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Resenha de Matrizes Do Pensamento Psicologico de Luis Claudio Mendonca Figueiredo PDF
Resenha de Matrizes Do Pensamento Psicologico de Luis Claudio Mendonca Figueiredo PDF
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CAPÍTULO I
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relação ao sensível, ao imediatamente dado. Nessa concepção, todo conhecimento é
mediado e construído. Desenvolvia-se a suspeita dirigida à experiência sensorial e numa
outra tradição, a própria razão tinha seu valor e limites investigados. David Hume reduziu
os processos mentais a fenômenos associativos apontando para a aprendizagem como sendo
origem das categorias e operações do pensamento. Hume inicia o procedimento que
desqualifica a lógica como reitora incondicional do discurso científico e a coloca como
resultado da experiência, portanto, condicionada e relativa. O que exige cautela, diante da
própria razão.
Não se encontra com facilidade, movimentos intelectuais que compartilhem
simultaneamente as suspeitas, diante das teorias e dos dados, da razão e da observação e
suspeitas generalizadas diante dos afetos e das motivações. Isto reduziria o sujeito ao
desespero e à condenação (por ilusória), de qualquer pretensão ao conhecimento objetivo.
O niilismo Nietzschiano é o que mais se aproxima deste limite. Com Peirce e Popper a
busca do fundamento absolutamente seguro do conhecimento foi substituída pela
especificação de um procedimento, de uma lógica da investigação, que diante da
impossibilidade de extirpar o subjetivismo e a arbitrariedade, no início da pesquisa, possa
promover um processo infinito de auto-correção, no qual a verdade objetiva se coloca como
idéia reguladora. A época define-se pela presença destes ataques ao sujeito empírico do
conhecimento, pelas táticas contra sua inclusão indesejada, pelo sítio armado em torno da
subjetividade.
O sujeito empírico é concebido como fator de erro, de ilusão. Constitui-se e tenta-
se colonizar um novo campo, “o da natureza interna” ou “intímo”. Este projeto carrega uma
contradição peculiar: justifica-se por se presumir que a natureza interna seja essencialmente
hostil à disciplina imposta pelo método científico e por isso deva ser neutralizada. Mas, por
outro lado, o objetivo seria submeter a natureza interna às mesmas práticas de pesquisa e
portanto de controle, que se firmaram e desenvolveram na interação com a natureza
externa. O sujeito, então é atravessado por uma sucessão de rupturas. As ciências naturais
repousam na pressuposição de uma exterioridade entre a prática da pesquisa e seu objeto, o
confronto nitidamente delimitado e rigidamente controlado entre sujeito e objeto, o que
promove a multiplicação e o refinamento dos instrumentos conceituais e teóricos de
descrição, previsão e controle. Mas, a Psicologia que nasce no bojo das tentativas de
fundamentação das novas ciências acaba por destinar-se a jamais encontrar seus próprios
fundamentos e nunca satisfazer os moldes de cientificidade que motivaram seu próprio
surgimento.
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egoista, imediatista, sem condições de autocontrole em benefício do social, tornando-se
assim o bode expiatório. Esta perspectiva instrumental da administração racionalizada
também aparece no projeto de constituição de uma psicologia como ciência do individuo e
(inúmeras vezes) contra o indivíduo. Observa-se: de um lado o indivíduo para si,
irredutível; do outro lado, o indivíduo para o outro, um suporte de papéis sociais e pré
definidos. Um, objeto de uma psicologia que não é ciência; o outro, objeto de uma ciência,
mas não chega a ser psicologia.
CONCLUSÕES
Nota-se, ao se reconstituir as condições sociais, econômicas e culturais existentes
no projeto de uma Psicologia Científica que lhe criam o espaço e definem seu significado,
oposição entre o caráter considerado pré-científico do sujeito, somado ao caráter pré-social,
ou anti-social do indivíduo privado de um lado, e do outro lado a necessidade de submeter
a subjetividade a leis, descobrindo aí regularidades que possibilitem seu controle e a
coloquem a serviço do domínio técnico da Natureza e da reprodução social. Daí, a ciência
psi, tende a constituir-se, vendo-se na obrigação de reconhecer e desconhecer seu objeto.
Ao não reconhece-lo, não se legitima como ciência independente e pode ser anexada à
outras modalidades de conhecimento. Mas ao não desconhece-lo, não se legitima como
ciência, pois não se submete aos requisitos da metodologia científica, nem resulta na
formulação de leis gerais com caráter preditivo. Abre-se um campo de conflitos que não é
acidental. Este, não parece que possa vir a ser unificado, por qualquer meio que o seja.
Antes, as divergências parecem refletir as contradições do próprio projeto que enraizam-se
por sua vez na ambigüidade da posição do sujeito e do indivíduo na cultura ocidental
contemporânea.
CAPÍTULO II
MATRIZES CIENTIFICISTAS
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mensuração definem a lógica experimental. Assim orientam-se a práticas de controle do
ambiente natural, no qual inserem-se aspectos da vida social.
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MATRIZES ROMÂNTICAS E PÓS-ROMÂNTICAS
Nelas, o que foi excluido pelas matrizes cientificistas é recolhido, no que se
denomina de vitalismo naturista: o qualitativo, o indeterminado, o espiritual, etc. Os
vitalistas, são a favor da vida e contra a razão. O sujeito, por não se reconhecer na sua
ciência, na imagem refletida pela ciência, desiste da ciência. Surge o interesse estético no
lugar do interesse tecnológico. Anulam-se as diferenças entre sujeito e objeto, entre ser e
conhecer. Esta matriz está profundamente enraizada no senso comum da prática psi e nas
representações sociais da Psicologia.
MATRIZES COMPREENSIVAS
Existem três grandes linhas compreensivas: o historicismo idiográfico, o
estruturalismo e a fenomenologia. O primeiro busca a captação da experiência como se
constitui na imediata vivência do sujeito. Propõe que se decifre e interprete as
manifestações vitais, culturais e psicológicas, ou seja, atribui às ciências do espírito uma
tarefa hermenêutica. Mas como resolver o problema da verdade? Como escolher entre
interpretações conflitantes? Uma das soluções para o problema da compreensão foi
proporcionada pelos estruturalismos.
