico, bino-
−Células
− endocervicais sem outras especi- cular, de baixa potência, com uma fonte de ilu-
ficações (SOE) ou especificar nos comen- minação de intensidade variável que ilumina a
tários área sob exame.
−Células
− endometriais SOE ou especificar
no comentários A colposcopia consiste na observação
−Células
− glandulares SOE ou especificar do trato genital inferior (colo do útero, vagina
nos comentários e vulva) por meio de lentes com diferentes au-
• Atípicas mentos; os aparelhos modernos permitem re-
−Células
− endocervicais, favorecendo neo- gular o aumento entre 6x e 40x. As variações
plasia dos aumentos são inversamente proporcionais
−Células
− glandulares, favorecendo neo- ao campo observado. Os aumentos menores
plasia permitem visão panorâmica das lesões e os
• Adenocarcinoma endocervical in situ maiores possibilitam observação de detalhes de
• Adenocarcinoma epitélio e vasos. Tais características também se
−Endocervical
− relacionam com a profundidade do campo, que
−Endometrial
− é tanto menor quanto maior o aumento.
−Extra-uterino
− Existem videocolposcópios sem oculares,
−SOE
− com observação exclusiva por meio de monitor, o
Quaisquer outras neoplasias malignas que parece diminuir a noção de profundidade no
devem ser especificadas. exame. O colposcópio pode ainda ser equipado
Testes auxiliares com aparelho de registro fotográfico e de vídeo.
• Fornecer uma breve descrição do método
do teste e relatar o resultado de modo a ser
facilmente compreendido pelo clínico 2.1. Indicações para a colposcopia
Revisão automatizada O motivo mais comum para o encami-
• Se o caso for avaliado com equipamento nhamento de mulheres para a colposcopia é a
automatizado, deve-se especificar o equi- citologia cervical anormal, em geral um achado
pamento e o resultado de triagem citológica.
Notas educativas e sugestões (opcionais)
De acordo com a Associação Brasileira de
• As sugestões devem ser concisas e consis-
Genitoscopia, são indicações do exame colpos-
tentes, com orientações do acompanha-
cópico:
mento clínico publicadas por organizações
profissionais (referências quanto às publica- Casos de pacientes com resultados de colpo-
ções relevantes podem ser incluídas) citologia oncóticas alteradas:
• Lesão intra-epitelial de baixo grau ou células
escamosas de significado indeterminado,
De acordo com a Organização Mundial de
em 2 citologias consecutivas
Saúde, a exatidão do exame citológico depende
• Alterações indeterminadas em células glan-
de inúmeras variáveis, sendo elas a qualidade
dulares
dos serviços, incluindo as práticas de coleta do
• Lesão intra-epitelial de alto grau, adenocar-
material, a fixação das células e a interpretação
cinoma in situ, suspeita de microinvasão e
laboratorial. Em condições ótimas, em países
citologia sugestiva de neoplasia invasiva
desenvolvidos, a citologia convencional permite
(escamosa ou glandular)
detectar quase 84% das lesões precursoras e do
Casos de pacientes que apresentem as se-
76 Faculdade Christus
Capítulo 7
Faculdade Christus 77
Capítulo 7
contrar ilhas de epitélio colunar cercadas i) Vasos atípicos - Aspecto colposcópico focal
por epitélio escamoso metaplásico, orifícios anormal no qual o padrão vascular se apre-
glandulares e cistos de Naboth na zona de senta com vasos irregulares com um curdo
transformação normal. interrompido abruptamente e com aparên-
cia de vírgulas, vaso capilares espiralados,
grampos ou com formas variadas.
2.3.2. Achados colposcópicos anormais
a) Epitélio acetobranco - É o epitélio que se
2.3.3. Alterações colposcópicas sugestivas de
torna esbranquiçado após a aplicação da
câncer invasivo
solução de ácido acético, pela alta densida-
de nuclear que apresenta. Embora isto pos- A presença de uma superfície irregular
sa ocorrer em casos de metaplasia imatu- como cadeia de montanhas em áreas acetobran-
ra, geralmente quanto mais denso é a área cas densas e alterações vasculares extremamente
acetobranca, tanto mais rápida a alteração bizarras falam a favor de invasão tecidual.
acontece e quanto maior o tempo de dura-
ção mais severa pode ser a lesão.
b) Epitélio acetobranco denso - Área aceto- 2.3.4. Colposcopia insatisfatória
branca densa no epitelio colunar pode indi- a) Junção escamocolunar não visível.
car doença glandular. b) Inflamação severa, atrofia severa, trauma.
c) Pontilhado fino - Constitui o aspecto col- c) Cérvice não visível.
poscópico focal, no qual os capilares apa-
recem em um padrão pontilhado. Quanto
mais fino e regular é a aparência do ponti- 2.3.5. Miscelânea
lhado e com distância intercapilar pequena, a) Condiloma - Pode ocorrer dentro ou fora
é mais provável que a lesão seja de baixo da zona de transformação e indica infecção
grau ou metaplasia. pelo Papilomavirus Humano. A colposcopia
d) Pontilhado grosseiro - Quanto mais gros- mostra um grupamento de pequenas papi-
seiro for o pontilhado, mais provável ser a las de base única. A aplicação de ácido acé-
lesão de alto grau. tico produz área acetobranca e ao iodo se
e) Mosaico fino - Alteração colposcópica apa- cora parcial ou irregularmente.
rentemente focal na qual a neoformação b) Queratose - Alteração colpóscopica focal, a
vascular tem um padrão retangular como qual a hiperqueratose está presente e se pare-
um mosaico. Quanto mais fino e regular é o ce com uma placa branca elevada. A alteração
mosaico, mais provável ser a lesão de baixo branca aparece antes da aplicação de ácido
grau ou metaplasia. acético e pode impedir a visualização adequa-
f) Mosaico grosseiro - Quanto mais grosseiro for da da zona de transformação subjacente.
o mosaico e quanto maior a distância interca- c) Erosão - Uma verdadeira erosão represen-
pilar, mais provável ser a lesão de alto grau. ta uma área de epitélio desnudo. Pode ser
g) Epitélio iodo parcialmente positivo. causado por traumas e pode indicar que
h) Epitélio iodo negativo - Depois da aplicação o epitélio de superfície seja possivelmente
da solução de iodo, o epitélio maduro que anormal.
contém glicogênio apresenta uma cor mar- d) Inflamação - Alteração geralmente difu-
rom escuro. Áreas iodo negativas podem sa caracterizada por congestão vascular e
representar metaplasia imatura, neoplasia edema de mucosa. Podem ser pontilhados,
intra-epitelial cervical ou baixa taxa de es- diferenciando-se por apresentar capilares
trogênio. Uma aparência de salpicado mar- finos e muito próximos entre si em um colo
rom-iodo malhado em uma área com alte- avermelhado. Geralmente, cora-se parcial-
ração acetobranca leve pode representar mente ao iodo.
metaplasia imatura ou neoplasia intraepi- e) Atrofia - Alteração epitelial devido a um
telial de baixo grau. Completa negatividade baixo estado de estrogênio, representa-
ao iodo, que se revela com uma coloração da por uma mucosa pouco espessa que
amarelo mostarda em uma área acetobran- deixa transparecer uma fina rede vascular.
ca é altamente sugestiva de neoplasia intra- As petéquias são frequentes e coram-se
epitelial de alto grau. muito pouco ao lugol.
78 Faculdade Christus
Capítulo 7
Faculdade Christus 79
Capítulo 7
80 Faculdade Christus
Capítulo 8
COALESCÊNCIA DE PEQUENOS LÁBIOS
Maria de Lourdes Caltabiano Magalhães
Ângela Clotilde Ribeiro Falanga e Lima
Samantha Cavalcante de Brito
A- PROBLEMA 2. Etiologia
C.D.A., 5 anos, sexo feminino foi levada Segundo Campbell, essa alteração po-
ao ambulatório de ginecologia, por sua mãe, derá ser congênita ou adquirida. Se congênita,
porque há alguns meses apresentou dificulda- haveria uma fusão medial das pregas labioes-
de para urinar e tem a “vulva diferente”. A res- crotais entre o terceiro e quarto mês de vida
ponsável refere que nunca havia notado nada embrionária. A variedade adquirida é a forma
diferente e ficou preocupada porque essa filha sustentada pela maioria dos autores porque
era diferente das outras. Exame físico: sem al- um processo infeccioso e irritativo localizado
terações. Exame ginecológico: presença de fina nos pequenos lábios levará à perda do epitélio
membrana translúcida que se estende da fúrcu- de transição, e as superfícies se acolam man-
la ao meato uretral. tendo entre elas camada de tecido conjuntivo.
Porém, cada autor defende a sua teoria para os
fatores desencadeantes. Huffman e Magalhães
B- OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM afirmam que a causa principal é o hipoestroge-
nismo fisiológico associado a infecções vulva-
1. Conhecer a fisiopatologia da coalescência res; Zeiguer compartilha da tese de Huffman e
de pequenos lábios Magalhães no que tange ao hipoestrogenismo,
2. Realizar a propedêutica adequada para o porém, em suas pacientes, não observou infec-
diagnóstico ções vulvares antecedendo a sinéquia vulvar.
3. Listar doenças para o diagnóstico diferencial Entretanto, a associação de hipoestrogenismo
4. Conhecer os tratamentos e seus mecansmos com higiene precária é defendida por Souza;
Vakar aventa a possibilidade de algum proces-
so inflamatório intra-uterino ou mesmo pós-
C- ABORDAGEM TEMÁTICA -parto; Ochsenius sugere ser a coalescência de
1. Introdução pequenos lábios consequência local de infec-
ções sistêmicas como a cólera, varicela, difteria
A coalescência de pequenos lábios se e escarlatina, entre outras e Scharfe afirma que
caracteriza pela aderência entre as ninfas, os lábios podem se fundir em resposta a algum
deixando transparecer uma tênue membrana trauma genital, mesmo a dermatite por fralda.
translúcida na linha mediana, com o conse- A vulvite adesiva envolve a fusão dos lábios
quente desaparecimento da fenda vulvar, por menores, provavelmente causada pela irritação
vezes existindo apenas um orifício abaixo do crônica associada com a vulvite. Afirma ainda
clitóris por onde passam a urina e o sangue que o líquen escleroso também tem sido co-
menstrual. Existem outras denominações para nhecido como causa de aderência secundária
a alteração citada: aderência dos lábios, agluti- aos baixos níveis de estrogênio.
nação ou conglutinação dos pequenos lábios,
sinéquia vulvar.
Capítulo 8
82 Faculdade Christus
Capítulo 8
O tratamento com cremes de estrógeno a ansiedade que este quadro traz para os fami-
não deve ser realizado por um período mais liares, os quais, muitas vezes, associam essa pa-
longo devido a seus efeitos colaterais: pseu- tologia com malformações da genitália externa.
dopuberdade precoce iatrogênica, botão ma- É necessário esclarecer o real diagnóstico, o
mário, lanugem pubiana chegando até a perda tratamento e o prognóstico, além de orientar
sanguínea por via vaginal. No entanto, em um a criança e/ou o responsável quanto aos pre-
estudo, Lewitan constatou que com o uso de ceitos de higiene da genitália e a vestimenta
medicação estrogênica local por 3 meses não adequada. Dessa maneira, evita-se ao máximo
ocorreram efeitos adversos e foi bem sucedida o prolongamento dos processos inflamatórios e
a abertura de aderência vulvar. as recidivas.
Creme estrogênico de pouca absorção
foi estudado por alguns autores. Magalhães,
em estudo com promestriene, que possui uma
D- Referências Bibliográficas
molécula modificada do estradiol e age como ÁVILA, A.N.; NIETO, A. Coalescencia de lábios
um estrógeno constatou a incapacidade dessa menores. In: SANCHEZ DE LA CRUZ, B. Gineco-
substância de atravessar o epitélio vaginal ou logia Infanto Juvenil. v. II. p. 67-70. Caracas:
vulvar, portanto, de ação estritamente local; ve- Editorial Ateproca; 2000.
rificou que a resposta é mais lenta, a coalescên-
cia se desfaz, em média com 40 dias de uso e HUFFMAN, J.W. The Gynecology of Child-
não há modificação da mucosa vulvar. hood and adolescence. Philadelphia: W.B.
Saunders, 1968.
Petti preconiza o uso de vaselina sólida,
e diz obter resultado tão satisfatório quanto o KUO, D.M. Labial fusion in a thirty-year old
obtido com cremes a base de estrógeno. Mas woman. Acta. Obstet Gynecol. Scandi. v.77,
Magalhães não concorda com essa conduta, n.6, p.697-8, 1998.
pois nesse caso não há o tratamento do maior
fator desencadeante que é o hipoestrogenismo LABRADOR, M.; DELGADO, R.; LABRADOR,
e/ou processo inflamatório. C. Coalescência de los lábios menores. Col.
Méd estado Táchira, v.11, n.3, p.14-18. out-
Recentemente, estudo retrospectivo, com -dec. 2002.
uso tópico de betametasona, foi realizado por
Mayoglou com 151 meninas com idade média LEWITAN, G.; HENRIQUES, C.A.; LYSANDRO,
de 3 anos, mostrou que a separação labial ocor- A.E.A.A. Coalescência dos pequenos lábios-Aná-
reu em um período curto de tempo e sem os lise de 64 casos. Rev. Bras. Ginecol Obstet,
efeitos colaterais do estrogênio tópico. Da mes- p.105-7, maio/junho, 1985.
ma opinião, é Myers; afirma que a betameta-
MAGALHÃES, M.L.C. Coalescência de Peque-
sona a 0,05% pode ser indicada como terapia
nos Lábios. In: MAGALHÃES, M.L.C; ANDRADE,
inicial ou em pacientes com outros tratamentos
H.H.S.M. Ginecologia Infanto-Juvenil. Rio de
prévios, sem sucesso.
Janeiro: Medsi, 1998 p.279-83.
A indicação cirúrgica é rara; deverá ser
particularmente reservada aos casos não so- MAGALHÃES, M.L.C.; SEABRA, M.A.S. Coales-
lucionados pelo tratamento com creme tópico cência de Pequenos Lábios. In: MAGALHÃES,
ou em pacientes em que a fusão se encontra M.L.C.; REIS, J.T.R. Ginecologia Infanto-Juvenil
bastante espessa. Consiste na debridação ma- – Diagnóstico e Tratamento. Rio de Janeiro:
nual, com ou sem anestesia local à base de cre- MedBook, 2007. Cap. 9, p. 83-87.
mes contendo lidocaína com Prilocaína a 2,5%. MAYUGLOU, L.; DULABON, L.; MARTIN-ALGUA-
Antes dessa manobra, está indicado o uso de CIL, N. et. al. Success of treatment modalities for
creme de estrógeno por uma semana e Lewitan labial fusion: a retrospective. J. Pediatric Ado-
preconiza a continuação do seu uso por mais lesc Gynecol, v. 22, n.4, p. 247-50, Aug. 2009.
duas semanas. Refere ainda que antes da indi-
cação cirúrgica a paciente deve ser bem avalia- MYERS, J. B.; SORENSEN, C.M.; WISNER, B. P. et.
da porque muitas apresentam recidivas. al. Bethamethasone cream for the treatment pf
pre-pubertal labial adhesions. J. Pediatric Ado-
Provavelmente, o maior dano que a coa-
lesc Gynecol., v. 19, n. 6, p. 407-11, Dec. 2006.
lescência dos pequenos lábios pode trazer seja
Faculdade Christus 83
Capítulo 8
84 Faculdade Christus
Capítulo 9
VULVOVAGINITES NA INFÂNCIA
Maria de Lourdes Caltabiano Magalhães
Gabriella Girão Campos de Barros
Maria Thereza da Frota Quinderé Ribeiro
mulher adulta. Como também, as lesões cervi- uso frequente e muitas vezes desnecessário
cais, que frequentemente são responsáveis por de antibióticos que modificam o ecossistema
sintomas depois da puberdade, são raras vezes vaginal, desequilibrando-o.
observadas na infância. Por outro lado, a vagi- infecção dos tratos respiratório, urinário, in-
nite, devido à infecção por micro-organismos testinal, da pele, alergias, transtornos imuno-
inespecíficos, escassamente observada na fase lógicos, entre outros.
adulta é o achado mais comum nas meninas. doenças crônicas como diabetes que favore-
cem a instalação e manutenção de infecções.
parasitoses intestinais, sendo a mais frequente
2. Fatores Predisponentes as infecções por oxiúros. O enteróbio é muito
Do ponto de vista fisiológico, anatômico frequente e não está necessariamente relacio-
e comportamental, as crianças pré-púberes re- nado com precárias condições de higiene. O
presentam um grupo de risco bastante suscep- contato entre crianças nas escolas pode fa-
tível para o aparecimento das vulvovaginites. vorecer a transmissão em meninas de classes
socioeconômicas mais elevadas. Outros para-
Os mecanismos de defesa não são total- sitas do trato digestivo raramente invadem a
mente conhecidos na mulher adulta e são defi- cavidade vaginal. Entretanto, Huffman relata
cientes ou nulos na menina. As principais alte- que durante uma vaginoscopia, encontrou
rações evidenciadas nos mecanismos de defesa uma espécie de Ascaris lumbricóides enrolada
da criança são: na cúpula vaginal de uma menina.
desenvolvimento anatômico incompleto, mas malformações do trato urinário e intestinal
fisiológico, das estruturas vulvoperineais dei- baixo como, por exemplo, ureter ectópico, fís-
xa o trato genital inferior mais permeável a tulas retovaginais e retoperineais.
agentes agressores; a ausência de pilosidade incontinência urinária e/ou fecal.
pubiana, lábios menores e maiores pouco de- enurese.
senvolvidos, pequena abertura himenal obs- obesidade.
truindo a saída de conteúdo vaginal na infân- desnutrição e avitaminose.
cia inicial. dietas muito ricas em hidratos de carbono que
proximidade entre o ânus e a vagina favore- aumentam os nutrientes dos microorganismos.
cendo as infecções ascendentes por contami- influências no estado geral como tensão e stress.
nação com micro-organismos fecais. corticoides, quando usados em forma sistê-
ausência de mecanismos autodefensivos da mica, diminuem a resistência às infecções.
vagina devido a um pH inadequado em con- precariedade da higiene genito-anal levando
sequência da falta de lactobacilos. Por se tor- material fecal para a vulva e vagina.
nar alcalino, o conteúdo vaginal na infância adultos portadores de infecções e que cuidam
passa a ser um bom meio de cultura para o de crianças.
crescimento de bactérias patogênicas. roupa íntima mal lavada, com detergentes ou
diminuição ou ausência quase total do muco sabões que poderão atuar como agentes aler-
cervical devido aos baixos níveis hormonais gênicos.
e consequente falta de lisozima, substância uso de roupa íntima de fibras sintéticas que man-
que possui uma ação defensiva contra alguns têm os genitais úmidos e transformam a vagina
agentes bacterianos, micóticos e parasitários. em meio de cultura ideal para as infecções.
falta dos anticorpos que estarão presentes na irritantes locais como perfumes ou desodo-
adolescência. rantes vulvares.
asseio exagerado e duchas vaginais que mo-
dificam a flora vaginal.
2.1. Outros fatores predisponentes masturbação.
Além da diminuição dos mecanismos de abuso e agressões sexuais.
defesa locais da menina, as infecções podem corpo estranho na vagina.
ser favorecidas por vários fatores sistêmicos ou
tópicos. Segundo alguns autores, quase todas 3. Manifestações Clínicas
as meninas têm, em alguns momentos de sua
A sintomatologia não é característica; a
vida, certo grau de vulvovaginite. Os principais
gravidade dos sintomas das vulvovaginites varia
fatores para isso são:
consideravelmente e depende do quadro clínico.
86 Faculdade Christus
Capítulo 9
Faculdade Christus 87
Capítulo 9
88 Faculdade Christus
Capítulo 9
será realizado todas as vezes que a fralda for monstrar trichomonas ou fungos. Indicar aplica-
trocada, somente com água morna e algodão. ção endovaginal de creme ginecológico; realizar
As meninas devem usar calcinhas de algodão de maneira cuidadosa para não traumatizar a
ou malha de algodão que têm a vantagem de criança, com material adequado e por pessoas
absorver a umidade e de não conter substân- habilitadas. Pode ser utilizado cremes à base
cias corantes nem materiais sintéticos capazes de sulfonamidas ou tetraciclina e anfotericina B
de irritar a pele. Dependendo da intensidade que são particularmente efetivos nesses casos.
do quadro e do prurido, indicamos cremes com Quando o tratamento não é realizado correta-
antibiótico ou corticoide, para diminuir a sinto- mente, pode ocorrer uma melhora do processo
matologia e a inflamação. inflamatório e logo que a medicação é suspen-
sa, a sintomatologia aparece novamente.
Nos casos de vulvites agudas eritematosas
ou exsudativas, utiliza-se como primeira medida,
compressas úmidas frias, se possível com antis-
5.2. Vaginose bacteriana
sépticos. Após o alívio da sintomatologia aguda,
pode-se indicar creme endovaginal e/ou apenas É a causa mais comum de corrimento du-
vulvar, com anti-inflamatório e/ou corticoide. rante a idade reprodutiva e não muito frequente
nas meninas. O crescimento excessivo da flora
Huffman refere que 80% das crianças tra-
bacteriana vaginal anaeróbia altera a predomi-
tadas por vulvovaginite inespecífica ficam as-
nância normal dos lactobacilos e resulta em va-
sintomáticas por vários meses, quando a boa
ginose bacteriana, que é responsável por apro-
higiene perineal é mantida. Antibioticoterapia
ximadamente 1/3 de todas as vulvovaginites em
sistêmica via oral ou parenteral só deve ser utili-
mulheres. O pH ideal para a sua sobrevivência
zada quando um agente específico é identifica-
é de 5 a 5,5 não coincidindo com o da menina
do ou há infecção urinária associada.
que é de 6 a 7,5.
Se o agente for o oxiúros, todos os mem-
Quanto à forma de transmissão, afirma-
bros da família devem ser submetidos a trata-
va-se que o contágio aconteceria de forma di-
mento. Outros parasitas intestinais como Giardia
reta e a transmissão na infância (menores de
lamblia e B. hominis, se presentes, necessitam
10 anos) poderia ocorrer por meio de toalhas
também ser tratados concomitantemente.
úmidas, sem deixar de pensar na violência sexu-
Quando a causa da enfermidade é um al. Atualmente, muitos trabalhos têm mostrado
corpo estranho, este deve ser removido da va- que não há um contágio, mas uma colonização
gina o mais rápido possível, com cuidado e de- cujo desequilíbrio se daria provavelmente por
licadeza e concomitantemente tratar o processo um parasitismo de fagos na população bacte-
inflamatório. riana aeróbia. O CDC – Atlanta no seu último
protocolo não mais considera a possibilidade
A inoculação hematogênica da vulva e
de transmissão, principalmente sexual.
da vagina por germes causadores de infecção
localizada em outro ponto do organismo e a A vaginose bacteriana, nas pré-puberes,
transmissão por meio de mãos contaminadas pode estar associada à queixa de corrimento
são outras causas de vulvovaginites em crian- em cerca de 5% dos casos e de prurido em tor-
ças. História de infecção, comprometendo as no de 3% das vezes. O tratamento é idêntico ao
vias aéreas superiores, pele, trato urinário ou da infecção por Trichomonas vaginalis.
gastrointestinal ou outros locais, pode estar
Como já foi abordado anteriormente, a
presente. O tratamento depende da definição
sintomatologia e o tratamento são os mesmos
da fonte primária de infecção, obtendo-se os
em todas as faixas etárias. Para não se tornar
resultados de culturas e determinando-se o tra-
repetitivo, estenderemo-nos um pouco mais fa-
tamento indicado. A antibioticoterapia prescrita
lando sobre vaginose e vaginites, no capítulo de
para a infecção primária tende a curar também
vulvovaginite no menacme.
a infecção vaginal. Uma boa higiene perineal e
banhos de assento, como antes descrito, são
importantes para proporcionar o alívio dos sin- 5.3. Candidíase vaginal
tomas e evitar a recorrência. O tratamento local
com antimicrobianos deve ser iniciado nos ca- É o micro-organismo encontrado com
sos em que o exame bacterioscópico não de- maior frequência nas infecções da infância, na
Faculdade Christus 89
Capítulo 9
90 Faculdade Christus
Capítulo 9
Faculdade Christus 91
Capítulo 9
92 Faculdade Christus
Capítulo 10
VULVOVAGINITES NA ADOLESCÊNCIA
Maria de Lourdes Caltabiano Magalhães
Lívia Mara Almeida Silveira
Marta Gabriela Silvestre Coelho Carvalho
Segundo a Organização Mundial da Saú- Para Halbe (2000), durante esse perío-
de (OMS), a adolescência compreende a faixa do, são várias as razões que configuram uma
etária entre 10 e 19 anos. De acordo com o Es- visita ao ginecologista: irregularidades no ci-
tatuto da Criança e do Adolescente (Lei no 8.069 clo menstrual, acne, contracepção, orientação
de 13/07/90), é considerado adolescente o in- sexual e, em um lugar de destaque, ficam as
divíduo entre 12 e 18 anos de idade. Essa dife- vulvovaginites. É responsável por aproxima-
Capítulo 10
damente 10 milhões de visitas por ano ao gi- saúde reprodutiva e enfatizar a importância do
necologista. exame ginecológico de rotina. Faz-se inicialmen-
te a inspeção vulvar, a classificação do desen-
Os processos infecciosos são mais fre-
volvimento dos pêlos, observa-se a presença ou
quentes nessa faixa etária devido às alterações
não de processo inflamatório e/ou traumatismo
hormonais. As sequelas dessas infecções incluem
e a condição do hímen. O método utilizado para
distúrbios mais sérios do trato genital superior
a coleta do conteúdo vaginal vai depender da in-
(por exemplo, salpingooforite com resultante
tegridade do hímen e de seu relaxamento.
infertilidade). Na avaliação de uma adolescente
que apresenta sinais e sintomas de vulvovagini- Em adolescentes, são comuns as infec-
te, precisa-se levar em consideração o estágio ções mistas. A avaliação do corrimento quanto
puberal, o envolvimento sexual atual ou recente à intensidade, cor, características, odor e pH é
(voluntário ou associado à agressão) e os mé- importante. As infecções da vagina, colo, útero,
todos de anticoncepção (caso sejam usados), já trompas de Falópio e do trato urinário produ-
que todos estes fatores podem influenciar no zem sintomas semelhantes, tais como disúria,
tratamento. A possibilidade de infecção sexual- prurido vulvar, dispareunia e aumento ou alte-
mente transmitida é motivo de significativa pre- ração do conteúdo vaginal.
ocupação para essas meninas e, dessa forma, a
A adolescente deve ser questionada sobre
consulta clínica proporciona a oportunidade de
o desejo da presença do responsável durante a
orientar a paciente e facilitar sua adesão ao trata-
consulta. É importante, também, explicar como
mento recomendado porque a atividade sexual
será realizado o exame bem como mostrar os
expõe as jovens a muitos patógenos.
instrumentos que serão utilizados.
A vulvovaginite na adolescente sem ati-
Na adolescência, as vulvovaginites de-
vidade sexual tem, em geral, as mesmas cau-
nominadas “inespecíficas” são encontradas
sas encontradas nas vulvovaginites da infância.
muito raramente.
Além disso, nesse período também é muito co-
mum a ocorrência de queixas de corrimento em
determinados dias do mês, correspondente ao XX Vaginose bacteriana
período da ovulação. Esse conteúdo vaginal, em Muitas pacientes portadoras de vaginose
geral, não apresenta sintomas associados. podem ser assintomáticas, mas a manifestação
Nas adolescentes com atividade sexual, clínica mais comum desta enfermidade é um
em geral, os micro-organismos são os mesmos corrimento vaginal fino, homogêneo, branco-
encontrados na mulher adulta: Cândida, Tricho- -acinzentado e com forte odor. A paciente pode
monas, Gardnerella. Podem também ocorrer apresentar também uma sensação de “queima-
as cervicites (Clamídia ou Gonococo), além de dura” na vulva e prurido, mas a característica
infecções por HPV, que devem ser adequada- principal é uma inflamação leve; daí o nome
mente acompanhadas. As infecções geralmente mais apropriado ser vaginose e não vaginite.
se iniciam como uma vaginite primária e o cor- A avaliação microscópica de uma gota do
rimento associado pode provocar uma vulvite conteúdo vaginal e de soro fisiológico nos mos-
secundária. É necessária uma investigação adi- tra células epiteliais vaginais pontilhadas, cujos
cional para se determinar se o processo infla- bordos se acham escurecidos pelas bactérias ade-
matório atingiu o trato genital superior. rentes. Esse aspecto típico é denominado “célu-
O uso de antibióticos, duchas, secreções las indicadoras” ou “clue cells”. Uma coloração do
alcalinas durante as menstruações, sabões alca- fluido vaginal pelo Gram revela microbiota rica em
linos e diabetes mellitus mal controlada estão elementos cocobacilares Gram variáveis, eventu-
entre as causas mais comuns de alteração da almente com bacilos curvos Gram negativos para
microflora vaginal. Gram variáveis, com poucos lactobacilos. As cul-
turas do conteúdo vaginal têm um valor limitado,
Durante a anamnese, é importantíssimo
porque esses organismos se encontram na flora
que o profissional estabeleça uma relação de
vaginal normal em mais de 50% das mulheres.
confiança com a adolescente.
Para Silveira, é mais frequente em mulhe-
Durante a anamnese e o exame físico, o
res que usam DIU (50%) do que nas que usam
profissional terá a oportunidade para orientar a
anticoncepcionais orais (20%).
paciente quanto ao desenvolvimento puberal, à
94 Faculdade Christus
Capítulo 10
Vaginose bacteriana é considerada por Nas adolescentes com vida sexual ativa,
muitos autores como uma síndrome que basica- nas formas leves, ao exame especular, observa-se
mente se associa a um desequilíbrio da micro- um fluxo semelhante ao da vaginose. O diagnós-
biota vaginal com mudança de sua população tico diferencial se faz pelo aspecto da mucosa;
bacteriana predominantemente aeróbia (Lacto- na tricomoníase, a mucosa vaginal é congesta
bacillus sp), na vagina normal, para anaeróbia e pode apresentar (20%) máculas semelhantes
(Gardnerella vaginalis, Prevotella sp, Bacteróides a pequenas framboesas muito típicas e distri-
sp, Mobiluncus sp e Peptostreptococcus sp). As buídas por toda a vagina e cérvice. À inspeção,
razões para este desequilíbrio são desconheci- geralmente, encontra-se eritema vulvar e vaginal
das, embora a perda de lactobacilos produtores além de hemorragias puntiformes da vagina e do
de peróxido de hidrogênio, que é tóxico para colo, que podem resultar em sangramento pós-
numerosos anaeróbios, deva ser um elemento -coito, alterando a cor do corrimento.
essencial. Atualmente o diagnóstico desta con-
Para adolescentes, o tratamento de elei-
dição reside em critérios clínico-laboratoriais
ção é o metronidazol ou secnidazol, via oral, 2
(critérios de Amsed (corrimento homogêneo
gramas em dose única, associado a medicação
e fino, teste das aminas positivo, bacilos supra
tópica, como o uso de asseio com substâncias
citoplasmáticos sugestivos de Gardnerella vagi-
acidificantes e cremes vaginais de metronida-
nalis e pH vaginal > 4,5). A presença de 3 dos
zol. O tratamento do parceiro sexual também
4 critérios permite o diagnóstico em 90% das
é recomendado. A terapia sistêmica visa ao tra-
mulheres ou pelo exame bacterioscópico por
tamento adequado dos reservatórios uretrais e
coloração de Gram.
periuretrais. Após o tratamento, deve-se orien-
O tratamento é idêntico ao da infecção tar a paciente no sentido de retornar para con-
por Trichomonas vaginalis, não havendo neces- trole, com o objetivo de nos certificarmos da
sidade de tratar o parceiro sexual. recuperação do fluxo normal.
Faculdade Christus 95
Capítulo 10
96 Faculdade Christus
Capítulo 11
VULVOVAGINITES NO MENACME
Maria de Lourdes Caltabiano Magalhães
Juliana Costa Alencar
Muitas vezes, somente o quadro clínico é de 105 a 106 por grama de fluxo, sendo que os
insuficiente para determinar a etiologia do cor- anaeróbios aumentam muito nas infecções che-
rimento genital, de modo que, para o estabe- gando a 109-1011/g de fluxo.
lecimento do diagnóstico etiológico, é de fun-
A interrelação dos micro-organismos da
damental importância o estudo do ecossistema
flora endógena com patógenos exógenos pode
vaginal, o qual compreende a medida do pH e a
ser de sinergismo, antagonismo ou indiferença.
avaliação da flora.
O resultado destas relações determina a extin-
ção de algumas das bactérias ou a invasão tis-
sular e a infecção do hospedeiro.
2. Testes diagnósticos
Como nos capítulos anteriores sobre vul-
Avaliação do pH (papel de hidrazina)
vovaginite, abordaremos as principais causas de
Exame a fresco
corrimento vaginal.
• Preparo das lâminas:
• Montagem em solução salina (soro fisio-
lógico) 3.1. Vaginose bacteriana
• Montagem em hidróxido de potássio
(KOH a 10%) A abordagem não difere das adolescen-
• Cobrir com lamínula e levar ao microscópi- tes. Trata-se de uma síndrome caracterizada
co óptico, com aumento de 10 a 40 vezes por infecção polimicrobiana, cuja ocorrência
Teste das aminas (Whiff-Test): com KOH a depende do sinergismo entre a Gardnerella va-
10%, o teste é positivo quando há liberação ginalis e as bactérias anaeróbicas (Mobiluncus
do odor característico, de “peixe podre”, pela e bacteroides) que estão associados ao decrés-
liberação das aminas putrescina e cadaverina. cimo de lactobacilos.
Amostra endocervical (em casos especiais), Prefere-se o termo vaginose ao termo va-
para pesquisa de Chlamydia, Neisseria gonor- ginite, pois a resposta inflamatória é escassa, apa-
rhoeae, herpesvírus, micoplasmas: para inves- recendo em cerca de apenas 50% das infecções
tigação de cervicite. genitais baixas. A importância da vaginose não se
Colpocitologia oncótica: é obrigatória no se- deve apenas à sua elevada frequência, mas, prin-
guimento ambulatorial de todas as pacientes, cipalmente, ao relacionamento com enfermidades
para rastreamento do câncer cervical. Pode obstétricas, como a corioamnionite, trabalho de
colaborar para o diagnóstico etiológico das parto prematuro e endometrite pós-parto. Além
vulvovaginites. dessas entidades, há relação com endometrites
Bacterioscopia (Gram): indicada nas situações não puerperais, salpingites, infecções pós-opera-
indicadas para cultura. tórias e infecções do trato urinário.
Não se deve solicitar, de rotina, cultura
O quadro clínico: corrimento abundan-
do conteúdo vaginal; apenas está indicada em
te, homogêneo, branco-acinzentado, de odor
casos selecionados em que há forte suspeita clí-
fétido e com pequenas bolhas. O odor pio-
nica e testes diagnósticos negativos. A cultura
ra após o coito ou durante a menstruação,
do conteúdo vaginal simples geralmente só de-
quando o pH vaginal se eleva. Observa-se,
monstra os germes comensais da vagina (flora
eventualmente, disúria, dispareunia, prurido e
normal), que não necessitam de tratamento.
colpite discreta.
98 Faculdade Christus
Capítulo 11
cada 8 horas, VO, durante 7 dias ou, pelo mes- das vulvovaginites. O Trichomonas é um orga-
mo período, a clindamicina, VO ou vaginal. nismo resistente, capaz de sobreviver em toa-
lhas molhadas e em outras superfícies, e, por-
Quanto ao parceiro da paciente, embora
tanto pode ser transmitido por via não sexual.
pareça controverso, prefere-se não tratá-lo ro-
O seu período de incubação varia de 4 a 28 dias.
tineiramente. Essa conduta alicerça-se no fato
de a vaginose ocorrer devido a um desequilíbrio A associação com gonococo é comum,
da flora vaginal e não pela introdução de algum provavelmente devido à sua capacidade de
agente agressor estranho ao meio vaginal. fagocitá-lo. O sinergismo infeccioso com flora
anaeróbica também é frequente.
O corrimento profuso, amarelo ou ama-
3.2. Candidíase vaginal
relo-esverdeado, bolhoso e fétido, pode ser
O quadro clínico também não difere das acompanhado de disúria, prurido e dispaurenia.
outras faixas etárias: corrimento branco, em pla- O aspecto bolhoso decorre da frequente asso-
cas, aderente, com aspecto de leite coalhado e ciação ao Micrococcus alcaligenies aerogenes.
prurido intenso, determinando hiperemia, mace- Os sintomas intensificam-se no período pré-
ração e escoriações na região vulvar, causando, -mentrual e a colpite, de natureza focal, expres-
às vezes, disúria e dispareunia. Os sintomas po- sa-se clinicamente pelo “colo em framboesa” e
dem ser decorrentes de reação alérgica á toxina pelo aspecto “tigróide” ao teste de Schiller.
da levedura (canditina) e surgem ou pioram na
O tratamento, também como já aborda-
fase pré-menstrual. Existe colpite difusa ao exa-
do, pode ser realizado por meio de nitroimi-
me ginecológico e, frequentemente, ocorre a
dazólicos, preferencialmente por via sistêmica,
forma ulcerativa, acompanhada de sintomas do-
para atingir a infecção uretral e vesical. Na ges-
lorosos, principalmente durante a micção. Essa
tação, aconselha-se clotrimazol tópico, de eficá-
forma clínica pode simular infecção herpética.
cia moderada, por ser inócuo ao feto.
Apenas uma minoria das mulheres com
Nas falhas do tratamento ou recidivas,
infecção clínica apresenta um dos fatores consi-
excluir a reinfecção; a causa mais comum é a
derados como facilitadores dessa doença como:
ausência de tratamento do parceiro. Cepas mais
gravidez, utilização de contraceptivos hormo-
resistentes respondem bem ao aumento da dose
nais com altas doses de estrogênio, diabetes
(1,2 até 2-3g/dia), ou ao emprego de tinidazol.
melittus, utilização de antibióticos sistêmicos de
largo espectro, vestuário inadequado com a uti- Os parceiros sexuais devem ser tratados e
lização de fios sintéticos, desodorantes íntimos as pacientes devem ser instruídas a evitar o in-
e absorventes perfumados, que predispõem à tercurso sexual até que o tratamento seja com-
reação alérgica local. pletado e os sintomas resolvidos.
O tratamento das candidíases nessa faixa
etária é idêntico ao preconizado às adolescen-
tes. Se o processo é recorrente, utiliza-se, na fase
D- Referências Bibliográficas
aguda, o tratamento oral e o creme intravaginal AMORIM, M.M.R. Vulvovaginites. In: SANTOS,
por 14 dias. Na etapa seguinte, o tratamento su- L.C.; FIGUEIREDO, S.R.; AMORIM, M.M. R. GUI-
pressivo deve perdurar por 6 meses. Se a opção MARÃES, V.; PORTO, A.M. Ginecologia Clínica
for via tópica, prescrever clotrimazol, 01 óvulo – Diagnóstico e Tratamento. Rio de Janeiro:
intravaginal de 500mg/semana; se for por via MedBook, 2007. Cap.21. p.207-218.
sistêmica, pode-se utilizar fluconazol 150mg/
semana ou itraconazol a 50 a 100mg/dia BARCELOS, M.R. et al. Infecções genitais em mu-
lheres atendidas em Unidade Básica de Saúde:
Não está indicado o tratamento do par-
prevalência e fatores de risco. Rev. Bras. Ginecol.
ceiro, a menos que ele também apresente algu-
Obstet., Rio de Janeiro, v. 30, n. 7, July 2008.
ma sintomatologia.
CAROLYN, J.; SMITH, A.J. Infecções do trato genital.
In: BANKOWSKI, B.J.; HEARNEM A.E.; LAMBROU,
3.3. Infecção por Trichomonas vaginalis N.C.; FOX, E.H.; WALLACH, E.W. Manual de Gine-
É considerada uma infecção sexualmen- cologia e Obstetrícia do John Hopkins. 2.ed.
te transmissível e responsável por cerca de 25% Porto Alegre: Artmed, 2006. Cap.24, p.326-342.
Faculdade Christus 99
Capítulo 11
Principais alterações que ocorrem na vulva e vulvovaginite por Trichomonas vaginalis ou Cân-
na vagina nessa faixa etária: dida, o tratamento é semelhante os já abordados
Vulva: a lubrificação do vestíbulo vulvar prove- nos capítulos anteriores de vulvovaginite.
niente das glândulas de Bartlholin diminui como
também a secreção de muco decorrente do es-
tímulo sexual, levando à dispareunia de introdu- D- Referências Bibliográficas
ção. Do ponto de vista histopatológico há atrofia
da pele, dos tecidos dérmicos, papilar e reticular. AMORIM, M.M.R. Vulvovaginites. In: SANTOS,
Vagina: o epitélio vaginal perde sua estratificação, L.C.; FIGUEIREDO, S.R.; AMORIM, M.M.R.; GUI-
havendo predomínio das células basais e inter- MARÃES, V.; PORTO, A.M. Ginecologia Clínica
mediárias. A mucosa vaginal torna-se adelgaçada, – Diagnóstico e Tratamento. Rio de Janeiro:
com desaparecimento de suas pregas, favorecen- MedBook, 2007. Cap.21. p.207-218.
do processo inflamatório e hemorrágico. O terço CAROLYN, J.; SMITH, A.J. Infecções do trato ge-
superior da vagina tende a se retrair e a vagina nital. In: BANKOWSKI, B.J.; HEARNE, A.E.; LAM-
inteira reduz seu comprimento e sua elasticidade. BROU, N.C.; FOX, E.H.; WALLACH, E.W. Manual
de Ginecologia e Obstetrícia do Johns Ho-
Diagnóstico pkins. 2. ed. Porto Alegre: Artmed, 2006. cap.24.
As principais queixas referentes à vagini- p.326-342.
te são: dor espontânea em queimação, secura
HALBE, H.W. et al. Síndrome do Climatério. In:
vaginal, dor às relações sexuais e sensação de
PINOTTI, J.A.; BARROS, A.C.S.D. Ginecologia
calor local. As manifestações clínicas da síndro-
Moderna. Rio de Janeiro: Revinter, 2004. Cap.
me uretral são: disúria, urgência miccional, po-
26. p.211-236.
laciúria e noctúria.
Por meio de o exame especular, observa- MACHADO, L.V. Endocrinologia Ginecológica.
-se que a mucosa vaginal apresenta-se hipere- Rio de Janeiro: MedBook, 2006.
miada. O conteúdo vaginal comumente é escas- MAGALHÃES, M.L.C.; ELEUTÉRIO JÚNIOR, J.;
so e tem aspecto purulento. FURTADO, F.M. Vulvovaginites. In: MAGALHÃES,
Na maioria das vezes, essa avaliação clí- M.L.C.; REIS, J.T. Ginecologia Infanto-Juvenil:
nica é suficiente para estabelecer o diagnósti- Diagnóstico e Tratamento. Rio de Janeiro: Me-
co de vaginite senil e de síndrome uretral. Em dbook, 2007. Cap 8. p.67-83.
situações especiais, pode-se realizar o estudo
NAUD, P.; STUCZYNSKI, J.V.; MATOS, J.C.; HAMMES,
do conteúdo vaginal; não se deve esquecer do
L.S. Vulvovaginites. In: FREITAS, F.; MENKE, C.H.; RI-
exame oncocitológico que também poderá cor-
VOIRE, W.A.; PASSOS, E.P. Rotinas em Ginecologia.
roborar com o diagnóstico.
Porto Alegre: Artmed, 2006. Cap.13. p.158-167.
não se deve descartar as causas não sexual- Brasil (MS) e a Organização Mundial da Saúde
mente transmissíveis. (OMS) preconizam o tratamento sindrômico das
úlceras genitais (Figura 1).
Os métodos diagnósticos específicos ine-
rentes às patologias relacionadas com úlcera ge- Apesar disso, sabe-se também que muitas
nital serão abordados no decorrer do capítulo. destas úlceras podem ter etiologias não sexual-
mente transmissíveis; logo, a confirmação diag-
nóstica é fundamental para o estabelecimento de
1.6. Tratamento um tratamento específico e consequentemente,
Considerando o fato de que as doenças o sucesso terapêutico. O tratamento específico
sexualmente transmissíveis são a principal cau- das patologias causadoras de úlceras genitais
sa das úlceras genitais, o Ministério da Saúde do será abordado no decorrer do capítulo.
com base mole e fundo purulento com odor lação, surgem outras lesões que ao se juntarem
fétido. Após uma semana do aparecimento atingem grandes áreas. A úlcera apresenta-se
do cancro, cerca de 30% a 50% dos pacientes com bordos irregulares, endurados, elevados e
apresentam uma adenite inguinal satélite re- bem delimitados, tendo uma coloração verme-
coberta por uma pele eritematosa, denomi- lho vivo e sangrando com facilidade. Não há
nada bubão. O bubão inguinal é geralmen- adenopatia satélite, mas ocorre a presença de
te unilateral, muito doloroso e pode evoluir pseudobubões (granulações subcutâneas) que
para uma fístula de único orifício que drena podem ser confundidos com adenites.
um pus espesso. XX Diagnóstico: apesar de o diagnóstico se dar
XX Diagnóstico: quando as características da apenas pelos dados clínicos, é confirmado
úlcera não são bem estabelecidas, realizam- evidenciando bacilos no interior de histióci-
-se testes laboratoriais, como coloração de tos quando corados pelo Giemsa.
GRAM, por meio do qual se visualizam pe- XX Tratamento:
quenos bacilos gram negativos e a cultura, Doxiciclina 100 mg, VO, de 12/12 horas, até
este sendo um teste mais sensível, entretanto a cura clínica (no mínimo por 3 semanas); ou
não muito factível, pelas exigências de cresci- Sulfametoxazol / Trimetoprim (160 mg e 800
mento do bacilo. mg), VO, de 12/12 horas, até a cura clínica (no
XX Tratamento: mínimo por 3 semanas); ou
Azitromicina 1g VO em dose única; ou Ciprofloxacina 750 mg, VO, de 12/12 horas,
Ceftriaxona 250 mg, IM, dose única; ou até a cura clínica; ou
Tianfenicol 5 g, VO, dose única; ou Tianfenicol granulado, 2,5 g, VO, dose única,
Ciprofloxacina 500 mg, VO, 12/12 horas, por 3 no primeiro dia de tratamento; a partir do se-
dias (contraindicado para gestantes, nutrizes gundo dia, 500 mg, VO, de 12/12 horas, até a
e menores de 12 anos); ou cura clínica; ou
Doxiciclina 100 mg, VO, de 12/12 horas, por Eritromicina (estearato) 500 mg, VO, de 6/6 ho-
10 dias ou até a cura clínica (contraindicado ras, até a cura clínica (no mínimo 3 semanas).
para gestantes e nutrizes); ou Caso não haja melhora na aparência da le-
Tetraciclina 500 mg, de 6/6 horas, por 15 dias são nos primeiros dias de tratamento com cipro-
(contraindicado para gestantes, nutrizes); ou floxacina ou eritromicina, aconselha-se adicionar
Sulfametoxazol / Trimetoprim (160 e 800 mg), um aminoglicosídeo, como gentamicina 1mg/
VO, de 12/12 horas, por 10 dias ou até a cura kg/dia, EV, de 8 em 8 horas. A resposta ao trata-
clínica; ou mento deve ser acompanhada. O único critério
Eritromicina (estearato) 500 mg, VO, de 6/6 de cura é o total desaparecimento da lesão. Caso
horas, por 7 dias. haja sequelas por destruição tecidual extensa ou
Além do tratamento sistêmico, deve-se fazer por obstrução linfática, pode-se realizar correção
a higienização das lesões. cirúrgica. Gestantes devem ser tratadas com eri-
tromicina (estearato) 500 mg, VO, de 6/6 horas,
até a cura clínica (no mínimo por 3 semanas).
DONOVANOSE
Nunca foi relatada infecção congênita devido à
XX Agente etiológico: Calymammatobacterium
infecção fetal. Pacientes portadores do vírus HIV
granulomatis.
são tratados de acordo com os esquemas cita-
XX Epidemiologia: a donovanose é rara, ocu-
dos acima; entretanto, nos casos mais graves,
pando o quinto lugar em frequência entre as
pode-se considerar o uso da gentamicina.
DST clássicas (gonorreia, sífilis, cancro mole e
linfogranuloma venéreo). Acomete principal-
mente a população com faixa etária entre 20
LINFOGRANULOMA VENÉREO
a 40 anos. Predomina em indivíduos do sexo
XX Agente etiológico: Chlamydia trachomatis-
masculino, na proporção de 3:1. Acomete
sorotipos L1, L2 e L3.
principalmente populações com baixo nível
XX Epidemiologia: a incidência é maior na po-
socioeconômico e com falta de higiene.
pulação com faixa etária entre 20 e 30 anos.
XX Quadro clínico: a donovanose apresenta um pe-
Predomina em populações com baixo nível
ríodo de incubação variável, podendo variar de
socioeconômico.
30 a 90 dias. A lesão inicial é subcutânea e carac-
XX Quadro clínico: o período de incubação va-
terizada por uma pápula, nódulo ou pústula que
ria de 3 a 32 dias. O quadro clínico caracte-
evolui para uma lesão ulcerosa. Por auto-inocu-
riza-se por três fases: 1- Inicia-se por pápula, ção sine qua non para o diagnóstico. As úl-
pústula ou exulceração genital, no local de ceras geralmente são dolorosas e com base
penetração da Chlamydia. Esta fase costuma necrótica central, ocorrendo na mucosa oral,
involuir espontaneamente. 2- Após a lesão genital e eventualmente na mucosa do trato
inicial, ocorre o acometimento linfonodal. A gastrointestinal. As manifestações cutâneas
adenite inguinal é dolorosa e pode evoluir incluem foliculite, eritema nodoso, exantema
para nódulos inguinais superficiais dolorosos, acneiforme e mais raramente vasculite. O en-
os bubões, maior característica da doença. O volvimento ocular caracteriza-se pela uveíte,
gânglio afetado pode evoluir com supuração irite, oclusão de vasos retinianos, podendo
e fistulização por orifícios múltiplos (bico de evoluir para cegueira. Artrite não deforman-
regador). 3- É caracterizado por sequelas da te também pode ser característica da doença.
obstrução linfática causadas pela infecção Trombose venosa profunda pode ocorrer em
clamidiana, como elefantíase dos genitais, alguns pacientes. Apesar das ulcerações afto-
fístulas e estenose retal. sas serem típicas da doença de Behçet, muitos
XX Diagnóstico: apesar de o diagnóstico ser ba- pacientes podem apresentar-se com úlceras
sicamente clínico, a confirmação diagnóstica orogenitais e não apresentarem a doença de
se dá por meio da imunofluorescência direta Behçet, enquadrando-se, portanto, nas doen-
ou por antígenos monoclonais para Chla- ças pseudo-Behçet (autoimunes), como aftose
mydia trachomatis. complexa, pênfigos, erupções por drogas e
XX Tratamento: outras situações de enfermidades.
Doxiciclina 100 mg, VO, de 12/12 horas, por XX Diagnóstico: o diagnóstico da doença de
21 dias; Behçet é essencialmente clínico. Exames labo-
Eritromicina (estearato) 500 mg, VO, de 6/6 ratoriais específicos ou anatomopatológicos
horas, por 21 dias; ou não são usados para estes casos. Os achados
Sulfametoxazol / Trimetoprim (160 mg e 800 laboratoriais são índices inespecíficos de doen-
mg),, VO, de 12/12 horas, por 21 dias; ou,, VO, ça inflamatória, como leucocitose e elevação da
de 12/12 horas, por 21 dias; ou velocidade de hemossedimentação. Anticorpos
Tianfenicol 500 mg, VO, de 8/8 horas, por 14 dias. contra a mucosa oral podem ser encontra-
XX Complicações: a obstrução linfática no linfo- dos. Os critérios diagnósticos para doença de
granuloma venéreo pode levar a elefantíase Behçet são: ulcerações orais recorrentes e mais
genital que, nas mulheres, é chamado de es- dois dos seguintes critérios: ulcerações genitais
tiomeno. Além disso, o agravamento das le- recorrentes, lesões oculares, lesões cutâneas,
sões pode acarretar a fístulas retais, vaginais teste da Patergia (reação cutânea inespecífica à
e vesicais e estenose retal. O acometimento injeção intradérmica de solução salina).
retal ocorre mais comumente em mulheres e XX Tratamento: o tratamento é realizado basica-
em homossexuais masculinos. mente com corticoterapia tópica e sistêmica.
diagnosticada por meio de achados anormais COSTA, I. M. C.; AZULAY, D. R. Síndrome de Rei-
no exame de prevenção. A presença de sangra- ter. In: AZULAY, D. R.; AZULAY, D. R.; AZYULAY, A.
mento anormal após relação sexual ou após o L. Dermatologia. 5.ed. Rio de Janeiro: Guana-
uso de duchas vaginais está presente em 50% bara Koogan, 2008.
dos casos. Dispareunia, odor, massa palpável e
descarga vaginal são sintomas observados nes- COSTA, J.B. et al. Úlceras Genitais Causadas por
ses casos. No exame ginecológico, deve-se rea- Infecções Sexualmente Transmissíveis. Acta
lizar o exame minucioso da cérvice e da vagina Medica Portuguesa, Lisboa. 2006.
e o exame bimanual. Deve-se também solicitar DE VITA, V. T.; LAWRENCE, T. S.; ROSENBERG, S.
uma radiografia de tórax, hemograma completo A. De Vita, Hellman and Rosenberg’s cancer:
e perfil bioquímico para todas as pacientes. O principles & practice of oncology. In: EIFEL, P.
tratamento varia de acordo com o local, o tama- J.; BEREK, J. S.; MARKMAN, M. A. Ginecologic
nho e a distribuição do tumor dentro da vagina Cancers. 8.ed. Philadelphia: Lippincott Williams
e estruturas adjacentes. & Wilkins. 2008.
AZULAY, M. M.; AZULAY, D. B. Doenças Sexual- GUEDES, A. C. M. et al. Doenças Virais de Inte-
mente Transmissíveis. In: AZULAY, D. R.; AZULAY, resse Dermatológico. In: AZULAY, D. R.; AZULAY,
D. R.; AZYULAY, A. L. Dermatologia. 5.ed. Rio de D. R.; AZULAY, A.L. Dermatologia. 5.ed. Rio de
Janeiro: Guanabara Koogan, 2008. Janeiro: Guanabara Koogan, 2008.
BELDA JÚNIOR, W.; SHIRATSU, R.; PINTO, V. GUIMARÃES, I. C. C. V. et al. Presença da Proteí-
Abordagem das Doenças Sexualmente Trans- na p53 como Prognóstico de Recidiva/Progres-
missíveis. Anais Brasileiros de Dermatologia, são de Neoplasia Intra-epitelial Vulvar III. Revis-
Rio de Janeiro, v.84, n.2, mar./abr. 2009. ta Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia, v.4,
n. 1 , p.55-57, Rio de Janeiro. 2002.
BRASIL. Ministério da Saúde. Coordenação Na-
cional de DST e Aids. Secretaria de Vigilância HILLARD, P. J. A. Doenças Benignas do Aparelho
em Saúde. Manual de Bolso Controle das Do- Reprodutivo Feminino. In: BEREK, J. S. Berek &
enças Sexualmente Transmissíveis DST. 2.ed. Novak: Tratado de Ginecologia. 14. ed. Rio de
Brasília, DF, 2006, 111p. Janeiro: Guanabara Koogan, 2008.
CORMACK, S. et al. Herpes Simples. In: FOCAC- HOLMES, K. K. Doenças Sexualmente Transmis-
CIA, R. Veronesi: Tratado de Infectologia. 3. síveis: Introdução e Abordagem Clínica. In: KAS-
ed, São Paulo: Atheneu, 2007. PER, D. L. et al. Medicina Interna. 16. ed, Rio de
Janeiro: Mc Graw Hill, 2006.
ais, em que um dos parceiros apresente corri- oral (VO) em dose única, ou doxiciclina 100mg VO
mento uretral, multiplicidade de parceiros ou de 12/12 horas, durante 7 dias. Como segunda
sem parceiro fixo e idade feminina menor que opção, pode-se administrar eritromicina 500mg,
20 anos, condição favorecida por epitélio colu- VO, 6/6h, ou tetraciclina 500mg, VO, 6/6h, ou oflo-
nar que recobre a cérvice uterina, diferente do xacina 400mg, VO, 12/12h, durante 7 dias.
epitélio escamoso de mulheres acima dessa fai-
Para gonorreia indica-se ciprofloxacino
xa etária
500mg, VO dose única, ou ceftriaxone 250mg,
O período de incubação da infecção intramuscular (IM), dose única. Como segunda
causada por Neisseria gonorrhoeae varia entre opção usa-se cefixima 400mg, ou ofloxacina
dois e cinco dias e as queixas clínicas mais fre- 400mg, VO, em dose única.
quentes são a presença de secreção purulenta
volumosa, disúria e “esquentamento”. Mais de
60% das mulheres podem permanecer assinto- 3.1. Aids
máticas, complicando com doença inflamatória A Aids, ou Síndrome de Imunodeficiência
pélvica, bartholinite, endometrite, infertilidade, Adquirida, é causada pelo vírus HIV (human im-
conjuntivite por autoinoculação e síndrome de munodeficiency virus) e apresenta caráter pan-
Firtz-Hugh-Curtis (perihepatite gonocócica). dêmico, representando um dos maiores proble-
A Chlamydia trachomatis produz uma in- mas de saúde pública da atualidade. De acordo
fecção indolente, com presença de secreção hia- com o Ministério da Saúde, desde 1980 até ju-
lina, mucoide, e sintomatologia branda. O perío- nho de 2008 foram registrados 506 mil casos
do de incubação varia entre duas a três semanas da doença, 80% nas regiões sul e sudeste. Anti-
e está relacionada à síndrome uretro-conjuntivo- gamente, atingia principalmente homossexuais,
-sinovial ou síndrome de Fiessinger-Leroy-Reiter. usuários de drogas injetáveis ou indivíduos que
receberam transfusão de sangue. Nas últimas
décadas, a epidemia assumiu um novo perfil,
2. Diagnóstico Laboratorial no qual a transmissão heterossexual passou a
ser a principal via de transmissão do HIV. Após
Em pacientes com gonorreia, a bacterios-
a introdução da política de acesso universal ao
copia pelo Gram quando disponível, pode cor-
tratamento antiretroviral, a mortalidade caiu e a
roborar para a visualização de diplococos Gram
sobrevida aumentou. Desde 1986, a notificação
negativos intracelulares. A sensibilidade do exame
de casos de Aids é obrigatória.
é de apenas 60% para mulheres e de aproximada-
mente 95% dos homens sintomáticos. A cultura O HIV é um vírus de RNA que através
em meio específico de Thayer-Martin constitui o de transcriptase reversa produz sequências de
padrão ouro. A PCR com amplificação da sequên- DNA viral que são integradas ao genoma do
cia de DNA permite melhores resultados quando hospedeiro (pró-virus). As células alvo do ví-
realizada em conteúdo vaginal do que em urina. rus são as que possuem a molécula de CD4 em
suas membranas como macrófagos e linfócitos
A bacterioscopia para clamídia é negativa
T, pois serve de receptor para o vírus.
e a cultura pelo elevado custo não é viável, po-
dendo ser realizada imunofluorescência direta e A infecção pelo HIV pode ocorrer de três
ELISA, sendo a PCR o método considerado pa- formas: por meio de contato sexual, por ex-
drão ouro. posição parenteral a sangue ou outros fluidos
corporais e verticalmente da mãe para o filho
Na abordagem sindrômica de uretrites e
(durante gestação, parto ou amamentação). As
cervivites, na presença de mucopus endocervical
chances de infecção são duas vezes maiores de
ou colo friável ou escore de risco maior ou igual
homem para mulher (provavelmente pela alta
a dois pontos, oferece-se tratamento empírico
concentração de HIV no sêmen, pelo coito po-
concomitante para gonococo e Clamídia, pela
der romper a mucosa introital mais comumente
presença de coinfecção em 10 a 30% dos casos.
que a pele do pênis, além de expor maior área
de mucosa).
3. Tratamento De duas a quatro semanas após a infec-
ção, geralmente se desenvolve uma infecção
A primeira opção terapêutica para infecção
retroviral aguda induzida por HIV como uma
por clamídia trachomatis inclui azitromicina 1g via
mononucleose-símile e seu reconhecimento cia laboratorial positiva contanto que não haja
e tratamento estão associados a um melhor outra explicação para a inumodeficiência.
prognóstico. Os sintomas geralmente são per-
da de peso, febre, artralgia, sudorese noturna,
faringite, rash eritemato-maculopapular, linfa- 3.1.2. Prevenção
denopatia, náuseas, vômitos, diarreia e tosse. Redução do número de parceiros sexuais,
Nessa fase, ocorre uma alta viremia com uma especialmente aqueles em grupos de alto
diminuição considerável de células CD4 periféri- risco, e uso de camisinha para qualquer ativi-
cas ocorrendo uma distribuição do vírus para os dade sexual. Aos pacientes infectados devem
diferentes tecidos podendo ser detectado por ser oferecidos vacinação contra hepatite B,
cultura, detecção de antígeno viral p24, PCR e influenza e pneumococo.
bDNA. Entre doze semanas e seis meses, dá-se
início à produção de anticorpos anti-HIV tor-
nando o paciente assintomático – fase latente. 3.1.3. Diagnóstico laboratorial
Nessa fase de baixa viremia, o tecido linfóide
O teste de anticorpos anti-HIV-1 e 2 deve
serve de reservatório para o vírus, cursando fre-
ser oferecido para mulheres: usuárias de drogas,
quentemente com linfadenopatia generalizada.
prostitutas, que moram ou nasceram em comu-
A carga viral no sangue aumenta progressiva-
nidades onde há uma alta prevalência de HIV,
mente durante anos, enquanto o número de
que receberam transfusões sanguíneas antes
CD4 diminui cursando com infecções oportu-
de 1985, com sinais de uma infecção por HIV,
nistas principalmente quando abaixo de 200
presidiárias, grávidas ou com parceiros com HIV
células/mm3. O tempo necessário para que isso
ou em grupos de risco de contrair HIV. O ELISA
ocorra varia, dependendo dos níveis de viremia
funciona como um teste de rastreamento para
iniciais, de profilaxia de infecções oportunistas
HIV; no entanto, dois testes positivos são confir-
e de drogas antiretrovirais. Se não tratado, a
matórios de infecção com 99% de sensibilidade
maioria dos casos desenvolve Aids em 17 anos.
e especificidade. Testes rápidos para HIV podem
No Brasil, as infecções oportunistas mais fre-
ser feitos em mulheres durante o trabalho de
quentes são pneumonia por Pneumocystis ji-
parto dando oportunidade para profilaxia de
rovecii, tuberculose pulmonar, candidíase oral
uma infecção previamente não diagnosticada,
e esofágica, toxoplasmose, citomegalovirose e
podendo-se obter os resultados em poucas ho-
criptococose no sistema nervoso central. Existe
ras com sensibilidade e especificidade compa-
uma forte associação entre HIV com sífilis e he-
ráveis ao ELISA.
patite B, bem como maior risco de coinfecção
HIV/outras DST, até 18 vezes mais em caso de
exposição sexual na presença de doença ulce- 3.1.4. Tratamento
rativa (Treponema pallidum, Haemophilus du-
creyi e herpesvírus simples), e 3 a 10 vezes mais O objetivo do tratamento é reduzir a vire-
em casos de doenças não ulcerativas genitais mia para níveis indetectáveis de forma estável e
(Chlamydia trachomatis, Neisseria gonorrhoeae aumentar os níveis de CD4 para níveis normais.
e Trichomonas vaginalis). A circuncisão está re- Qualquer paciente sintomático por infecção por
lacionada a uma redução de risco de transmis- HIV deve receber tratamento antiretroviral. No
são, tendo em vista que o prepúcio é um tecido entanto, não há consenso a respeito dos pa-
altamente vascularizado, rico em células de Lan- cientes que estão na fase assintomática. Hoje já
gerhans, tornando-se mais susceptível a micro se recomenda começar o tratamento para pa-
ulcerações durante o ato sexual. cientes com contagem de CD4 entre 200-350
células/mm3, ou caindo abruptamente (>50 cé-
lulas/mm3/ano) ou com viremia alta (>100 000
3.1.1. Diagnóstico cópias/ml). Antes disso, recomenda-se avaliar
os riscos e benefícios do tratamento, pois uma
Segundo o Ministério da Saúde, são ne-
má aderência precocemente pode eliminar pos-
cessárias evidências de infecção pelo HIV e
síveis opções terapêuticas futuras. Vale ressaltar
conjunto de sinais ou sintomas que somem no
que não deve ser feita a carga viral até 4 sema-
mínimo 10 pontos segundo critérios de OPAS/
nas após vacinação ou um processo infeccioso,
Caracas ou pelo menos uma doença definidora
inclusive gripe e herpes.
de Aids. Neste último, não é necessário evidên-
de uma política de vacinação contra VHB, no final ca que o paciente se recuperou da infecção e não
dos anos 80 e início dos anos 90, que inclui até transmite mais a doença. O anti-HBs é também
crianças abaixo de um ano tem mudado muito encontrado em pessoas vacinadas. Logo após,
o quadro desta doença que era considerado en- encontra-se também outro anticorpo, o anti-
dêmico em várias áreas. O estado do Amazonas -HBc. O IgM anti-HBc pode ser encontrado nas
chegou a ter uma prevalência de 15,3% em 1988 fases agudas e durante recaídas de hepatites crô-
que caiu para 3,4% em dez anos. nicas previamente assintomáticas. O IgG pode
permanecer positivo tanto após a resolução da
Já os índices de hepatite C variam desde
doença com aparecimento de anti-HBs, como na
1% como na Inglaterra, até 26% na região da ci-
cronicidade, persistindo o HBsAg positivo. Existe
dade do Cairo. Apesar da dificuldade de se esta-
ainda outro antígeno, HBeAg, que por ser uma
belecer a real prevalência de hepatite C no Brasil,
forma secretória de HBcAg, indica replicação e
alguns estudos com pré-doadores de sangue
infectividade. Logo, permanecendo positivo por
baseados em hemocentros estimam que a pre-
mais de 3 semanas é um forte indicativo de cro-
valência seja menor que 1%. Estudos populacio-
nicidade. Seus níveis plasmáticos tornam-se in-
nais em São Paulo e em Salvador apontam 1,42 e
detectáveis após o aparecimento de anti-HBe. Os
1,50% respectivamente. Infelizmente estes dados
exames para hepatite C incluem detecção de an-
não refletem a real prevalência de infecção, pois
ticorpos anti-VHC por imunoensaio de enzimas
dependem de um sistema de notificação de saú-
ou detecção de RNA viral por PCR (polymerase
de passivo, uma vez que a maioria dos acometi-
chain reaction).
dos são assintomáticos ou oligossintomáticos e
não procuram cuidado médico. Aproximadamente 5-10% das pessoas in-
fectadas com o vírus da hepatite B se tornam
O vírus da hepatite B consiste em uma
portadores crônicos do vírus, principalmente
molécula de DNA parcialmente dupla, prote-
imunoincompetentes. A maioria dos casos de
ínas internas (HBcAg) e uma parede externa
hepatite B crônica se dá em adultos que nunca
(HBsAg). É geralmente transmitido por contato
tiveram um episódio de hepatite viral aguda cli-
com sangue contaminado ou seus produtos e
nicamente relevante. Os níveis de DNA de VHB
por contato sexual, pois é encontrado no san-
no sangue são a melhor ferramenta para medir
gue, saliva, sêmen e secreção vaginal. Embora
o risco de cirrose ou carcinoma hepatocelular.
o maior número de casos se dê por contato
Menos de 1% desenvolvem hepatite fulminante
heterossexual, grupos de risco para hepatite B
com 60% de chance de óbito. Em torno de 85%
incluem usuários de drogas intravenosas, ho-
das pessoas infectadas com o vírus da hepatite
mossexuais masculinos, trabalhadores da saúde
C se tornaram portadores crônicos, indistinguí-
que lidam com sangue ou seus produtos, par-
vel clinicamente de hepatites crônicas de ou-
ceiros de portadores, prostitutas e presidiários.
tras etiologias. No entanto, 20% dos casos de-
Sete por cento das pessoas infectadas com o
senvolvem cirrose em 20 anos, principalmente
HIV também são positivas para VHB. O risco de
imunossuprimidos.
transmissão vertical de gestante para o feto é
de até 90%.
A classificação da hepatite crônica pode 3.3.2. Diagnóstico
ser feita por sua causa ou estágio, baseada em
Na fase aguda, incluem náuseas e vô-
estudo histológico de biópsia hepática, em que
mitos, diarreia ou constipação, febre baixa, ar-
se determina o grau de necrose periporta e a
tralgia, mialgia, fadiga e anorexia. Icterícia está
presença de células inflamatórias desintegrando
presente no início da doença ou até 5 a 10 dias,
a lâmina limitante dos hepatócitos periportais.
acompanhada de piora de sintomas seguida por
melhora clínica. Embora a síndrome aguda dure
apenas de 2 a 3 semanas, sinais laboratoriais
3.3.1. Exames
podem durar até 16 semanas para resolução.
HBsAg é a primeira evidência laboratorial O diagnóstico de hepatite crônica é essencial-
disponível da doença e é positivo durante o cur- mente laboratorial por testes de anticorpos e de
so agudo. Sua presença após a fase aguda indica ácidos nucleicos virais no sangue. Dada a lesão
cronicidade. Logo após o seu declínio encontra- hepática, as transaminases (ALT e AST) também
-se o anticorpo anti-HBs. Quando encontrado se encontram bastante aumentadas.
junto com o desaparecimento do antígeno indi-
Adefovil Interferon
Lamivudine Telbivudine Entecavir Interferon alfa 2b
Dipivoxil alfa 2a
5 milhões U/dia ou 10 mi-
100mg/dia 10mg/dia 600mg/dia 0.5mg/dia 180mcg 3x/semana
lhões U 3x/semana
VO VO VO VO 4 a 6 meses SC
4 a 6 meses IM
ELGOUHARI, H. M.; ABU-RAJAB TAMIMI, T. I.; SORRELL, M. F. et al. National Institutes of Health
CAREY, W. Hepatitis B: a strategy for evaluation Consensus Development Conference Statement:
and management. Cleve. Clin. J Med. v.76, n.1, management of hepatitis B. Annals of Internal
p.19-35, 2009. Medicine. v.150, n.2. p.104-10, 2009.
organismo, a idade da primeira relação sexual e mente, podendo estender-se ao clitóris e monte
a promiscuidade têm relação com o tempo de de Vênus, assim como para as regiões perineal,
exposição e com a exposição a vários tipos de perianal e canal anal. As infecções clínicas mais
vírus e os anticoncepcionais orais podem pro- comuns na região genital são as verrugas geni-
mover a integração do DNA do HPV ao genoma tais ou condilomas acuminados, popularmente
do hospedeiro. conhecidas como “crista de galo”.
