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O Casamento Pagão

(Cavaleiros de Ware 0.5)

Glynnis Campbell
Sinopse

Quando Sir Noёl de Ware vem da França para


reivindicar sua noiva ― a mais bela herdeira das Terras Altas
― ele tem certeza de ter recebido o melhor presente de natal...
até que ele descobre que a moça com quem está casado e na
cama, não é a irmã certa. Ysenda de Rivenloch nunca
pretendera ser uma noiva falsa, e quando começa a se
apaixonar por seu belo marido, fica presa em sua própria
decepção. Somente o amor verdadeiro e um desejo de natal
podem definir as coisas de forma direta e conceder-lhes um
final feliz.
Para todas as pessoas que não nasceram perfeitas
e todas aquelas sábias o suficiente para
ver seu valor de qualquer maneira
O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Capítulo 1

AS HIGHLANDS1
ÉPOCA DO NATAL 1199

Ysenda odiava a época do natal.


Ao seu redor, o clã celebrava com banquetes e aplausos.
O animado festejo encheu o grande salão. O riso e a música
ecoavam pelas vigas.
Ainda assim, ela franzia a testa para o copo de madeira
meio vazio.
Sua aversão não tinha nada a ver com a ceia. Quem
poderia reclamar sobre a comida suntuosa que cobria a mesa
a cada noite de natal? Esta noite havia uma cabeça de javali
suculenta, carne de carneiro defumado, veado assado, poção
de coelho, berbigão, avelãs, queijos e copos infinitos de
cerveja de inverno.
Ela nem se importou com a alegria bêbada que
inevitavelmente seguiu. Canções estridentes expulsaram a
tristeza. Rapazes fortes agarravam as meninas risonhas. A
música de flautas, harpa e tambores enchia o ar. A dança
barulhenta encorajava o retorno do sol após o solstício.

1 Highlands – Terras altas são a zona montanhosa do norte da Escócia.

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Os ramos de azevinho decorando o salão pareciam


reconhecidamente festivos. Da mesma forma, a hera cobria a
grande lareira. O visco pendia em todas as portas para a boa
sorte. As velas de sebo luminosas colocadas sobre a sala,
faziam com que os feixes de madeira áspera parecessem
aconchegantes e acolhedores ao olhar.
Por uma vez, apesar de estar lotado com as pessoas se
acotovelando, ninguém do clã estava brigando. Todos
estavam recém-banhados, sorridentes e vestidos com a
melhor roupa.
Mesmo Ysenda fez um esforço. Ela se banhou em água
perfumada com lavanda, e lavou sua túnica de linho até ficar
tão branca quanto a neve lá fora. Em cima disso, ela usava
seu melhor vestido de lã cinza suave. Escorrendo por sua
cintura e em seu peito tinha um manto de xadrez cinza claro,
preso no ombro com um broche de prata. Seu cabelo
castanho normalmente rebelde, estava preso na coroa por
duas tranças estreitas, amarradas na parte de trás com uma
fita e levemente perfumado com mais lavanda.
Ela se sentia bonita... quase tão bonita quanto sua irmã.
― Caimbeul! ― Do outro lado do salão, acima dos seus
amigos gritando, um dos muitos rufiões entediados agarrou
uma moça pelo braço e gritou para o irmão mais velho de
Ysenda.
― Caimbeul! Por que você não dança com Tilda aqui?
Ysenda enrijeceu quando Tilda se afastou com um rubor
horrorizado. Todo mundo riu.
Era por isso que ela odiava as festas de natal.

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Ao lado dela, Caimbeul sorriu da brincadeira. Mas


Ysenda sabia que estava morrendo por dentro. Ele queria
tanto se encaixar, ser como eles.
Na maioria das vezes, ele podia fingir que era. Na
maioria das vezes, Ysenda esquecia que ele era diferente.
Quando os dois estavam sozinhos, ele parecia tão bem feito e
apto como qualquer homem.
Foi só quando eles foram forçados a aparecer
publicamente, como na festa do natal ― sentados ao lado de
sua irmã e pai como se nada estivesse errado ― que sua
diferença ficou dolorosamente clara.
Uma vez que a multidão se reuniu e a cerveja estava
fluindo, as provocações e as risadas começaram. E para a
desonra de Ysenda, seu pai, Laird2 Gille, não fez nada para
evitar a zombaria.
Por que ele iria? O laird tinha desaprovado seu filho
deformado à primeira vista. Na verdade, a única razão pela
qual ele deixara o menino viver, foi porque Caimbeul tinha
seis meses de idade quando o laird voltou para casa de suas
viagens e, então, colocou os olhos sobre ele. A feroz mãe de
Ysenda, descendente das infames Damas Guerreiras de
Rivenloch, ameaçou a vida do laird se ele tocasse num fio de
cabelo de seu precioso filho.
Ao lado dela, Caimbeul suspirou e abaixou seu bolo de
aveia meio comido. Ysenda seguiu seu olhar. Um grupo de
crianças brincavam ao lado da lareira. Imitando seus irmãos

2 Laird – O Senhor da propriedade.

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mais velhos, eles estavam se divertindo com o personagem


coxo, caracteristica de Caimbeul.
Ela apertou sua adaga enquanto comia e murmurava:
― Aqueles filhotes de carneiros. O que eles acham que
estão fazendo?
Ele deu uma risada triste e indulgente. ― Eles são
apenas crianças, Ysenda. Eles não conhecem nada melhor.
― Oh, eu ficaria feliz em ensiná-los, ― disse ela entre os
dentes. ― Talvez eu os cuspa e os asse lentamente sobre o
fogo de natal.
Isso o fez sorrir. ― Ah, soa como a nossa mãe.
― É desrespeitoso, ― ela insistiu. ― Você é o filho do
laird.
Na verdade, ele era o único filho do laird. O primogênito.
Ele deveria ser o herdeiro do clã. Mas ele também podia ser
invisível. Sua presença era esperada nas festas de férias
quando o clã inteiro enchia o salão. Ele foi autorizado a
sentar-se ao lado de Ysenda quando o laird sentou-se entre
suas filhas. Mas Laird Gille não lhe deu atenção. Poderia ter
tido uma parede de milha-alta entre Caimbeul e seu pai.
Ainda assim, foi insensível por parte de Ysenda lembrá-
lo disso. Ela instantaneamente se arrependeu de suas
palavras.
Para corrigir e aliviar o humor novamente, ela deu a
Caimbeul uma piscadela conspiratória. Então, quando seu
pai não estava olhando, ela usou sua adaga para roubar uma
fatia de javali da trincheira do laird, deixando cair sobre o de
Caimbeul.

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Caimbeul sorriu e cavou dentro.


Ysenda não pôde deixar de sorrir de novo. Como alguém
podia ignorar o gentil humor nos macios olhos castanhos de
Caimbeul ― sua bondade, sua lealdade, sua natureza doce, ―
ela não sabia. Ela supôs que a maioria das pessoas nunca viu
além de seu corpo aleijado.
Chamá-lo de Caimbeul, que significava boca torta, tinha
sido educado. Para ser honesta, parecia que não havia um
osso em seu corpo que fosse reto. Suas costas estavam
encurvadas. Sua espinha tinha a forma de uma cobra se
arrastando. Seus quadris eram torcidos. E um ombro era
mais alto que o outro. Em cada ano que passou, sua
deformidade piorou, como se as garras cruéis de um dragão
se fechassem lentamente ao redor dele, deixando seu corpo
mais torcido e inútil.
A maioria das pessoas acreditava que seu cérebro
também estava torcido. Mas Ysenda sabia melhor. Ele podia
sofrer de abandono. Mas ele era brilhante, e possuía um
espírito irônico.
Infelizmente, seu pai considerou um desperdício
ensinar-lhe qualquer coisa. Ele disse que o rapaz morreria
jovem de qualquer maneira, então uma educação era inútil.
Para piorar as coisas, quando Caimbeul tinha doze anos
de idade sua mãe morreu na guerra, mortalmente ferida por
uma espada. Enquanto estava morrendo, fez Ysenda jurar
que cuidaria de seu irmão mais velho. Não foi uma tarefa
pequena para uma menina de nove. Mas Ysenda prometeu
que sim.

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Uma vez que sua mãe foi enterrada, contudo, as coisas


mudaram. O laird, envergonhado da enfermidade de seu
filho, expulsou o menino do castelo. Ele foi enviado para viver
em uma pequena casa coberta de palha no canto mais
distante da muralha externa.
Olhando para trás, Ysenda teve que admitir que
provavelmente tinha sido o melhor. Quando o laird estava de
mau humor e Caimbeul estava sob os pés, seu pai costumava
usar seus punhos, jogando sua frustração e raiva no rapaz.
No momento, no entanto, Ysenda sentiu que o exílio de
seu irmão era injusto. E desde que ela fez essa promessa à
sua mãe, não podia deixá-lo ir sozinho. Então, com o coração
partido ao pensar em perder tanto a mãe como o irmão mais
velho que adorava, Ysenda arrumou suas coisas
teimosamente, deixou o castelo, e mudou-se com Caimbeul.
Seu pai mal percebeu que ela saiu. Sua atenção foi
fixada em Cathalin, a única filha que lhe ofereceu esperança.
Cathalin era sua filha do meio, a bonita, aquela que se
casaria e herdaria o lugar do laird.
Ysenda fez tudo o que pôde para Caimbeul. Ela ensinou-
lhe o que sabia de ler, escrever e fazer contas. Ela o desafiou
a aprender sobre o funcionamento da casa e a parte de cada
um deles. Ela havia subornado os estudiosos visitantes para
tutorá-lo na história e na filosofia.
Caimbeul pode não ter sido abençoado com um corpo
poderoso. Mas havia muito poder no conhecimento.
E nas ocasiões em que ele precisava de defesa física, foi
Ysenda quem veio em seu socorro. Ela usava as habilidades

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de luta que sua mãe lhe ensinara. Muitos jovens rapazes


ganharam um olho preto ou uma canela ferida de ousar se
zombar do amado irmão de Ysenda. Alguns aprenderam sua
lição na ponta de sua espada.
Caimbeul empurrou-a com seu cotovelo ossudo,
enquanto ela lhe passava outra fatia de carne roubada.
― Ei. ― Ele acenou com a cabeça para a porta com um
sorriso largo. ― Eu acho que você tem um admirador.
Ysenda olhou para cima. Um homem alto, escuro e
bonito estava olhando para ela. Ele não estava vestido como
um highlander3. Ele usava um longo sobretudo azul escuro,
coberto por uma capa folgada marrom com cinto nos quadris.
Por sua capa com capuz, ele parecia ter acabado de chegar do
frio. Os flocos de neve estavam espalhados em seus amplos
ombros e em seu capuz.
Uma pitada de um sorriso tocou os lábios do homem,
alarmando-a. Mas não foi isso que a deixou mais
incomodada.
A verdade era que ela nunca o tinha visto antes.
Ysenda estava certa de que conhecia todos os rapazes,
moças e crianças do clã, bem como a maioria dos clãs
vizinhos. Ela se lembraria do rosto desse homem. Ele era
impressionante, construído como um guerreiro. Seu cabelo
era da cor do carvão. Seu olhar era intenso e firme o
suficiente para perfurar o ferro.
O que um estranho estava fazendo dentro do salão?
Ele baixou o olhar então, e ela examinou a sala.
3 Highlander – Homem das terras altas. Montanheses.

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Ele não estava sozinho. Meia dúzia de homens


desconhecidos estavam espalhados pelo salão.
Quem eram eles? E como diabos tinham entrado?

Sir Noёl de Ware amava a época do natal.


Não era só porque o feriado acontecia para marcar o seu
próprio nascimento, bem como o de Cristo. Ele amava tudo
sobre a temporada. Ele amava as creches da igreja e as
carolas no corredor. Ele adorava festejar com ganso assado e
beber vinho temperado. Sobretudo, ele adorava aconchegar-
se no clima invernal com uma mulher quente como um
incêndio.
Era por isso que ele estava infeliz.
Em vez de aproveitar a temporada de férias na França,
ele ficou preso aqui nas montanhas altas congeladas,
rastreando uma noiva relutante.
O Rei Philip prometeu-lhe uma esposa ― a garota mais
linda da Escócia, se o rumor fosse verdadeiro. Descendendo
das magníficas damas guerreiras de Rivenloch, ela era
herdeira de uma bela escocesa.
Mas ela estava atrasando-o com cartas e desculpas por
semanas agora.
Ela estava doente.
Ela estava visitando parentes.
A montanha era intransitável.

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O rio estava muito alto.


Ela estava sofrendo por uma cachorrinha perdida.
Enquanto isso, ele estava preso nas terras baixas,
aguardando a palavra de que poderia vir até ela.
Finalmente, perdeu a paciência. Estava cansado de
esperar pela moça decidir que ele merecia a companhia dela.
Parte do motivo do rei para lhe conceder uma noiva das
Highlands era garantir a contínua aliança entre a Escócia e a
França. O rei Philip recentemente havia feito a paz com o
inimigo da Escócia, a Inglaterra. Isso naturalmente provocou
um rumor de descontentamento entre os escoceses. O fato de
que essa noiva das terras altas em particular estava adiando
seu casamento, esticou não apenas a paciência de Noёl, como
colocou em risco a paz entre os seus países.
Então, por mais arcaico que parecesse, Noёl decidiu que
teria que exigir formalmente sua noiva.
Claro, ele não era um tolo. Os escoceses podem ser
aliados dos franceses. Mas os Highlanders eram de uma raça
diferente ― selvagem e imprevisível. Ele não podia se dar ao
luxo de ser pego com seus homens no norte congelado. Ele
trouxe apenas um punhado de homens com ele. Ele estava
mal equipado para fazer a guerra.
Então ele decidiu usar seu cérebro em vez de sua força
física.
Ele escolheu vir no feriado. Na época do natal, os
portões do castelo estariam abertos. O salão ficaria cheio de
pessoas. A bebida estaria fluindo. Os espíritos estariam

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elevados. Ninguém ficaria perturbado por alguns rostos


errantes entre o clã.
Uma vez que estivessem em segurança dentro, Noёl
anunciaria ao laird que ele não tinha podido suportar mais
um dia sem sua noiva. Com sorte, o gesto romântico
suavizaria o coração da noiva. Pelo menos, com todo o clã
como testemunha, isso dificultaria a sua recusa.
Até agora, as coisas tinham ido conforme o planejado.
Mesmo agora, ele e seus homens estavam se dispersando
pacificamente pelo salão lotado. Deixaram suas armaduras e
espadas fora dos portões. Não havia necessidade de parecer
hostil. Ainda assim, como medida de precaução, mantiveram
suas adagas perto da mão.
Ele observou o salão e decidiu que a moça sentada à
direita do laird deveria ser sua noiva.
Ela era tão adorável como ele tinha ouvido. Sua pele era
elegantemente pálida. Suas bochechas estavam
elegantemente rosadas. Seu cabelo avermelhado foi trançado
em um labirinto incrível que deve ter levado horas para fazer.
Seu queixo tinha uma inclinação orgulhosa. Seus lábios
coloridos estavam em um meio sorriso. O decote de seu
vestido revelava seios firmes e redondos. Seus olhos
esfumaçados com sutil e esquisito desejo enquanto bebia a
cerveja. Ela definitivamente viraria a cabeça, mesmo na
França, que estava cheia de beldades.
Então o olhar de Noёl dirigiu-se para a moça sentada no
lado esquerdo do laird. E seu coração tropeçou.

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Ele devia ter se enganado. Reconheceu, a primeira moça


era inegavelmente bonita. Mas a moça da esquerda foi feita
para tirar a respiração de um homem. Os rumores eram
verdadeiros. Ele nunca viu uma mulher mais bela... em
qualquer outro lugar.
Sua pele brilhava de saúde. Seus longos cabelos
castanhos, brilhando à luz das velas, caíam em ondas
simples e suaves sobre seus ombros. Ela tinha olhos grandes
e cativantes, um queixo pontiagudo e uma doce boca. A lã
macia de seu vestido cinza simples, parecia girar em torno de
seu pequeno corpo como a névoa das montanhas.
Ao observá-la, a moça roubou uma fatia de carne da
tigela de seu pai. Então, com um sorriso astuto, passou para
o homem ao lado dela.
O canto do lábio de Noёl se contraiu em diversão.
Parecia que sua noiva tinha uma série de traquinagens nela,
que lhe agradou.
Na verdade, enquanto observava a menina rebelde
continuar a roubar mais comida por debaixo do nariz de seu
pai, uma possibilidade interessante lhe ocorreu.
Noёl sempre esperara ter um casamento de conveniência
política. Como todos os nobres franceses, ele serviu como
peça de xadrez para o Rei Philip.
As alianças foram muitas vezes estabelecidas através de
casamentos estratégicos. O amor tinha pouco a ver com isso.
Ele tinha a mesma probabilidade de se casar com uma
mulher velha, quanto com uma simples filha de uma adorável
dama de sua idade.

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Saber que sua noiva era conhecida por sua beleza tinha
sido uma surpresa bem-vinda. Mas a idéia de que ele
realmente poderia gostar dessa nova e valente esposa? Isso
foi bastante intrigante.
Ele continuou olhando para ela até que ele chamou sua
atenção.
Mas, ao invés de retornar o sorriso amigável, seu sorriso
sumiu, e ela o encarou com suspeita.
Não desejando criar uma primeira impressão ruim, ele
rapidamente desviou os olhos. Quando ele olhou para cima,
ela deixou seu lugar na mesa e estava fazendo seu caminho
decidido em direção a ele.
Ele se endireitou e jogou para trás o capuz de sua capa,
preparado para dizer o que fosse necessário para garantir que
ele não deixasse as Highlands sem uma noiva. Nada poderia
prepará-lo, no entanto, para sua franqueza. Ou para seus
grandes, luminosos, reflexivos olhos cinzentos.
― Quem é você? ― ela murmurou em voz baixa em sua
língua gaélica enquanto o festejo continuava em torno deles.
― E o que você está fazendo aqui?
Noёl ficou surpreso por sua maneira destemida e direta.
A moça certamente não desperdiçou palavras. Nem pareceu
intimidada pelo fato de ele ser mais alto por quase um pé.
― Eu fiz uma pergunta. ― Ela disse com impaciência.
Ele lutou contra um sorriso. Que garota descarada ela
era. Noёl sabia falar sua língua, é claro. Mas era importante
que sua esposa soubesse falar francês. Por mais de cem anos,
desde a conquista normanda, a maioria dos ingleses e os

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escoceses das terras baixas falavam francês, e ele planejava


levá-la para a França. Então, por enquanto, ele se adiantou e
falou em Gaélico.
― Eu preferiria responder ao laird.
Ela levantou bem as sobrancelhas. ― De fato? E o que
torna tão certo que ele deseja falar com você?
― Por meu julgamento, ele não deseja, admitiu.
Ela franziu o cenho para ele. Mesmo aquela expressão
parecia adorável, como a cara franzida de um pequeno falcão.
Ele deu uma piscadela e confiou, ― Mas eu vou falar
com ele de qualquer maneira. ― Agora que seus homens
estavam dispersos em toda a multidão, ele clareou a garganta
para falar à aglomeração. ― Posso ter sua atenção, por favor?
Os músicos deixaram de tocar e o salão se acalmou.
Todos os olhos foram para ele. Laird Gille franziu a testa de
seu assento, parecendo muito com o pequeno falcão, antes de
bater o copo na mesa e se levantar.
― Quem é você, e o que significa isso?
Noёl observou seus homens, cujas mãos descansavam
sobre os punhos de suas adagas cobertas. Então ele deu ao
Laird uma saudação respeitosa.
― Meu laird, peço desculpas por interromper seus
prazeres. ― Disse ele. ― Eu sou Sir Noёl de Ware. Eu vim
reivindicar a noiva que me foi prometida pelo rei William da
Escócia e o rei Philip da França.
Ele sorriu e colocou uma mão sutilmente possessiva
sobre o ombro da adorável moça ao lado dele.

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― Eu não poderia esperar por mais tempo. Esperava que


minha chegada fosse uma surpresa bem-vinda no natal, para
Lady Cathalin.
Ysenda ficou rígida. Cathalin? Ele pensou que era
Cathalin? Como alguém poderia confundi-la com sua linda
irmã?
Da grande mesa, Cathalin ― a verdadeira Cathalin ―
ofegou.
Ysenda tinha ouvido fofocas sobre Sir Noёl de Ware, o
noivo de sua irmã mais velha, há algum tempo. Ele era um
nobre guerreiro francês. Ele queria levar sua irmã à França
para morar com ele em seu castelo. Após a morte de Laird
Gille, Cathalin retornaria à Escócia com Lord de Ware para
habitar o castelo e governar o clã.
Durante semanas, nem o pai nem Cathalin ficaram
felizes com o acordo. Verdade, houve uma aliança entre a
Escócia e a França. Mas Laird Gille não confiava nos
escoceses das planícies, muito menos em Normandos. Ele
queria um Highlander para herdar sua terra e título. E então
ele ignorou o comando do rei. Ele planejou casar
apressadamente Cathalin com um laird Highlander antes que
seu noivo normando chegasse.
Mas o Highlander ainda não havia chegado.
E o normando tinha.
E agora ele se enganou com Ysenda para sua noiva.
Ao ouvir o suspiro de Cathalin, Sir Noёl apressou-se a
tranquilizá-la.

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― Não há motivo para alarme, minha senhora. Eu


cuidarei bem de sua irmã, eu juro.
Ele olhou para Ysenda com carinho.
― Eu honrarei Lady Cathalin e a guardarei com a minha
vida.
Havia um silêncio incerto no salão.
Ysenda se afastou do cavaleiro. Isso não estava certo.
Sua irmã e seu pai podem não querer um casamento entre
Cathalin e Sir Noёl. Mas foi o que dois reis decretaram.
Ysenda não poderia fazer parte de tal fraude, uma fraude que
equivalia à traição.
― Tenho medo de ter cometido um erro. ― Disse ela ao
Normando. ― Eu não estou.....
― Filha! ― gritou seu pai.
Pela primeira vez em sua vida, Laird Gille envolveu um
braço companheiro em torno dos ombros de Caimbeul.
Caimbeul tinha uma expressão de esperança confusa em seu
rosto, como se seu pai tivesse percebido de repente que ele
tinha um filho a quem ele amava muito.
Somente Ysenda notou a adaga que pendia de forma
casual dos dedos do laird, a um centímetro da garganta de
Caimbeul. E não havia dúvida de que a ameaça brilhava nos
olhos de seu pai.
― Cathalin, querida, ― disse ele, dirigindo-se à Ysenda.
Ninguém no salão o corrigiu. Nem mesmo a própria Cathalin.
Ela apenas mordeu o lábio e olhou atentamente para a
cerveja.

