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As demências são mais prevalentes na população idosa e, apesar de causas reversíveis serem descritas, em sua maioria

são  processos  neurodegenerativos  progressivos  e  irreversíveis,  de  consequências  desastrosas  para  indivíduo,  familiares  e
sociedade.  As  diferentes  etiologias  terão  início,  evolução  clínica  e  marcadores  biológicos  distintos,  embora  possam
compartilhar entre si algumas características clínicas e, até mesmo, coexistir no mesmo indivíduo.
Em  2013,  a  Associação  Americana  de  Psiquiatria  publicou  a  5a  edição  do  Manual  Diagnóstico  e  Estatístico  dos
Transtornos  Mentais  (DSM­5,  2013),  agrupando  sob  o  termo  “transtornos  neurocognitivos”  o  delirium,  as  demências  e
outros  transtornos  cognitivos.  Os  termos  transtorno  cognitivo  leve  (TCL)  e  demência  passaram  a  ser  referidos,
respectivamente,  como  transtorno  neurocognitivo  leve  (TNL)  e  transtorno  neurocognitivo  maior  (TNM),  que  ainda
poderão ser estratificados por etiologia (p. ex., TNL ou TNM por doença de Alzheimer). O impacto que tais mudanças de
nomenclatura trarão à prática clínica e às pesquisas científicas ainda é desconhecido; por esse motivo, utilizaremos ambas
as terminologias como sinônimos ao longo deste capítulo.
Para o diagnóstico etiológico preciso das demências, a história clínica e o exame físico são fundamentais. Além disso, a
partir  das  informações  de  familiares  e  cuidadores,  da  avaliação  neuropsicológica  e  dos  exames  complementares,  as
etiologias mais prováveis podem ser identificadas.
Com  o  propósito  de  detecção  cada  vez  mais  precoce  e  com  maior  acurácia  etiológica,  novos  biomarcadores  das
demências têm sido identificados e testados em pesquisas científicas. Embora ainda tenham aplicação clínica limitada, em
um  futuro  próximo  poderão  ser  de  grande  valia  na  abordagem  das  demências,  especialmente  quando  dispusermos  de
intervenções farmacológicas modificadoras de doença.

Em 2050, a proporção de indivíduos acima de 60 anos corresponderá a 22% da população mundial. Desses indivíduos,
79% estão em países de baixa renda, onde a demência é pouco reconhecida e os recursos disponíveis são escassos (Prince
et al., 2013).
Enquanto em países de maior renda, como os do Reino Unido, a taxa de não detecção de demência é de 52%, nos países
de  baixa  e  média  renda  essa  taxa  pode  chegar  a  90%.  Estima­se  que  no  Brasil  existam  cerca  de  900  mil  indivíduos
portadores de demência sem diagnóstico e, portanto, sem tratamento (Nakamura et al., 2015).
A prevalência de demência varia substancialmente entre as diversas regiões do mundo. Na América Latina, a prevalência
é  maior  do  que  o  esperado  para  o  nível  de  envelhecimento  populacional,  fenômeno  explicado  pela  combinação  de  baixo
nível educacional e alta prevalência do perfil de risco vascular (Rizzi et al., 2014).
Dados  recentes  de  estudo  clinicopatológico  realizado  no  Brasil  (Grinberg  et  al.,  2013)  mostraram  as  seguintes
prevalências  dos  subtipos  de  demências:  doença  de  Alzheimer  (35,4%),  demência  vascular  (21,2%),  demência  mista
(13,3%) e outras causas de demência (30,1%). Em comparação a outros países, esses dados mostraram prevalências mais
baixas  de  doença  de  Alzheimer  e  mais  altas  de  demência  vascular  (DV)  e  demência  mista  (DM).  A  alta  prevalência
encontrada de DV e DM provavelmente reflete o acesso limitado da população estudada ao controle adequado dos fatores
de risco cardiovasculares.
Em  estudos  americanos,  entre  as  demências  neurodegenerativas  mais  prevalentes,  a  doença  de  Alzheimer  pode
corresponder  a  cerca  de  60  a  80%  dos  casos,  seguida  pela  demência  com  corpos  de  Lewy  e  demência  frontotemporal
(Gatchel et al., 2016).
A  prevalência  das  demências  apresenta  variações  de  acordo  com  a  faixa  etária  (Figura  20.1).  Nos  indivíduos  com
demência de início precoce (< 65 anos), a doença de Alzheimer é menos prevalente, mas continua sendo a etiologia mais
frequente. Por outro lado, a prevalência da demência frontotemporal é expressivamente maior nesse grupo etário, quando
comparado aos indivíduos com idade superior a 65 anos (Jefferies e Agrawal, 2009).

A maioria das demências se desenvolve por mecanismos fisiopatológicos multifatoriais. Portanto, são vários os fatores
de  risco  (Alzheimer’s  Disease  Association,  2014;  Ferman  et  al.,  2013)  envolvidos,  modificáveis  ou  não,  sendo  alguns
deles com maior especificidade para determinadas etiologias. Alguns dos fatores descritos na literatura estão expostos no
Quadro 20.1. Raramente, mutações genéticas específicas podem estar associadas ao desenvolvimento da demência (Loy et
al., 2014).

Figura  20.1  Etiologia  das  demências  por  idade  de  início  da  doença.  Fonte:  Jefferies  e  Agrawal,  2009.  DA:  doença  de
Alzheimer; DV: demência vascular; DCL: demência com corpos de Lewy; DFT: demência frontotemporal.


