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feitos sobre a Revolução Francesa e a “ turba" da Londres do comerciantes, capitalistas ou os pais de família mais prósperos

século XVIII. Estes, pelo menos, mostram haver pouca concor­ não faziam manifestações, motins, nem colocavam mosquetes no
dância entre os principais bairros do crime e da superpopulação ombro para sitiar a Bastilha ou tomar um palácio real pela força
e aqueles nos quais ocorreram com mais freqüência os movimen­ das armas. Em greves e motins de fome, isso é tão óbvio que nem
tos populares, as greves e as journées revolucionárias. Talvez valeria a pena mencionar; mesmo quando as simpatias de uma
fosse reconfortante para o moralista ou para o defensor de uma parte substancial das classes abastadas pendiam evidentemente
ordem social tradicional que assim não fosse, mas as provas não para o lado dos participantes, essas atividades ficavam geralmen­
dão a isso maior apoio. Em Paris, durante a Revolução Francesa, te com o rebanho comum. Assim aconteceu em Paris, com os fatos
os principais centros de agitação e reação revolucionárias foram, revolucionários de 1789 e 1792, e novamente em julho de 1830 e
sem dúvida, os principais centros dos pequenos comércios e fevereiro de 1848; e, na Inglaterra (embora os paralelos não sejam
ofícios e lojas, como os Faubourgs St. Antoine e St. Marce e a exatos), durante o "caso" Wilkes, nas fases iniciais dos motins
Secção des Gravilliers, embora seja certo que os populosos distri­ Gordon e nas agitações do Projeto de Reforma de 1831. (Mas, na
tos em volta dos mercados centrais e do Hôtel de Ville os seguiam Inglaterra, as "classes inferiores" viam-se, com mais freqüência,
bem de perto. Em Londres, a falta de concordância é ainda mais sem um apoio efetivo da classe média, com conseqüências polí­
acentuada. Os moradores de St. Giles-in-the-Fields, ou dos som­ ticas que serão consideradas num próximo capítulo.)
brios quarteirões de Holbom (como Field Lane, Chick Lane ou Na França, portanto, os que participaram dos motins e
Black Boy Alley) — centros de bebedeiras de gim, pequenos distúrbios pré-industriais foram, nas cidades, predom inante­
roubos, trabalho ocasional e dos imigrantes irlandeses mais po­ m ente os m estres de pequenas oficinas, os lojistas, aprendizes,
bres — podem, como deplorou Francis Place, estar entre aqueles artesãos independentes, jornaleiros, trabalhadores, os pobres
que mais prontamente acorreram a Tyburn Fair para ver as da cidade; e, no campo, os vinicultores, pequenos camponeses
execuções públicas; mas não foram eles, e sim seus concidadãos proprietários, trabalhadores sem terras e artesãos rurais. Na
dos distritos mais sóbrios, de ocupações fixas, como a City, o Inglaterra, foram os pequenos lojistas, vendedores am bulan­
tes, artesãos, jornaleiros, criados e trabalhadores, num caso; e
Strand, Southwark, Shoreditch e Spitalfields, que participaram
tecelões, m ineiros, cardadores de lã e pequenos agricultores
de forma mais evidente dos motins.14
arrendatários e donos de terras, trabalhadores agrícolas e ar­
Se, portanto, os moradores dos cortiços e os elementos crimi­
tesãos de aldeias, no outro. Trabalhadores de fábricas só come­
nosos não constituíam a principal tropa de choque da multidão
çam a aparecer em grande número nos distúrbios ingleses (com
pré-industrial, ou o sustentáculo do motim e da revolução, quem
exceção das greves) da década de 1830. Na França, eles não
desempenhava tais papéis? A resposta concisa dificilmente consti­
existiram nos motins da Revolução de 1789-95, nem, praticamen­
tuirá uma surpresa. Basicamente, eram as "classes inferiores", ou
te, nos de fevereiro e junho de 1848; e, em 1789, pelo menos, até
menu peuple das cidades e do campo, ou aqueles que, em Paris e
mesmo os trabalhadores de manufaturas (têxteis, vidro, tabaco,
outras cidades durante a Revolução Francesa, eram chamados de tapeçarias, porcelana) desempenharam um papel muito menos
sans-culottes. Excepcionalmente, podem ser recrutados entre outros evidente do que os artesãos ou trabalhadores da construção ou
grupos sociais: há muitos exemplos nos distúrbios de 1787-95, em dos portos fluviais.
Paris, de participação ocasional de estudantes, professores, profis­ Tudo isso significa que a composição dos amotinados nas
sionais liberais, funcionários públicos, pessoas que viviam de pe­ cidades e aldeias tendia a refletir os padrões sociais de uma era
quenas rendas e funcionários de escritórios de advocacia. Em certa pré-industrial. Mas isso não é tudo o que se pode dizer, pois
ocasião, a do levante monarquista de outubro de 1795 (o 13 Vendé- houve variações consideráveis na composição desses am oti­
miaire), esses elementos parecem até mesmo ter desempenhado o nados de "classe in ferior", tanto como entre os diversos m o­
papel principal. Em Londres, também, nota-se, durante os distúr­ vim entos populares; e essas variações podem ser altamente
bios wilkitas de 1763-71, que cidadãos "da melhor posição" mis­ significativas pela possibilidade de lançarem nova luz sobre a
turavam-se ocasionalmente à "turba" vulgar. Normalmente, porém,

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natureza dos próprios distúrbios. Nas disputas trabalhistas, isso França, onde o interesse comum dos pequenos consumidores da
pode parecer tão óbvio a ponto de constituir o mais vazio dos cidade e do campo envolveu não só os vinicultores, pequenos proprie­
truísmos; não obstante, mesmo nesse caso, conheceremos mais tários camponeses e artesãos rurais da aldeia e da cidade-mercado,
sobre a natureza exata de uma reivindicação se os documentos como também os carregadores e trabalhadores da cidade. A diversi­
nos disserem se seus autores estavam entre os que ganhavam dade é menos óbvia, embora certamente não menos significativa,
m aior ou m enor salário dentro de seu ofício; certamente os num movimento puramente rural como o dos trabalhadores ingleses
carregadores de carvão, os tecelões, os lapidadores de vidro e de 1830. Nesse caso, a maioria dos participantes era, sem dúvida, de
chapeleiros de Londres, que entraram em greve em 1768-9, já trabalhadores agrícolas no sentido mais rigoroso da expressão: os
recebiam salários mais altos do que a maioria dos trabalhadores lavradores da terra com o arado, os segadores, os tiradores de leite, os
daquela cidade. cavalariços, os pastores e outros semelhantes. Mas uma minoria
Na Revolução Francesa, encontramos apenas uma ocasião em substancial era de artesãos rurais: carpinteiros, marceneiros, pedrei­
que os assalariados, em oposição a outros grupos entre os sans-cu- ros, sapateiros, funileiros, tecelões e trabalhadores na manufatura de
lottes, parecem ter predominado numa disputa que não era princi­ papel. Entre os degredados para a Austrália, houve variações signifi­
palmente trabalhista; mas isso ocorreu com os motins Réveillon de cativas entre um condado e outro; mas, tomando-os como um todo,
abril de 1789, onde a questão salarial, embora secundária em relação cerca de 1 em cada 3 dos mandados para Nova Gales do Sul, e entre
ao preço dos alimentos, teve certamente influência. Da mesma 1 em cada 4 ou 5 dos que foram para a Tasmânia, eram desse tipo.
