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. 44 . Marcos Lobato Martins .

45 r
HISTORIA E MEIO AMBIENTE

homogeneidade ou identidade natural. Apegados a ecossistemas, a


l#%i&'ê-__É'?,f+_'
l Ti;b;iÉà á;;.;p; i
regiões climáticas, a bacias hidrográficas. Como a natureza não é a
única determinante na conformação regional, o historiador ambiental Tomando-se por base a lista de direções temáticas da História
poderá empregar outros critérios para elaborar a regionalização Ambiental ptoposia por José Augusto Drummond, apresentada no
apropriada para sua pesquisa. Não há razáo para reproduzir a atuação capítulo antãrior, pode-se afirmar que, com exceção talvez das pesquisas
dos naturalistas, quando elaboraram sua geografia das plantas, de olho ,obr" .s idéias de personalidades destacadas sobre a natureza e as
apenas na fisionomia6 do espaÇo. questõ es ambientaii, todas eIas exigem r.rn .hit!9{.949l,,91.9
qu er, qu a s e
Yçjqtç"*g*f-g"l=t=S-dp-M.ile*Darrjs.'(20o2)sobreasinteraçõesentre co nf in ad o em blbJisLqga§.-e jllqqlv-ç»s . A H i stóriãAmbiental re
clima, crises de foúe e imperiaiismo ern fins da chamada Era Vitoriana, Gãpre, árealiáação
abrangendo vastas superfícies da Ásia, África e América do Sul. Nesta de ir à natureza, *., d" §ffiilãqg" s. quer investigar e também
análise ambiental e política das grandes secas, ar'atureza comparece porque a observação direta das inter-relações sociedade-ambiente rende
por meio do fenômeno do El Niflo; a história participa da trama com o maii ao qrr. .ottfi.r nos discursos escritos e/ot pronunciados por
avanço do imperialismo e do mercado mundial. As regiões analisadas autoridadãS, "estudiosos de gabinete" e pessoas interessadas nos
são muito diversas, do ponto de vista da fisionomia: o sertão nordestino problemassocioambientais.o.C"h4hg-de.aqrpo -síriqp:r"g*e
brasileiro, o interior nordeste da China (a região de Shandong), as ,s naisasens são fontes paraã historjador ambiental e elas, quando
províncias indianas de Madras, Berar e Rajputana. O que toÍna estas ,ir tffi t,ia;"affi * ó ê i mãte r iá is e ê Á p ái iaii, ff;g-pr"igg b e m às
regiões, ecologicamente diferentes, comparáveis no âmbito do estudo simpliticaçõeseoSultagg.f-S*q"§.§S-tgtrPdg:*gtgt:9S-tSiqgBggevsr
de Davis? De um lado, a influência que sofrem de eventos climáticos oara saIvar certQ§-i!.teress-es e pogr-to-s-Ie vtsta.
r-?.;*ffiíãl,lr,i"-'ári*ãaãWáríenoean(7gg6),StuartB.
extremos e, de outro, o fato de que elas experirnentavarn simultanearnente
processos de violenta incorporação no "sistema mundial moderno". Estas Schwartz escreveu que, num encontro que tiveram etn1970, Dean o
regiões possibilitaram a Davis explorar "experiências naturais" para advertiu dizendo: '-fenho cuidado, o problema com os historiadores
(p.
discutir a questão: "Em que medida q. transformaçã.o colonial do sistemq. coloniais é que eles sempre acreditam nos documentos que lêem"
15). O .orrr"iho, bastante sensato e extensíve1 a todos os historiadores,
de produção mudou o mqneira pela qual os fatores climó.ticos puderam
exercer sua influência?" (DAVIS, 2OO2: 29). deve ser seguido religiosamente pelo historiador ambiental, a quem
@q+=gZB-?=)'.e Eç-r4 q nç §llçesê o.q a
cabeesgri{[tl..pgiíe-g9gs-t-eppé-nS9*9-:"*f 9.t3qglS-o1raes"às\ll o"
,bgrraôha, as regiões ana-lisadas fazentpanéãê-üú mesmo grande bioma
terÍesrre, as florestas úmidas próximas da linha do Equador, que se
costuma úata.r como se fossem iáreas ecológicas homogêneas. Entretanto, ,- " -
f'Ã-iermãs â raiao decisiva para que . trabalho
é justamente a diversidade das espécies endêmicas e de suas relações "pisiémotóglõôs,
de campo sela con-siderado elemento essencial da pesquisa em História
com o hábitat que explica porque aplantation da seringueira deu certo
Ambiental pôd" t". enunciada da seguinte forma' Como o que lgleJg.q§4
na Indonésia e no Ceilão, mas fracassou na Amazônia brasileira.
àHistóriaÃmbientaléapqgl{-p.-!ic,1d-e§çd.-"-içlô1.aç-lig§--ç-!g.iB}§I#êg}"
$[pgg$el-rtge_S o, quando
fofiffiàeaO frist6rícá dos amUiêrites nôs quais vivem as sociedades, seu
necessário ao estudo, *gg.pfqg.Hãg gg3r-go=qsg. Pensar o espaço do
ôhâr-ãstá orientado para üm"tiiro de problema: as-§Iêgks' ora, a
passado, ainda que motivado por problemas presentes, não dá direito
ênfase nas conexões enúe os elementos que constituem as várias
ao pesquisador de desüncular-se das evidências coevas. E gSgçisplgl.gf l**a
dinâmicas socioambientais produz o efeito de fazer "emergir Q
a sério a historicidadg-das" formaqõ^gE*e.sJêc-rars. T
*Ft-@*,#
- à
importânciq d.o estudo das relações e faz ressaltqr a necessidade do
nas relaçõe.s" (HISSÀ 2AO2: 274)- O que significa dizer que.,*g,

6. Toma-se aqui o termo fisionomia no sentido utilizado por La Blache para se referir
às características fisicas dos lugares.
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"ràr_d.o

ãlã busca comprecnder.


f#eeàH"ffi tfu'?#'.m:#ÉtáÊl'a;ãi
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HISTORIA E MEIO AMBIENTE

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Também assinala-se aqui o papel fundaÍnental desempenhado pelo 1
Ern que ordern de idéios descrever essas impressões profundas e confisos
trabalho de campo para a potencializaÇão e o desenvolvimento d.a que assalto:m o recém-chegado numa aldeia indigena cuia civilização
capacidade perceptiva do pesquisado4 bem como de sua sensibilidade. perrnarleceu relativamente intacta? [...] Diante de uma sociedade
Disso depende a argúcia das observações. corno bem sabem os ecó1ogos, aindaviva e fiel à sua tradição, o choque é tão forte que desconcerta:
nesse novelo de mil cores, que fio se deve segtir em primeiro lugar e
tentar desembaraçar?

e 1qe+p.9-s_tqntqqsHi,uTq qg{Plç4gge j
o, pSrqq1§r_d,olq!,e_"u!
igi.drguggsggja-apre-erdsl-el*ógtsqdo-qPJ§tr"o:§9sg:-T.1'.:eerÍ
rem€urescerrtes. iábe o que deve ser vislo primeiro, o que é relevq+le q *o:qgggA9, e-. Nar;
O trabalho de campo não é novidade nem nas ciências naturais üêÍAãaê;lmüãíüni ponto dê'partidá pú_-á a observaçãg é atgdi
nem nas ciências humanas. A História Natural européia praticada nos traiçoeiro, poiíã rêãfidãdd-dãõ áliãilifiê-a"i Há {uã dirigii às coisas,
seres e relações do ambiente que se investiga uma atenção flutuante,
1:çy9"1 481 " plestigio e-r.iii6itidáae'ás expedições
Y.II :tl"riu que se fixa arbitrariamente aqui e ali, por um momento. Pode-se começar
científicas. No século XVIII, Domingos Vandçti-(f 735_-1_B_^.16_), lente das
iãiããiãi' com os aspectos imediatamente mais salientes: a distribuição dos objetos,
a e e uímic a s* tffii.Íáií?ãfti ã ú.,ffêiiiããã àãô c o imb r a, a
das plantas, dos animais, o zoneamento das atividades, os fazeres das
quem coube a formação " de uma geração de naturalistas para servir ao
desenvolvimento do Império português, escreveu sobre aquilo a que os pessoas, os modos de usar os recursos disponíveis- Urn assunto leva a
naturalistas deveriam prestaÍ atenção em suas "viagens filosóficas": 1) outro e logo o pesquisador se verá discutindo tipos e características de
a análise de todas as terras e seus principais constituintes; 2) o maduro minerais, plantas e animais, conformações dos territórios, reglas sociais,
exame sobre o estado dos bosques, matas e minas; 3) o conhecimento práticas econôrnicas, normas e valores, padrões de relacionamentos
dos metais e dos minerais; 4) o conhecimento de todas as plantas e seus interpessoais e outras facetas mais abstratas dos sistemas sociais e dos
diferentes usos e; 5) a análise de todas as águas. \r'andelri enfatizou ambientes que os suportam. Com sorte, ele saberá discernir as variáveis
ainda a necessidade do conhecimento "ísico e moral dos povos,,7" Como ambientais e sociais significativas para sua pesquisa- Com criatividade,
se sabe, porque estavam mais alguma experiência e a ajuda de outros especialistas, o historiador
ambiental levará a bom termo sua experiência de campo.
- t O trabalho de campo requer a paciência para observa4 de olhar,i
€'purutõãô;os-ladõíãvançarÉádrapôf ÉêAr-4Fãi§a'§êffi ffilaisagem,í
pássaro por pássaro, flor por flor. gstu -"itt"4e*"ã
encontrada entre os üaiantes apressados do século )O(I. Sobrava, todavia,
escravista imperial -, que apenas confirmam a regra. Afinal, esta .nffi fr ilãliffi ããffi êüiõ-ffi , t oinõ sáirft-tiT@ *, *
preocupação com as inter-relações entre seres vivos no ambiente e enúe * ltambém exise saber culrivar a amizade dos "rr.dffi{Jãbãíi;ffiÉã;",--
-"4rffiãih tom-invasivo effiffiiabalho
=
de campo
sociedades e paisagens não era uma questão para a ciência, até bem
avançado o século )OX. cria a necessidade do pesquisador adquirir e desenvolver uma cultura
geográfica, incluindo a capacidade de se orientar'
Então, a lista de Vandelli para orientar os trabalhos de campo de
nada serve? Não é bem assim. E1a aponta uma dificuidade real que se Decorridos mais de duzentos e vinte e cinco anos após Vandelli ter
apresenta no rabalho de campo. Sobre esta dificuldade, Lévi-strauss escrito a Dissertação sobre as ímportqntes regras que o filósofo
(1981) escreveu logo no início do capítulo sobre os Borôro, ern rristes naturalista, ngs sucs peregrinações, deve principalmente obser-var, há
trópicos; ul
pouco que aproveitar do "rol dos instrumentos, drogas e maisutensilios
(...) que são indispensáveis a um naturalista que vicria". Lentes e
,
microscópios, tenazes para apanhar cobras e insetos, armações para
7. Cf. PRES'fES, op. cit., p.77-7a.
apanhar borboletas, conchas e corais, martelos, machados, escopros,
.
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Marcos Lobato Martins HISTORIA E MEIO AMBIENTE t49'
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limas e serrotes, anzóis, escalperos, navalhas, espingardas, tesouras, L
para que este diálogo seja ampliado. Trata-se de aceitar plenamente o
alfinetes e agulhas, sondas pàra o mar e ragoas nãã têm sentido
na !-
seguinte: nenhuma disciplina tem precedência intelectual mrma terltativa
ffiü&*:i*l'-,H*,*âlx*"lm*m,:mffi
e : ,,1
tão importante quanto a de assegurar á sustentabilidade da üda humana
na Terra.
s***g{p-sws,kgs".
Hoje, entre os equipamentos A cooperação interciências é fundamental para a compreensão
que deve carregar o historiador li
t' dos temas e problemas ecológicos. Há consenso de que se requer esforço
ambiental, destacam-se os ap-arelhor
9-iç_lfQtfi="oC p-i"ni1tu.1iz"ao, qr" transdisciplina4 orientaCo para colocar em diálogo as concepções das
possibilitam fo.?gjle|_I, g ã_ir, Atpàài-"ãr"""i' rô;; a aônvérS as. No
p a s s a d o, os ããtii?ãrictàí vi àj áva
diferentes ciências, integrando e sintetizando perspectivas, possibilitarrdo
* ;;à ; p;-; há; ;á ;;;.ãã; ;;, a abertura paÍa o uso de instrumentos menos convencionais de pesquisa,
"riscadores". o ato de desenhar o que se obierva é, de certo
modo, embaralhando e dissolvendo as fronteiras das disciplinas. O diálogo
insubstituível, porque o desenhã pede mais contemplação, a
contemplação necessária para proporcionar refazer parte do ouie[o interciências frente aos temas e problemas socioambientais deverá
para consistir na troca fundada tanto no intercâmbio de dados, quanto de
melhor entendê-lo. Não obstante, os t"mpos sáo ortro, e a habilidade
de desenha4 por isso mesmo, é cada vez mais rara entre nós. O modos de ver os fatos, fenômenos e processos. Este diiátogo será frutífero
lugar se reconhecer a solidariedade das deterrninações de fenômenos
dos artistas "riscadores" foi tomado pelas câmeras ópticas ou digitais.
A imagem sisuda que a maioria das pessoas assôcia à ciênciã
ambientais, econômicos, ideológicos, simbólicos e políticos.
e ao No diálogo interciências, talvez haja um papel reservado para a
cientista corresponde mar ao pra.,er qr. álgr-us atividades realizadas
nos trabalhos de campo propiciam- o histãriador ambiental não História, embora n.ão se possa dizer que seja exclusivo dela. Lévi-strauss
der.e afirmou que "estamos condenados a viver e pensqr em yárias níveis e
se abalar com este fato. cabe-lhe afastar as hesitações, não temer
os esses níyeis são incomensuráveis. Há sctltos existenciois para possar de
: To-nle{Llqs*g-qP-egUgLo§-ê}LEs-gs p{gpgrcio4ados nela agradávet sensação; um clo olLtro"a. Por convidar à üsão integrativa, o destino da História é
palqagens urlq."r e rurais,, de rnergulhar nelas, de ouuii ,ár§4_
*u- ill:o-*q
p-:I§HLqI:,9.1§ identificar seus elementos. O prazer destrtq
estimular estes saltos. Ou, dito de outra forma, o papel da História é
it9*,
'empreltada não deveráltrqo":,
encher de culpa o pesquisaáói a ponto cle leváj
justamente o de ocupar-se, pioneira e provisoriamente, da integração
lo a duvidar se isso é mesmo um traÉarhà. rr*" lembrai a propósito, dos níveis de pensamento e de apreensão dos fenômenos.
que a vida dos naruÍalistas do século )ilX foi muito dura enquanro ,. Par-te deste papel da HistóriaAmbiental é fazer a crítica dos estudosÍ
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gcneralizanres sobr-e a.q-cologfa êl as_ popg-lgçpSS_4:g#õoúo q


