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HISTORIA E MEIO AMBIENTE
6. Toma-se aqui o termo fisionomia no sentido utilizado por La Blache para se referir
às características fisicas dos lugares.
ffi
"ràr_d.o
$
Também assinala-se aqui o papel fundaÍnental desempenhado pelo 1
Ern que ordern de idéios descrever essas impressões profundas e confisos
trabalho de campo para a potencializaÇão e o desenvolvimento d.a que assalto:m o recém-chegado numa aldeia indigena cuia civilização
capacidade perceptiva do pesquisado4 bem como de sua sensibilidade. perrnarleceu relativamente intacta? [...] Diante de uma sociedade
Disso depende a argúcia das observações. corno bem sabem os ecó1ogos, aindaviva e fiel à sua tradição, o choque é tão forte que desconcerta:
nesse novelo de mil cores, que fio se deve segtir em primeiro lugar e
tentar desembaraçar?
e 1qe+p.9-s_tqntqqsHi,uTq qg{Plç4gge j
o, pSrqq1§r_d,olq!,e_"u!
igi.drguggsggja-apre-erdsl-el*ógtsqdo-qPJ§tr"o:§9sg:-T.1'.:eerÍ
rem€urescerrtes. iábe o que deve ser vislo primeiro, o que é relevq+le q *o:qgggA9, e-. Nar;
O trabalho de campo não é novidade nem nas ciências naturais üêÍAãaê;lmüãíüni ponto dê'partidá pú_-á a observaçãg é atgdi
nem nas ciências humanas. A História Natural européia praticada nos traiçoeiro, poiíã rêãfidãdd-dãõ áliãilifiê-a"i Há {uã dirigii às coisas,
seres e relações do ambiente que se investiga uma atenção flutuante,
1:çy9"1 481 " plestigio e-r.iii6itidáae'ás expedições
Y.II :tl"riu que se fixa arbitrariamente aqui e ali, por um momento. Pode-se começar
científicas. No século XVIII, Domingos Vandçti-(f 735_-1_B_^.16_), lente das
iãiããiãi' com os aspectos imediatamente mais salientes: a distribuição dos objetos,
a e e uímic a s* tffii.Íáií?ãfti ã ú.,ffêiiiããã àãô c o imb r a, a
das plantas, dos animais, o zoneamento das atividades, os fazeres das
quem coube a formação " de uma geração de naturalistas para servir ao
desenvolvimento do Império português, escreveu sobre aquilo a que os pessoas, os modos de usar os recursos disponíveis- Urn assunto leva a
naturalistas deveriam prestaÍ atenção em suas "viagens filosóficas": 1) outro e logo o pesquisador se verá discutindo tipos e características de
a análise de todas as terras e seus principais constituintes; 2) o maduro minerais, plantas e animais, conformações dos territórios, reglas sociais,
exame sobre o estado dos bosques, matas e minas; 3) o conhecimento práticas econôrnicas, normas e valores, padrões de relacionamentos
dos metais e dos minerais; 4) o conhecimento de todas as plantas e seus interpessoais e outras facetas mais abstratas dos sistemas sociais e dos
diferentes usos e; 5) a análise de todas as águas. \r'andelri enfatizou ambientes que os suportam. Com sorte, ele saberá discernir as variáveis
ainda a necessidade do conhecimento "ísico e moral dos povos,,7" Como ambientais e sociais significativas para sua pesquisa- Com criatividade,
se sabe, porque estavam mais alguma experiência e a ajuda de outros especialistas, o historiador
ambiental levará a bom termo sua experiência de campo.
- t O trabalho de campo requer a paciência para observa4 de olhar,i
€'purutõãô;os-ladõíãvançarÉádrapôf ÉêAr-4Fãi§a'§êffi ffilaisagem,í
pássaro por pássaro, flor por flor. gstu -"itt"4e*"ã
encontrada entre os üaiantes apressados do século )O(I. Sobrava, todavia,
escravista imperial -, que apenas confirmam a regra. Afinal, esta .nffi fr ilãliffi ããffi êüiõ-ffi , t oinõ sáirft-tiT@ *, *
preocupação com as inter-relações entre seres vivos no ambiente e enúe * ltambém exise saber culrivar a amizade dos "rr.dffi{Jãbãíi;ffiÉã;",--
-"4rffiãih tom-invasivo effiffiiabalho
=
de campo
sociedades e paisagens não era uma questão para a ciência, até bem
avançado o século )OX. cria a necessidade do pesquisador adquirir e desenvolver uma cultura
geográfica, incluindo a capacidade de se orientar'
Então, a lista de Vandelli para orientar os trabalhos de campo de
nada serve? Não é bem assim. E1a aponta uma dificuidade real que se Decorridos mais de duzentos e vinte e cinco anos após Vandelli ter
apresenta no rabalho de campo. Sobre esta dificuldade, Lévi-strauss escrito a Dissertação sobre as ímportqntes regras que o filósofo
(1981) escreveu logo no início do capítulo sobre os Borôro, ern rristes naturalista, ngs sucs peregrinações, deve principalmente obser-var, há
trópicos; ul
pouco que aproveitar do "rol dos instrumentos, drogas e maisutensilios
(...) que são indispensáveis a um naturalista que vicria". Lentes e
,
microscópios, tenazes para apanhar cobras e insetos, armações para
7. Cf. PRES'fES, op. cit., p.77-7a.
apanhar borboletas, conchas e corais, martelos, machados, escopros,
.
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Marcos Lobato Martins HISTORIA E MEIO AMBIENTE t49'
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limas e serrotes, anzóis, escalperos, navalhas, espingardas, tesouras, L
para que este diálogo seja ampliado. Trata-se de aceitar plenamente o
alfinetes e agulhas, sondas pàra o mar e ragoas nãã têm sentido
na !-
seguinte: nenhuma disciplina tem precedência intelectual mrma terltativa
ffiü&*:i*l'-,H*,*âlx*"lm*m,:mffi
e : ,,1
tão importante quanto a de assegurar á sustentabilidade da üda humana
na Terra.
s***g{p-sws,kgs".
