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TTGP

Transdisciplinar
Teoria Geral do Processo
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1995
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21ª edição on line


Revista e atualizada até 19/3/2013
http://www.padilla.adv.br/processo/tgp/

Livro I - TTGPs – Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos


Os processos de pensamento e de comunicação, dos quais são espécies os processos jurídico-administrativos, cíveis,
desportivos, eleitorais, legislativos, penais e trabalhistas à www.padilla.adv.br/ufrgs/tgp/tgp.pdf

Livro II - TGRs - Teoria Geral das decisões e Remédios processuais


Tipos de Tutela jurisdicional e remédios processuais administrativos, cíveis, desportivos, eleitorais, legislativos, penais,
trabalhistas à www.padilla.adv.br/ufrgs/tgp/tgr.pdf
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 2

Sumário:
Dedicatória, agradecimentos e abreviaturas:
Livro I - Da Teoria Geral:
Capítulo I - Panorama do Sistema Jurisdicional e da sociedade.
Capítulo II – Transdisciplinar Teoria Geral do Processo.
1. Por que uma Teoria Geral dos Processos?
2. Teoria Geral do Processo Civil, Penal e Trabalhista é possível?
3. Dos Princípios Gerais aos vários processos.
4. Porque é preciso existir um Poder Judiciário?
5. História do processo no Brasil.
6. Como afastar a confusão nos princípios?
7. Do Princípio Dispositivo.
8. Como distinguir um princípio de uma regra?
9. Da multiplicação dos princípios.
10. Dos princípios processuais fundamentais.
11. Do Princípio da Legalidade.
12. Do Princípio do Juiz Legal ou natural.
13. Da diferença entre o Judiciário e os demais poderes.
14. Do processo eleitoral.
15. Da falta de equilíbrio entre os Poderes.
16. Do quarto poder, não estatal.
17. Do Princípio da Legalidade exigir um juiz imparcial
18. Da evolução do processo como ciência
19. Podemos conceituar jurisdição?
20. Da substitutividade no processo penal.
21. Do porque de uma jurisdição “voluntária”
22. Conceito de jurisdição.
23. Dos outros operadores jurisdicionais.
24. Da advocacia, o clamar por justiça.
25. Da interdependência com a magistratura.
26. Da advocacia e da liberdade.
27. Da arte de criar sob pressão.
28. Da advocacia pública.
29. Do impedimento e da incompatibilidade.
30. Do Ministério Público.
31. Das modalidades de processo.
32. Da liquidação de sentença.
33. Dos Procedimentos Especiais.
34. Da prova, instrução e julgamento.
35. Do laudo pericial.
36. Dos sistemas de análise da prova.
37. Da presunção.
38. Da “Introdução aos Princípios da Moral e da Legislação”.
39. Da Instrumentalidade e do Utilitarismo.
40. Da inspeção judicial.
41. Dos debates ou memorial.
42. Da crise de justiça e da Justiça.
43. Do devido processo legal e a competência.
44. Do tribunal constitucional, o STF.
45. Da justiça comum e das especializadas.
46. Da Justiça Militar.
47. Dos quatro graus de jurisdição.
47.1. Da Justiça Eleitoral.
47.2. Da Justiça do Trabalho.
48. Do novo ramo do Direito, o Desportivo.
49. Princípio da sucumbência.
Sumário do Livro II e Bibliografia
Página 3 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

A TTGP, Transdisciplinar Teoria Geral do Processo,


conjuga as vintenárias linhas de pesquisas sobre
processos e esporte. Proporciona uma perspectiva
inovadora da vida em sociedade, de que toda a
atividade humana acontece em quatro planos de
atuação.

Temas abordados:

Panorama do Sistema Jurisdicional e da Sociedade. Porque uma Teoria Geral dos


Processos? Processos humanos e jurídicos: A solução dos conflitos de interesse, pretensão, lide,
autotutela, autocomposição e heterocomposição. Importância da disciplina para entender a
sociedade. Natureza jurídica do processo. Direito Material e Direito Processual, distinções.
Autonomia específica do processo jurisdicional. O Judiciário e os demais poderes do Estado,
semelhanças e diferenças. Paz social e tutela jurisdicional. Princípio da Legalidade. Modalidades
da Jurisdição: Criminal & Civil; Estadual & Federal; Trabalhista; Eleitoral; Militar: Federal &
Estadual; Juizados Especiais: Civeis & Criminais; Estaduais & Federais; Introdução à
Principiologia e aos conceitos de Ação, Procedimento, Processo, Contraditório, Angularização
da Relação Processual. Teorias do processo como relação jurídica e como situação jurídica.
Elementos da ação: sujeito, objeto e causa de pedir. Identidade de ações. Litispendência e coisa
julgada. Teoria da ação. Posições doutrinárias sobre o direito de ação. Direito, pretensão e ação.
Ação de direito material e ação processual. Garantias constitucionais do acesso ao poder
jurisdicional do Estado. O direito de ação na Constituição de 1988. Sujeitos do processo. Partes.
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Substituição processual e legitimação extraordinária. Distinção para sucessão processual.


Distinção para representação processual. Casos. Eficácia da sentença relativamente ao substituto
e ao substituído. Terceiros intervenientes. Auxiliares da Justiça, permanentes e eventuais. Partes
em sentido formal e em sentido material. Capacidade processual. Capacidade de ser parte.
Capacidade de estar em juízo. Capacidade postulatória. Representação processual. Curador
especial. Ministério Público: natural, histórico. Constituição de 1988. Parte, substituto
processual ou fiscal da lei? O advogado na relação processual. Natureza jurídica da advocacia.
A advocacia na Constituição de 1988. Advocacia Pública. Defensoria Pública. Juiz natural,
posição como órgão estatal, poderes e deveres, responsabilidades, impedimento e suspeição.
Competência, Imparcialidade e Jurisdição. Modalidades de atos do juiz. Atos delegados por lei
aos Servidores e Auxiliares da Justiça. Noções gerais sobre: Forma, tempo e lugar dos atos
processuais; Termos processuais, auto, certidões, atas, termos registro e distribuição. Processo
Relação Processual Procedimento: Formação, Suspensão e Extinção. Atos Processuais. Teoria
dos Vícios Processuais e Pressupostos Processuais. Formação do processo. Atos de iniciativa,
de desenvolvimento e de conclusão do processo. Fases do processo de conhecimento. Fase
postulatória, fase de saneamento, fase de instrução, fase decisória, fase recursal. A simplificação
pelo julgamento antecipado. Competência; critérios classificatórios. Competência objetiva: em
razão da matéria, em razão da pessoa e em razão do valor. Competência territorial ou foro. Foro
geral. Foros especiais. Competência funcional. Conceituação. Espécies Competência funcional
no plano horizontal e no plano vertical (competência recursal). Categorias de competências:
absoluta e relativa. Conceituação, distinções e casos. Prorrogações da competência. Prorrogação
voluntária: tácita e expressa. Prorrogação legal: conexão, continência e prevenção. Conflito de
competência. Conflito positivo. Conflito negativo. Procedimentos e soluções. Competência
Internacional. Conceituação. Limitação da Soberania do Estado. Noções Gerais das modalidades
de tutela processual: Conhecimento, Execução, Cautelar, Especiais. Distinção entre tutela
antecipada e cautelar. Funções do Processo. Função de conhecimento. Função de execução.
Função cautelar. Tipos de procedimento. Procedimento comum: ordinário e sumaríssimo.
Procedimento perante os juizados especiais. Procedimentos de execução. Procedimento
cautelares. Sistemas processuais: Legalidade. Princípios: Inquisitório x Dispositivo. Noções
gerais sobre prova, utilitarismo, economicidade e outros princípios aplicáveis à instrução.
Condições de ação civil e distinção de pressupostos processuais. Condições de procedibilidade
da ação penal. Doutrina de Liebman e orientação do Código de Processo Civil. Sentença.
Espécies de Julgamentos: Profundidade da cognição, acentuada, média ou superficial,
independe seja com ou sem exame de mérito. Princípios da Sucumbência, Lealdade, Publicidade
e o devido processo legal. Introdução à Hermenêutica Processual e Conceitos fundamentais
como a Teoria Critica do Direito e ao princípio do livre convencimento do juiz. Fungibilidade e
outros aspectos de prática discricionária nos quais se manifestam.
Página 5 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

Agradecimentos:

Na pessoa do saudoso professor Clóvis Veríssimo do Couto e Silva1,


o qual moldou um padrão de excelência acadêmica, homenageamos a todos,
tanto os antigos e memoráveis, quando os atuais e estimados colegas docentes
da Faculdade Livre de Direito de Porto Alegre; Também conhecida como a Casa
de André da Rocha, alusão àquele que mais tempo ocupou sua Direção2.
Agradeço aos familiares e amigos a paciência com minhas imersões na
dimensão do estudo e, com um carinho especial, Ellisa, Ângela e Marina.

Abreviaturas e simplificações:
Ao indicar algumas das páginas da internet suprimimos o http://
Priorizando a precisão à pontuação, após o endereço da página da web,
em geral omitimos o ponto final, com intenção de evitar que a marcação da
frase possa confundir o endereço de internet.
A primeira ocorrência de uma abreviatura é negritada, seguida do
extenso [entre colchetes ou parênteses]. Na citação de legislação, perdoem-nos os
puristas: substituímos “parágrafo único” por §.

1
Em 1992, sob a presidência de J.M Othon Sidou, a ABLJ [Academia Brasileira de Letras
Jurídicas] completou quinze anos renovando o compromisso de aprimorar o direito e a Língua Nacional,
instrumento do jurista. O “Dicionário Jurídico” da ABLJ (ed.Forense) demonstra esse cuidado. Naquele
momento, vagava uma das seis cadeiras ocupadas por gaúchos. Clóvis do Couto e Silva, ocupava a nº
42. Professor Catedrático, Diretor da Faculdade de Direito da UFRGS, criou, organizou e coordenava o
Pós-Graduação quando faleceu, dia 21 de maio de 1992. Possuía notável domínio dos direitos material e
processual. Deixou vasta relação de discípulos. Lecionou na Universidade de Paris. Encantava as
platéias européias com suas conferências – não raro de improviso: Ao saber da sua presença, os
organizadores o instavam a falar. Em cerca de uma hora, o Magister preparava um plano de exposição.
Ah! Um plano adequado é a chave do sucesso de qualquer empreendimento. E que sucesso! O público,
em geral composto de seletos juristas, adorava as explanações, fossem em inglês, francês, italiano,
alemão, etc. Recebeu as mais altas condecorações e atribuições, dentre as quais a missão de redigir a
parte de Família do Projeto de Código Civil que tramitou, muitos anos, no Congresso. Desenvolveu
intensa amizade com Pontes de Miranda, tornando-se seu principal interlocutor e confidente. Tarefa
difícil, preencher sua vaga. Tivesse sobrevivido ao infarto, provavelmente diria “...interessante...”
“Academia Brasileira de Letras Jurídicas” in “Ipsis Litteris”, Jornal OAB/RS, setembro de
1992 e Jornal do Comércio de Porto Alegre, segunda-feira, 6/9/1993, p.15 do 2º Caderno: Para o
currículo desse ilustre Professor: www.padilla.adv.br/ufrgs/clovis
2
Os criadores da Faculdade Livre de Direito de Porto Alegre foram liderados por Carlos Thompson
Flores, seu primeiro Diretor que, em 1904, passou o cargo a outro fundador, o Desembargador André
da Rocha, que a conduziu até 1934. Daí a Casa de André da Rocha, alusão àquele que
mais tempo ocupou a Direção. Outros aspectos interessantes da Faculdade e sua importância:
www.padilla.adv.br/ufrgs
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Livro I
Teoria Geral dos Processos
Capítu lo I
Pan orama do Sistema Jur isdici on al e da Socied ade:
Das profundas transformações políticas, econômicas, sociais
e jurídicas:
Até a década de 50, mais de 70% dos brasileiros moravam na área rural. A
economia era fraca e predominantemente primária; não havia indústria de
automóvel; a quase totalidade dos fogões era a lenha. Eletrodomésticos como
fogão a gás e geladeira eram artigos de luxo; telefone e televisão eram
raríssimos. Hospitais particulares eram uns poucos ligados às colônias de
imigrantes. Particulares, somente escolas religiosas.
A família brasileira, até os anos 50, era extremamente tradicional e
conservadora. A mulher casada não era capaz para a prática dos atos da vida
civil, devendo ser sempre assistida pelo marido. Ao se desquitar sofria
preconceitos e vergonha. O racismo não era motivo de debates, porque o negro
brasileiro não desenvolvia movimentos sociais de protestos e reivindicações. A
estrutura social era marcada pelo coronelismo. “Casa grande e senzala” ainda
eram perceptíveis. O transporte era deficiente e as comunicações inexistentes.
Professores eram valorizados, e os vencimentos que auferiam no ensino
público permitia-lhes sustentar suas famílias, na qual a mulher não
trabalhava, e ter os confortos da época, como o de dispor de empregados
domésticos.
Na década de 50, o Brasil passou a viver uma experiência política
esperançosa, reflexo da Constituição Federal de 1946 e do clima liberal
posterior à morte do Presidente Getúlio Vargas. Saiba mais sobre o tempo e a
influência desse ex-aluno da UFRGS, aqui http://www.padilla.adv.br/prof/getulio.htm
No campo social, foram as maiores e mais importantes mudanças da
história do Brasil. A população migrava para as grandes cidades. Rio de
Janeiro ainda era a Capital da República e exercia atração natural aos que
pretendiam seguir as carreiras públicas e, como metrópole, desenvolvia-se nas
artes, no turismo, na indústria naval e do petróleo. São Paulo atraia cada vez
mais trabalhadores para a indústria e o comércio. Em 1958, sob a Presidência
de Juscelino Kubtischek, a construção de Brasília, nova capital do país, em
grande otimismo, embriagou a economia em euforia. Também criou uma
alternativa ao movimento migratório nordestino para o sudeste.
Nas artes, 1958 marca o surgimento da “bossa nova”, afirmado na música
“chega de saudades”, de Tom Jobim e Vinícius de Moraes, lançada no LP
“Canção do amor demais”, na voz de Elizeth Cardoso e violão de João Gilberto.
Página 7 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

No esporte, o pais que se denominava“do futebol” venceu pela 1ª vez uma Copa
do Mundo, revelando Pelé, autor de 2 gols na final, o qual se tornaria o mais
notório dentre os seres humanos: http://www.padilla.adv.br/desportivo/futebol/
Após o regime centralizado da Velha República e da ditadura do Estado
Novo, em contraponto seguiu-se a exacerbação da liberdade. Todos podiam
exprimir livremente seus pensamentos e ideologias. Qualquer partido político
seria aceito e os de esquerda saíram da clandestinidade. Contudo, justamente
os regimes fechados desencadearam as mais intensas modificações estruturais
criando novos paradigmas, como o Direito do Trabalho, o Direito Desportivo, e
o acesso à Justiça: http://www.padilla.adv.br/teses/normas/

Das mudanças globais:


O Brasil foi afetado por acontecimentos, em todas as áreas, cujos reflexos
ainda são observados. Em 1958, o Tratado de Roma funda a Comunidade
Econômica Européia; O Cardeal Angelo Roncalli, Papa João XXIII, convocou o
Concílio Vaticano II; A renovação constitucional na França instituiu a
Cinquième République. Mao Zedong (antes Mao Tse-Tung), inicia a
industrialização forçada na China, o “grande salto” para a “revolução cultural”
dos anos 60.

O ditador Fulgêncio Batista abandonara Cuba a Fidel Castro que,


apontando mísseis soviéticos para a Flórida, levou ao extremo a guerra fria
quase desencadeando uma IIIª Guerra.
Nikita Khrushchovv, que denunciou os crimes de Stalin, iniciou uma
competição de duas décadas entre a União Soviética e os Estados Unidos
(Einsenhower/Kennedy): O ícone do desenvolvimento econômico e militar, a
corrida espacial, criou novas tecnologias em ritmo cada vez mais acelerado. O
inconsciente coletivo, impregnado de ansiedade, sobrecarregado de novidades,
e borbardeado por falsas crenças disseminadas pelos sociopatolobistas, impôs
padrões de consumo alimentados pela pseudoreflexão, açodada e superficial.

Das mudanças forenses e da criação do IBDP:


O consumismo, o coletivismo, o multiculturalismo e a globalização
mudaram o perfil dos conflitos jurídicos. Embora faltem estatísticas precisas, a
maioria dos tipos de conflitos que, hoje, encontramos nos tribunais, são
posteriores ao processo trabalhista, e ao acesso à Justiça (Lei 1.060/60):
http://www.padilla.adv.br/desportivo/idolatria/
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 8

O primeiro código de processo civil unitário do Brasil, de 1939, mal entrara


em vigor, quando o país foi agraciado pela primeira experiência renovadora:
Um dos maiores processualistas italianos, Enrico Tulio Liebman, fugiu das
atrocidades da Guerra Mundial e, temporariamente afastado da cátedra em
Milão, proporcionou a consolidação técnico-científica do direito processual
brasileiro. Promoveu encontros, sábados à tarde, fomentando uma geração de
professores que (equivocadamente ao nosso sentir) foi denominada de Escola
Paulista de Direito por Niceto Alcará Zamora y Castillo. Se, de fato, Alfredo
Buzaid, Bruno de Afonso André, Frederico Marques, Luiz Eulálio de Bueno
Vidigal, entre tantos outros paulistas, a integravam, não menos justo
homenagear aqueles que transpunham as grandes distâncias em transportes
precários, como os professores Galeno Lacerda (Porto Alegre/RS), Alcides de
Mendonça Lima (Pelotas/RS), Edson Prata (Uberaba/MG).

Ao final da década seguinte, alguns desses professores associaram-se com


índole científica, para aprimorar o direito processual:

“Aos quinze dias do mês de agôsto do ano de mil novecentos e cinqüenta e


oito, na Faculdade de Direito de P. Alegre, da Universidade do Rio Grande do
Sul, presentes o Sr. Diretor, Prof. José Salgado Martins, e os Srs. Professores
Luiz Eulálio de Bueno Vidigal, Alfredo Buzaid, José Frederico Marques,
Bruno de Mendonça Lima, Alcides de Mendonça Lima, Vicente Marques
Santiago e Galeno Vellinho de Lacerda, foi decidida a fundação do
Instituto Brasileiro de Direito Processual Civil (I. B. D. P. C.).”
“A idéia de fundação do Instituto, que vinha sendo difundida nos meios
universitários, encontrou caloroso acolhimento na sessão de encerramento dos
trabalhos da “1ª Semana de Estudos de Direito Processual Civil”. O momento e
o local escolhidos para a concretização daquela idéia, representam uma
homenagem do Processualistas Brasileiros ao Estado do Rio Grande do Sul,
que, no ano corrente, celebra o cinqüentenário de promulgação do primeiro
Código Estadual de Processo Civil elaborado no Brasil. O referido código,
trabalho pessoal do ilustre Dr. Antonio Augusto Borges de Medeiros, foi, a
pedido dêste, estudado, emendado e refundido por uma comissão de
professores da então Faculdade Livre de direito de Pôrto Alegre, tornando-se
lei em 15 de janeiro de 1908.”

Do sistema processual repleto de boas intenções:


Desde que o Instituto Brasileiro de Direito Processual nasceu, na
Faculdade de Direito da UFRGS, em 1958, o Brasil apresentou três sistemas
de processo civil; Nenhum deles foi eficiente.
Página 9 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

Do 1º modelo processual civil:


No CPC de 1939, vigente até 1973, herdamos práticas das Ordenações e
dos Códigos Estaduais. Repleto de arcadismos, sem preocupação com
efetividade, chegava à esquizofrenia no sistema recursal. Qual o meio
adequado de impugnação? Apelação ou o agravo de petição seriam cabíveis
conforme fosse terminativa ou extintiva a sentença!

A mudança moral, iniciada a partir dos anos trinta, alimentou a tolerância


às manobras protelatórias:
“...o processo jurídico, informado pela moral vigente, até então exigia uma postura
ética: O processo judicial era uma exceção à regra do adimplemento espontâneo das
obrigações. As discussões se limitavam à divergência de interpretar a aplicação da lei.
Raras, porque o imobilismo era característica imposta por assegurar a paz social. A
sociedade era estruturada sobre a obediência civil e simplesmente não tolerava quem não
adimplia suas obrigações!
“A quebra da bolsa afetou os costumes. Até então, o inadimplente era discriminado
pela sociedade. Ninguém queria passar por esse constrangimento, havia o cumprimento
espontâneo das obrigações.
“Após 1929, muitas pessoas, simultaneamente, perderam tudo. O inconsciente
coletivo começou a ter tolerância com o inadimplemento. Não tardou para que algumas
pessoas, percebendo a vantagem financeira de não cumprirem com as obrigações,
iniciassem uma onda de desobediência civil. Antes desprezível, cresceu, aumentando a
quantidade de demandas nas quais as indagações importantes, e de complexidade,
perdiam-se em meio a uma grande quantidade de litigâncias lucrativas. O mau exemplo do
Poder Público sobrecarregou o sistema judicial.”3

Os inescrupulosos proliferaram; diziam aos que prejudicavam para


“procurar seus direitos” ou “entrar na justiça”, onde já haviam percebido que
lucrariam com a demora!

3 Luiz R. N. Padilla, TGPs Teoria Geral dos Processos: Processos de pensamento e de comunicação, e
as modalidades jurídico-administrativas, cíveis, desportivas, eleitorais, legislativas, penais e trabalhistas;
p. 8, da 18 ed.; grifamos; colhida 14/12/2010 em http://www.padilla.adv.br/processo/tgp/
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 10

A tolerância com o comportamento ilícito acentuou-se com o mau


exemplo estatal. Exemplo não é a melhor forma de ensinar, é a única! Como
exigir dos particulares o cumprimento espontâneo das obrigações, se o
poder público criou um mecanismo de estelionato institucionalizado?

O precatório é a combustível da corrupção, da indecência, da sonegação


e da desobediência civil:
“O precatório é um mecanismo protelatório e de fomento à corrupção; Foi criado no
início do Sec. XX, no Rio de Janeiro. O poder público, até então, dava o bom exemplo.
Quando a condenação transitava em julgado, pagava. A desculpa de previsão orçamentária
é uma prosopopéia flácida para acalentar bovinos, derrubar lagartixa da parede. Serve para
alimentar uma corrupção cada vez maior.
“Quem administra recursos públicos (portanto: alheios) deve estar prévia e
expressamente autorizado efetuar tal despesas. Diferente do setor privado, o administrador
não pode decidir realizar uma despesa. Não é o caso da condenação judicial, a qual
decorre do exercício de outro poder do Estado, sujeito a legitimação diversa
“Não há necessidade de previsão orçamentária para pagar uma condenação judicial;
esta, vem de outro poder, e pressupõe um fundamento lógico-jurídico de Justiça, após
devido processo legal, ampla defesa, etc. O processo é público e observa princípios de
igual ou superior hierarquia ao que limita a disponibilidade dos recursos da população,
pelos administradores públicos, àquelas despesas previamente debatidas e aprovadas pelos
representantes do povo e que constam do orçamento prévio.4
“Então, lá no início do Século XX, bastaria que o juiz mandasse pagar. Decisão
judicial transitada em julgado seria cumprida. Ao invés de impor respeito à autoridade
municipal recalcitrante, criou um novo procedimento o qual, perceberam os políticos,
permitir-lhes-ia cobrar polpudas propinas.
“A ameaça de longos anos de espera judicial para receber desintegra capacidade de
resistência do credor: Ou paga o PF "por fora" ao dirigente político que detém o poder de
autorizar o pagamento da despesa, ou a empresa “quebra”. Para pagar o PF, as empresas
começaram a superfaturar os preços. E passaram a exigir PF cada vez maior. Dizem que,
nas obras do Pan2007, passou de 30%. Isso explica porque, apesar de cobrar impostos
mais caros do mundo, o Brasil oferece péssimos serviços públicos de saúde, educação,
segurança. Corrupção, superfaturamento, etc., são constantes escândalos.
“O poder público dá o pior dos maus exemplos: Protelação e corrupção! As empresas
protelam para lucrar. Apenas o fraco e pobre cidadão é obrigado a cumprir a Lei?
“Para acabar com a corrupção, basta extinguir o precatório. Num primeiro momento,
a fase de transição poderá escalonar a mudança para reduzir o impacto de décadas de
corrupção. E o poder público, quando a condenação transitar em julgado, passará a pagar
imediatamente. Primeiro porque tem deve dar o bom exemplo. Segundo, porque concentra
todo o poder econômico e político, e sua fonte de recursos é inesgotável, porque a

4 Confira Imparcialidade Judicial versus Discricionariedade Administrativa


originalmente publicado na Revista da Faculdade de Direito da UFRGS, v.12, 1996, p.209-215 e
disponível em http://padilla-luiz.blogspot.com.br/2013/01/imparcialidade-jurisdicional-
versus.html e http://www.padilla.adv.br/teses/
Página 11 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

arrecadação de impostos não para de crescer: http://www. impostometro.org.br/ e

http://www. youtube.com/playlist?p=PLE1DFCDB647956B21/
“Não obstante os prazos reduzidos e rigorosos, a Justiça foi ficando cada vez mais
distante. A demora tornou a inadimplência mais lucrativa! Outrora um dos principais
mecanismos para a realização da Justiça e paz social, o processo se tornou um expediente
para aumentar o lucro dos inescrupulosos:” Luiz R. N. Padilla, TGPs - Teoria Geral dos Processos: Processos de pensamento e de
comunicação, e as modalidades jurídico-administrativas, cíveis, desportivas, eleitorais, legislativas, penais e trabalhistas. in http://www.padilla.adv.br/processo/tgp/

O precatório é um estelionato institucionalizado porque, havendo inflação,


o credor está sendo induzido em erro: Nunca irá, realmente, receber!

A litigância lucrativa é uma das piores formas de concorrência desleal:

Distorce todo o mercado, obrigando a concorrência a seguir o mau


exemplo. Somada à inadimplência estatal, multiplicou a quantidade de
processos.

De Encenação Juridicional?

Do 2º modelo processual civil:


O Código de 1973 vigorou, como um sistema, até a intensa reforma, em
1994. Embora o processo seja um mecanismo para realizar a Justiça e, através
dela, fomentar a paz social, o CPC de 1973 é uma concepção
encantadoramente filosófica, em uma disciplina eminentemente pragmática. A
influência de Liebman, professor pouco habituado ao nosso tráfego forense,
ensejou paradoxos e polêmicas. Por exemplo, propunha a efetividade e a
oralidade do processo, contudo, conservava formalismos do CPC/1939.
As soluções que propunha à crise eram, teoricamente, ótimas. Faltavam
mecanismos para as colocar em prática. Demonstra a dissociação da teoria e
prática forense o fato, relatado por Carlos Alberto Carmona, no Congresso
Internacional de Direito Processual, em Brasília, 1997:
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 12

De IBDP 1997

Ao visitar o gabinete do professor italiano, presenteou-o com o CPC


Anotado do Theotônio Negrão. Este começou a folhear o livro, até se deparar
com o Procedimento Sumaríssimo. Encostou-se na mesa e, cuidadosamente,
leu, do art. 275 ao 281. Ao encerrar o breve capítulo, assumiu um ar
contemplativo. Fechou o livro, virou-se e o jogou sobre a mesa. Voltando-se,
disse:
- Que maravilha essa legislação de vocês...
Carmona, o qual é alto (veja na foto acima), sentiu-se crescer. Contudo, o
professor interrompeu:
- Certamente não funciona!

Da importância da Faculdade de Direito da UFRGS na Reforma:

Quando o Código completava dez anos, em 1983, a Faculdade de Direito


da UFRGS sediou o I Congresso Brasileiro de Direito Processual. Diversas
teses apresentadas embasaram a Reforma Processual. Milton dos Santos
Martins faleceu antes que a sua, sobre embargos infringentes, fosse convertida
em lei, em 1994.

Extraviada a ata de 1958, decidiram elaborar nova ata de fundação do


Instituto Brasileiro de Direito Processual, com a participação dos professores
gaúchos Adroaldo Furtado Fabrício, Alcides de Mendonça Lima, Araken de
Assis, Athos Gusmão Carneiro, Carlos Alberto Álvaro de Oliveira, Carlos
Silveira Noronha, Galeno Velinho de Lacerda, Ovídio A. Baptista da Silva e
Teori Albino Zawaski.

Em 1995, em Brasília, em membros presentes ao Congresso Processual, o


Rio Grande do Sul perdia apenas para a sede e São Paulo. Contudo, de 1983 a
1997, apenas este gaúcho que voz fala foi admitido no Instituto! Por nossa
sugestão e apoiados por Ada Pelegrini Grinover, Thereza Celina Arruda Alvim
Wambier, Carlos Alberto Carmona, Petrônio Calmon, entre outros, na
Página 13 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

Assembléia Geral de 13-8-2000, alteramos o Estatuto, criando a administração


regional, por Diretoria Executiva ombreada por Conselho Diretor. Com apoio
de Nelson Nery Jr., apresentamos novos sócios gaúchos: Ademir Fernandes
Gonçalves, Ana Luiza Carvalho Ferreira, Darci Guimarães Ribeiro, Dulce
Helena Coelho Klein, Maria Berenice Dias, Maria Cristina de Oliveira Silva,
Marco Aurélio Bortowski e Ricardo de Oliveira Silva (RePro 85/2-3).
Repassamos fichas para inscrição de outras dezenas de professores gaúchos a
Berenice Dias, a qual deu seguimento à formação da Diretoria Executiva
Regional e, eleita presidente, isso ajudou a romper o paradigma que, até então,
vinha obstaculizando sua promoção como a primeira Desembargadora gaúcha.
Em 2000, o ampliado Instituto Brasileiro, com duas centenas de membros
gaúchos, alterou o estatuto extinguindo a Diretoria Executiva Regional.

Segundo os processualistas estrangeiros, a legislação processual brasileira


se tornara, na virada do milênio, a mais moderna do mundo. E a contribuição
gaúcha foi significativa. A legislação italiana modelo para a antecipação de
tutela estava toda baseada na doutrina de Ovídio A. Baptista da Silva, o
primeiro, no mundo, a defender tal possibilidade.

Contudo, apesar da lei, em 1994, elevar a ordem pública o princípio da


lealdade, os juizes continuaram agindo como antes, quando o exame a
conduta processual da parte dependia de pedido expresso da parte contrária.
Previmos os males que provocaria ao sistema jurídico em alguns trabalhos,
sobre princípio da lealdade; um deles, é citado como referência, na Wikipedia:
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 14

Do 3º modelo processual civil:


Os dez projetos de lei, da Reforma Processual dos anos noventa, foram
todos aprovados, nove em leis, e o último encartado na reforma constitucional;
destes, quatro leis, com extensas modificações em centenas de dispositivos,
foram publicadas no dia 14.12.1994.
Pretendia impor um caráter satisfativo ao processo de conhecimento. Até o
conceito de sentença foi alterado para se adequar a tal modelo: Ao fim do
processo de conhecimento, agregou um apêndice, a fase de cumprimento. O
processo de execução recebeu reformulação cosmética. Nada disto funcionaria,
Página 15 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

pois o que era necessário, era um reposicionamento ideológico, e algumas


providências simples.
No processo de conhecimento pretende-se reconhecer um direito, declarar
a existência (ou não), de uma relação, ou extinguir, ou modificar algum ato. O
autor alega. O Estado-Juiz abre um prazo para o réu responder. O
contraditório é um dos elementos essenciais porque, neste tipo de processo, o
autor e o réu são iguais:

No processo de execução a situação é totalmente diferente. Mais do que


um simples autor, quem postula é um credor. No pólo passivo, não está
apenas um réu; o acionado é devedor.
Note o quanto o exeqüente e o executado situam-se a diferentes distâncias
do órgão julgador: No processo de execução, os pratos da balança não têm o
mesmo peso. Porque o devedor tem uma sobrecarga, tem eu seu poder algo,
aquilo que deve ao credor; o prato do executado está mais pesado. O autor é
credor, contudo, falta-lhe esse algo a que tem direito; o seu prato está vazio,
leve, e fica mais próximo do Estado-Juiz o qual deve atuar no sentido de
restabelecer o equilíbrio: Deve retirar do devedor, e entregar ao credor:
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 16

O que era necessário, portanto, era parar de tratar os executados como se


fossem réus em processo de conhecimento.
Essa fase da Reforma quis se espelhar na Justiça do Trabalho. Contudo,
limitou-se a adaptar as regras de lá, sem qualquer preocupação de adotar os
paradigmas que as amparam e asseguram sua eficácia na Justiça Trabalhista;
esta, baseia-se na presunção de disparidade entre as partes. No processo civil,
a execução continuou sendo tratada com base no modelo de paridade entre as
partes que, vimos acima, não corresponde à realidade.
Conforme prevíramos, as mudanças cosméticas ampliaram a quantidade
de atos e só pioraram os problemas. Os meus bem intencionados Colegas do
IBDP foram iludidos pelos sociopatolobistas, os quais queriam exatamente
isso, que a Justiça se tornasse ineficaz.

Das falsas crenças e valores invertidos:


(sofisma 1) julgar procedente estimularia o ajuizamento de demandas?

(sofisma 2) indeferir reduzirá o volume de ações?

Os processos que envolvem órgãos governamentais e instituições


financeiras representam mais de 90% das ações. Se os eliminarmos, ao invés
de julgar centenas de processos por semana, cada órgão jurisdicional
prolataria algumas dezenas de decisões. Com dez vezes mais tempo,
ponderariam sobre as informações seriamente coletadas, produzindo
magníficas decisões. Estas, por sua vez, estimulariam o comportamento
ajustado, e a sociedade teria um nível, jamais alcançado, de paz social.

Você já se perguntou porque há tanta violência e insegurança se esta


geração atual é a mais preparada e toda a história humana? Tal paradoxo só
explica pela existência .

Querem culpar os advogados pelo aumento na quantidade de processos


nos advogados. Contudo, a maioria das demandas seria evitada se juízes
estudassem os casos e realizassem justiça. Os 90% de processos são
motivados em auferir o lucro propiciado pela demora.
Página 17 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

As corporações, somadas aos políticos, todos estão interessados na


ineficácia da Justiça e colocam em prática um superficialismo acompanhado
da vergonhosa prática de buscar motivos para a improcedência, sob a
desculpa de pressa. Não haver tempo é uma falsa crença:

Há juízes que estudam os processos, e proferem magníficas decisões!

Vocacionados, focados em Justiça e paz social, são a prova de que


podemos ter uma Justiça fabulosa.

O bom juiz, resolve todo e qualquer problema, independente da Lei,


porque:
"O Direito é muito maior do que a Lei e seu objetivo devem ser sempre a
realização da Justiça." Ministro Garcia Vieira, Resp 495-RJ, v. u. 5-2-1990, RSTJ 8/301.

Curiosamente, entre os que alegam falta de tempo, encontramos muitos


que criam embaraços, especialmente contra os advogados que ousam
discordar da crença de que o juiz é Deus. Talvez tenham razão: Só Deus para
saber o que existe nos autos de um processo que jamais abriu!

Assinam mais decisões do que poderiam ler; em processos que nunca


examinaram!

Sob essa crença de que a pressa é o mais importante, os gabinetes são


orientados a usar um modelão, copiar parte da sentença, colocar o nome das
partes e, em minutos, um estudante editou um acórdão que decidirá o futuro
de muitas pessoas; e fez tudo isso enquanto navega pela Internet, ou paquera
os colegas! Qualquer desculpa é usada para indeferir: O papel aceita tudo! O
vício da improcedência aumenta o lucro ilícito:

Apesar das barbaridades que praticam, as prestadoras vencem sempre. Se


não formalmente, lucram com a demora; Os honorários são aviltantes, e as
indenizações pífias!

De Lucrar, lucrar, lucrar!

Da cupidez:
Valorar o lucro acima de tudo, está na raiz de todos os problemas!
A cultura que predomina (aceita pela maioria) flutua sobre um sistema de
crenças falsas e de valores invertidos, disseminados pelos sociopatolobistas.
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 18

Habilmente, os sociopatolobistas semearam a hostilidade, alimentada por


sofismas, tais como:
- o advogado seria culpado pela morosidade da justiça, e não merece ser
tratado com dignidade;
- os honorários e indenizações pífios desestimulariam o ajuizamento de
demandas;
- decisões justas poderiam ser alcançadas sem informações sobre a
controvérsia;
- julgar seria concluir rapidamente em exame superficial e sem precisar
colher todas informações;
- decisões injustas seriam menos danosas à sociedade do que a demora
provocada pelo exame cuidadoso;
- a prestação jurisdicional poderia ser terceirizada através de estudantes
que mal sabem limpar seus traseiros;
- e a pior de todas, que Sálvio de Figueiredo Teixeira denominou de
juizite, o complexo de autoridade e de abuso de poder que comete pessoas
não vocacionadas que, lamentavelmente, ingressam na carreira jurídica: Agem
como se exercer a função de juiz, que representa o ideal de justiça, o
transformasse em um Deus; não admite ser contestado. A juizite é agrava pelo
fato de que quando se expõe injustiça ou abuso praticado, enfrenta-se um
forte corporativismo, baseado na crença de que o Poder Judiciário, como
instituição, perde credibilidade com essa exposição.

São sofismas.
Para acreditar nessas mentiras, é necessário que a pessoa esteja bastante
distraída, enquanto a mentira é repetida até se tornar parte do cotidiano.
A ponderação, somada à cuidadosa coleta de informações, sempre
foram base para realizar justiça, desde sua origem mais remota, nos
agrupamentos pré-civilização.
A essencialidade de tais características é conhecida de qualquer
processualista sério, como registra o Professor Galeno Lacerda. 5
Sem ponderação sobre informações seriamente coletadas, não é justiça;
mas encenação!
Ademais, para funcionar adequadamente, são necessários o respeito e a
confiança:
“Juiz e advogado são como espelhos: cada um deles olhando para o interlocutor,
reconhece e saúda, reflete em si mesmo a própria dignidade.”
Piero Calamandrei, “Eles, os juízes, vistos por nós, os advogados”.

Então, como e por que isto tudo aconteceu? A TTGP responde.

5
Galeno Lacerda, Teoria Geral do Processo. Forense, 1ª ed. 2006.
Página 19 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

Como a impunidade e a corrupção cresceram enquanto


o Poder Judiciário foi sobrecarregado de processos?
Além de milhões de demandas dos consumidores lesados, há as
provocadas pelos comportamentos ilícitos do poder público que sequer
poderiam existir porque o poder público deve dar o bom exemplo. Agora,
aproveitando da “moda” da impunidade somada aos honorários aviltantes e
indenizações pífias, começam a pipocar ações temerárias, ajuizadas por
espírito emulativo ou para obter vantagens, sem risco nenhum. Leia mais em:
http://www.padilla.adv.br/teses/abuso.htm

Democracia foi criada em núcleos onde a reunião-assembléia que


decidia contava com a participação de todos os cidadãos. A moderna,
representativa, transformou-se em um engodo. O simples apoio de metade
pode estabelecer uma ditadura pilotada por sociopatolobistas, uma
minoria, que manipula a opinião pública. Controlam as informações e
jogam as pessoas decentes umas contra as outras. 6
Obviamente que as pessoas cultas e inteligentes são mais difíceis de
manipular. Assim, a primeira macro estratégia foi desmanchar o sistema de
ensino e a família, pilares da formação cultural. Quando menos culta e
inteligente a pessoa, e quanto mais perturbada por ter um desenvolvimento
mais fácil a dominação. Para reduzir a capacidade intelectual e facilitar o
entorpecimento, acabaram com a saúde pública.7

6 Porque as pessoas espertas podem ser tão tolas? Porque o processo de pensamento e de
comunicação processa-se em vários níveis. Quando , e percebe-se como é fácil manipular. Ao
mesmo tempo, ao conhecer as formas como a manipulação:
http://www.padilla.adv.br/processo/pensamento/
7 Os profissionais de saúde foram educados sob o patrocínio (e controle) das multinacionais

de medicamentos; "Treinados" a acreditar que a como a única verdade são as informações


manipuladas ou incompletas que receberam em congressos, revistas e livros patrocinados pelos
grandes laboratórios. Acham "normal" receitar fármacos que reduzem os sintomas, e ignorar os
efeitos colaterais. Por exemplo: quem possui pressão alta é tratado com medicamentos; as
artérias podem não arrebentar, contudo, a pessoa vai morrer de insuficiência real causada por
essas toxinas. Uma pessoa que cai nesse sistema de medicação jamais voltará a ter efetiva saúde!
Cada fármaco desencadeia um cipoal de doenças, demandando uma sucessão de outros
medicamentos para combater os sintomas, cada vez piores. A vítima do engodo dependerá de
diversos medicamentos para "tratar" os sintomas de distúrbios que não teria desenvolvido se
tivesse recebido informações e pudesse realmente escolher um tratamento adequado, e evitar
entrar naquela armadilha.
A causa do câncer, por exemplo, é conhecida a décadas: http://t.co/lQjqrGDB/ Contudo,
não interessa divulgar tal informação. Querem que milhões adoeçam, desnecessariamente, para
poderem lucrar vendendo remédios e tratamentos!
A maioria das doenças é decorrente dos distúrbios dessa acultura da superficialidade que
inverte valores, distorce a realidade e induz a uma dieta da morte. Começa por não incentivarem
o aleitamento materno e prossegue com água e alimentos que acidificam o corpo, impedindo o
correto funcionamento do sistema imunológico. A maioria dos alimentos industrializados
intoxica, entorpece e mata porque contêm, embutidas, toxinas que desequilibram o organismo. A
mais usada é a sacarose, o aditivo químico mais barato, popularmente conhecido como açúcar, o
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 20

Assim, a educação tem sido sucateada desde o advento de


globalização, na década de sessenta:

qual causa 147 doenças. Contudo, está em 80% dos alimentos industrializados; em alguns, como
os achocolatados, mais de 60% é açúcar; para aumentar o lucro, o açúcar é usado até para
produzir cervejas mais populares: http://pt.scribd.com/doc/61508666/
A maioria das pessoas não sabe que basta passar tomar água com ph alcalino que o sistema
imunológico volta a funcionar: http://www.youtube.com/watch?v=n1QmhN2mKMo/
Está provado que a exposição ao fluoreto reduz a função cerebral. Contudo, tal lixo tóxico é
adicionado à água tratada da maioria das cidades, sob a desculpa de prevenir cáries, ocultando
que querem reduzir a capacidade intelectual: http://www.youtube.com/watch?v=_1uVcy15PXc/
A população inculta e entorpecida é mais fácil de manipular, vive em uma escravidão
disfarçada.
Página 21 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

O desmanche do sistema de ensino foi gradativamente reduzindo o


nível cultural da população e a tornando cada vez mais dominada. Isso
permitiu aumentar a concentração das riquezas:

A riqueza passou a se concentrar ainda mais, o que aumentou


o poder dessa parcela ínfima e o controle que exercem sobre a
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 22

sociedade mediante a sistemática e concatenada manipulação:


http://vimeo.com/pad/midia-falsas-crencas/
As políticas de saúde pública foram direcionadas a criar um estado de
permanente morbidez... Exemplo: sob pretexto de reduzir as cáries,
envenenam a população com lixo tóxico adicionado à água que reduz a
capacidade intelectual. Estudos comprovam que a exposição ao fluoreto
reduz o QI, contudo, ele tem sido adicionado à água da maioria das grandes
cidades. Isso reduz a função cerebral e, EUREKA: Facilita a manipulação da
população, e uma prática escravidão. Não acredite,
confira: http://www.youtube.com/watch?v=_1uVcy15PXc

Nas décadas seguintes, estimularam o egocentrismo e o sexismo;


Teceram uma insana teia de paradoxos e de violência, A acultura da
superficialidade egocêntrica estimula o caos e espalha o medo, a
insegurança, a impunidade e a corrupção - induz ao imediatismo sob a
falsa crença de que não haverá amanhã. Nesse ambiente, vige uma
escravidão moderna, a das sensações.
Idolatram os superficiais, fuleiras, big brothers, etc.
Uma a uma, todas atividades essenciais à paz social, como justiça,
segurança, saúde e ensino, foram aviltadas.
Alguns acordam, e tentam se mobilizar. Contudo, antes que possam se
organizar, os safados se infiltram nos grupos em formação, e jogam as
pessoas decentes, umas contra as outras. Quem luta pelo bem, é isolado.
Implacáveis, jogam as pessoas decentes umas contra as outras, anulando-
nos com preconceitos, falsas crenças, bullyng, difamações. Espalharam
uma acultura de superficialidade e indecência, empulhando a inversão de
valores:
Para completar o entorpecimento, criam paradoxos e toda espécie de
distrações.
As pessoas decentes tem sido "educadas" a aceitar como normal
terceirizar o processo de pensamento, deixando que os outros decidam o
que vão comer, beber, vestir, e até mesmo falar!

Chomsky já enumerou as 10 estratégias de manipulação mais usadas.


Confira quais são, para as poder evitar: http://www.lobotomiaecomunicacao.com/2010/05/chomsky -e-as-10-
estrategias-de.html?ext -ref=comm-sub-email

Para quem duvida do poder que as palavras podem ter, confira:


http://www.facebook.com/video/video.php?v=10151159542133823

Então, por que há tantos processos?


Nos anos setenta, a magistratura começou a ser engolfada pela
acultura da superficialidade e, no primeiro momento, acreditaram que não
Página 23 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

precisavam condenar os comportamentos processuais ilícitos (Luiz R. Nuñes

Padilla, “Litigância de má-fé...” Revista de Crítica Judiciária, Leud Uberaba-MG, 1989, v. 5, p. 197-200; Revista de Processo, RT abril 1995, a. 20, v.78,

p.101-107 e Revista Trabalho e Processo, Saraiva, São Paulo, junho 1995, v. 5, p. 26-33).

A omissão em condenar a falta de lealdade tornou-se praxe na de´cada


seguinte. Agora, deu lugar à total inversão; os dispositvos sobre má-fé tem
sido usados contra quem recorre legitimimamente, numa especie de
represália contra quem recorre em busca de justiça, a fim de “estimular”
que os lesados “se conformem”. Leia mais em http://padilla-

luiz.blogspot.com.br/2012/12/litigancia-de-ma-fe_19.html

"Quem não pune o mal o está incentivando!" Leonardo Da Vinci. A


impunidade dos maus estimulou-lhes a audácia, e os processos se
multiplicaram. Ai, nos anos noventa, espalharam a falsa crença que a
Justiça precisa ser célere, mesmo que sacrificando a segurança jurídica.8

A busca de celeridade motivou a adoção de equipes para ajudar o juiz a


decidir. A falta de recursos levou a utilização de jovens, estudantes, que
ainda não aprenderam a valorizar a experiência e a ponderação. Muitos se
consideram modernos, contudo, exalam os ares fétidos da decadência do
Império Romano: "Carpe diem!" Inconscientemente acreditam que pode não
haver amanhã! Cresceram sob o bombardeio de falsas crenças, do estímulo
à inveja, do sexismo e egocentrismo. Sofreram sobrecarga de “informações”
irrelevantes, incompletas e distorcidas pela mídia, a qual mistura de
realidade com ficção, e imagens manipuladas, numa apologia ao aparentar,
à superficialidade, e à pseudo-reflexão. Continue lendo: http://www.espacovital.com.br/noticia-27693-as-mazelas-
acultura-superficialidade

A isso denominamos de "acultura da superficialidade".


http://blogln.ning.com/forum/topics/cultura-da-superficialidade-e Baseia-se na estrutura do processo de

8
Leonardo Da Vinci é um dos maiores luminares da criatividade humana. Considerado o
maior gênio da história devido a sua multiplicidade de talentos para ciências e artes, sua engenhosidade e
criatividade, inventando inúmeras utilidades, desde uma bobina automática, a um aparelho de teste da
resistência à tração de um fio. Da Vinci foi responsável por grande avanço do conhecimento nos campos
da anatomia, da engenharia civil, da óptica e da hidrodinâmica. Escrevia com as ambas mãos, inclusive
ao mesmo tempo redigindo textos diversos, ou com escrita refletida. Em 1926, seu QI foi estimado em
180.
Sua obra, como acontece com todo o visionário, causou polêmica. Concebeu idéias muito à frente
de seu tempo, como o casco duplo nas embarcações, uma teoria das placas tectônicas. Poucos de seus
projetos foram construídos durante sua vida pois, muitos, nem eram factíveis, como um protótipo de
helicóptero, tanque de guerra, o uso da energia solar, calculadora. Alguns dos interessantíssimos aspectos
do brilhantismo de Da Vinci estão em: http://www.padilla.adv.br/evoluir/davinci/
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 24

pensamento. Vale a pena investir alguns minutos para entender


como é esse negócio de “pensar”, em http://www.padilla.adv.br/processo/pensamento/

No terceiro momento, a própria advocacia está em risco. Os


lobistas das prestadoras de serviço de telefonia as quais, hoje,
faturaram bilhões lesando os consumidores, agindo ilícita e
impunemente, espalharam falsas crenças que tornam inócuas as
normas de Direito do Consumidor: http://www.padilla.adv.br/processo/morosidade/ e
http://www.espacovital.com.br/noticia-25300-encenacao-jurisdicional-artigo-luiz-roberto-nues-padilla

Essa inversão de valores não é casual; Foi orquestrada pela acultura


da superficialidade a qual se baseia na estrutura do processo de
pensamento. "O medo é a pequena morte", máxima da saga científica
"Duna", de Frank Herbert, publicada em 1965. Para entender como o medo
e outras emoções entorpecem a capacidade de raciocinar, valioso investir
minutos para entender o processo de pensamento:
http://www.padilla.adv.br/processo/pensamento/

Depois que uma crença ingressa no sistema, vai para o inconsciente. A


pessoa nem percebe que acredita ser correto tomar decisões rápidas,
mediante análise superficial e sem coletar (e muito menos analisar) todos os
dados; Quando a pessoa omite a busca de informações, é muito fácil a
manipular. Basta o sociopalobista identificar quais os valores e acenar com
uma "boa intenção" naquele sentido, e sugerir que determinada conduta a
possibilitará atingir. O viciado em superficialidade aceita o sofisma porque
o “confira.exe” foi desativado!

A tal "boa intenção" jamais será atingida e a vítima da manipulação


dificilmente perceberá que não podia funcionar porque os sociopatolobistas,
Página 25 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

desde o início, jogam uns contra os outros; assim, os antagonistas serão


apontados como os culpados quando nada funcionar.

Entender essa acultura da superficialidade pode até ser divertido, como


demonstra o Professor Mário Cortella9:
http://www.youtube.com/watch?v=ozxoOOaE__U%20

"Um poder será tanto maior quando menos for percebido." Michel
Foucault; leia mais em http://www.facebook.com/download/154625034700085/Foucault-Michel_Vigiar-e-Punir.pdf

Como os sociopatolobistas e politicorruptos conseguiram envolver nessa


acultura o Poder Judiciário, se os magistrados são pessoas tão bem
preparadas?

9
Autor, entre outros, de "O que a Vida me Ensinou - Viver em Paz para morrer em Paz", Mário Sérgio Cortella é
considerado o principal discípulo de Paulo Freire, mundialmente conhecido por seu trabalho no ensino.
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 26

Da distração para permitir semear crenças falsas e valores


invertidos:
Após 1988, os Estados caíram em insolvência: A nova Constituição Federal
ampliou-lhes as atribuições, provocando encargos financeiros novos, enquanto
a reforma tributária reduzia as receitas estaduais, concentrando recursos na
União! Os Estados simplesmente precisavam reduzir sua maior despesas, a
folha de pagamentos. A magistratura enfrentou, pela primeira vez, a desdita de
ter que lutar por sua dignidade, por necessidades básicas de recursos para
sobreviver!
A experiência dos magistrados gaúchos, transformada na Lei Federal nº
7.244, de 7/11/1984, de intentar conciliação, produzira excepcionais
resultados:
Durante uma década, as Pequenas Causas dependeram do trabalho
abnegado dos operadores: Juízes, advogados-conciliadores e servidores, todos
trabalhavam motivados pelo ideal de Justiça.
Em 1990, o Código de Defesa do Consumidor criou regras fabulosas.
Contudo, mais de duas décadas depois, as corporações continuam com
práticas e lucros abusivos como se grande parte delas não estivesse em vigor!
As normas do Direito do Consumidor asseguram tutela plena, contudo, no
Foro são ineficazes. Raramente o consumidor vence e os valores são uma
piada.
Como conseguiram isto? Convocaram sociopatolobistas, pessoas
eloqüentes, charmosas, capazes de impressionar e de cativar rapidamente para
assumir a liderança e espalharem crenças falsas, invertendo valores.
Uma das piores é a crença de que reduz o volume de trabalho indeferir e
fixar indenizações pífias, mentira adocicada para quem quer evitar o trabalho:
É fácil e rápido achar um motivo para indeferir.
É trabalhoso julgar: Entender todos os fatos e o pedido; Dirimir
controvérsias das versões mediante um cuidadoso exame da prova;
Estabelecer o silogismo entre os fatos e o Direito; Retornar aos fatos para
mensurar o valor do dano.
Para que tanto, se basta escolher um único motivo e julgar improcedente?
Nos casos onde a lesão é mais evidente, se a prestadora não for poderosa,
deferem indenizações pífias, e honorários aviltantes, para refrear o animus
ajuizandi.
Isso causa frustração e prejuízo porque o valor não cobre o custo do
processo, de tempo, deslocamentos, etc. A advocacia artesanal é privada de
efetiva contraprestação
Insatisfeitos, os jurisdicionados passaram a acionar a Justiça comum.
Contudo, não demorou a copiar o mesmo mecanismo, que vem minando a paz
social:
Página 27 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

A Lei 9.099/95 nasceu repleta de boas intenções. Contudo, devido à crise


que assolava a magistratura, foi usada para criar cargos e reduzir o arrocho
vencimental.
Isso inverteu o perfil dos operadores:
Antes, o Juizado de Pequenas Causas era movido pela labuta dos
abnegados voluntários, sem remuneração.
Os cargos do Juizado Especial são disputados por quem quer melhorar o
vencimento.
A conscientização dos direitos, aumentou as demandas e os
sociopatolobistas aproveitaram para implantar a encenação jurisdicional a fim
de assegurar o lucro das grandes empresas lesando o consumidor
impunemente:

Do lucro em protelar:
As Instituições Financeiras estão entre os maiores litigantes. Retardam os
pagamentos para manter, em seu poder, os recursos, que emprestam a juros
compostos, mês a mês , de 8% a 12% (dados públicos, art. 334, CPC).
No Foro o juro é simples, de 12% ao ano. Em poucos meses, a diferença
passa de 100%. Memória de cálculo de juros em um intervalo de 2 anos:
Juros forenses, de 12% ao ano, em 2 anos:
Juros percentuais em 2 anos = 24,00 %
Valor para fim de exemplo: R$ 8.000,00
Valor dos juros = R$ 1.920,00
Total com os juros forenses = R$ 9.920,00
* Observações sobre o juro fore nse simples:
Fórmula dos juros simples: Juros = (taxa / 100) * períodos
períodos = 17/31 (prop. Jul-09) + 23 (de Ago-09 a Jun-11) + 14/31 (prop. Jul-11) = 24
Juros = (1 / 100) * 24 = 24,00 %

Compare aos Juros bancários compostos a 8% ao mês:


Juros percentuais compostos em 2 anos = 534,12 %*
Aplicado sobre mesmo valor do exemplo: R$ 8.000,00
Valor dos juros = R$ 42.729,60
Valor total com juros = R$ 50.729,60
* Observações sobre os juros compostos bancários:
Fórmula dos juros compostos: Juros = ((1 + taxa / 100) ^ períodos) – 1
períodos = 17/31 (prop. Jul-09) + 23 (de Ago-09 a Jun-11) + 14/31 (prop. Jul-11) = 24
Juros = ((1 + 8 / 100) ^ 24) - 1 = 534,12 %

Diferença em um ano R$ 40.809,60 (R$ 42.729,60 – RS 1.920,00).


O exemplo comparou juros forenses ao percentual mínimo (8%) dos juros
compostos bancários. Contudo, não pense que só os bancos lucram.
As atividades comerciais bem sucedidas lucram alguns pontos percentuais
mensais. Desta forma, toda empresa pode ter lucros consideráveis “discutindo”
na Justiça o que deveria já ter pagado!
O comportamento protelatório transforma a derrota em vitória:
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 28

Em meses, o lucro da atividade é diversas vezes superior ao valor da


condenação. Paga toda conta do processo, e ainda sobra! Mesmo agregando
custas, a multa de mora de 10% do art. 475-J, honorários e indenização pela
litigância de má-fé, em 20%, e multa em favor do Estado, a conta forense será
inferior ao resultado dos juros bancários, de maneira que as instituições
financeiras lucram – daí a necessidade de punir o litigante de má-fé para
refrear essa conduta.
Contudo, o fato de haver tantos processos permitiu que os juízes
acreditassem nas mentiras adocicadas dos sociopatolobistas de que não existe
como examinar a conduta processual. Não há notícia de condenações contra
grandes empresas. Pelo contrário, ao invés de punir quem agiu ilicitamente,
não vocacionados inventam pretextos para punir quem pede que trabalhem:
Embora a condenação seja da parte, obviamente prejudica ao advogado, vítima
do abuso de poder, uma violação aos direitos humanos, pois é flagrante
represália pelo fato do causídico ter solicitado que o juiz cumprisse o dever do
cargo no qual está investido!
Comprova o mal que vem sendo causado por não punirem os infratores, a
Assistência Judiciária Gratuita.

A Lei 1.060/50, com a nova redação do art. 4º, em vigor a partir de 1986,
assegurou desfrutar do benefício mediante a singela alegação. Contudo, como
a litigância de má-fé não era penalizada, cada vez mais pessoas que não
reuniam as condições pediram, estimulando lides aventureiras!
Novamente, bastava punir os infratores: A Lei autoriza condená-los a pagar
o décuplo das custas:
“Presume-se pobre, até prova em contrário, quem afirmar essa condição ... sob pena de
pagamento até o décuplo das custas judiciais.” Lei 1.060/50, art. 4º, § 1º, redação da Lei nº 7.510, de
4/7/86.

Ao invés disto, passaram a exigir prova da necessidade de todos que


solicitavam.
Criaram problemas para todas as pessoas, a maioria delas honestas e sem
recursos.
Dificultaram o acesso à justiça!
Retardaram a prestação jurisdicional com atos desnecessários.
Sem falar do volume de documentos ilegalmente exigidos.
E o pior:
Continuaram sem punir os infratores!
A impunidade dos maus, ampliou-lhes a audácia, aumentando a
ocorrência de atos ilícitos e, conseqüentemente, a quantidade de litígios.
Página 29 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

De Prof. PADilla Faculdade de Direito UFRGS

Eureka! Há solução:
Para acabar com a corrupção, vimos acima, é só extinguir o precatório e
controlar a morosidade processual.
A vida é simples, algumas pessoas é que são complicadas como, no caso,
as que criaram esse ambiente de encenação jurisdicional.
Podemos quebrar este paradigma?
Podemos eclodir um movimento para ACORDAR:
Acordar a maioria que, entorpecida, alimenta as torres gêmeas da
SUPERFICIALIDADE e das FALSAS CRENÇAS, formando a base que alimenta
os politicorruptos e sociopatolobistas.
Acordar do torpor da acultura da superficialidade egocêntrica!
Os psicopatas são insensíveis, frios, calculistas e capazes de mentiras
inteligentes possuindo "brutal capacidade de manipulação e nenhum
sentimento de culpa ao fazer isto". Extremamente lúcidos, não perdem tempo,
nem energia, com juízos de valor. Agem rapidamente, tudo fazendo para
satisfazer os desejos egocêntricos de quem os financia. Não tem qualquer
remorso, mesmo se impuserem aos outros todo o tipo de sofrimento...
Inteligentes, são capazes de falsamente demonstrar sentimentos altruístas
que não possuem, pois aprendem a estudar seus comportamentos, para
conquistar simpatia. Nada (em termos morais) os detém.
A maioria das pessoas é decente, e quer o bem. A maioria se deixa levar
por achar “normal” esse egocentrismo artificial espalhado pelos
sociopatolobistas. Resgate o seu livre arbítrio. 10
No estudo "Litigância de Má-fé" publicado em coletânea organizada por
Humberto Theodoro Jr. e Edson Gonçalvez Prata na Revista de Crítica

10 Porque as pessoas espertas podem ser tão tolas? A resposta é encontrada ao conhecer o
processo de pensamento e de comunicação: http://www.padilla.adv.br/processo/pensamento/
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 30

Judiciária, ed. Leud Uberaba-MG, 1989, v. 5, p. 197-200 11, salientamos as


conclusões da XI Jornada Ibero-Americana de Direito Processual, cujo
Relator foi o professor Sérgio Bermudes, criticando que os novos dispositivos
legais sobre a litigância deletéria, introduzidos em 1973, não eram aplicados.

A impunidade dos maus, amplia-lhes a audácia. 12

A partir da Reforma, em 14.12.1994, quando acolhida nossa sugestão


de tornar dever de ofício do magistrado examinar a conduta, dispomos de
normas adequadas para reduzir as demandas mediante a punição dos
faltosos:13

11
Litigância de má-fé - na Revista de Crítica Judiciária, Leud, Uberaba-MG, 1989, v. 5, p.
197-200, editada a quatro mãos pelo saudoso professor Edson Gonçalves Prata e pelo prof.
Humberto Theodoro Jr. A esse trabalho, dentre duas centenas de outros ensaios cuja relação
pode ser conferida em nosso site na internet, podemos encontrar Limitando a má-fé em
execuções fiscais no Jornal do Comércio, Porto Alegre, 18 de julho de 1994, p.12, Segundo
Caderno; Litigância de má-fé nas JCJs: aplica-se o princípio da lealdade na Justiça do
Trabalho? Revista LTr, v.57 (ano 57) nº 3, março de 1993, p. 277-282; Litigância de má-fé
no CPC reformado Revista Trabalho e Processo, Saraiva, São Paulo, junho de 1995, v.5, p.26-
33; Observações à Acórdão condenando como litigante de má-fé Revista de Processo, RT,
São Paulo, v.64, p.268-269; Litigância de má-fé no CPC reformado Revista de Processo,
RT, São Paulo, abril-junho 1995, a.20, v.78, p.101-107.
12 Naquele que é considerado o discurso eloqüente mais curto da história humana, e que encerrou
uma polêmica criada pelos então emergentes "defensores dos direitos humanos dos bandidos", na
Guanabara, os quais insuflavam o povo contra a extradição do nazista Eichmann, um carrasco
responsável pelo extermínio de milhões de pessoas: "A impunidade dos maus gera a audácia dos
maus!". O Autor da frase, Carlos Lacerda, político polêmico, envolveu-se em conflitos com amigos e
inimigos. Consciente de que poderia afastar as pessoas próximas, contudo, não deixava de falar o que
pensava ser a verdade: “Coleciono inimigos também. Sempre pronto a me livrar deles, transformando-os
em amigos. É natural, pois, que alguns amigos, às vezes, se transformam em inimigos, como
compensação” (LACERDA, Carlos. Rosas e pedras de meu caminho. Brasília: Editora Universidade de
Brasília, 2001, p.56).
Embora apaixonado em seus posicionamentos, mudava de posição quando percebia estar errado no
que defendera até então. Assim, em 1929, saiu do Partido Comunista e iniciou, no jornalismo, forte
oposição àquele regime. Mais tarde, apoiou intensamente o Movimento de março de 1964; Contudo, após
a instalação do Governo Militar, tornou-se seu ferrenho opositor.
Orador de estilo inconfundível, expressava direta e imediatamente o que acreditava ser verdade.
Num de seus célebres discursos, no Congresso, combatia acirradamente determinada facção cujo líder,
incomodado, pediu um aparte. Lacerda corajosamente concedeu a palavra ao Deputado Federal
extremista o qual o atacou: “Vossa Excelência é um purgante!” Imediatamente respondeu Lacerda: “E
Vossa Excelência é o efeito desse purgante!”
Carlos Frederico Werneck de Lacerda é uma das lendas da vida pública brasileira. Jornalista de
posicionamentos firmes, foi um dos mais ferrenhos opositores do mais ilustre aluno da Faculdade de
Direito da UFRGS, Getúlio Vargas, apontado como o maior político do Século XX. Isso não é pouca
coisa, uma vez que a UFRGS, pioneira em currículo transdisciplinar, como no Direito Desportivo, é,
desde 2011 a 3ª melhor Universidade latinoamericana Webometrics Ranking of World Universities? E
nos mais recentes indicadores de qualidade da educação superior, o Índice Geral de Cursos, em dezembro
de 2012 atingimos 4,28, o mais alto entre as universidades brasileiras: Assim, a UFRGS é a melhor
universidade do Brasil na avaliação do MEC 2012: http://migre.me/cgHc9/
Concluindo, o embate entre Carlos Lacerda e Getúlio Vargas é apontado como a causa do suicídio do
presidente da república, o qual, dizem alguns, seria armação, para acobertar o assassinato.:
http://www.padilla.adv.br/prof/getulio.htm
13“Litigância de má-fé no CPC reformado”, Revista de Processo, RT, São Paulo, abril-junho
1995, a.20, v.78, p.101-107.
Página 31 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

Art. 18. O juiz ou tribunal, de ofício ou a requerimento, condenará o litigante de má-


fé a pagar multa não excedente a um por cento sobre o valor da causa e a indenizar a
parte contrária dos prejuízos que esta sofreu, mais os honorários advocatícios e todas as
despesas que efetuou
(...) § 2o O valor da indenização será desde logo fixado pelo juiz, em quantia não
superior a 20% (vinte por cento) sobre o valor da causa, ou liquidado por arbitramento.

A não aplicação desse dispositivo é a principal causa de assoreamento do


aparelho jurisdicional, pois estimula que o advogado:
"... sustente teses e invoque incidentes cuja inutilidade não lhe era lícito ignorar,
uma vez que, desaparecidos os rábulas, trata-se de BACHAREL em CIÊNCIAS Jurídicas
e Sociais, cursado em estabelecimento de ensino superior, e com estágio forense
obrigatório; se a advocacia inexperta, argüindo fatos que não podia ou pretendia provar,
ou eram manifestadamente infundados, advir de mau conhecimento da lei, responde o
procurador e seu constituinte, civilmente obrigado pelos atos de seu patrono.
"Saliente-se... que desde o nascimento do Direito, na antiga Roma, antes mesmo de
se conceber os recursos, praticava-se penalizar o litigante de má-fé: o demandado "na
actio judicati" podia articular em sua defesa a "revocatio in duplum" (...) mas se
sujeitava, no simples caso de sucumbência, à condenação dobrada ("duplum")..." (Luiz R.
Nuñes Padilla, "Litigância de má-fé" in Revista de Crítica Judiciária, Leud, 1989, v. 5,
p. 199/220

Para mudar esse modelo em que o juiz não examina, e poder controlar a
morosidade excessiva, basta um pequeno ajuste, mediante o acréscimo de
alguns parágrafos ao art. 18, do CPC:
§ 3º. Em cada Tribunal, junto à Corregedoria-Geral, funcionará um Departamento Comportamental
para o exame da conduta processual e parecer técnico.
§ 4º. O Departamento Comportamental manterá um banco de dados dos atos que, em tese,
configurem conduta desleal, a partir das comunicações que receber, de ofício, ou a requerimento, do
interessado ou Ministério Público, devidamente instruído.
§ 5º. Comportamentos de distintos processos poderão ser agrupados e serem objeto de parecer
conjunto da conduta processual.
§ 6º. No prazo previsto no art. 495, do CPC, o parecer sobre a tipicidade da conduta e a
recomendação de sanções será encaminhado ao órgão julgador, onde será assegurada vista às partes
e Ministério Público, em prazo sucessivo, de dez (10) dias cada, findos os quais serão conclusos para
homologação.
§ 7º. Considerar-se-ão todas as circunstâncias e, analogicamente, no que pertinente, os princípios
e normas de aplicação da pena (arts. 59 a 67) do Código Penal.