Pela história clínica, podemos caracterizar o padrão de acometimento neuropsicológico e a velocidade de instalação dos
sintomas, identificar fatores de risco, rever as medicações em uso e afastar outras causas de distúrbio cognitivo. Deve ser
obtida  diretamente  com  o  paciente  e  com  informantes  qualificados  (parentes,  cuidadores).  As  manifestações  clínicas
iniciais e sua evolução costumam fornecer dados relevantes para a formulação das hipóteses etiológicas mais prováveis e
para a escolha dos exames complementares pertinentes.
Alguns  casos  de  demência  em  fase  inicial  podem  confundir­se  até  mesmo  com  o  envelhecimento  normal,  pois  o
desempenho funcional ainda pode estar relativamente bem preservado.
O diagnóstico pode ser dificultado em casos com apresentação clínica atípica, início dos sintomas em idade abaixo dos
65  anos,  velocidade  rápida  de  progressão  ou  comprometimentos  cognitivos  isolados  (Kerry  e  Hildreth,  2015).  Nesses
casos, avaliações mais extensas podem ser necessárias. Também é preciso estar atento a possíveis armadilhas que podem
induzir ao erro no diagnóstico das demências (Quadro 20.2).


No  diagnóstico  diferencial  de  uma  síndrome  demencial,  o  exame  neurológico  é  mandatório  e  fundamental  para  a
definição  etiológica  (Fillit  et al.,  2010).  Nas  demências  corticais,  em  geral,  este  se  mantém  normal  até  a  fase  tardia  de
doença,  com  preservação  de  marcha,  tônus,  postura  e  reflexos.  Já  nas  demências  frontossubcorticais,  a  função  motora  é
geralmente comprometida nas fases iniciais (Cummings, 2003). Os principais sinais e sintomas a serem pesquisados estão
descritos a seguir.

DCL:  demência  com  corpos  de  Lewy;  DFT:  demência  frontotemporal;  TNL:  transtorno  neurocognitivo  leve.  *Hipertensão
arterial  sistêmica,  tabagismo,  obesidade,  hipercolesterolemia,  diabetes.  Fonte:  Alzheimer’s  &  Dementia,  2014;  Loy  et  al.,
2014.
Adaptado de Kerry e Hildreth., 2015.

▼Disfunção autonômica. A disfunção autonômica é mais comumente vista na demência com corpos de Lewy e na
doença de Parkinson (DP), mas também pode estar associada a doenças priônicas e à atrofia de múltiplos sistemas (AMS),
que é caracterizada por disfunção autonômica, parkinsonismo e disfunção cerebelar (DSM­5, 2013).
▼ Alterações  oculares  e  visuais.  Dentre  as  síndromes  demenciais  associadas  a  anormalidades  dos  movimentos
oculares  está  a  doença  de  Huntington  (DH)  e  a  paralisia  supranuclear  progressiva  (PSP).  A  DH  está  associada  ao
comprometimento das sacadas, exigindo a movimentação compensatória da cabeça. Já na PSP, podem ocorrer distúrbios de
visão (diplopia, borramento visual, fotofobia), sacadas lentas e hipométricas, convergência anormal, incapacidade de conter
o  reflexo  vestibulocular  e,  principalmente,  alentecimento  da  abertura  e  do  fechamento  dos  olhos.  A  oftalmoparesia
supranuclear é característica da doença e está relacionada com a perda dos movimentos verticais dos olhos. A opsoclonia
(movimentos  oculares  rápidos  e  involuntários,  irregulares,  não  estereotipados)  pode  ser  encontrada  em  pacientes  com
encefalite pós­viral ou nas síndromes paraneoplásicas.
▼Distúrbios piramidais. Sinais piramidais (neurônio motor superior), como espasticidade, hiper­reflexia e sinal de
Babinski,  são  comuns  em  doenças  cerebrovasculares  e  também  podem  ser  vistos  em  pacientes  com  demência
frontotemporal, atrofia de múltiplos sistemas e lesões estruturais do sistema nervoso central.
▼ Parkinsonismo.  O  parkinsonismo  é  definido  pela  presença  de  dois  dos  seguintes  sinais:  tremor  de  repouso,
bradicinesia e rigidez. Esses sinais são inespecíficos e podem ser encontrados na doença de Parkinson, na demência com
corpos  de  Lewy,  na  paralisia  supranuclear  progressiva,  na  atrofia  de  múltiplos  sistemas,  no  parkinsonismo  vascular  e  na
hidrocefalia  de  pressão  normal  (HPN).  Também  podem  ocorrer  na  fase  avançada  da  doença  de  Alzheimer  e  da  demência
frontotemporal.
▼Sinais cerebelares.  A  disfunção  cerebelar  pode  estar  associada  à  ataxia  da  marcha  e  é  proeminente  na  demência
relacionada  com  o  álcool  e  a  doença  de  Creutzfeldt­Jakob  (DCJ).  A  variante  cerebelar  da  atrofia  de  múltiplos  sistemas  é
caracterizada por nistagmo, dismetria apendicular e ataxia da marcha juntamente à disfunção autonômica.
▼Neuropatias. Evidências de neuropatia podem ser vistas em condições sistêmicas associadas à demência, tais como:
alcoolismo, diabetes, disfunção renal, deficiência de vitamina B12 e síndromes paraneoplásicas.
▼Distúrbios da marcha.  Demências  com  alteração  precoce  da  marcha  incluem:  demência  na  doença  de  Parkinson,
demência vascular, demência com corpos de Lewy e hidrocefalia por pressão normal.
▼ Mioclonias.  São  comuns  na  DCJ  e  também  podem  ser  encontradas  na  doença  de  Alzheimer  e  na  degeneração
corticobasal.