forma, vemos que as mulheres desempenharam um papel mais Por vezes, a diversidade podia tomar outra forma e a entra­
destacado nessas ocasiões — como na marcha sobre Versalhes, em da de novos elementos sociais num motim já em processo poderia
outubro de 1789, os motins da fome de 1792-3 e o levante final dos mudar toda a sua direção. Nos motins Gordon, por exemplo,
sans-culottes, em maio de 1795 — quando os preços dos alimentos e "com erciantes da melhor posição", que seguiram lorde George
outras questões relacionadas com a sobrevivência ocuparam o pri­ Gordon a Westminster para apresentar a petição da Associação
meiro plano. Em outras ocasiões, foram os artesãos das pequenas Protestante, foram logo afastados do caminho pelas "classes
oficinas — mestres, artesãos independentes e jomaleiros — que inferiores" de Londres — pequenos comerciantes, jomaleiros,
tiveram o papel principal. Isso aconteceu sobretudo nos movimen­ aprendizes e criados — que passaram das palavras aos atos e
tos mais organizados, como a manifestação no Campo de Marte e começaram a incendiar casas, escolas e capelas dos católicos; e
os ataques armados à Bastilha e às Tulherias: nesses casos, os eles, por sua vez, foram reforçados alguns dias depois pelos
pequenos lojistas e mestres de oficinas, que eram os principais presos soltos de Newgate e outros "indesejáveis" que podem
veículos das idéias e lemas revolucionárias entre o menu peuple, com explicar as orgias menos discriminatórias que marcaram as fases
freqüência levaram seus jomaleiros, garçons e aprendizes junto com finais do motim. Observamos, também, a direção tomada pelos
eles, como companheiros numa empreitada comum.15 motins Rebeca, quando os pequenos agricultores arrendatários,
Nos motins rurais ingleses de princípios do século XIX, já que até o verão de 1843 tinham controlado com firmeza o movi­
vimos que a composição dos aldeões participantes poderia mu­ mento, começaram a perder sua direção para os trabalhadores
dar acentuadamente de um incidente para outro: em 1830, foram desempregados de Glamorgan e para os "profissionais" como
os trabalhadores agrícolas dos condados do sul que destruíram D ai'r Cantwr e Shoni Sgubor Fawr: foi então que ele entrou em
máquinas e queimaram o cereal dos donos de terras e dos agri­ sua fase "lunática" e começou também a expressar as reivindica­
cultores; já nos motins da década de 1840, no País de Gales, foram ções dos trabalhadores contra os agricultores.' Em ambos os
os agricultores arrendatários que planejaram as operações notur­ casos, notamos que o aparecimento desses novos elementos mu­
nas de Rebeca e as puseram em prática. Quando os motins foram dou a disposição dos mais "respeitáveis" entre os partidários
generalizados, podemos notar uma diversidade semelhante, entre
os que participavam, nas diferentes partes do país. Tal diversidade é
bastante óbvia em movimentos como a guerra da farinha de 1775, na * Ver pp. 175-176.

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originais do movimento: no primeiro, entre os pais de família da os autos judiciais relativos ao caso concordam, todos, nesse pon­
City, que ficaram com o governo quando suas propriedades, e to. Walpole ressalta o papel desempenhado pelos “aprendizes",
não apenas as dos católicos romanos, correram risco; e, no segun­ e o número destes, bem como de jornaleiros e jovens trabalhado­
do, entre os agricultores, que se tinham alarmado com a crescente res de todos os tipos entre as 160 pessoas levadas a julgamento,
militância dos trabalhadores. confirmam o que ele diz. Embora os registros no tribunal de Old
Numa escala maior, vemos um processo semelhante desen­ Bailey não proporcionem um quadro completo das idades dos
volver-se em Paris, em 1848. Foi a entrada dos faubourgs, em 23 presos, é notável a freqüência com que as testemunhas se referem
de fevereiro de 1848, que transformou uma manifestação política aos acusados como “ um jovem ", "um rapaz" ou "um m enino",
contra o ministério numa insurreição que forçou o rei a abdicar; ou lhes atribuem idades de 1 5,16,18 e até mesmo (num caso), de
e muito do que aconteceu entre fevereiro e junho pode ser expli­ "m enos de 14"; e, das 25 pessoas enforcadas, uma (e certamente
cado em termos do desejo dos revolucionários mais "respeitá­ não tantas quanto Walpole sugere) era um menino de 15 anos.
veis” de se livrarem de seus constrangedores aliados de “ classe Essa juventude, porém, não era uma característica comum a
inferior". Ou um processo semelhante poderia ocorrer inversa­ todos esses distúrbios. A média etária dos 42 ludistas degredados
mente, e insurgentes de uma classe social mais elevada assumi­ para a Austrália, entre 1812 e 1817, era de 30,7 anos; a dos 75
rem o controle de um movimento iniciado pelos assalariados ou cartistas degredados em 1842 era de 26,5 anos, e a dos 16 degre­
pelos pobres urbanos. Alguma coisa assim aconteceu em Paris, dados em 1848 era de 31. A idade do número muito maior de
em outubro de 1789, e, novamente, em setembro de 1793. No distribuidores de máquinas e incendiários de 1830 que foram
primeiro caso, um motim da fome lançado pelas mulheres do degredados não era tão elevada, mas era superior à média do dr.
mercado foi transformado numa manifestação política com obje­ Robson para a totalidade dos condenados: uma média de 29, no
tivos extensos, pela entrada em cena dos volontaires de la Bastille caso das várias centenas mandadas para a Tasmânia, e de 27, para
de Stanislas Maillard e dos batalhões da Guarda Nacional. No os mandados para Nova Gales do Sul — destes, mais da metade
segundo, uma manifestação das “classes inferiores" dos sans-cu- eram casados e com fam ílias.'16 Esse ponto é de certa importân­
lottes, em favor de um máximo geral, ou de um teto para o preço cia, pois talvez se possa deduzir que homens com família não
dos alimentos, foi temporariamente desviada por Hébert e os seriam tão facilmente arrastados para aventuras tão desespera­
líderes da Comuna, transformando-se numa marcha maciça das das sem o estímulo de uma reivindicação premente ou de uma
Secções parisienses para impor suas próprias exigências políticas convicção profunda. As idades das pessoas feridas ou presas, ou
à Convenção Nacional. Em abril de 1848, um grande comício de simplesmente participantes, nos distúrbios da Revolução Fran­
trabalhadores convocado pelos líderes dos clubes foi eclipsado e cesa também podem ser significativas sob esse aspecto. A média
obscurecido por uma contramanifestação dos pequenos-burgue- de idade dos 662 vainqueurs de la Bastille era de 34 anos; dos
ses da Guarda Nacional, reunidos para demonstrar sua fidelida­ mortos ou feridos no ataque às Tulherias, em 1792, de 38; e dos
de a Lamartine e ao governo provisório. E, sem dúvida, toda presos depois da insurreição de maio de 1795, de 36 anos. Tais
revolução é rica de ilustrações semelhantes. homens eram bem mais velhos do que os detidos por participa­
De maneira alguma esgota isso a variedade de componentes rem dos motins de cereais na França, em 1775 (média de idade,
a serem buscados na multidão pré-industrial. Outras variáveis, 30 anos), nos distúrbios pró-parlement (23) e nos motins Réveillon
como idade, grau de alfabetização, religião ou distribuição geo­ (29), às vésperas da Revolução, e no caso do Campo de Marte em
gráfica e ocupacional, podem ser igualmente significativas. Uns 1791 (31). A proporção de pessoas que podem ser consideradas
poucos exemplos bastam para ilustrar isso. Nos distúrbios anti-
papistas de Londres, é razoavelmente certo que uma alta propor­
ção dos que destruíram propriedades católico-romanas e outras * Compare-se com a média de idade de 25,9 anos, calculada pelo dr. Robson,
para todos os condenados ingleses masculinos degredados para as duas colônias
era de jovens ou meninos: observadores contemporâneos, como australianas entre 1787 e 1852, dos quais apenas pouco mais de uma quarta parte
Horace Walpole, cronistas posteriores, como Charles Dickens, e eram casados (op. cit., pp. 25-6).