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― Não é um erro. É o decreto do rei. E quão afortunada


é por seu noivo ter chegado no natal. Os dois terão uma festa
de casamento para um rei.
Ysenda piscou com descrença. O pai realmente
acreditava que ela poderia passar por Cathalin? O normando
não poderia ver que sua irmã era a bonita? Ela esperou que
alguém falasse, para dizer que tudo era uma brincadeira.
Mas ninguém fez. Ninguém queria contradizer o laird.
Caimbeul estava ciente agora de que seu pai segurava uma
faca na sua garganta. Ambos sabiam que se ele pronunciasse
uma palavra, o laird não hesitaria em torná-la a sua última.
Finalmente, sua irmã levantou-se e levantou a caneca,
dizendo:
― Parabéns, Cathalin, querida irmã. Ninguém é mais
merecedora dessa grande honra do que você. E ninguém
poderia estar mais feliz por você do que eu.
Os olhos de Ysenda se estreitaram. Sem dúvida. As
coisas não poderiam ter funcionado melhor para a irmã.
Parecia que Cathalin conseguiria o marido dos Highlanders
que ela e seu pai queriam. E Ysenda seria sacrificada ao
normando.
Pior ainda, ninguém no clã era corajoso o suficiente
para defendê-la. Ela estava sendo jogada aos lobos. E não
havia nada que pudesse fazer sobre isso.
Mas o que o pai pensava? Sir Noёl obviamente
concordou em se casar com Cathalin pelo título e a terra que
viria com ela. O que aconteceria quando descobrisse que ele

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também não herdaria? E o que aconteceria quando os dois


reis descobrissem que a sua aliança tinha sido sabotada?
Parecia que Laird Gille estava cortejando a guerra.
Aqui e ali, o povo do clã começou a aplaudir em
hesitantes parabéns. O laird acenou com a cabeça para os
músicos para retomar a música. Todo mundo voltou a comer,
a dançar e a se divertir, dando boas-vindas aos normandos
aos seus festejos. E seu pai acenou para Sir Noёl se
aproximar com um aceno de sua mão.
O Normando ofereceu a Ysenda o braço dele. Ela não
ousou recusá-lo, por medo de por Caimbeul em risco. Então
descansou o antebraço levemente sobre o dele.
Ela tentou não entrar em pânico. Certamente seu pai
não estava falando sério. Ele não desafiaria o rei. Certamente
ele casaria a verdadeira Cathalin com esse normando. Seu
orgulho de encontrar para sua irmã, um laird das Highlands
era apenas isso ― seu orgulho.
O laird não podia esconder a verdade de Sir Noёl para
sempre. Ele devia saber que no instante em que Ysenda
soubesse que Caimbeul estava seguro, ela confessaria ao
normando que ela não era sua verdadeira noiva. Afinal, era
muito melhor enfrentar a raiva de seu pai do que atrair a ira
de dois reis.
Além disso, ela raciocinou enquanto olhava de soslaio
para o cavaleiro que a acompanhava, sua irmã deveria estar
agradecida. Muitas alianças políticas foram feitas com
homens idosos. Pelo menos Sir Noёl era apto e bonito. Ele
tinha ombros largos e cabelos grossos e ondulados. Sua

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mandíbula era forte, e seus olhos escuros brilhavam com


vida. Ele até falou num gaélico perfeito.
Laird Gille estreitou os olhos para o normando.
― Então você é aquele que veio para o meu prêmio mais
precioso.
Sir Noёl olhou para Ysenda. A sinceridade terna em seus
olhos fez seu coração vibrar.
― Tenho a honra de tê-la confiada.
Laird Gille gargalhou com isso.
― Eu estava me referindo ao meu castelo.
Ele pegou seu copo de cerveja com a mão livre, aquela
que não estava segurando uma adaga no pescoço de
Caimbeul.
― Mas sim, eu suponho que minha filha também é um
prêmio que vale pena.
Ele tomou um gole, e um gotejamento espumoso
escorreu pela barba.
Sir Noёl sorriu para ela.
― Ela é ainda mais bonita do que eu imaginava.
A respiração de Ysenda parou. Ele não podia estar
falando sobre ela. Ele até mesmo olhou para sua verdadeira
noiva? Cathalin era impecável. Ao lado da rosa perfeita que
era sua irmã, Ysenda parecia um cardo comum.
Pela expressão amarga de Cathalin, ela não apreciou o
elogio. Que alguém louvasse os olhares de Ysenda enquanto
Cathalin estava na sala era impensável. Ysenda quase podia
ver o vapor sair das orelhas perfeitas de sua irmã.

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Mas, para ser sincera, foi agradável ter um homem


atraente olhando para ela com tanta apreciação. Ninguém já
olhou para a Ysenda assim antes. Ela se acostumara a se
esconder na sombra de sua irmã deslumbrante.
Claro, aquele olhar ensolarado no rosto do normando
desapareceria uma vez que ele soubesse que sua noiva veio
sem herança. Mas ela não ia dar-lhe as más notícias até
Caimbeul estar fora das garras de seu pai.
Enquanto isso, seu irmão franziu o cenho de frustração.
Ela podia ver que queria ajudá-la. Mas ele não se atreveu.
Um pedaço da faca, e ele não seria bom com ninguém. Seu
pai estava bebendo pesadamente. Ele podia fazer algo
insensato, algo explosivo, algo que ele não poderia desfazer...
― Por que esperar? ― o Laird berrou. ― Vamos ter o
casamento agora!
Curtiu isso.

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Capítulo 2

Sir Noёl não poderia estar mais satisfeito com a idéia do


laird. Preparando-se para uma elaborada cerimônia semanas
antes parecia uma perda de tempo para ele.
O noivado foi feito. O laird concordou com o casamento.
Já havia uma festa suntuosa na mesa. Por que não conseguir
fazer a ação?
Além disso, ele tinha visto o suficiente de sua noiva para
suspeitar que havia um corpo esplêndido sob toda aquela lã.
Quanto mais cedo o casamento, mais cedo a cama.
Então ele olhou para a noiva dele.
Um olhar de pânico puro encheu seus olhos prateados.
― Tão cedo? ― ela gritou.
Ele colocou a mão sobre a dela preocupada.
Obviamente, a pressa não a atraiu. Mas por que?
Certamente, estava preparada para ser esposa. Não
devia ser uma surpresa. Ela já conhecia o noivado por algum
tempo.
Ela não achou que ele fosse adequado?
Verdade, ele não era um Adônis de cabelos dourados.
Ele tinha algumas cicatrizes de batalha. E foi-lhe dito que, às
vezes, podia parecer feroz e ameaçador.

24
O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Mas ele era jovem e forte, capaz de defender a honra de


uma dama. E a maioria das mulheres o achava atraente o
suficiente.
― O que há de errado? ― ele perguntou gentilmente.
O laird respondeu por ela. ― Ah, ela é apenas uma noiva
ansiosa. Mais uma razão para torná-lo rápido, sim?
Sua noiva estava cada vez mais agitada. Mas ela não
conseguiu encontrar as palavras para explicar
adequadamente o porquê.
― Espera. Eu não sou... você não pode... isso não é...
senhor, por favor... você não vê só piora as coisas se você...
― Sir Noёl, eu deveria apresentar meus parentes. ―
Interrompeu o laird.
Ele virou-se para sua segunda filha, que estava sentada
inquieta ao lado dele.
― Esta é a irmã de Cathalin, Ysenda.
― Minha senhora, é uma honra. ― Noёl fez uma leve
reverência.
O laird balançou um braço em direção a um homem de
barba vermelha que parecia um urso.
― Esse é o filho da minha irmã, Cormac. ― Ele apontou
para uma versão menor de Cormac. ― E esse é Dubne, seu
irmão.
Ele acenou com uma mão em direção a três moças de
cabelos compridos que estavam sussurrando juntas.
― E esses pequenos anjos são suas filhas ― Bethac, Ete
e Gruoch".

25
O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

― Senhoras ― Noёl inclinou a cabeça. ― Cavalheiros.


Tenho o prazer de conhecê-los.
Ele perdeu a noção de todos os parentes. A maioria
deles era baixo e robusto. A maioria deles tinha cabelo
castanho avermelhado. E a maioria deles estava meio bêbado.
Finalmente, voltou sua atenção para o jovem ao redor de cujo
pescoço o braço do laird estava trancado e esperou uma
apresentação.
― E você?
― Este? Este é Caimbeul.
Noёl podia ver que havia algo errado com o rapaz. Seu
corpo estava tristemente deformado. Mas isso não era tudo. A
aflição afundava as sobrancelhas do jovem. Talvez fosse
porque o laird estava acenando com a adaga perigosamente
perto da garganta do homem.
― ― Caimbeul, -― repetiu Noёl.
― Senhor, -― o homem respondeu fortemente.
Antes que o laird pudesse continuar, sua noiva
interrompeu. ― Pai, por favor ouça-me. ― Suas palavras
derramaram-se como a superfície falsamente calma sobre um
rio turbulento. ― Eu acho que seria melhor se demorássemos
pelo menos até amanhã, então você concorda?
― Sem sentido, filha. ― O laird repreendeu. ― Você não
pode ver quão ansioso seu noivo está ao seu lado?
― Mas...
― E ele veio todo o caminho da França.
― Sim, mas...

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

― Não vou ouvir mais nada disso. É melhor você se


casar aqui e agora.
Então ele se virou até que estava quase nariz a nariz
com Caimbeul.
― Você não concorda?
A noiva de Nöel baixou a cabeça então. Mas não estava
em submissão. Seus olhos estavam falando loucamente,
como se estivesse tentando encontrar um estratagema
inteligente.
― Minha senhora? ― Noёl disse suavemente em francês.
― Este não é o seu desejo?
Ela ergueu os olhos. Possuíam todas as cores de um céu
de inverno, passando de peltre sinistro para cinza
tempestuoso e prata serena. Quão agradável seria olhar para
aqueles olhos todos os dias durante o resto de sua vida,
observando seus matizes e modos de mudança.
Então ela olhou de volta para o pai, que ainda tinha um
aperto possessivo sobre Caimbeul.
― Senhor, por favor. Não...
― Você fará o que eu digo, moça. ― O laird repreendeu.
― Você conhece seu lugar. Todos nós fazemos sacrifícios.
Olhe para a pobre Ysenda aqui. Mesmo que a rapariga
desagradável de alguma forma conseguir agarrar um
marido... ― Ele fez uma pausa, seus olhos cintilando, e Noёl
estava certo de que o laird devia estar brincando. A moça era
quase tão bonita quanto sua irmã ― mesmo quando ela
franzia a testa, como agora.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

― Esse provavelmente não será melhor do que um


pastor de ovelhas das Highlands. Mas você... será a esposa de
um senhor normando. Você será Lady Cathalin de Ware.
A noiva de Noël apertou a mão sobre ele agora,
afundando no músculo do antebraço.
― Mas senhor, o rei irá...
― Silêncio! Não vou ouvir mais! ― interrompeu seu pai
enquanto apertava o ombro do homem, abraçando-o mais
perto.
― Você deveria ser como Caimbeul. Ele sabe quando
segurar sua língua. Não é, rapaz?
Caimbeul baixou os olhos com raiva e vergonha. A mão
sobre o braço de Noёl apertou ainda mais.
Noёl não tinha certeza do que estava acontecendo.
Caimbeul se opôs ao casamento? O homem estava sentado ao
lado de sua noiva. Era possível que ele tivesse sentimentos
por ela? E ela corresponde esses sentimentos? Talvez ela
preferisse o rapaz escocês de cara doce, apesar de seu corpo
torto.
Surpreendido com as dores de ciúmes que o
atravessaram, Noёl de repente desejava arrancar a noiva
desse lugar. Ele não gostou da idéia de mais ninguém desejar
sua esposa.
Ele também não gostou de Laird Gille. Não gostou do
fato de ele estar irresponsavelmente bêbado. Não gostou da
maneira como ele cortou sua filha. Ou como ele estava
agarrando Caimbeul. Na verdade, até que o laird morresse e

28
O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

entregasse seu título, Noёl ficaria tão longe quanto possível


das Highlands.
Mas, para o seu próprio espanto, mais do que tudo,
queria agradar a sua noiva.
Ele falou apenas para seus ouvidos.
― Minha senhora, alguma coisa está errada? Você me
acha repulsivo? Você está com medo de mim? Não vou forçá-
la, eu prometo.
Então ele pensou em outra coisa.
― Você está com medo da noite de núpcias? É isso?
Ele voltou a ver esse cálculo em seus olhos, como se
estivesse limpando o trigo da palha. Ela se virou para ele com
nova determinação.
― Sim, ― ela decidiu. ― É isso aí. Tenho medo da noite
de núpcias.
Havia agora uma luz ansiosa nos olhos dela, enquanto
apertava a manga nas duas mãos.
― Se você prometer não deitar comigo hoje à noite, eu
vou até o fim com o handfasting4.
Ela estava escondendo algo. Ele podia ver isso.
Duvidava que a intrépida garota tivesse medo de alguma
coisa. Mas, embora sua noção não lhe agradasse ― já seu
corpo agitou-se com desejo por ela ― se fosse o que queria,
supôs que poderia esperar outro dia.
― Como você desejar. ― Disse ele.

4Handfasting – É uma cerimônia ancestral pagã de união entre duas pessoas. Ato de
unir as mãos dos noivos em um laço

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Ysenda suspirou aliviada. Ela ganhou um dia. Nenhum


handfasting era oficial até que fosse consumado. Esperava
que, na manhã seguinte, quando seu pai estivesse sóbrio,
perceberia o grave erro que havia cometido e iria corrigi-lo. A
sua falsificação de um casamento seria anulada, e Cathalin,
a verdadeira Cathalin, tomaria seu lugar como noiva de Noёl.
Parte dela não estava feliz com isso. Já podia dizer que
Sir Noёl era muito bom para a irmã. Cathalin era egoísta e
mimada, acostumada a seguir seu caminho. Noёl era
atencioso, nobre e educado. Ele provavelmente tentaria
acomodá-la, e ela acabaria por deixá-lo destruído.
Cathalin nunca apreciaria sua gentileza. Ela estava
acostumada com os Highlanders contundentes que tomavam
o que queriam. Ela provavelmente confundiria a bondade de
Noёl com fraqueza e o depreciaria a cada momento.
Era uma pena. Mas Ysenda não podia dizer nada sobre
isso. Ela era a filha mais nova, sem poder e sem voz.
Seu pai ainda tinha uma adaga na garganta de
Caimbeul. Ele obviamente não esperava que Ysenda aceitasse
a cerimônia de bom grado.
Mas agora que tinha a promessa do normando ― e ela
confiava na palavra de um nobre cavaleiro ― ela sabia que
estava segura, pelo menos por esta noite. Então, obrigada por
seu pai, ela recitaria os malditos votos do handfasting.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

A cerimônia seria breve, sem dúvida mais breve do que


os luxuosos casamentos da França. A religião tinha pouco
uso para os escoceses, que não tinham paciência para a
aprovação da igreja quando se tratava de casamentos. O
matrimônio era realizado simplesmente por consentimento
mútuo.
Os homens de Sir Noёl fizeram uma formidável
apresentação quando se juntaram ao redor dele. Eles eram
grandes e poderosamente construídos. Sua maneira era grave
e protegida. Ysenda pensou que eles pareciam prontos para
desembainhar e lutar se alguém levantasse o olhar para eles.
Ela não tinha certeza do porquê, mas isso lhe deu um
estranho conforto.
Sir Noёl trouxe o acordo de casamento com ele. Um de
seus homens o desdobrou pela mesa entre o veado assado e o
carneiro defumado, junto com uma pena e tinta. Sir Noёl
escreveu sua marca no documento, assim como Laird Gille.
Ysenda engoliu em seco. Os pesados rabiscos pretos no
pergaminho fizeram o casamento parecer muito real... e
permanente.
Antes que a tinta estivesse seca, Laird Gille estava na
mesa para presidir o rito, e o salão novamente silenciou.
― Juntem suas mãos direitas, -― ele dirigiu.
Sir Noёl encarou-a e agarrou a sua mão direita, que se
sentiu insignificante dentro da dele. Ela podia sentir os calos
na sua mão, marcados pela espada de um guerreiro
experiente. Sua palma era quente e seca. Ela temia que a sua

31
O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

estivesse suada. No entanto, havia algo reconfortante em seu


aperto.
― Aqui, -― ofereceu sua irmã, puxando uma longa fita
escarlate de seus cabelos e passando para a frente. ― Para
celebrar.
Seu pai envolveu a fita em torno de suas mãos juntas,
amarrando-a frouxamente.
Então ela ergueu o rosto para olhar para o noivo dela.
Ela ficou surpresa. Na luz baixa, ela supôs que seus olhos
sombreados eram castanhos. Mas, ao aproximar-se dele, ela
podia ver que eles eram realmente azuis ― um azul tão
profundo como o oceano, tão escuro como a noite que cai. Por
um momento, ela apenas olhou para ele, perdida no céu de
seu olhar.
E então, ela viu que estava esperando insegura
enquanto o silêncio se arrastava.
― Diga seus votos, rapaz, -― exclamou Laird Gille.
Um pequeno sulco se formou entre as sobrancelhas de
Noёl. Ysenda percebeu que ele não conhecia os votos para um
handfasting. Provavelmente não tinham tal coisa na França.
Era sua vez então.
Com voz tremendo, começou. ― Eu, Lady Ysen... ― Calor
inundou suas bochechas enquanto reconhecia seu erro. Ela
tossiu para cobrir o erro, sussurrando para Noёl, ― Perdoe-
me. Estou um pouco ansiosa. ― Então ela limpou a garganta
e começou de novo. ― Eu, Lady Cathalin Gille, Dama de
Rivenloch, tomo, Sir... Noёl de Ware... para o meu marido, até
que a morte separe você e eu. E eu juro por minha vida.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Ela engoliu. Isso não foi tão difícil. E, no entanto, essas


palavras simples tinham um peso tão grande.
Sua voz parecia muito mais segura do que a dela.
― Eu, Sir Noël de Ware, tomo, senhora Cathalin Gille,
Dama de Rivenloch, como minha noiva...
“Para minha esposa casada" ― ela corrigiu em um
murmúrio.
― Para minha esposa casada... até que a morte... vem...
Ela lutou contra uma risada. -― Até que a morte separe
você e eu...
― Até que a morte separe você e eu.
― ― E a isso eu juro por minha vida, ela sugeriu.
― Sim, -― disse ele, terminando com um sorriso
triunfante. ― E a isso eu prometo a minha vida.
― Está feito então, ― seu pai disse com satisfação,
aplaudindo o fato com as mãos.
Ysenda quase não o ouviu. Sua atenção estava retida no
homem diante dela ― o homem que de alguma forma,
improvável, acabou de se tornar seu marido. Um brilho
quente brilhava em seus olhos. Seu sorriso era cativante. E o
polegar que ele passou suavemente sobre o topo de suas
mãos juntas, enviou um curioso formigamento através de
suas veias.
O laird levantou uma caneca de cerveja em saudação, e
o clã seguiu com saudações.
Mas Noёl não havia terminado. Levantou a mão para o
homem à sua esquerda, que colocou um anel de ouro na
palma da sua mão. Desatando a fita para libertar sua mão,

33
O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Noёl então, gentilmente, deslizou o anel para o terceiro dedo


de Ysenda.
Ela olhou para ele. Era pesado, esculpido com a figura
de uma cabeça de lobo.
― É o grande Lobo de Ware, ― ele disse a ela.
Ela mordeu o lábio, com as sobrancelhas franzidas em
preocupação. O anel estava solto no dedo. Esperava que não
escorregasse, que não o perdesse, pois pertencia
legitimamente a Cathalin.
Ele inclinou a cabeça para murmurar:
― Eu prometo, minha senhora, que a partir deste
momento, você terá a proteção do Lobo.
Por um momento tolo, ela desejou que isso pudesse ser
verdade. Não se importaria de ter um exército de ferozes
cavaleiros do lobo a seu alcance, para chamar.
Ela deu-lhe um sorriso vacilante, que ele retornou com
um sorriso largo que fez seu coração pular. Mas esse era o
marido de Cathalin, não o dela. E parte dela ardeu de inveja
com essa verdade.
Ele ainda estava apertando os dedos da mão direita
quando levantou a mão esquerda para afagar sua bochecha.
Ele inclinou a cabeça para cima, dominando o olhar dela.
Seus olhos escuros a provocaram como um carvão ardente.
Ela teve dificuldade em respirar. Seu polegar roçou o canto de
sua boca, persuadindo seus lábios a abrir. Em um instante
sensual, ela deixou sua mandíbula relaxar enquanto seus
olhos baixavam para sua boca tentadora.
Ele a beijaria. O noivo de Cathalin ia beijá-la.

34
O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Ela deveria ter parado ele. Mas teve que jogar fora esta
ideia, pelo amor de seu irmão.
Pelo menos foi o que disse a si mesma quando ele
diminuiu a distância.
Mas não era completamente verdade.
Ela queria ver o que seria beijar um homem. E queria
fingir, mesmo que por um momento, que fosse tão
merecedora e desejável quanto sua irmã.
Quando ele tocou seus lábios nos dela, o clã animado
pareceu desaparecer. Havia apenas os dois, conectados por
suas mãos juntas e suas bocas ansiosas. Seus olhos ficaram
fechados. Seu leve suspiro em sua bochecha enviou uma
corrente de prazer que a atravessou.
E então ele se inclinou mais perto, aumentando a doce
pressão.
Ela esperava, por sua formidável aparência, que seu
beijo fosse áspero e agressivo. Mas o guerreiro, de alguma
maneira, reprimiu sua força. Seus lábios eram macios, ternos
e habilidosos. A ponta dos dedos gentilmente acariciou a
carne sensível sob sua orelha, fazendo-a estremecer.
Ao beijá-la, entrelaçou os dedos da mão direita com a
dela e a aproximou, até que suas mãos emaranhadas
formaram um nó de amantes entre seus corações. Ysenda
sentiu-se como cera de vela quente, derretendo-se nele. Seu
coração bateu vigorosamente contra suas costelas. Um
gemido calmo e alegre soou em sua garganta enquanto
inclinava a cabeça para aprofundar o beijo.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Noёl nunca quis que o beijo acabasse.


Foi louco ― a atração forte e inexplicável que sentiu por
sua nova noiva. Seu coração estava batendo. Sua boca era
voraz. Ele não se atrevia a refletir sobre o que estava
acontecendo abaixo de seu cinto.
Ele supôs que deveria retirar-se em breve. Nem sequer
sabia se os beijos públicos eram adequados entre os
Highlanders. No entanto, não conseguiu se livrar.
Lady Cathalin era irresistível. Suave e doce, jovem e
adorável, apaixonada e disposta.
Ela era o melhor presente de natal que ele já havia
recebido.
O que fez para merecer um tesouro que não conhecia?
Mas ela era dele agora.
E não planejava deixá-la ir.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Capítulo 3

Demorou até que se encerrasse as provocações e


empurrões entre seus homens e o clã. Mas quando Noel,
quente e sem folego, olhou para sua noiva, esta parecia tão
atordoada quanto se sentia.
Suas bochechas estavam coradas. Seus olhos prateados
estavam dilatados de desejo. Erguendo seus dedos trêmulos
em seus lábios rosados. Se não a tivesse segurado pela mão,
poderia ter cambaleado para trás em uma surpresa
atordoada.
Este pensamento lhe deu imenso prazer, curvando o
canto de seus lábios enquanto olhava para ela. Ele lutou
contra o poderoso desejo de levá-la através das escadas e
reivindicar seus direitos de marido imediatamente.
Mas havia prometido não fazê-lo, não esta noite. E se
houvesse algo que melhor definisse os Cavaleiros de Ware
mais que seu saudável apetite por mulheres, era sua honra.
Então lidando com a fera em suas calças, recuou com
respeitoso aceno de cabeça.
― Coma! Beba! ― o laird encorajou. ― Você precisará de
força esta noite meu rapaz, para que possa empunhar sua

37
O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

brava claymore5. ― O laird fez um gesto desagradável que


causou um rugido de risadas estridentes, fazendo com que
sua nova noiva corasse.
Noel, com uma súbita onda de proteção, cerrou o
maxilar. Ninguém, especialmente o próprio pai, deveria falar
tão grosseiramente na frente de uma senhora.
Porém, desejando não embaraçá-la mais, não desafiaria
o laird por sua falta de cortesia. Entretanto, estava mais
inclinado a pegar sua esposa e seus homens e deixar seu teto
de uma vez.
Se concentrou em orientá-la sobre seu lugar à mesa,
acomodando-se entre ela e seus pai, de onde poderia protegê-
la da vulgaridade do laird bêbado. A última coisa que uma
noiva assustada precisava, era mais combustível para o medo
dela.
E mais demora.
Noel pode ter concordado em adiar a consumação do
casamento por um dia, mas mais do que isso seria testar as
fronteiras do razoável. Ele queria chegar em casa. Além disso,
se sua esposa realmente mantivesse sentimentos por aquele
jovem, Caimbeul, era melhor que isto terminasse da forma
mais rápida e limpa.
Entretanto, ele sabia que não poderia sair até que seu
casamento fosse oficial. Então, pretendia empregar seus
consideráveis poderes de sedução para garantir que ainda na

5É uma variante escocesa da espada medieval montante utilizada durante os séculos


XV e XVI.

38
O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

noite seguinte, tivesse em sua cama uma noiva muito


disposta.

Ysenda ainda estava cambaleando por aquele beijo de


tremer o chão, quando Caimbeul inclinou-se para ela,
claramente chateado.
― Oh, irmã, por que? ― ele mumurou em desespero. ―
Por que teve que fazer isso? Por que teve que concordar em
casar com ele?
Ela apoiou uma mão reconfortante no antebraço do
irmão.
― Caimbeul, eu não podia deixar que o ferissem.
Ele parecia miserável. ― Eu preferiria morrer a deixar
que se casasse com um estranho.
― Tudo ficará bem, você verá, ― prometeu em um
murmúrio, esperando que estivesse certa. ― O normando
prometeu não me tocar esta noite. O handfasting não se
perpetuará. Amanhã papai perceberá o erro de sua conduta.
Ele vai perceber que não pode desafiar o rei. E isso tudo será
desfeito antes que você possa piscar os olhos.
Caimbeul não parecia tão convencido, especialmente
quando lhe olhou por ela para Sir Noel. Mas ele assentiu.
― Prometa-me que não o deixará tocá-la.
Deu a ele um sorriso conspiratório. ― Eu vou dormir
com uma adaga em minhas mãos.