Hoje, entre os equipamentos A cooperação interciências é fundamental para a compreensão
que deve carregar o historiador li
t' dos temas e problemas ecológicos. Há consenso de que se requer esforço
ambiental, destacam-se os ap-arelhor
9-iç_lfQtfi="oC p-i"ni1tu.1iz"ao, qr" transdisciplina4 orientaCo para colocar em diálogo as concepções das
possibilitam fo.?gjle|_I, g ã_ir, Atpàài-"ãr"""i' rô;; a aônvérS as. No
p a s s a d o, os ããtii?ãrictàí vi àj áva
diferentes ciências, integrando e sintetizando perspectivas, possibilitarrdo
* ;;à ; p;-; há; ;á ;;;.ãã; ;;, a abertura paÍa o uso de instrumentos menos convencionais de pesquisa,
"riscadores". o ato de desenhar o que se obierva é, de certo
modo, embaralhando e dissolvendo as fronteiras das disciplinas. O diálogo
insubstituível, porque o desenhã pede mais contemplação, a
contemplação necessária para proporcionar refazer parte do ouie[o interciências frente aos temas e problemas socioambientais deverá
para consistir na troca fundada tanto no intercâmbio de dados, quanto de
melhor entendê-lo. Não obstante, os t"mpos sáo ortro, e a habilidade
de desenha4 por isso mesmo, é cada vez mais rara entre nós. O modos de ver os fatos, fenômenos e processos. Este diiátogo será frutífero
lugar se reconhecer a solidariedade das deterrninações de fenômenos
dos artistas "riscadores" foi tomado pelas câmeras ópticas ou digitais.
A imagem sisuda que a maioria das pessoas assôcia à ciênciã
ambientais, econômicos, ideológicos, simbólicos e políticos.
e ao No diálogo interciências, talvez haja um papel reservado para a
cientista corresponde mar ao pra.,er qr. álgr-us atividades realizadas
nos trabalhos de campo propiciam- o histãriador ambiental não História, embora n.ão se possa dizer que seja exclusivo dela. Lévi-strauss
der.e afirmou que "estamos condenados a viver e pensqr em yárias níveis e
se abalar com este fato. cabe-lhe afastar as hesitações, não temer
os esses níyeis são incomensuráveis. Há sctltos existenciois para possar de
: To-nle{Llqs*g-qP-egUgLo§-ê}LEs-gs p{gpgrcio4ados nela agradávet sensação; um clo olLtro"a. Por convidar à üsão integrativa, o destino da História é
palqagens urlq."r e rurais,, de rnergulhar nelas, de ouuii ,ár§4_
*u- ill:o-*q
p-:I§HLqI:,9.1§ identificar seus elementos. O prazer destrtq
estimular estes saltos. Ou, dito de outra forma, o papel da História é
it9*,
'empreltada não deveráltrqo":,
encher de culpa o pesquisaáói a ponto cle leváj
justamente o de ocupar-se, pioneira e provisoriamente, da integração
lo a duvidar se isso é mesmo um traÉarhà. rr*" lembrai a propósito, dos níveis de pensamento e de apreensão dos fenômenos.
que a vida dos naruÍalistas do século )ilX foi muito dura enquanro ,. Par-te deste papel da HistóriaAmbiental é fazer a crítica dos estudosÍ
-,---- _:- -:_*--^-.*",-=:ã++-
com as teorias do desenvolr.imento e da dependência, com as teorias do novas disciplinas na formação inicial do historiado4 obrigando-o a
Esr a d o, cõm à. G e o gra fi a ( d a b io ge gaTi à,-aã-geõiiiõiio I o gi a à àêo gÍffi ã estudar pacotes de conhecimentos da biologia, da geolc,gia, da
tiümàrã). No êampo das ciências narurais, a Éistória Ambiental deverá climatologia, da fisica, da química, etc. Sem dúvida existe a necessidade
dialogar principalmente com a Climatologia, a Ecologia, a Geologia, de reforçar a capacidade do historiador de compreender a cultura
a qal99gà1ogi+". u.,Qlologil {a E}i{iiãôl*-**'
" "';'**-" material das sociedades, os processos de influência recíproca e de
Mas nãõ§erá um diálogo fácil. Dos dois lados, tanto das ciências transformação que modificam os aparatos instrumentais e técnicos à
naturais quanto das ciências humanas, há lacunas importantes na disposição dos povos, nas diversas regiões e épocas. A familiaridade
formação dos especialistas que criam obstáculos e ruídos portentosos com os temas, os métodos e os resultados da História da Ciência e da
na comunicação. Há poucos cientistas naturais com formação histórica Técnica é um imperativo para os pesquisadores que se dedicam à
e/ou sociológica. Há poucos historiadores e cientistas sociais com História Ambientallo.
formação em fisica, química, biologia e geociências. Mais do que a ori, determinar
formação básica em ciências naturais, falta aos historiadores, em geral, r nas clenclas
até mesmo a disposição de ler as boas obras de divulgação científica específico, rlecidirá
escritas por físicos, biólogos, ecologistas, geólogos, etc. O inverso é ãs "co]heitas nas hortas
verdadeiro, a despeito do apregoado sucesso editorial da chamada "Nova
História". Portanto, a existência e a extensão destas lacunas de formação
dos especialistas agrava as dificuldades da ação interdisciplinar ou recuperem a simultaneidade e a articulação entre os planos empírico e
multidisciplina4 o que contribui para a reafirmação de "territorialidades teórico, excluindo o impróprio pela crítica, fomentando o debate com
científicas" e corporativismos danosos. outros especialistas. Uma epistemologia que convide e oriente ao rigo4
Atítulo de exemplo dos riscos que surgirão no debate interciências flexível para encontrar os procedimentos que dêem conta do objeto
promovido pela História Ambiental, pode-se citar os reducionismos pertinente e que responda às suas exigências. Um modo de produzir
difundidos poÍ correntes como a sociobiologia e a biossociologia. Será conhecimento que também inove no material utilizado e reabilite a
preciso lutar contra os que pretendem deduzir toda a vida social (e as imaginação, controlado pelo trabalho crítico do pensamento sobre si
relações entre sociedades e naturezas) da ecologia, da adaptação, da mesmo. No decurso da pesquisa, à medida que se constrói o método em
evolução e da seleção naturais. Rejeitar os determinismos genéticos e direção ao seu objeto, emergirão as oPortuÍridades para os diálogos
neodarwinistas, incapazes de compreender como as faculdades com os saberes acumulados pelas disciplinas das ciências naturais e
simbólicas dos homens e a produção de seus meios de existência agem das ciências humanasll. Estas oportr:nidades terão que ser aproveitadas,
sobre o modo de instalação e de reprodução de uma sociedade em seu ainda que pareçam desconcertantes as introüsões teóricas Porventura
ambiente. Contra certos geneticistas e biólogos evolucionistas, os encontradas no caminho.
