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A pesquisa deve começar pela idade da menarca, que é É importante anotar o número de gestações, ocorrência
a primeira menstruação na vida da mulher, que de prematuridade, gravidez ectópica ou molar, tipos de
normalmente ocorre entre 10 e 16 anos de idade, com partos – se transpélvicos (TP) ou cesarianas (CST), e o
uma média de 12 anos(3). Deve ser anotada a data da número de abortos - se espontâneos ou provocados,
última menstruação (DUM) se estiver no menacme, e seguidos ou não de curetagem. Anotar a idade em que
se for após a menopausa, anotar a idade que ocorreu a ocorreu o primeiro e último parto. Avaliar o
DUM, bem como se está em uso de terapia hormonal aleitamento, o tempo de amamentação de cada filho e
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se houve fissuras ou mastites. As intercorrências se abertas são aconselháveis, como: “Alguma outra
referem ao ciclo gravídico-puerperal, e é relevante dúvida?”, “Alguma coisa a mais que você acha
questionar diabetes, hipertensão arterial, hemorragias, importante me dizer, mas que ainda não perguntei?”
restrição de crescimento intra-útero e outros problemas
ou “e como vai a sua vida?”.
clínicos (6,8,9).
Medicamentos em Uso 2- Conhecer o roteiro para a realização do
exame físico ginecológico;
Perguntar quais, por que está em uso, qual a dose, há
quanto tempo, e quem prescreveu ou se está fazendo
Ao iniciar o exame ginecológico, cabe ao médico armar-
automedicação. Possíveis interações medicamentosas
se de paciência, de respeito e de delicadeza, não se
podem influenciar o aparecimento de sintomas
esquecendo da tensão emocional da paciente que se
ginecológicos, tais como, sangramentos, vulvovaginites
propõe a esse exame, em especial quando está se
e galactorreias, assim como reduzir a eficácia dos
submetendo a ele pela primeira vez. Ao medo de
contraceptivos hormonais(3,6,8).
realizar o exame, que supõe doloroso, juntam-se a
Hábitos de Vida
vergonha pela exibição dos órgãos genitais e o temor do
diagnóstico.
Quanto ao tabagismo, saber se fuma, a quantidade, o
tempo, se já cessou o hábito de fumar, há quanto A paciente não deve estar completamente despida
tempo parou; pois, está relacionado à maior incidência durante o exame, mas sim usando avental e lençol.
de tumor de colo uterino, tromboembolismo, Faz-se o desnudamento progressivo da paciente de
prematuridade e restrição de crescimento intrauterino. acordo com a região a ser examinada. Convém iniciar o
No quesito etilismo e uso de drogas ilícitas, saber se usa exame pelas mamas em respeito ao pudor da paciente.
ou não, qual a quantidade, o tipo, o tempo de uso e via Constitui pré-requisito a bexiga estar esvaziada antes
de administração(6,8).
do exame ginecológico. O esvaziamento intestinal
Revisão de Sistemas
também pode ser necessário em casos especiais,
Uma queixa muito comum nas mulheres quanto aos solicitando-se, então, o uso de laxativos na véspera.
sintomas urinários, são as alterações da frequência Deve ser recomendado à paciente não fazer duchas
urinária, da diurese, do jato e da percepção de sintomas vaginais higiênicas na véspera ou no dia do exame.
associados. Se a queixa for com relação à perda urinária
aos esforços, detalhar quanto à duração, fatores de O exame físico geral, principalmente a avaliação do
melhora ou piora, como tosse, espirro ou exercício físico estado geral, dos linfonodos e do estado de nutrição, a
e o impacto na qualidade de vida. Outra queixa comum caracterização do biotipo e a determinação do peso e
está relacionada aos sintomas intestinais, como da altura, são feito antes do exame ginecológico.
frequência das evacuações, presença ou não de dor, Exame das mamas
sangramentos e qualidade das fezes(6,9). A abordagem
dos membros inferiores deve ser feita quanto ao
questionamento de presença ou não de varizes,
tratamentos de trombose e edema (Fig. 1).