3. Quadro clínico
Um grande obstáculo para o diagnósti-
5. Diagnóstico diferencial
co precoce é o fato da forma mais comum da 1. Pequenos cistos de implantação
doença ser subclínica. Essa forma de infecção 2. Pólipos endocervicais
compreende 60% a 95% de todas as infecções 3. Tumores benignos (lipomas e fibromas)
por HPV. Os casos subclínicos têm o crescimen- 4. Cistos mesonéfricos simples (de Gartner)
to vascular insuficiente para formar projeções 5. Neoplasias malignas
estromais (lesões exofíticas), diferentemente, 6. Micropapilomatose labial
do que ocorre com os sintomáticos. Os casos 7. Cândida
subclínicos podem ser reconhecidos por meio 8. Trichomonas vaginalis
da Colposcopia após a aplicação de ácido acé- 9. Neisseria gonorrhoeae
tico a 3-5%, onde serão percebidas alterações 10. Vaginose bacteriana
acetobrancas ou padrões vasculares anômalos. 11. Chlamydia trachomatis
12. Doença Inflamatória Pélvica (DIP)
A infecção pelo HPV pode afetar principal-
13. Hiperplasia microgandular
mente a cavidade oral, órgãos genitais e região
anal, sendo este um dos principais locais acome-
tidos. Dentre os principais sintomas destacam- 6. Exames
-se o prurido anal e a presença de lesões exofí-
6.1. Papanicolau
ticas. A infecção anal tem nítida predileção por
alguns grupos de pacientes: com antecedentes Modalidade eficaz de triagem do câncer
de tratamento de HPV genital, antecedentes de de colo uterino. É um exame que é capaz de
outras DST, HIV positivos e pessoas com com- reduzir bastante a taxa de incidência do câncer
portamento de risco para DST. As lesões ocor- de colo, pois é de praxe ser feito rotineiramen-
rem primariamente em regiões úmidas, como o te por todas as mulheres sexualmente ativas
vestíbulo e a pele vulvar. Dissemina-se rapida- especialmente as que estiverem na faixa etária
6.2. Colposcopia
9. Tratamento
Esse exame permite visualizar a vagina e o
Atualmente, há diversos estudos, afirmando
colo do útero por meio de um aparelho chama-
que existe uma eliminação espontânea do vírus
do colposcópio, que é um instrumento óptico
em mais de 90% das pessoas infectadas no decor-
que permite aumentos de 5 a 50 vezes Durante
rer de um período de 24 meses. Tanto a infecção
a colposcopia, as pacientes podem ser subme-
pelo o HPV de baixo e alto risco pode regredir es-
tidas à biópsia dirigida, sendo o material, pos-
pontaneamente, o que sugere a eficiência da res-
teriormente, enviado para avaliação histológica
posta imune nos dois grupos de vírus, porém em
para ser então classificado como negativo, lesão
uma pequena parte, ocorre a persistência do HPV,
intraepitelial de baixo e alto grau.
o que pode levar à neoplasia e ao câncer genital.
6.2.1. Achados
9.1. Verrugas genitais
1. Epitélio acetobranco: é encontrado após
Não há tratamento curativo para o HPV,
aplicação de ácido acético;
mas há métodos de controle, sendo esse inicia-
2. Leucoplasia: epitélio branco visível antes da
do com a remoção dos condilomas visíveis. É
aplicação do ácido acético;
conhecido que em 20% dos casos existe a re-
3. Pontilhado: capilares dilatados que termi-
moção espontânea dos casos, entretanto se o
nam na superfície;
tratamento atrasar, as lesões podem ficar mais
4. Mosaico: capilares terminais que circundam
extensas havendo potencial de transmissão e
blocos aproximadamente circulares ou poli-
consequentemente mais grave.
gonais de epitélio acetobranco aglomerados;
5. Padrão vascular atípico: característico do São conhecidos diversos métodos para
câncer cervical invasivo, inclui vasos em removerem as lesões sendo eles: excisão, vapo-
alça, ramificados e reticulares. rização a laser, eletrocauterização, crioterapia,
podofilina, ácido tricoloacético, 5 Fluorouracil
(5-FU) e podofiloxina.
7. Biópsia
Em caso de condilomas, há necessidade
Exame que pode ser orientado pela col-
de biópsia quando:
poscopia ou realizado a olho nu. Tem a finali-
dade de retirar fragmentos do colo uterino para Dúvida no diagnóstico ou suspeita de neoplasia;
exame histopatológico. Falta de resposta ao tratamento convencional;
Aumento de tamanho das lesões durante ou
após o tratamento;
Em imunocomprometidos.
Quando não for observado melhora após realizado por métodos destrutivos e excisionais.
quatro semanas ou resposta parcial após oito se- Sendo os destrutivos: realizar destruição física
manas é importante pensar na troca da terapia. focal, podendo ser usado o eletrocautério, crio-
cirurgia ou ablação a laser. Também é usada a
destruição química com ácido tricloroacético
9.2. Neoplasia intraepitelial da vulva e pênis
a 50%-90%. Os métodos excisionais: mulheres
Os tratamentos poderão ser: métodos com áreas extensas de NIC de baixo grau histoló-
citodestrutivos, excisionais, a combinação de gico e colposcopia insatisfatória - realizar excisão
excisão e técnicas citod strutivas, imunoterapia por cirurgia de alta frequência (CAF).
isolada ou podendo ser associada às terapias
Em NIC de alto grau: realizar CAF, tam-
excisionais/citodestrutivas.
bém denominada Large Loop Excision of Trans-
Há a precisão de levar em consideração: formasion Zone (LLETZ), Loop Electrosurgical
idade, sintomas, topografia das lesões, extensão Excision Procedure (LEEP) ou eletrocirurgia.
para anexos, potencial maligno, preservação
funcional, fatores psicológicos e recorrência.
10. Prevenção
9.3. Vagina e neoplasia intra-epitelial vaginal Como toda DST, a prevenção é um princí-
(NIVA) pio básico, principalmente quando se tem infec-
ção por HPV ou verrugas genitais:
A NIVA apresenta-se com aspecto ace-
toesbranqueado, tem superfície áspera ou es- diminuir o número de parceiros sexuais. O nú-
piculada. Cerca de 2,5% das mulheres com NIC mero de parceiros contribui para o maior risco
(neoplasia intra-epitelial), têm anormalidades de contrair/transmitir qualquer DST, como o
epiteliais vaginais coexistentes, sendo que estas HPV e o vírus da Aids.
lesões se localizam na maioria no terço superior. uso constante e correto de preservativos, para
todos os parceiros sexuais, desde o início até
Na infecção subclínica mínima (colpite o fim da relação sexual. O uso de preservati-
micropapilar) o tratamento é comumente des- vos reduz muito a probabilidade de se con-
necessário, sendo a conduta expectante. Deve- trair / transmitir uma DST, inclusive o HPV e
-se optar por agentes tópicos locais como ácido o vírus da Aids. Qualquer DST funciona como
tricloroacético nos casos de condilomatose ou fator facilitador na aquisição e transmissão do
NIVA 1. Para NIVA 2 e 3 uma boa opção é o laser, vírus da Aids (HIV).
pela alta precisão e superficialidade da vaporiza- se existe suspeita de que o parceiro sexual
ção. Não sendo possível a utilização do laser, a tenha alguma DST é altamente recomendá-
aplicação de ácido bicloracético e tricloroacético vel consultar o médico. Até que isto seja feito,
(ATA) regional ou setorial para lesões mais exten- também é recomendável evitar relações sexu-
sas. Uso do 5-FU a 5% é restrito a casos de exten- ais com este parceiro, até que o tratamento
so comprometimento por NIVA 3. Recomenda- seja realizado, se for o caso.
-se meia aplicação semanal por 10 semanas. Se nunca se automedicar, pois desta maneira a
houver sangramento deve ser interrompido. DST pode ser “mascarada”, ou seja, parece
que foi tratada, mas continua ativa.
não compartilhar objetos de uso pessoal com
9.4. Cérvice
outras pessoas e fazer higiene de objetos de
Ocorre em qualquer área da cérvice: uso comum antes do uso.
verrugas genitais, lesões subclínicas puras da
cérvice; 11. Vacinação
lesões subclínicas da cérvice associadas à ne-
Duas vacinas contra o HPV profiláticas
oplasia intraepitelial cervical: NIC de baixo
têm sido desenvolvidas. Uma das vacinas, Gar-
grau e NIC de alto grau.
dasil, protege contra o HPV tipos 6, 11, 16, e
Em mulheres com HPV e com NIC 1 de bai-
18 (quadrivalente), e o outro, Cervarix, protege
xo grau, cerca de 14% as lesões podem progre-
contra os tipos 16 e 18 (bivalente). Ambas as
dir. Após realizarem exames citológicos e biópsia,
vacinas são baseadas no recombinante expres-
e confirmada a patologia, o tratamento pode ser
são e de automontagem das grandes proteína
capsidial, L1, em partículas de vírus (VIPs) que HALBE, H.W. Tratado de ginecologia. São Pau-
lembram o exterior capsidial de todo o vírus. lo: Rocca, 2000.
A meta de vacinação é reduzir a incidên- KINIRONS, M.; ELLIS, H. French- Diagnóstico
cia de casos de HPV genitais doença, incluindo Diferencial de A a Z. 14.ed. Rio de Janeiro: Gua-
cervical, pênis, vulvar, vaginal e anal, cancro, e nabara Koogan, 2007.
outras lesões pré-cancerosas.
PARELLADA, C. I.; PEREYRA, E. A. G. Papilomavi-
A eficácia e a segurança dos dados para
roses Humanas. In: FOCACCIA, R.; VERONESI, R.
estas duas vacinas estão disponíveis, mas ape-
Veronesi: tratado de infectologia. 3. ed. São
nas uma dessas vacinas é atualmente licencia-
Paulo: Atheneu, 2005, p.607-625.
da pelo FDA (Fundação Americana de Drogas),
sendo as recomendações, evidências e provas, RAMA, C. H. et al. Prevalência do HPV em mu-
principalmente no uso da vacina quadrivalente. lheres rastreadas para o câncer cervical. Rev.
Segundo os resumos das recomendações Saúde Pública, São Paulo, v. 42, n. 1, Feb.
Eurogin (European Research Organisation on 2008.
Genital Infection and Neoplasia) 2007, que fo- ROSA, M. I. et al. Papilomavírus humano e neo-
ram mostradas no Curso de Atualização em Pa- plasia cervical. Cad. Saúde Pública, Rio de Ja-
tologia do Trato Genital Inferior e Colposcopia neiro, v. 25, n. 5, May 2009 .
ABG – RJ Instituto de Ginecologia da UFRJ 20 de
junho de 2009. As perspectivas clínicas a partir SASLOW, D.; CASTLE, P.E., COX, J.T. et alAmerican
da introdução das vacinas contra HPV são: Cancer Society Guideline for Human Papilloma-
virus (HPV) Vaccine Use to Prevent Cervical Can-
Vacinação de rotina em meninas entre 9-14 anos
cer and Its Precursors. CA Cancer J Clin., v.57,
Vacinação catch-up (vacinação de recupera-
n.1, p. 13-17, Jan/Feb 2007.
ção) em meninas entre 15-18 anos
Vacinação catch-up (vacinação de recupera- TULIO, S. et al . Relação entre a carga viral de
ção) em mulheres entre 19-26 pode ser apoia- HPV oncogênico determinada pelo método de
da pelo financiamento privado; no entanto, captura híbrida e o diagnóstico citológico de le-
financiamento público não é recomendado. sões de alto grau. J. Bras. Patol. Med. Lab., Rio
Os estudos clínicos em mulheres com idade de Janeiro, v.43, n.1, Feb. 2007.
superior a 26 anos já terminaram, tendo com
desfechos clínicos a imunogenicidade e a pro- TUON, F. et al. Avaliação da sensibilidade e es-
teção da doença. No momento, aguarda-se a pecificidade dos exames citopatológico e col-
autorização das agências regulatórias respon- poscópico em relação ao exame histológico na
sáveis que visam suportar a ampliação da in- identificação de lesões intra-epiteliais cervicais.
dicação para essa população. Rev. Assoc. Med. Bras. v.48, n.2, p.140-4, 2002.
D- Referências Bibliográficas
ADDIS, I. B.; HATCH, K. D. ; BEREK, J.S. Tratado
de Ginecologia. 14.ed. Rio de Janeiro: Guana-
bara Koogan, 2008.
CAETANO, R. et al . Custo-efetividade no
diagnóstico precoce do câncer de colo ute-
rino no Brasil. Physis, Rio de Janeiro, v. 16,
n. 1, July 2006 .
vaginais promove alteração na flora vaginal, fa- acurado de salpingite. Entretanto, como possui
vorecendo a ocorrência de vaginose bacteriana, alto custo e expõe a paciente a riscos cirúrgi-
funcionando, assim, como fator de risco para cos, é usada apenas em casos de confirmação
DIP. Infecção por gonorreia, clamídia ou vagino- diagnóstica. Biópsia de endométrio fornece o
se bacteriana representa um fator de risco para diagnóstico de endometrite, com sensibilidade
DIP subclínica, definida histologicamente pela de 92%, mas também não é realizada rotineira-
presença de neutrófilos e de células plasmáticas mente. A US pélvica é útil, podendo evidenciar
no tecido endometrial. borramento nos contornos dos órgãos genitais,
coleções líquidas ou formações sólidas, caracte-
rísticas de abscessos. Entretanto, a ausência de
4. Apresentação clínica imagens sugestivas de DIP não diminui a pro-
A maioria dos casos são assintomáticos. babilidade da doença nem justifica o atraso no
Entre as manifestações mais comuns, estão: dor início do tratamento.
no abdome inferior, corrimento vaginal, dispa- Deve ser realizado teste de gravidez para
reunia, metrorragia, menorragia. A dor abdomi- afastar gravidez ectópica e complicações da
nal é geralmente bilateral e tem pouco mais de gravidez intrauterina. Urinálise e pesquisa de
duas semanas de duração. Sangramento ute- sangue oculto nas fezes também podem ter uti-
rino anormal ocorre em um terço ou mais das lidade. O hemograma tem pouco valor diagnós-
pacientes com DIP. Além disso, a paciente pode tico. Menos de metade dos pacientes apresenta
queixar-se de sintomas urinários, como disúria. leucocitose. O marcador de tumor ovariano CA-
Episódios subclínicos são especialmente co- 125 é, aparentemente, se encontra elevado nos
muns entre as usuárias de ACO. Febre, calafrios casos de DIP.
e vômito são sugestivos de doença grave.
Todas as mulheres com diagnóstico de
Mulheres infectadas pelo HIV não apre- doença sexualmente transmissível devem reali-
sentam diferenças em relação à severidade dos zar teste anti-HIV. Também é importante a reali-
sintomas nem à resposta ao tratamento quando zação de sorologia para sífilis e hepatites B e C.
comparadas a mulheres não infectadas.
Há um conjunto de critérios mínimos, re-
comendado pelo CDC, para aumentar a espe-
cificidade e reduzir o atraso no diagnóstico da
5. Diagnóstico
doença, incluindo dor à palpação abdominal,
A grande variação de sinais e sintomas di- mobilização cervical dolorosa e dor à palpa-
ficulta o diagnóstico de DIP. Geralmente é feito ção dos anexos. Para aumentar a especificidade
baseado em achados clínicos. dos critérios mínimos, os seguintes parâmetros
É importante que uma história clínica adicionais podem ser usados: T oral > 38,3oC,
detalhada seja realizada, com avaliação de ma- corrimento vaginal mucopurulento, VHS e/ou
nifestações como dor abdominal, corrimento, proteína C reativa aumentados, leucocitose (>5
dificuldade ou queimação ao urinar, dor nas leucócitos/campo), massa pélvica, infecção por
relações sexuais, irregularidade menstrual, clamídia ou por gonococo laboratorialmente
febre. Deve-se investigar também episódios comprovada. Os critérios elaborados são: bióp-
prévios de DIP e a história sexual da paciente, sia endometrial com evidências histopatológi-
incluindo número de parceiros e uso de méto- cas de endometrite, anormalidades laparoscó-
dos contraceptivos. picas compatíveis com DIP e US evidenciando
abscesso tubo-ovariano. Pacientes com pelo
Ao exame físico, cerca de metade das pa- menos um dos critérios elaborados são consi-
cientes têm febre. Pode-se detectar dor à palpa- deradas casos confirmados de DIP.
ção abdominal direta ou à descompressão súbi-
ta. Sensibilidade no quadrante superior direito
não exclui DIP, já que aproximadamente 10% 6. Diagnóstico diferencial
das pacientes desenvolvem perihepatite. Pode
haver também dor à palpação de órgãos pélvi- Outras causas ginecológicas que cursam
cos ou à mobilização cervical. com dor pélvica aguda são: cistos ovarianos, tu-
mores, gravidez ectópica, torção de ovário, en-
A laparoscopia é considerada o exame dometriose e dismenorreia.
padrão-ouro, fornecendo o diagnóstico mais
D- Referências Bibliográficas
BANIKARIM, C.; CHACKO, M. R. Pelvic inflamma-
tory disease in adolescents. Seminars in pedi-
atric infectious disease, v.16, p.175-180, 2005.
diagnósticos não elucidem a causa da dor. das, exceto nos casos de pacientes com distúr-
Portanto, a laparoscopia é mais eficiente nas bios cardiovasculares ou em uso concomitante
situações em que encontramos exame físico de inibidores da monoaminoxidase.
anormal ou se o manejo inicial não acarreta
melhora dos sintomas.
4.2. Tratamento psicológico
Tem como objetivo tratar a dor exces-
4. Tratamento siva e a incapacitação, educar a paciente a
Após seis meses de duração, a dor, por conviver da melhor maneira possível com a
si só, deixa de ser apenas um sintoma e tor- dor e tratar as doenças psicológicas. A abor-
na-se uma doença com fisiopatologia própria dagem comportamental tem apresentado re-
devendo, dessa forma, ser tratada de maneira sultados promissores.
consistente. Ao contrário do que ocorre na dor
aguda, no tratamento da dor crônica, é neces-
sário aceitar o conceito de manejar a dor mais 4.3. Tratamento neuroablativo
do que curá-la. Pode ser feito por ressecção cirúrgica
Quando um diagnóstico específico pode nervosa, injeção de substâncias neurotóxicas
ser feito, o tratamento também é específico ou corrente elétrica suficiente para destruir o
para essa patologia; quando não, o tratamento tecido neural. Dentre as técnicas laparoscó-
deve ser dirigido para o controle da dor. picas, a LUNA, ablação do nervo uterino com
ressecção dos ligamentos útero-sacros, é a
Os principais objetivos do tratamento são: mais utilizada.
o alívio do sofrimento, a restauração da função
normal e a prevenção da incapacitação.
O manejo da doença pélvica crônica, ela D- Referências Bibliográficas
própria como patologia, envolve tratamento
AGUIAR, F.M.; ABREU, L.G.; SILA, J.C.R.; REIS, R.M.;
medicamentoso, psicológico e neuroablativo.
FERRIANI, R.A.; MOURA, M.D. Etiopatogenia da
endometriose: o que há de novo? Femina. v.33,
4.1. Tratamento medicamentoso n.6, p.415-420, jun. 2005.
Podem ser utilizados analgésicos, anti- BERGMANN, G. G.; GARLIPP, D. C.; SILVA, G. M.
-inflamatórios não hormonais e opioides. Os G.; GAYA, A. Crescimento somático de crianças
analgésicos de primeira linha, anti-inflamató- e adolescentes brasileiros. Rev Bras Saúde Ma-
rios não hormonais e acetaminofeno podem tern Infant., Recife, v.9, n.1, p.85-93, jan./mar.,
ser considerados as drogas de primeira esco- 2009.
lha. Seria interessante que se fizesse o uso de
BRUNO, R.V.; OLIVEIRA, L.A.; VILLAFANA, G.; BO-
pelo menos três drogas isoladas ou associadas
TELHO, B.G.; SOUZA, R.C. Atualização na abor-
antes de se iniciar o tratamento com opioides,
dagem da dor pélvica crônica. Femina. v.35, n.1,
deixando estes últimos somente para casos re-
p.29-33, jan. 2007.
fratários ao tratamento prévio. Analgésicos do
grupo dos narcóticos não devem ser usados CARTER, J.E. Chronic pelvic pain: diagnosis
rotineiramente no tratamento da dor pélvica and management. Golden: Medical Education
crônica porque relaxam a musculatura lisa e Collaborative; 1996.
podem exacerbar a dor provocada por distúr-
bios de motilidade intestinal, além de provo- CHEONG, Y.; WILLIAM STONES, R. Chronic pelvic
carem sedação, o que dificultaria o retorno às pain: aetiology and therapy. Best Pract Res Clin
funções habituais. Os antidepressivos tricícli- Obstet Gynaecol. v.20, n.5, p.695-711, 2006.
cos podem ser associados aos analgésicos no
FREITAS, F.; MENKE, C.H.; RIVOIRE, W.; PASSOS,
alívio da dor uma vez que, eles podem aliviá-la
E.P. Rotinas em Ginecologia. In: OPPERMANN,
por meio do bloqueio nervoso periférico, ele-
M.L.R. Dor pélvica crônica. 5. ed., Porto Alegre:
vando o limiar à dor, e por estimulação central.
Artmed, 2006.
A amitriptilina, um antidepressivo com efeito
sedativo é uma das primeiras escolhas utiliza-
1. Introdução
A endometriose caracteriza-se pela pre-
2. Fatores de risco
sença de tecido similar ao do endométrio, tecido Apesar de não estarem ainda bem esta-
endometriótico, fora da cavidade uterina, princi- belecidos, vários fatores de risco foram sugeri-
palmente ovários e peritônio pélvico, o qual induz
Capítulo 18
dos para a endometriose. A herança multigenéti- rinas e, então, implantam-se na superfície peritone-
ca da endometriose vem ganhando importância. al. Dados clínicos e experimentais sólidos apoiam
Achados recentes que apoiam a característica essa hipótese. Apesar de o fenômeno da menstru-
genética da endometriose incluem: concordân- ação retrógrada ocorrer em 70 a 90% das mulheres,
cia entre gêmeos monozigóticos, idade de início ele pode ser mais comum naquelas com endome-
dos sintomas semelhante em irmãs não gêmeas, triose que nas mulheres que não têm a doença.
incidência em parentes de mulheres afetadas
A teoria da metaplasia celômica diz que o
que é até sete vezes maior que em mulheres não
epitélio da superfície ovariana pode sofrer um
afetadas, um efeito fundador detectado na po-
processo de metaplasia por ativação de um ale-
pulação da Islândia, além de evidências de liga-
lo K-ras oncogênico, originando as lesões en-
ção aos cromossomos sete e dez, apesar de não
dometrióticas ovarianas; já a teoria da indução,
terem sido identificados genes relevantes nessas
uma extensão da teoria da metaplasia celômica,
regiões até a presente data.
propõe que as células peritoneais indiferencia-
Outros fatores têm, aparentemente, im- das transformam-se em tecido endometriótico
portante papel quanto ao fator de risco para induzido por um fator bioquímico endógeno
endometriose: mulheres que apresentam aber- não definido. Outra teoria propõe que o tecido
rações anatômicas ou bioquímicas das funções menstrual da cavidade endometrial é transpor-
uterinas também apresentam maior prevalência tado para outros locais por veias ou vasos lin-
de endometriose, como, atresia do trato geni- fáticos e uma quinta proposta diz, ainda, que
tal inferior; estilo de vida reprodutiva, sendo a células sanguíneas circulantes originadas da
doença mais frequente nas mulheres que espe- medula óssea podem diferenciar-se em tecido
ram mais tempo para engravidar; ciclo de curta endometriótico em vários locais do organismo.
duração, menstruação com fluxo mais intenso e Nenhuma teoria isolada pode explicar a locali-
fluxo de maior duração, relacionada provavel- zação da endometriose em todos os casos.
mente a uma maior ocorrência de menstrua-
Para explicar a implantação com suces-
ção retrógrada; fatores imunológicos ainda não
so e o crescimento do tecido endometriótico
bem compreendidos; alguns fatores ambientais,
por menstruação retrógrada, foram propostos
incluindo, provavelmente, exposição a uma va-
duas teorias: defeitos moleculares e anormali-
riedade de toxinas ambientais, tal como a dio-
dades imunológicas.
xina. A altura e o peso da paciente mostram as-
sociação positiva e negativa, respectivamente, A teoria dos defeitos moleculares explica
com o risco de endometriose. que o tecido endometriótico exibe defeitos mo-
leculares pequenos, porém biologicamente im-
Ainda outras doenças foram relatadas
portantes, podendo favorecer a ativação de vias
como tendo relações com a endometriose, sen-
oncogênicas ou de cascatas de biossíntese le-
do elas: lúpus eritematoso sistêmico, nevus dis-
vando a um aumento da produção de citocinas,
plásicos e história de melanoma nas mulheres
metaloproteínas, prostaglandinas e estrogê-
em idade reprodutiva.
nios. Tais anormalidades são ampliadas drasti-
camente quando o tecido endometriótico adere
às células mesoteliais do peritônio, favorecendo
3. Patogenia
a sobrevivência e o crescimento do implante.
Para que se inicie o desenvolvimento da en-
A teoria das anormalidades imunológicas
dometriose, é necessário que o tecido endometrió-
afirma que a sobrevivência do implante pode ser
tico chegue ao local extrauterino, que tal tecido se
possível por uma menor eliminação de células
implante com sucesso e cresça localmente.
endometriais do tecido peritoneal pelo sistema
Existem várias teorias que tentam explicar imunológico (principalmente por diminuição da
o deslocamento, ou a aparição, do tecido endo- atividade de células exterminadoras naturais (NK)
metrial no local da endometriose. A proposta por e de macrófagos). Além de que a endometriose
Sampson, em 1920, e também a mais aceita, é de também pode ser encarada como um distúrbio
que o tecido endometrial chega à cavidade pél- de tolerância imunológica, já que o endométrio
vica por meio de um fenômeno conhecido como ectópico é um tecido próprio. As duas teorias
menstruação retrógrada, na qual fragmentos do provavelmente atuam conjuntamente para o de-
endométrio menstrual retrocedem pelas tubas ute- senvolvimento da endometriose.
Evidências sólidas sugerem que a endo- endometriose é uma doença em que ocorre a
metriose está associada à inflamação, que por ativação de múltiplos genes.
sua vez é associada a um aumento da produção
de prostaglandinas, metaloproteínas, citocinas e
quimiocinas. O aumento de algumas citocinas da 4. Diagnóstico
inflamação aguda, como interleucina-1ß, inter- Ainda um desafio diagnóstico para a me-
leucina-6 e fator de necrose tumoral (TNF) pro- dicina, a endometriose costuma ter um grande
vavelmente aumentam a adesão de fragmentos período de tempo entre o início dos sintomas e
do tecido endometrial na superfície peritoneal e a endometriose confirmada por cirurgia, cerca de
as metaloproteinases promovem, posteriormen- 8 anos no Reino Unido e de 12 anos nos Estados
te, a implantação desses fragmentos. Unidos, observa-se duração semelhante no Brasil.
Tanto a inflamação, como a sobrevivên-
cia do implante e a sua diferenciação deficiente
estão ligadas a defeitos na célula estromal, en- 4.1. Apresentação clínica
volvendo a formação excessiva de estrógenos A endometriose costuma aparecer em
e prostaglandina, além da resistência à proges- mulheres em idade fértil, quando as lesões são
terona. Entende-se hoje que todas essas alte- estimuladas pelos hormônios ovarianos. Dor
rações originam-se a partir de duas mudanças pélvica, dor lombar, dispareunia, dor nas costas,
epigenéticas diferentes, afetando um fator de disquezia e alginurese são sintomas comuns
transcrição, o fator esteroidogênico 1 (SF1) e o de sua apresentação. A endometriose também
receptor de estrógeno ß. Tal fator de transcri- pode estar associada a sintomas gastrointesti-
ção, quando exposto à prostaglandina E2 (PGE2), nais significativos como: dor, náusea, vômito,
promove a expressão de grandes quantidades saciedade precoce, edema e distensão abdo-
de enzimas presentes na esteroidogênese, prin- minal e alteração nos hábitos intestinais. Ainda
cipalmente a aromatase, o que leva a formação pode ser assintomática, mesmo em algumas
de grandes quantidades de estradiol. Já o estra- mulheres com doença mais avançada.
diol, vai agir, por meio dos receptores de estró-
geno ß estimulando a ciclooxigenase 2 (COX-2), A dor pélvica tipo dismenorreia, sintoma
levando a uma grande produção de prostaglan- mais frequente é particularmente sugestivo de
dina E2, assim, fecha-se um ciclo de retroali- endometriose quando começa após anos de
mentação positiva, com grandes produções de menstruação sem dor. Com frequência, a disme-
estradiol e de produtos da COX-2, incluindo a norreia inicia antes de ocorrer o sangramento e
PGE2, no tecido endometriótico. Além disso, a dura por todo o período menstrual. As possíveis
expressão aumentada de receptor de estrógeno causas de tal dor são: inflamação peritoneal lo-
ß inibe a expressão de receptores de progeste- cal, infiltração profunda com lesão tecidual, for-
rona, o que resulta em uma resistência a esse mação de aderências, espessamento fibrótico
último hormônio e em uma disfunção de uma e acúmulo de sangue menstrual eliminado em
das vias que inativa o estradiol. Ao fim, temos implantes endometrióticos.
grandes quantidades de estradiol acumulando- Uma significativa parcela das mulheres
-se devido a um aumento da sua produção e diagnosticadas com endometriose têm, como
uma diminuição da sua inativação no tecido motivo da consulta, infertilidade. A infertilidade
endometriótico, além de uma perpetuação do na endometriose moderada a grave está, geral-
processo inflamatório. Tudo isso leva a uma au- mente, associada a aderências que distorcem a
mento da expressão de moléculas de adesão anatomia pélvica, bloqueando a motilidade tu-
intercelular, diminuição da apoptose e aumento bo-ovariana e a captação do óvulo, porém estu-
da angiogênese e da neurogênese local. dos sugerem que, principalmente nos estágios
Além dessas diferenças entre o tecido en- mais leves da doença, outros fatores estariam
dometriótico e o tecido endometrial eutópico, envolvidos, como o aumento da ativação basal
estudos recentes mostram que existem também de macrófagos peritoneais levando à redução
grandes diferenças entre o tecido endometrial da motilidade dos espermatozoides, aumento
eutópico de mulheres com endometriose quan- da fagocitose dos espermatozoides ou a inter-
do comparadas a mulheres sem a doença. Tal ferência na fertilização, possivelmente pelo au-
fato apoia ainda mais a proposição de que a mento da secreção de citocinas, como o fator
de necrose tumoral α (TNF-α); além do que pa-
cientes com endometriose aparentam ter me- peritoneal, o qual é tido como uma promessa
nor reserva ovariana com oócitos e embriões de diagnóstica pela sua sensibilidade de 100% e
menor qualidade. especificidade de 89%, porém requer um pro-
cedimento invasivo para a obtenção do líquido.
custo e são amplamente utilizados para tratamen- tem-se: leuprolida, buserelina, nafarelina, histre-
to de dor. Agem bloqueando a via da ciclooxige- lina, goserelina, deslorelina e triptorelina.
nase (COX) na gênese da resposta inflamatória,
Como se pode esperar, o uso de agonis-
inibindo a produção de prostaglandinas e levando
tas do GnRH leva a efeitos colaterais hipoestro-
a uma diminuição da inflamação e da dor associa-
gênicos significantes. Os de curto prazo incluem
da. Apesar do seu uso rotineiro, uma revisão siste-
fogachos, secura vaginal, perda da libido e labi-
mática Cochrane de 2009 avaliou o uso dos AINEs
lidade emocional e o principal a longo termo é
no tratamento da dor associada à endometrio-
a perda substancial de densidade mineral óssea,
se, resultando inconclusivamente na sua eficácia
limitando a duração do tratamento com esses
quando comparado ao placebo. Vários efeitos ad-
agentes no máximo de 6 meses. Com a meta
versos são associados ao uso de AINEs, como san-
de diminuir a perda mineral óssea das mulhe-
gramentos no trato gastrointestinal (TGI), diarreia,
res em uso de agonistas do GnRH e aumentar
tontura, cefaleia e náuseas. O uso de AINEs seleti-
a duração do tempo máximo de terapia, o uso
vos para a enzima COX-2 reduziu a incidência de
da terapia de acréscimo ou “add-back” passou
efeitos colaterais, principalmente relacionados ao
a ser cada vez mais frequente. Esses regimes
TGI. As drogas mais estudadas na paciente endo-
incluem a adição de um progestágeno, de um
metriótica são: ácido acetilsalicílico, idometacina,
progestágeno mais um bifosfonado ou de um
ácido tolfenâmico e naproxeno sódico.
progestágeno mais estrogênio ao regime nor-
mal do agonista do GnRH. Apesar de o FDA re-
comendar que pacientes em uso por mais de 6
5.1.3. Derivados de andrógeno
meses de agonistas do GnRH devem iniciar o
O danazol é um agente androgênico que uso da terapia de acréscimo, tal terapia deve ser
induz amenorreia por meio de supressão do eixo iniciada mais cedo durante a terapia com ago-
hipotálamo-hipófise-ovariano, além de aumen- nistas do GnRH.
to na concentração sérica de andrógenos e di-
minuição da concentração sérica de estrógenos.
Apesar de eficácia bem evidenciada em vários 5.1.5. Progestágenos
estudos, o principal fator negativo do uso de da-
Os progestágenos vêm sendo usados
nazol no tratamento da endometriose é sua bai-
no tratamento da endometriose há mais de 40
xa tolerabilidade. Por ser um agente androgênico
anos. Agem de várias formas que beneficiam
com propriedades anabólicas, apresenta vários
essas pacientes: causam uma supressão do eixo
efeitos adversos como ganho de peso, edema,
hipotálamo-hipófise-ovariano levando à anovu-
mialgia, acne, hisurtismo e aumento da oleosi-
lação e à redução dos níveis de estrógeno séri-
dade da pele, levando a um limite de 6 meses
cos; levam à decidualização e atrofia tanto do
de tratamento com esse agente. Mulheres he-
tecido endometriótico como do endométrio eu-
patopatas ou hiperlipidêmicas não devem fazer
tópico; diminuem ou eliminam o fluxo menstru-
uso de danazol e mulheres em terapia com esse
al; demonstram inibir a angiogênese, necessária
agente devem usar contracepção efetiva durante
para manutenção do tecido endometriótico e
todo o tratamento.
diminuem os marcadores de inflamação intra-
peritoneal. Estão disponíveis em várias formas
de aplicação, incluindo pílulas, injeções, implan-
5.1.4. Agonistas do GnRH
tes endodérmicos e dispositivos intra-uterinos
Os agonistas do hormônio liberador de (DIU), e vários agentes foram estudados para o
gonadotrofina agem inicialmente ligando-se tratamento da endometriose. Deve-se sempre
aos receptores hipofisários de GnRH e estimu- ter em mente os potenciais efeitos colaterais
lando a síntese e a liberação do hormônio lu- do seu uso, como aumento do peso, depressão,
teinizante (LH) e do hormônio folículo estimu- acne, náusea, cefaleia e até diminuição da den-
lante (FSH), porém eles apresentam meia-vida sidade mineral óssea após 2 anos de uso.
muito maior do que o GnRH endógeno, levan-
do, a uma “down-regulation” a longo prazo dos
receptores hipofisários e, consequentemente, 5.1.6. Inibidores da aromatase
a uma diminuição da síntese e da liberação de
Como já dito, a aromatase é uma enzima
LH e de FSH, um estado de pseudomenopausa
que representa um passo crítico na síntese de
reversível. Dentre os disponíveis no mercado,
Quadro 2. Dose e efeitos colaterais dos principais medicamentos para tratamento da endometriose
XX Cisto folicular
B- OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM O cisto folicular corresponde à maioria
1. Elaborar hipóteses diagnósticas dos cistos funcionais. Origina-se do folículo de
2. Identificar a etiologia das massas pélvicas. Graaf, que não rompeu e continuou a crescer,
3. Identificar o diagnóstico diferencial. acumulando líquido até tornar-se cisto. Rara-
4. Estabelecer a conduta terapêutica. mente ultrapassam de 5 a 6 cm de diâmetro.
Capítulo 20
1.1.2. Cisto de natureza não funcional e, frequentemente, referem dor pélvica. Toma-se
conduta cirúrgica erroneamente por não se ter
XX Cisto paraovariano
certeza de se tratar de um cisto de inclusão.
Apesar de não ser um cisto pertencen-
te ao ovário, é necessário o seu estudo aqui
devido a sua semelhança morfológica com
1.2. Tumores neoplásicos benignos
outras patologias deste órgão. São cistos sim-
ples que se formam no ligamento largo a par- Atingem as mulheres de todas as idades.
tir dos ductos remanescentes de Muller ou do Nas neoplasias benignas, não há infiltração nos
ducto de Wolff. Geralmente, tendem a ser uni- tecidos vizinhos, nem propagação à distância.
loculares com conteúdo fluido amarelo-claro Entretanto, podem sofrer, devido a fatores des-
e que em sua maioria, são assintomáticos, pois conhecidos, transformação maligna.
não leva a um quadro de disfunção menstru-
al, exceto nos casos de torção e rotura que
cursam com dor, e que na maioria das vezes, 1.2.1. Epiteliais
seu diagnóstico é dado de modo acidental Nascem do epitélio de revestimento
na realização de ultrassonografia, tomografia do ovário ou a partir de suas invaginações
computadorizada ou durante cirurgia. Apesar no estroma, denominados cistos de inclusão;
de seu caráter benigno, nos casos em que o correspondem a 60-70% dos casos. Caracte-
cisto é maior do que 5 cm ou não ocorrendo rizam-se por um crescimento progressivo e,
regressão, deve suspeitar-se de neoplasia, in- ao contrário dos cistos foliculares, não regri-
dicando, assim, sua abordagem cirúrgica para dem de forma espontânea, podendo atingir
sua ressecção. até 20 cm de diâmetro. Há vários represen-
tantes, porém apenas os dois principais se-
rão citados.
XX Endometrioma
Ocorre no ovário em decorrência da
endometriose, podendo ser confundido com XX Cistoadenoma seroso
o cisto hemorrágico. Ao ultrassom, apresen- Em 50% dos casos, são bilaterais. Apre-
ta ecos internos ecogênicos homogêneos e senta líquido transparente amarelado seme-
sua parede pode apresentar um leve reforço lhante ao soro sanguíneo. Normalmente é
acústico. Ao ultrassom Doppler, não apresen- assintomático, mas pode causar desconforto
ta vascularização no centro da massa, igual- pélvico e inchaço abdominal. O diagnóstico é
mente ao cisto hemorrágico. Na tentativa de feito por meio da anamnese, do exame físico,
diferenciar cisto hemorrágico de endometrio- do exame ginecológico e da ultrassonografia.
ma, pode atentar-se ao fato de que o cisto Pode se fazer uso do marcador tumoral CA-125.
hemorrágico apresenta modificação no seu
A conduta terapêutica é cirúrgica, poden-
aspecto e diminuição de tamanho durante
do utilizar-se da via laparotômica ou laparos-
seu acompanhamento. A presença de líquido
cópica, realizando somente a cistectomia ou a
espesso no fundo de saco posterior é indica-
ooferectomia.
tivo de cisto hemorrágico.
Como sintomatologia, a paciente apre-
senta dor pélvica crônica, irregularidade XX Cistoadenoma mucinoso
menstrual e infertilidade. O tratamento é a São unilaterais em 75% dos casos. Apre-
ressecção cirúrgica. senta líquido espesso castanho ou avermelha-
do. São maiores que os cistoadenomas serosos
e geralmente assintomáticos, mas podem oca-
XX Cisto de inclusão peritoneal (pseudocisto) sionar massa ou desconforto abdominal.
Este é um cisto que não pertence ao ová-
A conduta terapêutica é cirúrgica, via la-
rio, mas é necessário o seu estudo aqui devido a
parotomia ou laparoscopia, realizando somente
sua semelhança morfológica com outras patolo-
a cistectomia ou a ooferectomia.
gias deste órgão. O cisto de inclusão desenvolve-
-se devido a processos aderenciais que represam
o líquido peritoneal. As pacientes apresentam ti-
picamente história de cirurgia anterior ou trauma
Graças à maior rapidez com que é diagnostica- também a depender do tempo e da quantidade
da e tratada hoje, a mortalidade causada pela de sangue presente na cavidade peritoneal.
gravidez ectópica diminuiu bastante, chegando
Achados como útero normal ou leve-
a 1 morte para cada 2000 gestações, contudo,
mente aumentado, dor à manipulação do colo
10 a 15% das mortes maternas ainda estão rela-
uterino e massas anexiais palpáveis, aumentam
cionadas à gravidez ectópica.
a possibilidade de tratar-se de um quadro de
Os maiores fatores de risco para a ocor- gravidez ectópica.
rência de uma gravidez ectópica são infertilida-
Somente o exame clínico não fecha o diag-
de, doença inflamatória pélvica, manipulação
nóstico, pois cerca de 30% das pacientes com
prévia das tubas uterinas durante procedimen-
gravidez ectópica não apresentam sangramento
tos na cavidade pélvica, gravidez ectópica pré-
vaginal, 10% somente têm massas anexiais palpá-
via e uso de dispositivo intra-uterino (DIU). Ta-
veis e cerca de 10% não apresentam alterações ao
bagismo, idade superior a 35 anos e múltiplos
exame pélvico. Desse modo, faz-se necessário o
parceiros durante a vida são considerados riscos
uso de alguns exames complementares.
menores. O uso de anticoncepcionais, interrup-
ção precoce de uma gravidez, abortamento e Os principais exames de escolha para
cesarianas não representam fatores de risco diagnosticar gravidez ectópica, por ordem de so-
para a ocorrência de uma gravidez ectópica. O licitação, são uma dosagem da subunidade beta
fato de mulheres inférteis mostrarem-se mais da gonadotrofina coriônica humana (beta-hCG)
suscetíveis a apresentar uma gravidez ectópica quantitativa, ultrassonografia (US) pélvica trans-
deve-se à possível alteração da integridade ou vaginal e dosagem seriada de beta-hCG quanti-
da função da tuba, uma das principais causas tativo sérico em casos específicos. Pode-se medir
de infertilidade, ou às técnicas de reprodução também níveis séricos de progesterona e realizar
assistida, principalmente a fertilização in vitro curetagem uterina, entretanto, esta pode termi-
(FIV). A FIV aumenta a incidência de gravidez nar uma gravidez uterina desejada e viável, se
ectópica mesmo em mulheres em que a causa não realizada no momento adequado, enquanto
da infertilidade não seja tubária. Vale ressaltar, aquele é um exame de baixíssima sensibilidade.
no entanto, que metade das mulheres diagnos- A dosagem quantitativa de beta-hCG ser-
ticadas com gravidez ectópica não apresenta ve somente para comprovar que a paciente está
nenhuma dessas causas. grávida e, desse modo, justificar a suspeita de
As mulheres com suspeita de gravidez gravidez ectópica e os demais exames.
ectópica apresentam, geralmente, um quadro A US representa o método mais indicado;
clínico inicial com manifestações inespecíficas, entretanto, apresenta certas limitações, sendo
como dor pélvica súbita ou cólicas abdominais, necessária a realização dos demais exames cita-
associada a sangramento vaginal após um pe- dos. Em gestações maiores do que 5 semanas,
ríodo de cerca sete semanas de atraso mens- a US transvaginal é o exame de maior acurácia.
trual. Essa dor pode ser unilateral ou difusa e Existem, entretanto, situações que podem false-
de intensidade variável – média a debilitante. O ar o resultado. As principais são gravidez intra-
sangramento é tipicamente intermitente, fino, -uterina com ausência de saco gestacional ou
amarronzado (pode aparecer avermelhado) e rompimento dele, gravidez ectópica muito ini-
raramente excede o volume do fluxo menstrual cial e com poucos sinais de hemorragia, inexpe-
normal. Além de gravidez ectópica, esses sinais riência do examinador, equipamento desregula-
e sintomas podem estar presentes em gravide- do e presença de anomalias uterinas, miomas e
zes intrauterinas ou abortamentos. hidrossalpinge.
Após a rotura, a paciente passa a apresentar A dosagem quantitativa de beta-hCG sé-
um quadro de choque hipovolêmico, com taqui- rica ajuda na interpretação dos achados ultras-
cardia, hipotensão e sensibilidade à palpação ab- sonográficos. Suspeita-se de gravidez ectópica,
dominal, esta localizada ou difusa. Esse quadro de pacientes em que não se constatou saco gesta-
instabilidade hemodinâmica decorre da hemorra- cional à US abdominal e com níveis séricos de
gia intraperitoneal maciça, uma vez que vasos são beta-hCG maiores do que 6.500 mUI/mL, ou pa-
lesados no momento da rotura. Dor à descom- cientes em que não se constatou saco gestacio-
pressão brusca e abdômen em tábua, sugestivos nal à US transvaginal e com níveis de beta-hCG
de irritação peritoneal, podem ser constatados iguais ou maiores do que 1.500 mUI/mL.
Uma única dosagem quantitativa de be- to, o qual desativa o rápido processo de replica-
ta-hCG não diferencia gravidez intra-uterina, ção da célula trofoblástica por meio da inibição
abortamento ou gravidez ectópica. É mais in- da síntese protéica. O seu uso é muito controver-
dicado fazer a dosagem seriada. Numa gravi- so, não é à toa que existem vários protocolos que
dez intra-uterina normal, os níveis aumentam regem a aplicação do metotrexato. Desse modo,
53% a cada 2 dias, chegando a um platô com essa não é a forma mais comum de tratar a gravi-
valores maiores do que 100.000 mUI/mL. Nas dez ectópica, além de não apresentar vantagens
pacientes com diagnóstico de abortamento, em relação ao tratamento cirúrgico.
quanto menor os níveis iniciais de beta-hCG,
O tratamento cirúrgico pode ser feito de
menor a sua proporção de queda. Em cerca de
duas maneiras: por meio de ressecção da estru-
70% das pacientes com suspeita de gravidez
tura anatômica em que está se desenvolvendo
ectópica a dosagem sérica de beta-hCG apre-
a gravidez, no caso da tuba uterina – salpingec-
senta uma queda mais demorada do que os
tomia, ou, por meio de dissecção da estrutura
casos suspeitos de abortamento, e um aumen-
com retirada do concepto e preservação da-
to menor do que nos casos de gravidez intra-
quela, no caso da tuba uterina – salpingosto-
-uterina normal.
mia. A salpingostomia é chamada de cirurgia
Para dar o diagnóstico e definir a conduta conservadora, sendo geralmente realizada por
com maior acurácia e menor tempo, o médico via laparoscópica. Ela consiste no método mais
deve colher a história clínica, fazer o exame fí- utilizado, porém apresenta um pouco mais de
sico e determinar se a paciente está hemodina- riscos para uma nova gravidez ectópica. A esco-
micamente estável ou não. Se a paciente estiver lha da técnica depende da experiência do cirur-
chocada, a conduta será cirurgia imediata; mas, gião, da história de gravidez ectópica prévia da
caso esteja estável, continua a investigação por paciente e sua vontade de engravidar no futuro,
meio de exames complementares como descri- além da gravidade do quadro. A salpingectomia,
to na Figura 1. geralmente por laparotomia, está mais reserva-
da hoje para casos de hemoperitôneo maciço
O tratamento da gravidez ectópica pode
e extenso com quadro de choque associado,
ser clínico ou cirúrgico. O primeiro é feito utili-
má visualização durante laparoscopia pélvica e
zando-se um antagonista do folato – Metotrexa-
comprometimento de estruturas vasculares.
Outros sintomas
Corrimento vaginal
Sangramento vaginal anormal
Sintomas sistêmicos (febre, náuseas, vômitos)
SIM
Exame físico NÃO
Febre
Taquicardia
Rigidez abdominal
Massa anexial
Dor à mobilização do colo uterino
Cervicite
SIM
Presuntivo de DIP
– Testes para DST (Clamídia, gonococo, HIV)
– Alterações em US (pisalpingite, hidrosalpingite)
Observação: o CDC não recomenda o uso da azitromicina 1g VO em dose única. Sugere-se que possa ser usado
desde que a Azitromicina 1g VO seja administrada no primeiro dia e no oitavo dia, para que se tenha cobertura com
tratamento por 14 dias.
A paciente deve ser acompanhada a fim mento irá depender da apresentação clínica
de se observar sua melhora clínica, que deve e, na ausência de sinais de peritonite ou alta
ocorrer em três dias após o início da terapêuti- suspeita de torção, uma abordagem expectan-
ca, se há ausência de febre, diminuição da dor à te com analgesia será apropriada. Já em outras
palpação abdominal e à descompressão brusca. circunstâncias, uma abordagem cirúrgica é ne-
cessária. Geralmente é feita uma laparoscopia
Parceiros que tiveram contato sexual nos
inicialmente a não ser que a paciente esteja
últimos 60 dias anteriores ao início dos sinto-
chocada, ou se o cisto for muito grande.
mas devem ser tratados pelo risco de reinfec-
ção da paciente e infecção via uretral por cla-
mídia e gonococo. É sempre prudente perguntar pela histó-
ria ginecológica da paciente para se estabelecer
a conduta adequada caso um cisto seja encon-
4. Cistos ovarianos trado durante uma laparotomia ou uma lapa-
A maioria dos cistos ovarianos que cur- roscopia. Essa medida é particularmente impor-
sam com complicações são cistos funcionais. tante se há uma suspeita de malignidade.
São mais comuns em mulheres jovens e, em
mulheres idosas, apresentam maior possibilida-
Diagnóstico diferencial
de de serem malignos. As complicações dos cis-
Na avaliação do abdome agudo gineco-
tos incluem hemorragia, rotura, torção e infec-
lógico, deve-se sempre pesquisar outras causas
ção. Cistos infectados causando abscessos são
de dor abdominal aguda, uma vez que a apre-
geralmente resultados da doença inflamatória
sentação de suas etiologias são muito seme-
pélvica aguda (DIP). Cistos com complicações,
lhantes. A apendicite aguda é a principal causa
principalmente se forem do lado direito, fazem
de dor abdominal aguda com resolução cirúrgi-
um importante diagnóstico diferencial com
ca. Paciente apresenta história de dor abdomi-
apendicite aguda.
nal periumbilical que migrou para a fossa ilíaca
Hemorragia: cistos que sangram podem causar direita, associada a náuseas, vômitos, diarreia,
sinais e sintomas similares à gravidez ectópi- anorexia e febre baixa. Quando a febre surge,
ca com dor abdominal baixa severa e rigidez pode ser constatada leucocitose. Ao exame fí-
abdominal. A paciente pode encontrar-se anê- sico, evidencia-se sinal de Blumberg e sinal de
mica. Massa pélvica constatada à palpação du- Rovsing positivos. Essa apresentação ocorre na
rante o exame vaginal representa um achado maioria dos pacientes com apendicite aguda,
mais favorável a cisto ovariano do que a gravi- porém pode variar de acordo com a localização
dez ectópica. A realização do teste de gravidez do apêndice, em pacientes imunossuprimidos e
seria a melhor maneira para diferenciar esses em idosos. O exame físico, junto à história clíni-
dois possíveis diagnósticos. A US transvaginal ca tem uma acurácia de 95% para o diagnóstico
confirmaria a presença de cisto ovariano. de apendicite aguda. Exames de imagem como
Rotura: casos de rotura de cisto podem apre- US e tomografia computadorizada podem ser
sentar-se semelhantes aos casos, embora a utilizados, principalmente em casos atípicos. A
paciente esteja menos anêmica e o início da conduta é ressecção do apêndice inflamado. No
dor seria provavelmente mais agudo. A US caso de dúvidas quanto a um abdome agudo
transvaginal mostraria uma quantidade signi- ginecológico, a laparoscopia diagnóstica está
ficante de líquido livre na pelve. bem indicada.
Torção: cistos que cursam com torção podem
Além da apendicite, outras situações clí-
causar episódios de dor recorrente, que pode
nicas são diagnóstico diferencial de abdome
aparecer ou desaparecer durante um longo
agudo ginecológico. São elas: obstrução intesti-
ou curto período de tempo a depender de
nal, diverticulite e nefrolitíase.
o pedículo estar ou não torcido. A dor pode
tornar-se contínua se o suprimento sanguíneo A principal causa de obstrução intestinal
ovariano for impedido e o ovário tornar-se, são as bridas formadas após cirurgias ou pro-
por consequência gangrenoso. cessos inflamatórios na cavidade abdominal.
Tratamento: muitos cistos funcionais, particu- A paciente apresenta cólicas abdominais, náu-
larmente aqueles com diâmetro inferior a 5cm, sea, vômitos, distensão abdominal progressiva
irão desaparecer espontaneamente. O trata- e constipação. Esses sintomas podem variar de
D- Referências Bibliográficas
AZEVEDO, M.R.D. et al. Síndrome pré-menstrual
em adolescente: um estudo transversal de fa-
tores biopsicossociais. Arq Med ABC, v.31, n.1,
p.12-17, 2006.
Raio-X de punhos e mãos, para avaliação anos em crianças brancas, sem outros sinais de
da idade óssea. Considera-se como critério de estrogenização e/ou virilização. Não há desen-
normalidade um desvio de idade inferior a 10% volvimento mamário, mas pode ocorrer discreta
da idade cronológica. Nos casos de telarca pre- aceleração da velocidade de crescimento, evi-
coce, não se observa avanço na idade óssea. denciada pela estatura e maturação esquelética
avançadas para a idade, não comprometendo
O teste de estímulo com GnRH pode fazer
a estatura final. Geralmente representa um au-
o diagnóstico diferencial entre telarca e puber-
mento precoce e modesto de androgênios su-
dade precoce. Nas portadoras de telarca preco-
pra-renais. Segundo Mansfield, é mais comum
ce, têm-se como resposta valores de FSH mais
em crianças negras, hispânicas e obesas.
altos do que os encontrados nas meninas nor-
mais, enquanto nas portadoras de puberdade O início mais precoce da adrenarca em re-
precoce idiopática os valores de LH são signifi- lação à gonadarca pode sugerir que os andró-
cativamente mais elevados. genos adrenais exerçam um papel importante
na maturação do eixo hipotálamo-hipófise-ova-
riano. Entretanto, vários fatos nos levam a crer
2.4. Tratamento que a adrenarca seja um processo independen-
A telarca precoce é uma alteração mamária te da gonadarca. Já foi observado que, mesmo
sem gravidade, não exigindo qualquer tratamen- nos casos de hipogonadismo, tais como disge-
to. O importante é o exame clínico periódico, com nesia gonadal e deficiência isolada de gonado-
a análise do crescimento das mamas, a ultrasso- trofinas, a pubarca está presente e os níveis de
nografia pélvica, da curva estatural, da citologia SDHEA são normais. Outro fato que reforça a in-
vaginal hormonal e da idade óssea. A avaliação dependência entre esses dois fenômenos é que
deve ser realizada em intervalos de 6 a 18 meses. nos casos de insuficiência adrenal geralmente
não ocorre atraso no início da puberdade. Além
Merece investigação especial e mais cui- disso, a maioria das pacientes com adrenarca
dadosa as pacientes que apresentaram desen- precoce inicia a puberdade e tem sua menar-
volvimento das mamas antes de 2 anos de ida- ca em uma faixa etária normal. Contudo, níveis
de e não ocorreu a regressão. patologicamente elevados de andrógenos adre-
Quando o crescimento das mamas é uni- nais, tais como ocorre nos casos de hiperplasia
lateral, há um grande receio por parte dos fa- adrenal congênita, podem levar ao desenvol-
miliares, de neoplasia. Os responsáveis devem vimento de um quadro de puberdade precoce
ser orientados da benignidade do caso, sobre verdadeira e antecipação da menarca.
a importância do acompanhamento e a contra- Temeck encontrou, entre 19 meninas de
-indicação absoluta de cirurgia. 2 a 7 anos avaliadas com pubarca precoce, de-
ficiência da 21-hidroxilase em 26% dos casos. É
importante que formas não-clássicas de hiper-
3. Pubarca precoce plasia congênita de suprarrenal sejam pesqui-
Após os 6 anos de idade, antes da ati- sadas. Miller observou que adolescentes com
vação do eixo hipotálamo-hipófise-ovário (go- ovários policísticos tinham história de pubarca
nadarca) e do estirão do crescimento, o córtex prematura.
suprarrenal aumenta a sua secreção hormonal, A pubarca precoce, geralmente é idiopá-
fenômeno denominado adrenarca, a qual se tica, mas é frequente em crianças com patolo-
caracteriza pela elevação dos níveis de DHEA, gia do SNC. Pode ser também o 1º sinal de um
SDHEA e androstenediona. Esses andrógenos, tumor das suprarrenais ou dos ovários ou da
principalmente a androstenediona, são precur- forma tardia da hiperplasia adrenal congênita.
sores da testosterona e do estradiol, contribuin-
do assim para o aumento desses hormônios.
O mecanismo exato que promove o início da 3.1. Quadro clínico e diagnóstico
adrenarca ainda é bastante controverso.
O quadro clínico, caracterizado pelas ma-
Define-se como pubarca precoce ou nifestações decorrentes do aumento na produ-
adrenarca precoce, o aparecimento isolado de ção de andrógenos, sugere o diagnóstico. Além
pelos pubianos e/ou de pelos e odor axilares, do desenvolvimento de pelos pubianos, outros
antes de 6 anos de idade em crianças negras e 7 sinais de atividade androgênica podem estar
Nos casos de pubarca precoce idiopática, REHME, M.F.B.; BEREZOWSKI G.; SOUZA, L.P. Pu-
não há necessidade de qualquer tratamento. A barca Precoce: Avaliação Clínica e Diagnóstico.
paciente e a família devem ser esclarecidas quan- Femina, v.28, n.4, p.201-03, 2000.
to à natureza benigna do quadro, que representa
REIS, J.T.L. Puberdade Precoce. In: Magalhães
simplesmente uma variação do normal, ou seja,
MLC; Reis, JTL Ginecologia Infanto-Juvenil
um processo fisiológico que está ocorrendo mais
– Diagnóstico e Tratamento. Rio de Janeiro:
precocemente. Nunca se deve esquecer a impor-
MedBook. 2007. Cap.17, p.195-209.
tância do acompanhamento periódico.
cremes de estrogênio ou ingestão inadvertida cial com a telarca prematura, situação na qual
de estrogênio oral. a curva mantém o seu ritmo fisiológico por não
Hipotireoidismo primário: causa provavel- haver produção estrogênica importante.
mente o desenvolvimento de cistos ovarianos,
No exame físico, avalia-se peso, altura,
devido à ação dos altos níveis de TSH nos re-
presença de acne ou manchas café-com-leite
ceptores ovarianos de FSH. Os caracteres se-
na pele, odor axilar e pilosidade pubiana e/ou
xuais secundários regridem com a regulariza-
axilar. Palpa-se a tireoide e investigam-se sinais
ção da função tireoidiana.
e hipotireoidismo severo. Nas mamas, avaliam-
-se o desenvolvimento glandular, o diâmetro e
4. Diagnóstico diferencial a coloração da aréola, e se essas mudanças são
uni ou bilaterais. Lembrando que o desenvolvi-
O diagnóstico diferencial é feito com a
mento mamário e a pilosidade pubiana devem
precocidade sexual incompleta que, geralmen-
ser estadiados segundo a classificação de Mar-
te, é composta por quadros não patológicos
shall e Tanner (Quadro 1). Palpa-se o abdome
que são a variação da puberdade normal sem
à procura de massas. Procuram-se, na genitália
a aceleração do crescimento e com os níveis
externa, sinais de ação estrogênica (desenvolvi-
hormonais adequados à idade cronológica. Os
mento de pequenos e grandes lábios, espessa-
principais são:
mento da mucosa vaginal, leucorreia) e de uma
Telarca prematura: desenvolvimento mamário possível ação androgênica (clitorimegalia). A
uni ou bilateral, com botão mamário medindo consulta neurológica específica deve ser reali-
de 2 a 4 cm, sem desenvolvimento areolar ou zada, quando necessária.
de outros sinais puberais, sendo mais comum
O estudo da idade óssea (IO) é muito útil
em menina com idade abaixo de 2 anos.
quando realizado de maneira sequenciada, tan-
Pubarca prematura: aparecimento isolado
to para o diagnóstico como para o controle do
de pelos pubianos e/ou pelos e odor axilares,
tratamento e a presença de avanço importante
antes de 6 anos de idade em crianças negras e
na IO indica que o processo está presente há
7 anos em crianças brancas, sem outros sinais
mais tempo.
de estrogenização e/ou virilização. Não há
desenvolvimento mamário, mas pode ocorrer Deve-se realizar, sempre que possível, a
discreta aceleração da velocidade de cresci- pesquisa da ação estrogênica por meio de um
mento, evidenciada pela estatura e maturação esfregaço de células vaginais, por ser prática e
esquelética avançadas para a idade, não com- objetiva. Coleta-se o material das paredes la-
prometendo a estatura final. terais do terço vaginal distal com cotonete ou
Menarca prematura: sangramento vaginal swab. A proporção entre as células superficiais,
em crianças com duração de um a cinco dias, intermediárias e profundas determinará o grau
em episódio único ou por vários meses, sem de ação estrogênica. Um resultado típico em
outros sinais de ação estrogênica. pacientes com puberdade precoce mostra 35%
de células superficiais, 50% de células interme-
diárias e 15% de células profundas, e valores su-
5. Diagnóstico periores a 40% de células superficiais sugerem
Para o diagnóstico deve-se proceder uma tumor produtor de estrogênio. Contudo, não
anamnese cuidadosa, apresentando dados in- ajuda a diferenciar a origem do estímulo estro-
dispensáveis como: episódios semelhantes em gênico, se central, periférico ou externo.
familiares da paciente, traumas ao nascimento A diferenciação entre a puberdade preco-
ou infecções afetando o SNC (encefalite, menin- ce verdadeira e a pseudopuberdade é feita por
gite...), aceleração do crescimento, dor abdomi- meio de dosagens hormonais, que podem in-
nal ou alterações urinárias ou intestinais, idade cluir pesquisa de níveis séricos de:
na qual os caracteres sexuais se evidenciaram e
a velocidade com que se desenvolveram. LH e FSH: é o exame de escolha para iniciar-se
a avaliação hormonal. Quando dosados du-
A curva de crescimento realizada de ma- rante o dia, não ajudam na diferenciação entre
neira regular e desde a infância, sugere, quando telarca prematura, pseudopuberdade precoce
alterada, aceleração no desenvolvimento ós- e puberdade precoce verdadeira em estágio
seo, sendo, assim, útil no diagnóstico diferen- inicial, porque, no início do processo puberal,
FSH e LH são liberados em picos noturnos e rino, visualização do endométrio, volume ova-
podem estar baixos. Quando se encontram riano, presença de folículos em crescimento e
em níveis adultos caracterizam a puberdade cistos ovarianos, além de ser útil na pesquisa de
precoce verdadeira, sendo LH um marcador tumores adrenais.
superior ao FSH, que pode estar elevado no
Tomografia computadorizada e ressonân-
período pré-puberal.
cia magnética (RM) ajudam na identificação de
Teste de estímulo pelo GnRH: é o exame mais
lesões do SNC, sendo a última, o método de
importante para confirmar o diagnóstico de
escolha, devendo ser solicitada em todas as pa-
puberdade precoce verdadeira, mostrando
cientes com menos de 6 anos de idade. A RM
uma resposta puberal ao estímulo hipofisário
permite o diagnóstico de pequenos tumores do
pelo GnRH, na dose de 100ug, EV. Espera-se
hipotálamo como os hamartomas.
uma elevação de LH bem mais significativa
do que do FSH, quando comparadas a valores
basais. É a ausência de elevação de LH após 6. Tratamento
estímulo com GnRH que tem valor diagnósti-
co. Cuidado ao avaliar crianças de até 2 anos Os casos de pseudopuberdade precoce
de idade, quando níveis de gonadotrofinas deverão ser tratados de acordo com sua cau-
estão fisiologicamente aumentados, podendo sa de base. Já os casos de puberdade precoce
levar a um diagnóstico equivocado de PPV. verdadeira por tumores deverão ser acompa-
Estradiol: pouco conclusivo, apresenta-se fre- nhados pelo neurocirurgião, e para o hipoti-
quentemente em níveis dentro da normalida- reiodismo primário será utilizada medicação
de (abaixo de 20pg/mL). Se níveis elevados tireoidiana apropriada com retorno ao padrão
sugerem puberdade precoce, níveis normais da idade cronológica. Quando presentes cistos
não a excluem. A presença de tumores é su- ovarianos, pode ser difícil definir se seriam por
gerida por níveis acima de 75pg/mL. estímulo gonadotrofico ou não, e para tanto, o
Androgênios: o sulfato de deidroepiandros- teste pós estímulo com GnRH é útil.
terona funciona como marcador da produção A indicação do tratamento não está vin-
androgênica adrenal, com boa relação com o culada somente à idade do inicio das mudanças
início dos pelos pubianos, mas não possui qual- puberais, mas também a rapidez de sua pro-
quer valor preditivo sobre a maturação gonadal, gressão e a presença de indicadores de perda
não sendo útil na determinação do início pube- estatural um vez que na puberdade precoce
ral. Naquelas pacientes com pubarca precoce e verdadeira, o tratamento deverá acontecer tão
sinais de virilização importante, devem-se tam- logo se faça o diagnóstico, a fim de que uma
bém pesquisar testosterona e 17-hidroxipro- melhor estatura final seja obtida.).
gesterona, pensando-se em surpreender tumor
virilizante ou hiperplasia congênita de suprarre- O acetato de medroxiprogesterona (AMP),
nal forma tardia. Em casos de tumor adrenal, o acetato de ciproterona e o danazol eram utilizados
SDHEA é um excelente marcador. como tratamento de escolha para a puberdade
TSH: para confirmar quadro de hipotireoidis- precoce verdadeira; entretanto, em decorrência de
mo primário grave, em que níveis elevados de seus efeitos adversos e de sua pouca eficiência na
TRH, TSH e prolactina sensibilizam os recep- inibição do crescimento, têm indicações somente
tores gonadais de gonadotrofinas e desenca- em situações especiais, tendo sido substituídos
deiam a puberdade. Ocorre principalmente em pelos análogos do GnRH sendo esta, atualmente,
pacientes com presença de caracteres sexuais considerada melhor opção terapêutica.
secundários, baixa estatura e retardo na IO, Os análogos do GnRH estão sendo uti-
sendo a única situação em que puberdade pre- lizados como medicamento de escolha para o
coce cursa com desaceleração de crescimento. tratamento da puberdade precoce desde 1981.
Esses medicamentos são análogos sintéticos do
Outros métodos por imagem comple- decapeptídeo natural do GnRH e têm como sítio
mentam a avaliação diagnóstica, sendo a ultras- de ação a glândula hipófise levando a uma di-
sonografia a primeira opção para avaliação do minuição do número de receptores para GnRH
abdome e pelve. Estudam-se parâmetros que na mesma. Os análogos do GnRH mais conheci-
podem estar alterados na puberdade precoce, dos são: acetato de leuprolida, goserelina, trip-
como volume uterino, relação corpo/colo ute- torelina e nafarelina, dentre outros.
Inicialmente existe uma estimulação CUNHA, S.B. et al. Diagnóstico Diferencial da Te-
na síntese e secreção da gonadotrofina po- larca Precoce: ainda um desafio. Revista Médi-
rém quando administrados cronicamente eles ca de Minas Gerais. v.18, n.4, p.229-235, 2008.
atuam suprimindo a produção da gonadotro-
nia com consequente repressão da produção LIMA, A. C. R. F. et al. Avaliação ultrassonográfi-
dos esteroides sexuais. Com isso teremos: a ca da genitália interna de meninas com puber-
regressão ou a estabilização dos caracteres dade precoce central idiopática antes e durante
sexuais secundários, a normalização da velo- o tratamento com análogo de GnRH. Revista
cidade de crescimento e a redução do avanço Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia. v.28,
da idade óssea. n.7, p.410-415, 2006.
Os efeitos secundários da longa ação MUL, D.; HUGHES, I.A. The use of GnRH agonists
dos análogos do GnRH são: sangramento va- in precocious puberty. European Journal of
ginal depois das primeiras doses, náuseas e Endrocrinology. v.159, S3-S8, 2008.
sintomas vasomotores decorrentes do hipo-
PRÉTÉ, G. et al. Idiopathic Central precocious
estrogenismo. Reações de hipersensibilidade
puberty in girls: presentation factors. BMC Pe-
podem ser encontradas, nesses casos, o uso
diatrics. v.8, n.27, p.1-8, 2008.
deve ser suspenso e deve ser instituida outra
medicação como a medroxiprogesterona ou o REBAR, R. W. Puberdade. In: BEREK, J.S. Berek &
acetato de ciproterona. Novak: Tratado de Ginecologia. Rio de Janei-
O controle do tratamento deve ser rea- ro: Guanabara Koogan, 2008. p. 735-769
lizado por meio de exames clínicos, avaliações REIS, J.T.L. Puberdade Precoce. In: MAGALHÃES,
hormonais e avaliações de imagem. Vale res- M.L.C.; REIS, J.T.L. Ginecologia Infanto-juvenil
saltar que o tratamento deve ser iniciado pre- - Diagnóstico e Tratamento. Rio de Janeiro:
cocemente em relação ao início dos sintomas e Medbook, 2007. p.195-209.
ao diagnóstico pois irá proporcionar um maior
ganho na estatura final e consequentemente
ganhos também na altura da idade adulta redu-
zindo assim os danos psicológicos decorrentes
das alterações físicas nessas pacientes.