historiadores ambientais terão que reafirmar que o ser humano é o
coqjunto de suas relações sociais, como já o fizera Marx. Também haverá
combates contra certas posturas de militantes de movimentos'!rerdes",
que se encontrarn demasiadamente inclinados a aceitar que o ambiente, 10. Na ampia maioria das graduações em llistória existentes no Brasil, a História da
de forrna todo-poderosa, desempenha um papel superdimensionado, Ciência e da Técnica não é sequer uma disciplina que consta na lista de optativas.
no sentído de que as variáveis ambientais teriam poder explicativo os grupos de pesquisa vinculados a esta área ainda são muito reduzidos e contam
com pouca üsibilidade. Esta situação, para o avanço da História Ambiental no
determinante. país, deverá sofrer aiteração radical.
O diálogo da História Ambiental com as ciências da natureza 11. Vêja-se o conhecido episódio envolvendo o historiador Warren Dean. Para escrever
deverá se materializar numa atitude de curiosidade, interesse e aberrura seu iiwo sobre a perda do monopólio da produção da borracha pelo Brasil, diante
em relação aos temas, métodos e técnicas das disciplinas que estudam dos competidores asiáticos, Dean adquiriu familiaridade com botânica, ecologia
e ourras ciências ambientais, estudando no Jardim Botânico de Nova York, nos
a üda, o planeta e seus variados biomas. Não se pretende introduzir anos 198O.
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"o*àenvolvidas e os
o modo de uso dos recursos, as concepções e as técnicas
1
1. As considerações feitas sobre a documentação produzida por governadores podem 2. A documentação produzida pelas Assembléias Provinciais,/Estaduais e pela
ser estendidas para os Ministérios, a coroa e a presidênúa dã República. Assembléia Gerai,/Congresso Nacional também atrorda questões similares, com a
diferença óbvia da escala regional e,/ou nacional do enfoque.
. 58 . Marcos Lobato Martins . 59 .-
HISTORIA E MEIO AMBIENTE
Fluminense de Agricultura, criado em 1860 e que incorporou o Jardim pela ideologia do "progresso" calacterística do Oitocentos, analisaram
Botânico do Rio de Janeiro, editava uma reüsta trimestral, cujo primeiro ã situação da economia, da sociedade e do espaço, tanto no plano
número veio a público em setembro de 1869. A circulação regular desta local como regional e nacional, diagnosticando os problemas que
revista ocorreu até o final do Império. Em suas páginas, que serrriram reduziam avelocidade da modernizaçáobrasileira e propondo medidas
para orientar os fazendeiros da época, registrou-se a memória da para solucioná-los. Nas matérias da irnprensa, descorrina-se, ainda que
-parcialmente,
produção técnica e científica da instituiçáo (idem, p. 51). Por sua vez, a visão das elites letradas nacionais, regionais e locais
o IAC (Instiruto Agronômico de Campinas, inicialmente chamado de iobre a terra e a gente do Brasil. Os jornais e as revistas contêm,
Imperial Estação Agronômica), criado em 1887, transformou-se no portanto, muitas informações ambientais e elementos constitutivos do
principal centro de pesquisas agronômicas do Brasil. Seus trabalhos, imaginário de certas camadas sociais brasileiras sobre a natureza e as
voltados basi.camente para a experimentação das variedades já relações dos homens com seu ambiente.
cultivadas em São Paulo, novas práticas agrícolas e controle de pragas, e.-rç-@ali-asê para a história ambiental'
foram divulgados anualmente, nas Coleções de Trabalhos Agricolas principahóãi estrangeiros e brasileiros
(idem, p.53). f izei?Írrsranae-quFre4é-sa\uç'á§ç-4F$§aç4*P$!?8§*4*f :
trabalhos de Debret
do Brasil. Tomaram-se célebres os
No campo da mineralogia e da mineração, os professores e
esrudantes da Escola de Minas de Ouro Preto, fundaclã efrffi]fior ffiq"rffio"fã a" Rugendas é mais suave, os dffififfiõ§"
ãrôrffo*n Eàd áãõ im Êãã ãire ma-ii;@ s e s rud o s de Debretretratam uma natureza exuberante e agfessiva, destacando a
sobre a realidade mineral de Minas cffi a matafechada, a enorrne dimensão das árvOres, com se{pentes enroladas
mnêrãIõEIã, ípôiitiêãTáiniô?ã;ãTiããruifrã,'â'iíetalürgia e a extraÇão nos troncos, os animais selvagens à espreita e os índios ameaçadores.
mineral tornaram-se temas de investigações amplas na Escolade Minas Ambos compuseram imagens sobre os escravos e as atividades exercidas
de Ouro Preto, talvez o mais destacado centro de ensino e de pesquisa por eles no país. Também registraram comportamentos, roupas,
nestas ríreas até a Segunda Guerra Mundial. Por conseguinte, a produção Ll"trr"r,tor arquitetônicos e decorativos, utensílios domésticos e
desta instituição, e de suas congêneres mais recentes, também é fonte instrumentos de trabalho. As plantas, os animais e as pessoâs que Povoam
muito relevaÍrte para as pesquisas ambientais. as imagens de artistas como Debret e Rugendas, que {ffi]§p€ro.S§S
Outro conjunto destacado de fontes impressas para a História e Daisasens do Brasil dos séculos XVIII e )CX, interessam de perto ao
Ambiental é representado pelas coleções de jornaisS_feyfstas publicados ffi ã-ri ês m=ífó rrn a,têVe - s e mencio nar arristas d a
no país. lvtuitos municípiàs brasileiros, dm Academia de Belas-Artes do fuo de Janeiro, denrre os quais ![gg*gf
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de incertezas e vfutualidades. Basta ver a controvérsia que é criada em para discutir o Catarina elaboraram um documento no qual
torno das informações sobre a mortalidade provocada pelos desastres recomendaram o estabelecimento de um sistema de bóias em alto-mar
ambientais ocorridos no passado. Nestes episódios, só se pode falar em e de uma rede de estações meteorológicas na costa brasileira. O que
níveis de grandeza. Maior precisão é quase impossível. Há duas razões significa que, mesmo no início do sécu1o )O(, ainda persistem problemas
para explicar esta dificuldade em paÍticular. Aprimeira está relacionada para a produção, na quantidade e na qualidade adequadas, de
à sobrecarga das autoridades que enfrentaram estas catástrofes. Elas informações de interesse ambiental.