Inspeção estática
- Alteração unilateral na pele da mama, como eczema, • Abaulamento (assinalando a região em que ele se
localiza, tamanho, forma, mobilidade, desaparecimento
edema cutâneo semelhante à casca de laranja, retração
ou não com a contração da musculatura da parede
cutânea ou distorções do mamilo. abdominal)
• Umbigo (normal, desviado, hérnia, inflamação,
- Descarga papilar sanguinolenta unilateral e neoplasia, dermatose)
espontânea (secreções transparentes ou rosadas • Pelos (disposição androide ou ginecoide, ausência,
também devem ser investigadas). escassez, hipertricose)
• Marcas e manchas (estrias, cicatrizes, manchas hiper
Exame do abdome (Ref: Semiologia Médica ou hipopigmentadas, equimoses, petéquias, VI'bices,
telangiectasias)
- Porto) • Circulação colateral (tipo porto-cava, cava superior,
cava inferior, síndrome de Cruveillier-Baumgarten)
O exame do abdome deve ser realizado com a paciente • Movimentos e pulsações (movimentos respiratórios,
deitada, localizando e anotando os dados clínicos de pulsações, peristaltismo visível)
acordo com a divisão em quadrantes. Faz-se a inspeção, • Lesões cutâneas (vesículas, flictenas, pústulas etc)
a palpação e a percussão. Em alguns casos, faz-se,
também, a ausculta, seguindo as normas técnicas Palpação
descritas no estudo semiológico do sistema digestivo. A palpação do abdome deve ser iniciada em regiões
distantes da zona dolorosa. Deve-se fazer a palpação
Inspeção superficial e a profunda, avaliando-se a espessura da
parede, hiperestesia, dor provocada, defesa, contratura,
A inspeção do abdome avaliam-se os seguintes tumor (forma, volume, consistência, mobilidade,
parâmetros: sensibilidade, pulsações), tensão da parede abdominal,
• Forma (normal, plano, obeso, globoso, escavado, de soluções de continuidade (orifícios hemiários, diástase)
batráquio, em avental). e ruídos hidroaéreos (vasculejo, patinhação e
gargarejo).
Percussão
Na percussão, investigam-se zonas de macicez e de
timpanismo, presença de ascite.
Ausculta
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Na ausculta, pesquisa-se a presença de ruídos é necessário que a paciente se encontre o mais cômoda
hidroaéreos e de sopros. possível, bem apoiada, de modo a não contrair a
musculatura.
Exame da genitália Ref: Semiologia Médica - Rocco
O exame ginecológico é comumente visto com
A paciente deve ser colocada na posição “ginecológica” apreensão pelas pacientes, podendo torna-lo
desconfortável. Assim, deve-se:
ou de “talha litotômica”, de modo a expor mais
1. Explicar para a paciente sucintamente no que
facilmente a genitália externa. Na maioria dos casos,
consiste o exame ginecológico e retirar suas
essa posição é suficiente. Contudo, quando é preciso
dúvidas antes de conduzi-la à sala de exame;
analisar melhor a parede anterior da vagina, no seu
2. Orientá-la a ir ao toalete e esvaziar sua bexiga e
terço superior, toma-se necessária a posição
intestino;
genupeitoral ou de "prece maometana".
3. Permitir tempo adequado para a troca de roupa e
A paciente é instruída a esvaziar a bexiga. Ela é colocada colocação do avental;
em posição de litotomia dorsal (Figura 1.1) e deitada de 4. Se o examinador for homem, é conveniente a
maneira apropriada. Os pés da paciente devem presença de uma auxiliar do sexo feminino ou, na
repousar de maneira confortável em estribos e com a impossibilidade, a acompanhante da paciente, se
borda dos glúteos na extremidade inferior da mesa, de esta concordar;
modo que a vulva seja inspecionada prontamente e o
5. Posicionar a paciente na mesa ginecológica na
espéculo possa ser inserido na vagina sem obstrução
pela mesa. posição clássica de litotomia: coxas em flexão,
abdução e leve rotação externa com relação ao
quadril, apoiadas no estribo. Solicitá-la que
posicione as nádegas na borda da mesa. Cobri-la
adequadamente até um pouco abaixo do nível dos
joelhos, possibilitando o contato visual. Existem
outras posições para avaliações específicas de
BEREK & NOVAK
patologias ginecológicas, como a GENUPEITORAL ou
Além da posição descrita, pode-se utilizar a posição
“prece maometana”, que expõe a parede vaginal
lateral ou lateral-oblíqua esquerda ou decúbito-lateral
esquerdo, ou posição de Sims, que permitem a anterior e a posição de Sims, que expõe a vagina
realização do toque em uma gestante em trabalho de anorretal;
parto; permite também a visualização da vulva, mas 6. Deixar o instrumental necessário separado e
exige maior manipulação preparado. Posicionar o foco de luz;
7. Calçar as luvas.
GENITÁLIA EXTERNA:
Inspeção e Palpação
Mamas
M1 - mama infantil.