Nestes, o trabalho de interpretação tenta modelar-se pela hipotetização, pelo
cálculo e teste de hipóteses, característica das ciências da natureza. A intenção é reconstruir
as estruturas geradoras de mensagens, as regras que controlam inconscientemente a
organização das formas simbólicas e os discursos. Mas é na fenomenologia que vamos
encontrar uma tentativa de superação, do cientificismo, ao qual os estruturalistas
sucumbem, assim como do historicismo. Os objetos, então, não são os eventos naturais,
mas os fenômenos, aquilo que à consciência aparece. Assim os eventos psi não são coisas
no mundo, mas, constitutivos do mundo.
A fenomenologia denuncia como irremediavelmente cético ao historicismo
idiográfico. O ceticismo seria uma conseqüência do relativismo radical historicista. A
fenomenologia descobre que o ser humano não tem essência alguma pré definida.
Compreender o indivíduo são ou doente, implica em reconstruir seu mundo, explicitar
horizontes que confiram sentidos a seus atos e vivências, desvelando o seu projeto
existencial. Na base de tudo encontra-se um sujeito e suas escolhas.
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PERSPECTIVAS ATUAIS
O projeto de unificação filosófica e metodológica permanece atual, mas parece
inviável. Desde Watson, até Skinner, na Psicanálise ou em Piaget, percebe-se a mesma
intenção. Diante da impossibilidade da unificação surgem projetos de partilha. Karl Jaspers
distribuiu os fenômenos psi entre uma ciência da natureza e uma ciência do espírito. S.
Koch aceita como inevitável a diversidade na Psicologia e preconiza a anexação das
diversas áreas às disciplinas mais próximas. Há quem defenda a permanência da
duplicidade epistemológica e metodológica, tal como Nuttin, para quem existe a
intencionalidade e as leis da natureza, sem que se possa excluir uma ou outra. Howaarth,
assume ótica pragmática e reúne tradição humanista e psicologia mecanicista e acaba
incorrendo num ecletismo embelezado. O ecletismo tem sido a maneira que se tem
encontrado predominantemente na comunidade profissional da Psicologia, para enfrentar as
contradições do projeto de independência científica da Psicologia. Mas assim, as
contradições ficam camufladas, travestidas de complementaridade e a própria natureza do
projeto é subtraida do campo da reflexão e da crítica.
CAPITULO III
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A ORDEM NATURAL
Copérnico, Kepler e Galileu e Descartes imbuíram nova função à matemática:
expressar as “leis da natureza”. Previsão e cálculos exatos obviamente não foram deixados
de lado. Sobretudo esta previsão é condicionada por uma abstração, que naturalmente
exclui o sensível para trabalhar apenas com o inteligível, com o puramente racional.
Haverá uma substituição: o mundo da experiência cotidiana saturado de
significados e de valores afetivos e estéticos intenções e desejos, dá lugar a um mundo em
que a pesquisa e a teorização são fins pra um universo geométrico e mecânico,
matematizável e homogêneo. Esta homogeneízação acaba com divisão do cosmos, porém
impõe-se a tarefa de oferecer descrições e explicações unitárias.
A ruptura epistemológica, que foi uma das grandes façanhas dos precursores da
física, ou seja, a superação e afastamento da experiência sensível para construção de um
objeto teórico original, construída pela razão e objeto da experiência intelectual, foi uma
lição. Apenas a este objeto se aplica de maneira exata as leis da matemática. Assim a
experiência cientifica foi se tornando cada vez mais abstrata e purificada.
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seu turno à sociedade, a imagem na qual as características da vida cotidiana, são fixas e
mostradas como fatos naturais.
Não se pode negar a cientificidade de muitas descrições e explicações da
Psicologia principalmente as mais relacionadas ao campo biológico, mas ao estender-se a
todas as formas e níveis de fenômenos psi e do comportamento o pensamento nomotético e
quantificador ao não revelar as origens sócio culturais de suas próprias possibilidades de
existência, a Psicologia cientificista acaba contribuindo para que se legitime práticas sociais
e interesses correspondentes, o que torna muito comum os produtos das matrizes
românticas, confundir os planos de análise, rejeitando junto com a ideologia cientificista,
conservadora ou progressista, a própria ciência.
CAPÍTULO IV
AS ORIGENS NA FÍSICA
A princípio, também Galileu aderiu à física do impetus, mas mediante sua
fragilidade, terminou por lançar as bases da física científica. Rompeu com Aristóteles e o
senso comum, ao conceber o movimento no vácuo, num experimento imaginário, o que o
conduziu à lei da inércia que atribui o mesmo valor e as mesmas propriedades ao repouso e
ao movimento. O movimento é dotado de autonomia e sua permanência é automática. A
aceleração e a direção são concebidas como procedentes de causas externas ao corpo que se
move, mas o movimento em si independe de força que o puxe como meta, ou causa final,
ou o empurre como ação que lhe foi impressa. Aos fatores causais de aceleração e direção
denomina-se causas eficientes: antecedem o movimento e lhe imprimem direção e
velocidade. O passado determina o presente e o presente ao futuro: é o conceito de
causalidade mecanicista. Homogeneíza-se o universo. Com a homogeneização, propiciada
pela matematização, surge a ressurreição do atomismo de Demócrito. Este concebia o real
como sendo composto de mínimas partículas, invisíveis, combinadas em diversas formas
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observáveis. Ao se postular que estes elementos seriam os realmente objetivos vai-se
desqualificar a sensibilidade e valorizar a razão como via de acesso ao real. Foi a mecânica
de Newton que sintetizou a matematização e a atomização. Engendrou-se o universo como
um grande mecanismo, um imenso relógio. Ali se condensava a idéia de movimento
automático, perfeição mecânica, determinismo estrito e quantificação. Surge uma nova,
abrangente e sistemática concepção da Natureza que se opõe radicalmente às concepções
aristotélicas. A síntese newtoniana tornou-se exemplo de cientificidade e matriz de teorias e
pesquisas em outras áreas de conhecimento.