A verificação do comportamento processual, o qual a doutrina


denomina de princípio da lealdade, exige o exame de um conjunto de
atividades. Um ato isolado nem sempre permite perceber a tipicidade. A
avaliação de conduta, na litigância de má-fé, possui uma natureza distinta
do exame de mérito dos processos de natureza cível onde a intenção do
agente é, muitas vezes, irrelevante. Numa reparação de dano, interessa o
nexo causal e a dimensão do dano. O exame da conduta processual exige
um tipo de valoração comportamental que mostra mais afinidade com o
direito penal do que com o civil.

"Quatro coisas devem ser feitas por um juiz: ouvir cortesmente, responder
sensatamente, considerar sobriamente e decidir imparcialmente" (Sócrates)
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 32

Capítul o II
Transdisci plin ar Teori a Geral do Processo
Em 1989 passamos a pesquisar, no PPGD-UFRGS, e a lecionar,
inicialmente na FURG, a disciplina de TGP:

A partir de 2002 adotamos uma abordagem principiológica geral


que, meio lustro depois, tornou-se a recomendada pelo MEC, Ministério da
Educação do Brasil, o qual propõe:
“ 5.7. Substituir a disciplina de Teoria Geral do Processo por princípios
constitucionais do processo, incluindo-a dentro do eixo de formação fundamental,
de forma que a mesma seja irradiadora das diferentes visões processuais,
cumprindo o papel de introduzir a temática processual a ser desenvolvida ao
longo do eixo de Formação Profissional. Dessa forma, passará a ter a missão de
apresentar os fundamentos e princípios gerais de todos os processos e não
apenas do processo civil como vem ocorrendo na maioria das FACULDADES.”14

14 ELEMENTOS PARA DEFINIÇÃO DO PROJETO PEDAGÓGICO DO CURSO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS


1.A presente proposta de reformulação do currículo do curso de Direito se deve à Resolução Conselho Nacional de Educação/Câmara de Ensino
Superior que instituiu as Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Direito. 2.Fiel ao estabelecido pelo MEC, o esboço do projeto
pedagógico prevê a redução da carga horária obrigatória, especialmente no Eixo de Formação Profissional, permitindo flexibilizações que
atendam os interesses dos alunos. Pressupõe que as disciplinas introduzam a visão e formas de abordar cada tema, sem o pressuposto de
esgotamento de conteúdo – somando-se às experiências e reflexões propiciadas pela atividade de Análise de Conflitos. Concentração de
disciplinas de caráter obrigatório nas etapas iniciais do curso, para uma maior disponibilidade de carga horária ser oferecida nos semestres finais
para atividades complementares, disciplinas eletivas, elaboração de TCC e realização de Estágio. 3. Concentração do curso em um único turno
de 20h, aí incluídas também as disciplinas de caráter eletivo, a serem desenvolvidas no decorrer dos vários semestres, o que permitirá que o
aluno trabalhe, estagie, desenvolva atividades próprias a uma formação jurídica plural. 4. Introdução de atividade curricular, de caráter
obrigatório, por oito semestres consecutivos, denominada análise de conflitos, com o objetivo de desenvolver temas básicos do direito através
da problematização de situações concretas, com a dupla finalidade de integrar os conteúdos de cada semestre e sinalizar os ramos do direito que
serão abordados na formação profissional. A atividade deve garantir a manutenção da reflexão acerca dos conteúdos de formação básica e se
incorpora ao Eixo de Formação Prática. 5.Reorganização do Eixo de Formação Fundamental, através das seguintes alterações:
5.1. Substituição das disciplinas História do Direito e Direito Romano I e II, por duas disciplinas de História do Direito – a primeira centrada no
direito romano e a Segunda preocupada com a história do direito no Brasil e na América. 5.2.Exclusão da disciplina Método de Estudo e
Pesquisa em Direito. 5.3. Reorganização dos conteúdos das disciplinas de Introdução ao Estudo do Direito, Filosofia do Direito e Sociologia do
Direito, afetos a cada disciplina, eliminando partes gerais de filosofia e sociologia. Redução da carga horária de Introdução ao Estudo do Direito
II e criação da disciplina de Hermenêutica e Argumentação Jurídica. 5.4. Manutenção da disciplina de Metodologia do Trabalho Científico em
Direito no início do curso, mas utilizar habilidades nela desenvolvidas para a produção textual em disciplinas do eixo profissionalizante até
culminar no TCC. 5.5..Posicionar a disciplina de Política e Teoria do Estado no primeiro período, consolidando o conjunto de disciplinas de
formação fundamental – redução da mesma para um único semestre. 5.6. Posicionar Economia Política também no primeiro período, com a
mesma função de consolidação do Eixo de Formação Fundamental. 5.7. Substituir a disciplina de Teoria Geral do Processo por princípios
constitucionais do processo, incluindo-a dentro do eixo de formação fundamental, de forma que a mesma seja irradiadora das diferentes visões
processuais, cumprindo o papel de introduzir a temática processual a ser desenvolvida ao longo do eixo de Formação Profissional. Dessa forma,
passará a ter a missão de apresentar os fundamentos e princípios gerais de todos os processos e não apenas do processo civil como vem
ocorrendo na maioria das Faculdades. 6. Reorganização do Eixo de Formação Profissional, através das seguintes alterações: 6.1.
Página 33 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

1. Teoria Geral dos Processos:


Processo pode ser definido como um conjunto de relações ou
movimento de energias? 15 Podemos os dividir em simples ou complexos?
Os processos simples são lineares e seqüenciais: um componente é a
conclusão de outro(s); Seu mecanismo de funcionamento é mais fácil de
entender, comparado ao dos processos complexos. Estes, constituem-se de
interações nas quais cada componente pode ser a causa de outro(s) e onde
as relações são multifárias, ecológicas, espaciais, sistêmicas,
multidimensionais. Seja simples, ou complexo, o processo é imbricado, e
pode se reciclar, constituindo-se no início ou parte de outro processo. Isto
os torna muito mais difíceis de perceber. Especialmente porque, neste exato
momento, estamos no meio de vários processos, acontecendo simultânea e
sucessivamente.
O processo jurídico é uma relação da legislação, ou do conjunto
de regras válidas num contexto, local e momento.16 O processo jurídico

Posicionamento de Criminologia I no segundo período, garantindo uma seqüência na formação penal, da criminologia ao respetivo processo;
organizar a disciplina de Direito Penal em quatro semestres, focados em Teoria Geral, Crime e Pena (a quantificação de pena é reforçada em
paralelo na atividade de Análise de Conflitos), respectivamente. Exclusão da disciplina de Criminalística e Medicina Legal, podendo-se optar
pela manutenção (em caráter obrigatório ou eletivo) de uma disciplina de Medicina Legal, que atenda necessidades da área penal, civil e do
trabalho. 6.2. Posicionamento de Direito Constitucional, logo após a disciplina de Política e Teoria Geral do Estado, a partir do segundo período,
dividido em três semestres: teoria geral, direitos individuais e coletivos (preparando um novo olhar sobre o direito civil, administrativo, penal,
tributário, dentre outros) e direitos sociais. – o que permitirá desenvolver uma nova perspectiva para o direito do trabalho, econômico e
previdenciário. 6.3.Reordenamendo da disciplina de Direito Civil em seis semestres, na seguinte ordem: teoria geral do direito civil, obrigações,
contratos, coisas, família e sucessões (esta última com dois créditos). Introdução de disciplina específica de Responsabilidade Civil, Consumidor,
culminando com a disciplina de direito urbanístico na qual será analisada em profundidade o novo regime jurídico da propriedade urbana. 6.4.A
Disciplina de Direito empresarial será ministrada em 4 (quatro) semestres, iniciando na quarta etapa, apos o estudo na disciplina de Direito Civil
II do Direito das obrigações. Os conteúdos programáticos serão desenvolvidos de forma que a última disciplina de direito empresarial se dê
imediatamente após direito financeiro e econômico e concomitantemente com o início do direito tributário. 6.5.Processo Civil estruturado em 4
semestres voltado ao “saber fazer”, a partir da base dos princípios constitucionais, com ênfase nas novas formas de tutela dos interesses
coletivos, o qual será desenvolvido de forma conjugada com a atividade de Análise de Conflitos. 6.6.Direito Internacional Privado posicionado
na nona etapa, quando já foram trabalhados os conteúdos de direito civil, penal, trabalho. 7.Eixo de Formação Prática: desenvolvido através da
introdução da atividade Análise de Conflitos, presente nos oito primeiros semestres, com o objetivo de fazer a interrelação de conceitos teóricos
com a prática jurídica, com enfoques por semestre, que reorientem questões da formação básica com a da formação profissional. Recebe um
reforço através das Atividades Complementares – normatizadas pela COMGRAD, dentro dos pressupostos da Resolução CEPE em vigor. As
Atividades Complementares podem ser desenvolvidas pelo aluno ao longo de todo o curso, mas a inclusão dos créditos pertinentes fica situada
no nono semestre, de forma a orientar o ordenamento de matrícula. O eixo tem, como culminância, a realização do Estágio Supervisionado e a
apresentação do Trabalho de Conclusão de Curso. O TCC, no nono semestre, inicia-se pela definição do tema, elaboração do projeto, valendo-se
dos conhecimentos obtidos na disciplina de Metodologia, da segunda etapa, bem assim dos posteriores exercícios de produção textual a serem
desenvolvidos ao longo dos semestres, tudo culminando com a execução do projeto no último semestre do curso. 8.Organização da cadeia de
pré-requisitos tendo em vista o processo de organização do conhecimento que se pretende ordenar em busca das habilidades e competências
previstas. Assim, os pré-requisitos podem se dar de duas formas: os de referenciais progressivos e os resultantes de uma necessária maturidade
curricular. Assim, pressupõe-se que, pelo menos, metade dos créditos do primeiro semestre (todos do eixo de formação fundamental) seja pré-
requisito para a disciplina de Ética e Legislação, exemplificativamente.
15
A física, ciência que estuda a composição do universo, entende que tudo é formado por energia, e
que as próprias partículas podem ser suas manifestações.
16
A legislação foi criada pelos humanos para disciplinar as relações entre os mesmos e com
criações humanas, como as pessoas jurídicas, existentes apenas num universo que nem sempre
corresponde à realidade. Há fatos reais que não integram o universo jurídico, e, neste, há elementos
separados da realidade. Em que consiste a realidade? Podemos defini-la como o resultado da percepção,
verificável por qualquer ser dotado de capacidade sensorial. Um som é real quando, dentro do seu
alcance, todos os seres o escutam, exceto os desprovidos de capacidade auditiva. Um objeto é real
quando o enxergam todos que nele focam o olhar ou, ainda, estando ao alcance do contato, todos o
sentirem na pele. Um odor é real, sob as mesmas condições. Também são reais os resultados de
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 34

opera em um plano distinto da realidade, constituído de regras criadas e


aplicadas à solução ou prevenção de litígios, para propiciar a paz e
progresso da sociedade. Sendo o principal instrumento do direito um
conjunto de regras, podemos acreditar que todo o Direito depende do
processo de comunicação.

A comunicação é um processo complexo, porque a estrutura


aparente e externa é influenciada por um processo interno: O processo de
pensamento consiste numa interação – às vezes uma confusão? - entre as
percepções e as crenças, pois entre o que existe e poderíamos perceber e o
que efetivamente registramos no banco de memória – como se fosse a
realidade, passa por uma filtragem que produz deleção, distorção,
e/ou generalização na informação:

Realidade à é filtrada, e sofre deleção, distorção, e/ou


generalização resultando o armazenamento, na memória, de dados
que não necessariamente correspondem à realidade. Há crenças sobre o
que é real. Muitas das crenças são úteis; outras não. E em determinado
momento, uma crença que pode ter sido útil no passado, passa a ter
efeito limitante.

Durante o processo de pensamento, acessamos o banco de memória


– e também ocorre similar filtragem, ampliando os efeitos da deleção,
distorção, e/ou generalização:

Banco de dados da memória à no processo de pensamento sofre


mais deleção, distorção, e/ou generalização resultando que o Processo
de Pensamento é influenciado por informações imprecisas, e pode gerar
novas crenças porque o sistema de crenças pode facilitar ou confundir o
processamento das percepções. Pode ocorrer a criação de crenças sobre
outras crenças.

O processo de pensamento depende da vontade, sendo direcionado


pelos objetivos - imediatos e mediatos; conscientes e inconscientes – os

percepções amplificadas por instrumentos, como os microscópios, ou testes, como as reações químicas,
que possam ser verificadas por todos. Diferente é o universo jurídico, que estuda fenômenos próprios: As
pessoas jurídicas existem apenas nesse plano, e, contudo, os atos que praticam, através dos humanos que
as representam, podem produzir efeitos sobre a realidade... No ângulo contrário, estão os atos jurídicos
que não produzem resultados no mundo real, como a garantia em favor do mutuário que cumpre a
obrigação contratada. Um negócio jurídico celebrado sobre condição suspensiva, pode nunca concretizar-
se. Um ato nulo não ingressa no universo jurídico. A legislação é criada, registrada e aplicada através de
um processo legislativo, através da linguagem que é parte do processo de comunicação. Há regras para
saber se outra regra é aceita num determinado momento e local, e essa própria aceitação da regra pode se
tornar controvertida. Há uma complexa relação na aplicação do direito, da qual trataremos ao longo desta
Teoria Geral dos Processos.
Página 35 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

quais influenciam, e são influenciados, pelo conjunto de crenças. O conflito


entre crenças e objetivos impede a eficiência do processo de pensamento.17

O processo jurídico tem dois objetivos: O imediato consiste em,


mediante disposição de vontade18, ou imposição19, solucionar ou prevenir
uma pretensão20. A sentença silogismo 21 entre o pedido e o direito aplicado
aos fatos considerados provados22. Tudo acontece - ou deveria acontecer -
dentro da Lei; e a sentença pressupõe um requerimento do interessado23.

17
Visualize o fenômeno de filtragem da realidade em www.padilla.adv.br/evoluir/perceber
18
O Estado, que também é uma criação jurídica, através de seus representantes edita, para as
relações mais comuns, regras genéricas que podem prevenir uma boa quantidade de litígios. Este, quando
ocorre, no mais das vezes resolve-se entre os envolvidos que, no todo, ou em parte, fazem concessões,
renuncias, que podem ser informais, como deixar o tempo passar, até que a prescrição põe fim ao direito.
Sobre a natureza e o alcance da prescrição como transferidor de direitos e obrigações, veja “As
chamadas prescrições "negativa" e "positiva" no Direito Civil Brasileiro e Português, semelhanças e
diferenças” na Revista de Informação Legislativa, Senado Federal, Brasília, outubro a dezembro de
1990, a.27, v.108, p. 285-295, disponível em www.padilla.adv.br/teses
19
O juridicamente interessado pode pedir que o Estado examine, decida e imponha solução.
20
A pretensão pode ser caracterizada como a existência de um interesse relevante obtado por um
obstáculo cuja supressão é objetivo do processo. CPC Art.3º Para propor ou contestar ação é necessário
ter interesse e legitimidade. O interesse processual é uma das condições gerais da ação, tratada adiante,
nesta Teoria Geral. Também é admitido o processo judicial para prevenir um litígios: CPC Art.4º O
interesse do autor pode limitar-se à declaração: I- da existência ou da inexistência de relação jurídica;
II- da autenticidade ou falsidade de documento. § un. É admissível a ação declaratória, ainda que tenha
ocorrido a violação do direito. Finalmente, há tutela jurisdicional denominada “jurisdição voluntária”
onde, propriamente, não há um litígio contra uma parte adversa; Há, contudo, uma resistência, da própria
ordem jurídica: Em casos específicos, de determinados institutos aos quais pressupõe necessidade de
tutela especial, exige o concurso de uma supervisão do Estado-juiz para validar a manifestação de
vontade dos interessados. Adiante, aprofundaremos esse conceito, junto com o de Jurisdição.
21
CPC Art.460. É defeso ao juiz proferir sentença, a favor do autor, de natureza diversa da pedida,
bem como condenar o réu em quantidade superior ou em objeto diverso do que Ihe foi demandado. § un.
A sentença deve ser certa, ainda quando decida relação jurídica condicional. Art. 458. São requisitos
essenciais da sentença: I- o relatório, que conterá os nomes das partes, a suma do pedido e da resposta
do réu, bem como o registro das principais ocorrências havidas no andamento do processo; II- os
fundamentos, em que o juiz analisará as questões de fato e de direito; III- o dispositivo, em que o juiz
resolverá as questões, que as partes Ihe submeterem.
22
Para definir quais são os “fatos provados” no processo, também há um processo de julgamento,
ou um conjunto de processos de julgamento, que definem: O que é incontroverso e, nos fatos
controvertidos, o que já foi provado, ou o que não precisa ser, porque se presume. Percebestes? Dentro
do processo que decidirá o mérito da questão proposta ao julgador, há outro processo, definindo quais são
os fatos válidos para a decisão a ser tomada. Nesse ponto, importante começar a familiarizar-se com a
regra do art. 302, do CPC: Cabe também ao réu manifestar-se precisamente sobre os fatos narrados na
petição inicial. Presumem-se verdadeiros os fatos não impugnados, salvo: I - se não for admissível, a seu
respeito, a confissão; II - se a petição inicial não estiver acompanhada do instrumento público que a lei
considerar da substância do ato; III - se estiverem em contradição com a defesa, considerada em seu
conjunto. Parágrafo único. Esta regra, quanto ao ônus da impugnação especificada dos fatos, não se
aplica ao advogado dativo, ao curador especial e ao órgão do Ministério Público.
23
Ressalvados os casos de interesse público, onde o pedido é ser presumido existente, para que haja
tutela jurisdicional deve haver pedido. Observe alguns artigos do CPC: Art.2º Nenhum juiz prestará a
tutela jurisdicional senão quando a parte ou o interessado a requerer, nos casos e forma legais. Art.6º
Ninguém poderá pleitear, em nome próprio, direito alheio, salvo quando autorizado por lei. Art. 262. O
processo civil começa por iniciativa da parte, mas se desenvolve por impulso oficial. Art. 263.
Considera-se proposta a ação, tanto que a petição inicial seja despachada pelo juiz, ou simplesmente
distribuída, onde houver mais de uma vara...
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 36

O objetivo mediato é o progresso com estabilidade social,


propiciados pela credibilidade do aparato jurisdicional perante a maioria da
população, estimulando os comportamentos lícitos. Daí a necessidade de
fundamentar logicamente, de maneira convincente, sem omitir os fatos ou
fundamentos (art. 93-IX C.F.). O que, comumente, costumamos denominar
de injustiça ou impunidade, gera a audácia dos maus, desestabilizando a
paz social.

No Sec. XIX, o processo jurídico era informado pela moral vigente,


que exigia uma postura ética: O processo judicial era uma exceção à regra do
adimplemento espontâneo das obrigações. As discussões se limitavam à
divergência de interpretar a aplicação da lei. Raras, porque o imobilismo
era característica imposta por assegurar a paz social. A sociedade era
estruturada sobre a obediência civil e simplesmente não tolerava quem não
adimplia suas obrigações!
A quebra da bolsa afetou os costumes. Até então, o inadimplente era
discriminado pela sociedade. Ninguém queria passar por esse
constrangimento, havia o cumprimento espontâneo das obrigações.
Após 1929, muitas pessoas, simultaneamente, perderam tudo. O
inconsciente coletivo começou a ter tolerância com o inadimplemento. Não
tardou para que algumas pessoas, percebendo a vantagem financeira de não
cumprirem com as obrigações, iniciassem uma onda de desobediência civil.
Antes desprezível, cresceu, aumentando a quantidade de demandas nas quais
as indagações importantes, e de complexidade, perdiam-se em meio a uma
grande quantidade de litigâncias lucrativas. O mau exemplo do Poder Público
sobrecarregou o sistema judicial.
O precatório é um mecanismo protelatório e de fomento à corrupção,
criado no início do Sec. XX no Rio de Janeiro. O poder público, até então, dava
o exemplo. Quando uma condenação transitava em julgado, era paga. A
desculpa de previsão orçamentária é prosopopéia flácida para acalentar
bovinos, derrubar lagartixa da parede e que vem servindo para alimentar uma
corrupção cada vez maior. Não há necessidade de previsão orçamentária de
condenação judicial, porque esta pressupõe um fundamento lógico-jurídico de
Justiça, princípio de igual ou superior hierarquia aquele que limita a
disponibilidade dos recursos da população àquelas despesas previamente
debatidas e aprovadas pelos representantes do povo. Quem administra
recursos públicos (portanto: alheios) deve estar prévia e expressamente
autorizado efetuar tal despesas. Diferente do setor privado, o administrador
não pode decidir realizar uma despesa. Não é o caso da condenação judicial, a
qual decorre do exercício de outro poder do Estado, sujeito a legitimação
diversa: Imparcialidade Judicial versus Discricionariedade
Administrativa in Revista da Faculdade de Direito da UFRGS, v.12, 1996,
p.209-215; tb. em http://www.padilla.adv.br/teses/
Página 37 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

Então, lá no início do Século XX, bastaria ao juiz mandar pagar.


Decisão judicial transitada em julgado se cumpria. Ao invés de impor respeito
à autoridade municipal recalcitrante, criou um novo procedimento o qual,
perceberam os políticos, permitir-lhes-ia cobrar polpudas propinas: A ameaça
de longos anos de espera judicial para receber desintegra capacidade de
resistência do credor: Ou paga o PF "por fora" ao dirigente político que detém o
poder de autorizar o pagamento da despesa, ou a empresa “quebra”. Para
pagar o PF, as empresas começaram a superfaturar os preços. E passaram a
exigir PF cada vez maior. Dizem que, nas obras do Pan2007, passou de 30%.
Isso explica porque, apesar de cobrar impostos mais caros do mundo, o Brasil
oferece péssimos serviços públicos de saúde, educação, segurança. Corrupção,
superfaturamento, etc., são constantes escândalos.
O poder público dá o pior dos maus exemplos: Protelação e
corrupção! As empresas protelam para lucrar. Apenas o fraco e pobre cidadão
está obrigado a cumprir a Lei?
Para acabar com a corrupção, basta extinguir o precatório. Num
primeiro momento, a fase de transição poderá escalonar a mudança para
reduzir o impacto de décadas de corrupção. E o poder público, quando a
condenação transitar em julgado, passará a pagar imediatamente. Primeiro
porque tem deve dar o bom exemplo. Segundo, porque concentra todo o poder
econômico e político, e sua fonte de recursos é inesgotável, porque a
arrecadação de impostos não para de crescer: http://www.impostometro.org.br/
e http://www.youtube.com/playlist ?p=PLE1DFCDB647956B21/

Não obstante os prazos reduzidos e rigorosos24, a Justiça foi


ficando cada vez mais distante. A demora tornou a inadimplência mais

24
Necessário ao andamento do processo, o rigor nos prazos é demonstrado pelo fato de que cinco
minutos de atraso em audiência são suficientes para que seja aplicada a revelia e a confissão ficta,
conforme recurso ordinário nº 1069100-10.2004.5.02.0000 Relator Ministro Renato de Lacerda Paiva,
Seção II Especializada em Dissídios Indiv iduais do TST. A CLT diz no Art. 775 Os prazos
estabelecidos neste Título contam-se com exclusão do dia do começo e inclusão do dia do vencimento, e
são contínuos e irreleváveis, podendo, entretanto, ser prorrogados pelo tempo estritamente necessário
pelo juiz ou tribunal, ou em virtude de força maior, devidamente comprovada... Art. 776 aO vencimento
dos prazos será certificado nos processos pelos escrivães ou secretários. Diante disto, deve ser aplicado
o CPC, por analogia, No CPC, diz o Art. 183: Decorrido o prazo, extingue-se, independentemente de
declaração judicial, o direito de praticar o ato, ficando salvo, porém, à parte provar que o não realizou
por justa causa. § 1º Reputa-se justa causa o evento imprevisto, alheio à vontade da parte, e que a
impediu de praticar o ato por si ou por mandatário. § 2º Verificada a justa causa o juiz permitirá à parte
a prática do ato no prazo que Ihe assinar. O CPP de 1941 regra diferente: CPP Art. 798. Todos os
prazos correrão em cartório e serão contínuos e peremptórios, não se interrompendo por férias,
domingo ou dia feriado. § 1º Não se computará no prazo o dia do começo, incluindo-se, porém, o do
vencimento. § 2º A terminação dos prazos será certificada nos autos pelo escrivão; será, porém,
considerado findo o prazo, ainda que omitida aquela formalidade, se feita a prova do dia em que
começou a correr. § 3º O prazo que terminar em domingo ou dia feriado considerar-se-á prorrogado
até o dia útil imediato. § 4º Não correrão os prazos, se houver impedimento do juiz, força maior,
ou obstáculo judicial oposto pela parte contrária. § 5º Salvo os casos expressos, os prazos
correrão: a) da intimação; b) da audiência ou sessão em que for proferida a decisão, se a ela
estiver presente a parte; c) do dia em que a parte manifestar nos autos ciência inequívoca da
sentença ou despacho. Sobre analogia, aponta o CPP no art.3º A lei processual penal admitirá
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 38

lucrativa! Outrora um dos principais mecanismos para a realização da Justiça


e paz social, o processo se tornou um expediente para aumentar o lucro dos
inescrupulosos: 25

Até 1929 → antes da quebra da Bolsa de NY havia o


cumprimento espontâneo das obrigações
para evitar o constrangimento social
1929 insolvência coletiva desencadeia revolução da moral exceto
em locais “ocidentalizados” após a década de 30. Dominado após 1945, no Japão a honra e
o cumprimento de obrigações é um valor social.

Após 1929 → tolerância social à inadimplência dissemina o não


cumprimento para aumentar o lucro e melhorar a performance frente
à concorrência. Isso cresceu a ponto de, em alguns ramos, usar desse
subterfúgio é uma forma de se manter no mercado. Faltou visão aos
legisladores para mudar o processo e reduzir o lucro da
inadimplência. Os maus pagadores tornaram-se a regra.

Em meados do Sec. XX, as discussões judiciais eram longas.


Diante do volume de processo, os mecanismos do princípio da lealdade,
sobre os quais trataremos em capítulo próprio, deixaram de ser aplicados,
porque o juiz, entre analisar a conduta processual das partes e
procuradores, e prolatar sentença em outro processo, preferia aumentar
sua estatística de produtividade.
Quando um consumidor prejudicado reclamava, além da demora,
as condenações eram raras, porque todo ônus da prova recaia sobre ele, a
parte mais fraca. Em 1990 foi editada uma nova legislação, o CDC Código
do Consumidor, para revolucionar as relações de consumo, estimulando o
aperfeiçoamento dos bens e serviços, e a livre concorrência. Contudo, no

interpretação extensiva e aplicação analógica, bem como o suplemento dos princípios gerais de direito e
a CLT no art.8º§ O direito comum será fonte subsidiária do direito do trabalho, naquilo em que não for
incompatível com os princípios fundamentais deste e no art.769 Nos casos omissos, o direito processual
comum será fonte subsidiária do direito processual do trabalho, exceto naquilo em que for incompatível
com as normas deste Título.
25
A “necessidade” humana de bens, serviços, atenções, parece ser infinita. Já percebestes
como (sempre!) há “coisas” que desejamos? Esses “desejos” desencadeiam os conflitos. Eles
podem ser resolvidos pela: autocomposição ou heterocomposição; nesta, um terceiro, alheio ao
conflito, intervém e, na via judicial, pode impor uma solução; naquela, há três tipos; desde a
renúncia de quem acreditava ter um direito, ou a submissão do que, inicialmente, resistia,
passando pela reciprocidade, prevista no CCB Art. 840. É lícito aos interessados prevenirem ou
terminarem o litígio mediante concessões mútuas. Considerando que, por maior que seja o
conflito, sempre é possível que o proceso termine em acordo, é correto afirma que a atividade
jurisdicional que, por natureza, é uma heterocomposição, pode, contudo, limitar-se a homologar
a autocomposição das partes; aliás, havendo processo, a transação depende de escritura pública
ou termo nos autos: CCB Art. 842. A transação far-se-á por escritura pública, nas obrigações
em que a lei o exige, ou por instrumento particular, nas em que ela o admite; se recair sobre
direitos contestados em juízo, será feita por escritura pública, ou por termo nos autos, assinado
pelos transigentes e homologado pelo juiz.
Página 39 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

final do sec. XX, o poder econômico dominara a sociedade, manipulava a


informação, criava e modificava as crenças e, conseqüentemente, o
pensamento da população, inclusive dos magistrados: Caravantes registrou
não haver juízes infalíveis porque o Estado "hablia de elegirlos entre los
hombres”.26
O poder econômico constrói idolatrias em torno de idéias e de
pessoas que se prestam aos seus objetivos. Destroem ou impedem o
crescimento de lideranças27. O objetivo de lucro distorceu e manipulou as
crenças e esvaziou os efeitos do Código do Consumidor. Quando o
prejudicado reclama, enfrenta resistência judicial e, não raro, termina em
improcedência, por qualquer pretexto, ou indenização de valor ínfimo, que
não repara o dano, e a violação do direito individual fica escondida em meio
a quantidade enorme de processos em que as decisões não examinaram os
fatos e fundamentos. Isso é fruto da crença, disseminada pelas poderosas, e
cada dia mais ricas, prestadoras de maus serviços: “Negar o direito do
consumidor, e nas raras procedências, arbitrar indenizações e honorários
pífios, desestimula o ajuizamento de novas ações, e reduzirá o excessivo
volume de processos.” Falso: Por mais que insistam em negar o direito aos
consumidores, ou fixar valores pífios, as pessoas sentem “fome e sede de
justiça” e ajuizarão ações.
Pelo contrário: A injustiça compromete a paz social e aumenta os
litígios. Os processos contra prestadoras de serviços desapareceriam se
houvesse o estímulo ao cumprimento da lei. E nada melhor para isto do
que impor indenizações consideráveis a quem não a respeita, prejudica o
consumidor, e o cidadão. Em outros países, existe respeito aos direitos e
cumprimento das obrigações porque os infratores sofrem as conseqüências
de seus atos. Ludibriados pela crença de que reduzirão a quantidade de
ações, negam o direito, e tornam ainda mais lucrativo o desrespeito à lei.
Vale dizer: Estimulam a desobediência civil. Esse desrespeito aos direitos
individuais é agravado pela sublimação dos direitos coletivos. Lembrem o
caso do FGTS: A CEF - Caixa Econômica Federal - devia devolver bilhões
aos depositantes do FGTS, de quem suprimiu a correção monetária.
Durante décadas, a variação cambial foi o mais público e notório dos fatos.
Até as crianças sabiam que, se não comprassem agora seu pirulito, o
dinheiro não seria suficiente amanhã. Para não pagar essa conta, o
Governo negou a existência da inflação. Aliás, o Poder Judiciário está
sobrecarregado de ações porque o poder público dá os piores exemplos. Não

26
José de Vicente Y Caravantes "Tratado Historico, Crítico Filosófico de los Procedimentos
Judiciales en Materia Civil, segun la nueva lei de enjudiciamento". Madrid, 1856 tomo IV, p. 83 n.
1.495.
27
Saiba mais em www.padilla.adv.br/etica/idolatria
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 40

cumpre com suas obrigações28, e responde pela maioria dos processos.


Estimulados pelo lucro, os empresários não pagam o que devem, e os
fornecedores de bens e serviços ludibriam o consumidor. Bastaria que os
juízes enquadrassem esses comportamentos abusivos, dentro da lei
processual29 e material 30, e deixaria de ser lucrativo o desrespeito à lei. As
grandes empresas e o poder público passariam a cumprir com suas
obrigações e, em curto prazo, o volume de processos reduzir-se-ia a um
percentual quase inexpressivo. Contudo, Marco Antônio Birnfeld vislumbra
o contrário apontando indícios. Refere grande quantidade de ações com
indeferimento dos pedidos ou, quando não há como encontrar motivo para
negar, fixam valores aviltantes como indenização31. Tudo indica que estão
agindo assim baseados na crença de que desestimularão os advogados a
postularem reparações de dano, e com isto reduzirão o volume de ações no
Judiciário.

Recente o exemplo das empresas de telefonia, detentoras de


enorme poder econômico. Praticaram atos ilegais, prejudicaram milhões de
consumidores e acionistas, e conseguem se safar com decisões criticadas
como aberrogação, um novo instituto, misto de aberração e revogação. Eu
me pergunto se conseguem perceber que a responsabilidade de mudar isto
é dos Juízes? Se o Judiciário impuser aos poderosos, políticos e às grandes
empresas, enfim, aos infratores, o cumprimento das obrigações e
observância ao princípio da Lealdade32, resgataremos a ética e a paz social.

28
“Mais de 75% dos processos julgados pelo Superior Tribunal de Justiça, de sua criação até o
mês passado, envolvem o Estado, o aparelho estatal, pelos seus entes federais, estaduais e municipais”
Ministro Pádua Ribeiro, em entrevista à Revista Consulex, nº 16, abril/98, p.7.
29
A não-utilização, pelos magistrados, dos dispositivos legais apenadores da litigância deletéria
introduzidos no CPC de 1973 é uma das causas de assoreamento do aparelho jurisdicional nas conclusões
da XI Jornada Ibero-Americana de Direito Processual, Relator Sérgio Bermudês. Conheça mais sobre o
tema e as normas processuais contra o abuso processual em “Litigância de má-fé no CPC reformado”
Revista de Processo, RT, São Paulo, abril-junho 1995, a.20, v.78, p.101-107, publicado em
www.padilla.adv.br/teses
30
Confira o trabalho Abuso no exercício de direito: Interpretação do art.187 do Código Civil,
Ricardo Seibel de Freitas Lima, publicado em www.padilla.adv.br/teses
31
As exceções? Não infirmam a regra. Amigos, podem receber as benesses da lei, ao ponto da
advogada Marlise Beatriz Kraemer Vieira criticar a disparidade de critérios entre uma condenação de R$
38 mil para uma parturiente violada sexualmente pouco antes de entrar em trabalho de parto, e R$
150.000,00 para uma juíza, servidora pública, "ofendida" por ter seu trabalho criticado. Se não for um
juiz, uma empresa de telefonia, uma instituição bancária, a sua "dor" será ressarcida com meia dúzia de
patacas? E uma crítica – sem conotação pessoal e ou agressão - faz parte de qualquer profissão,
mormente a pública, porque a sociedade, que paga os salários, tem o direito de cobrar e fiscalizar o que
fazem os servidores públicos. “A "dor" da togada é maior do que a de uma mulher brutalmente atacada
no momento em que estava prestes a colocar no mundo uma vida?”
www.espacovital.com.br/noticia_ler.php?id=15459 e www.espacovital.com.br/noticia_ler.php?id=15454
32
Percebendo que, no Projeto Cadernetas de Poupança da 19ª Vara Cível de Porto Alegre, mais de
80% das ações pediam AJG, a gratuidade judiciária, e parte significativa sem documentos
comprobatórios, em 2009 o Juiz Pio Giovani Dresch passou a fixar o dobro das custas como punição a
quem pediu gratuidade de justiça, sem fazer jus. E ameaçou aumentar, em até 10 vezes, conforme prevê a
Lei 1.060/50: www.espacovital.com.br/noticia_ler.php?id=14804
Página 41 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

2. Teoria Geral do Processo Civil, Penal, e


Trabalhista?
Na crescente bibliografia de TGP, a maioria aborda apenas
o processo civil. Alguns tecem comparação com o processo penal ou
trabalhista. Poucos doutrinadores confessam a limitação de suas
obras denominando-as de Teoria Geral do Processo Civil, ou similar.
A diversidade bibliográfica deu origem a uma extensa
variedade de abordagens, com dezenas de princípios, alguns idênticos
no nome, contudo, distintos no enfoque, outros similares, com nomes
diversos, ou conotações adicionais. Barros de Angelis, em 1979, farto
dessa verdadeira “Babel”33 principiológica publicou “Teoria Del
Proceso” abordando “el proceso civil, comercial, penal, administrativo,
tributário y aduanero”. Em quatro centenas de laudas evitou referir a
quaisquer princípios porque eram tantos que demandariam um
tratado, de milhares de aludas, os descrever e comparar,
posicionando-se a respeito das várias correntes. O filósofo, amigo da
sabedoria processual, de escola fomentada por Couture, atento às
características das normas processuais, publicidade, autonomia,
instrumentalidade, heteronomia, limitação, estatuária e razoabilidade
(pág. 78) lembrando que todos, em variados graus, são comuns às
demais normas jurídicas, conduz numa jornada através dessas
normas e de sua aplicação permitindo ao leitor inferir os princípios,
desenvolvendo uma noção que permita compreender e aplicar as
normas processuais, quaisquer que sejam seus tipos34, tendo em
conta a natureza do que é discutido.
"Processo Civil e Processo do Trabalho nasceram e cresceram a partir de
princípios gerais semelhantes, temperados pela diversidade nos interesses públicos que
motivaram a criação de um e outro.

"O Processo Civil aparece com a organização da sociedade que, procurando


evitar excessos no exercício das próprias razões e o sentimento de vingança, retira dos
particulares o direito de agir na defesa dos seus interesses, obrigando-os a buscar satisfação
através do Poder Judiciário. O processo Civil desenvolve-se permeado por um ideal
democrático tolerando uso abusivo de meios de defesa, adiando o final das causas. As causas
trabalhistas não podiam esperar tanto.
"Da necessidade de uma justiça mais célere e sensível à fome de quem busca o
meio de sobrevivência nasceu o Processo do Trabalho. A Justiça do Trabalho superestima a
oralidade, reduzindo ao escrito apenas o indispensável. Busca a concentração, e concede ao
juiz o poder-dever de impulsionar o processo que deve satisfazer os direitos salariais

33
Alusão à mística Torre de Babel na qual, para evitar a continuidade rápida da obra, cada um dos
operadores começou a falar em uma linguagem diferente e apesar do objetivo comum ninguém se
entendia.
34
Barros de Angelis, “Teoria Del Proceso” ed. De Palma, Buenos Aires, 1979
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 42

reclamados, enquanto o Processo Civil contenta-se em dizer o direito, afirmar quem tem
razão.
"Os atos e decisões são permeados por um princípio tutelar-protetivo,
conhecido com in dubio, pro misero que aparentemente desrespeita o princípio de
igualdade entre as partes, facilitando a atuação profissional do empregado. Mas pelo
contrário, essa tutela é justamente aplicação do princípio da igualdade que, conforme
máxima Aristotélica comumente atribuída a Rui Barbosa, consiste tratar igual aos iguais, e
desigual aos desiguais.

"Patrão e empregado são desiguais, em variáveis graus. Aquele possui todos


meios de prova, este é hipossuficiente. Semelhante inversão do ônus da prova foi possibilitada
pelo Código do Consumidor (art.6º)..."35

3. Dos Princípios Gerais aos vários processos:

A disciplina TGP foi criada pelo MEC [Ministério de Educação] para


atender uma necessidade, decorrente das modificações sociais36: O
processo crescera em importância37. TGP carecia de um manual com uma
abordagem unificada 38. No início do século XXI, encontramos visões
parciais, de processualistas civis, algumas temperadas com o processo
penal. Muitas possuíam capítulos ótimos; contudo, não permitiam a visão
sistemática do fenômeno “processo”. Como introduzir os instrumentos da
ciência jurídica processual? Como propiciar uma visão geral do processo
como fenômeno distinto do direito material? A percepção de “princípios”

35
Luiz Roberto Nuñesos Padilla, "Comparação entre os processos trabalhista e civil" in LTr,
Suplemento n.105/93, p.671/674; Nossos Tribunais (COAD), n.36/93, p.590/593; Advocacia Dinâmica
(ADv) 1993, p.456/459; Advocacia Trabalhista (ADt) n.30/93, p.320/321; Jornal do Comércio Segundo
Caderno 17-5-93, p.16; www.padilla.adv.br/teses
36
O MEC – Ministério da Educação - na orientação denominada “ELEMENTOS PARA
DEFINIÇÃO DO PROJETO PEDAGÓGICO DO CURSO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS”
recomenda até trocar o nome da disciplina, a fim de atender esse objetivo: “Substituir a disciplina de
Teoria Geral do Processo por princípios constitucionais do processo, incluindo-a dentro do eixo de
formação fundamental, de forma que a mesma seja irradiadora das diferentes visões processuais,
cumprindo o papel de introduzir a temática processual a ser desenvolvida ao longo do eixo de
Formação Profissional. Dessa forma, passará a ter a missão de apresentar os fundamentos e princípios
gerais de todos os processos e não apenas do processo civil como vem ocorrendo na maioria das
FACULDADES. “ Na Faculdade de Direito da UFRGS, procuramos observar a necessidade de
generalidade processual.
37
Os “desejos” e a busca do lucro, quando a sociedade mudou na metade do Século XX, acabando o
filtro da ética, multiplicaram as demandas.
38
Entre 1990 e 1991, lecionamos TGP no Curso de Direito da FURG e no Curso de Preparação à
Magistratura do Trabalho, na Escola da AMATRA-IVª, posteriormente transformada em Femargs. Em
1992, a tradição da UFRGS atribuía ao professor calouro as disciplinas restantes após as escolhas dos
docentes veteranos. Somente no limiar do Século XX, pudemos retomar a disciplina de TGP. Esse
intervalo – lecionando outras matérias, com o foco da pesquisa focada em TGP, foi importante, senão
indispensável na estruturação da Teoria Geral.
Página 43 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

processuais é essencial à visão sistemática, e fundamental para


compreensão das normas, e sua melhor aplicação.

Há diferentes modalidades de processos. Apenas entre os cíveis,


lato senso, são dezenas, repletos de peculiaridades: Por exemplo, os dois
tipos de juizados especiais e os trabalhistas. Há diversos processos penais
e o processo eleitoral. E os procedimentos administrativos? São inúmeros:
Cada órgão com peculiaridades. Os políticos resistem à unificação. Até os
processos legislativos são diversificados em níveis federal, estaduais e
municipais. Nesse contexto, o processo disciplinar desportivo destaca-se
como o primeiro a ser unificado, em 2003. O plural em TGPs - Teoria Geral
dos Processos, registra o compromisso de mirada geral. O desafio é abordá-
los em conjunto: O que há em comum versus o que os diferencia? E, de
brinde: O por quê!

No direito substantivo, as normas se referem à conduta permitida,


ou vedada, para preservar o que a lei entende como Justiça. Veja por
exemplo: A norma penal proíbe ferir e assegura o direito à integridade
corporal, inerente á dignidade humana. A regra trabalhista exige o
pagamento de horas extras em valor maior que o normal porque a ciência
prova que, a partir de um determinado tempo, que varia conforme certas
peculiaridades, o desgaste do trabalhador é muito superior em
conseqüência da equidade, e da correspondência das contraprestações
contratuais. A obrigação de alimentos da lei civil representa o dever de
subsistência entre os familiares. As normas de direito material são
vinculados aos direitos que representam. Cumprida a lei, a sociedade
estará em estado de equilíbrio, ou de Justiça.

O funcionamento das normas processuais é diferente. O processo


tem como objetivo restabelecer o equilíbrio social e efetivar o direito
material. Contudo, não é uma ou outra norma processual que produz o
resultado o qual depende de uma sucessão de atos. Tudo (deve ser)
praticado nos limites da legalidade. Assim, conforme demonstraremos a
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 44

seguir, toda legislação de processo deve ser 39 interpretada e aplicada


conforme dois princípios gerais sobre o como agir e o onde chegar com
essa atuação.

O princípio condutor – o como, o “how to”, a forma, é a legalidade:


Todo procedimento decorre da lei. Não se pode conceber que a atuação do
Estado ocorra fora da Lei. Nos seis volumes de "Acess to Justice”, Mauro
Cappelletti e outros demonstram que o aplicador deverá considerar as
regras legais estabelecidas a partir da Constituição Federal de cada Nação
buscando real efetividade no garantir o acesso à Justiça. O
princípio da legalidade vincula toda ação estatal. A lei deve ser
suportada, em primeiro plano, por quem a fez.40

O princípio finalístico é o objetivo, o “goal”, o onde se pretende


chegar com o processo. Podemos chamá-lo de equidade. Afinal, a lei existe
para realizar uma sociedade justa. Então, em que consiste a Justiça? Uma
das melhores definições do Direito é a milenar lição de Ulpiano de ser a
“vontade constante e perpétua de dar a cada um o que é seu”. Esses são princípios
efetivamente gerais, aplicáveis a todo tipo de processo, porque não-realizar
justiça, quando solicitado, e agindo na forma da lei, ofende a dignidade da
pessoa humana, a qual é a finalidade da existência do Estado. "A essência
da atividade jurisdicional é "aplicar contenciosamente a lei a casos
particulares", no dizer conhecido de Pedro Lessa: “... visando estabilizar o
conflito através de uma solução de efeito pacificador. No contexto do que seja
bem comum, não é possível afastar a exigência de uma convivência

39
Salientamos que “deve ser” porque falamos de direito processual em tese. Como veremos adiante,
ao tratarmos da introdução à Hermenêutica Processual e de conceitos fundamentais como a Teoria Critica
do Direito e ao princípio do livre convencimento do juiz, da fungibilidade e de outros aspectos de prática
discricionária nos quais se manifestam, nem sempre há esse respeito na prática. Constituiu abuso de
direito conduta que objetive aumentar os lucros, sob o pálio de aparente prática legal. Contudo, o poder
econômico do lucro vem prevalecendo nas decisões de massa. Conforme assevera Silvio Rodrigues,
“acontece, entretanto, que, às vezes, o direito de lesar legalmente é assegurado. É aí que se pode
apresentar o problema do abuso. Se o agente, conformando-se a um texto, o invoca para justificar o seu
ato, é possível que, atendo-se à letra, não tenha exercido de forma regular o direito que o texto
assegura” (Da responsabilidade civil. Forense, v. II, 1995. p. 254). Cita julgado constante na RT
332/226: “Abuso de direito é todo ato que, em princípio autorizado legalmente, se executa em
desconformidade ao ordenamento jurídico, ou com excesso na sua limitação” (ob. cit., p. 49). O que
fazer a respeito? Encontrar soluções é o papel do jurista.
40
CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, B. “Acess to Justice”. Milão, Giuffré, 1978. Examine
também a excelente tradução da Ministra Ellen Gracie Northfleet: “Acesso à Justiça”, Porto Alegre,
Sérgio Fabris, 1988, notadamente p.31-32.
Página 45 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

pacífica entre os indivíduos, situação a que o Estado está obrigado a


garantir...."41

Alfredo Buzaid, conhecido como Mestre das Arcadas, principal


expoente do movimento que Nicelo Alcalá-Zamorra y Castillo
carinhosamente referiu como a “Escola Paulista de Direito42”, registrou a
necessidade de priorizar e respeitar Princípios, a lição

“... a fidelidade aos princípios não tolera transigências... a dissensão é


insuperável, a tendência é de resolvê-la mediante concessões, que não raro sacrificam a
verdade científica a meras razões de oportunidade”. 43

O Princípio da Publicidade existe para dar transparência à


atividade jurisdicional. Para Pellegrini, Dinamarco e Cintra, “o princípio da
publicidade do processo constitui uma preciosa garantia do indivíduo no
tocante ao exercício da jurisdição”. Logo, não passa de uma aplicação ou
característica do Princípio da Legalidade.

4. Porque existe Poder Judiciário ?


Qual a finalidade do “Direito”? Ensina o mestre Barbosa
Moreira que a humanidade necessita convivência pacífica para
continuidade e progresso: “Desde que o Estado proibiu a justiça de mão própria e
chamou a si, com exclusividade, a tarefa de assegurar o império da ordem jurídica, assumiu
para com todos e para cada um de nós o grave compromisso de tornar realidade a disciplina
das relações intersubjetivas previstas nas normas por ele mesmo editadas.”44 Carlos
Silveira Noronha ampliou a mirada de Niceto Alcalá-Zamora y
Castillo45 - o Estado tem o dever de prestar jurisdição porque veda a
autotutela: 46

41
Op. cit.
42
A permanência de Liebman no Brasil, fugindo das atrocidades raciais da II Guerra Mundial,
ensejou profícuos estudos, em São Paulo, originando o mais moderno processo civil do II Milênio.
Niceto Alcalá-Zamora y Castillo carinhosamente apelidou de “Escola Paulista de Direito”, integrada
não só pelos paulistas, como Alfredo Buzaid, Luis Eulálio Bueno de Vidigal, Arruda Alvim, entre tantos
outros. Processualistas de todo Brasil deslocavam-se até São Paulo para abeberar-se na sabedoria do
Gran-Mestre Italiano: Castro Meira, de Pernambuco; Calmon de Passos, da Bahia; Celso Neves, do Rio
de Janeiro; Edson Prata, de Minas Gerais, carregado o “menino” Humberto Theodoro Jr.; Egaz Moniz de
Aragão, do Paraná; Galeno Lacerda, de Porto Alegre e Alcides de Mendonça Lima, de Pelotas, no Rio
Grande do Sul.
43
BUZAID, Alfredo, “Exposição de Motivos do Código de Processo Civil”, colhido no CPC, 10ª
ed, São Paulo: Ed. Saraiva, 2004, p. 2. (grifamos)
44
BARBOSA MOREIRA, José Carlos. “Tutela sancionatória e tutela preventiva.” Temas de
direito processual. 2ª série. São Paulo. Saraiva, 1980. p. 21.
45
Niceto Alcalá-Zamora y Castillo, Proceso, Autocomposición y Autodefensa, p.13, México, 1970.
46
José Eduardo Carreira Alvim (Teoria Geral do Processo, Forense), registra que Niceto
Alcalá-Zamora y Castillo terminou admitindo que autotutela era um vocábulo melhor que
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 46

"Esta forma de resolver as contendas [autotutela]... apresentava graves


inconvenientes... não só porque se atribuía ao credor a função de árbitro do
seu próprio ou pretenso direito, que o julgava em causa própria, com sua
consciência obliterada pela emoção do interesse próprio ou em face da
recusa do obrigado, mas também porque conduzia o interessado a expor-se a
excessos, no caso de resistência justa ou injusta do devedor... com emprego
da força... Ora, tal situação, que ensejava uma solução egoística,
unilateral e parcializada do litígio poderia desordenar a
sociedade, lançando sobre seus membros a insegurança, a desconfiança, a
perplexidade quanto à efetiva realização dos seus direitos, diante da ameaça
da decisão injusta..."47

A sociedade assume o ônus de resolver as questões para


restabelecer convivência pacífica quando há conflito de interesses
como contraprestação à proibir o exercício das próprias razões48. O
crescimento das sociedades49 cada vez mais complexas provocou o

autodefesa para definir a satisfação pelo exercício das próprias razões. Contudo, querendo
justificar a manutenção do título de sua obra, já clássica, “Proceso, Autocomposición y
Autodefensa”, alegou preocupação com o emprego do vocábulo autotutela. Diz temer que esse
instituto de direito processual pudesse ser confundido com uma situação, de direito material, na
qual o indivíduo, prevendo a possibilidade de vir a ser interditado, indicasse de antemão o seu
tutor. Isso até poderia ser chamado de autotutela, não fosse juridicamente impossível: Quem está
em vias de ser interditado não tem capacidade jurídica para indicar o seu tutor. Essa é uma
piada pronta, da vida real, e ilustra a via crucis da encenação jurisdicional:
http://www.espacovital.com.br/noticia-25300-encenacao-jurisdicional-artigo-luiz-roberto-nues-
padilla/
47
Carlos Silveira Noronha, Sentença, perfil histórico-dogmático, RT, 1995, p.12. Mestre e Doutor
pela USP, em 12-7-95, banca composta por Ada Pellegrini Grinover, Carlos Barbosa Moreira e Adroaldo
Furtado Fabrício aprovaram-no e ao Professor Carlos Alberto Álvaro de Oliveira, no Concurso Público
de Professor Titular em Processo Civil. No ano seguinte, também na UFRGS, foi aprovado no concurso
para Professor Titular de Direito Civil. Professor dos Cursos de Graduação em Direito, Mestrado e
Doutorado, da UFRGS, recordamos com emoção suas aulas de TGP, na década de setenta. Seus colegas
o consideram um vivo repositório da ciência jurídica. Diz a lenda que, na eminência de entrar em vigor o
Código Civil, um colega questionou o Prof. Manuel André da Rocha sobre a necessidade de adquirir
novos Códigos. Com seu característico bom humor, questionou: “Para que, se temos o Professor
Noronha, que é o Código personificado?” Na lição de Pontes de Miranda e Clóvis do Couto e Silva, um
raro jurista completo, com titulação em direito material e processual: www.padilla.adv.br/ufrgs/clovis
48
Exercício arbitrário das próprias razões é punido no art. 345 do Código Penal – “Fazer justiça
pelas próprias mãos, para satisfazer pretensão, embora legítima, salvo quando a lei o permite: Pena -
detenção, de 15 (quinze) dias a 1 (um) mês, ou multa, além da pena correspondente à violência.
Parágrafo único - Se não há emprego de violência, somente se procede mediante queixa.”
49
Durante muito tempo o incremento da quantidade de habitantes foi superior ao crescimento
econômico. A disparidade entre oferta e a procura, com interesses mais amplos do que a possibilidade de
os atender, desencadeia os conflitos pela posse desses bens limitados. O Judiciário existe para a solução
pacífica dos litígios. Até o Séc. XIX, o cumprimento espontâneo das obrigações era a regra. Em 1868,
Oskar Von Bullow apresentou o processo como uma relação jurídica distinta da de direito material,
provocando o “nascimento” da nova ciência – o direito processual. Seguiram-lhe outros estudos,
aprofundando o conhecimento. Paralelamente, as condições econômicas e as relações sociais
modificaram-se afetando a moral (cf. www.padilla.adv.br/etica/) com o crescimento da quantidade de
demandas cuja proliferação aumentava o interesse pela ciência processual. Em meados do Séc. XX o
processo contava com muitos pensadores concebendo teses. Dentre eles, Carnellutti (Sistema di diritto
Página 47 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

desenvolvimento de um novo ramo na ciência, o Direito, cujo objeto é


a elaboração e aplicação de regras para o convívio social 50.

A existência d’um conjunto de centenas de milhares de


regras51 não garante a paz social. A regulamentação52 é deficiente, ou
por falta, há situações incompletamente reguladas; ou por excesso,
havendo mais de uma regra incidindo numa situação. Há
divergências dos envolvidos na interpretação53, controvérsias, que
desestabilizam a sociedade. Para por fim aos conflitos o Estado
oferece a jurisdição. Os doutrinadores discutem - na qualificação da
jurisdição, se é um poder, um dever, ou um poder-dever54, etc. Pouco

precessuali civile, 1936) propôs conceituar jurisdição como atividade estatal que soluciona a “lide”,
situação na qual há uma pretensão resistida. Aprofundemos esse e outros conceitos ao conceituar
Jurisdição.
50
Entenda como acontece o processo de aquisição e ampliação do conhecimento em
www.padilla.adv.br/mistico/sabedoria/
51
Apenas na esfera federal havia mais de 100.000 diplomas legais - leis, decretos, regulamentos -
em vigor no ano de 1990 quando uma Comissão foi incumbida de estudar medidas para reduzir
quantidade. Ao cabo de muitos meses – em meados da década de noventa, haviam revogado mais de dez
mil diplomas legais. Contudo, naquele mesmo período foram editados, entre Leis, novas Medidas
Provisórias, e Decretos, quase três mil documentos, de maneira que, ainda somente na esfera federal,
restaram 93.000 diplomas legais. Mas isso foi há uma década e meia e, desde então, foram editadas mais
Leis, Medidas Provisórias, Decretos, etc., de maneira que já passamos dos seis dígitos (100.000). Mas
devemos lembrar que, em cada ponto do país, além das regras da legislação federal, incidem as de um
conjunto formado pelas legislações estaduais e municipais, que varia conforme o município. Numa
Capital, especialmente dos maiores Estados, a legislação é complexa, e poderemos estar diante de
qualquer coisa como 150.000 diplomas legais em vigor, hoje, no local onde lê este trabalho. Isto
demonstra o quão emaranhado e intrincado é o mecanismo. As regras deveriam facilitar a vida da
sociedade. Mas a proliferação aprisiona o cidadão: Para os amigos, as benesses da Lei. Para os inimigos,
os rigores. Há tantas Leis que é possível buscar texto moldável ao interesse do aplicador. Confira a
Teoria Crítica do Direito aplicada nos julgamentos em www.padilla.adv.br/teses/normas
52
Até porque a sociedade está em constante evolução sendo praticamente impossível prever todos
tipos de problemas que poderão ocorrer. Utópico pretender editar regras prévias, tudo solucionar. Veja o
caso das “barrigas de aluguel” para gestação de bebês que surgiu, na medicina, na década de noventa,
muito antes do que os sistemas jurídicos, mesmo os mais modernos, estivessem preparados para lidar
com os problemas. A situação era tão nova que não havia regra, nem analogia, ou costumes e a situação
teve de ser solucionada por princípios: Art. 4º - Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo
com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito.
53
Não raro a divergência existe apenas no papel. O Desembargador Alexandre Mussoi Moreira, há
duas décadas, enquanto procurador do Estado, no Congresso Estadual da categoria, manifestou crítica ao
abuso de direito exercitado por réus em executivos fiscais que, interessados na demora, usavam
argumentos de discutível razoabilidade, não raro ultrapassando (impunemente) a fronteira da má-fé,
somente para ganhar tempo. “O papel aceita tudo.” O tema litigância de má-fé foi tratado no início, e já
se demonstrou que a falta de aplicação do Princípio da Lealdade é a principal causa da sobrecarga de
processos.
54
Para um conceito de Jurisdição, verifique no capítulo específico, desenvolvendo idéias de
“Chiovenda, Jurisdição Voluntária e Processo Penal”, divulgado no Congresso Nacional de Direito
Processual, em Brasília, de 19-22/06/1995; in Revista de Processo, RT, v.81, jan-mar/1996, p.233-239;
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 48

importa: Impossível a sociedade sem atividade jurisdicional para


apaziguar os ânimos. Nesse sentido, é um dever do Estado suprir a
necessidade de tranqüilidade, sob pena de desintegração.

Por isto a Constituição assinala entre os “Direitos e Garantias


Fundamentais” que... “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário
lesão ou ameaça a direito” art. 5º inc. XXXV. Nem mesmo as leis podem
impedir o Judiciário de examinar lesões ou ameaças a direitos. E a justiça
deve ser célere: LXXVIII - a todos, no âmbito judicial e administrativo, são
assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a
celeridade de sua tramitação (EC nº 45/2004).

A atividade jurisdicional é essencial à vida em sociedade.


Constitui um ramo de conhecimento complexo. Um engenheiro pode
especializar-se em parafusos e conhecer apenas o que se relaciona
com sua especialidade. Saber “tudo” sobre porcas e parafusos, será
muito útil à sociedade. Um contador pode se especializar em fusões de
empresas, e saber “tudo” sobre isso, e ser muito útil às pessoas que o
procuram. Um advogado pode limitar-se a praticar uma determina
atividade. Um jurista, contudo, necessita conhecer o sistema, ter uma
noção desse conjunto de regras que pretendem harmonizar o
funcionamento da sociedade. Não é possível ser meio jurista. 55

5. História do processo no Brasil

Em 1822, quando declarada a independência do Brasil, o


processo civil era regulado pelo “Livro III” das “Ordenações
Filipinas” – fusão em 1605 de duas Leis de D.João III (5-7-1526 e 18-11-
1577). No ano seguinte à Declaração de Independência, em 20-10-
1823, foi editada uma Lei para “manter em vigor toda legislação portuguesa - até
que fosse editada a nacional”, desnecessária porque, pelo princípio da

Trabalho e Processo [Revista Trabalho e Doutrina], Saraiva v.7, dez/1995, p. 132-139


www.padilla.adv.br/teses/jurisdicao.htm
55
Veja www.padilla.adv.br/prof e www.padilla.adv.br/mistico/sabedoria.htm
Página 49 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

absorção, o novo direito constitucional recepciona o direito em vigor


compatível... Foram editados: Código Criminal do Império (1830), o
Código de Processo Criminal (1832) e o Código Comercial (1850). Em
25-11-1850, cinco meses após entrada em vigor deste último - aliás,
que continuou em vigor até o século XXI, foi promulgado o
Regulamento 737, disciplinando o Processo Comercial. O Processo
Civil persistiu regulado nas antigas Ordenações de 1605, acrescidas
de diversas leis extravagantes, alvarás, artigos de sisa, ordens da
fazenda, assentos e cartas régias, consolidados em Resolução Imperial
de 28-12-1876 conhecida como “Consolidação Ribas”, alusão ao
Conselheiro Imperial e Professor do Largo de São Francisco.

Proclamada a República, era necessário romper laços com a


colonização portuguesa. Adotando a forma Federativa, a Constituição
atribui a cada província, hoje Estados, editar uma legislação
processual própria, o que permitiria adequar a lei às peculiaridades
regionais. Contudo, passou-se um lustro até surgir o primeiro
Código de Processo Civil estadual, no Rio Grande do Sul, na virada
do século XIX. Seguiram-se os da Bahia (1915), Minas Gerais (1916), Rio
de Janeiro (1919), Pernambuco (1924) e, por fim, São Paulo, em 1930 -
quando Getúlio Vargas retomou o modelo do estado unitário, de
legislação centralizada. 56 Em 10-2-1930, Decreto nº 19.694 criou
Comissão para revisão legislativa uniforme. E a Constituição Federal
editada a seguir determinou que a legislação processual civil fosse
unificada com um surreal prazo de 3 meses para ultimar o Projeto do
CPC (art.11 + §2º das Disposições Transitórias). A parte geral do CPC foi publicada
do Diário Oficial de 9-12-1932; Contudo, o CPC só foi editado em 18-9-
1939, pondo fim aos Códigos Processuais dos Estados.

Entre a Proclamação da República e o Código de 1939


transcorreu meio século durante o qual a ordem constitucional vigente e as

56
Confira www.padilla.adv.br/prof/getulio
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 50

normas processuais estavam em conflito: Quando a Carta Magna afirmava


necessidade de legislações distintas em cada região, todas províncias
utilizavam lei idêntica, as Ordenações. Depois, quando ultimada a
regulamentação diferenciada em cada Província, aplicavam-se leis
processuais diferentes em cada região, embora a nova ordem constitucional
exigisse legislação unificada para todo o país. O sistema de Processo Civil
só se harmoniza do o mandando constitucional após a Segunda Guerra,
quando nasce a “Escola Paulista de Direito” a que carinhosamente aludiu
Niceto Alcalá-Zamora y Castillo, referindo-se à influência de Liebman que,
no Largo de São Francisco, reunia os luminares da cultura jurídica de
todos locais, como Galeno Lacerda e Alcides de Mendonça Lima que subiam
1000km desde o Rio Grande do Sul; Edson Gonçalves Prata que descia
outro tanto desde o Triângulo Mineiro.

6. Como afastar a confusão nos princípios?

Até o final do Século XIX o processo ocupava uma posição


diferente na sociedade. A sociedade discriminava os inadimplentes.
Ninguém ficava à vontade “devendo”. Havia o cumprimento espontâneo das
obrigações. O processo era “adjetivo” porque, salvo raras exceções, havia,
entre as partes, divergência quanto à interpretação do direito. Autor e réu
queriam decisão, ansiosos para prevalecer o seu ponto de vista, e
colaboravam para a finalização do litígio. Ganhou status de ramo autônomo
após sua principiologia começar a ser apontada por Oskar Von Büllow57.
Toda ciência possui proposições básicas, alicerces fundamentais que
condicionam as estruturas subseqüentes58. Querendo comprovar a
autonomia do direito processual os processualistas apressaram-se em
esboçar muitos princípios fundamentais do processo. Este, estava em
modificação, acompanhando à sociedade. Resultou num conjunto de
centenas de microvisões diferentes do mesmo fenômeno. Para ilustrar essa
multiplicidade de visões, partimos do pensamento de Humberto Theodoro

57
Em 1868 Oskar Von Büllow aponta a importância de estudar a relação processual. Confira a
tradução espanhola de 1964 “Excepiciones processales y presupostos procesales”, ou o original em
alemão, ambos disponíveis na Biblioteca da UFRGS.
58
CRETELLA JUNIOR, José. Tratado de direito administrativo. Rio de Janeiro: Forense. 1972.
v.10.
Página 51 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

Júnior, na Revista da Ajuris, apontado como “Princípios Gerais do Direito


Processual Civil”:
1- Princípio do devido processo legal;
2- Princípio inquisitivo;
3- Princípio dispositivo;
4- Princípio do contraditório;
5- Princípio da recorribilidade e do duplo grau de jurisdição;
6- Princípio da boa-fé e da lealdade processual;
7- Princípio da verdade real;
8- Princípio da oralidade;
9- Princípio da publicidade;
10- Princípio da economia processual;
11- Princípio da eventualidade ou da preclusão;

Fernando da Costa Tourinho Filho, no “Processo Penal”, 20ª


ed., São Paulo, Saraiva, 1998, elenca como princípios gerais do direito
processual penal:
1- Princípio da verdade real;
2- Princípio da imparcialidade do juiz;
3- Princípio da igualdade das partes;
4- Princípio da persuação racional ou do livre convencimento;
5- Princípio da publicidade;
6- Princípio do contraditório;
7- Princípio da iniciativa das partes;
8- Princípio do ne est judex ultra petita partium;
9- Princípio da identidade física do juiz;
10- Princípio do devido processo legal;
11- Princípio da inadmissibilidade das provas obtidas por meios ilícitos;
12- Princípio da inocência;
13- Princípio do duplo grau de jurisdição;
14- Princípio do favor rei.

Júlio Fabbrini Mirabete, em “Processo Penal”, 13ª ed., São


Paulo, Atlas, 2002, apresenta algumas diferenças:
1- Princípio do estado de inocência;
2- Princípio do contraditório;
3- Princípio da verdade real;
4- Princípio da oralidade;
5- Princípio da publicidade;
6- Princípio da obrigatoriedade;
7- Princípio da oficialidade;
8- Princípio da indisponibilidade do processo;
9- Princípio do juiz natural;
10- Princípio da iniciativa da parte e do impulso oficial;

Na rápida comparação acima, percebemos que alguns


princípios são comuns ao PROCESSO CIVIL e PENAL:
1- Princípio do devido processo legal;
2- Princípio do contraditório;
3- Princípio a recorribilidade e do duplo grau de jurisdição;
4- Princípio da publicidade;
5- Princípio da imparcialidade do juiz;
6- Princípio da persuasão racional ou do livre convencimento

Contudo, há princípios distintos nos dois ramos:


1- Princípio do estado de inocência;
2- Princípio da verdade real;
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 52

3- Princípio do favor rei.