M2 (8-13 anos) - fase de broto mamário, com
elevaçao da mama e aréola como pequeno montículo.
M3 (10-14 anos) - maior aumento da mama, sem
separaçao dos contornos.
M4 (11-15 anos) - projeçao da aréola e das papilas
para formar montículo secundário por cima da mama.
M5 (13-18 anos) - fase adulta, com saliência somente
nas papilas.
Atentar para a presença de piolhos ou lêndeas
característicos da pediculose pubiana, áreas Pilificação ou Pêlos
hiperemiadas sugestivas de processos alérgicos ou P1 - fase de pré-adolescência (nao há pelugem).
traumáticas. P2 (9-14 anos) - presença de pêlos longos, macios e
A maturidade sexual pode ser avaliada através da ligeiramente pigmentados ao longo dos grandes lábios.
Classificação de Tanner: existem estágios que vão do P3 (10-14,5 anos) - pêlos mais escuros e ásperos
padrão infantil ao adulto. sobre o púbis.
Ref da tabela e da imagem: Rotinas em Ginecologia - P4 (11-15 anos) - pelugem do tipo adulto, mas a área
Freitas coberta é consideravelmente menor que a do adulto.
P5 (12-16,5 anos) - pelugem do tipo adulto, cobrindo
todo o púbis e a virilha.
Lábios
VESTÍBULO VULVAR/DA VAGINA: Espaço circundado Deve ser avaliado respeitando a idade da paciente. Em
pelos lábios menores no qual se abrem os óstios da crianças e adolescentes devem ser buscados sinais de
uretra e da vagina e os ductos das glândulas malformações, como agenesia de vagina na Síndrome
vestibulares maiores e menores de Rokitansky-Kuster-Hauser.
Forma triangular; Delimitado anteriormente pelo
clitóris, posteriormente pela fúrcula, lateralmente pelos
pequenos lábios; Observa-se orifícios da uretra, vagina e
canais das glândulas de Skene (glândulas
uretrais/parauretrais)
Artigos do CEM relacionados:1 Art. 88 – É vedado ao deve ser liberado diretamente aos parentes do de
médico negar ao paciente acesso a seu prontuário, cujus, sucessores ou não. O direito ao sigilo tem
deixar de lhe fornecer cópia quando solicitada, bem efeitos projetados para além da morte. A
como deixar de lhe dar explicações necessárias à sua
compreensão, salvo quando ocasionarem riscos ao liberação do prontuário só deve ocorrer ante a
próprio paciente ou a terceiros. Art. 89 – É vedado ao decisão judicial ou requisição do CFM ou de CRM.
médico liberar cópias do prontuário sob sua guarda,
salvo quando autorizado, por escrito, pelo paciente, Isso é certo, pois o prontuário muitas vezes possui
para atender ordem judicial ou para a sua própria informações pessoais das quais o paciente não quer que
defesa. § 1º – Quando requisitado judicialmente, o a família saiba. Desse modo, o sigilo deverá ser
prontuário será disponibilizado ao perito médico preservado. A personalidade do ser humano cessa com
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a morte, mas os direitos personalíssimos persistem I) Justa causa: Fundamenta-se na extensão de
mesmo após o óbito. Assim, se houver interesse estado de necessidade. Haverá justa causa
justificado dos sucessores do de cujus em prestar quando a revelação for o único meio de
informações, principalmente às companhias de seguro,
conjurar perigo atual ou iminente e injusto
pode haver a quebra do segredo com o acesso ao
prontuário através de medidas judiciais e, por outro para si ou para outro. Entende-se por justa
lado, outras oficiais, por parte dos Conselhos de causa situações de grave risco à saúde
Medicina, para eventuais esclarecimentos na instrução coletiva, crimes de ação pública
de sindicâncias ou processos disciplinares. O prontuário incondicionada quando solicitado por
original deve ser conservado no arquivo – entregam-se autoridade judicial ou policial, não
apenas as cópias. A elaboração dos laudos não deve dependendo de representação e que não
resultar em ônus aos solicitantes, facultando-se, porém,
exponha o paciente a procedimento
a cobrança das despesas das cópias efetuadas.
3. Solicitação de outras entidades Salvo autorização criminal, e defendendo interesse legítimo
expressa da paciente, por justa causa e por dever legal, próprio ou legítima defesa.