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viajavam, mas eles divertiram-se bastante enquanto trabalhavam. **


q+Arriazônia ou a Nova Guin6, e1re_ tomam como rodos hoErsl&ê;1gffi =
iambientesesocied-adesg.g9ço*ii9-,+í$:Fjq!.cç-diÍã-iênêãeõjããffi t
'irHi;taA; t;iãiitãiiâõtstimutáiãaôsenvolvimenrode maiornúmero
de estudos sobre os diversos ecossistemas e zonas ecológico-econômicas
Ninguém duvida da relevância dos esforços que procuram
compreender as intrincadas relações entre as sociedades e seus mundiais, poderá ajudar as demais ciências a retomar e reavaliar
ambientes, nem das possíveis vantagens que poderão advir desse polêmicas teóricas, às vezes estéreis e paralisantes.
conhecimento para o enfrentu*ãrrto ào. ^grrr"s problemas É ciaro que os historiadores não poderão fazer isto sozinhos, sem
socioambientais senlsÍn orâneos. Atodas as ciências naturais e humanas o concurso de numerosos especialistas de outras ciências. A,flistória
é dirigido, hoje, um apelo no sentido de se dedicarem mais âp-b.is-rr-t-a1.Iãg.p-odBsefu rtar-asdidqegçpmaDemografi-4d;;iüii,Ab
profundamente à investigação das .,questões os estudos dás migrações), c.og-g*§..gs1gt9_fr]E9m etõtggiéa:teçofto_micse,
da üda,, no planeta.
A História Ambiental é, ao mesmo tempo, fruto etentativa de
resposta para estas inquietações ,.ecológicas,,. Sua disposição para
B. Folh« d.e Sõ.o Poulo, O3 de ourubro de 1993, p. 6.
participar do diiílogo interciências em torno dos desa-fios soãioambientais o O que..se tem em mente são esforços como os de MARTINET;ôJ_I.EB-r=J*qg,.S
contemporâ'eos é evidente. Mas há um ponto-base a ser respeitado SCHLUPMANN, Klaus. EcoLogiçal economics: energy, environment and society.
oYtriE-Bã]siÍTiiftÊffêrriisôô.-.-..-a:Y.:l*1....,+...--:-*..-,*.,{
. 50 . Marcos Lobato Martins HISTÓRIA E MEIO AMBIENTE .51 .

com as teorias do desenvolr.imento e da dependência, com as teorias do novas disciplinas na formação inicial do historiado4 obrigando-o a
Esr a d o, cõm à. G e o gra fi a ( d a b io ge gaTi à,-aã-geõiiiõiio I o gi a à àêo gÍffi ã estudar pacotes de conhecimentos da biologia, da geolc,gia, da
tiümàrã). No êampo das ciências narurais, a Éistória Ambiental deverá climatologia, da fisica, da química, etc. Sem dúvida existe a necessidade
dialogar principalmente com a Climatologia, a Ecologia, a Geologia, de reforçar a capacidade do historiador de compreender a cultura
a qal99gà1ogi+". u.,Qlologil {a E}i{iiãôl*-**'
" "';'**-" material das sociedades, os processos de influência recíproca e de
Mas nãõ§erá um diálogo fácil. Dos dois lados, tanto das ciências transformação que modificam os aparatos instrumentais e técnicos à
naturais quanto das ciências humanas, há lacunas importantes na disposição dos povos, nas diversas regiões e épocas. A familiaridade
formação dos especialistas que criam obstáculos e ruídos portentosos com os temas, os métodos e os resultados da História da Ciência e da
na comunicação. Há poucos cientistas naturais com formação histórica Técnica é um imperativo para os pesquisadores que se dedicam à
e/ou sociológica. Há poucos historiadores e cientistas sociais com História Ambientallo.
formação em fisica, química, biologia e geociências. Mais do que a ori, determinar
formação básica em ciências naturais, falta aos historiadores, em geral, r nas clenclas
até mesmo a disposição de ler as boas obras de divulgação científica específico, rlecidirá
escritas por físicos, biólogos, ecologistas, geólogos, etc. O inverso é ãs "co]heitas nas hortas
verdadeiro, a despeito do apregoado sucesso editorial da chamada "Nova
História". Portanto, a existência e a extensão destas lacunas de formação
dos especialistas agrava as dificuldades da ação interdisciplinar ou recuperem a simultaneidade e a articulação entre os planos empírico e
multidisciplina4 o que contribui para a reafirmação de "territorialidades teórico, excluindo o impróprio pela crítica, fomentando o debate com
científicas" e corporativismos danosos. outros especialistas. Uma epistemologia que convide e oriente ao rigo4
Atítulo de exemplo dos riscos que surgirão no debate interciências flexível para encontrar os procedimentos que dêem conta do objeto
promovido pela História Ambiental, pode-se citar os reducionismos pertinente e que responda às suas exigências. Um modo de produzir
difundidos poÍ correntes como a sociobiologia e a biossociologia. Será conhecimento que também inove no material utilizado e reabilite a
preciso lutar contra os que pretendem deduzir toda a vida social (e as imaginação, controlado pelo trabalho crítico do pensamento sobre si
relações entre sociedades e naturezas) da ecologia, da adaptação, da mesmo. No decurso da pesquisa, à medida que se constrói o método em
evolução e da seleção naturais. Rejeitar os determinismos genéticos e direção ao seu objeto, emergirão as oPortuÍridades para os diálogos
neodarwinistas, incapazes de compreender como as faculdades com os saberes acumulados pelas disciplinas das ciências naturais e
simbólicas dos homens e a produção de seus meios de existência agem das ciências humanasll. Estas oportr:nidades terão que ser aproveitadas,
sobre o modo de instalação e de reprodução de uma sociedade em seu ainda que pareçam desconcertantes as introüsões teóricas Porventura
ambiente. Contra certos geneticistas e biólogos evolucionistas, os encontradas no caminho.
historiadores ambientais terão que reafirmar que o ser humano é o
coqjunto de suas relações sociais, como já o fizera Marx. Também haverá
combates contra certas posturas de militantes de movimentos'!rerdes",
que se encontrarn demasiadamente inclinados a aceitar que o ambiente, 10. Na ampia maioria das graduações em llistória existentes no Brasil, a História da
de forrna todo-poderosa, desempenha um papel superdimensionado, Ciência e da Técnica não é sequer uma disciplina que consta na lista de optativas.
no sentído de que as variáveis ambientais teriam poder explicativo os grupos de pesquisa vinculados a esta área ainda são muito reduzidos e contam
com pouca üsibilidade. Esta situação, para o avanço da História Ambiental no
determinante. país, deverá sofrer aiteração radical.
O diálogo da História Ambiental com as ciências da natureza 11. Vêja-se o conhecido episódio envolvendo o historiador Warren Dean. Para escrever
deverá se materializar numa atitude de curiosidade, interesse e aberrura seu iiwo sobre a perda do monopólio da produção da borracha pelo Brasil, diante
em relação aos temas, métodos e técnicas das disciplinas que estudam dos competidores asiáticos, Dean adquiriu familiaridade com botânica, ecologia
e ourras ciências ambientais, estudando no Jardim Botânico de Nova York, nos
a üda, o planeta e seus variados biomas. Não se pretende introduzir anos 198O.
t
--
ç.

. 52 . Marcos Lobato Martins


'*
HISTORIA E MEIO AMBIENTE . 53 .
*
r
E
Em particular, neste ponto da convém ressaltar íP eficácia. Assim, o historiador ambiental não precisará renunciar a
tilidade a Históri É influenciar o curso dos fatos econômicos e políticos.
i Enfim, que fique claro. O projeto da HistóriaAmbiental somente
f:
florescerá no terreno cultivado zelosamente por urna filosofia da
de massa - sobre os processos socioambientais, as paisagens, seus x
í interdependáncia entre os diversos campos do saber.
elementos, inter-relações, ritrnos e transformações, Í
tr**bém sobre Ê

"o*àenvolvidas e os
o modo de uso dos recursos, as concepções e as técnicas
1

impactos ambientais resultantes" REFE RÊNCIAS Bt BLIOGRÁTICAS

BECKE& Berta K. A Amazônia pós-Eco-92.In: BURSZTYN, M. Para


pensar o desenvolvimento sustentáveL São Paulo: Brasiliense,/
IBAMA,/ENAP,/PNMA, 7993. p. 729 -7 44.
tenta.tiva de compreender a complexídade, significand_o a sua
aproximaçã-o com os humanidades e as ciências sociais. Em outra-s CLAVAL, Paul- La región: concept géographique économique et culturel.
palavras trata-se da neqas:ão da dívisão gntagônica entre-g!ê.n!:iq In: Revue Intentationqle des Sciences Socioles. Paris: UNESCq (712):
e
-h-\mttnidQd cç e o reconhecirnento d;m 779-792,7987.
§
alte.rnatiya em que a ação do homem pod.e ser eficaz paraforjar seu
próprio destino (BECKER, 7993, p. 74O). DAVIS, Mike. Holocqustos coloniais: clima, forne e imperialismo na
formação do Terceiro Mundo. Rio de Janeiro: Record, 2OO2.
Nestes tempos de crise global, nos quais se destaca a preocupação DEAN, Warren. Aferro e fogo: a história e a devastação da Mata Atlântica
comas alterações climáticas produzidas pela emissão de gaies de efeito- brasileira. São Paulo: Companhia das Letras, 7996.
estufa, a História Ambiental lida com temáticas de aJta voltagem. o . Alutapeloborrachqno Brasil: um estudo de história ecológica.
historiador ambiental será colocado, inevitavelmente, no centro das ãisputas São Paulo: Nobel, 7989.
entre governos, populações, ernpresários e movimentos sociais em torno
DIAMOND, Jared. Armaq germes e aço: os destinos das sociedades
dos graves problemas ecológicos. convém, portanto, dizer argumas parawas
sobre a posição do historiador no transcurso destas disputÃ. humanas.5. ed. Rio de Janeiro: Record, 2OO4.
Não se deve temer a relação que os historiaàores ambientais FEBVRE, Lucien. Lq. terre et l'evolution humaine: introduction
deverão estabelecer entÍe a compreensão dos processos e a contribuição géographique a l'histoire. Paris: Éditionelbin Michel, 7949.
à mudança. Abandonando falsas neutralidades, o historiador
ambiental fnÉUONT Armand. La région" espace vécu. Paris: PlJf,, 1976.
poderá tomar partido e fazer propostas. cumpre apenas que isso HISSA,, Cássio Eduardo Viana. A mobilidq"de das fronteiras: inserções
seja
feito obedecendo-se a uma indispensável precâuçaor o ao que é da geografia na crise da modernidade. Belo Horizonte: Editora
"rr,rdo
deve ser separado do estudo do que deve ser. o momento de compreender UFMG,2OO2.
não pode ser subordinado a pré-concepções, ideais e doutrinas. o
estudo LANDES, David S. A riqueza e a pobreza das nações. Por que algumas
dos processos socioambientais deve separar os fatos das ideoiogias
do são tão ricq.s e outrqs tã.o pobres. Rio de Janeiro: Campus, 1998.
desejável, desideologizar o objeto de eitudo. os juízos de valor
ficarão
reservados para um momento posterior à compreensão, gerando LENCIONI, Sandra. Regid.o e Geografia. São Paulo: Edítora da
tomadas
de posição p-ropositivas fundadas na compreensão perã revisão Universidade de São Paulo, 1999.
crítica.
A maneira de Weber, num primeiro movime.rto á dos LÉ\T-STRAUSS, Claude. Tristes trópicos. Lisboa: Edições 70; Sáo Paulo:
"o-preensão
fatos e processos, através do distanciamento conceitual e de uma visão Marrins Fontes, 1981.
holística; num segundo momento, o direcionamento para aprática
sociar
para permitir o surgimento do que deve ser, com maiores
chances de
. 54 .
Marcos Lobato Martins