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alfabetizadas devido a sua capacidade de assinar o auto das maior número de oficiais, como marcenaria, alfaiataria e sapata-
autoridades policiais nessas ocasiões também variou considera­ ria. Da mesma forma, com as modificações das condições histó­
velmente de um caso para outro — de 33% nos motins dos cereais ricas, é provável que investigações semelhantes da composição
de 1775 para 62% nos motins Réveillon, para 80 a 85% respecti­ da multidão na sociedade industrial mais desenvolvida das dé­
vamente no caso das journées de julho de 1791 e maio de 1795.* cadas de 1860 ou 1880 produzissem resultados muito diferentes.
Essas diferenças sugerem, sem dúvida, que os participantes de Esse último aspecto suscita uma outra pergunta: até que
um tipo de movimento eram mais educados do que os partici­ ponto é a multidão representativa dos grupos sociais de onde
pantes de outros. Infelizmente, porém, as provas nesses casos são vêm suas partes componentes? E bastante claro, sem dúvida, que
fragmentárias e inadequadas, não permitindo senão conclusões o fato de um certo número de serralheiros ou gravadores ter
muito experimentais. participado do sítio da Bastilha (e, nesse caso, sabemos o número
Igualmente significativa talvez seja a tendência de certas exato, reconhecido oficialmente) não quer dizer que contassem
ocupações serem mais radicais, rebeldes ou revolucionárias do com o apoio e a simpatia dos serralheiros e gravadores de Paris
que outras. Já notamos a inclinação dos mineiros de estanho de como um todo. Michelet supôs que assim era e, embora prova­
Comwall, dos tecelões e cardadores do West Country e dos velmente exagerasse, seu otimismo talvez tenha sido mais justi­
tecelões de seda de Spitalfields, e dos mineiros de carvão ingleses ficado nessa ocasião do que em outras. Mais freqüentemente, os
em geral, a serem arrastados para os motins da fome e para as historiadores trataram a multidão rebelde ou revolucionária
disputas violentas com seus empregadores; e já se ressaltou a como uma minoria m ilitante a ser nitidamente distinguida do
reputação de radicalismo, nessa e em outras épocas, dos pesca­ número muito maior de cidadãos de classe e ocupação seme­
dores franceses, dos madeireiros suecos, dos tosquiadores aus­ lhantes que, mesmo não sendo abertamente contra, não tiveram
tralianos e dos sapateiros vienenses.17 Durante minhas pesquisas, participação ativa no acontecimento. Assim, é comum estabe­
notei que os artesãos parisienses que mais se destacaram na lecer uma distinção entre militantes, ou "ativistas” , e a maioria
participação dos acontecimentos revolucionários de 1789-95 fo­ passiva. Será justificada tal suposição? E um problema com ­
ram os serralheiros, marceneiros, sapateiros, alfaiates e pedrei­ plexo, e ainda menos possível de ser solucionado pela citação
ros; e, entre as ocupações menos especializadas, os negociantes de dados estatísticos do que vários outros que focalizam os
de vinho, os carregadores d'água, os carregadores, cozinheiros e
neste capítulo. Para que um cálculo estatístico tenha uma re­
empregados domésticos. E notável como muitos desses ofícios
m ota possibilidade de convencer, teria de basear-se numa es­
reaparecem meio século depois entre os milhares de detidos e
pécie de am ostragem realizada entre a população em geral, o
condenados por participarem das jornadas de junho de 1848.18
que infelizm ente não é possível ao historiador.
Não há, é claro, nenhum mistério nisso: os pescadores franceses
Mesmo sem tais recursos, talvez se possa argumentar que
(para tomar um exemplo) podem, em sua longa história, ter
essa distinção entre militantes e "passivos" não deve ser levada
sofrido de uma margem muito injusta de insegurança de empre­
demasiado longe. E válida, sem dúvida, no caso dos pequenos
go; e não surpreende que, nas condições históricas aqui focaliza­
grupos de "ativistas" ou meneurs que, mesmo no movimento que
das, os artesãos sejam mais profissionalmente militantes do que
parece ser totalmente espontâneo, tiveram um papel claro: a eles
os trabalhadores de fábricas ou trabalhadores domésticos e que,
voltaremos num outro capítulo. A multidão podia ser formada
entre eles, os mais atuantes sejam os pertencentes a ofícios com
principalmente por um grupo de militantes dedicados, que deli­
beradamente se associaram e cuja dedicação, determinação e
percepção política os distinguia de forma mais ou menos clara de
* The Crouiil in the French Revolution, p. 249 (Apêndice V). No caso dos amotina­
dos "S w in g " de 1830, a porcentagem dos que sabiam ler, ou ler e escrever, seus concidadãos mais passivos. Isso pode ter ocorrido com as
oscilava entre 66 e 75%, de acordo com o navio em que viajaram. Não há, porém, operações quase militares da Revolução Francesa, como o ataque
certeza de que os métodos para verificar a alfabetização fossem os mesmos em
às Tulherias, em agosto de 1792, ou a marcha sobre a Convenção,
cada caso. (Ver referência 12.)