D- Referências Bibliográficas
ADAMI, F.; VASCONCELOS, F. A. G. Obesidade e
maturação sexual precoce em escolares de Flo-
rianópolis – SC. Revista Brasileira de Endocri-
nologia. v.11, n. 4, p.549-560, 2008.
de fluxo menstrual. Entre as alterações disgené- Pode ocorrer disgenesia gonadal associada
ticas possíveis, a mais frequente é a síndrome de a cariótipo XY. Algumas dessas pacientes têm mu-
Turner (disgenesia gônado-somática), descrita tação no gene SRY. As pacientes com disgenesia
inicialmente em 1938, e que ocorre em 1 a cada gonadal com cromossomo Y ou com fragmento
2500 nascidos vivas do sexo feminino. Segun- do cromossomo Y no seu cariótipo, apresentam
do Reis, em 57% dos casos o cariótipo é 45,X; risco mais alto de desenvolvimento de câncer
em 17,2% dos casos há uma deleção completa gonadal em comparação às pacientes sem essas
do braço curto do cromossomo X, resultando anomalias. Por isso, é imperiosa a remoção das
em isocromossomia para o braço longo do X – gônadas dessas pacientes em idade precoce.
46,Xi(Xq); em 9,89% dos casos há deleção parcial
Na disgenesia gonadal mista há uma gô-
do braço curto do X – 46,X(Xp-); e nos 15,91%
nada em fita de um lado e um testículo imaturo
restantes encontramos mosaicismo (46,XX / 45,X
contralateral, avaliação cromossômica revelan-
em um ¼ destas pacientes). O desenvolvimento
do vários tipos de mosaico (mais comum 45,X
embrionário ovariano se encontra normal até 10
/ 46,XY), genitália habitualmente ambígua e
a 12 semanas de vida intrauterina, quando então
eventual virilização na puberdade.
se inicia um processo acelerado de atresia folicu-
lar, levando à falência ovariana e à consequente
formação do “ovário em fita”, que será formado Radioterapia e a quimioterapia
por tecido fibroso denso igual ao ovário normal e O tratamento de doenças oncológicas,
ausência de células germinativas (nas formas cro- em crianças, pode determinar retardo puberal
mossômicas puras), porém com algumas células e distúrbios da função endócrina. Segundo Poli,
germinativas nas formas de Turner em mosaico. danos causados tanto ao eixo hipotálamo-hi-
Não há produção de estrogênio pelo ovário e nem pofisário quanto às gônadas podem determinar
feedback negativo sobre o hipotálamo, levando falha puberal. As anormalidades do desenvol-
a altos níveis de gonadotrofinas. Caracteriza-se vimento puberal estão correlacionadas com a
pela tríade clínica: baixa estatura (em média 1,42 idade da paciente, com a dose de irradiação
a 146,5 cm), atraso no desenvolvimento puberal e ministrada, com os diferentes regimes terapêu-
alterações somáticas diversas como implantação ticos e com o fracionamento da irradiação.
baixa de cabelos e orelhas, pescoço alado, linfe-
dema de palmas e plantas ao nascimento, tórax A radioterapia e a quimioterapia têm sua
em armadura, hipertelorismo mamário, cubitus ação sobre o ovário durante o tratamento de di-
valgo, quarto metacarpiano curto, malformações versas patologias, especialmente leucemias, lin-
do trato urinário e do aparelho cardiovascular. fomas e tumores de ovário. Silva et al lembram
Ainda pela falta de estrogênio, não há desenvol- a toxicidade gonadal de agentes alquilantes (ci-
vimento dos caracteres sexuais secundários, mas clofosfamida, clorambucil, metotrexato) e que,
a pubarca acontece normalmente. Cardoso lem- em transplantes de medula óssea, a falência
bra que pacientes 45,X podem ter seu diagnós- ovariana é praticamente certa pelas altas doses
tico feito ao nascimento ou início da infância, as de quimioterápicos utilizados. Para Machado,
demais podem revelar aparência quase normal e é provável que o número de oócitos presentes
apresentar-se apenas com menstruação ausente. por ocasião da terapia determine se a função
Nos casos em que o cariótipo é de mosaico, há ovariana será mais ou menos afetada. Quanto
alguma produção estrogênica que levará a um mais jovem a paciente, menos intensos são os
desenvolvimento mamário variável e, em algu- efeitos deletérios sobre o ovário, uma vez que
mas situações, à menstruação. sua ação se faz mais intensa em células que es-
tão em processo de multiplicação, situação esta
Quando as alterações se restringem so- pouco observada no “ovário em repouso” da
mente à presença de gônada rudimentar (a infância. Adolescentes podem apresentar ame-
maioria é 46,XX), sem estigmas somáticos como norreia e níveis altos de gonadotrofinas durante
os descritos acima, vê-se diante dos casos de a quimioterapia, situação esta reversível meses
disgenesia gonadal pura: genitália externa femi- ou anos após a sua finalização. Em estudo com-
nina, genitália interna mulleriana, pelos pubia- parando pacientes de 12 a 19 anos submetidas
nos e axilares escassos, amenorreia primária e à quimioterapia em período pré-puberal com
infantilismo sexual. Pode estar associada à sur- adolescentes normais, Silva et al observaram
dez sensorial (síndrome de Perrault). desenvolvimento puberal adequado nas primei-
ras, mas consideraram que há algum prejuízo na daquelas que apresentam distúrbios que con-
função gonadal dessas pacientes, principalmen- duzirão ao infantilismo sexual e necessitarão
te no que se refere à reserva ovariana, como de tratamento.
falência ovariana prematura. O ovário pode ser
protegido antes da terapêutica oncológica pelo
uso prévio de inibidores de GnRH (“congela- 2. Diagnóstico
mento” do ovário) e/ou transposição cirúrgica 2.1. Anamnese
dos ovários, retirando-os do campo de irradia-
ção. Um incômodo importante pós-irradiação Alguns pontos chamam a atenção, como
pélvica é o ressecamento vaginal. o ritmo de crescimento durante a infância e a
adolescência. As pacientes com retardo simples
apresentam um crescimento nos limites inferio-
Ooforite autoimune res da normalidade durante toda a infância; man-
Está mais associada à infertilidade e à têm uma velocidade de crescimento normal para
amenorreia secundária do que à falha do desen- a idade óssea e a maturação óssea é inferior a
volvimento puberal, mas deve ser sempre pes- 2DP da média. Em geral, há uma história no que
quisada no hipogonadismo hipergonadotrófico concerne ao padrão de crescimento e puberdade
com cariótipo normal. Frequentemente acompa- nos pais ou irmãos. Por outro lado, aquelas com
nha outras alterações autoimunes como suprar- hipogonadismo hipogonadotrófico geralmente
renais, tireoidianas, diabetes, anemia perniciosa e têm crescimento normal durante a infância, mas
vitiligo. Pode se apresentar de forma transitória, não apresentam o estirão puberal. Portanto, nes-
com recuperação espontânea ou estimulada por se caso, o retardo estatural é um acontecimento
meio de tratamento medicamentoso. recente. É fundamental conhecer-se a curva de
crescimento e o peso da paciente, a época de
aparecimento e a evolução dos caracteres se-
1.1.3. Retardo puberal constitucional xuais secundários, o uso de medicamentos, a
Na maioria dos casos, a puberdade re- existência de alguma patologia crônica, hábitos
tardada não é decorrente de alguma patologia, alimentares, a intensidade na prática de esportes
mas, em vez disso, representa final extremo de e atividades físicas, assim como, histórico pube-
uma puberdade normal (ou também chamada ral famíliar. É importante sempre se lembrar dos
por retardo simples da puberdade ou ainda, re- fatores socioeconômicos e psicossociais; o cres-
tardo puberal constitucional). Nesses casos, há cimento em qualquer época durante a infância
um atraso global, atingindo com a mesma in- e seguramente durante a puberdade pode ser
tensidade altura, idade óssea e puberdade, cor- marcadamente prejudicado por fatores dessa
respondendo a cerca de 10 a 30% dos casos de natureza, algumas vezes mascarando as influên-
puberdade tardia. Mais comumente, apresenta- cias genéticas. Geralmente, para sua obtenção,
-se como um retardo do crescimento, mas pode deve-se recorrer ao auxílio de uma assistente so-
interferir no desenvolvimento dos caracteres se- cial e/ou psicoterapeuta.
xuais secundários ou somente retardar a menar-
ca. Para Reis, essa alteração geralmente se deve
2.2. Exame físico
a fatores genéticos, com história familiar mater-
na semelhante ou associada a doenças crônicas, É básica a avaliação de peso e altura, pro-
como cardiopatias, enteropatias e desnutrição. porções corpóreas, caracteres sexuais secun-
As dosagens de gonadotrofinas e estradiol se en- dários, segundo a classificação de Marshall e
contram dentro da faixa normal para a infância, Tanner. A curva de crescimento realizada de ma-
e o teste de estímulo pelo GnRH apresenta re- neira regular desde a infância pode sugerir um
sultados bem variáveis e compatíveis tanto com retardo no desenvolvimento quando se apre-
padrão impúbere como com resposta puberal; senta a algum tempo em seus limites inferiores.
esses casos devem ser investigados segundo os Speroff recomenda a pesquisa de sinais clínicos
parâmetros estipulados no início deste capítulo, de doenças crônicas, hipotireoidismo (presença
para a confirmação do diagnóstico. de dentes de leite persistentes) e hipopituitaris-
mo (ausência de pilosidade pubiana), disgene-
Para Machado, é de suma importância
sia gonadal (baixa estatura e infantilismo sexu-
identificar aquelas pacientes que desenvolve-
al), avaliação neurológica (restrição do campo
rão uma puberdade espontânea, porém tardia,
visual, alterações do olfato), defeitos anatômi- roff acredita que o uso de agonistas de GnRH
cos (descompasso entre desenvolvimento pu- como acetato de leuprolida e acetato de nafa-
beral e amenorreia primária). Durante o exame relina seria uma opção no diagnóstico diferen-
físico, deve-se ainda ser avaliada a presença cial entre hipogonadismo hipogonadotrófico e
de fissura palatina que pode estar presente na retardo simples da puberdade, na expectativa
síndrome de Kallmann. Lembrar também que a de encontrar quando do último quadro clínico,
associação de obesidade, baixa estatura e retar- elevação dos níveis de gonadotrofinas.
do mental é frequentemente encontrada na sín-
drome de Prader-Willi. A polidactilia e a retinite
pigmentosa são observadas em pacientes com 2.3.2. Cariótipo
a síndrome de Laurence-Moon-Biedl. Define o diagnóstico das disgenesias go-
nádicas e deve ser sempre realizado quando os
níveis de gonadotrofinas estão altos.
2.3. Exames Laboratoriais
2.3.1. Dosagens hormonais
2.3.3. Idade Óssea
Em princípio, o diagnóstico etiológico é
definido a partir das dosagens de gonadotro- Deve ser estimada segundo critérios de
finas. Quando se encontram em níveis baixos, Greulich e Pyle, RUS ou Tanner-Whitehouse
indicam uma causa central, hipotalâmica ou (TW-20). Uma diferença superior ou igual a
hipofisária, e se estão elevadas, apontam para dois desvios-padrões entre a idade óssea e a
uma causa ovariana. Quando estão em níveis cronológica indica estímulo estrogênico insu-
normais, deve-se suspeitar de anomalias na ficiente. Na prática, esta diferença é traduzida
fusão dos ductos de Muller ou pseudo-herma- como sendo de três a seis meses em pacientes
froditismo masculino forma completa com in- de até 1 ano de idade, de doze a dezoito me-
sensibilidade periférica total aos androgênios ses, em pacientes com idade entre 1 e 3 anos, e
(a puberdade instala-se na época esperada, de 2 anos, em pacientes com idade superior a 3
mas não há menarca). Reindolar em sua série anos. A idade óssea juntamente com as dosa-
com 326 pacientes encontrou 31% de casos de gens de FSH/LH nas pacientes com puberdade
hipogonadismo hipogonadotrófico, 43% de tardia ajudam o profissional no diagnóstico di-
casos de hipogonadismo hipergonadotrófico ferencial. Paciente com níveis baixos de gona-
e 26% de casos sem alteração no eixo hipo- dotrofinas e IO>13 anos muito provavelmente
tálamo-hipófise-ovário. Porém, estas dosagens são portadoras de uma patologia subjacente.
devem ser avaliadas com cuidado, porque a Por sua vez, meninas com níveis baixos de LH/
liberação das gonadotrofinas acontece de for- FSH, porém com IO em torno de 10 a 11 anos,
ma pulsátil, podendo, assim, induzir um erro provavelmente são crianças que irão desenvol-
de interpretação quando da realização de uma ver maturação sexual normal.
única dosagem. Além do mais, existem várias
situações intermediárias nas quais os níveis de
gonadotrofinas não estão tão definidos quan- 2.4. Outros métodos de imagem
to nos exemplos anteriores. Contudo, quando A ultrassonografia orienta quanto às
se encontram definitivamente aumentadas, malformações, como agenesia uterina e ano-
ajudam a definir o diagnóstico como disgene- malias Mullerianas, às massas anexiais e na
sia gonadal. A resposta ao estímulo por GnRH avaliação da genitália interna de pacientes nas
é muito variável e depende da capacidade de quais não é possível a realização do toque va-
produzir gonadotrofinas e da exposição prévia ginal. Tomografia computadorizada (preferível
ao GnRH endógeno. No retardo simples e no para pesquisa de massas adrenais e abdomi-
hipogonadismo hipogonadotrófico em 50% nais) e ressonância magnética (preferível para
dos casos, a resposta ao estímulo pelo GnRH é pesquisa de alterações hipotalâmicas e outras
do tipo impúbere. A hiperprolactinemia pode intracranianas) ajudam na identificação de le-
estar associada a hipotireoidismo primário. sões do SNC e a densitometria óssea, na iden-
Dosagens séricas de GH, IGF-1 e IGFBP-3, in- tificação e no controle de pacientes com perda
clusive com teste pós-estímulo, podem dife- óssea significativa.
renciar puberdade tardia e déficit de GH. Spe-
2.4.1. Citologia hormonal vaginal Nos outros casos nos quais a deficiência
na produção estrogênica é irreversível, Spero-
Ajuda na determinação do grau de ação
ff, Molina e Zacharin concordam em fazer-se a
estrogênica, uma vez que a mucosa vaginal pré-
reposição objetivando desenvolver e manter os
-puberal é muito sensível ao seu estímulo. Útil
caracteres sexuais secundários, promover o es-
para confirmar os casos em que há uma discreta
tirão puberal aproveitando ao máximo o poten-
produção hormonal e no acompanhamento do
cial de crescimento, sem menosprezar o ganho
tratamento, pela proporção entre as células su-
de massa óssea adequado. Como boa parte da
perficiais, intermediárias e profundas (índice de
formação óssea acontece até o final da adoles-
Frost). Quanto maior a percentagem de células
cência (seu pico é por volta da menarca), o efei-
superficiais, maior o estímulo estrogênico.
to da reposição hormonal sobre sua estrutura-
ção é de fundamental importância. Dois terços
2.4.2. Laparoscopia destas pacientes têm redução significativa da
densidade mineral óssea, estando mais sujeitas
Em casos de disgenesia gonadal, quan- a fraturas espontâneas. Zacharin lembra que in-
do se deseja realizar biópsia da gônada em terações hormonais complexas, tratamentos à
fita e/ou gonadectomia. base de corticoesteroides e regimes quimiote-
rápicos contribuem para reduzir a massa óssea.
Molina e Zacharin ainda realçam a necessidade
3. Tratamento de manter um desenvolvimento adequado da
Segundo Reis, o tratamento, inicialmente, pele, musculatura e função dos órgãos sexuais,
visa a uma adequação social e emocional da pa- crescimento uterino normal e proliferação en-
ciente, além de reposição hormonal simulando dometrial (fertilidade futura), bom perfil lipídico
o processo fisiológico. prevenindo enfermidades cardiovasculares fu-
turas. Os riscos de sua utilização são similares
Para tanto, pode ser necessário um supor-
aos da paciente adulta, dependendo do estró-
te psicoterápico apropriado, uma vez que estas
geno utilizado, sua dose e via de administração.
adolescentes podem apresentar um sentimento
Zacharin acredita que para adolescentes com
de inferioridade em relação à feminilização e
risco de trombose ou coagulopatia, hiperten-
contato diminuído com adolescentes da mesma
são arterial ou alteração nas enzimas hepáticas
idade, mostrarem-se tensas, irritadiças ou de-
(alguns casos de síndrome de Turner), não se-
primidas, com rendimento escolar insuficiente,
riam recomendados os anticoncepcionais hor-
além de uma maior dependência e superprote-
monais orais, mas seria viável o uso de repo-
ção paternos com evidente imaturidade social.
sição hormonal por via transdérmica associado
Naquelas situações de hipogonadismo a progestágeno oral cíclico. Estrogenioterapia
hipogonadotrófico devido a tumores do SNC, transdérmica em lugar da via oral também es-
anorexia e desnutrição, atividade física excessiva taria indicada para pacientes com galactosemia.
ou hipotireoidismo, a causa básica que impede a Porém, não recomenda reposição por nenhuma
atividade hipotalâmica-hipofisária deve ser abor- via para aquelas pacientes com falha hepática
dada e solucionada. Para o craniofaringioma, está transitória ou permanente.
indicada combinação de cirurgia e radioterapia.
O momento de seu início depende da
Em pacientes com hipogonadismo hipergonado-
idade na qual o diagnóstico foi estabelecido,
trófico e presença de cromossomo Y, a gônada
mas a verificação da densidade mineral óssea
deve ser retirada tão logo seja feito o diagnósti-
(pela densitometria) e a observação do nível
co, como profilaxia contra o risco de sua malig-
de desenvolvimento dos caracteres sexuais se-
nizacão (poderá ocorrer em 20 a 30% dos casos,
cundários determinarão o esquema e as doses
na segunda ou terceira década de vida). Cardoso
hormonais mais adequadas. Ainda não há um
recomenda avaliar a possibilidade de gonadecto-
consenso sobre a melhor época de iniciar-se
mia em pacientes com disgenesia gonadal quan-
a reposição hormonal em pacientes anoréxi-
do houver calcificações na gônada disgenética,
cas e atletas. Cardoso salienta a prudência de
aumento de volume ou sinais de produção an-
aguardar a época da puberdade fisiológica para
drogênica, independentemente da forma clínica.
iniciar-se o tratamento em pacientes com dis-
O tratamento das alterações anatômicas do trato
genesia gonadal. Speroff lembra que a utiliza-
genital é específico para cada caso.
ção parenteral de GnRH pulsátil teria respaldo
fisiológico, mas seu custo financeiro alto e uso tamento, com recomendação de Kalantaridou
incômodo e difícil, inviabilizam a prescrição. para que seja o acetato de medroxiprogestero-
na, 5 a 10 mg/dia ou conforme Zacharin que
A reposição hormonal deve ser realizada
indica o acetato de norestisterona, 5 mg/dia, de
em doses que não excedam às necessárias para
doze a catorze dias ao mês. Molina sugere o uso
permitir o desenvolvimento físico, simulando o
de progesterona micronizada na dose de 100
processo fisiológico, sendo, portanto, dividida
mcg/dia, associada em forma cíclica por sete
em três momentos. Pode ser necessária desde
dias durante o mês, ou catorze dias, três a qua-
seu momento inicial (quando não há nenhum
tro vezes ao ano, se não houver sangramentos
estímulo estrogênico) ou só no último, depen-
intercorrentes. Qualquer uma destas doses de
dendo das necessidades individuais da pacien-
estrogênio é capaz de promover menstruações,
te. Molina indica começar-se entre as idades
mas a dose de 1,25 mg/dia pode ser utilizada,
de 12 a 15 anos e idade óssea de 12 anos, re-
durante algum tempo, em adolescentes nas
tardando o início da medicação para favorecer
quais é necessário aumento real da massa ós-
um maior crescimento pelo GH. Não se devem
sea, e não simplesmente manter-se a densidade
esperar grandes mudanças físicas durante o
óssea. O uso desta dose elevada tem como van-
primeiro ano de tratamento, sendo a resposta
tagem, também estimular uma atividade folicu-
clínica acompanhada pelos critérios de Tanner,
lar espontânea, caso esta seja possível, permi-
idade óssea e crescimento uterino.
tindo inclusive gravidez em algumas situações.
Para induzir o desenvolvimento mamário,
Para manutenção do desenvolvimento
a reposição hormonal, pode ser utilizada duran-
físico obtido: pode-se manter a medicação an-
te um período de até doze meses, dependendo
terior ou optar pelo uso da pílula anticoncep-
do grau de desenvolvimento mamário já exis-
cional de 20 a 35 mcg de etinil estradiol. Esta
tente. A duração desta fase pode ser encurtada,
escolha apresenta como vantagem, além da
mas, o que se deseja são mamas que atinjam
praticidade do uso, a semelhança em atitude
o estágio clínico dois ou três, segundo a clas-
com outras adolescentes da mesma idade e sua
sificação de Tanner. Seriam utilizadas doses de
ação anticoncepcional para aquelas pacientes
estrogênios conjugados equinos, 0,3 mg/dia,
que não querem engravidar (quando isto for
via oral, ou estradiol transdérmico, 25 mcg/24
possível). A adequação das doses utilizadas de
hs, ou 17 beta estradiol, 0,6 mg/dia, em forma
estrogênio dependerá da observação de efeitos
de gel. Neste período não é aconselhável o uso
colaterais, do controle de densidade óssea e do
de pílulas anticoncepcionais uma vez que, pelo
perfil lipídico, sendo mantida assim até a épo-
processo fisiológico espontâneo, ainda não
ca em que ocorreria a menopausa fisiológica. O
haveria a produção de progesterona. Segun-
uso de anticoncepcionais hormonais justifica-se
do Zacharin, etinilestradiol é reconhecidamen-
especialmente em pacientes que se submete-
te melhor que os estrogênios conjugados em
ram à quimioterapia (ex: ciclofosfamida) ou irra-
promover melhor definição corporal e da forma
diação craniana, situações em que pode ocorrer
dos seios, além de melhor viabilidade biológi-
uma recuperação da função gonadal até anos
ca que o estradiol micronizado, mas promove
após o tratamento inicial. O uso de estrogênio
maior produção de renina e de seus efeitos ad-
sistêmico ou local não resolve eventual resseca-
versos como hipertensão (10 mcg etinilestradiol
mento vaginal decorrente de irradiação pélvica,
~ 1 mg valerato de estradiol).
condição que só melhora com gel lubrificante.
Para promover menstruações regulares Nestas mesmas pacientes, o estímulo hormonal
e mineralização óssea adequada: aumenta-se promovendo renovação cíclica do endométrio é
inicialmente a dose do estrogênio e posterior- uma prevenção em relação à sinéquias uterinas,
mente associa-se progestágeno (em adolescen- que podem ser suspeitadas se houver recorrên-
tes com útero intacto). Em intervalos semestrais, cia da amenorréia.
a dose é aumentada para 0,625 até 1,25 mg/
Nas pacientes com síndrome de Turner,
dia de estrogênios conjugados equinos, ou 50
caracteristicamente com baixa estatura, ainda
a 100 mcg/24 hs, de estradiol transdérmico, ou
persiste a dúvida sobre a idade em que se deve
1,2 a 1,5 mg/dia de 17 beta estradiol, em forma
iniciar a reposição estrogênica, uma vez que
de gel. Como a progesterona não é necessária
esta levará ao fechamento das epífises ósseas.
para induzir a puberdade, justifica-se sua asso-
Por outro lado, parece aceitável, que nelas seja
ciação a partir do final do segundo ano de tra-
utilizado o hormônio do crescimento (GH) antes EMMANS, S.J. Delayed Puberty and Menstrual
do início do uso do estrogênio, com o objetivo Irregularities. In: EMANS, S.J.; LAUFER, M.R.;
de acelerar a velocidade de crescimento e uma GOLDSTEIN, D.P. Pediatric and Adolescent Gy-
questionável melhora na altura final. Porém, necology. Philadelphia: Lippincott-Raven Pub-
permanece discutível a utilização de doses bai- lishers, 1998, p.163-262.
xas de estrogênio para acelerar o crescimento
ósseo, a partir do final da infância. Ferràndez HISSA, M.N. Puberdade Atrasada. In: MAGA-
sugere o GH sintético, na dose de 1,0 U/kg/se- LHÃES, M.L.C.; ANDRADE, H.H.S.M. Ginecologia
mana, tão logo a estatura caia abaixo da curva Infanto-Juvenil. Rio de Janeiro: Medsi, 1998, p.
normal de crescimento e mostrou que sua as- 225-31.
sociação com oxandrolona, na dose de 0,1 mg/ JOB, J.C. Anomalies pubertaires. In: MAUVAIS-
kg/dia, levou a ganho estatural superior ao da JARVIS, P.; SITRUK-WARE, R.; LABRIE, F. Médi-
associação GH e etinilestradiol. cine de la reproduction. Paris: Flammarion
Em adolescentes sob suspeita de um re- Médicine-Sciences, 1982, p. 227-59.
tardo simples da puberdade, medidas intem-
KALANTARIDOU, S.N.; DAVIS, S.R.; NELSON,
pestivas devem ser evitadas. Podem ser utiliza-
L.M. Premature Ovarian Failure. In: ______. Endo-
das doses de estrogênios conjugados 0,3 mg/
crinology and Metabolism Clinics of North
dia, por três a seis meses, na esperança de que
America 1998.
o processo puberal prossiga espontaneamente
a partir deste momento. MARTINS, M.; VIANA, L.C.; GEBER, S. Puberdade
É importante lembrar a necessidade da Tardia. In: VIANA, L.C.; GEBER, S.; MARTINS, M.
ingestão adequada de cálcio, por volta de 1200 Ginecologia. Rio de Janeiro: Medsi, 1998, p.
a 1500 mg/dia uma vez que do total do cálcio 481-87.
corporal, 97% estão contidos no esqueleto e MASHALL, W.A.; TANNER , J.M. Variations in pat-
essa proporção aumenta durante o estirão pu- tern of pubertal changes in girls. Arch Dis Child,
beral. Se a dieta for inadequada, pode ser ne- 1969, p.44-291.
cessária sua reposição por um período de de-
zoito meses a três anos, salientando-se que este MOLINA, R; WENSIOE, K.R. Revisión de terapia
procedimento não substitui a reposição hormo- hormonal de reemplazo em la adolescente. Rev.
nal. Para se obter uma densidade óssea apro- Soc Chil Obst Ginec Inf Adoles. v.12, n.2, p.71-
priada, exercícios físicos regulares são também 7, 2005.
recomendados. Vale salientar que adolescentes
POLI, M.E.H. Puberdade Tardia. In: GIORDANO,
de maior estatura necessitam de 20% a mais de
G.M. Endocrinologia Ginecológica. Rio de Ja-
aporte de cálcio do que as mais baixas para per-
neiro: Rubio. 2009. Cap.10, p.107-115.
feita mineralização do seu esqueleto.
REINDOLAR, R.H. THO, S.P.T. McDONOUGH, P.G.
Delayed puberty: an updated study of 326 pa-
D- Referências Bibliográficas tients. Trans Am Gynecol Obstet Soc, 1989,
p.8:146.
SPEROFF, F.M.A. Abnormal Puberty and Growth
Problems. In: ______. Clinical Gynecologic En- REIS, J.T.L Puberdade Tardia. In: MAGALHÃES,
docrinology and Infertility, Philadelphia: Lip- M.L.C.; REIS, J.T.L. Ginecologia Infanto Juvenil
pincott Williams & Wilkins, 2005, p.361-99. Diagnóstico e Tratamento. Rio de Janeiro: Me-
dBook, Rio de Janeiro, 2007. Cap. 18, p. 211-221.
MACHADO, L.V. Puberdade Precoce e Tardia. In:
______. Endocrinologia Ginecológica. Rio de ZACHARIN, M. Use of androgens and oestrogen
Janeiro: MedBook, 2006, p.273-84. in adolescents – A Review of Hormone Replace-
ment Treatment. J Pediatr Endocrinol Metab-
CARDOSO, A.A.; PIAZZA, M.J. Disgenesias Gona-
ol. v.13, n.1, p.3-11, 2000.
dais – Revisão de Literatura. Femina. v.28, n.4,
p.193-99, 2000.
férica de andrógenos e estrógenos, e redução lesões são geralmente dolorosas, e a sua evolu-
dos níveis de globulina ligadora de hormônios ção frequentemente resulta em cicatrizes.
sexuais (SHBG), resultando em um aumento de
Exames laboratoriais são realizados para
testosterona livre e estradiol. Por ser mais ati-
a verificação da elevação androgênica, dos ní-
va metabolicamente, causa aumento nas con-
veis de insulina e dos distúrbios ovulatórios,
centrações de ácidos graxos livres que levam a
como também objetivam a exclusão de outras
uma hiperglicemia. No consultório, a obesidade
causas do hiperandrogenismo e de irregulari-
muitas vezes é avaliada pelo IMC, entretanto, as
dades menstruais, como desordens tireoidia-
medidas da circunferência do quadril e da cin-
nas, prolactinoma e insuficiência ovariana.
tura são mais úteis para avaliar a presença de
gordura do tipo androide, uma relação cintura/ A glicemia de jejum deve ser solicitada
quadril maior que 0,85 faz o diagnóstico. para pesquisa de diabetes e resistência à insulina.
A dosagem de colesterol total, LDL, triglicérides e
A avaliação clínica deve incluir história
HDL servem para auxiliar no diagnóstico de sín-
menstrual e informações sobre o início e dura-
drome metabólica e controle da obesidade.
ção dos sintomas de hiperandrogenismo. Ou-
tras importantes informações na história do pa-
ciente incluem a história pessoal ou familiar de
hiperplasia congênita da adrenal de início tar-
dio, que pode explicar o hiperandrogenismo e
doenças metabólicas.
O exame físico deve incluir uma avaliação
da pressão arterial, do índice de massa corpo-
ral (IMC) e medida da circunferência abdomi-
nal e do quadril, para que uma possível síndro-
me metabólica seja diagnosticada. A síndrome
metabólica, presente em cerca de 50-70% das
mulheres com SOP, tendo como condições ine-
rentes a obesidade, a resistência insulínica e o
elevado risco de doenças cardiovasculares. Os
parâmetros utilizados para sua caracterização
se constituem em circunferência abdominal
maior ou igual a 80cm ou relação cintura/qua-
dril maior que 0,85, e mais 2 dos quatro seguin-
tes: triglicerídeos maior ou igual a 150 mg/dl,
HDL maior que 50 mg/dl, PA maior ou igual a
130/85 mmHg e glicemia de jejum maior que
100 mg/dl. A pele também deve ser examinada
na suspeita de resistência à insulina (podendo
se manifestar sobre a forma de acantose nigri- Figura 2- Hirsutismo.
cans) e para o hiperandrogenismo (hirsutismo,
acne, e padrão masculino de alopecia). O hir- A dosagem de testosterona total e de
sutismo (Figura 2) é definido como a presença SHBG são necessárias para o cálculo de tes-
de pelos sexuais no padrão masculino (região tosterona livre no sangue, que pode estar au-
terminal do cabelo, na face, superfície anterior mentada ou normal na SOP. A testosterona livre
do tórax, superfície anterior do abdome, super- calculada é o marcador mais útil e sensível de
fície posterior do dorso) sendo frequentemente hiperandrogenemia em mulheres, e pode ser
lento e progressivo, podendo os adolescentes usada para diagnóstico e seguimento conjunta-
não desenvolver sintomas significativos. Estima- mente com a avaliação clínica.
-se que aproximadamente um terço dos pacien- A ultrassonografia (Figura 3) é o exame
tes com SOP têm acne e que a maioria das mu- de imagem mais útil para o diagnóstico de SOP.
lheres com acne grave apresentam SOP. A acne A tomografia computadorizada e a ressonância
se desenvolve normalmente na face, e menos magnética são utilizadas para a exclusão de outras
frequentemente na região dorsal e peitoral. As patologias, como por exemplo, o tumor adrenal.
3. Fisiopatologia
Vários mecanismos envolvidos na fisio-
patologia da SOP são conhecidos, mas não se
sabe o quanto cada um deles contribui para a
gravidade dessa síndrome.
Na SOP, a produção de gonadotrofinas
pode estar alterada. O hipotálamo, através da
Figura 3- Ultrassonografia. liberação pulsátil de hormônio liberador de go-
nadotrofinas (GnRH), estimula o aumento da
produção de hormônio luteinizante (LH) e hor-
Uma ultrassonografia pélvica e transvagi- mônio folículo estimulante (FSH). Quanto mais
nal pode ser útil na definição da morfologia ova- rápida for a secreção de GnRH, maior será a pro-
riana para o critério de Rotterdam e é de especial dução de LH e quanto mais lenta for a liberação
importância quando associada a níveis elevados de GnRH, maior a síntese de FSH (Figura 4).
de testosterona livre ou com hirsutismo ou vi-
rilização rapidamente progressivos. A ultrasso- Nas mulheres, os andrógenos são sinteti-
nografia transvaginal deve ser solicitada para a zados pelos ovários, fígado, adrenais, músculo,
detecção de ovários policísticos e ser realizada pele e tecido adiposo. Nos ovários, a ação do
entre a fase pré-menstrual e o terceiro dia do LH nas células da teca, corpo lúteo e estroma,
ciclo. Os achados de SOP incluem: mais de 12 e a ação do FSH nas células granulosas, con-
cistos foliculares com diâmetro entre 2 e 9 mm trolam a produção de estrógenos, a partir dos
no córtex ovariano, aumento da densidade no andrógenos. Na SOP, a secreção de GnRH está
estroma e volume ovariano maior que 10 cm3. desregulada, de modo que há um aumento na
relação de LH/FSH que muda de 2/1 para 3/1.
Após a detecção das morbidades associa- O aumento do LH eleva a secreção de andró-
das com a SOP, intervenções no estilo de vida genos ovarianos (androstenodiona e testoste-
como a dieta e exercícios físicos, devem ser rea- rona) causando desregulação em todo o eixo
lizadas de acordo com a apresentação clínica de hipotálamo-hipófise-ovários. Além disso, o au-
cada paciente. Vários estudos mostram que a re- mento da testosterona causa sintomas de hipe-
dução do peso corporal por meio da dieta e de randrogenismo e o aumento de androstenodio-
exercícios melhoram a sensibilidade à insulina e na causa um aumento no nível de estrona que
às taxas de ovulação. Em outras populações, a contribui para o desenvolvimento de câncer de
perda de peso em 5 a 7% diminui a conversão endométrio. A diminuição da secreção de FSH
de tolerância à glicose a diabetes tipo 2 em 58% impede a completa maturação do folículo le-
ao longo de um período de 3 anos. Além disso, vando à anovulação crônica. Além disso, há re-
numerosos estudos demonstraram que a dimi- dução da síntese de estrógenos.
Outro mecanismo que contribui para o hi- aumentando os níveis de testosterona livre, que
perandrogenismo é o aumento da produção de causa hirsutismo, acne e alopecia, e o de estra-
andrógenos pelas adrenais, presente em 25% diol livre, que contribui como fator de risco para
das mulheres com SOP. Esse aumento ocorre câncer de endométrio. Finalmente, a insulina
devido a fatores genéticos ou em resposta à impede a ovulação, seja diretamente afetando o
elevada secreção de andrógenos ovarianos. desenvolvimento folicular, ou indiretamente au-
mentando os níveis intraovarianos de andróge-
A resistência à insulina é outro importan-
nos ou alterando a secreção de gonadotrofinas.
te elemento dessa síndrome. Mulheres obesas,
com SOP têm uma sobrecarga da resistência à
insulina relacionada com a sua adiposidade.
4. Tratamento
A resistência à insulina parece ser a res-
4.1. Contraceptivos orais
ponsável pela associação entre essa síndrome e
o diabetes tipo 2. Também, pode estar associada Os contraceptivos orais (CO) são utiliza-
com fatores de risco cardiovascular, como disli- dos para a prevenção de câncer de endomé-
pidemia e hipertensão. A resistência à insulina trio, reduzindo a incidência dessas doenças
associada com a hiperinsulinemia compensató- em 50% depois de dois anos de tratamento.
ria também são fatores importantes na fisiopa- Também são utilizados para regularização dos
tologia, estando relacionados com o excesso de ciclos menstruais e para tratar os sintomas de
andrógenos e anovulação. A insulina estimula a hiperandrogenismo por meio da diminuição
produção de andrógenos pelos ovários por meio da produção de andrógenos ovarianos e pelo
da ativação de receptores IGF-1 (fator de cresci- aumento da produção hepática do hormônio
mento insulina-símile-1), e as mulheres com SOP sexual vinculado à globulina, reduzindo a fra-
parecem ter uma hipersensibilidade a esse estí- ção plasmática de testosterona livre para ocu-
mulo, mesmo quando os tecidos muscular e adi- par o receptor de andrógenos.
poso manifestam resistência a insulina. Além dis- Pode ser realizada a combinação de ace-
so, a hiperinsulinemia inibe a produção hepática tato de ciproterona (2mg) mais etinil estradiol
de SHBG, enzima ligada a 80% da testosterona,
Da infância até o início da puberdade, a prin- As de origem adrenal podem ser adqui-
cipal fonte de andrógenos é de origem adrenal. ridas ou congênitas. As principais são:
O sulfato de deidroepiandrotestosterona Tumores adrenais: são raros. A maioria
(DHEA-S) é derivado, quase exclusivamente, da das pacientes tem concentrações séricas eleva-
glândula adrenal. A diidrotestosterona (DHT) é das de DHEA e SDHEA e excreção urinária eleva-
metabolizada da testosterona pela 5-alfa-reduta- da de 17-cetosteróides, que não são suprimidos
se; uma atividade aumentada da 5-alfa-redutase em resposta à administração de dexametazona.
leva ao aumento da DHT e na estimulação do Alem das manifestações do hiperandrogenis-
crescimento dos pelos. Aproximadamente 78% mo, podem ocorrer as manifestações relaciona-
da testosterona circulante está ligada à globulina das ao excesso de cortisol.
plasmática [sex hormone binding globulin (SHBG)].
Hiperplasia adrenal congênita (HAC): afe-
Quanto maior a fração livre de testosterona, maior
ta uma em cada 14.000 pessoas/ano. É a causa
a possibilidade de haver sinais clínicos hiperan-
mais comum de genitália ambígua na infância. A
drogênicos. Assim, fatores que fazem diminuir a
HAC engloba um grupo de distúrbios autossô-
SHBG (androgênios, insulina, obesidade, hipoti-
micos recessivos que envolvem um numero de
reoidismo etc.) aumentam a fração livre.
deficiências enzimáticas em uma ou várias eta-
A obesidade é um importante fator de pas da síntese do cortisol a partir do colesterol,
risco para o desenvolvimento de resistência in- resultando em excessiva produção de andróge-
sulínica. A hiperinsulinemia aumenta a produ- nos. O bloqueio na síntese do cortisol diminui o
ção de andrógenos ovarianos, agindo sinergica- retrocontrole negativo da secreção do ACTH que,
mente com o LH (hormônio luteinizante) sobre por sua vez, induz uma estimulação crônica do
as células da teca ovariana. A hiperinsulinemia córtex adrenal, levando à hiperplasia glandular.
também causa diminuição da síntese hepática Aproximadamente 90% das HAC são causadas
da SHBG, levando a aumento da fração livre e pela deficiência da 21-hidroxilase, a qual poderá
biologicamente ativa da testosterona. ocorrer na forma clássica (simples virilização ou
perda salina) ou forma não clássica.
Síndrome de Cushing: devido a um esta-
2. Etiologia
do de hipercortisolismo, as pacientes apresen-
A etiologia do hisutismo pode ser de origem: tam além das manifestações hiperandrogênicas
Ovarianas (nem sempre evidentes), as características re-
• Hipertecose lacionadas ao excesso de cortisol [face em lua
• Tumores ovarianos virilizantes cheia, gibosidade, obesidade central, atrofia
• SOP muscular, estrias violáceas, pele delgada, altera-
Suprarrenais ções metabólicas (intolerância à glicose/diabe-
• Hiperplasia suprarrenal congênita tes, osteoporose)] e hipertensão dentre outras.
• Deficiência de 21-hidroxilase
• Deficiência de 3B-hidroxiesteróide dehi-
As de origem ovariana são:
drogenase
• Deficiência de 11-hidroxilase 1. Síndrome dos Ovários Policísticos (SOP): é
• Síndrome de Cushing um dos distúrbios hormonais mais comuns
• Tumores secretores de ACTH ectópicos na mulher, com prevalência estimada em 5 a
• Tumores suprarrenais virilizantes 10%. O diagnóstico de SOP de acordo com
Iatrogênicas os critérios do Consenso Rotterdam (2003),
• Androgênios baseia-se na presença de 2 ou mais das 3
• Ciclosporina seguintes características: oligo-amenorreia,
• Danazol evidência clínica e/ou bioquímica de hipe-
• Diazóxido randrogenismo e ovários policísticos. Esse
• Minoxidil último se caracteriza pela presença ao ultras-
• Fenitoína som de pelo menos 12 folículos na superfí-
Idiopática cie de cada ovário medindo de 2 a 9 mm de
• Aumento da sensibilidade da unidade pilos- diâmetro, ou aumento do volume ovariano
sebácea aos androgênios acima de 10 ml. Este ultrassom deve ser feito
entre o 3º. e 5º. dia do ciclo menstrual. Não
sendo a mulher virgem deve-se dar prefe- geralmente são lembrados e valorizados
rência para à técnica de ultrassom transva- pelas modificações bizarras que induzem
ginal. É importante definir que estes resulta- no organismo feminino: defeminização se-
dos não se aplicam a mulheres que estejam guida de virilização. São, entretanto, de
tomando anticoncepcionais orais. Se houver ocorrência extremamente rara (luteomas,
um folículo dominante ou um corpo lúteo arrenoblastomas, tumor de células hílares)
é importante repetir o ultrassom em outro
ciclo menstrual para realizar o diagnóstico.
3. Conduta Terapêutica
É importante notar que mulheres apresen-
tando apenas sinais de ovários policísticos A anamnese e o exame físico devem ser os
ao ultrassom sem desordens de ovulação ou mais completos possíveis. É importante ser ques-
hiperandrogenismo não devem ser conside- tionado sobre o aparecimento dos pelos (cresci-
radas como portadoras da síndrome de ová- mento rápido está mais relacionado a tumores,
rios policísticos. Cerca de 20% das mulhe- enquanto que surgimento lento, desde a menar-
res acometidas têm aumento de prolactina, ca, sugere SOP), padrão menstrual e os sintomas
podendo ocasionar galactorreia. A SOP está relacionados a tireoideopatias. Durante o exame
fortemente associada a distúrbios metabóli- físico, verificar alteração na pressão arterial, obe-
cos, sobretudo à síndrome metabólica (SM) sidade, gibosidade, aspecto e distribuição dos
e resistência insulínica (RI). Ambas as condi- pelos, presença de tireomegalia, secreção nas
ções estão implicadas em alterações no me- mamas, estrias abdominais, acantose, massas
tabolismo de carboidratos e lipídeos provo- anexiais ou abdominais e sinais de virilização.
cando uma constelação de fatores de riscos
para o desenvolvimento de doença cardio-
vascular. A presença de acanthosis nigricans 4. Diagnóstico Laboratorial
é um forte indicador de resistência insulínica. 4.1. Testosterona
3. Tumores ovarianos virilizantes: as neopla- 17-OHP na fase folicular devem ser me-
sias ovarianas produtoras de androgênios nores que 200ng/dl. Quando os níveis estão en-
são capazes de sintetizar testosterona e/ou tre 200ng/dl e 800ng/dl é indicado o teste de
androstenediona. Há suspeita de um tumor ACTH para distinguir a SOP da HSRA. Em níveis
virilizante quando ao se proceder a avalia- maiores que 800ng/dl está indicado o teste do
ção basal dos principais androgênios circu- ACTH, com diagnóstico quase certo de HSRA
lantes, ou seja, testosterona total e sulfato causada por deficiência de 21-hidroxilase
de deidroepiandrosterona (S-DHEA), estes
se encontram elevados. Nesse caso, reco-
menda-se realizar exames para a localiza- 4.3. Sulfato de Desidroepiandrosterona
ção anatômica do tumor: suprarrenal ou de (S-DHEA), Desidroepiandrosterona
ovário. Este último costuma ter dimensões (DHEA) e Androstenediona
pequenas e, muitas vezes, são localizáveis S-DHEA é o teste de triagem para detectar
apenas na cirurgia. Os tumores virilizantes a patologia adrenal. Tem maior especificidade que
tratamento será suprimir a causa. Raramente, ou de papel higiênico, cereais e grãos de areia.
observa-se a persistência de cistos ovarianos Após a retirada do corpo estranho pode-se re-
foliculares (funcionantes) que produzem quan- alizar colpovirgoscopia e, se necessário, trata-
tidades expressivas de estrógenos, podendo le- mento com creme tópico. (Ver capítulo de vul-
var à puberdade precoce; na maioria das vezes, vovaginites).
eles regridem espontaneamente, mas, se o ul-
trassom mostrar que permanecem inalterados
ou aumentados de volume, é necessária a res- 3.4.3. Prolapso uretral
secção cirúrgica. É a inversão da mucosa uretral através
do meato externo; torna-se edemaciada e ar-
roxeada, sangrando com facilidade. Como fa-
3.3. Iatrogênica
tores predisponentes, encontram-se o hipoes-
O uso inadequado de cremes à base de trogenismo e a pouca aderência desta mucosa
estrógeno na região vulvar pode levar a mani- ao tecido subjacente, agravados pela retenção
festações sistêmicas, até uma descamação en- urinária e episódios de aumento da pressão ab-
dometrial. dominal. Ocorre mais comumente em crianças
negras, com idade entre 4 e 5 anos. O diagnós-
tico diferencial com sarcoma botrioide é obri-
3.4. Causas orgânicas gatório, devendo-se identificar abaixo da lesão,
3.4.1. Infecções e infestações a membrana himenal e o orifício uretral. O tra-
tamento deverá ser realizado com creme à base
A vulvovaginite é o diagnóstico mais de estrógeno, por tempo limitado devido a seus
frequente na consulta de ginecologia infanto- efeitos colaterais, ou creme vaginal, na tentativa
-juvenil e quando a inflamação é intensa, pode de diminuir o processo inflamatório. Se a pa-
causar corrimento sanguinolento. Na infância, as ciente for sintomática com retenção urinária, ou
infecções genitais ocorrem geralmente devido se a massa for grande e necrótica, a ressecção
à higiene inadequada, podendo também estar do tecido prolapsado está indicada.
associadas a micro-organismos como estrep-
tococos beta hemolítico do grupo A, Shigella
e estafilococos. O parasita intestinal Enterobius 3.4.3. Traumatismos genitais e abuso sexual
vermicularis, além de prurido e hiperemia vulvar
São excepcionais no 1º ano de vida, mas
e anal, pode promover sangramento por esco-
com 4-8 anos, com a intensidade da atividade
riação. O tratamento dependerá do agente etio-
física, há uma maior frequência de traumatis-
lógico responsável pelo processo inflamatório.
mos genitais, principalmente os ocasionados
(Ver capítulo de vulvovaginites)
por queda a cavaleiro. Ao exame ginecológico,
podem encontrar-se equimoses, edemas, he-
3.4.2. Corpo estranho
matomas, como também lacerações himenais
Aos 3-4 anos de idade, as crianças des- e/ou perineais que devem ser bem investigadas,
cobrem os genitais manipulando-os com fre- pois pode haver lesão vaginal e/ou de fundo-
quência sem os devidos cuidados de higiene. A -de-saco, com perfuração de estruturas intra-
hipótese de corpo estranho nunca deve ser es- -abdominais. A hipótese de abuso sexual deve
quecida durante a consulta de perda sanguínea ser afastada em todo caso de traumatismo ge-
por via vaginal, mesmo porque, corresponde nital, independente da idade. O tratamento dos
a 4% dos problemas ginecológicos nessa faixa traumatismos vai depender da extensão e do
etária. A introdução de corpo estranho geral- grau de gravidade das lesões.
mente é acidental; ocorre sangramento escas-
so, não cíclico e muitas vezes, acompanhado de
secreção hemopurulenta e odor. Vários corpos 3.4.4. Discrasias sanguíneas
estranhos são introduzidos na vagina e, em pa-
Quando o sangramento genital se acom-
cientes colaborativas, podem ser retirados com
panha de gengivorragia, epistaxe, equimoses
cotonetes ou pinças apropriadas, e irrigação
faciais, dentre outras, deve-se afastar a hipóte-
vaginal com soro fisiológico, por meio de uma
se de uma discrasia sanguínea, como a púrpura
seringa ou sonda vesical. Os objetos mais en-
trombocitopênica, doença de Von Willebrand.
contrados são pequenos pedaços de brinquedo
É importante sempre lembrar que a perda san- MEDEIROS, F.C. Hemorragia Uterina Anormal
guínea por via vaginal pode ser o 1º. sinal de na Infância e na Adolescência. In: MAGALHÃES,
um transtorno hematológico. M.L.C.; ANDRADE, H.H.S.M. Ginecologia Infanto
Juvenil. Rio de Janeiro: Medsi, 1998, p.301-312.
meio do ciclo, associados à dor ou não, podem Pacientes com insuficiência renal geral-
ocorrer pela queda transitória do nível crítico de mente apresentam alterações menstruais (hiper-
estrogênio no momento da ovulação. Encurta- menorragia) e infertilidade. Nesses casos, acredi-
mento da fase folicular e/ou diminuição da fase ta-se que além do número reduzido de plaquetas
lútea podem ainda resultar em polimenorreia. e alterações na sua função, ocorra também a
Os defeitos da fase lútea podem ser expressos alteração da secreção das gonadotrofinas hipo-
pelo pequeno sangramento pré-menstrual e talâmicas, com redução nos níveis de estradiol
menorragia por produção inadequada de pro- no meio do ciclo, diminuição da relação FSH/LH
gesterona. Uma fase pós-ovulatória curta pode e aumento na concentração de prolactina.
ser uma consequência da formação deficiente
Na cirrose hepática, a deficiência na con-
do corpo lúteo devido a níveis insuficientes de
jugação e a metabolização dos esteroides resul-
FSH no meio do ciclo. O episódio esporádico
ta em aumento dos níveis de estrogênio livre.
do alongamento da fase lútea, por persistên-
O incremento dos níveis de estrogênio atuando
cia do corpo lúteo, com manutenção dos níveis
de modo contínuo e prolongado leva a uma hi-
plasmáticos de progesterona e descamação ou
perestimulação endometrial. Nos casos graves
amadurecimento irregular do endométrio, pode
de cirrose hepática, pode ocorrer hipoprotrom-
resultar em hipermenorreia ou oligomenorreia.
binemia, resultando em deficiência nos meca-
nismos de coagulação e consequente predispo-
sição ao aumento do sangramento menstrual.
Sangramento uterino anormal orgânico
Entre as causas orgânicas de sangramento Os transtornos tireoidianos, tanto hipoti-
anormal ou irregular na adolescência, devem ser reoidismo como hipertireoidismo, mesmo ten-
lembradas a gravidez e suas complicações, as le- do sinais e sintomas leves ou pouco evidentes,
sões localizadas nos órgãos genitais, as doenças também podem induzir o sangramento uterino
sistêmicas, as causas iatrogênicas e as essenciais. anormal na adolescência. O hipotireoidismo é
Para Speroff, a causa mais comum de alteração responsável por aproximadamente 10 a 15% dos
de um padrão menstrual regular e definido, seria casos de alterações menstruais (mais observa-
uma complicação de gravidez, principalmente, das são polimenorreia, proiomenorreia e hiper-
gravidez ectópica e abortamento incompleto, menorreia). Já no hipertireoidismo, as alterações
causas que, prioritariamente, devem ser excluídas menstruais são aquelas relacionadas com o au-
em adolescentes. Alterações locais como trau- mento do intervalo ou a amenorréia. No entanto,
matismo genital, corpo estranho, endometriose, vale ressaltar que há registros de hipotireoidismo
malformações congênitas, doença inflamatória causando alongamento do intervalo menstrual e
pélvica e tumores como: sarcoma botrioide da amenorreia, principalmente os casos de hipoti-
vagina ou da cérvice e o coriocarcinoma do ová- reoidismo crônico ou acentuado que geralmente
rio também devem ser descartadas. se associam a hiperprolactinemia.
Aproximadamente 10% das adolescen- Diabetes mellitus tipo I pode estar asso-
tes com discrasias sanguíneas apresentam ciado à menarca tardia e às alterações menstru-
alteração menstrual do tipo metrorragia ou ais. A prevalência de irregularidades menstruais
menorragia, 20% delas necessitam de interna- nessas adolescentes varia de 11 a 20%, sendo
ção hospitalar e cerca de 30% de transfusão a forma clínica mais comum a amenorreia. Es-
sanguínea. A suspeita de coagulopatia advém tas alterações menstruais podem ser causadas
da história clínica de sangramento anormal en- por vários fatores, sendo o ganho de peso ex-
volvendo outros locais além do útero. A me- cessivo e o controle glicêmico inadequado os
narca pode ser a primeira oportunidade para mais comuns; outra hipótese relaciona-se com
testar-se o mecanismo de coagulação e assim, a inibição da liberação de GnRH hipotalâmica
alterações como doença de Von Willebrand, exercida pela dopamina e os opioides endóge-
deficiência de protrombina, púrpura trombo- nos. A Síndrome de Cushing deve ser incluída
citopênica idiopática, disfunções plaquetárias no diagnóstico diferencial de anovulação entre
só serão diagnosticadas neste momento. A adolescentes assim como a hiperplasia congê-
hemofilia, a leucemia e os diversos tipos de nita da suprarrenal (HCSR) na forma não clás-
anemia também são citadas. As anormalidades sica. As enfermidades sistêmicas como tuber-
hematológicas podem ser tanto a causa como culose (comprometimento endometrial), certas
a consequência de alterações menstruais. cardiopatias congênitas ou adquiridas, a doen-
ça celíaca e a fibrose cística do pâncreas podem cidade da alteração, a história clínica e o exame
levar a alterações menstruais. físico são valiosos.
Os sistemas neuroendócrinos que facili- Nas adolescentes com idade ginecológica
tam a função cíclica hipófise-ovariana são sen- menor que um ano, afastadas as complicações
síveis a agentes farmacológicos que competem da gravidez, as lesões dos órgãos genitais e as
ou antagonizam os agentes neuro-humorais doenças sistêmicas, na ausência de obesidade,
envolvidos no processo de ovulação. Agentes uso de medicamentos, atividade física, perda
como a morfina, reserpina, fenotiazinas, inibido- de peso rápida, anemia, dietas, estresse, galac-
res de monoaminooxidase e os anticolinérgicos torreia, acne e hirsutismo, a conduta expectante
podem causar anovulação. O uso de anticoagu- com o controle do padrão menstrual é adotada.
lantes e hormônios deve ser investigado. Os an-
Ausência de regularidade menstrual após
ticoncepcionais hormonais (AHOC), geralmente
um ano de idade ginecológica pode indicar
aqueles contendo somente progestágenos ou
cronicidade no quadro de anovulação, sendo
os combinados de baixa dosagem, podem le-
necessária uma investigação mais detalhada.
var a sangramentos intermenstruais escassos na
Na presença de obesidade, acne, hirsutismo e
forma de spotting. As drogas mais comumente
alterações menstruais, independentes da ida-
registradas como interativas são os anticonvul-
de ginecológica, a possibilidade de anovulação
sivantes, a rifampicina e outros antibióticos.
crônica deve ser admitida desde o início. Do
Sangramento uterino essencial anormal mesmo modo, as adolescentes com amenor-
pode, ainda, ser resultado de fatores uterinos reia pós-menarca maior do que um ano devem
locais, endometriais e miometriais. ser investigadas.
A ocorrência de sangramento menstru- Na presença de desvio menstrual para
al excessivo na ausência de patologia óbvia, mais, as lesões dos órgãos genitais, o uso de
e, portanto sugerindo etiologia idiopática ou anticoagulantes, a doença hepática, o hipoti-
essencial, pode ser resultado de anormalida- reoidismo e os problemas hematológicos são
des nos mecanismos locais que autolimitam o as possíveis causas do sangramento uterino
sangramento menstrual. As alterações nestes anormal. Nas adolescentes com história de san-
mecanismos estariam relacionadas com a ação gramento profuso de origem não genital, os
não balanceada das prostaglandinas, atividade problemas hematológicos devem ser sempre
fibrinolítica exacerbada e densidade arteriolar investigados, preferencialmente antes da me-
anormal. O aumento e persistência da ativida- narca. Deve-se proceder do mesmo modo com
de fibrinolítica associada ou não a alterações na pacientes que apresentarem episódios agudos
produção de prostaglandinas vasoconstritoras de menorragia, principalmente se o fato ocorrer
e agregantes plaquetárias PGF2α e vasodilata- já por ocasião da menarca.
doras e antiagregantes plaquetárias PGE2 ou
A avaliação laboratorial inicial deve in-
prostaciclina PGI2, resultando em dificuldade
cluir um estudo completo da série vermelha e
na oclusão vascular e/ou relaxamento miome-
coagulograma, além da exclusão da gravidez,
trial prolongado, pode explicar um aumento da
quando necessária. Para adolescentes com ane-
perda sanguínea menstrual.
mia, a dosagem de hemoglobina é um bom pa-
râmetro de referência para acompanhamento
da paciente. Na presença de sinais e sintomas
2. Diagnóstico
sugestivos de tireoidiopatia, a função tireoidea
O primeiro passo na abordagem da adoles- deve ser avaliada.
cente com sangramento uterino anormal é a rea-
Na prática clínica a causa mais comum
lização cuidadosa da anamnese e do exame físico.
de sangramento intermenstrual ou spotting
Nas pacientes cujo exame ginecológico é o uso irregular dos anticoncepcionais hor-
for inconclusivo ou dificultado pela integridade monais ou a associação destes com outros
himenal, os órgãos genitais internos devem ser medicamentos. Como método complemen-
avaliados pela ultrassonografia pélvica. tar ainda pode ser necessário, em situações
Embora os critérios para o diagnóstico específicas: biópsia endometrial, curetagem
diferencial sejam extensos, alguns parâmetros uterina, vídeo-histeroscopia.
como a idade ginecológica da paciente, a croni-
lizada com sulfato ferroso, 250 a 500 mg/dia e CROSSIGNI, P.G.; RUBIN, B. Rubin B. Dysfunc-
ac. fólico, 2 a 5 mg/dia. Anti-inflamatórios não tional uterine bleeding. Hum Reprod. v.5, n.5,
esteroides (ácidos mefenâmico e naproxeno) p.637-8, 1990.
contribuem para diminuir tanto o volume de
sangramento, em cerca de 20 a 40%, quanto sua ELEUTÉRIO JÚNIOR, J.; FURTADO, F. M. Vulvova-
duração. Não há indicação para os derivados do ginites. In: MAGALHÃES, M. L. C.; REIS, J. T. Gine-
ergot e o ácido tranexâmico pode levar a efeitos cologia Infanto-Juvenil: Diagnóstico e Trata-
adversos gastrointestinais. Para Machado, não há mento. Rio de Janeiro: Medbook, 2007. Cap25.
lugar para a curetagem uterina no sangramento p. 291-299.
uterino disfuncional na adolescência. Em algu- FREITAS, F.; MENKE, A.H.; RIVOIRE, W.; PASSOS,
mas situações, como por exemplo, quando há E.P. Rotinas em Ginecologia. In: ACCETTA, S.G.;
diagnóstico de coagulopatias, pode ser necessá- ABECHE, A.M.; HERTER, L.D. Ginecologia infan-
ria amenorreia terapêutica que é obtida com o to-Puberal, 3. ed. Porto Alegre: Artes Médicas,
uso de acetato de noretisterona, 10 a 20 mg/dia, 1997. Cap. 4. p. 47-58.
via oral, sem interrupção; acetato de medroxipro-
gesterona, 150 mg, em aplicações trimestrais, via GALUCCI, J. Valor propedêutico dos distúrbios
intramuscular; desogestrel, 75 mcg/dia ou ainda menstruais. In: MEDINA, J. Fisiologia Menstrual.
implante subdérmico de etonogestrel. São Paulo: Manole, 1997. p.177-83.
Concluindo, sugere-se que em adoles- HALBE, H.W.; SAKAMOTO, L.C.; FONSECA, A.M.;
centes com sangramento uterino anormal, a fi- HEGG, R.; FREITAS, G.C. Irregularidades mens-
siologia da puberdade deva ser sempre respei- truais na adolescência: diagnóstico, tratamento
tada, a paciente orientada em relação aos seus e prognóstico. Sinop Ginecol Obstet. v.3, p.60-
ciclos pós-menarca e os diagnósticos diferenciais 4, 1995.
afastados. Ciclos ovulatórios não devem ser tra-
tados e atenção especial deve ser dada a pacien- LIMA, G.R.; BARACT, E.C. Disfunção menstrual.
tes com quadro de oligomenorreia persistente, In: ______. Ginecologia Endócrina. São Paulo;
anemia com hemoglobina inferior a 10 g/dl, ou Atheneu; 1995. p.105-13.
sinais clínicos de excesso de androgênios. MACHADO, L.V. Atividade Física e Reprodução.
In: ______. Endocrinologia Ginecológica. Rio de
Janeiro: MedBook, 2006, p.175-82.
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North Am. v.28, n.2, p.369-79, 1981.
Por meio da análise retrospectiva de mu- 2.1.1. Quadro clínico e tipo de manifestação
lheres inglesas, com idade entre 30 e 49 anos, do sangramento uterino disfuncional
os pesquisadores do Royal College of General
Agudo ou crônico, anovulatório ou ovu-
Practitioners constataram que 5% apresenta-
latório e quanto às variações observadas nos
ram-se à consulta com queixa de excessivas
ciclos. A forma aguda é importante quando a
perdas menstruais.
intensidade do sangramento for excessiva, im-
As repercussões orgânicas e psicológicas pondo uma conduta ativa e imediata. É crônico
da menorragia constituem-se em importantes quando se repetir mais de 3 vezes no período
temas em relação à saúde da mulher. Os san- de 1 ano e esporádico quando ocorrer apenas
gramentos menstruais excessivos são a cau- 1 ou 2 vezes.
sa mais comum de anemia por deficiência de
ferro em mulheres férteis e sadias. Além disso,
a ansiedade decorrente usualmente ocasiona 3. Sangramento disfuncional ovulatório
considerável impacto negativo em relação à Segundo Munro, nem sempre é possível
qualidade de vida. estabelecer o fator responsável pelo apareci-
Baracat e colaboradores afirmam que mento de menorragia em mulheres que apre-
para entender a fisiopatologia e a terapêutica sentam ciclos ovulatórios. Machado refere que
do sangramento disfuncional do endométrio, é 15% das pacientes com sangramento uterino
preciso conhecer o conceito de nível “hemorra- disfuncional apresentam ciclos ovulatórios. São
gíparo”. Teoricamente, toda paciente tem uma descritos os seguintes tipos de sangramento:
concentração plasmática mínima de estrogênio Sangramento na ovulação
que, quando atingida, provoca o sangramen- Polimenorreia
to por descamação do endométrio. Quando Descamação irregular
essa concentração é crescente (acima do nível Sangramento pré-menstrual
hemorragíparo), como ocorre na primeira fase Hipermenorreia ou menorragia
do ciclo menstrual, o sangramento não ocorre Persistência do corpo lúteo (Sindrome de Halban)
e o nível hemorragíparo é ultrapassado rapida-
mente, já que, nesse momento, o endométrio
encontra-se recém-descamado e, portanto, em 3.1. Sangramento na ovulação
fase inicial de proliferação. Todavia, após a con- Caracterizado por pequenas perdas san-
centração sérica de estrogênios permanecer guíneas na metade do ciclo menstrual, coinci-
acima desse nível por algum tempo, o endomé- dindo com a época da ovulação; ocorre com
trio estará proliferado. Quando o hormônio cair mais frequência no fim da vida reprodutiva e
lentamente e equiparar-se a esse nível, ocorrerá pode durar de um a três dias. O fator responsá-
o sangramento endometrial por privação, como vel por esta variedade de sangramento disfun-
ocorre durante a menstruação. Para que o san- cional é a queda mais acentuada que a habitu-
gramento por privação transcorra de maneira al, da secreção do estradiol pelo folículo, por
regular, com descamação uniforme do endomé- ocasião da postura ovular. Devido à transitória
trio, deve existir estímulo progestacional ade- queda do estradiol, surgem pequenos focos
quado associado ao estrogênio. A progesterona de necrose no endométrio, que ocasionam o
é o hormônio responsável pelas características sangramento. A conduta frente a sangramen-
normais e constantes do fluxo menstrual. to de pequena intensidade pode ser apenas
Portanto, haverá sangramento sempre expectante, uma vez que os mesmos não ofe-
que existir desequilíbrio entre esses dois hor- recem riscos para a saúde e muitas vezes de-
mônios, principalmente no que tange a sua in- saparecem espontaneamente. Devem receber
terrupção (ou queda), tanto em altos quanto em tratamento hormonal, as mulheres que tenham
baixos níveis. sua qualidade de vida prejudicada e/ou as que
pretendem engravidar, uma vez que o sangra-
É importante lembrar que o sangramento mento coincidente com a ovulação pode ser
uterino anormal pode ocorrer de atrofia endo- prejudicial para a concepção. Prescreve-se es-
metrial. É causado pela descamação irregular do trógeno conjugado 0,625mg/dia do 12o ao 16o
endométrio, na presença de níveis muito baixos dia do ciclo.
de estrogênios.
que haja um endométrio capaz de responder imperfuração himenal, septos vaginais trans-
aos estímulos dos hormônios ovarianos, versos e alguns casos de agenesia cervical, não
que haja produção adequada de estrogênios constituem uma amenorreia verdadeira, pois o
para proliferar o endométrio, endométrio se encontra presente e funcional-
que os ovários sejam estimulados pelo FSH e mente responsivo. O que ocorre é a retenção
LH hipofisários, a montante do fluxo menstrual, caracterizando
que a hipófise seja estimulada pelo GnRH hi- uma criptomenorreia. A história clínica é típica e
potalâmico que, por sua vez, sofre influência pontuada por crises progressivas de dor pélvica,
de emoções e do sistema nervoso central. consequentes a acúmulo e distensão cavitária
do sangue menstrual retido.
Segundo Reis, uma situação às vezes fi- A forma clássica da amenorreia primária
siológica, clinicamente comum, e que pode uterina é representada pela falha total dos fe-
ser confundida com a amenorreia primária, é o nômenos de fusão, canalização e reabsorção
atraso da menarca. A maioria das adolescentes dos cordões de Muller, conhecida como ute-
tem a sua primeira menstruação entre os 11 e rus bicornis rudimentarius solidus. Estes casos
14 anos, e Machado e Goldstein consideram o são também chamados de Síndrome de Mayer-
seu atraso possível até os 16 anos. Uma história -Rokitansky-Kuster-Hauser. Ainda não se conhe-
familiar semelhante pode sugerir origem cons- ce o mecanismo exato da agenesia dos ductos
titucional, porém a adolescente que não mens- de Muller, mas parece haver mutação do gene
truou até os quinze anos deve ser devidamen- do fator antimulleriano ou do receptor. Parece
te observada e examinada, considerando-se o haver anormalidades no metabolismo da galac-
tempo de evolução desde o aparecimento dos tose, com mutação no gene da enzima galac-
caracteres sexuais secundários. Se uma adoles- tose-1-fosfato-uridil-transferase. Como a pa-
cente de 15 anos teve o início de desenvolvi- tologia se restringe exclusivamente aos canais
mento puberal aos 14 anos, ela provavelmente de Muller, os ovários encontram-se presentes e
poderá esperar a menarca até 16 ou 17 anos. funcionando normalmente, promovendo o de-
Por outro lado, aquela que aos 16 anos ainda senvolvimento dos caracteres sexuais secundá-
não menstruou, mas iniciou seu desenvolvi- rios femininos, inclusive ovulando. Essa síndro-
mento por volta dos 12 anos, merece uma ava- me está muitas vezes associada com anomalias
liação completa. Alterações extremas de peso, do trato urinário. Pode ocorrer rim ausente em
stress e depressão parecem interferir na ativi- 15% dos casos, duplicidade ureteral em 40%
dade hipotalâmica atrasando o início dos ciclos das vezes e 10% de alterações ósseas.
hormonais.
Giordano afirma que o diagnóstico na
Pacientes com amenorreia primária podem maioria dos casos é realizado através do exa-
ser divididas em três grandes grupos básicos. me físico, ultrassonográfico e, se houver dúvida,
cariótipo (46XX). Urografia excretora e US renal
podem identificar alterações ureterais ou renais.
2. Primeiro Grupo Etiológico
O tratamento consiste em ampliar a ca-
As pacientes desenvolvem caracteres se- vidade vaginal, quando for necessário; está in-
xuais secundários normais, mas não chegam à dicada principalmente nos casos de queixa de
menarca. Principais causas: dispareunia. Como há gônadas funcionantes,
não há indicação de terapia hormonal.
mento é feito com reposição hormonal, à seme- aumento dos níveis de androgênios. São mais
lhança da Síndrome de Turner. comuns bloqueios na síntese dos esteroides da
adrenal por alteração das enzimas 21 e 11-hi-
droxilase (nove em dez casos pela primeira en-
3.2. Falência ovariana primária zima). Quando se manifesta durante a vida fetal,
Caracterizada por ausência ou deficiên- é responsável pela masculinização da genitália
cia no desenvolvimento dos caracteres sexuais externa feminina, desde este momento. Depois
secundários, amenorreia, infertilidade, deficiên- do nascimento, a excessiva produção de andro-
cia nos níveis séricos de hormônios esteroides gênios pela suprarrenal interfere no desenvolvi-
sexuais e elevação de gonadotrofinas; pode ser mento somático, podendo levar à virilização e à
idiopática, associada a processo auto-imune amenorreia primária das pacientes não adequa-
(observado com a Doença de Addison, hipoti- damente diagnosticadas e tratadas. Essa pato-
reoidismo, hipoparatireoidismo e/ou candidíase logia poderá não se manifestar durante toda a
muco-cutânea), com anormalidades nos recep- infância, revelando-se somente na adolescência.
tores de gonadotrofinas e nas gonadotrofinas, O tratamento será realizado com administração
com deficiência de enzimas que participam da de corticoides para diminuição dos níveis de
síntese do estrogênio, ou ainda resultante da ACTH e controle do hiperandrogenismo adre-
ação de quimioterapia e radioterapia sobre o nal. Há preferência pela dexametasona na dose
ovário. O tratamento padrão é a terapia hormo- 0,25 a 0,5mg, à noite, pois há melhor supressão
nal combinada para controle do hipoestroge- do eixo neuroendócrino quando comparado à
nismo (vasomotores, atrofia urogenital, inconti- hidrocortisona. O tratamento cirúrgico pode ser
nência urinária, osteoporose precoce). indicado nos casos mais graves.