LIPIETZ, Alain- uma üsão regulacionista sobre o futuro


da ecorogia
urbana. Cader-Íaos IppUR, fuo de Janeiro, UFRJ, ano WII,
n. 1, abr.
L994, p. 10.
NORTH, Douglass c. rnsrrffiions, Institutionctr chonge
and Economic
Perforrnance. Cambrid ge University press, I g g A
-
. Stracture and Change in Economic Histoty- New york:
W
W Norron, 1991.
SAHLINS, Marshall. socied-ad.es tribais. Rio de Janeiro:
Zahar, rg1o.
SANTOS, Milton. por uma Geografia Noya. São paulo
: Hucitec/Edusp,
7978.

As fontes da História Ambiental


O estudo das inter-relações entre as sociedades e as
naturezas, na perspectiva da HistóriaAmbiental, ancora-se numa grande
variedade de fontes. Muitas destas fontes são de uso já consagrado no
ofício do historiador, enquanto outras configuram aquisições
reiativamente novas. As fontes consagradas - os registros escritos, a
iconografia e os vestígios arqueológicos - precisam ser relidas à luz da
problemática típica da História Ambiental. As novas fontes, destacando-
se as próprias paisagens, requerem, para sua utilização, estratégias
específicas de observação e interpretação, cuja construção é parte do
trabalho em desenvolvimento na disciplina. A maneira de lidar com
esta fonte priüiegiada, a paisagem, também exige a abertura de di:ílogo
com especialistas de outros campos das ciências naturais.
De princípío, convém observar que a História Ambiental enfrenta
duas dificuldades quanto a suas fontes. A primeira delas é a de que as
sociedades, de modo geral, são pouco atentas às tralsformações que
ocoÍTem no seu ambiente. Os homens costumam observar e registrar
preferencialrnente os er/entos extremos ou e)ctraordiniários, descuidando
das variações infinitesimais que se acumulam no dia-a-dia. A segunda
dificuldade está associada à escala de tempo das transformações
ambientais. Muitas delas só são perceptíveis na longa duração, mas é
bastante raro encontrar registros históricos que cubram as numerosas
fases destas transformações de ionga duração.
Seja como fo4 aos historiadores ambientais resta o desafio de
inventar as fontes que podem üabilizar a discussão de seus novos
problemas. A intenção, nesta parte do texto, não é produzir um
inventiírio exaustivo das fontes usadas na História Ambjental - uma
. 56. Marcos Lobato Martins
HISTÓRIA E MEIO AMBIENTE .57.

tarefa, aliás, sem sentido prático. o que se pretende é fazer alguns


comentiírios sobre tipos de fontes que têm grande valor para a pesquisa sobre as fisionomias de porções territoriais, os modos habituais de
ambiental brasileira e, sobretudô, dir.rli, o papel [r" u História aproveitamento dos recursos disponíveis, as dificuldades de
Ambiental deverá desempenhar na luta pela pioáuçãó qualificada e implementação da legislação conservacionista referente às espécies úteis
democratização das informações ambientais nà país. de plantas e de animais, etc., bem como comentários, muitas vezes
maliciosos e distorcidos, sobre os gêneros de vida das populações
A diversidade das fontes: potencialidades e lirnites regionais.
As atas dos Senados das Câmaras contêminformações importantes
As sobre os processos locais de inter-relação sociedade-ambiente. Os
registros das Câmaras fornecem dados sobre as fazendas e sítios, as
e$-Usolórgicos-, os
sociedades trariicionais ou de grupos particulares inseridos nas iociedades ãEÍidades artesanais, ôs serviços de lawa, os camiÍrhos e trilhas usados
complexas, colhidos por meio de entreüstas, e as próprias paisagr:ns por tropeiros e viajantes, os problemas do abastecimento. Os códigos
são as principais fonres mencionadas nos trabàIffiãã;Eistoriadores de posturas retratam os cuidados que se tinha, ern cada época, com a
ambientais- ordenação urbana e a boa utilização de recursos como as águas, as
os registros escritos empregados para a análise ambiental são, matas, os pastos, as estradas. As corresp--o;tdências das Câmaras para
por sua vez, muito variados. constituem documentos de interesse também as autoridãd"r rrp"5gpgrruràuffiffiã'
Para outros campos da pesquisa histórica, como a história da ciência e
rffieradores, solicitações de ajuda pata fazer
da técnica, a história econômica, a história agrária, a história urbana face às conseqüências de eventos climáticos e para iniciar a exploração
e a história do cotidiano e da vida privada. Trata.se, dentre outros, de de novas partes do território ou de novos recursos naturais, descrições
isos de das medidas de socorro tomadas pelas autoridades locais diante de
as, relajos de via"i-anles,
viai obras de secas, inundações, epidemias, etc. Os camaristas também discutiram
-fuggnua*eqoogtdrias d.''. r,'ffi ç*fu ;iã problemas de degradação de cursos d'água, de esgotamento de solos
govemaJnentais. Fazendo releituras da documentação antiga, aos diririos-
de rriajantes, de obras literérias, enfim, reexaminanao ,r..,."mãÃá agriculturáveis, de escassez de lenha, de higiene e saneamento, cujo
clocumental variada, os historiadores podem rerirar informações sobre interesse para a História Ambiental é eüdente2.
o meio ambiente e as relações do homem com a narureza, concernentes De natureza semelhante à documentação que foi produzida por
a diversos períodos da história. rem,
No Brasil, os estudos de História Ambiental, relativos aos séculos
xYI[, )ilX e )o(, lançam mão de considerável quantidade de registros ê que caracteriza o terri o bras A documentação
oficiais. Nos relatórios de governadores de capitanias, de presidentes oriunda dos camaristas possibilita análises menor nível de
de Proúncias e de Estados, podem ser encontrádas informuçõ.r, quase agregação dos dados.
sempre dispersas e fragmentadas, sobre a marcha do povoámenro, os Pode pareceq à primeira vista, que não faz muito sentido prestar
usos econômicos do território, as técnicas do trabalho agrícola e mineral, atenção aos i@ para estudar as interações
os recursos naturais explorados, as expedições de "desbravamento,, sociedade-naf,ireza. Esta impressão é, na verdade, um grande equívoco.
realizadas em rios e áreas florestais, os contatos com os grupos indígenas, Os inventários são documentos que, em primeiro lugar, permitem a
as ocorrências de grandes enchentes e secas, etc1. Nos livros de ofícíos construção de séries históricas de dados de interesse paÍa a análise
e correspory!ências destas eut-qridades também são ambiental. Em segundo lugar, estes documentos distinguem-se pela
fu--.--*:q--- "ncõãEáffi

1. As considerações feitas sobre a documentação produzida por governadores podem 2. A documentação produzida pelas Assembléias Provinciais,/Estaduais e pela
ser estendidas para os Ministérios, a coroa e a presidênúa dã República. Assembléia Gerai,/Congresso Nacional também atrorda questões similares, com a
diferença óbvia da escala regional e,/ou nacional do enfoque.
. 58 . Marcos Lobato Martins . 59 .-
HISTORIA E MEIO AMBIENTE

riqueza de inform A partir de fins da década de 184O, estimulada pela pres:ns1lo


@--ef -Quinaurenlo;Ç*e-ggo,{ggggEt;çqs&6 IHGB (Instituto@ileiro), aprodu(ãõcientífi.ca
tIg!ro,- as pJáticas 999nQrylqgs diversas desenvolvidas pelo 6íãsiteÍf-a-ãdfrffiü"ffiãffiffi e monografias sobre
invãããffiao e asEra4iffilffiãããtãe de crédito) com ouúos agenres regiões do país, analisando aspectos de sua fisionomia,'história,
econômicos, vizinhos ou não. Ao possibilitaruma espécie de mapeamento demografia e cultura, foram escritas por pessoas com as mais diferentes
local do uso da terra, da produção e da troca, os inventários tàrnam-se formações (médicos, engenheiros, advogados, escritores-jornalistas,
fgls*::,iTgl1§-p gra§"*.-""^*preender or dadoffiffiômice§ -qse padres, naturalistas, etc.) e enüadas ao IHGB. NaRevrsra Trimensaldo
incide4ffi ffi iõõe_5sqje-{o;J4sçãp._d-g_arnbie,nte.
-:- --5-:
-- IHGB, cujo primeiro número apareceu em 1839, o historiador ambiental
Bem mais numerosos a partir de fins do século xvIII, os trabalhos encontrará informações sobre a natureza e a presença do homem nas
(memórias, dissertações) elaborados por funcionários e emditos a serviço
diversas regiões brasileiras, reunidas conforme o "estado da arte" nas
dos governos e as narrativas de üagens são importantes para as pesquisas
diversas disciplinas de especialidade dos sócios e colabora.dores do
da História Ambiental. os relatos dos viajant.s ierão Instituto. Ressalta-se que a volumosa producão do IHGB Draticamente
abordados no próximo item. Embora não tenham"rúangeiros
a fama alcançada dominou a cena científica
pelos textos dos viajaltes estrangeiros, há muitas memórias e relatórios
ãã=êãu6ffi F"?ilõffi ffi ,aÇ ã;;ã?ã" * as i ns ti ru i çõ e s
elaborados por determinação oficial que interessam ao historiador públicas que acolheram estudos"".st* sobre as mais diversas paisagens
ambiental dedicado a estudar o Brasil3. Em geral, estas memórias e regionais, a exemplo do Arquivo Público Mineiro (fundado em 1895) e
relatórios riveram sua produção motivada por decisões muito específicas: do Arquivo do Estado de São Paulo (criado em 1891, mas cujas origens
o Estado queria promover a exploração de novas partes do território e
remontam ao século XVI[).
de recr:rsos naturais valiosos; a necessidade geopolítica de esquadrinhar
AoladodoIHGB,o]{S:gg§-eç-ç_g3J,1fri.qd9*p9r*D*o:mJoãolIlem
áreas fronteiriças e defendê-1as adequadamente de potências rivais; a
modificação de padrões (técnicos, Iegais e organizacionais) da 1êl§. possuía prestígio equivalente e dedicava-se à história natural. O
Museu Nacional reunia acervos de antiguidades, de espécies dos três
exploração econômica de certos recursos, visando reverter quedas nos reinos da natureza e artefatos indígenass. Na sua "idade de ouÍo", entre
rendimentos obtidos. 1876 e 1893, os funcionários e membros correspondentes (nacionais e
Estes relatórios e memórias contêm descrições detalhadas de estrangefuos) estudavam anatomia, zoologia, botânica, agricultura, artes
aspectos físicos de diversas regiões brasileiras, das técnicas agrícolas e
mecânicas, mineralogia e geologia, arqueologia e usos e costumes das
de mineração empregadas pelas populações, da legislação e dos nações modernas. Os trabalhos eram publicados no periódicoArquivos
impostos referentes às atividades econômicas e dos problemas que do Museu Nqcional. Até hoje um dos mais importantes centros de
afetavam os rendimentos das lawas, plantações, criaçáes e indústrias pesquisa do país, o Museu Nacional possui acervo e muitas publicações
locais- construídos geralmente numa perspectiva utilitária, preocupada
de interesse paÍa as análises ambientais.
com a ampliação imediata da riqueza do Estado, estes textos trazem
O mesmo se pode dizer sobre SJp"Iggggeglqenic-a.e.Srsgtífic dos--
também informações sobre minerais, plantas e bichos e sobre modos
institutos agronômicos criados oor Dom$lgfl. O imperial Instituto
de relacionamento das populações com seus ambientes. por isso, os
relatórios e as memórias redigidos p__o.1p-g':çg.*s**Assrytga_da-*Cqvsfno§4 ffi;Tu"Aãàôã*Tgsg, e que originou a Escola
Agrícola da Bahia, a mais antiga faculdacle de agrgnomia brasileira
ãã*?;;;; basranre (funcionando até hoje no.município de Cruz das A1mas), realizava e
empregadas na pesquisa da história ambiental brasileira, ao lado das
divulgava periodicamente estudos sobre a situação das lavouras e da
narrativas dos üajantes estrangeiros.
pecuária na Bahia (SZMRECSÁNYI, 7990:5O). O Imperial Instiruto