é vedado ao médico: II) Dever legal: Dever previsto em lei, decreto
Art. 85 – Permitir o manuseio e o conhecimento dos e outros. Deriva não da vontade do que o
prontuários por pessoas não obrigadas ao sigilo confia a outrem, mas de condição
profissional quando sob sua responsabilidade. profissional, em virtude da qual ele é
confiado, e na natureza dos deveres que, no
Art. 94 – Intervir, quando em função de auditor, interesse geral, são impostos aos
assistente técnico ou perito, nos atos profissionais de profissionais.
outro médico, ou fazer qualquer apreciação em a) Leis penais
presença do examinado, reservando suas observações 1. Doenças infectocontagiosas de
para o relatório. notificação compulsória, de declaração
obrigatória e profissional, regulamentada
Art. 97 – Autorizar, vetar, bem como modificar,
pelo Departamento de Saúde Pública;
quando em função de auditor ou de perito,
2. Crimes de ação pública que teve
procedimentos propedêuticos ou terapêuticos conhecimento no exercício da Medicina,
instituídos, salvo, no último caso, em situações de desde que a ação penal não exponha o
urgência, emergência ou iminente perigo de morte do paciente a procedimento criminal.
paciente, comunicando, por escrito, o fato ao médico b) Leis extrapenais (Exclusão de Ilicitude) –
assistente. “Não há crime quando o agente pratica o
fato em estrito cumprimento de dever legal
Art. 98 – Deixar de atuar com absoluta isenção
ou no exercício regular de direito”.
quando designado para servir como perito ou como
auditor, bem como ultrapassar os limites de suas • Médicos legistas; • Médicos sanitaristas; • Médicos
atribuições e de sua competência. peritos; • Médicos de juntas de saúde; • Médicos de
companhias de seguro; • Médicos de empresas; •
O prontuário médico deve estar permanentemente Médicos militares; • Atestado de óbito; • Em pacientes
disponível, e sua liberação a outras pessoas que não o
menores de idade, com abuso do pátrio poder, de
próprio paciente envolve a delicada questão do sigilo
qualidade de padrasto, tutor ou curador, nos casos de
profissional, mencionado no Capítulo IX do Código de
Ética vigente, como também nos artigos 153 e 154 do sevícias, castigos corporais, atentado ao pudor,
Código Penal,6 artigo 207 do Código de Processo Penal7 sedução, estupro, supressão intencional de alimentos,
e 407 do Código de Processo Civil.8 Em atenção a esses desde que tenham capacidade de avaliar seus
dispositivos normativos, os dados nele existentes problemas e de se conduzir por seus próprios meios
somente podem ser divulgados a outrem por para solucioná-los, ou caso a não revelação possa
autorização expressa do próprio paciente ou de seu
acarretar danos a eles, pois se trata de crime de ação
representante legal, ou quando houver “justa causa”
ou, ainda, “dever legal”, explicados a seguir: pública e independem de representação; • Requisições
do CFM e dos Conselhos Regionais de Medicina; •
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Induzimento, instigação ou auxílio na prática do suicídio Na tentativa de superar dilemas na área de Saúde,
ou mesmo sua tentativa; • Abortamento provocado por surgiu em 1979 um modelo de análise bioética
outrem, sem o consentimento do paciente. comumente utilizado e de grande aplicação na prática
clínica em muitos países, especialmente nos EUA e na
O acesso ao prontuário pela figura do médico auditor Europa: o “Principalista”, introduzido por Beauchamp e
enquadra-se no princípio do dever legal, porque ele tem Childress. Esses autores5 propõem quatro princípios
atribuições de peritagem sobre a cobrança dos serviços bioéticos fundamentais ao contexto sanitário, que são a
prestados pela entidade, cabendo a ele opinar pela Autonomia, Beneficência, Não-Maleficência e Justiça.
regularidade dos procedimentos efetuados e cobrados, O princípio da Autonomia requer que indivíduos aptos a
tendo, inclusive, o direito de examinar a paciente para deliberar sobre suas escolhas pessoais devam ser
confrontar o que foi descrito no prontuário. Entretanto, tratados com respeito pela sua capacidade de decisão.