39
O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Mas Caimbeul não retornou seu sorriso.


No momento seguinte, sua atenção foi atraída pelos
homens de Noel. Como que por magia, eles trouxeram um
barril de vinho. Noel disse que era o melhor Bordeaux, e que
ele desejava compartilhar com seu novo clã.
Ysenda estava impressionada, tanto pelo gesto quanto
pelo vinho. Ela nunca havia bebido vinho antes. Nas
Highlands, eles bebiam cidra, cerveja, e em ocasiões
especiais, hidromel.
Noel encheu um copo para os dois compartilharem. Ela
tomou um gole do liquido cor de rubi. Era claro, suave e
doce. Mas também bastante forte.
Entregando o copo de volta a Noel, este colocou as mãos
sobre as dela para beber, as palmas calosas estavam quentes
sobre seus nódulos, fazendo com que sentisse o calor viajar
ao longo de seus braços, sua garganta e seu rosto.
Talvez o vinho fosse mais forte do que pensava.
A olhou enquanto bebia, com os olhos azuis meia-noite
brilhando de puro deleite.
Depois que afastou o copo dos lábios, ainda restava uma
gota do liquido vermelhos sobre eles e Ysenda lutou contra
um selvagem desejo de roubá-la com um beijo. Felizmente,
ele a lambeu antes que pudesse fazer algo tão imprudente.
Sua mão ainda envolvia as dela, e ela não estava com
desejo algum de retirá-las.
― Você gostou? ― ele murmurou baixando o olhar
enevoado para seus lábios.
Engoliu em seco. ― Sim.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Seus lábios se curvaram em um sorriso irônico. ― Você


gostaria de mais?
Oh, sim, pensou, olhando sua deliciosa boca. Gostaria
de muito mais. Mais de seus sorrisos... Mais de seus beijos...
Mais...
― Cathalin? ― ele chamou.
Ela piscou, então assentiu, assustada com o estranho
nome e mais com a rapidez com que seus pensamentos se
desviaram.
Não os deixou vagar. Esse era o marido de sua irmã
Cathalin, não o seu, não importa quais votos tenham trocado.
Faria bem em se lembrar disso.
Tentando silenciar suas sérias intenções, bebeu seu
segundo copo de vinho.
Noel riu espantado. ― Vejo que você gosta. ― Curvou a
sobrancelha em aviso. ― Mas cuidado, moça, é um pouco
mais forte do que está acostumada.
Ela lambeu os lábios. Parecia que sua pele crescia em
quentura.
Ele encheu o copo pela terceira vez, dando-lhe uma
piscadinha que fez seu coração acelerar.
Sua irmã teve muita sorte, só esperava que Cathalin
percebesse isso.
Ysenda olhou-a. De alguma forma, apesar das
sobrancelhas erguidas e do sorriso matreiro, Cathalin
continuava linda. Ysenda perguntou-se se alguma vez
pareceu feia.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Suspirando, baixou os olhos para o vinho. Seu pai tinha


razão em uma coisa. Uma de suas filhas provavelmente se
casaria com um pastor. E não seria Cathalin.
― Você não está satisfeita, cherie6? ― Noёl perguntou.
Cherie. Chamou-a de cherie. E de alguma forma parecia
ser sincero.
Droga! Não era justo que a exigente Cathalin ganhasse
tal prêmio. Homens como ele mereciam ser amados e
adorados, não desprezados. Sentia muito pelo cavaleiro nobre
e doce.
― Estou bem, ― assegurou a ele, tocando institivamente
seu peito com amabilidade. Quando percebeu o que tinha
feito, tentou puxar a mão para trás, porém ele a pegou e
apertou-a contra o peito, sobre o coração.
― Eu sou seu, cherie, coração e alma, deste dia em
diante.
Talvez tenha sido o vinho, mas suas palavras trouxeram
lagrimas a seus olhos. Como ela queria que aquilo fosse
verdade. E como queria que pudesse continuar com essa
promessa para sempre.
Apertou suavemente sua mão. ― Eu não quero nada
mais do que fazê-la feliz.
Seu coração se derreteu. Inferno. Sua irmã iria acabar
com esse pobre homem.

6 Querida.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Noel assustou-se ao perceber que o que dissera era


verdadeiro. Queria agradar sua nova esposa. Desejava ver
seus encantadores olhos cinzentos acenderem com alegria e
seus lindos lábios rosados se alargarem em um sorriso.
Não era o tipo de homem que acreditava em amor à
primeira vista, mas havia algo em sua noiva que o enfeitiçava.
Enquanto isso, ela já estava esvaziando seu terceiro
copo de vinho com uma pressa surpreendente, como um
guerreiro que se preparava para a batalha. Ele temia que
garotas que bebiam para o esquecimento não fossem
cuidadosas.
Pegou suavemente o copo vazio e colocou sobre a mesa.
Talvez um pouco de ar fresco ajudasse a clarear a cabeça;
― Gostaria de sair? ― sussurrou.
― Sair?
― Lá fora.
― Já é noite. ― Sua testa enrugou. ― É inverno.
― Você não me parece tão frágil para se ater diante de
um pouco de escuridão e neve. E além disso eu tenho um
manto que pode nos manter aquecidos.
Seus olhos brilharam como se houvesse proposto uma
aventura proibida.
Sem esperar por sua resposta, pegou sua mão e
inclinou-se em direção à porta. ― Vamos.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

A maioria do clã estava muito distraída para notar sua


saída. Caimbeul, por outro lado, teve o cenho franzido para
eles. Noel deu a ele um aceno de cabeça em reconhecimento à
sua desaprovação. Mas nada o impediu de pegar a mão de
sua noiva e sair de qualquer jeito pela porta em direção à
noite.
O ar estava puro e frio. A neve tinha parado de cair. O
chão estava coberto de branco como linho. Noel girou sua
capa de lã para que cobrisse os ombros de sua noiva,
enquanto entravam no pátio.
Ela hesitou, olhando para seus pés. Notou que ela
estava usando sapatos macios, apenas para o grande salão.
Sem hesitar, ele a puxou para seus braços. Ofegando, se
agarrou a ele como se temesse que fosse deixa-la cair, porém,
ela não pesava mais que sua mala. Ele atravessou facilmente
o pátio, além das dependências alinhadas contra as
cavidades dos muros. Suas botas afundaram na neve recém
caída.
― Suponho que seja difícil pensar em deixar o lugar de
seu nascimento, ― ele disse. ― Mas penso que gostará da
França. E podemos voltar aqui de vez em quando, se quiser.
― Isso é muito gentil.
Ele sorriu. ― Então diga-me, o que devo saber sobre esta
terra que devemos herdar?
Noel sabia que os moradores das Highlanders tinham
costumes curiosos. Um deles era que a filha mais velha
poderia herdar as terras e se tornar o laird de direito. Seus
irmãos estremeceram com o pensamento. Eles avisaram, por

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

muito tempo, que mesmo que sua noiva estivesse usando


trapos, ele seria forçado a fazer a corte.
Mas a ideia não o incomodava, ele admirava mulheres
capazes. Na verdade, estava ansioso para compartilhar as
responsabilidades da exploração, especialmente porque ele
sabia muito pouco sobre a vida no clã.
― A terra? ― Ela enrugou a testa com o pensamento. ―
Bem… séculos atrás, foi estabelecida pelos vikings.
― Vikings? Invasores?
― Não. Eles eram pacíficos o suficiente. Vieram mais
para construir casas. De fato, muitos dos meus antepassados
tiveram descendência viking.
― Eu imagino.
― Pouco resta de seu assentamento agora, apenas
algumas pedras aqui e ali.
― E sobre a terra? Ela gera provisões?
― Sim, há peixes no lago e caça na floresta suficiente
para manter o clã durante todo o inverno. Também
mantemos ovelhas, gado e galinhas. E nós semeamos aveia e
cevada. Quando chega o verão, há frutos silvestres em todos
os lugares. ― Ela se descontraiu um pouco ao falar do verão,
relaxando contra seu peito.
― Eu gostaria de ver o verão.
― É uma época bonita, os campos estão repletos de
grama verde e flores silvestres. ― Então, um vinco tocou sua
sobrancelha. ― Embora eles também estejam cheios de
mosquitos.
Ele riu. ― Qual o seu lugar favorito?

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

― Meu favorito? ― Ela refletiu por um momento. ― O


poço viking, eu suponho.
― O poço?
― É uma antiga ruina de pedra, mas alguns dizem que é
encantada.
Noel sentia-se encantado. Sua noiva se acomodou em
seus braços como se tivesse sido feita para eles. Sua voz era
suave e atraente. Seu corpo sentia-se quente e acomodado
contra o dele. ― Encantado? E por que isto?
― De acordo com a lenda antiga, dois amantes se
esconderam no poço para evitar seu casamento. Uma
tempestade surgiu, e os amantes se afogaram. Eles foram
amaldiçoados para viver separados na vida após a morte. Mas
é dito que, na época do natal, se dois amantes amarrarem os
cabelos, de forma que pesem, e os jogarem no poço, os
espíritos dos que se afogaram os abençoarão com magia,
unindo suas almas pela eternidade.
― Então é assim? ― Noel não acreditava em magia. Tudo
o que ele ganhou, ele ganhou não por magia, mas pelo suor
de sua testa. Ainda assim, ele não queria diminuir seus
espíritos. ― E a lenda é verdadeira?
Ela suspirou. ― Eu não saberia.
― Talvez devêssemos ir e tentar.
Ela enrijeceu em seus braços. ― Agora? ― Ela limpou a
garganta. ― Não, está tarde. E também é muito longe. Pode
haver lobos perto.
Noel conhecia uma desculpa quando a ouvia. Podia ter
se apaixonado por sua noiva em um instante, mas isso não

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

significava que ela compartilhasse seus sentimentos. Ele


precisaria ter paciência e ganhar suas afeições com tempo.
― Talvez no dia seguinte? ― perguntou.
― Possivelmente.

Ysenda sabia que deveria estar com frio. O ar estava


gelado. As nuvens eram grossas. Havia um pó de neve em
todos os galhos das árvores. Mas ela se sentiu
agradavelmente aconchegante, mergulhada nos braços do
cavaleiro, envolta em sua capa, aconchegada contra seu peito
firme.
Ela podia sentir o rubor em suas bochechas. Se era do
Bordeaux ou do fato de que um homem bonito a estava
carregando pelo pátio, ela não tinha certeza.
Mas quando de repente sucumbiu ao desejo irracional
de roubar um beijo, ela culpou o vinho.
Aconteceu em um instante. Em um momento, eles
estavam falando razoavelmente, discutindo a história e os
recursos da terra. No próximo, ela se ergueu pelas bordas de
sua capa e apertou os lábios nos seus.
Apesar de surpreendê-lo, ele respondeu com uma calma
equilibrada. Então, como se ela não fizesse nada
desagradável, ele a beijou de volta.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Depois disso, Ysenda, sabendo muito bem que não tinha


o direito de fazê-lo, não colocou nenhuma reprimenda sobre
ele, tomou sua cabeça entre as mãos e aprofundou o beijo.
O calor líquido de suas línguas emaranhadas parecia
derreter a noite gelada. Suas fervorosas respirações se
misturaram, fazendo névoa branca contra o preto da noite.
De repente, suas mãos estavam agindo por vontade
própria. Seus dedos percorreram seus ombros largos,
acariciaram as linhas de seu pescoço e emaranharam-se
sobre as espessas madeixas de seus cabelos.
Ele a aproximou. As pontas de seus dedos pressionaram
suas costas. Boca contra boca, em uma degustação de vinho
e luxúria. E ela gostou do sabor.
― Ah, mon dieu, cherie, 7 ― suspirava entre beijos.
Enquanto eles continuavam se deleitando, ele inclinou-
se sobre seu corpo, deixando-a escorregar para pousar sobre
suas botas. Ele tomou sua cabeça com ternura em suas
mãos, inclinou o queixo, roçando os polegares pelos cantos de
sua boca. Então puxou seu lábio inferior entre os seus,
sugando suavemente.
Através de uma névoa de desejo, ela sentiu seus dedos à
deriva por sua garganta e seu peito. Enquanto apertava-a por
trás de sua cabeça em uma mão, a outra se desviou pelo
decote de seu vestido. Quando mergulhou sob o tecido, ela
estava muito delirante de desejo para recusá-lo. E quando
sua mão se fechou sobre seu seio nu, ela sugou uma
respiração cheia de admiração pela sensação divina.
7 Ah, meu deus, querida.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Deveria ter empurrado-o para longe. Deveria tê-lo


chutado. Se estivesse no controle de seus sentidos, ela o teria
empurrado para um banco de neve para esfriar seus dorsos.
Mas não o faria.
Tudo o que podia fazer era flutuar em um navio celestial
de luxúria, sem saber ou se importar por onde ela navegava.
― Ah, mon amour, 8― murmurou contra sua boca. ― Devemos
entrar.
Ela assentiu. Qualquer coisa que a afastasse desse lugar
louco e perigoso seria uma escolha sábia. Uma vez que eles
estivessem dentro, certamente a razão prevaleceria.
Ele deu a seu seio uma última carícia. Então a pegou e a
levou rapidamente para o castelo.
Por sorte, ela poderia culpar seus lábios e bochechas
coradas pelo frio, embora ninguém tenha prestado atenção ao
casal quando entraram. Todos estavam ocupados demais
inebriados pelo Bordeaux.
O seio de Ysenda ainda doia onde Noel a tocou. Mas seu
vestido estava bem colocado, tinha verificado três vezes para
ter certeza.
Sir Noel se desculpou por um momento para conversar
com seu pai. O laird apontou a escada em direção ao quarto
de Cathalin, e Noel assentiu.
Ysenda engoliu em seco. Isso não seria fácil.
Seu irmão olhou para ela, como se ele pudesse ler sua
mente.
Ela olhou para trás.
8 Ah, meu amor.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Ele balançou sua cabeça.


Ela mostrou a língua.
Infelizmente, Noel virou naquele momento e a pegou no
gesto infantil. Ela rapidamente retirou a língua, mas não
antes que seu rosto se separasse em um sorriso.
Ela esperava que sua fuga para a cama passasse
despercebida. Mas não era para ser. Quatro franceses se
reuniram com grande pompa para carregar Noel nos ombros.
E antes que pudesse protestar, mais dois a levaram. Com o
clã torcendo em uma cena barulhenta, o casal foi carregado
pelas escadas e depositados antes do quarto de Cathalin.
Noel abriu a porta. Ysenda, não querendo arriscar mais
humilhação, apressou-se. Contava com a sorte que seus
homens não se aproximassem dela para dar boas-vindas no
quarto de dormir. Noel acenou um boa noite para os
celebrantes e fechou a porta.
O quarto estava escuro. Enquanto ela estava ao lado da
porta, ele retirou o manto e foi em direção à lareira, usando o
fósforo na parede para acender o fogo. Depois, ele colocou
alguns pedaços de madeira para manter o fogo.
Passou algum tempo desde que Ysenda esteve neste
quarto. Vivendo em sua cabana, ela havia esquecido como o
castelo era luxuoso. A cama de madeira esculpida estava
equipada com um espesso colchão de penas e coberta por um
dossel de brocado azul ao fundo. Um pesado baú contendo os
vestidos de Cathalin se encontrava no chão. Uma grande
mesa de cavalete de madeira estava posta contra uma parede.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Seu topo estava cheio de frascos e frascos de óleos, pós e


poções que Cathalin usava para manter sua beleza.
A janela estava fechada no momento. Mas ela sabia que
proporcionava uma visão magnífica do prado distante e da
floresta onde o velho poço viking estava, porque uma vez esse
quarto também pertenceu à Ysenda.
Enquanto ela estava perdida em seus pensamentos,
Noel apareceu atrás dela. Quando suas mãos se acomodaram
levemente em seus ombros, ela saltou.
Ele riu. ― Não queria assustar você, moça.
― Não estou com medo,― ela zombou. Não era a
verdade, mas mostrar medo nunca foi sábio. Pelo menos era o
que a mãe guerreira lhe ensinara.
Ele deslizou as pontas de seus polegares ao longo da
parte superior de seus ombros. ― Estou começando a
suspeitar que você não tem medo de nada.
Ele estava errado sobre isso. Nesse momento, ela estava
apavorada consigo mesma.
― Você me fez uma promessa, ― lembrou sem fôlego. ―
Eu confio que seja um homem de palavra.
― Eu sou um Ware, ― ele disse, como se isso devesse
explicar tudo.
Então, ele a virou nos braços para encará-lo, segurando-
a no seu olhar indagador. ― Mas você sabe que só pode me
dobrar por enquanto. Eu sou seu marido agora. Amanhã, não
vou aceitar um não como resposta.
Ela assentiu. Suas exigências eram perfeitamente
razoáveis. Mas amanhã, tudo seria resolvido. E, amanhã à

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

noite, no mesmo quarto, ele reivindicaria seus direitos de


marido ... com sua irmã.
A ideia virou o estômago.
Seus olhos baixaram para sua boca. Não podia suportar
o pensamento de Cathalin beijando Noel. Sua irmã pirralha
não merecia envolver seus braços ao redor de seu pescoço,
para provar seus lábios doces.
Enquanto ela continuava a olhar, sua boca curvou-se
em um sorriso lento e malicioso. ― Vamos com isso.
― O que?
― Beije-me.
― O que?
― Eu posso ver que quer fazê-lo.
Nervosa, deu um pequeno aceno com a cabeça.
― Vamos lá, ― instigou, cruzando os braços sobre o
peito. ― Eu nem vou te beijar de volta.
Beijá-lo novamente seria um erro. Ela sabia disso. No
entanto, baixou o olhar para a boca, considerando a ideia.
― Vamos, moça. Não posso esperar para sempre, ― ele
provocou.
Por outro lado, este pode ser o último beijo que ela irá
conseguir ... pelo menos até ela se casar com o pastor
grosseiro e mau cheiroso que seu pai arranjasse para ela.
Foi esse pensamento deprimente que a convenceu a
aproveitar a chance enquanto tinha.
― Suponho que posso dar um beijo de boa noite, ― ela
decidiu.
― Claro.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

― Mas apenas um.


Seus olhos cintilaram com gargalhadas. ― Como queira.
Descansando as mãos em seus antebraços cruzados,
ergueu-se nos dedos dos pés, levantou o queixo e fechou os
olhos. Ele baixou a cabeça para encontrá-la no meio do
caminho. Quando sentiu sua leve respiração em seu rosto,
ela moveu-se em direção a ele até seus lábios se tocarem.
Se esse fosse seu último beijo, queria lembrar disso.
Então, ela se concentrou no cálido calor de seus lábios e na
barba por fazer no queixo. Ela inalou sua fragrância
masculina, todo couro, ferro e especiarias. Ousando deixar
sua língua se aventurar, ela saboreou o gosto tentador de sua
boca. Ela suspirou contra ele com anseio agridoce.
E então ele começou a responder.
Sua boca se moveu sobre a dela, suavemente no início, e
depois com mais urgência, como se ele tentasse beber o
último pedaço dela antes que ela fosse embora.
Ela também estava cheia de um estranho desespero, um
desejo por mais dele, por todo ele. Um gemido suave de
saudade formou-se em sua garganta. A frustração enrugou
sua testa.
Seus braços se abriram. Ele a puxou para seu abraço.
Foi realmente emocionante.
Também era perigoso.
― Você está ... beijando-me ... de volta ― , advertiu entre
beijos.
― Eu estou?
― Sim.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

― Devo parar?
Fez uma pausa. ― Não.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Capítulo 4

Mal percebendo o que fazia, Ysenda começou a deslizar


as mãos sob seu casaco. Sua clavícula era firme e suave sob
seus dedos. Seu pulso batia vigorosamente em sua garganta.
Os músculos de seu peito flexionaram-se sob seu toque. Ela
deslizou as palmas por dentro, afrouxando a roupa de forma
que escorregasse de seus ombros maciços.
Encorajado por sua ousadia, a recompensou do mesmo
modo, puxou o decote de seu vestido mais baixo e mais baixo
até se acomodar precariamente nas pontas de seus seios.
Quando suas línguas começaram a se entrelaçar, ela
perdeu toda a esperança de propriedade e controle. Uma
vibração erótica começou em seus ouvidos, bloqueando a voz
da razão. Ela puxou suas roupas, ansiosa por sua carne.
Ele rosnou contra sua boca como uma fera faminta e
selvagem. E ela o deixou se alimentar. Inclinou-se contra ele,
desejando estar mais perto. Por fim, empurrou as mangas
para baixo, descobrindo seus seios para que pudesse
pressionar sua pele quente contra a dela.
Era o céu, esse sentimento, e ela nunca quis que ele
acabasse. Onde a carne nua fez contato, parecia derreter-se.
Suas línguas se acasalaram, criando a ambrosia mais
intoxicante.
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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Ela deixou suas mãos vagarem sobre ele com abandono,


roçando seus músculos lustrosos e mergulhando em seus
cabelos exuberantes. Ela tentou memorizar cada centímetro
dele com a ponta dos dedos.
Não era suficiente, ela queria mais.
Afastando-se de sua boca, ela deixou uma trilha de
beijos ... no canto do lábio ... ao longo da mandíbula ...
descendo ao lado do pescoço onde sua pulsação latejava.
Ele gemeu e depois respirou fundo entre os dentes. Ele a
aproximou, até que ela conseguiu sentir o comprimento rígido
embaixo de seu casaco.
Ela deveria ter ficado chocada. Uma exibição tão
flagrante era imprópria, bruta, nociva. No entanto, o desgosto
não era o que sentia ao pressionar contra ela.
Em vez disso, uma emoção inebriante a percorreu, como
se o Bordeaux preenchesse suas veias, aquecendo seu
sangue e fazendo-a embebedar.
Ela tinha feito isso. Ela o fez endurecer assim.
Mas envolvida em seu triunfo emocionante também era
a sua rendição. Seus ossos estavam derretendo. Seu coração
estava suavizando. Sua determinação estava enfraquecendo.
Ela não pretendia recuar em direção à cama. De alguma
forma, simplesmente aconteceu. De repente, a parte de trás
dos joelhos fez contato com a armação de madeira.
Noёl, em sua ânsia, continuou a avançar, cobrindo seu
rosto com beijos, sem perceber que não tinha para onde ir.
Eles caíram juntos no colchão de penas.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Na pequena parte de sua mente que não estava bêbada


de vinho e desejo, Ysenda sabia que deveria resistir a ele.
Mas uma parte maior de sua mente sabia que não havia
esperança de retorno. Eles haviam saltado para o mar furioso
e estavam sendo levados. E todos os sentidos que ela possuía
disseram-lhe que aproveitasse o momento.
Então, ela fez.

Quando ele era um menino, um dos irmãos de Noёl o


enganou para sentar-se em um cavalo intrépido. O corcel
havia atravessado o campo, levando-o a um passeio
selvagem. E tudo o que ele podia fazer era agarrar-se a vida.
Foi assim que ele se sentiu agora.
Ele se resignou a passar uma noite tranquila com sua
nova noiva, convencendo-a com exemplos razoáveis de que
ele resultaria um marido digno.
Mas quando começou a beijá-lo, suas boas intenções
saíram da sua cabeça.
Não era como se ele nunca tivesse sido beijado. Ele era
um Ware, pelo amor de Deus. Mas ele nunca tinha sido
beijado com tanta paixão, tanto entusiasmo, com prazer
genuíno.
Foi a sua falta de jeito que os fez cair na cama. E uma
vez que eles estavam na horizontal, era difícil resistir a fazer o

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

que acontecia naturalmente sempre que ele estava na


horizontal com uma mulher em uma cama.
Ainda assim, ele tentou resistir.
Mas quando a adorável moça começou a colocar as
mãos sobre ele, apertando seu casaco, rasgando seu
sobretudo, era difícil de ignorar. Quando ela chovia beijos
febris por todo o rosto, ele foi obrigado a respondê-los. E
quando ela o puxou pelas costas, todo seu autocontrole
desapareceu.
Medo da cama matrimonial?
Dificilmente.
Sua nova noiva claramente não era uma noviça
amedrontada. Ele se perguntou sobre o jogo que ela jogava,
tentando fazê-lo acreditar que ela era.
Talvez estivesse com medo de não casar com ela se
descobrisse que não era virgem.
Ela não precisava se preocupar com essa ideia. Noel
sempre preferiu voracidade à virtude.
Ele riu baixinho em sua garganta enquanto movia sua
boca com fome ao longo da clavícula. Agora que ele sabia a
verdade, ele não podia deixar de provocá-la um pouco.
― Eu pensei que você disse apenas um beijo.
― Eu disse? ― suspirou sem fôlego.
Ele sorriu. Não mais preocupado em manter uma rédea
em sua luxúria, ele entrelaçou as mãos em seu cabelo
glorioso e cobriu sua boca com a dele, deixando sua língua
dançar em seus lábios, então mergulhou dentro, saboreando
seu sabor doce de vinho.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Passaram meses desde que ele esteve com uma amante.