3. Como exemplos destes textos, citam-se: COUTO (7994), memória escrita em


7799; e CUNI{A MAIOS (1979), trabalho escriro enúe 1831 e 1837. 4. Sobre o IHGB e seu período áureo, ver GUIMARÁES, L. M. P (199s).
s. cf. LoPES 0997).
. 60 . .61 .
Marcos Lobato Martins HISTÓRIA E MEIO AMBIENTE

Fluminense de Agricultura, criado em 1860 e que incorporou o Jardim pela ideologia do "progresso" calacterística do Oitocentos, analisaram
Botânico do Rio de Janeiro, editava uma reüsta trimestral, cujo primeiro ã situação da economia, da sociedade e do espaço, tanto no plano
número veio a público em setembro de 1869. A circulação regular desta local como regional e nacional, diagnosticando os problemas que
revista ocorreu até o final do Império. Em suas páginas, que serrriram reduziam avelocidade da modernizaçáobrasileira e propondo medidas
para orientar os fazendeiros da época, registrou-se a memória da para solucioná-los. Nas matérias da irnprensa, descorrina-se, ainda que
-parcialmente,
produção técnica e científica da instituiçáo (idem, p. 51). Por sua vez, a visão das elites letradas nacionais, regionais e locais
o IAC (Instiruto Agronômico de Campinas, inicialmente chamado de iobre a terra e a gente do Brasil. Os jornais e as revistas contêm,
Imperial Estação Agronômica), criado em 1887, transformou-se no portanto, muitas informações ambientais e elementos constitutivos do
principal centro de pesquisas agronômicas do Brasil. Seus trabalhos, imaginário de certas camadas sociais brasileiras sobre a natureza e as
voltados basi.camente para a experimentação das variedades já relações dos homens com seu ambiente.
cultivadas em São Paulo, novas práticas agrícolas e controle de pragas, e.-rç-@ali-asê para a história ambiental'
foram divulgados anualmente, nas Coleções de Trabalhos Agricolas principahóãi estrangeiros e brasileiros
(idem, p.53). f izei?Írrsranae-quFre4é-sa\uç'á§ç-4F$§aç4*P$!?8§*4*f :
trabalhos de Debret
do Brasil. Tomaram-se célebres os
No campo da mineralogia e da mineração, os professores e
esrudantes da Escola de Minas de Ouro Preto, fundaclã efrffi]fior ffiq"rffio"fã a" Rugendas é mais suave, os dffififfiõ§"
ãrôrffo*n Eàd áãõ im Êãã ãire ma-ii;@ s e s rud o s de Debretretratam uma natureza exuberante e agfessiva, destacando a
sobre a realidade mineral de Minas cffi a matafechada, a enorrne dimensão das árvOres, com se{pentes enroladas
mnêrãIõEIã, ípôiitiêãTáiniô?ã;ãTiããruifrã,'â'iíetalürgia e a extraÇão nos troncos, os animais selvagens à espreita e os índios ameaçadores.
mineral tornaram-se temas de investigações amplas na Escolade Minas Ambos compuseram imagens sobre os escravos e as atividades exercidas
de Ouro Preto, talvez o mais destacado centro de ensino e de pesquisa por eles no país. Também registraram comportamentos, roupas,
nestas ríreas até a Segunda Guerra Mundial. Por conseguinte, a produção Ll"trr"r,tor arquitetônicos e decorativos, utensílios domésticos e
desta instituição, e de suas congêneres mais recentes, também é fonte instrumentos de trabalho. As plantas, os animais e as pessoâs que Povoam
muito relevaÍrte para as pesquisas ambientais. as imagens de artistas como Debret e Rugendas, que {ffi]§p€ro.S§S
Outro conjunto destacado de fontes impressas para a História e Daisasens do Brasil dos séculos XVIII e )CX, interessam de perto ao
Ambiental é representado pelas coleções de jornaisS_feyfstas publicados ffi ã-ri ês m=ífó rrn a,têVe - s e mencio nar arristas d a
no país. lvtuitos municípiàs brasileiros, dm Academia de Belas-Artes do fuo de Janeiro, denrre os quais ![gg*gf
l<:,-=:h

t-EEg-IlX, possuíram imprensa ativa. ffiã-ãs


_ .-l-:--- -
Meirelles. Acadêmicos, influenciados pelo Romantismo, eles foram
revistas, dotados de orientações editoriais e políticas as mais diversas, ãüiõfêfa. conhecidas pinturas históricas, nas quais registraram uma
foram publicedaf.Ug!í,çiagSShÃe eventos climáticos exrremos (secâs, natureza exuberante, grandiosa, exótica. Uma natureza viSta sob ótica
.----'-#----:-*
inúntações, enchentes, deslizamentos de encostas etc.), epidemias, negativa, porque produtora de influências nefastas sobre a formação
movimentos acentuados de populações, @ biológica ô moral da população. A hegemonia desta pintura acadêmica
apropriacão e do uso de recursos naturais e as ***."*e"*'Jw
acões das autoridades só seiia destmída pela emergência dos qgqe.iPlql1 ."9§ ?'q-q.1-P
F%i.ff
Curiosamênte, os modernistas - a exem ale
oara impor a ordemT. Com a intenção de educar os ieitores, a irnpçensa
divulgava as descobertas científicas e os aperfeiçoamentos técnicos na cândido Portinari - também fizeram das plantd;; dos animais, das
agricultur4 mineração e industria- Os homens de imprensa, impregnados pà;."«ffi;ãffienre os mesriços) e das paisagens do Brasil elementos
positivos para a construção de uma identidade nacional' Ora, tudo isto
ãobcado ãm jogo pelas pinturas e gravuras é de inegável interesse para
o historiador ambiental.
qtlg.qhggs! Lqr
6. Para mais informações, ver CARVAIHO (2OO2). e_p*gc-t4lg#.J brasileiro tem ainda a fg-tg"Alâf,3
7. Um exemplo de trabalho que utiliza bastante a imprensa como fonte é o estudo de ,nulã-{
VILLA (2OOO) sobre as secas nordestinas nos séculos )CX e )O(
. 62 .
Marcos Lobato Martins HISTORIA E MEIO AMBIENTE . 63 .

aruando na Corre a partir da década de 1B7O seguiam os


§5*: - Antes de passar aos coment:írios sobre os relatos de viajantes
:anon:s 9, B+qr.g ."Ta+lr.a e propagandiavam as Lqgg_A§5ãGÊ.dfu estrangeiros que percorreram regiões do Brasil no século )CX, é bom
4e_Jsn!_té;1o,.e"tqgd_"S_çSpe&Af eqt:lç-pçlpt-çr_rité:-,*ó"ãÃa_ec,àãffi assinalar a-]gumas observações sobre limites e dificuldadel*gg-e,
"9-.98o-cSrr-tqs: na Bahia, havia linde44eryr; em pernambuco, slêàL qffi
çe5egt efiz-err-r- cr-4ir g e qs*tr Biç §-- ligi+ae§. n rn a i i ãüà en te d âs
em Minas Gerais,
$*çd! em São pãiq H_ó_e3qn. Embora a maior parre cautelas que se deve ter ao
-A
trabalhar com as fontes antigas - no caso
da produção aos ffü§fafos fosse de ráüutos, há considerável
número brasileiro, anteriores aos anos 1930 - refere-se à percepção, por parte
1" {eggtgl_d.9_naiq3Sens urbanas e rurais. No sécuto }o(, a protusão do pesquisadoq de que é tardia a cornpreensão do inter-relacionamento
oe rrnagens totográficas, cinematográficas e te@
dos elementos que compõem o ambiente. Somente com o aparecimento
havendo grande quantidade de fotógrafos e documentaristas que
se das primeiras reflexões da Ecologia, no ú1timo quartel do século )il)Ç
especializaram em captar imagens da natureza e das paisàgens
os estudiosos começÉrrtrÍn a observar e procurar explicar as inter-relações
esp.alhadas pelo país..os
ryjr9-IlglspJ,h]j_.$g11qp,=u_q-_tçyr-s-f,as*eá,-o,g#f,ffi§, das coisas e seres que constituem o ambiente. Começou, então, a surgir
os@jslsÊs-o,qaÉvs§,ãscãrároãó!.déãÉ;içdá;ã;;fi ãiEiGru; a idéia de "dano ecológico". A tentativa de avaliar a extensão destes
geraram imensa iconografia. Esta massa de fotograiias"àntigai
e danos e de formular ações mitigadoras é ainda mais recente. No mundo
modernas é fonte para a História Ambiental.
industrial avançado, somente na década de 196O os governos e as
ú Os {çp-o-r1nqnlos de pessoas integrantes de sociedades ou de
smoos t .; empresas começaram a produzir os chamados "relatórios de impactos
u- [sociais específicos, obtido" por -"io das técnicas da históri; JJ {, '-
*' tambem constiruem fonres para a HisróriaAmbienral, ambientais" (Rimas)- Por conseguinte, nas fontes dos séculos XVIII, )CX
jogo o gstu:do dg p{oc_gssqq
quãããftiiãH t e início do )OÇ as informaçôes ambientais são apresentadas de modo
socioambientais mais ou menos recenrês fragmentado e as influências ativas e recíprocas entre as variáveis
Especial mente ú tei J parà tl à, i ããmã úg"çã d" ;"p***ffi
aspectos simbólicos dos imaginários-";;
ambientais permanecem desconhecidas, ou, na melhor das hipóteses,
sociais, as" técnicas da hiitória consideradas de modo bastante superficial.
oral possibilitam o acesso do pesquisador ao iepertório de narrativas,
Outra cautela que
Eiet ilglglg que os glup,gghumanos, no rad ame nre os sqsa lternos. e ao detalhamento das informacões contidas nas fontes antigas. Mesmo
c_onstro em sobre a n qlq{-eg1-ç- i§ :elaçõ*es d a s o cie d ad
vffimp*ãfi5ffi " "*
L,rprESu u.a ,rslorra orar nas pesqulsas cle Htstória "Ambiental
forma efícaz de tornar concreta a posição segundo a qual deve_se
ã
"*Éi*iã.
é uma
com o av€rnço do discurso sobre a "objetividade" do saber cienrífico nos
séculos XVIII e )(X, na linha ditada pelo modelo mecanicista-positiüsta,
os estudiosos e observadores da natureza e dos ambientes dispunham
"incorporar apluralidade axiotósca e a diiersid.o.ãe currurat naforrnação
de poucos recursos para produzir e analisar dados quantitativos. Esta
do conhecimento e na transfurrnação da rearid.q.de" (LEFE zôo+:
ot). situação fica evidente nas descrições das paisagens - o tamanho das
Afinal, qgg:*gpjerivos da História Ambienral é revalorizar os
áreas, a variedade das espécies minerais, vegetais e animais, as cifras
Sglts-TIS
conhecimentos-indrsãr;áiãê ât*;fÀã '#ãiit âãlãmr* ;==*}:;i;=;: ^
Ssglas gs,E_baɧ*m*Têsbfo=ãüãi6spdiãire.""té,
culturas em súá co-evolúêão côm aÀãíi."r^
demogriificas, os volumes da produção econômica e das trocas, os níveis
de extração,/consurro dos recursos narurais, tudg é_aboldq{g ggqglr49qlg
4§,*pêts-ggçns completam a lista das principais fonres da História vaga, impressionista. O que dificulta para o pesquisador
de maneira*--l:'_,i___A:
contemporâneo a elaboração de avaliações e de projeções relativas a
quadros ambientais do passado.
Esta dificuldade aparece claramente quando se lida com as
catástrofes ambientais de ontem. Para casos antigos de tragédias
ambientais, como o terremoto de Lisboa mencionado no capítulo
anterior, os cientistas dependem de referências históricas dispersas e
não podem contar com dados de qualidade suficiente para fazer um
estudo mais refinado do evento. Causas e dinâmicas das tragédias
8. Para maiores informações, consultar FABRIS (7ggg). ambientais ficam sujeitas a interpretações marcadas por elevado grau
. 64 . Marcos Lobato Martins . 65 .
HISTORIA E MEIO AMBIENTE