RAIZES SOCIOCULTURAIS
A organização social e técnica do trabalho industrial ocasionaram o surgimento e
consolidação do atomicismo e do mecanicismo. Mas o simples prestígio não explica a
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importação deste modelo para a Psicologia. É necessário que práticas sociais
institucionalizadas forneçam condições para o funcionamento do sujeito se equiparar aos
processos impessoais e padronizados da natureza inanimada e às formas de movimento das
máquinas. De início, o atomicismo e o mecanicismo se manifestaram nos primórdios da
Psicologia Industrial. Muitos psicólogos experimentalistas viram como possível e desejável
contribuir para adaptar o homem à máquina e à linha de montagem. A vivência da prática
mecanizada através do trabalho, nas condições que surgiram a partir de Taylor, Fayol e
Ford, faz com que o movimento assuma o lugar da conduta. Esta vivência junto com a
desvalorização da consciência, como fator causal, prepara o terreno para explicações
mecanicistas em Psicologia.
Este terreno, não fica nunca aplainado totalmente. Tem havido forte resistência ao
mecanicismo, gerada por vezes dentro dos próprios quadros das ciências naturais com o
funcionalismo, outras vezes geradas nos quadros das ciências humanas e da filosofia,
correspondentes à própria resistência engendrada nas práticas sociais.
CAPITULO V
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OS REFLEXOS DO FUNCIONALISMO NA PSICOLOGIA
Tanto no plano ontológico quanto no plano metodológico manifesta-se a presença
da matriz funcionalista e organicista na Psicologia. Toda Psicologia que se pretende uma
ciência natural adota modelo funcionalista instrumentalista dos fenômenos mentais e
comportamentais. Percepção, memória, pensamento, afetividade, motivação, aprendizagem,
são compreendidos como processos adaptativos o que aponta para uma intencionalidade,
consciente ou puramente objetiva, manifesta ou encoberta. Por sua própria amplidão no
campo da Psicologia ocorre uma enorme variedade ou diversificação do legado
funcionalista, organicista. O panorama torna-se confuso, graças às influências cruzadas do
funcionalismo, com vestígios do mecanicismo e do atomismo, como por exemplo, na
Psicologia da aprendizagem norte americana, na qual a dimensão estrutural, embora não
eliminada, permanece dissimulada, em segundo plano. Assim, é preciso analisar autor por
autor, para se descrever com alguma fidelidade, a versão de Psicologia funcional que cada
qual elabora.
A PSICOLOGIA COMPARATIVA
Estudar o comportamento animal para conhecer o desenvolvimento da vida
mental na escala filogenética e buscar a origem da inteligência humana foi iniciado por
Darwin, continuado por Romanes, Morgan, Thorndike, Jennings, dentre outros. O pano de
fundo deste projeto de Psicologia comparativa é a hipótese da continuidade evolutiva de
Darwin.
OS BEHAVIORISMOS
A partir do início do século XX organizou-se nos EUA um movimento
behaviorista representando uma conjunta influência de várias tradições filosóficas e
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científicas. Os positivismos, o pragmatismo, aparecem claramente no pensamento de Mach.
Com o behaviorismo de Watson, os primeiros atacados foram a introspecção e a vida
interior. Mas há em Watson, tanto o ideário funcionalista quanto algo do ponto de vista
atomicista e mecanicista. Em Watson o funcionalismo é compreensivo mas nada
explicativo. O mecanicismo prevalece em termos de explicação e assim ele rejeita a lei do
efeito de Thorndike, vendo nela vestígios de mentalismo, pois a mesma sugere
intencionalidade, o que o positivismo não poderia admitir.
Watson procurou na fisiologia do reflexo respaldo científico que o legitimasse. A
reflexologia e a teoria do condicionamento reflexo são a promessa de uma Psicologia
fundamentada em eventos observáveis e submetido a leis objetivas. De maneira ainda mais
acentuada o elementarismo e o mecanicismo está no behaviorismo de Guthrie. Hull e
Spence destacaram-se na evolução do behaviorismo rumo a uma purificação metodológica,
com base numa opção funcionalista.
CAPITULO VI
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FUNCIONALISMO NA PSICOGENÉTICA DE PIAGET
A formação biológica e a preocupação epistemológica conduziram Piaget à
Psicologia. Com seu trabalho quis buscar uma forma de integrar numa teoria científica do
conhecimento as duas áreas, biologia e psicologia, integrando os fenômenos cognitivos ao
contexto de adaptação do organismo ao meio. Encontra-se em Piaget uma obra das mais
completas, consistentes e articuladas, enquanto um representante do funcionalismo
organicista em Psicologia. Em Piaget dissolvem-se os limites entre filosofia, biologia e
Psicologia, mas os métodos e conceitos da biologia é que dominarão, ao longo de sua
carreira. Baldwin, Janet, Claparede, foram precursores de Piaget na Psicologia. Nas
primeiras obras de Piaget há indícios da influência de Freud. Em consonância com o
funcionalismo pragmatista norte americano, Piaget vê na ação concreta, motora, a origem
dos níveis superiores de adaptação. A ação é coordenada, decorrente da estrutura orgânica
do sujeito e dotada de lógica. Piaget focou o estudo das estruturas cognitivas, mas
acreditava, sendo funcionalista, na indissociabilidade dos fenômenos mentais e
comportamentais. Para Piaget, o desenvolvimento cognitivo, ocorre em paralelo com o
desenvolvimento das formas de afetividade e com as formas de existência social.
Evidenciam-se na obra de Piaget os pontos de vista da fisiologia da autoregulação e da
embriologia. Ele assumiu uma posição que o distingue bastante de outros autores no que
toca à evolução.
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FUNCIONALISMO NA PSICOSSOCIOLOGIA
Na psicossociologia a matriz funcionalista organicista associa-se às obras de
Durkhein, Malinowski, Radcliffe-Brown, Parson, Merton, etc. O modelo funcionalista de
sociedade é estruturado em torno das noções de função e complementaridade. A sociedade
é vista como um organismo. Cada parte desempenha função complementar às demais e essa
complementaridade é essencial ao funcionamento da vida social.
Na psicologia social existe a teoria dos papéis e o manual de Lindsey e Aronson,
condensa as principais lições em termos psicológicos, da sociologia funcionalista. Um dos
grandes nomes do funcionalismo foi Mead que se tornou, no entanto, mais conhecido na
sociologia que na psicologia.