Uma vez que ele soube de seu noivado com Cathalin, ele
cessou de fazer sexo com outras mulheres.
Mas estava pagando por sua abstinência agora. Ele
estava tão duro quanto uma pedra. Na verdade, sentia-se
como se pudesse explodir a qualquer momento.
O que seria um erro. Nada decepcionaria mais uma
noiva do que descobrir que seu novo marido derramou sua
semente mais rápido que um garoto de doze anos.
Então, tomando uma respiração sóbria, ele a virou,
sentando-se de joelhos para empurrá-la para que pudesse ter
mais controle. Ele deslizou as mãos sob o decote de seu
vestido, deslizou-o para baixo ao longo de seus ombros,
deixando beijos ao longo do caminho. Então puxou suas
roupas para baixo, até a cintura, prendendo os braços ao
lado dela.
― Você é tão linda, ― murmurou. ― Disseram que você
era a moça mais bonita em toda a Escócia. Eles estavam
certos.
Ela ofegou quando passou lentamente as pontas de seus
polegares por seus seios macios, até que eles descansassem
acima de seus mamilos tensos.
Noel sorriu quando ela se arqueou para forçar seu
toque, roçando os picos de seus seios contra seus polegares.
Então ele baixou a cabeça para substituir o polegar pela
língua, batendo levemente em cada mamilo antes de
depositar a bonita aureola em sua boca.
Ela gemeu e apertou os punhos.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

O desejo surgiu entre as pernas. Mas ele tinha que


temperar sua luxúria, pelo menos até combinar com a sua.
Deslizou as mãos lentamente sobre suas pernas de
seda, levantando as saias. Ela levantou a cabeça e empurrou
os braços como se pudesse tentar detê-lo. Mas suas mãos
ficaram presas nas mangas. E, a julgar pela névoa cinza
ardente de seu olhar, ele podia ver que ela realmente não
queria que ele parasse.
Com certeza, quando seus dedos cruzaram a parte
superior de seus joelhos e continuaram para cima, ela deixou
cair a cabeça para trás com um suspiro de arrebatamento.
Quando ele alcançou o vinco entre suas coxas, ele
empurrou as saias recolhidas. Lá, ele vislumbrou o céu. O
cabelo escuro e ondulante fazia um triângulo pequeno e
perfeito contra sua pele clara. Sua pelve doía com ânsia
enquanto ele examinava seu lindo corpo.
Engolindo seu desejo voraz, ele gentilmente instigou
suas pernas a se afastar. Deslizando os dedos em seu ninho
de cachos, ele a abriu tão ternamente quanto uma flor.

Ysenda respirou fundo entre os dentes. Por que estava


deixando-o fazer isso com ela? Não sabia. Mas não conseguiu
formar as palavras para detê-lo. Nem queria.
Ela queria isso.
Não, ela não queria. Ela precisava disso.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

No entanto, não era dela para ter. Ele não pertencia a


ela.
Ainda assim, ela o queria tanto.
E quando sentiu sua boca sobre ela ... lá embaixo ...
todo pensamento racional a abandonou. Através de um
relâmpago erótico, ela não conseguiu formar palavras. Seus
lábios a acariciaram com uma intimidade deliciosa,
inundando-a com calor. Sua língua a banhava com cuidado,
fazendo-a ofegar com uma surpresa feliz.
Ela apertou os olhos, muito envergonhada de seu
próprio prazer e fraqueza para encará-lo. Mas sua vergonha
veio com uma alegria curiosa. Uma força poderosa começou a
crescer dentro dela. Suas veias encheram-se de fogo
brilhante. Seu sangue pulsou com energia gloriosa. Sua
carne aqueceu, estava inchada e ansiosa.
Quando pensou que ela estouraria com desejo, o mundo
pareceu parar por um instante sem fim. Então, com um grito
silencioso, ela perdeu o controle.
Ela foi abalada por ondas de êxtase quando a sensação
mais divina a envolveu. Parecia que ela navegava em um
oceano profundo de prazer.
Mas durou apenas um momento.
E então ele mergulhou nela.
Ela gritou, sentindo o súbito e abrasador calor de sua
intrusão como uma faca.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Noёl refreou uma maldição e congelou. Que diabo?


Ele tinha tanta certeza de que sua nova noiva não era
virgem.
Ah, Deus, ele cometeu um erro terrível. Um imperdoável.
― Oh não, não, ― lamentou. ― Sinto muito, cherie.
As pontas dos dedos estavam brancas, seus olhos
estavam bem fechados e seus lábios estavam comprimidos
em uma linha tensa.
Ele doía com remorso. Daria qualquer coisa para
desfazer o que ele havia feito.
Mas não podia.
Tudo o que ele podia fazer era retirar-se e deixá-la em
paz, como deveria ter feito o tempo todo ... como havia
prometido.
No entanto, se ele se retirasse, isso só tornaria as coisas
mais difíceis. Na próxima vez, ela seria ainda mais relutante,
e com boa causa.
Não era como queria começar um casamento.
Não, se ele quisesse reparar o dano que tinha feito, teria
que ajudá-la através da dor e trazê-la de volta ao prazer.
Então permaneceu dentro dela.
― Eu vou melhorar,― ele prometeu, alisando o cabelo
para trás de sua sobrancelha perturbada. ― Eu não queria
machucar você, moça. Realmente não queria.
Ele puxou suas mangas, liberando seus braços. Suas
mãos relaxaram. Mas ela ainda não olhava para ele. Quebrou
seu coração. Ele teve que ventilar as chamas de seu desejo
rapidamente antes que o seu próprio se acalme.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

― Você não está com medo, não é? ― perguntou.


― Porque se você estiver ...
Isso chamou a atenção dela. Ela abriu os olhos e franziu
a testa. ― Não.
Ela estava com medo, podia ver isso da maneira como
sugava o lábio inferior entre os dentes. Mas ela não admitiria
isso. E preferiu admirá-la por isso.
― Eu posso fazer a dor desaparecer, ― disse. ― Se você
me permitir.
Parecia duvidosa. Então deu um aceno de cabeça.
Segurando-se nos cotovelos, baixou a cabeça para beijá-
la. Mas desta vez, ele a beijou suavemente, com ternura. E
quando ela respondeu muito ansiosamente, ele recuou. Era
essencial desta vez estar completamente pronta.
Não demorou muito, logo estava alcançando-o. Apertou
a parte de trás do pescoço para segurá-lo, ofegou contra sua
garganta e arqueou-se até que seus seios roçaram em seu
peito.
Então, para seu alívio, começou a mexer os quadris
lentamente contra ele. Ele fechou os olhos enquanto uma
onda de desejo percorria sua pelve. Mesmo uma virgem
instintivamente conhecia a dança do amor.
A fricção doce era quase demais para suportar. Ele
apertou os dentes contra sua libertação quando ela procurou
a sua.
Quando finalmente estremeceu, abrindo a boca com
admiração alegre, ele gemeu seu nome e dirigiu

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

profundamente dentro dela. Juntos, eles estremeceram de


felicidade.

Por um momento descontraído, Ysenda sentiu-se como


um falcão, subindo alto no céu. Não havia mais dor, apenas
liberdade. Então mergulhou em nuvens de puro prazer,
caindo tão rapidamente que suas asas tremiam no ar.
Teria sido um momento de felicidade perfeita ... se ele
não tivesse exclamado o nome da sua irmã.
A palavra atingiu-a como uma bofetada no rosto,
fazendo com que ela voltasse para a realidade.
Puta merda! O que ela tinha feito?
Noёl, completamente exausto, afundou-se sobre ela,
com cuidado para suportar seu peso em seus antebraços. Ele
ergueu um suspiro contente contra o pescoço.
― Ah, moça, estou tão feliz por ser seu marido.
Ysenda engoliu em seco, envolvendo seus braços ao
redor dele em um estranho abraço.
Não sabia o que dizer.
Não podia fingir que isso era culpa dele. Ela o encorajou.
Foi ela que quis ter aquele beijo de boa noite. Se ele não tinha
mantido sua promessa, foi apenas porque ela levou-o a
acreditar que já não o estava retendo.
Ele não fez nada de errado. Ele apenas fez amor com a
mulher que achava que era sua esposa.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Mas Ysenda cometeu um pecado. Ela conscientemente e


intencionalmente consumou um casamento falso.
― Você está bem, cherie? ― ele murmurou, levantando a
cabeça para olhar para ela.
Não, ela não estava bem. Havia se comportado como
uma libertina. E roubado o noivo de sua irmã.
Mas ela não se atreveu a confessá-lo. Então ela deu um
sorriso sombrio e assentiu.
Ele se afastou para se deitar ao lado dela, ainda a
segurando.
― Da próxima vez... ― prometeu ― será melhor.
A próxima vez? Não poderia haver próxima vez.
Mordeu o lábio. Supôs que estava arruinada agora. Mas
não faria Noёl pagar o preço por isso. No dia seguinte,
quando seu pai entrasse em seus aposentos e entregasse a
verdadeira noiva de Noёl, Ysenda faria o certo, a coisa
misericordiosa. Negaria que tivessem se deitado.
O handfasting seria quebrado. Noёl e Cathalin seriam
livres para se casar. Ele levaria sua nova esposa para o seu
castelo na França. E Ysenda provavelmente nunca mais o
veria.
Olhou para o cavaleiro bonito com o sorriso
deslumbrante e o coração amável. Se ele não estivesse
dormindo, teria visto as lágrimas infantis reunidas em seus
olhos.
Era bobo, ela sabia. Mas o queria por si mesma. Não se
importava com o fato de ele não ser um Highlander. Não se
importava com o fato de ele ser de Cathalin. Ela nem sequer

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

se importou de que ela não tivesse nada para lhe oferecer ―


nenhum castelo, nem terra, nem título.
Já havia lhe dado sua virgindade. E se acreditasse por
um instante que o aceitasse, também lhe ofereceria seu
coração ... porque tinha certeza de que ela se apaixonara.
Tão louco quanto parecia, era verdade. Embora o
conhecesse apenas algumas horas, sabia que era tudo o que
sempre quis em um marido. Era leal, corajoso, sincero, justo.
Ele mereceu o respeito dos homens e ganhou a admiração
das mulheres.
Mas seu coração não era para o que Sir Noel tinha
vindo. Ele veio para uma aliança política. Além disso, um
homem como ele poderia ter qualquer donzela que ele
escolhesse. Por que ele escolheria Ysenda quando ele tivesse
recebido a mulher mais linda em toda a Escócia?
Ela virou-se e se aconchegou para dormir.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Capítulo 5

Ysenda acordou antes do sol. Ao dormir, ela de alguma


forma envolveu seus braços e uma perna ao redor de seu
companheiro de cama. Ela empalideceu, percebendo que
tinha que se desfazer de Sir Noёl e da bagunça que seu pai
criara antes que fosse tarde demais. Ela também tinha que
ter certeza de que nada de ruim aconteceu com Caimbeul.
Ela se separou com cuidado e olhou para o homem
dormindo ao seu lado. Ela não conseguiu resistir a um
sorriso amoroso. Um lado de seu rosto estava amarrotado,
onde tinha se apoiado sobre o colchão. Seus cabelos se
estendiam de qualquer jeito, como uma árvore atingida por
um raio. Sua boca estava aberta e emitia grandes roncos. O
nobre cavaleiro não parecia tão nobre agora. E, no entanto,
seu sono desprotegido a fez adorá-lo ainda mais.
Quão agradável seria acordar cada dia com uma visão
tão fascinante ... para ouvir o som tranquilizador de sua
respiração ... para examinar os contornos esculpidos dele ...
Ela quase se engasgou quando viu a silhueta ousada
que cutucava para fora do lençol de linho. Como poderia ser
isso? Como ele poderia estar desperto quando ele estava
profundamente adormecido? Suas bochechas enrubesceram,
afastou-se da cama antes que as coisas pudessem piorar.
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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Lançou um último olhar desanimado para o homem que


estava deixando para trás. Então saiu do quarto para
procurar seu irmão.

― Onde ele está? ― ela exigiu. ― O que você fez com ele?
O laird fez uma careta quando suas palavras afiadas
pousaram em sua cabeça dolorida. ― Ele está bem. ― Ele a
afugentou e continuou a picar entre os frascos da cozinha por
algo para aliviar a dor.
Ela encontrou o frasco de extrato de casca de salgueiro e
empurrou-o na mão. ― Pai, ouça-me. O que aconteceu ontem
à noite foi um erro. Você não pode ir contra o rei. Isso... ―
Olhou ao redor da adega, embora fosse muito pequena para
esconder espiões. Então sussurrou ― É uma alta traição.
― Acha! ― zombou. ― O rei não virá marchando todo o
caminho até aqui para fazer valer um único casamento. ―
Mas Ysenda detectou um incômodo em seus olhos. ― Além
disso ― disse, desabotoando o frasco e cheirando o conteúdo.
― Agora é tarde demais.
― Mas é justamente isso, não é tarde demais. ― Lambeu
os lábios, odiando mentir. ― Nós não ... isso é ... na noite
passada... nós não dormimos juntos.
Ele torceu o rosto com descrença. ― O que?
― O handfasting pode ser quebrado agora. Ele será livre
para se casar com Cathalin.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Ele olhou para ela como se fosse estúpida. ― Ele não vai
se casar com Cathalin.
O coração de Ysenda despencou. ― Mas ele tem que. O
rei decretou isso. Você assinou os papéis sozinho.
― Não vou dar minha terra a um normando, não
importa o que o rei decrete.
― Mas meu laird... Pai ... você não vê? Foi dada uma
segunda chance.
Ele estreitou os olhos. ― Você planejou isso. Você
recusou-o de propósito.
― Sim, eu fiz. Eu fiz isso para o bem do clã. Eu pude ver
que você não estava em sua mente perfeita na noite passada.
E eu sabia que se não o fizesse ...
A parte de trás de seu punho estalou de repente contra
sua bochecha, balançando a cabeça e fazendo-a cambalear de
lado. Ela agarrou-se na prateleira, derrubando uma fileira de
garrafas que bateram no chão.
Ela piscou em estado de choque e mexeu sua
mandíbula, certificando-se de que ele não tinha quebrado
nenhum dente. Seus instintos lhe disseram que o devolvesse
com um soco sólido. Não teria sido a primeira vez que ela
havia levado a melhor sobre um homem.
Mas por uma vez ela teve que resistir ao impulso.
Afinal, ele era o laird.
Ele era o pai dela.
E ele tinha Caimbeul trancado em algum lugar.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

― Como você ousa falar comigo assim ― grunhiu. ― Eu


sei o que é melhor para o clã. E nada será melhor que um
laird escocês.
Ela ignorou sua bochecha ardendo. De alguma forma,
ela tinha que convencê-lo de que ele estava cometendo um
erro. ― Mas pai, ele deve ser um homem decente. O próprio
rei o escolheu. Ele será bom para Cathalin e proverá bem o
clã, assim como ...
― Não, está resolvido. ― Virou um pequeno gole do
frasco, enrugando o nariz. ― O noivo de Cathalin, seu noivo
das Highlands, deve chegar a qualquer momento. Eu
simplesmente direi que não poderíamos esperar mais por seu
cavaleiro normando, que quando chegou, seu casamento já
havia ocorrido.
― Você mentiria para o rei?
― Não é uma mentira. É um alongamento da verdade.
― E o que você vai dizer a Sir Noёl quando este
Highlander chegar?
― Ele já vai ter ido há muito tempo. Seu marido parece
muito interessado em chegar em casa. ― Brindou-a com o
frasco, tomou um gole generoso, estremeceu com o sabor
amargo, e enfiou a cortiça de volta. ― Sabe, você deveria
sentir-se com sorte, moça. Na França, você será uma dama
respeitável.
― Mas Sir Noёl descobrirá que não sou Cathalin.
― Não, a menos que você diga a ele.
Seus pensamentos correram. ― E se eu lhe disser
agora?

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

― Oh, eu não acho que você fará isso.


― E por que não?
― Porque eu mantenho aquele seu animal de estimação
corcunda, e você não quer ver nada lhe acontecer.
Ysenda apertou as mãos nos lados. Queria pensar que
ele estava blefando, que não faria nada para prejudicar sua
própria carne e sangue. Mas sabia melhor. O laird estava
querendo livrar-se de seu filho embaraçoso desde o momento
em que o viu pela primeira vez.
Laird Gille riu. ― Você sabe, você é como sua mãe. De
vontade forte e de coração fraco. Não pense que eu não sei
sobre os seus tutores vagabundos para ensinar esse imbecil.
― Ele não é um ... ― Ela conseguiu parar-se, mas só
porque sabia que era sem esperança.
― Você ficará bem na França. E se você for muito
obstinada para o gosto de Sir Noёl, ele tem um exército de
homens bravos a seu comando para mantê-la na linha.
Se ele estava tentando assustá-la, não estava
funcionando. Ela confiava completamente em Sir Noёl. O que
ela não podia antecipar era sua reação quando descobrisse
que ele havia sido enganado por seu pai ... e por ela, para
esse assunto. Ele acreditaria na verdade ― que ela tinha
medo pela vida de seu irmão? E se não, o que ele faria para
se vingar? Ele atiraria-a de lado e exigiria a sua verdadeira
noiva? Ele faria guerra ao clã e sitiaria o castelo?
Uma voz veio de além da porta. ― Bom dia?
Ysenda sugou uma respiração rápida. Era Sir Noёl.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Seu pai arqueou uma sobrancelha. ― Seu marido está


procurando você. ― Sorriu. ― Provavelmente por alguma
coisa que você esqueceu de lhe dar a noite passada.
― Cathalin? ― Noёl chamou.
Ysenda estremeceu.
Seu pai riu.
― Aqui ― ela abriu a porta.
Noёl estava mais magnífico do que ela lembrava. Ele
penteou os cabelos com os dedos. Seu rosto estava recém-
lavado. Ele estava vestido novamente em seu casaco azul
escuro, que realçava seus olhos cintilantes.
Infelizmente, ele não parecia como um homem que tinha
sido forçado a passar a noite de casamento em uma paixão
não correspondida. E a lembrança do que tinham feito caiu
sobre ela como uma onda quente, aquecendo suas
bochechas.
― Ah! Bom dia ... filho ― disse seu pai. De alguma
forma, ele conseguiu fazer com que a palavra soasse como
uma encenada saudação e um insulto. Ele nunca chamou
Caimbeul de "filho". Nem uma vez.
― Meu laird ― Noёl respondeu com um aceno de cabeça.
Ysenda teve a distinta impressão de que Noёl não se
preocupou em chamar Laird Gille de "Pai".
Já havia animosidade entre eles. Se Sir Noёl descobrisse
que o laird o enganou, seria terrivel. Ela não podia permitir
que isso acontecesse, não antes de Caimbeul estar seguro.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

― Você tomou seu jejum, Sir Noёl? ― perguntou,


pegando sua mão, ansiosa para separar os dois homens. ―
Você está com fome?
― Sim.― Noёl estava com fome, para ser verdadeiro o
que ele queria era se deleitar novamente com o lindo corpo de
sua esposa.
A esposa dele. Amava o som disso. E pensar que ele
estava temendo conhecer a noiva das Highlands.
Quando ele acordou sem encontrá-la, temia que tudo
fosse um sonho, mas os lençóis amarrotados cheiravam a ela
― fresco, quente e feminino ― e esse aroma o tinha
despertado.
Agora, caminhando ao lado de sua encantadora nova
esposa, ele teve que resistir ao impulso de carregá-la pelas
escadas, jogá-la na cama e fazer amor com ela ... durante
todo o dia.
― Deve haver pão fresco assado. ― disse ela, levando-o
pela porta do salão.
O pátio ainda estava coberto de branco. Mas o sol havia
aparecido esta manhã. Os pingentes de gelo escorreram dos
telhados de palha das dependências. A extensão nevada
cintilava como cristais.
Sua noiva ainda estava em seus chinelos. Então, ele a
pegou para levá-la para a casa de pão.
Ela gritou, assustada.
Ele sorriu para ela. Então notou algo que fez
desaparecer o sorriso. Um lado do rosto dela estava vermelho,
como se alguém a tivesse machucado.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Ele parou de andar e inclinou o queixo para examinar a


marca. Ele apertou os dentes. ― Sua bochecha ― alguém
bateu em você?
Ela franziu a testa, puxando o queixo dela. ― Não, ―
disse a ele. ― Provavelmente eu apenas dormi nele.
Ele suspeitava que não lhe dizia a verdade. ― Você sabe
que eu sou seu protetor agora. ― Na verdade, ficou surpreso
com o quão ferozmente protetor se sentiu. ― Se alguém a
tocar, ele terá que responder a mim.
Seus olhos foram todo maciez e calor quando ele disse
isso. Mas ele estava falando sério. Qualquer homem que
colocar uma mão em uma mulher indefesa, merece ser
espancado até tornar uma polpa sangrenta.
― É muito cavalheiresco, ― disse ela. ― Mas você sabe
que eu venho de uma longa fila de donzelas guerreiras.
― Foi o que ouvi.
Ainda assim, ele teve dificuldade em acreditar que sua
pequena esposa poderia defender-se de um homem adulto. Se
alguém a tivesse atingido ― e ele suspeitava que pudesse ser
seu pai ― talvez fosse bom que ele a levasse para longe desse
lugar.
Ele a levou para a casa de pão. Como prometeu, havia
pães de aveia frescos na panela. Eles estavam quentes,
amanteigados e recheados. Ele comeu três deles. Mas ele
deixou sua última mordida para ela. A alimentou com sua
mão, deixando a ponta do dedo em seu lábio.
Ele apaziguou uma fome, mas a outra ainda o
incomodava. Ele olhou para sua linda boca. Então, não

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

importando se era apropriado na Escócia, ele a puxou para


perto, levantou o queixo e colocou um beijo suave em seus
lábios.
Ela respondeu no ato, deixando seus olhos se fecharem.
Seus lábios eram flexíveis debaixo dos dele enquanto se
dissolvia contra ele. Ele a puxou para mais perto, deleitando-
se com seu calor. Os braços dela circularam em volta de seu
pescoço. E então ele sentiu uma forte onda de luxúria em
suas calças, uma que ele teve problemas para ocultar.
Ela ofegou levemente, e ele sabia que ela também sentia
isso. Sem mais uma palavra, ele terminou o beijo, acenou
com a cabeça para o padeiro, pegou sua noiva e voltou para o
castelo.
Felizmente, ninguém estava no caminho dele ― não o
seu pai desagradável, nem os cavaleiros de Noёl, nem o rapaz
Caimbeul. Ele subiu as escadas e abriu a porta para a
câmara.
Então ele parou. Sua irmã estava lá, revirando as
roupas de Cathalin.
― Oh! ― ela exclamou com surpresa, olhando para trás e
adiante entre os dois. ― Eu ... eu só precisava ... emprestar
um vestido ... da Cathalin. Está tudo bem ... Cathalin?
Ysenda nunca se sentiu mais estranha. Não havia
dúvida agora. Todos estavam conspirando juntos para
enganar o cavaleiro normando. Quando ele descobrisse ...
Ela olhou para ele e engoliu. Considerando a amplitude
de seu peito, seus poderosos músculos e os formidáveis