Por que diferem? Devido às peculiaridades do objeto do
processo. Todos, são ramos do direito público. Ao Estado cabe a solução
dos litígios, sejam privados ou penais. A divergência ocorre pela presença
de direito indisponível. A tradição escolástica do Direito Penal define os
princípios do sistema de garantias (SG) a partir de dez máximas:
Nulla poena sine crimine
Nullum crimen sine lege
Nulla lex (poenalis) sine necessitate
Nulla necessita sine iniuria
Nulla iniuria sine actione
Nulla actio sine culpa
Nulla culpa sine iudicio
Nullum iudicium sine accusatione
Nulla accusatio sine probatione
Nulla probatio sine defensione

O Processo Civil, primeiro a sistematizar os institutos, foi


adotado como modelo: CPP Código de Processo Penal, art.3º. A lei processual penal
admitirá interpretação extensiva e aplicação analógica, bem como o suplemento dos
princípios gerais de direito. CLT Consolidação das Leis do Trabalho Art. 769. Nos casos
omissos, o direito processual comum será fonte subsidiária do direito processual do trabalho,
exceto naquilo em que for incompatível com as normas deste Título.

Na distinção entre o direito material e o direito processual e o


campo do fato delituoso, Humberto Theodoro Júnior aponta como marca da
jurisdição a secundariedade. O indivíduo tem o dever cumprir as normas:
Se pediu um empréstimo, pague. Se alugou um imóvel, quite o locativo. Se
um bem é de outrem, respeite a propriedade. Regras básicas da vida que, se
desrespeitadas, podem sujeitar o infrator à atuação do Estado.
Secundariedade está em que, se o cidadão não cumprir espontaneamente a
obrigação, a jurisdição pode executar uma atividade coercitiva para que o
dever seja cumprido (ação mandamental), ou para sujeitar o infrator aos
efeitos do desrespeito às normas (ações condenatórias, declaratórias e
constitutivas).

Para intervir num litígio, o Estado depende da provocação do


titular; porque este pode renunciar à pretensão, que, por isto, denomina-se
de direito disponível. O Estado atua mediante provocação, porque uma
situação pode se resolver de várias formas: Os envolvidos podem conciliar
seus interesses, mediante concessões recíprocas, em transação direta ou
intermediada.
Diferente é a relação de direito indisponível. Nesta, há um valor
mais amplo do que o diretamente prejudicado. Embora a vítima de um
crime tenha direito à reparação, há um interesse maior, de toda a
Página 53 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

comunidade, de que aquele tipo de conduta não aconteça. Assim, o Estado


pode intervir para impor o respeito às normas porque o interesse decorre da
lei que disciplinou aquele como um direito indisponível. Como registra o
professor Salo de Carvalho, onze categorias identificam a principiologia
básica da dogmática penal 59 conjugando o direito penal60 e direito
processual penal61: pena, delito, lei, necessidade, ofensa, conduta,
culpabilidade, juízo, acusação, prova e defesa. Excetuando a pena, todas
demais seriam pré-requisitos para determinar a responsabilidade penal e
aplicar sanção.

7. Do Princípio Dispositivo:
Que tal comparar duas situações com semelhantes
componentes: Uma considerável quantia em dinheiro subtraída com dolo, o
remorso, o reconhecimento da infração praticada, a confissão e a intenção
de devolução. Procure, nas duas situações abaixo, o que as difere:

1ª hipótese.Um comerciante de prestígio, por questões de


saúde, decide mudar de país. Oculta esse fato e, em alguns dias, valendo-se
de seu bom conceito na praça. Facilmente obtêm, de diversas pessoas,
empréstimos pessoais, os quais somam uma quantia vultosa. Antes do
vencimento dos mútuos, desaparece, sem deixar endereço. Os credores
tentam localizá-lo, sem sucesso.

2ª hipótese. Outro comerciante, aproveitando uma


situação, furta quantia tão vultosa quanto a da hipótese anterior. Aberto
inquérito policial, o infrator não é identificado.

Muitos anos depois, tomados de remorso, os infratores decidem


voltar as suas cidades. Ambos confessam seus atos, e o dolo.

No primeiro caso, pode pagar toda a dívida, embora prescrita, e


ressarcir todos os prejuízos. O pagamento é válido, e não pode ser repetido

59
O conjunto de princípios é instrumento para avaliar a legitimidade da intervenção penal, desde a
elaboração da lei penal até a aplicação da pena, integrando o direito penal e o direito processual penal. Os
princípios incorporados pela Constituição servem “(...) para explicar e avaliar os diversos sistemas
penais concretos, considerados, tanto na dimensão normativa como na de sua funcionabilidade, e por
isso, capaz de verificar seus níveis de irracionalidade, de injustiça e de inconstitucionalidade” Ferrajoli,
Diritto e Ragione: Teoria del Garantismo Penale, p. 73, apud Salo de Carvalho
http://teoriadapena.blogspot.com/
60
Princípios do Direito Penal: Teoria da Lei Penal (princípio da legalidade, princípio da
necessidade e princípio da lesividade); Teoria do Delito (princípio da materialidade e princípio da
culpabilidade); Teoria da Pena (princípio da retribuição jurídica) Salo de Carvalho op. et loc cit.
61
Princípios do Processo Penal: Teoria da Ação (princípio acusatório ou da inércia da jurisdição);
Teoria da Jurisdição (princípio da jurisdicionalidade); Teoria do Processo (princípio da verificabilidade
probatória e princípio da ampla defesa) Salo de Carvalho op. et loc cit.
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 54

(art.882 CCB). Aliás, se algum credor recusar, pode consignar em


pagamento62

Inversa é a situação do segundo caso. Embora confessando à


polícia ter sido o autor do crime, o estado não pode promover a ação penal,
porque prescreveu a pretensão punitiva (art.109 CP). No Direito Penal, vige
o princípio nulla poena & nulla culpa sine iudicio. Ainda que aceite ser punido pela
conduta, independente de processo, não há como impor sanção penal ao
infrator. Nada adianta apresentar-se, pedir para ser condenado, porque
pena alguma foi ou poderá ser imposta.

Alguns autores chamam esta característica de Princípio


Dispositivo, e muitos o consideram conseqüência do Devido Processo Legal
da Constituição Federal, art.5º, inc.LV. Está concretizado nos arts. 2º, 262,
282-VII, 284 e 295 do CPC, num sistema de regras exigindo pedido,
inclusive o de citação. Observa como as regras fecham a questão:
CPC Art. 2º - Nenhum juiz prestará a tutela jurisdicional senão quando a parte ou o interessado
a requerer, nos casos e forma legais.
CPC Art. 262 - O processo civil começa por iniciativa da parte, mas se desenvolve por impulso
oficial.
CPC Art. 282 - A petição inicial indicará: (...omissis...) VII - o requerimento para a citação do
réu.
CPC Art. 284 - Verificando o juiz que a petição inicial não preenche os requisitos exigidos nos
arts. 282 e 283, ou que apresenta defeitos e irregularidades capazes de dificultar o julgamento de
mérito, determinará que o autor a emende, ou a complete, no prazo de 10 (dez) dias.
Parágrafo único - Se o autor não cumprir a diligência, o juiz indeferirá a petição inicial.
(grifamos)
CPC Art. 46 - Duas ou mais pessoas podem litigar, no mesmo processo, em conjunto, ativa ou
passivamente, quando:
I - entre elas houver comunhão de direitos ou de obrigações relativamente à lide;
II - os direitos ou as obrigações derivarem do mesmo fundamento de fato ou de direito;
III - entre as causas houver conexão pelo objeto ou pela causa de pedir;
IV - ocorrer afinidade de questões por um ponto comum de fato ou de direito.
CPC Art. 47 - Há litisconsórcio necessário, quando, por disposição de lei ou pela natureza da
relação jurídica, o juiz tiver de decidir a lide de modo uniforme para todas as partes; caso em que a
eficácia da sentença dependerá da citação de todos os litisconsortes no processo.
Parágrafo único - O juiz ordenará ao autor que promova a citação de todos os litisconsortes
necessários, dentro do prazo que assinar, sob pena de declarar extinto o processo.
CPC Art. 295 - A petição inicial será indeferida:
I - quando for inepta;
II - quando a parte for manifestamente ilegítima;
III - quando o autor carecer de interesse processual;
IV - quando o juiz verificar, desde logo, a decadência ou a prescrição (art. 219, § 5º);
V - quando o tipo de procedimento, escolhido pelo autor, não corresponder à natureza da
causa, ou ao valor da ação; caso em que só não será indeferida, se puder adaptar-se ao tipo de
procedimento legal;
Vl - quando não atendidas as prescrições dos arts. 39, parágrafo único, primeira parte, e 284.
Parágrafo único - Considera-se inepta a petição inicial quando:

62
CCB Art. 335. A consignação tem lugar: I - se o credor não puder, ou, sem justa causa, recusar
receber o pagamento, ou dar quitação na devida forma; II - se o credor não for, nem mandar receber a
coisa no lugar, tempo e condição devidos; III - se o credor for incapaz de receber, for desconhecido,
declarado ausente, ou residir em lugar incerto ou de acesso perigoso ou difícil; IV - se ocorrer dúvida
sobre quem deva legitimamente receber o objeto do pagamento;
Página 55 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

I - Ihe faltar pedido ou causa de pedir;


II - da narração dos fatos não decorrer logicamente a conclusão;
III - o pedido for juridicamente impossível;
IV - contiver pedidos incompatíveis entre si.

As regras concretizam o princípio dispositivo no funcionamento


do processo civil. Contudo, essas regras podem deixar de ser aplicadas
quando um princípio informa um valor maior. Nos processos que tratam de
direitos disponíveis, o ônus de provar é das partes. Contudo, em algumas
situações é possível que o ônus da prova seja invertido63, ou até mesmo que
o juiz assuma a prova.64 Sempre que isto acontecer, é porque outro

63
A inversão do ônus da prova é aplicada, desde meados do séc.XX, no processo do trabalho
brasileira, em razão do “princípio Tutelar” que ensejou a máxima, in dúbio pro misero – isto é, o
empregado autor é hipossuficiente em termos probatórios. Aproveitando essa experiência, foi inserida
regra expressa, para inversão do ônus da prova nas ações do consumidor. Conforme demonstrou Elaine
Harzheim Macedo, na Revista da Ajuris 112/69-85, a inversão do ônus da prova, contra o fornecedor de
bens e serviços, pela Lei, deve ocorrer sempre que presente a hipossuficiência do consumidor, ou a
verossimilhança da alegação. Ora, é público e notório que os consumidores tem sido lesados e, contudo,
não se vislumbra a efetividade das regras legais. Tudo começa no início dos anos noventa quando as
grandes companhias, prevendo que o novo CDC poderia revolucionar as relações de consumo, passaram
a investir em lobistas encarregados de disseminar crenças como a de que INDENIZAÇÕES e
HONORÁRIOS de bom valor - além de poderem ser vistos como um relativo enriquecimento de quem
os aufere, seria um estímulo ao ajuizamento de ações. “Isso poderia levar o Judiciário a uma sobrecarga
de processos, e dificultar o seu bom funcionamento.” As empresas, que visavam o lucro, mentiram, e
teve muita gente bem intencionada que acreditou. Não é a toa, portanto, que a sabedoria popular refere
ao inferno como um local repleto de boas intenções... Aconteceu o que? INDENIZAÇÕES e
HONORÁRIOS fixados em pequeno valor tornaram muito lucrativo o desrespeito à lei e a violação dos
direitos dos consumidores. O desejo de lucro e as pequenas condenações impostas quando os
consumidores demandam gerou um estímulo à desobediência civil. Os poderosos não cumprem a lei.
Quando os prejudicados demandam, a condenação é pequena, e também os honorários, de forma que
cada vez houve mais e mais desobediência civil. A inadimplência civil cresce, e os poderosos não
respeitam a legislação, confiantes na impunidade. Os consumidores e cidadãos, isolados, são fracos,
frágeis. A condenação inexpressiva produz o mesmo efeito da absolvição para quem quer lucrar, porque
a indenização a que são condenados é inferior ao que ganhou violando a ordem jurídica. Desestimulados
pela dificuldade em condenar os infratores da lei, e pelas condenações pífias e trabalhosas, muitos
lesados não ajuízam demandas porque – se pretendem reparação financeira, é perda de tempo investir
num litígio onde o benefício será pouco, ou nenhum; os custos de propor e manter um processo supera o
valor obtido em considerável parte das condenações. Alguns, confiantes de que a Justiça, um dia,
prevalecerá, ajuízam. São milhões de desobediências à lei por dia, só numa grande Capital. Mesmo que
apenas um pequeno percentual dos lesados ajuíze, serão muitas as demandas propostas todo dia... Para
reverter essa situação basta resgatar o efetivo papel do Judiciário, de produzir a paz social, penalizando
quem desrespeita a Lei, estimularão a conduta lícita. É necessário indenizar plenamente quem é
prejudicado. Ao contrário do que os lobistas dos poderosos mentem, há quase duas décadas, as
indenizações cabais e os honorários dignos reduzirão o volume de processos porque sé se acreditarem
que poderá custar caro um processo as corporações cumprirão a lei e suas obrigações de fornecedores.
Assim, a obediência civil exige que os juízes arbitrem `honorários e condenações adequadas.
64
Sobre o juiz assumir a busca da verdade, examine nosso trabalho, “Da inspeção judicial”,
originalmente publicado na Adv Advocacia Dinâmica COAD, Boletim Informativo Semanal nº 31/91, 4
de agosto de 1991, p.325-323, depois publicado com o fluxograma, no Jornal do Comércio, Porto Alegre,
11 de março de 1995, nº 18, ano 64, capa do suplemento semanal Jornal da Lei; e também, na íntegra,
em www.padilla.adv.br/teses
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 56

princípio foi aplicado, o que nos leva à necessidade de saber distinguir uma
simples regra de um princípio.

8. Como distinguir um princípio de uma regra?

O direito é um sistema, concebido como sendo um conjunto


de princípios e normas com finalidade básica reger a sociedade e
organizar o Estado. Princípio Jurídico é o que: a) constitui mandamento
nuclear de um sistema;65 b) irradia sobre normas norteando sua elaboração
e interpretação; c) positivado, transforma-se em norma-princípio 66. Violar
um princípio é mais grave do que desrespeitar uma norma. Num caso
concreto, conflito entre princípios resolve-se por meio de exceções de
aplicação, não havendo gradação, revogação ou hierarquização, apenas a
exigência de uma decisão justa no caso concreto67. O conflito de princípios
é questão hermenêutica: Interpretação como atribuição de sentido68 -
aplicação do direito para realizar Justiça, como ensinaram os filósofos
gregos, precursores do direito moderno69 presente na clássica obra de
Carlos Maximiliano777000. O objetivo do direito é alcançar o bem comum, uma
sociedade justa, com objetivo de reduzir as desigualdades sociais. Um
princípio é instituto jurídico que ocupa hierarquia máxima em
hermenêutica situando-se no ápice do sistema jurídico71. Incide no plano
real, e atinge concretude na sentença. Os "Princípios constitucionais
fundamentais" assumiram importância enorme, no Brasil, e no mundo. Um
“Princípio” não necessita estar formulado positivamente para existir como

65
MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Elementos de direito administrativo. 2. ed. São Paulo: RT,
1991. p. 299.
66
Registra Jorge Miranda (MIRANDA, Jorge. “Manual de Direito Constitucional”. 3ª ed.
Coimbra: Coimbra, 1996, p.237.) que “tudo quanto resulte do Poder Constituinte - seja preâmbulo,
sejam preceitos constitucionais - e conste da Constituição em sentido instrumental, TUDO É
CONSTITUIÇÃO EM SENTIDO FORMAL”. Carlos Antonio de Almeida Neto lembra que o
preâmbulo constitucional introduzindo e instituindo a Carta Magna diz-se “...destinado a assegurar o
exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, desenvolvimento, a
igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade....”
67
DWORKIN, 1999, p.321
68
GALUPPO, Marcelo Campos. 1999, p. p. 208 apud Almeida Melo op. et. loc. Cit.
69
www.padilla.adv.br/mistico/platao
70
MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do direito.
71
Há princípios jurídicos que, não sendo normas, não são capazes de aplicação imediata e, antes,
devem ser normativamente consolidados ou normativizados - CANARIS, Claus-Wihelm. Pensamento
sistemático e conceito de sistema na ciência do direito. Tradução de A Menezes Cordeiro. Lisboa:
Fundação Calouste Gulbenkian, 1989. p. 96.
Página 57 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

categoria jurídica e impor-se como cúspide da ordem jurídica72. Contudo,


qual a estrutura de um princípio? Como distingui-lo de uma regra ? Existe
hierarquia entre os princípios?73

Princípios e regras são espécies de normas74. Ambos expressam


algo que deve ser75. Encontramos três correntes da metodologia jurídica
com relação aos princípios76:

Uma corrente afirma serem os princípios “normas gerais ou


generalíssimas de um sistema” - o que nem sempre é verdadeiro: Apesar de
dotados de maior grau de generalização, os princípios não são formados por
um processo de abstração crescente77. Observe os princípios que não
constituem generalização de algo: “O princípio federativo adotado pela Constituição
brasileira, seria uma generalização de quê? O princípio da legalidade generaliza quais

72
FIGUEIREDO MOREIRA NETO, Diogo de. Tese apresentada em 1998 em Congresso da Anape,
Associação Nacional dos Procuradores de Estado. Acesse às teses em www.padilla.adv.br/anape
73
Humberto Bergmann Ávila, em conferência na “Semana da Saúde e da Qualidade” do TFR-
4ªR Tribunal Regional Federal da 4ª Região, dia 17/5/2005, desenvolveu os aspectos que tratou na obra,
Teoria dos princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos (3ª ed. São Paulo, Malheiros,
2004). Para o Conferencista, a distinção entre princípios e regras envolve duas grandes correntes de
pensamento. Uma, mais antiga, considera que os dois tipos de regramentos seriam determinados por
normas gerais e abstratas. "A distinção seria de grau". Os princípios teriam grau de generalidade e
abstração maior, enquanto as regras teriam esse grau nulo ou muito pequeno. Outra doutrina passou a
entender que a distinção se daria pelo modo de aplicação e também pela forma como o intérprete pondera
entre as regras e os princípios. “Ambas distinções, a mais fraca e a mais forte, mantêm a capacidade
interpretativa dos operadores do Direito". Os princípios determinam um estado de coisas sem dizer
como alcançá-lo enquanto as regras são normas que descrevem determinado comportamento, mas não
são auto-aplicáveis. O conflito entre os dois tipos é um tema novo na doutrina. Uma regra constitucional
prevalece em relação a um princípio infraconstitucional, e vice-versa. "Mas e quando a regra e o
princípio têm a mesma hierarquia ...somos levados a crer que os princípios devem prevalecer. Mas será
uma interpretação correta?" A regra deve recuperar a dignidade, porque tem a função de solucionar
conflitos, uma eficácia definida e a pretensão de resolver um problema. Exemplo uma regra de trânsito:
“se, ao invés da placa indicando a velocidade máxima na rodovia houvesse indicação de um princípio,
de obedecer a velocidade que permita ao motorista o controle sobre o veículo, no momento atual
provocaria confusão". Os princípios estabelecem determinados valores que "devem entrar em cena", com
caráter contributivo. Há hierarquia entre os princípios. Contudo, considera não ser absoluta, porque nossa
Constituição teria estabelecido princípios fundamentais com hierarquia relativa. Confira Humberto
ÁVILA, “Teoria dos princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos” 3ª ed. São Paulo:
Malheiros, 2004.
74
BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional. 20. ed. São Paulo: Saraiva, 1999.
www.padilla.adv.br/teses/normas
75
ALEXY, Robert. Sistema jurídico, princípios jurídicos y razón practica. México: Fontamara,
1993. _______. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estúdios Constitucionales,
1993.
76
GALUPPO, 1999, p. 143-191, citado por Carlos Antonio de Almeida Melo, “O Preâmbulo da
Constituição e os princípios jurídicos” in Revista de Informação Legislativa, Brasília a. 39 n. 154
abr/jun. 2002. p. 244 a 257.
77
GALUPPO, Marcelo Campos. Os princípios jurídicos no Estado democrático do direito: ensaio
sobre o modo de sua aplicação. Revista de Informação Legislativa, Brasília, Senado Federal, v. 36, n.
143, p. 191-209, jul/set. 1999.
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 58

normas?” 78 Os princípios costumam ser gerais, enquanto as regras referem-


se ao mundo real, ou a normas concretas. Contudo, há regras de alto grau
de generalização. Assim, a crítica a essa corrente está em que a
generalidade não é um diferencial sempre presente para distinguir regras
de princípios.

Robert ALEXY vê nos princípios mandados de otimização em


oposição aos mandados definitivos: “Os princípios não são normas
aplicáveis a qualquer situação.“ Seu conteúdo deve ser realizado “dentro” da
possibilidade possível jurídica e real, enquanto as regras contem
determinações, cumpridas ou não. Os princípios podem apresentar
conflitos solucionados casuisticamente ao considerar a precedência de um
para a fattispecie. Pode parecer absurdo relegar a um segundo plano o
direito a vida, contudo, está na Constituição Federal, art. 5° inc. XLVII
al..“a)”.79 No caso de guerra externa, o princípio da proteção à vida perde a
procedência absoluta e incondicionada, sendo superado pelo princípio da
proteção ao Estado. Habermas e Klaus Günther criticam a precedência de
um princípio a outro, alertando para a confusão entre normas jurídicas e,
em especial, dos princípios com valores 80.

Ronald Dworkin complementa que “os princípios são normas


cujas condições de aplicação não são pré-determinadas”. As regras
obedecem a uma lógica do “ou tudo ou nada”, e previamente prevêem as
exceções à sua aplicação. Diferente é com os princípios, que não podem ter
exceções enumeradas previamente porque qualquer princípio pode
representar uma exceção à aplicação de um outro princípio na hipótese
dos dois não poderem ser simultaneamente aplicados: Há aplicação de um
ou outro mediante ponderação e hierarquização como normas que, nos
casos concretos, excepcionam-se reciprocamente de forma fundamentada
do ponto de vista discursivo81: Os princípios são concorrentes, competem
entre si, sem serem contraditórios. A precedência na aplicação de um sobre
outro princípio é afirmada por meio de ponderações racionais que
78
GALUPPO, Marcelo Campos. 1999, p. 192 apud Almeida Melo op. et. loc. Cit.
79
GALUPPO cita a Constituição Federal, art. 5º, XLVII - não haverá penas: a) de morte, salvo em
caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX; b) de caráter perpétuo; c) de trabalhos forçados; d)
de banimento; e) cruéis;
80
GALUPPO, Marcelo Campos. 1999, p. p. 195 apud Almeida Melo op. et. loc. Cit.
81
GALUPPO, Marcelo Campos. 1999, p. p. 199 apud Almeida Melo op. et. loc. Cit.
Página 59 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

invoquem, por exemplo, a ratio do dispositivo, as conseqüências sociais


mais benéficas, a jurisprudência, a doutrina, etc.82. Com as normas é
diferente: A validade de uma implica a invalidade de outra que seja
contrária: Contendo determinações no âmbito fático e jurídico, duas regras
em conflito não podem ser simultaneamente válidas; são incompatíveis83.

9. Da multiplicação dos princípios:


O reconhecimento do processo, como ramo autônomo da
ciência, é bastante recente. Enfrentou forte resistência dos “civilistas”, que
consideravam seus estudiosos juristas de segunda classe. Entre o fim do
século XIX e a primeira metade do século XX,84 foi importante estabelecer
princípios próprios da ciência processual para conquistar sua autonomia
como ramo do direito. Passados cem anos, a sociedade evoluiu e o processo
representa papel fundamental. Nossa civilização não sobreviveria sem o
trinômio “processo”, “esperança” e “esporte” – principais válvulas de escape
às angustias da vida urbana85. Nesse século, gerações de processualistas
desenvolveram ensaios inesgotáveis sobre uma enorme quantidade de
princípios. Cada doutrinador adota alguns, conforme peculiaridades de sua
vivência. No passado, essa diversidade cumpriu relevante papel. Hoje,
contraria a marcha da história, cuja batalha é por celeridade e
simplificação de procedimentos visando a supremacia do bem da pessoa
humana, finalidade de toda atividade do Estado e razão de ser da
organização social, política, econômica e jurídica. Tudo existe para
dignidade do ser humano (art. 1° inc. III, da Constituição Federal).

10. Dos princípios processuais fundamentais:

82
ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estúdios
Constitucionales, 1993, p. 159
83
Alexy, op. cit, e Karl Larenz (1998, p.579) preconizam hierarquização de princípios no texto
constitucional ó a vida, a liberdade e a dignidade humana estão em nível mais elevado que os bens
materiais, por exemplo ó enquanto no direito privado não existiria ordem hierárquica entre os princípios
da autodeterminação e da auto-responsabilidade, exemplificando, que se restringem reciprocamente.
84
Entre milhares de trabalhos produzidos, confira: “Sulla massima: Ne eat judex ultra petita
partium (1904) e “Principii di Dirito proccedura civile”, de Chiovenda.
85
www.padilla.adv.br/desporto/futebol
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 60

A liberdade, direitos e aspirações dos cidadãos dependem da


sociedade e do poder público e, no enfoque moderno, há dois princípios
fundamentais do Estado de Direito: O Estado existe para assegurar a vida
humana com Dignidade e a Legalidade delimita a atuação do poder. A
Dignidade Humana é alcançada com justiça, que também pode ser
chamada de eqüidade, a busca de igualdade ou isonomia. No caput do
art.5º, o Constituinte conduz a isonomia a categoria de superprincípío
porque além de nortear a aplicação de todos demais, mediante seu
destaque no caput, onde aparece duas vezes, para não restar dúvida sobre
sua importância, o registra uma terceira vez no primeiro, dos 78 86 incisos,
que enumeram os Direitos e Garantias Fundamentais:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à
igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição;
(grifamos)

Três vezes assegura a igualdade! Comumente atribuído a Rui


Barbosa que o reescreveu no vernáculo, é de Aristóteles o ensinamento que
igualdade consiste tratar igual aos iguais, e desigual aos desiguais,
na medida de suas desigualdades. Note que a garantia de tratamento
justo – vg. eqüidade - vem logo depois dos direitos à vida, e à liberdade.
Nem mesmo segurança ou propriedade são tão importantes quando a
igualdade, entendida, na interpretação sistemática do texto constitucional,
como a equidade ou a realização de Justiça. Aristóteles, através de Ulpiano,
ensinou que Justiça é a vontade constante e perpétua de dar a cada um o
que é seu” 87. Equidade ou isonomia completam o conjunto das garantias
orientando sua aplicação. Antes disto, contudo, o art.1º foi além:

86
A Emenda Constitucional 45/2004, da “Reforma do Judiciário”, numa das mais morosas
tramitações no Congresso, praticamente de uma década, entre outras modificações inseriu mais um
inciso, no art.5º, da Constituição Federal: LXXVIII - a todos, no âmbito judicial e administrativo, são
assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua
tramitação. (grifamos) https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Emendas/Emc/emc45.htm
87
Ao mencionar o pensador Grego, e invocar os conceitos de Justiça, pedimos vênia para render
homenagem ao estimado Professor desta Faculdade de Direito. Provocando a pensar no Direito através
de Sócrates, por seu discípulo Platão e pelo discípulo-neto Aristóteles. José Sperb Sanseverino, depois
de lecionar a dirigir nossa Faculdade, exerceu diversas funções públicas, inclusive como administrador
do complexo hospitalar da centenária Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre a qual assumiu como
uma instituição despedaçada e sem futuro. Após alguns anos de trabalho, transformou-a num dos mais
modernos centros médicos da América Latina, com tecnologia de ponta em várias áreas. Isso provocou
alteração na busca no Vestibular Unificado, em Porto Alegre, no início do terceiro milênio. Antes, a
Página 61 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do
Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
I - a soberania;
II - a cidadania
III - a dignidade da pessoa humana;
IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
V - o pluralismo político.
Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes
eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.
Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;
II - garantir o desenvolvimento nacional;
III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;
IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e
quaisquer outras formas de discriminação.

Não se trata de liberdade, muito mais, a dignidade da pessoa


humana, os valores do trabalho e da livre iniciativa, informam a realização
da igualdade, que pressupõe tratamento justo, com eqüidade. A
dignidade de pessoa humana é inviolável, um dos pilares ou fundamentos
da República (art. 1º, III) que tem por função realizar valores fundamentais
humanos, como à honra e a imagem. Respeitá-la e protegê-la é obrigação
de todos os Poderes estatais. A dignidade da pessoa humana é MUITO
mais do que um DIREITO FUNDAMENTAL. Todos estes estão imbricados
naquela, que é princípio fundante do Estado Democrático de Direito do Brasil, valor-
guia que imanta toda a Constituição. Os Direitos Fundamentais estão
previstos, principalmente e não só, nos 78 incisos do art.5º da Constituição
Federal. Dignidade da pessoa humana é princípio basilar da própria
existência do Estado inserido - não sem razão, no primeiro artigo da
Constituição Federal. Abaixo apenas da soberania e cidadania. Porque
soberania é o "status" do Estado em face demais entes internacionais, sem o
qual ele não existe. E cidadania é o mecanismo pelo qual os habitantes
exercem seus direitos políticos de votar e ser votado para administrar o
pais88. Sem os dois primeiros não há organização política do Estado e, por
isso, os princípios dos inc. I e II do art. 1º não interferem no exercício do
que lhes segue: Considerado o mais importante, a dignidade da pessoa

Medicina da Ufrgs era a mais cotada. Perdeu a posição para a Fundação vinculada à Santa Casa, que,
mais tarde, daria lugar ao nascimento de uma nova Universidade da Saúde em Porto Alegre.
www.padilla.adv.br/mistico/platao
88
MIRANDA, Pontes de. Democracia, Liberdade, Igualdade (os três caminhos); 2ª edição; Editora
Saraiva, 1979.
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 62

humana, aparece antes dos valores do trabalho, ou da livre iniciativa.


Reconhecer a dignidade da pessoa humana constitui critério ou parâmetro
interpretativo aplicável a todo o sistema jurídico, vincula o intérprete a seu
conteúdo valorativo sob pena de flagrante inconstitucionalidade. Significa
que o Estado brasileiro se constrói a partir da pessoa humana cabendo a
este Estado o dever de propiciar as condições materiais mínimas para
que as pessoas tenham dignidade. A Constituição de 1988 buscou acima
de tudo estruturar a dignidade da pessoa humana de maneira a conferir
plena normatividade, projetando-a por todo sistema político, jurídico e
social instituído. A Constituição Federal salienta relevância da dignidade no
âmbito social em outros dispositivos89. A expressa inclusão da dignidade
da pessoa humana na Constituição Brasileira representou um marco no
constitucionalismo brasileiro, traduzindo a essencial pretensão da busca
efetiva e concreta da pessoa humana, seu fundamento e finalidade de sua
digna existência.

O Estado existe para assegurar dignidade da pessoa humana, e


a interpretação de quaisquer normas deve se adequar a este princípio
fundamental. Todos ramos do direito processual devem obedecer ao
princípio de que o processo deve produzir Justiça/Eqüidade, finalidade do
Estado, atuando dentro da Lei. “Equidade”, derivado do latim aequitas, de
aequus (igual, equitativo), confunde-se com “Justiça”, “se funda na circunstância
especial de cada caso concreto, concernente ao que for justo e razoável”90. A eqüidade
é instrumento da Justiça. Aliás “... quando a lei se mostrar injusta, o que se
poderá admitir, a equidade virá corrigir seu rigor, aplicando o princípio que vem do
Direito Natural, em face da verdade sabida ou da razão absoluta. Objetiva-se, pois no

89
Por exemplo, veja a Constituição Federal, nos arts. 170 “A ordem econômica, fundada na
valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna,
conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios...”; 226, §7º“A família, base
da sociedade, tem especial proteção do Estado - § 7º - Fundado nos princípios da dignidade da pessoa
humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao
Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer
forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas” e art. 227 “É dever da família, da
sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à
saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à
liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de
negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”.
90
De Plácido e Silva, Vocabulário Jurídico
Página 63 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

principio que modera ou modifica a aplicação da lei, quando se evidencia o excessivo rigor,
o que seria injusto”91

“O Código de Processo nacional institui o princípio de que o juiz, quando


autorizado a decidir por equidade, aplicará a norma que estabeleceria se fosse
legislador”92. Essa orientação harmoniza com art. 5º da LICC Lei de Introdução ao
Código Civil que dispõe: Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se
dirige e às exigências do bem comum. Esse princípio, eqüidade, visa realizar
Justiça até quando a lei é injusta, como consta de determinados
dispositivos do nosso sistema. O art.20, § 4º, do CPC, autoriza o Juiz a
decidir por equidade reconhecendo que as fórmulas da lei não podem
contemplar a solução dos casos concretos93. O art.6º da Lei 9.099/95,
autoriza o Juiz a usar a eqüidade para fazer Justiça no JEC Juizado Especial
Cível. Tal dispositivo harmoniza com o sistema do JEC onde não é possível
interpor Recurso Especial ao STJ94. No JEC, o magistrado pode fazer
Justiça, mesmo contra a Lei. Contudo, deve respeito à Constituição
Federal. Se ofender norma constitucional caberá Recurso Extraordinário
ao STF (art.102-III, CF). Há pífias notícias de aplicação dessa abertura nas
normas, talvez por desconhecimento. Um exemplo eloqüente pode
demonstrar sua utilidade para realizar Justiça; Penhora da residência do
devedor, contrariando a proteção da Lei 8.009/9095. Invocando o art.6º da
Lei 9.099/95 aplica-se a eqüidade, e rejeitar embargos do devedor. Injusto
isentar o devedor, proprietário de valiosa casa, de pagar ao credor, modesto
prestador de serviços que precisa do pagamento para sustentar a família.
Aplicar a impenhorabilidade da Lei 8.009 geraria injustiça e impunidade. A
impunidade dos maus gera a audácia dos maus, e ofenderia a Dignidade da
Pessoa Humana.

91
(op. e loc. cit..)
92
(ibidem)
93
O tema, relativo à sucumbência, será tratado adiante, mas confira “Da insuficiência da fixação
percentual”, Revista de Processo, ano 14, julho-setembro de 1989, nº 55, pág. 197 a 203, disponível em
www.padilla.adv.br/teses.
94
O art. 105-III da CF exige que a decisão recorrida seja de Tribunal; no JEC, não existe Tribunal,
apenas Turmas Recursais. Adiante retomamos o tema ao tratar do Duplo Grau de Jurisdição.
95
Sobre a famigerada Lei 8.009, e os interesses inconfessáveis confira
www.padilla.adv.br/teses/lei8009.htm.
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 64

Immanuel Kant conceituou dignidade como “tudo aquilo que


não tem preço”, porque o inestimável e o indisponível não podem servir
como moeda de troca:
“No reino dos fins tudo tem ou um preço ou uma dignidade. Quando uma coisa tem um
preço, pode-se pôr em vez dela qualquer outra como equivalente, mas quando uma coisa está
acima de todo o preço, e portanto não permite equivalente, então tem ela dignidade.
“O direito à vida, à honra, à integridade física, à integridade psíquica, à privacidade, dentro
outros, são essencialmente tais, pois, sem eles, não se concretiza a dignidade humana. A cada
pessoa não é conferido o poder de dispô-los, sob pena de reduzir sua condição humana; todas
as demais pessoas devem abster-se de violá-los.” (grifamos) 96

A Constituição de 1988 buscou antes e acima de tudo


estruturar a dignidade da pessoa humana de maneira a conferir plena
normatividade, projetando-a sobre todo sistema jurídico – entendendo
contidos e nele disciplinados todos demais “sistemas” político, social,
econômico, etc.. Em várias passagens97 a Constituição Federal salienta a
dignidade e sua relevância no âmbito social. A expressa inclusão da
dignidade da pessoa humana na Constituição Brasileira representou um
marco no constitucionalismo brasileiro. Traduziu essencial pretensão de
busca efetiva e concreta da pessoa humana, seu fundamento, e finalidade
de digna existência. Flademir Jerônimo Belinati Martins destaca:

“...quando analisamos a Constituição Brasileira percebemos que o valor fonte do nosso


sistema constitucional radica da dignidade da pessoa humana...
“A dignidade da pessoa humana, enquanto valor fonte do sistema constitucional, condiciona a
interpretação e aplicação de todo o texto, conferindo unidade axiológico-normativa aos diversos
dispositivos constitucionais, que muitas vezes se encontram sem relação aparente e até mesmo em
franca contradição.
(...omissis...)
“Enquanto valor inserto em princípio fundamental a dignidade da pessoa humana
serve de parâmetro para a aplicação, interpretação e integração de todo o ordenamento
jurídico, o que ressalta seu caráter instrumental.” (grifamos) 98

96
KANT, Immanuel.“Fundamentação da Metafísica dos Costumes”, trad. Paulo Quintela, 1986,
p.77.
97
A Constituição Federal contém exemplos dessa reiterada preocupação, como no art.170 “A
ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim
assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes
princípios...”; ou no art. 226, §7º “A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado - § 7º -
Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento
familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos
para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou
privadas”) ou ainda no art. 227 “É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao
adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à
profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e
comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração,
violência, crueldade e opressão”.
98
MARTINS, Flademir Jerônimo Belinati. “Dignidade da Pessoa Humana: princípio
constitucional fundamental”. Curitiba: Juruá, 2003, p.62.
Página 65 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

Antonio Junqueira de Azevedo, o preclaro Professor das


Arcadas, ensina que o pressuposto e as conseqüências do princípio da
dignidade do art.1º, inc.III, da Constituição Federal de 1988 estão
expressos nos cinco substantivos dos bens jurídicos tutelados no art.5º da
Carta Magna: vida que é pressuposto; segurança 1ª conseqüência;
propriedade 2ª conseqüência; liberdade e igualdade 3ª e 4º
conseqüências, inseparáveis na aplicação. O pressuposto é absoluto e as
conseqüências “quase absolutas” 99:
“É preciso... aprofundar o conceito de dignidade da pessoa humana. A pessoa é um
bem e a dignidade, o seu valor. O direito do séc.XXI não se contenta com os conceitos
axiológicos formais, que podem ser usados retoricamente para qualquer tese. Mal o séc.
XX se livrou do vazio do ‘bando dos quatro’ - os quatro conceitos jurídicos indeterminados:
função social, ordem pública, boa-fé, interesse público -, preenchendo-os, pela lei, doutrina
e jurisprudência, com alguma diretriz material, que surge, agora, no séc.XXI, problema
idêntico com a expressão ‘dignidade da pessoa humana’ !
“O princípio jurídico da dignidade fundamenta-se na pessoa humana e a pessoa humana
pressupõe, antes de mais nada, uma condição objetiva, a vida. A dignidade impõe, portanto,
um primeiro dever, um dever básico, o de reconhecer a intangibilidade da vida humana. Sem
vida, não há pessoa, e sem pessoa, não há dignidade.
“Um princípio jurídico, ao se concretizar, exige sempre um trabalho de modelação para
adaptação ao concreto; nesse trabalho, a intensidade da concretização poderá ser maior ou
menor. Até mesmo um princípio fundamental, como a dignidade da pessoa humana, impõe o
trabalho de modelação, porque, por exemplo, é preciso compactibilizar a dignidade de uma
pessoa com a de outra(e, portanto, alguma coisa da dignidade de uma poderá ficar prejudicada pelas
existências da dignidade da outra). Diferentemente, o pressuposto desse princípio fundamental
impõe concretização radical; ele logicamente não admite atenuação. Se afastado, nada
sobra do princípio da dignidade. E esse princípio, se pudesse ser totalmente eliminado, não
seria princípio fundamental. O preceito da intangibilidade da vida humana, portanto,
não admite exceção; é absoluto e está, de resto, confirmado pelo caput do art.5º da
Constituição da República” (grifamos) 100

Idêntico o entendimento de Edilsom Pereira de Farias, ao


descrever a relevância constitucional da dignidade humana:
“O princípio fundamental da dignidade da pessoa humana cumpre ...relevante papel
na arquitetura constitucional: o de fonte jurídico-positiva de direitos fundamentais.
Aquele princípio é o valor que dá unidade e coerência ao conjunto dos direitos
fundamentais. Dessarte o extenso rol de direitos e garantias fundamentais consagrados
no título II da Constituição Federal de 1988 traduz uma especificação e densificação do
princípio fundamental da dignidade da pessoa humana(art.1º, III). Em suma, os direitos
fundamentais são uma primeira e importante concretização desse último princípio, quer

99
Op. et loc. Cit.
100
AZEVEDO, Antonio Junqueira de. “Caracterização jurídica da dignidade da pessoa
humana”. RTDC. Vol.9, jan/mar 2002. p. 7/14.
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 66

se trate dos direitos e deveres individuais e coletivos (art.5º), dos direitos sociais(arts.6º a
11) ou dos direitos políticos(arts.14 a 17). Ademais, aquele princípio funcionará como
uma ‘cláusula aberta’ no sentido de respaldar o surgimento de ‘direitos novos’ não
expressos na Constituição de 1988, mas nela implícitos, seja em decorrência do regime e
princípios por ela adotados, ou em virtude de tratados internacionais em que o Brasil seja
parte, reforçando assim, o disposto no art. 5º. §2º. Estreitamente relacionada com essa
função, pode-se mencionar a dignidade da pessoa humana como critério interpretativo do
inteiro ordenamento constitucional”. (grifamos) 101

Flademir Martins recorda que a dignidade da pessoa humana


“se apresenta como uma fonte aberta de proteção jurídica, não sendo casual o fato de que
temas polêmicos sejam discutidos sob a ótica de seu conteúdo protetivo” 102.

Há íntima conexão entre dignidade e jurisdição, instrumento


processual de proteção dos direitos e garantias fundamentais assegurados
na Constituição, porque esta cria pressuposto básico para a vida na
liberdade que é a efetiva atuação do Poder Judiciário! Carlos Alberto
Álvaro de Oliveira, ao tratar de “O Processo Civil na Perspectiva dos
Direitos Fundamentais”, registra que direitos fundamentais são inerentes à
própria noção da pessoa - base jurídica da vida humana no nível de
dignidade, como direitos resultantes da concepção de Constituição
dominante, da idéia de Direito, do sentimento jurídico coletivo. A evolução
da humanidade exige nova concepção de efetividade dos direitos num
grau mais alto de juridicidade, concretude, positividade e eficácia. Os
direitos de primeira geração são os da liberdade, assegurados no plano
constitucional, e têm aplicação imediata103. Corroborando entendimento de
J.J.Canotilho104, o preclaro jurista gaúcho atribui ao Órgão Judicial poder
de exercer os direitos fundamentais(liberdade positiva) e de exigir omissões
dos poderes públicos para evitar agressões lesivas por parte
destes(liberdade negativa), ressaltando três aspectos essenciais na
concepção dos direitos fundamentais: normatividade do direito fundamental,
supremacia do direito fundamental (“não são os direitos fundamentais que se movem no
âmbito da lei, mas a lei que deve mover-se no âmbito dos direitos fundamentais”)105, apresentação
do direito fundamental como norma aberta buscando estabelecer pura e
101
FARIAS, Edilsom Pereir a de. “Colisão de Direitos: A honra, a intimidade, a vida privada e a
imagem versus a liberdade de expressão e informação.” 2ª.ed. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris
Editor, 2000, p. 66-67.
102
MARTINS, Flademir Jerônimo Belinati. Op. cit., p.127.
103
OLIVEIRA, Carlos Alberto Álvaro de. “O Processo Civil na Perspectiva dos Direitos
Fundamentais.” Revista da AJURIS, set/1987, 2002, p.37/49.
104
CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito Constitucional. 4ª.ed., Coimbra, Almedina, 1987, p. 448.
105
Cf. expressiva formulação de Jorge Miranda, “Manual de Direito Constitucional”, tomo IV,
Direitos Fundamentais, Coimbra, Coimbra ed., 1988, nº 60-I, p.282/283.
Página 67 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

simplesmente um programa e afirmar certa direção finalística para a


indispensável concretização jurisdicional. O Professor Álvaro conjumina
ensinamentos de Paulo Bonavides106 e Gilmar Ferreira Mendes 107, no
sentido de que “o aplicador da norma deve inclinar-se pela interpretação que conduza à
constitucionalidade da norma, embora por outra via pudesse considerá-la inconstitucional”. Deve
empenhar-se em encontrar uma maneira de aplicar as normas conforme ao
Direito Constitucional.

Reconhecer dignidade à pessoa humana constitui critério ou


parâmetro interpretativo aplicável a todo o sistema jurídico. Primordial
ponto de análise do hermeneuta ou do operador do Direito - vincula o
intérprete e aplicador da Lei a seu conteúdo valorativo. Aplicação de
qualquer lei que resulte contrariedade à dignidade da pessoa humana é
inconstitucional.

Na lição de Pontes de Miranda: “o direito não cessa onde o abuso começa:


o que dá ensejo à reparação é a existência do dano”108.
Caio Mário da Silva Pereira afirma que “o exercício abusivo do
direito situa-se no fato de que seu titular pretender extrair dele faculdades
ou vantagens que importem em malefício para outrem”109. No exercício
abusivo do direito conjugam-se a intenção do agente e o prejuízo de
outra pessoa. O magistrado tem grande responsabilidade social e política. O
dever de atuar além das conseqüências, prevenindo as causas dos
problemas sociais. Investido nos poderes decorrentes da função
jurisdicional, ao dirimir os conflitos deveria punir de forma rigorosa aqueles
abusam do direito e do poder econômico. Contudo, isto seria mais uma
fonte de trabalho. Os juízes contentam-se em julgar o mérito da questão,
omitindo-se de examinar a conduta processual. Dentre as possibilidades de
gerar responsabilidade civil do Estado pelos danos produzidos pela omissão
judicial. Sobressai na atualidade mundial o problema produzindo estudos
da responsabilidade civil do Juiz por atuação omissão dolosa ou culposa ao
não examinar a pretensão do jurisdicionado.

106
BONAVIDES, Paulo. “Curso de Direito Constitucional”, 7ª. Ed., São Paulo, Malheiros, 1997,
p.473/480.
107
MENDES, Gilmar Ferreira. “Jurisdição Constitucional – O Controle Abstrato de Normas no
Brasil e na Alemanha”, 3ª ed., São Paulo, Saraiva, 1999, p.231/237.
108
PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. “Tratado de Direito Privado”. RT, 1984, SP.
3ª ed., 2ª reimpressão. Tomo LIII, p.75.
109
Responsabilidade civil. 6 ed. Forense, p. 225.
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 68

11. Da Legalidade:
O processo nada mais é do que a busca da justiça (eqüidade)
através dos mecanismos legais (legalidade). Se o Estado deve assegurar a
Dignidade Humana, o Princípio da Legalidade é seu instrumento, definindo
os rumos dessa jornada, e estabelecendo limites à atuação estatal.
Legalidade, nos meios, e justiça, nos propósitos, constituem os dois
princípios fundamentais. Ao examinar os mecanismos de funcionamento
dos processos em nível de Teoria Geral estamos estudando o princípio da
legalidade movendo-se em direção à equidade para assegurar a dignidade
humana. Esse é o objeto de nosso estudo. Importante diferenciar a
atividade jurisdicional dos demais poderes da sociedade, e perceber a
necessidade de um juiz natural imparcial, característica do processo que
diferencia a Jurisdição dos demais poderes do Estado. Quem é o Juiz?
Como acontece o ingresso na magistratura? Qual a principal diferença
para os demais poderes? Porque há obrigatoriedade de fundamentar o ato
jurisdicional? Quais as diferença do Processo Legislativo? Porque a
hipertrofia do Poder Executivo provoca anomalias. Entenda como as
Corporações, que representam um poder econômico, prejudicam a
realização da justiça. 110

12. Do Juiz natural ou legal:

Nos Poderes Executivo e Legislativo o cargo é alcançado por


eleição, e a investidura é temporária. O ingresso na magistratura
acontece por concurso que parecem “maratonas”. Uma sucessão de
provas, cada vez mais difíceis, e em breve espaço de tempo, aprovam
pessoas inteligentes e cujas famílias tiveram condições financeiras de
110
Diferenças do Legislativo, Executivo, Econômico desenvolve e amplia alguns estudos publicados
sobre o tema: Controle do Judiciário e a diferença dos demais poderes do Estado ADV-COAD
Informativo Semanal 9/96 de 3-3-96 , p. 095-096; Imparcialidade Judicial Seleções Jurídicas Adv
Advocacia Dinâmica COAD, nº 7/95, julho de 1995, p. 43-44 Jornal do Comercio, Porto Alegre, 13 de
março de 1996, p. 19, Legislação & Espaço Vital; Imparcialidade Jurisdicional versus
Discricionariedade Administrativa Revista da Faculdade de Direito da UFGRS, v.12, 1996, p. 209-215;
Judiciário e demais poderes Jornal do Comercio, Porto Alegre, 13 de março de 1996, p. 19, Legislação
& Espaço Vital; Judiciário Diferente do Legislativo e Executivo Publicado na Revista da Advocacia
Pública - Publicação Oficial do Instituto Brasileiro de Advocacia Pública, Editora ADCOAS. Ano VI,
edição 12. São Paulo, dezembro de 2000. p. 28-30.
Página 69 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

propiciar-lhes um estudo de excepcional qualidade. Muitos até


possuem boa bagagem jurídica. Contudo, alguns são desprovidos da
vocação para aquela atividade e terminam vitaliciados como juízes
pelo simples decurso do prazo de três anos.111 Esse sistema não
analisa a vocação para o cargo, e o Ministro Sálvio de Figueiredo
Teixeira o aponta como principal motivo do aparecimento do
complexo de autoridade e abuso de poder, que o jurista mineiro
denominou de juizite.112

A seleção de magistrados pode ser realizada por um


concurso em estilo vestibular113. Os candidatos são selecionados em
provas de menor rigorosas porque o exame é para ingresso numa
Escola de Magistratura onde receberão ensinamentos teóricos e
práticos, com provas pontuais, diferentes dos concursos “maratona”.
Enquanto estudam, esses candidatos a juízes recebem pagamento
para se dedicarem e, ao final do curso, aprovados, são nomeados
como substitutos114. Este sistema, utilizado em muitos países como a
França e Espanha, seleciona os candidatos vocacionados. Na década
de noventa, no Rio Grande do Sul, foi criada uma forma híbrida115.

111
Conforme art.95-I, da CF, a vitaliciação ocorreria em dois anos. Na prática, o prazo era de apenas
um ano e oito meses porque os Juízes desfrutam de dois meses de férias por ano. Com a mudança para 3
anos, descontados 2 meses de férias a cada ano, restam 2 anos e meio de trabalho. Mesmo assim, não se
tem notícia da análise da vocação para o exercício do cargo nesse período.
112
Veja, a propósito, comunicações: “Concurso para Juiz pode acabar”, Jornal da OAB-RS, Porto
Alegre, Ipsis Litteris, fevereiro 1992, p.11 e “Alteração em concurso para juiz de direito” no Jornal de
Comércio, Porto Alegre, 6 de maio de 1994, p. 11, Segundo Caderno, disponíveis em:
www.padilla.adv.br/teses
113
Confira nossa advertência: “Concurso para Juiz pode acabar” em Jornal da OAB/RS “Ipsis
Litteris”, fevereiro de 1992, p. 11, também em www.padilla.adv.br/teses
114
O sistema de concursos vestibular estimula posicionamentos como o divulgado pelo TST
defendendo idade mínima de 25 anos para juiz. A Escola Nacional da Magistratura do Trabalho, deveria
a funcionar em março de 2003 revendo os padrões de seleção e formação de juízes. A criação da escola
está prevista na PEC (Proposta de Emenda Constitucional) da reforma do Judiciário adiada até o final de
2004 como Emenda Constitucional 45. O vice-presidente do TST, ministro Vantuil Abdala, disse que a
Escola ainda é o primeiro passo, apenas "uma fase embrionária" da reforma do Judiciário, e defende a
fixação de idade mínima para o ingresso na magistratura, como propunha o texto da Reforma do
Judiciário, em 25 anos. "Mais do que conhecimento teórico, o juiz precisa ter bom senso, equilíbrio,
serenidade e maturidade", afirma o vice-presidente do TST. Para o vice-ministro do TST "é muito grave
que jovens, sem nenhuma experiência de vida, sejam admitidos como juízes". Folha Online + Marco
Antonio Birnefeld, Espaço Vital, Diversos 10.07.2002 www.espacovital.com.br
115
Híbrida porque, ao invés de um ano de curso, e amadurecimento, o Judiciário Gaúcho, temendo o
hiato e o prejuízo que poderia aduir à atitude, compactuou o curso em 60 dias, por maior que seja o
empenho dos candidatos e professores, não há como compactar um ano de aprendizado, experiências,
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 70

13. Da diferença entre o Judiciário e demais poderes:

A sociedade funciona dividida em 3 Poderes formais cuja


atuação é disciplinada na legislação – compreendida como conjunto de regras que
inicia pela própria Constituição Federal, e um quarto poder, informal, que – sedo
privado – pode fazer o que quiser dentro dos limites da Lei 116. O
poder econômico não tem leis adequadas para o limitar.

O Poder Legislativo composto por mandatários do povo e dos


Estados produz regras, que deveriam disciplinar a vida em
sociedade117. O Poder Executivo conduz a política-economia dentro
dos limites das regras legais com objetivos de curto, médio e longo prazo,
visando o que, no entender dos administradores legitimados pelo
voto, é o caminho mais curto para o bem comum e o progresso.

O Poder Judiciário soluciona litígios onde pessoas divergem


sobre bens, fatos da vida, ou sobre a própria interpretação das regras
emanadas dos demais poderes118.

provas, e maturação, em meros 60 dias. Confira “Alteração em concurso para juiz de direito” Jornal de
Comércio, Porto Alegre, 6 de maio de 1994, p. 11, Segundo Caderno www.padilla.adv.br/teses.
116
A lei é o limite para a atuação provada, nos termos do art.5º-II, da CF: II - ninguém será
obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;
117
No exercício da atividade legislativa encontramos situações como a do Projeto de Lei 7041/2010
pelo o qual o dia 14 de janeiro passaria a ser o “Dia Nacional do Sexo”, o que, no entendimento do autor,
Deputado Edgar Mão Branca, contribuiria para a educação sexual e para quebrar “tabus” em relação à
prática, alegando que a “questão sexual” tem sido tratada de forma distorcida, “como uma mercadoria
suja” e que o sexo é colocado de maneira pejorativa em letras musicais, comerciais e em programas de
TV: www.camara.gov.br/sileg/integras/748187.pdf
www.camara.gov.br/internet/sileg/Prop_Detalhe.asp?id=471189
118
O Poder Executivo anomalamente exerce atribuições legislativas. Adiante retomamos o tema.
Em 1993 criticamos: “Revisão Constitucional ou golpe?” publicada no Adv Advocacia Dinâmica
COAD, Informativo Semanal 50/93, dez/93, p. 636, e no Jornal do Comércio, Porto Alegre, 18 de janeiro
de 1994, p. 8, Segundo Caderno. Veja www.padilla.adv.br/teses. O Congresso revisava o que ainda não
havia visto. Nesse sentido, também, o professor Telmo Candiota da Rosa Filho, Advocacia Dinâmica
(ADV) do COAD (pag. 554/555) e no Segundo Caderno do Jornal do Comércio (13-10-93, p. 15). Com
clareza peculiar, o professor de Direito Administrativo da UFRGS demonstra que a revisão constitucional
prevista no art. 3º do ADCT (Ato das Disposições Transitórias), junto e imediatamente após a revisão do
plebiscito concluindo, logicamente que o objetivo daquela revisão com quorum de votação reduzido para
maioria simples era a adaptação da Constituição em caso de adoção de um novo regime (Monarquista),
ou um novo sistema (parlamentarista). O plebiscito não provocou qualquer alteração. Mas aproveitaram
da brecha para modificar a Constituição, antes de regulamentá-la. As Medidas Provisórias foram um
engodo. A Constituinte estava na fase final. Acabavam os Decretos-lei herdados da “ditadura” de 64 mas,
sob pretexto de precisarmos de um mecanismo legislativo para urgências, somado à esperança de que o
Página 71 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

O Legislativo possui total liberdade para criar novas leis


dentro dos limites e procedimentos impostos pela Constituição que
dita as regras básicas do processo legislativo complementado pela
legislação e Regimento Interno da casa parlamentar. Embora alguns
Projetos de Lei apareçam acompanhados de "Exposição de Motivos", tal
se destina a convencer os Colegas Parlamentares a votar pela
aprovação, ou o Presidente a sancionar. A "Exposição de Motivos" não
integra o ato de poder emanado do Legislativo, que é a Lei.119 Ao
serem exteriorizados para a população, os atos de poder do Legislativo
não necessitam fundamentação. Basta uma lei ser aprovada pela
maioria do Congresso. Sancionada e publicada no Diário Oficial120,

Brasil tomaria rumo certo, adotando o parlamentarismo como sistema de governo, crença de todos
juristas de bem (confira César Saldanha de Souza Jr., “A crise da Democracia Brasileira”, Forense)
empulharam as Medidas Provisórias, instrumento adequado ao sistema parlamentar. Neste, quando o
Governo pensa editar Medida Provisória, consulta lideranças dos partidos políticos formalmente,
divulgado. Os jurisdicionados, sabendo, trocam idéias. Os seus pontos de vista, através das associações,
sindicatos, e outros mecanismos, chegam aos parlamentares que se baseiam nas informações dos eleitores
repassando às lideranças. Em uma semana o Gabinete do Governo sabe o quer o povo. Assim, quando o
Poder Executivo edita uma Medida Provisória, ela passou por uma mini consulta popular, e está
previamente aprovada. A medida provisória economiza recursos, evitando que o Congresso tenha de
mover processo legislativo para questões simples e que podem ser resolvidas rapidamente. A medida
provisória rapidamente é aprovada pelo Parlamento que já havia dado “ok” para sua edição. No Brasil,
contudo, ao invés de parlamentar, temos um regime para lamentar... Até a edição da Emenda
Constituição nº 32, em 11 de setembro de 2001, o Governo sobrecarregava o Poder Legislativo com uma
avalanche de Medidas Provisórias, em grande parte inconstitucionais por vício de origem porque
não havia urgência ou relevância que justificassem a edição. Confira, adiante, o capítulo sobre “O
crescimento do Poder Executivo”, bem como o artigo publicado em 2/3/2009 no espaço Vital,
“Constituição de 88 ainda tem 142 artigos por regulamentar”:
www.espacovital.com.br/noticia_ler.php?id=14077
119
Em raríssimas exceções, encontramos no Diário Oficial, uma exposição de motivos, para facilitar
a assimilação das alterações resumidas na “exposição”, fixando o momento histórico, os princípios que
nortearam a criação e algumas personalidades que contribuíram ao trabalho. Assim foi na edição de um
novo código de processo, em 1973, onde o Ministro da Justiça, professor Alfredo Buzaid,
coincidentemente fora o autor do Projeto, duas décadas antes.
120
Constituição Federal, art. 48 - Cabe ao Congresso Nacional, com a sanção do Presidente da
República, não exigida esta para o especificado nos art.s 49, 5l e 52, dispor sobre todas as matérias de
competência da União... Art. 65. O projeto de lei aprovado por uma Casa será revisto pela outra, em um
só turno de discussão e votação, e enviado à sanção ou promulgação, se a Casa revisora o aprovar, ou
arquivado, se o rejeitar. Art. 66. A Casa na qual tenha sido concluída a votação enviará o projeto de lei ao
Presidente da República, que, aquiescendo, o sancionará. § lº - Se o Presidente da República considerar o
projeto, no todo ou em parte, inconstitucional ou contrário ao interesse público, veta-lo-á total ou
parcialmente, no prazo de quinze dias úteis, contados da data do recebimento , e comunicará, dentro de
quarenta e oito horas, ao Presidente do Senado Federal os motivos do veto. § 2º - O veto parcial somente
abrangerá texto integral de artigo, de parágrafo, de inciso ou de alínea. § 3º - Decorrido o prazo de
quinze dias, o silêncio do Presidente da República importará sanção. § 4º - O veto será apreciado em
sessão conjunta, dentro de trinta dias a contar de seu recebimento, só podendo ser rejeitado pelo
voto da maioria absoluta dos Deputados e Senadores, em escrutínio secreto. § 5º - Se o veto não
for mantido, será o projeto enviado, para promulgação, ao Presidente da República. § 6º - Esgotado sem
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 72

será juridicamente perfeita. Se ofender à Constituição, a Lei poderá ser corrigida pelo
controle direto, via ADIn; ou indireto, casuisticamente em processos nos quais a
inconstitucionalidade seja reconhecida. O STF incidentalmente ao julgar Recurso Extraordinário
pode declarar a inconstitucionalidade, e comunicar ao Senado. Este pode promulgar Resolução
suspendendo a execução do dispositivo legal declarado inconstitucional (art. 52-X da CF) com
eficácia a partir de sua publicação no Diário Oficial. No caso de ADIn, a declaração de
inconstitucionalidade possui eficácia erga omnes.

O Executivo coordena as funções públicas com ampla


discricionariedade dentro das diretrizes gerais da Constituição e das
Leis. Deve atuar dentro da Lei, mas dentro dos limites legais tem total
liberdade. Os atos de poder do Executivo "stricto senso" não
necessitam fundamentação121.

deliberação o prazo estabelecido no § 4º, o veto será colocado na ordem do dia da sessão imediata,
sobrestadas as demais proposições, até sua votação final, ressalvadas as matérias de que trata o art. 62,
parágrafo único. § 7º - Se a lei não for promulgada dentro de quarenta e oito horas pelo Presidente da
República, nos casos dos §§ 3º e 5º, o Presidente do Senado a promulgará, e, se ente não o fizer em igual
prazo, caberá ao Vice-Presidente do Senado fazê-lo.
121
Confira a tese de Maria Sylvia Zanella di Pietro que, em 1990, conquistou cátedra de José
Cretella Jr. na USP “Discricionariedade Administrativa” ed. Atlas. A Constituição Federal, Art. 84, diz
competir privativamente ao Presidente da República: I - nomear e exonerar os Ministros de Estado; II -
exercer com o auxílio dos Ministros de Estado, a direção superior da administração federal; III - iniciar o
processo legislativo, na forma e nos casos previstos nesta Constituição. IV - sancionar, promulgar e fazer
publicar as leis, bem como expedir decretos e regulamentos para a sua fiel e execução; V - vetar projetos
de lei, total ou parcialmente; VI - dispor sobre a organização e o funcionamento da administração federal,
na forma da lei; VII - manter relações com o Estrado estrangeiros e creditar seus representantes
diplomáticos; VIII - celebrar tratados, convenções e atos internacionais, sujeitos a referendo do
Congresso Nacional ; IX - decretar o estado de defesa e o estado de sítio; X - decretar e executar a
intervenção federal; XI - remeter mensagem e plano de governo ao Congresso Nacional por ocasião da
abertura da sessão legislativa, expondo a situação do País e solicitando as providências que julgar
necessárias; XII - conceder indulto e comutar penas, com audiência, se necessário, dos órgãos instituídos
em lei; XIV - nomear, após aprovação pelo Senado Federal, os Ministros do Supremo Tribunal Federal e
dos Tribunais Superiores, os Governadores de Territórios, o Procurador-Geral da República, o presidente
e os diretores do Banco Central e outros servidores, quando determinados em lei; XV - nomear,
observado o disposto no art. 73, os Ministros do Tribunal de Contas da União; XVI - nomear os
magistrados, nos casos previstos nesta Constituição, e o Advogado-Geral da União; XVII - nomear
membros do Conselho da República, nos termos do art. 89, VII; XVIII - convocar e presidir o Conselho
da República e o Conselho de Defesa Nacional; XIX - declarar guerra, no caso de agressão estrangeiram,
autorizado pelo Congresso Nacional ou referendado por ele, quando ocorrida no intervalo das sessões
legislativas,e, nas mesmas condições, decretar, total ou parcialmente, a mobilização nacional; XX -
celebrar a paz, autorizado ou com o referendo do Congresso Nacional; XXI - conferir condecorações e
distinções honoríficas; XXII - permitir, nos casos previstos em lei complementar, que forças estrangeiras
transitem pelo território nacional ou nele permaneçam temporariamente; XXIII - enviar ao Congresso
Nacional o plano plurianual, o projeto de lei de diretrizes orçamentárias e as propostas de orçamento
previstos nesta Constituição; XXIV - prestar, anualmente, ao Congresso Nacional, dentro de sessenta dias
após a abertura da sessão legislativa, as contas referentes ao exercício anterior; XXV - prover e extinguir
os cargos públicos federais, na forma da lei; XXVI - editar medidas provisórias com força de lei, nos
termos do art. 62; XXVII - exercer outras atribuições previstas nesta Constituição. Parágrafo único. O
Presidente da República poderá delegar as atribuições mencionadas nos incisos VI, XII e XXV, primeira
Página 73 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

O Judiciário julga, isto é, decide questões propostas.


Indica qual, ou quais regras válidas para solucionar o caso concreto.
A atuação do Judiciário difere dos demais Poderes do Estado. Os atos
de poder do Judiciário são compostos pela fundamentação. Não
basta dizer qual é a vontade da Lei, mas é preciso dizer porque
aquela é a vontade da Lei ou, como bem expôs o livre docente da
PUC paulista122, “é preciso "exteriorização de valores sobre as provas e
questões submetidas ao julgamento do juiz."

Normalmente, uma Constituição contém regras gerais. O


Legislador Constitucional produz normas descritivas e
principiológicas. Somente diante de princípio de extrema importância
a Constituição afastar-se-á desse padrão para estabelecer disposição
de sanção, direta, inquestionável, como a do art.93, inc. IX:
"Todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e
fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade..." Constituição Federal, art.93, inc. IX
O texto Constitucional, prevendo sanção de nulidade para
desobediência à regra que enuncia, denota a importância da
fundamentação na atividade jurisdicional, elevada à categoria de
indispensável. Cumprindo os princípios da legalidade e ampla defesa,
inadmissível decisão judicial.
Essa exigência, cominando pena de nulidade, tem razões
lógicas no Estado de Direito. O professor Nelson Nery Jr. do
Doutorado Paulista, na tese de livre docência, salienta:
"Fundamentar significa o magistrado dar as razões, de fato e de direito,
que o convenceram a decidir a questão daquela maneira. A fundamentação tem
implicação substancial e não meramente formal, donde é lícito concluir que o juiz
deve analisar as questões postas a seu julgamento, exteriorizando a base fundamental
de sua decisão.Não se consideram "substancialmente" fundamentadas as decisões que
afirmam que 'segundo os documentos e testemunhas ouvidas no processo, o autor tem
razão, motivo por que julgo procedente o pedido". Essa decisão é nula porque lhe falta
fundamentação. 123

parte, aos Ministros de Estado, ao Procurador - Geral da República ou ao Advogado-Geral da União, que
observarão os limites traçados nas respectivas delegações.
122
Nelson Nery Jr, Princípios do Processo Civil na Constituição Federal. RT, 1995, 2ª ed., rev. e
aum. pág. 159. Em edições mais recentes, a partir da 7ª, de 2002, esse princípio vem abordado a partir da
pág.180 pois houve sensível ampliação da obra.