Embora a psicossociologia funcionalista tome a sociedade como sendo
essencialmente harmoniosa, não desconhece a existência de conflitos. Em forma de crises,
sendo que o tema das disfunções sociais, remete à idéia de patologias. Então, de certa
forma, absolve-se o sujeito, na crítica sociologizante, por seus maus comportamentos. O
problema está na sociedade e não no indivíduo.
Hoje o senso comum encontra-se impregnado de modelo funcionalista de
sociedade. Além das divergências teóricas o senso comum aproxima as escolas psicológicas
divergentes e com facilidade maior as inspiradas na matriz funcionalista organicista. Na
questão genética, onde a matriz funcionalista tem um de seus focos, surgem questões que
irão separar em suas respostas, ambientalistas e nativistas na Psicologia.
CAPITULO VII
O AMBIENTALISMO PSICOLÓGICO
Surge no século XIX a “inspiração ambientalista nos estudos da experiência
sensorial”, tais como, por exemplo, os estudos de Helmholtz (1821-1894) em psicofísica e
psicofisiologia. Para este autor a percepção dos objetos é aprendida; insere-se, portanto no
que leva ao empirismo epistemológico de Berkeley” século XVIII”. HELMHOLTZ afirma
que as qualidades da sensação devem ser consideradas como sensação pura e real mas a
maioria das percepções do espaço é produto de experiência e treinamento. Habito e
memória embora produzidos através de processos inconscientes e automáticos, conferem às
sensações puras uma estrutura não atribuível, apenas ao fenômeno sensorial. Lidar com
objetos sobre diversos pontos de vista ensina o sujeito a percebê-los como único objeto
apesar das diferenças de foco. A conclusão inconsciente (termo de Helmholtz) possibilita
compensar as deformações impostas pelas diversas perspectivas obtendo-se uma constância
de forma. As variações propiciadas pelas mudanças de iluminação acarretam conseqüências
na percepção das cores que são compensadas pela aprendizagem obtendo-se constância na
percepção da cor. O caráter inconsciente dos efeitos da aprendizagem faz com que se
tornem bastante difícil perceber isoladamente o papel do presente, do passado e de
experiências. A aprendizagem perceptiva também se revela na seleção de elementos
sensoriais importantes na composição da imagem com que se percebe um objeto. O critério
de conveniência existe e comanda esta seleção, ou seja, o critério da adaptação. Não
observamos exatamente nossas sensações senão quando úteis no reconhecimento de objetos
externos. Antes, pelo contrário, deixamos de lado as sensações sem importância para os
objetos.
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A aprendizagem nas obras de “Ebdinghaus” e “Thorndike” já não era, ao fim do
século XIX, um recurso meramente interpretativo, na explicação, quer filosófica quer
fisiológica, dos fenômenos. No auge do movimento behaviorista (século XX), recebeu a
psicologia da aprendizagem um intensivo tratamento, o maior já acontecido em relação a
um tema de psicologia cientifica. Watson posicionou-se equilibradamente, de início, entre
empirismo e nativismo, no entanto se inclinou mais e mais para uma opção ambientalista
radical. O que refletiu um movimento amplo na psicologia americana. Assim o conceito de
instinto sofreu crítica severa, tanto por questões empíricas, quanto por questões
metodológicas. Além disto, a opção ambientalista, mostrou-se manifestação de posturas
ideológicas e políticas.
Houve retraimento da importância atribuída ao organismo e negação do caráter
ativo do sujeito do comportamento. Enfatizar o controle ambiental faz com que se atenue a
imagem funcionalista de autoregulaçao: resulta o sujeito reagente sem espontaneidade e
direção própria. O ambientalismo radicalizado criou condições para combinação de
funcionalismo e mecanicismo, característicos de grande parte da psicologia norte-
americana, mas enfatizar o controle ambiental não conduz necessariamente a estes
compromissos, aja vista a obra de Skinner.
O ambientalismo/empirismo é nítido, explicitamente, em Skinner, podendo ser
inferido do seu discurso ou de sua prática de pesquisa. Ocorre uma suposição: os motivos
primários da ação são em numero bastante reduzido. Skinner afirma: a maior parte dos
reforços são condicionados, cultural e historicamente determinados, na espécie humana. As
condutas adaptativas são reforçadas. A prática de pesquisa de Skinner, baseia-se
principalmente nos conceitos de estímulos e respostas representativas. Skinner quer
elaborar leis empíricas que possam descrever a dinâmica do comportamento, em termos de
Sd -R - Sr supondo implicitamente que estas seriam leis gerais e sua aplicação à casos
particulares dependeria de ajustes de parâmetros. Qualquer estímulo poderia mostrar-se
estímulo discriminativo pra qualquer resposta; qualquer reforço poderia exercer efeitos
sobre qualquer resposta antecedente: é a eqüipotencialidade de estímulos e respostas. Isto
baseia todo o projeto científico de Skinner, no qual há uma critica à “botanização” da
psicologia, ou à sua redução, a uma pura descrição de comportamentos particulares e
situações, o que conduz a que se suponha que a experiência e as contingências ambientais,
são os determinantes únicos do comportamento. O comportamento tem uma estrutura que
não reflete a estrutura do organismo, mas a estrutura das relações do organismo com o
meio. A conduta adaptativa em sua estruturação de classes funcionais de respostas
operantes emergiria completamente da historia do individuo; então a tendência é
desconhecer que existam classes estruturais que precedem e interferem com as formações
das classes funcionais.
Admite-se as classes estruturais, mas no campo das respostas reflexas apenas,
negando-se que condutas adaptativas complexas e de caráter instrumental, possam estar
submetidas a uma estruturação biológica e hereditária. Supervaloriza-se a plasticidade do
comportamento considerando-se que tudo pode ser aprendido. Também se supervaloriza a
aleatoriedade da variabilidade comportamental, sobre a qual se aplica a seletividade da
conseqüência do reforço; minimiza-se, ou nega-se efeitos de estados motivacionais e de
estímulos ambientais, na indução de comportamentos específicos e assim restringe-se a
faixa de variabilidade sujeita à seleção.