não conseguiram manter registros precisos ou realizar recenseamentos Outra cautela importante que se deve observar ao manejar as fontes
de amostragem. Asegundatazáo prende-se ao fato de que era comum altigas, produzidas por eruditos brasileiros e estrangeiros, naturalistas,
registrar grande número de mortos, vítimas de epidemias, de conflitos artistas e funcionários dos goverÍros, diz respeito à atenção que se deve
pós-desastre ou de revoltas disparadas pela ausência de socorro ter com as "distorções". Estas pessoas não eram particiPantes diretos na
govemamental, depois do anúncio oficial do fim da catástrofe. Disto constÍução cotidiana que observaram em diferentes regiões do país e,
resulta uma tendência de subestimação das perdas humanas ocorridase. em função disso e de sua adesão irrestrita a uma determinada üsão
O historiador ambiental não pode perder de vista o fato crucial de européia de "civilização", elas não puderarn compreender perfeitamente
que a produção sistemática de dados de interesse ambiental é o ambiente, as relações sociais e os valores que observaram. Este ponto
relativamente recente. A elaboração e divulgação sistemática e será discutido mais longamente nos comentários sobre os textos deixados
abrangente de informações sismológicas, meteorológicas e de estatísticas pelos viajantes estraÍrgeiros.
ambientais diversas (sobre desmatamento, erosão de terrenos e
assorearnento de cursos d'água e baías, frentes de desertificação, volumes ambienral brasileira/
I O. tu*tos dos naturalistas e a história
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de emissão de poluentes, redução de cardumes e populações animais e
vegetais, listas de espécies em risco de extinção, etc.) começou somente osretatosd"*-"_1ggç,*:.j9r:.9-l*pSleq*vlaiep!&:=_+Lttil3l1Ê-t-4§-
nos fins do século )ilX. O exemplo da meteorologia é esclarecedor. Os .*",@ - t-,,1 i"-r^:
estransejÍqs-qlepercõ-LtúáIr]!-rias[gg§-i*ç"9]"-o,*,Xlxsãomuito
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primeiros serviços de previsão do tempo, empregando estações terrestres effiregados peloi historiadores em géral, e pelos praticantes da História
para medições e o telégrafo para a transmissão de dados, surgiram na Ambiental em particular. Apenas para ilustrar esta afirmação, Bgblg
Inglaterra (1861) e na França (1863). Somente nos anos 1960, com o *um-a]i§!a-4&§xgu*§ti-Ya
lançamento dos primeiros satélites meteorológicos, foi possível obter aos náiúiáiiitas êitrangeiros citados inclui *Zstqg§tl9lgg:'o -
informações estatísticas mais confiáveis e acompanhar em tempo real Como já foi ressaltado anteriormente, os naturaliitas tiveram sua
os flenômenos c]imáticos. atenção voltada prioritariamente para os minerais, as plantas e os
Todavia, ainda hoje, como revelou a discussão sobre a natureza animais do Brasil. Guiados pelos princípios e teorias da ciência que se
do Cqtarina (teria sido um furacão ou um ciclone?), fortíssima praticava no século XIX, os viajantes naturalistas c@
tempestade que assolou o litoral de Santa Catarina e do Rio Grande do
Sul em março de 20O4, muitos países não possuem meios adequados fu 35gssencomendadaspetas-{cadç4qi-4ç--4ç-ÇÉ-frSiq-qSg5qPgl§-Suas
expedi{Oês pelo território brasileiro erarn organizadas com esmero e
para monítorar os fenômenos naturais. Meteorologistas do Brasil e dos
motivadas por interesses amplos: individuais e institucionais, científicos
Estados Unidos, reunidos em julho de 2OO5, em São José dos Campos, e econômicos, religiosos e de diversão.
Todos eles trouxeram para o país que visitaram informações e Enfim, os viajantes naturalistas estrangeiros, aprisionados pelas
concepções já formadas sobre os trópicos americanos. os üajantes concepções de sua cultura européia, não souberam construir o
naturalistas distanciamento necessário para analisar os ambientes regionais
.i.qrlrrrqru_E3rqpê_rgEr"*q_Nô"ã.-lyI-tl4-4ó-_dé:ffi!o=Jrvr* brasile iro s. Ra z ão p ela qu al d eve m ser,relid q s caffriás.tarale_cqid a_{o
conheciam as experiências de ourros colegas qué3a haviamüsitado as .
Os relatos dos viajantes naturalistas estrangeiros conservam sua os descaminhos da atividade científica
imporrância como fontes, observados os devidos cuidados na leitura de foram com ffipe;ãiãados
suasinformações.OggpgILA$9é_çgsJgs§_Ie.l_W, labirintos , Car dé verbas e de apoio governamental,
o que corresponderia à crítica interna, e t4qlqÉry cqnfrqq!é-loj descontinuidade nas políticas públicas (educacionais, científicas e
M"!S ggg.+-r_fj!Jg§, o que corresponde à crítica tecnológicas), formação recente do mercado de ensino superior,
externa. selvagem e desregulado. Tudo isso influencia negativamente o setor de
De qualquer forma, deve-se seguir o preceito de combinar, nas ciência e tecnologia no país, de modo que ficam comprometidas as
pesquisas de História Ambiental, os mais variados tipos de fontes para possibilidades de desenvolümento soberano da nação.