São pacientes com cariótipo 46 XY que Como regra, está associada a evidências
possuem testículos funcionantes, mas os andro- clínicas da deficiência na elaboração de uma sé-
gênios produzidos por estas gônadas têm uma rie de hormônios. Geralmente, não se identifi-
ação incompleta nos órgãos-alvo. Os portado- cam fatores etiológicos, mas podem ser citados
res dessa patologia apresentam algum grau de como causas a destruição de partes da glândula
desenvolvimento dos caracteres sexuais mascu- por tumores na hipófise, no hipotálamo ou em
linos, desenvolvimento mamário menor do que áreas adjacentes, aneurismas intracranianos, to-
o esperado, pilosidade pubiana e vulva normais xoplasmose e infecções intracranianas.
e clitóris aumentado. O tecido testicular tam- A adolescente apresenta sinais e sintomas
bém pode ser encontrado no abdômen, na re- da diminuição da secreção dos hormônios hi-
gião inguinal ou nos grandes lábios, devendo pofisários, como baixa estatura, pouco desen-
ser retirado cirurgicamente na adolescência. volvimento mamário, desenvolvimento de pilo-
As principais formas incompletas de in- sidade axilar e pubiana deficiente ou ausente,
sensibilidade periférica aos andrógenos (insen- ausência de ação estrogênica vaginal e geni-
sibilidade parcial): S. de Lubs, Gilbert-Dreyfus, tálias interna e externa normais, mas imaturas.
Reifenstein e Wilson. Quando existe uma insuficiência significativa de
outros hormônios hipofisários, diferentes acha-
dos endocrinológicos vão muitas vezes se so-
4. Terceiro grupo etiológico brepor à amenorreia primária e à ausência do
desenvolvimento sexual.
Pacientes em que a amenorreia primária é
reflexo de uma alteração extragenital (endócrina,
hipotalâmica ou hipofisária). Principais causas: 4.3. Disfunção hipotalâmica e hipofisária
Tumores ao redor do quiasma óptico
4.1. Hiperplasia congênita de suprarrenal – ou do próprio hipotálamo, tumores encefáli-
HCSR cos ou anomalias congênitas, levando ao mau
funcionamento hipotalâmico e interferindo na
É causada por um defeito congênito na secreção normal de gonadotrofinas, podem ter
biossíntese de alguns esteroides adrenais, com
Fonte: MASTER-HUNTER, T., HEIMAN, D.L. Amenorrehea: Evaluation and Treatment. American Family Phisician, Unit-
ed States, v.73, n.8, p.1374-1382, abril, 2006.
D- Referências Bibliográficas
AMENORRHEA. In: SPEROFF, L.; FRITZ, M. Clini-
cal Gynecologic Endocrinology end Infer-
tility. Philadelphia, PA:Lippincott Williams &
Wilkins, 2005, p.401-63.
outras doenças sistêmicas (8%), anormalidades sugere uma necrose hipofisária – Síndrome de
anatômicas (7%) e menos frequentemente os Sheehan – e pode ser causa de amenorreia. De-
defeitos de receptores e enzimas (1%). tectar essa patologia é importante, devido a sua
alta associação com a insuficiência adrenal se-
Quando a regularidade do ciclo menstrual
cundária, que pode ser uma condição delicada.
é perdida, significa que tanto a função repro-
dutiva quanto a função endócrina dos ovários Fadiga, anorexia, perda de peso, febre,
podem estar comprometidas. A falta da mens- tosse e dispneia podem sugerir sarcoidose. Fra-
truação também está relacionada com a redu- queza, perda de peso e mudanças na coloração
ção da densidade óssea e o aumento do risco da pele podem sugerir hemocromatose.
de fratura.
Deve-se questionar sobre os hábitos
alimentares da paciente e o tipo e frequência
de exercícios físicos praticados. Uma restri-
2. Diagnóstico
ção alimentar, principalmente de carboidra-
A perda da regularidade menstrual deve tos e gordura, pode causar essa perda da
ser um indicador de uma revisão cuidadosa de regularidade menstrual, assim como o exer-
alguns sistemas que controlam o ciclo ovariano cício físico vigoroso praticado por mais de 8
assim como a anatomia dos órgãos genitais fe- horas por semana.
mininos. A perda do ciclo menstrual pode ser o
Sintomas psiquiátricos podem ser avalia-
primeiro sintoma de algumas doenças, deven-
dos de uma forma subjetiva durante a consulta,
do-se então ficar atento para o diagnóstico pre-
pois algumas vezes também estão associados
coce e para a correta intervenção.
ao diagnóstico de amenorreia. O uso de dro-
gas ilícitas e o abuso de álcool devem sempre
2.1. História clínica ser questionados.
dias, podendo chegar a 200 mg/dia. Com seu baseado na terapia hormonal, especialmente
uso ocorre ovulação em até 70% das pacien- para preservação da massa óssea e do trofismo
tes. Terapias combinadas envolvendo citrato urogenital, o alívio dos sintomas da deficiência
de clomifeno e outros agentes (metformina, estrogênica e uma melhora significativa na qua-
glicocorticoides, gonadotrofinas exógenas) lidade de vida.
podem ser efetivas nas falhas de indução da
ovulação. O uso de metformina tem ganho
muito destaque e seus resultados são bastante 5.5. Causa anatômica uterina
promissores. Ela diminui os andrógenos livres O tratamento das aderências intrauterinas
pela diminuição da produção e pelo aumen- é a ressecção das sinéquias, por histeroscopia ci-
to da produção hepática da SHBG. A dose de rúrgica, seguida da administração de estrógeno
metformina inicial é de 500 mg/dia e deve ser e progestágeno após a lise das aderências para
aumentada semanalmente para evitar seus estimular a nova epitelização do endométrio.
efeitos gástricos até a dose de 500 mg 3x/dia.
Seu uso está contraindicada em caso de doen-
ça hepática ativa, insuficiência renal moderada D- Referências Bibliográficas
a grave e abuso de álcool.
AGHA-HOSSEINIA, M.; ALEYASEENA, A.;
SAFDARIANA, L. Secondary Amenorrhea with
5.2. Hiperprolactinemia Low Serum Luteinizing Hormone and Follicle-
Os pacientes com hiperprolactinemia po- stimulating Hormone Caused by an Inhibin A-
dem conseguir a normalização da liberação de and Inhibin B-producing Granulosa Cell Tumor.
GnRH, da ovulação e dos ciclos menstruais com Taiwanese Journal of Obstetrics and Gyne-
o uso de fármacos agonistas dopaminérgicos cology. v.48, I.1, Mar. 2009, p.72-75.
como bromocriptina e cabergolina, os quais BAGNOLI, V.R.; ARIE, W.M.Y.; JUNQUEIRA, P. A.A.
bloqueiam a secreção do excesso de prolactina. et al. Amenorreia. Rev. Bras. Med. v.61. n.½.
A dose de bromocriptina varia de 5-7,5mg / dia Jan/Fev. 2004.
(doses divididas, nas refeições). A cabergolida
é preferível pelos seus efeitos colaterais menos BORGES, L.E.; MORGANTE, G.; MUSACCHIO, M.C.;
frequentes e pela facilidade da posologia 0,25- PETRAGALIA, F. New protocol of clomiphene citrate
0,5 mg 1-2 x/semana. treatment in women with hypothalamic amenor-
rhea. Gynecological Endocrinology: The Official
Em situações de hiperprolactinemia se-
Journal Of The International Society Of Gyne-
cundária a medicamentos e doenças endócri-
cological Endocrinology, v. 23, I.6, Jun. 2007.
nas, deve-se suspender a medicação e tratar a
doença de base. BURRINGTON, N. Amenorreia. In: BADER, T.J.;
ALLEN, R.; ARGENTA, P. Segredos em Gineco-
logia e Obstetrícia. 3.ed. Porto Alegre: Artmed,
5.3. Causas hipotalâmicas 2008. p.55-62.
As pacientes com amenorreia hipotalâmi-
GENAZZANI, A.; RICCHIERI, F.; LANZONI, C.;
ca relacionada à atividade física beneficiam-se
STRUCCHI, C.; JASONNI, V. Diagnostic and ther-
de modificação nos hábitos dietéticos e na in-
apeutic approach to hypothalamic amenorrhea.
tensidade dos exercícios físicos. A terapia cog-
Annals Of The New York Academy Of Scienc-
nitivo-comportamental pode ser benéfica neste
es, v. 1092, Dec. 2006.
tipo de situação e a terapia hormonal (chamada
no passado de Terapia de Reposição Hormonal) JOHNSON, S. Progestogens in the treatment of
previne a perda óssea. secondary amenorrhea. Journal of Reproduc-
tive Medicine, v. 44, n.2, Feb. 1999.
algumas mulheres. Este evento pode ser desen- podem causar dispareunia. O epitélio torna-se
cadeado por ativação noradrenérgica, serotoni- menos celular, ocasionando a perda do gli-
nérgica ou dopaminérgica. Frequentemente há cogênio e a diminuição do ácido láctico, nos
um pico de hormônio luteinizante (LH) no mo- quais, resultam na mudança do pH ácido da
mento do fogacho, porém esta não é a causa, vagina para um pH mais alcalino. Isto aumenta
porque ele também ocorre em mulheres sub- o risco às infecções.
metidas à ressecção da hipófise, mostrando que
Na prática, as mulheres referem dispareu-
não há relação entre o pico de LH e os fogachos.
nia, irritação e ausência da lubrificação vaginal.
O papel exato dos estrogênios na mo- Sinais da atrofia vaginal podem ser detectados
dulação desses eventos não é conhecido. Os no exame físico: palidez epitelial, petéquias, au-
fogachos são resultantes da interrupção do sência de pregueamento vaginal e de elasticida-
estrogênio e não apenas da deficiência dele. de. Ao contrário dos sintomas vasomotores, os
Por exemplo, uma mulher jovem com insufi- sintomas vaginais geralmente persistem ou se
ciência ovariana primária decorrente da Sín- agravam com o envelhecimento.
drome de Turner, com elevado nível de FSH
Já os sintomas urinários não estão clara-
e baixo nível de estrogênio, só manifesta o
mente correlacionados com a transição da meno-
fogacho quando o tratamento com estrogê-
pausa. As principais queixas urinárias são: urgência
nios é interrompido.
miccional, noctúria, polaciúria, disúria e infecções
Os fogachos duram de 30 segundos a 5 urinárias recorrentes. Infecções reincidentes na
minutos e ocorrem com maior frequência à noi- bexiga podem comprometer sua função e condu-
te, geralmente acompanhados de sudorese no- zir a um quadro de incontinência urinária.
turna, interferindo na qualidade do sono levan-
do ao cansaço, irritabilidade no período diurno
e dificuldades com a memória e a concentração. 2.1.3. Sintomas psicológicos
Tendem a ser mais prolongados e severos em Os sintomas psicológicos são queixas
mulheres que tiveram uma menopausa induzida frequentes de algumas mulheres durante o cli-
cirurgicamente, devido à interrupção abrupta matério. Os principais sintomas são depressão,
do estrogênio. ansiedade, perda da concentração, alteração do
Na maioria das mulheres, os fogachos são humor e na função cognitiva.
transitórios. A melhora dos sintomas podem Receptores de estrogênio estão presentes
ocorrer em poucos meses em cerca de 30 a 50% no sistema nervoso central, porém, não se pode
das mulheres e resolvem-se em 85 a 90% das afirmar que o decréscimo do nível do estrogê-
mulheres dentro de 4 a 5 anos. nio contribui diretamente na intensidade dos
Os fogachos podem ser agravados por sintomas psicológicos relatados no climatério.
alguns fatores, como estresse, alcoolismo, taba- Mulheres com antecedentes de transtornos afe-
gismo, cafeína, alimentação e clima quente. tivos têm risco aumentado para ter depressão.
Os fogachos e a insônia podem influen-
ciar negativamente nos sintomas psicológicos,
2.1.2. Atrofia urogenital
como na irritabilidade e no cansaço para reali-
O trato urogenital é sensível aos efeitos zar as atividades diárias.
dos hormônios sexuais femininos, pois contém
receptores de estrogênio na vagina, uretra, be-
xiga e musculatura do assoalho pélvico. Logo, a 2.1.4. Alterações da atividade sexual
deficiência estrogênica no climatério pode levar Existe uma tendência para a diminuição
à atrofia dos tecidos epiteliais, redução da vas- na frequência de relações sexuais e para o de-
cularização, diminuição da massa muscular e clínio do desejo sexual com o aumento da ida-
aumento da deposição de tecido adiposo, cau- de que, somados aos sintomas da menopausa -
sando sintomas como ressecamento e prurido por exemplo, a dispareunia - podem influenciar
vaginal, dispareunia, disúria e urgência miccional. desfavoravelmente na atividade sexual.
A atrofia da mucosa vaginal é responsá- A diminuição da atividade sexual tem
vel pela diminuição do fluxo sanguíneo, per- etiologia multifatorial envolvendo problemas
da da elasticidade e do tônus muscular, o que
psicológicos como depressão e ansiedade, con- e a gravidade dos fogachos, reduzindo a fre-
flitos no relacionamento e problemas físicos quência em até 95%. Todos os tipos e vias de
que tornam o ato sexual desconfortável, como a administração de estrogênio são efetivos. O be-
dispareunia e vaginite atrófica. Ou seja, há uma nefício é dose relativa, porém mesmo as baixas
interação entre fatores biológicos e motivacio- doses já são muitas vezes eficazes.
nais que podem contribuir para a perda da libi-
Geralmente há o alívio dos sintomas em
do e afetar o ato sexual.
4 semanas após o início padrão das doses de
A diminuição da libido e da resposta se- estrogênios (1mg por dia de estradiol oral ou
xual, podem ser atribuídas ao declínio nas taxas equivalentes). Doses mais baixas podem não ter
de estradiol e de testosterona durante o clima- os efeitos máximos de 8 a 12 semanas; entre-
tério. Entretanto, os fatores psicológicos apre- tanto estão associadas com menores taxas de
sentam maior impacto sobre a função sexual do efeitos colaterais, como hemorragia uterina e
que as próprias alterações hormonais. sensibilidade nos seios.
A terapia hormonal deve ser feita com
a menor dosagem e durante o mínimo tempo
3. Tratamento na síndrome climatérica
possível para atingir seus objetivos. Recomen-
3.1. Sintomas vasomotores da-se que o tratamento hormonal dos fogachos
3.1.1. Terapias alternativas e comportamentais deve ser feita em até cinco anos, e que após
esse período, seja feito a suspensão gradual das
O tratamento paliativo para os fogachos doses do medicamento. A interrupção abrupta
é a adoção de práticas que diminuam a tem- do tratamento pode trazer de volta os incômo-
peratura do corpo, como uso de roupas leves dos fogachos.
e exposição a ambientes mais arejados. É im-
portante o incentivo à prática de atividade física É importante que a paciente seja orien-
e ao abandono do fumo. A prática de exercí- tada quantos aos efeitos adversos e as contra-
cios físicos regulares é uma boa opção durante -indicações da terapia hormonal. O estrogênio
o climatério, pois além de aliviar os fogachos, deve ser evitado em mulheres com história ou
influencia no aumento da densidade óssea, na que estão em risco aumentado para doença
preservação da massa muscular, atua no perfil cardiovascular, câncer de mama, câncer uteri-
lipídico e melhora o humor. no, doença tromboembólica venosa e naquelas
com doença hepática ativa.
Estudos demonstraram que o alonga-
mento é mais benéfico do que a prática de exer- O estrogênio transdérmico, que evita
cício físico moderado quanto à diminuição do a primeira passagem do metabolismo hepá-
rubor. A respiração lenta (respiração ritmada), tico, tem menos efeitos sistêmicos e estão
que pode reduzir o tônus simpático em geral, associados ao menor risco de tromboembo-
reduziu a frequência do rubor em 35% a mais lismo venoso.
do que o relaxamento muscular. Os estrogênios associados à progesti-
Não existe comprovação científica do bene- na estão relacionados ao risco aumentado de
fício do uso de produtos naturais (fitoestrogênios), eventos coronarianos, embolia pulmonar e
da vitamina E e derivados da soja no tratamento câncer de mama, quando comparados ao uso
dos fogachos na menopausa. Muitas mulheres pre- do estrogênio isolado. Isto sugere que o uso
ferem medicamentos alternativos por acreditarem de progestágenos pode agravar os riscos. Po-
que eles são mais seguros, porém os fitoestrogê- rém, o risco de hiperplasia do útero e câncer,
nios podem causar efeitos adversos semelhantes aumenta significativamente com o tratamen-
aos observados na terapia estrogênica. to à base de estrogênios em mulheres com
útero, bem como dos procedimentos gineco-
lógicos e da histerectomia. Daí a importância
3.1.2. Terapia hormonal de sempre indicar a associação de estrogênio
com a progestina para mulheres que não se-
A terapia hormonal, quando não há con- jam histerectomizadas.
traindicações, é o tratamento de primeira linha
para o controle dos sintomas vasomotores. O As progestinas (Acetato de medroxipro-
estrogênio melhora sensivelmente a frequência gesterona – Provera 20mg/dia e Acetato de Me-
gestrol – Megace 40mg/dia) são eficazes para
A paciente deve ser aconselhada a inter- gesterona (5 mg) era benéfico para a preven-
vir nos fatores de risco modificáveis como: parar ção de tais distúrbios cardíacos; isso era fisio-
de fumar, fazer exercícios físicos regularmente, logicamente plausível já que estrógeno age na
aumentar a ingesta diária de Ca (1000 mg) e vi- diminuição do LDL e aumento do HDL, age na
tamina D (400 UI), esse acréscimo pode ser feito dilatação arterial, tem ação fibrinolítica e atua
com suplementos ou por meio da alimentação. na redução da resistência à insulina e na agre-
gação plaquetária.
A hormonioterapia é eficaz tanto na pre-
venção como no tratamento da osteoporose. Porém, estudos mais recentes mostraram
Estrogênio (0,65 mg) conjugado com acetato de que a terapia hormonal não previne, mas sim
medroxiprogesterona (5 mg). Doses mais baixas aumenta os riscos para doenças cardiovascula-
de estrogênio associadas a suplemento de Ca e res tanto em mulheres saudáveis como naque-
vitamina D também podem ser usadas para au- las com cardiopatia prévia Passou-se a reco-
mentar a densidade mineral óssea. A interrup- mendar o uso restrito com duração mais curta
ção da terapia hormonal (TH), mesmo após 10 possível e com dose mais baixa efetiva. O es-
anos, leva ao retorno acelerado da perda óssea. tudo The Heart and Estrogen/Progestin Repla-
cement Study (HERS) indicou um aumento de
Medicamentos que inibem a reabsorção
52% de eventos cardiovasculares nas pacientes
óssea são eficazes na prevenção e tratamento de
em uso de hormonioterapia no primeiro ano do
osteoporose. São os bifosfonatos: alendronato
tratamento. Houve aumento de infarto agudo
(35 a 70 mg/semana), risedronato (35 mg/sema-
do miocárdio (IAM) e acidente vascular cerebral
na) e ibandronato (150 mg/mês). Esse esquema
(AVC) em usuárias de terapia hormonal. A es-
terapêutico é feito com a paciente em jejum.
trogenioterapia apresenta aumento do risco de
Os moduladores seletivos do receptor de AVC e tromboembolismo venoso.
estrogênio como o raloxifeno (60 mg) é apro-
A Sociedade Americana de Cardiologia
vado para o tratamento da osteoporose e sem
não recomenda o uso de terapia hormonal na
estimular a mama ou o endométrio.
prevenção secundária da doença cardiovascular.
O mais novo tratamento para osteopo-
Quando a hormonioterapia é administrada
rose é o hormônio paratireoideo PTH recombi-
em mulheres mais idosas com doença cardiovas-
nante humano (20 µg/dia por via subcutânea).
cular prévia aumenta ainda mais o risco de even-
Ele não inibe a reabsorção óssea como os bi-
tos cardíacos e cerebrais (AVC), principalmente
fosfonatos, mas sim estimula a formação óssea.
no primeiro ano de exposição aos hormônios.
O risco de tromboembolismo venoso do-
4.2. Prevenção da doença cardiovascular bra com o uso de terapia hormonal, principal-
Na perimenopausa, a mulher aumenta o mente nos primeiros dois anos de tratamento;
peso corporal e a cintura abdominal, aumentando o mesmo risco ocorre com o uso de raloxifeno.
o risco de dislipidemias e doenças cardiovasculares. Ainda é desconhecido o efeito cardiovas-
A principal causa de morte em mulheres cular da terapia hormonal em baixas doses ou
na menopausa são as doenças cardiovasculares, por outras vias de administração.
principalmente aquelas que possuem fatores de Os médicos devem investir em suas pa-
risco: idade, história familiar, tabagismo, obesi- cientes na pós-menopausa em prevenção dos
dade, sedentarismo, diabetes, hipertensão e hi- fatores modificáveis nas doenças cardiovascu-
percolesterolemia. lares como: cessar o tabagismo, tratar hiperco-
Tanto a morbidade quanto a mortalidade lesterolemia, hipertensão e diabetes, incentivar
cardiovascular aumentam após a menopausa; o atividade física regular e dieta saudável.
risco aumenta dramaticamente na menopausa-
da com mais de 70 anos.
4.3. Prevenção do câncer de mama
A prevenção com terapia hormonal (TH)
O câncer mais comum em mulheres é
nas doenças cardiovasculares é confusa e con-
o de mama e é o 2o que mais mata. Mulheres
troversa. No passado, trabalhos científicos reve-
que fazem uso de terapia hormonal prolongada
laram que a terapia hormonal com conjugado
apresentam um risco aumentado para câncer
equino de estrógeno e acetato de medroxipro-
de mama. É atribuído ao uso de terapia com- e do benefício que esta paciente irá ter com a
binada (estrógeno mais progestina) maior risco hormonioterapia. Cada paciente deve ser indi-
para câncer de mama, quando comparado ao vidualizada e o tratamento deve ser específico
uso isolado de estrógeno, porém isso ainda é para suas necessidades.
um assunto controverso. Por isso, é importan-
te conhecer os fatores de risco para câncer de
mama para indicar corretamente a terapia hor- 4.5. Riscos da Terapia Hormonal (TH)
monal. Mulheres com alto risco não devem fa- O risco da terapia hormonal varia de
zer uso desse tratamento. Os fatores de risco acordo com a idade da paciente, seus fatores de
são: idade, menarca precoce, menopausa tardia, risco, tipo de hormônio, dosagem, via de admi-
nuliparidade ou primeiro filho com idade avan- nistração e duração do tratamento.
çada, obesidade, história familiar de câncer e
doença mamária prévia (atipia celular ou mes- Pacientes fumantes com alto risco para
mo câncer de mama). Muitos desses fatores es- tromboembolismo e com hipertrigliceridemia
tão associados a um maior tempo de exposição devem fazer uso de hormônio por via transdér-
estrogênica. O uso de estrogenioterapia causa o mica. O uso por longos períodos e em pacientes
aumento da densidade mamária. com mais de 60 anos estão associados a maiores
riscos de eventos cardiovasculares, tromboem-
O tamoxifeno e o raloxifeno são utilizados bolismos e câncer de endométrio e mama.
para prevenção de câncer de mama. Eles anta-
gonizam o estrogênio na mama. Esses medica- As mulheres que fazem uso de TH, prin-
mentos aumentam a probabilidade de trombo- cipalmente por via oral, são mais propensas a
embolismo venoso, assemelhando-se ao risco sofrer infarto agudo do miocárdio, acidente
do uso de hormonioterapia. Fogachos e esti- vascular cerebral, câncer de mama e de endo-
mulação endometrial também são vistos com o métrio, trombose venosa profunda, embolia
uso de tamoxifeno. pulmonar e doença hepática e da vesícula biliar.
Cirurgias e imobilizações prolongadas aumen-
É importante todas as mulheres com mais tam mais ainda os riscos.
de 50 anos, principalmente as que estão em uso de
terapia hormonal combinada, a mamografia como A presença de elevado risco para AVC,
exame de rastreio para alterações na mama. IAM, tromboembolismo e câncer de mama res-
tringe muito o uso de TH mesmo na presença
de intolerância aos sintomas. Para prevenção de
4.4. Benefícios da Terapia Hormonal (TH) fraturas patológicas devido a osteoporose em
pacientes com esses riscos, aceita-se o uso de
A terapia hormonal é muito efetiva para os
baixíssimas doses, por via transdérmica e cur-
sintomas da perimenopausa e pós-menopausa:
to período de tempo. Não se pode esquecer o
fogachos, irritabilidade, distúrbios do sono, fa-
seguimento dessas pacientes durante a hormo-
diga, depressão e atrofia urogenital. Atua tanto
nioterapia com exames de rastreio.
na prevenção de fraturas patológicas por perda
óssea quanto no tratamento da osteoporose da O principal efeito adverso é a hiperplasia
pós-menopausa. e câncer do endométrio. O risco diminui quan-
do é utilizada a terapia combinada com pro-
O uso da TH em mulheres com menos de
gesterona. A paciente deve ter um acompanha-
60 anos mostrou benefício maior que o risco.
mento anual com ultrassonografia transvaginal
O início da terapia na perimenopausa ou nos
para avaliar a espessura do endométrio (deve
primeiros anos da menopausa diminui o risco
ser menor que 5 mm).
cardiovascular, de fraturas patológicas e sinto-
mas vasoativos. Os efeitos colaterais mais comuns des-
se tratamento são: mastalgia, aumento da en-
A duração do tratamento não é uma de-
xaqueca e hemorragia vaginal (principalmente
cisão isolada do médico, mas sim, um comum
com uso de hormonioterapia cíclica). É contra-
acordo com a paciente. A mulher pós-meno-
-indicação absoluta o uso de terapia hormonal
pausada deve ser informada dos benefícios e
em mulheres com história de câncer de mama
riscos da terapia. O período, o tipo e a via de
ou endométrio, doença hepática ou biliar, trom-
tratamento vão depender do sintoma e de sua
boembolismo, sangramento genital não diag-
intensidade e frequência, dos fatores de risco
nosticado e infarto agudo do miocárdio.
D- Referências Bibliográficas
AHLBORG, H. G. et al. Bone loss and bone size
after menopause. The New England Journal of
Medicine, Malmo, v.349, n. 4, p. 327-334, jul. 2003.
hormônios esteroides e fatores de crescimento rina, equivalendo a 25% dos casos. Os submu-
podem ser formadores e atuarem no crescimen- cosos são encontrados na camada interna mio-
to dos miomas uterinos. Embora o crescimento metrial, apresentando projeção para a cavidade
dos leiomiomas seja responsivo aos hormônios uterina, sendo os menos prevalentes (5% dos
esteroidais, tais substâncias não são as respon- casos), porém os mais sintomáticos. Os submu-
sáveis pela gênese do tumor. Alguns estudos cosos e subserosos podem apresentar pedículos.
sugerem que cada leiomioma possa originar-se
a partir de uma única célula neoplásica no mús-
culo liso uterino. 6. Histopatologia
Os miomas representam neoplasias, não Os miomas podem sofrer degenerações
hiperplasias do miométrio, que foram desenvolvi- dos tipos: hialina, mixomatosa, calcificada,
das a partir de mutação unicelular, com alterações quística e outras menos comuns, como gordu-
genéticas já identificadas nos cromossomos 6, 7, rosa e necrótica.
12 e 14, em 40% dos casos. Os miomas podem A degeneração hialina ocorre em 65%
apresentar-se de tipos diferentes dentro do mes- dos casos. O tecido perde o padrão típico, apre-
mo útero, identificando-se diferentes cariótipos. sentando aspecto homogêneo de consistência
branda, pois ocorre substituição de células de
tecido muscular por tecido conjuntivo.
4. Fisiopatologia
A mixomatosa representa 15% dos casos,
Alguns autores acreditam que esta pato-
caracterizando-se por tornar-se pálida, acinzen-
logia seja um tumor dependente dos hormônios
tada, viscosa e gelatinosa, sem fibras muscula-
ovarianos, pois além de aparecerem durante a
res individuais.
menacme, aumentam durante o período gesta-
cional e regridem na menopausa. A calcificada pode aparecer em 4-10%
dos casos, sendo mais comum em mulheres na
Estudos mostram que o mioma apresenta
pós-menopausa. É frequente nos miomas subse-
concentrações maiores de estrogênio e maior
rosos pediculados, resultando de irrigação defi-
número de receptores de estradiol em relação
ciente.
aos tecidos miometriais vizinhos não acometi-
dos pelo mioma. O estradiol parece agir dire- A degeneração quística ocorre em 4%
tamente na proliferação celular dos miomas ou dos casos, na qual as áreas hialinizadas lisam e
pode ser mediado por fatores de crescimento, armazenam líquido.
como EGD, IGF-1 e insulina. Menos de 0,5% das degenerações trans-
Os progestogênios também podem estar formam-se em leiomiossarcomas.
envolvidos na proliferação tumoral. Tal fato se
deve a possíveis mutações gênicas que afetam o
gene do receptor de progesterona. Dessa forma, 7. Quadro clínico
há perda da ligação do hormônio ao receptor, o Cerca de 75% das pacientes com mioma
que acarreta a não ativação, consequentemen- uterino são assintomáticas. Nos casos sinto-
te, a não modulação da progesterona na taxa de máticos os principais achados são: sangramen-
mitose. Isso proporciona a propagação de muta- to uterino anormal, dismenorreia, dispaurenia,
ções somáticas, gerando células neoplásicas. sensação de peso no baixo ventre, massa abdo-
minal ou pélvica, queixas urinárias (polaciúria) e
retais (tenesmo e constipação) e infertilidade. A
5. Classificação apresentação dos sintomas depende do tama-
Os miomas podem ser classificados de nho, do número e da localização do mioma.
acordo com a localização em: intramurais, subse- O sangramento uterino anormal é a quei-
rosos e submucosos. Os intramurais localizam-se xa inicial mais comum e a que leva mais à pro-
na camada do miométrio, apresentando menos cura de atendimento médico. O sangramento
de 50% do volume protuído na superfície serosa pode apresentar-se prolongado (hipermenor-
do útero, representando cerca de 75% de todos reia), com aumento de volume (hemorragia) ou
os miomas. Os subserosos apresentam mais de no período intermenstrual (metrorragia).
50% do volume projetado na camada serosa ute-
B- OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
1. Conhecer a epidemiologia do câncer de
colo uterino.
2. Elaborar hipóteses diagnósticas.
3. Realizar o diagnóstico de câncer do colo uterino.
4. Estabelecer a terapêutica adequada.
C- ABORDAGEM TEMÁTICA
1. Introdução
A hipótese diagnóstica se direcionou para Figura 1. Gravura de conização cervical em paciente no
menacme. Arquivo do primeiro autor.
neoplasia epitelial maligna de localização restrita ao
Capítulo 37
Nos estádios mais avançados, as queixas mais rem atingidos nos casos de carcinoma do colo
significantes são dor no baixo ventre, anorexia, uterino invasor. Nos casos avançados, embora
adinamia, anemia (pela perda sanguínea exces- raramente, até mesmo os pulmões podem ser
siva e constante), dor lombar (acometimento atingidos por implantes metastáticos (figura 4).
uretero-renal), hematúria, oligúria, disúria, po-
O carcinoma epidermoide clinicamente
laciúria, dispareunia, alterações miccionais, com
confinado ao colo uterino (IB1 ou IB2) atinge os
eliminação urinária permanente devido a fístu-
linfonodos pélvicos em 15 a 25% dos casos. Quan-
las vésico-vaginais (invasão de bexiga), altera-
do envolve os paramétrios (estádio IIB), as células
ções no hábito intestinal (invasão do reto), lom-
malignas podem ser encontradas nos linfonodos
balgias e dor pélvica. De uma maneira geral, a
pélvicos em cerca de 30 a 40% dos casos e nos lin-
sintomatologia irá depender do estádio evolu-
fonodos para-aórticos em aproximadamente 15 a
tivo do carcinoma. No estádio IA inexistem sin-
30%. Quanto mais avançada a doença local, maior
tomas característicos, resultando o diagnóstico
a probabilidade de metástase à distância. Os linfo-
de propedêutica cuidadosa e apurada em casos
nodos para-aórticos são envolvidos em aproxima-
de endocervicites ou mesmo de colos macros-
damente 45% nas pacientes portadoras do estádio
copicamente tidos como normais. Nos estádios
IVA. O envolvimento ovariano é raro, não ultrapas-
IB e II, a paciente pode queixar-se de discreta
sando 0,5% nos carcinomas epidermoides e 1,7%
metrorragia (figura 3), sinusiorragia, conferindo
nos adenocarcinomas. O fígado e os pulmões são
ao corrimento o aspecto sanguinolento. Nos
os órgãos mais afetados nas metástases por via
estádios mais avançados, III e IV, por exemplo,
hematogênica, que é rara. O tumor também pode
além de metrorragia, corrimento sanguinolen-
atingir o cérebro, os ossos, as alças intestinais, as
to e fétido, podem surgir queixas de dor, às ve-
glândulas adrenais, o baço e o pâncreas. Quando
zes encontrando-se fístulas vésico-vaginais ou
o câncer não é combatido ou não responde à tera-
reto-vaginais e também comprometimento de
pêutica empreendida, o óbito ocorre em 95% das
órgãos distantes. Percebe-se, portanto, que o
pacientes dois anos após o surgimento dos sin-
sintoma dor encontra-se relacionado a estádios
tomas. A morte pode se dar por uremia, embolia
bastante avançados, sendo queixa tardia.
pulmonar ou por hemorragia direta dos vasos tu-
morais O carcinoma escamoso de células grandes
do colo uterino apresenta melhor prognóstico do
que o carcinoma de células pequenas.
Figura 2. Achado cirúrgico (pan-histerectomia abdomi- Figura 5. Pesquisa de receptor de progesterona (imuno-
nal) compatível com carcinoma endometrióide IAG1. histoquímica). Intensa reação nuclear.
Arquivo do primeiro autor. Cortesia do Dr. Francisco Valdeci de Almeida Ferreira
Figura 3. Microscopia compatível com carcinoma endo- Figura 6. Pesquisa de p53. Intensa reação nuclear (imu-
metrial bem diferenciado. HE. nohistoquímica).
Cortesia do Dr. Francisco Valdeci de Almeida Ferreira Cortesia do Dr. Francisco Valdeci de Almeida Ferreira
50% do tumor. Cerca de 5% dos carcinomas en- endometrial para estudo histológico, podendo-se
dometriais apresentam padrão mucinoso. empregar as alternativas referidas acima.
A histeroscopia permite, por visualização
direta, diagnosticar patologias localizadas in-
5.3. Carcinoma seroso papilar
trauterinamente. Pode ser empregada na ava-
Constitui cerca de 3 a 4% das neoplasias ma- liação de pacientes com sangramento na pós-
lignas do endométrio. Assemelham-se ao carcino- -menopausa, realizando ablação de pólipos ou
ma seroso do ovário e das trompas de Falópio. São coleta de espécime em área suspeita para ser
relatadas observações dos corpos de psammoma. encaminhado ao laboratório de histopatologia
com finalidade de firmar o diagnóstico.
A B
C D
Figura 5. Representação ecográfica de imagem vegetante em cavidade uterina. Planos longitudinal e transverso (A, B,
C). Estudo Doppler de Amplitude com sinais de neovascularização na vegetação (D). Compatível com câncer uterino.
Índice de resistência baixo. Arquivo do autor.
5. Tratamento
A abordagem terapêutica se fundamenta
principalmente na cirurgia, não obstante o clássi-
co conceito oncológico que diz que “o neoplas-
ma maligno é uma manifestação local de uma
doença sistêmica” se encaixar como uma luva
quando se lida com o sarcoma uterino. Prova
disso é o notório conhecimento de que a recor-
rência ocorre em mais de 50% dos casos de sar-
coma uterino, mesmo quando a enfermidade se
encontra aparentemente localizada no momento Figura 6. Peça cirúrgica de pan-histerectomia
da abordagem cirúrgica (figuras 6 e 7). abdominal. Útero aumentado de volume. Ar-
quivo do autor.
ou pontada. Tanto pode ser intermitente quanto correlação entre o local da dilatação e o sítio
constante, geralmente é unilateral e localizada, do sintoma. A deficiência de ácidos graxos poli-
mas pode ser bilateral (em atletas) e ocorre mais -insaturados é hoje a teoria mais aceita e afirma
frequentemente em mulheres com idade supe- que esse estado levaria a uma maior sensibili-
rior a 40 anos. A ectasia ductal, a adenose, as dade e afinidade dos receptores mamários aos
mastites agudas e crônicas podem cursar com estrogênios e à progesterona.
esse tipo de dor. Embora o câncer de mama pos-
O diagnóstico da dor mamária é basea-
sa apresentar-se no início como mastalgia acícli-
do em achados clínicos. Quando não há altera-
ca, é muito raro que a dor seja o único sintoma
ção orgânica detectável, é de difícil avaliação.
de malignidade. A dor extramamária está loca-
A história clínica e o exame físico devem ser
lizada na mama, mas associa-se a uma região
feitos preferencialmente na primeira fase do
fora da mesma. Estão entre as principais causas
ciclo menstrual, quando só há proliferação ce-
de dor extramamária: a dor muscular na parede
lular e ausência dos mecanismos que explicam
torácica, sintomas das cartilagens costais; her-
a dor na segunda fase do ciclo. A anamnese
pes zoster; radiculopatias e fraturas costais. A
consiste em pesquisar todas as características
Síndrome de Tietze é uma manifestação de dor
da dor: localização, tipo, intensidade, duração,
na parede torácica, que consiste na fragilidade
intervalo, fatores de melhora e piora e relação
da cartilagem que liga as costelas ao esterno e
com atividades diárias. Faz-se mister perguntar,
é agravada pela respiração, tosse, movimento
ainda, sobre os hábitos alimentares (cafeína e
dos braços, tórax ou ombros. A doença de Mon-
outras metilxantinas), o uso de medicamen-
dor, afecção incomum, associada a traumatismo
tos (hormônios, ansiolíticos, antidepressivos),
local (espontâneo ou cirúrgico), é benigna, au-
a prática de atividade física, estresse, tabagis-
tolimitada, regredindo após algumas semanas,
mo e antecedentes de doenças mamárias da
sendo caracterizada por tromboflebite das veias
própria paciente e de seus familiares. O exame
superficiais da parede torácica. Apresenta-se
físico das mamas precisa ser minucioso para
clinicamente como um cordão fibroso, doloroso
tranquilizar a paciente e afastar alterações
e espessado em região subcutânea da mama.
orgânicas. Atentar para a inspeção estática e
Angina e colelitíase são outras causas de mas-
dinâmica das mamas, palpação, expressão e
talgia extramamária.
exame das cadeias linfonodais. Podem ser de-
A etiologia permanece desconhecida, tectados espessamentos uni ou bilaterais en-
mas existem várias hipóteses. Dentre as quais, volvendo uma região ou toda a mama. Exames
a teoria do hiperestrogenismo, a qual conside- complementares dependem dos achados da
ra o estrogênio pré-requisito fundamental para anamnese e exame físico e a sua indicação tem
a ocorrência de mastalgia cíclica. Estudos, en- a finalidade de excluir a possibilidade de neo-
tretanto, não encontraram correlação entre os plasia. Solicitar a dosagem de prolactina e fun-
níveis séricos de estradiol e a presença do sin- damental, porque, quando está elevada, pode
toma. A deficiência de progesterona na fase lú- ser uma das causas de mastalgia. A radiografia
tea é uma teoria não confirmada pela literatura. de tórax deve ser solicitada em pacientes com
Aumento dos níveis séricos de gonadotrofinas é dor mamária acíclica e extramamária.
mais relacionado à mastalgia cíclica assim como
A orientação verbal como forma de tra-
a alteração no mecanismo pulsátil da prolactina,
tamento das mastalgias cíclicas deve ser reco-
em que as pacientes apresentam picos noturnos
mendada como primeira opção terapêutica,
mais elevados, diminuição na amplitude da va-
particularmente levando-se em consideração
riação normal circadiana e valores desse hormô-
os seguintes aspectos: existe grande número de
nio aumentados anormalmente pela manhã na
opções terapêuticas no tratamento da mastal-
fase lútea. Resposta inflamatória do tecido ma-
gia, incluindo a prescrição de diversos fárma-
mário é outra teoria com a qual não foi encon-
cos, muitas vezes de custo elevado, alguns com
trada correlação. A ectasia ductal tem embasa-
eficácia nem sempre comprovada e outros com
mento científico e foi verificado que, à ecografia
efeitos colaterais significativos. É reconhecido
das mamas, mulheres que apresentam dilatação
também que metade das pacientes tratadas re-
ductal, mais frequentemente são portadoras de
correrá em um curto período de tempo, após
dor mamária em relação às assintomáticas; além
apresentarem melhora dos sintomas com pos-
disso, o grau de dilatação relaciona-se à inten-
terior suspensão do tratamento. A orientação
sidade do quadro e, nas mastalgias acíclicas, há
verbal consiste na explicação convincente sobre sária, impede o pico de hormônio luteinizante
a natureza não neoplásica do sintoma, na não e suprime a formação de esteroides ovaria-
elevação do risco relativo para o câncer em suas nos. Possui eficácia comprovada nas mastal-
portadoras e suas possíveis causas, além de sua gias cíclica e acíclica. Os efeitos androgênicos,
evolução natural. que são muitas vezes intoleráveis e ocorrem
em cerca de 20-30% das pacientes, englobam
Os tratamentos têm incluído, em alguns
acne, edema, modificação da voz, ganho de
casos, diminuição do consumo de gordura e re-
peso, cefaleia, depressão e hirsutismo. Nas pa-
dução das metilxantinas presentes na cafeína, no
cientes com dor forte, pode ser iniciado com
chá, no chocolate e nos refrigerantes. A interrup-
doses de 100-200mg, duas vezes ao dia, por
ção da hormonioterapia pode ser efetiva em al-
via oral, e depois diminuída até uma dose diá-
gumas pacientes. Aplicação de compressas quen-
ria de 100mg.
tes ou frias e massagem suave também podem
minimizar o sintoma em algumas mulheres. O tamoxifeno é o medicamento mais efi-
caz para o combate da mastalgia, entretanto é
O tratamento medicamentoso está indi-
a última opção terapêutica e deve ser utilizado
cado para pacientes com duração dos sintomas
nos de casos de dor refratária a outros trata-
superior a três meses, com alterações das ativi-
mentos. É um antiestrogênico com eficácia de
dades diárias e/ou da qualidade de vida. A esco-
72-90%. Efeitos colaterais ocorrem em aproxi-
lha terapêutica dependerá do tipo de dor apre-
madamente 20% das pacientes e correspondem
sentada pela paciente, que deverá estar ciente
a alterações menstruais, náuseas, fogachos e
de que os fármacos não curam completamente
câncer de endométrio. Deve ser usado na dose
a mastalgia. O que geralmente ocorre são perío-
diária de 10-20mg, durante seis meses. O tra-
dos de remissão que podem ou não ser longos.
tamento da dor extramamária é direcionado à
Opções terapêuticas sem evidências científicas
causa de base da mastalgia. Normalmente, con-
de benefícios, mas que apresentam elevado
siste no uso de analgésicos e AINEs.
efeito placebo e baixa incidência de efeitos co-
laterais são o óleo de prímula, vitaminoterapia A cirurgia é raramente indicada no trata-
(vitamina E), progesterona e diuréticos. mento da mastalgia. Faz-se exceção em mulhe-
res com macromastia associada, cujo sintoma
O tratamento tópico não esteroide é
exige uma redução por meio da mamoplastia.
uma opção para mulheres com mastalgia, com
Como qualquer cirurgia, os riscos e benefícios
as quais, muitas vezes, são utilizados anti-infla-
do procedimento devem ser considerados.
matórios não esteroidais (AINEs) em forma de
gel. Esses anti-inflamatórios parecem corres-
ponder a um tratamento menos tóxico e po-
dem ser considerados como opção terapêuti-
D- Referências Bibliográficas
ca na dor acíclica. SCHUILING, K. D. & LIKIS, F. E. Women’s Gyneco-
A bromocriptina (dose: 2,5-5mg/dia, du- logic Health. In: ALLIOTA, H. M.; SCHAEFFER, N.
rante três a seis meses) e a cabergolina (dose: J. Breast Conditions. US: Jones & Bartlett Pub-
0,5-1,0mg/semana) são agonistas dopaminérgi- lishers, 2005. .
cos utilizados para a dor mamária relacionada
GRUBE, B. J.; GIULIANO, A. E. Doença benigna
à hiperprolactinemia. Efeitos colaterais como
da mama. In: BEREK, J.S. Berek & Novak: Trata-
náuseas, intolerância gástrica, constipação, ce-
do de Ginecologia. Rio de Janeiro: Guanabara
faleia e hipotensão postural podem ser vistos.
Koogan, 2008.
A gestrinona (dose: 2,5mg, duas vezes por
semana) é um esteroide sintético com proprie- DE LUCA, L. A.; GONÇALVES, M. F. V. S.; CAR-
dades androgênicas, antiestrogênicas e antipro- VALHO, L. R. Mastalgia cíclica pré-menstrual:
gestogênicas. Diminuição da mastalgia ocorre, placebo versus outras drogas. Revista da As-
geralmente, após três meses de uso. Efeitos sociação Médica Brasileira, Botucatu, v.52, n.4,
adversos constituem hirsutismo, acne, irregula- p.265-269, 2006.
ridade menstrual, alteração da voz, diminuição FONSECA, A. M.; BAGNOLI, V. R.; MASSABKI, J.
da libido, cefaleia, depressão e fadiga. O. P.; PINOTTI, J. A. Assistência à mulher na idade
O danazol é um androgênio sintético reprodutora. In: LOPES, A. C. Tratado de Clínica
que inibe a liberação de gonadotrofina hipofi- Médica. v.2. São Paulo, Roca, 2006.
das, realiza-se um exame microscópico direto proliferação ductal (derrame sanguineo) e nas
da secreção. Caso visualizem-se gotículas de alterações funcionais benignas da mama (des-
gordura, é galactorreia. É geralmente serosa, de carga serosa à expressão)
múltiplos ductos, bilateral e não espontânea,
A secreção patológica é quase sempre
ocorrendo após expressão suave. Esse tipo de
unilateral, uniductal, espontânea e persistente.
secreção pode ser causado por hipotireoidismo,
Ela pode ser sanguinolenta, serossanguinolenta,
adenoma pituitário e alguns fármacos.
serosa ou clara. A maioria das causas desse tipo
A principal causa de galactorreia é a utili- de secreção é de origem benigna, sendo a prin-
zação de medicamentos, sendo os mais comuns cipal o papiloma intraductal (48,1%), seguido
as drogas psicoativas, como as fenotiazinas, an- por ectasia ductal (15% - 20%). Outras causas
tidepressivos tricíclicos, inibidores seletivos da menos comuns são a papilomatose, o carcino-
recaptação de serotonina, haloperidol e ansiolí- ma intraductal e o carcinoma papilar.
ticos, as medicações antihipertensivas, como os
Papilomas solitários sem atipia não são
bloqueadores dos canais de cálcio, alfametildo-
considerados como tendo potencial maligno.
pa, reserpina e opiáceos, as drogas gastrointes-
Todavia, papilomas múltiplos, atipia e/ou papi-
tinais, como metoclopramida, cimetidina, famo-
lomatose estão associados a um risco aumenta-
tidina e ranitidina, os anestésicos, anfetaminas
do de câncer de mama. Pacientes com derrame
ou maconha e estrógenos, como estrógeno
papilar patológico são considerados candidatos
conjugado e acetato de medroxiprogesterona,
cirúrgicos devido ao potencial de malignidade.
contraceptivos orais e injetáveis.
A descarga papilar patológica relacionada à
Não havendo história de uso de medica-
lesão neoplásica geralmente ocorre em mulheres
ções, pedir dosagem de prolactina. Se mais de 100
com mais de 50 anos, está associada à massa pal-
ug/mL, pensar em adenoma de hipófise. Prosse-
pável ou a alterações detectáveis pelos métodos
guir investigação com tomografia computadori-
de imagem. Estudos prévios verificaram uma inci-
zada cerebral ou ressonância magnética de sela
dência de câncer de mama entre 9,3% a 21,3% em
túrcica. Raramente, carcinomas broncogênicos
mulheres com derrame papilar patológico.
podem resultar em produção ectópica de prolac-
tina. Algumas desordens hipotalâmicas também Os exames complementares estão indi-
podem resultar em um aumento da liberação de cados em todos os casos de descarga papilar
prolactina, como o trauma de cabeça, encefalites patológica. Para a segurança dos pacientes, po-
e infiltração hipotalâmica ou tumores. rém, muitos centros submetem todos os que
possuem descarga papilar aos exames com-
Outro causador de galactorreia são os es-
plementares, pois alguns raros casos de clíni-
tímulos neurogênicos através de manipulação
ca aparentemente benigna podem mascarar
sexual ou dos nervos da parede torácica (herpes
malignidade. Deve ser realizada a mamografia
zoster, toracotomias e queimaduras). Lembrar-
e a ecografia das mamas, a fim de excluir uma
-se do hipotireoidismo, que é uma das causas
massa associada. Adicionalmente, o exame de
frequentes de galactorreia. Pode também ter
ressonância magnética pode ser utilizado na
origem psicogênica e ocorrer em crianças devi-
propedêutica de derrame papilar patológico
do à doença endócrina.
quando as lesões não conseguem ser localiza-
Em cerca de 30% dos casos, não se identi- das através da mamografia e da ultra-sonogra-
fica a causa da galactorreia, sendo denominada fia. Nem o exame citológico (sensibilidade para
de idiopática. Existem os pseudoderrames con- malignidade de 34,6-46,5%) nem a ductografia
sequentes a eczemas, mamilos invertidos e in- (sensibilidade para detecção de lesão de 60% e
fecções das glândulas sebáceas de Montgomery. não visualização da periferia) têm valor prope-
dêutico importante.
A mamografia tem a capacidade de re-
2.2. Segunda pergunta: o derrame é fisioló-
velar lesões impalpáveis como as microcalcifi-
gico ou patológico?
cações e as alterações arquiteturais do parên-
Existem situações fisiológicas em que quima mamário. Resultado negativo, porém,
pode surgir secreção como na gestação (se- não exclui câncer de mama, e alguns estudos
creção láctea), durante a puberdade devido ao demonstram que apenas metade dos pacientes
rápido crescimento mamário com acentuada com câncer de mama e descarga papilar tem
mamografia suspeita. Em mulheres com menos ria dos nódulos situa-se próximo à aréola. Eles
de 40 anos, o exame tem sensibilidade muito devem ser avaliados quanto à positividade ou
baixa em razão da maior densidade do parên- negatividade para câncer de mama.
quima mamário nessa faixa etária. A ultras-
Na ausência de nódulo, observa-se a cor
sonografia complementa a mamografia, pois
do derrame, o número de ductos, se é uni ou
consegue diferenciar lesões sólidas de císticas
bilateral. Quanto à cor, as colorações que mais
e sugerir o envolvimento do sistema ductal na
se relacionam ao câncer são, por ordem de fre-
gênese da secreção. Ela, entretanto, tem valor
quência, a aquosa como “água de rocha” 45%
limitado na detecção de microcalcificações, nas
de câncer de mama), a sanguinolenta ( 24%), a
lesões periféricas de pequena dimensão sem
serossanguinolenta (12%) e a serosa (7%). Em
dilatação ductal e na avaliação de mamas extre-
relação ao número de ductos, os derrames de
mamente adiposas.
um único ducto merecem um maior cuidado,
A citologia da descarga papilar é um exa- enquanto que a grande maioria dos multiductais
me inicial de rastreio e deve ser realizada nos necessita apenas da tranquilização da paciente.
casos de descarga papilar espontânea. Tem
Derrame unilateral, uniductal e sanguíneo
como vantagem ser um exame barato e não
é geralmente produzido por papiloma intraduc-
invasivo. Porém, só deve ser utilizada como
tal solitário. Com menor frequência, pode ser
método complementar na decisão terapêutica,
por carcinoma ductal in situ ou por doença de
pois apresenta baixa sensibilidade, apesar da
Paget da mama. A descarga multiductal, com
alta especificidade. Como as células malignas
frequência bilateral, amarelo-esverdeada e es-
não apresentam caráter citológico ou citoquí-
pessa, corresponde, em geral, a ectasia ductal.
mico particular, é necessária a análise de uma
grande população celular para o diagnóstico O diagnóstico etiológico do derrame pa-
correto. Esse método tem menor sensibilidade pilar é feito por meio do exame histopatológico
que a punção aspirativa por agulha fina, uma após procedimento cirúrgico.
vez que as células neoplásicas da mama ten-
dem a diminuir e/ou desaparecer na descarga
papilar, levando a uma baixa celularidade, o que 3. Tratamento
torna o diagnóstico mais difícil. Alguns estudos A conduta frente a um derrame papilar
demonstram que a citologia tem uma sensibili- vai depender das características clínicas da des-
dade maior quando a descarga é espontânea e carga e dos achados que podem acompanhá-la.
sanguinolenta, atingindo um valor de 85%. As causas mais frequentes são: ectasia ductal,
A ductografia, apesar de não possuir valor papiloma intraductal, papilomatose, carcinoma
diagnóstico importante, permite a determina- intraductal e carcinoma papilar.
ção do número, localização e extensão de qual- Apenas os casos de descarga patológica
quer lesão subjacente. O uso pré-operatório do devem ser submetidos à cirurgia, uma vez que
referido exame com injeção de azul de metile- o procedimento é invasivo e sujeito a compli-
no pode auxiliar, mas é pouco específico, sendo cações, como comprometimento do sistema
dispensável na prática clínica. neurovascular do complexo aréolo-papilar,
necrose parcial do mamilo e perda da sensi-
bilidade do mamilo, a qual é a complicação
2.3. Terceira pergunta: o derrame é espontâ- mais frequente.
neo ou provocado?
Na descarga sem nódulo, uniductal, po-
A descarga persistente e espontânea é a de-se realizar exérese do ducto em pacientes
que tem valor semiológico. Deve-se realizar a ex- jovens sem prole definida. Nas idosas, faz-se a
pressão radiada para avaliar o derrame e localizar excisão de todo o sistema ductal terminal. Caso
a área correspondente para posterior cirurgia. sejam papilomas múltiplos, que se estendem à
periferia da mama procede-se a setorectomia.
2.4. Quarta pergunta: há nódulo palpável as- Deve-se, portanto, sempre enfatizar a
sociado ao derrame? importância da avaliação cuidadosa da des-
carga papilar para que seja instituída a melhor
Havendo nódulo, a investigação do der-
terapêutica.
rame deverá ficar em segundo plano. A maio-
D- Referências Bibliográficas
ANDREA, C. E.; SOBRAL, A. C. L.; COSTA, E. S. M.;
TOTSUGUI, J. T.; ARAÚJO, S. R.; COLLAÇO, L. M.
Citologia do derrame papilar. Jornal brasileiro
de patologia e medicina laboratorial, v. 42, n.
5, p. 333-337, 2006.
var-se de que não se trata de câncer. Fundamen- lesões encontradas, firmando-se como método
tal também é excluir os pseudonódulos, como a adjuvante no arsenal propedêutico da mama.
junção condroesternal em pacientes magras, o
As lesões císticas simples têm aspectos
prolongamento axilar e o tecido adiposo apri-
característicos à USG, apresentando-se como
sionado entre os ligamentos de Cooper.
nódulo circunscrito, de paredes imperceptíveis,
com conteúdo anecoide e reforço acústico pos-
terior, classificados como BI-RADS® 2, enquanto
XX PAAF – Punção Aspirativa por Agulha Fina
as lesões sólidas se apresentam normalmen-
Deve-se considerar como primeira opção,
te como nódulos ovoides, circunscritos, com
por sua fácil execução, desconforto mínimo,
orientação paralela à pele, classificados como
baixo custo, além de suas complicações, como
BI-RADS 3. No entanto, algumas lesões císticas
sangramento e dor, serem pouco frequentes.
podem não se apresentar em sua forma carac-
Com a realização de PAAF, é possível evitar que
terística, tornando difícil sua distinção de nódu-
biópsias cirúrgicas sejam desnecessariamente
los sólidos, principalmente quando apresentam
realizadas em casos de nódulos benignos.
conteúdo de líquido espesso em seu interior.
Após a punção aspirativa, é realizada a
análise citológica do material colhido. Essa aná-
lise possibilita o diagnóstico citológico de várias XX RNM – Ressonância Nuclear Magnética
lesões benignas e malignas. Nas duas últimas décadas, vários avanços
foram obtidos no campo da ressonância mag-
Este procedimento pode ser terapêutico,
nética (RM) de mama, tornando-a importante
em caso de cistos mamários.
modalidade de imagem na detecção e diagnós-
tico de alterações mamárias.
XX MMG – Mamografia Não existe consenso em relação ao me-
A mamografia é realizada por mamógra- lhor plano de aquisição para o estudo por RM de
fo, aparelho de raios X que fornece imagens de mama. Ao realizar o estudo de uma única mama,
cada mama em duas incidências: crânio-caudal qualquer plano de aquisição pode ser utilizado,
e médio-lateral oblíqua. Consiste em um méto- embora o plano sagital seja o mais frequente-
do de rastreamento com sensibilidade de 85 a mente empregado. O exame bilateral é mais
90%. Deve ser realizada em casos de massa pal- frequentemente realizado nos planos axial ou
pável ao exame clínico; mulheres com 40 anos coronal. Existem dois principais parâmetros que
ou mais com alto risco para câncer de mama; podem ser levados em consideração na interpre-
em todas as mulheres entre 50 e 69 anos. tação das imagens. São eles: aspectos morfoló-
O achado mamográfico pode ser: in- gicos das lesões e características da cinética do
conclusivo (BI-RADS 0), negativo (BI-RADS 1), realce após a administração do contraste.
benigno (BI-RADS 2), provavelmente benigno Apesar dos avanços, existem alguns pon-
(BI-RADS 3), suspeito (BI-RADS 4), altamente tos em relação à RNM das mamas que perma-
sugestivo de malignidade (BI-RADS 5) e ma- necem controversos na literatura, como, por
ligno (BI_RADS 6). Nos casos em que o achado exemplo, protocolos de exame bem definidos,
é provavelmente benigno, recomenda-se que critérios de interpretação de imagens e suas in-
seja realizado acompanhamento em curtos in- dicações clínicas.
tervalos de tempo. Esse acompanhamento é fei-
A RM é provavelmente o exame mais
to por meio da realização de mamografia a cada
sensível na avaliação do câncer de mama já
6 meses durante 3 anos.
diagnosticado, na extensão local da doença,
na avaliação de multicentricidade e à respos-
XX USG – Ultrassonografia ta à quimioterapia e em pacientes jovens com
Desde a década de 80, a ultrassonografia mutações genéticas do BRCA. No entanto, a sua
(USG) mamária é utilizada como método auxi- falta de especificidade limita suas indicações
liar na diferenciação de lesões mamárias sólidas na prática clínica. A RM está indicada quando
e císticas. A partir da década de 90, com a in- a avaliação do caso se encontra limitada pelos
trodução de sondas de maior frequência, a USG métodos convencionais e quando se acredita
possibilitou realizar uma análise criteriosa das que ela possa acrescentar informações adicio-
nais no manejo clínico da paciente.
Já é conhecida a influência dos fatores ge- ambientais (radiação ionizante). Alguns fatores
néticos, já que filhas de mães portadoras de cân- são protetores como a prática de atividades físi-
cer de mama têm um risco bem aumentado de cas regulares e o aleitamento materno.
desenvolver a doença se comparadas a mulheres
sem história familiar. Cerca de 10% das mulhe-
res que desenvolvem câncer de mama possuem 1.4. Manifestações
uma predisposição genética. A mutação é autos- Na fase inicial, não se observam sinais ou
sômica dominante, com penetração limitada, o sintomas do câncer de mama.
que significa que pode saltar uma geração.
O mamilo pode apresentar inversão ou
Atualmente, três genes têm sido apon- descarga papilar, e a retração cutânea pode
tados como principais no desenvolvimento do denotar a presença de câncer. A associação de
câncer hereditário de mama – o BRCA1, BRCA2 lesões eritemato-pruriginosas do mamilo ao
e o TP53. No entanto, as alterações encontradas nódulo mamário pode indicar doença de Paget.
nesses genes são responsáveis por apenas 5% de O sinal mais frequente é o tumor palpável da
todos os casos da doença. Certamente há outros mama, correspondendo a 60% das queixas an-
genes que também sofrem mutações em alguns tes do uso rotineiro da mamografia.
casos familiares. Há estudos que mostram liga-
ção da neoplasia maligna de mama com outros O nódulo palpável geralmente é único,
cânceres, como por exemplo, o de ovário. As sín- indolor, duro, pouco móvel ou fixo, com limi-
dromes de Li-Fraumeni, de Cowden, e de Muir e tes definidos e superfície irregular. Quando em
da ataxia telangiectásica são genéticas com alta fase avançada, podem existir alterações cutâneas
incidência de câncer de mama. (“peau d’orange”) e, quando associado com erite-
ma, caracteriza o carcinoma inflamatório ou pode
Os genes BRCA envolvidos com o câncer ainda apresentar ulcerações e nódulos cutâneos
de mama hereditário comportam-se como ge- na mama. O tumor pode apresentar fixação aos
nes supressores tumorais. Incluem proteínas do planos profundos (músculos peitorais e costelas)
reparo do DNA, reguladores dos “checkpoints” e podem-se observar abaulamentos axilares, cer-
do ciclo celular e genes que mantêm a exata se- vicais, paraesternal (mamária interna) e das re-
gregação dos cromossomos. A proteína p53 é giões supra e infraclaviculares, denotando ade-
sintetizada a partir do gene TP53, no cromosso- nopatia metastática que pode estar associada a
mo 17, e é um gene supressor tumoral, particu- linfedema do membro superior homolateral.
larmente importante na regulação da transição
da fase G1, impedindo a entrada na fase S do
ciclo celular em casos de danos no DNA. 1.5. Diagnóstico
Existem ainda os polimorfismos, varia- No Brasil, aproximadamente 60% das
ções na sequência do DNA, que são mutações neoplasias malignas da mama de mulheres são
muito mais frequentes, da ordem de 40 a 50% diagnosticadas em estádios III e IV. Já nos Esta-
da população, com um pequeno aumento do dos Unidos e Inglaterra, quase 80% das mulhe-
risco individual. res recebem o diagnóstico em estádios I e II.
Assim, a pesquisa de alterações genéticas O Instituto Nacional de Câncer (INCA)
e sua associação com fatores ambientais po- recomenda para rastreamento e detecção do
dem levar à compreensão dos mecanismos en- câncer de mama: exame clínico das mamas
volvidos na etiologia desta doença, assim como (ECM) em mulheres a partir dos 40 anos, ECM
auxiliar no diagnóstico e tratamento. mais mamografia anual em mulheres de 50-69
anos de idade e ECM mais mamografia anual
em mulheres com risco elevado a partir dos 35
1.3. Fatores de risco anos. Ainda de acordo com este consenso, são
Os principais fatores de risco do câncer de definidos como grupos populacionais com risco
mama são: idade avançada, história familiar posi- elevado para o desenvolvimento do câncer de
tiva, menarca precoce, menopausa tardia, nulipa- mama: mulheres com história familiar de pelo
ridade, primeira gravidez tardia (após 30 anos), menos um parente de primeiro grau (mãe, irmã
obesidade, dieta rica em gorduras, elevada in- ou filha) com diagnóstico de câncer de mama,
gestão de álcool, terapia hormonal (TH) e fatores abaixo dos 50 anos de idade; mulheres com
2. Exame físico
É composto pelo autoexame das mamas 3.4. Mamocintilografia
e pelo exame clínico das mamas. De acordo com Waxman (1997), existem
O autoexame das mamas deve ser reali- aplicações específicas para se utilizar a cintilo-
zado da seguinte forma: antes da menopausa, grafia mamária, podendo citar: pacientes com
sete dias após o período menstrual, mensal- mamas densas, com mamas com distorção ar-
mente; após a menopausa, no mesmo dia, men- quitetural ou temor excessivo de biópsia, espe-
salmente. O autoexame das mamas não reduz cialmente se esses pacientes são considerados
as taxas de mortalidade. Já o exame clínico das de alto risco.
mamas deve ser realizado pelo médico: a cada
três anos, se a paciente tiver entre 20 e 40 anos
3.5. Ressonância magnética
ou anualmente se história familiar positiva; a
partir dos 40 anos, anualmente. O exame físico Indicada no caso de lesões que só te-
detecta 10-20% dos cânceres não observados nham sido vistas em uma incidência mamográ-
radiologicamente. fica e que não tenham apresentado correlação
com US e incidências mamográficas adicionais,
em carcinomas ocultos, lobulares, para detectar
3. Exames complementares recidivas, avaliar a extensão da doença e multi-
3.1. Mamografia centricidade e para monitorar a resposta à tera-
pia neo-adjuvante.
A mamografia, apesar de ser considerado
o método diagnóstico mais adequado, apresenta Com uma sensibilidade de 88,1% e uma
um alto custo e, infelizmente, ainda hoje não está especificidade de 67,7%, a ressonância com
acessível a toda a população, principalmente en- achados anormais não indica câncer, assim
tre mulheres em pior condição sócioeconômica. como sua ausência não exclui o carcinoma.
3.2. Mamografia digital 3.6. Punção aspirativa por agulha fina (PAAF)
Possibilita que o profissional trabalhe com Lesões palpáveis ou guiadas por ultras-
as informações sem que a paciente precise se sonografia apresentam taxas de falso-negativos
submeter a novas radiografias. Alguns estudos variando de 10-15% e as de falso-positivos são
mostram que não há diferenças importantes na menores do que 1%, sendo que 15% da amos-
acurácia diagnóstica desse método se compa- tras são insuficientes. Resultados negativos da
PAAF não excluem neoplasia maligna e devem para marcar a lesão a fim de que o cirurgião
ser avaliados por core biópsia ou biópsia cirúr- possa guiar-se e retirar a lesão. A técnica pos-
gica das lesões suspeitas. sibilita a marcação pré-operatória adequada de
92 a 98% das lesões subclínicas de mama. Po-
De acordo com DeVita, Hellman e Ro-
rém, pode não propiciar a exérese completa da
senberg (2008) é um método rápido, indolor
lesão em até 40% das vezes. Além disso, a utili-
e barato, mas incapaz de distinguir o carcino-
zação desses fios está associada a complicações
ma invasivo do in situ. Outra desvantagem é a
perioperatórias importantes, destacando-se a
necessidade de um citopatologista experiente
migração do fio dentro da mama, transecção
para a conclusão do diagnóstico.
do fio durante o ato cirúrgico com permanência
de fio metálico no parênquima mamário e mi-
3.7. Punção percutânea por agulha grossa gração para a cavidade pleural, com ocorrência
(“core biópsia”) de pneumotórax.
O carcinoma medular perfaz até 7% dos tu- mor móvel, lobulado e indolor, de crescimento
mores malignos da mama, acometendo mulheres rápido. É muito raro, sendo mais comum após
mais jovens (menores que 35 anos), principalmen- os 40 anos. Em 80% dos casos, é benigno. Entre-
te se pertencentes às famílias com mutações ge- tanto, apresenta alta tendência de recidiva local
néticas de BRCA1 e BRCA2. Mesmo com aspectos e pode sofrer degeneração maligna sarcomato-
histopatológicos de neoplasia indiferenciada, é sa.
considerado tumor de bom prognóstico.
O papiloma intraductal é a neoplasia
O carcinoma inflamatório representa 1 a epitelial benigna que se desenvolve no lúmen
3% dos tumores malignos da mama, caracte- de grandes e médios ductos subareolares. O
rizado por predomínio de sinais inflamatórios potencial de malignidade é baixo. O seu prin-
clínicos (eritema, edema com espessamento de cipal sintoma é a descarga papilar hemorrági-
pele e aumento da temperatura cutânea) e/ou ca, espontânea, uniductal e unilateral. É mais
patológicos (invasão de linfáticos da derme). É frequente entre os 30 e 50 anos. Em pacientes
uma das formas mais agressivas do câncer de com mais de 50 anos, com esta queixa, deve-
mama, tendo um prognóstico bem reservado. -se sempre afastar o diagnóstico de carcinoma
papilífero e o ductal.
A doença de Paget constitui 0,7 a 4% dos
carcinomas da mama. Caracteriza-se por lesão, Como a mama é normalmente constituí-
por vezes, erosiva, pruriginosa que se inicia na da também por tecido adiposo, o lipoma é re-
papila, progredindo até a aréola e, raramente, lativamente frequente. O hamartoma é uma le-
acometendo a pele adjacente. O carcinoma são pouco observada, com perfil mamográfico
intraductal pode ser encontrado em 65% das peculiar de lesão circunscrita contendo gordura.
vezes e o CDI, em 30-35%. Cerca de 60% das
pacientes com a doença de Paget apresentam
tumor palpável e o tratamento e o prognóstico 6. Estadiamento
dependem de ter nódulo subjacente ou não. O estadiamento proposto pela União In-
ternacional Contra o Câncer – UICC baseia-se
em três componentes principais:
5. Diagnóstico diferencial
Características do tumor primário;
É importante ressaltar que até 80% dos
Características dos linfonodos das cadeias de
tumores mamários palpáveis são alterações be-
drenagem linfática do órgão em que o tumor
nignas e que não aumentam significativamente o
se localiza;
risco para desenvolvimento do câncer de mama.
Presença ou ausência de metástases à distância.
Os cistos mamários incidem em 7 a 10%
da população feminina, podendo ser únicos ou
6.1. Tumor primário
múltiplos, uni ou bilaterais. A faixa etária aco-
metida é de 35 a 50 anos, coincidindo, pois, Nesta classificação o “T” representa o tama-
com a fase involutiva dos lóbulos mamários. nho do tumor primário e a presença ou ausência
Manifestam-se como nódulos de aparecimento de fixação às estruturas adjacentes, com subcate-
súbito, de contornos regulares, móveis e dolo- gorias que variam de T0 (Tis, in situ) a T4.
rosos.