123
Nelson Nery Jr, Princípios do Processo Civil na Constituição Federal. RT, 1995, 2ª ed., rev. e
aum. pág.159. Na edição mais recente, a 7ª, de 2002, esse princípio vem abordado a partir da pág.180,
sendo a citação da página 183, 2º §.
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 74

O ato de fundamentar não basta ser formal. Deve ocorrer


de fato, pena de nulidade:
"A decisão que, infelizmente, ocorre amiúde no foro,
indefere a pretensão 'por falta de amparo legal' , não tem guarida no
sistema constitucional processual brasileiro."124
Não basta dizer que “falta amparo legal”, mas é necessário
dizer porque para convencer os jurisdicionados e obedecer o princípio
da legalidade. Como ficaria a ampla defesa diante da perplexidade.
Incapaz de recorrer por desconhecer as razões da decisão ? Ofenderia
a dignidade da pessoa humana estimulando a arbitrariedade.
www.padilla.adv.br/teses/normas

14. Do processo eleitoral:


O Legislativo pode editar Leis, e alterar a Constituição,
sem agregar uma fundamentação e esse ato de poder. Diferente do
Judiciário, o Executivo e Legislativo não precisam fundamentar seus
atos. Os eleitores insatisfeitos manifestarão sua inconformidade no
pleito seguinte, elegendo outros governantes ou parlamentares. O
processo eleitoral é de confiança do mandante no mandatário, por um
tempo previamente determinado.

Para angariar votos, os políticos fazem promessas


eleitorais. Os parlamentares assumem compromissos de defender
determinados direitos e de esforçar-se para aprovar leis sobre
determinados temas. Os parlamentares são representantes num
colegiado e seu compromisso é o de lutar por resultados. Se seu
trabalho não agradar, o eleitorado vota em outros representantes.
Traçando um paralelo com o direito contratual é uma obrigação de
serviço sob padrões usuais de perícia. Não há compromisso de
sucesso, e sim de lutar, usando a palavra, articulação e apresentando
projetos de Lei. Diversa é situação dos candidatos a chefe do poder
executivo, que comandam uma estrutura com considerável poder
econômico. A Presidência da República, por exemplo, tem orçamento
de bilhões e nomeia dezenas de milhares de cargos de confiança. O
orçamento dos maiores Estados, e até das maiores cidade, como São
Paulo, são vultosos. Suas promessas de campanha podem ser
cobradas.
Hipocrisia, em latim clássico ´hipokrisis`, possuía dois sentidos:
o original, teatral, de "declamação", "mímica" e o sentido derivado, e mais

124
Nelson Nery Jr, Princípios do Processo Civil na Constituição Federal. RT, 1995, 2ª ed., rev. e
aum. pág.100
Página 75 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

atual, de fingimento, falsidade etc125. Após 1964, o brasileiro acostumou-se


a conviver com a hipocrisia. Quando os militares devolveram o poder aos
civis os eleitores estavam acostumados ao vai e vem de candidatos que
nada faziam. O Brasil paga um preço alto pelo “jejum” eleitoral que
implantou um misto de apatia com tolerância às promessas
impossíveis ou inverossímeis.

Os políticos continuaram se comportando como se não tivessem


o poder de cumprir suas promessas e uma eleição pode ser vencida por
margem de votos oriundas de falsidades. A impunidade deixou os
candidatos à vontade para promessas eleitorais fantasiosas ou
programas de governo impossíveis de cumprir. Candidato honesto
pode não ter chance contra os que iludem o eleitor: Na mesma
campanha, variam o discurso, com promessas contraditórias. A
intenção de angariar votos, com base na indução em erro do eleitor,
parece tipificar um “estelionato eleitoral”126:
Código Penal Estelionato Art. 171 - Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em
prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou
qualquer outro meio fraudulento: Pena - reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, e multa.

Os programas de governo dos candidatos a cargos


executivos devem ser de cumprimento obrigatório, assim como são lei
os orçamentos aprovados para o ano seguinte. E o programa deve ser
claro uma vez que apresentar um programa vago, ou ambíguo,
também pode induzir o eleitor em erro.

15. Do não equilíbrio entre os Poderes:

A sociedade busca o equilíbrio entre os Poderes do Estado127.


Contudo, desde 1988, o Poder Executivo Federal cresceu afetando o
equilíbrio entre os poderes. De 1964 a 1988 como conseqüência da
revolução, e depois por anomalias inseridas na Constituição, o Poder
Executivo concentra poder político e econômico. A reforma tributária

125
Salles, Manoel Whitaker “Dentro do Dentro - Os nomes das coisas”, Editora Mercuryo, 2003.
Páginas 95 e 119
126
Considerado o símbolo da fraude e da dissimulação, por sua capacidade de disfarce, a mudar de
cor para passar despercebido, confundindo-se com o ambiente o camaleão é um pequeno lagarto coberto
de manchas que parecem pequenas estrelas. Seu nome, em latim, era ´stellio` (de ´stella`, estrela). Daí
estelionato, nome dado ao crime da velhacaria e da fraude. A palavra latina ´stella` "estrela" é parente da
palavra grega ´aste` e seu derivado ´astron´, que deram em português as palavras astro, astronomia, e
também desastre. Salles, Manoel Whitaker “Dentro do Dentro - Os nomes das coisas”, Editora
Mercuryo, 2003. Páginas 95 e 119
127
Os poderes de administrar o “reino”, de editar leis e decidir contendas foram divididos entre três
entidades abstratas, Executivo e Legislativo poderes políticos, e o Judiciário um poder apaziguador. Os
membros desses poderes são escolhidos através de diferentes mecanismos. Aqueles eleitos, estes
selecionados pela capacidade.
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 76

da Constituição Federal de 1988 concentrou receitas no poder


Executivo Federal reduzindo a participação dos Estados. Outra
anomalia é a função legislativa, usurpando128 atividade do Congresso.

Essa anomalia resulta de um conjunto de distorções. A


Constituição de 1967, make-up da Carta de 1946 sem inovações
importantes, foi alterada pelo Emendão de 1969. O AI-5 fechou o
Congresso. Os Decretos-leis nascem para legislar em casos de
segurança nacional e finanças públicas. A Constituição Federal de
1988 encerraria aquele período. Todo cientista político acreditava que
a Nação adotaria o Parlamentarismo no debate que parecia iniciar. O
Parlamentarismo foi isca para que, na Constituição “Cidadã” ao invés de
dar poder ao povo, para a dignidade da pessoa humana, hipertrofiasse o
Executivo com o poder de editar Medidas Provisórias sobre qualquer
assunto: Se os Decretos-Lei incomodavam, mesmo tendo limite nas
matérias, pior são as Medidas Provisórias. O povo queria o fim dos
Decretos-lei – herança maldita da “ditadura” de 1964 – através da
qual o Governo Federal iniciou a prática de confiscos - sob alcunhas
variadas. Sob a maquilagem de medida provisória, Fernando Collor
confiscou a poupança de todas pessoas honestas129.

O sistema presidencialista de governo não funciona bem:


Seus defensores sempre invocam o exemplo de um único país do
mundo: Estados Unidos da América, omitindo que, apesar do poder
presidencialista, a eleição é um sistema híbrido. O presidente chega
ao poder de maneira indireta. Nas eleições de 1998, por exemplo, Al
Gore teve mais votos do que G. W. Bush que, contudo, venceu por
pequena margem nos Estados mais populosos. Há polarização entre
dois grandes partidos políticos, de enorme rivalidade, que decidem as
eleições nas suas convenções. Como o país é muito rico, ninguém
percebe a precariedade do funcionamento do presidencialismo
americano. No restante do mundo, o parlamentarismo é o caminho
da democracia. A esperança de que o Brasil tomaria rumo adotando o
sistema de governo parlamentarista animava os juristas130.

128
O Poder Executivo exerce atribuições legislativas que não lhe competem. Aproveitaram da
brecha para modificar a Constituição, antes mesmo de regulamentá-la. Veja “Leis e Medidas Provisórias”
em www.padilla.adv.br/teses.
129
Através de uma Medida Provisória, Fernando Collor confiscou todo dinheiro em circulação no
país. Aliados políticos, contudo, sabendo da medida, na véspera retiraram todo dinheiro dos bancos...
Todos precisavam de dinheiro, e passaram a vender o que tinham, especialmente dólares. A cotação caiu
à metade. Quem sabia do confisco, e sacou seus recursos do banco, no dia seguinte duplicou o capital,
comprando dólares pela metade do preço. Um lucro tão fabuloso só foi igualado quando dos atentados
terroristas do dia 11 de setembro de 2001 provocando uma reviravolta na economia mundial. Quem sabia
do atentado, comprou as ações certas dias antes, multiplicando as fortunas.
130
César Saldanha de Souza Jr., “A crise da Democracia Brasileira”, Forense. www.direitoufrgs.br
Página 77 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

Este clima foi propício a “engolirmos” as Medidas Provisórias,


numa inteligente armação. Adiaram o debate sobre o sistema de governo, e
o assunto jamais ganhou o espaço que merecia da imprensa. Se o povo
soubesse as vantagens do sistema de governo parlamentarista,
provavelmente pediria por ele. Depois, misturaram a crucial decisão sobre o
sistema de governo com uma pretensa opção por um retorno ao regime
monarquista. Falemos sério: A maioria absoluta da população votou no
plebiscito sem saber o que decidia. Escolha, aleatoriamente, algumas
pessoas nascidas antes de 1977, e pergunte-lhes se sabem a diferença
entre os dois sistemas de governo. O plebiscito foi uma encenação para
legitimar o poder concentrado no Governo Federal. sob a desculpa da
necessidade de um mecanismo legislativo para urgências, e que o país
ficaria ingovernável sem a lei orçamentária. Em qualquer sistema de
governo o Processo Legislativo no Congresso é relativamente lento devido à
quantidade de pessoas envolvidas131. No Sistema Parlamentarista de
Governo, ao planejar uma Medida Provisória consulta-se às lideranças dos
Partidos Políticos no Parlamento, e a imprensa divulga. Os eleitores,
reúnem-se nas associações, sindicatos, clubes, debatem e os grupos
repassam a opinião dos eleitores aos parlamentares, que as retransmitem
as lideranças partidárias que, em pouco tempo, fornecem feedback (retorno)
ao Gabinete do Governo. O Poder Executivo edita Medida Provisória após
uma consulta popular informal, porém eficaz, que previamente a aprovou e
sua edição é mera formalidade, economizando recursos, evitando o trâmite
demorado e caro do processo legislativo ordinário em questões que podem
ser resolvidas dessa forma. Num país parlamentarista, o Congresso
derruba132 o Chefe de Governo que editar medidas provisórias de
surpresa! No Brasil, acontece o oposto: Medidas Provisórias
elaboradas na clausura de gabinetes – às escondidas... Ao invés de
parlamentar, temos um regime para lamentar... O Governo
sobrecarrega o Poder Legislativo com avalanche de Medidas
Provisórias, em parte inconstitucionais133 por vício de origem por
faltar urgência ou relevância que justifiquem a edição.

131
Você já assistiu um Júri, ou filme que o retrate? Então percebeu a demora do Conselho,
debatendo, antes de decidir. Todos querem opinar. Consegue imaginar um Júri com centenas de
componentes? Enquanto um fala, outro sai. Quando volta, pede a palavra para dizer algo que já foi
debatido. Nisto, chega outro e começa quer tratar de outro assunto, igualmente importante. Quando nos
damos conta, esse “júri” está tratando de centenas de assuntos ao mesmo tempo. Um Júri assim não
chegará a uma conclusão. Assim, é natural que o Congresso tenha dificuldade de editar leis, devido ao
seu gigantismo.
132
E derruba mesmo ! É a distinção entre ser Presidente pelo prazo previsto na eleição no Sistema
Presidencialista de Governo – o que leva o Eleito a se sentir DONO DO PODER - e estar na Chefia do
Governo enquanto desfruta da confiança do parlamento no Sistema Parlamentarista de Governo.
133
A Constituição Federal exige que haja vigência e relevância para justificar a edição de Medida
Provisória. Veja mais em: “Controle jurisdicional do abuso de medidas provisórias” in Adv Advocacia
Dinâmica COAD, Boletim Informativo Semanal nº 28/95, 14 de julho de 1995, p. 307-305; e
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 78

O Poder Econômico134 articulou-se para concentrar o Poder no


Executivo e, hoje, o Presidente da República tem mais poder do que os
Militares, que possuíam menos recursos e cujos Decretos-leis estavam
limitados à segurança nacional e finanças públicas. Esvaziado o poder do
Congresso Nacional, nos anos noventa o Poder Econômico focou no
Judiciário. Havia dezenas de milhares de juízes no país. Contudo, a
descoberta de apenas um corrupto - exceção confirmando a regra de
licitude - levantou suspeitas de corrupção sobre todas categorias de
magistrados. Os integrantes do Judiciário, profissionais da justiça,
técnicos, estavam em desvantagem pois não dispunham de experiência
para lidar com essa situação. Os políticos queriam o controle externo da
magistratura na pauta de reformas constitucionais135.

16. Do quarto poder:


O 4º Poder numa nação é o “econômico” controlando a opinião
pública e, através dela, os políticos usando os recursos da mídia.
Diferente dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, cujos
detentores são ostensivos, o Quarto Poder atua dissimuladamente e as
manipulações e interesses ocultos, não raro inconfessáveis, são ocultados
da população – a maioria sequer tem idéia de sua existência.
A capacidade da mídia de construir e destruir lideranças136 é
impressionante. Vejam os exemplos: Até 1988, exceto em Alagoas, pequeno
Estado, um dos menores do país, dotado de poucos recursos e pequena
população, Fernando Collor de Mello era um ilustre desconhecido. A Rede
Globo era associada às organizações da família Arnon de Mello e apoiou a
candidatura do governador das Alagoas. A novela "Que rei sou eu" foi levada
ao ar no ano de 1989, de 13 de fevereiro a 16 de setembro ou seja, nos
poucos meses de euforia política, que antecediam à primeira eleição direta
para Presidente da República – na reabertura política depois de décadas de
jejum eleitoral.

“Imparcialidade Judicial versus Discricionariedade Administrativa” in Revista da Faculdade de Direito


da UFRGS, v.12, 1996, p.209-215, também em www.padilla.adv.br/teses.
134
Interessa ao Poder Econômico que os poderes fiquem concentrados num só órgão, a Presidência
da República. É muito mais difícil controlar um poder diluído.
135
Seriam manifestações de preocupação da sociedade em manter ou resgatar o controle de seus
destinos diante de um Judiciário repleto de questões resolvidas insatisfatoriamente ? Será ? Então
vejamos: Alguma vez, em toda história deste país, distribuiu-se tanta Justiça à população quanto agora
? Claro que não. Todas camadas sociais têm acesso ao Judiciário - cada vez mais ágil e preocupado em
distribuir justiça eficaz. A população está satisfeita com o Judiciário ? Claro que sim ! Perguntar-se-ia,
porque pertinente: Então de onde vem esse suposto desejo de controlar o Judiciário ?
136
Referências bibliográficas: tese da professora Sandra Garcia Fabbrin à banca formada pelos
professores Lucienne Cornu, da Université Aix-Marseille II (França) & Henri Dou da Université Aix-
Marseille III (França), e Salvato Trigo, da Universidade do Porto (Portugal), no Projeto Europa-
Mercosul, da FULP, em 24-9-1994 & Guy Debord, A sociedade do espetáculo, 1959.
Página 79 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

"Que rei sou eu", de Cassiano Gabus Mendes, era ambientado


no “Reino de “Avilan” (leia a-vi-lã). Sob o pretexto de uma inocente analogia
entre os anos que antecederam à Revolução Francesa (1786) com o
processo de abertura política do Brasil do final dos anos oitenta. Mesclava
ficção e realidade, procedimento usado para conferir credibilidade à
mensagem subliminar: O inconsciente do espectador não distingue onde
termina a realidade e começa a fantasia...

Apesar da riqueza de Avilan o povo passava necessidades. O


poder estava nas mãos de uma corja de fanfarrões desonestos - alusão aos
políticos corruptos.
Uma escrachada Rainha Valentina, representada com graça
irreverente pela atriz Teresa Rachel, era enganada pelos desonestos e
estava perdida, alusão à incerteza nos rumos do Brasil. No último capítulo,
índice altíssimo de Ibope, a mídia escancarou a intenção: ao invés da
bandeira da França, ou de uma fictícia, foi hasteado o Pavilhão Nacional
Brasileiro. O “herói” aparecia na tela com cores verde e amarelo
emoldurando uma cara de quase adolescente explicando que estavam
mudando o nome do “reino” para Brasil, e que tudo seria melhor, enquanto,
a mocinha ao seu lado, e todos ao fundo, mostravam-se muito satisfeitos.
Na novela, o jovem herói havia surgido do nada. Teria
legitimidade para aspirar ao poder por ter sangue nobre – seria filho
bastardo do rei morto. Hábil mensagem subliminar para a aceitação de
Fernando Collor, muito jovem para ser Presidente, desconhecido até
ontem... Collor era um desconhecido e muito jovem para o cargo de
Presidente da República ao qual aspirava. Vinha de linhagem “nobre” –
descendente de Lindolfo Collor, de família “tradicional” oriunda de São
Leopoldo (RS) e que conquistou riqueza em Alagoas. O personagem,
representado pelo ator Edson Celulari, guardava até semelhanças físicas
com Collor, jovem, atlético, bem apessoado, com discurso calmo, muito
articulado, e gestos estudados.
A imprensa passava imagem de Collor como a de um
Governador caçador de marajás... O tipo de político “corajoso” capaz de
colocar o país em Ordem e Progresso.

Collor era órfão de pai – exatamente como o “herói” da novela.


A novela sedimentou bases subliminares para a população
confiar os destinos do país nas mãos de um jovem desconhecido de um
pequeno estado nordestino, enquanto o restante da mídia amiga insistia na
imagem de corajoso “caçador de marajás”.
Eleito, Collor sentiu-se legitimado, como primeiro presidente
eleito por uma inteira geração, dono do Poder. Começou com um confisco
mais logo entrou em rota de colisão com o poder econômico. Foi o período
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 80

de menor carga tributária da história recente. Como é o povo quem paga os


impostos (www.padilla.adv.br/etica/impostos), isso pouco interessa ao
poder econômico, que também desgostou das decisões de liberar
importações, obrigando os fabricantes nacionais a produzirem bens
melhores. Os veículos produzidos até 1990 eram, como Collor disse,
“carroças”. Em poucos anos houve uma revolução na qualidade dos
produtos também pelo código do consumidor que Collor batalhou para
aprovar (Lei 8078/90). Quando a Rede Globo rompeu com Collor a
estratégia foi a mesma, mensagens subliminares para produzir o resultado
inverso, destruir a liderança antes forjada.

A ameaça de impeachment era improvável diante da força


econômica e política concentradas no Poder Executivo. Collor não foi o
primeiro governante com membros da equipe acusados de envolvimento em
corrupção. Mas a imprensa – coordenada por seus inimigos, foi implacável.
Acuado, Collor defendeu-se requisitando espaço na mídia na condição de
Presidente da República. Queria apoio popular para, somar ao poder
político e econômico da Presidência, e “abafar” o Congresso Nacional. A
guerra pela mídia foi o fim de Collor – lutava no terreno de seus algozes.
A Rede Globo colocou no ar uma minissérie “Anos rebeldes”.
Denis Carvalho usou a mesma fórmula de Que rei sou eu - mesclou ficção e
realidade para dar credibilidade à mensagem subliminar. Centrava-se nos
anos 60, adolescentes oriundos das classes mais favorecidas. Cláudia
Abreu representou a filha de um banqueiro financiador da ditadura. Uma
dondoca que virou heroína porque ingressou na luta armada. Os heróis,
adolescentes de fascinante pureza e extremamente preocupados com as
questões sociais do país, colocavam a militância política acima da própria
felicidade e realização pessoal. A minissérie incitou o subconsciente dos
jovens à reviravolta, ampliou o desejo revolucionário inconsciente no
adolescente.
Collor requisitou novamente espaço na mídia - para quinta-
feira, dia 13-8-1992, no horário nobre. Falaria em cadeia nacional e
pretendia captar apoio da população - saírem às ruas, no final de semana,
usando as cores verde-amarelo. Essa requisição de espaço foi comunicada à
imprensa com 72 horas de antecedência. Ao saber, a Rede Globo acelerou o
final da minissérie concluindo a mensagem subliminar. A história se
arrastava há três semanas; estrategicamente, para atuar em coordenação,
foi acelerada, e todos capítulos compactados para terminar na sexta-feira.
Lembram o que aconteceu naquele final de semana ? Domingo - dia 16 de
agosto de 1992 – horas após o final a minissérie – levada ao ar entre 14 de
julho a 14 de agosto de 1992 – Milhares de jovens saíram às ruas com
roupas e caras pintadas de preto para expressar rebeldia. A imprensa
exagerou, no espaço, manchetes, capas, reforçando a conotação de “heróis”
aos jovens, e o movimento dos cara pintadas, que iniciou com cerca de dois
Página 81 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

mil jovens, espalhou-se pelo país. A imprensa incentivou a continuidade da


manifestação, ao mesmo tempo que cobrou dos políticos o andamento do
processo de impeachment.

Fernando Collor de Mello foi inventado pela mídia da Rede


Globo, então associada à família Arnon de Mello. Ocupou a função mais
poderosa do país, a chefia de Estado e de Governo, um Poder Executivo
com a concentração de forças econômicas e políticas. Contudo, a
capacidade da mídia de construir e destruir lideranças é tão grande que,
três anos depois, quando entrou em conflito com esse grupo que controla o
Poder Econômico, foi destruído pela mesma máquina midiática. O
Presidente Lula chegou ao poder com expressiva votação no 1º turno, em
sua primeira eleição, prometendo melhorar o país. Aumentou a carga
tributária 137 e multiplicou a corrupção. Alardeia grandes benefícios,
contudo, a segurança, a saúde, a educação e a qualidade de vida
apresentam-se precárias.138

17. Do Princípio da legalidade e o juiz imparcial:


A imparcialidade do órgão julgador é uma das principais garantias
do jurisdicionado. O Estado-juiz 139 deve adotar posição eqüidistante de ambas
partes (CPC art. 125-I); na ordem legal, ouve ambas. 140 Essa imparcialidade é
um dos principais elementos que separam e distinguem a jurisdição de outras
atividades estatais. Chiovenda 141 referia-se à Jurisdição como atividade
estatal realizando o direito positivo142 através de um terceiro-imparcial.

137
www.padilla.adv.br/etica/tributos
138
O alardeado projeto “Fome Zero” nada distribuiu de alimentos no primeiro ano. Compare ao
Rotary que distribui toneladas, através do “banco de alimentos”, sem alarde www.padilla.adv.br/rotary
139
Chamamos o Juiz de “Estado-Juiz” porque este é o órgão do Poder Judiciário (Constituição
Federal art.92) e quando decide é o Estado, por um de seus poderes, que se manifesta.
140
Como o processo é uma sucessão de atos, e deve respeitar a legalidade e contraditório, o Juiz
ouve ambas as partes. Em geral, autor, depois o réu,. Mas pode ser o contrário: Quando o réu junta um
documento referido ser importante para a solução da controvérsia, o juiz só vai decidir depois de “ouvir”
o autor (art. 398 CPC). A expressão, de uso corrente no Foro, “autos conclusos”, ou “conclusão ao Juiz”,
deriva do procedimento correto, de que o processo só é posto na mesa do Magistrado para decidir e,
portanto, dar ao processo (e à situação real que o originou) uma solução de continuidade isto é,
“concluindo” o procedimento.
141
Giuseppe Chiovenda, Princippi di diritto processuale civile, § 2º, ou na edição brasileira das
Instituições de Direito Processual Civil, na excelente tradução anotada por Liebman.
142
Chiovenda usou a expressão “direito positivo” porque consagrada pela primeira geração de
processualistas, especialmente Rosenberg, que tratavam jurisdição como “atividade estatal que realiza o
direito positivo”, definição insuficiente porque todos poderes do Estado realizam o direito positivo, pois
não podem agir fora da lei. Contudo, o Juiz faz mais do que realizar o “direito positivo”. Porque mesmo
não havendo “direito positivo”, isto é, leis a respeito da matéria a decidir, o Juiz não se exime de
sentenciar, usando a analogia com outras normas de casos similares, os costumes e, por fim, os princípios
gerais do direito para construir uma solução. Logo, o Juiz decide fazendo Justiça, que é um conceito mais
amplo que o direito positivo este pode ser omisso, ou contraditório indicando direções opostas. Como
pontificou o Min. Garcia Vieira “O direito é muito maior do que a lei (direito positivo) e seu objetivo é a
realização de Justiça” www.padilla.adv.br/normajuridica.mht.
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 82

Carlos Alberto Alvaro de Oliveira e Daniel Mitidiero


destacam a imparcialidade como condição, sine qua non, da
jurisdição “...sem a qual não pode haver processo justo...
consagrada no art. 10 da Declaração Universal dos Direitos do
Homem (1948) e no art. 8º, 1, da Convenção Americana sobre
Direitos Humanos, introduzida no direito interno brasileiro pelo Decreto
Legislativo nº 27/2 (DOE de 28.5.1992) 143.

O Estado proíbe as partes agir uma em relação à outra,


mas lhes dá o direito de agir perante um órgão estatal imparcial. A
imparcialidade é a máxima justificativa da existência do Poder
Judiciário. Aproxima a atividade jurisdicional do ideal de justiça.
Um terceiro imparcial, desinteressado na solução, decide. Reveste a
jurisdição de respeitabilidade. Afinal, fosse para o Estado decidir
com parcialidade, melhor seria deixar às partes resolverem seus
conflitos sem interferência estatal, economizando tempo e recursos
públicos.
As leis processuais estão repletas de regras sobre a
imparcialidade do juiz 144. A simples possibilidade de parcialidade é
fundamento suficiente para rescindir a sentença transitada em
julgado proferida por juiz impedido; tanto no processo civil (art.
485-II, CPC) quanto no processo do trabalho (Súmula 194 do TST).
O legislador permite ai rescisão das sentenças cíveis-trabalhistas
apenas por impedimento. Não permite nos casos de mera
suspeição, por razões de política judiciária. As situações de
impedimento são objetivas, documentalmente comprováveis (art.
134-CPC). A suspeição, é subjetiva; envolve valoração de eventual
interesse no litígio 145 ou da natureza e intensidade de ligações

143Carlos Alberto Alvaro de Oliveira e Daniel Mitidiero, Curso de Processo Civil, Atlas,
2010, v.1, p. 31, grifamos
144
Algumas das regras que asseguram a imparcialidade nos processos judiciais civis, trabalhistas e
penais:
CPC arts.134 a 138 - cujas relações não são exaustivas, conforme lição de Calmon de Passos, nos
Comentários... (Forense), p.302.
CLT arts.801 e 802.
CPP arts.96, 97, 103, 106, 107, 254, 255, 258, 458, 460, 564-I
Cód. Proc. Penal Militar arts.37 a 41
O processo administrativo disciplinar ressente-se da falta de um código único mas todos diplomas
que regulamentam as centenas de procedimentos, em cada órgão da administração, contém regras
semelhantes, ou remetem aos códigos processuais.
145
Compare os casos de impedimento com os de suspeição: CPC, Art. 134. É defeso ao juiz exercer
as suas funções no processo contencioso ou voluntário: I - de que for parte; II - em que interveio como
mandatário da parte, oficiou como perito, funcionou como órgão do Ministério Público, ou prestou
depoimento como testemunha; III - que conheceu em primeiro grau de jurisdição, tendo-lhe proferido
sentença ou decisão; IV - quando nele estiver postulando, como advogado da parte, o seu cônjuge ou
qualquer parente seu, consangüíneo ou afim, em linha reta; ou na linha colateral até o segundo grau; V -
quando cônjuge, parente, consangüíneo ou afim, de alguma das partes, em linha reta ou, na colateral, até
o terceiro grau; VI - quando for órgão de direção ou de administração de pessoa jurídica, parte na causa.
Página 83 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

Parágrafo único. No caso do no IV, o impedimento só se verifica quando o advogado já estava


exercendo o patrocínio da causa; é, porém, vedado ao advogado pleitear no processo, a fim de criar o
impedimento do juiz.
Art. 135. Reputa-se fundada a suspeição de parcialidade do juiz, quando: I - amigo íntimo ou
inimigo capital de qualquer das partes; II - alguma das partes for credora ou devedora do juiz, de seu
cônjuge ou de parentes destes, em linha reta ou na colateral até o terceiro grau; III - herdeiro presuntivo,
donatário ou empregador de alguma das partes; IV - receber dádivas antes ou depois de iniciado o
processo; aconselhar alguma das partes acerca do objeto da causa, ou subministrar meios para atender às
despesas do litígio; V - interessado no julgamento da causa em favor de uma das partes. Parágrafo
único. Poderá ainda o juiz declarar-se suspeito por motivo íntimo. CLT, Art. 801- O juiz, presidente ou
juiz classista, é obrigado a dar-se por suspeito, e pode ser recusado, por algum dos seguintes motivos, em
relação à pessoa dos litigantes:
a) inimizade pessoal; b) amiz ade íntima; c) parentesco por consangüinidade ou afinidade até o
terceiro grau civil;
d) interesse particular na causa. Parágrafo único- Se o recusante houver praticado algum ato pelo
qual haja consentido na pessoa do juiz, não mais poderá alegar exceção de suspeição, salvo sobrevindo
novo motivo. A suspeição não será também admitida, se do processo constar que o recusante deixou de
alegá-la anteriormente, quando já a conhecia, ou que, depois de conhecida, aceitou o juiz recusado ou,
finalmente, se procurou de propósito o motivo de que ela se originou.
Art. 802 - Apresentada a exceção de suspeição, o juiz ou Tribunal designará audiência dentro de 48
(quarenta e oito) horas, para instrução e julgamento da exceção. § 1º- Nas Juntas de Conciliação e
Julgamento e nos Tribunais Regionais, julgada procedente a exceção de suspeição, será logo convocado
para a mesma audiência ou sessão, ou para a seguinte, o suplente do membro suspeito, o qual continuará
a funcionar no feito até decisão final. Proceder-se-á da mesma maneira quando algum dos membros se
declarar suspeito. § 2º- Se se tratar de suspeição de Juiz de Direito, será este substituído na forma da
organização judiciária local; e CPP Art. 96 - A argüição de suspeição precederá a qualquer outra, salvo
quando fundada em motivo superveniente. Art. 97 - O juiz que espontaneamente afirmar suspeição
deverá fazê-lo por escrito, declarando o motivo legal, e remeterá imediatamente o processo ao seu
substituto, intimadas as partes. Art. 103 - No Supremo Tribunal Federal e nos Tribunais de Apelação, o
juiz que se julgar suspeito deverá declará-lo nos autos e, se for revisor, passar o feito ao seu substituto na
ordem da precedência, ou, se for relator, apresentar os autos em mesa para nova distribuição. § 1º - Se
não for relator nem revisor, o juiz que houver de dar-se por suspeito, deverá fazê-lo verbalmente, na
sessão de julgamento, registrando-se na ata a declaração. § 2º - Se o presidente do tribunal se der por
suspeito, competirá ao seu substituto designar dia para o julgamento e presidi-lo. § 3º - Observar-se-á,
quanto à argüição de suspeição pela parte, o disposto nos arts. 98 a 101, no que Ihe for aplicável,
atendido, se o juiz a reconhecer, o que estabelece este artigo. § 4º - A suspeição, não sendo reconhecida,
será julgada pelo tribunal pleno, funcionando como relator o presidente. § 5º - Se o recusado for o
presidente do tribunal, o relator será o vice-presidente. Art. 107 - Não se poderá opor suspeição às
autoridades policiais nos atos do inquérito, mas deverão elas declarar-se suspeitas, quando ocorrer
motivo legal. Art. 254 - O juiz dar-se-á por suspeito, e, se não o fizer, poderá ser recusado por qualquer
das partes: I - se for amigo íntimo ou inimigo capital de qualquer deles; II - se ele, seu cônjuge,
ascendente ou descendente, estiver respondendo a processo por fato análogo, sobre cujo caráter
criminoso haja controvérsia; III - se ele, seu cônjuge, ou parente, consangüíneo, ou afim, até o terceiro
grau, inclusive, sustentar demanda ou responder a processo que tenha de ser julgado por qualquer das
partes; IV - se tiver aconselhado qualquer das partes; V - se for credor ou devedor, tutor ou curador, de
qualquer das partes; Vl - se for sócio, acionista ou administrador de sociedade interessada no processo.
Art. 255 - O impedimento ou suspeição decorrente de parentesco por afinidade cessará pela dissolução do
casamento que Ihe tiver dado causa, salvo sobrevindo descendentes; mas, ainda que dissolvido o
casamento sem descendentes, não funcionará como juiz o sogro, o padrasto, o cunhado, o genro ou
enteado de quem for parte no processo. Art. 258 - Os órgãos do Ministério Público não funcionarão nos
processos em que o juiz ou qualquer das partes for seu cônjuge, ou parente, consangüíneo ou afim, em
linha reta ou colateral, até o terceiro grau, inclusive, e a eles se estendem, no que Ihes for aplicável, as
prescrições relativas à suspeição e aos impedimentos dos juízes. Art. 458 - Antes do sorteio do conselho
de sentença, o juiz advertirá os jurados dos impedimentos constantes do art. 462, bem como das
incompatibilidades legais por suspeição, em razão de parentesco com o juiz, com o promotor, com o
advogado, com o réu ou com a vítima, na forma do disposto neste Código sobre os impedimentos ou a
suspeição dos juízes togados. § 1º - Na mesma ocasião, o juiz advertirá os jurados de que, uma vez
sorteados, não poderão comunicar-se com outrem, nem manifestar sua opinião sobre o processo, sob
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 84

emocionais. Em questões de grande interesse econômico, o


perdedor, inconformado, por criar situações destinadas a semear
dúvidas quanto à existência de interesse, induzindo a suspeição.
Pode ser facilmente provocado um encontro entre juiz e parte ou
advogado, e “industriar” toda sorte de situações. E sempre haverá
dúvida: havia, ou não, motivos para suspeição ? Essas dúvidas
não podem afetar a eficácia material da coisa julgada: Os Processo
Civil e Trabalhista contentam-se com a verdade formal, porque os
direitos envolvidos são, em maior parte, disponíveis.
O processo penal é mais rigoroso, e prefere um potencial
culpado solto do que um possível inocente preso. A suspeição é
causa de nulidade do processo penal, tal como o impedimento (art.
564-I, CPP). Mas é inadmissível revisão criminal com
embasamento na suspeição ou impedimento do juiz, porque as
hipóteses do art. 621 do CPP são taxativas146. Na prática, contudo,
o impedimento ou a suspeição do juiz, hipóteses de nulidade ex
lege (CPP, art. 564-I) são fundamentos para habeas corpus anular
sentença transitada em julgado ou cassar seus efeitos (CPP, art. 648-VI).
Aquela mesma dúvida sobre existência, ou não, de interesse
fundado em suspeição, dúvida insuficiente para rescindir a
sentença transitada em julgado no processo civil ou trabalhista - no
processo penal conduz à anulação do processo. No processo penal
a verdade formal é temperada pelo princípio in dubio, pro réu,
exigindo maior rigor na prova para condenação. A dúvida, afasta a
possibilidade de condenar.
Essa principiologia estará presente nos demais direitos
processuais essencialmente punitivos, como o administrativo
disciplinar, e o desportivo disciplinar. Nestes, também vigora o
mesmo princípio “in dúbio, pro réu”. Mas é diferente no processo
eleitoral, com respeito às penas de cassação de mandato. O
processo eleitoral possui natureza punitiva imprópria porque em
conflito com o princípio da inocência até prova em contrário 147
estão direitos públicos mais importantes. O artigo 1º-II da
Constituição Federal impõe supremacia da cidadania sobre a
dignidade da pessoa humana. Quer dizer: A tutela do sistema
representativo – via eleição, é mais importante do que direitos

pena de exclusão do conselho e multa, de duzentos a quinhentos mil-réis. § 2º - Dos impedidos entre si
por parentesco servirá o que houver sido sorteado em primeiro lugar. Art. 460 - A suspeição argüida
contra o presidente do tribunal, o órgão do Ministério Público, os jurados ou qualquer funcionário,
quando não reconhecida, não suspenderá o julgamento, devendo, entretanto, constar da ata a argüição.
Art. 564 - A nulidade ocorrerá nos seguintes casos: I - por incompetência, suspeição ou suborno do juiz;
146
Florêncio de Abreu (Comentários ao CPP, RJ, 1945, v.V, p.415, n.199) e Rogério Lauria Tucci
(Persecução penal, prisão e liberdade, Saraiva., 1980, p.287).
147
O direito do réu à absolvição penal exceto havendo prova suficiente para condenação.
Página 85 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

individuais de um candidato eleito com suspeita de fraude.


Havendo elementos de convicção denotando fraude no processo
eleitoral, a dúvida razoável, com elementos de convicção indicando
fraude, constitui fundamento para a Justiça Eleitoral cassar o
mandato e diplomação. Há de se ponderar, unicamente, a
possibilidade de preservar os votos em favor da legenda quando a
fraude paira unicamente na pessoa física do candidato.

18. Da Evolução do processo como Ciência:


A megalomania nazista e as atrocidades da guerra apressaram
Enrico Túlio Liebman a peregrinar para o Brasil, trazendo notável
progresso a nossa ciência processual. A península italiana, efervescente de
pensadores - era palco a longo processo dialético, do qual Liebman vinha
impregnado. Os civilistas teciam duras críticas aos estudiosos da
ciência processual. Sugeriam que o processo seria apêndice do direito
material e, sozinho, não tinha razão de existir. Referiam que tanto na
Itália, quanto no Brasil, as prateleiras das livrarias continham mais
obras de direito adjetivo que de direito material, o que qualificavam de
grande perda de tempo. Chegavam a atribuir esse fenômeno ao fato
de que em ambos países eram abundantes os bons vinhos,
estimulando a discussão em torno de “inutilidades” (sic). As críticas
não prosperam. No atual estágio da sociedade, o direito material não
teria como existir sem o direito processual. O direito processual
coloca a disposição das partes a possibilidade da coerção estatal
conferindo respeitabilidade e efetividade ao direito material. Ambos,
direito adjetivo e substantivo, convivem lado a lado e com a mesma
importância. Procurar desenvolver um, sem dar a mesma impulsão ao
outro, é inutilidade. O professor Clóvis Couto e Silva insistia na
idéia – a mesma de Pontes de Miranda, de que um jurista só é
completo se conhece direito processual e direito material
www.padilla.adv.br/clovis.htm Parafraseando Calamandrei148
civilistas e processualistas são como espelhos: cada um deles olhando
para o interlocutor, reconhece e saúda, reflete em si mesmo a própria
dignidade.
A permanência de Liebman no Brasil ensejou a criação
do que Niceto Alcalá-Zamora y Castillo carinhosamente denominou
“Escola Paulista de Direito”, integrada por juristas de primeira
grandeza, como Luis Eulálio Bueno de Vidigal149 ou Galeno Lacerda
mas cujo expoente mais ilustre foi Alfredo Buzaid que – em 1973,

148
A citação parafraseada foi colhida de trabalho nosso na Revista de Processo RT v.55, p. 200,
baseado no clássico de Calamandrei: “Eles, os juízes, vistos por nós, os advogados” acessível em
www.padilla.adv.br/teses.
149
Vidigal se tornou conhecido em todo Brasil como empresário e presidiu a FIESP.
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 86

como Ministro da Justiça, teve o privilégio de encaminhar à sanção


presidencial a Lei, aprovada pelo Congresso, contendo o novo Código
de Processo Civil que ele próprio, Buzaid, duas décadas antes havia
elaborado. O CPC de 1973 é impregnado pelas idéias revolucionárias
que Liebman semeou nos estudiosos de direito processual brasileiros.
Dando continuidade ao enorme progresso que Liebman iniciou, novas
gerações de processualistas legaram sucessivas reformas e
aperfeiçoamentos. O CPC brasileiro é uma das mais modernas
legislações do mundo e suas inovações estão sendo copiadas por
sucessivos países. 150

19. Podemos conceituar jurisdição?


Na discussão com civilistas, Rosemberg 151 havia
esboçado conceito de jurisdição 152 como “atividade estatal que
realiza o direito objetivo”. O Conceito é insatisfatório porque toda
atividade estatal realiza o direito... Aliás, o administrador público
tem de agir dentro da Lei, ou termina na cadeia...
Giuseppe Chiovenda propôs conceito de Jurisdição como
atividade substitutiva. O Estado substitui as partes. Esse conceito
não chegou a amadurecer porque seu arqui-rival, Francesco
Carnelutti153, havia elaborado um conceito distinto: Jurisdição
como atividade estatal que soluciona a lide – sendo esta, por sua
vez, o conflito de interesses qualificado pela pretensão resistida154
que, para Carnelutti, seria o principal fator ao qualificar a
jurisdição. Seus seguidores, criticavam Chiovenda alegando não ser
possível vislumbrar a substituição no processo penal, e muito
menos na chamada jurisdição voluntária155.

150
Veja www.padilla.adv.br/ibdp
151
Na verdade, Leo ROSEMBERG não foi o único a formular essa idéia no Tratado de derecho
procesal civil . Pode ser encontrada também, dentre outros, em Adolf WACH, Manual de derecho
procesal civil; Adolf SCHÖNKE, Derecho procesal civil; todos disponíveis em boas traduções
espanholas
152
Jurisdição é aglutinação de duas palavras: juris , genitivo singular da 3ª declinação, significando
“do direito”, e dictio, nominativo singular da mesma declinação, isto é, dicção, ou dição, ato de dizer; de
dicere, dizer. Corresponde, portanto, a dizer o direito.
153
Francesco Carnelutti, Sistema di diritto processuale civile, 1936, v.I, p.131:269
154
Opus et locus citatum.
155
Para entender melhor a jurisdição voluntária, façamos uma comparação: Voluntas x litis. Na litis
– processo contencioso – por exemplo um pedido de reintegração de posse: o interessado(parte) solicita
a tutela jurisdicional porque, diante da recusa da parte adversa de cumprir o que manda a lei ou contrato,
a única forma de solucionar o litígio é pedir ao Estado-Juiz uma providência - porque o Estado proíbe o
exercício das próprias razões (no art.345 Código Penal): A qualquer momento as partes podem convir
num acordo no qual, mediante concessões recíprocas, ou mesmo unilaterais, podem resolver a questão
independente de decisão judicial. O juiz possui controle apenas sobre o conteúdo formal do acordo, e as
partes possuem poder discricionário de praticar o ato.
Na voluntas - jurisdição voluntária - como num pedido de homologação de separação judicial, os
interessados solicitam a tutela jurisdicional independentemente de litígio. O casal pode estar em
comum acordo com respeito a todas cláusulas e condições. O Estado substitui as partes (interessados) no
Página 87 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

O objetivo de criticar o rival tanto cegou Carnelutti e


séqüito que não perceberam que suas críticas ao adversário
amoldavam-se melhor contra sua própria tese.
Aproveitando-se do impasse entre os dois grandes
processualistas, Enrico Allorio 156 pegou uma idéia originalmente de
Piero Calamandrei 157 de que o ponto de partida para definir a
jurisdição seria a coisa julgada. Define coisa julgada o art. 467 do
CPC: coisa julgada material é a eficácia que torna imutável e indiscutível a sentença, não mais
sujeita a recurso ordinário ou extraordinário. 158 A parte não pode discutir o que
restou decidido não apenas no próprio processo (art.473 do CPC),
mas em qualquer outro (art. 468 do CPC). A sentença, que julgar
total ou parcialmente a lide, tem força de lei nos limites da lide e
das questões decididas. Se tem força de Lei, deve ser obedecida, e
não discutida. Faz coisa julgada no cível (CPP art.65) a sentença
penal reconhecendo os casos que excluem a ilicitude: estado de
necessidade, legítima defesa, estrito cumprimento de dever legal ou
no exercício regular de direito.159
Allorio refere-se a coisa julgada como a pedra de toque
para distinguir a jurisdição dos demais atos do Estado. Essa
tese floresceu com a adesão, dentre outros, do maior processualista
latino americano Eduardo Couture160 e, através dele, no Brasil, de
Lopes da Costa161, Arruda Alvim, e José Frederico Marques,
entre muitos outros.
No primeiro momento, a imutabilidade da coisa julgada
parece adequado ponto de partida para definir jurisdição. Os atos

exame da conveniência de praticar o ato. As partes não dispõem de tal exame. A conveniência do ato
que pretendem praticar, e seus efeitos, estão sujeitas ao exame judicial porque – para a segurança da
sociedade, é indispensável o controle desses atos na legalidade e conveniência (interesse de menores, por
exemplo).
156
Enrico Allorio, La cosa giudicata rispetto terzi, 1935 & problemas del derecho procesal, II,
tradução espanhola, Buenos Aires
157
Piero Calamandrei, Limites entre jurisdición y administración en la sentencia civile, nos
Estudios sobre el proceso civil, tradução argentina de 1961, p.48
158
O CPC define institutos comuns a todos ramos processuais. Outros códigos ora remetem ao CPC
via analogia, com o CPP art.3º e a CLT art. 769, ora reproduzem literalmente dezenas de artigos do CPC,
como fez o recente C.B.J.D. editado no final de 2003(www.padilla.adv.br/desportivo/código)
159
O exercício abusivo é ilícito: veja em www.padilla.adv.br/teses
160
Eduardo Couture, Fundamentos del derecho procesual civil, 1958, p.42.
161
Lopes da Costa “Direito Processual Civil Brasileiro” 1959, 2ª edição, Forense, um monumental
tratado originalmente publicado em 1941, sem dizer das demais obras: “Da citação no processo civil”
(Belo Horizonte, Imprensa Oficial, 1927); Da responsabilidade do herdeiro e dos direitos do credor da
herança (São Paulo, Saraiva, 1928); Direito Profissional do Cirurgião Dentista (idem); Da intervenção
de terceiros no processo (São Paulo, C. Teixeira & Cia, 1930); (1941); Medidas preventivas - medidas
preparatórias - medidas de conservação (1953, 3ª ed. em 1966, ed. Sugestões Literárias S.A); Manual
Elementar de Direito Processual Civil (Forense, 1956); A administração pública e a ordem jurídica
privada (Belo Horizonte, Bernardo Álvares, 1961); “Demarcação - divisão tapumes - condomínio -
paredes-meias (ed. Bernardo Álvares, 1963).
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 88

administrativos podem ser revistos e, inclusive, “a administração


pública pode declarar a nulidade dos seus próprios atos” conforme
Súmula nº 346 do STF. Mas Allorio cometia o mesmo deslize de
Carnelutti: pressa em criticar. Quem tem telhado de vidro. A tese de ser a
“coisa julgada” ideal para definir jurisdição esfarela-se diante de
simples constatações de decisões judiciais que não transitam em
julgado:
CPC à Art. 471. Nenhum juiz decidirá novamente as questões já decididas, relativas
à mesma lide, salvo:
I - se, tratando-se de relação jurídica continuativa, sobreveio modificação no estado
de fato ou de direito; caso em que poderá a parte pedir a revisão do que foi estatuído
na sentença;
II - nos demais casos prescritos em lei.

Decisões sobre situações continuativas como alimentos,


guarda, visitas, etc., não transitam em julgado, podendo ser
revistas quando necessário. Não é só isso: Toda e qualquer decisão
prolatada em processo de Jurisdição Voluntária pode ser revista:

CPC, art. 1.111. A sentença poderá ser modificada, sem prejuízo dos efeitos
já produzidos, se ocorrerem circunstâncias supervenientes.

Também não podemos esquecer a possibilidade da ação


rescisória em quaisquer processos de natureza não penal (civil,
comercial, federal, trabalhista, etc..) no prazo de dois anos do
trânsito em Julgado. O que dizer então do processo penal no qual a
revisão criminal que pode ser intentada a qualquer tempo ?

Também não está sujeita a prazo para interposição a


ação anulatória que tenha por objeto a declaração de nulidade da
sentença formalmente transitada em julgado.162 Ou de ação
anulatória tendo por objeto o processo anterior. Sobre tais
sucedâneos veja Teoria Geral dos Remédios, em
www.padilla.adv.br/teses.

162
Querella Nulitatis, confira a tese de Ad roaldo Furtado Fabrício, Revista da Ajuris 42, p.7 e ss.
Veja detalhes no “Sucedâneos Recursais”, em Teoria Geral dos Remédios, disponível em
www.padilla.adv.br/teses.
Página 89 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

Erros de cálculo e inexatidões materiais também não


transitam em julgado, e o juiz pode corrigir (art.463, inc.I, CPC) ou
mandar corrigir até mesmo de ofício.

E nem falamos do fato de que há decisões da


administração que se revestem de imutabilidade semelhante à
judicial, do qual é bom exemplo o processo administrativo
disciplinar com acusado absolvido, que impede de retomar a
discussão, ainda que surjam novas provas.

O conceito de jurisdição pode envolver as idéias de litígio,


ou de coisa julgada, mas ambos não são satisfatórios para
conceituar. O caráter substitutivo da atividade jurisdicional que
propôs Chiovenda, foi contestado por hábeis debatedores que
alegavam inexistir substituição no processo penal e na jurisdição
voluntária. O gran-mestre nunca se interessou por replicar os
críticos.

20. Da substitutividade no processo penal:


No exame superficial do processo penal realmente
parece não existir substituição das partes: Onde (em que ponto) o
Estado substitui as partes ? Deixemos de lado o processo civil
refletindo com profundidade sobre o direito penal e o processo
penal. O grande equívoco é imaginar que o Estado estaria
substituindo à vítima ou familiares. Não vamos negar que a
punição do(s) criminosos(s) pode proporcionar à vítima e familiares
certo conforto. Pode haver benefício direto para a vítima ou familiares: A
condenação do acusado é título executivo judicial163. A vítima é
diretamente interessada na decisão e pode atuar como assistente
da acusação 164. Mas pense bem: Se o MP Ministério Público estivesse

163
CPC, art.485, I, combinado ao art. 63. do CPP : “Transitada em julgado a sentença condenatória,
poderão promover-lhe a execução, no juízo cível, para o efeito da reparação do dano, o ofendido, seu
representante legal ou seus herdeiros.”
164
CPP Art.268. Em todos os termos da ação pública, poderá intervir, como assistente do Ministério
Público, o ofendido ou seu representante legal, ou, na falta, qualquer das pessoas mencionadas no Art.
31. [Art. 31. No caso de morte do ofendido ou quando declarado ausente por decisão judicial, o direito de
oferecer queixa ou prosseguir na ação passará ao cônjuge, ascendente, descendente ou irmão.] Art. 269.
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substituindo a vítima, não haveria necessidade do MP continuar


promovendo a ação quando a vítima intervêm no processo, não é
mesmo ? Mas o que acontece ? A vítima ingressa como assistente
da acusação e acompanha o processo ao lado do Ministério Público, atuando
como litisconsorte 165, buscando finalidade comum, a condenação.
Se o litígio fosse com a vítima, no momento em que esta intervém
não haveria interesse de agir do MP para prosseguir não é mesmo ?
Mas o MP prossegue porque representa a sociedade, e não a vítima.
Recordemos Beccaria: o fundamento do direito de punir
está no propósito de recuperar.
O objeto do processo penal é muito mais amplo do que
a punição do criminoso in casu. O processo penal é um instrumento
do direito penal e, como tal, seu objetivo é a proteção de toda
comunidade contra comportamentos proibidos.
O direito penal lato senso, englobando tanto o direito material quanto o
processual, objetiva manter a paz social definindo condutas criminosas
– proibidas, prevendo punição. Para desestimular os atos proibidos
é preciso que haja punição. E que a punição seja exemplar. Esse é
o desejo da sociedade. Do outro lado, está o acusado pretendendo
preservar a sua liberdade 166.
Para uma nação progredir, e até mesmo existir, é
necessária paz social. Quando um ou mais dos indivíduos sofre
agressão, a sociedade é ameaçada. Se a conduta agressiva não for
reprimida, repetir-se-á, multiplicar-se-á, e em breve toda sociedade
estará comprometida. Por isto o interesse da sociedade: punir
exemplarmente para reprimir condutas criminosas. Ao invés da
sociedade linchar o criminoso, ele é processado. o MP representa o

O assistente será admitido enquanto não passar em julgado a sentença e receberá a causa no estado em
que se achar. Art. 270. O co-réu no mesmo processo não poderá intervir como assistente do Ministério
Público. Art. 271. Ao assistente será permitido propor meios de prova, requerer perguntas às
testemunhas, aditar o libelo e os articulados, participar do debate oral e arrazoar os recursos interpostos
pelo Ministério Público, ou por ele próprio, nos casos dos arts. 584, § 1º, e 598. § 1º O juiz, ouvido o
Ministério Público, decidirá acerca da realização das provas propostas pelo assistente. § 2º O processo
prosseguirá independentemente de nova intimação do assistente, quando este, intimado, deixar de
comparecer a qualquer dos atos da instrução ou do julgamento, sem motivo de força maior devidamente
comprovado. Art. 272. O Ministério Público será ouvido previamente sobre a admissão do assistente.
Art. 273. Do despacho que admitir, ou não, o assistente, não caberá recurso, devendo, entretanto, constar
dos autos o pedido e a decisão.
165
CPC Art. 46. Define o litisconsórcio: Duas ou mais pessoas podem litigar, no mesmo processo, em
conjunto, ativa ou passivamente, quando: I - entre elas houver comunhão de direitos ou de obrigações relativamente
à lide; II - os direitos ou as obrigações derivarem do mesmo fundamento de fato ou de direito; III - entre as causas
houver conexão pelo objeto ou pela causa de pedir; IV - ocorrer afinidade de questões por um ponto comum de fato
ou de direito. Parágrafo único. O juiz poderá limitar o litisconsórcio facultativo quanto ao número de
litigantes, quando este comprometer a rápida solução do litígio ou dificultar a defesa. O pedido de
limitação interrompe o prazo para resposta, que recomeça da intimação da decisão.
166
Sobre norma jurídica e sanção veja capítulo “Teoria Crítica do Direito” disponível em
www.padilla.adv.br/teses.
Página 91 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

interesse da sociedade de punir, propõe ação para que o réu seja


julgado por um 3º que substitui a sociedade na punição.
No processo penal, a parte ativa da lide -isto é a parte autora- é
a sociedade, interessada na imediata punição dos criminosos para
alcançar seu interesse mediato (médio e longo prazo) de prevenir os
litígios (isto é, evitar futuros delitos).
O Estado-Juiz é o terceiro imparcial que examina as
provas decidindo se deve ocorrer a punição do acusado. E, no caso
de crimes dolosos contra a vida, o Estado-Juiz apenas preside o
processo, para preservar a legalidade nos aspectos técnicos, mas o
julgamento é realizado por um corpo de jurados, ou conselho de
sentenças que substitui a sociedade, decidindo se o acusado é
culpado, de que, e em que grau.
O interesse público 167, no processo penal, aproxima-o da
ação civil pública. Nas ações penais privadas, notadamente nas
queixas-crime em delitos contra a honra, vigora o princípio da
conveniência ou dispositivo. A vítima ocupa o pólo ativo, com todos
privilégios processuais, podendo desistir da ação a qualquer
momento, inclusive tacitamente quando não requer a condenação
nas alegações finais. Mas se a ação penal é pública, leia-se, há interesse público, quando
as provas indicam a culpa o Estado-Juiz deve condenar mesmo que o autor da ação não solicite.
Os procedimentos penais criados pela Lei 9.099/95 para
as infrações de menor potencial lesivo está em ponto intermediário
entre as ações penais privadas e as públicas. A idéia de litígio e de
substitutividade ficam ainda mais claras quando o Estado-Juiz
propicia às partes uma tentativa de acordo, semelhante a tentativa
de conciliação na Queixa Crime.
O Estado-Juiz decide substituindo as partes, que são o
grupo pacífico e ordeiro da sociedade em litígio contra o criminoso,
a quem pretendem punir.
O conflito-lide168 esta entre o interesse público de punir o
acusado, com o interesse privado de liberdade do réu (pólo passivo).

167
Se a instrução indica que o acusado não é o autor do crime, o próprio Ministério Público, autor
da ação, deve pedir a absolvição. A punição de um inocente pode ser pior à paz social do que a
impunidade de um possível criminoso. Pode gerar revolta, além de prestar desserviço à credibilidade do
sistema. O processo onde prevalece o interesse público busca a verdade real, embora se manifeste de
formas diversas. No processo eleitoral, a dúvida sobre a legitimidade da eleição implica sua anulação,
porque o interesse público é preservar a representação política (art. 1º - II Constituição Federal).
168
O Estado-Juiz soluciona o conflito para realizar a Justiça que pode não ser, necessariamente, a
superlotação dos presídios.
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O Estado-Juiz é o terceiro imparcial, o aplicador da lei


conciliando o conflito entre o interesse público de punir e o
interesse privado do réu de liberdade.
Há, portanto, lide e substitutividade no processo penal.

21. Porque uma Jurisdição “Voluntária”?


Na “jurisdição voluntária” há uma resistência, da própria ordem
jurídica: Em casos específicos, de determinados institutos aos quais
pressupõe necessidade de tutela especial, exige o concurso de uma
supervisão do Estado-juiz para validar a manifestação de vontade dos
interessados. Etimologicamente, Jurisdição expressa idéia de dizer o
direito, aglutinando dois termos: juris genitivo singular da 3ª declinação do direito +
dictio nominativo singular da mesma declinação dicção, ou dição, ato de dizer; de dicere.
Ao investigar a real expressão, na prática jurídica de quem diz o
direito, percebemos que a idéia expressa no vocábulo contém mais
um componente, a necessidade de dizer o direito. 169

Só há necessidade de dizer o direito havendo um litígio a


ser solucionado. Do contrário, sem controvérsia, não haveria
porque “dizer o direito”. Logo, na ciência processual, jurisdição
pressupõe necessidade de “dizer o direito” que só existe se houver
um confronto, com teses opostas. 170
Sem partes disputando o convencimento do Estado-Juiz
com teses antagônicas, não há interesse ou necessidade de dizer o
direito.
O principal diploma processual é o CPC, do qual
socorrem-se os demais ramos 171. Embora pelo “art. 4o o interesse do

169
Art. 126 - O juiz não se exime de sentenciar ou despachar alegando lacuna ou obscuridade da lei.
No julgamento da lide caber-lhe-á aplicar as normas legais; não as havendo, recorrerá à analogia, aos
costumes e aos princípios gerais de direito.
170
Art. 2º - Nenhum juiz prestará a tutela jurisdicional senão quando a parte ou o interessado a
requerer, nos casos e forma legais. Art. 262 - O processo civil começa por iniciativa da parte, mas se
desenvolve por impulso oficial.
171
O principal diploma processual é o CPC por ser o único a possuir preocupação sistemática
mínima de tratamento de todos institutos do processo. CPC é fonte subsidiária dos Processos Penal, do
Trabalho, Disciplinar, etc... è CLT art. 769. Nos casos omissos, o direito processual comum será fonte
subsidiária do direito processual do trabalho, exceto naquilo em que for incompatível com as normas
deste Título. Art. 8º As autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho, na falta de disposições legais
ou contratuais, decidirão, conforme o caso, pela jurisprudência, por analogia, por eqüidade e outros
princípios e normas gerais de direito, principalmente do direito, e, ainda, de acordo com os usos e
costumes, o direito comparado, mas sempre de maneira que nenhum interesse de classe ou particular
prevaleça sobre o interesse público. Parágrafo único. O direito comum será fonte subsidiária do direito do
trabalho, naquilo em que não for incompatível com os princípios fundamentais deste. Art. 899. Aos
trâmites e incidentes do processo da execução são aplicáveis, naquilo em que não contravierem ao
presente Título, os preceitos que regem o processo dos executivos fiscais para a cobrança judicial da
Página 93 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

autor pode limitar-se à declaração: I - da existência ou da inexistência de


relação jurídica; II - da autenticidade ou falsidade de documento. Parágrafo único. É
admissível a ação declaratória, ainda que tenha ocorrido a violação do direito.” Deve ser interpretado
em conjunto com os dois dispositivos que o antecedem, pelos quais “art. 2 o
nenhum juiz prestará a tutela jurisdicional senão quando a parte ou o
interessado a requerer, nos casos e forma legais.” e, especialmente, o “art. 3 o
Para propor ou contestar ação é necessário ter interesse e legitimidade.”
Nesse contexto, um pedido de “dizer o direito” sem necessidade,
provocada pelo litígio, é caso clássico de extinção do processo por
falta de uma das condições da ação, o interesse processual (art.267
inc. VI, CPC).

Nesse sentido, é do cotidiano da jurisdição o princípio do


contraditório pelo qual as partes buscam convencer o terceiro
imparcial a dizer o direito em seu favor.
Constituição Federal, art.5º, inc.LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são
assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes; (grifamos)

Candido Rangel Dinamarco 172, em feliz alusão científica e


poética de que participar é viver o processo, lembra que o Estado-
Juiz dirige o processo com a colaboração das partes opostas. O
ordenamento jurídico concede ao Estado-Juiz parcela de poder
para cumprimento do dever funcional de solucionar controvérsias.
Os autos não se resumem aos papéis como simples instrumento de
representação, mas um instrumento para a realização do direito e
paz social decidindo entre as versões opostas apresentadas.

A jurisdição - ou seja, o dizer o direito pressupõe teses-


interesses, posições antagônicos entre as quais o Estado-juiz deve
afirmar qual, do ponto de vista jurídico, está correta.

Então, quando o legislador definiu uma modalidade


especial de jurisdição como voluntária, sua preocupação era
expressar que a idéia de litígio entre “partes” é secundária ou

o
dívida ativa da Fazenda Pública Federal.+ CPP art.3º è Art. 3 A lei processual penal admitirá
interpretação extensiva e aplicação analógica, bem como o suplemento dos princípios gerais de direito.
172
Dinamarco, Candido Rangel. Fundamentos... P. 90
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 94

sequer existe naquele processo no qual um ou mais interessados


dirigem-se ao Estado-juiz para requerer formalização, homologação
ou autorização para prática de atos. Quando todos os interessados
não vão, desde logo, formular o pedido de jurisdição “voluntária”, o
Estado-Juiz manda chamar os demais para integrar o processo
através de citação (art.1105 CPC).

Na jurisdição voluntária pode até haver conflito


caracterizando existência de partes, pretendendo resultados
distintos. Mas essa situação de partes opostas não é necessária,
porque o interesse processual – uma das condições da ação (art.3º +
267 inc. VI, CPC) decorre da imposição legal.

Nosso sistema jurídico adota o princípio da liberdade


positiva. Tudo que não for proibido em lei é permitido. Logo após a
principal garantia fundamental da eqüidade e realização da
justiça173 o segundo inciso do art.5º da Constituição traz como
segundo entre os Direitos e Garantias Fundamentais que inc. II - ninguém
será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em
virtude de lei;

Ou seja, somente a Lei pode impor condições para algum


efeito. A Des. Mª Berenice Dias adequadamente registra que "um dos
mais elementares princípios gerais do Direito é o da legalidade positiva, ou
seja, tudo que não é proibido em lei é permitido". (TJRGS, processo nº 70004210514)

A Jurisdição Voluntária é caso de legalidade impositiva.


A Lei obriga o interessado a provocar o Estado-Juiz: “Precisamos
que digas o direito com relação a este ato que pretendemos praticar”.
Os interessados na constituição de novas situações, ou
homologação de atos da vida civil, são obrigados pela Lei a buscar.

173
No art. 5º, caput e inc. I da CF.
Página 95 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

O concurso da vontade fiscalizatória do Estado-Juiz para formação


do ato.

Observe uma separação consensual. O casal está


separado de fato e requer ao Estado-Juiz que homologue o ato
praticado há desoras e o mande averbar no registro civil (art.1124 CPC).
Também são homologados testamentos e codicilos (art.1125 e ss. CPC).

Nos casos de alienações judiciais, o que se pretende é


uma autorização (art.1113); o mesmo acontece na locação de coisa
comum (art.1112). Em todos esses casos, há exigências legais para a
prática dos atos porque o Estado-Legislador retirou dos
interessados a capacidade de decidir sobre a conveniência e
regularidade formal. Para o Estado-Legislador, os interessados não
possuem o direito de agir sozinhos. Para a formação do ato, o
Estado exige que a vontade do interessado seja completada com a
fiscalização de legalidade pelo Estado-Juiz. O Estado-Legislador
impõe que o ato seja supervisionado pelo o Estado-Juiz.

Nas questões ordinárias da vida civil o Estado-Juiz só


atua quando provocado (direito de ação) pela parte prejudicada. Na vida
privada, o Estado-legislador confere aos legislados ampla liberdade
de decidir sobre a conveniência de, relativamente a direitos
disponíveis, adotar os comportamentos possíveis não ilícitos. (CF
art. 5º II). Há incontáveis lesões de direito que não são objeto de
qualquer reparação porque o detentor do direito subjetivo não
exercita, isto é, não ajuíza processo. E com o passar do tempo, a
prescrição ou decadência consolida essa situação. 174

174
Veja nossa Teoria Geral da Prescrição em www.padilla.adv.br/teses
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 96

Nos casos de jurisdição-voluntária o Estado-Juiz


manifesta-se sobre o direito do interessado de completar aquele ato
embora não havia controvérsia.

A palavra voluntária é acrescentada à jurisdição para


indicar que – nesse tipo de atividade, o Estado-Juiz não se depare
com partes opostas em conflito, mas pode ser procurado por partes
voluntariamente unidas com interesse comum de que o Estado-Juiz
autorize ou homologue os atos que pretendem praticar, ou já
praticaram. Vão ao Juiz porque a Lei o exige. Por isto, poderíamos
chamar este tipo de processo de Jurisdição Obrigatória.

Na jurisdição contenciosa, os jurisdicionados podem


optar pela substituição oferecida pelo Estado, porque os direitos
são disponíveis e as partes podem resolver sua questão
extrajudicialmente. Ao contrário, na jurisdição voluntária a
substitutividade é obrigatória.

A lei penal é essencialmente proibitiva: proíbe


comportamentos ilícitos através da atribuição de punições para o
desrespeito. Mas que no atual estágio de desenvolvimento
tecnológico o Estado não tem meios eficazes para impedir os
comportamentos proibidos. Daí a necessidade de um processo
penal. Punir os infratores da Lei e, com isto, estimular a
obediência.

Mas na burocracia da vida civil ocorre o contrário. A lei


civil regulamenta relações e o alcance e conseqüências dos atos. Há
liberdade de atuação, tudo que não é proibido é permitido, e mesmo
diante de infração da lei civil o Estado-Juiz só agirá mediante
provocação (arts.2º e 262 do CPC). A lei civil confere liberdade de decidir
sobre a conveniência de adotar comportamentos.
Página 97 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

Há atos da vida civil informados pelo interesse público de


legalidade. Diferentemente da Lei Penal, impotente para impedir
os comportamentos proibidos, a burocracia instituída e mantida
pelo Estado permite um controle quase absoluto de alguns atos da
vida civil. O casamento é um contrato civil, mas somente com a
chancela judicial pode haver separação judicial ou divórcio.