reunir informações sob o foco convergente de técnicas diversas e analisá- Se o Estado brasileiro já não controla diretamente o trabalho dos
las segundo diferentes eixos teóricos. pesquisadores, ele mantém antigas dificuldades e cria outras novas quase
'*_-+-----_*-.-+ diariamente. Uma delas é o pequeno investimento feito pelos sucessivos
I A Historia Ambiental e a produção de I governos nos órgãos públicos destinados à produção de informações e
i informações ambientais i estudos sobre o país, principalmente naqueles com responsabilidades
,. -l
sobre a questão ambiental. Falt+Ir-lheslrcssoal- equipgmento e !!-inhqiro,,
Um dos mais famosos naruralistas luso-brasileiros foi Alexandre g que prejudiqa a plodqqã-g - em quantidade e com qualidade -1|g
Iggl#Jg'-'-.--*-u(f -Z-úJ-ôí."i;iid"..*ilffi ei'o!ç§1-'1iãã"siia" #fiformãeõ-es ambieqlais. Êalta-lhes prestígio político. o Ministério do
no Brasil. Errggg?, o naturalista nascido em Salvador p4g_t1gde Lisboa -ttrteio ---
Ambi ente- o IBAMA, a s §ggI#IBql§B gUA§ ç-\[qlticipai-s_ de
go-ne+_dg.if{.o*ããte!-ol _g-Ip_g-qlg+.-o_c-l-e_E!íqca empreendida'@a
portuguesa em solo brasileiro. A expedição de Alexandre Rodrigues
CJ,_ga @exemíÍõ;ããu"."*àttíilúlos-ã
. _p$.s-4*it.Arçry -siB E:gT," DIry3;
ôontam com recursos ?õfrffi
G"
;õr s
Ferreira pç.rç_,o_-1gçtr cerca de S_9JgúJ_qU#Jge1Ig.1nas Capitanias dogJão suficientes paÍa empreende4 sistematicamente, levantamentos e estudos
@sr.o'(4rse?_o.l1-q)Sl4ete*c_f gjlg,estendendo-se ambientais nacionais e regionaisla. A atuação das ONGs e Universidades
até
#%
o ano de 7792. O naturalista enfrêntou muitas dificuldades durante não é capa:. de suprir as lacunas deixadas pelo Poder Executivo, nos
a expedição (falta de recursos, deserção de soldados e índios, demora seus três níveis de atuaçáo. No Brasil, portanto, há muito que melhorar
no enüo de materiais coletados para o Real Museu de Lisboa, extravio quanto àpqgdgçeo-ç dig;tg"ç& de i"f"gt!.§õ.s d
de amostras, etc.). Em Portugal, boa parte do que havia resultado do Além do desaparelhaúêntô dos órgãos públicos com
trabalho de Alexandre Ferreira acabou perdido, por falta de organizaçáo lresponsabilidade sobre a questão ambiental, outro problema sério é o
e conservação e até mesmo porque peças foram levadas para outros 1rítmo lento de democratização da atuação destes mesmos órgãos, fator
países sem qualquer controle. A_Coroa também não realízou esforços íque também favorece a dilapidação do patrimônio ambiental da
parapubiicarqsdesç9bs.gtgs*{e-Eq&Éã,mantendãIãlgteSgàp*"-1lt-r-s4 \sociedade brasileira. Ao higlolldolêEbiçnta-l cabe a tarefa dç.Sngçgr
os- i*;1qú .
jeste estado de coisas. Ele deve disc-r1§r-fe§-9-p*çksJé*c-ruçg§-**a;f,dBde
do naruralista perrnaneceu dois séculos no esquecimento. irransparênc-iê9-gong,q§dardsgisgçq-tqma4rsllglg§lesgI&As§estatai§,
1=--+..."F%*-
odestinoterríveldado;ôüá6ã'h;,ãã-Áó;ándrãffi AãÊuesFerreira ip-rincipalmentenoqueserefereàe-lAb.of açãe.âEesçI$4qão.êpro.vêçãg
pelo mesmo governo que o haüa patrocinado mostra como, em Porrugal, ,dg-Ugç1s (relatórios de impacto ambiental).
as razões de Estado sobrepunham-se ao fazer científico. Outra i-ndicação
neste sentido é fornecida pelo fato de que "o trajeto, as áreasvisitadas,
as mernórias [elaboradas pelo nq.turalista.] erqm q-utorizo.dqs e 13. Departamento Nacional da Produção mineral, órgâo do Ministério de Minas e
encomendadas pelas autoridq.des coloniais" (RÁMINELLI, 2OO7: 64). enêrgia responsável pelo registro e fiscalização da atividade mineriíria no país.
Esta falta de autonomia da ciência, sua subordin aos desígnios do t+. Em 2002 e 2OO4, o IBGE publicou os Indicsdores de Desenvolvímento Sustentável,
Estado e ica administrativa proietou-se, no Brasil, no século XIX que incluem a dimensão ambiental ao lado da econômica, social e institucional.
Neles, há 17 indicadores ambientais, organizados em 5 temas: "atmosfera", "terra",
blica, "oceanos, mares e áreas costeiras", "biodiversidade" e "saneamento"-
'"'-* ;iirl**1i qb!-,:h:i
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s e [e c i o n á v cl d a re a ] d a d e h i s tór i c a.
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.o.Sl-.1 g 1". çrr,
íãh H bi Ü irY-E"lS, Todavia, para o estudioso que sublinha a compreensão de
ama ç.-o-qpl94+,9 dilâ-1ntçAdç.slemçn"tq"§."p*t1fgis (físico-biológicos), "interações holísticas", os fatores clirnáticos (e outros fatores ambieirr-ais,
dq,m9gçi_fic,"__.s,__.*g-çiÊj-sà"jHtÍÉi"çg.sr"ç1ll*tr-ais*, etc. Çgng, físico-biológicos e socioculturais) devem ser levados em conta,
1.c-o1i9.-n1iq9s,
rtanto, seria possívet dçll"+"r_iE*t|9'"Hç"tp'l_-+rrt]rigp,tl_it"? convergindo para uma síntese global mais do que para urna
Por conseguinte, também não se pode dizer que a História especialização setorizada. Para a História Ambiental, portanto, o jogo
Ambiental é uma outra abordafJem, como a econômica, a política ou a a ser jogaclo não é o de fazer desapal:ecer tradicionais domínios da
Flistória - como a História Econômica *, mas de dialogar com e1es,
problematizá-los. Pensar suas variadas articulações, cotejar as suas
.'--)
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intcrprctaçõcs.