Uma vez estabelecido o diagnóstico de demência, a próxima etapa é a definição etiológica (Quadro 20.3).
Primeiramente,  é  importante  classificar  as  demências  de  acordo  com  o  seu  potencial  de  reversibilidade  (reversíveis  ou
irreversíveis), a fim de que o tratamento para o primeiro grupo seja instituído prontamente.
No  passado,  as  demências  eram  geralmente  classificadas  em  corticais  (afasia,  apraxia,  agnosia  e  amnésia)  ou
subcorticais (bradifrenia, distúrbios do humor e alterações da personalidade). Entretanto, por ser insuficiente, essa divisão
dicotômica  tem  sido  criticada,  já  que  algumas  formas  de  demência,  como  a  frontotemporal,  podem  apresentar  padrão
misto, afetando tanto estruturas corticais quanto subcorticais (Borgeois e Hickey, 2009).
Outra forma de classificação, com base na fisiopatologia, distingue as demências em degenerativas e não degenerativas.
As  primeiras  estão  associadas  a  processos  patológicos  que  causam  dano  cerebral  progressivo,  como  a  doença  de
Alzheimer, a doença de Creutzfeldt­Jakob e a demência na doença de Parkinson. As demências não neurodegenerativas são
aquelas  decorrentes  de  lesão  cerebral,  como  acidente  vascular  encefálico  (AVE)  e  traumatismo  cranioencefálico.  Porém,
essa  classificação  está  sujeita  a  diferentes  interpretações.  Por  exemplo,  a  demência  vascular  pode  representar  uma  causa
óbvia  de  demência  não  degenerativa;  entretanto,  alguns  questionam  o  fato  de  que  a  doença  aterosclerótica  subjacente  à
demência vascular represente, na verdade, um processo degenerativo (Agronin, 2014).
Adaptado de Fillit et al., 2010.


Aproximadamente 10% das demências podem ser reversíveis (Clarfield, 2003). Embora existam controvérsias acerca do
real  potencial  de  reversibilidade  de  algumas  etiologias,  essas  patologias  devem  ser  sempre  identificadas  e  tratadas.  A
relação das possíveis causas de demências tratáveis é extensa e engloba uma série de transtornos clínicos, neurológicos e
psiquiátricos.
Por uma questão didática, Maletta (1990) propôs uma divisão em três grandes subcategorias:

■ Demências com comprometimento estrutural do sistema nervoso central (SNC): hidrocefalia de pressão normal (HPN),
lesões expansivas (neoplasias, hematoma subdural) e doenças infecciosas do SNC
■ Condições  médicas  gerais:  medicamentos,  carências  nutricionais,  distúrbios  hidreletrolíticos,  transtornos  endócrinos,
doenças sistêmicas, intoxicação por metais pesados
■ Transtornos psiquiátricos: principalmente a depressão maior.


As demências rapidamente progressivas são caracterizadas por um intervalo menor do que 2 anos entre a instalação dos
sintomas e o diagnóstico de demência ou a morte (Shrestha et al., 2015). É frequente o acometimento de indivíduos com
idade inferior a 65 anos, e as possibilidades etiológicas costumam ser mais amplas do que nas demências de início tardio
(Quadro 20.4).  Por  esse  motivo,  o  processo  investigativo  (Larson,  2015)  contempla  uma  bateria  mais  ampla  de  exames
(Quadro 20.5).
SNC: sistema nervoso central. Adaptado de Shrestha et al., 2015.

EAS:  exame  de  elementos  e  sedimentos  anormais  da  urina;  PCR:  proteína  C  reativa;  FAN:  fator  antinuclear;  VHS:
velocidade  de  hemossedimentação;  HIV:  vírus  da  imunodeficiência  humana;  PET:  tomografia  por  emissão  de  pósitrons;
SPECT: tomografia computadorizada por emissão de fóton único. Fonte: Larson, 2015.

A prevalência das etiologias varia dentre os estudos e conforme as características de cada instituição de pesquisa. Nos
centros  de  referência  de  doenças  priônicas,  a  proporção  da  doença  de  Creutzfeldt­Jakob  tende  a  ser  maior.  Porém,  em
estudo realizado em um centro de demências (Paterson et al., 2012), as causas mais frequentemente diagnosticadas foram
as demências por causas reversíveis (27%) (tóxico­metabólicas, autoimunes, vasculites, infecciosas), seguidas por doença
de Alzheimer (18%), demência frontotemporal (16%) e doença de Creutzfeldt­Jakob (13%).