Skinner, nunca abandonou a imagem do organismo ativo, emitindo respostas,
atuando sobre e modificando seu ambiente. Sua originalidade explicita-se na simultânea
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lealdade ao funcionalismo e ao radical ambientalismo, então, se designa como sendo não
mecanicista, apesar de ambientalista, nem cognitivista, apesar de funcionalista, pois realça
a intencionalidade da conduta.
O NATIVISMO PSICOLÓGICO
As tradições racionalistas e nativistas revelaram-se na psicofisiologia de Müller
(1801-1858). Muller postulou energias específicas dos “nervos” que pela estimulação
externa ou interna dariam aos fenômenos sensoriais suas qualidades. Uma pancada, no
ouvido produz um som, no olho uma luminosidade, noutra parte do corpo, mera sensação
táctil. Muller naturalizou o apriorismo transcendental de Kant convertendo num apriorismo
fisiológico, pois afirmou a especificidade de cada via sensorial. Na psicofisiologia
contemporânea, Maturana, com os seus trabalhos acerca da estrutura da experiência visual
da rã (função da estrutura do olho deste animal), inseriu-se na tradição de Müller e também
de Von Uexküll, para quem o ambiente de cada espécie, não é o que as ciências da física e
da química descrevem, mas um conjunto articulado de estímulos com valor e significado
para o animal.
Foi com Lorenz que o conceito de instinto retornou, mas livre do mentalismo.
Lorenz mostra segurança quanto a uma diferenciação entre comportamentos sujeitos a
aprendizagem e comportamentos inatos. No homem o inato se retrai, mas não é eliminado.
Recentemente, Chomsky e seus seguidores manifestaram-se pelo nativismo; situam-se na
tradição da lingüística racionalista cartesiana e do pensamento romântico organicista.
Segundo Chomsky o fenômeno lingüístico essencial é o aspecto criativo do uso da
linguagem: “a fala não está determinada pela associação fixa de palavras à estímulos
externos ou à estados fisiológicos” . O pensamento de Chomsky representa o estruturalismo
e não se insere na tradição funcionalista.
OS INTERACIONISMOS
As respostas ambientalistas e nativistas nunca são encontradas na forma pura e
exclusiva, pois isto destruiria a característica principal dos fenômenos vitais: os elementos
estruturais no organismo e no ambiente são coordenados uns com os outros. Assim, o
organismo adapta-se ao ambiente, e o ambiente, inclusive o interno ambiente, ao organismo
se adapta: eis o que mantém a vida.
A estrutura orgânica é inseparável da estrutura ambiental, não existem
isoladamente e suas existências expressam mútua coordenação. Na Psicologia como ciência
natural, veda-se a possibilidade de uma exclusiva opção, seja pelo controle ambiental, seja
pelo controle organísmico. Organismo e ambiente definem-se em termos de
interdependência. É natural, portanto, existir uma terceira força entre o ambientalismo e o
nativismo, buscando uma síntese que apreenda o organismo e o ambiente como integrantes
de uma totalidade que se auto-sutenta.
Baldwin, Loyd Morgan e Poulton, assim como Waddington e Piaget, associaram-
se à ênfase nas interações reciprocamente determinantes, entre organismo e ambiente e
entre a história da espécie e do indivíduo. A história do individuo, implicando na
supervalorização da aprendizagem e da experimentação, num determinado ambiente e a
ênfase na história da espécie, implicando na sobrevalorização do organismo, na
determinação do curso em que se desenvolve e na qualidade de suas experiências e de suas
reações.
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Em Freud encontra-se outro exemplo, da adesão ao interacionismo, porém nem
tão explícitos, embora bastante ambíguo. No trabalho de Freud, surge como tendo um
caráter essencial, o conflito. Natureza e ambiente, de modo especial o ambiente social
encontram-se indissoluvelmente associados e integram como pólos um antagonismo. O
indivíduo se desenvolve refletindo o conflito que há entre o natural (instinto) e o que o
ambiente físico e social lhe oferece, possibilidades que são restritivas. Os resultados dos
conflitos tornam a personalidade simultaneamente natural e social; desaparece a separação
entre influências biológicas e influências sociais. O indivíduo não existe dissociado do
ambiente, em nenhum espaço e temporalidade. O indivíduo, se constitui exatamente no
processo, entre natureza e sociedade.
Além de Piaget e Freud que assumiram o interacionismo, autores de áreas mais
marcadas pelos extremos, ambientalismo e nativismo, aproximaram-se da terceira posição.
A dicotomização do comportamento inato e aprendido foi atacada por D. Hebb e F.ª Beach
que mostraram ser todo comportamento, dependente, tanto de hereditariedade como de
experimentação. Beach nega a utilidade do conceito de instinto, enquanto definido como ‘o
que não é aprendido’. Inato, enquanto conceito, deve-se evitar, no contexto dos estudos da
ontogênese, quando passa a designar uma fixidez de desenvolvimento, oposta a plasticidade
comportamental.
Skinner também aderiu ao interacionismo. O ponto de vista interacionista sempre
se manteve vivo e atuante e hoje ele tende a tornar-se o ponto de vista dominante, além do
ambientalismo e do nativismo. Estas posições extremadas, no entanto, ainda permanecem e
procurar entender o contexto cultural que a tempos vem lhes garantindo a dominância e
assegurando sua sobrevivência, ainda hoje, pode ser útil.
Skinner admite a determinação genética da aprendizagem e a existência de
padrões instintivos, modelados, contudo, pelas contingências naturais que determinaram a
evolução da espécie.
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E aqui surge a possibilidade de olharmos as alternativas que se oferecem, no que se
denominou “matrizes românticas e pós-românticas” (Figueiredo).
CAPITULO VIII
O BERGSONISMO: UM EXEMPLO
A obra de Bergson é representativa de algumas orientações intelectuais e afetivas,
bem específicas, presentes nessas linhas e em especial em algumas formulações ecléticas e
do senso comum. É como introspeccionista que Bérgson inicia sua reflexão filosófica e se
mantém sempre atento às informações, impressões e sentimentos que lhe chegam por essa
via que ele considera privilegiada. Justifica-se, com um ponto de vista cartesiano,
afirmando ser a existência a respeito da qual se tem segurança e que se conhece melhor, a
existência pessoal. Em seus primeiros trabalhos versou sobre dados da consciência e sobre
memória.