esse acesso deverá ocorrer, impreterivelmente, dentro Desde a década de 90, os Códigos de Ética Profissional,
das dependências da instituição de assistência à saúde inclusive o de Ética Médica, tentam estabelecer uma
responsável por sua posse e guarda, não podendo a relação médico-paciente na qual o respeito à autonomia
instituição ser obrigada, a qualquer título, a enviar os tenda a ser ampliado, reconhecendo o direito de as
prontuários aos seus contratantes públicos ou privados pessoas atendidas decidirem sobre as questões
(Resolução CFM nº1.614/01).9 4. Solicitação de relacionadas ao seu corpo e à sua vida. Quaisquer atos
autoridades policiais ou judiciárias Além das exceções médicos, portanto, devem ser autorizados pelo
acima descritas, existe outra que decorre do paciente: obter a permissão depende da capacidade de
ordenamento jurídico, ou seja, os representantes legais comunicação e empatia do médico, como explicam
de pessoas que não têm aptidão para praticar Muñoz e Fortes:
pessoalmente os atos da vida civil, como, por exemplo, A postura do médico na relação com o paciente,
os pais de um menor de idade ou de maiores
dentro dos princípios bioéticos, é a de consultor,
comprovadamente incapazes.
Com relação ao pedido de cópia de prontuário pelas conselheiro, parceiro, companheiro e amigo, com
autoridades policiais (delegados) e/ou judiciárias maior ou menor predomínio de um desses papéis
(promotores e juízes), vale citar o artigo 73 do CEM que
na dependência das características de
preceitua: “É vedado ao médico revelar fato de que
tenha conhecimento em virtude do exercício de sua personalidade do paciente e do próprio médico.
profissão, salvo por motivo justo, dever legal ou
consentimento, por escrito, do paciente”.1 Portanto, na Em relação às mulheres, o princípio da Autonomia
ocorrência das duas hipóteses – justa causa e dever enfatiza o importante papel que devem adotar na
legal – o médico está liberado do segredo médico. tomada de decisões quanto aos cuidados de sua própria
Entretanto, como a revelação do sigilo profissional pode saúde. Neste ponto, os médicos deverão observar a
causar constrangimento, a solução é a nomeação de um vulnerabilidade feminina, questionando expressamente
perito médico pelo Juiz, a fim de que este manuseie sobre suas escolhas e respeitando suas opiniões, como
com maior fluência os documentos e elabore um laudo salienta, desde 1994, a Federação Internacional de
conclusivo sobre o assunto em investigação. Ademais, Ginecologia e Obstetrícia (FIGO). O marco ético emitido
deverão ser sempre resguardadas todas as informações pela FIGO tem sido divulgado por meio de seu Comitê
contidas no prontuário médico por força do sigilo para Assuntos Éticos da Reprodução Humana e Saúde
médico que alcança, além do médico, todos os seus da Mulher.
auxiliares e pessoas afins que, por dever de ofício, Tratando a paciente com o adequado respeito à sua
tenham acesso às informações confidenciais constantes condição humana, o médico conseguirá obter seu
do prontuário. consentimento para os atos propostos, ou então
4- Compreender os aspectos éticos em identificará, sem maiores dificuldades, os motivos da
ginecologia presentes no código de ética do recusa, procurando, no diálogo, alternativas para
CRM. solucionar ou aliviar o sofrimento. Deve-se, enfim,
tentar compreender as razões da rejeição, identificando
Ref: Ética em ginecologia e obstetrícia. 5ª edição /
opções que sejam aceitas e satisfaçam a atendida.
Organização de Krikor Boyaciyan. São Paulo: Conselho
Regional de Medicina do Estado de São Paulo, 2018. No caso de pacientes intelectualmente deficientes e de
crianças, o princípio da Autonomia é visto como
Princípios bioéticos (Capítulo 1) limitado, e, por isso, deve ser exercido pela família ou
responsável legal. Entretanto, motivados por questões
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religiosas, culturais e emocionais, estes não têm o No âmbito individual, no consultório ou ambulatório, o
direito de forçar os menores a receberem tratamentos médico que atende ao princípio bioético de Justiça deve
nocivos ou desproporcionalmente penosos. Isso atuar com imparcialidade, evitando ao máximo que
significa que, quando a equipe médica concluir que as aspectos sociais, culturais, religiosos, financeiros, entre
decisões de pais e responsáveis são contrárias aos outros, interfiram na relação médico-paciente. Os
melhores interesses do paciente, deve intervir ou negar- recursos devem ser equilibradamente distribuídos, com
se a adotar condutas específicas, contando, por o objetivo de alcançar com melhor eficácia o maior
exemplo, com o apoio do Serviço Social ou Comitê de número de pessoas assistidas.