O fibroadenoma é a neoplasia mais fre- 6.2. Linfonodos regionais
quente da glândula mamária, precedida pelo car-
cinoma. Apresenta-se como um nódulo fibroelás- O “N” indica a presença ou ausência de
tico, sólido, indolor, móvel à palpação, de limites metástases para os linfonodos regionais, com
precisos e mede de 1 a 3 cm. Surge quase sempre subcategorias que variam de N0 a N3, que ex-
na mulher jovem, entre 15 e 30 anos. Em geral, pressam o grau de fixação linfonodal.
trata-se de uma lesão sem potencial de maligni- 6.3. Metástase
zação. Certos tipos de câncer, chamados tumores
O “M” indica a presença ou ausência de
circunscritos, podem simular um fibroadenoma
metástases à distância, com as subcategorias
sendo, portanto, prudente que os fibroadenomas
M1 ou M0, respectivamente.
sejam submetidos à confirmação histopatológica.
O símbolo “X” é utilizado quando uma
O tumor filodes apresenta-se como tu-
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pélvica do períneo. Os órgãos que estão situados Sabe-se que inúmeros agentes po-
acima dos levantadores do ânus são denomina- dem condicionar a perda de equilíbrio do
dos de intra-pélvicos e os localizados abaixo, suporte pélvico, propiciando o surgimen-
perineais. Este complexo muscular forma faixa to de prolapsos. Certamente que o fator de
semelhante à uma rede de dormir entre o púbis risco mais importante é o relato de partos
e o cóccix, ligando-se ao longo da parede pélvica vaginais, que podem ocasionar lesões no
lateral. Os levantadores do ânus encontram-se complexo músculo-ligamentar (levantado-
tonicamente contraídos, fornecendo apoio firme res do ânus, corpo perineal, ligamentos de
para suportar o conteúdo pélvico, auxiliando Mackenrodt e útero-sacros). O parto trans-
por outro lado na continência urinária e fecal, vaginal pressupõe que o bebê distendeu o
proporcionando o equilíbrio da estática pélvi- canal do parto, podendo na ocasião terem
ca (figura 2). A fáscia endopélvica é constituída sido danificadas ou enfraquecidas as estru-
de tecido conjuntivo frouxo, contendo peque- turas do assoalho pélvico, que incluem os
nos vasos, linfáticos e nervos. Áreas anatômicas músculos acima relacionados e a fáscia en-
mais espessas da fáscia endopélvica são descri- dopélvica, que englobam e fecham a saída
tas como ligamentos (cardinal ou de Macken- da pélvis, com envolvimento da abertura da
rodt e útero-sacros), os quais também exercem vagina, uretra e do canal anal. Esse compo-
importante função no suporte útero-vaginal. A nente etiológico e de risco se torna sítio de
fáscia endopélvica de apoio que separa a vagina ação danosa quando do nascimento por via
da bexiga é chamada de pubovesical ou vési- transvaginal de fetos macrossômicos (pe-
covaginal; e a que separa a parede posterior da sando 4kg ou mais) e quando da inadequa-
vagina do reto, é chamada de retovaginal. A da aplicação de fórceps de Simpson, por
parede vaginal anterior é apoiada principalmen- exemplo. Fatores genéticos e constitucionais
te pela aponeurose ou fáscia pubocervical. Essa (relato de hérnias umbilicais, inguinais e in-
fascia pubocervical é mais espessa e mais densa cisionais) também têm enorme importância.
por baixo e ao redor da uretra, do que por bai- Embora se desconheça o motivo, os prolap-
xo da base da bexiga. Esse achado anatômico é sos dos órgãos pélvicos são mais frequentes
do conhecimento de todo ginecologista afeito nas mulheres brancas, caucasoides, do que
à cirurgia pélvica. nas negras e nas asiáticas. Os incrementos
crônicos, repetitivos e transitórios da pres-
são intra-abdominal (tosse crônica por pneu-
mopatia, por tabagismo, constipação intesti-
nal e esforço físico extenuante), obesidade e
ascite constituem também fatores de risco.
Não obstante o prolapso dos órgãos pélvicos
poder se manifestar em qualquer idade, ele é
mais comum em mulheres na pré-menopau-
sa, devido provavelmente aos danos sofridos
pelos tecidos de sustentação pélvica que se
agravaram com o ato parturitivo transvagi-
nal sem correta assistência obstétrica (parto
em que havia indicação de episiotomia e que
esse procedimento cirúrgico obstétrico não
foi empregado), com o passar dos anos, bem
como com a falência ovariana na menopau-
sa e na pós-menopausa (hipoestrogenismo).
Também é de considerável importância co-
nhecer os diversos compartimentos anatô-
micos que suportam os órgãos pélvicos. Sa-
bemos que os defeitos devidos às agressões
Figura 2. Gravura simulando o músculo pubococcígeo em sofridas pelas estruturas do suporte pélvico
repouso e contraído (contração da uretra, vagina e reto),
resultam no evidente relaxamento anormal
aumentando o fechamento das luzes desses órgãos.
dessa região anatômica, atribuindo-se tam-
Adaptado de Berek & Novak Tratado de Ginecologia, 2008.
bém à retroversão uterina, parte nesse con-
2. Classificação
Existem inúmeras classificações para
quantificar os graus dos prolapsos dos órgãos
pélvicos. Uma delas, por exemplo, avalia como
pertencente ao primeiro grau, quando a estru-
tura vaginal (que pode conter bexiga ou alça
intestinal) desce ao nível do introito vaginal, à
Manobra de Valsalva (esforço físico ou tosse);
do segundo grau, quando ultrapassa o introito
Figura 4. Resultado cirúrgico imediato do caso da figura
vaginal à mesma manobra e do terceiro grau,
anterior (cirurgia de Lawson Tait (esfincteroplastia anal
quando ultrapassa o introito vaginal, a pacien-
com perineoplastia). Arquivo do primeiro autor.
4. Diagnóstico
A correta anamnese e bem elaborada
propedêutica clínica são de vital importância, o
Figura 5. Prolapso útero-vaginal grau 4, em mulher na
exame físico estático e dinâmico consolidando pós-menopausa. Arquivo do primeiro autor.
a impressão diagnóstica e o diagnóstico dife-
rencial (Existe uretrocele? A lesão se localiza na
parede vaginal anterior? É um prolapso apical?
É um prolapso da parede vaginal posterior? É
um prolapso vaginal pós-histerectomia? O cor-
po tendinoso do períneo está intacto? A lesão
perineal atinge o esfíncter estriado do ânus?).
O grau da ginecopatia poderá ser avaliado
com a utilização do sistema de classificação da
quantificação do prolapso do órgão pélvico (POP-
-Q) mencionado anteriormente. A figura 5 ilus-
tra caso de paciente na pós-menopausa, grande
multípara, compatível com prolapso uterino grau
4, com comprometimento urológico (hidronefro-
se, comprovada por ultrassonografia de vias uri-
nárias e urografia excretora, com taxas de ureia,
Figura 6. Mostra retocele baixa, enterocele e prolapso
creatinina e clearance da creatinina dentro dos
uterino grau 2. Modificado de Netter FH. Reproductive
limites considerados normais para a idade), em
System. Ciba Collection, 1965.
decorrência do tempo da enfermidade (9 anos),
que regrediu após a realização da histerectomia
vaginal, seguida de cistopexia, correção de ente- O estudo ultrassonográfico e o Dop-
rocele, de retocele e de laceração perineal incom- pler são indispensáveis em Ginecologia, prin-
pleta. A prevalência de hidronefrose em pacientes cipalmente se efetuados por via endovaginal,
com prolapso genital é apreciável (cerca de 17%) podendo fornecer dados importantes, como
e está relacionada ao grau do prolapso uterino e quantificação da espessura endometrial e
do tempo em que ocorreu até o dia da correção surpreender a presença de neoplasia pélvi-
cirúrgica da distopia. ca benigna ou maligna. No caso do tema do
problema em epígrafe, a ultrassonografia foi
O exame vaginal (toque bidigital) e retal
utilizada, fornecendo informações acerca do
(toque unidigital) devem ser realizados rotinei-
útero, anexos uterinas e bexiga, não obstante
o diagnóstico ter sido soberanamente clínico, alta, os exames de toque vaginal e retal, simul-
dependendo exclusivamente dos conhecimen- taneamente, com a paciente realizando esforço
tos semiológicos do examinador. e em pé, são realizados. Quando se trata de en-
terocele, o examinador perceberá a descida de
uma estrutura no interior do septo, no espaço
4. Tratamento compreendido pelos dedos polegar e indica-
Pode ser conservador, não cirúrgico, em dor, sem deslocamento da parede anterior do
paciente portadora de doença hipertensiva se- reto para a luz vaginal. No caso de retocele é a
vera, consistindo na mudança do estilo de vida parede anterior do reto que se desloca para a
da doente, utilizado também em casos de pro- luz vaginal. O diagnóstico de retocele baixa não
lapso grau 1, principalmente com incontinência oferece a menor dificuldade, sendo feito pelo
urinária de esforço genuína (IUEG) com hiper- toque retal, percebendo-se o desvio do trajeto
mobilidade uretral, tendo como objetivo dimi- que era para ser retilíneo e que apresenta uma
nuir o risco de agravamento da ginecopatia, saculação, herniação da parede retal anterior e
aconselhando-se receber orientação de fisio- protrusão da parede vaginal posterior, no sen-
terapeuta para melhor exercitar a musculatura tido do lumen vaginal.
do assoalho pélvico (exercícios de Kegel). A mu- Um prolapso de órgão pélvico de ocor-
dança do estilo de vida consiste em orientação rência rara é a inversão uterina ginecológica,
dietética para redução de peso; se for fumante, caracterizada pela invaginação do fundo do
abandonar o quanto antes esse nefasto vício ta- útero em sua cavidade, podendo ser aguda ou
bagista, a paciente sendo também incentivada crônica, exteriorizando-se através da vagina ou
a emagrecer e a procurar executar atividades não. A paciente pode queixar-se de plenitude
físicas leves, saudáveis e diárias. pélvica, dor de grande intensidade, corrimento
Outra opção conservadora que pode fétido e de metrorragia. A etiologia oncogenéti-
ser utilizada em mulheres muito idosas e com ca é evidente na maioria dos casos, advindo da
prolapsos graus 3 e 4 consiste na inserção de tentativa do útero em expulsar tumor submuco-
pessário, que é um anel maleável de material so que se torna parido. Pode também ser origi-
sintético inerte de vários tamanhos. Após a es- nária de iatrogenismo, quando o ginecologista
colha do pessário adequado, ele é inserido pelo tenta enuclear o mioma parido por via vaginal
ginecologista, que o fixará com delicadeza no por torção e tração, podendo ocorrer até mes-
fundo de saco vaginal anterior e posterior, o mo choque neurogênico devido à dor intensa.
colo uterino passando por meio dele. A pacien- Ambas, entidades nosológicas (inversão uteri-
te deverá ser acompanhada de dois em dois na ginecológica crônica e a aguda) podem ser
meses para verificação do posicionamento do solucionadas através de histerectomia vaginal,
pessário, aproveitando-se a ocasião para se efe- com conservação ou não dos anexos.
tuar o completo exame ginecológico. A pacien- Existe também a inversão uterina obsté-
te poderá também utilizá-lo enquanto aguarda trica, que autores relatam ocorrer em 1:20.000
a realização do procedimento cirúrgico. partos na Europa e de 1:2.000 a 1:6.400 partos
O tratamento cirúrgico do distúrbio pél- nos Estados Unidos. Em Fortaleza, em trabalho
vico poderá ser conservador, com a não reti- feito na Maternidade Assis Chateaubriand é re-
rada do útero em mulher jovem, indicando-se portada a ocorrência de um caso de inversão
a Operação de Manchester-Donald-Fothergill, uterina obstétrica para 16.650 partos.
que consiste na amputação do colo uterino, Procedimento não cirúrgico e conserva-
encurtamento dos ligamentos de Mackenrodt, dor que pode ser empregado na correção da
cistopexia e perineoplastia. inversão uterina aguda obstétrica, é a mano-
Quando o diagnóstico de colpocistoce- bra da taxe (figura 7), obtendo como resultado
le ou cistocele é feito, a correção cirúrgica dá- a desinversão uterina por via vaginal sob anes-
-se pela cistopexia, com colporrafia anterior. tesia. A cirurgia de Spinelli (figura 8) também
Havendo retocele baixa, a retocele é corrigida pode ser levada a efeito, solucionando o grave
cirurgicamente, seguida de colporrafia poste- episódio da inversão uterina obstétrica (figuras
rior, perineoplastia ou perineorrafia. Havendo 9 e 10). Outra opção é a histerectomia vaginal.
dúvida se se trata de enterocele ou retocele
Figura 7. Manobra da taxe: reposicioname nto manual do útero em seu sítio anatômico.
Modificado de Rezende Obstetrícia, 2010.
Figura 8. Tempos cirúrgicos da operação de Spinelli. Adaptado de Greenhill, J.P. Cirugia Gine-
cológica, México, 1963.
Figura 9. Inversão uterina aguda obstétrica grau 4. Figura 10. Mostra inversão uterina subaguda obstétrica
Arquivo do primeiro autor. grau 4. Arquivo do primeiro autor.
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vaginal pós-histerectomia. Tese de Concurso
para Professor Titular de Ginecologia e Obste-
trícia. Faculdade de Medicina da Universidade
Federal do Ceará, Fortaleza, 1998.
tindo assim o enchimento vesical. Os recepto- entre o sistema nervoso e as estruturas anatô-
res alfa estão presentes na musculatura lisa da micas íntegras relacionadas à bexiga e à ure-
uretra e no colo vesical, aumentando o tônus tra. Dois importantes fatores contribuem para
muscular e os betarreceptores se localizando no a continência uretral: a pressão de fechamen-
corpo vesical, promovendo o relaxamento. to uretral e o papel desempenhado pelos ele-
mentos anatômicos da região uretro-trigonal.
O sistema nervoso parassimpático se ori-
A pressão de fechamento uretral depende da
gina da medula espinhal sacral (S2-S4), tendo
integridade da mucosa uretral, do plexo vascu-
como neurotransmissor a acetilcolina, sendo
lar submucoso e das camadas de musculatura
responsável pela ativação do músculo detrusor
lisa e estriada que envolvem a uretra. O aumen-
e consequentemente pelo esvaziamento vesical.
to compensatório da pressão uretral, quando
O sistema nervoso somático possui a mesma
ocorre incremento da pressão intra-abdominal,
origem do sistema parassimpático, inervando o
constitui a base do mecanismo de continência.
assoalho pélvico e o esfíncter externo da uretra,
Portanto, qualquer situação ou enfermidade
desempenhando apenas função periférica no
que altere esse equilíbrio de interação poderá
controle neurológico do trato urinário inferior.
ocasionar incontinência urinária.
3. Fisiologia
Durante a fase de enchimento vesical, me-
diada pelo sistema nervoso simpático, o músculo
detrusor permanece inativo, permitindo a disten-
são da bexiga sem grande alteração de pressão
e concomitantemente ocorrendo o aumento do
tônus uretral, facilitando o fechamento uretral e
o mecanismo de continência (figura 2). Quando
o volume de urina contido na bexiga atinge de-
terminado valor, os receptores de estiramento- Figura 2. Funcionamento harmônico uretrovesical, com
-volume localizados na parede vesical são sensi- ação das musculaturas lisa e estriada.
Modificado de Bastos, A.C. Ginecologia, 1998.
bilizados e enviam sinais ao cérebro para o início
da micção. O mecanismo de micção é mediado
pelo sistema nervoso parassimpático, ativando o
4. Tipos de incontinência
músculo detrusor e pelo relaxamento voluntário Dentre as diversas causas de incontinên-
do assoalho pélvico e da uretra. É importante cia, estão incluídas alterações de funcionamen-
ressaltar que o volume limiar para sensibilizar to uretral e vesical, malformações congênitas
os receptores de estiramento-volume é variável, e fístulas urinárias. É possível identificar clini-
dependendo das vias aferentes sensoriais e dos camente algumas situações e agrupar a incon-
centros superiores do sistema nervoso. Assim, o tinência urinária em cinco tipos: incontinência
limiar de micção pode ser alterado ou reajustado urinária de esforço, incontinência urinária de
por várias influências. urgência, incontinência mista, funcional, transi-
tória e extra-uretral.
A inervação parassimpática, como relata-
do acima, está concentrada em grande parte da A incontinência urinária de esforço é a
bexiga, o neurotransmissor acetilcolina sendo forma mais frequente de incontinência e bastan-
responsável pela contração do detrusor. As fibras te comum em mulheres jovens. A hipermotilida-
simpáticas estão distribuídas na musculatura lisa de da uretra após partos transvaginais constitui
da bexiga e da uretra. O sistema alfa-adrenérgico a causa mais comum da incontinência urinária
encontra-se predominantemente na uretra, os de esforço genuína (IUEG). Normalmente a va-
seus impulsos produzindo contração. O sistema gina encontra-se fixada bilateralmente ao dia-
beta-adrenérgico inerva a bexiga e a uretra, en- fragma pélvico, o que condiciona base estável
contrando-se predominantemente na bexiga, os onde o colo vesical e a uretra repousam. Essa
seus impulsos produzindo relaxamento. disposição anatômica permite que incrementos
na pressão intra-abdominal sejam transmitidos
O elemento fundamental no mecanismo
igualmente para a bexiga e para a uretra, man-
de micção e continência é a perfeita interação
tendo o fechamento uretral e consequentemen-
te a continência. Nas mulheres, principalmente nais fisiológicos e sim a fatores que impedem
multíparas, com hipermotilidade uretral, existe a mulher de chegar rápido ao banheiro, como
descida da uretra proximal e do colo vesical, de incapacidade ou dificuldade de deambulação.
forma que essas estruturas não são mais com-
Outra forma de incontinência é a transi-
primidas contra a vagina durante o aumento da
tória, na qual as causas dos distúrbios são cli-
pressão intra-abdominal, ocorrendo perda in-
nicamente reversíveis. As principais causas são:
voluntária de urina (figura 3).
uretrites, cistites, psicopatias, farmacológicas,
excessiva produção de urina, restrição da mobi-
lidade e fecaloma.
Anomalias congênitas e traumatismos são
as principais formas de incontinência extra-ure-
tral, a perda involuntária de urina não se dando
através da uretra. As principais causas congêni-
tas são a extrofia vesical e o ureter ectópico. De
causas traumáticas, a fístula vésico-vaginal é a
principal, ocorrendo frequentemente na síndro-
me do parto obstruído, com período expulsivo
prolongado, que poderá culminar com a rotura
Figura 3. Uretrocele + prolapso uterino pós-histerecto-
uterina complicada. Outras causas comuns de
mia grau 4. Arquivo do primeiro autor.
fístulas geniturinárias são o câncer do corpo e
do colo uterino, a radioterapia e procedimen-
Em um subgrupo de pacientes portado- tos cirúrgicos, como histerectomia vaginal ou
ras de IUEG, existe debilidade do esfíncter in- abdominal simples ou radical, na qual a bexiga
terno da uretra, resultando deficiência esfinc- pode ser aprisionada ou sofrer lesão acidental,
teriana intrínseca. Nesse grupo, a incontinência sem a adequada correção cirúrgica ou ser trans-
urinária ocorre com mínimos exercícios físicos fixada por sutura.
ou mesmo até em repouso. As causas comuns
Também deve ser mencionada a existên-
são a idade avançada, a cirurgia prévia do colo
cia do úraco, que é um canal do feto que liga
vesical e o tratamento radioterápico. Os efeitos
a bexiga com a alantoide. Após o nascimento,
da incontinência de esforço não são os mesmos
transforma-se num cordão fibroso que vai do
para todas as mulheres, dependendo do meca-
umbigo ao vértice da bexiga (ligamento me-
nismo esfincteriano, do nível de estresse físico
diano vesical). O úraco pode permanecer per-
imposto e do controle urinário da paciente.
meável, a anomalia se manifestando pela saída
A incontinência urinária de urgência de urina pelo umbigo intermitentemente e em
é consequência da hiperatividade do detrusor, quantidades variáveis. O normal é que inicial-
quando a pressão de contração vesical supera mente no feto a bexiga se distenda até a região
a pressão de fechamento uretral, levando à in- umbilical; com a maturação, a porção superior
continência e à urgência miccional. Essa forma tornando-se delgada, dá lugar a formação tu-
é bastante comum em pessoas idosas e está bular que se oblitera, constituindo o úraco ou
frequentemente associada com polaciúria e nic- ligamento mediano umbilical. Se esse tubo não
túria (o mesmo que noctúria, que são micções se fecha, comunica-se a bexiga com o exterior
frequentes durante a noite, o volume urinário através do umbigo, como relatado anteriormen-
noturno superando ao ocorrido durante o dia). te. Em alguns casos, o úraco permeável pode
Dentre as possíveis causas dessa forma de in- ser encontrado associado à obstrução uretral.
continência, podemos citar os distúrbios neuro-
lógicos, as infecções e as de origem idiopática.
5. Fatores de risco
Pacientes que possuem insuficiência ure-
tral ou alteração de sustentação dos órgãos pél- Considerando que a incontinência uriná-
vicos, juntamente com hiperatividade do detru- ria tem grande impacto na qualidade de vida
sor apresentam incontinência urinária mista. da mulher, é importante familiarizar-se com os
diversos fatores de risco relacionados com essa
A incontinência funcional se caracteriza
entidade uroginecológica.
por não estar relacionada a mecanismos miccio-
ção pós-parto e nas pacientes com IUE por e condicionar a pélvis para o parto normal.
hipermobilidade do colo vesical sem disto- Tem sido relatado que esses exercícios po-
pias severas (grau I). Também no condiciona- dem fazer com que os homens apresentem
mento muscular do assoalho pélvico pode ser significativa melhora na ereção peniana e na
empregada a eletroestimulação (age por estí- ejaculação, beneficiando também a fase or-
mulo elétrico vaginal ou retal, de comprovada gásmica feminina.
eficácia no tratamento da hiperatividade do Primeiramente deve-se ensinar às mulheres
detrusor - bexiga hiperativa, com a vantagem como identificar os músculos pélvicos envol-
de apresentar baixos paraefeitos e indicada vidos tanto na micção como na defecação. A
para pacientes que mostram dificuldade de forma preconizada e fácil é quando da mic-
contração da musculatura do assoalho pélvi- ção, a paciente procurar tentar parar o jato
co (figura 5). Tem-se também o biofeedback de urina, intercalando etapas de relaxamento.
(que atua por estímulo sonoro ou visual, a pa- Quando a paciente for praticar nos dias se-
ciente aprendendo a inibir a contração vesical guintes os exercícios de Kegel, a bexiga deve-
de forma consciente), os exercícios perineais rá estar vazia, contraindo e relaxando a mus-
e o uso de cones vaginais. culatura perineal rapidamente durante cinco
vezes. Realizar permanentemente os exercí-
cios de Kegel com a bexiga cheia de urina,
cortando o jato, a mulher correrá o risco de
desenvolver infecção urinária. Em seguida, a
paciente contrai a musculatura do assoalho
pélvico e mantém-na assim, contando de 1
até 5, passando a relaxá-la. O ginecologista
quando da realização do exame vaginal (to-
que) procurará identificar os músculos pubo-
coccígeos. Para isso, afastará o dedo indicador
do dedo médio, que estão repousando sobre
a parede vaginal posterior, posicionando-os
como se fosse uma tesoura aberta, orientan-
do a paciente para contrair os músculos pu-
Figura 5. Eletroestimulador com eletrodo vaginal. bococcígeos. Chegará a um ponto em que
os dois dedos afastados serão comprimidos
Terapia comportamental e treinamento e aproximados um do outro. Só se consegui-
vesical. É realizada através da micção pro- rá resultado satisfatório com o procedimento
gramada da paciente, juntamente com o con- de Kegel, se esses exercícios forem continu-
dicionamento do assoalho pélvico, a fim de amente praticados e sob supervisão de pro-
inibir a urgência miccional. fissional com eles familiarizados. A literatura
Exercícios de Kegel. Evidências de ensaios especializada tem demonstrado o efeito be-
clínicos têm mostrado que o treinamento néfico desses exercícios nas portadoras de
supervisionado da musculatura do assoalho IUE leve (grau I), com 72% de cura a longo
pélvico (exercícios de Kegel) constitui opção prazo, após conclusão do programa; as mu-
eficaz para alguns casos de incontinência lheres com graus mais severos, classificados
urinária de esforço. Os exercícios de Kegel como II e III, deverão ser encaminhadas para
foram idealizados na década de 40 para o resolução cirúrgica.
fortalecimento da musculatura do assoalho Medicamentos. Podem ser utilizados os anti-
pélvico, com o intuito de tratar mulheres colinérgicos, antidepressivos inibidores da re-
com incontinência urinária de esforço mani- captação de serotonina e norepinefrina. O uso
festadas após os partos transvaginais. Con- de estrogênio oral ou creme por via vaginal
sistem na contração voluntária dos mús- pode ocasionar algum benefício, limitado às
culos elevadores do ânus, realizada várias mulheres pós-menopáusicas ou com incon-
vezes ao dia. Atualmente eles podem ser tinência mista. Atentar para os riscos do uso
também utilizados na abordagem da incon- prolongado de estrogênio sem a proteção
tinência fecal não cirúrgica e para melhorar progesterônica.
o desempenho sexual (homens e mulheres) • Anticolinérgicos. São utilizadas a oxibutinina
e a tolterodina, cujos principais efeitos cola- mica da saída vesical, sendo aconselhado no
terais são boca seca, aumento da frequência entanto, fazer parte do procedimento a cor-
cardíaca, constipação instestinal, turvação reção por via vaginal de qualquer alteração
visual, tontura e hipotensão ortostática. Po- do equilíbrio do assoalho pélvico. Apresen-
dem ser utilizados no tratamento da incon- tam menos eficácia quando ocorre disfunção
tinência de urgência. intrínseca do esfíncter.
• Antidepressivos tricíclicos. A imipramina Não obstante o sucesso conseguido com
apresenta vantagem na abordagem tera- a colposuspensão extraperitonial (espa-
pêutica da incontinência de esforço mista ço de Retzius) atingir percentuais de 71 a
e na instabilidade do detrusor, por combi- 95%, deve ser alertado, que em relação à
nar propriedades alfa-adrenérgicas e anti- técnica de Burch, tem sido comprovado que
colinérgicas. a simples elevação da parede vaginal ante-
• Inibidores da recaptação de serotonina e rior pode alterar o eixo da parede posterior,
norepinefrina. A duloxetina é a droga de expondo-a a uma maior pressão oriunda do
escolha. Pode ser utilizada tanto na incon- interior do abdome. Uma cistocele poderia
tinência de urgência, como na incontinência tender a adquirir mobilidade, como resul-
de esforço, em virtude de apresentar ação tado da elevação da parede anterior, o que
nos receptores 5-HT e a-1 adrenérgico, au- condicionaria maior tendência para o des-
mentando a capacidade vesical e a pressão garro do suporte de sustentação do ápice
no esfíncter uretral estriado. e da parede posterior, associado à falta de
reparo do relaxamento do assoalho pélvico,
condicionando o aparecimento mais adiante
8.2. Tratamento cirúrgico
de enterocele e retocele. Retenção urinária
Colporrafia vaginal anterior (cirurgia de pós-operatória e instabilidade do detrusor
Kelly-Kennedy). A abordagem cirúrgica re- também têm sido relatadas.
presenta o procedimento mais comumente Alça (sling) pubovaginal tradicional. Nas
empregado, na dependência do tipo de IUE, pacientes com insuficiência esfincteriana, as
baseando-se na reconstituição do ângulo técnicas de sling são mais indicadas. O mate-
uretrovesical posterior. Um dos procedimen- rial utilizado pode ser autólogo (aponeurose
tos cirúrgicos muito utilizados foi a operação dos retos abdominais e fáscia lata) ou hete-
de Kelly-Kennedy, que consiste no preguea- rólogo (fáscia liofilizada de cadáver). Outra
mento horizontal através de sutura objetivan- opção é a aplicação de uma faixa de poli-
do o reforço da fáscia pubocervical, tendo propileno por via vaginal sem tensão (ten-
como ponto de abordagem cirúrgica a parede sion free vaginal tape- TVT), passando sob a
vaginal. A parede vaginal anterior é apoiada uretra como se fosse uma tipoia, o processo
principalmente pela aponeurose pubocervi- de cicatrização e fibrose elevando a uretra e
cal. Essa aponeurose situada por baixo e ao reduzindo o ângulo uretrovesical posterior.
redor da uretra é mais espessa e mais densa Deve ser salientado, que nas técnicas de alça
do que na área inferior da bexiga. (sling) ou de fita (TVT), existe necessidade
Uretropexia retropúbica. Consiste na sus- da realização de cistoscopia intraoperatória
pensão retropúbica do colo vesical, realizada para maior segurança do procedimento uro-
por via abdominal extraperitonial, com aces- ginecológico.
so ao espaço de Retzius, estribando-se na Neuromodulação. É a implantação de esti-
fixação da fascia endopélvica periuretral ou muladores na raiz do nervo sacro em pacien-
perivesical aos ligamentos iliopectíneos de tes com hiperatividade detrussora.
Cooper (operação de Burch) e na suspensão Injeções de botox. Ultimamente tem sido
e fixação da fáscia endopélvica à face pos- preconizado o emprego de injeções de botox,
terior do púbis – periósteo – (operação de baseado no princípio de liberação de acetilco-
Marshall-Marchetti-Krantz). Todos esses pro- lina, com atuação nas terminações nervosas
cedimentos cirúrgicos visam evitar a hiper- colinérgicas periféricas.
mobilidade uretral e a consequente incon-
tinência urinária de esforço. Essas cirurgias
têm demonstrado bons resultados na cura
da IUE causada por hipermobilidade anatô-
progressão da infecção do trato urinário superior resultar da simples multiplicação na urina sem
para pielonefrite enfisematosa, abscesso renal, invasão do tecido. O início e a persistência de
abscesso corticomedular, necrose perinefrítica qualquer processo infeccioso dependem da ade-
ou papilar. São comuns em mulheres, resultam rência do micro-organismo a superfícies muco-
em considerável morbidade e custo, e são difí- sas do hospedeiro através de uma estrutura bac-
ceis de lidar na prática clínica. teriana chamada “pelo” ou pili (adesina). Na ITU
este processo é mais evidente porque existem
A diferença entre ITU complicada e não
receptores nas células do hospedeiro que apre-
complicada é muito importante para o clínico.
sentam uma afinidade específica pelas adesinas
Uma infecção não complicada é um episódio de
o que determina uma ligação estereoquímica de
cistouretrite seguido de colonização da mucosa
encaixe entre adesina-receptor levando a uma
da uretra e da bexiga, sem comprometimento
perfeita fixação do micro-organismo à mucosa.
do trato urinário alto. Este tipo de infecção é
considerado não complicado porque raramen- Todas as porções do trato urinário podem
te leva à sequela, exceto quando ocorre mor- correr risco, desde que um dos seus sítios torne-
bidade causada pela reinfecção ou recidivas -se infectado. No entanto, durante a gravidez, o
em mulheres. As mulheres jovens geralmente entendimento desta afirmação deve ser amplia-
apresentam pielonefrite não complicada que da, considerando-se os riscos potenciais de com-
respondem bem à terapia antimicrobiana. A ITU plicações decorrentes da BA. Há duas vias de in-
complicada ocorre na gravidez, diabetes, imu- fecção dos rins: infecção hematogênica, ou seja,
nossupressão, pielonefrite prévia e anormalida- pela corrente sanguínea, e infecção ascendente,
de estrutural do trato urinário e os sintomas du- a partir da via urinária baixa. A infecção ascen-
ram por mais de duas semanas. Nas infecções dente é, claramente, a via mais comum pela qual
complicadas, há o envolvimento do parênquima as bactérias têm acesso ao rim. O primeiro passo
(pielonefrite ou prostatite) e ocorrem frequen- para a patogenia da infecção ascendente parece
temente, na presença de uropatia obstrutiva ou ser a colonização da uretra distal e introito vagi-
após instrumentação. Os episódios podem ser nal por coliformes, pela capacidade de adesão às
refratários à terapia, apresentarem recidivas e células vaginais ou da uretra.
ocasionalmente acarretam sequelas como sep-
Mudanças do trato urinário inferior na
se, abscessos metastáticos e mais raramente in-
Gravidez ocorrem quando fatores mecânicos e
suficiência renal aguda (IRA).
hormonais relacionados à condição gravídica in-
duzem alterações no sistema coletor renal que
levam à estase urinária, que é fundamental para a
3. Patogênese
gênese da infecção do trato urinário nesse perío-
Uma possível prevenção e a detecção pre- do. Estas mudanças podem ser detectadas já na
coce de ITUs dependem do conhecimento da 6a semana de gestação e vão desaparecer entre
patogênese e da epidemiologia. A infecção do a 6a e 12a semana após o parto. A patogênese
trato urinário (ITU) é uma das doenças bacteria- não está completamente definida e provavel-
nas mais comuns; a conduta clínica adequada mente está relacionado a mais de um fator, com
exige o conhecimento do número e tipos de diferentes contribuições hormonais e/ou mecâ-
bactérias envolvidas. Assim, quando métodos nicas em cada fase da gestação. A dilatação ure-
quantitativos ou semiquantitativos são usados, teral durante a gravidez resulta de compressão
o exame bacteriológico de urina pode ser uma externa, alterações intrínsecas da parede urete-
ajuda valiosa no diagnóstico e no controle tera- ral e efeitos hormonais. Altas concentrações de
pêutico. A urina é um excelente meio de cultura progesterona reduzem o tônus, o peristaltismo
para a maioria dos micro-organismos que infec- e a pressão de contração ureteral e levam à dila-
tam o trato urinário e o crescimento bacteriano tação da pelve calicial e dos ureteres superiores
pode ocorrer na urina “in natura”, resultando em (hidroureter fisiológico da gestação). Hidronefro-
contagens elevadas em infecções estabelecidas se ocorre normalmente e é mais comum no lado
e não tratadas, ou mesmo por contaminação da direito (90%). A compressão externa do ureter
genitália externa. direito pode ser devido à dextrorrotação do úte-
A bacteriúria pode ocorrer em várias con- ro pelo cólon sigmoide, torcendo para o lado o
dições clínicas que envolvam a invasão microbia- ureter, quando este cruza a artéria ilíaca direita
na de qualquer tecido do trato urinário ou pode ou a veia ovariana direita. O sistema de coleta
dilatado pode armazenar 200 a 300 mL de urina, gura 1) os períodos da vida onde os fatores de
servindo assim como um excelente reservatório riscos são preponderantes para UTIs. O gráfico
de bactérias, que podem aumentar o risco de de- mostra o aumento aparente da prevalência de
senvolvimento de pielonefrite. bacteriúria sintomática com o avanço da idade.
A ITU tem sido associada com a idade, gravidez,
Os sítios mais comuns de infecção do tra-
relações sexuais, uso de diafragma como anti-
to urinário, na mulher, são a uretra e a bexiga.
conceptivo, preservativos tipo “camisinha”, uso
Os fatores de risco de contaminação do trato
de espermicidas, micção pós-coito demorada,
urinário podem ocorrer em todas as fases de
menopausa e história anterior recente de ITU.
vida. Kunin et al. resumiram em um gráfico (fi-
Figura 1 – Frequência e distribuição de ITU e BA por idade e sexo. Fonte: LEVI; RELLER, 2009.
produto conceptual (embrião/feto e placenta). Por gravidez, sendo causa frequente de dor e inter-
estes motivos, o conjunto do diagnóstico precoce, nação nesse período. Cerca de 0,026-1,14% das
seguido de terapêutica adequada e imediata, é im- gestações são complicadas por litíase urinária.
prescindível durante a assistência pré-natal, evitando
comprometer o prognóstico materno e gestacional.
4. Etiopatogenia
Sabe-se que a redução da capacidade
renal de concentrar a urina durante a gravidez O perfil microbiológico das infecções uri-
reduz a atividade antibacteriana deste fluido, nárias na gravidez é bem conhecido. A Escheri-
passando a excretar quantidades menores de chia coli é o uropatógeno mais comum, sendo
potássio e maiores de glicose e aminoácidos, responsável por mais de três quartos dos casos.
além de produtos de degradação hormonal, Por isso, a terapêutica inicial necessariamente
fornecendo um meio apropriado para a proli- deve levar em consideração o padrão de sensibi-
feração bacteriana. Neste período, observa-se lidade desse micro-organismo aos antimicrobia-
também que a urina da grávida apresenta pH nos propostos. O gráfico 2 mostra a ocorrência
mais alcalino, situação favorável ao crescimento de micro-organismos isolados de cultura de uri-
das bactérias presentes no trato urinário. Adi- na no ano de 2009 em um laboratório de Forta-
cionalmente, o hiperestrogenismo gestacional leza (dados fornecidos pelo LabPasteur-DASA). O
contribui para a adesão de certas cepas de Es- gráfico mostra a mesma etiologia de publicações
cherichia coli, portadoras de adesinas tipo 1, às na literatura em relação à Escherichia coli, Entero-
células uroepiteliais. Assim, parece claro que, bacter spp e Klebsiela spp, que juntas respondem
durante a gravidez, fatores mecânicos e hor- por 85% a 90% das infecções durante a gravidez.
monais contribuem para provocar mudanças Nestes resultados estão contempladas amostras
no trato urinário materno, tornando-o mais sus- de pacientes ambulatoriais e hospitalizados daí
ceptível às formas sintomáticas de infecções. A o aparecimento de micro-organismos comuns a
urolitíase também pode facilitar a ocorrência de infecções hospitalares como Pseudomonas aeru-
quadros de infecção do trato urinário durante a ginosa e Acinetobacter baumanii.
Gráfico 1 - Distribuição dos microrganismos isolados em culturas de urina no LabPasteur de janeiro - dezembro de
2009 (%)
Esccol - E. coli; Stasap - S. saprophyticus; Mormor - M. morganii; Entkos - E. koseri; Klepne - K.pneumoniae;
Entclo - E. cloacae; Pseaer - P. aeruginosa; Entfec - E. faecalis; Promir - P. mirabilis; Acibau - A. baumannii;
Entaer - E.aerogenes; Entfae - E.faecium; Sermar - S. marcescem
vezes, os critérios de Kass são pouco sensíveis. petido na 16a semana de gestação. Alguns autores
Em crianças que não controlam a micção e apre- recomendam repetição da urocultura no segundo
sentam um tempo menor de permanência da e terceiro trimestre da gestação, principalmente se
urina na bexiga, o método de Stamm com ape- a paciente tem história prévia de ITU de repetição
nas 103 UFC/mL de urina é mais sensível. Utilizan- ou refluxo vesicoureteral.
do somente os critérios de Kass, a possibilidade
A cistite acomete aproximadamente 1%
de culturas falso-negativas seria elevada uma
das mulheres grávidas. A cultura de urina deve
vez que mulheres com cistite aguda e bacteri-
ser considerada positiva quando apresentar uma
úria inferior a 105 UFC/mL seriam interpretados
contagem maior ou igual a 103 UFC/mL em ges-
como “não infectadas”, segundo tais critérios.
tantes com sintomas agudos e piúria. Para urina
Já no caso de utilização dos critérios de Stamm,
coletada por cateterização a contagem de UFC/
para estes mesmos casos, o número de culturas
mL padronizada como positiva também é maior
positivas provavelmente seria mais significativo.
ou igual a 103 UFC/mL. Os micro-organismos iso-
Alguns autores corroboram esta discussão su-
lados da urina de pacientes com cistite aguda
gerindo que ambos os critérios devam ser utili-
em gestantes são os mesmos encontrados em
zados, sempre acompanhados de dados clínicos
mulheres não grávidas.
compatíveis para que se diagnostique correta-
mente a ITU. Atualmente, os critérios de Stamm A Pielonefrite aguda não complicada na
são utilizados para crianças e mulheres jovens. gestante se desenvolve em decorrência de uma
bacteriúria assintomática não tratada. Duas mu-
Em pacientes sintomáticos ou assinto-
danças fisiológicas acontecem na gravidez, pre-
máticos contagens maiores que 105 UFC/mL
dispondo a gestante à infecção ascendente do
são indicativas de infecção recomendando-se
trato urinário, levando à pielonefrite: altas con-
a identificação e sensibilidade do micro-orga-
centrações de progesterona secretadas pela
nismo isolado. Em mulheres, segundo Kass, se
placenta com efeito inibitório sobre a peristalse
duas amostras sucessivas de urina, colhidas
uretral e a compressão dos ureteres pelo útero
por micção espontânea, isolarem o mesmo mi-
gravídico. A cultura de urina para diagnóstico de
cro-organismo com uma concentração de 105
pielonefrite segue o mesmo processo para ure-
UFC/mL, a probabilidade de ITU é de 95%. Em
trites, tendo como ponto de corte 103 UFC/mL.
crianças, casos de ITU podem vir acompanha-
dos de bacteriúria com valores aproximados de
103 UFC/mL podendo passar despercebida se 5.2. Coleta
utilizados os critérios propostos por Kass.
A coleta de urina para cultura deve ser de
A BA ocorre em 10% das mulheres grávidas preferência realizada no laboratório sob supervi-
e quando não tratada acarreta o desenvolvimento são e orientação do pessoal do setor de coleta. O
de cistite em aproximadamente 30% e de pielone- processamento laboratorial deve ser feito, o mais
frite em mais de 40%. O diagnóstico da bacteriúria rápido possível, dentro de duas horas se a urina for
assintomática deve ser baseado na cultura de uri- mantida em temperatura ambiente e se refrigera-
na do jato médio coletada com técnica asséptica. das a 4ºC até o momento da semeadura, o mais
Em gestantes assintomáticas, duas culturas conse- rápido possível, no prazo máximo de 24 horas.
cutivas positivas com o mesmo agente com uma
contagem acima de 105 UFC/mL de urina confir- A coleta deve ser feita pela manhã, prefe-
mam a ocorrência de bacteriúria assintomática. rencialmente da primeira micção do dia, ou en-
Uma vez que a bacteriúria aumenta a probabili- tão após retenção vesical de duas a três horas.
dade de risco de complicações para a gestante, Crianças:
esta deve ser pesquisada nas primeiras visitas do Assepsia rigorosa prévia dos genitais com
pré-natal. Se o resultado for negativo deve ser re- água e sabão neutro, e posterior secagem com gaze
estéril. O Ideal é jato intermediário (jato médio) es- alta especificidade e uma baixa sensibilidade.
pontâneo. Bem indicado em crianças que urinam Stamm et al.,(1982) comprovaram que mulheres
sob comando, usado também em lactentes. Em com síndrome clínica de disúria, urgência uriná-
lactentes em que não se consegue coletar através ria e piúria apresentavam culturas com conta-
do jato médio, pode-se usar o saco coletor de urina, gem de UFC entre 102 a 104 UFC/mL com boa
porém a troca deve ser realizada de 30 em 30 minu- sensibilidade e especificidade (tabela 1). Portan-
tos e, ao trocar o coletor, refazer a assepsia. Em casos to, recomenda-se que os laboratórios utilizem
especiais (RN, lactentes de baixo peso, resultados os critérios propostos por Stamm e comecem a
repetidamente duvidosos) indicar punção vesical detectar microrganismos a partir de 102 ou 103
suprapúbica, que deverá ser realizada por médico. UFC/mL, utilizando diluição com alças calibradas
de 0,01 ou 0,001 respectivamente.
Adultos sexo feminino:
A coleta de amostras do sexo feminino deve O resultado da cultura de urina deve ser
ser supervisionada pessoalmente por uma enfer- sempre avaliado com outros recursos diagnós-
meira ou auxiliar treinada. O processamento labora- ticos e sinais e sintomas clínicos por ser um
torial deve ser feito dentro de duas horas. Caso não recurso diagnóstico de síndromes clínicas de
seja possível, as amostras deverão ser refrigeradas apresentações diversas com fatores de riscos
a 4ºC até o momento da semeadura (no máximo para complicações localizadas ou sistêmicas.
de 24 horas). Remover toda a roupa da cintura para
No quadro abaixo apresentamos os crité-
baixo e sentar no vaso sanitário. Separar as pernas
rios interpretativos padronizados para os tipos
tanto quanto for possível. Afastar os grandes lábios
de materiais e tipo de infecção.
com uma das mãos e continuar assim enquan-
to fizer a higiene e coleta do material. Usar uma
gaze embebida em sabão neutro, lavar de frente Tabela 2 - Critérios interpretativos padronizados
para trás e certificar-se que está limpando por en- para os tipos de materiais e tipo de infecção.
tre as dobras da pele, o melhor possível. Enxaguar
com uma gaze umedecida, sempre no sentido de
Tipo de
frente para trás. Continuar afastando os grandes lá- Material UFC/mL de urina
infecção
bios para urinar. O primeiro jato de urina deve ser
desprezado no vaso sanitário. Colher o jato médio Urina
urinário no frasco fornecido pela enfermagem (um coletada
por cateter Todas ≥ 102 UFC/mL*
pouco mais da metade do frasco). Evite encher o
ou punção
frasco, fechar bem e caso haja algum respingo na
supra-púbica
parte externa do frasco, lave-o e enxugue-o.
Cistite não
Adultos sexo masculino: Urina de jato
complicada com ≥ 105 UFC/mL
A coleta deve ser feita pela manhã, prefe- médio
sintomas leves
rencialmente da primeira micção do dia, ou en-
Urina de jato Cistite com sinto-
tão após retenção vesical de duas a três horas. ≥ 10³ UFC/mL*
médio matologia aguda
Pacientes cateterizados com sistema de dre- Urina de jato Pielonefrite
nagem fechada: ≥ 10³ UFC/mL*
médio aguda
Colher a urina puncionando-se o cateter
Urina de jato Bacteriúria assin- 2 culturas com C/C
na proximidade da junção com o tubo de dre-
médio tomática ≥ 105 UFC/mL
nagem. Não colher a urina da bolsa coletora.
No pedido laboratorial deverá constar que o
paciente está cateterizado.
6. Diagnóstico por imagem
Usado nos casos de identificação de in-
5.3. Critério interpretativo de positividade: fecção urinária complicadas, para identificar
O critério de contagem de colônia para in- anormalidades do trato urinário e para o diag-
fecção urinária proposto por Kass (1956) deter- nóstico de complicações relacionadas à própria
mina a contagem ≥ 105 UFC/mL como limite de ITU ou a infecções recorrentes. Este tipo de in-
positividade. Contudo, no caso de pacientes do vestigação tem por objetivo avaliar anomalias
sexo feminino com infecção urinária sintomática renais, estabelecer a presença ou não de refluxo
não complicada, este limite corresponde a uma vesicoureteral RVU e definir a conduta apropria-
da que possa evitar a injúria renal. Recomenda- devem receber cuidados profiláticos de nitrofu-
-se a exploração do trato urinário em pacientes rantoína durante toda a gestação e no puerpério.
com bacteriúria assintomática, ITU com sinais
Considera-se como melhora clínica a re-
clínicos de pielonefrite, infecção urinária acom-
missão do quadro clínico agudo, principalmente
panhada de massa abdominal, hipertensão ou
da febre, dor lombar e sintomas sistêmicos ge-
déficit de função renal.
rais (náuseas, vômitos, mal-estar). Na gravidez
deve ser evitado o uso de quinolonas devido ao
risco de causar alteração na cartilagem fetal.
7. Conduta terapêutica
Tratamento antimicrobiano em gestantes
Na bacteriúria assintomática, embora re- 8. Prevenção
ferida, não está comprovada a associação com
As mulheres com ITU de repetição, ou
parto prematuro. Seu tratamento é de suma im-
seja, mais de três episódios por ano, serão
portância, pois impede o desenvolvimento de
aconselhadas a tomar antibióticos de baixas do-
pielonefrite em 80% dos casos. Esse tratamento
ses por um longo período para a prevenção de
pode ser feito com administração de agentes
recidivas. A administração de SMX-TMP (80/400
orais apropriados, no caso a amoxicilina 500mg,
mg), TMP isolada (100 mg) ou nitrofurantoína
3 x dia, durante sete dias ou cefalexina (500mg,
(50-100 mg) diariamente ou 3 vezes por sema-
4/dia, por 7 dias). Outra forma de tratar seria
na, tem sido eficaz. São orientadas, também,
com o uso de nitrofurantoína (100mg, via oral,
para evitar o uso de espermicidas e urinar logo
4/dia, durante sete dias).
após o intercurso sexual. Mulheres com bacte-
É fundamental uma cultura após 10 dias riúria assintomática o uso de profilaxia é reco-
do final do tratamento. Se esse exame for posi- mendado, podendo ser a mesma utilizada nas
tivo, está indicado tratamento de longa duração mulheres com ITU de repetição.
e talvez a sua manutenção por toda a gravidez.
No tratamento da cistite, podem ser usa-
das as mesmas drogas utilizadas na terapêutica
D- Referências Bibliográficas
da bacteriúria assintomática. Nessa situação a ANVISA, Agência Nacional de Vigilância Sanitá-
medicação deve ser iniciada antes do resulta- ria. Manual de Microbiologia Clínica para o
do do exame de cultura e do antibiograma e Controle de Infecção em Serviços de Saúde.
ajustada após o recebimento do resultado da Brasília: Agência Nacional de Vigilância Sanitá-
cultura e antibiograma. ria. 1. ed. Mod. 1, p.01-05, 2004.
A pielonefrite aguda é tratada normal-
DUARTE G, MARCOLINI A C, QUINTANA S M,
mente com hospitalização e antibióticos intra-
CAVALI R C. Infecção urinária na gravidez. Re-
venosos (cefazolina, ceftizoxima, gentamicina).
vista Brasileira de Ginecologia e Obstetricia,
Outra opção seria a ceftriaxona, 1g intramuscu-
Rio de Janeiro, v.30, n.2, p.93-100, fev. 2008.
lar, repetida após 24 horas, seguida de cefalexi-
na, 500 mg, via oral, 4/dia, por 10 dias. STAMM W E. Urinary Tract Infection, Pyelone-
Na gestação a cistite aguda pode ser tra- phritis, and prostatitis In: FAUCI A S, KASPER L
tada com amoxicilina, nitrofurantoina ou uma D, LONGO D L. Harrison´s Principles of Inter-
cefalosporina durante 7 dias. Em gestantes com nal Medicine The McGraw-Hill Companies, Inc.
pielonefrite, está indicada a hospitalização e an- 17.ed. Chicago, p. 1820-26, 2008
tibioticoterapia parenteral em geral com cefalos- FUNAI E F. Renal and urinary tract physiology
porinas. Recomenda-se a realização de culturas in pregnant women. 2008. Disponível em: Offi-
periódicas até o fim da gravidez. Se a infecção cial reprint from UpToDate® www.uptodate.com.
reaparecer, as pacientes devem ser tratadas no- Acesso em 09 fev 2010.
vamente com regime de permanente medicação
com nitrofurantoína, 50-100 mg, cada noite antes HOOTON T H, STAMM W E. Urinary tract infec-
de dormir ou sulfametoxazol (SMX-TMP) 80/400 tions and asymptomatic bacteriuria in preg-
mg também à noite. A ocorrência de recidiva su- nancy. 2009.
gere anormalidades do trato urinário e deve ser
investigada. Gestantes com pielonefrite crônica
2.4.2. Critérios médicos de elegibilidade boa atenção preventiva, mas não tem relação
com o uso seguro do método anticoncepcional.
Os critérios de elegibilidade médica para
Categoria D: não somente desnecessários,
uso de métodos anticoncepcionais foram de-
mas irrelevantes para o uso seguro do méto-
senvolvidos pela Organização Mundial de Saúde
do anticoncepcional.
(OMS, 1996) com o objetivo de auxiliar os profis-
sionais da saúde na orientação das usuárias de
Quadro 2- Procedimentos para iniciar o uso de ACO
métodos anticoncepcionais. Não deve ser con-
Procedimento Categoria
siderada uma norma estrita, mas sim uma reco-
Exame pélvico (especular e toque bima-
mendação, que pode ser adaptada às condições C
nual)
locais de cada país. Consiste em uma lista de Medida de pressão arterial B
condições das usuárias, que poderiam significar Exame das mamas B
limitações para o uso dos diferentes métodos, e Triagem para DST por testes de laborató-
C
as classifica em 4 categorias, de acordo com a rio (indivíduos assintomáticos)
definição no quadro 1. Triagem para câncer de colo uterino C
Testes laboratoriais rotineiros (colesterol,
D
glicose, enzimas hepáticas)
Quadro 1- Critérios de elegibilidade Pontos específicos para orientação sobre
OMS 1: O método pode ser usado sem restrições. ACOC: Eficácia; efeitos colaterais co-
OMS 2: O método pode ser usado. As vantagens ge- muns; uso correto do método, incluindo
ralmente superam riscos possíveis ou comprovados. A
instruções para pílulas esquecidas; sinais
As condições da categoria 2 devem ser consideradas e sintomas para os quais deve procurar o
na escolha de um método. Se a mulher escolhe este serviço de saúde; proteção contra DST
método, um acompanhamento mais rigoroso pode Orientação sobre mudanças no padrão
ser necessário. A
menstrual.
OMS 3: O método não deve ser usado, a menos que
o profissional de saúde julgue que a mulher pode
usar o método com segurança. Os riscos possíveis 2.4.4. Momentos apropriados para iniciar o uso
e comprovados superam os benefícios do método. Na maioria dos casos, a primeira cartela de
Deve ser o método de última escolha e, caso seja
anticoncepcional deve ser iniciada no primeiro dia
escolhido, um acompanhamento rigoroso se faz
do ciclo menstrual. Porém existem casos especiais
necessário.
OMS 4: O método não deve ser usado. O método
em que se deve analisar a tabela seguinte:
apresenta um risco inaceitável. Quadro 3- Momentos para início de ACO
Precaução
Esquema para início extra neces-
2.4.3. Procedimentos para iniciar o uso do de contraceptivos Dia de início sária para
método combinados orais contracep-
ção?
O procedimento para iniciar o uso do
Dia 1-5 do ciclo Nenhuma
método, relacionado abaixo, está classifica- Com menstruação
Após o 5o dia 7 dias
do em quatro categorias. Estes critérios foram Pós-parto: Minipílula
desenvolvidos por um grupo de agências co- - Aleitamento Dia 21 ou espere Nenhuma
laborativas da United States Agency for Inter- - Não aleitamento o próximo ciclo Nenhuma
national Devlopment (USAID) e são orientados - Abortamento Próximo dia
fundamentalmente para salientar os requisitos Troca imediata,
mínimos para a oferta de métodos anticoncep- não fazer parada
cionais em regiões com poucos recursos. Mudando: de uma semana
Nenhuma
- Vindo de ACO Troca imediata
Categoria A: essencial e obrigatório em todas - Vindo da minipílula Iniciar ACO
as circunstâncias para o uso do método anti- Nenhuma
- Vindo da injetável enquanto ainda
Nenhuma
concepcional. ou implante estiver prote-
Categoria B: médica/epidemiologicamente gida por outro
racional em algumas circunstâncias para oti- método
mizar o uso seguro do método anticoncep- 1o ou 2o dia da
cional, mas pode não ser apropriado para to- Após pílula do dia menstruação,
Nenhuma
das as clientes em todos os contextos. seguinte com fluxo cor-
reto
Categoria C: pode ser apropriado para uma
ACO pode mascarar marcadores sanguíneos Proteção contra gravidez ectópica: devido à
de menopausa como o nível de estradiol e de supressão da ovulação.
hormônio folículo estimulante (FSH). Esse efeito Previnem doença benigna de mama.
desaparece após seis semanas de interrupção Reduzem o risco de neoplasia de ovário.
das pílulas de ACO e os níveis desses marcado- Reduzem o risco de neoplasia de endométrio:
res podem ser confiáveis. A dosagem pode ser reduz em 50%.
repetida 1-2 meses depois e caso os níveis de Proteção contra câncer cólon-retal.
FSH sejam repetidamente maiores que 30 IU/L Promovem regressão de cistos funcionais
consideram-se sugestivo de falência ovariana. ovarianos.
Em tais casos, mulheres com mais de 50 anos Endometriose.
são aconselhadas a continuar a contracepção Proteção contra acne.
por mais um ano e mulheres com menos de 50 Prevenção da perda da densidade mineral óssea.
anos devem continuar a contracepção por mais Proteção contra artrite reumatoide: redução
dois anos. A contracepção pode ser descontinu- de 30% da incidência.
ada se a amenorreia persistir. Melhora anemia.
Pensando nos efeitos colaterais que
o ACO pode acarretar, é importante saber 2.9. Efeitos colaterais dos ACO
as situações em que se deve suspender o
São pouco frequentes com os anticon-
ACO: diminuição da acuidade visual, papi-
cepcionais de baixa dosagem e com progesto-
ledema, dor precordial, hemoptise (suspei-
gênios mais seletivos utilizados no momento
tar de embolia pulmonar), massa hepática.
atual, podendo surgir nos primeiros três meses
Além dessas, existem outras situações como
de ingestão, que é o período de adaptação, po-
amenorreia (afastar gravidez), sangramento
rém caso haja persistência, aconselha-se a troca
intermenstrual, nódulo mamário, dor em hi-
para outro produto ou método.
pocôndrio direito ou icterícia, epigastralgia
(pensar em trombose mesentérica ou IAM), Em geral, esses efeitos são atribuídos aos
enxaqueca em que o ACO pode ser continu- componentes das formulações. Aos estróge-
ado até a confirmação diagnóstica. nos são referidos os seguintes efeitos: cefaleia,
tontura, náuseas e vômitos, mastalgia, edema,
irritabilidade e cloasma; nos cíclicos acrescen-
2.8. Outros efeitos benéficos dos ACO tam-se: alterações visuais e ganho de peso. En-
quanto ao progestágeno se atribuem: ansieda-
Alta eficácia: tomada correta e consistente-
de, depressão, insônia, cansaço, alterações da
mente, a pílula de ACO é extremamente efeti-
libido, amenorreia, acne, ganho de peso, sensi-
va para prevenir gravidez com índice de falha
bilidade mamária, vertigem.
de 0,1-3/ 100 mulheres por ano. A eficácia do
método, para cada caso individual, depende- Outros paraefeitos:
rá fundamentalmente da maneira como a mu-
Tromboembolismo (TEV). É a principal com-
lher toma as pílulas e a orientação adequada.
plicação do método e a mais temida, causada
Reversibilidade: pode ocorrer um atraso no
pelo componente estrogênico. Pode ser divi-
retorno da fertilidade até um ano, mas não há
dido em venoso ou arterial. O etinil-estradiol
comprometimento a longo prazo, indepen-
produz efeitos na cascata da coagulação, au-
dentemente da duração da utilização.
mentando os fatores II, V, VII, IX, X, XII e dimi-
Redução do fluxo menstrual.
nuindo fatores anticoagulantes como a Anti-
Diminuem a frequência e a intensidade da
trombina III. Além disso, aumenta as plaquetas
dismenorreia.
em número, aderência e agregação, aumenta
Previsibilidade da menstruação: por regulari-
o tromboxane A2 e diminui as prostraciclinas.
zar os ciclos menstruais
Estudos recentes sugeriram que dois novos
Promovem alívio dos sintomas da tensão pré-
progestágenos, o Gestodeno e o Desogestrel
-menstrual (TPM)
foram associados a maior risco de TEV em re-
Proteção contra doença inflamatória pélvica
lação aos progestágenos mais antigos, como
(DIP): devido à redução da penetrabilidade do
o Levonorgestrel. No entanto, a mortalidade
colo do útero por aumento da viscosidade do
por TE entre as usuárias de ACO é muito bai-
muco cervical.
xa, e é afetada pela idade (maior mortalida-
de entre 35 e 44 anos) e pela obesidade, por à glicose oral, mas não há aumento na inci-
exemplo. Não há evidências de que o fumo dência de diabetes. O aumento da resistência
ou a presença de varizes aumente o risco de insulínica é um fator importante no desenvol-
TE. Mulheres com um fator de risco maior vimento de doença cardiovascular, mas o ACO
para TEV (história de TVE, história na família não altera as taxas de doença cardiovascular
de TVE em parente de primeiro grau com < 45 de maneira significativa.
anos, grande cirurgia com tempo prolongado Efeitos no fígado e vias biliares: Os ACOs
de imobilização, longo tempo imobilizado ou de alta dosagem alteram o transporte de bile,
anemia falciforme) ou vários fatores de risco podendo gerar icterícia colestática. Podem
menores para TVE. elevar a incidência de cálculos biliares princi-
Obs.: Grande cirurgia sem tempo prolonga- palmente no primeiro ano de uso, por efeito
do de imobilização, índice de Massa Corpórea estrogênico, que parece aumentar a satura-
(IMC > 30) não deveria ser prescrito ACO. ção de colesterol.
Doença cardiovascular (IAM, AVC, TVE) e Tumores hepáticos: Há controvérsias quanto
hipertensão. Estudos maiores indicam que ao aumento do risco de adenomas, nos casos
não há aumento do risco de IAM ou AVC entre de maior duração e de maiores doses.
as mulheres sadias e não fumantes em uso de
ACO. O risco de AVC isquêmico entre usuárias
2.10. Contraindicações
de ACO aumenta pelo fumo e pela dose de
estrógeno, além da idade entre 40 e 44 anos, As contraindicações são divididas em ab-
hipertensão e enxaqueca com aura. Quanto solutas e relativas.
ao risco de AVC hemorrágico, aparentemente 1. Absolutas
não há correlação com os componentes, do- - Idade superior a 35 anos com tabagismo (mais de 15
ses ou duração de uso dos ACOs. O risco de cigarros ao dia).
IAM aumenta com a idade, hipertensão, dia- - Gravidez confirmada ou suspeita
betes e dislipidemias. - Lactentes com menos de seis semanas (até três se-
Câncer de mama: Há achados contraditórios manas pelo maior risco de tromboembolismo e de
entre os vários estudos de caso controle. De três a seis semanas devido à menor atividade enzi-
um modo geral os maiores estudos revelaram mática do lactente)
um aumento no risco relativo de 1,4 de cân- - No puerpério, em mulheres que não estejam lactan-
do, o ACO é contraindicado nas primeiras três se-
cer de mama em mulheres em uso de ACO,
manas.
este risco diminui após dez anos de suspen-
- Cirurgia de grande porte com imobilização prolon-
são do ACO. O câncer de mama em usuárias
gada
de ACO parece ser menos avançado clinica- - Neoplasia hormonal dependente
mente. História familiar de câncer de mama, - Câncer de mama declarado ou suspeito
duração de uso de ACO, idade do início, dose - Tumor hepático (benigno ou maligno)
do hormônio e o componente do hormônio - Cirrose hepática descompensada ou hepatite viral
não tem efeitos adicionais no risco de câncer ativa
de mama. A incidência de câncer de mama - Diabetes mellitus descompensado
em mulheres jovens, idade inferior a 30 anos, - Sangramento uterino anormal não diagnosticado
é bastante baixa, enquanto a incidência au- - Tromboflebite ou doenças tromboembólicas
menta com a idade. No entanto, ainda não há - Hipertensão arterial sistêmica grave (estágio II)
- As seguintes doenças cardiovasculares: cardiopatias
consenso a respeito.
congênitas cianóticas, hipertensão pulmonar, valvo-
Câncer de colo: Há controversas, pela maior
patias com fibrilação atrial, múltiplos fatores de risco
frequência de teste de Papanicolau entre as
para doença coronariana, IAM em andamento ou
usuárias e pelo menor uso de métodos de história de IAM, AVE em andamento ou passado de
barreira entre elas. AVE. Insuficiência cardíaca com aumento do risco de
Perfil lipídico: Os progestágenos derivados trombogênese.
da 19-nortestosterona diminuem o HDL e - Lúpus eritematoso sistêmico complicado com nefro-
aumentam o LDL, contrariamente ao efeito patia ou síndrome de anticorpo antifosfolípide
estrogênico. Os progestágenos mais recentes - Enxaqueca com aura
têm menos efeitos deletérios.
Afeta o metabolismo carboidrato: O com-
ponente progestagênico altera a tolerância
Existem duas maneiras em que a inges- SPENCER, A.L.; BONNEMA, R.; MCNAMARA,
tão de outras drogas pode reduzir a eficácia do M.C. Helping Women Choose Appropriate Hor-
ACO. A primeira baseia-se na indução de enzi- monal Contraception: Update on Risks, Ben-
mas hepáticas as quais conduzem a um aumen- efits, and Indications. The American Journal of
to no metabolismo e eliminação de estrogênio Medicine v.122, p.497-506, 2009.
e progestágeno. Este fato acontece com alguns
medicamentos anticonvulsivantes (barbitúricos, VANDENBROUCKE, J.P. et al. Oral Contraceptives
hidantoína e carbamazepina), antibióticos con- and the Risk of Venous Thrombosis. The New
tra tuberculose como rifampicina, antifúngico England Journal of Medicine v. 344, n. 20, p.
chamado griseofulvina e alguns antiretrovirais. 1527-1535, 2001.
Além disso, existe o efeito da circulação WEBBERLEY, H.; MANN, M. Oral contraception –
enterohepática. Etinilestradiol (EE) é sujeito a updated. Clinical Obstetrics and Ginecology v.
um intenso metabolismo de primeira passa- 16, p. 21-29, 2006.
gem. Metabólitos de glucoronídeo são pro-
cessados no fígado, mas uma vez que eles re-
entram no lúmen do intestino grosso, a flora
intestinal é capaz de remover o grupo gluco-
ronídeo e restaurar algum EE para reabsorção
e pode ajudar a manter seu nível na circulação.
Certos antibióticos de largo espectro pode al-
terar a flora intestinal e teoricamente reduzir a
reabsorção de EE. Esse efeito somente se aplica
a períodos curtos de terapia com antibiótico
C- ABORDAGEM TEMÁTICA
A incidência de gravidez indesejada é
bastante elevada mundialmente, a OMS estima
que metade das gestações seja indesejada, em
especial nos países em desenvolvimento. No
Figura 1- Pílula do dia seguinte.
Brasil, esse problema tem como principal causa
a relação sexual desprotegida ou com proteção
Capítulo 48
O aborto induzido é realizado por 750.000 primeira escolha devido sua maior efetividade
a um milhão de brasileiras por ano, sendo uma e menos efeitos colaterais, é realizada por meio
das principais causas de mortalidade materna, da administração de uma dose total de 1,5 mg
devido à escassez de meios adequados para sua de levonorgestrel dividida em dois comprimi-
realização, consequência da sua legalidade ser dos iguais de 0,75 mg, em um intervalo de 12
restrita para poucos casos. Nos Estados Unidos, horas, ou em dois comprimidos de 0,75 mg si-
o aumento do uso da contracepção de emer- multaneamente, em dose única (Quadro 1). Essa
gência contribuiu com mais de 43% no declínio última forma de administração simplifica o uso
total nas taxas de aborto entre 1994 e 2000. Essa desse método, como consequente, maior taxa
ampliação pode reduzir metade das gravidezes de adesão, sem aumento dos efeitos colaterais
não planejadas nos Estados Unidos, o que re- segundo estudos realizados pela Organização
sulta em 1,5 milhões de gravidezes não deseja- Mundial de Saúde (OMS).
das a menos, e metade dos abortos induzidos,
o que resulta em 700.000 abortos a menos. Po- Quadro 1- Anticoncepção de emergência hormonal
rém esse aumento no uso desse método requer ,75 mg de levonogestrel por
familiaridade com o mesmo, conhecimento do Levonogestrel
comprimido
público sobre a sua disponibilidade e acesso a 2 comprimidos Via oral Dose única
um serviço de saúde com médicos capacitados 1 comprimido Via oral A cada 12 horas
que possam prescrevê-lo com segurança.
AHOC c/ 30µg de etinilestradiol
Apesar das vantagens da contracepção de Método de Yuzpe e 150µg de levonogestrel por
emergência, existe uma ausência de conhecimento comprimido
na comunidade médica com relação ao uso corre- 4 comprimidos Via oral A cada 12 horas
to, indicações, contraindicações, interações medi- 8 comprimidos Via oral Dose única
camentosas, efeitos colaterais, mecanismo de ação AHOC c/ 50ug de etinilestradiol
e prescrição. De acordo com uma pesquisa reali- Método de Yuzpe e 250µg de levonogestrel por
zada entre ginecologistas, obstetras e médicos de comprimido
família dos Estados Unidos em 2000, apenas 20 a 2 comprimidos Via oral A cada 12 horas
25% usualmente discutiam contracepção de emer- 4 comprimidos Via oral Dose única
gência durante as consultas. Em outro estudo rea-
lizado em Nova York com pediatras, especialidade O método deve ser iniciado para uma me-
que vem abrangendo um crescente número de pa- lhor eficácia nas primeiras 72 horas após a rela-
cientes sexualmente ativos, foi encontrado a inex- ção sexual, podendo ser utilizado até cinco dias
periência como a principal razão para a não prescri- após o ato sexual com taxas de falhas maiores.
ção de métodos de contracepção de emergência.
O Ministério da Saúde do Brasil (MS) dis-
Há igualmente uma carência de conheci- ponibiliza o levonorgestrel comprimido 1,5 mg.
mento e de uso da contracepção de emergên- Esse método também pode ser encontrado no
cia entre as pacientes. Em 2000, um estudo com mercado com diferentes nomes comerciais,
mais de 500 mulheres americanas de idade entre como: POZATO®, NOGRAVID®,PILEM®, NORLE-
18 e 44 anos revelou que apenas 2% havia usado VO®, POSTINOR-2®.
esse método, e somente uma em quatro possuía
conhecimentos superficiais sobre contracepção
de emergência. Já outro trabalho realizado com 2. Método de Yuzpe
adolescentes cita início da vida sexual em 71%
O método de Yuzpe é realizado por meio
delas, enquanto apenas 30% conheciam a exis-
da administração de um estrogênio combinado
tência da contracepção de emergência.
a um progestágeno sintético com o objetivo de
Os métodos de contracepção de emer- contracepção de emergência, sendo a sua forma
gência existentes são: mais comum uma dose total de 200µg de etini-
lestradiol e 1mg de levonorgestrel dividida em
duas doses iguais, ministradas em um intervalo
1. Levonorgestrel isolado de 12 horas, ou em dose única. Como o levo-
A contracepção de emergência por meio norgestrel é o isômero ativo do norgestrel, uma
do uso do levonorgestrel isolado, método de dose equivalente de qualquer pílula contendo
norgestrel requer dose dupla de progestágeno.
do oral combinado quando usado como contra- gravidar. O uso da contracepção de emergência
cepção de emergência. Já o American College of reduz esse número para 20 mulheres.