de incertezas e vfutualidades. Basta ver a controvérsia que é criada em para discutir o Catarina elaboraram um documento no qual
torno das informações sobre a mortalidade provocada pelos desastres recomendaram o estabelecimento de um sistema de bóias em alto-mar
ambientais ocorridos no passado. Nestes episódios, só se pode falar em e de uma rede de estações meteorológicas na costa brasileira. O que
níveis de grandeza. Maior precisão é quase impossível. Há duas razões significa que, mesmo no início do sécu1o )O(, ainda persistem problemas
para explicar esta dificuldade em paÍticular. Aprimeira está relacionada para a produção, na quantidade e na qualidade adequadas, de
à sobrecarga das autoridades que enfrentaram estas catástrofes. Elas informações de interesse ambiental.
não conseguiram manter registros precisos ou realizar recenseamentos Outra cautela importante que se deve observar ao manejar as fontes
de amostragem. Asegundatazáo prende-se ao fato de que era comum altigas, produzidas por eruditos brasileiros e estrangeiros, naturalistas,
registrar grande número de mortos, vítimas de epidemias, de conflitos artistas e funcionários dos goverÍros, diz respeito à atenção que se deve
pós-desastre ou de revoltas disparadas pela ausência de socorro ter com as "distorções". Estas pessoas não eram particiPantes diretos na
govemamental, depois do anúncio oficial do fim da catástrofe. Disto constÍução cotidiana que observaram em diferentes regiões do país e,
resulta uma tendência de subestimação das perdas humanas ocorridase. em função disso e de sua adesão irrestrita a uma determinada üsão
O historiador ambiental não pode perder de vista o fato crucial de européia de "civilização", elas não puderarn compreender perfeitamente
que a produção sistemática de dados de interesse ambiental é o ambiente, as relações sociais e os valores que observaram. Este ponto
relativamente recente. A elaboração e divulgação sistemática e será discutido mais longamente nos comentários sobre os textos deixados
abrangente de informações sismológicas, meteorológicas e de estatísticas pelos viajantes estraÍrgeiros.
ambientais diversas (sobre desmatamento, erosão de terrenos e
assorearnento de cursos d'água e baías, frentes de desertificação, volumes ambienral brasileira/
I O. tu*tos dos naturalistas e a história
,*_*-*-=*._-_
de emissão de poluentes, redução de cardumes e populações animais e
vegetais, listas de espécies em risco de extinção, etc.) começou somente osretatosd"*-"_1ggç,*:.j9r:.9-l*pSleq*vlaiep!&:=_+Lttil3l1Ê-t-4§-
nos fins do século )ilX. O exemplo da meteorologia é esclarecedor. Os .*",@ - t-,,1 i"-r^:
estransejÍqs-qlepercõ-LtúáIr]!-rias[gg§-i*ç"9]"-o,*,Xlxsãomuito
#,+ffi ----:---.*'.i.-n+E+.#
primeiros serviços de previsão do tempo, empregando estações terrestres effiregados peloi historiadores em géral, e pelos praticantes da História
para medições e o telégrafo para a transmissão de dados, surgiram na Ambiental em particular. Apenas para ilustrar esta afirmação, Bgblg
Inglaterra (1861) e na França (1863). Somente nos anos 1960, com o *um-a]i§!a-4&§xgu*§ti-Ya
lançamento dos primeiros satélites meteorológicos, foi possível obter aos náiúiáiiitas êitrangeiros citados inclui *Zstqg§tl9lgg:'o -
informações estatísticas mais confiáveis e acompanhar em tempo real Como já foi ressaltado anteriormente, os naturaliitas tiveram sua
os flenômenos c]imáticos. atenção voltada prioritariamente para os minerais, as plantas e os
Todavia, ainda hoje, como revelou a discussão sobre a natureza animais do Brasil. Guiados pelos princípios e teorias da ciência que se
do Cqtarina (teria sido um furacão ou um ciclone?), fortíssima praticava no século XIX, os viajantes naturalistas c@
tempestade que assolou o litoral de Santa Catarina e do Rio Grande do
Sul em março de 20O4, muitos países não possuem meios adequados fu 35gssencomendadaspetas-{cadç4qi-4ç--4ç-ÇÉ-frSiq-qSg5qPgl§-Suas
expedi{Oês pelo território brasileiro erarn organizadas com esmero e
para monítorar os fenômenos naturais. Meteorologistas do Brasil e dos
motivadas por interesses amplos: individuais e institucionais, científicos
Estados Unidos, reunidos em julho de 2OO5, em São José dos Campos, e econômicos, religiosos e de diversão.

9. A experiência histórica recente tem mostrado que esres problemas pennanecem


ocorrendo em diversos países, a despeito do avanço material e técnico da
1O. São eles: Thomas Lindley, John Mawe, August de Saint-Hilaire, Karl F' P von
humanidade. Freqüentemente, hoje como no passado, governos preferem a longa
e continuada ocultação dos fatos, enganando deliberadamente o próprio povo e
Martius, wilhelm von Eschwege, John E. Pohl, Konrad Guenther, Alexander
Caldcleugh, John Luccock, Hermann von Burmeister, Charle§ J' E Bunbury John
os povos de ouros países. Tentativas que eram mais bem sucedidas antes da
H. Elliot, Georg W. Freyreiss, Louis d'Alincourt, william J. steains e Alfred Russel
difusão das modernas e baratas câmeras fotográficas, do rádio e da TV
Wal1ace.
. 66. Marcos Lobato Martins .67.
HISTORIA E MEIO AMBIENTE

Todos eles trouxeram para o país que visitaram informações e Enfim, os viajantes naturalistas estrangeiros, aprisionados pelas
concepções já formadas sobre os trópicos americanos. os üajantes concepções de sua cultura européia, não souberam construir o
naturalistas distanciamento necessário para analisar os ambientes regionais
.i.qrlrrrqru_E3rqpê_rgEr"*q_Nô"ã.-lyI-tl4-4ó-_dé:ffi!o=Jrvr* brasile iro s. Ra z ão p ela qu al d eve m ser,relid q s caffriás.tarale_cqid a_{o
conheciam as experiências de ourros colegas qué3a haviamüsitado as .

Américas e qflg_ggavam imunes às influências rer-na4escentes do P§la-h§Igtlêd or arqb isrlr{.


Não se rrara, é craro, de descartar os r€ra{o§.dg_ldgsggs como
gêp-a1ie.4re-Eãyq1.§ptrêãiãnãJãffi ânteF{'Güq,r.t.;;-.ir*; fontes úteis para a pesquisa ambiental. Há neles muitas informações
sobre os três reinos da narureza, sobre a cultura material, as técnicas e
e-de-'lprqgrp=ç=sp-g-ru"dtf gslda-dçqe-qrê-! contatos a as práticas econômicas das populações brasileiras oitocentistas. Há
@.dlfe-r-çnte.
Desta forma, os viajantes
trotícias sobre a diminuição de á$as, matas e bichos em diversas áleas
naturalistas que visitaram o país ,,
tgdqlalg-esrcreefq.Il3**g]tq um gIglige rnglgggqpical, espaço associado aos e.s.iefse§- de_j3_esblavêmeLrg" de íã§i0es e bacias
de pessoas, plantas, animais e cosrumes estranhos, suipreendentes. o hidrográficas- Além disso, os relatos dos viajantes naturalistas
Bra-silsrlgs*tg rglLg*qlrpg§.Esgê!-erp-rérrsao.-ec-o-ng!]Lcês,_ggc-têis estrangeiros cobrem, por assim dizer, a cronologia do século XIX. Se se
p-admiaistr4piva5-gare.iara-4g_ ggb::eStgl1:1E4.-+9e,
.,
p.gr-qú-é rghmÉSt toma o caso de Mi[as Gera_is, há g1i1"oÍ]Í!s§: s]I:essivas de-yi_ajarfqgs
a,snggt:-o1.9§?"9499:"es,kes-g"**Ç@ç-q*íü.üa,& que percorreram regiões mineiras entre
.@ os anos 1809 e 187O, como
gatu{çUg*tropical. Quando-óbservaram as pessoas e o mundo só-ãã indicaoquadroabaixo:
escraústa brasileiro, os viajantes naturalistas perceberam muitos detalhes
das üdas dos brancos, dos mesriços, dos índios e dos escravos, seus
costumes e instituições. suas narrativas constituem quase-roteiros da Vialantes estrangeiros em Minas Gerais 1809-1870
vida cotidiana que se desenrolava no Oitocentos. -
Mas estas narrativas precisam ser lidas com cuidado, porque Viajante Nacionalidade Formação/Profissão Época cle passagem
ca rre gam
-a r_n a{c gIIl i njr *rs p rçqon c ej to s elr roJ SU§. ôidélA_d a
a_ d e 4et John Mawe inolês comerciante I809-'í810
§.uper_loridade do cgFpleio ôulru+ll eJrropeu tranç_parese*n s opinioãt G. W. Freireyss rUSSO naturalista 18í+1815
,Çgs:r-aia nte s, snli.ú d e rr qgeg113r ,jg[ g_$- g:e.nig s á o É iãi i t. op i n iõ e s e Barão de Eschwege alemão mineralogista 1411-1821
comenqi4gg {n?tegicç,nrgs ggç- associáàói ài concepcões em Auguste de Saint-Hilaire frãncês botânico 1817-1822-
v,oga_sobre a i+fgrio-ridaÊs-daúqçgs de cor e de seus dáscendentes. o John Luccock inqlês comerciante 18í7 ê 1818
Brasil era üsto, portanto, como uma@ à qual Karl von Maúius e
conviria adquirir o refinamenro e os meios díLüruãêtropeiã. Ãprópaa Johann von Spix alemáes zoólogo/bôtânico 1818

nqtqlç z g tamb ém era ob-X11aA@qs es, gL5id erada


Johann E. Pohl austríâcô médico e botânico 1818,1820-1821
Barão de La alemão naturalista 1825
4çlaasradarnç$esepsgd, exuberante, em reclÃffiõÊffiõ
mesmo cgpgz gg e_qqa.qusgqr c espíri-r_o"!ú,4u]aÉ
e 9_Sglpo_g_os[ogrer]slr.
Alcide D'Orbigny francês naturalista 1833-1834
Charles J- F. inglês naturalista 1834-1835
George Gardner inglês naturalista 1840
Louis amencanó geólogo í865-1866
11. Para uma discussão interessante sobre os viajaates, ver LEITE (1996). Richard Burton lnglês diplomata 1867
t2. o naturalista francês Georges Louis Leclerc (77o7-i-7BB), conde de Buffon, James Wells inqlês 1875
considerava o No\.o Mundo inferior à Europa, a natureza americana degenerada
(os animais seriam menores e o homem mais frágil) e afirmava que * Períodos diversos de permanência em Minas
a iaisagem
transformada pelo homem, como na Europa, era superior á selvagem, como
a
brasileira. Para muitos autores do século xD(, o clima tóoido do Brasii erá propício
a Índios selvagens e "hordas,, de negros.
. 68 . Marcos Lobato Martins HISTÓRIA E MEIO AMBIENTE .69.