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realizada pelos batalhões sans-culottes em maio de 1795. Isso, de sim patia e interesse comum ligando os poucos ativistas com
porém, só podia acontecer depois que a Revolução tivesse tido
os muitos inativos. Mais luz talvez possa ser lançada sobre o
tempo de produzir uma elite política a partir dos próprios sans- assunto quando, em capítulos posteriores, examinarmos os mo­
culottes, treinada nos clubes, assembléias distritais e Guarda Na­ tivos subjacentes aos distúrbios populares e as causas de seu
cional, e pela experiência adquirida com uma série de joum ées sucesso ou fracasso.
populares. Não poderia ter ocorrido nos anos anteriores e só
poderia acontecer muito mais tarde na Inglaterra, onde o motim
jam ais chegou à fase de revolução. Em outros casos, nas greves e
motins da fome em particular, é duvidoso que se possa estabele­ REFERÊNCIAS
cer uma distinção precisa e válida, desse tipo, entre a grande
maioria dos que se juntam à multidão e os que ficam à beira da 1. A . Soboul, Les sans-culottes parisiens en Van II (Paris, 1958), p. 440
calçada como meros espectadores, ou até mesmo permanecem 2. A . Briggs, “ The Language of 'C lass' in Early N ineteenth-Century
em casa. A questão complica-se ainda mais porque, nessas oca­ E ngland", em A. Briggs e J. Saville (orgs.) Essays in Labour History
siões, observadores inocentes, ou participantes ocasionais, po­ in Memory of G.D.H. Cole (Londres, 1960), pp. 43-73.
3. G. Le Bon, The Crowd: A Study of the Popular Mind (Londres, 1909)
dem ser mortos por balas ou, se cederem a uma demonstração
pp. 36 ss. [Título original: La Psychologie des foules]; La Révolution
momentânea de entusiasmo, podem ser presos como "líd eres": françaiseet la psychologie des révolutions (Paris, 1912), pp. 53-61,89-93.
os registros policiais franceses estão cheios de exemplos disso.' 4. M.D. George, London Life in the Eighteenth Century (Londres, 1951),
Um problema correlato é até que ponto a minoria de parti­ pp. 118-19; D orothy M arshall, Eighteenth-Century England (Londres,
cipantes ativos conta com a simpatia da m aioria passiva. E 1962), pp. 36-7.
im possível, m ais uma vez, discutir isso a não ser nos termos 5. L. Chevalier, Classes laborieuses et classes dangereuses (Paris, 1958).
6. G. Rudé, "T h e Gordon Riots: A Study of the Rioters and their
m ais gerais. Há ocasiões em que a multidão (usando a palavra
V ictim s", Transactions of the Royal Historical Society, 5a série, VI
em seu sentido mais amplo) só pode impor sua autoridade, ou (1956), 104-105.
conseguir a aquiescência silenciosa da maioria, pelo terror ou 7. G. Rudé, "L a taxation populaire de m ai 1775 à Paris et dans la région
violência destrutiva, ou pela demonstração de uma força su­ p arisienne", A nn. hist. de la Rév.franç., n2 143, abril-junho de 1956,
perior. Foi, sem dúvida, apenas por esses meios que os grupos pp. 139-79; e " L a taxation populaire de mai 1775 en Picardie, en
das armées révolutionnaires recrutados em Pa;ris e em outras N orm andie, et dans le Beauvaisis", ibid. na 165, julho-setembro de
1961, pp. 305-326.
cidades puderam impor sua vontade à população rural france­ 8. V er m eu The Crowd in the French Révolution (Oxford, 1959), pp.
sa no outono de 1793. E um medo semelhante das conseqüên­ 186-90, 249. t
cias provavelm ente contribuiu para a inatividade dos policiais 9. Gentleman's Magazine, XXXVII, 48 (26 de fevereiro de 1767) (grifo no
e m agistrados londrinos durante os motins antipapistas de original).
1780. Mas não foi esse o caso dos motins Réveillon em Paris, 10. Tasm anian State Archives, 2 /1 3 2 -2 /1 7 8 , 5 3 /4 3 2 8 ; The Names and
Descriptions of Ali Male and Female Convicts Arrived in the Colony of
em abril de 1789; ainda assim, muito depois de term inados os
New South Wales during the Years 1830 to 1842 (11 vols., Sydney,
d istúrbios, a população local m ostrou onde estavam suas 1843), II, 43-52.
sim patias, recusando-se a entregar à justiça participantes do 11. L.L. Robson, The Origin and Character of the Convicts Transported to
m ovimento. Observamos exemplos semelhantes nas m anifes­ New South Wales and Van Diemen's Land 1787-1852 (tese de doutora­
tações luditas, no centro e no norte da Inglaterra, e nos motins do inédita, Australian NationaLU niversity, Canberra, 1963), pp.
Rebeca, na Gales do Oeste. Nesses casos, há um evidente laço 28-9.
12. V er meu artigo " 'C aptain Swing' and Van Diemen's L an d ", a ser
publicado em Tasmanian Historical Research Association: Papers and
Proceedings.
* Ver pp. 268-271. 13. L. Chevalier, op. cit., pp. 551-3.

228 229
14. G. Rudé, The Crowd in the French Revolution, pp. 185-6; Wilkes and
Liberty (Oxford, 1962), pp. 13-16; "T he London 'M ob' of the Eight- CAPÍTULO QUATORZE
eenth C entury", The Historical Journal, II, i (1959), 1-18.
15. The Crowd in the French Revolution, pp. 179-85.
16. G. Rudé, Protest and Punishment (Oxford, 1978) pp. 250-51.
17. E.J. Hobsbawm, Primitive Rebels (Manchester, 1959), p. 122 (citando
o Dr. Ernst W angerm ann); W.G. Runciman, Social Science and Poli-
tical Theory (Cambridge, 1963), pp. 95-6 (citando André Siegfried).
18. The Crowd in the French Revolution, pp. 185, 234-5, 246-8 (A pêndi­
ce IV).

Motivos e Crenças

E
nquanto a multidão na História foi considerada indigna de
atenção séria, era natural que o estudo de seus motivos fosse
um tanto superficial. As explicações das causas que levavam as
multidões a se amotinarem ou rebelarem tendiam, naturalmente,
a variar com as atitudes sociais ou valores dos autores. Aqueles
para os quais as ações da multidão eram totalmente censuráveis,
ela parecia ser levada pelos motivos mais vis, pela atração do
saque, do ouro, do estupro, ou pela perspectiva de satisfazer
outros instintos criminosos em potencial. Para os que considera­
vam a multidão, no todo, digna de simpatia ou compaixão, e não
de reprovação (embora isso variasse com a ocasião), ideais no­
bres, em particular os de sólida inspiração de classe média e
liberal, desempenhavam um papel influente. Para outros ainda,
aqueles que Marx chamou de proponentes do materialismo "v u l­
gar", os fatores econômicos a curto prazo pareciam a explicação
mais válida de todos os tipos de inquietação popular, e qualquer
distúrbio tornou-se, quase que por definição, um motim da fome,
ou émeute de la faim .