A jurisdição voluntária é uma a situação quase oposta ao


processo penal. O interesse público na proteção de certas relações
jurídicas motiva o Estado a revestir sua constituição ou alteração
de formalidades, exigindo homologação, autorização, enfim, o que
for necessário para preservar o respeito à lei.

Na jurisdição voluntária, o caráter substitutivo está na


decisão sobre a conveniência (legal) dos atos praticados
(homologação) ou a serem praticados (autorização). Ao invés do
interessado decidir e praticar o ato, é “assistido” na prática do ato
pelo Estado-Juiz.

Para haver total obediência à lei, o Estado-legislador


retira dos particulares o poder de decidir com toda liberdade sobre
a conveniência de seus comportamentos (art.1122, § 1º, contrario senso, CPC).
Mesmo na presença de concordância de todos interessados, o
Estado-Juiz pode recusar a validade a atos (Lei 6.515/77, art.34, § 2º) ou
determinar providências distintas daquelas solicitadas (art.1109 CPC).

Na condução de suas vidas privadas, naquelas questões


sujeitas à obrigatória jurisdição voluntária, os interessados são
substituídos pelo Estado-Juiz que decide sobre a conveniência e
oportunidade do ato jurídico pretendido. Há, portanto,
substutividade na jurisdição voluntária, embora nem sempre haja
lide.
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 98

22. Conceito de Jurisdição:


Quando a ciência processual criada ao final do século
XIX175 ensaiava seus primeiros passos, Chiovenda demonstrava
amplitude de horizontes: vislumbrou na substitutividade a
característica mais importante da atividade jurisdicional.
A
substitutividade é característica geral de todas
atividades jurisdicionais que pressupõe imparcialidade do
magistrado, do processo penal à jurisdição voluntária.
Na jurisdição voluntária o interesse privado está no pólo
ativo que se dirige ao Estado-Juiz buscando homologação-
autorização de atos. Na jurisdição voluntária não há partes - termo
jurídico que expressa a divisão do processo em lados opostos
disputando provimento jurisdicional favorável. Na jurisdição
voluntária há interessados na obtenção de uma autorização ou
homologação. E no pólo passivo “oculto” está a sociedade que, para
segurança jurídica, reveste certos atos de formalidades
supervisionadas pelo Judiciário.
O Estado-juiz substitui às partes ou interessados
decidindo sobre a conveniência-legal da intenção pretendida pelos
interessados-autores, porque o interesse público reveste aqueles
atos de cautela.
No processo penal, o interesse público em preservar a
liberdade protege o réu.
Na jurisdição voluntária, o interesse público reveste
certos atos da vida civil de formalidades ou exigências que devem
ser verificadas pelo Estado-juiz.
A sucessão de mentes brilhantes do direito processual
italiano ofuscou a idéia, verdadeiramente brilhante, do inolvidável
mestre italiano Chiovenda, só muito mais tarde alcançada em sua
genialidade pela obra de Gian Antonio Micheli que, em memorável
ensaio 176, retomou as alturas alcançadas no pensamento de
Chiovenda. O mesmo diapasão é encontrado em J. J. Calmon de
Passos 177, reproduzindo a lição de Marco Tullio Zanzucchi178.

175
Há consenso de que a ciência processual nasceu com a obra de Oscar Von Bulow, “A Teoria das
Exceções Processuais e os Pressupostos Processuais”, que se ocupou de traçar uma visão principiológica
do processo.
176
Gian Antônio Micheli, Per una revisione della nozione di giurisdizione voluntaria, Rivista,
1947, v.I, p. 31, traduzido para o espanhol e republicado em 1970 nos Estudios de derecho procesal civil,
v.IV, p. 18
177
J. J. Calmon de Passos Da jurisdição, 1957, p. 31
178
Marco Tullio Zanzucchi Diritto processuale civile
Página 99 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

Conceituando jurisdição como atividade substitutiva,


Chiovenda pretendia expressar que o juiz substituía às partes por
ser um terceiro, totalmente desinteressado no resultado 179,
podendo julgar de forma imparcial.
Conclusão: A parcialidade e o envolvimento,
comprometimento ou interesse no resultado são características das
atividades administrativas. A imparcialidade e o desinteresse do
Estado-juíz na solução do litígio, ouvindo ambas as partes
(contraditório), são indispensáveis na atividade jurisdicional.

23. Dos operadores jurisdicionais:


Araken de Assis consagrou a expressão “operadores” do
processo, corretíssima, do ponto de vista técnico, como sempre acontece
nas lúcidas análises do iminente processualista gaúcho. Contudo, nossa
opção é denominar os “operadores” do processo como “atores jurisdicionais”
na perspectiva de que o processo não pertence ao mundo real, e sim a um
plano jurídico.
Processo é um mecanismo da sociedade para canalizar as
insatisfações e propor soluções. Estas, podem ser aceitas pelas partes, ou
não. O Estado-Juiz pode, nos limites da lei, ordenar aos oficiais de justiça
e demais agentes do poder público a prática de atos e, se houver o
cumprimento da ordem, o que reduz ainda mais as hipóteses, será
somente em tais casos que atos processuais produzirão efeitos no mundo
real. No mais das vezes, os atos processuais não passam de encenação.
Ora, quem tem por profissão praticar encenação é um ator, não é mesmo
? Às vezes, um ator escorrega, cai do palco e provoca movimento na
platéia e, quase sempre, os atores emocionam os espectadores às lágrimas
ou gargalhadas, mas não deixam de ser atores para se tornar “operadores”
do teatro. Da mesma forma, quem por profissão pratica atos processuais os
quais, eventualmente, até provocam alterações no mundo real, são atores
180
do cenário jurídico.

24. Da Advocacia: clamar por Justiça:


O art.68, do antigo Estatuto da OAB181 assegurava que em
seu “ministério privado” o advogado é inviolável por seus atos no
exercício da profissão. As polêmicas em torno da interpretação desse
dispositivo foram revigoradas no art.133 da Constituição Federal182,

179
Mesmo o interesse remoto compromete a imparcialidade. Nas ações discutindo critérios de
reajuste do SFH, os juízes mutuários do sistema habitacional consideraram-se suspeitos para decidir
porque, como mutuários, possuíam interesse (ainda que remoto) de que prevalecessem as teses que
reduziam as prestações.
180
Escrevemos a respeito desde o início dos anos noventa. Confirma detalhes em
www.padilla.adv.br/advogado
181
Lei Federal 4.215/63 vigorou por mais de 30 anos até o Estatuto da OAB de 1994.
182
Constituição Federal, art. 133 – “O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo
inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei.”
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 100

cuja exegese permanece no Supremo Tribunal em ADIn183


hostilizando o novo Estatuto da OAB184. Porque da hostilidade ? A
proliferação de cursos jurídicos no final da década de oitenta
provocou demanda por professores mas o mercado não dispunha de
recursos humanos. Houve redução na qualidade do ensino que, pouco
depois, passou a despejar no mercado de trabalho bacharéis (sic ?185)
de precária ou incompleta formação profissional186.
Demonstra o sentimento acarretado pela desqualificação do
causídico que, na reforma do judiciário e criação de procedimentos
sumarizados187 promovendo conciliação, como acontecia no Juizado

183
ADIns = argüições de inconstitucionalidade
184
Lei n. 8.906, de 4 de Julho de 1994, Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil
– OAB, dispõe (art. 1º) que “São atividades privativas de advocacia: I - a postulação a qualquer órgão do
Poder Judiciário e aos juizados especiais”. O STF suspendeu a eficácia do inciso I, "in fine", do art. 1º, no
que se refere a "Juizados Especiais", ou seja em relação aos Juizados de Pequenas Causas (depois
substituídos pelos Juizados Especiais, regulados na Lei 9.099/95), Justiça do Trabalho e Justiça de Paz
(ADIn nº 1.127-8-DF-Medida Liminar, Rel. Min. Paulo Brossard, DJU 14.10.94, seção 1, pág. 27.596).
Confira "O novo estatuto da advocacia e os juizados de pequenas causas", por Luis Felipe Salomão
(Revista Jurídica 212/34).
185
Muitos desmerecem o título. Dispõem de diploma, expedido por estabelecimento de ensino
superior mas... não são realmente bacharéis, no sentido do clássico termo francês-antigo, “bacheler”,
sendo “o que recebeu numa academia ou universidade o primeiro grau para chegar ao de doutor.”
Faculdades mais tradicionais do mundo, com mais de 500 anos de existência, como Santiago de
Compostela na Espanha ou Heidelberg na Alemanha, tem no curso de bacharel pré-requisito ao ingresso
no doutorado, com extremo rigor. Na Faculdade Alemã, foi criado um curso de Mestrado para
estrangeiros visando nivelá-los com os egressos das universidades alemãs, habilitando-os a ingressar no
Doutorado. Na Espanha, o curso de doutorado pratica nível tão alto de exigência que apenas os
pretendentes à carreira no magistério jurídico o enfrentam.
186
Há duas mil faculdades despejando milhares de advogados num mercado de trabalho onde a
maioria dos potenciais clientes não dispõe de meios para verificar a habilitação do “causídico”, exceto
referências pessoais de amigos. A tabela de valores mínimos para honorários advocatícios impraticável
na realidade do mercado, conjugada à grande dificuldade de fiscalização, permitem oferta de serviços por
preços aviltantes. O potencial cliente, seduzido por melhor oferta, contrata “profissional” sem habilidade
técnica necessária para as tarefas que necessita. Só mais tarde descobre que economizar em advogado
custa caro. Agrava a situação o cliente não dispor de conhecimentos para avaliar a habilidade do
advogado contratado. Proliferam nas dezenas de seccionais da OAB processos disciplinares sem
sentido, que constituem a maioria, nascidos da dúvida infundada do cliente ou mesmo da má-fé,
utilizando o “processo administrativo” como “desculpa” para não honrar o pagamento dos honorários.
Esses procedimentos dificultam o andamento dos processos efetivamente necessários contra os
causídicos que cometeram erros ou atos ilícitos e efetivamente necessitam punição. Há tantos processos
sem sentido, que os que mereceriam punição terminam prescrevendo.
187
Novo Processo Civil aponta à evolução, nascida dos estudos e trabalhos do IBDP Instituto
Brasileiro de Direito Processual (www.padilla.adv.br/ibdp), e capitaneada pela Comissão de Notáveis,
instituída pela Portaria do Ministério da Justiça nº 145/92, liderada pela Professora Ada Pellegrini
Grinover, e pelos Ministros Sálvio de Figueiredo Teixeira e Athos Gusmão Carneiro. Na 1ª fase,
foram elaborados 11 anteprojetos, aproveitando a o texto legal vigente, abrindo espaços para novos
artigos, mas mantendo a fisionomia do Código de 1973. Dez projetos foram convertidos em leis até 1995,
a última delas a 9.245/95. O 11º projeto, "uniformização jurisprudencial nas demandas múltiplas" PL
3.804-A foi sustado em face do anúncio de reforma constitucional que o tornaria prejudicado, mas passou
uma década até que ocorresse a E.C. 45, emenda mais polêmica da história recente. Através dela o poder
econômico tenta engessar o Judiciário. A partir do Congresso Internacional de Direito Processual
realizado em Brasília em 1997, iniciou a segunda fase da Reforma de que foram exemplos a Lei Federal
nº 9.756, de 17.12.98 sobre recursos e Lei Federal nº 9.800, de 26.05.99, uso de fax e meios eletrônicos
Página 101 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

de Pequenas Causas, hoje Juizado Especial188, preferiam a presença


apenas das partes, sem os advogados (para não atrapalhar...).
Em quaisquer atividades encontramos pessoas capazes de
atos reprováveis189. Mas em nenhuma atividade o comportamento
desleal, ou desonesto, é tão transparente como na advocacia190. Para
piorar a política sucateou o sistema de ensino191 e o mercado de
trabalho descontrolado192 foi invadido por hordas de “sabeburrice
jurídica”193 dignas de rábulas.

de transmissão de dados para contagem de prazos recursais. Na virada do milênio, o Brasil contava com
o processo civil mais moderno do mundo.
188
Da lei 9.099/95
189
Errarum, humanun est...Mas “persistirum nu errarum est burrarum”.
190
O advogado é profissional do Direito. Seu ofício é lidar com Justiça. Quando vai de encontro às
lições da ética e do saber, tem um comportamento entendido como injusto pela média das pessoas,
concentra mais atenção do que outro profissional, engenheiro, médico, dentista, etc., porque a “injustiça”
ou erro do advogado é documentada.
191
O advogado e professor Jorge Souza Santos desabafou na revista Veja de 27 de julho de 1994,
p.122: “Cansei de ser professor.” Às vésperas da aposentadoria como mestre, exonerou-se em protesto
contra a indignidade. Quando começou a lecionar, em 1953, tinha orgulho. Os concursos eram
disputados. Professor desfrutava de “status” elevado permitindo vida “nababesca” comparada ao padrão
atual. Com salário de docente sustentava folgadamente esposa e filhos com confortos como duas
empregadas, e adquiriu casa e carro. A partir da década de setenta as populações das grandes cidades
cresceram vertiginosamente e a política imediatista dos governantes limitou-se a multiplicar vagas nas
escolas muito além do que parcas verbas destinadas à educação permitiriam. A qualidade do ensino caia
e a verbas do ensino idem. Com raras exceções, escolas públicas aos poucos se transformaram em
depósitos para crianças enquanto os pais trabalhavam. Professores frustrados e mal remunerados são
incapazes de despertar a sede do saber na juventude. Pelo contrário, desestimulam o desejo de crescer,
sufocam a curiosidade. O jovem sente a infelicidade do professor, e se questiona: “- Aprender, para quê
? Para ser um adulto amargurado como meu professor ?” Por essa época, para piorar, o poder da mídia
de construir e destruir lideranças já se fazia sentir e crescia a idolatria alimentada pelo poder econômico
(www.padilla.adv.br/desportivo/futebol) Com ensino de má qualidade, as verbas ficam cada vez
menores: Porque pagar bem professores, questiona o político, se eles trabalham sem dedicação e com
baixo rendimento ? Na década de noventa, veio o golpe de misericórdia: A administração federal
acabou com as verbas para as universidades; Hoje, a única saída para o ensino público está em estender
chapéu para a iniciativa privada, implorando auxílio. Para recuperar a centenária Faculdade de Direito da
UFRGS, no final do século passado, os professores foram buscar recursos na iniciativa privada porque a
verba total em 1997, para obras, era de apenas R$ 60.000,00 em toda UFRGS, instituição com dezenas de
prédios e milhares de alunos. Em 8/12/1996, em reunião com a Congregação da Faculdade de Direito, a
Reitora confessou a sua decepção e impotência diante de tal “verba” íntima, com a qual não poderia nem
trocar o elevador da Escola de Artes, que ruira. A busca de recursos na iniciativa privada pela Faculdade
de Direito foi, depois, seguida por toda UFRGS, inclusive para que os professores disponham de outros
empregos ou “bolsas” para se sustentar, porque seus vencimentos estão congelados há dez anos.
Lecionar, nas universidades federais, pode virar “bico”. Em países evoluídos, a situação é oposta.
Tomemos com exemplo a Alemanha, na Europa, ou o Japão, Na Ásia. Em ambos, professor das
categorias sociais mais respeitadas e valorizadas, e o professor universitário (Daikako no Sensei Desu em
"nihon go”japonês); Professor and der Rechtsfakultät em “deutsch”alemão) ocupa o alto da pirâmide
social. Aqui no Brasil, bem... Ilustra-o o relato do cole ga ao final dos anos 90 que, recém empossado
no cargo, orgulhoso, identificou-se como professor universitário numa compra. Desconfiado, o lojista
consultou o SPC, apesar da quantia pequena do cheque. . .
192
Mercado de trabalho sem controle ético. Quando alguém necessita advogado, e não está disposto
($$$) a pagar um grande escritório, nem tem quem indique um profissional honesto, trabalhador, corre
risco de escolher um “picareta”...
193
Fazendo justiça ao criador da expressão, “sabeburrice jurídica” é neologismo criado nos anos
noventa pelo colega Rodolfo Luiz Rodrigues Corrêa, Procurador do Estado do RS, classe superior, que
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 102

Rábula era quem advogava sem diploma. Eram comum no


século passado. No interior, distante das Faculdades, não havia
diplomados, e os rábulas proliferaram. A Lei Federal nº 4.215/63
disciplinando a advocacia obrigou os rábulas à inscrição na Ordem
para exercer a profissão; denominando-os “provisionados” (nome técnico
do rábula) reconhecendo o direito de continuar advogando. O novo
Estatuto da OAB de 1994 revogou aquele sistema, o que já não era
sem tempo. Nosso país é afamado como a República dos Bacharéis.
Não mais existindo provisionados, a denominação está “vaga” e
podemos utilizar “rábula” nos novos tempos para referir ao causídico
que, apesar do diploma, não tem afinidade do o estudo mas sim com a
prática rotineira da chicana em questões judiciais e pouca (não raro
nenhuma) intimidade com a cultura jurídica194. Utiliza trajes
compatíveis com “tal padrão de excelência”: Ternos xadrezes nas Varas do
Trabalho; tributaristas em azul-marinho; criminalistas em ternos e
camisas pretos com gravatas contrastantes, não raro roxas. A esses
atributos somam-se acessórios variáveis195, como enormes anéis de
formatura com descomunal pedra vermelha cintilante, ou uso de
broches e pins da OAB em ocasiões impróprias como velórios,
casamentos, batizados, aniversários, e até em visitas informais à casa
de parentes, fruto da predileção por divulgar “prerrogativas”
profissionais. Dentre práticas sedimentadas no comportamento
diuturno está a de instruir sua secretária que, quando estiver com um
novo cliente, interrompa a cada cinco minutos com suposta ligação
importante e urgente, na qual simula dar instruções, ordens, enfim,
mostrar ao novo cliente que ele “é o cara”.
Sua carteira de clientes é repleta de devedores que se
valem deles para protelar o cumprimento de obrigações, contribuindo
enormemente para atravancar ainda mais os já assoberbados
caminhos da justiça. Desde logo os rábulas aprendem a usar de todos

nos emprestou auxilio inestimável nos trabalhos de revisão na primeira versão desta obra, em 1994
nascidas como breves comentários as profundas alterações legislativas que ocorreram, ofertando
oportunas sugestões. Observou o Colega que, em razão de tantos e tantos “causos”, a expressão deixou
de ser neologismo para se tornar uma “necessidade consuetudinária”, caminhando para se tornar arcaica,
merecendo atualização ... Felizmente, a exigência do Exame de Ordem estabelecido pelo EOAB está
provocando maior preocupação com a formação dos profissionais. Com o tempo, o Exame de Ordem
poderá se tornar ainda mais rigoroso.
194
A militância cotidiana do advogado é pautada pelo princípio da legalidade. Mas ao contrário, o
rábula tem seu exercício profissional guiado por princípios como o da fungibilidade dos recursos e das
petições em geral, não raro pedindo uma coisa por outra. Das lições da Faculdade, a única que guarde é a
parêmia "dabi factum dabo tibi ius" pela qual se limita a expor o que aconteceu e deixar que o Juiz se
vire em descobrir os fundamentos, se é que existem. Raramente sabe se o que está pedindo tem
fundamento. É o famoso “se colar colou”, mais tragédia que humor, instrumentalizando a vida dos júris-
IN-peritos e seus erros técnicos indecorosos.
195
Outros incorporaram serviços de cópias, plastificação, encadernação e outros de papelaria, sem
prejuízo dos típicos de bazar, além da digitação de "curriculum vitae"
Página 103 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

meios para protelar, no que se tornam especialistas. Foram os


responsáveis, por exemplo, pela ojeriza contra procedimentos que
seriam normais em um processo, como o réu impugnar o valor que o
autor atribuiu à causa. Tal valor é relevante para determinar desde o
tipo de procedimento (art. 275 – I CPC, Lei 9099/95 art. 3º), ao cabimento de
reexame (art. 475 § 2º CPC), ou recursos (do que trataremos no Livro II) passando
pelo valor da sucumbência proporcional (art. 20, § 3º CPC). Mas os
advogados que impugnam o valor da causa são estigmatizados, por
conta dos rábulas. A impugnação ao valor da causa é um incidente
processual que – na prática, retarda o andamento. As custas são
proporcionais ao valor da causa e, uma vez impugnado o valor da causa, o
processo não tem andamento aguardando seja decidida pois, antes disto,
não se sabe se o pagamento efetuado de custas foi completo. Alguns, como
Gelson Amaro de Souza, entendem que a impugnação ao valor da causa
tem natureza jurídica de ação incidental196.
A preocupação com o nível de profissionalização e do
ensino levou a exigência de melhoria no nível que resultou no
Estatuto da OAB em 1994 tornar obrigatória uma avaliação dos
candidatos ao título de advogado mediante o Exame de Ordem197.
Essa exigência permite controle da admissão de novos advogados.
Antes, bastava concluir Curso de Direito em qualquer Faculdade.
Hoje, necessária aprovação no Exame198.
O Estatuto da OAB de 1994 define o objetivo da Ordem dos
Advogados como a defesa da “Constituição, a ordem jurídica do Estado
democrático de direito, os direitos humanos, e pugnar pela boa aplicação das
leis, pela rápida administração da justiça e pelo aperfeiçoamento da cultura e
das instituições jurídicas.” 199 A OAB presta serviço público200, com

196
Gelson Amaro de Souza, Do valor da causa, Saraiva, SP, p.98. Realmente, há julgados
utilizando expressões como “propôs” e “autora de impugnação”. “Propôs” vem de propositura,
reservada para se referir a quem propõem a ação. “Autora” refere-se a quem toma o pólo ativo da ação.
Ao dizer “autora desta impugnação” conferem à impugnação a conotação de ação (AI 92.01.0244533-
PA, 3ª Turma, j. 24/08/92, DJU 21.09.92, in Revista de Processo - Repro 77/328-329, Ed. RT, SP,
Jan./Mar. 1995).
197
Lei n. 8.906, de 4 de Julho de 1994, art.8º - IV, exige o Exame, regulado em Provimento do
Conselho Federal (§ 1º) e aplicado pelos Conselhos Seccionais (art.58-VI). Através de M.S. impetrado
em favor de Rudy Garcia, ex aluno na UFRGS, obtivemos liminar, a partir da qual o Presidente da OAB-
RS Luiz Felipe Magalhães conseguiu convencer o Colégio de Presidentes de Seccionais a editar uma
norma transitória que a lei 8.906 olvidou, sobre a situação dos alunos formandos por ocasião da sua
edição.
198
Os Exames de Ordem observam o rigor. O índice de reprovação no primeiro exame foi de 75 %,
embora fossem todos Bacharéis em Ciências Jurídicas e Sociais, i. é. egressos de cursos superiores. Os
índices baixaram um pouco nos anos seguintes, a maioria que rodou foi fazer cursos, estudar de verdade,
ou tentar outras atividades. No final da década de noventa começou a subir, e em 2004 o índice voltou a
orbitar em 80% de reprovação.
199
Estatuto da OAB, art. 44 inc. I
200
A OAB presta serviço público à art.44 EOAB.
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poderes de requisição201, imunidade tributária202 e total


independência203. A médio e longo prazo, os inscritos até 1994, antes
da necessidade do Exame e que não apresentavam nível aceitável de
profissionalismo, serão página virada, “estórias” e “causos”. Mas não
podemos esperar esse futuro, que se apresenta ainda um pouco
distante, para recuperar o prestígio da advocacia.
O prestígio da advocacia independe da depuração204 dos
quadros da Ordem dos Advogados. Advém da função que exercem os
causídicos. O direito de defesa, para segurança de todos, necessita
das garantias ao livre trabalho do advogado. Tivesse o juiz de buscar
os argumentos favoráveis a uma e outra das partes não teria tempo
para julgar e ainda comprometeria a imparcialidade técnica da
Justiça. A imparcialidade está entre as principais características da
Jurisdição.
O juiz é como o timoneiro de um barco, “...que sente o
vendaval e não abandona o leme :não pode ele deixar que o levem as
correntezas, pois ante os olhos tem como bússola a lei e, quando esta faltar, ainda se orienta pelo senso
comum, pela razão humana, como o homem perdido ou como o navegante pelo sol, com sua luz, pelo céu
com as estrelas. 205" O Juiz - timoneiro é quem conduz o barco, mas sua
função perde sentido sem os maquinistas que alimentam o sistema de
propulsão. Os advogados maquinistas são indispensáveis. Asseguram
o contraditório, permitindo ao juiz manter a imparcialidade técnica,
sem a qual a jurisdição perde seu principal componente.
Ao Estado-Juiz cabe examinar as provas e argumentos das
partes, rebatidas nas teses da parte contrária, tornando o processo
“maduro”, pronto para ser julgado. Na mítica figura da Balança,
usada para representar a Justiça, cada advogado coloca nos pratos
seus fundamentos, enquanto o Juiz segura o instrumento e avalia
qual deve prevalecer. O juiz que começa a alimentar os pratos da
balança perde imparcialidade. Se a atividade jurisdicional é
essencial à paz social e o advogado indispensável para o exercício da
Justiça, sem profissionais da advocacia prestigiados e livres de todas
as peias da prepotência não há paz social.
Até meados do Século XX os advogados eram profissionais
respeitados no meio forense, admirados na sociedade. O “Dia do

201
A OAB possui poderes de requisição de informações semelhante aos órgãos jurisdicionais à
art.50 EOAB.
202
A OAB desfruta de imunidade tributária à art.45 § 5º EOAB.
203
A OAB goza de total independência em ralação aos órgãos de quaisquer poderes à § 1º, do
art.44, EOAB.
204
Depuração consiste na limpeza, ato pelo qual o organismo se liberta de “substâncias inúteis ou
nocivas”.
205
Martins Teixeira in Adv, Boletim 48, p.618, 5/12/93
Página 105 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

Pindura”206 nasceu como fruto desse prestígio. Os causídicos


conquistaram o direito ao vocativo “doutor” – tratamento destinado no
meio forense em deferência pela excelência de suas atuações. A
evolução social acontecia lentamente, quase imperceptivelmente.
Décadas depois... Ao crescente progresso tecnológico
somou-se o fim da inércia, isto é, do imobilismo entre as classes
sociais, para o qual a “crise” econômica207 emprestou grande impulso.
Os altos e baixos da política208, seus reflexos na economia,
as necessidades de adaptação ao mercado de trabalho em constante
mudança, conduziram-nos a uma realidade social-cultural
praticamente, sem similar nem raízes no passado. Neste contexto,
muitos profissionais do direito ressentem-se do pouco prestígio
perante magistratura, servidores judiciais, delegados e policiais209.
Hoje, quando o advogado é tratado como doutor no Foro, não raro é
pejorativo.
Para recuperar o prestígio é necessário a profissionalização
da advocacia. Os bons advogados são exemplos de trabalhadores
incansáveis, sem hora ou dia para cumprir suas tarefas e encerrar
suas atividades. Os prazos seguem, indiferente trate-se de feriado,
domingo, dia Santo... Sempre é possível melhorar o trabalho
sacrificando convívio familiar, lazer, etc. Até na passagem do dia
comemorativo de sua profissão, 11 de agosto, prosseguem na
206
Os estudantes, oriundos de famílias latifundiárias, deslocavam-se para os grandes centros.
Estudavam longe de casa, e faziam amizade com os donos dos poucos restaurantes que, não sabendo o
aniversário daqueles moços inteligentes, cultos e bons clientes, homenageavam a todos no dia do
aniversário da criação daqueles cursos que haviam motivado a vinda dos “moços” para a Capital,
propiciando ao comerciante mais lucros. O dia do pendura, que hoje é um prejuízo para os donos de bares
e restaurantes invadidos por estudantes, em quantidade cada vez maior – são mais de 2000 cursos no país
– que nunca foram clientes desses estabelecimentos.
207
A “quebra” da bolsa de Nova Iorque, em 1929, impulsionou a “revolução” social, rompendo
com tradição secular de imobilismo social. De um dia para outro, ricos tornavam-se pobres e pessoas
oriundas das classes sociais menos favorecidas aumentavam suas posses, sua importância econômica, os
“novos ricos”.
A clássica pergunta, perdeu sentido: “você é filho de quem ?...”
Deu lugar a uma nova realidade: “Trabalhas com o quê ?” - “Quem representas ?”
208
Exemplo de baixos na política modificando a sociedade: a questão do ensino público Sobre o
sucateamento de todo sistema de ensino publico, confira notas acima.
209
Más experiências são marcantes: algumas autoridades ficam praticamente traumatizadas,
desenvolvem predisposição contrária aos postulantes, acentuada na repetição dos contatos desagradáveis.
Não é para menos: Justamente a pessoa com problemas será a que vai apresentar a maior capacidade de
aborrecer, de insistir intempestiva e inadequadamente. O mau profissional, o ser humano mal resolvido,
agindo impertinente ou inconvenientemente presta desfavor a si mesmo tornando cada vez mais distantes
seus objetivos. A diferença entre a injustiça no julgamento pela apressada compreensão dos fatos, ou
inadequada aplicação do direito, por vezes é confundível com o erro de procedimento. Este, por sua vez,
pode degenerar para abuso de autoridade sutil, difícil de controlar até porque quem exerce a autoridade
também é humano... Advogados recém formados, jovens, ou profissionais desconhecidos, as vezes são
vítimas desse preconceito. Há décadas preocupam-nos os problemas da advocacia, como documentou o
Jornal Zero Hora de Porto Alegre na edição de 27 de outubro de 1986, p.35, seção “Justiça” em quadro
destacado com título “O stress na advocacia”. Disponível em www.padilla.adv.br/teses
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 106

incessante Luta pelo Direito, pois os prazos fluem, enfatizando todas


as peculiaridades e agruras da profissão.
A incrível capacidade de superação e transcendência dos
advogados é comprovada por nossos legisladores, tanto cível210
quanto penal211, presumindo que o advogado tenha conhecimento das
intimações pela simples publicação em quaisquer dos periódicos212.
Até 2002, no primeiro grau de jurisdição do processo do trabalho o
advogado era intimado por carta de intimação. via ECT-SEED. No
segundo grau, seguia o mesmo mecanismo dos demais processos.
Diário Oficial de União de 24-4-98 sexta-feira, por exemplo, bateu
recorde mundial em número de páginas, nada menos de 5.224
páginas213. Superou o “The New York Times” - maior edição da
história em 14-9-87 com 2.244 páginas. Da edição, que chegava a
5,55 kg de papel por exemplar, nada menos de 1.132 páginas eram
do Diário da Justiça, com intimações para os advogados. O que não
foi noticiado é que esse recorde constituiu fato comum do dia a dia
forense. O Diário sempre é volumoso: O Recorde anterior do Guiness
na categoria maior número de páginas por tablóide em edições
regulares já era do Diário Oficial da União que, em 19 de dezembro de
1997, circulou com 2.120 páginas, e 5,26 quilos214. E, depois,
quebrou, várias vezes, o seu próprio recorde.
Esse Diário Oficial contém, encartado, o Diário da Justiça,
com intimações dos processos do Supremo Tribunal Federal, Superior
Tribunal de Justiça, e Tribunal Superior do Trabalho, que envolvem a
maioria das causas em andamento no país. Impresso em Brasília, o
jornal só chega na maioria das Capitais dois dias úteis depois e
demora vários dias úteis para chegar até às regiões mais distantes,
mas os prazos iniciam a contar do dia seguinte. Alguns prazos,
exíguos – como dois dias para interpor embargos de declaração no
processo penal215, decorreram quando o Diário chegou às mãos do
destinatário da intimação. O atraso das comunicações nem é o maior
problema. Na mesma data em que circula o Diário Oficial (isto é, de
segunda a sexta-feiras...), milhares de jornais locais e dezenas de periódicos

210
CPC, art. 236 - No Distrito Federal e nas Capitais dos Estados e dos Territórios, consideram-se
feitas as intimações pela só publicação dos atos no órgão oficial.
211
CPP, art. 370 - Nas intimações ... § 1º - A intimação do defensor constituído, do advogado do
querelante e do assistente far-se-á por publicação no órgão incumbido da publicidade dos atos judiciais
da comarca, incluindo, sob pena de nulidade, o nome do acusado.
212
Além do Diário de Justiça da União, com circulação Nacional, cada Estado possui pelo menos
um periódico para intimações. Mas há incontáveis localidades onde periódicos locais publicam as
intimações.
213
Jornal Zero Hora, de Porto Alegre, 26-4-1998, p.3, Informe Especial
214
Zero Hora, de Porto Alegre, 20-12-1997, p.13, política
215
CPP Art. 619 - Aos acórdãos proferidos pelos Tribunais de Apelação, câmaras ou turmas,
poderão ser opostos embargos de declaração, no prazo de 2 (dois) dias contado da sua publicação,
quando houver na sentença ambigüidade, obscuridade, contradição ou omissão.
Página 107 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

regionais, por todo país, publicaram uma quantidade impossível de


mensurar de intimações destinadas aos advogados... Mais tragédia
que humor, o legislador pressupõe que os advogados estejam a par de
todas essas publicações, tanto no cível, quanto na área penal216.
Ainda que não tivessem nada mais a fazer... que não dormissem...
não se alimentassem, nem cuidassem das necessidades fisiológicas,
não haveria tempo para ler todas publicações na procura de
intimações. E mesmo que - num trabalho digno de figurar entre as
façanhas de Hércules, algum advogado conseguisse vencer essa
avalanche de papel, centenas de milhares de páginas, ao final de um
dia, nada adiantaria... Porque não sobraria tempo para praticar os
atos, recursos, etc., objeto da intimação... E no dia seguinte, se - por
puro acaso ou teimosia o causídico tivesse sobrevivido ó porque
ninguém vive sem alimento, descanso, etc. - a maratona da busca das
intimações prosseguiria... A Internet veio dar alento a este problema.
As intimações são automaticamente enviadas por e-mail aos
advogados. O serviço ainda é incipiente, nem todos advogados usam,
e vai demorar algum tempo até que possamos acabar com as
publicações em papel, poupando milhões de árvores por ano. O uso
da Internet cresceu. Começou com os processos virtuais no Juizado
Especial Cível Federal, estendeu-se a alguns setores da estadual217, os
Tribunais passaram a utilizar a certificação eletrônica218. O processo
virtual o qual, de início, era a exceção, hoje é a regra; Na jurisdição do
TRF-4º Região, no início de 2013, não mais é possível ingressar com
processo que não seja eletrônico.

Do defensor público:
Quando a parte tem renda até um limite, estipulado para a
região219,
e não dispõe deadvogado, pode receber o patrocínio de um
advogado pago pelos cofres públicos e que só pode exercer essa

216
Em notas anteriores já trouxemos os textos do CPC e CPP
217
A partir de 3/12/2002 iniciou, na justiça gaúcha, o processo virtual nos Juizados Especiais. O
projeto piloto é desenvolvido no Foro de São Sebastião do Caí, com a realização de uma audiência
totalmente informatizada. A manifestação das partes, dos negociadores e até a decisão do magistrado não
utiliza papel. O presidente do Tribunal de Justiça, desembargador José Eugênio Tedesco, enfatizou o
sucesso da inovação. “A agilização da Justiça, principalmente nas pequenas questões, passa pela
utilização das ferramentas de nosso tempo” afirmou.
218
No TJRGS, esse serviço iniciou em várias câmaras em 2004.
219
No Rio Grande do Sul esse limite é de três salários mínimos líquidos após abatido imposto na
fonte e previdência e descontando meio salário mínimo por dependente; desconta, ainda, condomínio ou
prestação do SFH. Quem percebe acima desse valor não poderá recorrer à Defensoria Pública. Mas pode
conseguir ajuda nos SAJU´s - Serviços de Assistência Judiciária Universitária - que funcionam junto às
Faculdades de Direito onde, em geral, o limite é de cinco salários mínimos ao dobro da defensoria. Esses
atendimentos são prestados por equipes de estudantes de direito supervisionados por professores
responsáveis pela disciplina de Estágio Profissional, auxiliados por advogados - em geral recém
formados – que querem ganhar experiência.
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 108

atividade. Em geral, o Defensor Público220 fica vinculado a


determinado(s) foro(s). Sua intimação, nos processos, é sempre
pessoal. O defensor público não pode advogar fora das atribuições
constitucionais para evitar angariar clientela221.
25. Da interdependência com a magistratura:
A profissionalização da advocacia e da magistratura
estabelece a interdependência entre ambas atividades. Nas bancas
para os concursos à carreira da magistratura exige-se a presença de
advogados que - depois de dez anos de advocacia, poderão enriquecer
os Tribunais com conhecimentos e experiências já esquecidas ou
jamais vividas pelos juízes de carreira222. O magistrado, via de regra,
ao se aposentar da judicatura encontra no exercício da advocacia um
novo estímulo na existência, exaltado nos bons exemplos.
Lembrando o saudoso Ruy Sodré 223 e Stº Tomás de
Aquino224, Peter Ashton225 oportunamente registrou que:
"O verdadeiro advogado é aquele que aprendeu a discernir, deliberar
e argumentar a respeito daquilo que é legal e ilegal... a respeito do que é lícito a
luz do que é justo...
"Já Cícero afirmava que o essencial no preparo de um argumento é a
procura das razões e motivos para sustentar o raciocínio. Esta tarefa era a

220
Constituição Federal- Art. 134. A Defensoria Pública é instituição essencial à função
jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a orientação jurídica e a defesa, em todos os graus, dos
necessitados, na forma do art. 5º, LXXIV. Parágrafo único. Lei complementar organizará a Defensoria
Pública da União e do Distrito Federal e dos Territórios e prescreverá normas gerais para sua organização
nos Estados, em cargos de carreira, providos, na classe inicial, mediante concurso público de provas e
títulos, assegurada a seus integrantes a garantia da inamovibilidade e vedado o exercício da advocacia
fora das atribuições institucionais.
221
A vedação da advocacia fora das atribuições constitucionais tem fundamento lógico na
necessidade de evitar possibilitar angariar causas. Ocorreu no passado de pessoas que exerciam esse tipo
de função direcionarem os jurisdicionados para escritórios particulares – inclusive sob alegação de que
ficariam melhor tutelados, especialmente quando a causa envolve quantias vultuosas. Veja a diferença
para os advogados públicos em www.padilla.adv.br/pgers/advogar
222
Constituição Federal de 1988, art. 94 – “Um quinto dos lugares dos Tribunais Regionais
Federais, dos Tribunais dos Estados, e do Distrito Federal e Territórios será composto de membros, do
Ministério Público, com mais de dez anos de carreira, e de advogados de notório saber jurídico e de
reputação ilibada, com mais de dez anos de efetiva atividade profissional, indicados em lista sêxtupla
pelos órgãos de representação das respectivas classes. Parágrafo único - Recebidas as indicações, o
tribunal formará lista tríplice, enviando-a ao Poder Executivo, que, nos vinte dias subseqüentes,
escolherá um de seus integrantes para nomeação.”
A Constituição Federal de 1934 consagrou a representação dos advogados e promotores nos
Tribunais, o que se repetiu nas cartas de '37, '46, '67 e '88. Esta última corrigiu o texto, esclarecendo
que, para aspirar ao cargo de juiz no Quinto Constitucional na vaga dos advogados é indispensável contar
dez anos de "efetiva atividade profissional", fechando essa porta àqueles bacharéis meramente inscritos
na OAB, mas com atuação meramente eventual e esporádica no Foro. Isso preserva o objetivo do
Quinto, que é conduzir aos pretórios a experiência da militância, o que passou à fiscalização da Ordem
dos Advogados a quem cumpre na primeira instância a organização das listas sêxtuplas.
223
Ruy de Azevedo Sodré A ética profissional e o Estatuto do Advogado SP, LTr, 1975
224
Santo Tomás de Aquino na Summa Theologica
225
Doutor Peter Walter Ashton foi professor e Diretor da Faculdade de Direito da Ufrgs
Página 109 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

inventio dos retóricos latinos que era acoplada à dispositio, ou seja, à montagem
e arrumação destes argumentos. A deliberatio, palavra que vem de libra
(balança), é a escolha, a sopesagem de alternativas e possíveis formas de agir e
apresentação dos argumentos...
"O teste mais válido do caráter de qualquer argumento, é perguntar e
indagar: quem é que verdadeiramente tirará proveito das alegações do
orador/apresentador do argumento. Se for aquele que alega e argumenta sem
provas, pode haver prejuízo para quem nele acredita. A falsa retórica insiste e
urge na aceitação de uma ação ou de um raciocínio que beneficia aquele que
apresenta o argumento e não aquele que o ouve...
"A boa retórica baseia-se na ética. Assim também a advocacia e
a política... Daí segue que também na advocacia um advogado honesto
não deverá usar, deliberadamente, argumentos enganadores, nem
mesmo para beneficiar um cliente importante..." 226
A ética227 recomenda ao profissional “aconselhar o cliente a
não ingressar em aventura judicial” Mas as vezes pode ser difícil distinguir
onde termina o “jus sperneandi”228 iniciando a litigância de má-fé.
Mesmo quando é possível a distinção é trabalhosa, e convivemos
com escassez de tempo229. Daí a dificuldade de encontrar
decisões aplicando sanções relativas à litigância de má-fé. Apesar
da existência de numerosos dispositivos, conforme mencionamos
em vários escritos230. Além disto, o Juiz receia ser injusto, ou
excessivamente rigoroso. É mais fácil ficar em paz com a
consciência julgando procedente ou improcedente uma
postulação, do que aplicando as normas relacionadas com a
litigância desleal, que sempre envolvem critérios subjetivos de
análise da conduta das partes e procuradores. Há certa tendência
em exigir maior rigor. Alterações na legislação estabelecem novos

226
Peter Walter Ashton, “A prática do Direito e o seu ensino nas Faculdades de Direito nos
Estados Unidos e no Brasil” in Revista da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande
do Sul, vol. 9, nº 1º, novembro de 1993, pág.48 usque 59; a citação é da pág. 56
227
EOAB Lei 8906/94, e Código de Ética e Disciplina da OAB art.2º-VII in DJU 1º-3-1995. Veja
228
Literalmente: Direito de espernear, isto é, reclamar, ajuizar ação...
229
Time is a luxury we don’t have.
230
“Litigância de má-fé no CPC reformado” in “Revista de Processo”, editora RT, São Paulo,
abril-junho 1995, a.20, v.78, p.101-107 + “Revista Trabalho e Processo”, São Paulo, junho de 1995, v.5,
p.26-33 – rebatizada pela editora Saraiva como “Trabalho e Doutrina” a partir de 1997. “Litigância de
má-fé nas JCJs: aplica-se o princípio da lealdade na Justiça do Trabalho?” in “Revista LTr”, v.57
(ano 57) nº 3, março de 1993, ed. LTr, p. 277-282. “Litigância de má-fé” in “Revista de Crítica
Judiciária”, Leud Uberaba-MG, 1989, v. 5, p. 197-200 – coletânea organizada por Humberto Theodoro
Jr. e pelo o saudoso professor Edson Gonçalves Prata. Disponível em www.padilla.adv.br/teses
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 110

casos de multas por recursos protelatórios231, chamando atenção


para a conduta sob o prisma da lealdade. Calamandrei, um dos
maiores processualistas de todos os tempos, advertia haver mais
coragem em ser justo, parecendo injusto, do que em ser injusto,
para que sejam salvas as aparências. Aprofunde o tema
www.padilla.adv.br/etica

"O justo não é, frisa Aristóteles, algo diferente de eqüidade.


Esta é suscitada pelas circunstâncias particulares do caso. Entretanto,
tanto a fonte da lei como a do ato de eqüidade que dirime um caso
concreto são uma e mesma: a igualdade que deve ser realizada entre os
indivíduos, pois que, quem pratica a eqüidade age como agiria o legislador
na mesma situação. Justo é, finalmente, na concepção aristotélica, 'o que
observa a lei e a igualdade', ou o que é conforme a lei e a eqüidade.
Ambos, porém, a eqüidade no momento da aplicação da lei e o justo na da
sua elaboração, procuram realizar uma só coisa: a essência da virtude
da justiça que é a igualdade. Ambos consultam o ditame da razão, a
igualdade: um no momento abstrato da lei, outro no momento concreto da
realização da justiça”232

O advogado – profissional esforçado no crescente


(auto)aperfeiçoamento, desenvolve o sentido de justiça. Busca a
vitória, mas sabe conviver com o aparente fracasso, aprendendo com
os resultados de cada disputa. Embora lute para vencer, porque desse
empenho depende seu sucesso como profissional, está preparado para
conviver com a derrota, mantendo a serenidade necessária para as
transformar em vitórias. É o “fair play” que ensina o espírito olímpico
(www.padilla.adv.br/desportivo/aneis). Concentra suas energias nas postulações justas,
evitando a lide temerária. Sabe que tal patrocínio será prejudicial à
credibilidade junto aos juizes, colegas, e até dos próprios clientes233.

231
Exemplos de multas por recursos protelatórios criados na reforma do CPC na década de noventa:
arts. 17-VII; 538§; 557§2º
232
A citação é de “A idéia de Justiça em Kant - seu fundamento na igualdade e na liberdade” -
UFMG, 1986, Cap. I, § 13, pág. 43, e consta do voto do Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, no
REsp nº 31.751-8-MG, publicado no DJU de 22-11-93, e em destaque para o trecho na COAD, tanto na
Adv Advocacia Dinâmica quanto na Adt Advocacia Trabalhista na capa dos Informativos de nº 50,
publicados em 16-12-94. Aprofunde o tema em www.padilla.adv.br/normajuridica.mht
233
Quando um advogado se dispõe a patrocinar expedientes protelatórios em benefício do cliente
para retardar a cobrança de dívidas, serve de mau exemplo para o próprio cliente que, mais tarde, pode
Página 111 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

Ao argumentar, expõe os fatos, adequando-os ao direito. O direito


decorre dos fatos, e não dos adjetivos.

Os adjetivos correspondem à opinião pessoal. Devem ser


evitados. A arma ou instrumento dos juristas – entre eles os
advogados, é a lógica, e a lógica deve ser transparente, calcada em
substantivos, e separada dos adjetivos234.

26. Da advocacia e da liberdade:


Azevedo Sodré, invocado pelo ministro Sidney Sanches235
transplantou para a doutrina brasileira a lição de F. Padilla236:

"...el abogado... tiene... proyecciones sociales más amplias y


permanentes: es uno de los órganos de elaboración de la ley 237; al
estudiarla y adaptarla a las condiciones ambientes, observa
experimentalmente sus efectos y faltas; contribuye a interpretarla o
aclararla cuando es oscura; por su dominio técnico y la esencia de su
función está más próximo al cuerpo social y recibe de immediato las
manifestaciones de la lucha por el derecho. En una palavra: da vida al
organismo de la ley, que sin él seria casi um cuerpo muerto, y ija la
consciencia jurídica del pueblo y la releja em la norma positiva." 238

Sendo o advogado quem fixa a consciência jurídica do


povo, sem liberdade no exercício da advocacia nenhum cidadão é
livre. Qualquer cerceamento ao advogado, na sua atuação
jurisdicional, atenta contra a legalidade, permite que o arbítrio
prevaleça239. Advogados são artistas jurisdicionais vivenciando a luta

colocar em prática a mesma filosofia contra quem lhe prestou serviços, recusando – ou pelo menos
retardando o pagamento dos honorários contratados...
234
“Linguagem Jurídica” Jornal da OAB-RS, Porto Alegre, Ipsis Litteris, junho 1992, p.11, e “A
norma jurídica vista sob o enfoque da Teoria Crítica do Direito” Revista de Direito Civil, RT, a.13,
v.49, julho/setembro 1989, p.21-23
235
Sidney Sanches RT 648/241
236
Francisco Eduardo Padilla foi professor na Universidad Nacional de Tucumán, Argentina, entre
as décadas de trinta e sessenta.
237
São os advogados que, ao pretender a aplicação das leis neste ou naquele caso, funcionam
como verdadeiros órgãos de aplicação das lei.
238
Francisco Eduardo Padilla, Ética y Cultura Forense, pág. 27, da 2ª ed. revista e ampliada em
1962, editora Assandri, Córdoba; ver também Sidney Sanches, RT 648/241
239
Maior prova de indispensabilidade do livre atuar do advogado para a liberdade dos povos são os
registros de nossa história recente, nos rigores da ditadura, onde os advogados e seus órgãos de classe
constituíram a única trincheira que remanesceu resistindo aos "avanços" do totalitarismo, mesmo diante
de toda sorte de perseguições, inclusive atentados a bomba com vítimas fatais.
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 112

pelo Direito no dia a dia. Fazendo da Justiça meta de vida,


contribuem para harmonizar o convívio social.

Libertemo-nos dos preconceitos gerados por alguns


(poucos240) maus exemplos cujo lugar são os anedotários jurídicos,
página virada da história na evolução do direito241.

240
Proporcionalmente, poucos são os maus exemplos. Mas chamam atenção. Como uma ovelha
negra num rebanho – é uma só mas, de longe, se destacam. Valorizando os bons profissionais,
contribuímos para aprimorar a profissão, separando o joio do trigo. Quem sabe este dia, em que não
haverá mais “ovelhas negras” não esteja, assim, tão longe ? Depende de nós...
241
Eram tantos os problemas relatados de abusos contra os advogados que, no “Ipsis Litteris”, do
Jornal da OAB/RS em setembro de 1991, p.13, criticavamos os “Castelos Judiciais”, comentando
reclames de Advogados e Estagiários. Apesar de toda abertura política e desburocratização, algumas
escrivaninhas judiciais persistiam criando obstáculos à atividade forense impedindo a extração de
fotocópias nos processos públicos, retardando certidões, ou simplesmente negando o direito de carga dos
autos aos advogados e estagiários em quaisquer processos sob a alegação de que todo prazo para falar
sobre uma decisão judicial ser prazo comum a todas partes, porque mesmo a vencedora poderia reclamar
de algum aspecto. Medievalidades ilógicas, decorrentes da falta de confiança nos profissionais da
advocacia. Escrivão, Chefe de Secretaria, e servidores relutam dar a posse (carga) de autos,
especialmente quando sem procuração. Noticiamos no Jornal do Comércio Porto Alegre, terça-feira, 29
de junho de 1993, p. 12, do Segundo Caderno, que os Tribunais são obrigados a resolver problemas desse
tipo. Certa feita, o STJ teve de garantir aos advogados o "Livre Acesso aos Cartórios" (Ipsis Litteris,
Jornal da OAB -RS, maio/92, p.7) e assegurar a vista dos autos fora Foro quando a 2ª Turma por
unanimidade concedeu o RMS 126-SP Rel. Min. Peçanha Martins. O art. 89-XVIII, da Lei 4.215/63,
permitia ao advogado retirar em carga autos findos por 10 dias, mesmo sem procuração. Servidores,
apoiados pelos magistrados, afirmavam que o art. 40, do CPC editado em 1973 teria revogado esse
direito. O STJ afastou a restrição afirmando que o CPC regulou os casos de processos em andamento,
subsistindo a regra do Estatuto de OAB para autos findos. Seria ilógico entender diferente: Se o
advogado pretende analisar um caso arquivado, estudar a possibilidade de aceitar procuração para propor
ação rescisória ou outra medida, primeiro precisa analisar o processo. Não há como, nem porque, exigir
procuração antes do advogado decidir sobre a viabilidade da causa e acertar os honorários com o cliente.
O novo Estatuto da OAB, Lei Federal de 8.906/94 ampliou os direitos do advogado no art.7º, com essa
regra no inc.XVI:
Art. 7º - São direitos do advogado: I - exercer, com liberdade, a profissão em todo o território
nacional; II - ter respeitada, em nome da liberdade de defesa e do sigilo profissional, a inviolabilidade de
seu escritório ou local de trabalho, de seus arquivos e dados, de sua correspondência e de suas
comunicações, inclusive telefônicas ou afins, salvo caso de busca ou apreensão determinada por
magistrado e acompanhada de representante da OAB; III - comunicar-se com seus clientes, pessoal e
reservadamente, mesmo sem procuração, quando estes se acharem presos, detidos ou recolhidos em
estabelecimentos civis ou militares, ainda que considerados incomunicáveis; IV - ter a presença de
representante da OAB, quando preso em flagrante, por motivo ligado ao exercício da advocacia, para
lavratura do auto respectivo, sob pena de nulidade e, nos demais casos, a comunicação expressa à
seccional da OAB; V - não ser recolhido preso, antes de sentença transitada em julgado, senão em sala de
Estado Maior, com instalações e comodidades condignas, assim reconhecidas pela OAB, e, na sua falta,
em prisão domiciliar; VI - ingressar livremente: a) nas salas de sessões dos tribunais, mesmo além dos
cancelos que separam a parte reservada aos magistrados; b) nas salas e dependências de audiências,
secretarias, cartórios, ofícios de justiça, serviços notariais e de registro, e, no caso de delegacias e prisões,
mesmo fora da hora de expediente e independentemente da presença de seus titulares; c) em qualquer
edifício ou recinto em que funcione repartição judicial ou outro serviço público onde o advogado deva
praticar ato ou colher prova ou informação útil ao exercício da atividade profissional, dentro do
expediente ou fora dele, e ser atendido, desde que se ache presente qualquer servidor ou empregado; d)
em qualquer assembléia ou reunião de que participe ou possa participar o seu cliente, ou perante a qual
Página 113 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

27. Da arte de criar sob pressão:


A advocacia é um exercício que combinando conhecimentos
técnicos - ao contrário do artesão que dispõe242 de liberdade ao moldar o
barro, do escultor que talha a pedra ou madeira, do pintor que esgrima
com o pincel, do maestro criando partitura musical, o advogado é obrigado
a criar sob pressão243, adquiridos com esforço, dedicação, considerável dose

este deva comparecer, desde que munido de poderes especiais; VII - permanecer sentado ou em pé e
retirar-se de quaisquer locais indicados no inciso anterior, independentemente de licença; VIII - dirigir-se
diretamente aos magistrados nas salas e gabinetes de trabalho, independentemente de horário
previamente marcado ou outra condição, observando-se a ordem de chegada; IX - sustentar oralmente as
razões de qualquer recurso ou processo, nas sessões de julgamento, após o voto do relator, em instância
judicial ou administrativa, pelo prazo de quinze minutos, salvo se prazo maior for concedido; X - usar da
palavra, pela ordem, em qualquer juízo ou tribunal, mediante intervenção sumária, para esclarecer
equívoco ou dúvida surgida em relação a fatos, documentos ou afirmações que influam no julgamento,
bem como para replicar acusação ou censura que lhe forem feitas; XI - reclamar, verbalmente ou por
escrito, perante qualquer juízo, tribunal ou autoridade, contra a inobservância de preceito de lei,
regulamento ou regimento; XII - falar, sentado ou em pé, em juízo, tribunal ou órgão de deliberação
coletiva da Administração Pública ou do Poder Legislativo; XIII - examinar, em qualquer órgão dos
Poderes Judiciário e Legislativo, ou da Administração Pública em geral, autos de processos findos ou em
andamento, mesmo sem procuração, quando não estejam sujeitos a sigilo, assegurada a obtenção de
cópias, podendo tomar apontamentos; XIV - examinar em qualquer repartição policial, mesmo sem
procuração, autos de flagrante e de inquérito, findos ou em andamento, ainda que conclusos à autoridade,
podendo copiar peças e tomar apontamentos; XV - ter vista dos processos judiciais ou administrativos de
qualquer natureza, em cartório ou na repartição competente, ou retirá- los pelos prazos legais; XVI -
retirar autos de processos findos, mesmo sem procuração, pelo prazo de dez dias; XVII - ser
publicamente desagravado, quando ofendido no exercício da profissão ou em razão dela; XVIII - usar os
símbolos privativos da profissão de advogado; XIX - recusar-se a depor como testemunha em processo
no qual funcionou ou deva funcionar, ou sobre fato relacionado com pessoa de quem seja ou foi
advogado, mesmo quando autorizado ou solicitado pelo constituinte, bem como sobre fato que constitua
sigilo profissional; XX - retirar-se do recinto onde se encontre aguardando pregão para ato judicial, após
trinta minutos do horário designado e ao qual ainda não tenha comparecido a autoridade que deva
presidir a ele, mediante comunicação protocolizada em juízo. § 1º - Não se aplica o disposto nos incisos
XV e XVI: 1) aos processos sob regime de segredo de justiça; 2) quando existirem nos autos
documentos originais de difícil restauração ou ocorrer circunstância relevante que justifique a
permanência dos autos no cartório, secretaria ou repartição, reconhecida pela autoridade em despacho
motivado, proferido de ofício, mediante representação ou a requerimento da parte interessada; 3) até
encerramento do processo, ao advogado que houver deixado de devolver os respectivos autos no prazo
legal, e só o fizer depois de intimado. § 2º - O advogado tem imunidade profissional, não constituindo
injúria, difamação ou desacato puníveis qualquer manifestação de sua parte, no exercício de sua
atividade, em juízo ou fora dele, sem prejuízo das sanções disciplinares perante a OAB, pelos excessos
que cometer. § 3º - O advogado somente poderá ser preso em flagrante, por motivo de exercício da
profissão, em caso de crime inafiançável, observado o disposto no inciso IV deste artigo. § 4º - O Poder
Judiciário e o Poder Executivo devem instalar, em todos os juizados, fóruns, tribunais, delegacias de
polícia e presídios, salas especiais permanentes para os advogados, com uso e controle assegurados à
OAB. § 5º - No caso de ofensa a inscrito na OAB, no exercício da profissão ou de cargo ou função de
órgão da OAB, o conselho competente deve promover o desagravo público do ofendido, sem prejuízo da
responsabilidade criminal em que incorrer o infrator.
242
Em geral os artistas dispõe de considerável liberdade no uso do tempo para encontrar os
melhores momentos, mais propícios à inspiração criadora.
243
Sobre “o stress na advocacia”, escrevemos um comentário, publicado no Jornal Zero Hora, de
Porto Alegre, edição nº 7.715, do dia 27 de outubro de 1986, pág.35, abordando dois aspectos, o
financeiro e o da pressão. O stress financeiro está na necessidade do advogado viver com uma certa
incerteza do amanhã, tendo de sair em busca do pagamento para seu sustento e das despesas do
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 114

de inspiração sob condições extremas. Há pressão do cliente, que deseja


um trabalho de bom nível: Cobra sucesso. Há pressão do mercado de
trabalho, saturado pelo excesso de mão de obra, nem sempre qualificada,
ofertada a preços aviltantes com os quais é impossível competir, obrigando
a buscar outros mecanismos de atração para a clientela. Há pressão
econômica244: O advogado está acompanhando mais processos do que
gostaria, resultando numa menor disposição de tempo para o estudo de
cada caso. Há pressão do judiciário na fiscalização rigorosa dos prazos
processuais. Há pressão do colega ex adverso sempre disposto a rebater os
argumentos e encontrar mecanismos para anular as estratégias colocadas
em prática.

Em meio a toda pressão, é indispensável clareza, equilibrando


necessidade de concisão com a de apresentar fundamentos. Os
magistrados, com salas repletas de processos, não têm tempo disponível
para ler textos longos, enfadonhos, repetitivos. Os trabalhos jurídicos
devem combinar a linguagem atraente, com boa apresentação. Lidos, e
revisados várias vezes para depurar os erros de digitação, gramática ou
sintaxe, que comprometem a credibilidade, e para tornar mais rápida a
leitura e fácil compreensão.245

escritório. E o stress da injustiça, porque os pratos da balança não têm o mesmo peso: Enquanto o
advogado é escravo dos prazos preclusivos sobre os quais não tem o menor controle, uma vez que não
pode programar quando será intimado da decisão ou para as audiências e outros atos que necessitam
intervenção, convive com a morosidade processual, não apenas dos magistrados, nos exemplos ali citados
naquele artigo, mas dos serviços auxiliares, alguns demorando meses para a prática dos atos mais
singelos. Há exemplos eloqüentes de escrivanias judiciais que desenvolvem um trabalho exemplar, como
– no caso de Porto Alegre, as 7ª e 11ª Varas Cíveis, as quais já tivemos oportunidade de elogiar em
trabalho publicado na “Adv Advocacia Dinâmica COAD”, Boletim Informativo Semanal nº 50/90, de 14
de dezembro de 1990, pág. 506-505, sob título “Da penhora em face da Medida Provisória nº 143, e Lei
nº 8009”. Todos estes trabalhos estão disponíveis em www.padilla.adv.be/teses
244
Essa pressão não ocorre, em geral, nos profissionais solidamente estabelecidos na carreira, ou
que dispõe de outras fontes de renda, que se torna verdadeiramente liberais, no sentido de que podem
escolher carinhosamente as causas que desejam patrocinar. É o caso dos Procuradores do Estado e do
Município
245
Numa conversa ou mesmo em uma exposição oral, é possível perceber o grau de
acompanhamento do(s) interlocutor(es) que pretendemos convencer. Uma das dificuldades do texto
escrito está na diferença: A exposição que pretende convencer precisa observar uma preparação. Se
pensar e escrever, suas idéias poder ser ótimas, mas o texto que resulta pode ser uma confusão que nada
esclarece, muito menos convence. Primeiro é preciso pensar qual é o OBJETIVO (GOAL), ou qual é a
mensagem que pretendemos transmitir? Definido esse objetivo, a forma de o colocar em prática, HOW
TO, consiste em pensar em tudo que será preciso saber para alcançar a conclusão. Convém fazer
anotações. Sugerimos uma folha, ficha ou página para cada tópico que deve ser abordado. Terceiro,
analise cada tópico, do ponto de vista de como o expor para convencer. Há fatos e fundamentos que o
Página 115 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

Dentre as atividades onde a criatividade predomina, a advocacia


é a única na qual o trabalho criativo deve ser desenvolvido dentro de prazos
apertados246. Em alguns momentos, como nas audiências de instrução e
julgamento, inquirições, nos instantes que antecedem uma sustentação
oral, e durante ela, o nível de atenção do advogado assemelha-se ao de um
piloto de Fórmula Um ao ingressar numa curva a 300 km/h.

Advogar é, sobretudo, a arte de encontrar a inspiração criadora


e fazê-la fluir sob forte pressão:

"O Direito é muito maior do que a Lei e seu objetivo


deve ser sempre a realização da Justiça" 247.

A aplicação do mais importante princípio de direito processual -


a legalidade – encontra no contraditório248 um de seus principais
componentes porque, sem ele, comprometer-se-ia a imparcialidade. Por
isto, o advogado é indispensável. Sem ele, não há condições para realizar
Justiça:

“Os advogados são a sustentação da força e grandeza do

destinatário deve saber, e estes serão registrados. Contudo, é preciso que esse registro seja acompanhado
de explicações, para o caso de nossa suposição sobre o destinatário saber do que falamos não ser correta.
São úteis as notas de rodapé com as informações. Também, numa tese longa, pode-se adotar a estratégia
de indicar qual a conclusão que pretendemos naquele item no primeiro a último parágrafo. De forma que
se o nosso interlocutor já conhece aquilo, poderá pular toda a fundamentação e passar para o próximo
item ou capítulo. Ainda nesse ponto, é aconselhável jamais supor que o destinatário sabe tudo, muito
menos que nada sabe. Busque um equilíbrio. As informações essenciais devem estar no texto, as
complementares em notas de rodapé. Quarto PENSAR em como expor logicamente os tópicos para
facilitar a conclusão desejada. Por isto estar cada ponto em fichas, folhas ou páginas, facilita, pois aqui é
a hora de simplesmente ordená-las. Então, começa o trabalho de escrever, colocar e tirar, mover daqui
para ali, mudar a ordem, de frases, parágrafos, etc., enfim, editar.
www.padilla.adv.br/LinguagemJuridica.mht
246
Exemplos de prazos mínimos são de 24 horas para comparecimento ou prática de ato cível (CPC,
art.192) e 48 horas para embargos declaratórios no Processo Penal (CPP art. 619). Até a Reforma, em
1994, a sentença cível só podia ser embargada até 48 horas da intimação, conforme antigo art.464 do
CPC, hoje revogado, vigorando prazo de 5 dias.
Os prazo mais comuns em Processo Penal são de três (3) dias, CPP art.46 § 2º, 58, 145 II, 384 §,
395, 405, 447 §, 500, 537, 600 in fine e §1º, 689 §1º, 757, 775 V.
Em Processo Civil, o prazo menor era de cinco (5) dias (art.185, 398, 535, 557 CPC) que, até a
reforma, também vigorava para o agravo de instrumento (artigo art.522): após 1995, o prazo para o
agravo de instrumento é de dez dias (novo art.522 CPC), mas o agravante possui mais encargos: deve
documentar a petição com cópias e certidões, e efetuar o preparo previamente.
247
Ministro Garcia Vieira parte final da ementa ao acórdão do Recurso Especial n.495-RJ, provido à
unanimidade em 5-2-1990, Relator o Exmo. Sr. Dr. Ministro Garcia Vieira, in RSTJ, Revista do Superior
Tribunal de Justiça, V.8, abril de 1990, pág.301
248
Constituição Federal, art. 5º, LV à LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e
aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela
inerentes;
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 116

Poder Judiciário. Sem eles, o Judiciário não atuaria: acéfala, a Justiça


não seria distribuída. Se o Judiciário é um organismo vivo, necessário à
oxigênio da ordem e paz sociais, os advogados são-lhe a seiva
vitalizadora, lhes garantindo e sustentando a existência e sobrevivência.
“A advocacia sempre foi e será o único veículo capaz de
acionar a Justiça na direção de seu ideal de paz social.249

O Estatuto da OAB é a cristalização da íntima solidariedade


funcional entre juízes e advogados em prol da Justiça: aflige e perturba
ambos quando qualquer um deles é atingido; ambos sustentam e garantem,
inseparáveis, a Justiça, combinando seus desforços no objetivo comum. Ao
contrário do que pintam prevenções insolentes, não é o advogado a figura
parcial, facciosa, perturbadora da solenidade e magnificência da
Magistratura. Ele é sim, parte da própria Justiça, justaposta, como seu ex
adverso na estrutura do contraditório processual, como condição essencial
à aplicação da lei e prevalência do direito. O advogado, portanto, não é
auxiliar da Justiça. Ele é um órgão da Justiça250. E por ser o advogado um
órgão da Justiça – foi consagrado no art.133 da Constituição Federal promulgada
em 1988 entre as funções essenciais à Justiça. Repetiu texto do Estatuto
da OAB de 1963 onde encontramos regra de paridade entre advogados e
juízes:

“Art. 69. Entre os juízes de qualquer instância e os advogados não há hierarquia


nem subordinação, devendo-se todos consideração e respeito recíprocos”. Estatuto da OAB, Lei
4.215, de 27.4.63

Essa regra é repetida no Estatuto de 1994:


Art. 6º - Não há hierarquia nem subordinação entre advogados, magistrados e
membros do Ministério Público, devendo todos tratar-se com consideração e
respeito recíprocos.
Parágrafo único. As autoridades, os servidores públicos e os serventuários da
justiça devem dispensar ao advogado, no exercício da profissão, tratamento
compatível com a dignidade da advocacia e condições adequadas a seu
desempenho.