Bioética Hospitalar, e, como último recurso, fazendo uso Em outro importante marco de referência ética para os
de medidas de cunho legal. É válido lembrar que, por cuidados ginecológicos e obstétricos, o Comitê para
não ser um direito moral absoluto, mesmo a autonomia Assuntos Éticos da Reprodução Humana e Saúde da
da paciente legalmente responsável ou sem deficiência
Mulher assinala: ao se oferecer cuidados de saúde à
poderá entrar em conflito com a do profissional de
saúde. Por razões éticas, é permitido ao médico alegar mulher, o princípio da Justiça requer que todas sejam
objeção de consciência para se opor aos desejos da tratadas com igual consideração, independentemente
paciente de realizar certos procedimentos, incluindo de sua situação socioeconômica.
aborto e técnicas de reprodução assistida, ainda que
haja amparo legal ou deontológico para essas ações. Ética no exercício da Ginecologia e
A autonomia do médico de recusar-se a prestar serviços
Obstetrícia (Capítulo 4) – A relação
que contrariem “os ditames de sua consciência” está
explicitada no próprio Código de Ética Médica. Como médico-paciente
exceção figuram situações de urgência e emergência, de
dano ao paciente, ou na ausência de outro colega. Pode-se dizer que a relação humana começa quando as
Por sua vez, o princípio da Beneficência refere-se à pessoas se dispõem a fazer algo em comum na busca
obrigação ética de maximizar o benefício e minimizar o pelo benefício da aplicação do saber de outra. A partir
prejuízo. A Beneficência vincula-se à obrigação moral de daí, consolida-se uma relação de confiança. Sejam quais
agir em favor dos outros, ajudando-os a promover seus forem os motivos e as necessidades, o saber, a prática, a
interesses importantes e legítimos, muitas vezes base moral e ética para o sucesso estará plantadas
prevenindo ou removendo possíveis danos. Ou seja, o nessa confiança. Assim é a relação médico-paciente.
profissional deve ter convicção e informação técnica Para que essa relação tenha fluência e manutenção
para assegurar que o ato médico será benéfico ao garantidas, a dinâmica de atendimento dos pacientes
paciente (ação de fazer o bem). deve obedecer a princípios e compromissos, conforme a
O princípio da Beneficência proíbe infligir dano Declaração de Genebra de 2002.1 O bem-estar do
deliberado, e isso é enfatizado também pelo princípio paciente, o respeito à autonomia e à aplicação da
da Não-Maleficência, que estabelece que a ação do justiça social são princípios fundamentais para o bom
termo dessa relação. Além disso, o médico deve
médico deva levar ao menor prejuízo ou agravos à
apresentar competência profissional, ser sincero com os
saúde do paciente (ação de não fazer o mal). A Não- pacientes, obedecer ao sigilo profissional
Maleficência é universalmente consagrada pelo (privacidade/confidencialidade), manter um
aforismo hipocrático “primum non nocere” (primeiro relacionamento apropriado, destinar o tempo
não prejudicar), cuja finalidade é reduzir os efeitos adequado às consultas, facilitar o acesso dos pacientes,
adversos ou indesejáveis das ações diagnósticas e atualizar continuamente seus conhecimentos, ser
transparente nos conflitos de interesse e, acima de
terapêuticas no ser humano.
tudo, ter responsabilidade profissional. São
O princípio da Justiça estabelece como condição compromissos inarredáveis para a boa prática médica.
fundamental a equidade, obrigação ética de tratar cada Tendo em vista ainda que o doente, que já está
indivíduo conforme o que é moralmente correto e fragilizado, desgastado e até desequilibrado, carrega
adequado. Nos cuidados de saúde é geralmente também o fardo do sofrimento, é essencial a presença
definido como uma forma de justiça distributiva, ou, dos princípios da afetividade e do acolhimento. Essas
como dito por Aristóteles, “dar a cada um aquilo que premissas geram sentimentos de confiança,
lhe é devido”. Essa modalidade de justiça parece profissionalismo, respeito, urbanidade e credibilidade
depender do fato de que alguns bens e serviços são nos envolvidos. Esses princípios constituem a essência
escassos, e, sendo assim, meios justos de alocar tais da vertente humanitária do atendimento médico.