Em Bérgson, instaura-se a mística da fluidez e da indeterminação, com pretensão
de representar uma posição metacientífica. Bérgson não nega a importância da ciência
natural em relação matéria orgânica, mas estabelece uma interdição, quanto ao estudo
naturalista dos fenômenos vitais, em particular com relação à Psicologia. A ciência, produto
do intelecto, nada entende da vida. A Psicologia Científica é um contra senso. A promessa
de previsão e controle é uma farsa. O que esperar de uma Psicologia que renuncia ao status
de ciência, se apresenta como metafísica, denuncia a lógica e o conceito, recusa as
faculdades intelectuais e coloca as próprias colocações em perigo? Bergson se vale da
experiência estética e tenta justificar a viabilidade da apreensão intuitiva dos fenômenos
vitais.
A psicologia metafísica não é um corpo de doutrinas e menos ainda um arsenal de
técnicas e instrumentos. Sob este ponto de vista a psicologia metafísica é uma arte delicada
e sutil da qual a própria idéia de utilidade deve ser afastada pra que não se caia na
perversão. Mas, embora não tenha utilidade, no entanto, tem um interesse: promover
comunhão entre o indivíduo e o fluxo vital, do qual faz parte e que o constitui. Este é o
interesse que permeia a obra de Bérgson e o leva ao exagero de estetização nas idéias e no
estilo. Sem os ornamentos do estilo o trabalho de Bergson pode ser percebida, como
incoerente, pobre, inócua, baboseiras. Sua obra antecipa várias correntes da Psicologia
contemporânea que sequer o mencionam como precursor.
O HUMANISMO ROMÂNTICO
A institucionalização da profissão de psicólogo não é compatível com a noção de
Bergson de Psicologia, pois esta supõe uma prática mais para os grandes inspirados:
artistas, santos, heróis. Uma boa parte das seitas psi que existem nas grandes metrópoles
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culturais e são importadas para o Brasil, são marcadas por essas idéias de psicólogo guru.
Essa perspectiva é forte nos humanistas. Cura, reeducação, solução de problemas, são
substituídos pela esperança na fruição do sujeito por ele mesmo em termos estéticos,
entregando-se à corrente da vida, impetuosa e criativa. Um barato. O objetivo da terapia,
seria libertar a energia vital. Para tanto, deve-se abolir as restrições sociais. A uniformidade
do modelado pelo social deve ser substituída pela diversidade do autêntico, do individual.
Em Bérgson, o misticismo da criação e da indeterminação, associa-se ao
intuicionismo e à desvalorização da lógica e do conceito; o autêntico é o pré simbólico,
aquilo que não se pode comunicar, a experiência pessoal e intransferível. A linguagem deve
permanecer na berlinda e intervenções não verbais ou antiverbais ganham simpatia. No
corpo e pelo corpo, no gesto pelo gesto; nos movimentos vicerais, os motivos autênticos e
sentimentos genuínos.
O IRRACIONALISMO CONFORMISTA
Entre os filósofos modernos, o intuicionismo irracionalista e o vitalismo não são
exclusividade de Bérgson. O discurso do anti-racionalismo psicológico pode ser visto nele.
Divulga-se uma visão otimista e positiva da condição humana. A energia vital não
depende, para ser liberada, de nenhuma condição de vida concreta. Basta uma nova atitude,
a ser obtida por meio da terapia. O retorno ao subjetivo via intuição, com vistas a uma
pretensa liberação das forças vitais, que jazem amortecidas, é de tal forma banalizado e ao
senso comum da prática psi incorporado, preenchendo um vácuo teórico e outorgando certa
consistência à prática profissional, entre ecléticos, que surge uma tentativa de analisá-lo,
em sua dimensão ideológica.
Supõe-se no bergsonismo e em outras versões do humanismo, assim como na
gestáltica, em outras terapias corporais, na bioenergética, etc., que a realidade psi tenha
uma existência pré-simbólica e anti-simbólica. Mas não se cogita que a libertação desses
conteúdos vitais possa comprometer a vida socialmente falando-se. O subjetivismo de
Bérgson é anêmico, sem capacidade de resistência efetiva, contra a massificação, a
estereotipia, a repressão, sendo que o próprio irracionalismo bergsoniano não compromete
ninguém, com uma crítica radical da racionalidade estreita, reduzida à pura
instrumentalidade, pois é muito bem comportado.
O funcionalismo, parece representar, principalmente em suas versões mais
interacionistas que superam a visão de ambiente e organismo independentes, o velho
liberalismo burguês em sua forma viril e progressista; o vitalismo naturista, parece que
corresponde à forma feminina e magoada do liberalismo. O vitalismo reduz-se a uma
ideologia sem valor cognitivo. Inverte os valores dos termos em oposição, ordem e
história, razão e vida. Renega a racionalidade e o impulso crítico. No plano do
conhecimento nenhuma ambição rigorosa, mas delicada intuição dos sentimentos da
subjetividade, enfim. A nenhuma das outras matrizes cabe tão bem o conceito de romântica.
CAPITULO IX
20
DESDOBRAMENTOS E DIFERENCIAÇÕES DO ILUMINISMO
Iluminismo, na obra de Adorno e Horkheimer, designa uma tradição cultural que é
crítica e combate as tradições. Tem por objetivo libertar o sujeito para o desempenho sem
entraves, de seu poderio técnico-manipulatório, sobre a Natureza, submetendo-a a sua
próprias finalidades. A crítica deve ser livre, racional e soberana. Espera-se da crítica o
desbloqueio, ou a quebra de todos os bloqueios que limitam o homem em seu progresso de
um domínio teórico e prático. Neste processo impiedoso, o iluminismo separa
constantemente o sujeito (do poder e do conhecimento), do objeto. Na Idade Moderna, o
iluminismo traz a exaltação do sujeito como senhor do Universo. Mas, como pré-condição
para o exercício do poder, também exalta o objeto.
A oposição ao cientificismo objetivista no pensamento psicológico decorreu, ou da
metafísica bergsoniana, ou de uma posição crítica mais radical ao Iluminismo: o
romantismo. Mas, a vertente subjetivista do Iluminismo, foi incorporada, às tradições do
pensamento psicológico, no contexto da problemática romântica e assumindo muitas de
suas proposstas.