11"
, í,(,'
I§+.p,rritrç,g, os ç§!94_9q gg
-rylq1ffla Anr.bl-e""rltgl--v-Êip.p"e"ç-qp*c-ggç1sçLdo fl'{lt»"''
na expJ-o-;1ção, mais empírica Co que teóri93,.{9.ç9"{,I9§.,"t_e_g}.*f .p.Íirlçip-ais,
*"-Sln
abitâ n gendô Criseíamt,icn ta is do pâssado, impl icaçõcs de determ inados
cursos de ação antrópica, sistemas de crenças e valores relativos à
natureza (eruditos ou populares). Mesmo conduzidos sob a égide da
multicausalidade e da interdependência entre diferentes processos, estes
esforços de pesquisa esbarram em ambigüidades e dificuldades teóricas mesmo Ce surgiS na década de 7970, a História Ambiental - assiru
que estão longe de serem sanadas. A I-{istória Arnbiental veio para ficar, batiza d a p or h is toriadore s norte - a mericanos - â-Hi§_ténê-.Fç-o.p_ômi.ca
mas tem muito chão de estrada pela frente, que deverá percorrer
almejando o refinamento conceitrral, teórico e metodológico de sua
produção. **"\P'
r - '"--1 as flutuações nos
I A Hiscoria Ambiental e a História Econômica t
dos seus rebanhos e a história das plantas por eles cultivadas.
No nível analítico mais convencional cla História Econômica (ou Assinale-se, como apenas um ggrnplo, o interesse que para o
mesmo da Geografia Econômica), as,variávg§ flrpbienlAis costumam historiador ambiental possui o liwo de _En*menqgl_L.S$p.y*I"+"d_+nS
-(].9.pD I
apaÍecer sem qualquer destaque, apenas na condição de "qf!çm#edSSl,
para usar o jargão dos economistasl. Na maioria das vezes, os objetivos *'P_ $obre a eJ*o-Lyçq.o*dq-I-_ênsq.e-{qç -{".e-eê*.*nà_,i#-.id;;iõ-àre"ã te;íi;!oíA'
ffyLII. Neste #ff!ç-g-de.-hiqt-qria rqral, são descritos minuêioiamenre os I
específicos da investígação do historiador c1a economia não exigem "bsos dos campos, dos terrenos aluviais, das encostas dos rnontes e das
que se considere, por exemplo, o clima como fator que desempenha um zonas alagadiças c1o litoral. São examinadas as IHLA+.4"S..§.Rqip-.g-1].çqe§
papel na formação das estrutul'as econômicas. Florestas e os.airirnais brgyios c as {isp-uta§.pof cnt!ci
_ {So1r1rp
"as ^cspaço
-
-- - h"J3s lavggtes ç qs cliqç§es, marcadas pcla oiggnsão ^d,qs cercai âç pcçp"a.l .t
d A atenção também se volta para a variada fisionorrliá
9à,i ilaq4es,,'
y*.tens.nJdçla§, para u g"o grrfiu d o trifflããffi;fr;'ã;";"srantreira, <l zr
1. Externalidades sã.o dattos ou bencfícios sociais causados pclas ativiclades privadas.
seda, das {Sirra-s-.de*ca.w"ãp e das pastagens, geografia que gerou
Elas podem ser negativas, como a poluição de um rio por uma indírstria de papel,
ou positivas, como a preservação de um conjunto de construções de valor patrinonial
paisagens diferentes em estreita conexão com a qualidade clos solos.
por uma empresâ. Para além das descrições, o jogo das relações mútuas de diversas
Ôr1§ N fnp l"x':!{{. '#Lr'{."í(:r!i:r'} fii
-t)'§ $ \i-1ê ,'.., -§& rl: /$''íixrr*-
. 76. Marcos Lobato Martins srsróRtA E MEto AMBTENTE ü ç rú
n:
q.('ü' " { " 77 "
"f1;1.
de
variáveis, que o autor realça para explicar os movimentos seculares uperização das fontes de recursos
,*u d"t"rminada socieáade tradicional - sua siruação de
desenvolvimento e os níveis de vida de seus habitantes -,, delineia um
odayggr*{gPjl*:S}gf *a"e'-"P3§Xsgis{u!4§99}-ansqrs-dqq'Ela
"'ú"f
pod" ser üõlunr6rícl[êd?nôilcsütiã''tciãàliinb::.'3ç^t§§!-e9Sm-ea''1"{ie-
clas diversaq produçõôs ê áõ pfõdütõ'ie'§iõiiál'l;iütó,
dóã preçoi ê das
+}.;itã;.i"';âau a'diâ"â aiiiiiü, ó rüôô,'ãü'ü'{'õlütrô;ô.{Tâlãiiôf,
revoltas e as lutas
ã-,iffi".".;.r1rs.çh,osràç:"-q-qf .g"-lç,,R.g.§,*g-*q;ais*(inclusive as
#ilri;';;, j . N á "ài,ró;niá[Hii"ãã"i"ê#áços-tempos do Languedoc à época tguns malxisras, no âmbito da socieda§.S-Sggii*lis13.-a-.di!e;t
dãh ãn [á i; d a iuta d
"rüF
ãáã"rrru.g.rq-*,1,jplgg.iai*9,"g-",#,"s.""*.p.fl.pel, representarla
pelas
3t#.*i1t" #ra-"m;inTãtr= Là"?lvêisã§" d í;n é;'õü
iôi s y ariáv el meteo r otó gíc a" qie liberdade2.
.o*o ruriÜêiiüiffi;."ilâõ' ômitid a "
-- nct
i i^porto,rt" "fffri{tÜri" agráriq ond'e nos ajuda s compreender Ãêffiõãܧlüãã"lü;il ;;;ãüçãoê te êônàumo, à orsanização do
t" po breve, essencialmente - a irreguloridode das colheitos e os
,opiirhot
- d.a oferta" (IÁDURIE, 7997: 76) '
Oru, tudo isto é de muito proveito para o praticante da Flistória
Ambiental. A "aventura de uma história total" de uma região rural
sugestÓes
mediterrânica empreendida por Ladurie fornece inspirações e
Ourros exer,plos
fu.u u investigação de proôessos socioambientais.
este podãm ser enãonmaclos no âmbito da História Econômica.
"o*o o qrà e preciso ressaltar é o fato de que P-"9"ié19.9.-%**,.111::9':l:
História EcorrÔ".niçq.ée sm,+ pB*ê.e,.i." #H'?iiâi§ ã iítiiiê
Ambiental com a tiist"ó.ri+ d!*it
*u"il1ff:il*_ff';ffi
r**§ trn§,,,
ffi *m;%"t:;:.i:;'
2. Ver LÓ\MY (2005) e KONDER (1984)
o 78 .