A doença de Alzheimer (DA) é uma doença neurodegenerativa de causa e patogênese incertas, que afeta principalmente
idosos e corresponde a aproximadamente 60% de todas as demências, sendo, portanto, a principal e mais prevalente dentre
todas as causas (Gatchel et al., 2016).
Apresenta curso clínico tipicamente de início insidioso e deterioração progressiva. A sobrevida após o diagnóstico varia
entre 3 e 20 anos, com uma expectativa de vida média de 8 a 10 anos.
A manifestação clínica mais precoce e essencial da DA é o comprometimento da memória episódica, inicialmente para
eventos recentes, embora existam exceções em formas atípicas da doença. Déficits em outros domínios cognitivos podem
aparecer  de  forma  concomitante  ou  subsequente  ao  déficit  de  memória.  A  disfunção  executiva  e  o  comprometimento
visuoespacial  geralmente  estão  presentes  em  fases  iniciais,  enquanto  as  alterações  da  linguagem  (afasia),  apraxia  e
distúrbios comportamentais se manifestam mais tardiamente no curso da doença (Fillit et al., 2010).
Ocasionalmente,  a  apresentação  inicial  da  doença  pode  incluir  distúrbios  comportamentais;  porém,  a  proeminência
dessas alterações em relação às alterações cognitivas no início do curso da doença é incomum e deve motivar a busca por
outras  etiologias.  As  características  adicionais  que  diminuem  a  probabilidade  de  doença  de  Alzheimer  incluem  um  início
súbito,  a  presença  de  sinais  neurológicos  focais  (hemiparesia,  perda  sensorial,  déficits  de  campo  visual,  perda  de
coordenação)  e  a  presença  de  alterações  da  marcha  ou  convulsões  de  início  precoce  (Maalouf  et  al.,  2011).  Nas  fases
iniciais  da  DA,  o  exame  neurológico  é  normal.  Quando  sinais  motores  piramidais,  extrapiramidais,  mioclonias  e
convulsões estão presentes, estes tipicamente ocorrem nas fases avançadas da doença.
Embora  normalmente  se  apresente  como  uma  síndrome  amnéstica,  existem  variantes  clínicas  da  DA.  Esses  casos
atípicos  podem  representar  grandes  desafios,  comprometendo  a  agilidade  e  a  acurácia  diagnóstica.  A  atrofia  cortical
posterior  consiste  em  uma  dessas  variantes  e  cursa  com  problemas  visuoespaciais.  Pode  ainda  estar  associada  a  uma
síndrome  logopênica  (Larner,  2014)  caracterizada  por  anomia  e  fluência  verbal  prejudicada.  Outra  variante  possível  é  a
síndrome corticobasal (SCB). Sabe­se que a SCB pode ser consequência não apenas da degeneração corticobasal (DCB),
mas também de várias outras patologias subjacentes, inclusive DA (Hassan et al., 2011). Também foi descrita a variante
frontal  ou  disexecutiva,  em  que  o  paciente  apresenta  uma  disfunção  executiva  proeminente  em  relação  ao  déficit  de
memória.
O diagnóstico definitivo da doença de Alzheimer requer o exame histopatológico, o que raramente é realizado em vida.
Portanto, o diagnóstico na prática é realizado a partir de critérios clínicos (DSM­5, NINCDS­ADRDA), que permitem um
diagnóstico  preciso  em  mais  de  90%  dos  casos.  A  DA  deve  ser  suspeitada  em  qualquer  idoso  que  se  apresente  com  um
declínio insidioso e progressivo da memória e de pelo menos alguma outra função cognitiva.
O papel dos exames laboratoriais e da neuroimagem é principalmente o de excluir outros diagnósticos.
Existe uma série de biomarcadores para apoiar o diagnóstico de DA (Albert et al., 2011), mas que em sua maioria ainda
não  tem  aplicabilidade  à  prática  clínica  (Quadro  20.6).  No  entanto,  são  recursos  disponíveis  que  podem  acrescentar
confiabilidade  adicional  ao  diagnóstico  clínico  e  podem  ser  úteis  em  certas  circunstâncias,  como  na  investigação  de
pacientes com apresentações atípicas ou na doença de início precoce.

PET:  tomografia  por  emissão  de  pósitrons;  SPECT:  tomografia  computadorizada  por  emissão  de  fóton  único;  RM:
ressonância magnética.

Nenhum  desses  testes  possui  validade  como  critério  diagnóstico  isolado.  Porém,  têm  sido  utilizados  largamente  em
pesquisas científicas para a definição diagnóstica de formas sintomáticas e pré­sintomáticas da doença. Após padronização
definitiva  desses  testes  em  pesquisas,  é  provável  que  os  mesmos  sejam  incorporados  futuramente  aos  critérios
diagnósticos clínicos (Morris et al., 2014).
A redução dos níveis plasmáticos da apolipoproteína E e APOE4 tem sido investigada com o objetivo de se aumentar o
valor  preditivo  de  DA  em  idosos  não  demenciados  e  naqueles  com  transtorno  neurocognitivo  leve,  além  de  auxiliar  no
diagnóstico  diferencial  dentre  as  demências.  Porém,  o  papel  dessas  mensurações  na  prática  clínica  ainda  não  está  bem
estabelecido  (O’Bryant  et  al.,  2010).  Os  testes  genéticos  não  são  recomendados  como  avaliação  de  rotina.  O  genótipo
APOE  acrescenta  valor  preditivo  marginal  ao  critério  clínico  e  pode  estratificar  o  risco  de  conversão  de  pacientes  com
transtorno  cognitivo  leve  para  DA,  porém  falsos  positivos  e  negativos  podem  ocorrer.  Testagem  genética  para  proteína
precursora  amiloide,  presenilina  1  e  2,  deve  ser  reservada  para  casos  de  demência  pré­senil  em  um  contexto  de  história
familiar positiva.
A degeneração lobar frontotemporal (DLFT) consiste em um termo amplo para descrição de um grupo heterogêneo de
distúrbios, caracterizados patologicamente pela atrofia progressiva dos lobos frontal e/ou temporal, que se manifestam por
meio de três síndromes clínicas distintas: demência frontotemporal variante comportamental (DFTv), demência semântica
(DS) e afasia não fluente progressiva (ANFP).
Geralmente  é  reconhecida  como  uma  causa  de  demência  pré­senil  (<  65  anos),  mas  pode  ser  tão  precoce  quanto  na
terceira  década  ou  tão  tardia  quanto  na  nona  década.  Estudos  epidemiológicos  europeus  e  norte­americanos  descrevem
estimativas de prevalência em indivíduos com idade inferior a 65 anos que variam de 4 a 15/100.000. Apesar da escassez
de dados disponíveis, a prevalência em grupos etários mais idosos tende a ser subestimada (Sorbi et al., 2012).
A  DLFT  apresenta  um  componente  genético  substancial,  com  um  padrão  de  herança  autossômica  dominante  e/ou
mutações causadoras de doenças identificadas em cerca de 10 a 20% dos casos e história familiar positiva em proporção
maior (Sorbi et al., 2012).
A DFTv é caracterizada por um amplo espectro de manifestações fenotípicas que podem incluir declínio progressivo nas
relações  interpessoais,  disfunção  executiva,  indiferença  afetiva,  e  uma  ampla  variedade  de  comportamentos  anormais,
como desinibição, adinamia, obsessões, rituais, estereotipias e alterações do padrão alimentar.
A DS é uma síndrome mais uniforme, caracterizada pela perda progressiva da memória semântica, geralmente afetando
o  conhecimento  das  palavras.  Os  pacientes  comumente  apresentam  uma  fala  fluente,  embora  vazia  de  significado,  com
perda  de  vocabulário  e  disgrafia.  Um  comprometimento  semântico  mais  generalizado,  com  prejuízo  das  informações
visuais  (prosopagnosia,  agnosia  visual)  e  de  outros  domínios  não  verbais,  geralmente  sobrevém  mais  tarde  no  curso  da
doença.  A  DS  é  associada  à  atrofia  anteroinferior  seletiva  e  assimétrica  do  lobo  temporal,  predominantemente  do  lado
esquerdo, na maioria dos casos.
A  ANFP  é  caracterizada  por  uma  perda  progressiva  da  fluência,  afetando  inicialmente  a  fala  e,  posteriormente,  as
habilidades  de  aprendizagem.  Geralmente,  o  discurso  é  não  fluente,  contendo  erros  articulatórios  (discurso  apráxico)  e
agramatismo (Sorbi et al., 2012).
As alterações precoces no comportamento e na personalidade e a disfunção executiva distinguem a DFTv da doença de
Alzheimer.  Entretanto,  como  a  DA  pode  se  apresentar  de  forma  atípica  por  meio  de  uma  síndrome  logopênica,  pode  ser
difícil o diagnóstico diferencial entre DLFT (afasia progressiva primária, DS) e DA em alguns pacientes.