Obstetricians and Gynecologists contraindica a
O método de apenas progestágeno pare-
contracepção de emergência em pacientes com
ce ser mais eficaz que o método combinado na
suspeita ou gravidez conhecida, com hipersensi-
prevenção da gravidez. Em um estudo rando-
bilidade a algum componente do produto, e com
mizado duplo-cego, a proporção de gravidezes
sangramento genital anormal sem diagnóstico.
prevenidas foi de 85% com o primeiro método
Recomenda-se a preferência pelo uso do e de 57% com o método de Yuzpe quando com-
método com apenas progestágeno em mulhe- parados com o grupo sem nenhum tratamento,
res com história de trombose idiopática, de aci- gerando um risco relativo entre os dois méto-
dente vascular cerebral, de enxaqueca severa, dos de 0,36.
ou de diabetes mellitus com complicações vas-
Já o índice de falha, número de gestações
culares. Baseado em casos esporádicos de gra-
por cem mulheres que utilizaram o método no
videz ectópica após o uso de contracepção de
período de um ano, para a contracepção de
emergência, é aconselhável uma atenção maior
emergência é estimado em 2%. Quando o levo-
com as pacientes em uso desse tratamento com
norgestrel isolado e o método de Yuzpe foram
antecedentes de doença inflamatória pélvica
iniciados em 72 horas e comparados, a taxa de
(DIP) ou gestação ectópica devido ao risco po-
gravidez foi de 1,1% para a progestágeno isola-
tencialmente aumentado.
do e de 3,2% para o método combinado.
A pílula do dia seguinte possui alta efi-
2.5. Interações medicamentosas do Levonor- cácia; porém, esta não deve ser utilizada fre-
gestrel isolado e do Método de Yuzpe quentemente devido a um aumento no índice
de falha.
O uso simultâneo de certas medicações
como as drogas antiepilépticas, o antibióti-
co rifampicina, o antifúngico griseofulvina, e
2.7. Informações que devem ser fornecidas à
os medicamentos para tratamento do vírus da
paciente ao se prescrever a contracepção
imunodeficiência humana (HIV) podem reduzir
de emergência
a eficácia do método de Yuzpe, mas não do le-
vonorgestrel isolado. Por exemplo, em casos de Com relação aos métodos de Yuzpe e
administração de contracepção de emergência do levonorgestrel isolado, deve-se orientar a
em pacientes vítimas de abuso sexual e em mu- paciente a repetir a medicação em caso de vô-
lheres soropositivas para o HIV, ambas, usuárias mitos com uma hora após a ingestão de cada
de antirretrovirais, deve-se optar pelo levonor- dose. Caso haja episódios de vômitos novamen-
gestrel isolado. te cerca de uma hora após a administração dos
comprimidos via oral, é aconselhável a adminis-
Os fármacos antimicrobianos, como a
tração da contracepção de emergência via va-
griseofulvina e os antirretrovirais, interferem
ginal, já que a absorção desses hormônios pela
na eficácia dos estrogênios e progestágenos
vagina apresenta níveis semelhantes àqueles
ao alterar a flora gastrointestinal, que aumenta
administrados por via oral.
o ciclo êntero-hepático e a biodisponibilidade
desses hormônios. Já a rifampicina e as drogas Outro efeito adverso da contracepção de
antiepilépticas, indutoras das enzimas do me- emergência hormonal que preocupa bastante as
tabolismo microssômico hepático, podem au- pacientes é a antecipação ou o atraso da mens-
mentar o catabolismo hepático dos estrogênios truação; por isso, é de extrema importância infor-
e dos progestágenos. mar ao prescrever o método que mais de 98% das
mulheres menstruam com 21 dias do tratamento;
e caso isso não ocorra, ela deve procurar um médico.
2.6. Eficácia do Levonorgestrel isolado e do
Se a contracepção de emergência for
Método de Yuzpe
utilizada antes da ovulação, o sangramento
A eficácia da contracepção de emergên- menstrual poderá vir de três a sete dias antes
cia varia entre 55 e 94%, com uma média de do esperado; e se o tratamento for iniciado
70%. Ou seja, se 1000 mulheres no período fértil após a ovulação, a regra pode atrasar ou vir no
tiverem relação sexual desprotegida, 80 irão en- tempo esperado. Geralmente, após o uso da
contracepção de emergência, 57% das mulhe- taxa de falha como contracepção de emergên-
res terão a menstruação no período esperado, cia de 0,09%, e age inibindo a fertilização por
15% terão a regra atrasada até sete dias, 13% meio de alterações espermáticas, ovulares, cer-
terão um atraso de mais de sete dias, e 15% vicais, endometriais e tubárias.
terão uma antecipação da menstruação menor
As contraindicações do DIU não hormo-
que sete dias.
nal podem ser absolutas e relativas. As absolu-
Ao se prescrever a contracepção de tas são: gravidez ou suspeita de gravidez, infec-
emergência, independente do método esco- ção pélvica subaguda ou aguda, malformações
lhido, deve-se informar à paciente, para uma uterinas, presença ou suspeita de neoplasia
melhor adesão e consequente eficácia do tra- uterina e sangramento genital de etiologia des-
tamento, como aquele medicamento funciona, conhecida. E as relativas são cardiopatias valvu-
qual a probabilidade de uma gravidez após o lares, afecções pélvicas de natureza inflamatória
seu uso correto, quando e como iniciar o mé- recorrente, história de aborto séptico ou endo-
todo, data prevista da próxima menstruação, metrite pós-parto nos três primeiros meses an-
efeitos colaterais, marcas disponíveis no mer- tes da inserção, anomalias da cavidade uterina
cado do método escolhido, que a contracep- congênita ou adquirida, estenose do canal cer-
ção de emergência não protege contra DST/ vical, risco de gravidez ectópica, dismenorreia
HIV e não funciona como método anticoncep- ou hipermenorreia intensas, cervicite aguda,
cional de rotina, a ausência de efeito abortivo coagulopatias ou tratamento com anticoagu-
da medicação, e que ela não deve ser utilizada lantes, nuliparidade, prolapso uterino, alergia
de forma repetida. ao cobre, entre outras.
A paciente também deve ser orientada O DIU de cobre é mais eficaz na contra-
sobre as vantagens do uso do preservativo, que cepção de emergência que o hormonal devido
deve ser fornecido no momento do atendimen- à maior reação inflamatória causada no endo-
to, e a marcar uma próxima consulta para pla- métrio, o que consequentemente produz efei-
nejamento familiar. tos colaterais bem mais significativos.
O DIU hormonal, conhecido como MI-
RENA®, atua liberando cerca de 20µg de le-
3. Dispositivo intrauterino
vonorgestrel por dia. Ele possui menos efeitos
O dispositivo intrauterino (DIU), o mais colaterais que o TCU 380A e funciona causando
eficaz de todos os métodos, é uma estratégia de espessamento do muco cervical, anovulação e
contracepção de emergência ideal para prevenir atrofia do endométrio.
uma gestação após cinco dias da relação sexual
Dentre os raros efeitos colaterais do MIRE-
desprotegida. É prudente lembrar que ele não
NA®, podemos citar alterações no padrão da mens-
é recomendado como método de emergência
truação, acne, cefaleia, náusea, ganho de peso, ver-
para mulheres com risco de infecção por doen-
tigem, mastalgia, mudanças de humor, entre outras.
ças sexualmente transmissíveis (DST), como as
vítimas de abuso sexual, ou nulíparas. O DIU é recomendado, portanto, como
contracepção de emergência para as mulheres
Outra importante característica do DIU é
não nulíparas e que tiveram relação sexual des-
a contracepção continuada que ele oferece com
protegida há mais de cinco dias. E ao se prescre-
um custo inferior que o dos anticoncepcionais
ver esse método, deve-se informar à paciente
orais. Por exemplo, um DIU de cobre, com du-
como ele age, seus efeitos colaterais, suas con-
rabilidade de 10 anos, custa R$ 60, o MIRENA®
traindicações, sua taxa de eficácia, seus benefí-
custa R$ 700, com durabilidade de cinco anos, e
cios, que ele não protege contra DST/ HIV e que
o anticoncepcional oral custa em média, R$ 30
ele não possui efeito abortivo.
por mês. Até quando comparado com o MIRE-
NA®, o DIU mais caro, o anticoncepcional hor-
monal é mais oneroso, pois o seu uso durante
4. Outros métodos de contracepção de
cinco anos custa R$1800.
emergência
O DIU é disponível nas formas hormonal
Outras estratégias para contracepção de
e não hormonal. O DIU não hormonal, disponi-
emergência são menos estudadas e disponíveis
bilizado pelo MS no modelo TCU 380A, possui
que os métodos citados anteriormente.
D- Referências Bibliográficas
AMERICAN ACADEMY OF PEDIATRICS. Emer-
gency contraception. Pediatrics, v.116, n.4, p.
1026-1033, out. 2005.
cionais que serão logo seguidas de reorganiza- a se tornar uma ordem vigente. Por isso convi-
ções da mesma natureza. Portanto, entender e dam-se todas jovens a cumprir essa etapa de
acolher a adolescência é sempre um desafio. descobertas da vida com mais sentimento, mais
afeto, mais partilha, mais qualidade e verdade
É senso comum que uma crise significa
nas relações entre pessoas.
oportunidade e perigo, pois ela coloca diante
do sujeito situações de enfrentamento, emer- Dentre as diversas transições que marcam
gência, desafios, superações e necessidades de a adolescência, vivenciar a sexualidade com o
transformação. parceiro é uma das transições de maior reper-
cussão, uma vez que provocam sentimentos
Há crises que estão nas coisas “externas”,
contraditórios, como medo e desejo, prazer e
elas parecem ser do mundo. Outras, que se dão
culpa afetando emocionalmente o indivíduo.
nas coisas “internas” e parecem ser do EU. Porém,
o que na realidade ocorre é que elas se dão num Magalhães e Reis elencam as razões que
processo de verdadeira interação entre o externo motivam as adolescentes a buscarem o início
e o interno, ou seja, entre o mundo e o EU. da vida sexual; dentre elas, citam que a curio-
sidade, pressão grupal, desejo físico e prova de
É por isso que a sexualidade vivida pelo
amor ao parceiro são as de maior relevância. O
adolescente tende a ter a cara do contexto fa-
que foi reiterado por Gubert e Madureira.
miliar e sociocultural em que ele se insere. Neste
campo nada está estabelecido e não há deter- A sexualidade é uma expressão da perso-
minação biológica que mantenha um definitivo nalidade e um fator de equilíbrio na saúde inte-
sobre o sexual. gral do indivíduo, logo, deve ser vivida de forma
igualitária por ambos os sexos. Por razões so-
Segundo Costa, 1994 – “Tudo está sujeito
cioculturais ela ainda é tratada com distinções: o
à revisão, pois cada sociedade inventa a sexua-
homem é estimulado a exercê-la precocemente
lidade que pode inventar”. Pensando sobre essa
a fim de exaltar a sua masculinidade e de provar
afirmação e analisando nossa sociedade atual,
para a sociedade que possui uma conduta he-
onde todos são levados a contemplar e consu-
terossexual; devido a isso, o início da atividade
mir imagens cabe algumas ponderações.
sexual masculina, pode ocorrer repleta de an-
Essas imagens podem ser exatamente da- gústias, como medo do fracasso e de não cor-
quilo que falta ao jovem na vida real e pode ser responder às expectativas da parceira. Por outro
criado nele um nível de alienação e consumo lado, a mulher tem sua sexualidade reprimida,
de ilusão, altamente nocivo. Todo jovem precisa especialmente pela religião e pela família, que
ler, pensar, refletir e sentir sobre a sua sexualida- apresentam o conceito de sexo como pecado e
de para deixar aflorar, emergir de si mesmo um de virgindade como pureza, gerando, assim, mi-
ser humano comprometido com o SER. O SER é tos a respeito da relação sexual, os quais podem
muito mais do que o TER e o PARECER, que são provocar disfunções e traumas, acarretando até
apelos vigentes e atuais. a negação da mulher ao prazer sexual.
A atuação do jovem deve ser focada na Nos últimos anos vem se verificando a re-
pessoa humana com grande estímulo e valori- dução da idade de início da vida sexual e, com
zação do afeto para fazer fluir o respeito de um isso o aumento da incidência de Doenças Se-
para com o outro e com os projetos pessoais de xualmente Transmissíveis (DST) e gravidez na
cada um. adolescência. Devido ao aumento da vulnera-
Entende-se que a presença de depressões, bilidade atribuída aos jovens e que se exacerba
fobias, pânicos, tentativas de suicídio entre ou- quanto menor é sua idade e vem sendo rela-
tros agravos comuns na prática clínica podem cionada positivamente às seguintes variáveis,
significar mal estar, autodesvalorização, menos segundo Villela e Doreto:
valia, drogadição e falta de sentido para a vida. 1. Baixa escolaridade: o nível precário de infor-
É com muita frieza que as jovens estão mações sobre a saúde sexual e reprodutiva
sempre se arriscando nas baladas noturnas, nos associada à reduzida habilidade cognitiva,
pegas, nas roletas russas, no sexo sem proteção é o que dificulta a compreensão a respeito
ou preservativo. E é esse contexto que alguns das orientações recebidas, e torna esses jo-
chamam de pós-moderno, de vivência da sexu- vens propícios à prática do sexo de risco e
alidade com liberdade e insegurança, que tende suas consequências.
2. Baixa renda: jovens de baixo poder aquisi- A população adolescente que está iniciando
tivo muitas vezes não vêm a gravidez como sua vida sexual tem algumas opções de métodos
um obstáculo para o sucesso profissional, contraceptivos para que evitem uma gravidez in-
uma vez que tem poucas oportunidades desejada ou não planejada, tendo em vista o des-
nesse âmbito, podendo até vê-la como um vio ou transtorno que a gravidez pode representar
meio de aquisição de identidade e função para a vida da jovem. Considerando as particulari-
social. Além disso, há uma maior dificuldade dades que envolvem o modo de vida adolescente,
no acesso às informações sobre contracep- é importante lembrar as situações de urgência, as
ção e aquisição dos métodos. relações sexuais não programadas, que embo-
3. Famílias monoparentais, desestruturadas ou ra ocorram em qualquer idade é mais frequente
com pouca convivência entre pais e filhos: o di- na adolescência, fazendo com que o preservativo
álogo sobre sexo na família desmistifica o tema masculino, ou condom masculino seja a opção de
e fornece aos adolescentes informações essen- escolha. De onde já se pode apreender o conceito
ciais para compreender a importância da prática de sexo seguro, pois a camisinha possibilita ainda
do sexo seguro. Além disso, ter um apoio emo- a proteção contra as doenças sexualmente trans-
cional e sentir-se amado pela família é um dos missíveis (DST), inclusive a AIDS.
fatores que proporciona ao jovem uma boa au-
Dentre as várias opções de métodos con-
toestima, levando-os a prezar pela integridade e
traceptivos, existem aqueles que são mais indica-
saúde do próprio corpo e a não buscar o sexo
dos para essa faixa etária, cabendo à jovem ou ao
como refúgio para possíveis carências afetivas.
casal a escolha do método ao qual mais se adapta.
Os métodos contraceptivos utilizados
Os fatores acima citados parecem deixar
atualmente são divididos em:
explícito que a falta de informação seja a princi-
pal responsável pela vulnerabilidade dos jovens, Comportamentais
demonstrando, assim, a necessidade da educa- De barreira
ção sexual, oferecida preferencialmente desde Hormonais
a infância e antes do início da atividade sexual. Dispositivo intrauterino (DIU) e
Anticoncepção cirúrgica.
Todas as pessoas passaram, passam ou
ainda passarão pela adolescência e sabem ou
saberão que o período de início das relações Neste capítulo, serão abordados os métodos
sexuais é uma etapa bastante delicada na vida comportamentais, de barreira e o DIU. Os demais
dos jovens, várias dúvidas os afligem, por isso, serão abordados em outro capítulo deste livro.
é necessário que o profissional de saúde tenha
a habilidade de transmitir as informações de
maneira adequada, a fim de orientá-los correta- 2.1. Métodos naturais ou comportamentais
mente, desmistificando a relação sexual e trans- De acordo com Brasil e Hypólito, os mé-
mitindo aos jovens conhecimentos sobre a real todos comportamentais são baseados na fisio-
importância da prática de um sexo seguro para logia reprodutiva e sinais e sintomas indicativos
a saúde integral da jovem compreendendo a de fertilidade. Exigem que a mulher aprenda
saúde física, mental, espiritual e psicológica do quando seu período fértil começa e termina;
indivíduo e do seu parceiro na relação. abstinência sexual no período fértil e adapta-
ções na rotina sexual do casal, portanto reque-
rem cooperação de ambos os parceiros.
2. Métodos contraceptivos
Idealmente um método anticoncepcional
2.1.1. Tabela
deve ter eficácia de 100%, ser inócuo, de baixo
custo e reversível. Porém este método ideal ain- Também conhecida como método de Ogino-
da não existe. Especificamente para os jovens as -Knaus, calendário ou método rítmico. Consiste na
qualidades do método, a motivação da usuária observação de vários ciclos menstruais da mulher se-
e a participação do parceiro são fatores impor- guidos como forma de determinar seu período fértil.
tantes e que vão propiciar boa adesão ao méto-
Calcula-se tal período após a observação
do, além do acolhimento pelo serviço de saúde
de 6 a 12 meses de ciclos menstruais. O início
a jovem que o procura.
2.1.4. Sintotérmico
3. Métodos de Barreira
Baseado nos métodos da tabela, tempe-
São métodos que têm como função evi-
ratura basal e muco cervical usados de forma
tar a progressão do espermatozoide da vagina
combinada, além da observação de sinais e sin-
até chegar ao útero. Podem fazer uma barreira
tomas que podem indicar o período fértil da
mecânica, química ou uma junção de ambas e os
mulher. Sintomas como dor ou aumento no ab-
principais exemplos são a camisinha masculina,
dômen, aumento de peso e apetite, alterações
camisinha feminina, diafragma e espermaticidas.
3.1. Camisinha masculina gens já citadas como por ser o método mais co-
nhecido por essa faixa etária e ser de fácil acesso.
Trata-se de uma fina capa de borracha que
deve ser colocada no pênis ereto antes da penetra- O condom deve ser usado corretamente
ção, impedindo dessa forma o contato desse órgão em todas as relações sexuais para ser altamente
com a vagina, com o ânus ou com a boca. Devido eficaz. Muitos homens não usam o condom cor-
a essa característica, é o único método contracep- retamente, ou não usam em todas as relações
tivo (além da camisinha feminina) que protege o sexuais. Nestes casos eles correm o risco de en-
indivíduo também contra as doenças sexualmente gravidar a parceira, de contrair e ou transmitir
transmissíveis (DST), inclusive HIV/AIDS. uma DST.
Vantagens: baixo custo, e não necessi-
dade de acompanhamento médico e de exame
3.2. Camisinha feminina
pélvico antes do uso.
Feita de material semelhante ao da ca-
Desvantagens: o risco de falha (caso não
misinha masculina, a camisinha feminina, além
esteja bem conservada ou se rompa durante o ato
da função de anticoncepção, também oferece
sexual ou por má colocação), redução da sensibi-
proteção contra as DST por impedir o contato
lidade peniana, possível dificuldade de manuten-
direto do pênis e de suas secreções com a va-
ção da ereção e necessidade de estar disponível
gina. Serve como boa opção para aquelas mu-
antes do início da relação sexual e alergia ao látex.
lheres que têm dificuldade em convencer seus
Para sua correta conservação e funcionamen- parceiros para o uso do preservativo masculino,
to, algumas recomendações devem ser seguidas: conferindo-lhes autonomia. Age como barreira
para a entrada dos espermatozoides no útero
Armazenamento em local seco e fresco;
e sua implantação deve ser feita antes da pe-
Não é recomendado o uso de lubrificantes
netração. A mulher deve estar atenta para as
oleosos (a maioria das camisinhas já vêm lu-
mesmas dicas de conservação dadas para a
brificadas);
camisinha masculina e a técnica de colocação
Não deve ser carregada de forma permanen-
deve ser bem explicada pelo médico antes de
te em bolsos, carteiras ou dentro de qualquer
sua adoção como método contraceptivo e deve
outro objeto em que o movimento e o calor
seguir os seguintes passos:
possam ressecar ou rasgar a embalagem;
Não se deve usar duas camisinhas ao mesmo Encontrar uma posição que a mulher achar
tempo, pois pode acarretar um aumento do mais confortável (deitada, de pé, de cócoras,
risco de rompimento; com a perna apoiada em uma cadeira ou sen-
É aconselhável que se verifique a data de valida- tada com os joelhos afastados).
de na embalagem e se a mesma possui o selo do Apertar a camisinha (com os dedos polegar
Inmetro, o que garante a qualidade do material. e médio) pela parte de fora do anel interno,
Além disso, deve-se atentar para a conservação da formando um “oito”.
camisinha, se não existem furos ou ressecamento. Abrir os grandes lábios com a outra mão e
empurrar o anel interno com o dedo indica-
IMPORTANTE dor, até sentir o colo do útero.
Para uma correta utilização, a camisinha Certificar-se de que a camisinha não ficou tor-
deve ser colocada no pênis já ereto antes da cida e que o anel externo ficou do lado de
penetração. É necessário que se segure a ponta fora, cobrindo os grandes lábios.
da camisinha para retirar o ar que esteja dentro Deve ser retirada logo após a saída do pênis
e que pode facilitar o rompimento da mesma. ou um tempo depois. Para tal, a mulher deve
Desenrola-se a camisinha com os dedos até que segurar as bordas do anel externo e dar uma
cubra todo o pênis. Logo após a ejaculação e leve torcida na camisinha, puxando-a delica-
com o pênis ainda ereto, retira-se a camisinha damente para fora da vagina.
com um movimento inverso ao anterior e a
mesma é descartada, devendo ser usada ape- É importante enfatizar que quando utili-
nas uma vez. zada da maneira correta, a camisinha feminina
Esse talvez seja o método mais indicado não incomoda ou diminui o prazer sexual da
para a população adolescente, tanto pelas vanta- mulher ou de seu parceiro.
Também são utilizados com frequência os Estudos brasileiros têm mostrado que a
métodos contraceptivos em que há a ação de gravidez indesejada chega à uma proporção de
hormônios que interferem no ciclo menstrual. 50% entre adolescentes de 15 a 19 anos, uma
A administração pode ser feita através de pílu- vez que as relações sexuais nessa faixa etária,
las, injeções ou dispositivos de depósito, que geralmente, ocorrem com contracepção incor-
contêm diferentes tipos e concentrações dos reta ou ausente. Este fato pode se relacionar a
hormônios. Dentre esses, há ainda as chama- fatores como, objeção do parceiro ao uso do
das pílulas do “dia seguinte”, que servem como contraceptivo, padrão imprevisível das relações
contracepção de emergência após uma relação sexuais, sentimentos de onipotência e invulne-
desprotegida, falha do preservativo ou casos de rabilidade dos jovens e falta de informação ou
estupro. Tais métodos serão abordados em ou- adaptação aos métodos; levando a um crescen-
tro capítulo deste livro. te número de gravidezes indesejadas, abortos
provocados e infecções por DST.
A grande incidência de DST e a epidemia ALDRIGHI, J.M.; PETTA, C.A. Anticoncepção: ma-
de AIDS, doença que vem matando milhões de nual de orientação. São Paulo: Ponto. 308p. 2004.
pessoas principalmente na África, traz um ape-
lo à necessidade do uso de camisinha em to- BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Aten-
das as faixas etárias, pois ninguém está livre do ção à Saúde. Departamento de Ações Progra-
contágio, homens e mulheres, adultos e idosos, máticas Estratégicas. Direitos sexuais, direitos
homossexuais e heterossexuais são todos vul- reprodutivos e métodos anticoncepcionais.
neráveis. Nesse sentido reitera-se o que sugere Brasília: Ministério da Saúde, 2006.
Reis e Gir (2005) quando dizem que em todas as CAMARGO, B.V.; BOTELHO, L.J. Aids, sexualidade
faixas etárias, não apenas na adolescência, o uso e atitudes de adolescentes sobre proteção contra
de métodos contraceptivos de dupla proteção o HIV. Rev Saúde Pública, v.41, n.1, fev. 2007.
ou associação entre os métodos são desejáveis.
COLETÂNEA sobre Saúde Reprodutiva do Ado-
Há na literatura especializada um bom nú-
lescente Brasileiro. Brasília. OPAS / OMS, 1988.
mero de estudos que reconhecem os métodos
de barreira, preservativo masculino e feminino, COSTA, J. F.; A Sexualidade ontem e hoje. Pre-
como os únicos que oferecem isoladamente a fácio. São Paulo: Cortez. 1994.
dupla proteção, uma vez que impede o contato
das secreções sexuais com o parceiro. GUBERT, D; MADUREIRA, V. S. F. Iniciação Sexual
de Homens adolescentes. Ciênc. saúde coleti-
No entanto, o uso do preservativo en- va, v.13, supl.2, Rio de Janeiro, dez. 2008.
volve muitos aspectos e valores com respeito
à sexualidade e nesse sentido cabe um alerta HYPÓLITO, S. B. Métodos anticoncepcionais e
aos jovens: é necessário prevenir-se contra DST novidades em contracepção. In: MEDEIROS, F.
e gravidez, mas também é necessário preservar C.; ALMEIDA, F. M. L; OLIVEIRA FILHO, M. Ma-
a sexualidade no que se refere à sua naturalida- nual de Ginecologia da Maternidade-Escola
de como desejo, fantasia, troca, cumplicidade, Assis Chateaubriand, Universidade Federal
parceria, o que os ajudará a vivenciá-la com res- do Ceará. Fortaleza: UFC. 2004. p. 92-99.
peito, tolerância e aprendizado com aceitação.
MADUREIRA, V.S.F.; TRENTINI, M. Da utiliza-
Segundo Osis (2004) a escolha de um ção do preservativo masculino à prevenção de
método contraceptivo deve ser feita de forma DST/AIDS. Ciência & Saúde Coletiva, v.13, n.6,
livre e informada. Para tanto é necessário que p.1807-1816, 2008.
haja conhecimento sobre todos os métodos
anticoncepcionais disponíveis, para que o jo- MAGALHÃES, M. L. C.; REIS, J. T. L. Anticoncepção na
vem opte por aquele que seja mais adequado adolescência. In: MAGALHÃES, M. L. C.; REIS, J. T. L.
às suas características e condições de vida. Esse Ginecologia infanto-juvenil: diagnóstico e trata-
processo de decisão deve ser orientado por um mento. Rio de janeiro: MEDBOOK, 2007. p. 361-379.
profissional de saúde, a fim de que a escolha
MOSER, A.M.; REGGIANE, C.; URBANETZ, A. Com-
seja feita levando-se em consideração fatores
portamento sexual de risco entre estudantes uni-
como eficácia do método, possíveis efeitos co-
versitárias dos cursos de ciências da saúde. Rev
laterais, contraindicações, disciplina para o uso,
Assoc Med Bras, v.53, n.2, p. 116-121, 2007.
acesso ao método, aspectos religiosos e éticos.
De modo que, com todas as informações ne- OSIS, M. J. D.; DUARTE, G. A.; CRESPO, E. R.; ES-
cessárias e uma conscientização adequada, a PEJO, X.; PÁDUA, K. S. Escolha de métodos con-
prática sexual possa se dar de forma saudável, traceptivos entre usuárias de um serviço públi-
prazerosa, sem dúvidas, medos e angústias. co de saúde. Cad. Saúde Pública, v.20, no.6 ,
Rio de Janeiro Nov./Dec. 2004.
desde cedo, com o trabalho e com as responsa- objetivo qualquer dos itens seguintes ou uma
bilidades inerentes à vida adulta. combinação deles”:
Com o empobrecimento da nobreza e a Tumescência/detumescência: indícios con-
ascensão da burguesia, houve uma valorização cretos e observáveis de ereção nos órgãos ge-
da cultura e das artes, fazendo que a pureza in- nitais, mais facilmente evidenciados no sexo
fantil fosse exaltada em resposta aos crescentes masculino pela ereção peniana, mas também
movimentos sociais religiosos que se inseriam presentes no sexo feminino com uma reação
na época. A prática do sexo era compreendida semelhante, a ereção clitoriana.
como uma atividade pecaminosa que não era
Estimulação erótica: a criança busca tipos es-
digna de aceitação religiosa e social. As crian-
pecíficos de estimulação (não a simples estimula-
ças, porém, por não terem os órgãos genitais
ção de partes físicas), respondendo com tumescên-
desenvolvidos e por não praticarem o ato sexual,
cia parcial ou total, excitação, interesse ou atenção.
estavam em estado de pureza e livres, portanto,
de qualquer “culpa”. Tensão/relaxamento: indícios de dureza
ou rigidez de tecido erétil (não exclusivamen-
Partindo desse conceito, foi adotado um
te dos órgãos sexuais) com subsequente perda
tipo de educação em que, para manter essa
de rigidez, em zonas erógenas específicas ou de
“pureza”, era necessário manter a criança de-
maneira mais generalizada.
sinformada sobre qualquer assunto relacionado
à sexualidade humana. Para tanto, os pais im-
punham-lhes um padrão repressor de compor- 3. Etapas do Desenvolvimento Psicossocial
tamento, visando manter seus filhos longe da
curiosidade sobre o assunto e da prática preco- Segundo Freud, todos os seres humanos
ce de atividades sexuais. praticam sexo, sendo, dessa forma, uma manifes-
tação da natureza humana desde o nascimento.
A partir do início do século XX, as primei-
ras mudanças em relação à concepção da crian- Freud propôs a divisão da sexualidade na
ça como ser puro e isento de qualquer manifes- infância nas seguintes fases:
tação sexual passaram a se manifestar. Fase oral: ocorre após o desmame;
Grande parte dessas mudanças ocorreu Fase ânus-uretral: inicia-se com o controle
devido à divulgação das ideias de Sigmund dos esfíncteres (de um a três anos);
Freud que somente foram valorizadas a par- Fase fálico-edipiana (de três a cinco anos);
tir dos anos 60 com o advento da denomina- Fase de latência: ocorre dos seis aos onze ou
da “Revolução dos Costumes”. Freud defendia doze anos.
a existência da sexualidade desde a infância e
correlacionou-a a diversas fases do desenvolvi- Atualmente, admite-se que a sexualidade
mento infantil. Suas ideias foram bastante criti- manifesta-se desde o início da vida e que se de-
cadas, uma vez que iam de encontro à concep- senvolve com o crescimento normal do indivíduo.
ção que a sociedade da época tinha em relação
às crianças. O primeiro meio de prazer consiste na
amamentação, pois se acredita ser uma ativi-
Existem outras linhas de pensamento que dade bastante prazerosa para o recém-nascido.
utilizam conceitos de sexualidade infantil mais Com o amadurecimento do sistema nervoso
diretamente relacionados aos órgãos da repro- central, a criança passa a descobrir mais o corpo
dução (obviamente sem a ideia de procriação), e os prazeres que este lhe proporciona.
abrangendo as curiosidades que as crianças
apresentam sobre os processos sexuais, os Como o próprio Freud (1905/1976) cita
comportamentos que envolvem os caracteres em “Três Ensaios sobre a teoria da sexualidade”,
sexuais secundários, a tumescência/detumes- “quando vemos um bebê saciado deixar o seio e
cência genital e o despertar sexual. Nessa cor- cair para trás adormecido, com um sorriso de sa-
rente pode-se citar, segundo Andrade, William tisfação nas faces rosadas, não podemos deixar de
Reevy, que define a sexualidade infantil, na dizer que esta imagem é o protótipo da expressão
Enciclopédia do Comportamento Sexual de da satisfação sexual na existência posterior”.
Albert Ellis, como “o estado ou condição da Para Freud (1905), quando o bebê larga o
criança em relação ao impulso que tem por seio, instintivamente, ao fantasiá-lo, passa a su-
gar o próprio dedo polegar, tendo início assim xual da criança. Em primeiro lugar, vale lembrar
o autoerotismo. que a capacidade de “enganar” a criança com
histórias clássicas como a da cegonha somente
Logo, o bebê, ao ser amamentado, entra
será possível até os sete anos. E em segundo
em contato direto com a pele da mãe, com a
lugar, a capacidade de concentração de uma
sua voz e com suas carícias. Dessa forma, mãe e
criança nessa idade não ultrapassa cinco minu-
filho iniciam uma relação afetiva e sexual. Sexual
tos. Por esse motivo, é interessante que os pais
no sentido mais amplo, uma vez que a mãe, ao
evitem conversas longas sobre qualquer assun-
amamentar seu filho, o erotiza.
to. O que é realmente importante durante esse
Ressalte-se que, essa primeira manifestação processo educativo é estabelecer uma relação
da sexualidade humana não é vista como um ato aberta e de confiança entre pais e filhos, a fim
a ser reprimido pelos pais, uma vez que a socie- de que a criança venha procurá-los para conver-
dade desconhece a sexualidade não genitalizada. sar sempre que achar necessário. O que ocorre,
Autores pós-freudianos como Karl muitas vezes, é que a criança passa a entender
Abraham e Melanie Klein valorizaram muito essa que esse tipo de assunto não deve ser abordado
etapa primitiva do desenvolvimento da sexuali- com os pais, refletindo, por sua vez, a imaturi-
dade com enfoque maior nas fantasias do bebê dade deles em relação à educação do seu filho.
que giram em torno do seio materno (a possibi- Na idade escolar, o convívio com outras
lidade de devorá-lo e seu medo de ser devorado crianças passa a despertar um interesse ainda
pela mãe). Ao se analisarem os desenhos infantis, maior pela descoberta do corpo. Iniciam-se os
por exemplo, encontramos imagens de tubarões jogos sexuais que, apesar de envolverem o cor-
e de monstros. Contos de fadas como Chapeu- po como um todo, só são identificados como
zinho Vermelho e Pinóquio, por exemplo, ressal- reprimíveis pelas instituições responsáveis pela
tam bem a ideia da criança sendo devorada. educação da criança (família e escola) aqueles
Mesmo sem concordar com a interpreta- que envolvem os órgãos genitais. Esse ato causa
ção “kleiniana”, a qual atribui fantasias tão com- nos pequenos seres um sentimento de enorme
plexas às crianças tão pequenas, precisa-se ter culpa, principalmente aos pertencentes ao sexo
em mente que a fase oral do desenvolvimento feminino, que vivenciam a sexualidade com
infantil é marcada não somente pela associação maior dificuldade, uma vez que a repressão so-
entre alimento e amor materno, como também bre elas é bem maior.
pela angústia e sentimento de insignificância A partir de cinco anos de idade, a criança
que acompanham o bebê. passa a ter consciência de seus atos, sendo toda
A fase seguinte do desenvolvimento da manifestação de sexualidade um ato consciente
sexualidade coincide com o descobrimento do e prazeroso para ela.
controle dos esfíncteres. Durante essa fase, os O quarto período do desenvolvimento
pais exercem a repressão por meio da demons- sexual da criança é marcado pela sexualidade
tração de nojo e desagrado em relação às fezes adormecida, retraída, latente. Devido à educação
e à urina. Essa fase vai até os três ou quatro anos. imposta pelos pais e pela sociedade baseada na
Nesse período, a criança passa a querer co- repressão de qualquer manifestação genital da
nhecer mais o ambiente em sua volta, uma vez sexualidade, a criança reprime a pulsão sexual, por
que já é capaz de andar e de falar. No campo meio de sentimentos como a vergonha. Nessa
da sexualidade, fixa-se a conhecer melhor o seu ocasião, forma-se o superego, uma das três ins-
corpo, e o do outro, assim como os prazeres que tâncias psíquicas, que é responsável pelo desen-
este pode oferecer. Essa nova fase de descoberta volvimento da moral, da ética. Essa fase inicia-se
do outro corpo também se estende ao corpo da por volta dos seis anos e se estende aos onze
mãe e do pai. O conhecimento dos órgãos sexu- ou doze anos, quando a última fase do desen-
ais sofre também uma importante interferência volvimento psicossocial, a fase genital, começa,
da educação repressora, ao passo que os pais se coincidindo com o início da puberdade.
encarregam de informar à criança sobre todo o
“pecado” que existe nessa parte do corpo.
3.1. Identidade sexual
É de grande valia ressaltar aqui dois pon-
Em 1981, Constantine & Martinson re-
tos importantes no processo da educação se-
conheciam publicamente que: “Nossa identi-
dade sexual básica como homens ou mulhe- não apresentam o comportamento considera-
res; nossa orientação erótica primária para o do pela sociedade como adequado para o seu
mesmo sexo ou para o sexo oposto; o que nos sexo, podem adquirir o rótulo de “menino efe-
excita sexualmente e o que nos inibe; nossa minado” ou “menina masculinizada”. Entretan-
sensação de segurança e conforto como se- to, observa-se que uma grande mudança vem
res sexuais, nossos medos e preocupações se- acontecendo no comportamento de homens e
xuais; tudo isto e muito mais é determinado mulheres nos últimos trinta anos. Os papéis de
e estabelecido principalmente na infância”. mando (masculino) e submissão (feminino) es-
Apesar da importância destes fatos, o conhe- tão sendo substituídos pela equidade de gêne-
cimento da sexualidade infantil continua sen- ro, ou seja, a igualdade de oportunidades entre
do ainda uma área assustadora e até proibida homens e mulheres.
para muitos adultos.
Segundo Andrade, a identidade sexual
3.3. A descoberta do próprio corpo
corresponde ao aspecto psicológico da sexua-
lidade – é o sentimento que as pessoas têm de A expressão da sexualidade na infância
sua masculinidade ou feminilidade e compreen- tem como principal foco o conhecimento do
de a identidade de gênero, o papel de gênero e corpo. O autoconhecimento positivo favorece-
a orientação de gênero. rá o respeito, a valorização do próprio corpo e
o autocuidado. As atenções “maternais” com o
A consciência de ser homem ou mulher é
banho, a limpeza e principalmente a amamen-
alcançada por meio de um processo de identifi-
tação, assim como o olhar, o acariciar e o con-
cação que ocorre desde a primeira comunidade
versar criam a intimidade e a confiança necessá-
– o lar, com os pais, depois com os amigos na
rias para um bom desenvolvimento emocional e
escola e, em seguida, com a sociedade. Assim,
intelectual da criança.
pode-se dizer que a identidade sexual é cons-
truída em três níveis:
No nível biológico (ao nascimento): a criança 3.4. A descoberta do corpo do outro
nasce com um pênis ou uma vagina. Para Andrade, a curiosidade pelo corpo
No nível psicológico (até três anos): desenvol- do outro assusta muito os adultos, em geral por
ve a consciência de pertencer a um sexo. medo da concretização de uma relação sexual
No nível social (até a adolescência): a partir da - para a qual não existe ainda desenvolvimento
definição clara do que representa o homem biofisiológico adequado, ou ainda pelo receio
e a mulher sexualmente, a criança aprende o de ser a expressão de uma homossexualidade –
que pode ou não pode fazer e estabelece a que pode representar apenas mais uma fase no
orientação do desejo sexual para o mesmo desenvolvimento psicossexual da criança. Deve
sexo ou para o sexo oposto. ficar claro para os pais que, através do com-
panheiro do mesmo sexo, a criança confirma
3.2. Papéis sexuais e confere seu próprio corpo – ela aprende so-
bre a igualdade. Com um companheiro do sexo
A manifestação externa da consciência de
oposto, ela descobre um outro corpo e aprende
ser homem ou mulher é o que chamamos de
sobre as diferenças.
papel sexual, ou seja, a forma de comportamen-
to apresentada na sociedade.
Sabe-se que, desde antes do nascimento, 3.5. Os jogos sexuais infantis
os adultos já demonstram expectativas sobre O jogo constitui-se na linguagem do
pensamentos, sentimentos e comportamentos ser humano desde a infância e apresenta
que consideram adequados para meninos e uma série de funções importantes no proces-
meninas. Isto determina uma educação diferen- so de desenvolvimento psicológico e mental
ciada e, consequentemente, um padrão duplo do indivíduo. As crianças necessitam viven-
de expressão sexual - os garotos assumindo ciar seus sentimentos e curiosidades sexuais,
mais a iniciativa, controladores, desvinculando o que elas conseguem nos jogos por meio
frequentemente o sexo do afeto. As jovens mais de contatos e exploração do corpo, manipu-
reprimidas, condicionadas e reivindicando mais lação genital.
um vínculo romântico e afetivo. Crianças que
D- Referências Bibliográficas
ANDRADE, H.H.S.M. Sexualidade na Infância e
na Adolescência. In: MAGALHÃES, M.L.C.; REIS,
J.T.L. Ginecologia Infanto Juvenil – Diagnós-
tico e Tratamento. Rio de Janeiro: MedBook,
2007. Cap. 35, p.419-28.
Se, por um lado, a sexualidade foi sendo cos que vivem a adolescência como importan-
moldada de acordo com questões religiosas, te fase do desenvolvimento.
sociais, culturais e até políticas, atualmente, a ci-
Na cultura ocidental contemporânea, os
ência e a tecnologia vêm ditando novas regras,
primeiros indícios de maturação sexual marcam
remediando a repressão sofrida pelos adoles-
o início da adolescência. Esta é caracterizada
centes, notadamente pelas garotas, ao longo
como uma etapa de profundas mudanças físicas,
dos séculos. Por outro lado, há que se tomar
que culmina com o alcance da maturidade se-
cuidado com a erotização precoce, que pode
xual e da capacidade reprodutiva (puberdade),
acarretar danos imensuráveis para a formação,
associada à busca de uma identidade própria e
integridade e dignidade dos jovens.
à definição de um papel a ser desempenhado na
A questão da sexualidade tem sido abor- sociedade. Entretanto, é preciso compreendê-
dada de maneira tão avassaladora pelos meios de -la, não como um processo natural e imutável,
comunicação em massa, que tem deixado os pais mas como uma construção sociohistórica, que
confusos quanto ao diálogo com os filhos. Anti- pode ser modificada e redefinida culturalmente
gamente, as famílias não tinham dúvidas sobre o – essas mudanças são vividas pelas pessoas de
que era certo e errado, sobre o que podiam ou não formas diferentes, dependendo do contexto em
permitir. Hoje, vive-se um momento difícil para a que vivem, configurando tantas adolescências
construção de um sistema de valores sexuais. quanto a diversidade humana permite.
No entanto, há certos valores que não po- Em perspectiva ampla, a adolescência en-
dem deixar de ser transmitidos aos jovens, como globa a evolução da sexualidade e suas vicissi-
o respeito por si próprio e pelo outro. Não se tudes até a maturidade, abrangendo desde os
pode privar o adolescente de informação, de- limites da dependência infantil até a autonomia
vendo-se responder às dúvidas de maneira clara, do adulto.
honesta e não preconceituosa. Deve-se, ainda,
Apesar de sua importância para a forma-
ajudá-los a desenvolver visão crítica e reflexão
ção do indivíduo tanto do ponto de vista cor-
para escolher o que lhes convém. A falta de co-
poral como psicológico, apenas recentemente
municação com os jovens abre espaço para a co-
a adolescência tem sido reconhecida e incluída
brança dos grupos, o que, aliada à exposição da
como objeto de atenção em programas sociais
sexualidade na mídia, acaba por fazer que jovens
e de saúde.
desestruturados tenham iniciação sexual preco-
ce, transformando em algo angustiante uma ati- Nesse período, a personalidade está em
vidade que deveria ser prazerosa. fase final de formação, e a sexualidade se insere
nesse processo como elemento estruturador da
identidade do indivíduo.
2. A Sexualidade na adolescência É importante, diferenciar sexo, genitalida-
Segundo a Organização Mundial de Saú- de e sexualidade.
de (OMS), a sexualidade é um aspecto central Sexo é o conjunto de características ana-
da experiência humana ao longo da vida e tômicas e fisiológicas que determina que os
abrange o sexo, identidades e papéis de gênero, indivíduos sejam masculinos ou femininos. Ge-
orientação sexual, erotismo, prazer, intimidade nitalidade pode ser compreendida como uma
e reprodução. A sexualidade é influenciada pela função dos órgãos genitais, um fenômeno fi-
interação de fatores biológicos, psicológicos, siológico para satisfazer o instinto e que pode
sociais, econômicos, políticos, culturais, étnicos, existir sem a participação afetiva na relação. A
legais, históricos, religiosos e espirituais. sexualidade, entretanto, tem uma dimensão
Segundo Andrade e Lopes, no conceito de tipicamente pessoal e humana; compreende a
Mary Calderone, “a sexualidade humana abran- genitalidade, porém a supera e transcende, em
ge quem somos, e o que somos como homens um contexto muito mais rico de valores. A sexu-
e mulheres, como chegamos a sê-lo, como nos alidade sobrepõe-se aos limites do impulso ge-
sentimos a esse respeito e como lidamos com nital, que não é mais do que um dos elementos
isso em uma relação. de uma relação sexual na qual intervêm, sobre-
tudo, afetividade, fantasia, emoção, comunica-
Adolescer, do latim, significa crescer.
ção e respeito ao outro.
Dentre os seres vivos, os humanos são os úni-
Além da falta de apoio social para lidar A masturbação é algo bastante comum na
com suas transformações, as jovens deparam adolescência, apesar de reprimida e repleta de
com os modelos de beleza e com a extrema tabus, ou até mesmo tratada como algo errado
valorização da aparência veiculada pelos meios e proibido. A consequência é que os jovens se
de comunicação. É preocupante o fato de que sentem culpados em manusear e tirar proveito
esses modelos sejam internalizados, sem se- do corpo de maneira solitária.
rem questionados, como algo natural do su-
Fala-se que apenas os homens se mastur-
jeito. A intensidade que os meios de comuni-
bam, o que não é verdade. As mulheres tam-
cação atingem as culturas é mais intensa do
bém, mas comentam pouco, devido ao medo
que a capacidade de assimilação das pessoas,
de serem criticadas. Já os rapazes relatam suas
fazendo que, o que se vê seja incorporado sem
experiências com ar de malandragem.
ser simbolizado.
De qualquer modo, é importante que se
Em nossa sociedade, há uma desconsi-
saiba que manipular o corpo é uma necessi-
deração da subjetividade e uma supervaloriza-
dade própria da adolescência e que não causa
ção da imagem, um culto narcísico ao corpo,
nenhum problema; pelo contrário, permite ao
que é vendido como objeto de consumo, se-
jovem usufruir dos prazeres que o corpo pode
gundo o qual, mais importante do que sentir,
proporcionar em um período em que ainda não
pensar, criar, é ter medidas perfeitas, conside-
se sente preparado para a atividade sexual a dois.
rando-se o padrão de magreza como ideal. As-
sim, a adolescente, que já tem que lidar com O único cuidado a ser tomado é quanto
suas transformações físicas, é colocada frente aos excessos; deve-se preocupar em evitar trau-
a esses modelos e à impossibilidade de corres- matismos ao introduzir objetos na vagina.
ponder a eles.
A construção da identidade adulta impli- 2.4. O “Ficar”
ca uma série de perdas, como o corpo infantil,
a condescendência com a condição de criança Ao se destacar o comportamento sexual
e os pais da infância, que eram mais protetores entre os jovens, o “ficar” é um modo de repre-
e menos exigentes. A essas perdas somam-se a sentação afetiva e de interação sexual, é uma
dificuldade de se configurar uma autoimagem experiência de estar com o outro, de trocar
corporal em um corpo em constante transforma- carícias, intimidade, descobertas e sensações
ção, sobre a qual não tem controle. Se acompa- sobre o corpo e sobre si mesmo. “Rolam” bei-
nharmos a turbulência de deparar com um corpo jos, abraços, e eventualmente, pode-se chegar
em constante mudança - e sem controle sobre a uma relação sexual propriamente dita. Os li-
ela -; novas exigências do meio - e sem experi- mites do “ficar” são determinados pelo próprio
ência prévia -; a sexualidade impulsionada pelos casal. Em geral, inclui afetividade, porém não há
hormônios; e a possibilidade de procriar - sem um compromisso de continuidade ou exclusivi-
ter autonomia financeira -, veremos que, mais do dade. Possivelmente, o casal pode vir a namorar.
que em outras ocasiões, na adolescência, o ser O “ficar” tem aparecido como uma for-
humano precisa de parâmetros e regras que o ma alternativa ao namorar, que, segundo os
ajudem a integrar tantas coisas novas. A sua tare- jovens, exige maiores obrigações. A fidelidade
fa principal, como já foi colocado, é transformar- é uma das dificuldades que o “ficar” minimiza,
-se em adulto e preparar-se para desempenhar o levando à possibilidade de experimentar novas
papel de adulto de uma forma satisfatória. sensações, identificar diferenças e semelhanças,
permitindo ao jovem novas descobertas e ex-
perimentações. O “ficar” permite que ocorra a
2.3. Masturbação aproximação entre o desejo e a escolha efetiva.
Antes de partir para a relação sexual pro- No entanto, esse novo modelo de rela-
priamente dita, é fundamental que o indivíduo cionamento pode estar demonstrando o desen-
conheça bem seu próprio corpo e saiba usufruir cantamento dos jovens com o casamento e o
dos prazeres que ele lhe proporciona. Pode-se desejo implícito de serem diferentes dos pais.
entender como ilógica a ideia de buscar o co-
nhecimento explícito do corpo de outra pessoa Tem-se observado que não existem con-
quando não se conhece o próprio corpo. tornos rígidos que determinem a impossibilida-
sexual ocorreu a partir dos 16 anos de idade. xuais desestimula a utilização contínua de um
Já foi descrito que as experiências pré-sexuais, método contraceptivo.
como o primeiro beijo e o “ficar”, ocorrem antes
A decisão de quando se iniciar sexual-
dos 14 anos de idade e que a primeira relação
mente é estritamente pessoal, e apenas o jovem
sexual tende a se dar após os 15 anos de idade.
tem o poder de tomá-la. A melhor maneira de
Isso parece mostrar que a iniciação sexual das
decidir quando ter a primeira relação sexual é
adolescentes é um processo gradual - ou seja,
analisando quatro pontos: motivo, companhia,
há uma fase de experimentação física, relacional
privacidade e prevenção.
e pessoal, assim como de impregnação de cer-
ta cultura sexual da classe à qual a adolescente É importante que se queira ter a relação
pertence - que se inicia logo nos primeiros anos sexual. A sexarca não deve ocorrer por vontade
da adolescência, mas culmina com a relação se- do parceiro ou por pressão dos amigos. O jo-
xual propriamente dita nos anos mais próximos vem estará pronto para ter sexo quando o de-
do fim da adolescência, se adotada a faixa etária sejo partir dele próprio.
de 10 a 19 anos de idade como a etapa cro- A primeira relação sexual deve ser algo
nológica que a Organização Mundial da Saúde especial, para que fique gravada na memória
compreende como sendo adolescência. com uma experiência boa e prazerosa. Portanto,
é fundamental que seja com alguém com quem
exista um envolvimento afetivo.
2.7. Iniciação e atividade sexual
A privacidade é um aspecto importante
Estima-se que quatro milhões de jovens se
nas relações sexuais, principalmente quando se
tornam sexualmente ativos no Brasil anualmente.
trata da primeira experiência, uma vez que per-
Em pesquisa publicada pelo Ministério da mite agir com calma, aproveitando cada mo-
Saúde, constatou-se uma diferença significati- mento.
va no comportamento sexual entre os gêneros,
É óbvio que só se pode relaxar e aprovei-
quando comparados em dois momentos espe-
tar ao máximo quando se tem certeza de que
cíficos. Em 1984, 35% dos meninos e 14% das
não haverá problemas futuros. Portanto, é im-
meninas relataram ter-se iniciado sexualmente
portante que o jovem tome precauções quanto
antes dos 15 anos de idade. Em 1998, os valores
a gravidez e doenças sexualmente transmissí-
foram, respectivamente, 47% e 32%.
veis durante a relação sexual.
Segundo Leite, em estudo feito em 2000,
com uma amostra de estudantes entre 10 e 19
anos de idade, 60,2% dos rapazes afirmaram já 2.8. Iniciação sexual masculina
ter tido a primeira relação sexual, enquanto esse Os jovens do sexo masculino costuma-
número foi de apenas 16,7% entre as garotas, de- vam buscar as profissionais do sexo e as empre-
monstrando, assim como no estudo do Ministério gadas domésticas para terem relações sexuais.
da Saúde, diferenças quanto aos sexos. Também No entanto, esse padrão vem mudando. A ini-
foi relatado que a iniciação sexual dos rapazes ciação sexual dos adolescentes tem-se dado, ul-
ocorreu em média aos 13,1 anos de idade, en- timamente, com amigas ou namorada. No meio
quanto a das moças, aos 14,1 anos de idade. rural, os animais ainda são citados.
Segundo esse estudo, a probabilidade de Os motivos que levam os jovens à inicia-
iniciar a atividade sexual é maior entre os ado- ção sexual são a curiosidade em saber o que é
lescentes do gênero masculino, sem religião e realmente uma relação sexual, como é de fato
com idade mais avançada. uma mulher, o impulso genital exacerbado, a
Ao contrário do que muitos pensam, pressão do grupo de companheiros e do próprio
os jovens não são promíscuos em seus rela- pai, além da vontade própria de se autoafirmar.
cionamentos sexuais, uma vez que é comum Dessa maneira, a iniciação sexual dos jo-
a relação com um parceiro fixo. Muitas vezes, vens ocorre envolvida pelo temor do desempe-
a atividade sexual ocorre de forma escondida, nho, medo do fracasso, podendo levar a disfun-
permeada pelo medo da descoberta e sem ções sexuais e traumas emocionais.
aconselhamento médico prévio. A não existên-
cia de uma frequência regular nas relações se-
como o desejo de contato, intimidade, expres- Quando chega à fase adulta, atinge a matu-
são emocional, prazer, carinho e amor. ridade sexual; o sexo é vivido com base emocional
voltada para o outro e onde são compartilhados de-
Os direitos sexuais são direitos humanos
sejos, fantasias e emoções. Nesta fase, percebe-se a
universais, baseados na liberdade, dignidade e
consciência da sexualidade como algo mais abran-
igualdade para todos os seres humanos. Saúde
gente, que vai muito além da genitalidade. A busca
sexual é um direito fundamental, e como tal um
de um relacionamento duradouro e o domínio da
direito humano básico.
sexualidade favorece a oportunidade de desfrutar o
Para assegurarmos que os seres humanos sexo com prazer, determinando a ausência de senti-
e a sociedade desenvolvam uma sexualidade mentos de culpa, medo ou vergonha.
saudável, os seguintes direitos sexuais devem
Essa maturação, que chega em diferentes
ser reconhecidos, promovidos, respeitados e
épocas para diferentes pessoas, é atingida mais
defendidos pela sociedade:
frequentemente durante o final da fase de “adulto
Direito à liberdade sexual jovem” (até os 30 anos). Infelizmente, à custa de
Direito à autonomia e integridade sexual uma distorcida educação sexual e de preconcei-
Direito à privacidade sexual tos sociais os mais diversos, nem sempre é assim.
Direito à igualdade sexual Não é incomum que as pessoas tenham uma no-
Direito ao prazer sexual ção distorcida da sexualidade, deixando de vê-la
Direito à expressão sexual como algo positivo, como algo de bom e belo,
Direito à livre associação sexual como um dom. Foi por um período divulgado um
Direito às escolhas reprodutivas livres e conceito bastante distorcido da sexualidade, apre-
responsáveis sentando como meta suprema e obrigatória, o or-
Direito à informação baseada no conheci- gasmo, considerado como o mais precioso bem
mento científico a que se pode almejar. Nessa acepção seria “obri-
Direito à educação sexual gação” do homem dar orgasmo à mulher, como
Direito à saúde sexual se orgasmos fossem presentes que a onipotência
masculina possa distribuir a seu bel prazer. A mu-
Nos capítulos anteriores foram abordadas lher, por sua vez, para considerar-se “verdadeira-
as fases da sexualidade; pré-genital (0-6 anos), mente mulher”, deveria ter orgasmos sem o que
latência (7-11 anos) e a última a genital (da ado- seria considerada uma fracassada. Infelizmente
lescência à vida adulta). essas crenças, embora mais raras atualmente, ain-
da existem, mas muito raramente.
Segundo Freud, o desenvolvimento psi-
cossocial do indivíduo se daria através da ex-
pressão da libido, uma força motivacional inata, 2. Comportamento sexual
inicialmente generalizada em todo o corpo e de-
pois mais concentrada em determinadas partes. Segundo Kaplan, o comportamento sexual
pode ser entendido como um processo sequen-
Na adolescência, à medida que a matu- cial de três fases: desejo, excitação e orgasmo.
ração sexual vai se completando e o corpo vai
amadurecendo, a personalidade vai se estrutu- A fase do desejo, que pode ser prévia ao
rando. A principal tarefa do adolescente é cons- contato sexual compreende um impulso produ-
truir a própria identidade, incluindo a identidade zido pela atividade de centros específicos do cé-
sexual. Progressivamente, sai do autoerotismo rebro. Normalmente, ante a um estímulo (tato, vi-
para uma relação de troca e, sobretudo de mui- são, olfato etc.) adequado, os centros específicos
to prazer, não só físico como também afetivo são ativados, iniciando a resposta sexual. O centro
emocional. Nessa fase, a variedade de experi- do prazer encontra-se em íntima relação com o
ência sexual faz parte do preparo para a vida centro da dor e da ansiedade, que são capazes de
adulta e, há uma intensificação sexual, embora inibi-lo. Parece que um nível mínimo de testos-
o processo de aprendizado ainda não seja tão terona precisa existir para que ocorra a ativação
rápido e nem tão completo. O comportamento desses centros, desencadeando o complexo me-
instável na busca do parceiro agora é substituí- canismo neuro-hormonal da função sexual.
do gradativamente por satisfações mais impor- A fase de excitação guarda uma relação
tantes do relacionamento estável. estreita e direta com a do desejo. Os fenômenos
mais importantes nesse período são: vasocon- lidade do intercurso. É síndrome clínica caracteri-
gestão pélvica e miotoniais (contraturas) geni- zada por queixas e sintomas que frequentemente
tais e generalizadas, ainda incipientes. Além das resultam em insatisfação e inadequação sexual.
reações genitais, podemos observar uma gama
Estima-se que entre 40% a 45% das mulheres
de reações extra-genitais, como aumento dos
e de 20% a 30% dos homens tenham alguma quei-
ritmos respiratórios e cardiovasculares, a con-
xa de disfunção sexual. Sua alta prevalência compro-
tração do esfíncter anal etc.
va o fato de constituir problema de saúde pública,
A fase do orgasmo é verificada à medida uma vez que chega a comprometer pouco menos
que o indivíduo atinge um determinado nível de da metade da população das mulheres. De acordo
excitação e corresponde ao máximo de vasocon- com a Second Consultation International on Sexual
gestão e contrações vasculares genitais e extrage- Medicine, realizada em Paris, em 2004, 45% das mu-
nitais. Embora a sensação orgásmica esteja centra- lheres adultas apresentam ao menos uma disfunção
da nos genitais, o orgasmo envolve todo o corpo, sexual manifesta, com tendência a aumentar com a
até o momento em que a descarga orgásmica idade, principalmente após a menopausa.
libera o organismo da tensão sexual acumulada.
Não obstante às altas taxas de disfunção
No homem, essas sensações são percebidas mais
sexual, muitas mulheres não procuram ajuda
especificamente no pênis, na próstata e nas vesí-
médica por vergonha, frustração ou falhas de
culas seminais, enquanto que na mulher é percebi-
tentativas de tratamento sub-profissionalizado.
da principalmente no clitóris, na vagina e no útero.
São fatores de risco associados à disfun-
Masters e Johnson acrescentam à resposta
ção sexual: comprometimento do estado de
sexual humana a fase final ou de resolução, que
saúde geral, doença cardiovascular e genituri-
começa logo depois que a descarga orgásmica
nária, desordem psicológica e psiquiátrica, do-
libera a tensão sexual e caracteriza-se por um
enças crônicas, fatores relacionais e condições
processo de regressão involuntária e gradual do
sociodemográficas desfavoráveis.
organismo ao estado de equilíbrio basal. Durante
esse processo regressivo, os homens apresentam As disfunções sexuais são divididas em
reações fisiológicas diferentes das mulheres, se sete categorias principais: transtornos do desejo
forem submetidos à continuidade da estimulação sexual, transtornos da excitação sexual, transtor-
sexual; enquanto as mulheres, após atingirem um nos do orgasmo, transtornos sexuais dolorosos,
orgasmo, podem ou não atingir outros a partir de disfunção sexual causada por condição médica,
uma estimulação sexual adequada, os homens disfunção sexual induzida por substâncias, dis-
passam por um período refratário em que o or- função sexual sem outra especificação.
ganismo não reage à estimulação sexual e, conse- Toda e qualquer disfunção sexual pode
quentemente, não atingem nova ejaculação. ser classificada, de acordo com o tipo em:
Segundo o DSM-IV-TR (Manual Diagnós- Primária: as expectativas sexuais nunca se rea-
tico e Estatístico de Transtornos Mentais – 4. ed. lizaram, em quaisquer situações;
– revisão de texto), o ciclo de resposta sexual Secundária: atualmente uma ou mais fases da
humana psicofisiológica é composto de quatro resposta sexual não funcionam, enquanto que
fases - desejo, excitação, orgasmo e resolução. no passado já funcionaram;
Deve-se situar em que fase do ciclo se encon- Situcional: a resposta sexual não ocorre em
tram as alterações e a etiologia destas, para que determinada situação, porém, ocorre em ou-
se possa classificar devidamente as disfunções tras circunstâncias;
sexuais. O distúrbio em uma das etapas da fi- Absoluta: a resposta sexual não ocorre ou a
siologia sexual levaria à ocorrência das disfun- relação sexual completa não se dá em qual-
ções sexuais: inibição do desejo, disfunção eré- quer circunstância.
til, anorgasmia, vaginismo, entre outras.
Experiência sexual traumática, incluindo abu- tudo, diagnosticar e tratar as causas orgânicas, com
so sexual e incesto; atenção especial às ginecopatias. Deve também, tra-
Orientação sexual inadequada. tar a ansiedade, melhorar a autoestima da paciente e
ajudar na melhora do relacionamento do par.
Os fatores desencadeantes das disfun-
ções sexuais são essencialmente:
4. Conclusão
ansiedade e depressão;
As disfunções sexuais, apesar de serem
infidelidade;
uma queixa relativamente frequente nos servi-
falha ocasional;
ços de ginecologia, foram abordadas sucinta-
disfunção do homem;
mente porque não é o objetivo deste capítulo.
abortamento e parto;
experiência sexual traumática Por tudo que foi relatado, pode-se concluir
conflitos nos relacionamentos gerais. que todas as pessoas têm o direito de receber edu-
cação e orientação para ter condições de exercer
Os fatores que mantêm uma disfunção sua sexualidade saudável e com responsabilidade.
sexual são:
ansiedade quanto ao desempenho;
depressão;
D- Referências Bibliográficas
medo de falhar; ANDREASEN, N. C.; BLACK, D. W. Disfunção
culpa; sexual, parafilias e transtornos da identida-
falha na comunicação; de de gênero. Introdução a psiquiatria. 4.ed.
conflitos no relacionamento geral; Porto Alegre: Artmed, 2009. p.335-345.
troca de carícias muito limitada;
crenças irracionais, preconceitos e tabus; BARBOSA, R. M; KOYAMA, M. A. H. Comportamen-
exigências do parceiro. to e Práticas Sexuais de Homens e Mulheres, Brasil
1998 e 2005. Rev. Saúde Pública, São Paulo, 2009.
das ciências médicas que, trazendo para homens mais, uma população idosa. E, cada vez mais se
e mulheres a possibilidade de viver mais, levou torna atual o tema: “O sexo no Climatério e na
um contingente enorme de mulheres não só a Velhice”. Esta atualidade faz-se ainda mais evi-
chegarem lá, mas também a ultrapassá-la. Ao fa- dente quando se considera a idade média de
zê-lo, no entanto, as mulheres não se livraram do vida da mulher e a idade média da menopausa.
mais pesado dos significados que a menopausa A relação entre as duas permite-nos fixar o nú-
sempre trouxe embutida no seu bolo, a de que mero de anos que a média das mulheres vive,
se está chegando à tão temida velhice. após terem silenciado as funções ovarianas;
chegou-se à conclusão que a mulher ultrapassa
Mas, com os avanços da ciência, a mulher
no mínimo de 20 a 30 anos a vida de seus ová-
de 50 anos não é mais a mesma dos anos 30,
rios. Isto implica afirmar que, praticamente, um
40, 50. A geração que está vivendo o climatério,
terço da existência feminina é vivido no clima-
hoje, está realmente mais jovem e, como se sen-
tério e na velhice.
te com o espírito rejuvenescido, cuida mais da
aparência, e não só as caminhadas são uma prá- Até mesmo o mais grosseiro raciocínio
tica constante, como também ginástica, danças de valorização das coisas parece confirmar a
de salão, viagens, cursos e tantas outras coisas. importância do estudo destas fases, sobretudo
Tem outro visual e outros papéis, e tem sorte quando se sabe que sobre elas confluem pres-
em muitos aspectos: possui mais liberdade a sões biológicas, socioculturais e psicológicas.
respeito do seu corpo, é mais consciente sobre
A expressão “tota mulier est in útero”
os problemas de saúde e, principalmente, é a
(toda mulher está no útero) encerra em si mes-
geração que ganhou de presente a pílula an-
ma, um mito nuclear que alimenta e é alimen-
ticoncepcional, a medicina preventiva, o parto
tado por outros mitos secundários. Na verdade,
assistido, as psicoterapias e que ganha, agora, a
toda uma estrutura mística suporta esta afirma-
possibilidade da reposição hormonal.
tiva que procura identificar a sexualidade com a
Para Machado, se tudo é assim tão mara- função reprodutora. Realmente, se o sexo fosse
vilhoso, por que ainda se ouvem tantas queixas posto exclusivamente a serviço do fenômeno
e tantas reivindicações? Porque, um grande nú- reprodutivo, no climatério – quando se observa
mero de mulheres ainda vive esse período com a diminuição e do desaparecimento da função
grande pudor, pouco conforto e nenhum con- gonadal – teria lugar um processo de desse-
solo. As que se acomodaram a regras e sistemas xualização. A velhice seria uma fase assexuada.
de manutenção, por ser um processo mais fácil O argumento de que a mulher quando enve-
do que tentar se colocar contra mecanismos so- lhece e perde a capacidade de reproduzir tam-
ciais já cristalizados sentem o peso dos efeitos bém perde os motivos para o sexo, encerra um
de uma repressão tão violenta, e não mudam. sofisma evidente. O ato sexual já é um motivo
Muito menos têm uma visão positiva da maturi- suficiente por si mesmo e, além disso, a função
dade e dos direitos que a idade confere, presas sexual é muito mais abrangente do que a fun-
na armadilha dos rígidos estereótipos que di- ção reprodutora.
zem respeito ao papel da mulher mais velha. A
Atualmente ninguém mais discute a nítida
menopausa é, inclusive, uma boa desculpa para
diferença entre o campo do sexual e o campo do
o término de uma série de coisas: dos sonhos,
reprodutivo. Poucas pessoas fazem sexo pensan-
da vida sexual, do investir em si própria. Sen-
do apenas em procriar. Na maior parte das vezes,
tem-se marginalizadas, mas esquecem-se que
a sexualidade é usada com uma forma de prazer,
contribuíram para a própria marginalidade.
uma extraordinária forma de comunicação. Nos-
Segundo o Instituto Brasileiro de Geogra- sos corpos são eróticos ou erotizáveis durante
fia e Estatística (IBGE), há cerca de 24 milhões toda a vida; durante apenas alguns anos possu-
de mulheres com mais de 40 anos (censo 2000). ímos o potencial de reprodução. A sexualidade
A perspectiva de vida, no Brasil, é em torno de é a norma; a reprodução é uma ocorrência. São
72,4 anos, sendo que um terço da vida dessas os fatores socioculturais e não os biológicos que
mulheres será vivido no climatério, predomi- perpetuam o mito da identidade entre sexualida-
nantemente na fase de deficiência estrogênica. de e fenômeno reprodutivo.
Do ponto de vista demográfico, portanto, A sexualidade é definida como um dos pi-
o mundo de hoje tende a comportar, cada vez lares da qualidade de vida, sendo cada vez mais
dessas mudanças masculinas para que não as nais que agem sobre a realização sexual, ou seu
interprete erroneamente, como se o parceiro a tratamento apresenta consequências negativas
estivesse rejeitando. para o exercício da sexualidade).
O ginecologista, à medida que é um mé- A ausência de informações, assim como
dico não só da mulher, mas também do casal, suas distorções (tabus e mitos), constitui a gran-
deve ter conhecimento da resposta sexual do de causa de disfunções sexuais em nosso meio.
homem com a idade, assim como a origem de Segundo a prática clínica diária, nas mulheres,
seus problemas e tratamento, recorrendo a um encontra-se com maior frequência a inapetên-
especialista, quando necessário. cia sexual ou desejo sexual inibido devido à mo-
notonia conjugal e à habituação, e à dispareu-
Alguns anos após a menopausa, surge a
nia, por deficiência de estrogênio. A maioria das
atrofia da pele e das mucosas do aparelho ge-
mulheres na fase do climatério tardio perde o
nital, devido à deficiência estrogênica. A vagi-
interesse sexual por problemas psicossociocul-
na perde sua elasticidade, sua flora normal, sua
turais e não por deficiência hormonal, porém,
acidez e torna-se seca. A consequência destas
não se pode relegar o status hormonal a um se-
alterações é o aparecimento da vagina atrófica
gundo plano.
e a dispareunia. A reposição estrogênica, seja
sistêmica ou local (somente sobre a mucosa do Quando se trata de disfunções do desejo
sistema urogenital) propicia um retorno do tro- na mulher climatérica, as causas somáticas são
fismo da mucosa vaginal e uretral, levando ao raras. Entretanto, deve-se pesquisar se a pa-
reaparecimento do glicogênio das células vagi- ciente faz uso de medicamentos que interfiram
nais, à diminuição do PH vaginal e consequen- na libido, como antidepressivos, antiulcerosos,
temente a um predomínio da flora de lactoba- tranquilizantes e barbitúricos. Como já foi dito
cilos, que impedem a colonização de bactérias anteriormente, para a função sexual normal da
patogênicas, principalmente os gram-negativos mulher os androgênios têm um papel muito im-
responsáveis pelas cistites e uretrites. Quando portante. No diagnóstico da queixa de diminui-
há contraindicação para o estrogênio, pode-se ção da libido é imprescindível a avaliação clínica
utilizar o promestrieno. e laboratorial, no sentido de pesquisar a pre-
sença ou não de hipoandrogenismo.