Nenhuma dessas explicações é totalmente destituída de
méritos, embora sejam superficiais ou enganosas. Espero mostrar
neste capítulo a razão disso. Uma palavra preliminar, porém, é
necessária sobre a primeira dessas interpretações, que, sendo a
mais generalizada das três, pede um comentário à parte. Sua

230 231
motins de fome, como os invasores das mercearias de Paris, em
suposição implícita parece ser a de que as massas nao tem aspi­ fevereiro de 1793, tinham sido pagos por agentes de Pitt ou dos
rações dignas e próprias e, sendo naturalmente venais, so podem "aristocratas".2 Trinta ou 40 anos depois, essas explicações sim­
ser levadas à atividade pela promessa de uma recompensa, feita ples tinham perdido muito de sua violência: basta ler os debates
por agentes de fora ou “ conspiradores". "N a maioria dos movi­ parlamentares ingleses sobre os luditas e cartistas para apreciar
mentos populares", diz Mortimer-Ternaux, histonador do Ter­ a diferença. Mas, durante todo o século XVIII, a polícia — a
ror revolucionário francês, " o dinheiro tem maior influencia do francesa talvez mais obstinadamente do que a inglesa — apegou-
que o sentimento ou a convicção" (la passion). E Tame e sua esco a se à convicção de que os agentes do motim e da rebelião eram o
apresentam explicações semelhantes para a queda da Bastilha ou suborno e a "conspiração".
para a derrubada da monarquia francesa.1 Tal opmiao, porem, Para ilustrar esse ponto, vamos citar o notável interroga­
com sua evidente tendenciosidade social, tem ampla confirma­ tório que a polícia de Beauvais fez a um trabalhador de lã,
ção na opinião dos observadores contemporâneos. Enquanto preso na cidade-mercado de Mouy, na época dos motins dos
nenhuma tentativa séria foi feita para sondar as aspirações mais cereais de 1775:
profundas dos pobres, suas explosões periódicas em motins ou
rebeliões eram passíveis de ser atribuídas às maquinações de um
adversário político ou à mão oculta .
Dessa atitude participavam todos os que dispunham de P. Como se sabia que havia motins em outros lugares?
autoridade, fosse aristocrática ou de classe média, conservadora, R. Todos diziam isso no m ercado de Mouy.
liberal ou revolucionária, embora o tipo de explosão que pudesse P. A pareceram "estran geiros" que concitaram o povo a am oti­
ser tolerado, em caráter excepcional, variasse naturalmente de nar-se?
uma classe ou partido para outro. Onde Sir Robert Walpole, R. Ele não viu nenhum.
P. Como eram esses "estran geiros"?
principal ministro do rei, atribuía os motins de 1736 na Inglaterra
R. Repete que não viu nenhum.
à conspiração jacobita, e alguns de seus agentes falavam sombria­
P. Sobre o que falavam?
mente da "igreja conservadora" ou de "padres papistas , lorde
R. Repete que não viu "e stran g eiro s".
Granville, par da oposição, atribuía esses "tum ultos à opres­ P. A legaram eles ser portadores de ordens do rei e m ostraram
são" E onde os ministros de Jorge III e seus agentes insinuavam papéis que pretendiam provar isso?
que os motins Gordon podiam ter sido instigados pelo ouro R. Repete que não viu "estran geiros".
francês ou americano, alguns líderes da oposição inclinavam-se P. Deram , em prestaram ou prom eteram dinheiro?
a culpar o próprio governo, por ter estimulado deliberadamente R. N ão viu ninguém oferecendo dinheiro.
os motins como pretexto para chamar o exército e impor a lei P. A lgum deles m ostrou pão bolorento... para estimular o povo?
marcial. Na verdade, foi comum na Inglaterra do século XVIII um R. Ele não viu nenhum pão bolorento.
partido acusar o outro de "organizar uma turba". Na França, P. Sabe onde, e por quem, esse pão bolorento foi feito?
R. Repete que não viu nenhum pão bolorento.
Voltaire, sendo crítico da aristocracia e amigo de Turgot, conven­
P. Como é que os m oradores de cada aldeia se reuniram no
ceu-se de que os amotinados dos cereais de 1775 estavam a soldo
mesm o dia e na mesma hora?
dos inimigos de Turgot na corte. Durante a Revolução Francesa,
R. Isso sempre acontece nos dias de mercado.
tanto os líderes revolucionários como seus adversários monar- P. Ele viu algum volante ser colocado ou distribuído?
quistas ou aristocráticos eram notavelmente liberais com tais R. Não.
acusações, quando isso lhes convinha: Montjoie, jornalista mo- P. Eram impressos ou escritos a mão?
narquista, declarava ter provas de primeira mão (que se revela­ R. Repete que não viu nenhum.
ram insubstanciais) de que os amotinados de Réveillon, em 1789, P. Sabe onde foram impressos?
tinham sido subornados com louis d ’or; e girondinos e jacobmos R. Repete que não viu nenhum.
dispunham-se igualmente a acreditar que os promotores dos
233
232
P. Reconhece a letra dos escritos a mão? mam a casa ou a fiação de seu empregador, ou destroem suas
R. Responde que não viu nenhum. máquinas durante uma disputa trabalhista, não precisamos de
P. Onde beberam, com quem, e quem pagou as bebidas?
poderes divinatórios para concluir que, qualquer que seja a forma
R. Repete que não viu ninguém.3
do distúrbio, seus objetivos são os aumentos de salário. Da mes­
ma forma, quando os participantes dos motins da fome ameaçam
padeiros, invadem mercados e rasgam sacos de farinha ou cereal,
É notável que esse interrogatório insistente tenha produzi­
podemos supor que o objetivo real não é tanto o de intimidar ou
do, neste e em outros casos, resultados quase que totalmente
destruir, mas de fazer baixar o preço dos alimentos. E, ainda uma
negativos. Ocasionalmente, um preso ou uma testemunha, ao
vez, quando os parisienses atacam e tomam a Bastilha, e os
contrário do preso de nosso exemplo, admite ter ouvido boatos
sobre distribuição de dinheiro para provocar desordens, mas londrinos "derrubam " casas e capelas católicas, devemos supor
nunca presenciou a transação, nem participou pessoalmente. Isso que pretendiam fazer exatamente isso. Ao procurar os motivos,
não quer dizer que tais boatos fossem todos igualmente destituí­ devemos, portanto, não ser tão sutis ou tortuosos a ponto de
dos de fundamento, mas mostra que os casos de suborno nos desconhecer a intenção clara ou básica.
movimentos populares não são tão freqüentes quanto as autori­ Essa intenção clara, porém, só nos proporciona uma chave
dades supunham.4 Nem exclui a realidade do suborno em outros para a natureza geral de um distúrbio; e aqui não nos interessa
casos, quando grupos de capangas corpulentos foram recrutados tanto isso, e sim o que levou pessoas, freqüentemente de diferen­
por um homem de “ qualidade" para espancar ou intimidar um tes grupos sociais, diferentes ocupações e crenças, a participar do
adversário político. Isso aconteceu na eleição de dezembro de acontecimento. Mesmo que os motivos imediatos, ou claros,
1768, no Middlesex, quando o canditado da corte, Sir William saltem aos olhos, ainda temos de explorar os que estão sob a
Beauchamp Proctor, contratou um grupo de carregadores irlan­ superfície. E, se pessoas de diferentes classes ou credos estão
deses — ao preço de 2 guinéus por dia, como declarou seu líder envolvidas, algumas podem ser impelidas por um motivo, e
— para expulsar os partidários de seu adversário radical da outras, por um outro. Portanto, os motivos variam não só entre
tribuna onde eram escolhidos os candidatos.5 Era o conhecido uma ação e a seguinte, como também entre diferentes grupos de
recurso de "form ar uma Turba"; mas nada tinha a ver com o tipo participantes do mesmo distúrbio. Ainda assim, ficaremos irre­
de movimento popular que examinamos aqui. m ediavelm ente confusos de não tentarmos estabelecer certa
De qualquer modo, essas explicações, mesmo quando dota­ distinção entre o que podemos chamar de motivos ou crenças
das de substância mais sólida de verdade, são grosseiras e exces­ dominantes e os subjacentes. Aqui, por uma questão de clareza,
sivamente simplificadas. A multidão pode amotinar-se porque vamos dividir os primeiros em "econôm ico" e "p olítico", e exa­
está com fome, ou teme vir a ficar, porque sofre profunda injus­ minar que papel tiveram, tanto separadamente como em associa­
tiça social, porque busca uma reforma imediata ou o milênio, ou ção, nas atividades da multidão pré-industrial.