A demência com corpos de Lewy (DCL) é o segundo tipo mais comum de demência degenerativa, respondendo por 10 a
15%  dos  casos.  Clinicamente,  a  DCL  é  caracterizada  por  declínio  cognitivo  progressivo,  acompanhado  de  sintomas
característicos,  como  alucinações  visuais  complexas,  atenção  e  cognição  flutuantes  e  parkinsonismo  de  início  precoce  no
curso  da  doença.  Características  que  apoiam  a  doença  incluem  a  hipersensibilidade  aos  neurolépticos  e  distúrbios
comportamentais do sono REM.
Atenção,  habilidades  visuoespaciais  e  funções  executivas  encontram­se  mais  afetadas  nos  indivíduos  com  DCL  em
comparação  aos  portadores  de  DA.  Além  disso,  alucinações  visuais  como  sintomas  iniciais  são  frequentes  na  DCL  e
também podem auxiliar no diagnóstico diferencial de DA (Sorbi et al., 2012).

As  síndromes  parkinsonianas  são  doenças  neurodegenerativas  com  características  proeminentes  extrapiramidais
(bradicinesia,  rigidez,  instabilidade  da  marcha).  Com  frequência  essas  síndromes  estão  também  associadas  a
comprometimento  cognitivo  significativo.  Dentre  as  síndromes  parkinsonianas  estão  a  doença  de  Parkinson  (DP),  a
paralisia supranuclear progressiva (PSP), a demência com corpos de Lewy (DCL), a atrofia de múltiplos sistemas (AMS)
e a degeneração corticobasal (DCB).
Na DP, o comprometimento cognitivo tende a surgir pelo menos 1 ano após o início dos sintomas motores. Essa regra
temporal tem sido utilizada para auxílio no diagnóstico diferencial entre DP e DCL.
A  PSP  é  inicialmente  caracterizada  por  oftalmoplegia  supranuclear,  instabilidade  postural  complicada  por  quedas  e
rigidez axial.
A AMS é caracterizada pela associação de parkinsonismo com disautonomia, disfunção cerebelar ou corticoespinal.
A DCB é uma síndrome clínica heterogênea que causa parkinsonismo assimétrico, distonia e sinais como apraxia, perda
sensorial cortical ou membro alienígena (Sorbi et al., 2012).
A doença cerebrovascular é a segunda causa mais comum de demência no idoso. O aparecimento de demência no prazo
de  3  meses  após  um  acidente  vascular  cerebral  e  a  deterioração  da  cognição  em  degraus  são  altamente  sugestivos  de
demência  vascular  (DV).  O  curso,  entretanto,  pode  ser  bastante  variável,  e  um  início  insidioso  de  alterações  cognitivas
com  progressão  gradual  e  sem  histórico  de  acidente  vascular  cerebral  ou  evidências  de  lateralização  neurológica  também
pode ser encontrado (Sorbi et al., 2012).
A apresentação clínica da DV dependerá, portanto, da localização e da causa das lesões cerebrovasculares. Uma doença
de  grandes  vasos  leva  comumente  a  infartos  corticais  (síndrome  demencial  cortical),  enquanto  uma  doença  de  pequenos
vasos  causa  isquemia  da  substância  branca  periventricular  e  infartos  lacunares,  levando  à  demência  vascular  isquêmica
subcortical (DVIS), que consiste no subtipo mais comum e responsável por mais de 50% dos casos de DV (Fillit et al.,
2010).  Dependendo  da  localização  das  lesões,  o  padrão  do  déficit  cognitivo  poderá  ser  subcortical,  cortical  ou  misto
(Gallucci et al., 2005).
As  demências  de  padrão  subcortical,  em  geral,  resultam  em  uma  síndrome  caracterizada  por  alterações  frontais,
disfunção  executiva,  comprometimento  leve  da  memória,  prejuízo  da  atenção,  depressão,  alentecimento  motor,  sintomas
parkinsonianos,  distúrbios  urinários  e  paralisia  pseudobulbar  (Fillit  et al.,  2010).  Nas  demências  de  padrão  cortical,  as
características cognitivas dependerão das áreas cerebrais afetadas.
Para o diagnóstico de demência vascular deve haver evidências na anamnese, no exame físico e nos exames de imagem
(tomografia  computadorizada  ou  ressonância  magnética)  de  alterações  compatíveis  com  doença  cerebrovascular.  O
diagnóstico  é  altamente  sugestivo  quando  há  predominância  de  disfunção  executiva,  sintomas  neurológicos  focais,
síndrome pseudobulbar e início precoce do transtorno de marcha ou urgência urinária (Jack et al., 2011). Um dos critérios
diagnósticos mais amplamente utilizados é o NINDS­AIREN (National Institute of Neurological Disorders and Stroke and
Association  Internationale  Pour  la  Recherche  et  l‘Enseignement  en  Neurosciences),  que  porém  não  contempla  critérios
para o diagnóstico de DVIS. Em 2000, Erkinjuntti et al. sugeriram critérios diagnósticos para esse subtipo específico.
A contribuição específica de alterações isquêmicas vistas em imagens de ressonância magnética para o déficit cognitivo
pode  ser  de  difícil  determinação  em  virtude  da  coexistência  frequente  de  doença  de  Alzheimer.  A  presença  de  doença
extensa  e  confluente  na  substância  branca  e  a  localização  de  lesões  isquêmicas  em  “áreas  estratégicas”  para  a  cognição,
como  giro  do  cíngulo,  lobo  temporal  medial,  tálamo  ou  caudado,  aumentam  a  probabilidade  da  etiologia  vascular  para  o
comprometimento cognitivo (Maalouf et al., 2011).
Os  sinais  neurológicos  focais  que  podem  ser  encontrados  na  demência  vascular  incluem  resposta  extensora  plantar,
paralisia pseudobulbar, anormalidades da marcha, hiper­reflexia e paresia de uma das extremidades.