Mas nem poderia ser diferente. Afinal de contas, juízes e


advogados fraternizam a vida inteira:

249
Calamandrei, Piero. Eles, os Juizes, vistos por nós, advogados.
250
Adaptado do texto “Institucionalização da advocacia”, da lavra do Dr. Elias Farah, pres. da 93ª
Subseção da OAB-SP, colhido no Informativo Semanal 20/88, p. 211 COAD
Página 117 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

Na mesma Faculdade, escutando os mesmos mestres,


abeberam-se das mesmas fontes doutrinárias.

Em coro, proferiram o mesmo juramento de exercer o grau sem


deserdar jamais a causa da humanidade.

Verdade que, enquanto o advogado opta pela militância em


favor do direito ferido, o magistrado assume a dramática responsabilidade
de julgar.

Nos umbrais, porém da Magistratura, estão os advogados a


julgar os juízes, por exigência da própria Constituição, como integrantes da
banca examinadora do Concurso para Ingresso na Magistratura.

E quando da aposentadoria, é entre as fileiras de advogados


que os magistrados vão encontrar orgulhosa acolhida.

Na inspirada observação de Calamandrei, “juiz e advogado são


como espelhos: cada um deles olhando para o interlocutor, reconhece e
saúda, reflete em si mesmo a própria dignidade”251.

28. Da Advocacia Pública: 252

As legislações de todas unidades da federação atribuem aos


procuradores do Estado a defesa do poder público em juízo e a
consultoria dos entes públicos. Esta, atende não apenas o Estado
podendo abranger “assistência jurídica e administrativa aos
Municípios”. A consultoria acontece por consultas verbais, que
prescindirão de formalismos mas, visando estabelecer relação
institucional com os consulentes, as consultas escritas 253 devem ser

251
Apud Rui de Azevedo Sodré, in O Advogado, seu Estatuto e a Ética Profissional, São Paulo, Ed
RT, 1967, p. 358, colhido e adaptado de discurso do Dr. Justino Vasconcelos, proferido no TJRS, em
4.3.74
252
Baseado no texto “A assistência aos municípios” que publicamos em “O Pioneiro”, 20 de março
de 1995, Caxias do Sul (periódico diário do Grupo RBS)
253
As consultas escritas serão respondidas, conforme o caso, de quatro formas: pareceres,
informações, promoções ou despachos. O Parecer, que após aprovado pelo Procurador Geral do Estado
possui força cogente como orientação obrigatória para a administração pública, destina-se aos casos onde
a questão jurídica possa ser resolvida com relação a toda uma série de casos análogos. A Informação
soluciona questão jurídica que, pela sua singularidade, não comporta aplicação a outros casos. A
Informação depende de aprovação majoritária dos Procuradores do Estado da Região e, havendo
discordância, esse voto divergente deve ser incorporado à Informação para ciência da autoridade
consultante. A Promoção adequa-se aos casos onde a questão jurídica for simples, onde a solução, por
exemplo, está expressa em lei ou em Parecer. O Despacho destina-se à solicitar providências e
diligências, quando - por exemplo, há necessidade de maiores esclarecimentos sobre o objetivo das
consultas formuladas.
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 118

subscritas pela autoridade254. Também há consultoria sobre ADINs


ações diretas de inconstitucionalidade das leis e atos normativos
municipais. Em 1995, administração da PGE-RS comandada por
Manoel André da Rocha e Maurício Batista Berni (este falecido pouco depois,
ambos Professores na Faculdade de Direito da Ufrgs), aproximou a PGE das
comunidades e autoridades municipais no sentido de que a
assistência fosse prestada através das Procuradorias Regionais,
descentralização copiada em outros Estados. Durante as décadas de
setenta a oitenta Estados estruturaram suas procuradorias
procurando estabelecer paridade de carreiras, vencimentos e vedações
com a magistratura e MP. A Constituição Federal de 1988 impôs nova
sistemática tributária. Reduziu receitas dos Estados ao mesmo tempo
em que impôs novas e caras atribuições na saúde, educação,
segurança, etc. provocando uma crise econômica sem precedentes
obrigando uma mudança na carreira de procurador. Dez anos após, a
maioria dos Estados era incapaz de pagar vencimentos à altura de
uma excelência profissional, e os procuradores passaram a completar
sua renda com a advocacia fora das atribuições institucionais
(www.padilla.adv.br/pgers/vencimento). No Rio Grande do Sul, apesar da tradição
de vanguarda jurídica, na contramão da história e influenciada por
uma maioria de procuradores aposentados a quem não interessa, vem
se mantendo uma política de que os procuradores não poderiam
exercer a advocacia fora das atribuições institucionais contrariando a
Constituição Federal e a Lei www.padilla.adv.br/pgers

29. Do impedimento e da incompatibilidade:


Os advogados são fortemente balizados pela ética, que os
impede de representar interesses antagônicos, ainda que em
processos diversos. Chama-se impedimento, previsto na legislação,
essa vedação que, no advogado público, impede de atuar contra a
Fazenda Pública que o remunera. É situação diferente da
incompatibilidade. A incompatibilidade é mais ampla, e resulta na
impossibilidade de advogar fora das atribuições institucionais. A
incompatibilidade ocorre com os Chefes, como os procuradores-gerais
e a eles equiparados, bem como aos seus substitutos legais porque,
na qualidade de representantes plenos de um ente público, não
podem exercer a advocacia senão na representação estatal.

254
Autoridade que formula a consulta pode ser, se do Poder Executivo Municipal, seu chefe, o
Prefeito Municipal; quando oriundas do Legislativo, pelo Presidente da Câmara de Vereadores
Página 119 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

Não obstante muitos proclamem suposta incompatibilidade


dos procuradores do Estado do RGS atuarem fora das atribuições
institucionais, desde meados da década de noventa eles atuam
num total que soma dezenas de milhares de processos nos quais
receberam procurações de pessoas jurídicas de direito privado conforme
documentado no processo 110141976 da 5ª Vara da Fazenda Pública de Porto Alegre e Agravo de Instrumento nº
70004587192 no tribunal de Justiça gaúcho. O Poder Público Estadual, e sua
Procuradoria Geral do Estado referindo-se ao Estatuto da OAB e seu art. 30 que trata
dos impedimentos confessou que o Estado não pode ampliar restrições da
Lei Federal porque “se a lei federal disciplina... não cabe ao Poder local
acrescer novas hipóteses...” 255.

No mencionado processo houve acordo, homologado em


ambos graus de Jurisdição, e os procuradores gaúchos em setembro
de 2004 começaram a receber honorários advocatícios pelo trabalho em prol
das entidades de direito privado. Essa questão possui interessantes
aspectos constitucionais sobre a liberdade do exercício de
qualquer profissão, e o princípio maior da liberdade positiva que
poderá aprofundar, e até se estarrecer diante das perseguições
desencadeadas durante a verdadeira batalha jurídica travada pelos
procuradores que lutaram por contraprestação justa pelo trabalho,
acessando www.padilla.adv.br/pgers/oab2005.pdf

30. Do Ministério Público:


Entre as funções “Essenciais á Justiça” a primeira
lembrada na Constituição Federal, antes mesmo do advogado, foi o
Ministério Público. Não é que o promotor de justiça seja mais
importante que o advogado, mas porque este, o advogado, exerce um
ministério privado256, enquanto o Ministério Público, como o nome
indica, é servidor público.
Promotores e Procuradores de Justiça no Poder Judiciário Estadual,
Procuradores da República na Justiça Federal, e Procuradores do Trabalho
255
Através de requerimento de fls. 218 a 226 do Agravo de Instrumento nº70004587192 ante o
tribunal de Justiça gaúcho de 2 de julho de 2002 no qual o Exmo. Sr. Dr. Procurador Geral Adjunto para
Assuntos Jurídicos gaúcho postulava nos limites da sua competência de representar plenamente o Estado.
256
No capítulo “Advocacia: eterno postular & recorrer“ compare com o “Ministério Privado”
exercido pelo advogado: também em http://www.padilla.adv.br/teses/oab/
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 120

naquela Justiça especializada, cumprem duas funções distintas. Fiscal de Lei,


ou parte. Como fiscal da Lei, zela pela observância do direito. É custos
legis em causas de interesse público (ação civil pública, ação popular, falência e
concordata; com incapazes, ações de estado, capacidade civil, direito de família, litígio coletivo pela
posse de terras, meio ambiente CPC art.82; usucapião art.944; jurisdição voluntária art.1105)
sujeitando-se aos mesmos impedimentos dos juízes (CPC art.138-I). Fala
depois de todas partes. Pode requerer provas e diligências (CPC art.83).
Também pode atuar como parte. Promove ações penais
públicas. Instaura inquéritos e ajuíza ações civis públicas (Lei
7.347/85 art. 5º; ou prossegue a ação quando o autor desiste § 3º do
mesmo artigo). Prossegue ação popular quando o autor desiste (Lei
4.717/65 art. 9º). Promove inventário (quando herdeiro incapaz art.
988-VIII CPC), procedimentos de jurisdição voluntária (art. 1.104
CPC), interdição (art. 1.177-III CPC). Em quaisquer hipóteses de
atuação, como parte ou fiscal, o Ministério Público deve ser intimado
pessoalmente de todos os atos257.

257
Constituição Federal, Art. 127. O MP (Ministério Público) é instituição permanente, essencial à
função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos
interesses sociais e individuais indisponíveis. § 1º São princípios institucionais... a unidade, a
indivisibilidade e a independência funcional. § 2º... é assegurada autonomia funcional e administrativa,
podendo, observado o disposto no art. 169, propor ao Poder Legislativo a criação e extinção de seus
cargos e serviços auxiliares, provendo-os por concurso público de provas ou de provas e títulos, a política
remuneratória e os planos de carreira; a lei disporá sobre sua organização e funcionamento. § 3º O MP
elaborará sua proposta orçamentária dentro dos limites estabelecidos na lei de diretrizes orçamentárias. Art. 128. O
MP abrange: I - o MP da União, que compreende: a) o Ministério Público Federal; b) o Ministério Público do
Trabalho; c) o MP Militar; d) o MP do Distrito Federal e Territórios; II - os MP dos Estados. § 1º O MP da União
tem por chefe o Procurador-Geral da República, nomeado pelo Presidente da República dentre integrantes da
carreira, maiores de trinta e cinco anos, após a aprovação de seu nome pela maioria absoluta dos membros do
Senado Federal, para mandato de dois anos, permitida a recondução. § 2º A destituição do Procurador-Geral da
República, por iniciativa do Presidente da República, deverá ser precedida de autorização da maioria absoluta do
Senado Federal. § 3º Os MP dos Estados e o do Distrito Federal e Territórios formarão lista tríplice dentre
integrantes da carreira, na forma da lei respectiva, para escolha de seu Procurador-Geral, que será nomeado pelo
Chefe do Poder Executivo, para mandato de dois anos, permitida uma recondução. § 4º Os Procuradores-Gerais nos
Estados e no Distrito Federal e Territórios poderão ser destituídos por deliberação da maioria absoluta do Poder
Legislativo, na forma da lei complementar respectiva. § 5º Leis complementares da União e dos Estados, cuja
iniciativa é facultada aos respectivos Procuradores-Gerais, estabelecerão a organização, as atribuições e o
estatuto de cada MP, observadas, relativamente a seus membros: I - as seguintes garantias: a)
vitaliciedade, após dois anos de exercício, não podendo perder o cargo senão por sentença judicial
transitada em julgado; b) inamovibilidade, salvo por motivo de interesse público, mediante decisão do
órgão colegiado competente do MP, por voto de dois terços de seus membros, assegurada ampla defesa;
c) irredutibilidade de subsídio, fixado na forma do art. 39, § 4º, e ressalvado o disposto nos arts. 37, X e
XI, 150, II, 153, III, 153, § 2º, I;" II - as seguintes vedações: a) receber, a qualquer título e sob qualquer
pretexto, honorários, percentagens ou custas processuais; b) exercer a advocacia; c) participar de
sociedade comercial, na forma da lei; d) exercer, ainda que em disponibilidade, qualquer outra função
pública, salvo uma de magistério; e) exercer atividade político-partidária, salvo exceções previstas na lei.
Art. 129. São funções institucionais do MP: I - promover, privativamente, a ação penal pública, na forma
da lei; II - zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos
direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia; III -
promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio
Página 121 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

31. Das modalidades de processo:


Ao examinar o fenômeno processual, percebemos a existência
de espécies de processos: conhecimento, liquidação, execução, cautelar,
especiais.
O processo inicia quando o autor apresenta a petição inicial
perante o servidor judicial que atua como Distribuidor do Foro ou, ainda
quando, em caso de urgência, antes mesmo de distribuição formal,
apresenta a petição diretamente a um juiz e obtém despacho. O
procedimento, entretanto, precede ao processo, iniciando com atos do
advogado ou do representante do Ministério Público (e seus auxiliares) na
pesquisa e edição da petição inicial, seleção dos documentos que a
acompanharão dentre os quais a procuração da parte autora. A procuração
é dispensada em 2 a 5 casos. A quantidade de casos varia conforme
agrupemos os de mesma natureza: 1º Quando o autor atua em causa
própria (art. 36 CPC). 2º Mas semelhante à atuação em causa própria
acontece quando atua como advogado o próprio representante legal da
autora pessoa jurídica ou entidade abstrata, legitimada
extraordinariamente a ser parte (CPC, art. 12 inc. III a V e VII a IX). 3º
Havendo urgência em ajuizar (art. 37 CPC) o advogado pode assumir
responsabilidade pessoal por qualquer dano que acarrete o ajuizamento,
protestando por juntar em 15 dias, prorrogáveis por mais 15. 4º As
pessoas jurídicas de direito público interno são representadas por seus
procuradores estatuários. 5º Semelhante natureza é a representação do

ambiente e de outros interesses difusos e coletivos; IV - promover a ação de inconstitucionalidade ou


representação para fins de intervenção da União e dos Estados, nos casos previstos nesta Constituição; V
- defender judicialmente os direitos e interesses das populações indígenas; VI - expedir notificações nos
procedimentos administrativos de sua competência, requisitando informações e documentos para instruí-
los, na forma da lei complementar respectiva; VII - exercer o controle externo da atividade policial, na
forma da lei complementar mencionada no artigo anterior; VIII - requisitar diligências investigatórias e a
instauração de inquérito policial, indicados os fundamentos jurídicos de suas manifestações processuais;
IX - exercer outras funções que lhe forem conferidas, desde que compatíveis com sua finalidade, sendo-
lhe vedada a representação judicial e a consultoria jurídica de entidades públicas. § 1º - A legitimação do
MP para as ações civis previstas neste artigo não impede a de terceiros, nas mesmas hipóteses, segundo o
disposto nesta Constituição e na lei. § 2º - As funções de MP só podem ser exercidas por integrantes da
carreira, que deverão residir na comarca da respectiva lotação. § 3º - O ingresso na carreira far-se-á
mediante concurso público de provas e títulos, assegurada participação da Ordem dos Advogados do Brasil em
sua realização, e observada, nas nomeações, a ordem de classificação. § 4º - Aplica-se ao MP, no que couber, o
disposto no art. 93, II e VI. (II - promoção de entrância para entrância, alternadamente, por antigüidade e
merecimento (...omissis...); VI - a aposentadoria dos magistrados e a pensão de seus dependentes observarão o
disposto no art. 40) Art. 130. Aos membros do MP junto aos Tribunais de Contas aplicam-se as disposições desta
seção pertinentes a direitos, vedações e forma de investidura.
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 122

Ministério Público, por seus membros, igualmente nomeados pelos mesmos


procedimentos e formalidades que os procuradores públicos. Aliás, a origem
dos advogados dos entes públicos e do Ministério Público confunde-se na
antiga figura, conhecida, dentre outros nomes, por “advogados de ofício”
existentes desde o império. Aprofunde seus estudos sobre advocacia
pública em www.padilla.adv.br/anape

No processo de conhecimento o autor pretende que o Estado-


Juiz reconheça algum direito, declare a existência ou inexistência de
alguma relação, imponha obrigação ao réu, etc. No início desse processo,
autor e réu estão em pé de igualdade. O autor diz ter algum direito. O
Estado-Juiz abre prazo para o réu responder:

Processo Estado-Juiz O autor


de ä 258 æ 259 ALEGA
Conhecimento Autor Réu ter direito
Enquanto sentença eficaz do Estado-juiz não reconhece o direito alegado pelo autor as partes são iguais e
como tal devem ser tratadas ó Princípio da Isonomia arts.1º-III+5º caput e inc. I e II Constituição Federal

Elio Fazzalari salienta, no contraditório, o elemento conceitual


essencial do processo de conhecimento (Diffusione del Processo e Competi della
Dottrina, 1958, reiterado em trabalhos posteriores Istituzioni di Diritto
Processuale). A ordem jurídica assegura a legalidade e ampla defesa: LV - aos
litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o
contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes; O contraditório
concretiza-se no momento em que há duas versões; nesse momento, com
relação à resposta, opera-se a preclusão:
A preclusão do prazo da resposta pode ser temporal,
consumativa, ou lógica. Temporal acontece pelo decurso do prazo: Art. 183.
Decorrido o prazo, extingue-se, independentemente de declaração judicial, o direito de praticar
o
o ato, ficando salvo, porém, à parte provar que o não realizou por justa causa. § 1 Reputa-se
justa causa o evento imprevisto, alheio à vontade da parte, e que a impediu de praticar o ato por
si ou por mandatário. § 2o Verificada a justa causa o juiz permitirá à parte a prática do ato no
prazo que Ihe assinar.
Consumativa é a operada pela apresentação, ainda que antes do
prazo: Art. 303. Depois da contestação, só é lícito deduzir novas alegações quando: I - relativas

258
Inicia o processo com a apresentação da petição: CPC Art. 263. Considera-se proposta a ação,
tanto que a petição inicial seja despachada pelo juiz, ou simplesmente distribuída, onde houver mais de
uma vara...
259
Quando o réu é citado, surge a relação processual: Art. 263. in fine... A propositura da ação,
todavia, só produz, quanto ao réu, os efeitos mencionados no art. 219 depois que for validamente citado.
Página 123 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

a direito superveniente; II - competir ao juiz conhecer delas de ofício; III - por expressa
autorização legal, puderem ser formuladas em qualquer tempo e juízo.

Lógica é a prática de atos incompatíveis com a vontade de


contestar, e que importem reconhecimento do pedido: Art. 130. Caberá ao juiz, de
ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias à instrução do processo,
indeferindo as diligências inúteis ou meramente protelatórias. Art. 269. Haverá resolução de mérito:
(...) II - quando o réu reconhecer a procedência do pedido.

Se o réu não contestar, isso equivale a confirmar os fatos


alegados pelo autor, tornando-os incontroversos. Fato não contestado é fato
confessado: CPC Art. 302. Cabe também ao réu manifestar-se precisamente sobre os fatos
narrados na petição inicial. Presumem-se verdadeiros os fatos não impugnados, salvo: I - se não
for admissível, a seu respeito, a confissão; II - se a petição inicial não estiver acompanhada do
instrumento público que a lei considerar da substância do ato; III - se estiverem em contradição
com a defesa, considerada em seu conjunto. Parágrafo único. Esta regra, quanto ao ônus da
impugnação especificada dos fatos, não se aplica ao advogado dativo, ao curador especial e ao
órgão do Ministério Público.

O Estado-juiz, contudo, não está vinculado ao enquadramento


legislativo da inicial. O juiz pode entender que a natureza jurídica dos fatos
incontroversos é diferente da alegada pelo autor. Por exemplo, na inicial, a
reintegração de posse alega que o autor emprestou um imóvel, e que o réu
se comprometeu a pagar as despesas de condomínio e Iptu, e as prestações
do financiamento hipotecário, durante determinado período, findo o qual o
réu não devolveu o imóvel. Citado, o réu não contesta. O Juiz, apesar dos
fatos incontroversos vai extinguir a ação (art. 367-VI, CPC) porque a natureza
da relação jurídica é de locação, e somente pode ser retomada a posse
mediante ação de despejo, um procedimento especial com tutela de ordem
pública.260

No processo de execução a situação é bastante diferente.


Quem ajuíza a ação é muito mais do que simplesmente um autor. É um
credor, o exeqüente. No pólo passivo, não é apenas um réu; o acionado é
um devedor, o executado.

Até a decisão do processo de conhecimento, as partes eram iguais.


Mas a partir do momento quando o Estado-Juiz decide favoravelmente a uma
das partes desaparece a condição de igualdade. Cabe ao Estado-Juiz, no

260
Lei 8.245/91, das Locações: Art. 5º Seja qual for o fundamento do término da locação, a ação do
locador para reaver o imóvel é a de despejo. Parágrafo único. O disposto neste artigo não se aplica
se a locação termina em decorrência de desapropriação, com a imissão do expropriante na posse do
imóvel.
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 124

processo de execução, tomar providências para que a igualdade seja


restabelecida.

No processo de execução, o credor tem um título que legitima


seu direito. No início do processo de execução os pratos da balança não têm
o mesmo peso porque o réu é devedor. Logo, em seu poder há mais do que
deveria, o seu prato está mais pesado. O autor é credor, contudo, falta-lhe
e o seu prato é mais leve. O peso maior na balança do devedor eleva o autor
para bem próximo ao Estado-Juiz, cuja atuação consiste justamente em
restabelecer o equilíbrio. Para isto, retirará do devedor, e entregará ao
credor o bem da vida devido. O processo do trabalho cumpre
adequadamente essa função.

Estado-Juiz deve restabelecer equilíbrio entre as partes


Processo ä æ Há um desequilíbrio:
de Autor æ O réu deve e
Execução Réu O autor é credor
As partes não são iguais e como tal devem ser tratadas ó Princípio da Isonomia arts.1º-III+5º caput e inc. I e II
Constituição Federal ó o Estado-juiz deve determinar atos eficazes para o desiderato do Sistema Jurídico que é
transferir do patrimônio do devedor para o do credor o necessário

A maior crise do processo civil moderno acontece nas


execuções. Sentenciar uma ação ordinária pode até dar trabalho. Fazer um
devedor pagar...

O processo de conhecimento evoluiu. O Juiz pode antecipar


a tutela quando em cognição sumária “se convença da
verossimilhança da alegação” (art. 273-caput) em caso de “...abuso de
direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu” (art. 273-II)
– e contra tal decisão só cabe agravo, recurso desprovido de efeito
suspensivo que apenas excepcionalmente recebe. Os recursos
mudaram em passo de tartaruga: A apelação possui sempre
efeito suspensivo, exceto naquelas hipóteses previstas em lei (art. 520), e
que agora contemplam também a antecipação da tutela (art. 520-VII CPC).
Responda rápido: Considerando que da sentença cabe apelação com
efeito suspensivo porque o juiz pode mandar executar uma tutela
Página 125 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

antecipatória, isto é, uma decisão provisória, e não pode mandar


executar a decisão definitiva?

O processo de execução recebeu reformulação cosmética,


quando necessitava reposicionamento ideológico. 261

O princípio da isonomia tem enfoques diferentes no


processo de conhecimento e no processo de execução. O
desconhecimento de como funciona o princípio conduz à ineficácia da
prestação jurisdicional executiva. No processo de conhecimento, as
partes, autor e réu, são iguais e assim devem ser tratados.

Contudo, no processo de execução, quando uma sentença


transitada em julgado determinou que o réu é devedor, os pratos da
balança estão em desequilíbrio, como se vê na figura acima.262

O mesmo juiz que pode – num processo de conhecimento –


deferir tutela antecipada mandando seqüestrar bens, arrestar
créditos, enfim, tornar indisponível o patrimônio do réu, ou deferir a
medida que for adequada à proteção do direito, não raro assiste o
processo de execução ficar paralisado quando o devedor esconde os
bens, oculta-se, e utiliza de todos expedientes para retardar e impedir
a satisfação do crédito.

261
Isto pode mudar? Confira www.padilla.adv.br/processo/morosidade/
262
O réu é devedor. Causou um dano ou recebeu sem dar a devida contraprestação. O credor está
desfalcado, na mesma proporção em que o Devedor possui a mais. As partes não são iguais. Estão em
desequilíbrio e o Juiz deve restabelecer o equilíbrio, determinando providências e, se necessário, dentro
da lei, ser rigoroso com o devedor.
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 126

O problema está na posição perceptual. As execuções são


despachadas pelos mesmos juízes que examinam os processos de
conhecimento e que incorporaram os hábitos daquela outra modalidade de
processo. No processo de conhecimento, o contraditório é essencial.
Acostumado a essa dialética, o juiz termina tolerando que o devedor
comporte-se como um réu em processo de conhecimento, fazendo toda
espécie de manifestações, pedidos, etc. Anos depois do trânsito em julgado,
voltam a criticar a sentença. E juntam peças, não raro cópias do próprio
processo, e ao invés de reprimir esse conduta ilegal, o juiz abre “vista” ao
credor. A impunidade leva ao total desrespeito pelos devedores. Até que o
Credor se irrita, com razão, e se não tiver prudência, e reclamar, aí mesmo
é que o processo não vai andar, e pode até ser arquivado.

Toda essa confusão acontece por falta de compreensão da


natureza do processo de execução. Prova, blá, blá, blá, juntada de
documentos, petição “disto”, ou “daquilo”, etc., são comportamentos para
um processo de conhecimento.

No processo de execução apenas interessa uma única coisa:


como vamos obter, do devedor, a satisfação da obrigação. O devedor deve
Página 127 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

falar? Sim, para oferecer bens a penhora, dizer o que prefere perder entre
seus bens, propor um parcelamento e até, admite-se, discutir atualizações.
Evidentemente poderá reclamar de quaisquer ilegalidades que ocorram,
contudo, o processo de execução deve se movimentar em direção à tomada
de bens do devedor e satisfação do credor 263.

32. Da Liquidação de Sentença

Embora, fisicamente, aconteça dentro dos autos do próprio


processo, constitui novo processo de conhecimento posterior à
sentença. Através desse procedimento especial de jurisdição
contenciosa e de cognição sumária (sumária porque examina aspectos limitados)
verifica-se o que é devido ao credor. Em alguns casos, pode depender
de perícia ou até mesmo produção de provas como perícias ou
depoimentos em audiência (art. 608, CPC). Em sendo um novo processo,
discutia-se a necessidade de citação pessoal do próprio réu, não raro
providencialmente "desaparecido" para adiar o andamento do
processo. O parágrafo único264 colocado no art. 603 do CPC acabou
com o problema de localizar o devedor. A citação ocorre na pessoa do
advogado que o representou no processo de conhecimento. 265

263
O art. 605 CPC permite ao devedor evitar a execução fazendo-a às avessas conforme art.570
CPC. O devedor deposita o valor que entende devido, indicando por petição, ou em anexo ao
requerimento, os critérios de cálculo adotados para chegar à quantia.
264
O CPC de 1973 foi alterado na liquidação de sentença pela Lei Federal nº 8.898, de 29-6-94,
publicada no DJU de 30-6-94, em mais um dos excelentes projetos elaborados pela Comissão de
Notáveis capitaneada pelo Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, Athos Gusmão Carneiro, e Ada
Pellegrini Grinover. São pequenas alterações, no plano teórico perceptíveis apenas aos operadores mais
atentos, mas que produzem enorme agilização nas demandas, demonstrando, como no dito popular, que
em pequenos frascos encontramos fragrâncias de aroma insuperável. Demonstrando o esmero da
Comissão, o art.609 remete ao procedimento comum, nova denominação do procedimento ordinário.
Comentamos as modificações em dezenas de artigos, tanto os publicados no Ipsis Litteris (Jornal da
OAB-RS), no Segundo Caderno do Jornal do Comércio, e na Advocacia Dinâmica do COAD, como –
por exemplo, Jornal do Comércio, Quinta-feira, 04 de agosto de 1994, p.12; Nossos Tribunais,
(doutrina)COAD, Boletim nº 34/95, 25 de agosto de 1995, p. 370; Advocacia Dinâmica, boletim semanal
nº 34, ano 04, 1995, p. 695, disponíveis em www.padilla.adv.br/teses
265
Preocupa a possibilidade, ad horrorem, do dispositivo ter sua efetividade esvaziada por manobra
indigna. Bastaria que, logo que transitada em julgada, o devedor extra-autos solicite aos advogados
renunciarem ao mandato. A nova norma processual cairia num vazio. Para evitar essa possibilidade os
magistrados devem permanecer atentos, dando a renúncia de mandato rigorosa observância do art. 45, do
CPC, pelo qual o advogado deve continuar a representar o constituinte até 10 dias depois de notificar o
ex-cliente da renúncia. O Estatuto da OAB, Lei Federal nº 8.906, de 4-7-94, faz idêntica determinação no
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 128

Novidade da reforma do CPC em 1994, a enxuta redação


do art. 604. O texto de 1994 permite ao credor pode ingressar
diretamente com o pedido de execução de sentença, abreviando o
processo. A petição de execução de sentença trará em si mesmo, ou
em anexo, os cálculos aritméticos pelos quais se chega ao montante
devido e o pedindo a citação para pagar em 24 horas na forma do art.
652, do CPC. Além de agilizar o processo, evita a necessidade de
“descida”266 dos autos ao contador, a qual era seguida de vista as
partes da conta, de petições, até que fosse homologada, tudo
dependendo de publicação; antes, da decisão que homologava a
conta, o devedor podia recorrer e protelar, pois era obrigatória a
abertura de vistas ao recorrido, a subida ao Tribunal, julgamento,
trânsito em julgado, etc., atos que atrasam o processo. Ademais, o
novo sistema implica economia de custas. Torna-se desnecessário o
pagamento ao contador do foro por contas que o próprio credor pode
apresentar e, via de regra, precisava fazer para poder conferir a que,
antes, era realizada pelo contador do Foro...

A nova sistemática criou um problema quando a realização


da conta depende de documento em poder do devedor. Por exemplo,
os credores do FGTS necessitam o saldo dos períodos em que houve a
correção monetária a menor. Os requerem na Caixa Federal, mas esta
não os fornece. O credor pede ao Juiz para intimar a Caixa mas este
afirma que é ônus do credor apresentar a conta. Em 7 de agosto de
2002, entrou em vigor importante alteração que resolve o problema
acrescentando parágrafos ao art.604 267 pelo qual o devedor é

art. 5º, § 3º.


266
Descida dos autos ao contador é expressão usual no Foro porque, na maioria dos prédios, esses
serviços se situam nos pavimentos mais baixos.
267
A Lei nº 10.444, de 7 de maio de 2002 acrescentou ao art. 604 dois parágrafos: § 1º Quando a
elaboração da memória do cálculo depender de dados existentes em poder do devedor ou de terceiro, o
juiz, a requerimento do credor, poderá requisitá-los, fixando prazo de até 30 (trinta) dias para o
cumprimento da diligência; se os dados não forem, injustificadamente, apresentados pelo devedor,
reputar-se-ão corretos os cálculos apresentados pelo credor e a resistência do terceiro será considerada
desobediência. § 2º Poderá o juiz, antes de determinar a citação, valer-se do contador do juízo quando a
memória apresentada pelo credor aparentemente exceder os limites da decisão exeqüenda e, ainda, nos
Página 129 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

intimado a fornecer os dados no prazo que o juiz fixar, no máximo de


trinta dias, sob pena de não poder impugnar os que o credor
apresentar. A fórmula é idêntica a do § 2º, do art.915 CPC, que trata da
prestação de contas na qual o réu que não apresentar as contas no
prazo legal não poderá impugnar as contas apresentadas pelo autor.
O Juiz julga as contas declarando o saldo credor apresentado. O
risco, para o réu que não apresenta valores, é que o autor fica
liberado para apresentar valores estimativos, onde é lícito estimar os
valores máximos possíveis para a relação jurídica discutida. O
devedor não os poderá impugnar.

33. Dos Procedimentos Especiais:


Procedimentos Especiais são regulados em separado, tanto no
IVº e último livro do CPC, quando em legislações esparsas. Isso deve-se a
dois fatores:

(a) O direto tutelado tem natureza importante e o legislador o


destacou; é o caso das ações possessórias, porque a posse é um dos mais
importantes direitos no sistema do Código Civil; nosso país foi
eminentemente agrícola; a ação tem rito ordinário, mas comporta fase
prévia de concessão de liminar, e tem natureza dúplice, isto é, o réu pode
pedir, contra o autor, proteção semelhante, no próprio processo, sem
necessidade de reconvir.268

(b) O procedimento é repleto de peculiaridades próprias só


encontradas naquele tipo de processo, daí a necessidade de o disciplinar
em separado. É o caso da ação de prestação de contas com duas fases,
pequenos prazos; ou da consignação em pagamento que pode ser
extrajudicial, e possui peculiaridades relacionadas com o depósito, sua
complementação, seu levantamento, etc.

casos de assistência judiciária. Se o credor não concordar com esse demonstrativo, far-se-á a execução
pelo valor originariamente pretendido, mas a penhora terá por base o valor encontrado pelo
contador."(NR)
268
A reconvenção é um pedido, feito em petição avulsa e apresentado junto com a contestação, no
qual o réu pede contra o autor algum direito (conexo ao suporte fático do processo).
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 130

Os procedimentos de Jurisdição voluntária, que abordamos ao


tratar do conceito de jurisdição, são destacados na última parte do CPC. Há
um interesse público sobre as relações envolvidas e seu procedimento,
embora utilizando considerável parcela de regras do processo em geral,
apresenta peculiaridades que justificam o destaque.

34. Da Prova, instrução e julgamento:


A formação do convencimento do juiz a respeito dos fatos da causa
pressupõe que ele conheça as regras de direito, e que sua experiência se
complete além da própria prova, com o conhecimento de fatos notórios num
determinado ambiente e momento; com as regras da experiência que integram
a disciplina do caso concreto e que levam à aplicação das regras de direito e da
interpretação do seu conteúdo.
Provas devem ser colhidas com respeito ao princípio do
contraditório, ao da igualdade das partes, e perante o juiz.
Isto explica o valor legal de certas provas, cuja livre valoração se
pretendeu subtrair ao juiz. Como se sabe, em certas épocas históricas, um
espírito de desconfiança contra o livre convencimento do juiz trouxe uma série
de regras legais, que limitaram a livre valoração por parte do juiz. E uma
destas regras permaneceu, como se viu pelo exame da confissão, cujo valor da
prova legal se justifica porque fundado sobre uma regra da experiência,
pacificamente identificada: vale dizer, aquela regra, segundo a qual, ninguém
declara qualquer coisa de seu interesse se essa qualquer coisa não é
verdadeira. E como vimos também esta assim chamada regra de experiência
não é absolutamente verdadeira, dado que pode encontrar-se em conflito com
interesses públicos superiores, respeitantes à própria parte que confessa.
Outras considerações devem ser feitas a respeito das presunções, que
representam em rigor, um procedimento lógico para remontar de um fato
conhecido ao fato desconhecido, com base em regras de experiência. Em certos
casos o mesmo legislador escolhe regra de experiência, e, assim, extrai de um
dado fato conhecido certas consequências, de tal forma que a parte
interessada não demonstrando o contrário, ou seja, no caso que não se
verificaram aquelas consequências que o legislador hipotizou, com base numa
regra da experiência encampada pelo legislador.
Em outros casos, ainda, estamos propriamente fora do campo da
prova, entendida no seu sentido moderno. E, tal ocorre, quando o legislador
estabelece uma presunção absoluta de lei, em cuja hipótese a assim chamada
presunção representa uma maneira, não necessariamente correta, de formular
uma norma de lei, dado que em tais casos o destinatário da norma, e assim
também o juiz, não pode substituir a livre valoração do nexo entre o fato
conhecido e o fato desconhecido para valoração, por assim dizer, que é de
ordem legal.
Página 131 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

São as assim chamadas presunções absolutas, que representam,


um resquício histórico de uma lógica meramente formal, e que exclui a
possibilidade de se fornecer em juízo a prova contrária. Existem, enfim, as
chamadas presunções simples (hominis ou facti) que representam, repita-se,
puros processos lógicos para recolher fatos desconhecidos, fatos básicos com
fundamento na experiência livremente eleita pelo juiz.
É preciso, de fato, recordar que a prova por testemunhas é
excluída quando a lei prescreve a prova por escrito (outras regras legais de
prova de origem do antigo direito francês; ver também o art. 401 do CPC
brasileiro). Isto significa que a prova presuntiva é concebida pelo legislador,
como uma prova menos segura do que aquela por documentos, os quais são,
em certa medida, os reis da prova no processo civil. Tudo isso leva à
conseqüência de que, quando seja prescrita prova documental, é excluída
também a prova por presunções simples. Eis uma outra regra de prova legal,
que limita a formação do livre convencimento do juiz.
Nestes sistemas processuais, dentre os quais se incluem tanto o
processo italiano, como também o brasileiro, a iniciativa do processo e da
defesa, pertencem, de regra, às partes litigantes (art. 2° do CPC brasileiro; art.
99 do CPC italiano). É o princípio da demanda que representa a projeção
processual da tutela dos direitos subjetivos, entendidos como o
reconhecimento da autonomia privada dos particulares.
Esta posição social foi particularmente desenvolvida, pela primeira
vez, pela ordenança processual austríaca e, essa lei influenciou sobretudo o
desenvolvimento sucessivo dos sistemas processuais modernos (aí
compreendidos os processos italiano e, também, o brasileiro), onde os poderes
de iniciativa em matéria de prova são, em verdade, não muito extensos e se
concentram nas inspeções dos lugares e das coisas e, ainda, no acesso de
fatos, de lugares e de coisas, que possam constituir fontes de provas, como
ainda na perícia técnica que constitui um procedimento probatório voltado a
fornecer ao juiz o conhecimento de fatos ou de circunstâncias, que, para cujo
conhecimento é necessária a aplicação de particulares regras técnicas,
também exteriores às técnicas jurídicas.
A prova em juízo objetiva à reconstrução histórica dos fatos que
interessam à causa, mas há sempre uma possível diferença entre os fatos, que
ocorreram efetivamente fora do processo e a reconstrução destes fatos no
processo.269
No processo de conhecimento o réu sempre responde, porque
silêncio também é resposta. Quando transcorre o prazo sem manifestação,
na verdade o réu respondeu tacitamente - está satisfeito com os fatos

269 Gian Antonio Micheli, Teoria Geral da Prova, conferência proferida em 6.9.1975 no V°
Curso de Especialização em Direito Processual Civil promovido pelo Setor de Especialização
da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e coordenado pelo prof. Arruda Alvim, que
traduziu do italiano, e o encartou na Revista de Processo n° 3, pág. 161-168.
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 132

alegados pelo autor, os quais passam a ser presumidos verdadeiros270. Após


a resposta do réu segue a fase da verificação da controvérsia sobre fatos e
da prova a produzir.

Toda pretensão, seja do autor ou do réu, fundamenta-se em fato(s)


cuja ocorrência pode ser controvertida.

As dúvidas quanto á veracidade dos fatos afirmados e relevantes


para a decisão da causa constituem os FATOS CONTROVERTIDOS sobre os
quais deve orbitar a prova testemunhal – delimitação ordenada pelo art. 451:
“Ao iniciar a instrução, o juiz, ouvidas as partes, fixará os pontos controvertidos sobre que incidirá a
prova”, e 331, § 2º: “Se, por qualquer motivo, não for obtida a conciliação, o juiz fixará os pontos
controvertidos, decidirá as questões processuais pendentes e determinará as provas a serem
produzidas, designando audiência de instrução e julgamento, se necessário”, ambos do CPC: às
vezes não obedecida. As Ordenações Filipinas ensinavam “a prova é o farol
que deve guiar o juiz nas suas decisões” e não há motivos por que permitir ao
juiz desviar-se de seu rumo com fatos irrelevantes para a decisão da causa.

Havendo suporte fático controvertido (quando as partes divergem quanto a


fatos relevantes) e a documentação não soluciona tal controvérsia, o Estado-Juiz
abre prazo para as partes requererem a produção de provas.

270
A revelia, total ou parcial, normalmente acarreta presunção de veracidade dos fatos afirmados na
inicial (art. 320, I a III) Art. 320 - A revelia não induz, contudo, o efeito mencionado no artigo
antecedente: I - se, havendo pluralidade de réus, algum deles contestar a ação; II - se o litígio versar
sobre direitos indisponíveis; III - se a petição inicial não estiver acompanhada do instrumento público,
que a lei considere indispensável à prova do ato - ou seja, fato não contestado, equivale a fato admitido
no processo como incontroverso. Art. 302 - Cabe também ao réu manifestar-se precisamente sobre os
fatos narrados na petição inicial. Presumem-se verdadeiros os fatos não impugnados, salvo: I - se não for
admissível, a seu respeito, a confissão; II - se a petição inicial não estiver acompanhada do instrumento
público que a lei considerar da substância do ato; III - se estiverem em contradição com a defesa,
considerada em seu conjunto. Parágrafo único. Esta regra, quanto ao ônus da impugnação especificada
dos fatos, não se aplica ao advogado dativo, ao curador especial e ao órgão do Ministério Público. Mas
há direitos indisponíveis ou que a Lei só admita prova por escritura pública. Presunção é dos fatos. Ao
Estado-Juiz cabe dizer qual direito se aplica aos fatos. Por exemplo: o Autor alega que emprestou ao réu
um imóvel, e que este ficou de o devolver quando pedisse. Requer a reintegração de posse no imóvel
porque o réu parou de pagar as prestações do financiamento que se comprometera. Citado, o réu não
contesta os fatos. Mas apesar da revelia, o Estado-Juiz pode não dar ganho de causa ao autor. Porque ?
Porque a relação que o autor descreve é de locação. Empréstimo do imóvel, mas não gratuito, porque o
ocupante assumiu compromisso de pagar as amortizações do financiamento. Nesse caso, a relação
contratual entre as partes é de locação e somente através de uma ação de despejo o autor pode retomar o
imóvel conforme Lei do Inquilinato, 8.245/91 art. 5º “Seja qual for o fundamento do término da locação,
a ação do locador para reaver o imóvel é a de despejo.”
Página 133 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

Através das provas será demonstrada a existência - ou não - dos


fatos alegados sobre os quais se fundamentam as pretensões. Não há porque
provar o desnecessário (art.130 “in fine”) nem limitar ou restringir a admissibilidade
de quaisquer meios para a produção de provas.

Se há controvérsia quanto à questões técnicas, isso demanda


perícia, que deve ser requerida pelas partes é realizada antes da audiência (art.
452-I do CPC) o perito poderá ser convocado a esclarecer o laudo. As partes
requerem a perícia mas o juiz pode indeferir,271 e, para evitar preclusão, o
prejudicado poderá interpor agravo retido (no processo civil) ou apresentar
“protesto antipreclusivo” (processo do trabalho) recurso em sentido estrito no
processo penal.

35. Do Laudo pericial: 272

A Lei 8.455/92 introduziu profundas alterações na perícia.


Acabou com o “compromisso” do perito; a obrigação de ser imparcial e
cumprir com fidelidade o encargo decorre da própria Lei (art. 422) e da
ética profissional. Quando o juiz nomeia o perito fixa prazo para a
entrega do laudo (art. 421 CPC), no mínimo 20 dias antes da audiência
(art.433 CPC). Ultrapassado o prazo sem apresentação do laudo o juiz
pode impor multa e nomear outro perito (art. 424-II, parágrafo único, pelo qual o
faltoso pode responder processo administrativo disciplinar). Dependendo da natureza da
perícia, o laudo é dispensado. Basta ouvir o perito e os assistentes na
audiência “a respeito das coisas que houverem informalmente
examinando ou avaliando” (§ 2º, art. 421). O assistente técnico,
contratado pela parte para defender seu ponto de vista, não está mais

271
Ao juiz é licito a produção de prova pericial quando esta se revela desnecessária ao julgamento
da causa. AgRg no Ag 500602, Rel. M. Castro Filho, DJ de 06/12/2004; Resp n° 499975, Rel. Min. Teori
Albino Zavascki, DJ de 18/10/2004; Edcl no Resp 573230, Rel. Min. Jose Delgado, DJ de 31/05/2004;
Resp. 508476, Rel. Min. Gilson Dipp, DJ de 16/11/2004.
272
"Apontamentos sobre a perícia", por Arruda Alvim (RP 23/9, RBDP 37/17); "A perícia
psicológica", por Lília de Muzio Piccinelli e Maria Cecília Meirelles Ortiz (RT 609/262). "As novas
regras sobre a perícia judicial", por Clito Fornaciari Júnior (RT 690/7, Ajuris 57/233, RF 324/41, RJ
194/5); "Prova pericial: Inovações da Lei 8.455/92", por Rogério de Meneses Fialho Moreira (RT 690/47,
RTJE 111/39, RJ 183/30); "O objeto da prova pericial", por Hugo de Brito Machado (RT 690/276, RF
321/404); "A prova pericial e a recente alteração do CPC", por Carlos Alberto Carmona (RT 691/26); "A
prova pericial e a nova redação do CPC", por Ivan Lira de Carvalho (RJ 185/5, RTJE 107/9, Ajuris
57/241, RT 696/35).
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 134

sujeito à argüições de suspeição (art. 138-III e 422, do CPC).

O perito entrega seu laudo na data fixada e, dez dias depois


e independentemente de intimação, os assistentes deviam apresentar
os seus laudos, pena de presumir acordo com o laudo do perito. Mas
a Lei 10.358/2001 adequou esse aspecto ao princípio da legalidade:
Somente quando intimadas as partes sobre o laudo é que passa a fluir
o prazo de dez dias para o Assistente Técnico apresentar laudo com
opinião divergente.

Ao considerar o compromisso obrigação ética do


profissional e decorrente da Lei, não há obstáculos que um perito seja
contratado pelo autor, antes mesmo de ajuizar a demanda, para fazer
uma perícia prévia, extrajudicial, cujas conclusões acompanharão a
petição inicial: “O Juiz poderá dispensar a prova pericial quando as partes, na
inicial ou contestação...apresentarem pareceres técnicos ou documentos
elucidativos que considerar suficientes” (art.427 CPC). Se o réu entender que o
laudo não é correto, deverá trazer o seu próprio perito, ou apresentar
outro laudo. De posse de ambos laudos o Estado-Juiz terá elementos
para decidir.

36. Dos Sistemas de análise da prova:


No livro II “TGR Teoria das decisões e Remédios processuais”,
analisaremos as espécies de decisões judiciais conforme seu grau de cognição,
e examinaremos os remédios processuais, constituídos dos recursos e
sucedâneos recursais. No momento, oportuno saber que, como não se admite,
no direito moderno, o “non liquet” – isto é, alegar não estar convencido para
decidir a causa, haverá uma sentença, que - demonstra Mauro Cappeletti
(Revista Ajuris 23) vem de sentir. Enquanto evoluíamos das soluções tribais de
liderança (Galeno Lacerda, TGP, Forense, p. 6 e ss.) os sistemas judiciais
para analisar a prova e decidir passaram por diversas fases:
(1) Místicos - porque os julgamentos eram conduzidos por oráculos
e sacerdotes que “traduziriam” aos mortais os desígnios dos deuses.
(2) Acidentais - porque as regras conduziam à vitória do mais forte,
do mais astuto ou do mais sortudo, como no julgamento por duelo, entre
Página 135 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

contendores ou entre um destes e o juiz ou as testemunhas273. Na idade


média, ainda era praticado na França o Duelo Judiciário baseado na crença de
que os deuses não permitiram ao justo perder o combate... Havia também a
prova das duas fogueiras, afastadas a distâncias variáveis e em meio as quais
passavam os contendores, vencendo o que ficasse menos chamuscado ou o
que sobrevivesse;
(3) Arbitrários - porque sujeitos ao total arbítrio do julgador
(4) Tarifado ou da Prova Legal , no qual as provas eram contadas,
como se o juiz fosse matemático. Embora hoje possa parecer ridículo,
representava um progresso em relação aos sistemas anteriores onde não havia
critérios científicos. Ainda que fosse difícil de provar com a “prova contada”,
era possível fazê-lo. A palavra de um nobre, mesmo em proveito próprio, valia a
de dez plebeus. Um nobre, portanto, só podia ser desacreditado por uma
dezena de pessoas - nem sempre possíveis de reunir. O juiz poderia até estar
convencido pelos depoimentos coerentes contrários à palavra do nobre mas a
prova não era suficiente e tinha de acatar a prova legal e decidir com injustiça.
Hoje, quando a parte depõe, não presta compromisso de dizer a verdade e tudo
que falar pode ser usado contra ela, nada aproveitando em seu favor...
(5) Liberdade Total - Como antítese ao Sistema Legal no qual o juiz
estava preso à "tarifa" ou valor atribuído pela Lei e onde, não raro, produzia
injustiça porque mesmo convencido de uma das partes estar com a razão era
obrigado a decidir em favor da outra, aparece um Sistema de Liberdade Total
que muitas vezes significou retorno aos tempos do arbítrio, porque não havia
critérios...
(6) Entre a prisão da prova legal e o desatino da liberdade total (a
"caballero" como gostam os castelhanos) surge o Sistema Racional ou da
Persuasão Racional , também chamado de Livre Convencimento, embora essa
denominação estimule confusões com aquele período anterior por que, embora
livre o convencimento, a fundamentação é obrigatória - como vimos acima -
e deve encontrar correspondência no conteúdo dos autos. O Estado-Juiz pode
ficar convencido com apenas uma testemunha 274.
Embora adotando o Sistema da Persuasão Racional para decisão,
encontramos vestígios dos anteriores sistemas ultrapassados no Direito

273
Na Antiguidade pré-clássica e em Roma, nos tribunais, no cerimonial as testemunhas não
prestavam juramentos solenes sobre um livro sagrado e sim levando a mão direita aos testículos. Há uma
relação entre os dois vocábulos, testículo e testemunha. Os testículos, de fato, são testemunhas
privilegiadas do ato sexual, além de prova de virilidade. Testemunham a verdade, afirmações. A palavra
latina para testemunha era “testis”, a terceira pessoa que poderia descrever os fatos com isenção.
274
"...no Direito Moderno, o peso da prova testemunhal não depende do número de depoimentos
colhidos, mas da respectiva credibilidade" (J.C. Barbosa Moreira). "A validade da prova testemunhal
não é medida pela quantidade de depoentes, mas pela assertiva e coerência do testemunho idôneo."
(TRT da 1º Região, em 30.9.87, 4ª Turma, Relator o Juiz Oldenir de Almeida, Jurisprudência Adv/Coad
n.36140). "O que é necessário é que a prova não dependa exclusivamente desse depoimento, mas seja
corroborada por outros elementos existentes nos autos." (Embargos AC. Civel 8-57, Laranjeiras do Sul,
Paraná, Relator Desembargador Segismundo Gradowski. Revista Jurídica, 34:593)
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 136

Moderno
Como resquício do Sistema da Liberdade Total , estão aqueles
direitos potestativos conferidos ao Juiz que possibilitam contornar o Princípio
da Inércia (também chamado Iniciativa da Partes) e trazer ao processo
elementos de convicção. Tais faculdades são pouco utilizadas pelos juizes em
razão do lamentável acúmulo de trabalho. Quando são empregadas,
demonstram seu verdadeiro valor, sua importância e comprovam que todo o
tempo despendido repercute em acentuada aceleração das atividades
subseqüentes. Uma delas é a oitiva informal das partes, prevista no art. 342,
do CPC.
Mauro Cappelleti275 considera a oitiva informal como um dos
pressupostos do Sistema da Oralidade expressamente adotado no Brasil. Ouvir
o autor e o réu permite limitar a demanda e fatos controvertidos através das
palavras das próprias partes que constituem confissões quando admitem de
fatos desfavoráveis. A confissão é a rainha das provas e se a parte admite o
fato, é desnecessário mais provas e até proibido pretender produzir prova a
respeito (art. 400, inc. I, parte final, do CPC).
O que dizer, então, de outras modalidades de liberdade total do
Estado-Juiz, como: mandar apresentar documentos (art.355), interrogar a
testemunha (art.416), ouvir as testemunhas referidas ou mandar acarear (art. 418),
proceder inspeção (art. 355), formular e indeferir quesitos (art.425), mandar
realizar nova perícia (art.437), proceder inspeção de pessoas ou coisas (art.440),
dispensar provas (art. 407, parágrafo único) e decidir contra o laudo (art.436).
Dentre os resquícios do sistema da "prisão" legal do juiz à prova
"tarifada", então as disposições do art. 405, parágrafo primeiro, inc. III, do
CPC, que diz incapaz de depor, ou seja, sequer sendo ouvido, nem mesmo
como informante, o menor de 16 anos. Trata-se de dispositivo legalóide e
possivelmente inconstitucional por ofensa ao princípio da igualdade. Não há
fundamento compromissar um menor entre 16 e 18 anos que não poderá ser
responsabilizado penalmente por eventual falso testemunho, mas não ouvir o
depoimento de outro um dia mais jovem, digamos, com 15 anos 11 meses e 29
dias de idade, muitos já ingressando nos bancos universitários.
O depoimento de adolescente menor de 16 anos é prova tarifada
com valor zero (nº 0). Não há justificativa lógico-jurídica para a discriminação.
No ângulo diametralmente oposto, também como resquício da prova tarifada,
estão a presunção decorrente da revelia e a confissão, ambas tarifadas como
provas de valor máximo.

37. Da Presunção:

275
Mauro Cappelleti "L'Oralita nel Processo Civile Italiano: Ideale Contro Realtá", in: revista
Brasileira de Direito Processual, vol. 3, pg. 155:67
Página 137 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

"Não há diferença substancial entre prova e presunção..."


276.Porque notória a "...dificuldade de provar certos fatos por via direta...
de sorte que só se revelam por meio de outros fatos com os quais se
relacionam." 277 O"ex eo quod prerumque fit" orienta o operador do processo:
"É tão necessário à vida servir-se também das vias indiretas para
conhecimento das coisas - diz Malatesta - que a natureza previdente, até na
cegueira do animal bruto, criou impulsos instintivos para guiá-lo em direção àquilo
que não se lhe apresenta diretamente à percepção sensorial direta. O Cão que,
farejando o simples vestígio, consegue alcançar... Fatalidade benéfica esta, nos
brutos, que os conduz pela mesma via pela qual nos conduz a razão, e os faz chegar a
um mesmo fim, isto é, ao convencimento deduzido de provas indiretas. Convicção
instintiva e cega, neles; convicção racional e lúcida em nós.
"No homem, é sempre a razão que guia o espírito no seu caminho do
conhecido e desconhecido, por meio daqueles fios ideológicos que ligam o primeiro ao
segundo...
"Sem a possibilidade de valer-se do raciocínio presuntivo para decidir a
lide, o juiz estaria fadado a resolver um número bem diminuto de casos, pondo em
risco a própria finalidade da justiça. É, assim, a presunção um recurso de relevante
importância em matéria de prova." 278
"No plano judiciário, a presunção se apresenta como meio de prova "No
domínio da prova, o legislador interfere várias vezes em nossa sistemática, ora para
dizer quais os meios de sua produção (CC, art. 136, e CPC, art.332 ), ora para estabelecer certas
provas (CC, art. 134), ora para cercear a prova (CPC, arts. 401 e 402), ora para dizer quando
devem ser produzidas (CPC, art.336), ora para estabelecer o ônus probatório (CPC, art.333). O
legislador, compreendendo que em inúmeros casos a prova é de difícil produção,
permite ao juiz que se utilize de sua experiência pessoal para atingir o fato
conhecido." 279
38. Da Introdução aos Princípios da Moral e da
Legislação:
O exame aprofundado sobre provas recomenda estudo do “Tratado
das Provas Judiciais” de Jeremy Bentham. As nossas crianças do Terceiro
Milênio estão cada vez mais precoces, inteligências e capacidades de
aprendizado fantásticas.

Isso, contudo, não é novidade, pois em mil setecentos Jeremy


Bentham, com três anos de idade, estudava filosofia na sua língua, o inglês,

276
Sérgio Carlos Covello "As presunções em Matéria Cível” SP, Saraiva, 1983, pg. 47
277
“A presunção em matéria cível” Sergio Carlos Covello, Saraiva, 1983, p.48
278
Op. cit. p..49
279
“A presunção em matéria cível” Sergio Carlos Covello, Saraiva, 1983, p.52 e nota de rodapé
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 138

em latim e grego, com estrutura e alfabeto diferentes... Não surpreende que,


com apenas cinco anos de idade, fosse conhecido como “Jeremy, o filósofo”280.

Quatro décadas depois, aos 41 anos de idade, um dos maiores


gênios de toda história humana publicou “Uma Introdução aos Princípios da
Moral e da Legislação”. É uma das maiores obras intelectuais da humanidade,
eclipsada porque no ano de 1789, 14 de julho, eclodiu a Revolução Francesa
cujas idéias simples de liberdade, igualdade e fraternidade, contagiaram o
mundo. Na urgência de mudanças não houve espaço para a análise
proposta, profunda e perfeita, do funcionamento da sociedade humana.
Bentham racionalizou séculos à frente do seu tempo.

A obra de Bentham assenta bases para o Direito do Terceiro


Milênio, prova o Tratado das Provas Judiciais com toda sabedoria moderna.
Nesse sentido, depoimentos inquestionáveis dos dois maiores processualistas
latino-americanos de todos os tempos: Eduardo Couture e Santiago Sentis
Melendo:

“Escolhi Jeremias Bentham porque, em meu conceito e

apesar de passageiro eclipse que sofre neste momento, é o filósofo do


progresso jurídico.” Eduardo Couture, referendado por Santiago Sentís
Melendo referindo-se aos “Três poetas do direito: Bentham, Valéry, Rodó”
281 .

39. Da instrumentalidade e do Utilitarismo:


Um dos mais importantes corolários do princípios da legalidade é o
da instrumentalidade das formas ou, simplesmente, da instrumentalidade.
Cândido Rangel Dinamarco, enfatizou-o ao tomar posse no 1ºTACivSP 282

280
Gandhi tinha muito a nos ensinar quando disse: ‘A grandeza de uma nação e seu progresso
moral podem ser julgados pelo modo como seus animais são tratados’. Mas Jeremy Bentham, há
“trocentos” anos, deu o maior argumento contra os maus tratos de animais: "A questão não é Eles
pensam ? ou Eles falam ? A questão é Eles SOFREM."
281
Texto colhido na apresentação de Santiago Sentís Melendo ao Tratado ds Provas Judiciais.
Traduzimos como, de resto, traduzimos todo texto do Tratado... para publicação pela Editora Lenz. Mas a
polêmica em torno da edição do novo Código Civil que trazia um capítulo sobre provas, com centenas de
projetos, destaques, substitutivos, e as peculiaridades da tramitação no Congresso, nos permitiram adiar a
publicação até que, finalmente editado, o novo Código Civil Brasileiro em 2002, veio nosso editor
Ricardo Lenz a falacer, tendo a sua sucessora nos libertando do compromisso podemos, como era já
nossa intenção, disponibilizar o texto em nosso saite.
282
Primeiro Tribunal de Alçada Cível de São Paulo (discurso de posse nos julgados do TACiv.SP,
v. 65, p. 281 e ss.),
Página 139 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

salientando que "... o processo não deve dar a alguém, nem tirar de alguém,
coisa alguma...", idéias que depois desenvolveu em "A Instrumentalidade do
Processo" (SP, RT, 1987). Semelhante tese, com invulgar brilho, é sustentada por
Humberto Theodoro Jr., e, em especial, Carlos Alberto Álvaro de Oliveira, em
diversas passagens de suas notáveis contribuições para a bibliografia jurídica,
denominando-o de formalismo-valorativo. Contudo, o princípio da
instrumentalidade é a aplicação, ao direito processual, da percepção ecológica
do “Utilitarismo” concebida por Bentham, há séculos.

Utilitarismo, o cálculo do bem comum = ecologia!


O ponto de partida do utilitarismo de Bentham encontra-se na sua
crítica à teoria do direito natural que supõe a existência de um "contrato"
original pelo qual os súditos deveriam obediência aos soberanos. Para
Bentham, a doutrina do direito natural é insatisfatória por duas razões:
primeiro, porque não é possível provar historicamente a existência de tal
contrato; segundo, porque, mesmo provando-se a realidade do contrato,
subsiste a pergunta sobre por que os homens estão obrigados a cumprir
compromissos em geral. Em sua opinião, a única resposta possível reside nas
vantagens que o contrato proporciona à sociedade. O cidadão, segundo
Bentham, deveria obedecer ao Estado na medida em que a obediência
contribui mais para a felicidade geral do que a desobediência. A felicidade
geral, ou o interesse da comunidade em geral, deve ser entendido como o
resultado de um cálculo hedonístico, isto é, a soma do bem comum e dores dos
indivíduos. Assim, Bentham substitui a teoria do direito natural pela teoria da
utilidade, afirmando que o principal significado dessa transformação está na
passagem de um mundo de ficções para um mundo de fatos. Somente a
experiência, afirma Bentham, pode provar se uma ação ou intuição é útil ou
não. Conseqüentemente, o direito de livre discussão e crítica das ações e
intuições constitui-se em necessidade da maior importância.
Para sustentar seu princípio utilitarista, Bentham teve que lutar a
vida toda, criticando severamente as instituições tradicionaise,
particularmente, a caótica legislação de seu país. Bentham mencionava
Beccaria (1738-1794) como seu mais importante predecessor. Beccaria
também sustentava o princípio da maior felicidade possível para o maior
número possível de pessoas como o objetivo último de toda legislação.
Orientado por esse princípio, Beccaria criticou a legislação penal então
existente. Bentham deu àquele principio uma aplicação ainda mais ampla e
por essa razão colocou-se em antagonismo aos conservadores. Bentham, por
outro lado, opôs-se também aos revolucionários franceses, quando estes
apelavam para o direito natural e afirmavam os direitos universais do homem.
Para Bentham, o indivíduo somente possui direitos na medida em que conduz
suas ações para o bem da sociedade como um todo, e a proclamação dos
direitos humanos, tal como se encontra nos revolucionários franceses, seria
demasiado individualista e levaria ao egoísmo. Este, segundo Bentham, já é
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 140

muito forte na natureza humana; assim, o que deve realmente ser procurado é
a reconciliação entre o indivíduo e a sociedade, mesmo que seja necessário o
sacrifício dos supostos direitos humanos.
Obviamente que, apesar da generalidade, as idéias de Bentham
foram ofuscadas pelos ideólogos da Revolução Francesa a cujas idéias se
opunha.
Nos Princípios da Moral e da Legislação, principal obra do ponto de
vista filosófico, Bentham estuda pormenorizadamente a aplicação do princípio
de utilidade como fundamento da conduta individual e social. Inicialmente,
indaga que sentimentos devem ser preferidos a outros, salientando que se deve
levar em consideração todas as circunstâncias da satisfação: sua intensidade,
sua duração, sua proximidade, sua certeza, fecundidade e pureza. Indaga, em
seguida, quais os castigos e recompensas que poderiam induzir o homem a
realizar ações criadoras de felicidade e quais os motivos determinantes das
ações humanas, com seus respectivos valores morais.
A respeito dessas questões é de particular importância a análise
dos motivos que levam o homem a agir de certa forma e não de outra. Esse
motivos devem ser chamados “bons” na medida em que possam conduzir
harmonia entre os interesses individuais e os interesses dos outros, enquanto
que “maus” seriam todos aqueles motivos que contrariassem esse objetivo de
equilíbrio entre os homens. Entre os motivos bons, o que mais certamente
conduz, segundo Bentham, à promoção do princípio de utilidade é a
benevolência ou boa vontade. Em seguida, viriam a necessidade de estima dos
outros, o desejo de receber amor, a religião e os instintos de autopreservação,
de satisfação, de privilégio e de poder.
A prática do utilitarismo: Bentham não ficou apenas na análise
teórica dessas idéias sobre o homem como ser moral e social. Procurou suas
possíveis aplicações práticas, dedicando-se, sobretudo, à reforma da legislação
de acordo com princípios humanos, à codificação das leis afim de que
pudessem ser compreendidas por qualquer pessoa, ao aperfeiçoamento do
sistema penitenciário e ao desenvolvimento do regime democrático através da
introdução do sufrágio universal. Em suas lutas reformistas, o princípio de
utilidade desempenha o principal papel teórico. Na opinião do historiador
Harald Hölffding, Bentham sempre deu por certo e seguro esse princípio,
transformando-o em um princípio dogmático, válido para todo o sempre. Por
esse razão, jamais sentiu necessidade de investigá-lo mais profundamente e
não percebeu que se poderia levantar objeção à sua idéia de maneira
semelhante ao que ele fez com relação aos defensores do direito natural. Assim
como Jeremy Bentham indagou por que os homens devem cumprir
compromissos, assim também se poderia perguntar por que os homens devem
conduzir-se em função da felicidade de todos. A verdade de ambos princípios
não é evidente.
Página 141 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

Mas apesar da fragilidade do pensamento de Bentham, do ponto


de vista estritamente filosófico, sua influência na Inglaterra da época foi muito
grande, embora vivesse isolado e só se comunicasse com os homens públicos
através de seus escritos. No fim de sua vida, Bentham expressou suas idéias
reformistas através do Westminster Review. Esse periódico colocou-se em
posição diametralmente antagônica ao pensamento conservador do Quarterly
Review e do Edinburgh Review. Nessa tarefa, Bentham contou com a
colaboração de vários seguidores do utilitarismo, formando uma escola de
renovação de idéias. Entre seus seguidores, estavam o filósofo James Mill
(1773-1836) e seu filho, John Stuart Mill.
Neologismos de sucesso são devidos à mente brilhante de Jeremy
Bentham. Até o final do século XVIII denomina-se o de Direito das Gentes o
que buscava regular as relações entre distintas nacionalidades. O adjetivo
Internacional surgiu em 1780 quando um Jeremy Bentham desculpava-se pelo
que chamada temeridade em criar MAIS UM termo novo283. "A expressão
”Direito internacional" foi usada pela primeira vez, em 1780, por Bentham284.
Muitas classificações que empregamos no linguajar forense – como a de
denominar as regras processuais de Direito Adjetivo vem de Bentham285.
Enfim: o sujeito era um Gênio que, há 250 anos, concebeu um tratado sobre
provas jurídicas.

40. Da Inspeção Judicial:


Após encerrada a instrução há possibilidade de prova
suplementar. Inspeção deriva do latino “inspectio”, ato de olhar, observar,
verificar 286.
O nosso sistema processual prevê a inspeção, o exame direto pelo
Juiz. Inspeção judicial é ato jurídico processual complexo de objetivo
instrutório complementar, cuja necessidade e execução estão a cargo do órgão
judiciário, é o juiz, realizado com ciência dos procuradores das partes e
intimação pessoal da pessoa objeto do exame ou responsável por este objeto.