É conhecido que o declínio da libido com
a menopausa inclui fatores biológicos. Segundo Diante das queixas de disfunção da ex-
Lopes, citando Kaplan e Owett, a baixa de an- citação, também como já foi abordado, a prin-
drogênios na mulher está associada a um signi- cipal causa é a deficiência de estrogênio, cau-
ficativo decréscimo no desejo sexual ou libido. sando secura vaginal. Exames ginecológicos e
A observação clínica, segundo Lopes, leva-nos sistêmicos são bastante esclarecedores, de-
a pensar que frente a um caso de hipoandro- monstrando o menor trofismo dos tecidos es-
genismo existe comprometimento também nas trogênio dependentes. Porém, em alguns casos
outras fases da resposta sexual, como a exci- a queixa pode ser devido a problemas neuroló-
tação e o orgasmo. Do ponto de vista prático, gicos e, mais raramente, doenças endócrinas e
uma mulher menopausada cirurgicamente ou metabólicas. Do ponto de vista prático deve-se
com níveis séricos de testosterona baixos ou no reforçar que a lubrificação vaginal, sensibilidade
limite inferior, pode ser favorecida com a adição clitoridiana e presença ou ausência de dor ao
de androgenioterapia. coito são dados importantes no diagnóstico de
disfunções relacionadas à fase de excitação.
Com relação aos bloqueios emocionais
provocadores de disfunções sexuais no clima- Nos casos de disfunção do orgasmo,
tério, as causas podem ser: psicológicas imedia- apenas três patologias orgânicas podem ser
tas, conflitos intrapsíquicos, conflitos relacionais as causadoras: problemas neurológicos, medi-
ou circunstanciais. camentos que provocam disfunções químicas
dos nervos responsáveis pela função reflexa
É importante enfatizar que as causas or-
do orgasmo e patologias endócrinas e meta-
gânicas (neurológicas, vasculares, endócrinas,
bólicas que comprometem a função hormo-
psiquiátricas, uso de drogas ou medicamentos),
nal. Alguns autores consideram a neuropatia
podem exercer uma influência direta (a doen-
diabética como a principal causa orgânica de
ça impede a manifestação da sexualidade), ou
anorgasmia feminina.
indireta (a doença produz alterações emocio-
O tratamento das disfunções sexuais nes- LORENZI, D.R.S.; SACILOTO, B. Factors related to
sa faixa etária pode ser preventivo ou curativo. frequency of sexual activity of postmenopausal
As mulheres climatéricas devem comunicar aos women. Revista da Associação Médica Brasi-
seus parceiros sobre suas necessidades e pro- leira, v.52, n..4, p.256-260, 2006.
blemas sexuais, bem como ser instruídas so-
bre as mudanças fisiológicas e anatômicas que LORENZI,D.R.S.; et al.. Predicting factors of cli-
ocorrem com o avançar da idade. Nesse mo- macteric symptoms. Rev. Bras. Ginecol e Obst,
mento é importante estar atento a mudanças v.27, n.1, p.12-19, 2005.
nas atividades sexuais propriamente ditas, não MACHADO, I.P. Sexualidade no climatério. In:
considerando o coito como a única expressão MACHADO, L.V. Endocrinologia Ginecológica.
de sexualidade e fazendo uso de hormônios Rio de Janeiro: MedBook, 2006. Cap 15. p.255-
e lubrificantes vaginais quando necessários. 69.
Quando os problemas forem de origem emo-
cional, pode-se tentar resolvê-los por meio do OLIVEIRA, D.M.; JESUS, M.C.P.; MERIGHI, M.A.B.
estímulo ao diálogo e da proposição do sexo Climateric and sexuality: the comprehension of
descompromissado com o coito. Educação se- this interface by women attended in group. Tex-
xual, psicoterapia sexual e aconselhamento to & Contexto – Enfermagem, v.17, n.3, p.519-
constituem também armas efetivas quando as 526, 2008.
pessoas não resolvem por si só. Segundo Lopes,
SOUZA, C.L.; ALDRIGHI, J.M.; LORENZI FILHO,
se os problemas forem de origem orgânica, o
G. Quality of sleep of climacteric women in São
acompanhamento pelo sexólogo pode ajudar
Paulo: some significant aspects. Revista da As-
na resolução. O uso de medicações tem que se-
sociação Medica Brasileira, v.51, n.3, p. 170-
guir rigoroso critério científico e nenhuma dro-
176, 2005.
ga tem o poder de fazer que a pessoa se inte-
resse pelo sexo ou fazer o parceiro interessante
e interessado, quando existem problemas intra
ou interpessoais importantes.
Para Lopes, todo ginecologista deve es-
tar preparado para abordar a sexualidade no
climatério. É uma exigência da medicina mo-
derna, que se preocupa com a qualidade de
vida dos pacientes.
D- Referências Bibliográficas
BERNI, N.I.O.; LUZ, M.H.; KOHLRAUSCH, S.C. Co-
nhecimento, percepções e assistência à saúde
da mulher no climatério. Revista Brasileira de
Enfermagem , v.60, n.3, p. 299-306, 2007.
sexual durante a gestação parece ser um dos companheiro está forçando ou simulando sen-
pontos mais vulneráveis do relacionamento do timentos que não tem. A ideia de que o marido
casal, podendo acarretar crise na vida conjugal. simula sentimentos que na verdade não possui,
que pode estar procurando outra mulher, favo-
Apesar da grande importância deste
rece um clima de discórdia continuada, poden-
tema, sexo durante a gravidez é considerado
do provocar uma crise de vínculo do casal.
um dos últimos tabus a serem desvendados.
Pouco ainda se conhece a respeito das mudan- O exercício da sexualidade durante a ges-
ças fisiológicas e psicológicas na esfera sexual tação depende fortemente de como é vista pela
determinadas pela gravidez. Entretanto, se- própria mulher antes da gestação. Se a visão
gundo Barclay, pode-se classificar basicamente anterior for negativa, ou seja, visto como algo
as alterações como de fundo sociocultural, or- sujo, ruim ou até pecaminoso, é óbvio que não
gânico e psicológico que atuam durante a ges- se conseguirá reverter durante o curto período
tação, interferindo de diferentes formas sobre da gestação para uma visão positiva. A visão da
a sexualidade do casal. mulher está fortemente vinculada à relação com
seus pais ou pessoas que exerceram ou exercem
A cultura e as tradições de cada socieda-
este papel. Um relacionamento problemático
de podem exercer forte influência sobre a vida
frequentemente vincula-se a um relacionamen-
sexual do casal durante a gestação.
to mais instável com o companheiro. Assim sen-
Na gestação, a mulher passa por uma re- do, o exercício da sexualidade visto como algo
volução hormonal e por profundas alterações “impuro” torna-se incompatível com o conceito
em seu esquema corporal. Não seria sensato de certa “santidade”, que cerca a maternidade.
negar as contundentes alterações físicas que
Para Lazar, as mulheres que não aceitam
acontecem como o crescimento abdominal, a
a gravidez geralmente procuram os serviços
sensibilidade mamária, a ocorrência inoportuna
de pré-natal em estágios mais avançados da
de náuseas e vômitos, à maior lubrificação vagi-
gestação, o que poderia traduzir uma dificul-
nal, entre outros. Todas essas são alterações or-
dade maior de sua aceitação, sendo muitas
gânicas que as mulheres experimentam durante
vezes negadas em seus estágios iniciais. Pode
a gestação e que podem influir fortemente na
ser conflitante estar em um momento cultural-
vida sexual do casal. Segundo Lazar, não se trata
mente considerado especial e, ao mesmo tem-
de uma interferência por carência de afeto ou
po, não estar gostando de si mesma. Emoções
de sentimentos, mas por gerar desconforto.
e sentimentos variáveis, desde a alegria até a
Do ponto de vista psicológico, a mulher depressão, decorrem de preocupação em rela-
pode não se sentir atraente ou feminina, dimi- ção à evolução da gestação, das condições do
nuindo com isto sua autoestima. Na sociedade recém-nascido, dos problemas econômicos,
atual, a imagem que é veiculada por meio dos dos futuros cuidados com o filho. A mulher
meios de comunicação, como jornais, revistas passa a se ver e a ser vista de maneira diferen-
e televisão exigem que as mulheres sejam ex- te, adquire um novo papel, o de mãe, o que
tremamente magras e esguias e que, mesmo pode gerar sentimentos de insegurança e ins-
quando grávidas, engordem o mínimo possí- tabilidade emocional. Nesta fase, pode haver
vel, até mesmo menos que o recomendado por conflitos importantes entre o papel anterior de
seus médicos. Criou-se um ideal de beleza tam- companheira e amante, permeado do papel de
bém durante a gestação. Mediante este quadro, esposa, e o seu status de mãe.
a mulher pode sentir-se atraente e desejável
Emocionalmente, essas questões podem
para o seu companheiro ou ter medo de perdê-
comprometer seriamente a libido. Há necessi-
-lo para outra mulher.
dade de uma reorganização de identidade que
A sexualidade da mulher na gravidez envolve também o homem, pois a paternida-
dependerá, também, de como se percebe, se de implica responsabilidade pela criança que
avalia e se valoriza. Sentir-se amada e atraente vai nascer assumir a função de protetor de sua
depende, também, dos esforços de seu com- companheira, e a ajustamentos à sua nova con-
panheiro em deixar claro seu sentimento por dição. Com o nascimento do primeiro filho, o
ela, aumentando, assim, sua afetividade. A au- casal muda a condição de família, com um ter-
toestima rebaixada manifesta-se por extrema ceiro elemento na composição da díade conju-
insegurança, dando a nítida impressão de que o gal, o que, consequentemente, gera impactos
profundos. Surge a necessidade de novas adap- de sexual antes da gestação, e uma diminuição
tações e ajustamento, tanto no sentido pessoal ainda mais acentuada durante a gestação, prova-
quanto no interpessoal. velmente devido à repressão da expressão sexual
da cultura chinesa, quando comparada à ociden-
Conflitos decorrentes do medo da per-
tal. Analisando-se o primeiro, segundo e terceiro
da da individualidade, da divisão do amor pelo
trimestres respectivamente, foram observados
parceiro por mais outra pessoa (filho), da inse-
37,3%, 34% e 64,7% de abstinência sexual.
gurança em relação às modificações físicas, po-
dem surgir e a gravidez pode se transformar em O desejo sexual é definido como impulso
ameaça à relação do casal, principalmente se sexual, produzido pela mobilização do mundo
essa relação tiver sido construída anteriormen- interno (psicológico) da pessoa e pela ativação
te em alicerce frágil. A mulher pode começar a do sistema límbico e hipotalâmico em função
excluir progressivamente o parceiro de sua vida, de estímulos eróticos. O desejo é experimenta-
o que pode gerar no homem, intenso ciúme do do na forma de sensações específicas que le-
filho que vai nascer ou repulsa por alguém que vam a pessoa a buscar ou a tornar-se receptiva
“não lhe quer mais”. Nem todos os casais viven- às experiências sexuais. Assim como existe o
ciam tais problemas, e a intensidade com que desejo, existe a inibição do desejo, que é co-
essa crise da gravidez é vivida pelos casais é ex- mum no homem e na mulher, ocorrendo perda
tremamente variável. de interesse sexual um pelo outro.
Para Vitiello, o fator que parece mais di- As causas da inibição, como já foram abor-
retamente influenciar na performance sexual dadas, podem ser físicas, psicológicas ou cultu-
masculina é a questão estética da mulher. De- rais. Para alguns casais existe o temor de que a
pendendo das preferências do companheiro, relação sexual machuque a mãe e/ou o bebê; o
as alterações na estética corporal da mulher excesso de zelo, contudo, leva alguns casais a ini-
servem como desestímulo à sua libido. Muito bir o desejo sexual, o que pode representar uma
embora por amor e respeito algo possa ser dito regressão afetiva e uma insegurança emocional.
em sentido contrário, na realidade a perda de Mas hoje, muitos casais procuram ajuda e man-
atrativos sexuais da mulher, que passa a não têm inalterado o seu comportamento sexual.
corresponder ao modelo social de “sexualmente
De forma genérica, um padrão de com-
atraente”, é um importante fator negativo sobre
portamento pode ser observado dependendo
o desempenho sexual masculino.
da idade gestacional. Alguns autores dividem a
Algumas mulheres, apesar de apresen- gestação em quatro fases distintas, de acordo
tarem certo desconforto ou mesmo desprazer com a sexualidade em cada período: da concep-
durante o coito, preferem cumprir suas “obriga- ção até 2 ½ meses de gestação (12 semanas);
ções” maritais por temer a infidelidade do ma- de 2 ½ a 8 meses (12 a 32 semanas); durante o
rido. Os números a esse respeito são variados, oitavo mês de gestação (32 a 36 semanas) e no
estimando-se que entre 4% a 23% dos compa- nono mês de gestação (36 semanas ou mais).
nheiros iniciam vida extramarital durante a ges- A maioria, entretanto, prefere dividir a gravidez
tação; entretanto, antes da gestação cerca de em apenas três fases, correspondendo ao pri-
15% destes já tinham tido casos extraconjuais meiro, segundo e terceiro trimestres e cada uma
e no pós-parto 8% iniciaram uma relação ex- delas apresentando reações e sentimentos dife-
traconjugal, sendo que 4% destes pela primei- rentes, que são influenciados por vários fatores.
ra vez. Sentimentos de rejeição são descritos
como o principal fator motivador para o início
de relacionamentos extramaritais neste perío- 2. Modificações no comportamento sexual
do. A labilidade do companheiro para lidar com 2.1. Primeiro trimestre
esses medos é de importância relevante para a
relação neste período. No primeiro trimestre da gravidez, os
sintomas desagradáveis como náuseas, vômi-
A atividade sexual durante o ciclo gravídi- tos, insônia e fadiga levam à inibição sexual. O
co costuma sofrer uma redução de 40% a 60%, lento desenvolvimento do ventre propicia sen-
em virtude de todos esses fatores aqui citados. timentos ambíguos como alegria, entusiasmo,
Na China, estudo retrospectivo em dois hospitais apreensão, angústia e rejeição. Esses sintomas
escola de Hong Kong, encontrou baixa ativida- são provocados por alterações hormonais e por
mudanças psicológicas, que podem levar a uma amor do companheiro e testam esse amor por
baixa no desejo sexual. A libido da mulher volta- meio de inusitados desejos. Do ponto de vista
-se para o processo de mudanças corporais e emocional, é o período mais estável. A aparição
sua atividade sexual diminui; para as nulíparas, de novas redes vasculares na zona subabdomi-
esse decréscimo pode refletir o medo, muitas nal cria uma vasocongestão bastante estimulante
vezes infundado, de abortar. para a maioria das mulheres. Os efeitos da con-
gestão da vasculatura pélvica e a diminuição dos
Quando a mulher descobre que está grá-
vômitos gravídicos no segundo trimestre podem
vida, ela geralmente necessita de um período
ser fatores importantes que permitem que as mu-
de recolhimento até incorporar o papel de mãe;
lheres grávidas continuem tendo práticas sexuais.
terá de abdicar de algumas atividades para po-
der doar parte de si para o filho que irá nascer. A exploração do corpo despertada pela
curiosidade que acompanha a gravidez pode le-
Embora os fatores psicossociais sejam re-
var a mulher e seu parceiro a novas descobertas;
levantes, os chamados “pequenos sintomas” da
por meio dos toques e das carícias, acontecem
gestação, de origem orgânica, podem ter influ-
um maior contato e valorização do corpo.
ência no desejo sexual, dentre os quais a mas-
talgia por engurgitamento venoso e o edema Do ponto de vista emocional, é o período
do epitélio vaginal, que deixam o seio e a va- mais estável.
gina menos sensíveis ao toque. Nos níveis mais
profundos do psiquismo, ocorrem sentimentos
e defesas que são característicos nesse período 2.3. Terceiro trimestre
inicial da gestação. O mecanismo de defesa de No terceiro trimestre, o grande tamanho
negação surge pelo conflito entre desejo e con- do ventre ocasiona dificuldades com posições
tradesejo de ter esse filho. As defesas maníacas para o sexo e tende a diminuir a frequência
são representadas pela certeza da chegada de deste. Além disso, as mulheres apresentam so-
um filho bonito, que cumulará os pais de feli- nolência, irritabilidade, tensão dorsal e dor nas
cidade; em oposição, a excitação masoquista costelas. Emocionalmente, os sentimentos mais
mostra-se pelo medo do filho disforme, que comuns nesse momento são a ansiedade com
pode assumir proporções ansiogênicas. As fan- a proximidade do parto e o medo irracional da
tasias terroríficas são demonstradas pelo medo criança não ser normal.
de morrer no parto e de não saber cuidar bem
do bebê. Nesse período, a ansiedade dominan- Esse período é caracterizado por um au-
te pode estar sendo ativada pela culpa de ter mento da interferência dos fatores orgânicos e
tido relação sexual (visão do sexo como impuro) das ansiedades em relação ao parto, o que leva
e pela reativação de fantasias incestuosas. a uma notória diminuição da atividade sexual.
As oscilações da pressão arterial, a retenção de
Durante essa fase, a gestante vive muitas líquido e a liberação das endorfinas, podem le-
mudanças emocionais características desse pe- var à diminuição do desejo sexual. Além disso,
ríodo inicial quando ela necessita saber que é corroborando com esses sinais, são frequentes
amada pelo parceiro e pelos outros membros os casos de sonolência, fadiga, dispareunia, irri-
da família. tabilidade, tensão dorsal e geralmente excesso
de peso. O grande tamanho do ventre ocasiona
dificuldades nas relações sexuais acarretando
2.2. Segundo trimestre
um maior desconforto na busca de posições
A segunda fase da gestação caracteriza- adequadas para a penetração. No entanto, a ne-
-se pelo aumento do desejo sexual na maioria cessidade de buscar posições alternativas para
das mulheres. O medo da perda gestacional di- um maior conforto no ato sexual contribui para
minui; a mulher está mais confiante no seu po- o desenvolvimento da criatividade e da sintonia
der de gestar. A percepção real da gravidez com entre os parceiros o que ajuda a mulher a se
o crescimento do ventre, bem como a ausência tornar mais desejada, evitando a diminuição do
de náuseas, propiciam aumento do erotismo e interesse sexual do parceiro que é tão comum
da qualidade orgástica, elevando, assim, sua au- nessa fase da gestação.
toestima Entretanto, para algumas gestantes, a
Emocionalmente, os sentimentos mais
percepção das modificações corporais remete-as
comuns nesse momento são a ansiedade com
a uma maior insegurança, pois temem a perda do
a proximidade do parto, a data do nascimen- lução. Para Lopes, a gravidez produz modifica-
to, como será o parto, o medo de a criança ções nas distintas fases.
não ser normal e sua criação que podem pro-
Na fase de excitação, há maior ingurgitação
piciar defesas como o pensamento mágico e
e edema dos lábios maiores da vagina. Nas multí-
a onipotência das ideias; o grau dessas ansie-
paras, o desenvolvimento da plataforma orgástica
dades dependerá do ambiente e da receptivi-
é maior. Na fase de resolução, quanto mais avan-
dade da família.
çada a gravidez, menos notável é a diminuição da
A frequência de relações sexuais, como já vasodilatação que precede o orgasmo.
foi dito anteriormente, diminui com a progressão
Na lactação, a sucção do mamilo provoca
da gravidez, com acentuada diminuição do pe-
liberação do ocitocina pela pituitária posterior
ríodo pré-gravidez para o 1º. trimestre e muitas
(neuro-hipófise), contribuindo para as modifi-
vezes diminuição drástica, chegando muitas ve-
cações uterinas que acompanham o orgasmo.
zes à abstinência quando se aproxima do parto.
O reverso também pode ser demonstrado, ou
Como no primeiro trimestre, os cuidados seja, a estimulação sexual da mulher pode vir
médicos são imprescindíveis nessa última fase acompanhada de ejeção láctea, provavelmente
da gestação. A vida sexual ativa na gravidez devido à liberação de ocitocina. Os baixos níveis
normal, além de não prejudicar, contribui para de andrógenos, nesta fase, explicariam a dimi-
a manutenção do tônus dos músculos da região nuição do desejo sexual, e, consequentemente,
pélvica, facilitando o trabalho de parto; mantém uma menor lubrificação vaginal, que poderia
a capacidade orgásmica da mulher, o sentimen- ocasionar dispareunia. As dores ao coito podem
to de ser amada e desejada. Assim, os papéis ser exacerbadas ou mantidas devido à episioto-
prioritários de marido e mulher não são substi- mia ou outras formas de traumas do parto.
tuídos, mas apenas acrescidos pelos papéis de
Fatores hormonais são relevantes, porém
pai e mãe, sem interferir na expressão da afeti-
mudanças psicossociais durante este período
vidade erótica.
explicariam mais acuradamente os frequentes
No pós-parto observa-se também, dimi- bloqueios sexuais no pós-parto.
nuição do interesse sexual, em geral atribuídos
a temor, dor, fadiga, debilidade e secura vaginal
devido à queda das taxas hormonais. Segundo 4. Práticas sexuais em gestantes
Lazar, neste período a puérpera sente-se cansa- 4.1. Penetração vaginal
da e pode até mesmo sentir-se ressentida com
o marido. Muitas vezes encontra-se ainda acima A prática da penetração vaginal, quando
do seu peso pré-gestacional, o que acarretaria di- comparada por trimestre, mostra um decréscimo
minuição de sua autoestima e problemas sexuais progressivo com o avançar da gestação. Estudos
adicionais. A lactação pode reduzir o desejo se- mostram que mais de um terço das mulheres chi-
xual de seus parceiros, do mesmo modo que a nesas e cerca de 42% das malaias cessam a prá-
imagem da esposa como mãe dos seus filhos, em tica de penetração vaginal durante a gestação.
contraste com sua imagem como objeto sexual. Essa redução foi associada com a cultura, conhe-
cimento inadequado e ansiedade excessiva.
Fatores inerentes à forma de alimentar o
recém-nascido, como medo de nova gravidez,
dor persistente, relacionamento em crise, doen- 4.2. Masturbação
ça na família, desemprego, interferem também
na frequência das relações sexuais e não podem Um estudo realizado no Canadá em 2000
ficar à margem das abordagens terapêuticas A mostrou que 31% das mulheres grávidas são
suspensão do aleitamento materno geralmente adeptas da masturbação, já no Brasil, outra aná-
está associada a uma melhora no estado de hu- lise mostrou uma prática de 13%, 11%, e 13%
mor, disposição e sexualidade. no primeiro, segundo e terceiro trimestres res-
pectivamente. Antes da gestação 44 a 75% dos
casais europeus e americanos praticam mastur-
3. Modificações na resposta sexual bação mútua e já 27,5% dos casais brasileiros a
praticam. Esses índices são explicados pelo pre-
A resposta sexual pode ser dividida em domínio da cultura da classe media profissional,
quatro fases: excitação, platô, orgasmo e reso- que nos países europeus e nos Estados Unidos
essa classe é mais populosa e tem uma cultura A interrupção do ato sexual pode ser re-
mais aberta do que a do Brasil. comendada nos seguintes casos: risco de abor-
to, sangramento, perda de líquido amniótico,
Em 2007, um estudo intercultural mostrou
histórico de parto prematuro, infecções, dores,
que quase metade das mulheres nunca teve um
dilatação prematura do cérvix, dores abdomi-
orgasmo por meio da masturbação; esta é asso-
nais, placenta prévia, insuficiência placentária,
ciada a um maior conhecimento corporal e das
incompetência cervical, gravidez múltipla e res-
zonas erógenas, que está positivamente relacio-
trição de crescimento intrauterino.
nada com uma melhora da qualidade da vida
sexual tanto das mulheres quanto dos seus par- O orgasmo na mulher é representado
ceiros. Dessa forma, a masturbação durante o pe- fisiologicamente por dois fenômenos: vaso-
ríodo gestacional pode ser benéfica, já que ocorre congestão e contrações musculares. Dentre as
intensa ação hormonal e alterações adaptativas contrações musculares, as uterinas, principal-
atuando no corpo feminino nessa fase da vida. mente, podem representar perigo para as mu-
lheres com risco de abortamento ou parto pre-
maturo, ou história habitual destas patologias
4.3. Sexo oral obstétricas. A história habitual de uma dessas
No Canadá, 55% dos casais realizam duas entidades nosológicas deve ser orienta-
sexo oral durante a gestação. Em contrapar- da para as atividades não coitais ou orgásti-
tida na China foi verificado uma porcentagem cas apenas no período correspondente, e não
de 0% de sexo oral antes da gestação e no durante toda a gravidez. Em caso de risco de
primeiro trimestre, já nos três últimos meses abortamento, tão logo seja afastada a hipótese
da gestação foi notado uma taxa de 1,1% des- de interrupção da gravidez, deve-se suspender
sa prática sexual. Esses dados não especificam a proscrição do sexo.
quem recebia e quem praticava o sexo oral
(felação e cuninligus). Diante dessa falta de
informação, foram avaliadas gestantes brasi- 6. Mitos e tabus sexuais
leiras em 2002, e observou-se uma porcenta- Na população, de uma forma geral, ainda
gem de 55,5%, 25%, 34,5% e 38,1% de fela- existem muitos mitos, tabus e desinformações
ção antes da gestação, no primeiro, segundo que geram uma visão distorcida sobre esse
e terceiro trimestre respectivamente, e para tema. “Sexo provoca aborto”, “toda mulher
cunilingus encontrou-se nas mesmas fases, sente menos necessidade de sexo na gravi-
63,9%, 38,9%, 44,9% e 33,3% . dez”, “a infidelidade masculina é uma constan-
te nesse período”, “a mulher fica feia”, e outras
crendices acabam levando à deserotização da
4.4. Sexo anal relação sexual do casal. O maior mito sexual
Estudos mostram que o sexo anal é inco- consiste na crença de que não deve existir re-
mum entre as mulheres chinesas durante a ges- lação sexual na gravidez.
tação; ocorre em torno de 7% entre as gestan- Os casais de classes sociocultural média e
tes brasileiras e as canadenses e cerca de 40% alta apresentam menos crenças irreais com rela-
entre as grávidas francesas. ção à sexualidade da gravidez; entretanto, esses
números ainda não são significativos. Estudos
mostram que cerca de 19,5% das mulheres de
5. Sexualidade e complicações da classe média e 25% das universitárias acredita-
gravidez vam na incompatibilidade entre o sexo e gra-
Os perigos potenciais do coito durante a videz, e que o mito “o sexo faz mal ao nenê”
gravidez envolvem três áreas principais: fatores é mais frequente entre homens (30%) do que
mecânicos, infecções e contrações uterinas. A úni- entre mulheres (7%).
ca técnica sexual que deve ser questionada duran- É muito importante que os profissionais
te uma gestação saudável é o cuningulus. Alguns de saúde esclareçam esses mitos e tranquili-
trabalhos relatam morte materna atribuída à em- zem o casal sobre a prática sexual durante a
bolia gasosa produzida por insuflação (sopro de gestação nos casos em que ela não está con-
ar) vaginal. Enquanto isso, os temores ligados aos traindicada.
possíveis danos do coito vaginal são infundados.
COWAN, C.P.; COWAN, P.A. When partners be- UDDENBERG, N. Psychological aspects of sexual
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Paulo: Summus, 2001, p.189- 200. Thai. v.87, n.3, p.45-49, 2004.
resultados dos exames físicos são dados como culdades em manter relações sexuais e em de-
normais. Isso ocorre principalmente porque a senvolver um relacionamento com os filhos.
maioria dos casos de agressão demoram para
Outra consequência para as crianças e
ser notificados, permitindo a cicatrização da le-
adolescentes vítimas de abuso é que elas ten-
são, ou então, o abuso não foi constituído de
dem a perpetuar o ciclo quando adultos, viti-
relações com penetração e sim por carícias, to-
mando os próprios filhos.
ques, dentre outros.
Com a agressão frequente, aumentam
os riscos de a criança desenvolver uma gravi- 6. Prevenção
dez precoce e, nessa condição, pode sofrer um A prevenção da violência é realizada de
aborto, induzido ou não. Outro enorme risco diferentes formas, podendo ser primária, discu-
para a criança ou adolescente vítima de abuso tida agora, secundária ou terciária, discutidas no
sexual é a contaminação pelo vírus HIV, além atendimento às vítimas de violência.
de outras doenças sexualmente transmissíveis,
como: sífilis, gonorreia. A prevenção primária busca evitar a ocor-
rência da violência, principalmente por meio de
Os abusos também podem provocar al- abordagens educacionais direcionadas a grupos
terações súbitas do comportamento normal da como escolas e faculdades; a indivíduos selecio-
criança ou do adolescente, como: distúrbios ali- nados por estarem expostos a fatores de risco; e
mentares e afetivos, padrão de sono alterado, às pessoas que já demonstraram comportamento
agressividade, isolamento social, medo de ficar violento, sendo essa última uma intervenção indi-
sozinho, déficit de linguagem e de aprendiza- cada como terapia para controle da violência.
do, baixa autoestima, práticas de delitos, uso
de drogas ilícitas, pesadelos, tristeza, ansie- Todas as abordagens devem ser baseadas
dade, depressão, ideias suicidas e homicidas, em estatísticas que forneçam orientação acerca
dentre vários outros. A criança pode tornar-se de qual problema é o mais prevalente ou gra-
sexualizada além do normal para a idade, de- ve, como também qual ação seria mais eficiente
monstrando conhecimentos não usuais sobre o para reduzí-lo.
tema; comportamento erótico avançado para a Sabe-se que, atualmente, o principal foco
idade; desenvolvendo brincadeiras sexuais com da prevenção está sobre as reações secundárias
amigos, objetos; masturbando-se compulsiva- e terciárias, oferecendo suporte para as vítimas
mente; desenhando órgãos sexuais detalhados, da violência e aconselhamento psicológico para
dentre outros. os agressores, entretanto, uma resposta abran-
A longo prazo, podem surgir distúrbios psi- gente deve abordar não só as vítimas, mas tam-
cológicos e de personalidade, os quais constituem bém promover a não violência, reduzindo as cir-
os mais sérios problemas decorrentes do abuso. cunstâncias e condições que a favorecem.
Várias alterações psiquiátricas foram relacionadas O enfrentamento da violência exige a in-
a episódios de violência sexual sofridos na infân- tegração de setores da sociedade, como: saúde,
cia ou adolescência, com gravidade e característi- segurança pública, educação justiça e trabalho,
cas variando com tipo de violência, idade de iní- assim como da população em geral. Nesse aspec-
cio, duração, relação da criança com o agressor, to, torna-se absolutamente necessária a capacita-
número de agressores, uso de força. Estatísticas ção de profissionais que tenham habilidade para
americanas de 1994 mostram que 85-90% dos abordar a questão, seja na educação para preven-
pacientes psiquiátricos foram vítimas de maus tra- ção, seja na saúde para detecção e tratamento.
tos na infância, principalmente abuso sexual.
As principais psicopatologias cujos riscos
de desenvolvimento aumentam nesses indivídu- 7. Notificação
os: transtorno do estresse pós-traumático, trans- No Brasil, estima-se que 20% das crianças
tornos dissociativos, fobias, paranoia, transtorno e adolescentes sejam hoje vítimas de alguma
obsessivo compulsivo, transtorno de conversão. forma de violência. Na verdade, acredita-se que
Adultos que foram vítimas de violência esse percentual seja bem maior, com muitos ca-
sexual na infância podem desenvolver proble- sos suspeitos ou confirmados não chegando a
mas para se adaptarem socialmente, com difi- ser notificados.
Nos casos em que a avaliação inicial da O espaço físico hospitalar para atendi-
paciente é feita diretamente pelo profissional mento das vítimas deve demonstrar preocupa-
médico, esse deverá realizar o preenchimento ção com a privacidade, sem, entretanto, rotular
de uma ficha padronizada, relatando os dados as crianças e adolescentes ali atendidas com
importantes sobre o ocorrido, uma anamne- placas indicativas nas salas para atendimento às
se detalhada, um exame físico completo com vítimas de violência.
atenção especial para as áreas mais envolvidas
Dessa forma, o ambiente ideal tem que ser
em atividades sexuais (boca, mamas, genitais,
constituído de uma sala privativa onde possam
nádegas, região perineal e ânus) e um exame
atuar a psicóloga e a assistente social e de um
ginecológico criterioso, descrevendo as lesões
consultório médico com sala de exame ginecoló-
encontradas e realizando a coleta do conteúdo
gico. É necessária a existência de um centro cirúr-
vaginal para pesquisa de espermatozoides.
gico, mesmo que pequeno, para os atendimentos
No caso de crianças, durante a anamnese, que necessitem de correção cirúrgica de urgência
devem ser investigados dados como com quem e para a realização dos abortos previstos por lei.
a criança passa o dia, com quem ela dorme, os
Após o atendimento médico, a vítima
hábitos de vida (banho, privacidade na troca de
será encaminhada para a assistente social e
roupa), o início e a duração do abuso, o local
para a psicóloga. À assistente social caberá as
do mesmo, quem poderia ser o responsável,
funções como elaborar o prontuário, contendo
como foi o abuso (carícias, masturbação, ejacu-
dados do ocorrido, orientar sobre os direitos le-
lação, penetração anal e/ou vaginal, penetração
gais, fazer contato com delegacias, orientar os
peniana, digital ou de corpo estranho), rendi-
familiares e conhecer a situação social da vítima.
mento escolar e dificuldades na escola, modi-
ficações na conduta da criança e de familiares, Com relação ao acompanhamento psico-
entre outros aspectos. lógico, este busca avaliar o impacto da violência
sobre a esfera psíquica da vítima. Na entrevista
O comportamento dos familiares deve ser
psicológica, que aborda tanto a vítima como seus
investigado, pois vários sinais constituem um
familiares, deve-se dar ênfase ao histórico de vio-
alerta para a possibilidade do abuso, como: uso
lência na família, à sexualidade no contexto fami-
abusivo de álcool e/ou drogas, excesso de zelo
liar e às relações entre os membros da família.
para com a criança ou adolescente, relação con-
jugal instável, comportamento sedutor, postura Quando se trata de uma criança, a entre-
contraditória ao prestar informações sobre o caso, vista inicial é feita com a mãe ou responsável, a
ausência do lar, estímulo à criança ou adolescente fim de obter informações sobre os danos emo-
para as descobertas sexuais, dentre outros. cionais gerados pela violência, as reações da
criança e da família e a capacidade desse adulto
O médico deve proceder, quando neces-
de ser um “cuidador” da criança.
sário, ao reparo das lesões encontradas e à co-
bertura com antibióticos e analgésicos, à contra- Em relação à adolescente, é importante
cepção de emergência e a outras medidas como considerar todo o processo psicológico que en-
a vacinação antitetânica em casos de ferimentos volve essa fase da vida, necessitando o profis-
perfuro cortantes ou contato com a terra. sional adquirir a confiança da vítima para que
essa possa sentir-se à vontade para falar sobre
Durante o atendimento médico, são so-
o ocorrido.
licitados os exames laboratoriais para investi-
gação de DST, tais como sorologia para sífilis, O profissional responsável pelo acompa-
hepatites B e C, anti-HIV, além do teste de gravi- nhamento psicológico da criança/adolescente
dez, se isso tudo já não tiver sido realizado pela e suas famílias deve demonstrar interesse em
equipe de enfermagem. assistir a ambas as partes, pois é muito impor-
tante que se estabeleça um vínculo para que o
A relação do profissional com a pessoa
tratamento tenha êxito.
que acompanha a criança ou o adolescente
deve ser firme, sincera e, ao mesmo tempo, Tratando-se de qualquer tipo de violên-
procurar demonstrar toda a sensibilidade que cia, a “alta” do paciente só poderá ser concedida
esse tipo de problema requer, acolhendo com após a análise da equipe multidisciplinar para se
carinho e respeito, a fim de evitar qualquer tipo ter certeza de que todas as questões foram bem
de descriminação. trabalhadas e discutidas.
D- Referências Bibliográficas
ADED, N. L. O. et al. Abuso sexual em crianças e
adolescentes: revisão de 100 anos de literatura.
Rev Psiq Clín. v. 33, n. 4, p. 204-13, 2006.
conceito bastante abrangente do que vem a ser de proteção, tais como a facilitação no acesso aos
esta espécie de violência. Veja-se: benefícios tecnológicos e científicos com o forne-
cimento dos serviços de contracepção de emer-
Art. 7o São formas de violência doméstica
gência e profilaxia das DST; a garantia de proteção
e familiar contra a mulher, entre outras:
policial, quando necessária; o fornecimento de
I – omissis transporte e abrigo para a ofendida, quando hou-
II – omissis ver risco de vida; a imposição de medidas protetivas
de urgência contra o agressor, como por exemplo,
III - a violência sexual, entendida como o afastamento do lar, domicílio ou local de convi-
qualquer conduta que a constranja a presenciar, vência com a ofendida ou a proibição de determi-
a manter ou a participar de relação sexual não nadas condutas – aproximação ou contato com a
desejada, mediante intimidação, ameaça, coação vítima ou frequentação de determinados lugares a
ou uso da força; que a induza a comercializar ou fim de preservar a integridade física e psicológica
a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, da mulher (BRASIL. Lei no 11.340, 2009).
que a impeça de usar qualquer método contra-
ceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, É importante esclarecer que a Lei
ao aborto ou à prostituição, mediante coação, 11.340/06 não visa tutelar toda e qualquer vio-
chantagem, suborno ou manipulação; ou que li- lência contra a mulher, mas tão somente aquela
mite ou anule o exercício de seus direitos sexuais caracterizada no seio familiar, ou seja, a violên-
e reprodutivos (BRASIL. Lei no 11.340, 2009); cia intrafamiliar, em que haja uma relação de
posição de poder entre vítima e agressor.
Nota-se que, por meio do dispositivo legal
acima, destacam-se algumas variantes da violên- O Código Penal Brasileiro traz o conceito
cia sexual, como o abuso sexual e a exploração legal do que vem a ser o estupro – espécie de
sexual. O abuso sexual é aquele realizado por violência sexual – em seu art. 213. Veja-se:
meio da força física, ameaça ou sedução com a Art. 213. Constranger alguém, mediante
finalidade de satisfazer a lascívia de quem depre- violência ou grave ameaça, a ter conjunção car-
ende esses esforços. Já a exploração sexual está nal ou a praticar ou permitir que com ele se pra-
intimamente relacionada com a ideia da comer- tique outro ato libidinoso: (Redação dada pela
cialização sexual, na qual o corpo da mulher é Lei nº 12.015, de 2009)
associado a um objeto e/ou mercadoria.
Pena - reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos
É importante destacar que a Lei Maria da (BRASIL. Código penal, 2009).
Penha tem por objetivo a proteção da mulher
contra a violência praticada no seio familiar. É
a chamada violência sexual intrafamiliar, prática Dessa forma, por meio do dispositivo le-
muito recorrente em nosso país. Dessa forma, gal acima posto, denota-se que estupro pode
visando dar um suporte jurídico e policial às ví- ser pratica do tanto mediante a violência – uti-
timas dessa espécie de violência, é que a citada lização de força física capaz de forçar a vítima a
lei traz diversos mecanismos de política pública. praticar o ato libidinoso -, quanto por meio da
grave ameaça – promessa de um mal injusto e
Em assim sendo, o art. 8o da supracitada
iminente com potencialidade de constranger a
lei dispõe sobre medidas de prevenção à violên-
vítima à prática do ato libidinoso.
cia intrafamiliar contra a mulher, como a realiza-
ção de estudos estatísticos a fim de sistematizar Nota-se que houve uma significativa mu-
bancos de dados para avaliação periódica dos dança legislativa responsável pelo sincretismo
resultados das medidas adotadas; a implemen- de dois crimes. Dessa maneira, com a edição
tação de atendimento policial especializado da Lei 12.015/091, a antiga redação do art. 213
com preferência nas sedes das Delegacias de do Código Penal foi alterada. Assim, é que este
Atendimento à Mulher; a promoção e realiza- artigo trazia em seu texto a figura do estupro
ção de campanhas educativas de prevenção da na modalidade de violência sexual praticada
violência doméstica e familiar contra a mulher; mediante a conjunção carnal, ao passo que no
dentre outros (BRASIL. Lei no 11.340, 2009). art. 214 era configurado o crime de atentado
violento ao pudor, no qual eram compreendidas
Já com relação à mulher em situação de vio-
lência intrafamiliar, a Lei Maria da Penha invoca, em 1 Lei que altera o Título VI (Dos Crimes Contra a Dig-
seus artigos 9o, 11º e 22º, medidas assistenciais e nidade Sexual) da Parte Especial do Código Penal.
outras formas de prática de atos libidinosos di- quatro mulheres relatou ter sido fisicamente
ferentes da conjunção carnal. agredida pelo marido ou namorado em algum
momento de suas vidas; a cada ano, pelo menos
Nesse diapasão, pelo antigo regime, ape-
4 a 8 de todas as gestantes, cerca de 240.000,
nas a mulher poderia ser vítima de um crime de
são agredidas por um homem. Alguns estudos
estupro. Já o atentado violento ao pudor poderia
indicam que a violência durante a gravidez pode
ter como vítimas homens e mulheres. Atualmen-
ser mais prevalente do que doenças como hi-
te, o art. 214 – que tratava do atentado violento
pertensão, diabetes gestacional ou placenta pré-
ao pudor – foi revogado e parte de sua redação
via, condições para as quais as gestantes fazem
foi inserida no corpo do texto do art. 213, tratan-
rastreio de rotina. No Chile, 26 das mulheres de
do este de uma nova e moderna afiguração do
uma amostra representativa de Santiago relata-
estupro, podendo este ter como vítima homens e
ram pelo menos um episódio de violência come-
mulheres, bem como possuindo tanto a conjun-
tida pelo parceiro. Na Nicarágua, 52 mulheres de
ção carnal, quanto outros atos libidinosos, como
uma amostra representativa de Leon relataram
modalidades de violência sexual.
ter sido fisicamente agredidas pelo parceiro pelo
Outra inovação trazida por esta lei foi a menos uma vez; 27 relataram agressão física no
figura de um novo crime: estupro de vulnerável, ano anterior à pesquisa (1996).
sendo este o estupro praticado contra vítima
Mas existem também estatísticas mostran-
menor de 14 anos, enfermo ou deficiente men-
do que: as mulheres vítimas de violência sexual
tal sem o necessário discernimento para a prá-
possuem entre 1 a 68 anos, sendo a faixa etá-
tica do ato sexual, bem como aquelas pessoas
ria mais acometida entre 10-19 anos. Segundo
que, por qualquer outra condição, não tenham
esses estudos, as mulheres solteiras (78,3 % dos
meios de oferecer resistência.
casos) e com baixo grau de escolaridade foram
É importante destacar que, nesta espécie as mais acometidas pela violência sexual. O abu-
de estupro, é desnecessária a prática de qualquer so ocorre principalmente no período noturno
violência ou grave ameaça, bastando a prática de (64,7% dos casos), das dezoito às cinco horas, e
conjunção carnal ou de qualquer outro ato libi- no mesmo sítio da abordagem (local ermo, pró-
dinoso diverso com essas pessoas determinadas ximo da residência da vítima).
para configurar o crime de estupro. Antes do ad-
Como nos demais tipos de violência, não
vento dessa inovação legislativa, essa hipótese
há um fator isolado que possa ser identificado
era também vivenciada, sendo necessária apenas
como responsável pela violência. Esta é causada
a combinação do instituto da presunção de vio-
por um conjunto de fatores, todos relacionados
lência, previsto anteriormente, com as figuras do
às desigualdades de poder nas relações entre
estupro e do atentado violento ao pudor.
homens e mulheres. A impunidade dos agres-
Por fim, vale frisar que essas inovações sores é um fator importante na manutenção da
legislativas trouxeram uma disciplina jurídica violência contra mulheres.
com uma maior perfeição, eliminando algumas
A violência intrafamiliar é repetitiva em
atecnias legislativas bastante comuns na prática
sua natureza: uma em cada cinco mulheres
forense, as quais prescindem de maiores deta-
agredidas pelo marido ou ex-marido relataram
lhamentos, tendo em vista fugirem do objetivo
que foram vítimas de uma série de pelo menos
principal deste capítulo.
3 episódios de agressão física nos últimos 6 me-
Infelizmente, as próprias vítimas desco- ses (EUA, 1993). Os episódios de violência ten-
nhecem seus direitos e ficam com receio de dem a crescer com o tempo, em frequência e
denunciar. intensidade, aumentando progressivamente os
A violência intrafamiliar contra mulheres riscos para a mulher.
é, na maioria das vezes, cometida por parceiro Por meio de múltiplos padrões de com-
íntimo. O estigma social associado a situações portamento, ameaças de abandono, intimida-
de violência dificulta a revelação do problema. ção com olhares e exibição de armas, humi-
De acordo com estimativas da UNICEF lhação, controle financeiro, ameaça de retirar
(1997), 25 a 50% das mulheres no mundo sofrem a guarda dos filhos, para citar alguns exemplos
violência, cometida pelo parceiro. Nos Estados – o agressor estabelece uma dinâmica de poder
Unidos, pesquisas indicam que uma em cada e controle no relacionamento.
Sair de uma relação violenta é um processo; FREITAS, F.; MARMONTEL, M. Violência sexual
o tempo necessário para que a mulher tome a deci- contra a mulher. In: FREITAS, F. et al. Rotinas em
são de mudar de situação é variável. Umas abando- Ginecologia. 5. ed. Porto Alegre: Artmed, 2006.
nam a relação violenta precocemente, outras após Cap.23 p.287-289.
um longo período, e algumas nunca abandonam.
LOPES, I. M. R. S. et al. Caracterização da Vio-
A maioria das mulheres agredidas não é lência Sexual em Mulheres Atendidas no Projeto
vítima passiva, mas usa estratégias para maxi- Maria-Maria em Teresina-PI. Revista Brasileira
mizar sua segurança e a de seus filhos. Algu- de Ginecologia Obstetrícia, v. 26, n. 2, p. 111-
mas resistem, outras tentam manter a paz aten- 116, 2004
dendo a demandas do parceiro. O que pode
parecer falta de resposta para um observador MAGALHÃES, M.L.C. et al. Violência na Infância
externo, pode ser uma tática de sobrevivência e na Adolescência: Assistência Médica e Psicos-
e de proteção para os filhos. Muitas mulheres social. In: MAGALHÃES, M.L.C.; REIS, J.T.L. Gine-
abandonam a relação e voltam várias vezes, até cologia Infanto-Juvenil – Diagnóstico e Tra-
terminarem definitivamente. tamento. 1.ed. Rio de Janeiro: Medbook, 2007,
p.407-418.
Infelizmente, abandonar a situação de
violência não significa encontrar segurança. A MATTAR, R. et al. Assistência Multiprofissional
violência, algumas vezes, continua e pode até a vítima de violência sexual: a experiência da
se tornar mais grave. Universidade Federal de São Paulo. Caderno de
Saúde Pública, v. 23, n. 2, p. 459-464, 2007.
Uma frequente anormalidade uterina ad- A anamnese feminina deve abordar ida-
quirida é o leiomioma uterino. Pode interferir na de, ocupação e tempo de infertilidade. Mulhe-
fertilidade de formas variadas, dependendo do res apresentam um declínio da fertilidade a par-
tamanho, da localização e do número de leio- tir dos 35 anos. Informações sobre dor pélvica
miomas (solitários ou múltiplos). No entanto, crônica, dismenorreia progressiva e dispareunia
não é considerado uma causa direta de infer- são importantes, pois podem estar presentes
cérvice uterina etc.). No entanto, o exame não sença de espermatozoides móveis e a interação
deve ser limitado aos órgãos sexuais femininos. entre o muco e os espermatozoides. O exame
Na pele, podem ser encontrados sinais de ex- deve ser realizado um ou dois dias antes do
cesso androgênico (p.ex.: hirsutismo, seborreia, dia esperado da ovulação. A coleta do muco
acne e acantose nigricans). Vitiligo e outras for- pode ser realizada até 24 horas depois a rela-
mas de despigmentação podem sugerir doença ção sexual. As causas de um TPC anormal são
autoimune. a realização do teste no momento incorreto do
ciclo menstrual, anovulação, anormalidades do
No homem, deve-se observar distribui-
colo do útero (estenoses, cervicites), infecção
ção de pelos e gordura, pois pelos rarefeitos e
e alguns medicamentos (citrato de clomifeno,
corpo ginecoide podem indicar hipogonadismo.
tamoxifeno, corticoides). O monitoramento foli-
Presença de ginecomastia é sugestivo de hiper-
cular é feito pelo ultrassom transvaginal, porém
prolactinemia. Massas abdominais e cicatrizes
não é viável pelo alto custo. A biopsia endome-
inguinais devem ser pesquisadas. O exame físico
trial pode ser feita a partir do 23º dia do ciclo
do pescoço pode diagnosticar anomalias tireoi-
menstrual em pacientes com ciclos regulares de
dianas. No exame da genitália, o tamanho testi-
30 dias. A biopsia permite que se classifique o
cular é um parâmetro importante, devendo ter
endométrio como proliferativo ou secretor (res-
no mínimo 20 ml de volume e comprimento mé-
ponsivo à progesterona), bem como datá-lo de
dio superior a 4 cm. A presença de anorquia ou
acordo com os critérios de Noyes.
de testículos não descidos deve ser investigada.
Os testículos devem ser manuseados procuran- Para pacientes com oligo ou amenorreia,
do por nodulações, cistos, hiperestesias, hérnias, a avaliação deve incluir dosagem sérica de pro-
hidroceles e linfoceles. A presença de varicocele lactina, gonadotrofinas e função tireoideana. A
também deve ser investigada. Deve ser feito exa- dosagem da prolactina quando mostra níveis
me prostático para avaliar tamanho da glândula. altos deve ser repetida para excluir resultados
O exame do pênis pode revelar anormalidades falsos positivos. Quando acima de 100 pg/ml,
penianas como hipospádia, curvaturas anormais deve-se investigar micro ou macroadenoma
(doença de Peyronie) e fimose. hipofisário ou outra massa anormal encefálica
por meio de tomografia computadorizada ou
A avaliação da ovulação depende da his-
de ressonância magnética do crânio. O hormô-
tória menstrual. Se a paciente tiver ciclos mens-
nio folículoestimulante (FSH) deve ser dosado
truais regulares, deve-se orientá-la a medir a
no 3º dia do ciclo. Baixos níveis de FSH podem
temperatura corporal basal e solicitar proges-
indicar distúrbios hipotalâmicos e altos níveis,
terona sérica no meio da fase lútea, hormônio
distúrbios ovarianos. O hormônio tireoestimu-
luteinizante (LH), avaliação do muco cervical,
lante (TSH) também deve ser dosado, porém, o
monitoramento folicular e biopsia endometrial.
T4 é opcional. Quando alterados, deve-se ex-
O registro da temperatura corporal basal, feito
cluir causas secundárias.
pela manhã, em um gráfico. A progesterona é
um hormônio termogênico e sua secreção ocor- A histerossalpingografia é utilizada na
re após a ovulação, levando a um aumento de investigação tubária, permitindo avaliar a sua
até 0,5ºC acima da temperatura basal, eviden- perviedade. Permite a avaliação de patologias
ciando um padrão bifásico. Porém, esse exame uterinas como alterações anatômicas do canal
apenas confirma a ovulação, não a prevê. Tam- cervical, incompetência cervical, pólipos, siné-
bém pode ser dosada a progesterona sérica no quias uterinas, miomas submucosos e intramu-
meio da fase lútea, entre o 21º e o 23º dia de rais, malformações, alterações da superfície en-
um ciclo de 28 dias. Um nível igual ou superior dometrial e de patologias tubárias obstrutivas
a 10 ng/ml confirma a ovulação. Valores inferio- ou deformantes, como aderências, endometrio-
res indicam insuficiência lútea ou anovulação. se e processos infecciosos. É realizada após o
O pico de hormônio luteinizante (LH) é outro término do fluxo menstrual, entre o 6º e o 11º
método, devendo a ovulação ocorrer após 34 dia do ciclo, por meio da introdução de uma câ-
a 36 horas. Em apenas 5 a 10% das mulheres nula através do colo uterino e da dispersão de
não é possível dosar o LH urinário, devendo-se contraste iodado hidrossolúvel, com monitori-
realizar dosagens séricas. zação das imagens.
A avaliação do muco cervical se faz pelo A histeroscopia é indicada para pacientes
teste pós-coito (TPC), que também avalia a pre- em que a histerossalpingografia ou o ultrassom
sugiram algum processo intrauterino. Permite indicação para utilizar metformina associada.
avaliação do canal endocervical, cavidade ute- Após 12 semanas de tratamento, essas mulhe-
rina e óstios tubários, podendo diagnosticar res diminuem significativamente seus níveis de
patologias como septos, aderências, pólipos e insulina e testosterona total em jejum, o índice
miomas (ver capítulo de histeroscopia). de testosterona livre, a razão cintura-quadril, o
hirsutismo e a acne. Antes de iniciar a terapia,
A laparoscopia é o padrão-ouro na ava-
deve-se confirmar as funções hepática e renal
liação do fator tuboperitoneal, permitindo visu-
normais e excluir gravidez pelo hCG sérico. Ini-
alizar, além das tubas uterinas, outras estruturas
cia-se a terapia com 500 mg uma vez ao dia, no
pélvicas. Pode também diagnosticar miomas
desjejum, até chegar a 1000 mg duas vezes ao
uterinos intramurais e subserosos, aderências
dia. A metformina geralmente é interrompida
pélvicas e, principalmente, endometriose.
após confirmação da gravidez.
A análise do sêmen inclui a medida do vo-
Pacientes com hiperprolactinemia ou ga-
lume, a concentração, a motilidade e a morfolo-
lactorreia e disfunção ovulatória, após exclusão
gia. Também pode ser avaliada a medida do pH,
de macroadenoma hipofisário ou outra pato-
os níveis de frutose e o número de leucócitos. É
logia intracraniana, devem usar bromocripti-
importante seguir as recomendações para a co-
na, um agonista dopaminérgico que inibe a
leta da amostra. O período de abstinência para a
secreção de prolactina, para tratar a hiperpro-
realização da coleta deve ser entre 2 a 5 dias. São
lactinemia. Os efeitos colaterais do tratamento
recomendáveis no mínimo duas coletas de sêmen
incluem: náusea, diarreia, cefaleia e fadiga. Há
com intervalo de tempo entre elas de aproxima-
ovulação em 90% das pacientes. Pacientes com
damente 15 dias. Os valores normais são base-
hipotireoidismo voltam a ter ciclos ovulatórios
ados nos critérios da Organização Mundial de
após reposição com tiroxina.
Saúde (OMS), segundo o Quadro 1. Caso sejam
encontradas anormalidades no sêmen, deve ser O tratamento da insuficiência lútea en-
indicada avaliação do homem por um urologista. volve a administração de progesterona vaginal
(200 mg duas vezes ao dia), oral (200 mg duas
vezes ao dia) ou intramuscular (50 uma vez ao
3. Tratamento dia), começando três dias após a documenta-
Cada casal é tratado de forma individual, ção de um pico de LH, devendo ser mantida até
a depender da causa da infertilidade. Pacien- o primeiro dia do próximo ciclo menstrual ou
tes com distúrbios ovulatórios devem realizar até a documentação de um nível sérico quanti-
a indução da ovulação. Na SOP, a indução da tativo de hCG negativo. Se a paciente engravi-
ovulação é feita com citrato de clomifeno. Esse dar durante o tratamento, a progesterona deve
é um estrogênio sintético fraco, que atua ocu- ser mantida até oito a dez semanas de gestação.
pando receptores estrogênicos no hipotálamo O tratamento do fator tuboperitoneal é ci-
e na hipófise, causando feedback negativo dos rúrgico, baseado em técnicas de laparotomia ou
estrógenos e levando à liberação de GnRH, LH laparoscopia. Dentre os principais procedimentos
e FSH. Esse efeito antiestrogênico tem como estão a lise de aderências pélvicas, a reanasto-
consequências a mudança na quantidade e mose tubária, a salpingoplastia e fimbrioplastia.
qualidade no muco cervical e o espessamento Para mulheres com suspeita de endometriose es-
endometrial limitado. Os principais efeitos ad- tágio I ou II, deve-se preferir a laparoscopia antes
versos são fogachos e distensão ou plenitude de iniciar tratamento com citrato de clomifeno,
abdominal. Após essa terapia, a ovulação ocorre gonadotrofinas ou fertilização in vitro (FIV). Se a
em 60 a 90% das mulheres, no entanto somente mulher tiver mais de 35 anos, aconselha-se a FIV
30 a 40% dessas irão engravidar. Essa diferen- após a cirurgia, pois elas apresentam diminuição
ça deve-e à sua ação antiestrogênica sobre o da fecundidade e aumento das chances de abor-
muco cervical e o endométrio. A ovulação deve tamento espontâneo devido à idade avançada.
ser documentada utilizando um kit de LH uriná- Para pacientes em estágio III ou IV e que já rea-
rio doméstico. Espera-se que a ovulação ocorra lizaram cirurgias para infertilidade, a FIV é a me-
cinco a 10 dias após o último dia de tratamento. lhor opção terapêutica.
Pacientes que não apresentarem sucesso Para o fator uterino, as abordagens variam
na terapia isolada com citrato de clomifeno têm de acordo com a doença. As malformações ute-
rinas são corrigidas com cirurgias, como a me- Em pacientes com azoospermia secundária à
troplastia de Strassman e histeroplastia de Bret- obstrução epididimária, pode ser realizada a va-
-Plamer, essa última nos casos de útero bicorno soepididimostomia, uma anastomose acima do
e septado. A histeroscopia é feita para corre- nível da obstrução.
ção de septos uterinos, útero bicorno, pólipos
Se a avaliação básica mostra parâmetros
endometriais e sinéquias uterinas. Os miomas
normais do sêmen, indícios de ovulação, per-
podem ser removidos por meio das técnicas de
meabilidade das tubas uterinas e não há outra
laparoscopia ou por laparotomia. A hipoplasia
causa óbvia de infertilidade, é estabelecido o
uterina e a atrofia endometrial são tratadas com
diagnóstico de infertilidade inexplicada. Em
uso de ciclos hormonais artificiais com estróge-
mulheres com infertilidade inexplicada, o tra-
no e progesterona, que melhoram a vasculari-
tamento de escolha é o citrato de clomifeno e
zação uterina.
a inseminação intraútero. Caso esse tratamento
seja malsucedido após 3 meses, faz-se hiperes-
timulação ovariana controlada utilizando go-
3.1. Tratamento do fator masculino
nadotropina e inseminação intrauterina. Se as
O hipogonadismo hipogonadotrófico é duas falharem, pode-se tentar ICSI ou FIV.
tratado com a reposição de gonadotropinas,
iniciando-se com hCG 1500 UI IM 3x/semana
por 3 meses e depois associa-se hMG 75 UI IM D- Referências Bibliográficas
3x/semana. Pode-se também administrar GnRH
pulsátil com bomba de infusão, simulando a li- BEREK, J. S. Berek & Novak: Tratado de Gine-
beração fisiológica, na dose de 100g. A hiper- cologia. 14. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koo-
prolactinemia deve ser tratada com bromocrip- gan, 2008.
tina, com doses iniciais de 2,5 a 5 mg/dia. As
FREITAS, F. et al. Rotinas em Ginecologia. 5. ed.
infecções sintomáticas do trato genital devem
Porto Alegre: Artmed, 2006.
ser tratadas com doxiciclina 100 mg 2x/dia por
14 dias e nos pacientes alérgicos a derivados de GLINA, S.; FRAGOSO, J. B.; MARTINS, F. G. Infer-
tetraciclina pode-se usar eritromicina 1,5 g/dia tilidade Masculina. In: HERING, F. L. O.; SROUGI,
por 10 a 14 dias. Deve-se também tratar a par- M. Urologia: diagnóstico e tratamento. São
ceira. A ejaculação retrógrada deve ser tratada Paulo: Roca, 1998.
com medicamentos que restaurem a inervação
simpática do colo vesical, como a pseudo-efe- JENKINS, G.; JENKINS, J. Issues relating to infer-
drina (60 mg 4x/dia), fenilpropanolamina (75 mg tility. Practice Nurse. Sutton: v. 32, n. 4, 2006.
2x/dia), efedrina (50 mg 4x/dia) ou imipramina LASHEN, H. Investigations for infertility. Current
(25 mg 3x/dia). Por causarem efeitos colaterais, Obstetrics & Gynecology v. 14, p. 269-276,
essas drogas devem ser usadas por 10 dias du- 2004.
rante o mês, iniciando 5 dias antes do período
esperado para a ovulação. Caso não se obtenha MONTELLA-ROSENE, K.; KEELY, E.; LAIFER, S.
resultado, pode ser feita a reprodução assistida, A. Evaluation and Management of Infertility in
recuperando-se o sêmen na urina. Women: The Internists’ Role. Ann Intern Med.
v. 132, p. 973-981, 2000.
O tratamento da varicocele é cirúrgico,
visando à ligadura das veias espermáticas e PELLATI, D.; MYLONAKIS, I.; BERTOLONI, G.; et al.
suas tributárias. Estima-se uma taxa de gravidez Genital tract infections and infertility. European
em torno de 40% até um ano após a cirurgia. Journal of Obstetrics and Gynecology and
Entretanto, a idade da parceira é um fator im- Reproductive Biology, n. 140, p. 3-11, 2008.
portante a ser observado para a orientação do
melhor tratamento do paciente. Casais em que PINOTTI, J. A.; FONSECA, A. M.; BAGNOLI, V. R.
o homem tenha varicocele e a parceira tenha Tratado de Ginecologia. Rio de Janeiro: Revin-
idade superior a 37 anos deve ser indicada a ter, 2005.
reprodução assistida. Quanto a homens que se
TEMPLETON, A. Varicocele and infertility. The
submeteram à vasectomia, a reversão do pro-
Lancet. v. 361, n. 9372, 2003.
cedimento tem melhores resultados que a re-
produção assistida ou a indução da ovulação.
Para uma boa análise deve-se esvaziar a ampola 2.2.5. Diagnóstico das anormalidades endo-
retal antes do exame. metriais
Em mulheres com sangramento na pós-
-menopausa, uma espessura endometrial me-
2.2.2. Diagnóstico de mioma
nor que 5mm associa-se a um baixo risco de
A ultrassonografia é o método mais con- doença endometrial, enquanto que com es-
fiável no diagnóstico de miomatose, sendo útil pessuras em torno de 20mm, deve ser inves-
para diferenciar de outras massas anexiais e tigado porque nessa faixa etária a neoplasia
localizar o mioma. A ultrassonografia pélvica maligna é mais frequente que a benigna. A
é utilizada na visualização de grandes massas medição da espessura endometrial é aplicável
pélvicas, enquanto que a transvaginal é feita quando o endométrio é homogêneo. Qualquer
em casos de úteros menores. Esta apresenta lesão focal requer biópsia.
alta sensibilidade (95-100%). A ultrassonografia
Como não existe um padrão limiar de
apresenta limitações na localização de miomas
anormalidades da espessura endometrial em
múltiplos ou em úteros maiores.
mulheres na pré-menopausa, uma avaliação
A histerossonografia pode ser usada no adicional deve ser realizada baseando-se na
auxílio do diagnóstico de mioma, principalmen- situação clínica, principalmente nos sangra-
te submucosos. mentos anormais persistentes não responsivo
a conduta terapêutica ou suspeita de anorma-
lidades endometriais, como pólipo, que exige
2.2.3. Diagnóstico da endometriose remoção tardia.
Os principais exames de imagem reco-
mendados para diagnóstico e localização são a
ultrassonografia transretal (UTR) e ultrassono- 2.2.6. Diagnóstico de carcinoma de endométrio
grafia transvaginal (USTV), além da ressonância Não há estudos que permitam indicar a
nuclear magnética (RNM). melhor sequência de exames para diagnóstico
A ultrassonografia transvaginal avalia de câncer de endométrio em mulheres sinto-
mais detalhadamente as estruturas próximas à máticas, mas todas as técnicas dependem de
sonda endovaginal, como os ovários, o útero, os treinamento prévio para que os melhores resul-
ligamento útero-sacros, a parede retal e a be- tados sejam obtidos. Uma avaliação inicial pode
xiga, mas seu valor para a detecção de lesões ser efetuada com a USTV. Espessura endome-
superficiais peritoniais, focos ovarianos e endo- trial igual ou menor que 4mm não está asso-
metriose pélvica profunda é incerto. Imagens ciada a carcinoma endometrial, podendo estes
de alta resolução podem ser obtidas via trans- casos ser excluídos de investigações adicionais.
vaginal utilizando-se uma sonda de 7,5 mHz. A Para pacientes recebendo terapia de reposição
ultrassonografia transretal com sondas de alta hormonal, a espessura abaixo da qual não se
frequência tem sido recomendada para a detec- observou casos de carcinoma foi de 4mm. Para
ção da endometriose no reto e em localizações mulheres com queixa de sangramento vaginal, a
retovaginal, uterossacral ou retossigmoidal. USTV tendo 4mm como ponto-de-corte, a sen-
sibilidade é de 96% a 98% com especificidade
de 36% a 68%21(13).
2.2.4. Diagnóstico das malformações uterinas Para pacientes em uso de tamoxifeno,
A ultrassonografia é método inicial na recomenda-se a investigação anual com ultras-
avaliação de anormalidades mullerianas. sonografia transvaginal, mas não há dados que
apoiem a rotina de investigação, exceto nos ca-
A ultrassonografia 2D e principalmente a
sos sintomáticos.
3D são métodos diagnósticos indispensáveis na
avaliação das malformações uterinas, permitin- Para pacientes com indícios de doença
do diagnósticos precisos, possibilitando a clas- extrauterina ou com alto risco para metástases
sificação das malformações e fornecendo infor- solicitar Rx de tórax; exames ultrassonográficos
mações que auxiliam a conduta terapêutica e o de pelve e abdome; tomografias da pelve e/ou
prognóstico reprodutivo. abdome ou crânio se houver suspeita de metás-
tases para estes sítios; cistoscopia e retosigmoi-
doscopia se houver suspeita de extensão para testinal (através de ingestão oral ou e injeção
bexiga ou para retosigmoide. retal de contraste), pulmões, vísceras sólidas e
coluna vertebral, dentre outros.
A TC é utilizada para estadiamento pré-
2.2.7. Diagnóstico do câncer epitelial ovariano
-operatório do câncer ovariano ou para planeja-
Quando o exame do ultrassom sugere a mento de outros procedimentos. A tomografia
presença de câncer ovariano, deve-se realizar computadorizada também pode ser útil para
o diagnóstico diferencial com carcinoma epi- biópsia e drenagem em pacientes com massas
telial ovariano primário, carcinoma ovariano anexiais benignas (cistos de ovário ou abscessos
não epitelial, metástase ovariana e câncer da tubo-ovarianos). As contraindicações incluem
tuba uterina. falta de via segura e desobstruída para agulha e
Apesar da importância do ultrassom desordens de coagulação. A TC pode ser ainda
no diagnóstico do câncer ovariano, o Colégio indicada em conjunto com a ultrassonografia
Americano de Obstetras e Ginecologistas e o pélvica no diagnóstico e conduta da doença in-
Colégio Americano de Médicos não recomen- flamatória pélvica, torção anexial, trombose ve-
dam o exame para rastreamento em mulheres nosa ovariana e cistos ovarianos hemorrágicos.
assintomáticas. A Tomografia Computadorizada por
Emissão de Pósitrons (PET), baseada no uso de
marcadores radioativos, tem-se tornado impor-
2.2.8. Características ultrassonográficas de tante no diagnóstico e conduta de câncer no
massas anexiais benignas e malignas trato reprodutivo. Muitas vezes é realizada para
As principais características ultrassono- avaliação de mulheres com câncer do colo ute-
gráficas associadas com malignidade são: com- rino podendo detectar metástases nodais ou à
ponentes sólidos não hiperecoicos nodulares distância não detectadas por outras modalida-
ou papilares; septações, espessas (>2 a 3mm); des radiológicas.
demonstração pelo doppler de fluxo em com-
ponente sólido; presença de ascite.