O termo demência mista é mais comumente aplicado à coexistência de doença de Alzheimer e demência vascular. Porém,
outras  patologias  concomitantes  também  podem  ocorrer  em  demência.  A  doença  de  Parkinson  está  presente  em  20%  dos
pacientes  com  DA,  e  aproximadamente  50%  dos  casos  de  demência  com  corpos  de  Lewy  estão  associados  à  doença  de
Alzheimer (Heath et al., 2010).
Estudos de necropsia têm evidenciado que a patologia vascular coexistente ocorre em 24 a 28% dos pacientes com DA.
Porém,  o  diagnóstico  e  o  tratamento  desses  pacientes  com  patologia  mista  são  complexos  graças  à  ausência  de  critérios
diagnósticos específicos (Langa et al., 2004).
As  lesões  vasculares  nos  pacientes  com  DA  podem  ser  subestimadas  e  parecem  estar  associadas  à  deterioração  clínica
mais  rápida.  A  apresentação  mais  comum  de  demência  mista  é  a  de  um  paciente  com  sintomas  e  características  clínicas
típicas de DA que sofre piora abrupta, acompanhada pela presença de sinais clínicos de AVE (Gallucci et al., 2005).

A doença de Creutzfeldt­Jakob (DCJ) é o protótipo das demências rapidamente progressivas. Consiste em uma doença
causada por príons, que pode ser herdada geneticamente, adquirida como uma infecção, ou esporádica. A DCJ esporádica
corresponde  à  forma  mais  comum  da  doença  (85%  dos  casos)  e  tem  uma  prevalência  estimada  em  0,5  a  1,5  caso  por
milhão;  a  idade  média  de  início  é  65  anos,  e  a  duração  média  da  doença  é  de  8  meses.  Somente  4%  dos  pacientes
sobrevivem por mais de 2 anos (Maalouf et al., 2011).
Embora  rara,  a  DCJ  deve  ser  reconhecida  prontamente  devido  à  possibilidade  de  transmissão  através  de  instrumentos
cirúrgicos contaminados ou transplante de órgãos (Sorbi et al., 2012).
Os critérios diagnósticos para a DCJ esporádica são baseados em sinais clínicos, presença de ondas periódicas trifásicas
e assimétricas no eletroencefalograma, presença no liquor da proteína 14­3­3 e aumento de sinal nas sequências de difusão
da ressonância magnética nas regiões do córtex, gânglios da base e pulvinar (Heath et al., 2010). O padrão de progressão
acelerada associado a mioclonia, ataxia de marcha e anormalidades visuais (defeitos de campo visual e alucinações visuais)
no  início  do  curso  da  doença  deve  sugerir  DCJ.  À  semelhança  de  outras  doenças  neurodegenerativas,  no  entanto,  o
diagnóstico de certeza requer confirmação histopatológica (Maalouf et al., 2011).

A  depressão  maior  no  idoso  está  associada  frequentemente  à  deterioração  cognitiva.  Déficits  cognitivos  leves  na
memória, na velocidade de processamento e no funcionamento executivo são particularmente comuns e, quando presentes,
estão  associados  à  pior  resposta  ao  tratamento  antidepressivo,  além  de  maiores  chances  de  recaída  e  de  incapacidade
funcional.
Um  comprometimento  cognitivo  leve  durante  episódios  depressivos  não  evolui  para  demência  na  maioria  dos  casos  e
tende  a  melhorar  quando  os  sintomas  depressivos  são  tratados.  No  entanto,  os  sintomas  cognitivos  graves  parecem  estar
associados a um risco aumentado de demência subsequente.
A  depressão  geriátrica  pode  apresentar­se  concomitante  ou  mesmo  preceder  às  síndromes  demenciais.  Alguns  idosos
podem  desenvolver  uma  síndrome  demencial  (antigamente  denominada  “pseudodemência”)  secundária  à  depressão,  que
pode ser revertida após remissão dos sintomas depressivos. Esses pacientes costumam se apresentar com uma depressão
de início tardio grave e uma síndrome demencial leve.
Quando  comparados  aos  pacientes  deprimidos  com  doença  de  Alzheimer,  os  pacientes  com  depressão  e  “demência
reversível” apresentam mais sintomas psíquicos e de ansiedade somática (Morimoto et al., 2015).