283
"The word international, it must be acknowledged, is a new one, though, it is hoped, sufficiently
analogous and intelligible." STEPHAN ULLMANN in "Semântica: uma introdução à ciência do
significado", 5ª ed., Lisboa, Calouste Gulbekian, p.289
284
Bentham usa a expressão “Direito Internacional” pela primeira vez em "An Introduction to the
Principles of Morals and Legislation". Anteriormente, denominava-se "direito das gentes", expressão
usada, no século XVI, por Francisco de Vitória. (Paulo Dourado de Gusmão: "Introdução ao Estudo do
Direito", 10 edª, 1984, p. 187)
285
Bentham. qualificou o direito processual de adjetivo devido à dinâmica emprestada às normas
que, sem procedimento, são inúteis - enquanto as demais normas “substantivas” regulam relações
diretas, entre os sujeitos de direito, no grupo social. Sérgio Bermudes, "Introdução ao Processo Civil", 2ª
ed., Forense, RJ, 1996, p. 100, propõe qualificar as normas processuais de formais ou instrumentais por
se destinarem a fazer atuar as normas substanciais ou materiais que regulam as relações do grupo social.
286
Dicionários como Michaelis e Aurélio indicam origem através do latino inspectione, com
significados como: “Ato ou Ação de ver, de olhar, de observar. Fiscalização, Exame, vistoria. Lance de
olhos. Inspecionamento.”
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 142

Constituindo a última seção do capítulo que trata das provas, a


colocação assegura a qualificação de prova complementar - em relação às
demais - das quais se diferencia. A posição denota que o ato pressupõe prévia
instrução probatória a cargo das partes287 e sua utilização pelo Juiz como
derradeiro instrumento para um bom julgamento. Contudo, pode ser
determinado de plano. Inspeção judicial pode resolver um processo moroso,
evitando desperdício de tempo e dinheiro com a produção de provas. Exemplo:
O ex-marido pediu exoneração da pensão contra a ex-esposa que estaria
vivendo com outro homem, que podia lhe prover o sustento. Fato contestado
pela ré afirmando morar só. Ambos queriam produzir prova oral, depoimentos
pessoais, dez testemunhas do autor, oito da ré, audiência para muitas horas, e
que seria adiada para ausência de testemunhas da esposa. Hoje, com
estenotipia, a audiência terminaria mais rápido, mas seriam horas e o
processo ficaria com centenas de folhas em transcrições. O Magistrado
resolveu o caso em meia hora. Mandou o auxiliar que redigia os autos pegar
uma pequena máquina de escrever e da sala de audiência, saiu em inspeção
judicial até a casa da ré. Encontrou sapatos 44, cuecas e uma série de objetos
pessoais masculinos. A ata foi lavrada ali mesmo, quatro linhas, resolvido, a ré
concordou com o pedido do autor.
Nenhum prejuízo pode trazer às partes a realização de inspeção
pelo juiz porque ninguém pode se recusar a expor a verdade ao Judiciário
(Sérgio S. Fadel, CPC Comentado p.305; cf. art. 339 CPC)
Nas questões relativas à proteção do meio ambiente essa
modalidade de prova também assume importância: nada melhor que o próprio
magistrado constatar a perturbação com seus sentidos; nenhum relato,
nenhum meio de reprodução poderá impressionar o julgador como a
experiência sensorial direta.
Nas ações possessórias, além de prova complementar (ao final da
instrução), pode ser utilizada também liminarmente pelo juiz como cautela
extrema antes de conceder uma medida liminar - muitas vezes simplificando e
acelerando o procedimento; neste caso, reduzida a auto, serve como prova de
turbação ou esbulho cujos vestígios o cumprimento da medida liminar pode
fazer desaparecer.288
Tal modalidade de prova assume especial relevância nos processos
de interdição nas quais deixa de ser opcional, tornando-se prova obrigatória
(art. 1181): Nada melhor do que o contato direto do Estado-Juiz com o
interditado para auferir as suas condições gerais.

287
RT 590/23, Adv/COAD 21619
288
Em 1984, o Juiz de Direito Válcio Duarte Peixoto, preocupado com ação possessória envolvendo
UGES União Gaúcha de Estudantes Secundários, entidade tradicional na Capital gaúcha, e com o fato
das partes apresentarem teses opostas, inspecionou o local antes de deferir a medida liminar.
Página 143 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

O Estado-Juiz pode usar da prerrogativa de realizar a Inspeção


Ocular, Direta, ou Judicial, prevista na legislação comum 289, e na do
Juizado Especial Cível 290. Instituto relativamente novo, é pouco usual.
A Inspeção Direta não figurava do CPC de 1939, contudo, era
praticada no primeiro grau, na justiça comum, e trabalhista291. Já na edição
de 1954 do Tratado de Direito Privado, Pontes de Miranda referia-a dentre os
meios de prova:“...O Código Civil, art. 136 I-VII, inclui a inspeção judicial, que é
toda assunção de prova feita pelo próprio juiz.” 292 Praticava-se o Instituto em
diversos países do novo (Colômbia 293) e do velho continente, (Alemanha 294;
França, Itália295;). Em Portugal: “sempre que julgue conveniente, pode, por sua
iniciativa ou a requerimento das partes inspecionar coisas ou pessoas”296Alfredo
Buzaid encontrou resistência para conseguir colocar esse instituto no Código
de 1973.
A Inspeção Judicial possui pressuposto genérico subjetivo comum
a todas modalidades de prova, informado pelo princípio da instrumentalidade e
pelo utilitarismo: que o juiz a entenda necessária. A parte deve se
desincumbir, tanto quanto possa, do ônus probatório. A parte deve produzir
toda prova possível por meio de fotografias, audiovisuais, documentos, ou
testemunhas (o ônus da prova é da parte - art. 333). Não é possível pedir que o
juiz que inspecione determinado objeto para suprir omissão da parte em
produzir prova297. A lei, art. 440, fala em “esclarecimento”, que pressupõe
controvérsia, dúvida, advindas da instrução probatória. Pressupostos para ser
determinada fora da sede do juízo: pressupostos subjetivos (necessidade) inc. I,
do art. 442; pressupostos objetivos (impossibilidade, dificuldade,
inconvenientes) inc. II e III do mesmo dispositivo.
Além de ato processual, é ato do próprio Estado-Juiz, do órgão
judiciário, ato complexo envolvendo: Provimento jurisdicional a respeito da
necessidade da inspeção298. Ato real ou material quanto o magistrado realiza a

289
Arts. 440 a 443 do CPC.
290
Lei 9.099/95, Juizado Especial Cível “Art. 35. Quando a prova do fato exigir, o juiz poderá
inquirir técnicos de sua confiança, permitida às partes a apresentação de parecer técnico. Parágrafo
único. No curso da audiência, poderá o juiz, de ofício ou a requerimento das partes, realizar inspeção
em pessoas ou coisas, ou determinar que o faça pessoa de sua confiança, que lhe relatará informalmente
o verificado.“ Ou seja, seu procedimento diferencia-se: o juiz pode inspecionar durante a audiência
mas, se ocorrerem circunstâncias do art. 442 do CPC, pode designar pessoa de sua confiança que
realizará a inspeção e a relatará na audiência como se fosse testemunha. A redação é similar ao texto do
art. 36 da Lei 7.244/84 que disciplinava o juizado de “Pequenas Causas”.
291
Amaury Mascaro do Nascimento “A nova prova no Processo Trabalhista” in RF 252 p.415
292
Pontes de Miranda, edição de 1954 do Tratado de Direito Privado, Tomo II, § 347, cap. 2, al. g
293
La “Inspección judicial”, art.223-244 do CPC Colombiano
294
Der “Ausgenschien”, art. 371 do Z.P.O.
295
La “Inspezione di lughi”, art.258, CPC Italiano
296
O texto é do art. 613-1, do CPC Português
297
É ônus da parte produzir prova e não cabe tentar transferir tal ônus ao juiz, que deve indeferir
inspeção conforme Julgados do TARGS 59/261, AI 185069010; TJMG “in” RT 590/233.
298
É ato discricionário do juiz proceder ou não à inspeção (RT 629/206), e – embora a parte
requeira fundamentadamente, seu indeferimento não constitui, diretamente, cerceamento de defesa (RT
633/134)
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 144

inspeção. Exige atos dos auxiliares intimando os envolvidos da data e local em


que se praticará o ato (o art.442, parágrafo único incide se for caso de intimar).
Durante a inspeção há ato de auxiliar redigindo auto circunstanciado 299 do
útil para o julgamento (art.443 ‘caput’). Pela inspeção judicial ou inspeção
ocular o juiz pode inspecionar pessoas ou coisas com vistas e esclarecer-se
sobre fato controvertido que interesse a decisão da causa atendendo a
concentração e imediatidade.
A decisão que determina, ou indefere esse tipo de prova é ato
discricionário assemelhado a despacho de mero expediente (arts. 162, § 3º, e
504, do CPC) havendo quem sustente não caber recurso. Entendemos
diversamente. Cabe recurso. Desaconselhável agravo de instrumento. Somente
na prolação da sentença poder-se-á perceber a motivação da decisão (art.458,
II) e se houve prejuízo. Então, quando indeferida a inspeção, o inconformado
deve interpor agravo retido para evitar preclusão (RT 612/119) permitindo ao
Tribunal avaliar necessidade e reabrir a instrução (TJ-SC Adv/COAD 39550)
como com qualquer outra diligência julgada indispensável300. Antes da
sentença o juiz de primeiro grau (art.463) pode reconsiderar a decisão e
proceder à inspeção.
O juiz deve determinar o local (pois tal medida foge à regra geral do
art. 336 de que os atos são praticados no Foro), data e hora, e mandar intimar
as partes e envolvidos (peritos, pessoa examinada etc); se o examinado for
parte representada por advogado, ambos devem ser intimados, parte e
advogado (sob pena de nulidade RT 587/139); sem publicidade prévia, a
inspeção corre o risco de converter-se numa visita pessoal eivada de
subjetividade onde o juiz assumiria posição delicada, possível de ser inquinada

299
O Superior Tribunal de Justiça sugere que a não lavratura do auto circunstanciado torna a
inspeção inócua, invalidando-a como meio de prova (STJ-1ª Turma, Ag 14.646-MG-AgRg, rel. Min.
Garcia Vieira, j. 9.12.92, negaram provimento, v.u., DJU 5.4.93, p. 5.810, 1ª coluna, ementário). Com
razão, porque o que não consta dos autos, não está no processo. Mas nada impede que o Juiz –
independente de auto circunstanciado da inspeção, faça referências ao exame na fundamentação da sua
decisão da mesma forma como faria com referência a fatos notórios (art.334-I, CPC. Não excluiu o
princípio da livre e fundamentada apreciação das provas pelo juiz (RTJ 99/144), do art. 131, pelo qual:
“O juiz apreciará livremente a prova, atendendo aos fatos e circunstâncias constantes dos autos, ainda
que não alegados pelas partes; mas deverá indicar, na sentença, os motivos que lhe formaram o
convencimento.” A livre apreciação da prova, desde que a decisão seja fundamentada, considerada a lei e
os elementos existentes nos autos, é um dos cânones do nosso sistema processual (STJ-4ª Turma, REsp
7.870-SP, rel. Min. Sálvio de Figueiredo, j. 3.12.91, deram provimento parcial, v.u., DJU 3.2.92, p. 469,
1ª col., em.). Mas o Juiz deve usar com cuidado essa possibilidade de relatar, na decisão, os fatos, pena
de ser confundido com uma testemunha e comprometer sua imparcialidade: "Se o juiz que profere a
sentença julga segundo conhecimento próprio dos fatos ou de parte deles o processo é nulo, pois, não se
tratando de máxima de experiência ou de fato notório, atua como testemunha extrajudicial, estando
impedido de exercer suas funções jurisdicionais, ante a ausência de pressuposto processual da
imparcialidade" (RT 630/140). Para mais detalhes sobre a imparcialidade como requisito indispensável
no ato jurisdicional, veja capítulos acima ou consulte www.padilla.adv.br/teses.
300
Para ser determinada, contra a vontade do juiz de primeiro grau, deve ser considerada
indispensável (RT 595/226);Antes da sentença o juiz, e depois o Tribunal, pode converter o julgamento
em diligência reabrindo a instrução (Adv/COAD 42258). Antes da sentença o juiz, e depois o Tribunal,
pode converter o julgamento em diligência reabrindo a instituição (Adv / COAD 42258). Os recursos
serão estudados adiante na Teoria Geral dos Remédios Processuais.
Página 145 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

de suspeita (arts. 134 II e 409 III). Se não houver intimação das partes pode
ocorrer nulidade, Comentários ao CPC, t.IV, p. 467 para alguns insanáveis
(Gildo dos Santos, “A prova no Processo Civil”, p. 73 e ss.). Se o juiz se fizer
acompanhar perito para lhe prestar esclarecimentos, tal circunstância deve ser
dada a conhecer de antemão, pois analogicamente (arts. 126) deve permitir às
partes se acompanharem de assistentes técnicos (art. 421, §1º). Realizado o
ato de inspeção, lavra-se auto circunstanciando o que for útil para o
julgamento. Contudo, há casos nos quais, pelas peculiaridades, a medida
poderia não surtir efeito se as partes soubessem de antemão. Assim, é possível
ao juiz o fazer sem intimar previamente as partes conforme o Embaixador
Pontes de Miranda diz que “...as partes podem ser intimadas....”
Se determinada no Tribunal, Marcos Afonso Borges atribuiu a
prática do ato exclusivamente ao Relator (“Comentários ao CPC”, 2º vol, p.
119), o que não é correto. Baixa em diligência conforme art. 492, do CPC,
aplicável senão diretamente, por analogia (art. 126 CPC).

41. Dos debates ou memorial:


Quando termina a apresentação de todas as provas que as
partes pretendem produzir e que foram deferidas, o Estado-Juiz pode
encerrar instrução, oportunizando a cada parte apresentar um resumo oral
(20 minutos prorrogáveis por mais 10, art. 454 CPC quando as alegações acontecem no
encerramento da audiência) que pode ser substituído pela apresentação de petição,
denominada de memorial, para a qual é fixado dia e hora porque, nesse tipo
de petição não há contraditório. Os memoriais de ambas partes, litisconsortes
ou assistentes, devem ser apresentados simultaneamente. Não se deseja que
uma parte possa rebater os argumentos da outra porque consiste em resumo
do que interesse destacar do processo.

Esse é um momento importante para apontar aqueles aspectos


cruciais dos fatos, incontroversos ou provados. Lamentavelmente, o que mais
se vê no Foro são as razões “remissivas”, reportando-se as manifestações
anteriores, desperdiçando a oportunidade de apresentar uma visão do
“conjunto” favorável à parte.

Determinadas demandas, por sua natureza, necessitam de prova


testemunhal e os depoimentos, em geral, possuem sutis aspectos, os quais, na
análise de conjunto, conferem ou retiram toda a credibilidade, quando
apontamos contradições, incongruências ou inconsistências.

O autor deve comprovar os fatos que configuram o seu direito – a


presença de todos os elementos que caracterizam o direito alegado: CPC Art. 333.
O ônus da prova incumbe: I - ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito;
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 146

Um dos exemplos controvertidos atuais são as declarações de


união estável cumulada com partilha de bens, nas quais deve ser comprovada
uma relação de afeto duradoura, com publicidade e fidelidade, convívio
familiar; contribuições de um para outro cônjuge na consecução de objetivoso
patrimoniais e sustento; alguns julgados exigem ainda que os cônjuges
compartilhem, relevada em casos nos quais o trabalho dos consortes, realizado
na residência, exige privacidade para atendimento de clientes, como no caso de
costureiras, tradutores, professores de língua ou música, entre outros
prestadores de serviços.
As contradições entre um e outro ponto do depoimento da
própria testemunha são extremamente poderosas, porque revelam que a
testemunha mentiu. Por exemplo, a testemunha iniciou dizendo ter encontros,
com o falecido, “sempre aos sábados” e, após uma hora de perguntas, diz que
seriam “sempre aos domingos”. As afirmações divergentes sobre o dia em que
sempre corriam os encontros demonstram que a testemunha faltou com a
verdade. A neurociência explica como acontece tal fenômeno: A memória
rápida ou de curto termo é aquela que recebe as informações captadas pelos
sentidos e as passa ao sistema cognitivo. Também armazena as informações de
saída, expressa com a fala ou movimentos. Contudo, armazena as
informações por um período de tempo muito pequeno, da ordem de 10
segundos. Também é chamada de memória de curto termo porque armazena
poucas informações. 301
Resumo do diagrama de Shneidermann (1992) à

A memória de trabalho
recebe este nome porque é nela que as
informações - que chegam da memória
de curto termo - são trabalhadas e
concatenadas, para depois serem
enviadas para a memória permanente.
No caso, após diversas perguntas e de
todo o processamento que essa
inquirição provocou, o dia o qual a testemunha, de início, mencionara como
aquele onde sempre encontrava o falecido, foi esquecido e ao reafirmar os
encontros que sempre ocorriam no mesmo dia, afirmou outro que, naquele
exato momento, parecia fazer sentido. É através de mecanismos assim que se
revelam as mentiras nos testemunhos.302

301
A quantidade de "nacos" (chunks) de informações armazenada é de 7 (±2). A memória de curto
termo guarda em média 7 das informações, com uma variação média de 2, ou seja, entre 5 e 9
informações. Um exemplo clássico de comprovação foi publicado por Miller, em 1956: Ditando-se para
uma pessoa uma lista de cerca de 30 ou 40 palavras. Ao final do ditado, pede-se para o ouvinte escrever o
maior número de palavras que pode lembrar. Em geral, as pessoas médias lembram de cerca de apenas 7
palavras. Alguns até escrevem mais do a média, porém, algumas palavras não faziam parte da lista.
302
Uma memória temporária, e as informações ali contidas podem ser retidas por um tempo bem
maior que a memória rápida, dependendo do processamento, podem durar dezenas de minutos. Porém
não armazena de forma permanente. Quando se estuda um assunto que é do nosso interesse, procura-se
criar mecanismos para que sejam colocados na memória permanente e serem recuperados depois. Se o
estudo do tema não é de importância fundamental, ou seja, se está estudando apenas para obtenção de
conhecimentos superficiais, ou para uso temporário, estas informações permanecem ainda na memória de
trabalho por um tempo que pode variar de minutos a dias. Um exemplo clássico da memória de trabalho
é o exemplo do estudante. Quando este estuda para aprender algum conhecimento ou habilidade, que
Página 147 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

A memória permanente tem este nome porque consegue


armazenar informações, como diz o nome, de forma permanente. Também é
conhecida como memória de longo termo, e tem uma grande capacidade.303
No exemplo, a testemunha não estava focada em contar a verdade.
Se assim fosse, estaria coletando os acontecimentos da memória permanente e
o relato seria sempre o mesmo. Não importa quantas vezes fosse perguntado, a
resposta seria coerente. Ao querer aumentar a credibilidade do seu
depoimento, afirmou manter amizade e encontros freqüentes com o Falecido, e
se fixou tanto na idéia de que “sempre” se encontravam no mesmo dia que –
após uma hora de perguntas, esqueceu ter iniciado afirmado ser “sempre aos
sábados”. Ao voltar a falar sobre a fantasia que inventara, troca o dia no qual
“sempre” ocorriam os encontros! Porque o objetivo da testemunha era que se
acreditasse que sempre se encontravam. 304

O fato de o depoente mentir sobre um aspecto – qualquer que


seja – compromete a credibilidade de todo o depoimento. Quando um depoente
faltou com a verdade em qualquer momento, é certo que pode ter faltado com a
verdade em quaisquer outros momentos da narrativa. Afinal, uma mentira
qualquer comprova que o compromisso de falar apenas a verdade valia nada:
Quem, após ter se comprometido a dizer a verdade sob as
penas da lei, formula afirmações que se contradizem, ou seja, em um momento
faltou com a verdade, não é digno de credibilidade conforme CPC, no art.
405, pois “Podem depor como testemunhas todas as pessoas, exceto as
incapazes, impedidas ou suspeitas. ... § 3º São suspeitos: ... II - o que, por seus
costumes, não for digno de fé;” Quem mente, sob compromisso, como
aconteceu no exemplo, é suspeito.
As contradições entre um e outro aspecto do depoimento da
testemunha são extremamente poderosas. Revelam que - depois de ter se
comprometido a falar somente a verdade – descumpriu o prometido! Assim,
logicamente concluímos que mentiu (aspectos contraditórios) e, diante disto,
o depoimento perde toda a credibilidade.

julgue importante, o fará com mecanismos que o permitam, mais tarde, lembrar daquilo que estudou. Se
o estudante estuda para um assunto que, a seu julgamento, não lhe parece importante para o futuro, ele o
fará de forma a apenas "lembrar para a prova". Efetivamente o que ocorrerá é que dias ou meses depois
ele não lembra de quase nada daquilo que estudou, embora tenha logrado bom desempenho na prova. A
memória de trabalho também é responsável pelo retorno, pela recuperação das informações que estão na
memória permanente, até um meio de saída (fala, escrita, etc). Usando algum tipo de mecanismo, a
recuperação é feita e levada à memória de curto termo. Os mecanismos de recuperação podem ser:
analogias, metáforas, regras, exceções à regras, mnemônicos ou outros tipos de auxiliares que o ser
humano usa para "não esquecer" de algo. Desta forma, as informações que chegam e que saem da
memória permanente passam pela memória de trabalho, lá sendo as informações tratadas e organizadas.
303
O que efetivamente ainda não se sabe é como lá colocar tamanha quantidade de informações em
tempo relativamente curto. um exemplo que mostra a validade desta afirmação é o caso de pessoas que se
dedicam a estudar certos temas com profundidade de detalhes, sendo capazes até de dizer a página do
livro que contém certa informação. Em tempos passados havia até programa de televisão no qual eram
desafiadas algumas pessoas que se diziam conhecedores de um tema, da vida de uma pessoa, ou de fatos.
As perguntas feitas eram de detalhes que escapariam a um leitor comum, mas para o desafiado
geralmente a resposta era precisa.
304
Algum encontro até pode ter ocorrido contudo, o contexto do depoimento, a amizade da
testemunha com a Ré, apontam para a intenção de influenciar o Falecido, estimulá-lo a perdoar a ex-
mulher.
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 148

As incongruências ou inconsistências revelam-se entre


testemunhos relatando detalhes paradoxais. Por exemplo, ao apresentar um
álibi, as testemunhas afirmam ter estado jantando com o acusado na
residência de um deles. Indagados sobre os alimentos consumidos, as
respostas sugerem um diversificado buffet. O que ordinariamente acontece
indica que as testemunhas mentiram e suas alegações perdem a credibilidade:
Art. 335. Em falta de normas jurídicas particulares, o juiz aplicará as regras de experiência comum
subministradas pela observação do que ordinariamente acontece e ainda as regras da experiência
técnica, ressalvado, quanto a esta, o exame pericial.

“Comportamento processual como prova” (Ney da Gama


Ahrends, na Revista Ajuris v.6) revela-se, no exemplo da dissolução de
sociedade conjugal, quando, demandada a sucessão do falecido, representada
pela mãe dos filhos, o réu não pode provar, diretamente, fatos não existentes.
Pode negar os fatos afirmados pelo autor. Contudo, a estratégia de defesa
precisa ser coerente e, ao alegar a não existência de um, ou mais, dos
requisitos de uma união estável, cuidar com o que é difícel de provar. Se o réu
alegar fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor estará se
impondo o ônus de produzir essa prova: CPC Art. 333. O ônus da prova incumbe: II -
ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.

Também pode haver evitar conflito entre provas. Se a contestação,


para afastar a sociedade conjugal com a companheira-autora, articula a tese
de que o falecido teria reatado convivência com a ex-esposa, corre o risco de tal
alegação ser desmentida por documentos da própria contestante declarando
estar separada naquela época.
Assim, a análise da prova de acontecer em conjunto, sopesando o
que está provado e o que se presume, em face do que ordinariamente acontece.
Obviamente isso exige ponderação, incompatível com a acultura da
superficialidade.

42. Da crise de Justiça da Justiça:


Sentença, implica em sentir, definiu Mauro Cappelletti.305

A Lei Fundamental Alemã exige que, nas sentenças, os juizes


repitam e repitam, pena de nulidade, "In Namen des Volke"; isto é, em
nome do povo. Toda a hora o juiz tem que se lembrar que decide em nome
do povo e não porque foi ungido juiz. A ele foi delegado um poder. Simples
assim como lembrou Ruy Gessinger. 306

Quem julga, mais do que em qualquer outra profissão, deve se


esforçar, todo dia, em desenvolver a capacidade de ponderar. Porque é o

305 Mauro Cappelletti, A ideologia no processo civil, revista Ajuris, vol. 23, p. 16 e ss.,
tradução Athos Gusmão Carneiro.
306 Ruy Armando Gessinger no grupo Advogados do Brasil, em 20/2/2013 as 16:46h.

Subject: RES: juiz - mais do que qualquer outra profissão - deve desenvolver a ponderação, punctum saliens do seu
poder/dever: PONDERAR todas as alternativas, para poder optar pela mais justa.
Página 149 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

punctum saliens do seu poder/dever: Analisar todas as alternativas para


poder optar pela mais justa dentre todas elas. Totalmente diferente do que
tristemente assistimos no Foro: Grassa um hábito não ecológico de buscar
motivos para arquivar, que é mais fácil do que examinar tudo. A maior
parte dos pedidos de indenização são indeferidos. Como não podem
indeferir tudo, alguns poucos eles deferem. Para se furtar do exame das
condições do caso concreto, fixam valores módicos, alguns chegam a ser
desprezíveis e pífios comparados ao que a vítima sofreu. E ainda
vilipendiam os advogados, recusando impor sucumbência ou aviltando as
parcas que deferem.

Ai, o advogado, que é um ser humano, tem emoções, quando se


revolta contra essa falta de respeito, sofre ainda mais: com o abuso de
autoridade e de poder! Tais atitudes, em minha opinião, estimulam o
comportamento ilícito; Fomenta a injustiça e enfraquece a paz social!307
No início do milênio, Marcus Antônio de Souza Faver registrou a
crise social envolvendo três níveis:
A crise do Direito;
A crise de Justiça;
A crise da Justiça:
São “três facetas de um mesmo problema: a crise social, decorrente do
acentuado descrédito da população em relação às suas instituições, aos seus dirigentes e
ao próprio Judiciário”.308 A responsabilidade de resolvê-la é, frise-se, dos
Juízes. Porque exercem o poder de julgar. Poder-dever de julgar!

307 Recentemente, o advogado militante do Foro de Porto Alegre, Rogério Guimarães


Oliveira desabafou que, nas ações judiciais movidas pelos consumidores contra as mega-
corporações como bancos (as quais podemos acrescentar o Poder Público), o "poder Judiciário brasileiro
mostra-se encolhido, medroso, temeroso de aplicar a lei civil existente. Procuram ...
sancionar o ofendido e não o ofensor." http://forumjusticaecidadania.blogspot.com.br/2013/02/artigo-direito-bancario-e-do-consumidor.html
Lamentavelmente, parece ter razão... Não basta ao lesado propor uma ação porque,
quase que inevitavelmente, será arquivada ou julgada improcedente, sob qualquer pretexto.
Praticamente todos os recursos que forem apresentados serão indeferidos no Tribunal
Estadual, repetindo a sentença, sem analisar os fundamentos apresentados. Acesso a Justiça?
Talvez, mediante Recurso Especial, se tiver sorte, e cair nas mãos de um assessor que se apiede
e examine; ou propondo ação rescisória contra a ilegalidade... É a “acultura da
superficialidade”. Alguns jovens acham “normal” usar qualquer argumento, não raro adotado
sem exame dos autos, para “agilizar” o julgamento formal sem, realmente, enfrentar o problema
apresentado e, muito menos, o resolver.
308
FAVER, Marcus Antônio de Souza Faver. O Judiciário e a Credibilidade da Justiça.
Revista da EMERJ, vol. 4, nº 13-2001. p. 12. O Desembargador Antônio de Souza Faver era
Presidente do TJ/RJ qua ndo proferiu Conferência Magna, dia 5 de fevereiro de 2001, na abertura do 1º
semestre letivo da EMERJ com essa tese.
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 150

Contudo, interessados em que a Justiça não funcione,


disseminaram mentiram que, de tanto repetidas, muita gente acredita nelas
como se fossem verdades.
Estamos cercados de falsas crenças, tais como de que “tudo nasce
pronto”, ou de que qualquer coisa pode ser “aceita como normal”, ou de que "a
felicidade é um direito." Mário Cortella demonstra-as com maestria e de forma
divertida: http://www.youtube.com/watch?v=ozxoOOaE__U%20
A partir dos anos noventa, começa a prática da encenação
jurisdicional. Foros e Tribunais foram enlameados pela crença de que a
celeridade é tudo e que, por haver processos em demasia, os magistrados não
teriam tempo para os examinar. Como se tais crenças fossem verdades, o Juiz
orienta o gabinete a preparar minutas de julgamentos. Como acredita não ter
tempo de examinar, às vezes as aprova sem ler. Estatísticas dos tribunais
comprovam-no com quantidades de julgamentos impossíveis de terem sido
realizadas por um ser humano. Quem julgou? O juiz não examinou o processo.
Assessores repassam aos estagiários, que rascunham decisões309, naquilo que
LÊNIO STRECK refere como "Estagiariocracia" 310 integrante da cadeia
predatória da juizite e da corrupção.311

Anula a principal característica da jurisdição, de ser realizada com


imparcialidade, isenção e para o bem comum! 312
Quem duvida do poder dos estagiários, veja o ponto ao qual
chegamos: Como acreditam que os juízes assinam sem ler, e que não há
qualquer responsabilidade, descuidam até dos textos de uma linha sobre

309
Um dos mandamentos de Eduardo Couture é de que o direito se aprende estudando, contudo,
pratica-se pensando. A arte do exercício profissional nivela-se por baixo a partir da Internet que permite,
a qualquer novato, acesso a milhares de informações e sítios onde consegue as mais variadas respostas, e
os modelos de petições ou de decisões, que edita apresentando como se fosse seu trabalho. Tal prática
engessa a criatividade. Não seria assim se o processo fosse oral, distinguindo uns dos outros, como assim
acontece em parte da atividade judicial da comum law. No direito continental, escrito, a tecnologia
provocou a repetição interminável de textos, onde o advogado do autor copia, o da defesa copia, o juiz
copia, os recursos copiam...Tudo igual, bastando apertar teclas control, alt, etc. e importar textos.
310
LÊNIO STRECK, "Estagiariocracia", Jornal "O Sul", de Porto Alegre, dia 3.9.2011, e
reproduzido em http://www.espacovital.com.br/noticia_ler.php?id=25380/ e http://pt-
br.facebook.com/pages/Lenio-Luiz-Streck/115390585209499
311
Contratação irregular de 6.480 estagiários, exemplo do E-ED-RR nº 94500-35.2004.5.05.0008
em http://www.espacovital.com.br/noticia_ler.php?id=25404
312
Os estagiários deveriam aprender. Contudo, os assessores, pessoas preparadas e que, até então,
realizavam as pesquisas, os resumos e os projetos de decisão, terceirizaram seu trabalho. O trabalho dos
estagiários não é revisado, e a cobrança é meramente estística, sem compromisso ou responsabilidades
com resultados efetivos. Os estudantes, sem muita experiência de vida, e muito menos de direito,
percebem que tal encenação permite-lhes concretizar suas simpatias pessoais, e favorecer seus amigos,
sem qualquer problema. Aproximar-se do estudante, com pouca experiência de vida, é fácil. Isso é campo
feculdo para o dolo dos sociopatolobistas. O prejudicado sequer tem acesso à informação sobre como
desenrolou-se a encenação e o sistema esconde o inimigo que preparou a decisão. Pior, ferozmente
protege a autoridade que, ao fim e ao cabo, chancelou toda a encenação! E se o advogado ousa questionar
a ditadura dos estagiários, é perseguido. Imparcialidade Judicial... Rev. Faculdade Direito UFRGS,
v.12, p.209-215, tb. http://www.padilla.adv.br/teses/
Página 151 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

substituir o perito por "peito substituto", após o MP comprovar “a liminar


postulado(sic) no agravo”.313
A economia processual vem sendo praticada com “redução das
atividades processuais em violação ao direito fundamental da ampla defesa
e do contraditório.” 314
A frustração da Justiça tornou-se o pior dos paradoxos: Os maus
são um sucesso:
Quem é correto, sofre.
Danos e lesões ao direito não são reparados:
http://www.espacovital.com.br/noticia_ler.php?id=25300

Há décadas, pessoas bem intencionadas tem sido jogadas, umas


contra as outras, provocando o desmanche do ensino e das instituições em
geral. Professores, constrangidos pelo arrocho da contraprestação,
abandonaram a carreira aviltada.
Hoje estão usando a mesma tática para acabar com a advocacia
que – durante séculos, foi o grupo defensor da Justiça: A OAB foi, até algum
tempo atrás, a maior defensora da liberdade e dos direitos.

Como ensina Cândido Rangel Dinamarco, “falar em


instrumentalidade do processo ou em sua efetividade significa, no contexto, falar dele como
algo posto à disposição das pessoas com vista a fazê-las mais felizes (ou menos infelizes),
mediante a eliminação dos conflitos que as envolvem, com decisões justas”315 Assim, não
se pode conceber que a vida dos jurisdicionado seja decidida sem que o juiz
examine o processo, ele, apenas com base na opinião – nem sempre
fidedigna – por fatores que vão da falta da influência dos lobistas até a falta

313
Como sabem que os juízes vão assinar sem ler, e que “não vai dar nada” os estagiários não se
dignam a cuidar sequer dos textos de uma única e singela linha. Veja este despacho anunciando nomear
"peito substituto" (no lugar do perito) após o MP comprovar “a liminar postulado(sic) no agravo”
processo 001/10523815119 ação civil pública na 4ª Vara da Fazenda Pública do Foro Central de Porto
Alegre colhido em https://www.tjrs.jus.br/site_php/consulta/consulta_despacho.php?entrancia=
1&comarca=porto_alegre&Numero_Processo=10523815119&num_movimento=210&code=5474
314
LEAL, Rosemiro Pereira. Teoria Geral do Processo. 2ª ed. Porto Alegre: Síntese Ltda. 1999, p.
93. Em Santa Catarina, acórdão do processo nº 22040160100 foi publicado com a íntegra de um longo
trabalho universitário, um "nada a ver", misturado à decisão judicial. Em 18.03.2010, alertado pela
repercussão do caso, o TJ de Santa Catarina retirou de seu site o acórdão e anunciou comissão sindicante
para apurar o episódio, identificar o responsável e tomar as providências cabíveis. Passado mais de um
ano, não se tem notícia alguma de resultados. Na publicação, pelo gabinete do desembargador substituto
Jaime Viccari, foi inserida a íntegra de um longo trabalho universitário do aluno Carlos Freiberger
Fernandes, na disciplina de "Psicologia de Esporte e Exercício", a ser apresentada ao professor Emilio
Takase, no curso de Licenciatura em Educação Física, da UF-SC. No Rio Grande do Sul, num dos
episódios demonstrando que são feitas várias atividades ao mesmo tempo – obviamente com a atenção
prejudicada - enquanto cuidava (?) da publicação de uma decisão, organizava um churrasco. Dias depois,
no meio da intimação, o convite, com todos os detalhes do evento que, lamentavelmente, já havia
acontecido quando da publicação, no Diário Oficial, algum tempo depois
www.espacovital.com.br/noticia_ler.php?id=17722
315
DINAMARCO, Cândido Rangel. Instrumentalidade do Processo. 12 edição. São Paulo:
Malheiros, 2005. p . 372.
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 152

de compromisso dos subalternos – “o juiz não vai ler mesmo” – ou “estamos


sobrecarregados e não dá para examinar tudo”

Decisões formatadas às pressas, sem compromisso, ampliam a


sensação de injustiça, e podem eternizar o problema. O Judiciário perde
credibilidade, e isso estimula os abusos, que aumentam porque os
poderosos sabem que vão lucrar violando a Lei. A impunidade dos maus
fomenta a audácia destes e, cada vez, há maior concentração de poder!

O compromisso com a paz social, como registra Cappelletti, é


condição para a eficiência do processo em estimular o cumprimento
espontâneo das obrigações: "não devemos mais esquecer que as leis, e
mesmo as Constituições, têm pouco valor sem aquele que os romanos já
chamavam constans voluntas - os esforços, os sacrifícios, a coragem
daqueles que devem aplicá-la."316
Eu me pergunto se os consumidores – sem o recurso
jurisdicional, irão continuar acreditando numa paz social unilateral? A
Teoria Geral dos Processos cíveis, trabalhistas, penais, eleitorais,
administrativos, legislativos, disciplinares desportivos propõe
paradigmas para a compreensão das dificuldades contemporâneas e sua
superação pela aplicação dos princípios. O Estado existe para assegurar a
dignidade humana: é a razão de seu existir. Por isto a dignidade está no
terceiro inciso, antes dos valores do trabalho, e da livre iniciativa. Sua função é
realizar valores, sobretudo os fundamentais do ser humano. Respeitá-la e
protegê-la é obrigação de todos os Poderes estatais. O Estado brasileiro se
constrói a partir da pessoa humana e cabe ao Estado dever de propiciar
condições materiais mínimas para que as pessoas tenham dignidade. O
saudoso Calmon de Passos, em 1992, destacou em Congresso realizado em
Porto Alegre:
“Os idealistas são tratados como cupins nas instituições, todos
tentam matá-los, com veneno, mas eles não morrem, ao contrário, se
organizam, olham um para a cara do outro e dizem: vamos roer! Um dia
o todo poderoso senta na sua cadeira e cai porque a pata da cadeira
está roída.” 317

316
Cappelletti, 1990, p. 112, citado por Rui Portanova, Princípios do Processo Civil, 3ª Ed. Ed.
Livraria do Advogado, p. 118.
317
José Joaquim Calmon de Passos, apud Wanda Maria Gomes Siqueira, em “Notícias eartigos
interessantes”, newsletter “Advogados do Brasil” advogadosdobrasil@ig.com.br 7/7/2009 11h21m;
acrescentando a advogada gaúcha: “...penso que os bem intencionados pouco conseguem fazer porque
são em menor número e ainda existem os que não fazem mal mas não têm temperamento para
questionar, reivindicar e se indignar com as injustiças. Resta escrever... e construir espaços para que as
pessoas possam falar desse mal estar, como fizemos com o Grupo ‘Advogadosdobrasil’.” Sobre a
permanência de Liebman no Brasil, e a “Escola Paulista de Direito”, integrada por juristas dos
principais estados, como Calmon de Passos, da Bahia, veja nota supra, ao final do Capítulo Dos
Princípios Gerais aos vários processos:
Página 153 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

Mauro Cappelletti, no estudo de profundidade "Juízes


Irresponsáveis?", registra318 "O problema da responsabilidade dos juízes, já
agudamente sentido em todos os ordenamentos modernos - pelas razões que serão discutidas
neste estudo - recentemente apresentou-se na Itália de maneira totalmente particular e há não
muitos anos até imprevisível, tornando-se nada menos do que objeto do referendum popular
nacional no início deste mês (novembro de 1987). Foi justamente este extremo aguçar-se, no
nosso país, da sensibilidade ao problema, que me induziu a colocar em versão italiana este
trabalho, na esperança de que uma análise comparativa possa contribuir ao esclarecimento de
temática tão delicada e complexa, senão também para prestar alguma ajuda ao nosso
legislador que, depois do sucesso de referendum, esse sim perfeitamente previsível e a meu
entender de todo justificado, deverá finalmente providenciar em dar ao país uma
regulamentação mais adequada aquela até agora em vigor. Êxito justificado, digo eu, porque
não era concebível que na Itália pudesse se perpetuar um sistema judiciário carente, ao
mesmo, de profissionalidade e de responsabilidade: ou seja, um ordenamento no qual os
juízes, tendo assumido a magistratura sem base em séria aprendizagem e avançando na
carreira substancialmente com fundamento apenas na antiguidade, ficassem, outrossim,
completamente imunes de responsabilidade perante as partes e outros sujeitos prejudicados
por atos ou omissões viciadas de culpa, inclusive gravíssima do magistrado, enquanto a
própria responsabilidade disciplinar era exatamente limitada, seja no plano da ação (com
apenas dois órgãos centrais legitimados a agir), seja no do juízo (com apenas um órgão
investido daquela que é chamada, expressamente, uma fonte de justiça "doméstica" ou
"corporativa"." 319
A lição de Mauro Cappelletti aplica-se, sem modificação, ao
panorama brasileiro. A constante e reconhecida demora na entrega da
prestação jurisdicional, sem causas justificadoras imputáveis ao
jurisdicionado, desafia realizar interpretação do texto constitucional de
acordo com os valores da cidadania que o ordenamento jurídico se
propõe a proteger. As características da responsabilidade civil do
Estado por atos judiciais danosos vêem sendo construídas no campo
doutrinário desde o Século passado conforme registrou o Professor de
Direito Administrativo da Faculdade de Direito e Ciências Sociais da
Universidade de Buenos Aires Guido Santigo Tawil: "La naturaleza del
ato que realiza um juez que viola sus deberes al dictar sentencia, no puede ser puesta em
duda; porque siendo condiciones esenciales de la magistratura, la rectitud, la probidad y el
conocimiento del derecho, comete sin duda un delito, más o menos grave, el juez que por

318
Responsabilizar o juiz foi o tema de maior preocupação do XI Congresso Mundial da
International Academy of Comparative Law, realizado em Caracas de 30 de agosto a 4 de setembro de
1982, conforme registrou CAPPELLETTI e José Augusto Delgado, na XV Conferência Nacional da
OAB, em Foz do Iguaçu, 4 a 8 de setembro de 1994, no Painel Informática Jurídica, colhido dia
14/12/2000, as 8 h. em http://www.jfrn.gov.br/docs/especial01.doc
319
CAPPELLETTI, Mauro, "Juízes Irresponsáveis?", pag. 8
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 154

interés, por amor u odio o por ignorancia juzga mal, resuelve contra derecho y atenta
contra la justicia." 320

O movimento doutrinário no sentido de responsabilizar


civilmente o Estado pela dificuldade enfrentada pelo cidadão de acesso à
Justiça e pela demora na entrega da prestação jurisdicional vem
produzindo incipiente repercussão jurisprudencial como enfatiza, com
absoluta propriedade o Ministro Carlos Mário Velloso, na magnífica obra já
citada: "A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é no sentido de que o Estado não é
civilmente responsável pelos atos dos juízes, a não ser nos casos expressamente declarados em
lei: em tema criminal prevalece o art. 630 do Código de Processo Penal, que prevê
responsabilidade civil que surge com a revisão criminal, que reconhece o referido erro. De
outro lado, o Juiz responderá, pessoalmente, por perdas e danos quando, no exercício de suas
funções, proceder com dolo ou fraude, ou quando recusar, omitir ou retardar, sem justo
motivo, providência que deva ordenar de ofício, ou a requerimento da parte (Código de
Processo Civil, art.133; Lei Complementar 35/79, art. 49)." (...omissis...) "A tendência do Direito
Brasileiro é no sentido de acolher a tese da responsabilidade civil do Estado pelos atos dos
seus juízes. Em verdade, deve o Estado ser responsabilizado, civilmente, pelos atos dos juízes,
não só em razão do comportamento desidioso do magistrado, como, também, principalmente e
pelo menos, em razão do mau funcionamento do serviço judiciário, ou pela faute du service. Na
primeira hipótese - comportamento desidioso do magistrado - caberá ação regressiva contra
este." ." 321

A encenação jurisdicional 322 acaba com a efetividade do


sistema jurídico, impregnado-o com falsas crenças e valores
invertidos. Transforma em letra morta importantes princípios
processuais, como os da Sucumbência 323 e da Lealdade. 324

Quaisquer pretextos se prestam para não “decidir” sem


julgar. Um pirandeliano, cosi è, se vi pare, que toma o que quer que
lhe pareça afirmando, não raro, estultices. "J`ai voulu voir
jusqu`oú allait la bêtise humaine: elle est sans limites." 325

320
MORENO, José Maria. “Obras completas del doctor José María Moreno” Buenos
Aires,1883. Vol.I, pág.437. Apud TAWIL, Guido Santigo. "La responsabilidad del estado y de los
magistrados y funcionarios judiciales por el mal funcionamiento de la administración de justicia",
Ediciones Depalma Buenos Aires, 1989, pg. 127
321
VELLOSO, Carlos Mário "Temas de Direito Público", Capítulo 15 dedicado a
"Responsabilidade Civil do Estado", pg. 478, conferência no 1º Seminário Internacional de Direito
Administrativo, outubro de 1986. Veja também"Princípios Constitucionais do Processo" em memória
do Ministro Carlos Coqueijo Torreão Costa.
322 http://www.espacovital.com.br/noticia-25300-encenacao-jurisdicional-artigo-luiz-roberto-
nues-padilla
323 http://www.espacovital.com.br/noticia_ler.php?id=14223
324 http://www.espacovital.com.br/noticia_ler.php?id=11153

325 MAUROIS, André. Letter Ouverte a um Jeune Homme, Paris, ed. 1966, p.38
Página 155 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

"A estultice tem uma real e efetiva importância no agir humano. Talvez seja
por isso que o poeta Schiller escreveu, há dois séculos, que ‘Contra a estupidez os
próprios deuses lutam inutilmente’. Apesar de tudo, para mim, na minha visão de
professor de Direito, não é demais ainda confiar na inteligência humana, que um
dia acabará prevalecendo.” Paulo Pasquilini

Esse fenômeno não passa desapercebido de alguns juízes.


Quando tomou posse como Presidente do Superior Tribunal de Justiça, o
Ministro Ari Pargendler denunciou e criticou a exacerbação da celeridade:

"Entre o artesanato e a indústria, eu ainda prefiro ... não julgar a julgar errado."
326

No mesmo sentido, a Ministra Eliana Calmon:

“Não está sendo fácil corrigir os rumos, implantar práticas administrativas


modernas, desalojar os vilões do Poder e, principalmente, mudar os usos e costumes de
um Judiciário desenvolvido à sombra de uma sociedade elitista, patrimonialista, desigual
e individualista. Este não é um trabalho de pouco e para pouco tempo. É meta arrojada a
exigir esforço concentrado de todos os atores da atividade judicante, especialmente dos
magistrados. Não podemos esperar pelo legislador e pelo Executivo. A iniciativa de
reconstrução é nossa”.327

43. Do devido processo legal e a competência:

A Constituição Federal assegura no art. 5º inc. LIII que ninguém


será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente
(grifamos). “Competente” é o magistrado escolhido pelo conjunto de regras, de
direito constitucional e processual. Vejamos a estrutura do Poder
Judiciário. O art. 92 da Constituição Federal enumera seus órgãos (grifamos):
I - o Supremo Tribunal Federal;
II - o Superior Tribunal de Justiça;
III - os Tribunais Regionais Federais e Juízes Federais;
IV - os Tribunais e Juízes do Trabalho;
V - os Tribunais e Juízes Eleitorais;
VI - os Tribunais e Juízes Militares;
VII - os Tribunais e Juízes dos Estados e do Distrito Federal e Territórios.

326
Ministro Ari Pargendler, discurso de posse no STJ
http://www.canaleletronico.net/index.php?option=com_content&view=article&id=439
327
Op. et loc cit; Porque as pessoas espertas podem ser tão tolas? A resposta é encontrada
ao conhecer o processo de pensamento e de comunicação:
http://www.padilla.adv.br/processo/pensamento/
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 156

Como é essa divisão, ou quem julga o que ? A Constituição


Federal estabelece a competência de cada órgão do Poder Judiciário em razão da
matéria e da hierarquia. Cada parte da estrutura do Poder Judiciário está
vinculada à competência em razão da matéria e da hierarquia, a qual é
inderrogável por convenção das partes (CPC art.111). Diz-se prorrogável a
competência quando pode ser modificada por acordo expresso ou tácito das
partes. É expresso o acordo prorrogando a jurisdição quando as partes
convencionam um Foro de Eleição para tratar questões oriundas do
contrato que celebram. O acordo é tácito quando o autor ajuíza a ação num
Foro diverso do estabelecido em lei e o réu “concorda” não oferecendo
exceção de incompetência no prazo da resposta à CPC exige petição que
será autuada em apenso (recebe capa, fica ligado aos autos
principais por corda ou grampo) arts. 114 + 305 e ss. No Processo
Penal a exceção pode ser apresentada verbalmente, em homenagem à
ampla defesa. O prazo é o da defesa prévia que, em conjunto com o
interrogatório do réu, compõe a “resposta” do réu no processo penal à
CPP art. 108. No Processo do Trabalho, na falta de regramento
completo aplicam-se as disposições de processo civil, e a exceção ser
apresentada por petição própria antes da contestação, isto é, antes ou
durante o início da audiência, sempre antes da contestação. Pelo art.800
da CLT o Magistrado deveria suspender o processo por 24 horas para
resposta do Exceto (a parte contrária). Procurando evitar que se converta
num mecanismo de protelação os magistrados costumam consignar na
própria audiência a resposta do Exceto e desacolher a exceção, ou afirmar
que seu exame se confunde com a matéria da fundo, especialmente quando
a exceção afirma que a natureza da relação jurídica entre as partes não é de
direito do trabalho. Pelo sistema da CLT, que detalharemos adiante,
especialmente pelo art. 799 § 2º, não cabe recurso de tal decisão. A parte
prejudicada deve “protestar pelo cerceamento de defesa” e reiterar a
questão em razões ou contra-razões de recurso ordinário. No segundo livro
detalharemos os recursos.
Página 157 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

A Constituição de 1988 trouxe duas inovações. Criou,


instalados em maio de 1989, TRF´s Tribunais Regionais Federais, o segundo
grau de jurisdição na Justiça Federal. 328

Aproveitou a estrutura física e recursos humanos do TFR


Tribunal Federal de Recursos que extingiu, dotado de excepcional ritmo
operacional329 – para o transformar num novo Tribunal, o STJ Superior
Tribunal de Justiça. Nas instalações físicas e recursos humanos do TFR
com a quantidade de Ministros ampliada para 33330, reunindo condições
para orientar a interpretação do direito. Em 1995, o STJ mudou-se para
nova sede construída com 60 gabinetes, prevendo as ampliações na Corte.
Veja mais sobre STJ em www.padilla.adv.br/teses/stj.htm.

Na década de setenta o STF não conseguia cumprir o papel de


orientar a interpretação do direito e editou uma súmula afirmando que
decisões “razoáveis” não poderiam ser julgadas pelo STF em recurso
Extraordinário [Súmula 400, STF “Decisão que deu razoável interpretação à lei, ainda que

328
C.F. Art.107. Os Tribunais Regionais Federais compõem-se de, no mínimo, sete juízes,
recrutados, quando possível, na respectiva região e nomeados pelo Presidente da República dentre
brasileiros com mais de trinta e menos de sessenta e cinco anos, sendo: I - um quinto dentre advogados
com mais de dez anos de efetiva atividade profissional e membros do Ministério Público Federal com
mais de dez anos de carreira; II - os demais, mediante promoção de juízes federais com mais de cinco
anos de exercício, por antigüidade e merecimento, alternadamente. Parágrafo único. A lei disciplinará a
remoção ou a permuta de juízes dos Tribunais Regionais Federais e determinará sua
329
O volume de processos do TFR era “sufocante”, toda competência da Justiça Federal de todo
país. Quando o particular perdia, recorria; Quando ganhava, além do recurso havia reexame necessário.
O TFR proferiu mais de cinqüenta mil julgamentos num único ano, em 1978. As Leis Federais
6.025/78 e 6.030/78 reduziram acesso ao TFR criando grau único de jurisdição na Justiça Federal (Lei
6.025), e na Justiça comum nas execuções fiscais (art. 34 da Lei 6.030/78), nas causas de valor inferior a
50 ORTN´s. A Lei 6.025 foi revogada na década de noventa por uma Medida Provisória. A Lei de
Execuções Fiscais continua em vigor e aplicada em regiões onde, periodicamente, atualizam o valor de
alçada a partir do qual é cabível apelação. A norma do art. 899 da CLT remete às regras das execuções
fiscais aos feitos trabalhistas e autorizara (em tese) o uso dessa alçada recursal mas não temos notícias de
aplicação. CLT, art.899. Aos trâmites e incidentes do processo da execução são aplicáveis, naquilo em
que não contravierem ao presente Título, os preceitos que regem o processo dos executivos fiscais para a
cobrança judicial da dívida ativa da Fazenda Pública Federal.
330
Conforme art.104, da CF, os Ministros do STJ serão nomeados: I - um terço dentre juízes dos
Tribunais Regionais Federais e um terço dentre desembargadores dos Tribunais de Justiça,
indicados em lista tríplice elaborada pelo próprio Tribunal; II - um terço, em partes iguais, dentre
advogados e membros do Ministério Público Federal, Estadual, do Distrito Federal e Territórios,
alternadamente, indicados na forma do art.94. (...à...) Art. 94. Um quinto dos lugares dos Tribunais
Regionais Federais, dos Tribunais dos Estados, e do Distrito Federal e Territórios será composto de
membros, do Ministério Público, com mais de dez anos de carreira, e de advogados de notório saber
jurídico e de reputação ilibada, com mais de dez anos de efetiva atividade profissional, indicados em lista
sêxtupla pelos órgãos de representação das respectivas classes. Parágrafo único. Recebidas as indicações,
o tribunal formará lista tríplice, enviando-a ao Poder Executivo, que, nos vinte dias subseqüentes,
escolherá um de seus integrantes para nomeação.
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 158

não seja a melhor, não autoriza recurso extraordinário pela letra “a” do art. 101, III, da CF” (hoje a
remissão correta seria ao art. 105, III, “a”, da Constituição). Aprofunde o tema em
www.padilla.adv.br/teses/resp.htm

A crise do Supremo decorria de cumprir dois papéis


inconciliáveis. Até 1988, o STF era guardião da Constituição mas –
ao mesmo tempo, também era responsável por uniformizar a
jurisprudência.

O STF é formado por onze Ministros que, na prática,


reduzem para oito porque três são destacados para o TSE331 e um
cumpre o papel de Presidente, isto é, é o Chefe do Poder Judiciário,
repleto de atribuições administrativas e protocolares. A quantidade
de Ministros é adequada para uma Corte Constitucional. A guarda
da Constituição necessita uma Corte pequena, com juristas
excepcionais para debate das questões com ponderação e
profundidade.

Diferente é a aplicação uniforme da Lei Federal que


envolve mais de 100.00 diplomas legais num país de dimensões
continentais, com dezenas de Tribunais estaduais e regionais
encaminhando milhares de recursos com pretensões de decisão
sobre interpretação do direito, exige uma corte numerosa.

Aumentar a quantidade de Ministros do STF deturparia


seu papel de Corte Constitucional. A solução proposta pelo saudoso
Theotonio Negrão na década de setenta: Criar novo Tribunal para
exame das questões legais, o STJ, cujo compromisso com a
renovação foi tanto que - abandonando o imobilismo histórico
passou a rever e modificar entendimentos arraigados, liderado por
juristas de escol como Athos Gusmão Carneiro e Sálvio de
Figueiredo Teixeira, dois dos mais importantes mentores da
evolução do Direito Processual na virada do milênio. Veja a Súmula
621 do STF impedindo ao possuidor de boa fé de defender a sua
posse se o título não estiver registrado. Vigorou por décadas,
sacramentando injustiças, até a edição, pelo STJ, de Súmula 332

331
CF Art. 119. O Tribunal Superior Eleitoral compor-se-á, no mínimo, de sete membros,
escolhidos: I - mediante eleição, pelo voto secreto: a) três juízes dentre os Ministros do Supremo
Tribunal Federal; b) dois juízes dentre os Ministros do Superior Tribunal de Justiça; II - por nomeação
do Presidente da República, dois juízes dentre seis advogados de notável saber jurídico e idoneidade
moral, indicados pelo Supremo Tribunal Federal. Parágrafo único. O Tribunal Superior Eleitoral
elegerá seu Presidente e o Vice-Presidente dentre os Ministros do Supremo Tribunal Federal, e o
Corregedor Eleitoral dentre os Ministros do Superior Tribunal de Justiça.
332
Súmula 84 STJ.“É admissível a oposição de embargos de terceiro fundados em alegação de
posse advinda do compromisso de compra e venda de imóvel, ainda que desprovido de registro.” -
oposto ao teor da Súmula 621 do STF, veja a nota seguinte.
Página 159 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

com teor contrário 333. Parece estranho: O Supremo, como o nome


sugere, não estaria acima do STJ? A questão se resolve na
competência334: Pela Constituição compete ao STJ decidir, em
última instância, a interpretação da Lei. O Supremo Tribunal julga
ofensas à Constituição Federal. Em matéria legal, não havendo
ofensa à Constituição, a última palavra é do STJ. In casu, era
preciso saber, do ponto de vista legal, o que era mais importante, o
direito do credor de penhorar um bem em nome do devedor? Ou o
direito do possuidor de boa fé de defender sua posse do bem que
estava em nome do devedor? Na solução da controvérsia, prevaleceu
a interpretação sistemática do direito privado consolidado, quando
o pais era eminentemente agrícola; o direito das coisas e a posse de
imóvel são mais importantes que o direito das obrigações.

O STJ possui três Seções especializadas, em Direito


Penal, Público, e Privado, cada uma com duas Turmas. Súmulas
resumem o entendimento da maioria dos Ministros 335. Repetidos

333
Súmula nº 621 do STF, anterior à Súmula 84 do STJ que derevogou sua eficácia: “Não enseja
embargos de terceiro à penhora a promessa de compra e venda não inscrita no registro de imóveis.” –
contrário à Súmula 84 do STJ, veja a nota anterior.
334
O Superior Tribunal de Justiça é competente para as questões legais e uniformizar a
jurisprudência, interpretando as leis. Art.105, C.F.: I - processar e julgar, originariamente: a) nos
crimes comuns, os Governadores dos Estados e do Distrito Federal, e, nestes e nos de responsabilidade,
os desembargadores dos Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal, os membros dos
Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal, os dos Tribunais Regionais Federais, dos
Tribunais Regionais Eleitorais e do Trabalho, os membros dos Conselhos ou Tribunais de Contas dos
Municípios e os do Ministério Público da União que oficiem perante tribunais; b) os mandados de
segurança e os habeas data contra ato de Ministro de Estado, dos Comandantes da Marinha, do Exército
e da Aeronáutica ou do próprio Tribunal; c) os habeas corpus, quando o coator ou paciente for qualquer
das pessoas mencionadas na alínea "a", ou quando o coator for tribunal sujeito à sua jurisdição, Ministro
de Estado ou Comandante da Marinha, do Exército ou da Aeronáutica, ressalvada a competência da
Justiça Eleitoral; d) os conflitos de competência entre quaisquer tribunais, ressalvado o disposto no
art. 102, I, "o", bem como entre tribunal e juízes a ele não vinculados e entre juízes vinculados a tribunais
diversos; e) as revisões criminais e as ações rescisórias de seus julgados; f) a reclamação para a
preservação de sua competência e garantia da autoridade de suas decisões; g) os conflitos de atribuições
entre autoridades administrativas e judiciárias da União, ou entre autoridades judiciárias de um Estado e
administrativas de outro ou do Distrito Federal, ou entre as deste e da União; h) o mandado de injunção,
quando a elaboração da norma regulamentadora for atribuição de órgão, entidade ou autoridade federal,
da administração direta ou indireta, excetuados os casos de competência do Supremo Tribunal Federal e
dos órgãos da Justiça Militar, da Justiça Eleitoral, da Justiça do Trabalho e da Justiça Federal; II - julgar,
em recurso ordinário: a) os "habeas-corpus" decididos em única ou última instância pelos Tribunais
Regionais Federais ou pelos tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territórios, quando a decisão for
denegatória; b) os mandados de segurança decididos em única instância pelos Tribunais Regionais
Federais ou pelos tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territórios, quando denegatória a decisão;
c) as causas em que forem partes Estado estrangeiro ou organismo internacional, de um lado, e, do outro,
Município ou pessoa residente ou domiciliada no País; III - julgar, em recurso especial, as causas
decididas, em única ou última instância, pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos tribunais dos
Estados, do Distrito Federal e Territórios, quando a decisão recorrida: a) contrariar tratado ou lei federal,
ou negar-lhes vigência; b) julgar válido ato de governo local contestado em face de lei federal; c) der a lei
federal interpretação divergente da que lhe haja atribuído outro tribunal.
335
Ilustram postura revolucionária do STJ decisões permitindo alterar periodicidade de reajuste de
aluguel, de anual para semestral, contra a vontade do inquilino. Em 23-6-92, sob a presidência do
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 160

julgamentos idênticos pelas Turmas, a Sessão especializada edita


Súmula (Regimento Interno do STJ, art 122 a 127); Julgamentos divergentes
autorizam a parte interpor Embargos de Divergência ou podem
conduzir ao “incidente de uniformização de jurisprudência” no qual, após
profundo debate, resulta Súmula com o entendimento da maioria
(Regimento Interno do STJ, art. 118 a 121).

44. Do Tribunal Constitucional - STF


Ao STF Supremo Tribunal Federal com 11 Ministros escolhidos
entre “cidadãos com mais de trinta e cinco e menos de sessenta e cinco anos de idade, de
notável saber jurídico e reputação ilibada” (a escolha deve ser aprovada pela maioria do Senado, CF
art.101 e §) processam as mais elevadas autoridades, e a guarda da
constituição, cuja guarda é examinada no controle difuso em Recurso
Extraordinário ou em controle direito via ADIn Ação Direta de Inconstitucionalidade336.

Ministro Athos Carneiro que também foi Relator, a 4ª Turma analisou a divergência jurisprudencial. Não
admitiam alteração: RT 610/146 e 157. Permitiam julgados do próprio STJ: 4ª T., Resp 5839, mesmo
Relator e Resp 512, Rel. Min. Barros Monteiro; 3ª Resp 14131, Rel. Min. Eduardo Ribeiro. Em
julgamento unânime, os ministros Fontes de Alencar, Sálvio de Figueiredo, Barros Monteiro e Bueno de
Souza acompanharam o Relator reconhecendo que, se por um processo judicial pode ser elevado o
aluguel, nada impede que modifique a periodicidade do reajuste (Adv-semanal 92/448-449) e “Reajuste
de aluguel” in Jornal da OAB/RS “Ipsis Litteris”, outubro de 1992, p. 15
336
As competências do Supremo Tribunal Federal estão na Constituição Federal, art.102, inc. I,
sobre processar e julgar, originariamente, a ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo
federal ou estadual e a ação declaratória de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal; nas
infrações penais comuns, o Presidente da República, o Vice-Presidente, os membros do Congresso
Nacional, seus próprios Ministros e o Procurador-Geral da República; nas infrações penais comuns e nos
crimes de responsabilidade, os Ministros de Estado e os Comandantes da Marinha, do Exército e da
Aeronáutica, ressalvado o disposto no art. 52, I, os membros dos Tribunais Superiores, os do Tribunal de
Contas da União e os chefes de missão diplomática de caráter permanente; o "habeas-corpus", sendo
paciente qualquer das pessoas referidas nas alíneas anteriores; o mandado de segurança e o "habeas-data"
contra atos do Presidente da República, das Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, do
Tribunal de Contas da União, do Procurador-Geral da República e do próprio Supremo Tribunal Federal;
o litígio entre Estado estrangeiro ou organismo internacional e a União, o Estado, o Distrito Federal ou o
Território; as causas e os conflitos entre a União e os Estados, a União e o Distrito Federal, ou entre uns e
outros, inclusive as respectivas entidades da administração indireta; a extradição solicitada por Estado
estrangeiro; a homologação das sentenças estrangeiras e a concessão do "exequatur" às cartas rogatórias,
que podem ser conferidas pelo regimento interno a seu Presidente; o habeas corpus, quando o coator for
Tribunal Superior ou quando o coator ou o paciente for autoridade ou funcionário cujos atos estejam
sujeitos diretamente à jurisdição do Supremo Tribunal Federal, ou se trate de crime sujeito à mesma
jurisdição em uma única instância; a revisão criminal e a ação rescisória de seus julgados; a reclamação
para a preservação de sua competência e garantia da autoridade de suas decisões; a execução de sentença
nas causas de sua competência originária, facultada a delegação de atribuições para a prática de atos
processuais; a ação em que todos os membros da magistratura sejam direta ou indiretamente interessados,
e aquela em que mais da metade dos membros do tribunal de origem estejam impedidos ou sejam direta
ou indiretamente interessados; os conflitos de competência entre o Superior Tribunal de Justiça e
quaisquer tribunais, entre Tribunais Superiores, ou entre estes e qualquer outro tribunal; o pedido de
medida cautelar das ações diretas de inconstitucionalidade; o mandado de injunção, quando a elaboração
da norma regulamentadora for atribuição do Presidente da República, do Congresso Nacional, da Câmara
dos Deputados, do Senado Federal, das Mesas de uma dessas Casas Legislativas, do Tribunal de Contas
Página 161 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

Quando o Tribunal competente no Estado, ou região profere a


decisão o jurisdicionado prejudicado em tese dispõe de dois recursos. Ao
STJ, mediante Recurso Especial, veicula inconformidade por ofensa ou
negativa de vigência à Lei Federal, dissídio jurisprudencial na interpretação
de Lei Federal, etc. E mediante Recurso Extraordinário pode invocar que o
STF cumpra seu papel de guardião da Constituição. Ambos tem mesmo
prazo, 15 dias, e devem ser obrigatoriamente interpostos (os dois) quando a
decisão tiver duplo fundamento. Se a decisão recorrida tiver fundamento
simultaneamente em normas Constitucional e Legal, não basta veicular
apenas um dos recursos. Porque um recurso ao STJ só pode modificar a
decisão com respeito à matéria legal. E perante o STF só poderá ser obtida
exegese da Constituição. Ora, se a decisão tem duplo fundamento, é preciso
veicular os dois recursos para atacar ambos aspectos dos fundamentos, ou
fica inviabilizado o conhecimento da inconformidade. Não haveria utilidade
uma das Cortes examinar a parte legal ou a constitucional, porque a
decisão continuaria a subsistir baseada no outro fundamento. Nesse caso,
o recurso interposto contra apenas um dos aspectos fica com seu exame
prejudicado pela falta de interesse. Cada uma das cortes tem sua
competência limitada, uma examina questões legais (STJ). Outra, as
constitucionais (STF). Apenas um dos Tribunais não poderá afastar o duplo
fundamento.337

45. Da Justiça Comum x Especializadas:


Usual denominar o Poder Judiciário estadual de Justiça Comum
para o distribuir dos quatro grandes ramos de Justiças Especializadas:
Eleitoral, Federal, Militar e do Trabalho.

da União, de um dos Tribunais Superiores, ou do próprio Supremo Tribunal Federal; Compete, ainda,
inc. II do mesmo art. 102, julgar em recurso ordinário: o "habeas-corpus", o mandado de segurança, o
"habeas-data" e o mandado de injunção decididos em única instância pelos Tribunais Superiores, se
denegatória a decisão; o crime político; Finalmente, pelo inc. III do mesmo art. 102, julga, mediante
recurso extraordinário, as causas decididas em única ou última instância, quando a decisão recorrida:
contrariar dispositivo da Constituição; declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal; julgar
válida lei ou ato de governo local contestado em face desta Constituição.
337
Na Justiça Federal ocorre o mesmo. Depois de julgado pelo Juiz Federal, o processo vai ao TRF
Tribunal Regional Federal e, quando este decide em última instância, em tese o vencido pode veicular os
dois recursos mencionados. Ao STJ, Recurso Especial para discutir matéria de legislação.... Mediante
Recurso Extraordinário ao STF veicula ofensa à Constituição. Se a decisão recorrida tiver fundamentos
legais e constitucionais deve interpor os dois recursos.
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 162

Em razão da hierarquia dos envolvidos ou natureza da matéria –


o caso é competência de alguma das Justiças Especializadas ou sujeito ao
exame prévio da Justiça Desportiva que, como vimos acima, é um tribunal
privado. Não verificada algumas dessas hipóteses, o julgamento é
competência da Justiça Estadual. As decisões de primeiro grau são do Juiz
de Direito. Até 2004 cada unidade da Federação em sua respectiva
Constituição Estadual competia organizar a Justiça Estadual permutando
haver mais de um tribunal repartindo a competência recursal. Havia um
Tribunal de Alçada no RS, PR, MG e RJ, e três em SP. O Rio Grande do Sul
fundiu o Tribunal de Alçada com o Tribunal de Justiça, e os outros Estados
possuíram Tribunais de Alçada.338 A divisão da competência entre os
Tribunais de Alçada e o de Justiça era realizada na Constituição Estadual.
E a iniciativa de Leis em matéria de Organização Judiciária é do Tribunal
de Justiça, encaminhando Projetos de Lei à Assembléia Legislativa (art. 125, §
1º, da C.F.).
A competência da Justiça Federal está no art. 109, Constituição
Federal atribuindo aos Juízes Federais:
I - as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição
de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à
Justiça do Trabalho;
II - as causas entre Estado estrangeiro ou organismo internacional e Município ou pessoa domiciliada ou
residente no País;
III - as causas fundadas em tratado ou contrato da União com Estado estrangeiro ou organismo internacional;
IV - os crimes políticos e as infrações penais praticadas em detrimento de bens, serviços ou interesse da União
ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas, excluídas as contravenções e ressalvada a competência da Justiça Militar e
da Justiça Eleitoral;
V - os crimes previstos em tratado ou convenção internacional, quando, iniciada a execução no País, o
resultado tenha ou devesse ter ocorrido no estrangeiro, ou reciprocamente;
VI - os crimes contra a organização do trabalho e, nos casos determinados por lei, contra o sistema financeiro
e a ordem econômico-financeira;
VII - os "habeas-corpus", em matéria criminal de sua competência ou quando o constrangimento provier de
autoridade cujos atos não estejam diretamente sujeitos a outra jurisdição;
VIII - os mandados de segurança e os "habeas-data" contra ato de autoridade federal, excetuados os casos de
competência dos tribunais federais;
IX - os crimes cometidos a bordo de navios ou aeronaves, ressalvada a competência da Justiça Militar;
X - os crimes de ingresso ou permanência irregular de estrangeiro, a execução de carta rogatória, após o
"exequatur", e de sentença estrangeira, após a homologação, as causas referentes à nacionalidade, inclusive a respectiva opção, e
à naturalização;
XI - a disputa sobre direitos indígenas.
§ 1º - As causas em que a União for autora serão aforadas na seção judiciária onde tiver domicílio a outra
parte.