2.4. Ressonância nuclear magnética
O componente sólido na escala de cinza
é o achado mais significante de malignidade. A ressonância nuclear magnética (RNM)
Septações podem estar presentes na doença é modalidade de grande importância na gi-
benigna e maligna, mas a espessa sugere ma- necologia, podendo fornecer informações su-
lignidade. Câncer ovariano pode ser unilocular, plementares à ultrassonografia e à tomografia
entretanto, a ausência de septações não garan- computadorizada.
te que a massa seja benigna. É o método de imagem de maior acurácia
na avaliação de leiomiomas, embora a ultrasso-
nografia transvaginal seja método de escolha
2.3. Tomografia computadorizada inicial. Tem indicação precisa quando não é pos-
É vasto o papel da tomografia computa- sível, por outros métodos, distinguir entre leio-
dorizada na avaliação radiológica da pelve fe- mioma e adenomiose focal. No diagnóstico de
minina. A ultrassonografia só a supera pela fa- adenomiose, a RNM tem mostrado superiorida-
cilidade de execução (para o bom operador) e de à ultrassonografia, com uma sensibilidade de
pela aquisição de imagens em tempo real sem 88 a 93% e uma especificidade de 66 a 91%.
radiação ionizante. As malformações do ducto mulleriano
Embora apresente poucas vantagens em são tradicionalmente demonstradas pela ul-
relação à RNM (como exemplo, temos maior trassonografia e histerossalpingografia. A RNM
acurácia na avaliação de metástases para ossos), vem sendo cada vez mais utilizada para avalia-
ainda é (e por anos será) modalidade imageno- ção adicional, substituindo técnicas invasivas,
lógica muito utilizada na avaliação de maligni- como laparoscopia, laparotomia ou histerosco-
dades ginecológicas, principalmente em centros pia, com uma acurácia próxima aos 100%.
onde a RNM não está disponível. Muitas vezes, Embora a ultrassonografia seja a modali-
faz-se uso da TC para avaliação de metástases dade de escolha para avaliação inicial de mas-
para órgãos extrapélvicos, como trato gastroin- sas anexiais, a RNM é útil nos casos em que há
inconclusão. Pode caracterizar melhor as lesões, ximadamente 4cm em região do colo uterino,
por exemplo, diferenciando entre massas ane- bem como ureterohidrofrose bilateral grau III
xiais e massas uterinas e estudar melhor as re- a montante. A seguir, foi solicitada Tomografia
lações do tumor com as estruturas adjacentes. Computadorizada abdominal e pélvica, com
os devidos cuidados de preparo pela nefroto-
É um excelente método para estagiamen-
xicidade do contraste iodado. A TC com espe-
to pré-operatório das neoplasias ginecológicas,
cial atenção para coluna vertebral evidenciou
permitindo a avaliação de linfadenopatias e ex-
implantes secundários em vértebras lombares
tensão tumoral para órgãos adjacentes. Tam-
– verdadeira causa de suas dores lombares - e
bém é útil no acompanhamento pós-tratamen-
hidronefrose (com retardo funcional renal, cau-
to e rastreio de recidivas.
sa da anemia) por compressão ureteral em pa-
As indicações para sua utilização na ava- ramétrios. A ressonância nuclear magnética de-
liação do câncer de colo uterino são: tumor com limitou melhor a invasão anexial do tumor e os
diâmetro transverso > 2cm por exame físico, exames radiológicos simples foram realizados
tumores endocervicais ou predominantemente apenas para avaliação de metástases pulmona-
infiltrativos que não podem ser avaliados cli- res à distancia (aliás, ausentes).
nicamente com acurácia e em mulheres grávi-
A paciente foi então encaminhada a con-
das ou que têm lesões uterinas concomitantes,
sultório ginecológico, onde foi realizada col-
como leiomiomas.
poscopia, com retirada de fragmento do colo
No câncer de endométrio é recomendada do útero para biópsia que, após estudo his-
para avaliação de metástases em linfonodos e topatológico, diagnosticou neoplasia de colo
para avaliação de invasão de estruturas adja- uterino, justificando o triste quadro de con-
centes, como colo do útero e miométrio. sumpção da paciente.
É o método de maior acurácia na carac-
terização de uma massa ovariana como benig-
na ou maligna e para detecção de metástases D- Referências Bibliográficas
peritoneais extrapélvicas. Além disso, pode ser
ALCÁZAR, J. L. Three-dimensional ultrasound in
utilizada para avaliação de irressecabilidade no
gynecology: current status and future perspec-
câncer ovariano.
tives. Current women’s health reviews, v.1, n.1,
p.1-14, 2005.
3. Discussão ANDRADE , J.M. et al. Rastreamento, Diagnós-
As técnicas de imagem utilizadas atual- tico e Tratamento do Carcinoma de Endomé-
mente têm grande valor no diagnóstico e tra- trio. Projeto Diretrizes Associação Médica Brasi-
tamento precoce de desordens ginecológicas leira e Conselho Federal de Medicina. 2001.
benignas e malignas. Para oferecer às pacientes BENEDET, J.L. et al. FIGO staging classifications
o melhor atendimento, deve-se sempre estar and clinical practice guidelines in the manage-
atento ao desenvolvimento e aplicações de no- ment of gynecologic cancers. FIGO Committee
vos procedimentos diagnósticos de imagem. on Gynecologic Oncology. Int J Gynaecol Ob-
Não importando qual a tecnologia utili- stet v.70, p.209-62, 2000.
zada hoje ou no futuro, o objetivo será sempre
CATELLANI, M. A. et. al. Métodos Complemen-
o mesmo: fornecer rápido, com baixo risco, o
tares em Ginecologia. In: CONCEIÇÃO, J. C. J.
diagnóstico apurado das condições ginecológi-
Ginecologia Fundamental. 1. ed., São Paulo:
cas e manter em mente o custo e o benefício do
Atheneu, 2005.
cuidado oferecido.
CORLETA, H. E.; CHAVES, E. B. M.; CAPP, E. Mio-
mas uterinos. In: FREITAS, F. et al. Rotinas em
4. Conclusão ginecologia. 5. ed. Porto Alegre: Artmed 2006
Retoma-se o caso clínico que abriu este p. 111-118.
capítulo: para a referida paciente, foram soli- DE CHERNEY, A. H.; GRAEBE, R. A.; HUANG, A.
citadas ultrassonografias abdominal, pélvica e SARAJARI, S. The Role of Imaging Techniques in
transvaginal, que evidenciaram tumor de apro- Gynecology. In: DECHERNEY, A. H.; NATHAN, L.;
Podem variar de modelo, tamanho, forma das nesse exame. Um pólipo e um mioma po-
e peso, como também ter mecanismos de dem não ser diferenciados, por exemplo, sendo
zoom e fonte de luz integrada. essa a razão mais frequente para a realização do
XX Fonte de luz: podem ser de diferentes ori- procedimento histeroscópico. Mais recentemen-
gens: halógena, não sendo ideal para este te, a avaliação histeroscópica da infertilidade do
tipo de procedimento, pois apresenta baixa fator uterino vem se tornando cada vez mais co-
durabilidade; HTI, com uma duração de apro- mum, sendo largamente utilizado em pacientes
ximadamente 250 horas; e a mais indicada, que irão se submeter à fertilização in vitro. Entre-
de xenon, que apresenta melhor iluminação tanto, o sangramento pós-menopausa é a indi-
por ter maior potência sem produzir calor ex- cação mais comum para o procedimento. Nesses
cessivo, porém também é a mais cara. casos, aproximadamente 50% apresentam causa
XX Histeroflator: aparelhos que controlam a orgânica, aumentando para 90% se a duração do
infusão do meio de distensão da cavidade sangramento for maior ou igual a seis meses.
uterina, podendo ser gasoso (CO2) ou líqui-
Diversas são as indicações para a histe-
do (soro fisiológico, água destilada, solução
roscopia diagnóstica. Além das já citadas ante-
de Ringer lactato, manitol, glicina, dentre ou-
riormente, as mais comuns são:
tros), e sua pressão intrauterina.
XX Óticas: são instrumentos que medem de 1,2 XX Na menacme: esclarecer causas de sangra-
a 4 mm de diâmetro, suportando a fibra óp- mento anormal (patologias cervical e corpo-
tica, com túbulos que permitem a passagem ral uterina); sangramento em grande monta
dos instrumentos utilizados durante o exame. por mais de oito dias, por períodos repetidos
XX Outros instrumentos: secundários para a re- ou períodos frequentes de pelo menos 21
alização do exame, mas fundamentais para a dias; pesquisa de restos ovulares, corpos es-
realização do exame (como o espéculo), de- tranhos (dispositivos intrauterinos perdidos,
vem estar à mão do operador (dilatadores – fios de sutura); e acompanhamento de com-
velas de Hegar e histerômetro, por exemplo. plicações após curetagem uterina, miomec-
tomias, ablação endometrial e de sinéquias.
XX Na menopausa: sangramento pós-menopau-
3. Indicações sa com ou sem TH; citologia cervical anormal,
Diversos autores comprovam a acurácia apresentando células endometriais; e pesqui-
(95%), especificidade (95,5 a 100%) e sensibili- sa de anomalias endometriais observadas em
dade (91 a 98%) da histeroscopia diagnóstica. outros métodos, como na ultrassonografia.
Na realização do exame, é possível observar
morfologia da cavidade uterina (avaliação do O aspecto importante deste método é a
tamanho, da forma e sua expansividade), do capacidade de realização de biópsias histeroscó-
canal endocervical (se há processo inflamatório, picas, em que pequenos fragmentos são retira-
concomitante ou não com estruturas fibrosas), dos sob visualização direta para estudo histopa-
aspectos endometriais (se o tipo de superfície tológico, com ajuda de pinças apropriadas, a fim
está compatível com a data do ciclo, cor, tipo e de confirmar e/ou esclarecer diagnósticos ine-
da vascularização, aspectos do muco, aderên- rentes ao procedimento. Essas técnicas recebem
cias e malformações), e observação das regiões classificação dependendo do tipo de lesão a ser
cornuais uterinas (análise da morfologia e vas- pesquisada: orientadas, quando a lesão se apre-
cularização dos óstios tubários). Devido aos di- senta difusa ou em área ampla; aspirativa, com a
ferentes estágios em que o útero se apresenta, mesma indicação da anterior, alterando apenas
suas indicações são relacionadas às mesmas. o instrumental utilizado; e dirigida, no caso de
Durante a menacme, outros métodos lesões focais ou de pequenas dimensões.
diagnósticos são relativamente imprecisos, daí a
frequente indicação de histeroscopias diagnósti-
cas. Com o advento da ultrassonografia e sua uti- 3.1. Contraindicações da histeroscopia
lização como exame de rotina, houve aumento As contraindicações podem ser absolutas
de exames histeroscópicos com o intuito de di- ou relativas. Apesar de ser um método experi-
ferenciar anomalias (espessamento endometrial, mentado e seguro, todo procedimento invasivo,
líquido na cavidade uterina, suspeita de pólipos mesmo que seja mínimo, está sujeito a compli-
endometriais e miomas submucosos) observa- cações que abordaremos mais adiante.
DONNEZ, J.; NISOLLE, M.; CLERCKX, F.; GILLEROT, SENTILHES, L.; SERGENT, F.; ROMAN, H.; VER-
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Paulo: Artes Médicas, 2001. p.332-334.
e maior risco de gravidez ectópica em que um estadiamento, coleta de material para cultura
tratamento adequado e precoce melhora o e a realização de pequenos procedimentos que
prognóstico da paciente. melhoram o prognóstico da doença. Durante o
exame, procedimentos realizados como drena-
A endometriose é uma das principais
gem de abscessos, diminuem a população bac-
causas de DPC e a videolaparoscopia permite
teriana e permitem melhor acesso do antibióti-
confirmação diagnóstica com biópsia, esta-
co aos tecidos acometidos; a lavagem exaustiva
diamento da doença e tratamento inicial ou
da cavidade abdominal com solução fisiológica
definitivo de lesões endometrióticas como
diminui a formação de aderências prevenindo
comentaremos.
infertilidade, DPC e outras complicações, melho-
Síndrome de congestão pélvica crônica é rando, assim, o prognóstico da doença. Caso já
uma moléstia ginecológica comum, com pre- existam aderências, pode ser feito adesiólise, o
valência de 15% a 20%, sendo de difícil diag- que trata ou previne as complicações acima ci-
nóstico e tratamento. Os sintomas são dor pél- tadas. A cultura do material coletado permite a
vica de intensidade variável, que aumenta no identificação dos agentes etiológicos e associa-
período menstrual, após exercícios e com alte- da ao antibiograma orienta à antibioticoterapia
rações de postura. Frequentemente, é acom- adequada. O estadiamento do processo é feito
panhada de dismenorreia, dispareunia e dor durante o procedimento, de acordo com o grau
pós-coito. Acomete mulheres multíparas em do comprometimento dos órgãos pélvicos; du-
idade reprodutiva e idosa. Durante a gravidez, rante o estágio 1, há endometrite e ou salpingi-
as veias pélvicas dilatam-se cerca de 60 vezes te sem comprometimento peritoneal; no está-
mais e a falta da recuperação da morfologia, gio 2, há peritonite; durante o estágio 3, existe
que acontece em 6 meses após o parto, está comprometimento tubo-ovariano ou abscesso
estritamente ligada à fisiopatologia da síndro- íntegro; e, durante o quarto estágio há secreção
me. Pode acontecer também por defeitos ou purulenta na cavidade ou abscesso roto. Ape-
por ausência das válvulas. Isso acaba inverten- sar de oferecer muitas vantagens, não devemos
do o fluxo das veias ováricas, ilíacas internas e esquecer que é um exame invasivo; portanto,
suas tributárias. Durante o exame físico, podem deve ser guardado para casos com dificuldade
estar presentes varizes vulvares, dor à palpação de diagnóstico, coleções pélvicas, líquido livre
de anexos e varicosidades atípicas nas coxas e na cavidade ou não responsivo ao tratamento
nádegas. Ultrassonografia com doppler colori- clínico inicial. A indicação de um second look é
do pode ajudar no diagnóstico da síndrome. A contraditória e deve ser guardada para pacien-
Flebografia que cateteriza a veia femoral até as tes com mau prognóstico tubário.
ováricas e ilíacas interna é padrão ouro para o
diagnóstico; porém, a técnica é bastante invasi-
va e possui grandes riscos. A laparoscopia em- 3.3. Endometriose
bora invasiva sela diagnóstico com confiança,
É definida como a presença de tecido en-
demonstrando as veias ectásicas, varizes e con-
dometrial ectópico e pode ser classificada em
gestão pélvica; durante o procedimento, pode
relação à sua localização, em endometriose pe-
ser instituído o tratamento pela ligadura das
ritoneal, ovariana e do septo retovaginal. A do-
veias insuficiente de forma segura permitindo,
ença também acomete em menor proporção o
assim, o alívio sintomatológico.
trato urinário em 1,2% a 16% e o aparelho intes-
tinal em 1% a 25% dos casos, segundo trabalhos
recentes. Os sintomas clássicos são: infertilida-
3.2. Doença Inflamatória Pélvica (DIP)
de, DPC, dismenorreia e dispareunia. Ao exame
O diagnóstico de DIP, processo infeccioso físico, devemos ficar atentos para cistos palpá-
que pode envolver útero, tubas uterinas, ovário veis em região anexial em endometriose ovaria-
e estruturas adjacentes, pode ser clínico; porém, na e ao exame especular podemos deparar com
os exames laboratoriais e quadro clínico são obliteração de fundo de saco na endometriose
muito inespecíficos; como o tratamento deve do septo retovaginal. Um exame bioquímico útil
ser instituído o mais breve possível, a laparos- é o marcador CA-125 positivo em até 36% das
copia tem-se mostrado útil no diagnóstico di- pacientes com endometriose, sendo mais pro-
ferencial. A laparoscopia é exame padrão ouro, porcional a infiltração do implante endometrió-
pois proporciona diagnóstico definitivo com tico. É importante o diagnóstico diferencial para
tumores ovarianos malignos de origem epite- distensão abdominal ou até um quadro clínico
lial em que a positividade chega a ser de 86%. de abdômen agudo como em casos de torção
Exames complementares de imagem como a de cisto. Na anamnese, devemos buscar infor-
ultrassonografia (USG), útil na caracterização de mações que apontem risco para a malignidade
cistos, dopplervelocimetria, para o estudo do como idade, paridade e história familiar gineco-
caráter da vascularização e ressonância mag- lógica. Exames complementares como USG com
nética (RM) são importantes para o diagnóstico color doppler são importantes para ajudar a de-
diferencial de neoplasia antes de indicar a lapa- finir características e vascularização das massas;
roscopia, tendo em vista que, atualmente, em marcadores bioquímicos como alfa-fetoproteí-
doenças presumivelmente malignas a aborda- na, HCG, CA-125 associados com métodos de
gem via laparotomia é mais segura. imagens como USG RM e TC aumentam a espe-
cifidade do diagnóstico.
A laparoscopia tem a vantagem de po-
der fazer simultaneamente diagnóstico, esta- A inspeção da massa é detalhada e ajuda
diamento e tratamento, além de possibilitar a bastante no diagnóstico presuntivo de maligni-
análise de características como topografia ou dade ou benignidade e é auxiliada pela definição
visualização de pequenas lesões como aderên- de características à translucência. A punção só é
cias hemorrágicas, cicatriciais ou petéquias. As aceitável nos casos presumivelmente benignos,
lesões possuem características muito diferentes; tendo em vista, o risco de disseminação. A bióp-
na verdade, parecem mostrar uma evolução, sia é preferencialmente excisional, com retirada
podendo ser detectada histologicamente inclu- da cápsula íntegra, evitando-se recidiva, peritoni-
sive em tecido peritoneal. A American Society te ou disseminação no caso de diagnóstico ines-
Fertility em 1985 propôs a classificação das le- perado de malignidade. Com o avanço da técni-
sões, sendo esta revisada e modificada em 1996 ca, dispositivos chamados endobags que isolam
pela então American Society reproductive Me- a massa da cavidade foram desenvolvidos para
dicine e é a classificação mais utilizada até hoje. evitar peritonite e disseminação, podendo ser
AFS-r propõe um sistema de pontuação em que usados em casos de dúvida em relação ao cará-
se avaliem as lesões quanto ao número, tama- ter benigno da massa. Após avaliação, alterações
nho, profundidade, presença e característica das presumivelmente malignas devem ser abordadas
aderências; uma pontuação de 1-5 pontos clas- por via laparotômica, pois complicações como
sifica como estádio I/mínima, 6-15 pontos está- disseminação após rotura de cistos, implantes
dio II/leve, 16-40 pontos estádio III/moderada e neoplásicos na parede abdominal corresponden-
>40 estádio IV ou severa. A AFS-r classifica a en- tes aos sítios dos trocartes ou até mesmo piora
dometriose em estágios que se correlacionam do prognósticos por progressão do estadiamen-
bem com o prognóstico reprodutivo, o que não to de 1 A ou 1B para 1C limitam, assim a aborda-
acontece com a sintomatologia da paciente. gem por via laparoscópica.
3.4. Tumores e cistos ovarianos 3.5. Gravidez ectópica
As patologias ovarianas permitem uma A gravidez ectópica é definida como ges-
fácil abordagem por via laparoscópica, porém, tação fora da cavidade uterina e sua incidência
como veremos, a via possui limitações nas ne- tem aumentado devido ao aumento de casos de
oplasias malignas. Portanto, o procedimento DIP, uso de DIU e técnicas de reprodução assis-
cirúrgico padrão-ouro para a abordagem das tida. Antigamente, o diagnóstico era realizado
patologias presumivelmente malignas ainda é somente após 6 a 8 semanas de gestação junto
a laparotomia. A avaliação pré-operatória deve ao evento catastrófico do choque hemorrágico.
ser, portanto, meticulosa para decidir a via de Com o advento do exame bioquímico, quantita-
abordagem nas patologias ovarianas; deve in- tivo de gonadotrofina coriônica humana (HCG),
cluir anamnese direcionada, exame físico e casos de gestação anômala inválida e ectópica
utilizar recursos oferecidos por exames com- podem ser diagnosticados precocemente; este
plementares. Ao exame físico, podemos de- hormônio costuma dobrar sua concentração a
parar com alterações variáveis a depender do cada dois dias na gravidez intrauterina e viável
caso, como massa palpável em região anexial, o que não acontece na gravidez ectópica em
abdômen em tábua, evidenciando peritonite, que a concentração aumenta mais lentamente.
O exame também é útil para acompanhar o tra- laparoscópica visando corrigir disfunção ovula-
tamento medicamentoso ou cirúrgico quando a tória foi feito por Palmer e Brux em 1967 e por
diminuição da concentração for inferior a 15%, ser procedimento endoscópico reduziu muito
após o 4º ou o 7º dia do procedimento pode evi- a formação de aderências; porém, estas ainda
denciar gravidez ectópica resistente. Baixo nível hoje continuam sendo uma das principais limi-
de progesterona pode indicar gestação inviável, tações da técnica. A cauterização de 4 a 10 pon-
porém é menos específico para a gestação ec- tos do córtex ovariano tem se relacionado com
tópica. A USG transvaginal deve sempre ser soli- sucesso na ovulação em 84% a 100% dos casos
citada junto ao HCG para selar o diagnóstico de e em 20% a 87% conseguem engravidar, se-
gravidez ectópica antes de indicar um procedi- gundo diferentes estudos. Melhoras no quadro
mento cirúrgico invasivo, como a laparoscopia. clínico como regulação do padrão menstrual e
A laparoscopia, além de permitir a abordagem melhora da pele acnéica são relatados e pro-
medicamentosa local permite resolução por vavelmente se devem a uma melhora do perfil
procedimento cirúrgico, seja ele radical com sal- endócrino que envolve LH, testosterona, SHBG,
pingectomia, retirada do anexo, ou conservador progesterona, estradiol e 17OH-progesterona.
com salpingostomia em que se preserva a tuba
Complicações associadas à técnica, como
a depender do comprometimento do órgão e do
atrofia ovariana e falência ovariana precoce são ra-
desejo da paciente de ainda constituir prole. Para
ras e graves; formação de aderências e menopau-
acompanhamento dos resultados do procedi-
sa precoce são mais frequentes junto às compli-
mento cirúrgico; pode ser indicado histeroscopia
cações relacionadas à via de abordagem. Apesar
para as pacientes que ainda desejem engravidar.
de mostrar benefícios em relação ao tratamento
A abordagem cirúrgica vem mostrando medicamentoso, como menor risco de hiperes-
permitir um melhor prognóstico reprodutivo; timulação ovariana e menor risco de aborto, por
portanto, o tratamento medicamentoso deve ser diminuição da concentração plasmática de LH, a
guardado para casos em que há contraindicação laparoscopia é procedimento invasivo e deve ser
aos procedimentos cirúrgicos. Na presença de indicado para pacientes que não obtiveram suces-
instabilidade hemodinâmica, comprometimento so com o tratamento convencional.
grave da função cardiopulmonar ou obesidade
mórbida, a via laparotômica é a mais indicada,
caso a opção terapêutica seja cirúrgica. 3.7. Histerectomia
A histerectomia existe há 17 séculos e
durante a sua evolução, a primeira abordagem
3.6. Síndrome do Ovário Micropolicístico
endoscópica foi por via vaginal. A laparoscopia
(SOMP)
entrou inicialmente para auxiliar a histerectomia
O primeiro tratamento para SOMP, sín- vaginal e hoje, o procedimento pode ser feito
drome caracterizada por hisurtirmo, acne, exclusivamente por via laparoscópica, consti-
amenorreia, infertilidade e cistos ovarianos foi tuindo uma alternativa para pacientes com indi-
desenvolvido por Stein e Leventhal em 1935, cações para histerectomia abdominal; caso em
procedimento cirúrgico laparotômico que fa- que seja favorável, como associado a prolapso
zia ressecção em cunha dos ovários e mostrava uterino, o procedimento via vaginal é o mais in-
resultados como regulação do ciclo menstrual dicado. O tratamento por via vaginal mostrou-se
e em pequeno percentual proporcionou gra- menos invasivo e é feito com anestesia loco-re-
videz. Após a descoberta das ações do citrato gional. Na laparoscopia, além das complicações
de clomifeno (CC) na indução da ovulação o relacionadas à técnica envolvendo pneumoperi-
tratamento cirúrgico passou a ser questionado tôneo, ainda há riscos relacionados à anestesia
tendo em vista que os altos índices de forma- geral. Há vantagens da via laparoscópica em re-
ções de aderências de 15% a 100%, na verda- lação à via abdominal bem como às limitações
de podem piorar o prognostico reprodutivo da que foram citadas no início do capítulo sendo
paciente. Estudos recentes afirmam que 15% relevante acrescentar que ela é contraindicada
a 25% das pacientes em tratamento com o CC em casos de massas anexiais com diâmetro su-
permanecem em anovulação crônica, criando- perior a 18 cm. Apesar das vantagens oferecidas
-se, portanto necessidades de novos tipos de pela técnica como retorno mais cedo às ativida-
tratamento. O primeiro registro de abordagem des rotineiras, menos dores no pós-operatório
Com esse aumento considerável na inci- Quadro 4: Critérios Propostos pela IDF (International
dência e prevalência do sobrepeso e da obe- Diabetes Federation): Presença de obesidade central
sidade e de suas consequências, houve uma (cintura > 94 cm em homens e > 80 cm em mulheres)
mudança na maneira de se avaliar este tipo de associada a 2 ou mais dos critérios abaixo:
paciente. Surgiu então o conceito de Síndrome
1) Níveis de triglicerídeos ≥ 150 mg/dl
Metabólica (SM), anteriormente também co-
2) Colesterol HDL < 40 mg/dl em homens e < 35 mg/
nhecida como Síndrome X, Síndrome Plurime-
dl em mulheres
tabólica, Síndrome de Resistência à Insulina ou 3) Pressão arterial ≥ 130 x 85 mmHg
Quarteto Mortal. 5) Glicemia de jejum >100 mg/dl
As definições mais usadas para a SM são
as propostas pela OMS (Organização Mundial 2. Etiologia
de Saúde) e pelo NCEP/ATP III (National Choles-
terol Education Program, Adults Treatment Panel A etiologia da obesidade é complexa,
III). Na prática clínica diária, a classificação mais multifatorial, resultando da interação de genes,
utilizada tem sido a proposta pelo NCEP/ATP III. ambiente, estilos de vida e fatores emocionais.
Mas, em abril de 2005, a Federação Internacio- A influência do genótipo na etiologia
nal de Diabetes propôs uma nova definição de pode ser intensificada ou atenuada por fatores
SM, um pouco mais rígida, mas mais abrangen- não genéticos, como fatores ambientais e inte-
te. Todos esses critérios são mostrados no qua- rações psicossociais que atuam sobre mediado-
dro abaixo. res fisiológicos de gasto e consumo energético.
Vários locais e padrões para avaliação da Dentre os fatores ambientais, estão os alimen-
circunferência abdominal têm sido sugeridos, tares, podendo-se destacar o excesso de calo-
mas o local definido e recomendado pela OMS rias e, principalmente, de lipídios, favorecendo
é o ponto médio entre o rebordo costal inferior o aumento da adiposidade.
e a crista ilíaca, com o paciente de frente. A me- A senescência também está associada
dida do quadril deve ser tomada no seu maior ao ganho de peso, devido ao declínio na taxa
diâmetro com a fita métrica passando sobre os metabólica basal em consequência da perda de
trocânteres maiores. massa muscular, diminuição da prática de ativi-
dades físicas e aumento do consumo alimentar.
a ingestão alimentar ou o gasto enérgico. Po- 140 e < 200 mg/dl e diabético se a glicemia for
demos citar alguns desses medicamentos: cor- ≥ 200 mg/dl.
ticosteroides, antipsicóticos, antidepressivos tri-
As principais doenças que poderiam cur-
cíclicos, antiepilépticos, sulfonilureias, insulina,
sar com esse quadro são:
dentre outros.
Síndrome de Cushing: doença causada por
A obesidade ocorre com maior frequên-
hipercortisolismo (excesso de produção de
cia em populações mais pobres e de menor ní-
cortisol pela suprarrenal). Nesse caso, solicita-
vel educacional. Este fato pode estar associado
ríamos um teste de supressão com dexameta-
à maior palatabilidade e mais baixo custo de ali-
sona, 1 mg às 23 horas. Se o cortisol colhido
mentos de grande densidade energética, como
no dia seguinte estiver abaixo de 1,8 µg/dl,
açúcar e gorduras.
afastamos este diagnóstico.
Considerando que o índice de massa cor- Depressão endógena isolada, que normal-
pórea (IMC) é calculado como: P(kg)/altura2(m), mente não cursaria com esses outros achados
esta paciente tem um IMC de 35,82 (ver Quadro metabólicos.
1), e uma relação cintura/quadril de 1,09 (nor-
mal: < 80 cm, para mulheres) sendo assim con-
3. Tratamento
siderada como portadora de obesidade grau 2
com predominância visceral (abdominal). Sua Tratar obesidade é uma tarefa complexa e
glicemia de jejum está acima de 99 mg/dl, sen- multidisciplinar. O tratamento envolve mudan-
do classificado como intolerante à glicose de ças no estilo de vida, além do tratamento far-
jejum, o seu LDL está acima de 130 mg/dl e o macológico. A escolha do tratamento deve ser
HDL está abaixo de 50 mg/dl, podendo também baseada na gravidade da patologia e na presen-
ser considerada como portadora de dislipide- ça ou não de comorbidades.
mia mista. Como a PA está ≥ 130 mmHg para O tratamento inicial é feito com orientação
a sistólica e ≥ 85 mmHg para a diastólica, pode dietética e mudanças no estilo de vida, com in-
ser que ela já possa estar com hipertensão ar- centivo à prática de atividade física, entretanto o
terial, embora tenhamos que conferir esta pres- tratamento medicamentoso já pode ser iniciado
são arterial numa próxima consulta. Todos esses se o paciente apresentar os seguintes critérios:
achados preenchem os critérios para que a pa-
ciente seja portadora de Síndrome Metabólica 1) IMC ≥ 30 kg/m2, ou ≥ 25 kg/m2 na presença
(Quadros 2, 3 e 4). de comorbidades
2) Ausência de perda de peso com o tratamento
Além disso, pelas suas queixas pode-se não farmacológico.
pensar numa síndrome depressiva leve causada
pela própria obesidade e suas consequências na
autoestima da mulher. Diante de um quadro de Atualmente, as principais drogas usadas
intolerância à glicose de jejum numa paciente no tratamento da obesidade são:
com dislipidemia, obesidade e história familiar 1. Substâncias anorexígenas catecolaminér-
de diabetes, é importante solicitar um teste de gicas: dietilpropiona, mazindol e fempro-
tolerância oral à glicose (TTOG) para afastar o porex. Agem diminuindo o apetite por meio
quadro de diabetes mellitus tipo 2. de uma ação central, por isso tais drogas
Além dos parâmetros já descritos para podem causar sintomas leves a moderados
obesidade, dislipidemia e hipertensão arterial de estimulação do sistema nervoso central
é imperativo a realização da curva glicêmica (como insônia, euforia, nervosismo) e do sis-
(TTOG). Para isto, a paciente deve ficar com uma tema cardiovascular (levando a taquicardia e,
dieta normal de carboidratos por 3 dias, fazer às vezes, elevação da pressão arterial). Não
um jejum de 8 horas e no dia do exame, após há estudos com duração maior que um ano
a coleta do sangue em jejum, tomar uma carga com a dietilpropiona e o mazindol, por isso
de 75 g de glicose por via oral e, com 2 horas não se pode assegurar eficácia e segurança
colher novo exame para glicemia. É considerado dessas drogas a longo prazo. Em relação ao
normal o paciente que 2 horas após a carga de femproporex, ainda muito utilizado em fór-
glicose tem uma glicemia <140 mg/dl, intole- mulas de manipulação, não há estudos clíni-
rante à glicose, aquele que tem uma glicemia ≥ cos publicados, o que não se permite pres-
crevê-lo com confiança.
2. Sacietógenos: sibutramina. Atua como um tência à insulina, como a metformina. Para a dislipi-
potente inibidor da recaptação da norepine- demia poderíamos inicialmente esperar três meses,
frina e da serotonina e não aumenta a libe- preconizando apenas a dieta. Caso persista com
ração neuronal dessas monoaminas. Ela age níveis elevados de colesterol LDL, deverá ser inicia-
principalmente inibindo a ingestão alimentar do tratamento com estatinas. Os níveis de pressão
por estímulo do processo fisiológico da sacie- arterial deverão ser rigorosamente monitorados
dade. Os principais efeitos colaterais são leve no início do tratamento, uma vez que eles podem
aumento na pressão arterial diastólica (3 a 5 se elevar um pouco com o uso da sibutramina e,
mmHg) e 2 a 4 batimentos por minuto a mais nesse caso, poderá ser necessário a utilização de
na frequência cardíaca. Outros efeitos adver- anti-hipertensivos leves como diuréticos, ou baixas
sos comuns são cefaleia, boca seca, constipa- doses de inbidores da renina-angiotensina (ou ain-
ção, rinite e faringite. O estudo mais impor- da outras classes de drogas anti-hipertensivas).
tante com essa droga (STORM- Sibutramine
Trial in Obesity Reduction and Maintenance),
com 2 anos de duração, demonstrou a efi- D- Referências Bibliográficas
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esta patologia, com drogas que diminuam a resis-
(Quadro 1). Nos dez primeiros anos após a me- uma anamnese e um exame físico minuciosos,
nopausa, por conta da deficiência estrogênica, abrangendo desde os determinantes do pico
ocorre uma alta remodelação óssea, com uma de massa óssea até a concomitância com ou-
perda anual de 2 a 3% de osso trabecular e 1 tras patologias ou a exposição a medicamentos
a 2% de cortical, podendo chegar até a 50% e relacionados à desmineralização óssea, assim
30%, respectivamente. como os fatores de risco modificáveis ou não
para osteoporose e fraturas.
Não modificáveis Modificáveis
- Sexo feminino - Baixa densidade mineral O diagnóstico clínico da osteoporose
- Raça branca ou óssea torna-se indesejável, à medida que se baseia na
asiática - Baixo peso corporal (IMC < ocorrência de fraturas ósseas, que geralmente
- Constituição corpó- 19kg/m2) são decorrentes das atividades de vida diária –
rea diminuída - Amenorreia na pré-meno-
como as vertebrais, ou por trauma de baixo im-
- Envelhecimento pausa ou nuliparidade
pacto, como cair da própria altura para frente
- Menarca tardia e - Sedentarismo e imobilização
– como as do antebraço, e para trás ou para os
menopausa precoce prolongada
- Antecedentes pes- - Condições osteopenizantes
lados – como as do quadril.
soais e familiares de associados Por sua vez, os exames laboratoriais são
fratura por osteo- - Tabagismo e alcoolismo indicados para avaliar indiretamente a micro-
porose - Baixa ingestão de cálcio e -arquitetura óssea, por meio dos marcadores
- Genótipo do VDR/ vitamina D
bioquímicos de remodelação óssea, ou refletir
COLIA-I - Alta ingestão de cafeína,
as alterações no metabolismo do cálcio, ou ain-
- Geometria femoral proteína, sódio e fosfato
da afastar ou confirmar co-morbidades osteo-
- Fatores intrínsecos - Fatores extrínsecos para
para quedas em quedas em idosos penizantes (Quadro 2). Contudo, a massa óssea
idosos somente pode ser estudada integralmente, me-
diante biópsia óssea, que por se tratar de um
Quadro 1 – Fatores de risco para desmineraliza- método invasivo, é indicada apenas para des-
ção óssea e fraturas. cartar condições osteopenizantes secundárias,
associadas ou não à osteoporose involucional.
Em relação à principal manifestação clínica
Marcadores de Marcadores de
da osteoporose, as microfraturas da coluna ver- formação óssea reabsorção óssea
tebral são as mais frequentes, geralmente oligos- Séricos Séricos
sintomáticas e dificilmente diagnosticadas, ocor- - Osteocalcina - Fosfatase alcalina
rem precocemente após a menopausa, levando à - Fosfatase alcalina tartarato resistente
limitação das atividades de vida diária pelas de- - Propeptídeos amino e - Telopeptídeo amino
formidades, dor crônica, comprometimento físico carboxi-terminal do pro- (NTX) e carboxi (CTX)-
mental, e à predisposição a novas fraturas. A inci- colágeno I terminal do Colágeno I
dência de fraturas do antebraço também ascende
após a menopausa, estabilizando-se por volta dos Urinários
- NTX e CTX
65 anos, gerando dor crônica, perda de função,
- Deoxi e piridinolinas
neuropatias compressivas, artrite pós-traumática
em mão e punho, por vezes secundária aos pro- Marcadores do Exames
cedimentos cirúrgicos. O número das fraturas do metabolismo do cálcio complementares
quadril eleva-se lentamente a partir dos 60 anos, e - Cálcio e fósforo - Hemograma
exponencialmente a partir da oitava década, cau- - Dosagem de PTH - Velocidade de hemos-
- Dosagem de TSH e T4 livre sedimentação
sando aumento das taxas de morbi-mortalidade,
- Dosagem de LH, FSH, - Eletroforese de pro-
gerando incapacidade física e diminuição do nível
prolactina e estradiol teínas
de qualidade de vida desses indivíduos, e oneran- - Dosagem de 25-hidroxivi- - Função hepatorrenal
do a saúde pública e privada. tamina D - Sumário de urina
- Calciúria de 24h - Clearance de creati-
nina
2. Como confirmar o diagnóstico?
Quadro 2 – Propedêutica laboratorial para de-
Por se tratar de uma patologia pouco terminar diagnóstico e prognóstico das formas
sintomática, a abordagem inicial de paciente primárias e secundárias de osteoporose.
com distúrbios do metabolismo ósseo exige
Osteoporose Generalizada
Osteoporose primária
- Juvenil idiopática
- Idiopática em adulto-jovem
- Involucional
Tipo I ou pós-menopausa
Tipo II ou senil
Osteoporose secundária
Doenças endócrinas Doenças gastrointestinais
- Síndrome de Cushing - Doença celíaca
- Hiperparatireoidismo - Doenças inflamatórias intestinais
- Hipertireoidismo - Hepatopatias crônicas
- Hipogonadismo - Cirrose biliar primária
- Hiperprolactinemia - Pós-gastrectomia
- Síndrome de má absorção
Doenças hereditárias do tecido conjuntivo - Síndrome do intestino curto
- Síndrome de Ehlers-Danlos
- Homocistinúria Miscelânia
- Síndrome de Marfan - DPOC
- Osteogênese imperfecta - Insuficiência renal crônica
- Pós-transplante
Doenças reumatológicas - Desnutrição
- Artrite reumatoide
- Espondilite anquilosante Iatrogenia medicamentosa
- Glicocorticoides
Doenças hematológicas/neoplasias - Anticoagulantes
- Mieloma múltiplo - Anticonvulsivantes
- Mastocitose sistêmica - Hormônios agonistas do liberador de gonadotrofinas
- Linfoma / leucemia - Imunossupressores
- Carcinomatose disseminada
Portanto, diante de uma fratura de estres- pico de massa óssea durante a infância e ado-
se ou de baixo impacto, especialmente em se lescência e retardar a perda óssea relacionada à
tratando de indivíduos adulto-jovens, do sexo menopausa e à idade, para alcançar o objetivo
masculino, ou com Z-score abaixo de -2,0DP, principal que é evitar as fraturas ósseas.
torna-se imprescindível questionar sobre os
A prevenção primordial da desmineraliza-
determinantes de pico de massa óssea, a co-
ção óssea baseia-se em condutas farmacológicas
-existência de outras condições osteopenizan-
e não farmacológicas, como: ingestão adequada
tes, e fatores de risco para osteoporose de alta
de cálcio e exposição ao sol; prática de atividades
remodelação e fraturas, além de atentar para a
físicas aeróbicas; evitar o tabagismo e o excesso
faixa etária e o quadro clínico, por conta das im-
de bebidas alcoólicas e de dieta rica em cafeína e
plicações em relação à terapêutica específica e
proteínas; correção do status hormonal envolvi-
prognóstico das causas secundárias.
do no metabolismo do cálcio; suplementação de
cálcio e vitamina D a partir da menopausa e, es-
pecialmente, em pacientes imobilizados, institu-
2.2. Como, quando e quem prevenir e tratar?
cionalizados e idoso e uso judicioso de glicocor-
Perante a possibilidade de osteoporose, ticoide. Já a prevenção primária da osteoporose
a abordagem dos pacientes deve identificar os inclui: a terapia hormonal na pós-menopausa;
fatores de risco para desmineralização óssea e uso de doses baixas de bisfosfonatos e evitar
fraturas, excluir as condições osteopenizantes e quedas em pacientes idosos.
estabelecer as medidas preventivas e terapêu-
A prevenção secundária da osteoporose
ticas apropriadas, visando elevar ao máximo o
ou terapia farmacológica pode ser classifica-
por dois anos e indicado para aqueles indivíduos Outra droga que já se encontra na fase III dos en-
com osteoporose primária e secundária ao uso saios clínicos é o anticorpo monoclonal denosu-
de glicocorticoides com alto risco para fraturas, mab, análogo da osteoprotegerina e concorrente
ou que já as apresente em sítios vertebrais ou natural do RANK-L pelo receptor de ativação dos
que tiveram falha terapêutica anterior. Os prin- osteoclastos. Na fase II, esta droga equiparou-se
cipais efeitos colaterais são: náuseas, tonturas e aos bisfosfonatos na elevação da DMO da coluna
cãimbras, sendo a hipercalcemia menos comum. vertebral, do quadril e do antebraço.
Por contra do desenvolvimento de osteossar-
A conduta cirúrgica de pacientes com
coma em ratos, a teriparatida está totalmente
osteoporose estabelecida vai depender da lo-
contraindicada em pacientes com risco maior de
calização, da gravidade da fratura e prognósti-
malignidade óssea: crianças, antecedente de ra-
co funcional, respeitando-se o estado geral do
dioterapia, doença de Paget e fosfatase alcalina
paciente e a existência de outras co-morbida-
idiopática persistentemente elevada.
des. Porém, foge do escopo dessa publicação.
No cenário terapêutico da osteoporose sur- O tratamento sintomático por meio do uso de
gem novas perspectivas, como o ranelato de es- analgésicos e anti-inflamatórios não hormonais,
trôncio que aumenta a massa óssea tanto inibin- além das associações com opioides e reabilita-
do a reabsorção, quanto estimulando a formação ção, é imperativo. Caso os sintomas dolorosos
óssea e, por conseguinte, reduz o risco de fraturas não cessem ao cabo de, no máximo, três meses,
em sítios corticais e trabeculares. Atualmente, o provavelmente trata-se de fratura patológica e
protos encontra-se na fase de fármaco-vigilância. a pesquisa de doença subjacente impõe-se.
D- Referências Bibliográficas
BRANDÃO, C. M. A. et al. Posições Oficiais 2008
da Sociedade Brasileira de Densitometria Clíni-
ca (SBDens). Arq Bras Endocrinol Metab, São
Paulo, v. 53, n. 1, p. 107-112, 2009.
Esses últimos são: sexo feminino (100 vezes O tamoxifeno também reduz o risco de
mais comum do que no homem), idade, história câncer invasivo e não invasivo da mama. Re-
familiar, fatores genéticos (mutações em BRCA1/ duz em 38% o risco do câncer de mama, porém
BRCA2), história familiar ou pessoal de câncer de pode causar câncer de endométrio, eventos
mama, cor branca, densidade do tecido mamá- tromboembólicos, catarata, dentre outros.
rio, algumas lesões benignas da mama, fatores O raloxifeno, SERM de segunda geração,
reprodutivos (idade tardia do primeiro filho ou é eficaz em: prevenção do câncer de mama, os-
não ter filho), história menstrual (menarca preco- teoporose em mulheres na pós-menopausa e
ce, menopausa tardia, história médica (tratamen- doenças cardíacas. A dose diária recomendada
to do linfoma Hodgkin com irradiação torácica). é de 60 miligramas por cinco anos. Esse fármaco
Há fatores de risco para o câncer de possui uma eficácia semelhante ao tamoxifeno,
mama que podem ser modificados: sobrepeso, mas com menos efeitos colaterais, de acordo
consumo de álcool e uso de hormônios exóge- com o estudo STAR. Esse trabalho multicêntri-
nos (terapia hormonal pós-menopausa e uso de co e randomizado, englobou mais de 19.000
anticoncepcional). mulheres com risco aumentado para câncer
de mama invasivo. Um grupo recebeu raloxi-
Para o grupo de risco que apresente um feno 60 mg/dia e o outro, tamoxifeno 20 mg/
percentual acima de 20% de desenvolver cân- dia. O objetivo do estudo era avaliar quão eficaz
cer de mama, de acordo com os fatores de risco, seria o raloxifeno em reduzir o risco de câncer
como a forte história familiar de câncer de mama de mama invasor assim como avaliar a sua se-
ou ovário, é indicado o rastreamento anual com gurança a longo prazo. Há uma menor taxa de
a mamografia em associação com a ressonância câncer endometrial como efeito colateral em
magnética. Essa associação não é recomendada relação ao tamoxifeno (36% menor risco de ne-
para o grupo abaixo de 15% de risco. oplasia de endométrio com raloxifeno).
Mulheres com história de irradiação na O estudo STAR comprova que o raloxifeno
região torácica ou mutação do gene do câncer causa menos efeitos adversos do que o tamo-
de mama são classificadas de alto risco. Mulhe- xifeno, o qual pode causar leucorreia, sangra-
res com múltiplos fatores de risco ou história mento vaginal e maior quantidade de eventos
familiar forte de câncer de mama são do grupo adversos de trombose venosa profunda.
de risco moderado.
Porém, em mulheres antes da menopau-
A prática de atividades físicas reduz em sa, o tamoxifeno é o único fármaco aprovado
até 20% o risco de câncer de mama em mulhe- para reduzir o risco do câncer de mama. Mu-
res pós-menopausa. lheres na pós-menopausa têm duas opções, ta-
moxifeno e raloxifeno. Portanto, deve ser inves- desenvolvimento do câncer de mama. Há as-
tigada a história clínica, a familiar e os riscos e sociação com o consumo de carne vermelha e
benefícios para cada caso, para então adotar o risco de neoplasia maligna da mama.
melhor fármaco a ser utilizado.
O consumo de álcool implica efeitos di-
O raloxifeno possui a mesma eficácia que retamente carcinogênicos devido aos metabóli-
o tamoxifeno para reduzir o risco de câncer in- tos como o acetaldeído ou radicais do oxigênio.
vasivo da mama. Porém não previne o câncer Contudo, o seu uso associado ao ácido fólico
não invasivo de mama. Os efeitos colaterais, em diminui o risco de desenvolver câncer de mama.
geral, são menores com raloxifeno, mas uma Estudos têm provado que a vitamina D e o alto
análise deve ser feita quanto aos riscos para nível de carotenoides têm efeito protetor.
cada paciente, considerando que o tamoxifeno
Há evidências que associam o sobrepe-
tem maior proteção, pois previne a neoplasia
so e a obesidade na pós-menopausa com a
maligna da mama invasiva e não invasiva.
maior susceptibilidade de desenvolver câncer
Os inibidores da aromatase estão sendo de mama. É fundamental a perda de peso após
estudados sobre o efeito quimiopreventivo do a menopausa, que reduz o estrógeno circulante,
câncer de mama em mulheres na pós-meno- diminuindo assim o risco de câncer de mama,
pausa, porém ainda não há comprovação cientí- especialmente em mulheres que não estão em
fica de seu uso para essa função. Esses fármacos tratamento com terapia hormonal.
são utilizados no tratamento adjuvante do cân-
Ao contrário do que acontece em mulhe-
cer de mama, agindo no bloqueio da produção
res após a menopausa, aquelas obesas ou com
de estrogênio em mulheres na pós-menopausa.
sobrepeso no menacme têm o risco menor de
Outros medicamentos estão sendo ava- desenvolver câncer de mama. Uma hipótese é
liados na prevenção do câncer, como a aspirina que a obesidade pode causar anovulação, redu-
e os anti-inflamatórios não esteroidais, porém zindo a exposição ao total de hormônios.
sua eficácia ainda não está comprovada.
Estratégias para reduzir o risco de cân-
Há evidências de que a terapia hormonal cer de mama nas mulheres são voltadas prin-
na pós-menopausa aumenta o risco de desenvol- cipalmente para as mudanças de estilo de vida.
ver câncer de mama, principalmente quando da Medidas como redução ou até eliminação do
associação de estrogênio e progesterona. O risco uso de bebidas alcoólicas devem ser adotadas.
diminui bastante quando a terapia não é adotada. O uso de terapia hormonal após a menopau-
sa deve ser avaliado, pois apesar de seus be-
A opção cirúrgica pode ser um meio pro-
nefícios para reduzir os sintomas da menopau-
filático de prevenir o câncer de mama, realizan-
sa, representa grande risco para desenvolver a
do a mastectomia poupadora de pele (“skin-
doença, principalmente se prolongada (tempo
-sparing”) bilateral em mulheres com alto risco
superior a cinco anos) e em pacientes que já ti-
de desenvolver a doença. A cirurgia reduz em
veram neoplasia maligna da mama ou com his-
até 90% o risco, porém não o elimina totalmen-
tória familiar importante.
te, pois não remove o tecido das mamas por
completo, remanescendo pequena quantidade Mulheres devem ser aconselhadas a man-
de tecido mamário no prolongamento axilar e ter um índice de massa corpórea saudável para
na região subareolar. É indicada em mulheres evitar os riscos da obesidade na pós-menopau-
com mutação no gene BRCA, com história de sa. Todas as pessoas devem ser encorajadas a
câncer de mama prévio em uma mama, forte adotar hábitos de vida saudáveis, como prati-
história familiar e/ou biópsias com carcinoma car atividades físicas, regularmente pelo menos
lobular in situ. meia hora de intensidade moderada ou intensa,
três a cinco vezes na semana.
A ooforectomia pode ser realizada em
mulheres com mutação no gene BRCA, reduzin- O câncer de mama pode ser prevenido
do o risco de câncer de mama em 50%, devido com hábitos de vida saudáveis, combatendo a
ao fato de eliminar a principal fonte de estrogê- obesidade, eliminando o álcool, não aderindo
nio do corpo. à terapia hormonal na pós-menopausa, prati-
cando atividades físicas regularmente e aderin-
Estudos sugerem que a gordura total
do ao exame periódico das mamas através da
consumida pode ser um fator de risco para o
mamografia. Realizar a quimioprevenção com
tamoxifeno ou raloxifeno por cinco anos deve xa de dor, que é bastante frequente, não deve
ser bem discutido com a paciente, avaliando os despertar muito desespero e preocupação. Esse
riscos e os benefícios que lhe proporcionarão. exame é bastante encorajado pelos médicos,
mas é opcional, já que a literatura é bastante
controversa e não existem dados que suportem
2. Prevenção Secundária maior detecção precoce da doença e redução
O rastreio para o câncer de mama é ba- da mortalidade do câncer de mama. Por isso, os
seado em técnicas de imagem associadas ao benefícios e limitações do referido exame de-
exame físico. vem ser esclarecidos.
anatômico (OEA) em cerca de 90% das mulhe- tecidual: HPV cutâneotrópico e HPV mucoso-
res, sendo a ocorrrência fisiológica denomina- -genitotrópico. O HPV de baixo risco (tipos 6,
da de eversão. Ao ocorrer a eversão, a mucosa 11, 42, 43, 44) está relacionado ao desenvolvi-
endocervical torna-se menos resistente ao meio mento de verrugas genitais (figuras 3, 4, 5 e 6)
vaginal. Essa exposição propicia transformação - condilomas acuminados na vulva, na vagina e
de um epitélio em outro da mesma linhagem no colo uterino ) e à neoplasia intraepitelial de
histológica, havendo metaplasia do epitélio ci- baixo grau ou CIN I. A figura 4 mostra imagem
líndrico simples em epitélio pavimentoso estra- colposcópica compatível com condiloma exofí-
tificado (epitélio escamoso). Esse processo esta- tico localizado no colo uterino; a figura 5 mostra
belece uma nova área denominada de zona de forma espiculada, com irregularidades e aspere-
transformação, em que há maior vulnerabilida- zas, situada no lábio posterior (LP) do colo uteri-
de aos agentes oncogênicos, tornando-se assim no. A figura 6 mostra implantes condilomatosos
mais suscetível à transformação neoplásica. exofíticos no colo e na vagina.
O início precoce da atividade sexual (<16
anos), múltiplos parceiros (poliandria), expo-
sição à radiação ionizante, tabagismo, multi-
paridade, baixo nível nutricional, deficiência
vitamínica, infecção pelo papilomavírus huma-
no (HPV) e por outras doenças sexuais prévias,
constituem fatores de risco para desenvolvi-
mento do carcinoma do colo uterino.
As atipias citológicas de baixo grau (LSIL)
são frequentes em adolescentes, ocasionadas
provavelmente pela imaturidade do colo uteri-
no e maior exposição da zona de transforma-
ção a fatores de risco. A faixa etária de mulhe-
res com neoplasia intraepitelial cervical (CIN III)
mostra tendência à diminuição, o que sugere
o acometimento de infecções do trato genital
inferior por HPV, que atua como verdadeiro co- Figura 3. Condilomatose vulvar em adolescente na 26ª.
-fator para o surgimento do carcinoma do colo semana de gestação.
uterino nas mulheres imunológica e genetica- Arquivo do primeiro autor.
mente predispostas. Sabe-se que o tabagismo
diminui a funcionalidade das células de Lan- O HPV de alto risco (16, 18, 31, 33, 35,
gerhans e células apresentadoras de antígeno, 39, 45, 52, 56 e 58) encontra-se relacionado
comprometendo, significativamente a imunida- às lesões intraepiteliais de alto grau (CIN II e
de celular local. Em decorrência disso, substân- CIN III) e às neoplasias malignas do colo ute-
cias químicas como nicotina, fenóis, cotinina e rino. Acredita-se que o percentual de neopla-
alcatrões contidos no cigarro influenciariam os sia intraepitelial atribuída à infecção por HPV
mecanismos da carcinogênese cervical. aproxime-se de 90%. O tipo 16 é a forma de
HPV mais encontrada no carcinoma invasivo
O HPV é considerado uma das doenças
do colo uterino e em CIN II e III, sendo detec-
sexualmente transmissíveis mais comuns no
tado em 47% das mulheres com a neoplasia
mundo, estando correlacionado com a maio-
nesses estádios. Por outro lado, é o tipo mais
ria dos cânceres epidermoides de colo uterino,
encontrado em mulheres com citologia nega-
vulva, vagina, pênis e ânus. O HPV pertence à
tiva para células malignas. O HPV 18 é encon-
família Papovaviridae, seu genoma sendo cir-
trado em 23% das mulheres com cânceres in-
cular, composto por dupla fita de DNA, pos-
vasivos do colo uterino e em 5% com CIN II e
suindo forma icosaédrica, com 72 capsômeros.
III. O HPV 18 mostra mais especificidade que o
Classifica-se em tipos de acordo com a organi-
HPV 16 para tumores malignos. Sabe-se tam-
zação das sequências de nucleotídeos do DNA.
bém, que o HPV 16 é o tipo mais prevalente
Já foram descritos mais de 100 tipos de HPV,
no carcinoma de células escamosas e o HPV
15 deles sendo considerados oncogênicos e
18 é o mais prevalente no adenocarcinoma do
classificados de acordo com a especificidade
colo uterino. Os fatores de risco associados são através de alterações colpocitológicas já bastante
imunosupressão, infecção por HIV ou o relato conhecidas (coilocitose, binucleação e discariose),
de outras doenças sexualmente transmissíveis, como reportado e comprovado a seguir.
tabagismo, multiparidade e uso de contracep-
Do ponto de visto das alterações ocasio-
tivos orais. Estima-se que 50 a 80% das mulhe-
nadas pelo HPV observadas na colpocitologia
res sexualmente ativas serão infectadas por um
oncótica convencional (Papanicolaou) podem ser
ou mais tipos de HPV.
encontradas imagens na camada epitelial com va-
A forma mais comum do HPV é a subclí- cuolização citoplasmática ou halo citoplasmático
nica, compreendendo o percentual de 60 a 95% perinuclear (células em balão ou coilócitos), mul-
dessas infecções viróticas. Os casos subclínicos tinucleação e discariose, hipercromasia, denomi-
mostram crescimento vascular insuficiente para nadas citopatias viróticas (figuras 7, 8 e 9); essas
condicionar o aparecimento de lesões exofíticas. vacuolizações são escamosas típicas. A principal
Esses casos podem ser reconhecidos através do diferença histológica entre o CIN e as alterações
exame colposcópico, após aplicação de ácido acé- proporcionadas pelo HPV, é que os vírus desen-
tico na concentração de 3 a 5%, percebendo-se cadeiam alterações no sentido da superfície epite-
depois de cerca de um minuto áreas acetobran- lial para a membrana basal. Também não se deve
cas, com padrões vasculares anômalos. O exame esquecer, que o papiloma laríngeo e o condiloma
colposcópico detecta grupamento de pequenas vulvar em crianças de mães com o canal do parto
papilas de base única. O teste de Schiller condi- infectado por HPV têm sido reportados. Até agora
ciona coloração irregular ou parcial pela impreg- não foi possível a realização da cultura desses vírus.
nação do iodo. Também poderão se manifestar
Ambas as vacinas são produtos de Enge- CHARO, RA; AGOSTI, JM; BADEN, GF et al. Future
nharia Genética, vacinas inativadas recombinan- II Study Group. Quadrivalent vaccine against hu-
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vacinados ou que não tiveram a doença cons- fagos da família Culicidae, em especial dos gê-
tituem grupo prioritário para vacinação contra neros Aedes e Haemagogus. O período de incu-
hepatite B. bação varia, em geral, entre três e seis dias.
Essa vacina é produzida a partir de tecno- Clinicamente, a febre amarela pode se
logia de DNA recombinante, através da inserção apresentar assintomática, oligossintomática,
do plasmídeo contendo o gene para o AgHBs moderada, grave e maligna. A letalidade global
dentro de uma levedura (Sacharomices cerevi- varia de 5% a 10%, mas entre os casos graves,
siae). As células do levedo produzem o AgHBs, que evoluem com síndromes ictero-hemorrági-
que será posteriormente purificado e utilizado ca e hepatorenal, pode chegar a 50% .
na produção da vacina.
Pode ser prevenida pelo uso da vacinação
A eficácia da vacina contra hepatite B é em antiamarílica, que é indicada como rotina pelo
torno de 95% em crianças e adolescentes, e alguns MS e pela SBP e deve ser administrada aos ado-
fatores podem reduzi-la: imunodepressão, diabe- lescentes que residam ou que forem viajar para
tes, obesidade, tabagismo, insuficiência renal, apli- área endêmica (estados: AP, TO, MA, MT, MS,
cação na região glútea e aumento da idade. RO, AC, RR, AM, PA, GO e DF), área de transição
(alguns municípios dos estados: PI, BA, MG, SP,
Deve ser administrada via intramuscular,
PR, SC e RS) e área de risco potencial (alguns
e o músculo de escolha é o deltoide. Em ado-
municípios dos estados BA, ES e MG). Também
lescentes sem comprovação de vacina anterior,
é indicada para quem viajará para áreas endê-
devem ser tomadas três doses com intervalos
micas no exterior. A vacina deve ser administra-
de 30 dias da primeira para a segunda dose e
da dez dias antes da viagem. Reforços são ne-
de 180 dias da primeira para a terceira dose. Em
cessários a cada dez anos.
caso de vacinação incompleta, completar o es-
quema já iniciado. A vacina contra febre amarela é constituí-
da de vírus vivos atenuados. Aproximadamente
É considerada imunizada para hepatite B a
90% das pessoas vacinadas apresentam anticor-
pessoa que apresentar título anti-HBsAg maior
pos neutralizantes no soro já a partir do 10º dia
que 10 UI/mL. O teste sorológico rotineiro é re-
após vacinação.
comendado apenas para pessoas em situações
de risco (exemplos: profissionais de saúde, usu- Está contraindicada em indivíduos com
ários de drogas), e deve ser realizado um a dois história de alergia grave a ovo de galinha, em
meses após a última dose. gestantes e imunodeprimidos (exceto, se hou-
ver alto riso de transmissão e se o estado clínico
Eventos adversos: dor (3%-29%) e endu-
do paciente permitir).
ração/rubor (2%-17%) no local da injeção; febre
(1%-6%) nas primeiras 24h após a aplicação;
fadiga, tontura, cefaleia, irritabilidade, descon-
2.3. Vacina tríplice viral
forto gastrointestinal leve (1%-20%); reação de
hiperesensibilidade (1 caso para 600.000 vaci- A vacina tríplice viral (SCR) é constituída de
nados). Pode ocorrer, raramente, púpura trom- vírus vivos atenuados e visa prevenir três doenças:
bocitopênica idiopática (PTI) após vacinação sarampo, rubéola e caxumba. É composta de ce-
contra hepatite B, cuja relação causal é difícil de pas vacinais dos vírus da rubéola, da caxumba e
ser comprovada. O tempo entre a aplicação da do sarampo cultivadas em ovos embrionados de
vacina e o aparecimento dos sintomas de PTI é galinha e conservantes (traços de antibióticos).
de alguns dias até dois meses. A rubéola é causada por um togavírus, que
A ocorrência de reação anafilática até duas é o único membro do gênero Rubivirus. É uma
horas após a aplicação de dose anterior contra- infecção de adultos e crianças que tipicamen-
-indica o prosseguimento do esquema vacinal. te apresenta exantema, febre e linfadenopatia,
e tem amplo espectro de outras manifestações
possíveis. Sua vacina tem como principal objetivo
2.2. Vacina antiamarílica a eliminação da síndrome da rubéola congênita.
A febre amarela é causada por um ar- A caxumba (parotidite) é uma infecção vi-
bovírus do gênero Flavivirus e transmitida ao ral aguda, sistêmica, benigna e contagiosa, cuja
manifestação mais típica é o aumento de uma ríngea e cutânea causada pelo Corynebacterium
ou de ambas as glândulas parótidas. O acometi- diphteriae. As cepas toxigênicas do C. diphteriae
mento de glândulas salivares, das meninges, do produzem uma toxina protéica que provoca
pâncreas e das gônadas também é comum. É efeitos tóxicos sistêmicos, miocardite e poli-
causada por um paramixovírus. neuropatia. É transmitido por via aerossolizada,
principalmente durante o contato íntimo.
O sarampo é, atualmente, uma doença
controlada no Brasil, mas, antes de se tornar con- O tétano é uma doença não contagiosa
trolada, era uma das maiores causas de mortali- causada pela tetanospasmina, toxina da bacté-
dade infantil. É uma doença respiratória exante- ria anaeróbia Clostridium tetani, que se desen-
mática, aguda e altamente contagiosa. O vírus do volve no interior de ferimentos. O reservatório
sarampo é membro da família Paramyxoviridae. da bactéria é o trato intestinal do homem e de
animais domésticos, o solo, a pele e/ou qual-
A SCR é indicada como rotina pelo MS.
quer instrumento perfurocortante. Geralmen-
Adolescentes que tiverem duas doses de SCR
te, os casos de tétano ocorrem após uma lesão
devidamente comprovadas no cartão de vaci-
aguda (ferida puntiforme, laceração, abrasão ou
nação não precisam ser revacinados. Para indi-
outro traumatismo). O período de incubação é
víduos sem comprovação de vacina anterior, a
de dois dias a três semanas, variando de acordo
vacina tríplice viral ou a dupla viral (sarampo e
com a natureza, a extensão e a localização da
rubéola) são recomendadas para mulheres de
ferida. O tétano é caracterizado por hipertonia
12 a 49 anos e para homens até os 39 anos de
muscular e espasmos.
idade. A eficácia, quando aplicadas as duas do-
ses preconizadas para as crianças, após 1 ano A coqueluche é causada pelo bacilo gram-
de idade e com intervalo mínimo de um mês, -negativo Bordetella pertussis. A principal carac-
é superior a 99% para o sarampo. Uma dose a terística da doença é a tosse. A coqueluche é
partir dos 12 meses de idade induz proteção de extremamente contagiosa, e a mortalidade em
95% para rubéola e caxumba. países em desenvolvimento pode chegar a 15%.
Febre e erupção cutânea de curta dura- Para adolescentes sem comprovação de va-
ção, ocorrendo habitualmente entre o quinto e cinação anterior, o MS recomenda que devem ser
o décimo dia depois da vacinação são os even- aplicadas três doses da vacina dupla bacteriana do
tos adversos mais comuns. Pode haver também tipo adulto para difteria e tétano (dT): a primeira
episódios de artralgia e artrite, sendo mais fre- na primeira visita ao serviço de saúde, a segun-
quentes nas mulheres adultas susceptíveis. da 2 meses após a primeira dose e a terceira 4
meses após a primeira dose. O intervalo mínimo
As dermatites de contato com neomicina
entre as doses é de 30 dias. As pessoas com es-
e reações de hipersensibilidade ao ingerir ovo de
quema incompleto devem completá-lo. Aquelas
galinha não são contraindicações para vacinação,
previamente vacinadas e com esquema completo
mas devem ser administradas com precaução.
devem receber uma dose de reforço da vacina du-
São contra-indicadas na gestação e em pessoas
pla bacteriana do tipo adulto para difteria e tétano
imunodeprimidas. As mulheres vacinadas devem
(dT) a cada 10 anos. A dose de reforço deve ser
evitar gestação por 28 dias, mas, se a vacina for
antecipada para 5 anos em caso de gravidez ou
aplicada inadvertidamente em gestantes, não é
ferimento suspeito de causar tétano.
recomendada a interrupção da gravidez.
Apesar de o MS recomendar na adoles-
Administração de imunoglobulina hu-
cência a vacina dupla bacteriana do tipo adulto
mana padrão, sangue total ou plasma no três
para difteria e tétano (dT), sabe-se que a inci-
meses anteriores pode reduzir a resposta imu-
dência de coqueluche vem aumentando entre
nológica do vacinado, e, sendo possível, a admi-
adolescentes e adultos, os quais são importante
nistração do imunizante deverá ser adiada.
fonte de infecção para os lactentes. Até pouco
tempo atrás, não havia uma vacina recomenda-
2.4. Vacinas antidifteria, tétano e coqueluche da para essa faixa etária. A vacina disponível até
então, tríplice bacteriana contra difteria, tétano
São vacinas inativadas. Estão disponíveis e coqueluche de células inteiras (DTPw), é indi-
combinadas ou não a outras vacinas e na forma cada somente para menores de 7 anos de idade.
acelular (DTaP) ou de células inteiras (DTP, per- Portanto, foi desenvolvida a vacina tríplice bac-
tussis clássica). A difteria é uma infecção nasofa-
teriana contra difteria, tétano e coqueluche ace- -exposição, para indivíduos com leucemia linfo-
lular para uso em adolescentes e adultos (dTpa), cítica aguda e tumores sólidos em remissão há
a qual possui uma eficácia para coqueluche de pelo menos 12 meses, desde que apresentem
85% em adolescentes e adultos após uma dose. >700 linfócitos/mm3, plaquetas > 100.000/mm3
A perspectiva é que a vacina dTpa substitua a e sem radioterapia; para profissionais de saú-
vacina dT para a dose de reforço no programa de, pessoas e familiares susceptíveis à doença
de imunizações. e imunocompetentes que estejam em convívio
domiciliar ou hospitalar com pacientes imuno-
Os eventos adversos mais comuns após a
deprimidos; para candidatos a transplante de
aplicação das tríplices bacterianas são: dor, ver-
órgãos, susceptíveis à doença, até pelo menos
melhidão e enduração locais, febre, mal-estar
três semanas antes do ato cirúrgico, desde que
geral e irritabilidade nas primeiras 24 a 48 horas.
não estejam imunodeprimidos; para imuno-
Em lactentes, pode haver sonolência, choro pro-
competentes susceptíveis à doença e, maiores
longado e incontrolável, convulsões e síndrome
de um ano de idade, no momento da interna-
hipotônicohiporresponsiva. As vacinas acelula-
ção em enfermaria onde haja caso de varice-
res são mais seguras e menos reatogênicas.
la; antes da quimioterapia, em protocolos de
pesquisa; para nefropatas crônicos; para crian-
2.5. Vacinas antivaricela ças com síndrome nefrótica, em uso de baixas
doses de corticoide (<2 mg/kg de peso/dia até
A varicela é causada pelo vírus varicela- um máximo de 20mg/dia de prednisona ou
-zóster (VVZ). A aquisição da doença depende equivalente) ou para aquelas em que o corti-
da idade, da condição imunológica, da con- coide tiver sido suspenso duas semanas antes
dição de vacinação e do tipo de exposição. A da vacinação; para doadores de órgãos sólidos
transmissão ocorre por contato íntimo com e medula óssea; para receptores de transplante
doentes, desde 2 dias antes até 5 dias após o de medula óssea: uso restrito, sob a forma de
surgimento das vesículas. As manifestações clí- protocolo, para pacientes transplantados há 24
nicas surgem 10 a 21 dias após contato. A mor- meses ou mais; para pacientes infectados pelo
talidade é baixa (6,7/100.000), porém a letalida- HIV/SIDA se susceptíveis à varicela e assinto-
de varia com a idade e condição imunológica, máticos ou oligossintomáticos (categoria A1 e
sendo mais elevada nos grupos de risco para N1); para pacientes com deficiência isolada de
complicações (exemplos: gestantes, pessoas imunidade humoral e imunidade celular preser-
com imunodeficiência congênita ou adquirida, vada; para pacientes com doenças dermatoló-
adolescentes adultos, entre outros). A letalidade gicas crônicas graves; para pessoas em uso crô-
é 15 vezes maior em adultos. Em adolescentes nico de ácido acetilsalicílico (suspender uso por
e adultos, assim como em imunodeprimidos, a seis semanas após a vacinação); para indivíduos
varicela pode acarretar, mais frequentemente, com asplenia anatômica ou funcional e doenças
complicações respiratórias e neurológicas gra- relacionadas; para portadores de trissomias. Na
ves que podem levar à morte. As gestantes so- pós-exposição, para pessoas imunocompeten-
ronegativas para o VVZ são consideradas como tes comunicantes de casos em enfermarias.
grupo de grande risco e devem ter muito cuida-
do com a exposição, pois, se contrairem o VVZ O esquema de vacinação atualmente re-
durante os primeiros meses de gestação, o feto comendado é de dose única para crianças com
pode nascer com malformações. A varicela ad- idade entre 12 meses e 13 anos e de duas do-
quirida in utero, cinco dias antes do nascimento ses, com intervalo mínimo de 4 semanas, para
até dois dias depois, também apresenta grande pessoas com mais de 13 anos de idade com
risco, podendo provocar um quadro de varicela antecedente negativo para a doença. Verificou-
grave e disseminada no neonato. -se que, em crianças entre 1 e 12 anos, a vacina
previne infecção leve em 70% a 85% e quadros
As vacinas contra varicela contêm vírus moderados ou graves em 99%. A partir dos 13
vivos atenuados, geralmente derivados da cepa anos de idade, a resposta imune ocorre em 78%
Oka. São formuladas com quantidades variáveis das pessoas que receberam uma dose da vaci-
de unidades formadoras de placa do VVZ e de- na e em 99% nas que receberam uma segunda
vem ser administradas por via subcutânea. dose, justificando a necessidade de duas doses
O MS não disponibiliza a vacina como a partir dessa faixa etária.
rotina, somente em situações especiais: na pré-
mente possível na gestação. Gestantes parcial- A vacina contra influenza está recomen-
mente vacinadas devem completar o esquema dada para gestantes sadias com idade gesta-
vacinal. O intervalo entre as duas primeiras do- cional superior a 14 semanas, nos meses que
ses é de 2 meses, e entre a segunda e a terceira antecedem a estação de influenza.
doses, de 6 meses. Se não houver tempo para
As vacinas contra hepatite A e B podem
aplicar as três doses da vacina durante a gesta-
ser aplicadas em grávidas susceptíveis que se
ção, a segunda dose deve ser aplicada no máxi-
expõem durante a gestação.
mo até 20 dias antes da data provável de parto.