Os relatos dos viajantes naturalistas estrangeiros conservam sua os descaminhos da atividade científica
imporrância como fontes, observados os devidos cuidados na leitura de foram com ffipe;ãiãados
suasinformações.OggpgILA$9é_çgsJgs§_Ie.l_W, labirintos , Car dé verbas e de apoio governamental,
o que corresponderia à crítica interna, e t4qlqÉry cqnfrqq!é-loj descontinuidade nas políticas públicas (educacionais, científicas e
M"!S ggg.+-r_fj!Jg§, o que corresponde à crítica tecnológicas), formação recente do mercado de ensino superior,
externa. selvagem e desregulado. Tudo isso influencia negativamente o setor de
De qualquer forma, deve-se seguir o preceito de combinar, nas ciência e tecnologia no país, de modo que ficam comprometidas as
pesquisas de História Ambiental, os mais variados tipos de fontes para possibilidades de desenvolümento soberano da nação.
reunir informações sob o foco convergente de técnicas diversas e analisá- Se o Estado brasileiro já não controla diretamente o trabalho dos
las segundo diferentes eixos teóricos. pesquisadores, ele mantém antigas dificuldades e cria outras novas quase
'*_-+-----_*-.-+ diariamente. Uma delas é o pequeno investimento feito pelos sucessivos
I A Historia Ambiental e a produção de I governos nos órgãos públicos destinados à produção de informações e
i informações ambientais i estudos sobre o país, principalmente naqueles com responsabilidades
,. -l
sobre a questão ambiental. Falt+Ir-lheslrcssoal- equipgmento e !!-inhqiro,,
Um dos mais famosos naruralistas luso-brasileiros foi Alexandre g que prejudiqa a plodqqã-g - em quantidade e com qualidade -1|g
Iggl#Jg'-'-.--*-u(f -Z-úJ-ôí."i;iid"..*ilffi ei'o!ç§1-'1iãã"siia" #fiformãeõ-es ambieqlais. Êalta-lhes prestígio político. o Ministério do
no Brasil. Errggg?, o naturalista nascido em Salvador p4g_t1gde Lisboa -ttrteio ---
Ambi ente- o IBAMA, a s §ggI#IBql§B gUA§ ç-\[qlticipai-s_ de
go-ne+_dg.if{.o*ããte!-ol _g-Ip_g-qlg+.-o_c-l-e_E!íqca empreendida'@a
portuguesa em solo brasileiro. A expedição de Alexandre Rodrigues
CJ,_ga @exemíÍõ;ããu"."*àttíilúlos-ã
. _p$.s-4*it.Arçry -siB E:gT," DIry3;
ôontam com recursos ?õfrffi
G"

;õr s
Ferreira pç.rç_,o_-1gçtr cerca de S_9JgúJ_qU#Jge1Ig.1nas Capitanias dogJão suficientes paÍa empreende4 sistematicamente, levantamentos e estudos
@sr.o'(4rse?_o.l1-q)Sl4ete*c_f gjlg,estendendo-se ambientais nacionais e regionaisla. A atuação das ONGs e Universidades
até
#%
o ano de 7792. O naturalista enfrêntou muitas dificuldades durante não é capa:. de suprir as lacunas deixadas pelo Poder Executivo, nos
a expedição (falta de recursos, deserção de soldados e índios, demora seus três níveis de atuaçáo. No Brasil, portanto, há muito que melhorar
no enüo de materiais coletados para o Real Museu de Lisboa, extravio quanto àpqgdgçeo-ç dig;tg"ç& de i"f"gt!.§õ.s d
de amostras, etc.). Em Portugal, boa parte do que havia resultado do Além do desaparelhaúêntô dos órgãos públicos com
trabalho de Alexandre Ferreira acabou perdido, por falta de organizaçáo lresponsabilidade sobre a questão ambiental, outro problema sério é o
e conservação e até mesmo porque peças foram levadas para outros 1rítmo lento de democratização da atuação destes mesmos órgãos, fator
países sem qualquer controle. A_Coroa também não realízou esforços íque também favorece a dilapidação do patrimônio ambiental da
parapubiicarqsdesç9bs.gtgs*{e-Eq&Éã,mantendãIãlgteSgàp*"-1lt-r-s4 \sociedade brasileira. Ao higlolldolêEbiçnta-l cabe a tarefa dç.Sngçgr
os- i*;1qú .
jeste estado de coisas. Ele deve disc-r1§r-fe§-9-p*çksJé*c-ruçg§-**a;f,dBde
do naruralista perrnaneceu dois séculos no esquecimento. irransparênc-iê9-gong,q§dardsgisgçq-tqma4rsllglg§lesgI&As§estatai§,
1=--+..."F%*-
odestinoterríveldado;ôüá6ã'h;,ãã-Áó;ándrãffi AãÊuesFerreira ip-rincipalmentenoqueserefereàe-lAb.of açãe.âEesçI$4qão.êpro.vêçãg
pelo mesmo governo que o haüa patrocinado mostra como, em Porrugal, ,dg-Ugç1s (relatórios de impacto ambiental).
as razões de Estado sobrepunham-se ao fazer científico. Outra i-ndicação
neste sentido é fornecida pelo fato de que "o trajeto, as áreasvisitadas,
as mernórias [elaboradas pelo nq.turalista.] erqm q-utorizo.dqs e 13. Departamento Nacional da Produção mineral, órgâo do Ministério de Minas e
encomendadas pelas autoridq.des coloniais" (RÁMINELLI, 2OO7: 64). enêrgia responsável pelo registro e fiscalização da atividade mineriíria no país.
Esta falta de autonomia da ciência, sua subordin aos desígnios do t+. Em 2002 e 2OO4, o IBGE publicou os Indicsdores de Desenvolvímento Sustentável,
Estado e ica administrativa proietou-se, no Brasil, no século XIX que incluem a dimensão ambiental ao lado da econômica, social e institucional.
Neles, há 17 indicadores ambientais, organizados em 5 temas: "atmosfera", "terra",
blica, "oceanos, mares e áreas costeiras", "biodiversidade" e "saneamento"-
'"'-* ;iirl**1i qb!-,:h:i
ti::l''''l:l-.&tÊ=?; §"^,1:), :: N -|,*i;g t
. 70. Marcos Lobato Martins
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ÉISTORIA E MEIo AMBIENTE
3
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O historiador ambiental deve dialogar com os órgãos públicos e


t específicos e suas dinâmicas diversas escapam ao conhecimento dos


as entidades privadas com aruação no campo ambiental, com vistas a ! órgãos de governo e da sociedade, pelo menos nos momentos iniciais
sugeriq avalia4 diversificar e aperfeiçoar a produção de dados e estudos I
das ocupaçõ.r. A" j-:Eegs-de-satéUtepossibilitam mapear, em tempo
sobre a natureza e as relações meio ambiente-sociedade nas diversas '6 real, o avanço da ocupação e alguns tipos de impactos sobre o quadro
,.
regiões do país" O historiador ambiental deve estimular e participar do ;i natural, mas elas naq Cgle1n dagg§-IefgI-çqtes."-às-interações-entre-os ii
debate sobre os tipos de dados a serem levantados, as metodologias, a ri

i e§fSq :g.,iuj: çrygl:ri$gs (Eegs vaiores. e-sç-qhs* lntpresses,sstratégias, Ji


periodicidade dos levantamentos e estudos, os recursos necessários, etc. i &rmas.de r-es!.s1_ê_pç!3 eçc.) e nem sobre as modificações que afetam as I
Além da produção de macrodados ambientais, os praticantes da História relações ecológicas originais.
Ambiental devem prosseguir na luta pela criação de bancos de dados Enfim, a pequena capilaridade da presença e da ação do Estado
locais sobre a biodiversidade e as paisagens, com o cuidado de manter no Brasil - evidenciada na informalidade de setores da economia e na
em mãos nativas o controle destes bancos. Num certo sentido, é preciso ocupação desordenada do espaço - dificulta a produção de dados oficiais
fazer as informações ambientais entrarem definitivamente para o dia- de interesse para a História Ambiental. Por outro lado, a tendência
a-dia das pessoas, como hoje acontece, no Brasil, com as informações histórica do Estado de relegar a plano secundário o aparelhamento
sobre inflação, câmbio, balança comercial, índice de negócios na Bolsa adequado de alguns de seus braços, como é o caso dos órgãos que
de valores, diariamente divulgadas nos jornais e telejornais. Afinal, o atuam nas áreas da ciência e tecnologia e do meio ambiente, adiciona
problema ambiental é o maior desafio do século )O(. mais dificuldades para a acumulação de informações e esrudos sobre
Afalta de mapas, levantamentos e estatísticas ambientais no Brasil os processos socioambientais. Processos que, cumpre não esqueceq o
não é decorrência somente do desinteresse governamental. Dois outros Estado deveria regular e mesmo planejar.
fatores também conrribuem para dificultar a produção de informações A História Ambiental e seus praticantes brasileiros têm o dever de
relativas à interação sociedade-natureza: a alta mobilidade e lutar para reverter este quadro, ajudando o Brasil a encontrar meios
informalidade das atividades econômicas e a rápida ocupação mais eficazes e democráticos para produzir informações e estudos
"espontânea" de muitas áreas do território nacional. ambientais.
Tomem-se, por exemplo, os setores extrativista e agrícola da
economia brasileira. Eles são, historicamente, predatórios e, por
conseguinte, praticamente nômades. Engolem mais e mais terras, REFERÊNCIAS BI BLTOGRÁTICAS
i ,, sempre avançando na direção de fronteiras abertas. Os caEgs_da/j
(garimp_ç)_e _d-a-pêqr1^gria são embl"*ad.og p.eqglni;;Ei
\ 7- llnineração
.ltri-É
a mão-de-ôBimiãffialí
CARVALHO, José Murilo de. Á Escolq. de Mincts de Ouro Preto: o peso da
I ESgr*çat^,I(imç4gares, glória. 2. ed. Belo Horizonte: Editora da UFMG,2OO2.
'segundo as leis trabalhistas vigentes, os empreendimentos não têm
regularidade fiscal. Quantos garimpeiros procuram diamantes em Minas COUTO, José Vieira. Memória sobre s Capitania dqs Minas Gerais; seu
Gerais e Mato Grosso? Quantos garimpeiros trabalham nas lavras de território, clima e produções metálico"s. Belo Horizonte: Fundação
ouro e cassiterita da Amazônia? euais os volumes de produção e de João Pinheiro,7994.
insumos envolüdos nestas atiüdades? Onde estão os ,.serviços,, de CUNLIA MAIO S, Raimundo José da. C oro grafia histórica da Província
mineração? Ninguémsabe ao certo-nemo govemo, nemos garimpeiros, de Minas Gerqis. Belo Horizonte: Arquivo Público Mineiro, 7979.
nem as grandes empresas mineradoras. Amesma situação vale para as 2v.
carvoarias no cerrado e na Amazônia, e para as madeireiras no pará,
DEAN, War;en. Aferco e fogo: a história e a devastação da Mata Atlântica
Maranhão, Tocantins, Rondônia e Mato Grosso.
A ocupação rápida e desordenada de grandes áreas do território brasileira. São Paulo: Companhia das Letras, 7996.
brasileiro gera "áreas de sombra" no teÍTeno das informações ambientais. EABRIS, A. (org.). Usos efunções dafotografia.no séculoXN- São Paulo:
As origens locais e regionais desses processos, seus mecanismos Editora da Universidade de São Paulo, 7993.
. 72 . Marcos Lobato Martins

GUIMARÃES, L. M. p Debaixo da imediata proteção de sua Majestade


Imperial- o Instituto Histórico e Geogriífico Brasileiro (1838-18g9).
In: RIHGB. Rio de Janeiro, n. 3gg, 7995.
LEFI Enrique. Aventuras da epistemolosa ambientql: da articulação
das ciências ao diálogo de saberes. Rio de Janeiro: Garamond,
2004.
LEITE, Ilka Boaventura. Antropologia da viagem: escravos e libertos
em Minas Gerais no século )(X. Belo Horizonte: Editora UFIVIG,
7996.
LOPES, M. M. o Brasil descobre a pesquisa cienífica. são paulo: Hucitec,
''í
1997. A História Arnbiental e a pluralidade dos
RAMINEI.IJ, Ronald. Anatureza na colonização do Brasil. In: REIGOTA, dornínios da História i
Marcos (org.). verde cotidiano: o meio ambiente em discussão. 2.
ed. Rio de Janeiro: Dp&A, 2OO1. Em capítulo anterior, os diálogos interciências que
SZMRECSÁÀM, Tamás. pequenahistória d.a agriculturct na Brasil. sáo devem envolver a História Ambiental e seus praticantes foram
Paulo: Contexto, lgg}. assinalados, ainda que na forma de rápido esboço. I{estç-pg!!g-{o
VILI-A, Ir'Iarco Antônio. vídq e morte no sertão-- história das secas no -tq4ts, o que se pretende fazer é qssinalar direções para os diálogo.s
intrahistóricos, isto é, as relações que a HistóriaAmbiental deve manter
Nordeste nos séculos )ilX e )OC São paulo: Ática, 2OOO. com os múltiplos domínios da História.
Antes, porém, devem ser feitas algumas observações a propósito
de dificuldades que afetam a úúriaÁmhisrtal. Este novo campo tem
como proposta observar no passado, em meio aos movimentos de
conjunto de uma sociedade (ou comunidade), os mecanismos de
produção, reprodução e úansformação dos ambientes. Suaconstitgi§ãp
responde a dois movir4e.ntosjiingqni-ad8§: a tendência de ft