338
EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 45, DE 8 DE DEZEMBRO DE 2004 (DOU 31/12/2004)
Art. 4º Ficam extintos os Tribunais de Alçada, onde houver, passando os seus membros a integrar os
Tribunais de Justiça dos respectivos Estados, respeitadas a antigüidade e classe de origem. Parágrafo. No
prazo de 180 dias, contado da promulgação desta, os Tribunais de Justiça, por ato administrativo,
promoverão a integração dos membros dos tribunais extintos em seus quadros, fixando-lhes a
competência e remetendo, em igual prazo, ao Poder Legislativo, proposta de alteração da organização e
da divisão judiciária correspondentes, assegurados os direitos dos inativos e pensionistas e o
aproveitamento dos servid ores no Poder Judiciário estadual.
Página 163 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

§ 2º - As causas intentadas contra a União poderão ser aforadas na seção judiciária em que for domiciliado o
autor, naquela onde houver ocorrido o ato ou fato que deu origem à demanda ou onde esteja situada a coisa, ou, ainda, no Distrito
Federal.
§ 3º - Serão processadas e julgadas na justiça estadual, no foro do domicílio dos segurados ou beneficiários, as
causas em que forem parte instituição de previdência social e segurado, sempre que a comarca não seja sede de vara do juízo
federal, e, se verificada essa condição, a lei poderá permitir que outras causas sejam também processadas e julgadas pela justiça
estadual.
§ 4º - Na hipótese do parágrafo anterior, o recurso cabível será sempre para o Tribunal Regional Federal na
área de jurisdição do juiz de primeiro grau.
Art. 108. Compete aos Tribunais Regionais Federais:
I - processar e julgar, originariamente:
a) os juízes federais da área de sua jurisdição, incluídos os da Justiça Militar e da Justiça do Trabalho, nos
crimes comuns e de responsabilidade, e os membros do Ministério Público da União, ressalvada a competência da Justiça Eleitoral;
b) as revisões criminais e as ações rescisórias de julgados seus ou dos juízes federais da região;
c) os mandados de segurança e os "habeas -data" contra ato do próprio Tribunal ou de juiz federal;
d) os "habeas-corpus", quando a autoridade coatora for juiz federal;
e) os conflitos de competência entre juízes federais vinculados ao Tribunal;
II - julgar, em grau de recurso, as causas decididas pelos juízes federais e pelos juízes estaduais no exercício
da competência federal da área de sua jurisdição.

Em ambas, Justiça Estadual e Federal, o STF pode se


transformar num quarto grau de jurisdição porque, em tese,
possível veicular Recurso Extraordinário contra a decisão definitiva
ocorrida no STJ no julgamento do Recurso Especial, desde que
possível alegar violação de preceito constitucional.

Em ambas Justiças, estadual ou federal, cabe Recurso Ordinário


ao STJ, quando um tribunal estadual ou federal denegar "habeas-corpus",
mandado de segurança, "habeas-data" ou mandado de injunção ajuizado
originalmente perante o Tribunal recorrido [105 II a) da Constituição Federal]

46. Da Justiça Militar


Uma Justiça especializada é a Militar a qual, em alguns Estados,
revela-se duas Justiças distintas, Justiça Militar Estadual, e a Justiça Militar
Federal. Além do Superior Tribunal Militar e dos os Tribunais e Juízes
Militares Federais, instituídos por lei (CF. art.122), lei estadual pode criar,
mediante proposta do Tribunal de Justiça, a Justiça Militar Estadual 339,
constituída, em primeiro grau, pelos Conselhos de Justiça e, em segundo,
pelo próprio Tribunal de Justiça, ou por Tribunal de Justiça Militar nos
Estados em que o efetivo da polícia militar supere vinte mil integrantes340.

339
Em 23.10.2003 havia Justiça Militar Estadual em três estados do país: São Paulo, Minas Gerais e
Rio Grande do Sul. Neste o Tribunal Militar é constituído de sete juízes, três togados e quatro militares.
Criado 1918, num dos governos de Borges de Medeiros, com nome de “Corte de Apelação da Justiça
Militar do Estado” (Luiz Juarez Nogueira de Azevedo), “A advocacia pública e a memória da justiça
militar” www.espacovital.com.br/artigoluizjuares.htm
340
Caso do Rio Grande do Sul. Conselho de Justiça TJM Tribunal de Justiça Militar estadual, julga
policiais militares estaduais e bombeiros. Vem acontecendo uma redução do efetivo da Brigada Militar
no Rio Grande do Sul, causando preocupações com a segurança e suscitando discussão em torno da
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 164

Havendo Justiça Militar Estadual ela processa e julga os policiais militares e


bombeiros militares nos crimes militares, definidos em lei, cabendo ao
tribunal decidir sobre a perda do posto e da patente dos oficiais e da
graduação das praças (art.125, §§ 3º e 4º da CF).

A Justiça Militar da União julga os militares federais. A decisão


de primeiro grau é tomada pelo Juiz-Auditor, pelo Conselho Especial de
Justiça, ou pelo Conselho Permanente de Justiça, conforme o caso, com
recurso ao STM Superior Tribunal Militar341.

Da decisão de qualquer Tribunal Militar, Estadual ou Federal, o


STF atua como terceiro grau de jurisdição342 em Recurso Extraordinário
quando possível sustentar contrariedade à Constituição [102 III (a) da Constituição
Federal]:; ou quando a decisão de TJM estadual fundar-se em dispositivo de
legislação estadual contestado em face da Constituição Federal [102 III (c) da
Constituição Federal]: Na Justiça Militar também cabe recurso ordinário da
decisão denegatória de "habeas-corpus", mandado de segurança, "habeas-
data" ou mandado de injunção. Do STM o recurso será para o STF [102 II (a)
da Constituição Federal]. Do TJM estadual o recurso será para o STJ [105 II (a) da
Constituição Federal]

47. Dos quatro graus de jurisdição:


Nos Tribunais de Justiça e nos Tribunais Regionais Federais, da
decisão proferida podem ser cabíveis o recurso especial e, ou, o recurso
extraordinário, os quais deverão ser apresentados simultaneamente.
Diversamente, nas Justiças Eleitoral, e do trabalho, há quatro
graus de jurisdição, pois das decisões dos Tribunais Regionais Eleitorais, ou
do Trabalho, primeiro recorre-se a uma Corte especializada e, somente depois
de esgotadas as instâncias desta, o recurso extraordinário.

47.1. Da Justiça Eleitoral:

inconstitucionalidade de manter Tribunal de Justiça Militar Estadual, quando Constituição Federal exige
efetivos superiores a 20.000.
341
Art. 123. O Superior Tribunal Militar compor-se-á de quinze Ministros vitalícios, nomeados pelo
Presidente da República, depois de aprovada a indicação pelo Senado Federal, sendo três dentre oficiais-
generais da Marinha, quatro dentre oficiais-generais do Exército, três dentre oficiais -generais da
Aeronáutica, todos da ativa e do posto mais elevado da carreira, e cinco dentre civis. Parágrafo único.
Os Ministros civis serão escolhidos pelo Presidente da República dentre brasileiros maiores de trinta e
cinco anos, sendo: I - três dentre advogados de notório saber jurídico e conduta ilibada, com mais de dez
anos de efetiva atividade profissional; II - dois, por escolha paritária, dentre juízes auditores e membros
do Ministério Público da Justiça Militar.
342
Na década de oitenta, ainda sob influência do poder pelos militares, era corrente a lição de que o
STF era o Supremo Tribunal, situado na praça dos Três Poderes, mas que ele, na prática, não reformava
decisões tomadas pelas Cortes Militares porque era o STM era Superior... Na verdade, realmente, o
STM era “superior” ao STF em pelo menos um aspecto: o prédio do STM é muito mais alto do que a
sede do STF...
Página 165 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

A Justiça Eleitoral é responsável pela disciplina e julgamento dos


procedimentos de eleição e diplomação dos administradores públicos e
representantes da população nas casas legislativas. Em matéria eleitoral os
quatro graus de jurisdição são ostensivos, semelhante ao processo trabalhista.
Em primeiro grau, as questões tramitam perante Juntas e Juízes Eleitorais;
em segundo grau nos TRE´s Tribunais Regionais Eleitorais – um em cada das Capital
(art.120 da Constituição Federal); em terceiro grau o TST Tribunal Superior Eleitoral o qual só
examina recursos das decisões dos TRE´s quando (art.121, § 4º, da Constituição
Federal ): I - proferidos contra disposição expressa da Constituição ou de lei; II - ocorrer
divergência na interpretação de lei entre dois ou mais Tribunais Eleitorais; III -
versarem sobre inelegibilidade ou expedição de diplomas nas eleições federais ou
estaduais; IV - anularem diplomas ou decretarem a perda de mandatos eletivos federais
ou estaduais; V - denegarem "habeas-corpus", mandado de segurança, "habeas-data" ou
mandado de injunção. Das decisões do TSE cabe Recurso Extraordinário por
ofensa a Constituição [art.121, § 3º, cc. 102 III (a) da Constituição Federal]: ao STF, que
será como um quarto grau de jurisdição e Corte Constitucional ao julgar. O TSE
julga também, Recurso Ordinário quando denegado "habeas-corpus" ou
mandado de segurança no TSE [art.121, § 3º, cc 102 II (a) da Constituição Federal]:

47.2. Da Justiça do Trabalho:


A Justiça especializada do Trabalho compete conciliar e
julgar dissídios individuais ou coletivos entre trabalhadores e empregadores,
as controvérsias decorrentes da relação de trabalho, e litígios do cumprimento
de suas próprias sentenças, inclusive coletivas, bem como as contribuições
sociais previstas (para INSS) no art. 195, I, a, e II, e seus acréscimos legais, decorrentes das
sentenças que proferir.

Na Justiça do Trabalho também encontramos quatro graus de


jurisdição. A criação e competência dos três primeiros graus são da legislação
ordinária. Das decisões definitivas dos Juízes do Trabalho cabe recurso para o
TRT Tribunal Regional do Trabalho. Há regiões onde um Estado possui mais de um
TRT343 (São Paulo possui TRTs da 2ª e 15ª regiões, na Capital, e em Campinas); n’outras
regiões um mesmo TRT julga recursos oriundos de mais de um Estado

343
O Presidente Itamar Franco quis instalar um segundo TRT em Minas Gerais na sua cidade natal.
Encomendou ao TST estudo da demanda de serviço atendida pelo TRT para justificar a decisão. O
Estudo do TST concluiu que o volume de serviço indicava necessidade de instalar um terceiro TRT em
São Paulo e um segundo TRT no Rio Grande do Sul, cujas demandas eram maiores do que as do TRT
mineiro. Os custos envolvidos fizeram abandonar o projeto. Vilson Bilhalva, então presidente do TRT-
4ªR., recorda que, na época, várias cidades do RS disputavam a sede de um 2º TRT gaúcho. Novo
Hamburgo, com economia forte e considerável demanda de reclamações contra empresas de calçados
mas demasiado próxima de Porto Alegre não descentralizando o serviço. Santa Maria, centro geográfico
do Estado, possuía demanda regional pequena. Pelotas, centro de região com demanda relativamente
extensa, aspirava impulso na economia outrora muito mais forte. Mas Caxias do Sul possuía demanda
maior que da região sul e propiciava maior descentralização, além de constituir a região que mais crescia
no Estado.
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 166

(Rondônia e Acre. São julgados no TRT da 14ª região, em Campo Velho; ou Amazonas e Roraima,
TRT da 11ª Região em Manaus, art. 674 da CLT ).
Em terceiro grau de jurisdição está o TST Tribunal Superior do
Trabalho o qual examina recursos das decisões de última instância dos TRT´s
quando (Art.896 CLT):
a) derem ao mesmo dispositivo de lei federal interpretação diversa da que lhe houver
dado o mesmo ou outro Tribunal Regional, através do Pleno ou de Turmas, ou a Seção de Dissídios
Individuais do Tribunal Superior do Trabalho, salvo se a decisão recorrida estiver em consonância com
enunciado da Súmula de Jurisprudência Uniforme do Tribunal Superior do Trabalho; (Note a diferença para
o Art. 105, da Constituição Federal pelo qual o STJ dirime dissídios entre Tribunais diversos)
b) derem ao mesmo dispositivo de lei estadual, Convenção Coletiva de Trabalho, Acordo
Coletivo, sentença normativa ou regulamento empresarial de observância obrigatória em área territorial
que exceda a jurisdição do Tribunal Regional prolator interpretação divergente, na forma da alínea a;
(Note a diferença para o STJ que examina só violações as normas federais; a competência do TST é muito
mais ampliado que a do STJ)
c) proferidas com violação de literal dispositivo de lei federal, ou da Constituição da
República.

Da decisão do TST é possível veicular dois tipos de recursos ao


STF, que funcionaria como um quarto grau de jurisdição no
“Extraordinário” por ofensa à Constituição [102 III (a) da Constituição Federal]:; ou em
Recurso Ordinário quando denegado "habeas-corpus", mandado de
segurança, "habeas-data" ou mandado de injunção ajuizado perante o TST
[102 II (a) da Constituição Federal].

O processo do trabalho sofreu rápida evolução, em meio


século. Nasceu da intenção de oferecer aos empregados condições de
reclamar dos empregadores mediante mecanismo mais célere e
acessível. No final da década de trinta um processo na Justiça comum
demorava anos tramitando e era bastante dispendioso. Só duas
décadas mais tarde, em 1950, foi editada a Lei 1.050/60, preocupada
em assegurar o acesso à Justiça para pessoas sem condições de pagar
as custas344.

344
Ao longo de meio século, a Lei 1.060/50 que regula a Dispensa de Custas e a Assistência
Judiciária recebeu diversos aperfeiçoamentos e o instituto continua em constante evolução. A recente
polêmica é sobre às pessoas jurídicas poderem, ou não, desfrutar do benefício. Há argumentos e decisões
em favor de empresas familiares ou levadas a situação de insolvência, não raro pelos fatos que
justamente discutem judicialmente. Por exemplo, ocorrido um incêndio com destruição da sede da
empresa, equipamentos, matéria prima, produtos finais, etc., a seguradora recusa a indenização, sem a
qual a empresa não pode prosseguir. O valor da causa é elevado, e conseqüentemente as custas, que a
empresa, com atividades paralisada pelo sinistro e com muitas obrigações a cumprir, não tem meios de
atender. Veja detalhes em www.padilla.adv.br/processo/assist.htm
Por outro lado, após a edição da Constituição Federal de 1988, houve confusão entre dois institutos,
da gratuidade da justiça e da isenção de custas. Processos onde a dispensa das custas vinha sendo
desfrutada foram convertidos em diligência exigindo dos beneficiários comprovar estado de pobreza
acenando com o art. 5º - LXXIV, da Constituição Federal que teria revogado normas legais do art.4º, da
Lei Federal 1.060/50, com redação da Lei Federal n. 7.510/86, segundo o qual basta declaração da parte,
Página 167 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

As reclamatórias trabalhistas surgem como processo no


Poder Executivo, sob a égide do Ministério do Trabalho, para resolver
as questões trabalhistas de maneira célere e sem custos para o
empregado. Com o passar do tempo o processo do trabalho passou à
esfera judicial com constantes evoluções, embora ainda conserve
resquícios da origem não judicial e simplificada, como a não previsão
de recurso contra decisões interlocutórias no processo de
conhecimento. A passagem do processo do trabalho, da esfera
administrativa para a judicial, permite antever a possibilidade de, em
alguns anos, surgir um Poder Judiciário Desportivo. Ambos
desenvolveram-se, no Brasil, sob a influência de Getúlio Vargas,
aluno da Casa de André da Rocha - cf. www.padilla.adv.br/ufrgs/

na própria petição, que se presume verdadeira. Julgamento unânime do plenário do Tribunal de Justiça do
Rio de Janeiro em 26-2-91, voto do ponderado e erudito Desembargador Barbosa Moreira, qualificou
essa intervenção como "odiosa restrigenda", asseverando ser: " ... muito surpreendente, dada a
orientação geral da nova Carta, de marcada preocupação social, a que não se conceberia ficasse
alheio tema da facilitação do acesso a Justiça (...). Bem ponderada a questão, todavia, percebe-se que,
com tornar obrigatória a prestação da assistência jurídica na hipótese de comprovação da
insuficiência de recursos, de modo algum proibiu a Constituição Federal que o legislador ordinário
fosse além e outorgasse o benefício mesmo sem prova da carência. (adv. n. 54043). O dispositivo da
magna carta que provocou toda polêmica, art. 5º-LXXIV, nasceu da tese do Professor Walter Ceneviva
aprovada no I Encontro Nacional sobre Assistência Judiciária realizado em São Paulo em setembro de
1985 (cf. Revista dos Tribunais vol. 602, pág. 286-91) e impôs ônus ao Estado e não às partes. Obriga o
Estado a assegurar aos pobres a assistência por advogados pagos pelos cofres públicos, nascendo daí a
obrigação aparelhar uma defensoria pública. Art.4º, da Lei 1.060/50, determina: “A parte gozará dos
benefícios da assistência judiciária, mediante simples afirmação, na própria petição inicial, de que não
está em condições de pagar as custas do processo e os honorários de advogado, sem prejuízo próprio
ou de sua família.” O tempo verbal é imperativo: Gozará ... mediante simples afirmação, na própria
petição inicial. Logo, inexiste possibilidade para a interpretação restritiva. O egrégio Superior Tribunal
de Justiça dirimiu a controvérsia pela 3ª Turma, em 24 de outubro de 1989, unanime, Resp 1009-SP,
Relator o Ministro Nilson Naves, confirmou a validade do art. 4º da Lei Federal n. 1.060/50, e a
presunção legal de veracidade da alegação de pobreza lançada, pelo procurador, no corpo do
requerimento forense, RSTJ v. 7, p. 414 e 415. Mas persistiu o exigir comprovação, inclusive recusando
andamento aos recursos interpostos sem pagamento de custas processuais, muito embora, por evidente, o
recurso interposto contra decisão que indefere ou revoga o benefício da Assistência Judiciária deve ter
efeito suspensivo, não só por expressa disposição legal, Lei 1.060/50, art. 17, mas por lógica: indeferido
o benefício o prejudicado recorre mas o recurso não será processado ou conhecido porque não
pode pagar as custas o que não ofende garantia constitucional de acesso aos Tribunais (art. 5º - XXXV).
TRF-1ª R. "Nenhum recurso pode ser deserto antes de examinado o pedido de Assistência
Judiciária anterior ..." (Tribunal Regional Federal 1ª R. Agravo de Instrumento n. 89.0.0617-6/DF, Rel.
Dr. Catão Alves, v. unânime de 4-12-91 Adv 53590; cf. tb. 53681). No TJRGS, o Des. Francisco José
Pellegrini adverte para “não confundir benefício de gratuidade com o de assistência judiciária” e
definiu:
Gratuidade - “É o benefício que se defere diante da afirmação da necessidade, nos termos do art.
4.º da Lei 1.060/50, e sob as penas estabelecidas no §1.º do mesmo art., o qual adverte que se presume
pobre, até prova em contrário, quem afirmar esta condição nos termos desta lei, sob pena de pagamento
até o décuplo das custas judiciais”.
Assistência Judiciária – “É o serviço prestado pelo Estado àqueles que provarem necessidade, cf.
art. 5.º, inc. LXXIV da CF, que prescreve que o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita
aos que provarem insuficiência de recursos”.
O Des. Pellegrini salienta que “se trata de pedido de gratuidade da Justiça que – por dizer com o
direito de acesso ao judiciário – é instituto nobre, que recomenda liberalidade no seu deferimento”.
(70000282814) fonte: ESPAÇO VITAL por Marco Antonio Birnfeld, Jornal do Comércio, 10 a 12 de
dezembro de 1999, pág. 27, também disponível via Internet: http://www.espacovital.com.br
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 168

Antes da Constituição Federal de 1988, os entes da


administração pública direta e indireta da União, dos Municípios, do
Distrito Federal, e dos Estados, assim como os de direito público externo,
não respondiam as questões trabalhistas perante os Juízes e Tribunais do
Trabalho (art. 114 da C.F.), e sim perante juízes federais ou estaduais.

47. Do novo ramo do Direito:


Após a Constituição Federal de 1988, e com Márcio Braga ocupando
cargo com prerrogativas de Ministro de Estado do Desporte, acordo de lideranças no Congresso editou a Lei
Federal 8.672/93, de 6 de julho de 1993, chamada Lei Zico, instituindo
normas gerais sobre Desportos. Em seu art.66 tratava de manter em
vigor os Códigos Disciplinares Desportivos em vigor. Poucos anos
depois, foi substituída pela Lei Pelé, Lei Federal n° 9.615/98, de 24 de março
de 1998, ainda em vigor, após duas dezenas de leis e medidas provisórias,
com centenas de modificações. Para os contornos da Justiça Desportiva
examine informações completas em www.padilla.adv.br/desportivo. Cada
desporto tem características distintas, regras próprias, inclusive de
disciplina. O que é indisciplina em um desporto, pode não o ser em outro. A
Página 169 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

diversidade envolvida, as peculiaridades, o Sistema Olímpico e Para-


Olímpico: www.padilla.adv.br/desportivo/aneis. Há um sistema de Justiça
Desportiva com duplo grau de jurisdição vinculado à federação estadual e à
Confederação nacional de cada modalidade: o julgamento inicia na Comissão
Disciplinar Estadual e cabe recurso ao TJD Tribunal de Justiça Desportiva
(estadual). Nas competições nacionais ou interestaduais, a primeira decisão é
da Comissão Disciplinar Federal e o recurso ao STJD Superior Tribunal de
Justiça Desportiva.

A Medida Provisória nº 2.193-6, de 23.8.2001 estendia às Ligas


Desportivas a faculdade de constituir seus próprios órgãos judicantes
desportivos, com atuação restrita às suas competições.

Art. 52. da Lei Federal n° 9.615/98 com texto em vigor após


diversas modificações, prevê que os órgãos integrantes da Justiça Desportiva
são autônomos e independentes das entidades de administração do desporto
de cada sistema,345 compondo-se do Superior Tribunal de Justiça Desportiva,
funcionando junto às entidades nacionais de administração do desporto; com
competência para processar e julgar as questões previstas nos Códigos de
Justiça Desportiva, sempre assegurada a ampla defesa e o contraditório.

Até 2003, havia dois Códigos Disciplinares conjugando qualidades


dos processos civil e penal, com regras destinadas a preservar a observância
dos princípios gerais de direito processual:

“Entre as semelhanças do Processo Desportivo e Processo Civil: podemos apontar que


quando o Código não fixa prazo para a prática de algum ato, esse prazo será de 5 dias (igual ao
art.185, do CPC). Na avaliação da imparcialidade das testemunhas utilizam-se regras do CPC.
O novo Código Desportivo amplia as semelhanças. Entre as difere nças: O não comparecimento
do acusado ao julgamento não acarreta a presunção de veracidade que ocorreria no processo
civil. Mas presume-se verdadeiro, até prova em contrário, que a arbitragem colocou na
Súmula, exceto quando se tratar de julgamento da conduta de árbitro ou auxiliar. Nos
Processos Penal e Civil comum testemunhas devem ser arroladas previamente (mínimo de 10
dias) para que a parte contrária possa investigar quem são essas pessoas para argüir sua
suspeição. O Processo Disciplinar Desportivo assemelha-se ao Processo Trabalhista e ao do
Juizado especial e as testemunhas podem ser indicadas e apresentadas na hora do
julgamento. Por isto, ao iniciar a sessão, o Presidente indaga as partes se tem provas a
produzir. Ouve-se o Relator sobre a pertinência das provas solicitadas, e o Tribunal decide se
defere ou não. Em caso positivo, as testemunhas são inquiridas pelos Auditores e pelo
Presidente a pedido das partes e da Procuradoria. Depois colhe-se a prova fonográfica ou de
vídeo, e por fim é apresentado o relatório. Para produzir a prova fonográfica a parte deve
requerer com 24 horas de antecedência para que o equipamento esteja preparado. Finda a

345
Embora autônomos e independentes das entidades administrativas (Confederações e Federações)
são estas obrigadas por lei a oferecer ao Tribunal toda estrutura material necessária ao seu
funcionamento.
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 170

instrução, o Presidente do TJD concede a palavra, por dez minutos para sustentação oral,
primeiro à Procuradoria e depois a cada uma das partes. Segundo o Estatuto da OAB de 1994,
esse tempo deve ser de 15 minutos quando o defensor for advogado. Quando duas ou mais
partes são representadas pelo mesmo defensor prazo será de 20 minutos. Diferentemente dos
processos comuns, o Código Disciplinar admite a prorrogação desses prazos "em casos
especiais" ao arbítrio do Presidente do Tribunal. Encerrados os debates, o Presidente indaga
se os Auditores estão em condições de votar. O Relator prestará esclarecimentos solicitados
pelos Auditores. Diligências que não puderem ser imediatamente cumpridas, quando deferidas
pelo Tribunal, adiarão o julgamento para a próxima sessão que acontece na semana seguinte.
O primeiro a votar é o Relator, seguido do Vice-Presidente, e dos demais Auditores em ordem
de antigüidade. Após o voto do Relator qualquer Auditor pode pedir vista, reiniciando o
julgamento na sessão seguinte mesmo que mais de um Auditor solicite vista. Quando dois ou
mais Auditores requerem vista dos autos, o prazo é comum. Em caso de empate no
julgamento, ao Presidente é atribuído o voto de qualidade, salvo na imposição de pena
disciplinar quando prevalecerão os votos mais favoráveis, a semelhança do Processo Penal
comum.” 346

Em 2003 foram substituídos por um Código Disciplinar único,


reformulado em 2006 e 2009, disponível, com comentários, em
www.padilla.adv.br/desportivo/codigo
Para diferenciar seus membros dos Juízes dos vários ramos do
Poder Judiciário, a Justiça Desportiva dá ao seu julgador o título de auditor.
Embora não sejam órgãos governamentais, conforme Art. 54, “O membro do
Tribunal de Justiça Desportiva exerce função considerada de relevante
interesse público e, sendo servidor público, terá abonadas suas faltas,
computando-se como de efetivo exercício a participação nas respectivas
sessões.
Para atender ao princípio da liberdade positiva (art. 5º-II, CF), e
sendo os Códigos Desportivos normas ao nível de Portaria Ministerial, não
poderiam impor restrição de direitos, que precisam estar previstas em lei.
Assim, a Lei determina as penas:
Lei Pelé Art. 50. A organização, o funcionamento e as atribuições da Justiça Desportiva, limitadas ao
processo e julgamento das infrações disciplinares e às competições desportivas, serão definidas em
códigos desportivos, facultando-se às ligas constituir seus próprios órgãos judicantes desportivos, com
atuação restrita às suas competições. (Redação da Lei nº 10.672, de 2003)
§ 1º As transgressões relativas à disciplina e às competições desportivas sujeitam o infrator a:
I - advertência;
II - eliminação;
III - exclusão de campeonato ou torneio;
IV - indenização;

346
O Código Brasileiro Disciplinar de Futebol, com 347 artigos, aprovado pela Portaria nº 702/81,
de 17 de dezembro de 1981, do Ministro de Estado da Educação e Cultura, atendendo proposta do
Conselho Nacional de Desportos, conforme inc. III, do art. 42, da Lei 6.251/75, e art. 63, do Decreto
80.228/77, foi publicado no Diário Oficial da União de 23/12/81, nas págs. 24.623 a 24.643, e
reproduzido na Lex de 1981, págs. 2.314 a 2.352, serviu de padrão aos desportistas profissionalizados.
Posteriormente, Portaria nº 629/86, de 2 de setembro de 1986, o Ministro de Estado da Educação e
Cultura, atendendo proposta do Conselho Nacional de Desportos, conforme inc.III, do art. 42, da Lei
6.251/75, e art. 63, do Decreto 80.228/77, aprovou outro Código com 310 artigos, publicado no Diário
Oficial da União de 3/9/86, nas págs. 13.198 a 13.209, e reproduzido na Lex de 1986, págs. 1.848 a
1.892. Esse, o Código Brasileiro de Justiça e Disciplina Desportiva serviu de padrão para todos
desportos não profissionais, inclusive o universitário (Códigos Disciplinares; Jornal do Comércio de
Porto Alegre, segunda-feira, 13-12-1993 p.14 Segundo Caderno; Revista de Processo, RT São Paulo,
abril-junho de 1994 a . 19, v. 74, p.175-178; Revista Trabalho e Processo, ed Saraiva, v.1 junho 1994, p.
89-83; Adv-Advocacia Dinâmica, COAD, Boletim Informativo Semanal nº4/94, 30-1-1994, p. 44-42;
Nossos Tribunais, COAD nº 4/94, 30-1-1994, p. 71-69.
Página 171 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

V - interdição de praça de desportos;


VI - multa;
VII - perda do mando do campo;
VIII - perda de pontos;
IX - perda de renda;
X - suspensão por partida;
XI - suspensão por prazo.
§ 2º As penas disciplinares não serão aplicadas aos menores de quatorze anos.
§ 3º As penas pecuniárias não serão aplicadas a atletas não-profissionais.
§ 4º Compete às entidades de administração do desporto promover o custeio do funcionamento dos
órgãos da Justiça Desportiva que funcionem junto a si. (Incluído pela Lei nº 9.981, de 2000)

A Lei Pelé – apesar de mais de vinte vezes alterada por leis e


medidas provisórias, persiste imprecisa. Os políticos que editam a norma e
suas alterações simplesmente ignoram os Princípios de Direito Desportivo,
(cf. TGDD – Teoria Geral do Direito Desportivo). O processo disciplinar
desportivo sofreu similares problemas347 até que, a partir de 2003, passou a
ser revisto, com a participação de especialistas, a cada três anos.
A Carta de 1988 confere status constitucional a esse ramo
emergente da ciência jurídica, reconhecendo autonomia ao Sistema
Desportivo e a competência de seus Tribunais:
Constituição Federal, art. 217: É dever do Estado fomentar práticas desportivas
formais e não-formais, como direito de cada um, observados:
I - a autonomia das entidades desportivas dirigentes e associações, quanto a sua
organização e funcionamento;
II - a destinação de recursos públicos para a promoção prioritária do desporto
educacional e, em casos específicos, para a do desporto de alto rendimento;
III - o tratamento diferenciado para o desporto profissional e o não- profissional;
IV - a proteção e o incentivo às manifestações desportivas de criação nacional.
§ 1º - O Poder Judiciário só admitirá ações relativas à disciplina e às competições
desportivas após esgotarem-se as instâncias da justiça desportiva, regulada em lei.
§ 2º - A justiça desportiva terá o prazo máximo de sessenta dias, contados da
instauração do processo, para proferir decisão final. (grifamos)

Tecnicamente, a Justiça comum só poderá, depois, examinar a


legalidade do procedimento da Justiça Desportiva. Pode anulá-lo, se violadas

347
As penas disciplinares aplicadas na Justiça Desportiva tiveram o seu regramento no Decreto
Federal nº 2.574, de 29 de abril de 1998, cujo art. 53 § 4º excluía de penas pecuniárias também os atletas
“semiprofissionais” – que recebem valores, patrocínios e ajudas, contudo, sem contrato de trabalho. O §
5º do mesmo art. 53 assegura que penas pecuniárias e de suspensão por partida ou prazo não podem ser
aplicadas cumulativamente. O art. 61, § 6º, do Decreto nº 2.574/98, ampliou os casos em que o recurso
contra decisão da Comissão Disciplinar terá efeito suspensivo – A Lei prevê a suspensão para casos de
penalidade que exceder de duas partidas consecutivas, ou quinze dias. O Decreto manda aplicar aos
casos de penas pecuniárias de valor superior a R$ 120,00. O dispositivo mais polêmico do Decreto era o
§ 6º do art. 53 obrigando converter em pena pecuniária toda pena de suspensão por tempo superior o
prazo de vinte e nove dias aplicada a atleta profissional. Ou seja, se o caso prevê suspensão por 180
dias, o atleta profissional será suspenso por 29 dias, e multado pelo tempo restante. Para os críticos, esse
dispositivo obrigando a converter em multa a pena de suspensão é benéfico aos clubes, evitando que o
jogador, funcionário, seja impedido de trabalhar. Gerou certa “aura” de impunidade. Devido aos
salários relativamente elevados que recebem certos jogadores, penas pecuniárias aplicadas com
moderação não surtem qualquer efeito disciplinar porque não serão sentidas pelo infrator.
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 172

garantias, como as relacionadas aos princípios gerais de direito processual, os


quais devem ser observados em todos ramos processuais.
Considerando-se que a Constituição Federal atribuiu competência
exclusiva aos Tribunais da Justiça Desportiva o exame vedando ao Poder
Judiciário examinar sem que sejam esgotadas as vias desportivas, se não
forem interpostos, dentro do prazo, todos os recursos previstos na Justiça
Desportiva, não caberá o exame da questão pelo Poder Judiciário. Com a
inovação introduzida em 2009, passa a ser admissível o recurso de embargos
de declaração na Justiça Desportiva, que devem ser interpostos -
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49. Princípio da sucumbência:


A sucumbência é um dos princípios gerais de direito processual
segundo o qual o vencido deve arcar com a despesa que provocou sua
resistência, e está previsto nos art. 19 e 20 do CPC. A vitória - na Justiça - não
pode representar uma redução patrimonial para o vencedor. Aliás, nem
poderia ser diferente, à luz do disposto na Constituição Federal:
Art. 1º - A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do
Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
I - a soberania;
II - a cidadania;
III - a dignidade da pessoa humana;
IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
V - o pluralismo político.
Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente,
nos termos desta Constituição.
Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;
II - garantir o desenvolvimento nacional;
III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;
IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer
outras formas de discriminação.
Página 173 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

O princípio da sucumbência não era conhecido pelos romanos nos


primórdios do direito. Para os cidadãos romanos o direito era quase que
uma diversão. Ainda não eram conhecidos os princípios elementares de
direito natural como aquele que veda o empobrecimento sem causa.
Honorários advocatícios vêm de honorarium, tributo à honra. Não havia
pagamento pelo trabalho dos
causídicos, mas sim uma Há décadas pesquisando o funcionamento da
homenagem do vencedor ao Justiça, incorporamos a abordagem
transdisciplinar, acrescentando a perspectiva
tribuno que, normalmente, era humana ao formular uma interdisciplinar Teoria
um rico cidadão romano que Geral dos Processos.
A acultura da superficialidade tem
não dependia dessas honrarias
inviabilizado o funcionamento do sistema jurídico,
para viver (cf. Luiz R.N. Padilla, com falsas crenças e valores invertidos. Ilustram
isso a não aplicação de dois importantes princípios
Jornal do Comércio de 21/6/93, Segundo
processuais, a Sucumbência e a Lealdade
Caderno, pág.12).
Disso resultou a encenação jurisdicional,
na qual a acultura da superficialidade admite
Os tribunais qualquer pretexto para não julgar. Acreditando
modernos reconheceram a em sofismas, fixam honorários aviltantes. O
importância da correta fixação cotidiano forense transformou-se em um
pirandeliano, cosi e, se vi pare, que diz o que
da verba honorária. Exceto na
quer que pareça, sem se preocupar com a
Antiga Roma, onde os realidade e, muito menos, com as conseqüências:
advogados viviam – e o faziam
"J`ai voulu voir jusqu`oú allait la bêtise
regiamente – das honrarias humaine: elle est sans limites" (André
prestadas pelos vencedores, Maurois, Letter Ouverte a um Jeune Homme, Paris, ed.
daí a denominação de verba 1966, p. 38)
honorária, do latino "A estultice tem uma real e efetiva
honorarius, impor ao vencido importância no agir humano. Talvez seja por isso
a remuneração do patrono que o poeta Schiller escreveu, há dois séculos,
vencedor, decorre de princípio que ‘Contra a estupidez os próprios deuses
elementar de Direito Natural, lutam inutilmente’. Apesar de tudo, para
mim, na minha visão de professor de Direito, não
pelo qual o que dá causa ás
é demais ainda confiar na inteligência humana,
despesas deve com elas arcar. que um dia acabará prevalecendo.” (Paulo
Transporto tal princípio para Pasquilini
as conseqüências da sucumbência, resulta na cominação do vencido pagar
o advogado do vencedor. A sucumbência significa que o vencido deu causa
à necessidade do vencedor contratar advogado para postular em juízo seu
direito.

A fixação de uma justa remuneração – ainda que em quantum


superior ao valor da causa, sendo corolário de justa e indispensável
provocação do Judiciário, em decorrência de ato ou omissão daquele que é
condenado, não só é possível, como recomendável à luz da boa razão:
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 174

Primeiro, porque o sucumbente, não podendo alegar


desconhecimento da lei (LINDB, antiga LICC, art. 3º) – mesmo porque
poderia valer-se dos conselhos de um advogado – ao motivar a necessidade
do socorro ao Judiciário, assume o risco de ver-se penalizado, pagando todo
trabalho de casa.

Segundo, porque não fazê-lo seria penalizar, ao invés do


infrator, os justos: ou o advogado ou seu cliente: um dos dois vai ter que
abrir mão de uma fatia do que é seu para pagar o custo do trabalho
efetuado pelo advogado, ou o próprio advogado não recebendo adequada
remuneração, ou o cliente, tirando de seu bolso para pagar seu patrono.
Equivale dizer: empobrecimento injustificado, de um ou de outro –o que viola
o art. 5º LIV, da Constituição Federal.

Terceiro, porque à sociedade interessa penalizar quem comete


ilícito civil, porque tais ilícitos são danosos à vida social. Válida a máxima
de Beccaria também em matéria cível: somente a punição dos infratores –
servindo de exemplo -reprime a má conduta. Ademais, em lapidar frase em
meio ao discurso proferido quando da polêmica do caso Eichmann,
manifestou-se o então Governador da Guanabara: “... A impunidade dos
maus gera a audácia dos maus”.
Frisou Giuseppe Chiovenda, na abertura do clássico:
"1. - La massima che il vinto debba incondizionatamente pagar le spese di
lite al vincitore, appartiene all'ltima fase del dirito romano." (Giuseppe Chiovenda, in La
condanna nelle spese giudiziali, 2ª ed., 1935, pág. 1).

O direito evoluiu, juntamente com a sociedade, aproximando-se do


conceito de Justiça, para albergar o princípio de direito natural que veda o
empobrecimento sem causa e, como corolário, nasceu o princípio do
sucumbimento, pelo qual o vencido deve pagar ao vencedor todas despesas,
inclusive os honorários advocatícios. Mas isto demorou bastante no processo
brasileiro. A lei substantiva brasileira em vigor até 2003, o Código Civil de
1919, previa no art. 1.290, parágrafo único, que o mandato outorgado a
advogado é contrato oneroso. Nosso legislador processual andava atrasado.
Somente passados mais de dez lustros, com a Lei 4.632, de 18 de maio de
1965, alterando o art. 64 do CPC de 1939, é que o princípio da sucumbência
foi albergado em nosso ordenamento.

Tratando-se de um atributo à honra, inconcebível sejam arbitrados


em quantia insignificante. Contudo, é comum depararmo-nos com honorários
advocatícios aviltantes. Seria cômico, não fosse trágico, o “aumento” de R$
6,00 para R$ 300,00 dos honorários de sucumbência na AC 70025886409
Página 175 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

TJRGS. Desde a década de oitenta denunciamos isso como um grave


problema:

O aviltamento dos honorários é uma das principais causas


do aumento de quantidade das demandas. Sempre pesquisando, e
procurando entender a situação, a debatemos em centenas de trabalhos, do
qual é exemplo o publicado na Revista de Processo v. 55, em 1989. Ali,
combatíamos a fixação de sucumbências pequenas invocando o § 4º, do art.
20, do CPC:
“... é danosa à Justiça porque, no acompanhamento da causa, obviamente
o advogado despende muito. No mais das vezes, o valor fixado não reembolsaria sequer o
material que gastou no processo, a energia, a conexão de Internet, os papéis, a tinta, a
depreciação de equipamento, as cópias, etc., etc., etc...
Não pagaria nem o custo dos deslocamentos ao Foro...
Mesmo que os advogados fossem a pé para não gastar combustível,
estacionamento, etc., teriam despendido, em solados de sapato, valores superiores aos dos
“honorários” arbitrados.”348

A verba honorária deve ter justa fixação para evitar


empobrecimento injustificado.
Atento a estes aspectos, o legislador criou a possibilidade pela
expressa autorização à fixação por equidade, de adequar-se a verba
honorária ao trabalho desenvolvido.

Sábio foi o legislador: evitando deixar as causas de pequeno


valor sem patrocínio (por força do prejuízo que representariam ao
profissional em vista dos custos da atividade), e especialmente evitando o
patrocínio infiel, pior que patrocínio nenhum; enfim, objetivando estancar a
nefasta proliferação de maus profissionais no campo do Direito, cuja
afinidade com a Justiça exige justamente o contrário...

Foi cuidadoso o legislador ao inserir, no diploma processual


civil, dispositivo permitindo a fixação dos honorários mediante aplicação
eqüitativa – CPC art. 20 § 4º.
O que vem a ser “equidade”?

“Equidade”, derivado do latim aequitas, de aequus (igual,


eqüitativo), era antigamente confundida com “Justiça”. Modernamente,
distingue-se dessa, e “se funda na circunstância especial de cada caso
concreto, concernente ao que for justo e razoável” (De Plácido e Silva,
Vocabulário Jurídico).
A equidade portanto, distingue-se da Justiça, da qual é
instrumento.
Adiante, De Plácido e Silva acrescenta: “... quando a lei se mostrar

348 Revista de Processo v.55, em 1989.


TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 176

injusta, o que se poderá admitir, a equidade virá corrigir seu rigor, aplicando o princípio que nos vem do
Direito Natural, em face da verdade sabida ou da razão absoluta. Objetive-se, pois no principio que modera ou
modifica a aplicação da lei, quando se evidencia o excessivo rigor, o que seria injusto” (ob. e loc. cits.).
Finalizando: “ O Código de Processo Penal nacional institui o
princípio de que o juiz, quando autorizado a decidir por equidade, aplicará a
norma que estabeleceria se fosse legislador” (ibidem).

O art. 125, III, do CPC, reprime os atos contrários à dignidade


da Justiça. Os honorários são aviltantes quando calculados sobre causas de
pequena expressão econômica em razão das regras que informam os critérios
de fixação do valor da causa, ou de artimanhas do devedor que faz demorar
processo de execução com ocultamento, etc...

Exemplo de processo onde o autor atribui valor ínfimo à ação para


reduzir os efeitos da derrota e economizar nas custas é o pedido de
indenização que tramitou na 4ª Vara da Fazenda Pública da Capital Gaúcha, 2º Juizado de Direito,
processo 01191282825 movido pela Sucessão de Augusto Gomes Gueiral, a João José Pereira Moreira e
outros. O processo chegou ao Tribunal de Justiça na AC 598367050, Rel. Desª
Marilene Bolzanini Bernardi - votação unânime de 27 de outubro de 1999 com
Des. Décio Antônio Erpen e João Pedro Freire, negou provimento ao apelo do
autor, e deu provimento ao recurso do réu para elevar a verba honorária a 60
URHS. Fundamentou a ilustre Relatora:
“o valor da causa, consoante pude constatar por consulta à Contadoria,
corresponde, na realidade, a apenas 50 URCs, ou seja, ao valor de alçada, de molde que,
ainda que fixados honorários em 20%, o montante final girará em torno de R$ 80. E esse
valor é ínfimo, não remunerando condignamente o trabalho desenvolvido não encontrando
eco em quaisquer dos parâmetros estabelecidos pelo art. 20, §§ 3º e 4º, do CPC, pelo que
se impôe sua majoração, atendido ao zelo desenvolvido e trabalho prestado em feito que se
arrasta por vários anos.”
O arbitramento percentual em causas pequenas e trabalhosas
nega vigência ao § 4º, do art. 20, do CPC: A Lei afasta o critério percentual
e manda usar a eqüidade.
“a autorização de ‘apreciação equitativa’ significa liberdade [pôr
isso não se aplica o § 3º] e não modicidade”

Se o legislador desejasse “modicidade” não estabeleceria equidade


como critério no parágrafo quarto. Para a modicidade - já bastam os limites
de 10% a 20% do parágrafo anterior... Se a causa é módica, muito mais
módicos serão 10% a 20% de seu valor.

Módicos e aviltantes, constituindo motivo de indignidade para o


profissional do direito que trata com questão séria como a Justiça...

Interpretando o dispositivo legal em comento, o quarto


parágrafo do art. 20 do CPC, assinala Antônio Cláudio da Costa
Machado, no CPC Interpretado (ed. Saraiva) que “a autorização de ‘apreciação
Página 177 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

equitativa’ significa liberdade e não modicidade”. Se o legislador


desejasse “modicidade” não estabeleceria no § 4º equidade como critério,
porque para modicidade já bastariam os limites de 10% a 20% do parágrafo
anterior... Se a causa é módica, muito mais módico será 10% a 20% de seu
valor. Módicos e aviltantes, constituindo motivo de indignidade para o
profissional do direito que trata com questão tão séria quanto o é a Justiça...

Da distrazzione:

O advento do Estatuto da OAB de 1994 alterou a natureza jurídica


dos honorários de sucumbência. Até então nosso ordenamento adotava a
distrazzione de forma híbrida como demonstrou Yussef Cahali no clássico
sobre honorários, dedicando capítulo destacado ao tema. Exatamente nesse
sentido a decisão unânime do 1º Grupo de Câmaras Cíveis do Tribunal de
Justiça do RJ, nos embargos infringentes 190/86, encartados na Revista dos Tribunais 627, pág.184/185:
"4. A controvérsia reside em que o v.Acórdão embargado não conheceu da
apelação porque interposta em nome do próprio advogado, entendendo faltar
legitimidade a este para recorrer da decisão...
"Assim decidem... ser inegável a legitimidade do advogado para recorrer, em seu
próprio nome, da decisão que, desprezando a impugnação feita ao cálculo de seus
honorários, o homologou.
"É que constitui direito autônomo do advogado, ut art. 99, e § 1º, da Lei 4.215/63,
com a redação que lhe foi dada pelo art. 2º da Lei 7.346/85, o crédito oriundo da
sucumbência, previsto no art. 20 da lei adjetiva civil, o qual poderá ser executado nos
próprios autos da ação, embutindo-se a ação de cobrança dos honorários naquela em
que foi proferida a sentença objeto da liquidação.

Na Revista Brasileira de Direito Processual , cuja continuidade


comprometeu a ausência do saudoso professor Edson Gonçalves Prata,
reproduzidas em Acórdãos como o da RJTAMG vol. 24, pág. 248/253:
"SAID CAHALI examinou, de modo exaustivo, a figura dos honorários e anotou que
"mais recentemente nossos tribunais tem ressaltado que o parágrafo primeiro do art. 99
dos Estatutos da Ordem continua em pleno vigor não o tendo revogado o novo CPC.
Daí a legitimidade ad causam do advogado para a cobrança, valendo-se da sentença
condenatória proferida em favor de seu cliente, como título executivo judicial (CPC,
584, I), visando ao recebimento da parcela relativa a honorários".

Vale dizer que, até 1994, havia um sistema híbrido: A


sucumbência processual não era em favor do advogado. Contudo, também não
era uma indenização da parte contratante porque havia possibilidade de sub-
rogação do advogado (art. 99, § 1º, Lei 4.215/63) em alguns casos, como quando havia
contrato de honorários assim dispondo. A partir da Lei 8.906/94, art. 23,
constitui direito autônomo do advogado a execução da sucumbência, que
passa a ser uma de bonificação ao advogado vencedor. Isto é: Instituiu a
distrazzione ex lege.
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 178

A distrazzione ex lege é mais um forte motivo para que os


honorários não sejam aviltantes, porque ofendem o advogado, a quem
pertencem. Os §§ 3º e 4º, do art. 20, do CPC, determinam os critérios de
aplicação, sendo a equidade na fixação o patamar mínimo. A equidade é
buscar o justo, o razoável. Por mais boa vontade que se possa ter com os
devedores, nada há de razoável em honorários em quantias que não
reembolsam sequer o custo do deslocamento ao Foro...

Dos critérios objetivos para fixação:

Embora, como se viu, a previsão legal de arbitramento dos


honorários por equidade, tem-se observado indisfarçável relutância em
aplicar aquela regra. Furtam-se os juizes da aplicação, sustentando alegada
falta de critérios objetivos para tal fixação eqüitativa.
Tal argumento, data vênia, não procede, pois a dúvida (“Que
norma seria justa estabelecer na espécie e nas assemelhadas? “Que norma o julgador cria
para o caso concreto?”) não resiste a cinco minutos de ponderação.
Para tanto, basta que se tenha em mente a notória paridade
entre advogados e juizes:
“Os advogados são a sustentação da força e grandeza do Poder
Judiciário. Sem eles, o Judiciário não atuaria: acéfala, a Justiça não seria distribuído.
Se o Judiciário é um organismo vivo, necessário à oxigênio da ordem e paz sociais, os
advogados são-lhe a seiva vitalizadora, lhes garantindo e sustentando a existência e
sobrevivência.”
A advocacia sempre foi e será o único veículo capaz de acionar
a Justiça na direção de seu ideal de paz social.
E o Estatuto da OAB é a cristalização da íntima solidariedade
funcional entre juízes e advogados em prol da Justiça: aflige e perturba
ambos quando qualquer um deles é atingido; ambos sustentam e garantem,
inseparáveis, a Justiça, combinando esforços no objetivo comum. Ao
contrário do que pintam prevenções insolentes, não é o advogado a figura
parcial, facciosa, perturbadora da solenidade e magnificência da
Magistratura. Ele é sim, parte da própria Justiça, justaposta, como seu ex
adverso na estrutura do contraditório processual, como condição essencial
à aplicação da lei e prevalência do direito. O advogado, portanto, não é
auxiliar da Justiça. Ele é um órgão da Justiça (adaptado do texto
“Institucionalização da advocacia”, da lavra do Dr. Elias Farah, pres. da 93ª Subseção da
OAB-SP, colhido no Informativo Semanal 20/88, p. 211 COAD). E por ser o advogado
um órgão da Justiça – ora consagrado no art. 133 da CF promulgada em
5.10.88, que há mais de 25 anos, já em 1963, ao editar o Estatuto da OAB,
Lei 4.215, de 27.4.63, cuidou o legislador de inserir regra de paridade entre
Página 179 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

advogados e juízes, no art. 69.

“Art. 69. Entre os juízes de qualquer instância e os advogados não há


hierarquia nem subordinação, devendo-se todos consideração e respeito recíprocos”.

Nem poderia ser diferente. Afinal de contas, juízes e advogados


fraternizam a vida inteira;

Na mesma Faculdade, escutando os mesmo mestres, abeberam-


se das mesmas fontes doutrinárias.

Em coro, proferiram o mesmo juramento de exercer o grau sem


deserdar jamais a causa da humanidade.

Verdade que, enquanto o advogado opta pela militância em


favor do direito ferido, o magistrado assume a dramática responsabilidade
de julgar.
Nos umbrais, porém da Magistratura, estão os advogados a
julgar os juízes, por exigência da própria Constituição, como integrantes da
banca examinadora.
E quando da aposentadoria, é entre as fileiras de advogados
que os magistrados vão encontrar orgulhosa acolhida.
Na inspirada observação de Calamandrei, “juiz e advogado são
como espelhos: cada um deles olhando para o interlocutor, reconhece e saúda, reflete em si
mesmo a própria dignidade” (apud Rui de Azevedo Sodré, in O Advogado, seu Estatuto e a Ética
Profissional, São Paulo, Ed RT, 1967, p. 358; colhido e adaptado de discurso do Dr. Justino
Vasconcelos, proferido no TJRS, em 4-3-1974).

Durante paralisação dos magistrados gaúchos, ao final de 1987,


todos ficaram sabendo do achatamento vencimental.349

Ora, se os magistrados fazem greve, paralisando a Justiça,


pretendendo recuperar o poder aquisitivo a um patamar justo, isso também
serve de referência para remunerar dignamente o advogado, por equidade
porque o texto constitucional, em seu art. 135, declarando o advogado
indispensável à administração da Justiça. Antes de invocar o art. 39 §1º, da
isonomia de vencimentos, saliente-se a diferença marcante entre as duas
funções indispensáveis à Justiça: O advogado arca com o custo do
escritório, uma despesa que ninguém ignora; ao contrário, o magistrado
não está sujeita a custo algum da escrivania judicial.

349 Ivo Gabriel da Cunha, Presidente da AJURIS, no jornal Correio do Povo, 9-12-1987, p.
13, registrou que a remuneração dos magistrados. Em janeiro de 1986, um juiz de direito em
início de carreira recebia o equivalente a 322 OTN mensais, e que aquele seria um patamar justo
para remuneração dos juízes em início de carreira. Motivava a greve, que em decorrência da
inflação, a remuneração dos juízes sofreu uns achatamentos. Embora o movimento grevista não
tenha posto fim ao achatamento inflacionário, minorou seus efeitos.
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 180

Outra diferença, o magistrado desfruta de dois meses de férias


remuneradas. Para satisfazer a necessidade de descanso, pelo gozo anula
de férias, nas quais as despesas de escritório em sua maior parte se
mantêm, o profissional liberal é compelido a fazer uma poupança mensal
de, no mínimo, 1/11 do que necessitará gastar nas férias.

Desta forma, valorizando o trabalho do advogado, como


condição de sua dignidade humana (CF de 1967, art. 160, II e Carta promulgada em
5.10.88, art. 170, caput, 193, caput, art. 1º III e IV, e art. 3º I e III) será necessário que a
fixação dos honorários advocatícios por apreciação equitativa seja condigna
para, proporcionalmente ao “...o tempo exigido para seu serviço” medido em
horas despendidas (CPC, art. 20 § 3º “c”, in fine) basta – partindo do
pressuposto de que o advogado seja um super-homem, jamais adoece e
trabalhe seis dias por semana, ou 25 dias por mês; e mentalizando oito
horas de efetivo trabalho, já que a Medicina demonstra que as horas que
daí excedem não são produtivas, chegar-se-á a seguinte fórmula: 25 dias de
trabalho x 8 horas = 200 horas de trabalho mensais. Logo, valor inferior a
R$ 120,00 por hora, com devida vênia, será aviltante.
Demonstrado o critério objetivo, basta observar o trabalho
desenvolvido, e, se o tempo do advogado não estiver indicado, o estimar e,
por simples multiplicação, encontrar o valor mínimo. Sempre que a fixação
percentual revelar valor inferior ao encontrado pela operação alinhada,
esta fixação percentual deverá ser rejeitada, por impor ao advogado um
empobrecimento injustificado.
O advogado, que não é “auxiliar”; Desempenha função essencial
à Justiça, contudo, encontra dificuldades para obter uma adequada
remuneração pelo seu trabalho. Muitas vezes requerendo, fundamentando
sua pretensão, o faz para ouvidos moucos, insensíveis à justa reivindicação.
Nos honorários periciais, tanto na Justiça Comum, quanto na do trabalho,
os experts, “auxiliares” da Justiça, recebem uma contraprestação média de
5 salários mínimos por uma dezena de horas de trabalho mediante simples
solicitação desacompanhada de qualquer fundamentação.
Página 181 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

Da vantagem para a Justiça:

Sucumbências pesando nos perdedores provocaria, rapidamente, a


redução da quantidade de demandas: Basta que o devedor saiba que não
cumprindo com as suas obrigações terá que pagar o trabalho do advogado da
parte contrária – dispendioso, em valor que pode até ser superior ao da própria
discussão, especialmente quando é relativamente pequena, haverá um forte
estímulo ao cumprimento espontâneo das obrigações.

Sucumbências justas reduzirão a quantidade de demandas,


porque litigar para ganhar tempo deixará de ser financeiramente vantajoso.

Da inversão de valores:

O Poder Judiciário existe para decidir divergências sobre a


aplicação do direito. Contudo, a maior parte das demandas não possui litígios
reais. Isto é, não há efetivamente divergência. O devedor sabe que deve, só que
vai usar o Judiciário para ganhar tempo, adiar o pagamento de suas
obrigações, não raro livrando-se delas porque, em meio a tantas demandas,
algumas perdem o impulso (art. 262 CPC) e param... O pior é o mau exemplo
do Poder Público. Ele centraliza recursos, e os administra de forma hipócrita:
Sob pretexto de defender o interesse público, uma quantidade enorme de
recursos é manipulada para vantagens dos partidários. Cumprem apenas as
obrigações que querem. Leia-se: as que produzem alguma vantagem. Assim,
inescrupulosos, e sedentos de lucro, deturpam o mais sublime dos poderes
que, em meio a um dilúvio de “litígios”, enfrenta dificuldades para examinar
tudo. Com milhares de processos num gabinete, dá para examinar cada um?
Desde a invenção dos julgamentos de carreirinha, uma sessão rápida julga
centenas de processos. Toda semana. Alguém acredita que o juiz examinou
aqueles processos? Tecnicamente, é impossível ter examinado cada um. Ai, as
demandas proliferam, porque quanto mais litiga, maior o lucro com a demora.
E ainda tem a quase loteria: Com sorte, pode ganhar sem ter razão. A busca de
Justiça fica perdida no dilúvio de choradeiras. Se há solução? Reduzir as
demandas protelatórias, com mero intuito de lucro. Para isto, nada melhor que
fixar sucumbências que efetivamente remunerem o advogado. Até porque, com
boa remuneração, estaremos melhorando a qualidade dos profissionais do
direito, e aprimorando a Justiça.

Juízes que fixam honorários de R$ 5,00 ou R$ 300,oo (TJRGS AC


70025886409) não se permitiram considerar a ecologia, acima exposta. Os
"argumentos" para os valores aviltantes são sofismas:

“Se os honorários forem elevados o advogado leva vantagem”. Sofisma,


porque o advogado é obrigado a promover ações de pequeno valor para não
perder o cliente, num mercado de trabalho concorrido. O custo do
acompanhamento de uma ação de valor módico é superior ao valor que o
cliente postula, como demonstramos no trabalho publicado na Revista de
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 182

Processo (RePro 55/197-203). O valor baixo estimula a inadimplência, que


aumenta a quantidade de demandas.

“É injusto condenar o vencido em valores elevados.” Sofisma: O vencido


deu causa ao ajuizamento. A culpa é do vencido. E quem tem a culpa para,
conforme princípio de direito. Como honorários aviltantes, quem termina
pagando é o advogado. Ou será que o juiz quer PUNIR o advogado por tê-lo
incomodado com uma questão de pequena monta? Importante conhecer
melhor o princípio da sucumbência: CHIOVENDA, Giuseppe. La condanna nelle
spese giudiziali. Torino, 1935, 2ª ed.

“O advogado ganha em outros processos, e pode bancar o prejuízo neste.”


Sofisma: Invocar fatores extra-autos para decidir é ilegal. O que não está
nos autos não pertence á decisão, e não pode ser usado. Até porque, alguns
podem ganhar, outros não. Então o caso concreto deve ser decidido com
base na lei aplicada à fattispecie.

“Se fixar valor considerável, estarei estimulando o ajuizamento de


demandas.” Sofisma: O que estimula o ajuizamento de ações é a fixação de
pequenos valores, que tornam vantajoso litigar, ganhar tempo, pagando-se
apenas a correção e juros legais, mais um pequeno percentual de
honorários.
Quando Alfredo Buzaid idealizou o atual CPC, com a
Sucumbência idealizada por Chiovenda no final do Sec. XIX, tinha em
mente o bom funcionamento da Justiça que depende da correta aplicação
desse princípio. Mais que isto, percebendo que, em causas de pequeno
valor, o percentual resultaria em aviltamento, no § 4º do art. 20 do CPC
determina fixar em valor justo e digno o trabalho do advogado, mesmo que
a causa seja de pequeno valor. Percentual sobre quase nada é menos ainda...
Tribunal de Justiça do RGS deu provimento à apelação Cível nº
70000446518 na 12ª CC (nota 42 DJE 7-4-2000), impondo sucumbência
arbitrada em 10 salários mínimos.

O STJ acolheu a tese, e a 3ª Turma, em voto vencedor do Ministro


Eduardo Ribeiro, admitiu a fixação de honorários em quantia superior ao valor
da própria causa atualizada [o valor da causa atualizado na decisão submetida ao Resp
37.069-8/MG era de Cr$ 40.218,39 - enquanto os honorários sucumbenciais foram arbitrados em
Cr$ 50.000,00 - quantia que correspondia a 125 % do valor da causa]:
"Honorários.
"Tratando-se de causa de pequeno valor, a fixação de honorários, com obediência
aos limites estabelecidos no § 3º, do artigo 20, do CPC, poderá não remunerar o trabalho
do advogado, forçando a parte, não obstante vencedora, a arcar com o respectivo
pagamento.
"Tendo em vista o princípio de que o processo não haverá de resultar em prejuízo para
quem tenha razão, incide a regra especial do § 4º do mesmo artigo." Resp 37.069-8,

Seja qual for o valor da causa, os honorários devem ser


Página 183 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

fixados em quantia que não cause o aviltamento ou o


empobrecimento, do vencedor ou de seu advogado. Trata-se de um
princípio de ordem pública. O consciente jurista precisa
compreender a natureza aberta da norma jurídica, superando a
aporia de interpretações condicionadas por objetivos ideológicos
subjacentes. 350
Conheça a Teoria Crítica do Direito:
http://www.padilla.adv.br/teses/normas/

Para uma visão geral da Teoria


Geral dos Processos:
http://www.padilla.adv.br/processo/tgp

Para o Processo de Comunicação, instrumento do direito:


http://www.padilla.adv.br/processo/comunicacao

Para o Processode Pensamento, base da comunicação:


http://www.padilla.adv.br/processo/pensamento/

Para entender a manipulação coletiva do Processo de Pensamento;


http://www.padilla.adv.br/processo/pensamento/etica/

do Processo no Brasil, e das causas da morosidade judicial e


Breve História
corrupção política: http://www.padilla.adv.br/processo/morosidade/

Sobre a acultura da superficialidade e a encenação jurisdicional:


http://www.padilla.adv.br/processo/pensamento/superficial

Como funciona o Plano do Direito, e a manipulação de preconceitos:


http://www.padilla.adv.br/teses/normas/

Escute Eduardo Couture, um dos maiores processualistas: www.padilla.adv.br/processo/Couture.mp3

Sistema Jurídico e as Leis em “O Profeta” Gibran Khalil Gibran em primorosa tradução de Mansour Chalitta interpretado por
Tôni Luna: www.padilla.adv.br/teses/leis.mp3

Crime e do Castigo inspirada análise de Gibran Khalil Gibran em “O Profeta” primorosa tradução de Mansour Chalitta
interpretado por Tôni Luna www.padilla.adv.br/teses/crime.mp3

350Luiz Fernando Coelho, comentando nosso resumo, publicado na Revista de Direito Civil
21, da Teoria Crítica Direito, disponível em http://www.padilla.adv.br/teses/normas/
TTGP Transdisciplinar Teoria Geral do Processo 21/3/2013 è www.padilla.adv.br/processo/tgp/ Página 184

Sumário do Livro II
Teoria Geral dos Recursos e impugnações não recursais:
Espécies de Julgamento com mérito (art. 269 + 794 CPC) e sem (art.267)
O duplo grau de jurisdição (introdução)
Inconformidade, nulidades e Fungibilidade
Evolução do “transito em julgado” imediato no Direito Romano até a definição
dos modernos contornos do sistema recursal
Características e exceções
Quatro graus de jurisdição
Qualidades e Defeitos do duplo grau
Princípio da lealdade
Relação com o princípio da sucumbência
Fundamentos do direito de recorrer
Modalidades de processo
Prova – Instrução
Instrumentalidade e utilitarismo
Inspeção Judicial
Recursos em espécie + Conceito
Apelação
Agravo
Dez tipos de agravos
Necessário autenticar cópias
Embargos Infringentes
Embargos Declaratórios
Embargos Contra Despachos
Recursos Extraordinários
Recurso Especial
Recurso de Revista
Embargos de Divergência
Outros recursos
Sucedâneos Recursais
Teoria Critica do Direito
Exceção de pre-executividade
Ação monitória
Página 185 ó TTGP Transdisciplinar Teoria Geral dos Processos 2013 Luiz Roberto Nuñes Padilla

Bibliografia:
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Eletrônico. RJ, Forense, 2010. 3ª ed.
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Procedimentos cautelares específicos.
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Concretizada a visão da Teoria Geral dos Processos, no Livro II trataremos das decisões
e níveis de cognição, e dos remédios processuais, que englobam os recursos processuais e os
sucedâneos recursais è www.padilla.adv.br/ufrgs/tgp/tgr.pdf

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