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

homens que o seguiam ... não queria estar lá quando


descobrisse.
Mas não havia nada que pudesse fazer sobre isso agora.
Até Cathalin, parecia que desde que sua irmã tivesse acesso a
seus vestidos extravagantes, ela não estava perturbada que
Ysenda pudesse estar usurpando o homem que deveria ter
sido seu marido.
― Cathalin? ― repetiu sua irmã.
― Claro ― disse Ysenda. ― Fique à vontade.
Ela deu-lhes um sorriso conspiratório. ― Posso voltar
depois, se ...
― Não ― respondeu. ― Nós estávamos apenas ...
― Sim ― disse Noёl simultaneamente. ― Volte mais
tarde.
Cathalin saiu com uma piscadela, acenando com as
meias que ela escolheu.
Isso foi um desastre. Ysenda ainda esperava que ela
pudesse persuadir sua irmã, se não o pai, a ver a razão.
Certamente Cathalin não desejaria ser o alvo da ira de dois
reis. Mas agora seria impossível convencer sua irmã de que
nunca havia consumado o casamento.
Noёl pareceu não notar sua angústia. Tinha apenas uma
coisa em sua mente, e quanto mais Ysenda olhava para seus
olhos azuis, mais ela tinha que concordar que nada mais
parecia importante.
O que começou leve, com uns beijos convidativos,
tornaram-se urgentes e exigentes. Contra seu melhor
julgamento, ela começou a acariciar sua carne e então

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

agarrar suas roupas. Quando eles caíram de cabeça na cama,


já estavam meio despidos.
Ela disse a si mesma que não importava se eles fizessem
amor novamente. Afinal, eles consumaram o handfasting.
Que diferença faria se eles se juntassem mais uma vez, duas
vezes ou uma dúzia de vezes? Uma mentira ainda era uma
mentira.
Mas a verdade era que ela estava muito sobrecarregada
pelo desejo para pensar corretamente. Ela o queria. Queria
isso. E quando Noёl tirou o casaco e jogou-o de lado, a visão
dele a deixou sem fôlego.
Não havia tempo para os jogos a que se entregaram
ontem à noite. Ambos sabiam o que precisavam. Não havia
motivo para demorar.
Ele empurrou as saias e esfregou-se suavemente dentro
dela. Ela o recebeu com um arrepiante desejo.
Desta vez, sentiu que estavam correndo juntos pela
inclinação de um grande orgasmo. Eles ofuscaram-se com
esforço enquanto se aproximavam do topo. Quando chegaram
ao pico, eles pararam para admirar o lindo vale abaixo. Então
eles caíram do outro lado tão rápido quanto uma cachoeira,
apressando-se sobre as rochas e mergulhando em uma
piscina profunda e refrescante.
Depois, enquanto recuperavam a respiração, Ysenda
pensou que nunca tinha se sentido contente como estava,
deitada nos braços de Noёl. Um brilho ofuscante parecia
cercá-los, protegendo-os do arrependimento, culpa e tristeza.
Ela fechou os olhos e apreciou a paz da total satisfação.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Mas logo desapareceu. Então ficou com o remorso e


preocupação.
O que ele pensaria quando descobrisse que ela era uma
mentirosa? Ele pensaria que ela não era melhor do que uma
prostituta que o usara para sua própria gratificação? Ou
apenas uma traidora sem coração?
Ela mordeu o lábio quando um pensamento ainda pior
aconteceu com ela.
E se ele a tivesse engravidado?
Ele se inclinou em um cotovelo, olhando-a com adoração
e gratidão, duas coisas que ela sabia que não merecia. Mas
ela obrigou-se a sorrir.
― Vamos sair daqui ― ele disse com um sorriso
sorrateiro.
― Agora? ― por um instante horrível, ela pensou que ele
queria sair imediatamente para a França.
― Sim. ― Ele tirou o cabelo de sua testa. ― Por que não
arranjamos uma pequena cesta, e você pode me mostrar esse
poço dos desejos?
Ela soltou a respiração que estava segurando. Ideia
brilhante. Ela precisava se afastar da tentação do quarto de
dormir. Ainda havia uma chance de que Cathalin decidisse
fazer o que era certo e concordasse em casar com o marido
pretendido. Ysenda não queria pôr em risco essa
possibilidade mais do que já tinha.
Ainda assim, foi com grande arrependimento que ela
vestiu a roupa e as botas mais quentes da irmã. Ela ofereceu

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

uma despedida silenciosa à cama e ao êxtase que nunca mais


teria ... mas nunca se esqueceria.

Noёl sabia que seus homens estavam inquietos,


ansiosos para estar em casa. E agora que o handfasting tinha
sido selado, não havia motivo para permanecer na Escócia.
Se eles saíssem no dia seguinte, talvez ainda houvesse umas
férias para desfrutar.
Ele sorriu com o pensamento de compartilhar sua nova
noiva com sua família. Ele não podia esperar para mostrar a
Cathalin os belos enfeites de Natal. Ele queria que ela visse
os malabaristas realizando acrobacias no salão. E em seu
aniversário, ele queria beber vinho morno com ela ao lado do
fogo.
Ainda assim, ele não queria parecer grosseiro com o clã.
Um dia, tudo isso seria dele, e ele nem sequer havia recebido
uma inspeção decente. Assim, tanto quanto ele preferiria se
deitar na cama com sua esposa deliciosa o dia inteiro, ele
decidiu que deveria fazer o certo e dar um passeio pela terra.
Agora, quando eles passaram pelo campo nevado para a
floresta, Noёl teve que admitir que ficou surpreso com a
extensão da propriedade. Parecia que o rei tinha sido
bastante generoso. Eles já caminhavam há algum tempo.
― Quanto mais longe? ― ele perguntou.
― Não longe. Apenas através dessas árvores, na clareira.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Suas bochechas estavam rosadas com o frio, sua


respiração fazia névoa no ar e seus olhos cinzentos brilhavam
com excitação. Parecia quase uma pena arrancá-la da terra
que tanto amava.
― Lá! ― ela respirou quando finalmente chegaram a uma
pequena clareira na floresta, onde feixes de sol dispersos
pareciam lançar gemas brilhantes na neve.
O poço já não era muito mais que uma ruína. Um
emaranhado de pedras era o que restava das paredes de
pedra. As samambaias cresceram em torno da rocha coberta
de musgo. Os pinheiros carregados de neve se aglomeravam,
as pontas dobradas para dentro como se fossem proteger o
poço dos intrusos. Se Noёl não soubesse melhor, ele diria que
era um lugar mágico.
Quando se aproximaram, viu um curioso disco de pedra
sobre o poço. Parecia uma tampa desalinhada.
― Há uma inscrição no topo ― disse ela. ― Vê as runas
vikings?
― O que isso diz?
― É uma benção. Para uma jornada tranquila, dias
alegres e fortes intervenções de Odin.
― Odin?
― O deus viking. ― Ela passou os dedos pelas runas
esculpidas. ― E aqui diz: Seu amor permaneça fiel ao seu
coração nobre.
Ele assentiu. ― Isso parece uma boa benção. ― Ele
puxou sua adaga. ― Você acha que devemos tentar? Vamos
cortar os cabelos e ...

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

― Oh, não! ― ela desencorajou. ― Acho que não.


Sua resposta deixou-o inquieto. Ontem ele esperava que
ela tivesse algumas dúvidas sobre permanecer fiel a um
homem que ela nunca conheceu. Mas eles estavam bem
casados agora.
E eles fizeram amor.
Duas vezes.
― Não?
― É só ... acho ... ― ela disse, tropeçando nas palavras ―
Eu acho que não... acredito muito nos desejos.
― Hmm. ― Ela não estava completamente certa quanto a
ele. Mas ele supôs que não importava. Desejando ou não
desejando, ele pretendia permanecer fiel ao seu coração
nobre. E ele pretendia manter sua nova noiva tão satisfeita
que nem sequer pensaria em se afastar.
Ele embainhou sua adaga, e depois examinou a tampa
de pedra e o abismo do poço. Parecia uma coisa perigosa
deixar aberto. Uma criança pequena poderia cair e se afogar.
Seu filho pequeno.
― É profundo ― ele disse com uma careta. ― Se eu fosse
laird agora, eu vedaria isso.
― Oh, você não deve fazer isso.
― E por que não?
― Porque os espíritos seriam presos dentro. Além disso,
nesta época do ano, todas as meninas lançam seus desejos
nele.
― Eu pensei que você não acreditava em desejos.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

― Bem, eu não, não ― ela disse, corando um pouco. ―


Mas os outros ...
― Eu vejo ― ele disse com um sorriso. Ele cruzou os
braços sobre o peito. ― Você sabe, você fica muito lindinha
quando ruboriza assim.
Ela deu-lhe um empurrão perante sua provocação. ― Eu
não estou corando. É só o frio.
― Bem, eu vou ter que aquecer então, não vou? ― Ele
não esperou por uma resposta. Ele abriu sua capa e a
envolveu sobre os dois. ― Melhor?
Ysenda assentiu. Ela tinha que admitir que estava
melhor, mas não porque ela estava com frio. Ela tinha o
sangue grosso de um guerreiro Highlander afinal, e o manto
de lã coberto de peles e as robustas botas de couro da sua
irmã eram uma boa proteção contra as nevascas.
Estava melhor porque sentiu-se ... protegida ... nos
braços de Noёl.
Ela poderia se proteger, é claro. Sua mãe tinha passado
o suficiente de suas habilidades de luta para garantir que sua
filha não fosse deixada vulnerável.
Mas nunca houve ninguém para defender Ysenda. Ela
lutou contra o preconceito de seu pai. Ela lutou contra a
arrogância de sua irmã. Ela defendeu seu irmão quando ele
estava fraco demais para se defender. Mas ela sempre lutou
sozinha. Ninguém jamais chegou e ficou ao seu lado.
Agora, pela primeira vez, aconchegada nos braços desse
guerreiro normando, sentiu-se absolutamente segura.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

― Há quanto tempo você é um cavaleiro? ― ela


perguntou.
― Eu sou um Ware. Nasci com uma espada nas mãos.
Ela riu e deu um cutucão em suas costelas. ― Isso deve
ter sido doloroso para sua mãe.
― Ah, sim, a pobre mulher tinha oito de nós, cavaleiros.
― Oito? Isso não é uma família. É um exército.
― O melhor da França, ― disse-lhe com orgulho. Ele
apertou os braços ao redor dela. ― Eu mal posso esperar para
mostrar você para meus irmãos.
Ele começou a falar seus nomes, muitos para lembrar,
dando uma descrição humorística de cada um. E com cada
nome, Ysenda ficou cada vez mais desanimada. Eles
pareciam tão maravilhosos. Mas nunca iria encontrá-los. E
ela teve que enfrentar esse fato.
Na verdade, a razão pela qual ela não faria o pedido ao
poço viking, era porque ela não queria se livrar da falsa
esperança de que ela pudesse, de alguma forma, mantê-lo
para si mesma.
Enquanto observava o córrego em silêncio, seus olhos
refletiam o poço, enchendo-se de água. Uma lágrima secreta
escorria pela bochecha enquanto ansiava com todo o coração
por aquele que ela não poderia ter. Então, envergonhada de
seu egoísmo, rapidamente apagou-a.
Sua voz estava cheia de carinho enquanto continuava
falando sobre sua família. Enquanto isso, a água borbulhava
sobre as rochas. O gelo nas bordas do córrego criou fissuras

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

suaves quando cedeu ao sol. O derramamento de neve


gotejou das árvores.
Ysenda fechou os olhos, desejando que ela pudesse ficar
aqui para sempre, envolvida em seus braços.
Ela desejou muitas coisas.
Mas o que ela disse era verdade. Ela não acreditava nos
desejos.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Capítulo 6

Noël gastou a maior parte da manhã com sua nova


noiva, caminhando por encostas e pântanos, através de
floresta de pinheiros, além de um grande lago. No caminho,
pararam para compartilhar o pequeno banquete de bolos de
aveia e queijo macio que eles tinham empacotado, bebendo
sidra para acompanhar.
Posteriormente, ela mostrou o melhor lugar de pesca e o
local onde as moças gostavam de tomar banho no verão. Ela
lhe mostrou os restos apodrecidos de uma Casa de Campo
viking onde ela brincava, e o arvoredo de azevinho onde a
mãe dela uma vez, assustou e colocou dois lobos para fora.
Ele viu o amor naqueles olhos pela sua terra. O que o fez
amá-la ainda mais.
Mas também havia um toque de tristeza nos olhos
cinzas dela. Ele desejou saber. Era a ideia de deixar o castelo
o que a entristecia? Ou algo mais?
Ele pensou novamente no homem jovem sentado junto
dela, à mesa. Eles tinham parecido muito íntimos. O coração
dela pertencia a ele? O ciúme o picou novamente.
Ele supôs que isso não tinha importancia. Eles
viajariam para a França em um dia ou dois, deixando todo o
mundo que ela conhecia bem atrás.
85
O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Ainda assim, isso não mudava a maneira que ela sentia.


E Noël queria que sua noiva estivesse apaixonada por ele.
A ideia era cômica. Ele tinha vindo à Escócia para um
propósito. Fazer uma aliança política. Se apaixonar nunca
tinha feito parte dos seus planos.
Mas isso não mudava o fato que ele queria ganhar o
coração dela agora. Ele queria fazê-la sorrir. Ele queria trazer
a alegria de volta aos olhos dela.
― Assim, moça, quando foi a última vez que você fez
uma mulher de neve? ― ele perguntou.
Ela curvou sua sobrancelha para ele. ― Eu fiz um
boneco de neve.
― Oh, sim, todos fazem um boneco de neve. Mas você fez
uma mulher de neve?
Ela lhe deu um sorriso cético. ― Eu não vejo como
poderia haver muita diferença.
― O que? Claro que há uma diferença. Venha, eu
mostrarei.
Juntos, eles empilharam e empacotaram a neve até que
tivessem um montículo vertical maior que o tamanho dela.
Ele arredondou o topo em uma bola para uma cabeça. Ela
formou dois tocos para servir como braços roliços. Então ela
procurou dois pequenos cones de pinheiro para fazer os
olhos. Ele fez um pequeno nariz de neve e prendeu um galho
curvo debaixo dele, transformando-o em uma carranca.
― Por que ela está tão infeliz? ― ela perguntou.
― Porque ela se parece com um boneco de neve.

86
O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

― Eu falei a você que não havia nenhuma diferença. ―


Ele franziu o cenho e acariciou o queixo, estudando a
escultura. ― Talvez se encontrasse algumas flores bonitas
para ser o cabelo dela. ― Ela examinou o vale e achou à
deriva douradas agulhas de pinheiro, caídas perto dos
troncos das árvores. Enquanto ela estava ocupada coletando
eles, ele começou a trabalhar. Ele juntou dois pequenos
globos de neve e arrancou uma baga de azevinho para pousar
no meio de cada um. Estes, ele colou estrategicamente à
frente do corpo. Então ele esperou pelo retorno dela. Primeiro
ela ofegou. Então ela deu risada. Era um som encantador. ―
Vergonha de você, Sir Noël ― , ela repreendeu, incapaz de
manter o riso longe da voz dela.
― Vergonha? ― ele perguntou, todo inocência. ― Por
que?
Os olhos prateados dela dançaram quando ela apareceu
ao lado dele. ― Você não vai deixá-la assim.
― Assim como?
Ela tentou lhe dar uma cotovelada. ― Despida.
― Ela ficará bem ― , ele a assegurou. ― Ela não ficará
com frio. Ela é uma mulher de neve.
― Não é do frio que eu estou falando, e você sabe disso.
Ele estendeu a mão e transformou o galho franzido em
um sorriso. ― Mas olhe como ela está feliz agora.
Ela balançou a cabeça. ― Você é um rapaz malcriado.
Ele piscou para ela. ― Ah. Espere até você ver meu
boneco de neve.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Por um momento, ela apenas olhou para ele. Finalmente


os olhos dela se arregalaram e a boca formou um “O”
chocado. ― Ela começou a atacá-lo com as agulhas de
pinheiro.
Ele riu e sacudiu o dilúvio. Então, ele a pegou pela
cintura e a arrastou para ele.
Beijá-la era tão natural e instintivo como respirar. Os
lábios dela se abriram para os seus tão prontamente como
uma fechadura para uma chave. A risada dela derramou na
sua boca e ele bebeu sua alegria. As línguas se tocaram e a
corrente o atravessou, tornando-o instantaneamenete duro e
ansioso.
Se fosse verão, ele teria espalhado sua capa na grama
macia e feito amor docemente com ela, bem ali e em seguida.
Mas o mundo estava molhado e gelado.
Assim, entre beijos, ele ofegou, ― Vamos voltar...para
continuar...antes de eu me transformar...em um homem de
neve.
Sacudindo sua luxúria, ele tomou sua mão e começou a
curta caminhada para casa, feliz por ter feito ela sorrir. Mas
no momento em que eles emergiram da floresta, em vista do
castelo, ele já estava pensando em seu acolhedor quarto de
dormir.
― Eu vou correr ― , disse ele.
― O que? ― ela riu.
― Venha. Quem chegar primeiro ao portão, começa a
despir o último. ― Ela ainda estava pensando se seria melhor
ganhar ou perder, quando disparou pela neve.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

― Espere! ― , ela gritou. ― Você trapaceou!


― Apresse-se!
― Mas você nunca disse vá!
― Vá! ― , ele gritou.
Ele obteve uns bons metros. Mas, em seguida, cometeu
o erro de se virar para tripudiar. Enquanto ele estava
correndo de costas, seu calcanhar pegou na raiz de uma
árvore, e ele caiu batendo seu traseiro.
Ela explodiu em risos, passando por ele enquanto ele
começava a se levantar.
― Volta aqui, mulher! ― , ele berrou atrás dela.
― Acho que não! ― , ela cantou.
― Mas uma esposa deve obedecer ao seu marido!
Ela apenas riu.
Rindo, ele espanou a neve de sua calça e deixou-a tomar
uma curta distância à frente. Ele estava apreciando a vista,
depois de tudo, observando o movimento de seu traseiro e
vislumbrando seus encantadores tornozelos enquanto ela
levantava as saias para correr pela neve.
Ele não conseguia superar o fato de que ela era sua.
Aquela moça deslumbrante, vibrante, de rosto fresco das
Highlands pertencia a ele. Como ele tinha conseguido tal
sorte, ele não sabia. Mas ele não tinha a intenção de deixá-la
ficar longe dele. Nem agora nem nunca.
No fim, ele a deixou ganhar, mas só por um instante.
Ele beliscou os tornozelos dela todo o caminho, fazendo-a
gritar em pânico por um momento, e dar risada das
palhaçadas dele no próximo. Quando eles desfaleceram

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

contra o portão, estavam ofegantes de correr e tontos pelas


risadas.
Ele sorriu para seus olhos cinza brilhantes e curvou-se
para lhe dar um beijo ousado, decidindo que não se
importava se era próprio ou não. Qual o problema se alguns
curiosos membros do clã vissem o quanto ele amava a sua
noiva?
Seus lábios estavam frios. Sua língua estava quente. A
respiração dela se misturou com a sua quando eles se
beijaram, então tomaram fôlego e beijaram-se novamente. ―
“Você venceu” ― , ele sussurrou, embalando seu rosto com a
palma da mão. Então ele recuou com seus braços estendidos.
― Prossiga. Me dispa. ― Ela ofegou em um choque encantado,
empurrando o tórax dele. ― Você é malvado, um homem
malvado ― . Ela acrescentaria mais alguns ― malvados ― se
ela pudesse ler os pensamentos luxuriosos que atravessavam
sua cabeça agora mesmo. Claro, ele não estava prestes a agir
sobre nenhum deles. Até agora havia vários pares de olhos
neles.
Em vez disso, ele a acompanhou educadamente pelo
portão, andando de mãos dadas com ela.
O pátio estava eriçado com as preparações do natal.
Cozinheiros assavam coxas de carne de carneiro em um
grande espeto. Criadas amarravam juntas moitas de sempre-
vivas com tira vermelha. Rapazes da cozinha transportavam
cestas de pão para guardar. E em um canto do quintal, onde
a neve tinha sido empurrada para longe, os seus homens
estavam treinando com as espadas, proporcionando

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

entretenimento ao vivo para o laird e para os pequeninos


reunidos em volta.
Quando Noël levantou seu olhar, ele viu que alguém
mais estava assistindo. Na mais alta janela da torre,
estudando atentamente os cavaleiros, estava Caimbeul.
― Eles são muito bons ― , sua noiva exclamou quando
ela viu seus homens cruzando as lâminas.
Ele sorriu. ― Sim. ― Os Cavaleiros de Ware são os
melhores espadachins da França.
Ele olhou novamente para a janela. Caimbeul o avistou.
O jovem estava olhando para ele com um olhar venenoso.
Noël franziu a testa. Era com ciúme? Ele tinha de descobrir.
Ele poderia não ser capaz de consertar o coração quebrado do
rapaz. Mas ele poderia pelo menos tentar fazer as pazes com
ele e fazer a verdade — que Cathalin era a sua esposa agora,
mais fácil de suportar.
― Você gostaria de assisti-los um pouco? ― ele
perguntou.
― Sim, se você não se importar.
― De modo nenhum. ― Beijando os dedos e soltando sua
mão, ele olhou para cima novamente, ao carrancudo
Caimbeul. ― Eu retornarei. Eu tenho algo “para atender”.

Ysenda admirava bons espadachins. Era um traço que


ela tinha, sem dúvida, herdado de sua mãe. E os Cavaleiros

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

de Ware eram muito superiores a quaisquer lutadores que ela


tinha visto na Escócia.
Mas esse não era o real motivo dela querer vê-los.
Ela principalmente queria evitar ir ao quarto de
Cathalin.
A vontade de Ysenda estava mais fraca do que nunca
agora. Não só ela desejava esse cavaleiro normando com o
rosto bonito, cabelos pretos indisciplinados e olhos azuis
deslumbrantes; mas, agora, ela também o adorava.
Ele a fez rir. Ele a fez sentir-se bonita e amada. Ela
olhou para baixo, para o Lobo do anel Ware no dedo dela.
Desistir dele ia ser doloroso. E quanto mais íntimos se
tornassem, mais difícil seria.
Cathalin também estava assistindo à batalha dos
cavaleiros. Talvez se Ysenda conseguisse falar com ela
sozinha, poderia fazê-la ver a razão.
Depois que Noël saiu, ela se aproximou.
― Cathalin, ― ela sussurrou, puxando sua manga.
Cathalin virou sua cabeça ao redor. ― Não me chame de
tal modo ― ela sussurrou. ― Eles podem ouvir.
― Nós precisamos conversar.
― Não há nada para falar.
Levará apenas um momento. Provavelmente nós não nos
veremos novamente por anos. Nós não podemos pelo menos
dizer adeus? ― Cathalin revirou os olhos. ― Ah, muito bem.
Eu estou cansada de assistir estes jovens franceses com suas
lâminas pequenas, de qualquer maneira. ― Lâminas
pequenas? As espadas de folha larga deles poderiam não ser

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

tão grandes quanto uma espada escocesa, mas Ysenda estava


certa que um normando ágil com uma lâmina leve, teria uma
vantagem definitiva sobre um Highlander com uma espada
pesada.
Eles recuaram para um lugar ao longo da parede
traseira da guarda.
Cathalin cruzou os braços sobre o seu peito. ― O que
você quer dizer?
― Eu preciso que você pense sobre o que está fazendo.
― Eu sei exatamente o que eu estou fazendo. ‘Vou me
casar com um Highlander. E ele e eu herdaremos o castelo e
governaremos o clã quando papai morrer.
― Mas você não vê? Os reis não permitirão isto. Eles
haviam prometido você a um normando, porque eles querem
que um normando retenha a terra.
― Não importa se eles permitirão isto. Será feito. Eu vou
casar antes que eles possam ter sua opinião. ― Ela sorriu
maliciosamente. ― Além disso, você já fez bom uso do
handfasting.
― Nós podemos dizer que não, Ysenda disse, agarrando
a manga de sua irmã em desespero. ― Nós podemos dizer que
nunca foi consumado. Então você estará livre para... ― Ela
quase sufocou nas palavras. “Se casar com o Sir Noël”.
― Eu não quero casar com o Sir Noël.
― Você deve. É a vontade do rei.
― Eu não me importo, ― Cathalin disse com um lindo
biquinho. ― Além disso, nosso pai disse que a realeza não
ousaria vir para as Highlands para—

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Ysenda agarrou sua irmã pelos ombros. ― Eles virão.