recursos devem ser determinados. Fatores que podem intervir na relação médico-
paciente
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a) Local e forma de atendimento Entre os grupos vulneráveis, destaca-se o atendimento
às crianças e aos adolescentes, e a participação de seus
As atividades médicas relativas ao atendimento dos familiares está fundamentada em evidências científicas
pacientes acontecem em diferentes situações e locais,
e dispositivos legais (Estatuto da Criança e do
tais como: emergências/urgências em prontos-socorros,
atendimento eletivo em consultórios/ambulatórios e Adolescente).2 No caso das mulheres incapazes, fica
pacientes internados em enfermarias/apartamentos. determinada a necessidade de um responsável legal por
Essa assistência médica pode ocorrer nos serviços ela, que deve se relacionar com a equipe médica em
públicos, em instituições beneficentes, nos serviços favor dos interesses da paciente.
privados ou sob a tutela da medicina de grupo. Logo,
constata-se que o vínculo trabalhista do profissional e) Presença de acompanhante
médico se estabelece de forma ampla. Em cada
situação, a qualidade assistencial estará em estreita A presença de acompanhante é garantida pela Lei
dependência dos recursos técnicos disponíveis, dos Estadual nº 10.241/99 (conhecida como Lei Covas),3
recursos humanos alocados para o local de atuação do pela Lei Federal nº 11.108/054 e pela Portaria MS/GM
médico e do volume de casos a serem atendidos. É n° 2.418/05.5,6 A presença é garantida em todos os
evidente que inadequações podem intervir
procedimentos médicos, incluindo as consultas e
negativamente na qualidade da relação médico-
paciente. De acordo com cada situação de trabalho e partos. Indubitavelmente, isso gera uma tarefa adicional
sua especificidade, essa relação pode se tornar tensa, ao médico, por vezes até perniciosa para a fluência do
desgastante e repleta de riscos. seu trabalho. No entanto, cabe à paciente decidir pela
b) Avanço tecnológico presença ou não de acompanhante.
Em que pese a existência de alguns aspectos negativos, f) Atendimento aos direitos das pacientes:
o avanço tecnológico na Tocoginecologia deve ser
celebrado, já que humanitarismo e tecnologia não são • Dignidade no atendimento: as pacientes têm direito
necessariamente antagônicos. Dentre esses avanços na ao atendimento digno, solícito e respeitoso. Ela deverá
especialidade tocoginecológica, destaca-se a ser chamada pelo nome e sobrenome e jamais pela
ultrassonografia, que revolucionou a prática médica patologia que porta, pelo número do leito ou de modo
notadamente. Entretanto, na execução dos exames, é genérico, desrespeitoso ou preconceituoso;
preciso adicionar cuidados em relação a toda • Direito à autonomia: conforme visto sobre
metodologia diagnóstica – que consome muito da consentimento esclarecido (item 3.3), o respeito à
atenção médica e promove certo distanciamento do autonomia constitui o mais importante pilar da Bioética;
paciente que está sendo examinado. Esse fato é muito • Direito à informação: o direito à informação é sagrado
comum em períodos de aprimoramento médico: e essencial para que a cliente possa manifestar
quando a utilização de maquinário como método plenamente sua escolha, sem coação externa – ou seja,
auxiliar para o diagnóstico ou monitoramento de ela pode desempenhar sua autonomia nos
doenças induz o médico aprendiz não “automatizado” à procedimentos médicos;
abstração, o que pode ser um grande entrave no seu • Direito ao prontuário: conforme descrito no tópico
relacionamento com o doente. Prontuário médico (3.1), todos os pacientes têm o
c) As malformações fetais direito ao seu prontuário e podem solicitar uma cópia
dele a qualquer momento;
Em Obstetrícia, a aplicação dos métodos de diagnóstico • Direito ao respeito: de forma bastante especial, o
frequentemente ocasiona uma angústia adicional, respeito à intimidade da paciente na esfera
especialmente nos casos em que anomalias estruturais tocoginecológica é item de suma importância. Por essa
são diagnosticadas no feto, gerando muita tensão no razão, a presença de auxiliar de sala em consultórios é
casal. A relação médico-paciente pode se deteriorar imperiosa;
muito rápido – às vezes, por simples descuido do Nas demais situações, o respeito aos pacientes é parte
examinador ou do médico assistente. Nas integrante da conquista da cidadania.
malformações fetais, uma equipe multidisciplinar de • Direito à segunda opinião: em situações conflitivas ou
Medicina Fetal, detentora de conhecimentos sobre o quando há prejuízos na relação médico-paciente,
tema, deve coordenar as ações para a obtenção do recomenda-se facilitar a procura de uma segunda
melhor porvir à gestação. opinião para a paciente. Nesse sentido, o médico
d) Cuidados dos grupos vulneráveis assistente tem a obrigação de elaborar um relatório,
mesmo que sucinto – mas verdadeiro –, sobre o quadro
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da paciente até o momento em que ela esteve sob sua • Não exigir o impossível do médico, que só pode
responsabilidade; oferecer o que a Ciência e a Medicina desenvolveram.