porque quer destruir um inimigo ou acalmar um "h eró i". Rara­ Vamos começar com os distúrbios em que as questões eco­
mente, porém, é apenas por uma dessas razões. E claro que seria nômicas tiveram claro predomínio. Foram eles os motins da fome
ridículo rejeitar as respostas simples e óbvias somente por serem (na época, os mais freqüentes), as greves, os ataques de campo­
simples e óbvias. Os motivos econômicos, por exemplo, podem neses aos castelos, a destruição de portões e cercas, a queima de
ser considerados predominantes nas greves e motins da fome, tal medas de feno e a destruição de máquinas industriais e agrícolas.
como as questões políticas desempenham um papel de variada Representam, como já vimos, a grande maioria das agitações das
importância, tanto nos movimentos de reforma radicais como quais a multidão pré-industrial na França e Inglaterra participou
nos movimentos dirigidos contra a reforma radical, como os ativamente. E devemos supor (a menos que tenhamos prova em
motins Priestley de Birmingham, em 1791. Quandos os mineiros contrário) que a gente comum da cidade e do campo a elas foram
do estanho de Cornwall, ou os tecelões do West Country, quei­ impelidas pela necessidade de manter ou melhorar os padrões de

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vida, para aumentar os salários ou impedir sua redução, para 1720,1752 e 1788, e de Londres em 1736,1768 e 1794, embora ali
resistir à usurpação de suas terras ou de seus direitos de pasta­ os motins Gordon e, mais tarde, os distúrbios wilkitas, pareçam
gem comum, para proteger seu meio de vida contra a ameaça de ter constituído exceções." Da mesma forma, as revoluções france­
novos aparelhos mecânicos e, acima de tudo, para assegurar um sas de 1830 e 1848 ocorreram durante períodos de escassez de
abastecimento constante de alimentos baratos e abundantes. Não alimentos e depressão econômica; e observamos o papel que
obstante, as más condições econômicas, e até mesmo terríveis coube aos desempregados de Paris, em junho de 1848. A mesma
condições econômicas, não eram um “ gatilho” automático para intrusão das questões econômicas é evidente nas manifestações
as perturbações. Na Inglaterra, as greves e a atividade sindical inglesas de princípios do século XIX; o professor Rostow ilustrou
tenderam a ocorrer não em momentos de grande depressão eco­ vivamente esse ponto em sua “carta de tensão social” para os
nômica e desemprego, mas antes na ascensão de um surto de anos de 1790 a 1850.7
prosperidade: como em 1792,1818,1824 e 1844-66 (o ano de 1768 Nessas ocasiões, a escassez e o elevado preço do pão e dos
parece ter sido uma exceção). Durante a Revolução Francesa, alimentos parecem ter agido como um estímulo à participação
como observamos, as mais prolongadas disputas trabalhistas popular em movimentos que tinham ostensivamente outros ob­
foram as de 1791 e 1794, anos de relativa prosperidade; e, quando jetos e versavam sobre outras questões. Durante a primeira Re­
uma inflação incontrolável e o desemprego predominavam, co­ volução Francesa, a preocupação com o preço do pão é um fio
mo no inverno de 1794-5, as greves paravam e passavam a ocorrer constante que percorre todas as fases da luta dos partidos e quase
motins de fome. Estes, ao contrário das greves, eram produto todas as grandes joum ées populares, explicando, talvez mais do
direto das más colheitas e depressão econômica, preços em as­ que qualquer outro fator, a unidade e a militância dos sans-culot-
censão e escassez de estoques. Mas não ocorreram necessaria­ tes parisienses. A crise revolucionária de 1789 transcorreu sobre
mente no auge de um ciclo de elevação de preços; vimos que um pano de fundo de preços do pão em constante e acentuada
tenderam mais, como nos maiores distúrbios desse tipo antes de elevação: vimos como o movimento camponês começou com
1789 — os de 1766, na Inglaterra, e os de 1775, na França — a ataques aos mercados, moinhos e celeiros, antes de se transfor­
surgir em conseqüência de um súbito e acentuado movimento mar numa guerra contra os donos de terras. E os participantes
ascendente que levou à escassez e às compras provocadas pelo dos motins Réveillon, que destruíram as casas de dois manufatu-
pânico. M ais uma vez, greves, motins de fome e movimentos reiros impopulares, também atacaram mercearias e exigiram uma
cam poneses, mesmo quando as questões predom inantes eram redução no preço do pão. Em outubro, as mulheres dos merca­
puram ente econôm icas, podiam ocorrer com um pano de fun­ dos, que marcharam sobre Versalhes para levar a família real até
do político que lhes dava uma maior intensidade, ou uma nova Paris, cantavam enquanto marchavam (pelo menos, assim diz a
tradição): "vam os buscar o padeiro, a mulher do padeiro e o
direção. Em Londres, em 1768, as disputas trabalhistas já exis­
f ühinho do padeiro”; e Barnave, aos descrever os acontecimentos
tentes foram contaminadas pelo movimento político wilkita: en­
do dia a seüs eleitores dauphinois, escreveu que, enquanto “a
contramos tecelões e carregadores de carvão aclamando John
burguesia” estava preocupada principalmente com as questões
W ilkes; e na França, em 1789, parece improvável que os cam ­
políticas, “ o povo" estava igualmente preocupado com a escas­
poneses tivessem escolhido aquele momento específico para
sez de alimentos. A deflagração da guerra trouxe novos proble­
acertar contas com seus senhorios se as condições políticas
mas: não só o pão, mas a carne, o vinho, o café e o açúcar
gerais não fossem as que eram. começaram a desaparecer das lojas e, em Paris, os motins da fome
Inversamente, os motivos econômicos interferem com fre­
antecederam, ou acompanharam, cada uma das joum ées políticas
qüência em movimentos que eram, em sua essência, políticos.
de 1792 e 1793. Em setembro de 1793, já vimos, foi como resultado
Motins urbanos, nos quais as questões políticas geralmente inter­
feriam, ocorreram com freqüência num ambiente de elevação de
preços ou escassez de alimentos: vimos exemplos de Paris em
* Ver Capítulo 3.