Eles vão enviar homens como aqueles, ― ela disse, apontando
para os Cavaleiros de Ware. ― E eles matarão todos no clã, se
você não fizer o que o rei quer.
Cathalin ergueu a mão de Ysenda de seu ombro. ―
Então você terá que continuar fingindo que você é Cathalin. É
o único caminho para manter a paz.
Ysenda suspirou em exasperação. ― Ele vai descobrir.
Mesmo que eu não diga nada, não será um segredo por muito
tempo. Assim que papai morrer, o segredo será descoberto.
Cathalin endireitou-se com orgulho. ― Até então, meu
marido Highland terá criado um exército para defender o
castelo. ― Ela zombou. ― Seus homens vão matar todos os
últimos desses pequeninos jovens com suas pequeninas
espadas.
Ysenda só podia olhar para a irmã dela, mortificada.
Como poderia Cathalin ser tão delirante, tão imprudente? Ela
iria trazer destruição para cima de seu clã.
E para quê? Para que ela pudesse se casar com o
homem de sua escolha? Um homem que ela nunca
conheceu?
Ela queria torcer o pescoço perfeito de sua irmã.
Mas talvez ela poderia tentar uma abordagem diferente.
Ysenda não tinha a intenção de ir para a França no lugar de
Cathalin, deixando Caimbeul e seu clã para trás para ser
morto pelo exército do rei.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

― Você sabe, Sir Noel seria um ótimo partido para você.


― As palavras eram difíceis de passar por sua garganta. ― Ele
vem de uma família rica.
Você gostaria de viver em um lindo castelo. Você teria
tudo que desejasse. Servos à sua disposição e chamado.
Todos os vestidos novos que você desejar. Joias, peles,
falcões. Sir Noel iria conceder todos os seus desejos, eu sei. E
as suas crianças... Elas seriam as mais belas crianças em
toda a França.
― Que seja. ― Cathalin fungou. ― Mas eu me recuso a
casar com um homem cego e estúpido.
Ela piscou. ― O que você quer dizer?
Cathalin levantou seu queixo altivo. ― Como o tolo pôde
ter pensado que você era a moça mais bela em toda a
Escócia?
Enquanto Ysenda ficou boquiaberta, Cathalin pegou
suas saias e prosseguiu mau humorada.
Ysenda só pôde olhar fixamente depois de Cathalin. Ela
não podia argumentar com ela. Aquilo foi o que Sir Noel tinha
pensado. E uma vez que o orgulho de Cathalin foi insultado,
não havia nenhuma maneira de aliviar seus sentimentos.
Inferno. Agora ela não sabia o que fazer.

Noël bateu ligeiramente na porta. ― Caimbeul?

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

― Não houve nenhuma resposta. Mas ele ouviu um


raspar assustado do outro lado.
Ele abriu a porta lentamente, preparando-se para se
defender se necessário.
Caimbeul estava sentando no chão debaixo da janela,
franzindo o cenho para ele.
― Eu preciso falar com você ― , Noël disse. O olhar
severo de Caimbeul tornou-se desconfiado.
Noël fechou a porta atrás dele. Caimbeul não fez
nenhum movimento para levantar, mas talvez a corrente
atada à cintura do jovem, tornasse dificil para ele ficar em pé.
Ele fez um favor ao rapaz se abaixando perante ele.
― Eu acho que é melhor falarmos claramente, ― ele
disse, ― Então, eu gostaria da verdade de você. Você tem
algum … sentimento para minha noiva?
O rosto de Caimbeul retorceu. ― Sentimento? O que
você quer dizer?
― Sentimentos românticos.
Os olhos de Caimbeul se estreitaram de raiva. Antes que
Noël pudesse se esquivar para o lado, o rapaz moveu com
fúria o punho. Felizmente, não atingiu o nariz de Noël, mas
só porque uma pesada corrente em torno de seu pulso, o
impedia de chegar perto o bastante. Contudo, Noël recuou
instintivamente, caindo para trás em seus membros
posteriores.
― Como você se atreve! ― Caimbeul gritou. ― Ela é
minha irmã, seu imbecil!

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Noël não sabia o que o chocou mais, o fato de que


Caimbeul desferiu um impressionante soco para um homem
aleijado, ele estar acorrentado como um animal, ou que ele e
sua noiva eram irmãos. Ele levantou uma mão em paz.
― Espere. Sua irmã? Você é filho do laird?
― Sim, ― ele disse.
Noël sentou-se para a frente, descansando seus braços
nos joelhos. Ele lembrou a atitude do laird com Caimbeul na
mesa. Ele nunca o apresentou como seu filho. E ele o havia
tratado com uma distinta falta de respeito.
― Seu pai lhe colocou essas correntes?
Caimbeul não respondeu. Sua frustração de vergonha
foi resposta suficiente.
Por que o laird faria tal coisa? Ele estava com medo de
que seu filho fosse interferir no casamento? Talvez Caimbeul
pensasse que estaria protegendo sua irmã.
― Diga-me, de homem para homem, ― Noël disse. ―
Você me desaprova? Acha que eu não sou bom o suficiente
para sua irmã? ―
Os olhos de Caimbeul queimavam com raiva silenciosa.
― Qual irmã?
Isso foi uma pergunta estranha. ― A com quem eu me
casei, é claro.
Caimbeul olhou para ele em silêncio por um longo
tempo, como se decidindo o que dizer. Finalmente ele disse. ―
Você não está casado com a certa.
― O que você quer dizer?

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Em vez de responder, Caimbeul focou seu olhar no chão


e disse firmemente, ― Você já dormiu com ela, não dormiu?
Noël deixou as palavras do moço se afundar. O que ele
quis dizer, “a certa”? Era possível que ele tivesse se casado
com a irmã errada?
Ela é Cathalin. Sim? ― , ele perguntou, com medo da
resposta.
― Ela não é.
Noël sentiu a respiração congelar em seu peito. Como
pode ser isso? Como ele poderia ter se casado com a irmã
errada?
Em seguida, ele olhou novamente para o jovem. Talvez
Caimbeul fosse louco. Talvez ele estivesse confuso. Talvez foi
por isso que seu pai o acorrentou.
― Você está certo? ― , ele perguntou.
― É claro que eu estou certo. Eu conheço minhas
próprias irmãs. Você que se enganou. ― Ele acrescentou com
um sorriso despreocupado, ― Você se casou com Ysenda, e
não Cathalin.
Noël não podia compreender tudo. Ele levantou
lentamente aos seus pés. ― Mas por que...
― O meu pai queria um Highlander, não um normando,
para herdar a sua terra.
― Mas não depende de seu pai. Dois reis decretaram
esse casamento.
― Sim, e você já viu isso. Tanto quanto você sabe, você
se casou com Cathalin.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

― Mas isso é ridículo. Se ela não é a verdadeira


Cathalin, então quando o laird morrer
― Você não herdará nada. A terra vai para a verdadeira
Cathalin e seu marido Highlander.
Noël ficou espantado. ― Isso não pode ser verdade. Cada
membro do clã teria que estar informado para ser cúmplice
da fraude para
― Ninguém disse uma palavra quando você confundiu
Ysenda com Cathalin. Eles estavam com muito medo de
contradizer o laird. Meu pai estava muito feliz. Você jogou as
peças perfeitamente dentro de suas mãos.
Todo o ar saiu dos pulmões de Noël. Como isso pôde ter
acontecido? O seu erro honesto tinha se tornado um ato de
rebelião? Ele balançou a cabeça, que estava girando
enquanto ele recordava os acontecimentos dos últimos dias.
― Seu pai temia que você falasse alto, ― ele percebeu. ― É por
isso que ele tinha uma faca em sua garganta.
Caimbeul assentiu com a cabeça.
― E porque colocou você em correntes agora.
― Sim.
― Então ele não deve saber que eu vim falar com você. ―
Noël endireitou-se e colocou uma mão de confiança no
antebraço de Caimbeul. ― Eu não sei como, mas eu prometo
a você...irmão...eu vou fazer tudo direito.
Com isso, ele deixou a câmara. Mas sua mente estava
longe de ser resolvida. E enquanto ele descia as escadas, ele
começou a pensar—não como um pretendente, mas como um
guerreiro.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Oferecendo-lhe a noiva errada, Laird Gille tinha


intencionalmente quebrado um juramento a dois reis. Por
direitos, Noël deveria arrastá-lo ante a corte real.
Mas o clã se viraria contra ele, se ele tornasse o laird
deles, prisioneiro. Essa era a última coisa que ele queria
fazer, considerando que algum dia essas pessoas seriam de
sua responsabilidade. Ele sempre governou seus cavaleiros,
não pela força, mas ganhando o seu respeito. E era assim que
ele queria governar o clã.
Além disso, ele só trouxe um pequeno contingente de
seus homens. É verdade, eles eram Cavaleiros de Ware, mas
eles não eram páreo para uma centena de membros raivosos
do clã. Tinha de haver outra maneira. E ele estava
determinado a encontrá-la.
Ainda assim, não era o aspecto mais preocupante da
decepção para Noël. A pior parte era saber que sua noiva
havia mentido para ele. Ela segurou sua mão, beijou-o, falou
os votos do handfasting.
Sua testa enrugou quando ele lembrou que ela pediu
que ele não consumasse o casamento. Talvez tivesse tido um
momento de arrependimento, então.
Mas eles tinham consumado o casamento. Ela o deixou
... Não, ele corrigiu, ele se impôs sobre ela. Tinha sido um
acidente, mas tinha sido sua culpa.
Talvez ela não quisesse que isso acontecesse.
Ainda assim, ela nunca lhe contou a verdade — que ela
não era sua verdadeira noiva, apesar de ter havido uma
ampla oportunidade para a sua confissão.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Ela riu com ele.


Ela tinha dormido com ele.
Ela o fez se apaixonar por ela.
Foi tudo uma mentira? Ela não sentiu nenhum
sentimento por ele?
Ele franziu a testa, engolindo o nó alojado na garganta.
Isso não importa, ele disse a si mesmo. Eles não
estavam destinados a ser marido e mulher, de qualquer
maneira. Ele iria encontrar uma maneira de anular o
casamento. Ninguém os tinha visto no quarto de dormir. Ele
poderia alegar que ele nunca consumou o handfasting. Assim
ela poderia continuar sua vida, livre de seus pecados.
Mas seu coração parecia que estava quebrado em dois.
Ele não conseguia tirar seus alegres olhos cinzentos da sua
mente. Nem poderia pensar sobre a outra irmã, a que ele
deveria se casar, sem um estremecimento de aversão.
Ele faria seu dever, para o rei e o país, por mais doloroso
que fosse. Mas ele nunca ficaria feliz com isso.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Capítulo 7

Ysenda assistiu com o resto do clã, quando a fogueira do


natal foi acesa no pátio. Sir Noel estava ao seu lado. As
chamas iluminavam o seu rosto. Mas sua expressão ainda
era inescrutável, como tinha sido desde que ele voltou do
castelo. Ela não sabia o que estava errado. De alguma forma
ele parecia...distante.
Provavelmente ele estava bem. Depois de não conseguir
convencer Cathalin a fazer a coisa certa e se casar com Noël,
Ysenda percebeu que sua única esperança era fazer Noël cair
de amores por Cathalin. Uma vez que visse sua irmã em seu
melhor brilho, certamente não poderia deixar de se encantar
por ela. Todos os homens amaram Cathalin. E, claro,
Cathalin ficaria loucamente apaixonada por ele, por que qual
mulher não ficaria? Talvez, então, Ysenda pudesse reparar o
dano causado.
Claro, toda a ideia a deixou doente no coração. Ela não
podia suportar a ideia de perder Noël, especialmente para sua
irmã mimada. Mas por causa do seu irmão, a quem prometeu
proteger, e por seu clã, a quem ela devia fidelidade, ela faria o
sacrifício.
Ysenda! ― ela chamou baixinho sua irmã, cutucando–a
quando ela não respondeu ao nome desconhecido.
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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Cathalin fez uma careta.


Destemida, Ysenda tocou o antebraço de Noël e sorriu
de volta para a sua irmã. ― Eu ia contar a Sir Noel, sobre a
época que tentamos salvar os filhotes na lagoa.
Cathalin olhou silenciosamente para trás. Finalmente,
ela encolheu os ombros e disse, ― Vá em frente, então.
Ysenda deu à sua irmã um olhar aguçado. ― Mas você
fala muito melhor.
Cathalin suspirou. ― O que há para dizer? Vimos os
filhotes na lagoa, e saltamos para retirá-los.
O rosto de Ysenda se abateu. ― Sim. ― Ela se virou para
Noël para explicar. ― Mas, fomos feitas de bobas, porque a
mãe dos filhotes estava apenas tentando ensiná-los a nadar.
― Ela sorriu. ― Nós não sabíamos que eles poderiam nadar,
então nós mergulhamos para salvá-los. E quando Ca-, minha
irmã descobriu, ela ficou furiosa, porque seu vestido novo
estava molhado e sujo.
Cathalin dirigiu um pequeno sorriso em seguida. ―
Depois de arruinado, eu dei a você o vestido.
― Então você fez, ― Ysenda disse com uma risada.
Ela olhou para Noël. A sua expressão era de um
interesse educado, nada mais.
Ysenda tentou novamente. ― Seu cabelo parece adorável
esta noite, querida irmã.
Isso funcionou. Cathalin tocou seus cabelos. ― Você
gosta? Tilda passou a metade da manhã trançando.
― Muito bonito. Você não concorda, Sir Noel?
Ele assentiu.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Cathalin, claramente irritada por sua falta de elogios,


franziu os lábios.
Ysenda abaixou suas mãos. O que mais ela poderia
fazer? O que poderia impressionar Noël?
― Você sabe, Sir Noel, minha irmã é muito hábil com
uma agulha.
Noël levantou uma sobrancelha. ― Costura pano ou
cutuca as pessoas com ela?
Com um bufar de irritação, Cathalin pegou suas saias e
girou para ficar ao lado de outra pessoa.
Ysenda virou-se para Noël em censura. ― Por que você
fez isso?
― Ela é como uma garota mimada. Alguém precisa pegar
no pé dela.
Ysenda pensou sobre suas palavras, enquanto as
chamas se espalhavam no céu noturno.
― Alguém como você, ― ela decidiu. ― Alguém que
pudesse levá-la pela mão, ensiná-la pacientemente, trazer o
melhor dela. ― Ela engoliu. ― Você acha que poderia ser feliz
com...alguém como minha irmã?
Sua boca apertou enquanto olhava para o fogo. ― Não
tão feliz como eu estou com você.
Os olhos de Ysenda se encheram de lágrimas. Ela tentou
culpar a fumaça. Mas seu coração estava quebrando.
― Eu... eu estou cansada. Eu estou indo para a cama.
Ela não esperou por sua resposta. Ela precisava fugir
antes de explodir em lágrimas. Talvez Noël falasse novamente

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

com Cathalin. Talvez não. Mas ela poderia pelo menos, dar-
lhes a oportunidade.

Depois que ela saiu, Noël tentou bravamente cair de


amores por Cathalin. Ele olhou para ela de longe no brilho da
fogueira, admirando seu perfil perfeito, sua pele cremosa, ela
fazendo beicinho com os lábios. Ele a viu rir, quando alguém
sussurrou em seu ouvido. Ele a viu lançando cones de pinho
no fogo com delicada graça.
Mas ela não era sua irmã. Ela não tinha o rosto honesto
de Ysenda, sua doçura, seu cativante charme inocente.
Cathalin era arrogante, mimada, e irremediavelmente sem
remédio. A vida com ela seria desagradável.
Noël assistia sua chance de felicidade flutuar, como uma
das brilhantes faíscas da fogueira, subindo e sendo engolidas
pelo céu escuro. Tudo o que ele conseguia pensar era na
moça irresistível que o esperava em seu quarto de dormir,
mesmo agora, a menos de cem passos de distância.
Ela lhe prometeu ser sua. Ela tinha falado as palavras
que os vinculava como marido e mulher. Pelo menos, era o
que ela queria que o mundo acreditasse. E se ela queria
manter essa aparência, por que negá-lo? Se esta noite era
para ser sua última noite juntos...se amanhã ele iria
enfrentar o laird e exigir sua verdadeira noiva...então, talvez,

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

ele deveria aproveitar a alegria que ele podia, antes de se


resignar a uma vida de miséria.
Ele deu à mulher que deveria casar um último olhar. Ela
era bela. Não havia nenhuma dúvida. Mas ela não era páreo
para a moça que ele tinha casado.
Contra seu melhor julgamento, ele andou aqueles cem
passos para o quarto de dormir.
Quando ele suavemente entrou no quarto, sua esposa
estava agachada junto ao fogo, mexendo as brasas.
Ela caiu sobre seus pés em surpresa. As chamas
criaram vida atrás dela, iluminando o linho de sua roupa de
dormir, não deixando nada para a sua imaginação.
― Eu pensei que você fosse demorar a vir se deitar. ―
Sua voz era cautelosa.
Seus olhos nunca a deixaram enquanto fechava a porta
atrás dele. ― E eu pensei que você já estivesse na cama.
― Eu estava. Eu vou
Esta mulher havia mentido para ele. Ela o enganou,
ganhando a sua confiança no momento, para que ela pudesse
explorá-la mais tarde. O pior de tudo, ela o deixou se
apaixonar por ela. Por todos os direitos, ele deveria se sentir
magoado e traído.
Mas vendo-a com coração compassivo, o brilho suave do
rosto dela, seus olhos brilhantes, seus lábios tão tentadores—
fez com que ele sentisse apenas desejo.
Sua afeição por ele teria sido um ardil? Ela não sentiu
nada por ele?
Ele tinha de descobrir.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

― Então, vamos para a cama juntos, ― ele disse.


Ela engoliu. ― Você não quer assistir o fogo de natal?
― Não. Eu já vi o suficiente. ― Ele deu um passo em
direção a ela.
Ela mexia com o seu vestido. ― Eles fazem um círculo do
lado de fora...
Ele deu outro passo.
Ela lambeu os lábios. ― E eles andam...
Ele deu o terceiro passo.
― Na direção do sol, então...
Seu quarto passo trouxe-o perto o suficiente para notar
o desejo enfumaçado em seus olhos. E quando ele baixou seu
olhar, ele pôde ver a doce curva de entre os seus seios, onde o
linho se afastava.
Diga-me alguma coisa ― , ele sussurrou, quase com
medo da resposta.
― Sim? ― Sua voz rachada.
― Você me ama em absoluto?
Enquanto o olhava, seus olhos se encheram de
lágrimas, e seu queixo começou a tremer.
Ele sentiu seu coração quebrar. Ela pode não querer
dizer as palavras. Mas a resposta estava lá, em seu silêncio.
Ele apertou a mandíbula contra a amarga decepção.
Mas assim que ele se virou e a deixou sozinha, talvez
para afogar as mágoas em um barril de Bordeaux—ela
chocou-se contra seu peito com um grande soluço.
― Oh, sim, Deus me ajude, mas eu sim, Noël. Eu te amo
muito.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Ela chovia beijos e lágrimas nele em igual medida. O


calor de sua admissão foi um bálsamo calmante para o seu
coração. Ele a segurou perto, muito perdido no alívio e alegria
para pensar para além do momento.
Seus beijos rapidamente espalharam as chamas de
amor, do carinho ao desejo, do desejo ao desespero. Noel não
queria pensar no amanhã. Ou no seu rei. Ou na sua noiva
verdadeira. Tudo o que ele queria era uma noite linda com
sua irresistivel mulher, que sim, o amava.
Ysenda sabia que ela estava jogando um jogo perigoso.
No entanto, ela descaradamente continuou, como os rapazes
que saltavam sobre a fogueira do natal. Ela não conseguia
parar por si mesma.
A situação era impossível. Ela não tinha sido capaz de
fazer Cathalin apaixonar-se por Noël, mais do que ela poderia
conseguir deixar de amá-lo.
E agora que ela admitiu que se importava com ele, ela
não poderia confessar que ela o enganou. Isso quebraria seu
coração.
Ainda assim, mesmo com o mortal nó de mentiras e
engano envolto em torno dela, tudo que ela podia pensar era
fazer amor com ele. Ela não queria pensar em sua irmã. Ou
Noël voltar para a França. Ou o que seria de Caimbeul. Tudo
o que ela queria era viver para este momento.
De alguma forma, suas roupas caíram. De alguma forma
eles acabaram em cima da cama. Em um delicioso
emaranhado de membros, eles deixaram o resto do mundo
desaparecer.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Seus labios beijaram sua culpa. Seus dedos acariciaram


sua preocupação. E com sua carne nua pressionada, não
havia espaço para o remorso.
Ela flutuava em celestial esquecimento. No momento,
tudo que importava eram os dois e sua busca convincente
pelo prazer. Desta vez, era mais do que mera cópula. Ela
queria lhe mostrar o quanto ela se importava com ele. Ela
queria que ele sentisse o seu amor no mais profundo de sua
alma. E ela queria sentir-se acarinhada em troca.
Quando ele pressionou gentilmente para dentro dela, ela
suspirou em alívio. Olhando para ele com um olhar lânguido,
ela viu a mesmo doce satisfação em seus olhos da meia-noite.
Quando ele começou a se mover dentro dela, ela o
encontrou, impulso por impulso. Assim como eles haviam
caminhado lado a lado em volta dos campos nevados, eles
atravessaram a paisagem do desejo juntos.
Seu olhar queimava dentro dela. Sua respiração enviou
arrepios ao longo de sua pele. A sua língua banhou-a com
seu néctar inebriante. O traçar dos dedos provocavam para
persuadi-la às maiores alturas.
Querendo mantê-lo com ela para sempre, ela entrelaçou
suas pernas em torno dele. Ela apertou seus calcanhares em
suas nádegas, fazendo-o gemer com felicidade.
Ele prendeu seus dedos através dela, ancorando-a ao
colchão. Ela prendeu a respiração enquanto sua luxúria
afiava-se para um bom ponto. Em seguida, ele explodiu em
uma centena de belos fragmentos.
Ela arqueou-se e apertou os punhos dele.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Ele respondeu, entrando nela com um grito de


libertação.
Em seguida, ela se enrijeceu.
Ele a chamou pelo nome.
O seu verdadeiro nome.
Ela sugou uma respiração em pânico, mas ele não iria
soltá-la. Seus dedos ainda estavam entrelaçados com os dela.
E quando ele lentamente abriu seus olhos vidrados de desejo,
ela viu a verdade.
Ele sabia quem ela era.
Ele sabia de tudo.
Por um longo momento, eles apenas olharam um para o
outro.
― Como você descobriu? ― , ela sussurrou.
Ele não respondeu a ela. Em vez disso, o seu olhar
endureceu. ― Como você pôde mentir para mim?
― Eu precisei, ― ela confessou. ― Eu não tive escolha.
Ele ainda estava segurando-a. Ela não tinha medo dele,
não realmente. Ele era um homem de honra, um cavaleiro
que nunca prejudicaria uma senhora. Mas ela podia ver pelo
brilho ameaçador do seu olhar, e a força dos seus braços, que
ele poderia ser um inimigo temível.
― Quando você planejava me dizer? ― ele exigiu.
― Eu queria falar com você o tempo todo. Eu tentei
parar o handfasting. Eu nunca quis consumá-lo. Eu esperava
convencer a minha irmã a casar com você. ― Ela acrescentou
calmamente, ― eu ainda faço.
― Por que você não me disse na primeira noite?

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Ela engoliu em seco, baixando os olhos. A verdade era


humilhante. Mas ela devia isso a ele. ― O laird disse que se
eu falasse com você, ele machucaria Caimbeul.
Ele tem desejado matar meu irmão desde que ele
nasceu. Ele não pode aguentar ter um filho que não é
perfeito. Quando minha mãe morreu, ela me fez jurar cuidar
de Caimbeul. Eu sempre cuidei dele.
Os dedos dele soltaram os seus. A linha dura da sua
boca relaxou. ― Você poderia ter me falado. Seu pai não teria
sabido. ― Ela lhe deu um sorriso sentido. ― E o que você teria
feito, então? Insistido em se casar com minha irmã? E
quando meu pai recusasse, você teria se levantado contra
todo o clã somente com seus seis cavaleiros?
Ele comprimiu seus lábios.
― Eu nunca quis enganar você ― , ela disse a ele. ― É
pura loucura ir contra o rei. Eu tentei dizer isso ao meu pai.
Mas ele não me ouviu. Ele quer um Highlander para manter
suas terras.
― Quando os reis descobrirem.
― Eles vão enviar um exército para acabar com o clã. Eu
sei. Meu pai se recusa a acreditar nisso. E a minha irmã acha
que seu marido Highlander trará homens para defender
nosso clã.
― Então, ele prefere iniciar uma guerra que ver um
Normando herdar suas terras.
Ela assentiu com a cabeça.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Ele desenlaçou seus dedos e rolou para o lado, deitado


de costas para olhar para o teto. Ela puxou o lençol sobre os
seios.
Doia-lhe dizer as palavras, mas ela o fez. ― Eu queria
que minha irmã amasse você.
Ele não hesitou. ― Eu nunca poderia amá-la. Não do
jeito que eu amo você.
Seu coração virou. E, então, afundou. ― O que nós
vamos fazer?
― Mon dieu, eu não sei.