, dentre os quais destaca-se o


ambientalismo. Desta
.ÇÕ*-'----.*-r"1!e-
forma, tem sentido perguntar: a História
.ffiTiiêiitá]Tõêíui temas próprios, recortados na totalidade histórica
se gundo critérios amplamente reconhecidos ? 4E!Úiê-llilhlgg§êté I
i g Ãa--dis c-iplina o u É..bi.oliu z g r" rá .
"..
rosemõ ffiõ *d-"- I
{+bordtger.n?
'-ÃHistóriaAmbiental'+ã9*É*qme*qi§sigtigágUg§sgPomultie
interdisciplinpr. S.,u d"t tldãã-"J"óri
ããtGõ§Aá História Ambiental são p€gru=rÂç'rg§gs, e ela carece-d§
i'o econômico" e "o social",
.@p.13=qLe.SÉçgs e operatórios. se há
dõffiãis se ocuparn, respectivamente, a História Econômica e a História
Social, não há "o ambiental", entendido como uma dimensão específica
q.iUe r..r:r,,') !i.i"i; t?(.,*sr Jfu l,i
" 7 4 ír__ Marcos Lobato Martins HISTÓRIA E MEIO AMBIENTE . 75 .
.1

:r... r -Ii) f {)l:t :i. /,/ij( ", /gf\J3l( r," rl .{


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s e [e c i o n á v cl d a re a ] d a d e h i s tór i c a.
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.o.Sl-.1 g 1". çrr,
íãh H bi Ü irY-E"lS, Todavia, para o estudioso que sublinha a compreensão de
ama ç.-o-qpl94+,9 dilâ-1ntçAdç.slemçn"tq"§."p*t1fgis (físico-biológicos), "interações holísticas", os fatores clirnáticos (e outros fatores ambieirr-ais,
dq,m9gçi_fic,"__.s,__.*g-çiÊj-sà"jHtÍÉi"çg.sr"ç1ll*tr-ais*, etc. Çgng, físico-biológicos e socioculturais) devem ser levados em conta,
1.c-o1i9.-n1iq9s,
rtanto, seria possívet dçll"+"r_iE*t|9'"Hç"tp'l_-+rrt]rigp,tl_it"? convergindo para uma síntese global mais do que para urna
Por conseguinte, também não se pode dizer que a História especialização setorizada. Para a História Ambiental, portanto, o jogo
Ambiental é uma outra abordafJem, como a econômica, a política ou a a ser jogaclo não é o de fazer desapal:ecer tradicionais domínios da
Flistória - como a História Econômica *, mas de dialogar com e1es,
problematizá-los. Pensar suas variadas articulações, cotejar as suas
.'--)
,j
intcrprctaçõcs.
11"

, í,(,'
I§+.p,rritrç,g, os ç§!94_9q gg
-rylq1ffla Anr.bl-e""rltgl--v-Êip.p"e"ç-qp*c-ggç1sçLdo fl'{lt»"''
na expJ-o-;1ção, mais empírica Co que teóri93,.{9.ç9"{,I9§.,"t_e_g}.*f .p.Íirlçip-ais,
*"-Sln
abitâ n gendô Criseíamt,icn ta is do pâssado, impl icaçõcs de determ inados
cursos de ação antrópica, sistemas de crenças e valores relativos à
natureza (eruditos ou populares). Mesmo conduzidos sob a égide da
multicausalidade e da interdependência entre diferentes processos, estes
esforços de pesquisa esbarram em ambigüidades e dificuldades teóricas mesmo Ce surgiS na década de 7970, a História Ambiental - assiru
que estão longe de serem sanadas. A I-{istória Arnbiental veio para ficar, batiza d a p or h is toriadore s norte - a mericanos - â-Hi§_ténê-.Fç-o.p_ômi.ca
mas tem muito chão de estrada pela frente, que deverá percorrer
almejando o refinamento conceitrral, teórico e metodológico de sua
produção. **"\P'
r - '"--1 as flutuações nos
I A Hiscoria Ambiental e a História Econômica t
dos seus rebanhos e a história das plantas por eles cultivadas.
No nível analítico mais convencional cla História Econômica (ou Assinale-se, como apenas um ggrnplo, o interesse que para o
mesmo da Geografia Econômica), as,variávg§ flrpbienlAis costumam historiador ambiental possui o liwo de _En*menqgl_L.S$p.y*I"+"d_+nS
-(].9.pD I
apaÍecer sem qualquer destaque, apenas na condição de "qf!çm#edSSl,
para usar o jargão dos economistasl. Na maioria das vezes, os objetivos *'P_ $obre a eJ*o-Lyçq.o*dq-I-_ênsq.e-{qç -{".e-eê*.*nà_,i#-.id;;iõ-àre"ã te;íi;!oíA'
ffyLII. Neste #ff!ç-g-de.-hiqt-qria rqral, são descritos minuêioiamenre os I
específicos da investígação do historiador c1a economia não exigem "bsos dos campos, dos terrenos aluviais, das encostas dos rnontes e das
que se considere, por exemplo, o clima como fator que desempenha um zonas alagadiças c1o litoral. São examinadas as IHLA+.4"S..§.Rqip-.g-1].çqe§
papel na formação das estrutul'as econômicas. Florestas e os.airirnais brgyios c as {isp-uta§.pof cnt!ci
_ {So1r1rp
"as ^cspaço
-
-- - h"J3s lavggtes ç qs cliqç§es, marcadas pcla oiggnsão ^d,qs cercai âç pcçp"a.l .t
d A atenção também se volta para a variada fisionorrliá
9à,i ilaq4es,,'
y*.tens.nJdçla§, para u g"o grrfiu d o trifflããffi;fr;'ã;";"srantreira, <l zr
1. Externalidades sã.o dattos ou bencfícios sociais causados pclas ativiclades privadas.
seda, das {Sirra-s-.de*ca.w"ãp e das pastagens, geografia que gerou
Elas podem ser negativas, como a poluição de um rio por uma indírstria de papel,
ou positivas, como a preservação de um conjunto de construções de valor patrinonial
paisagens diferentes em estreita conexão com a qualidade clos solos.
por uma empresâ. Para além das descrições, o jogo das relações mútuas de diversas
Ôr1§ N fnp l"x':!{{. '#Lr'{."í(:r!i:r'} fii
-t)'§ $ \i-1ê ,'.., -§& rl: /$''íixrr*-
. 76. Marcos Lobato Martins srsróRtA E MEto AMBTENTE ü ç rú
n:
q.('ü' " { " 77 "
"f1;1.

de
variáveis, que o autor realça para explicar os movimentos seculares uperização das fontes de recursos
,*u d"t"rminada socieáade tradicional - sua siruação de
desenvolvimento e os níveis de vida de seus habitantes -,, delineia um
odayggr*{gPjl*:S}gf *a"e'-"P3§Xsgis{u!4§99}-ansqrs-dqq'Ela
"'ú"f
pod" ser üõlunr6rícl[êd?nôilcsütiã''tciãàliinb::.'3ç^t§§!-e9Sm-ea''1"{ie-
clas diversaq produçõôs ê áõ pfõdütõ'ie'§iõiiál'l;iütó,
dóã preçoi ê das
+}.;itã;.i"';âau a'diâ"â aiiiiiü, ó rüôô,'ãü'ü'{'õlütrô;ô.{Tâlãiiôf,
revoltas e as lutas
ã-,iffi".".;.r1rs.çh,osràç:"-q-qf .g"-lç,,R.g.§,*g-*q;ais*(inclusive as
#ilri;';;, j . N á "ài,ró;niá[Hii"ãã"i"ê#áços-tempos do Languedoc à época tguns malxisras, no âmbito da socieda§.S-Sggii*lis13.-a-.di!e;t
dãh ãn [á i; d a iuta d
"rüF
ãáã"rrru.g.rq-*,1,jplgg.iai*9,"g-",#,"s.""*.p.fl.pel, representarla
pelas
3t#.*i1t" #ra-"m;inTãtr= Là"?lvêisã§" d í;n é;'õü
iôi s y ariáv el meteo r otó gíc a" qie liberdade2.
.o*o ruriÜêiiüiffi;."ilâõ' ômitid a "
-- nct
i i^porto,rt" "fffri{tÜri" agráriq ond'e nos ajuda s compreender Ãêffiõãܧlüãã"lü;il ;;;ãüçãoê te êônàumo, à orsanização do
t" po breve, essencialmente - a irreguloridode das colheitos e os
,opiirhot
- d.a oferta" (IÁDURIE, 7997: 76) '
Oru, tudo isto é de muito proveito para o praticante da Flistória
Ambiental. A "aventura de uma história total" de uma região rural
sugestÓes
mediterrânica empreendida por Ladurie fornece inspirações e
Ourros exer,plos
fu.u u investigação de proôessos socioambientais.
este podãm ser enãonmaclos no âmbito da História Econômica.
"o*o o qrà e preciso ressaltar é o fato de que P-"9"ié19.9.-%**,.111::9':l:
História EcorrÔ".niçq.ée sm,+ pB*ê.e,.i." #H'?iiâi§ ã iítiiiê
Ambiental com a tiist"ó.ri+ d!*it

"*"M hffiffiôiê§",üê§,fô^i{e ôôrãiatiaãae enrre raúos da pesquisa,*:.:"r1.1T11 §{-"*


ãd e e stá ass entad a num dad o incontornávet'-**.F.-+,"t" I39,999P?
r à: referência -^L-a oa mrtariqliáráe
-^r^*A-^iô sobre materialidade (da nâfilr-eza e da CUltUfa).
natulê2ât"ilã"ôü'lÊi'ilâ)
"*P lFl'dá** Hfitôiiâ Ã*urêtitál' üâ * u*"tarie ecuiiôffiTêâê$#üâiií as

uma certa ponta de ironia. Ao tematizar os processos socioambieltais,


cujas implicações tendem a ser cada vez mais planetárias, e que estão
iniimarnente associados às condições de vida das sociedades, +-Hip-t§{
Ambiental poderá reconduzir os historiadores a estudar o fator mai

*u"il1ff:il*_ff';ffi
r**§ trn§,,,
ffi *m;%"t:;:.i:;'
2. Ver LÓ\MY (2005) e KONDER (1984)
o 78 .
Marcos Lobato Martins HISTORIA E MEIO AMBIENTE .79 r