CARACTERIZAÇÃO DO ROMANTISMO
O romantismo opõe-se ao Iluminismo. Na segunda metade do século XVIII a
dominância do Iluminismo era incontestável. Então, dominava a matriz atomicista e
mecanicista. Goethe identificava-se com o Iluminismo, porém não aceitava suas limitações.
Desenvolveu então uma nova forma de ciência que exerceu mais tarde, considerável
influência na formação do ideário romântico. Empenhou-se Goethe na constituição de uma
ciência anti-newtoniana. Os românticos herdaram da obra científico-poética de Goethe
vários aspectos que em nada influíram nos rumos das ciências naturais do século XIX. Em
contrapartida, encontraram-se no cerne de muitas das ciências morais ou humanas e
também das reflexões estéticas e metafísicas.
É preciso que se saiba que existem distinções entre o romantismo alemão, o
funcionalismo e o intuicionismo de Bergson, com os quais o romantismo aparenta alguma
semelhança. Também os românticos renegam o indivíduo independente, racional, crítico,
em favor da coletividade, porém, com a pressuposição e com a promoção da comunicação
entre particulares e não sua aniquilação.
O ROMANTISMO E AS HUMANIDADES
O romantismo não proporcionou nenhuma solução metodológica às ciências
naturais, mas inspirou uma série de ciências morais. As humanidades tem fenômenos
espirituais e culturais como objetos, nos quais o pesquisador se reconhece de alguma forma.
Não faz sentido buscar a neutralização do sujeito em nome de uma objetividade absoluta.
As ciências morais, ao invés de repousar sobre e acentuar a separação entre sujeito e objeto,
supõe e promove a aproximação entre eles.
21
positivismo nos trabalhos acerca das ciências naturais podem ser encontradas pelo leitor
moderno. Trata-se de uma reflexão critica que define a natureza do sujeito e do objeto e as
relações entre estes, numa concepção peculiar desta forma de conhecimento. O trabalho de
Dilthey posiciona-se no campo da ontologia e da epistemologia e não no campo da
metodologia. Dilthey retoma uma distinção já insinuante no espírito do tempo: a diferença
radical entre as ciências naturais e históricas. Isto marca o repúdio do romantismo e do
cientificismo iluminista que procuravam cada um ao seu modo, englobar as práticas
cientificas num mesmo construto epistemológico.
Durante o século XIX as ciências naturais não se deixaram influenciar
profundamente pelo romantismo e além disto, geraram novas produções metodológicas na
tradição iluminista que superaram as limitações de sua própria versão mecanicista, com a
biologia funcionalista e com os avanços na física e na química, corroendo o universo de
Newton. No entanto, o romantismo sobrevivera e se consolidara nas ciências morais.
Dilthey definiu as ciências naturais como sendo explicativas, pois seu procedimento é na
elaboração de leis gerais, com a explicação de acontecimentos particulares subsumidos
nestas leis. Já, as ciências morais e históricas são ciências do espírito e sua meta não é a
explicação, mas a compreensão de seus objetos. Compreender é elucidar a experiência
vivida, manifesta por meio dos atos comunicativos. Os atos comunicativos sempre são atos
de um indivíduo, histórica e culturalmente datados que se articulam ao conjunto da
biografia individual que se integra ao sistema total das formas culturais. Somente nesta
articulação com um conjunto, do individuo e da sociedade, o ato adquire sentido e pode ser
compreendido, como momento e expressão de uma totalidade histórica e biográfica.
Mas se o limite do psicologismo é o irracionalismo, já o limite do historicismo é o
ceticismo e o conjunto de regras interpretativas, caso elaborado, resolvendo a contradição
entre a universalidade e a singularidade, não seria um produto histórico? Assim solapam-se
as bases da ciência do espírito: a interpretação já não pode visar as verdades das mensagens
INTERPRETAÇÃO E VERDADE
Em vários arraiais psicológicos a preocupação com a verdade não é acentuada.
Variantes do discurso Diltheyano, na psicologia clinica, aparecem com freqüência. Os
humanistas, por exemplo, usam e abusam desta terminologia: compreensão significado, etc.
Assim, operam na redução destes conceitos ao nível do vitalismo pré-crítico, ou, de
bergsom. Em que condições poderemos expressar sobre a compreensão verdadeiras? O
núcleo da compreensão, encontra-se na valoração do espírito.
CAPÍTULO X
A PROBLEMÁTICA ESTRUTURALISTA
A noção de organismo, central na matriz funcionalista, também aparece no ideário
romântico, sendo que ela, traz consigo, em ambos os casos, o enfoque anti-elementarista,
globalizante, sistemático. Na biologia, no entanto, a noção de organismo liga-se à noção de
complementaridade. As partes do todo, adquirem significado funcional, ajustando-se umas
às outras, complementando-se com harmonia na promoção da interação adaptativa do
organismo ao meio externo a este, mantendo o meio interno dentro da faixa de variação que
seja compatível com a conservarão da vida. O disfuncional, o patológico é puramente
22
negativo; é o acidental que se opõe ao essencial; é a desintegração contra-posta à
cooperação orgânica entre os componentes do todo
No romantismo as noções de organismo, totalidade, ou forma, supõe
interdependência mas não complementaridade e não excluem o conflito. No campo das
ciências naturais, o romantismo nunca exerceu grande influência, mas, no campo das
ciências morais, não apenas influenciou, mas, também frutificou e passou sérias
transformações que dizem respeito fundamentalmente à atividade crítica autoreflexiva que
oferece às ciências morais, um terreno seguro, epistemologicamente falando-se. A
neutralização do sujeito caracteriza o ideal cientifico dos estruturalismos, colocando-os
como uma espécie de positivismo das ciências humanas e tal índole cientificista levam as
ciências humanas estruturalistas para bem próximo das ciências naturais, distinguindo-se no
entanto pela persistência em considerar as noções de significado, de sistemas simbólicos,
como definidoras de seus objetos específicos. Os estruturalismos, julgam superar a
oposição entre compreender e explicar: compreende-se uma determinada mensagem,
quando se aplica à mesma, de modo mais ou menos automático, mais ou menos,
exploratório, mais ou menos consciente, a gramática que a gerou, ou se é capaz de
reproduzi-la.