236 237
"V ive le Tiers Etat!" e (como os camponeses de Arthur Young,
direto da agitação popular nos mercados, ruas e Secções que a
alguns meses depois)11 lhe tivessem dado um significado espe­
Convenção Nacional aprovou a lei do Máximo Geral, que esta­
cial, próprio. E tais idéias e lemas não eram certamente guarda­
beleceu um teto para os preços da maioria dos artigos de primeira
dos no gelo, por assim dizer, para as grandes ocasiões políticas:
necessidade. E, depois da queda dos jacobinos e do abandono do
pelo contrário, há inúmeras provas de que se difundiam cada vez
máximo, os insurgentes de maio de 1795 levavam em seus bones
mais profunda e amplamente, à medida que a Revolução avan­
e blusas os lemas duplos "A Constituição de 1793" e "Pao .
çava. Já em agosto de 1789, encontramos um armeiro jornaleiro
Não estamos, certamente, argumentando que os fatores
preso em Versalhes por falar mal do general Lafayette, apoiando
econômicos a curto prazo fizeram desaparecer todos os outros e
suas palavras em um considerável público com apelos aos "d i­
que os movimentos populares desse período, mesmo os politica­
reitos do hom em "; e Malouet, um observador hostil, relata como,
mente orientados como os da Revolução Francesa, foram todos,
nessa época, os carregadores às portas da Assembléia Nacional
na realidade, motins da fome disfarçados. Vimos num capítulo
discutiam com todo o interessse os prós e os contras dos argu­
anterior que, antes mesmo de 1789, as idéias políticas dos parle-
mentos em favor do direito de veto real. Um ano depois, os
ments de Paris e do Conselho Municipal da Cidade de Londres
democratas do Club des Cordeliers formavam clubes e socieda­
desempenharam um certo papel nos distúrbios populares. Ed-
des populares através dos quais começaram a dar aos pequenos
ward Thompson afirma que as multidões londrinas das décadas
artesãos e aos assalariados instrução sistemática sobre as doutri­
de 1760 e 1770 "m al tinham começado a desenvolver organiza­
nas revolucionárias mais avançadas. E lemos, nos arquivos da
ções ou líderes próprios" e que, inspirando-se em teorias pouco
polícia, que jornaleiros e criados domésticos assinavam jornais
distintas das defendidas por seus "diretores" da classe media,
radicais e até mesmo se inscreviam no exclusivo Clube Jacobino.12
ainda eram um instrumento pouco confiável das políticas radi­
Sob esse impulso, os sans-culottes não só formaram orga­
cais 9 isso é certo, e a prova está no fato de que a mesma multidão
nizações políticas próprias como também, mais tarde, quando
que gritara por "W ilkes e Liberdade", em 1768, alguns anos mais
dominavam as Secções parisienses e a Comuna, começaram a
tarde dirigia suas energias para canais pouco propícios à causa
apresentar novas políticas e soluções que se m ostraram alta­
radical — destruição de casas e capelas católicas. Não obstante,
m ente constrangedoras para seus aliados jacobinos. E não só
as lições políticas aprendidas não foram totalmente esquecidas,
isso: tendo assimilado sUas idéias, deram-lhes um novo conteú­
tendo revivido e se enriquecido sob o impacto da Revolução de
do que correspondia mais a seus próprios interesses do que aos
1789, formulando de maneira clara, em seus aspectos multifor-
interesses de seus professores da classe média.13
mes, os novos conceitos dos "direitos do homem e da sobera­
O movimento dos sans-culottes terminou, como já vimos,
nia do povo", acrescentou uma dimensão nova aos distúrbios
com a manifestação final e desastrosa de maio de 1795 e, quando
populares e deu um novo conteúdo à luta dos partidos e classes.
reapareceu, na década de 1830, tinha adquirido um novo conteú­
Alguns historiadores colocaram em dúvida a profundidade
do social e novos gritos de guerra e lemas. Como dissemos no
da penetração dessas idéias políticas entre a gente do povo. O
Capítulo 11, foram o advento da revolução industrial e o cresci­
professor Cobban, por exemplo, questionou a importância da
mento do movimento da classe trabalhadora nos anos interme­
circulação de alguns lemas políticos, pois (escreve ele) "sabem os
diários, em grande parte, os responsáveis pela transformação.
com que facilidade se pode ensinar a multidão a gritar tais lemas
Babeuf, durante a primeira das revoluções políticas, já tinha dado
e o pouco conteúdo político que eles podem ter".10Isso seria certo
uma nova cor socialista às idéias de 1789, embora fosse tarde
se se tratasse apenas de gritar lemas tomados de empréstimo,
demais para encontrar um público efetivo entre os sans-culottes.
embora até mesmo estes tivessem certa importância para con­
Só depois de 1830 suas idéias, e outras semelhantes, provocaram
quistar o apoio popular a uma causa radical: é sem dúvida
uma reação profunda entre os clubes e organizações de trabalha­
significativo, por exemplo, o fato de que, mesmo antes de os
dores que surgiram em Paris e tiveram um papel tão destacado
Estados Gerais se reunirem em Versalhes, em 5 de maio de 1789,
nos acontecimentos de 1848.0 que havia de novo, agora, não era
multidões parisienses tivessem repetido a palavra de ordem
239
238
apenas o conteúdo das idéias em si, mas a classe de homens que proporcionalmente maior do que na própria França. As socieda­
as expressavam. Entre os detidos após as “jornadas" de junho des inglesas tiveram, porém, vida curta, sucumbindo à repressão
daquele ano estava Antoine Bisgambilia, um artífice (mécanicien) imediata, e pouca oportunidade de recrutar membros entre a
obscuro e analfabeto que, em nota ditada para a polícia, na prisão população fabril que começava a aparecer.
de La Roquette, expressou assim suas convicções políticas: As idéias jacobinas, porém, sobreviveram e, aos poucos,
encontraram um público maior; "levadas a aldeias de tecelões,
às oficinas de teares de malha de Nottingham e aos segadores do
Todos sabem que eu não faço concessões em m atéria de
Yorkshire, aos filatórios do Lancashire, propagaram-se durante
consciência e, enquanto tiver um sopro de vida no corpo, eu o
todos os períodos de aumento de preços e de dificuldades".16Elas
usarei p ara a vitória da República Dem ocrática e Socialista.14
voltaram novamente à superfície na atmosfera política mais livre
da eleição para Westminster, em 1807, quando os radicais Burdett
e Cochrane foram levados à vitória pelo voto popular e inspira­
Devemos reconhecer que essa declaração aparece num do­
ram os tecelões do Lancashire, que foram atacados pela milícia
cumento isolado e que dificilmente poderíamos esperar encon­
montada de Manchester no grande comício pela reforma parla­
trar outras desse tipo. Mas a natureza da revolta de junho e o
grande número dos detidos e condenados mostram que tais mentar de agosto de 1819, em St. Peter's Fields. Depois disso, a
opiniões eram partilhadas por muitos outros. O certo é que, já tradição jacobino-radical, enriquecida pelas lembranças de "Pe-
então, os assalariados — ferroviários, trabalhadores na constru­ terloo", assumiu uma nova forma com o advento das idéias
ção e jom aleiros dos ofícios tradicionais — estavam desempe­ socialistas defendidas por Robert Owen e outros. Foi essa mistura
nhando um papel muito maior nos movimentos políticos do que de idéias que modelou o pensamento político de homens como
na primeira revolução, e estavam até mesmo (como os lojistas e George Loveless, sindicalista e um dos "M ártires de Tolpuddle"*
artesãos, em 1793) fazendo exigências políticas próprias. de 1834, que, alguns anos antes de Marx, escreveu: "nada será
Evolução semelhante ocorreu na Inglaterra e, sob certos feito para minorar o sofrimento da classe trabalhadora, a menos
aspectos, ela foi mais rápida do que na França. Como na Inglater­ que eçta o faça por suas próprias m ãos."17 E, numa moldura bem
ra não atravessou nenhuma revolução própria, as novas idéias mais ampla, essas idéias foram levadas à frente na agitação
revolucionárias dos direitos do homem e da soberania popular nacional pela Carta do Povo, que, como já vimos, tanto se inspi­
foram copiadas, em grande parte, do outro lado do canal da rava no passado como se voltava para o futuro.