• Direito ao sigilo: conforme o que foi explanado no Da mesma forma, jamais culpar o médico pela doença;
capítulo Segredo Médico (3.2), o sigilo deve permanecer • Respeitar a autonomia profissional e os limites de
compulsoriamente resguardado. atuação do médico. Ele não pode ser responsabilizado,
Recomendações do CRM prolatadas no Guia da por exemplo, por todas as falhas dos serviços de saúde,
Relação Médico-Paciente muitas vezes sucateado por seus gestores. Nesse
sentido, é direito do paciente denunciar e reivindicar
O que melhora a relação médico-paciente: para que o Estado cumpra sua obrigação. Existem
Por parte do médico: órgãos competentes para isso, como os Conselhos de
• Prestar um atendimento humanizado, marcado pelo Saúde e o Ministério Público, além da direção dos
bom relacionamento pessoal e pela dedicação de próprios serviços;
tempo e atenção necessários; • Não exigir dos médicos exames e medicamentos
• Saber ouvir o paciente, esclarecendo dúvidas e desnecessários, lembrando que o sucesso do
compreendendo suas expectativas, com registro tratamento está muito mais na relação de confiança
adequado de todas as informações no prontuário; que se pode estabelecer com o médico;
• Explicar detalhadamente, de forma simples e objetiva, • Seguir as prescrições médicas (recomendações,
o diagnóstico e o tratamento para que o paciente dosagens, horários etc.) e evitar a automedicação;
entenda claramente a doença, os benefícios do • Ter consciência dos seus direitos.
tratamento e também as possíveis complicações e
prognósticos;
• Após o devido esclarecimento, deixar que o paciente Referências:
escolha o tratamento sempre que existir mais de uma Ref: Semiologia Ginecológica: o atendimento da mulher
alternativa. Ao prescrever medicamentos, dar a opção na atenção primária à saúde – Renata Bittencourt,
do genérico, sempre que possível; Sheldon Botogoski e Tania Pires
• Atualizar-se constantemente por meio de participação Ref: Facchini & Barbosa, 2004; Facchini, 2004 – Dossiê
em congressos, estudo de publicações especializadas, Saúde das Mulheres Lésbicas: Promoção da equidade e
cursos, reuniões clínicas, fóruns de discussão na da integralidade.
internet etc; Ref: Rotinas em Ginecologia – Freitas
• Ter consciência dos limites da Medicina e falar a Ref: Semiologia Médica – Porto 7ed
verdade para o paciente diante da inexistência ou pouca Tratado de Semiologia Médica SWARTZ
eficácia de um tratamento; Ref: Ética em ginecologia e obstetrícia. 5ª edição /
• Estar disponível nas situações de urgência, sabendo Organização de Krikor Boyaciyan. São Paulo: Conselho
que essa disponibilidade requer administração flexível Regional de Medicina do Estado de São Paulo, 2018.
das atividades; Ref: Semiologia Médica - Rocco
• Indicar o paciente a outro médico sempre que o
tratamento exigir conhecimentos que não sejam de sua
especialidade ou capacidade, ou quando ocorrer
problemas que comprometam a relação médico-
paciente;
• Reforçar a luta das entidades representativas da
classe médica (conselhos, sindicatos e associações),
prestando informações sobre condições precárias de
trabalho e de remuneração e participando dos
movimentos e ações coletivas.
Por parte do paciente:
• Lembrar-se de que, como qualquer outro ser humano,
o médico tem virtudes e defeitos, observando que o
trabalho médico é uma atividade naturalmente
desgastante;
• Considerar cada médico principalmente por suas
qualidades, lembrando que em todas as áreas existem
bons e maus profissionais. Ter claro que o julgamento
de toda a classe médica por conta de um mau médico
não faz sentido;
Tutoria UC3 – Anamnese e Exame Ginecológico
MARIANE Físico KOLANDJIAN