Uma boa noite de sono nada resolveu.


Noël desejou nunca ter sabido a verdade. Ele poderia ter
vivido feliz na França com sua falsa noiva por anos, antes do
pai dela morrer. Então, seria muito tarde para desfazer o que
havia sido feito. Não que ele mesmo quisesse. Ele começou a
sonhar menos com a herança da terra, e mais sobre como
roubar a filha do homem.
Mas, apesar de sequestrá-la, ele ainda não sabia como
resolver o problema do seu casamento.
Um problema ele sabia como resolver. Uma moça jovem
como Ysenda não deveria ser sobrecarregada de cuidar de
seu irmão para o resto de sua vida. Esta manhã, Noël
pretendia provar-lhe que Caimbeul não era uma criatura
indefesa que precisava ser alimentado à mão e ajudado. Se

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Noël não pudesse fazer mais nada, ele poderia pelo menos
dar a Ysenda o dom da liberdade.
Ele se arrastou para fora do quarto sem acordá-la. A
maioria do clã estava no grande salão, quebrando o jejum
com bolinhos de aveia com manteiga.
Ele se aproximou de Laird Gille.
― Meu laird, eu não vi o seu homem, Caimbeul,
ultimamente.
O laird grunhiu. ― Por que você deveria se interessar por
ele?
Noël deu de ombros. ― Eu estava imaginando se você
acha que ele estaria disposto a um pouco de esporte, esta
manhã.
Os olhos do laird se iluminaram. ― Esporte?
― Sim. ― Meus homens me emitiram um desafio. Eles
dizem que eu não posso fazer de um aleijado, um lutador. Eu
digo que posso.
― Realmente? ― o Laird acariciou a barba em
especulação. ― E você pôs moeda nisto?
Ele acenou a ideia. ― Não, é apenas uma questão de
orgulho.
Os olhos do laird estavam brilhando agora. ― Orgulho?
Ah! Há uma moeda a ser feita em uma aposta assim.
― Talvez.― O laird Gille riu. ― Para não mencionar que
isto poderia ser divertido. Caimbeul com uma espada.
Noël disfarçou sua aversão. ― Então, você acha que ele
concordará?
― Oh, sim, eu posso fazê-lo concordar.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

― Depois do café da manhã então? No pátio?


― Sim. ― O laird esfregou alegremente as mãos e partiu
para buscar Caimbeul.
Noël não falou para Ysenda o que ele estava fazendo. Ela
só tentaria interferir para proteger o irmão dela. Ela
descobriria logo, de qualquer maneira.
Os cavaleiros estavam exercitando no pátio, e o sol
estava dançando ao longo do topo dos pinheiros distantes,
quando Caimbeul, não mais em correntes, veio mancando e
pulando rapidamente ao longo do pátio, enquanto se apoiava
em um bastão nodoso.
Noël o estudou. Mas ao invés de notar as falhas no
andar dele, ele procurou as forças do homem.
Claro que os homens de Noël não emitiram, realmente,
esse desafio. Eles conheciam Noël bem o bastante para saber
que ele poderia transformar qualquer homem em um lutador.
Em vez disso, eles deram boas-vindas a Caimbeul dentro do
campo, com braços abertos e lâminas prontas.
Laird Gille tinha criados trazendo-lhe uma cadeira para
que ele pudesse sentar-se na linha lateral. Ele provavelmente
imaginou que estava prestes a ver um espetáculo horrível e
divertido. Uma multidão pequena de homens juntou-se ao
redor. Noël poderia vê-los trocando moedas, apostando no
resultado.
No momento que Caimbeul alcançou Noël, seu rosto
estava vermelho e furioso, e seus olhos cheios de raiva.
É assim que você me paga por dizer a verdade? ― , ele
sussurou. ― Lutar com espadas?

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

― Não de todo, irmão, ― Noël disse com tranquilidade.


― Eu vou ensiná-lo a lutar de maneira adequada...então
você não terá que ter medo de seu pai, mais.
Caimbeul piscou em surpresa. Por um instante a
esperança brilhou em seus olhos. Então, eles escureceram
com cinismo. ― Eu sou um aleijado. Eu não posso lutar.
― Você mandou um bom murro em mim na noite
passada. Se não tivesse sido o grilhão, você teria me
achatado.
Caimbeul parecia quase satisfeito com isso.
― Venha, ― Noël pediu, golpeando-o com cuidado no
ombro. ― Vamos mostrar ao seu pai o que você tem.
O rapaz caiu algumas vezes. Seu pai riu. Mas, a cada
vez, Noël e seus cavaleiros reforçaram a coragem e o coração
do jovem, assegurando-lhe que ele estava fazendo um bom
progresso.
E ele estava. Ele pode não ter a estatura para empunhar
uma espada com grande precisão, potência ou velocidade.
Mas ele tinha a surpresa no seu lado.
Qualquer um olhando Caimbeul, imaginaria que ele não
podia se defender.
Mas mesmo com sua estrutura torcida, ele poderia
avançar com uma adaga, socar um homem em cheio no nariz
e chutar as pernas de um atacante por debaixo dele.
De fato, Laird Gille começou a franzir o cenho quando
Caimbeul conseguiu não só ficar de pé dele, mas derrubar
alguns dos cavaleiros dele.
Foi então que Ysenda chegou.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Mas para o pesar de Noël, o amplo sorriso de orgulho


triunfante e saudação alegre que ele deu a ela, foi murchado
por sua carranca de pura fúria.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Capítulo 8

O coração de Ysenda vibrou em pânico quando ela


acordou e descobriu que Noel tinha partido. Ele tinha
decidido que era muito doloroso dizer adeus? Ele
simplesmente partiu sem uma palavra?
Apesar de que provavelmente seria o melhor ― melhor
ainda se ele houvesse fugido com Cathalin ― ela esperava
com todo coração que não tivesse.
Ela se aproximou da janela e espiou pelas persianas. Os
homens de Noel ainda estavam lá, lutando no pátio abaixo.
Com um suspiro de alivio ela voltou para a cama. Seu
olhar pegou o prêmio tolo que recolhera ontem à noite
enquanto Noel dormia ― a mecha preta que ela tinha cortado
de sua cabeça e amarrado na fita vermelha que uniu suas
mãos no handfasting.
Ela mordeu os lábios. Ela tinha esquecido disso. Tinha
sido um gesto infantil. Mas ela queria uma lembrança dele.
Alguém arranhou a porta. Com um pequeno suspiro,
Ysenda arrebatou a mecha incriminatória e escondeu sob o
corpete da sua camisola. Ela abriu a porta para Cathalin e
sua criada, que vieram escolher o traje de Cathalin para o
dia.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Depois de terem ido, Ysenda vestiu seu próprio vestido e


desceu as escadas. Ela queria fazer mais uma tentativa para
convencer seu pai a fazer as coisas direito. Ela pegou um
biscoito de manteiga no salão, e saiu para falar com o seu
pai, que estava assistindo os cavaleiros normandos
treinarem.
Agora ela tinha alcançado a borda do campo onde seu
pai estava sentado. Ela parou em seu caminho.
O que ela viu a deixou de queixo caído, e fez com que o
biscoito de manteiga caísse no chão.
No meio da luta estava Caimbeul. Ele estava arrastando
a espada para trás enquanto coxeava contra dois homens de
Noel.
De repente ele balançou a arma ao redor. O primeiro
cavaleiro esquivou. O segundo empurrou Caimbeul de lado
com seu escudo, empurrando-o para fora do equilíbrio.
Caimbeul caiu para trás em seu traseiro. Ao lado dela,
seu pai resfolegava de riso.
Seu sangue ferveu.
Apertando a mandíbula ela avançou. Ela empurrou os
homens do seu clã para fora do caminho, roubando uma
espada de um, antes que ele percebesse, e continuou
carregando.
Caimbeul tinha se recuperado, e estava de pé
novamente, pirateando seus atacantes. Mas seria apenas
uma questão de tempo antes de cair novamente.
Ela empurrou um dos cavaleiros de Noel. Ele
instintivamente puxou sua lâmina. Então, vendo que era uma

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

mulher, ele embainhou a espada e recuou com as mãos


levantadas.
― Para mim! ― ela gritou com os cavaleiros que
atacavam seu irmão.
Como a maioria dos estranhos às highlands, os
cavaleiros franceses não estavam acostumados a enfrentar
uma mulher com uma arma. Assustados, eles se viraram
para ela. Um deles abaixou o seu escudo. O outro foi forçado
a levantar o seu, quando ela veio nele com um golpe forte o
suficiente para tirar-lhe a cabeça, se tivesse alcançado.
Prejudicada pelo impacto da sua espada no escudo,
Ysenda cambaleou de forma inclinada. Mas se recuperou
rápido o suficiente para intervir entre o cavaleiro e seu irmão
e tomou outro balanço.
Do outro lado do campo, ela ouviu Sir Noel gritar, ―
Não!
Muito tarde. Ela deu um corte no ombro do cavaleiro,
como castigo. Ele tropeçou para trás, apertando seu braço
machucado, enquanto seu companheiro rapidamente
recuperou seu escudo.
Mas então ela foi apanhada pela cintura, por trás. Antes
que ela pudesse virar, sua espada foi arrancada de seu
punho. Um instante depois, seu captor a varreu com um
golpe rápido na parte de trás de seus calcanhares. Em vez de
deixá-la cair, ele a pegou em seu braço e abaixou-a com
cuidado exagerado sobre a grama molhada.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Ela imediatamente ergueu os cotovelos, franzindo o


cenho na raiva. Mas a ira dela desapareceu quando ela viu
quem a desarmou.
― Caimbeul? ― ela piscou de forma surpreendente.
Ele sorriu para ela. ― Bom dia, irmã.
― O que você....? ― Como você...?
Parecia impossível.
Ele deu uma piscadela. ― Parece que você não é a única
em cujas veias correm o sangue dos guerreiros.
Ela ainda estava sem palavras e com admiração quando
Noel abaixou-se ao lado dela. Sua testa estava pesada.
― Meu anjo, você está ferida?
Ela olhou para frente e para trás entre os dois homens.
Os olhos de Noel estavam preocupados, os de Caimbeul com
orgulho alegre. ― O que diabo está acontecendo? ― ela
retrucou.
― Ela está bem, ― Caimbeul assegurou a Noel.
Noel parecia duvidar. ― Foi bem forte o tombo que ela
levou.
Caimbeul encolheu os ombros. ― Eu já a vi em situação
pior.
Noel balançou a cabeça. ― Como pode suportar sua
própria irmã lutar?
― Ela é mais dura do que parece.
A testa de Noel levantou. ― É isso mesmo?
― Oh, sim. E não é a primeira vez que ela cai sobre seu
traseiro.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Ysenda franziu a testa. ― Já basta, vocês dois. Eu estou


bem aqui, vocês sabem. Eu posso ouví-los.
Ela procurou ficar em pé, batendo nas mãos prestativas
deles.
Noel murmurou, ― Você tem certeza de que está tudo
bem?
― Eu estou bem, ― ela disse, apesar de seu orgulho
estar ferido. ― Agora, é melhor que um de vocês me diga o
que está acontecendo.
― Sir Noel está ensinando-me a lutar, ― Caimbeul disse.
― Oh, ele está, ele está?
Seus olhos queimaram quando ela se virou lentamente
para encarar Noel. Então, ela o agarrou pela frente de sua
túnica e o arrastou para fora da audiência de Caimbeul. ―
Ensinando-o a lutar? ― ela sibilou. ― Contra os cavaleiros
testados pela batalha? ― Um aleijado? ― ela odiava usar
aquela palavra, mas não havia nenhum outro termo para
isso. ― Por que? Você pensou que seria divertido para o meu
pai?
Os olhos de Noel ficaram escuros. Ele baixou o olhar frio
para os punhos dela, ainda firmes em sua túnica. Sua
mensagem não dita estava clara. Ele não permitiria que ela o
rebaixasse na frente de seus homens e do clã. E ele não iria
responder até ela soltá-lo.
Então ela soltou.
Mas ela ainda precisava de uma resposta.
― Como você pode ser tão cruel? ― ela sussurrou. ―
Você não consegue ver como o laird zomba dele?

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

― Ele não está zombando dele agora.


Ela olhou para o pai dela. Noel estava certo. O laird não
estava regozijando. Ele estava olhando com um ar
ameaçador.
― O seu irmão é mais capaz do que você pensa. Ele é
mais capaz do que ele mesmo acredita.
― Você não entende. ― Ele é...ele é um aleijado.
― Ele é um pouco torcido,― Noel admitiu. ― Mas ele
ainda pode lutar. Ele a derrubou sobre seu traseiro.― Um
lado da sua boca elevou-se num sorriso.
― Talvez ele possa dar uma rasteira na irmã. Mas ele
não pode lutar contra guerreiros experientes. ― Uma onda de
pavor baixou sobre ela enquanto considerava as
consequências. ― Se você o fizer acreditar, pode matá-lo.
― E se você o fizer acreditar que ele não pode, você o
manterá fraco.
Seus ombros caíram. ― Eu não posso deixar que o mal
venha até ele. Eu fiz um voto.
Seus olhos suavizaram. ― Você era criança quando você
fez esse voto. Ele é um homem crescido, agora. Ele pode
cuidar dele mesmo.
Ysenda mordeu o lábio. Uma parte dela queria acreditar
nisso. Mas Noel não conhecia Caimbeul como ela. Ele não viu
como Caimbeul tinha sido zombado e desprezado em toda a
vida dele, como ele desejou ser normal. Ele não podia
entender a dor do irmão dela.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

― Olhe para ele um pouquinho, ― Noel sugeriu. ― E se


você não concordar que ele pode se defender, você pode voltar
a limpar seu traseiro.
Ela deu-lhe um empurrão por esse comentário, mas só o
fez sorrir. Então ela olhou por cima de seu ombro para
Caimbeul, que já estava de volta para lutar com um dos
cavaleiros de Noel. Ela não podia lembrar uma época em que
seu irmão parecia tão brilhante, ansioso e vivo.
Foi uma decisão difícil. Mas ela finalmente assentiu sua
concordância. Noel voltou para o campo.
Seus dedos estavam brancos enquanto ela apertava
seus punhos nas saias, resistindo ao impulso de correr para
a frente na defesa de Caimbeul, enquanto ele se esquivava
das cutiladas de homens com braços tão grossos quanto
carvalhos. Ela ofegou várias vezes quando uma lâmina por
pouco não atingia sua cabeça. E seu coração desceu para o
estômago quando um dos cavaleiros o despachou estatelado
na grama.
Mas então, no meio da luta, Noel gritou algumas
instruções. De repente, Caimbeul executou um giro
inesperado para trás, sob o braço da espada de um homem,
empurrando-o para a frente do segundo atacante.
Como os dois cavaleiros caíram em um emaranhado de
correntes, Caimbeul cantou vitória. Noel apressou-se a bater-
lhe nas costas.
― Bem feito. Você vê? A sua melhor arma é o elemento
surpresa.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Intrigada agora, Ysenda observou enquanto Noel


continuava treinando seu irmão, com um estilo e técnica
únicos. Claro, uma vez que Caimbeul começou a melhorar,
sua esquisitice não era mais divertida, o laird perdeu o
interesse e retirou-se para o castelo. Mas Ysenda permaneceu
para assistir com fascínio, vislumbrando um lado de seu
irmão que ela nunca tinha visto antes.
Gradualmente, ao longo de uma hora, Noel transformou
Caimbeul em um impressionante e letal lutador. Ainda mais
significativo, os cavaleiros de Ware tornaram-se os
companheiros de Caimbeul em armas. Eles o desafiaram,
brincaram com ele, vangloriou e amaldiçoou juntos. Seu
irmão finalmente teve amigos que o tratavam como um igual.
Ainda que para que fim?
Seu coração afundou. Os cavaleiros podem ser seus
irmãos agora. Mas logo eles iriam abandonar Caimbeul para
voltar para a França. Então, ele ficaria mais uma vez com os
homens do clã, que zombavam dele.
Não era justo. Era ruim o bastante que ela tivesse que
entregar um marido perfeito para sua irmã egoísta. Era ainda
mais cruel fazer Caimbeul sacrificar sua felicidade também.
Ela nunca se sentiu mais como inimiga da sorte.
Na sombra da sala de armas, Noel destravou o cinto da
espada e jogou-o de lado. Ele estava cheio de
arrependimento. Como se escolher entre seu dever para com
seu rei e os ditames de seu coração não fosse suficientemente
difícil, agora ele teria que sofrer com a perda de um jovem
irmão que ele rapidamente viera a admirar.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Noel nunca teve um estudante mais entusiasmado e


atento do que Caimbeul. O rapaz não apenas aprendeu
rápido, mas ele era inteligente e inventivo. Se apenas Noel
tivesse mais tempo com ele, ele estava confiante que ele
poderia moldá-lo em um guerreiro respeitável.
Noel tirou sua túnica pela cabeça, então inclinou-se
para se livrar de sua cota de malha, deixando-a ficar no chão.
Atrás dele, ele ouviu alguém entrar na sala de armas. O
passo desigual ― o bater do bastão e o pé arrastando pelo
chão ― foi instantaneamente identificável.
― Eu vim agradecê-lo, Sir Noel, ― Caimbeul disse
silenciosamente, ― por me dar algo que nenhum homem já
me deu antes. ― Ele parou no meio da sala. ― Esperança.
Os ombros de Noel baixaram. Esperança? Ele temeu ter
dado a Caimbeul apenas falsas esperanças. O que seria do
rapaz uma vez que os cavaleiros fossem embora? Ele voltaria
a se encolher diante de seu pai?
― Você me fez ver que eu sou mais do que apenas um
aleijado, ― ele continuou. A emoção engrossou sua voz. ― ―
Eu nunca esquecerei isso. E eu nunca vou esquecê-lo.
Noel assentiu e virou-se para Caimbeul. Mas ele não
podia olhá-lo nos olhos. ― Eu nunca vou esquecê-lo, também.
Contudo, um outro par de olhos flutuou em seus
pensamentos. Olhos que brilhavam como névoa cinzenta.
Olhos que brilhavam como um suave mar prateado. Eles
eram olhos que ele nunca seria capaz de banir de sua mente.
Com um suspiro, ele afundou no banco de madeira e
suspendeu a cabeça.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Caimbeul coxeou e sentou-se ao lado dele.


― Você a ama, não é? ― ele adivinhou. ― Ysenda?
Cansado de mentir, Noel assentiu.
― ― E você não quer deixá-la.
Noel engoliu o desespero e respondeu bruscamente.
― Não é minha escolha, Caimbeul. Eu tenho a obrigação
de honra de fazer a vontade do rei.
Caimbeul sacudiu sua cabeça. ― É minha culpa. Se eu
não tivesse dito a você que você casou com a irmã errada...
Noel sorria tristemente. ― Não é como uma disputa,
Caimbeul. Você não pode fingir-se de tolo e enganar o seu
caminho pela vida.
― Você não pode? ― ele resmungou.
Noel sacudiu a cabeça.
― Mas se você ama verdadeiramente minha irmã, não é
tudo que importa?
Noel mordeu sua língua. ― Você tem habilidades com
uma lâmina agora. Mas você ainda tem muito para aprender
sobre dever e honra.
Caimbeul soltou um suspiro. Então ele puxou sua
adaga e começou a esculpir, lentamente, o topo de seu bastão
de madeira.
― Além disso, ― Noel disse, ― você não preferiria que eu
levasse a verdadeira Cathalin e deixasse Ysenda aqui? Eu sei
que você é muito ligado à sua irmã. E ela o ama muito.
Caimbeul continuou esculpindo em silêncio, mas Noel
viu seus lábios apertados com uma pergunta não solicitada.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

― Você estava esperando vir conosco, ― Noel adivinhou,


― Não estava?
Caimbeul encolheu os ombros. ― Talvez. ― Ele espanou
as aparas de madeira de cima do seu bastão. ― Eu poderia
me fazer útil agora.
Suas palavras partiram o coração de Noel. Não havia
nada pior para um homem do que não se sentir útil. Ele
desejou poder levar Caimbeul com ele.
Mas se ele fizesse o certo e se casasse com a Cathalin
verdadeira, ele teria que deixar Caimbeul para trás. Ele não
podia ser tão cruel para roubar o irmão de Ysenda dela.
Com um resmungo de frustração, ele se pôs de pé,
passando as mãos pelo cabelo.
O movimento abrupto assustou Caimbeul, que
cambaleou no banco de surpresa e quase caiu. Como ele
agarrou em Noel para recuperar o equilíbrio, sua adaga
arranhou o pescoço de Noel.
― Ah! ― Caimbeul chorou. ― Perdoe-me. Você me
assustou. Você está bem?
― Sim, ― ele disse, batendo a mão no pescoço
ensanguentado para se certificar de que a cabeça ainda
estava presa. Então ele deu ao rapaz uma piscadela de
tranquilidade. ― É apenas um arranhão. Mas é melhor você
guardar a sua arma, antes que seu sangue guerreiro obtenha
o melhor de você.
― Desculpa. ― Caimbeul embainhou sua adaga e
curvou-se para recuperar o seu bastão. ― Você tem certeza de
que está tudo bem?