Marcos Lobato Martins HISTORIA E MEIO AMBIENTE .79 r
A História Ambiental e a História Social obras como estas chamam a atenção do historiador ambiental
para a necessidade de observar e compreender os coÍnportamentos e as
Há décadas a produção no inrerior da História social vern relações enfre os grupos sociais, a interessar-se pelas experiências das
abordando temáticas que interessam aos praticantes da História pessoas comuns e pelas suas reações a estas experiências. Estas e outras
funbiental3. conceitos, métodos e abordagens desenvolvidos pela
tht*;:"d-a*H-rs"tftia§,p-çi.aJ"M-da"s*trç"nçç^s^çnraç§--e.§-
I*"1:,ttil*§_p*",t"*i..#sde gr3lgs*Hsgincorporaram-se ao arsenat dos q
que realçam o tempo da experiência e do vivido, meios de acàsso
d;ã'dâÍilffi?ã"Tô "ê§f,il{ôIíã;ãffiê;;;; Iocioambienrais. Esre diárogo ç"qlgfi_v.,*:;
privilegiado à historicidade das relaçôes entre as sociedades e
intrahistórico, da História Ambiental com a História social, é táo os
ambientes.
necessário quanto o que se examinou acima, entre a História Ambiental
A sensibilidade para lidar com as {çp*r-e#n".çA.Ç,Õ,ç§_,p
e a História Econômica. çi.+_h*f_4,*ti-ym
à_**.tyfSfn pode ser apreenclida em trabaiÍiõi rnodetarói ââ uistoria
t j'Fy
,.1..t
Social. Por exemplo, o livro de l(çithJb-qJpʧ-(1988), um csrud<_r
enciclopódico da relação do homem õ;-*Tàimais c pla,ras na
,"*& Inglatena modema, empregando grancle quantidade de fontes literiírias,
ii
examina como mudaram as atrltudes do homem diante cla natrrreza: cle
, ,1,- uma postura seiscentista de derrubar matas, drenar pântanos, eliminar
!Y,' '-l{"
'n{,*
I insetos e animais, lawar a rnaior superfície possíver de solo, para ourÍa,
,.iu i formada a partir do sécu1o xvIII, que valoriza o ambientÀ natural e
It
{t
,e--1 contesta os direitos do homem de explorá-la em seu proveito. Thomas
__--.,,T"11 di.ssipa o preconceito de que, antes da industrialização, o homem clava
,v
T
mais valor à natureza. Para o historiador ambr'ental, trata-se cle
advertência importanre: é preciso aprender com a Flistória social a
o historiador ambiental encontra temas para suas pesquisas, contextualizar culturalmente os processos e acontecimentos históricos,
ensinamentos e estímulos nos trabalhos clássicos da História social desenvolver a capacidade de compreender os comportamentos, as icléias,
I9-lt**^q-'"s+ran'rlh$t*.q,*-o*".d*.fp"n*ô.m,s.p',o*I,iBdnflÉ'6';ã;Ü âüil",ã*ã" as opções e as atitudes de pessoas, de hoje ou do passarJo, diferentes c10
Bgn_ngl§ Wil.flgns (r98f) et," aborda as retaqsegenrre carnpe g.çi"q;1de pesquisador.Sn*jkh*çSree*Jfogntg,*§";gigg*-Chara.À,G996)explorouos
rla.l.r-lglatcrra da Revolução Indusuial a parl-ir defon[cs,Jiteriiriai. oüüo conteúdos míticos que persistem subjacentes nas tradições paiiagísticas
exemplo rnais recenre é o liwo de \4pgqhg!_B.er*na&ffig_8.6J, preocupaclo de diversas regiões e culturas ocidentais. As ntatas, ás águas, as
em pensar as transformações provocadas pela [rodernidade em conexão montanhas foram meios metafóricos para delinear preocupaçõe,s
com os projetos urbanísticos, a filosofia e a literatura, sobre o quotidiano modemas - império, nação, liberdade, etc. -, o que mostra qlle a
das ruas e a cidade. Também vale citar
4,+i*,.Ç"o".rh.rn.(J"9S,gJ com seu natuÍeza não é algo anterior à cultura e independente da história de
3*1,,*,s1ç,*F-*s6.ps»,H*m..çl-o"he.aílç^ns-.","qigslrH-+-à"=i*ápmir, esra.p.ffisg.Ç,.r8 cada povo.
"y1ti1",queór.r9 jSg_g{41-rd_ç_"q}.osp"idçç^lgçrçr.d.a.itudústriagp_túJnfnp,
outra lição fundamenral que a História Ambiental sabiamenre
assimilou: aquilo que se conserva e se destrói na paisasem natural está
Jig-3ao, proÊffiãã§"ffiffiêaidé{}iÉÊrda' .qlruÍelóêniã.'so úlb basrãrià
para justificar o cliálo§o contínüo enrre a História Ambienral e a l{istória
social. Mas há muito mais razões para manrer aberto este diálogo. As
3. Aqui o termo História Social é tomado na acepção abrangente dos ag*o_g*]p,/*p-
como o carnpo que estuda os modos de constituição dos atores históffãos e suas msis+.sã.cs*.*,s*lp"l:mas,g6_s-*s"§Jra,r.é.g1"+p d"ç.*ç#p;[p#.*f,*_çg,p*,_c_,g,1.*qgryes nos
relações, as bascs (socioeconômícas e culturais) das iclentidades, as representações sqçsqambie!.qãF,'üjõêdiiT.tãá.ilri-ããJ'ãüãilü; à;-ili,ró.iâ
p"rsssfs_es
colerivas e a história da üda cotidiana, priülegiando clurações maii curtas. Ele Amliental, o*q4sm tsuán"v".e,,sJ1gad3ss-q.p.*,s,ins_pjgagne.*ç_q"H+halhp.s*dB-8,
inclui,portan,o,rTir"t*i** 1)p*.j*.gg*gyu-H*§*ó**.**c**tg* hompç.gn. Por exemplo, a obra-Ç,uff"g.gr-ç-qns,gm#.q,Íl*realça a questão
frl
+,..\,,j',t:;.l,t,'.l,i'JF,{.,.'-f.],l-.,'-".
\--"".'ro . ( r . ...; l, \sit ,,;."'i-1
i'" ;r..:r,f"fd.yorsul.in, HISTORIA E MEIO AMBIENTE .81 .