A  determinação  do  padrão  de  disfunção  cognitiva  e  comportamental  apresentado  na  fase  precoce  da  doença  é
fundamental  para  o  diagnóstico  e  reflete  as  estruturas  cerebrais  inicialmente  comprometidas.  Na  doença  de  Alzheimer,  o
comprometimento  da  memória  episódica  é  frequentemente  o  primeiro  sintoma  associado  ao  envolvimento  precoce  do
córtex  entorrinal  e  do  hipocampo.  Desinibição,  apatia  e  distúrbios  emocionais  caracterizam  os  primeiros  estágios  da
demência  frontotemporal  com  predominância  da  atrofia  dos  córtices  anteromesial  e  orbitofrontal.  A  demência  semântica
com atrofia da região temporal anterior esquerda é caracterizada por dificuldade de compreensão e discurso fluente embora
sem  conteúdo,  ao  passo  que  a  atrofia  perisylviana  é  em  geral  associada  à  afasia  não  fluente  que  está  relacionada  com  o
prejuízo  da  fluência  verbal  e  com  erros  gramaticais.  Na  degeneração  corticobasal,  o  distúrbio  visuoespacial,  a  apraxia  de
membros e a “síndrome da mão alienígena” refletem a atrofia dos lobos frontal e parietal. A atrofia parieto­occipital está
associada  às  alucinações  visuais  e  aos  distúrbios  visuoespaciais  na  demência  com  corpos  de  Lewy.  Já  nas  formas
subcorticais de demência (demência vascular isquêmica subcortical, hidrocefalia por pressão normal, demência na doença
de  Parkinson),  nas  quais  os  circuitos  frontossubcorticais  estão  em  geral  interrompidos,  há  o  desenvolvimento  de  uma
síndrome caracterizada por alentecimento motora a disfunção executiva associada aos lobos frontais (Sorbi et al., 2012).
As  pesquisas  em  neuropsicologia  têm  apresentado  considerável  progresso  em  delinear  padrões  cognitivos  e
comportamentais (Quadros 20.7  e  20.8)  que  possam  distinguir  a  doença  de  Alzheimer  de  outras  causas  de  demência  e,
dessa forma, auxiliar no diagnóstico diferencial.
N:  normal;  A:  alterado;  V:  variável;  DA:  doença  de  Alzheimer;  TNLa:  transtorno  neurocognitivo  leve  amnéstico;  DFT:
demência  frontotemporal;  ANFP:  afasia  não  fluente  progressiva;  DCL:  demência  com  corpos  de  Lewy.  Fonte:  Fillit  et  al.,
2010.

SNC: Sistema nervoso central. Fonte: Cummings, 2003.

Na  DCL  há  um  padrão  de  comprometimento  de  habilidades  visuoespaciais,  funções  executivas  e  atenção  mais
proeminente do que na DA, enquanto o prejuízo da memória ocorre em menor intensidade.
Estudos que investigam perfis cognitivos associados a DA e DFT sugerem que pacientes com DFT apresentam déficit
mais  proeminente  das  funções  executivas  com  relação  a  outras  funções  cognitivas,  ao  passo  que  na  DA  a  disfunção
executiva é proporcional aos déficits na linguagem e nas habilidades visuoespaciais e menos proeminente do que o déficit
de  memória  episódica.  Na  variante  frontal  da  degeneração  lobar  frontotemporal  (demência  frontotemporal),  há  melhor
capacidade  de  retenção  em  tarefas  de  aprendizagem,  com  padrões  distintos  de  fluência  verbal,  disfunção  executiva  mais
acentuada  e  alterações  marcantes  do  comportamento.  Já  nas  variantes  temporais  de  degeneração  frontotemporal,  afasia
progressiva e demência semântica, um pior desempenho na linguagem é tipicamente característico (Salmon e Bondi, 2009).
Quanto à demência vascular, os estudos sobre perfis neuropsicológicos têm primariamente focado na diferenciação entre
DA  e  demência  vascular  subcortical.  Esses  estudos  têm  mostrado  que  pacientes  com  DV  subcortical  são  mais
comprometidos do que aqueles com DA em testes de função executiva, enquanto os pacientes com DA apresentam maior
comprometimento da memória episódica (Salmon e Bondi, 2009).


▼ Memória  episódica.  Uma  comparação  entre  pontuações  obtidas  na  evocação  livre  e  na  evocação  com  pistas  é
bastante  útil  no  diagnóstico  diferencial  entre  a  doença  de  Alzheimer  e  outras  demências.  Enquanto  os  pacientes  com
distúrbios frontais (p. ex., demência frontotemporal) e de estruturas subcorticais (p. ex., demência vascular) tendem a se
beneficiar por meio de pistas, o mesmo não acontece na doença de Alzheimer, na qual a evocação tardia está gravemente
comprometida em consequência da atrofia do lobo temporal mesial.
▼ Memória  semântica.  O  comprometimento  seletivo  é  típico  da  demência  semântica.  Esses  pacientes  apresentam
pior desempenho na categoria fluência e nos testes de nomeação visual, quando comparados aos pacientes com DA e DFT.