23
não deixa transparecer uma idéia ou conteúdo; ela é o conteúdo em sua manifestação
sensível, a única em que pode este conteúdo subsistir. Importa na análise da forma detectar
princípios de organização, técnicas construtivas. A matriz é Urphänomen (Goethe) dos
contos fantásticos, como a Urplanze o era dos vegetais, contudo um objeto construído e não
um objeto da imediata experiência, alvo da intuição concreta.
24
mitologia, os rituais, as religiões e a arte. Em Levi Strauss, a antropologia se pretende
ciência semiológica, situando-se resolutamente no nível da significação. Na antropologia
estruturalista uma nova imagem de homem surge que é a de um ser simbólico e
simbolizante, sempre imerso num mundo de significados incessantemente estruturando seu
universo em um sistema significativo.
Na Psicologia vinculam-se a desdobramentos da psicologia da forma, repercussões
do estruturalismo, em particular na influência exercida por Kurt Lewin. F.Heider com sua
teoria das relações interpessoais que se baseia numa dinâmica orientada pelo
balanceamento, está na trilha de Lewin. Há uma tendência à congruência, ao equilíbrio, a
boa forma, no campo das interações pessoais. Além de Heider, também há Festinger com
sua teoria racionalista da motivação que atribui tendência ao sujeito para buscar
compatibilidades em suas representações atitudes e sentimentos. São questões
extremamente atuais no contexto de consideração das alternativas teóricas e metodológicas
da psicologia contemporânea.
CAPÍTULO XI
25
rigorosamente cientificas. Os estruturalismos concebem o rigor em termos metodológicos,
prioritariamente. Assim sendo exigem empenho máximo na formalização dos conceitos das
hipóteses dos procedimentos analíticos. A fenomenologia, no entanto, preocupa-se
essencialmente com o rigor epistemológico e promove a radicalização do projeto de análise
critica, dos fundamentos e das condições de possibilidade do conhecimento.
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foco adquire significado para o sujeito. A experiência pré-reflexiva está sempre adiante da
reflexão e assim a compreensão da vivência é tarefa essencialmente inacabada.
AS DOUTRINAS EXISTENCIALISTAS
Sobre a psicologia, a fenomenologia influiu como ciência compreensiva e foi em
grande parte mediada pelas doutrinas existencialistas. O método fenomenológico, ao ser
sistematizado, despertou no inicio do século vinte, em muitos a esperança de que se
proporcionasse a descrição da existência concreta, um rigor ainda não alcançado. É
necessária, contudo uma distinção entre, por exemplo, K. Jaspers, Heidegger e Sartre.
A PSICOPATOLOGIA DE K.JASPERS
K.Jaspers foi não apenas a figura de maior destaque de uma das correntes
existencialistas, mas um pioneiro das ciências compreensivas: psicopatologia e psiquiatria.
“O existir não é objetividade”. Em Jaspers temos mais um filosofar existencialista, que uma
filosofia dogmática existencialista. Este filosofar relaciona-se duplamente com as ciências.
As relações entre ciências do homem e filosofias existencialistas, diferem daquelas em que
se baseiam as ontologias de Heidegger e Sartre, duramente criticadas por Jaspers.
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processo essencialmente incompleto de totalização e não uma totalidade acabada e
determinada. Diz Cooper que se deve compreender o que o sujeito faz com o que lhe é feito
e o que ele faz do que ele é feito.
Para Laing e Cooper, a gênese da esquizofrenia e a solução terapêutica desta, e a
própria caracterização deste quadro clínico, remetem ao sistema de interações sociais, que
no conjunto da sociedade e de forma crítica, no seio da família, configuram o projeto de
loucura. O pessimismo existencialista é bastante atenuado, no momento em que a
antipsiquiatria se propõe como terapêutica existencial, o que a aproxima da psiquiatria
alternativa norte-americana. que se inspira na psicossociologia funcionalista, e com o mito
da comunidade desalienada, do pensamento político romântico.
CAPITULO XII
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A SUPERAÇÃO E A DURAÇÃO DA DIVERSIDADE
Constitui-se o sujeito individual num contexto histórico e determinado
culturalmente: fora deste processo ele simplesmente não teria qualquer existência.
É necessário sublinhar o caráter histórico das relações entre o cientista e o seu
objeto.
“O que a ciência nos oferece é um quadro da natureza, isto é, uma relação
ordenada do homem e da matéria” (Serge Moscovici).
O conhecimento cientifico não seria apenas conhecimento de um objeto que se
transforma efetuado por um sujeito que também se transforma, mas fundamentalmente, um
conhecimento das formas históricas das relações práticas que a humanidade instaura com a
matéria criando e recriando assim as ordens naturais.
As diferentes matrizes se refletem e expressam formas diferentes de relações
humanas, a opção individual entre as correntes psi é uma questão ética , não cientifica, mas
sem ser absolutamente uma questão para qual só existem soluções irracionais e arbitrarias.
Um dos mecanismos de defesa contra a incerteza é o dogmatismo, não se deve esquecer
disto, pois, não é atôa que lado a lado ecletismo pragmático agnóstico e dogmatismo
acrítico irracionalista lado a lado campeι am na psicologia.
COMENTÁRIO:
A Psicologia em todas as suas facetas e nuances mostra-se multifacetada
pluripresente e multiatuante na sociedade hoje. Apesar da complexidade, ou antes, graças a
Ela pode-se perceber nas diversas tendências e linhas da Psicologia algo relacionado, algo
que parece comum: quer seja no discurso nomotético e quantificador quanto na gestalt
assim como no lado romântico da Psicologia, quanto ao sujeito (ou o que quer que lhe
chamem, quer seja organismo, etc.), sempre portar de uma forma ou de outra , sua
singularidade. Se organismo, contingência, se gestalt, parte do todo, se procedente de
vitalismo uma outra instância...
É interessante observar no entanto, um fato curioso: dentro do curso de Psicologia,
se a singularidade aparece, às vezes, tem que ser massacrada? Tem-se, obrigatoriamente
que fazer parte do bando? É o tudo e o nada do 4º Reich?
FIM?
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