\, ,, r.,
\
\r dos valores e das necessidades legítimos dos diferentes grupos sociais. movímentos socizlis, etc. Decisivo e desejável é a participação da Flistór ia
Ambiental nos debates teóricos e metodológicos cla História, uma vez
Estudando as {a9 m.aqsls- ngl":+l dos séculos XVII e X*V"I.,J,[.,39
çg-"aç§Es
que a História Ambiental é apenas um ramo novo, embora bastante eÍn
q-y3*çs.S.çJ.ifi-wê^inàiC+de" -u, gre,.ã' dó fô#ô,?iH-?iüaii""l'fr"rri"i,iã
/ clesempenharam o papel principal, e as revoltas -, Thompson desvendou evidência, da árvore da História.
ln â racionalidade específica destas resistências, vinculando-as à existência Não há dúvida de que a História Ambiental possui grancle
"ccoflom"ia ryora.!""Ça p-l.qb_e(THOMPSON, 1991). Já em §_"*Írfgr".g\ capacidade de seduzir; e pode ser acusada de estar na moda, produz.inclo
",.\lcgggd-or-es
1da
trabalhos ligeiros para consumo imediato de um público ávido por
(799.7), Thompson debruçou-se sobre os incidentes dranráticosl
'ocorridos, em noüdades. Este risco existe não apenas para a lJistóriaAmbiental. Contra
}J*?;il na região da Floresta Real de Windso6 que levaram
à aplicação da pena de morte ern mais de cinqüenta novos crirnes, ele só há um antídoto: ó preciso teoria, detida reflexão conceitual e
inclusive certas modalidades de caça e de coleta nas florestas praticadas epistemológica; também são precisos métodos, exigentes e rneticulosos;
por canrponcses. Enr torno da {i;p1r_t"g p.ç.lq .apr-qpf,iação e..ut-ilizaçflo1 e, finalmente, é preciso Llma boa carga de leitura acun.urlada pelo
,.
praticante, sem o que náo se viabilizará a interpretação de fôlego,
_ i[das terras, das rnatas, dos biçJiqq e dgq-nlanl.?s, Thompson elaborafl _+"*-
- $I![qm-g jti1gigrgiã{ao do'diiàito.ãrno u-.!-po complexgdc tutas. ô-s[,-.' baseada na construção do maior número de relações entre os dados
'procedimcntos de Thompson nestcs livros.lonrecem pislas pa-ra o estudoí socioeconômicos, culturais e ambientais. Além de afastar-se clas
dos movimentos conservacionistas e ambientalistas, bem como para o ideologias, a História Ambiental precisa ter cuidado com as
sociais pclah*h-"* interpretações e com a prova dos fatos. Deverá dar tatrta atenção à
__*hJfe#tçndinleqç-q,,$9p.",çgp,fííôLr.tg§,.,ÇIlt-,,1,.e..p,Çxp-§..elp,]l*gr$po5.
-ffi"Wl qpl"priação dc.rccursos naturaisa. I -' teoria qllanto à "empiria".
Neste rarno novo da História, as estruturas do quotidiaro, as foruas
l -. Em todos estes trabalhos de Thompson, e rnuitos outÍos da História
Social, o praLicante da História Arnbiental encontra reflexões instigantes de exploração econômica e de dominação política, o espaÇo (com seus
,;.",.'i." elementos físico-biológicos e ritmos próprios) e o tempo são o ambiente
.' ."i ' ' sobre avontade4iberdade dos atores sociais verrus os condicionamentos,/
Hmites estruturais que pesam sobre a ação coletiva. E também ctrepara que se quer compreendeç interpretar e transfonnar na direção da
-,**Ç
.' ,,
\'t.-
-^"
corn a percepção dos sujeitos históricos como produtos sociâis efeüvos sustentabilidade. Mas este ambierlte também é lugar de projeção de
'.''l .'1\- da experiência histórica. sentimentos e simbolizaçôes humanas, de modo que, ao fim e ao cetbo,
reenconüa-se o significado do antigo provérbio chinês: pela considcração
l. ,-,r)ft
.,V', São matizes que devem orientar o olhar do historiador ambiental,
de rnaneila que the scja possívcl rcconhecer a dialctica da comnlexidadel I que um homem tiver por uma borboleta, pode-se saber o aprcço que ele
L;gsg;s"**qp*çp.n"'..tj*..111§,a.p^,ae,sfrI#r.fr,ãilã; ilü;=";e..e\l terrr pelos seus iguais.
-- }, rhnp.r"*ta1, "q---
patg_S§f,içqp" p"lq qp.ropriação da natureza. Um campo onde qr-ralqucril
ttotalidacle tem que ser concebida como um conjunto de relações de
* { â$istór1.4"4*b,1"ç*91.9-qy-ç"f+ consolidar o seu lugar no campo closj
\ t saueres.co-nlrapondo-sà tântõ âo ant_ropgsg!!Íism,g.3Í-tgg,e*]ls..ggtn"1,gi
.áiô àô É'àiit, à História Aã t,iô;ii {
rl
História Ambiental precisa comportar histórias específicas das ciências ygt:lrgep c_o-Tp?"luti-u-u. nSgtql, por permitir produtividq{"çs "1qajo1.çs,i I
-" ' I
-1*.*
do que as zonas tcmPeradas do plancta. Mas, parat
e das técnicas, da "consciência cotidiana", das idéias, da política, clos l*e- -I2[qlnassa
' aproveitar esta vantagem, há que considerar a advertência lançada por
Sérgio Buarque de Flolanda sobre as condições do nascirnento do Brasil;
4. Para os adeptos do ES^p*ESç.1êli::r*,9 ,""o jogo do futuro está no implantação tle unkt
'economia tnorsl' no sentido que E. P Thornpson daya a essu expressã.o, ou seja, "... a tentativa de impknttaçã"o da cukura européia ent exÍenso
unru politica econômica fundada ent critérios não-monetários e extra-econômicos: teritório, dotado de condições naturai1 se não adversas, lorgantente
ú
'- - -ffi i,oríico" (t.ówx zgop-=-*.íi.
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cm oulros palavras, a'reirnltricação'tlo econôntico no ecológ,ico, no sociol c no estran.has à sua tradiçdo milenar, é, nas origetu cla sociedadebrasílciro,
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. 82 . Marcos Lobato Martins HISTORIA E MEIO AMBIENTE . 1l
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