A predominância da disfunção executiva em relação ao comprometimento da memória episódica é típica de DFT, DCB,
DV e DCL. Redução da fluência em testes, perseverações, redução da velocidade de processamento e defeitos na inibição
de respostas automáticas podem ser causados por lesões frontais ou subcorticais.


Pacientes com DCL e DCB apresentam particularmente um comprometimento das habilidades visuoespaciais.
Sintomas neuropsiquiátricos como depressão, ansiedade, irritabilidade ou agitação estão presentes em 90% dos casos de
demência, ainda nos primeiros anos após o diagnóstico. Entretanto, essas alterações podem preceder em meses a anos os
sintomas  cognitivos  e  as  perdas  funcionais,  como,  por  exemplo,  na  doença  de  Alzheimer  (Jost  e  Grossberg,  1996).  O
predomínio  desses  sintomas  e  a  preservação  inicial  da  memória  podem  indicar  a  presença  de  demência  frontotemporal
(desinibição,  alterações  de  personalidade)  ou  doença  com  corpos  de  Lewy  (alucinações  visuais  e  delírios,  com  sintomas
motores).

Os  exames  recomendados  para  investigação  etiológica  de  um  quadro  demencial  incluem  hemograma  completo,
eletrólitos, glicose, cálcio, ureia, creatinina, provas de função hepática, vitamina B12, ácido fólico, hormônios tireoidianos,
sorologia para sífilis e anti­HIV para indivíduos com história de risco.
A  punção  lombar  é  indicada  para  casos  de  demência  em  indivíduos  com  menos  de  55  anos,  ou  quando  se  suspeita  de
condições infecciosas, inflamatórias, autoimunes ou desmielinizantes. A presença da proteína 14­3­3 no liquor é útil para o
diagnóstico de doença de Creutzfeldt­Jakob. Os marcadores liquóricos na doença de Alzheimer (redução da proteína beta­
amiloide e aumento da tau total e da tau fosforilada) podem auxiliar no diagnóstico mais precoce e preciso; porém, a baixa
aceitação  do  procedimento  de  punção  lombar  por  parte  dos  pacientes  e  a  ausência  de  padronização  laboratorial  limitam  o
seu uso de rotina (DSM­5, 2013). Biomarcadores plasmáticos na doença de Alzheimer poderão ter um papel no futuro para
monitoramento terapêutico.
A testagem genética é raramente indicada e deve ser solicitada apenas após aconselhamento apropriado. A testagem pode
estar indicada na suspeita de doença de Huntington, arteriopatia cerebral autossômica dominante com infartos subcorticais
e leucoencefalopatia (CADASIL), doença de Alzheimer e demência frontotemporal.

A neuroimagem estrutural por meio de ressonância magnética (RM) ou tomografia computadorizada (TC) é uma etapa
necessária na investigação dos quadros demenciais. Um dos principais objetivos da solicitação desses exames é descartar
lesões intracerebrais que causem demência e possam ser potencialmente tratáveis, como hematoma subdural e hidrocefalia
de pressão normal. Além disso, permitem o diagnóstico de infartos corticais, subcorticais e alterações da substância branca
que  possam  justificar  uma  etiologia  vascular,  e  podem  evidenciar  padrões  de  atrofia  característicos  de  determinadas
demências.  Como  exemplo,  a  atrofia  hipocampal  e  temporomedial  são  marcadores  sensíveis  e  precoces  da  doença  de
Alzheimer, e a atrofia do lobo temporal anterior ou frontal pode ser vista nas demências frontotemporais. A escolha de um
dos métodos (TC ou RM) dependerá da disponibilidade local, das considerações de custo e das contraindicações; porém, a
ressonância é um método mais sensível e, por esse motivo, é considerada como primeira opção em muitos serviços.
A neuroimagem funcional com tomografia computadorizada por emissão de fóton único (SPECT) ou a tomografia por
emissão  de  pósitrons  (PET)  mostram  padrões  regionais  distintos  de  perfusão  ou  metabolismo  que  podem  auxiliar  na
diferenciação  entre  a  doença  de  Alzheimer  e  as  demências  vascular  ou  frontotemporal.  A  utilização  da  PET  atualmente
ainda  se  restringe  às  pesquisas  científicas  devido  ao  alto  custo  e  à  baixa  disponibilidade  nos  serviços  de  saúde  (APP,
2013).
Recentes avanços na neuroimagem, como o composto B de Pittsburgh (PIB – marcador amiloide) para PET na doença e
de Alzheimer, provavelmente terão um papel no futuro para o diagnóstico diferencial das demências e o monitoramento do
tratamento.  Outras  técnicas  em  estudo  para  auxílio  no  diagnóstico  das  demências  incluem  mensurações  volumétricas
cerebrais, RM com difusão, RM com espectroscopia e RM de placas senis.

O diagnóstico diferencial das demências (Figura 20.2) é um processo complexo, custoso e que demanda tempo. Apesar
do estabelecimento de critérios diagnósticos e de protocolos de investigação, as demências ainda são subdiagnosticadas e
mal classificadas quanto a sua etiologia. A existência de quadros clínicos atípicos torna ainda mais difícil essa tarefa.
Com  a  perspectiva  da  descoberta  de  drogas  modificadoras  de  doença  no  futuro,  um  arsenal  ainda  mais  amplo  de
ferramentas diagnósticas estará disponível para a detecção cada vez mais precoce e precisa dos processos patológicos das
demências em suas fases pré­clínicas.
Figura 20.2 Algoritmo para o diagnóstico diferencial das demências. DCJ: doença de Creutzfeldt­Jakob; DCL: doença com
corpos de Lewy; HIV: vírus da imunodeficiência humana; TCE: traumatismo cranioencefálico. Fonte: Fillit et al., 2010.

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