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Noel assentiu. Não, ele não estava bem. Ele estava com
o coração partido e desencorajado. Ele não conseguia ver
nenhuma saída para essa situação. Não haveria um final
feliz...para ninguém.
Depois que Caimbeul saiu e Noel ficou sozinho
novamente, na sala de armas, seus pensamentos começaram
a se acumular.
O poço viking de repente materializou-se em sua mente.
Porque, ele não sabia. Ele realmente não acreditava em
encantamentos. Apenas um tolo poderia imaginar que uma
antiga ruína possuía poderes mágicos.
No entanto, as palavras de Ysenda o assombraram. O
que ela havia dito? Que o poço poderia abençoar dois
amantes, unindo-os para a eternidade.
O que era ridículo. Mas ele supunha que cada lugar tem
suas lendas locais ― as terras altas mais do que a maioria.
Para os supersticiosos, tudo o que bastava para manter uma
lenda viva, era suficiente coincidências inexplicáveis.
Noel, no entanto, não era supersticioso nem crédulo.
Sacudindo a cabeça sobre a sua ideia absurda, ele deixou a
sala de armas.
Quando ele entrou no grande hall, ele vislumbrou
Ysenda perto da parede mais distante. Ela parecia tão bonita
quanto...quanto uma deusa viking.
Ele franziu a testa. Uma deusa viking? O que fez esse
pensamento em sua mente? Ele não sabia nada sobre deusas
vikings.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Ele endireitou-se e atravessou a multidão em direção a


Ysenda.
O sorriso dela estava melancólico. Seus olhos pareciam
como nuvens pesadas prestes a perder sua provisão de chuva
enquanto murmurava, ― Não posso agradecer o suficiente
pelo que você fez por Caimbeul.
― Ele é um bom lutador. Se ele colocar sua mente nisso,
um dia ele será um grande guerreiro viking.
― Um que?
Noel franziu as sobrancelhas. O que o fez dizer isso?
― Highland, um grande guerreiro Highland.
Os olhos de Ysenda estavam úmidos. Ele podia ver que o
elogio a seu irmão significava muito para ela. Mas quanto
mais ele a olhava, mais miserável ele sentia. Estar em pé ao
lado dela era uma tortura quando sabia que não poderia
mantê-la.
Ele tinha uma desculpa para fugir, mesmo que por um
momento.
Havia um barril de cerveja no lado oposto do hall.
― Vou pegar uma bebida do poço. Você gostaria que eu
conseguisse uma para você?
Ela deu-lhe um olhar zombeteiro. ― Do poço?
― O que?
― Você disse que ia trazer uma bebida do poço.
― Não, eu não disse.
― Sim, você disse.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Ele havia dito isso? O que estava errado com ele? ― Eu


estou indo pegar uma bebida do barril lá na parede mais
distante. Sim, o que eu disse, da parede.
Não era o que ele havia dito, e ele sabia disso. Mas ele
não podia explicar por que sua mente estava fixada naquele
danado poço viking. E ele não queria tentar.
Sem esperar para ver se ela queria uma bebida, ele saiu
para encher dois copos.
No momento em que ele trouxe sua cerveja, ele esqueceu
tudo sobre o poço. Ele acenou com a cabeça para o pai dela.
O laird estava falando com três dos cavaleiros de Ware e
Caimbeul.
― Parece que seu pai tem um novo respeito pelo filho.
― Sim, ― ela respondeu, tomando um gole, ― pelo
menos enquanto ele está cercado por seus homens.
O lembrete da iminente partida de Noel, trouxe uma
careta para seu rosto.
Só então, Cathalin desceu as escadas e entrou no
grande salão. Nenhum fio de cabelo estava fora do lugar.
Nenhuma ruga vincava o seu vestido. Mesmo seus próprios
homens, acostumados às grandes beldades da França,
viraram as cabeças quando ela entrou no salão. Mas olhar
para ela só fez o seu coração se afundar. Um peso desceu
sobre os seus ombros. E ele sabia que ele tinha que fazer algo
sobre isso.
― Nós precisamos conversar, ― ele disse à Ysenda.
― Eu sei.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

― Nós precisamos decidir o que fazer. Eu planejei partir


hoje, e
― Hoje?
― Aguardar mais não torna isso fácil.
― Eu sei.
Ela estava tentando ser corajosa. Ele podia ver isso. Mas
os olhos dela estavam molhados. E isso estava fazendo sua
garganta doer.
Uma mecha de cabelo caiu para a frente em sua
bochecha, e ele pegou, colocando-o atrás de sua orelha. Mas
seu olhar prendeu o dele em especulação.
Uma mecha do cabelo dela e uma mecha do seu,
amarrados juntos com uma fita.
Ele franziu a testa. Ele não deveria fazer isso. Era um
ritual bobo. Uma perda de tempo.
E, no entanto, ele pensou, enquanto apertava a
mandíbula para evitar o tremor do queixo, que dano faria?
Ele tentou todo o resto. Por que não tentar isso? Contanto
que ninguém o pegasse no poço, ninguém seria mais sábio.
Mas como ele conseguiria uma mecha do cabelo dela?
― E com quem você vai partir? ― ela engasgou. ― Minha
irmã? Ou eu?
Ela estava à beira das lágrimas. Ele sabia que ela não
queria chorar em frente do seu clã. Então ele pegou sua mão
e a guiou até as escadas.
Quando eles atingiram as sombras das escadas, ele a
rodeou com seus braços. Ele a beijou profundamente,

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

apaixonadamente. Foi um abraço agridoce de perda e


saudade, de despedida e infeliz desejo.
Foi também uma oportunidade para Noel deslocar sua
adaga e roubar uma mecha do cabelo dela. Sentindo-se um
tolo, não obstante ele conseguiu obtê-la sem o seu
conhecimento. Ele a fechou na palma da mão, e depois
interrompeu o abraço segurando-a um pouco distante de si.
― Eu preciso estar só por um pouquinho...para pensar.
Ela assentiu.
Ele olhou em seus olhos novamente, transmitindo seu
amor por ela com um olhar. E, então, ele saiu.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Capítulo 9

Depois que ele saiu, os olhos de Ysenda se encheram e


transbordaram. Os soluços alojados em sua garganta eram
muito dolorosos para engolir.
Ela nunca chorou ― pelo menos não onde alguém podia
vê-la. Chorar era um sinal de fraqueza.Ou assim a mãe dela
sempre tinha acreditado. Então, ela sentou-se no degrau,
enquanto entregava-se à sua tristeza em segredo.
Não havia nenhuma maneira de desfazer o que havia
feito? Não havia uma escolha que pudesse satisfazer a todos?
Não havia nada que pudesse fazer para mudar seu destino?
Enquanto ela continuava fungando ruidosamente nas
mãos, ela sentiu uma coceira entre seus seios. Com dedos
úmidos de lagrimas, ela alcançou seu corpete.
A mecha do cabelo. Ela havia se esquecido que ela
estava lá.
Ela retirou-a pela fita vermelha e olhou para ela. De
repente, uma estranha sensação de formigamento começou
na parte de trás de seu pescoço. Uma pequena esperança
soprou através de sua alma como um vento vadio.
Mechas do cabelo de cada amante, amarradas juntos
com uma fita.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Era possível? Ela poderia invocar a magia do poço


viking?
Ela nem sequer sabia se ela acreditava em magia.
Alguns do clã juraram por isso. Mas ela não colocava muita fé
em lendas antigas e encantamentos antigos.
Por outro lado, algo a obrigou a cortar a mecha docabelo
na noite passada. Por que mais ela teria feito isso? Ela deve
ter sabido, no fundo de seu coração, que ela iria acabar
visitando o poço.
Ela passou o polegar sobre os fios sedosos de cabelo
preto. Ela estava sendo infantil. Era apenas uma história
Natalina, depois de tudo.
Ninguém sequer sabia se a história era verdadeira. Ir lá
era, provavelmente, uma imprudente perda de tempo.
Por outro lado...qual era o prejuízo? Ela tinha que
tentar.
Enxugando as lágrimas, ela foi para o andar superior e
vestiu seu manto. Ela não queria que Noël a visse indo. Ele
poderia adivinhar o que ela estava fazendo. E ele poderia
pensar que ela era uma tola. Então, ela saiu do castelo em
silêncio e tomou um atalho para o poço.
No meio do caminho, ela parou para descansar.
Sacando sua adaga, ela cortou uma pequena mecha de seu
cabelo e amarrou-a juntamente com a dele.
O seu ruivo e o preto dele fizeram um contraste
interessante. Ela não podia deixar de pensar sobre como iria
parecer os cabelos dos seus filhos.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Ela engoliu em seco. E se a criança já estivesse


crescendo em seu ventre? O pensamento foi ao mesmo tempo
emocionante e apavorador.
Fechando os preciosos fios na mão, ela continuou sua
viagem, esperando que ninguém a visse.
Na verdade, ela estava tão ocupada certificando-se de
que não era seguida, que quando ela chegou, ela não
percebeu que não era a única visitante ao poço.
Há apenas dez passos do poço, ela finalmente viu que
ela não estava sozinha.
Arfou em surpresa.
Noel olhou para cima com uma carranca. ― Ysenda?
― O que você está fazendo aqui?
Ele escondeu algo atrás de suas costas e limpou a
garganta. ― Eu poderia perguntar-lhe a mesma coisa.
Ela percebeu que estava segurando as mechas de cabelo
onde ele poderia vê-las, facilmente. Mas ela não podia colocá-
las de volta em seu corpete. ― Eu precisava...ar fresco.
Ele não foi enganado nem por um instante. E seu olhar
foi imediatamente para o que ela estava segurando na mão. ―
O que você tem aí?
― Uma dúzia de mentiras cruzou sua mente. Ela abriu a
boca para falar uma delas. Mas nenhuma delas era crível.
Então ela fechou a boca novamente. Ela poderia muito bem
confessar. Ela abanou a cabeça. ― Mechas de cabelo.
― Cabelo de quem?
Ela levantou o queixo em desafio. ― O seu e o meu.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Ela esperava que ele fosse tirar sarro dela. Ele, sem
dúvida, daria uma boa risada às suas custas. E assim como
havia previsto, ele começou a rir.
Mas então ele segurou o que ele tinha atrás de suas
costas. ― Como essas?
Ela franziu a testa. Ele estava segurando fios de cabelo
preto e castanho-aloirado, amarrados juntos com uma fita
verde. Sua mão foi instintivamente para a sua cabeça, e ela
perguntou-se quando ele tinha roubado uma mecha de seu
cabelo. ― Como você...?
― Enquanto estávamos nos beijando. ― Um lado de sua
boca curvada para cima em um sorriso. ― E você?
Ela deu-lhe um tímido sorriso. ― Enquanto você dormia.
Ele balançou a cabeça. ― Venha. ― Seus olhos
brilhavam quando ele lhe chamou com sua mão livre. ―
Podemos acabar com isso.
Ela juntou-se a ele, onde ele parou sobre o poço. ― Você
acha que essa trança funciona?
― Eu não tenho ideia, mas vale a pena…
Houve um súbito movimento entre as árvores. Ambos
gelaram. Alguém estava vindo na direção deles. Porra! A
última coisa que Ysenda queria era um público para sua
tolice.
Mas depois de um momento, ela piscou, surpresa. Ela
reconheceu a movimentação do intruso.
Noël reconheceu também. ― O que diabo? Caimbeul?

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Caimbeul estava tentando através da neve. Seu bastão


escorregou na superfície lisa e ele estava sem fòlego. Mas ele
tinha um grande sorriso no rosto.
― Caimbeul! ― , ela disse, entregando as mechas de
cabelo para Noël, antes de correr para a frente para atender a
seu irmão. ― Você está bem? Como você andou tão longe? E
na neve? ― tanto quanto ela se lembrava, ele tinha ido ao
poço apenas uma vez antes, e ele tinha andado parte do
caminho no carrinho de um mascate.
Ele encolheu os ombros às perguntas dela, para fazer a
sua própria. ― O que os dois estão fazendo aqui? Vocês estão
fazendo desejos ao poço? É o que vocês estão fazendo?
― Não ― , ela disse.
― Sim, ― Noël disse.
Ysenda franziu a testa. Ela não estava exatamente
orgulhosa do que faziam.
Mas Caimbeul apenas riu e coxeou para a frente, então,
tirou algo de dentro da sua mochila. Por um instante, Ysenda
não pôde falar.
― É o que penso que é? ― Noël perguntou.
Caimbeul sorriu. ― Mechas do seu cabelo? Sim.
Ysenda pestanejou para o pacote de fita branca.
― Começo a pensar que tive sorte de não ter ficado
calva. Como você fez …?
― Lembra quando a derrubei em seu traseiro no pátio?
Caimbeul perguntou, atuando claramente como um
fanfarrão. ― Eu poderia ter roubado algumas mechas
enquanto você estava incapaz.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Noël estreitou os olhos e acenou com cabeça. ― E


apanhou o meu quando sofreu aquele 'acidente' na sala de
armas, não é?
― Você disse que a malandragem era a minha força ― .
Caimbeul sorriu com orgulho. ― Então, o que nós fazemos
agora?
Tinha parecido bastante bobo quando Ysenda estava
pensando em fazer o desejo sozinha. Agora, com três deles
recitando o desejo, pareceu absolutamente ridículo.
Por outro lado, o que tinham a perder? O fato de que
todos eles quisessem a mesma coisa tocou-a. E tornou-a mais
do que disposta a satisfazer os dois homens mais importantes
em sua vida.
― Suponho que nós os pesemos com pedras e atiramos
no poço juntos ― , ela disse.
Noël assentiu. ― Isto deve dar ao nosso desejo três vezes
o poder.
Uma vez que firmaram pequenas rochas em cada
pacote, puseram-se de pé, em conjunto, sobre o poço.
― O que devemos dizer? ― Noël perguntou.
― Não estou certa ― , admitiu Ysenda. ― Suponho que
desejamos uma maneira de unir nossos dois espíritos juntos
pela eternidade?
― Eu farei ― , Caimbeul ofereceu quando eles estavam
acima do poço. ― Penso que vocês devem ficar de mãos
dadas. ― Eles fizeram. ― No nome dos amantes infelizes que
uma vez se afogaram neste poço, eu faço este desejo de natal,
que as duas almas a que estas mechas de cabelo pertencem

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

sejam abençoadas no seu casamento e juntem-se para


sempre e sim.
Todos eles assentiram com a cabeça, satisfeitos com a
sua escolha de palavras. E logo deixaram os seus símbolos,
um por um, na água, onde desapareceram nas profundezas
escuras.
Os céus não abriram para deixar os anjos descer.
O ar não se misturou com a brisa das asas das fadas ou
se encheu do som de gaitas antigas.
Nenhum espírito viking apareceu.
De fato, o momento foi notavelmente não notável.
― O que fazemos agora? ― Caimbeul perguntou.
Noël respondeu. ― Suponho que esperamos
À medida que o tempo passava, Ysenda ficou mais e
mais desanimada. Nada estava acontecendo. O feitiço não
estava funcionando. Ela deveria ter sabido melhor que
acreditar em magia.
Depois de um desconfortável e longo silêncio, ela falou
finalmente. ― Talvez devêssemos voltar.
― Você acha que funcionou? ― Caimbeul perguntou.
― Não. ― A palavra arranhou sua garganta, como uma
lâmina de espada em uma pedra afiada.
As sobrancelhas de Caimbeul se juntaram. ― Então o
que fazemos agora?

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

O peito de Noël estava apertado. Ele esperava não ter


que responder isso. Ele esperava, impossivelmente, que de
alguma forma o poço lhe desse uma resposta. Mas não tinha
havido nada.
― O que devemos ― , ele decidiu.
Caimbeul endireitou-se, tanto quanto a sua estrutura
torta permitiu. ― O que quer que aconteça, eu vou para a
França com você ― , ele falou. ― Isto é, ― ele corrigiu, ― se
você deixar.
Do canto de seu olho, Noël pode ver que Ysenda apertou
sua mandíbula.
Ele balançou sua cabeça. ― Eu não posso tirar você de
Ysenda, Caimbeul. Você pode ser o seu irmão mais novo, mas
agora que você cresceu, ela precisa da sua proteção.
Caimbeul franziu o cenho, simultaneamente
desapontado e lisonjeado. No fim, tudo que fez foi murmurar,
― Eu não sou seu irmão mais novo. Sou o mais velho.
Houve um longo e melancólico silêncio.
Finalmente, as palavras de Caimbeul baixaram-se. Noël
pestanejou, perguntando-se se tinha ouvido mal. ― O que? O
que você disse?
― Sou mais velho do que Ysenda. Três anos mais velho.
Ele franziu a testa. ― É? E Cathalin?
― Sou dois anos mais velho que Cathalin.
Ele sacudiu a cabeça. Certamente não estava certo.
― Você é o mais velho?
― Sim

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Noël fechou os olhos. Ele estava perdendo alguma coisa?


― É o mais velho? ― repetiu.
― Sim ― , os irmãos disseram juntos.
― O mais velho, assim como o herdeiro legítimo do laird?
― Oh. Bem, não ― , Ysenda explicou. ― O laird nunca …
ele nunca declarou Caimbeul como seu herdeiro
― Espere, ― O coração de Noël começou a disparar. Ele
não quis animar-se prematuramente. Mas algo estava errado
aqui. ― Vocês estão dizendo que você é o próximo na linha?
― Em princípio, sim, mas
― Não, não, não, não ― , Noël interrompeu. ― Não em
princípio. Na verdade. ― Agora o seu coração estava
latejando. Esta poderia ser a sua resposta. ― Exatamente por
que ele não declarou você? Você não é seu filho pelo sangue?
― Sou
― Você é um bastardo?
― Não
― Por que então?
Caimbeul ruborizou e baixou o olhar.
Ysenda respondeu por ele. ― Nunca reivindicou
Caimbeul como seu filho porque ele é um aleijado e incapaz
de governar.
― Mas ele não é incapaz ― , Noël insistiu, começando a
acelerar ansiosamente, enquanto considerava esta nova
informação. ― Você o viu no campo. Não só ele é brilhante e
inteligente, como pode até mesmo segurar a sua própria
espada.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Ysenda e Caimbeul olharam um para o outro.


Claramente, o pensamento de contestar a herança nunca
tinha atravessado suas mentes.
Supôs que podia ver por que. As Highlands eram tão
remotas que o senhor de um clã era, essencialmente, o
soberano do seu próprio domínio. O rei escocês poderia
estabelecer a lei do país. Mas o laird sentia que tinha o poder
de curvar essa lei de acordo com a sua conveniência.
Em verdade, contudo, as leis eram uma questão de
registro. Ninguém pode alterar o que foi escrito por um rei
para atender às suas próprias necessidades … nem mesmo
um laird.
― Não importa se o laird deseja declará-lo ou não ― ,
Noël explicou. ― Caimbeul é seu filho. Enquanto ele for apto
para governar — e qualquer um pode ver que é — por lei,
Caimbeul é o verdadeiro herdeiro.
― Então você está dizendo que a herdade não pertence
legalmente a Cathalin ― , Caimbeul pensou em voz alta, ―
não importa com quem ela se case? Pertence a mim?
― Exatamente ― . Noël cruzou os braços sobre o peito
com satisfação. ― Que significa
― O que significa que todos podemos ter o que queremos
― , Ysenda irrompeu. ― Podemos ficar casados e ir para a
França. Cathalin pode se casar com o seu Highland …
― E eu posso ir treinar com os seus homens ― ,
Caimbeul inseriu, por medo de que pudesse ser excluído.
Noël deu-lhe um sorriso lento. ― Sim

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Caimbeul esfregou a sua mandíbula, pensando nisso.


Então a sua testa vincou. ― Não parece possível. Você
realmente pensa que isso acontecerá? O meu pai é muito
forte e decidido. E a região montanhosa da Escócia é um
longo alcance para o braço da lei.
― É por isso que o rei envia homens como os Cavaleiros
de Ware para fazer cumprir a lei ― , Noël disse.
― Você faria isso?
― Sim, claro. Você é um de nós agora
― Mas sobre o clã? ― perguntou. ― Eu não quero guerra
com o clã
― São o meu clã também ― , Noël assegurou-o. ―
Quando a hora chegar, encontraremos um modo de manter a
paz. Você é um homem inteligente. Vai pensar em algo.
Os belos olhos de prata de Ysenda brilharam com
esperança. Mas havia sabedoria e prudência em sua voz. ―
Tudo isso deve ser mantido em segredo. Se o laird suspeitar
que Caimbeul tem uma reivindicação para a herdade...
Não terminou o pensamento. Mas todos eles sabiam o
risco. Laird Gille não hesitaria em eliminar o seu herdeiro se
Caimbeul provasse ser … inconveniente.
― Sim ― , Noël disse. ― Isto será um segredo entre nós
três.
Eles assentiram em um acordo solene.
E então, com um grito suave de vitória, Ysenda jogou-se
nos braços de Noël.
Ele riu com prazer e segurou-a mais perto.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Mas como o seu abraço persistente continuou, Caimbeul


finalmente revirou os olhos e virou-se para sair. ― Aonde você
vai? ― Ysenda perguntou-o.
― De volta para o castelo ― , disse sobre o seu ombro. ―
Há algo que eu tenho pensado em fazer por um longo tempo.
Mas não se inquiete. No momento em que você terminar de
celebrar … … você pode me acompanhar.
Noël acenou-lhe em despedida. Então ele sorriu, e beijou
o topo da cabeça de sua encantadora esposa. ― Parece que
teremos toda a nossa vida para celebrar.
― Não apenas nossas vidas ― , murmurou. ― A
eternidade.
― Funcionou, não é? ― perguntou-lhe suavemente. ― O
poço viking. Concedeu-nos o nosso desejo de natal.
Ela assentiu com a cabeça. Então olhou para ele. O seu
sorriso era como um vinho doce e quente. Seus olhos
brilhavam com o calor das velas de Natal. ― Para sempre e
sim.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Epílogo

Deixando a sua casa nas Highlands para viajar para o


Sul com os Cavaleiros de Ware, Ysenda nunca se sentiu tão
bem protegida. Claro, isso não a impediu de empacotar sua
própria mala e armas. Velhos hábitos eram difíceis de
quebrar. Seria necessário um longo tempo para ela aceitar
que tinha um exército de cavaleiros a seu comando, e que seu
irmão poderia cuidar de si mesmo.
Caimbeul certamente provou isso em seu retorno ao
castelo.
Ysenda tinha tido muito tempo para pensar no caminho
do poço para casa. Agora que ela não estava mais sujeita a
seu pai, os anos de raiva pelos maus tratos a Caimbeul
começaram a supurar dentro dela. Todos os abusos passados
do laird — sua zombaria, violência e crueldade —
congelaram-se em um único e difícil nó de raiva e injustiça,
que estava preso em seu ser ― . A cada passo que levava em
direção ao castelo, a fúria fluia mais quente nas veias.
Quando finalmente chegaram ao castelo para enfrentar
seu pai, ele estava sozinho no grande salão, imerso em suas
xícaras. O seu escárnio embriagado quando os três se
aproximaram, apenas adicionou combustível ao desejo quase

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

irresistível que Ysenda teve, de fazê-lo pagar por toda a dor


que causara.
Mas ela segurou a língua quando Sir Noël explicou que
desejavam levar Caimbeul com eles para a França.
Os olhos do pai iluminaram-se. ― Ah, sim! ― gritou.
― Ouvi dizer que os tribunais franceses gostam de usar
anões para entretenimento.
Ysenda desejou xingar seu pai por suas palavras
brutais.
Mas então ela ouviu o eco da voz de sua mãe. Antes de
mais nada, a donzela guerreira deve manter o controle das
suas emoções. Perder o temperamento nunca foi sábio. Além
disso, ela e Caimbeul partiriam logo e provavelmente nunca
veriam o laird novamente. Não havia motivo para provocar
problemas. Então, ela tencionou a mandíbula contra o
impulso de disparar uma réplica mordaz.
O laird olhou Caimbeul pensativamente por cima da sua
xícara. ― Ou talvez você está planejando vendê-lo ao longo do
caminho? O rapaz tem uma voz decente. Não há dúvida que
um cantor aleijado pode produzir um bom preço.
Ysenda apertou os dentes até doerem. Mas continuou
repetindo, mentalmente, o conselho de sua mãe. É preciso
respirar profundamente, aproveitar toda a raiva e escolher as
batalhas com sabedoria.
O laird tomou uma bebida e logo bateu os lábios. ― Ele
provavelmente terá mais cinco ou seis anos de vida, no
máximo. Ainda assim, você terá o valor da sua moeda

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Isso fez o sangue de Ysenda ferver. Mas não importa o


quanto ela anseie arrancar aquele sorriso sujo do rosto do
laird, por mais gratificante que fosse rasgar a barba do seu
queixo, não importando que seu punho doesse por …
Ecoou o som de um soco!
Ysenda levantou o olhar a tempo de ver a cabeça do seu
pai jogada para trás pelo soco sólido de Caimbeul. O laird
cambaleou para trás, soltando a sua xícara e apertando o seu
nariz.
Enquanto Ysenda olhava com admiração, Caimbeul
sacudiu os nós dos dedos feridos. Então ele sorriu com
satisfação. ― Isso é por uma vida de sofrimento… pai.
Aquelas tinham sido as últimas palavras de Caimbeul ao
laird, que se afastou para alguém cuidar do seu nariz
ensanguentado. Ysenda nunca tinha estado mais orgulhosa
do seu irmão. E ela pensou que sua mãe concordaria que ele
tinha escolhido sua batalha sabiamente.
Agora eles estavam indo para a França — para a
liberdade e para a família. Tão impossível quanto parecia,
Ysenda pensou que Caimbeul dava a impressão de ser mais
alto enquanto viajava ao lado dos seus novos companheiros
de armas. Talvez ele já não se sentisse esmagado pelo peso da
sua enfermidade.
Quanto ao marido, embora seus homens insistissem
com riso que Noël era o mais feio dos irmãos de Ware, Ysenda
não poderia ter ficado mais feliz por ter se casado com um
homem tão bonito, gentil, nobre, brilhante e honrado. Noël
tinha prometido que quando o seu pai morresse, ele e seus

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

homens retornariam com Caimbeul para ajudá-lo a reclamar


a herdade nas Highlands, sem derramar uma gota de sangue.
Seu caminho do castelo os levou além do poço viking.
Ysenda pediu um momento privado antes de continuarem em
sua viagem, para visitá-lo uma última vez. Recolhendo sua
capa sobre ela, escalou através dos montes de neve até que
alcançou o córrego prateado e as pedras desmoronadas da
ruína.
Lá, ela passou os dedos pelas antigas runas esculpidas
na tampa do poço. Sussurrou agradecimento aos amantes
perdidos, por conceder o seu desejo. Então enviou uma
oração silenciosa dela própria — que de alguma forma, de
qualquer maneira, não importa quanto tempo demore, o casal
condenado poderia ter eventualmente sua própria maldição
levantada.
Quando voltou à companhia, os cavaleiros estavam
falando com uma dúzia de estrangeiros — viajando na
direção contrária. O bando de highlanders esfarrapados,
disseram que estavam a caminho do castelo de Laird Gille.
O pequenino rapaz na frente lambeu os lábios secos e
ergueu o queixo sem barba, vangloriando-se em sua alta e
doce voz, que ia casar-se com a moça mais bonita em toda a
Escócia.
Ysenda levantou as sobrancelhas. Mas sabiamente
segurou sua risada. Ela desejou poder ver o rosto de sua irmã
quando Cathalin visse o noivo que tanto queria — todos os
quatro pés dele.

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O Casamento Pagão ― (Cavaleiros de Ware 0.5) ― Glynnis Campbell

Em vez disso, sorriu a Noël, cujos lábios estavam


comprimidos com diversão. Ele deu uma piscadela, e ela
suspirou com prazer.
Esta seria sem dúvida, o melhor natal de todos.

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