A História Ambiental e a História Social obras como estas chamam a atenção do historiador ambiental
para a necessidade de observar e compreender os coÍnportamentos e as
Há décadas a produção no inrerior da História social vern relações enfre os grupos sociais, a interessar-se pelas experiências das
abordando temáticas que interessam aos praticantes da História pessoas comuns e pelas suas reações a estas experiências. Estas e outras
funbiental3. conceitos, métodos e abordagens desenvolvidos pela
tht*;:"d-a*H-rs"tftia§,p-çi.aJ"M-da"s*trç"nçç^s^çnraç§--e.§-
I*"1:,ttil*§_p*",t"*i..#sde gr3lgs*Hsgincorporaram-se ao arsenat dos q
que realçam o tempo da experiência e do vivido, meios de acàsso
d;ã'dâÍilffi?ã"Tô "ê§f,il{ôIíã;ãffiê;;;; Iocioambienrais. Esre diárogo ç"qlgfi_v.,*:;
privilegiado à historicidade das relaçôes entre as sociedades e
intrahistórico, da História Ambiental com a História social, é táo os
ambientes.
necessário quanto o que se examinou acima, entre a História Ambiental
A sensibilidade para lidar com as {çp*r-e#n".çA.Ç,Õ,ç§_,p
e a História Econômica. çi.+_h*f_4,*ti-ym
à_**.tyfSfn pode ser apreenclida em trabaiÍiõi rnodetarói ââ uistoria
t j'Fy
,.1..t
Social. Por exemplo, o livro de l(çithJb-qJpʧ-(1988), um csrud<_r
enciclopódico da relação do homem õ;-*Tàimais c pla,ras na
,"*& Inglatena modema, empregando grancle quantidade de fontes literiírias,
ii
examina como mudaram as atrltudes do homem diante cla natrrreza: cle
, ,1,- uma postura seiscentista de derrubar matas, drenar pântanos, eliminar
!Y,' '-l{"
'n{,*
I insetos e animais, lawar a rnaior superfície possíver de solo, para ourÍa,
,.iu i formada a partir do sécu1o xvIII, que valoriza o ambientÀ natural e
It
{t
,e--1 contesta os direitos do homem de explorá-la em seu proveito. Thomas
__--.,,T"11 di.ssipa o preconceito de que, antes da industrialização, o homem clava
,v
T
mais valor à natureza. Para o historiador ambr'ental, trata-se cle
advertência importanre: é preciso aprender com a Flistória social a
o historiador ambiental encontra temas para suas pesquisas, contextualizar culturalmente os processos e acontecimentos históricos,
ensinamentos e estímulos nos trabalhos clássicos da História social desenvolver a capacidade de compreender os comportamentos, as icléias,
I9-lt**^q-'"s+ran'rlh$t*.q,*-o*".d*.fp"n*ô.m,s.p',o*I,iBdnflÉ'6';ã;Ü âüil",ã*ã" as opções e as atitudes de pessoas, de hoje ou do passarJo, diferentes c10
Bgn_ngl§ Wil.flgns (r98f) et," aborda as retaqsegenrre carnpe g.çi"q;1de pesquisador.Sn*jkh*çSree*Jfogntg,*§";gigg*-Chara.À,G996)explorouos
rla.l.r-lglatcrra da Revolução Indusuial a parl-ir defon[cs,Jiteriiriai. oüüo conteúdos míticos que persistem subjacentes nas tradições paiiagísticas
exemplo rnais recenre é o liwo de \4pgqhg!_B.er*na&ffig_8.6J, preocupaclo de diversas regiões e culturas ocidentais. As ntatas, ás águas, as
em pensar as transformações provocadas pela [rodernidade em conexão montanhas foram meios metafóricos para delinear preocupaçõe,s
com os projetos urbanísticos, a filosofia e a literatura, sobre o quotidiano modemas - império, nação, liberdade, etc. -, o que mostra qlle a
das ruas e a cidade. Também vale citar
4,+i*,.Ç"o".rh.rn.(J"9S,gJ com seu natuÍeza não é algo anterior à cultura e independente da história de
3*1,,*,s1ç,*F-*s6.ps»,H*m..çl-o"he.aílç^ns-.","qigslrH-+-à"=i*ápmir, esra.p.ffisg.Ç,.r8 cada povo.
"y1ti1",queór.r9 jSg_g{41-rd_ç_"q}.osp"idçç^lgçrçr.d.a.itudústriagp_túJnfnp,
outra lição fundamenral que a História Ambiental sabiamenre
assimilou: aquilo que se conserva e se destrói na paisasem natural está
Jig-3ao, proÊffiãã§"ffiffiêaidé{}iÉÊrda' .qlruÍelóêniã.'so úlb basrãrià
para justificar o cliálo§o contínüo enrre a História Ambienral e a l{istória
social. Mas há muito mais razões para manrer aberto este diálogo. As
3. Aqui o termo História Social é tomado na acepção abrangente dos ag*o_g*]p,/*p-
como o carnpo que estuda os modos de constituição dos atores históffãos e suas msis+.sã.cs*.*,s*lp"l:mas,g6_s-*s"§Jra,r.é.g1"+p d"ç.*ç#p;[p#.*f,*_çg,p*,_c_,g,1.*qgryes nos
relações, as bascs (socioeconômícas e culturais) das iclentidades, as representações sqçsqambie!.qãF,'üjõêdiiT.tãá.ilri-ããJ'ãüãilü; à;-ili,ró.iâ
p"rsssfs_es
colerivas e a história da üda cotidiana, priülegiando clurações maii curtas. Ele Amliental, o*q4sm tsuán"v".e,,sJ1gad3ss-q.p.*,s,ins_pjgagne.*ç_q"H+halhp.s*dB-8,
inclui,portan,o,rTir"t*i** 1)p*.j*.gg*gyu-H*§*ó**.**c**tg* hompç.gn. Por exemplo, a obra-Ç,uff"g.gr-ç-qns,gm#.q,Íl*realça a questão
frl
+,..\,,j',t:;.l,t,'.l,i'JF,{.,.'-f.],l-.,'-".
\--"".'ro . ( r . ...; l, \sit ,,;."'i-1
i'" ;r..:r,f"fd.yorsul.in, HISTORIA E MEIO AMBIENTE .81 .
\, ,, r.,
\
\r dos valores e das necessidades legítimos dos diferentes grupos sociais. movímentos socizlis, etc. Decisivo e desejável é a participação da Flistór ia
Ambiental nos debates teóricos e metodológicos cla História, uma vez
Estudando as {a9 m.aqsls- ngl":+l dos séculos XVII e X*V"I.,J,[.,39
çg-"aç§Es
que a História Ambiental é apenas um ramo novo, embora bastante eÍn
q-y3*çs.S.çJ.ifi-wê^inàiC+de" -u, gre,.ã' dó fô#ô,?iH-?iüaii""l'fr"rri"i,iã
/ clesempenharam o papel principal, e as revoltas -, Thompson desvendou evidência, da árvore da História.
ln â racionalidade específica destas resistências, vinculando-as à existência Não há dúvida de que a História Ambiental possui grancle
"ccoflom"ia ryora.!""Ça p-l.qb_e(THOMPSON, 1991). Já em §_"*Írfgr".g\ capacidade de seduzir; e pode ser acusada de estar na moda, produz.inclo
",.\lcgggd-or-es
1da
trabalhos ligeiros para consumo imediato de um público ávido por
(799.7), Thompson debruçou-se sobre os incidentes dranráticosl
'ocorridos, em noüdades. Este risco existe não apenas para a lJistóriaAmbiental. Contra
}J*?;il na região da Floresta Real de Windso6 que levaram
à aplicação da pena de morte ern mais de cinqüenta novos crirnes, ele só há um antídoto: ó preciso teoria, detida reflexão conceitual e
inclusive certas modalidades de caça e de coleta nas florestas praticadas epistemológica; também são precisos métodos, exigentes e rneticulosos;
por canrponcses. Enr torno da {i;p1r_t"g p.ç.lq .apr-qpf,iação e..ut-ilizaçflo1 e, finalmente, é preciso Llma boa carga de leitura acun.urlada pelo
,.
praticante, sem o que náo se viabilizará a interpretação de fôlego,
_ i[das terras, das rnatas, dos biçJiqq e dgq-nlanl.?s, Thompson elaborafl _+"*-
- $I![qm-g jti1gigrgiã{ao do'diiàito.ãrno u-.!-po complexgdc tutas. ô-s[,-.' baseada na construção do maior número de relações entre os dados
'procedimcntos de Thompson nestcs livros.lonrecem pislas pa-ra o estudoí socioeconômicos, culturais e ambientais. Além de afastar-se clas
dos movimentos conservacionistas e ambientalistas, bem como para o ideologias, a História Ambiental precisa ter cuidado com as
sociais pclah*h-"* interpretações e com a prova dos fatos. Deverá dar tatrta atenção à
__*hJfe#tçndinleqç-q,,$9p.",çgp,fííôLr.tg§,.,ÇIlt-,,1,.e..p,Çxp-§..elp,]l*gr$po5.
-ffi"Wl qpl"priação dc.rccursos naturaisa. I -' teoria qllanto à "empiria".
Neste rarno novo da História, as estruturas do quotidiaro, as foruas
l -. Em todos estes trabalhos de Thompson, e rnuitos outÍos da História
Social, o praLicante da História Arnbiental encontra reflexões instigantes de exploração econômica e de dominação política, o espaÇo (com seus
,;.",.'i." elementos físico-biológicos e ritmos próprios) e o tempo são o ambiente
.' ."i ' ' sobre avontade4iberdade dos atores sociais verrus os condicionamentos,/
Hmites estruturais que pesam sobre a ação coletiva. E também ctrepara que se quer compreendeç interpretar e transfonnar na direção da
-,**Ç
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\'t.-
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corn a percepção dos sujeitos históricos como produtos sociâis efeüvos sustentabilidade. Mas este ambierlte também é lugar de projeção de
'.''l .'1\- da experiência histórica. sentimentos e simbolizaçôes humanas, de modo que, ao fim e ao cetbo,
reenconüa-se o significado do antigo provérbio chinês: pela considcração
l. ,-,r)ft
.,V', São matizes que devem orientar o olhar do historiador ambiental,
de rnaneila que the scja possívcl rcconhecer a dialctica da comnlexidadel I que um homem tiver por uma borboleta, pode-se saber o aprcço que ele
L;gsg;s"**qp*çp.n"'..tj*..111§,a.p^,ae,sfrI#r.fr,ãilã; ilü;=";e..e\l terrr pelos seus iguais.
-- }, rhnp.r"*ta1, "q---
patg_S§f,içqp" p"lq qp.ropriação da natureza. Um campo onde qr-ralqucril
ttotalidacle tem que ser concebida como um conjunto de relações de
* { â$istór1.4"4*b,1"ç*91.9-qy-ç"f+ consolidar o seu lugar no campo closj
\ t saueres.co-nlrapondo-sà tântõ âo ant_ropgsg!!Íism,g.3Í-tgg,e*]ls..ggtn"1,gi
.áiô àô É'àiit, à História Aã t,iô;ii {
rl

poder,constituído por valores e sentidos diferenciados- \ tr"r,


- ft _,,-d.amen f;tirApê*I"gi;"No
deve participar do esforço para mgsfi-ar",q-o pgyo g"àp.qu19rid.3dep. gt;gg
E, claro que os diálogos intrahistóricos devem ser ampliados ao
máximo. As fronteiras internas nos domínios da História <levem ser ç}ig:**9.g-p_.i.,^*l
por uruito tempo encarado como um entrave paÍa a
fluidas, convidar ao contato, estimular os intercâmbios saudáveis. A * \lconsuução de um país moderno, desponta agora como uma d_gf*É,pg"fgi! ii
t

História Ambiental precisa comportar histórias específicas das ciências ygt:lrgep c_o-Tp?"luti-u-u. nSgtql, por permitir produtividq{"çs "1qajo1.çs,i I
-" ' I
-1*.*
do que as zonas tcmPeradas do plancta. Mas, parat
e das técnicas, da "consciência cotidiana", das idéias, da política, clos l*e- -I2[qlnassa
' aproveitar esta vantagem, há que considerar a advertência lançada por
Sérgio Buarque de Flolanda sobre as condições do nascirnento do Brasil;
4. Para os adeptos do ES^p*ESç.1êli::r*,9 ,""o jogo do futuro está no implantação tle unkt
'economia tnorsl' no sentido que E. P Thornpson daya a essu expressã.o, ou seja, "... a tentativa de impknttaçã"o da cukura européia ent exÍenso
unru politica econômica fundada ent critérios não-monetários e extra-econômicos: teritório, dotado de condições naturai1 se não adversas, lorgantente
ú
'- - -ffi i,oríico" (t.ówx zgop-=-*.íi.
' " '-'
cm oulros palavras, a'reirnltricação'tlo econôntico no ecológ,ico, no sociol c no estran.has à sua tradiçdo milenar, é, nas origetu cla sociedadebrasílciro,
liI
,l
. 82 . Marcos Lobato Martins HISTORIA E MEIO AMBIENTE . 1l
83 "
i

o fato dominante rico em conse(lüências.. . O certo é que todo o


e mo,Ls
IÁDURIE, Emmanuel l,e Roy. Os camponeses do Languedoc. Lisboa:
fiato de nasso trctbal.ho ou de nassa preguiÇa parece partícipar de um Editorial Esrarnpa.
sistema de evolução próprio de outro clima e de outra polsagent" 1 997.
.4.+.í',..
,.."".:..
(HOIÁNDA, 1996: 31). VY- Michael ^ F.c,oloçin e <o mo. São
PAUIÁ', João Antônio de. Eco,omia porítica e ecologia políiica. t,:
Esta crítica às cópias servis de modelos alienígenas tambérn LAVINAS, L. et al. (org.)" Integraçã.o, regiõ,o e regionalisrrro. fuo cle
aparece em outro intelectual brasileiro, Gilberto Freyre, que cunhou o
Janeiro: Bertrand Brasil, 7994.
controvertido conceito de "tropicalismo". Mesmo que se discorde do
SCFIAMA, simon. Paisagem e memória. são paulo: compa*hia das
que Frelre dizia sobre a adaptabilidade lusitana às terras tropicais, é
preciso reconhecer a sua yisão pioneira de uma civilização original dos Letras, 7996.
trópícos, aindaporserinventada (BENCHIMOL,7996). Este é um assunro THoMÁs, Keith. o homem e o mundo natural: muclanças de atitude
[-odalnv*e.nses"C^Ç-,9,gtg"]t*9"9.ç.{pa"".jyj}i«*ç*,9-,.4,p-,hi -a em relação às plantas e aos a,imais (1500-1goo). São pauro:
W
í,$ \discutido seriarnent-e_, com a,participação ativa da His Companhia das Letras, 1988.
*::t.",]$p"g9çiamsnp.e.,*.ç.o.p.r*"ê",F..artiçip.açãp-_"+-tj,.v.ada,Hrp*fuia*Amhi.p.,lr,.tel
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