Mancha. Com as obras de Thomas Paine e outros, essas idéias Talvez não tenha passado despercebido ao leitor o fato de
começaram, já em 1792, a circular entre democratas, dissidentes que, até agora, nos ocupamos principalmente dos aspectos "p ro ­
e mestres artesãos e jomaleiros das grandes cidades e das cidades gressistas" dos motivos da multidão para se rebelar e amotinar.
industriais. Foi também naquele ano que a Sociedade dos Corres­ Nossa argumentação pode ter dado a impressão de que, se ho­
pondentes de Londres, de Thomas Hardy, começou a reunir-se mens e mulheres foram levados a tais atividades, foi por estarem
no bar The Bell, em Exeter Street, tendo como associados os muito famintos, por desejarem acabar com uma opressão real ou
pequenos comerciantes urbanos e os artesãos: uma composição imaginária ou para garantir um futuro mais rico e mais feliz, ou
social semelhante ao público que se reunia nos clubes e comitês por uma combinação de razões semelhantes. Mas isso é apenas
da Paris revolucionária. Não obstante, em algumas sociedades parte da história. Se limitarmos nossa atenção a fatores como
inglesas, como a de Sheffield, parece ter havido uma porcenta­ estes, como explicar então manifestações como os motins Gor-
gem maior do "tipo inferior de manufatureiros e trabalhadores"
do que em organizações semelhantes na França.15 Sob esse aspec­
to, talvez se possa dizer que, na Inglaterra, as novas idéias revo­ * Tolpuddle Martyrs, 6 trabalhadores agrícolas condenados ao degredo de 7
anos, em 1834, por terem criado um sindicato na aldeia de Tolpuddle, Dorset. (N.
lucionárias encontraram entre os assalariados uma receptividade do T.)

240 241
don, os movimentos milenares, o ludismo ou o “ Igreja e rei", ou A turba está particularmente irritada contra as grandes p a­
mesmo o paradoxo dos sans-culottes revolucionários parisienses róquias de St. Mary-le-Bow, St. George H anover Square e St.
que, como vanguarda da democracia radical, voltavam-se para o Jam es, que com preendem as casas de quase todas as grandes
famílias do Reino Unido.19
futuro e, para a solução de seus males econômicos, voltavam-se
para as condições idílicas de um passado imaginário?18 Para
compreender tais fenômenos, temos de examinar também alguns
Mas, até então, o instituto de "nivelam ento" da multidão
dos motivos básicos e mitos e crenças tradicionais — o que os
podia ser atrelado tanto a uma causa anti-radical como a uma
psicólogos da multidão e os cientistas sociais denominaram de
causa radical. Nos motins Gordon, a escolha de alvos pela mul­
crenças "fundam entais" ou "generalizadas"* — que tiveram um
tidão mostrou que ela estava mais interessada em destruir as
papel destacado nesses distúrbios.
propriedades dos católicos ricos do que as dos católicos em geral;
Para começar, temos o tradicional instinto do "nivelam en­
e um amotinado de Bermondsey disse à sua vítima, que afirmava
to ", comum em todas essas ocasiões, que leva os pobres a buscar
ser protestante: "Protestante ou não, nenhum cavalheiro precisa
um grau de justiça social elementar às expensas dos ricos, les
de mais do que 1.000 libras por ano. Isso é suficiente para um
grands, e dos que representam a autoridade, quer sejam funcio­
cavalheiro v iv e r."20 Notamos um motivo subjacente semelhan­
nários do governo, senhores feudais, capitalistas ou líderes revolu­
cionários de classe média. E o terreno comum no qual, além dos te no movimento "Igreja e rei": se jacobinos foram atacados
lemas das partes em conflito, o sans-culotte encontra o amotinado do nas ruas de Nápoles, em 1799, foi tanto porque viajavam em
"Igreja e rei" ou o camponês em busca de seu milênio. Até mesmo carruagens como pelo fato de serem aliados dos franceses
em períodos de relativa paz social, nós o encontramos nos métodos " a te u s "; e, em Birmingham, Priestley e seus com panheiros
tradicionais de "auto-ajuda" da população rural, tanto na França foram escolhidos não só porque eram dissidentes ou reform a­
como na Inglaterra. A medida que as dificuldades aumentam ou dores, mas também porque eram manufatureiros, magistrados
surge a oportunidade, pequenos agricultores e proprietários, cam­ e hom ens de riqueza e posição.* Da mesma forma, os cam po­
poneses e arrendatários servem-se da lenha e da caça às expensas neses da Vendéia reagiram contra a Paris revolucionária por­
do grande proprietário ou do rico agricultor e, quando encontram que, por m otivos muito particulares, seu ódio à burguesia
resistência, agridem o guarda de caça ou queimam as medas do urbana era maior do que seu ódio aos senhores locais; e Toc-
agricultor. Tais crimes são punidos severamente pela lei — na queville, embora seu senso da história não fosse tão arguto
Inglaterra, cada vez mais depois de 1815 — mas não são condenados quanto o de Marx, revelou bastante bom senso ao considerar a
pela população rural, ao contrário do que acontece com o assassi­ insurreição de junho como um conflito entre "r ic o s " e " p o ­
nato e o roubo comum. Havia uma forma elementar semelhante de b res", ou "u m a espécie de Revolta dos E scravos".21
protesto social na alegre disposição das multidões londrinas, que, Tal elemento não foi, é claro, peculiar à multidão pré-indus­
nas manifestações a favor de Wilkes, quebraram as vidraças das trial. De maior relevância foi sua aversão à inovação capitalista.
janelas dos lordes e senhoras da moda e pintaram o símbolo de A medida que o comercialismo e a busca de "progresso" chega­
Wilkes, o "4 5 ", nas solas dos sapatos do embaixador austríaco. vam à aldeia, as terras comuns eram divididas e cercadas, barrei­
Vamos encontrá-la nos motins londrinos contra a Lei dos Cereais ras eram levantadas e o cereal era armazenado em celeiros e
de 1815, quando o Morning Post noticiou: retirado da circulação imediata, enquanto os preços podiam se­
guir os caprichos da oferta e da procura e encontrar seu nível
"n atu ral". Da mesma forma, com o desenvolvimento da indús­
* Assim, Le Bon distingue entre “ idéias acidentais e passageiras criadas pela tria, máquinas que poupavam trabalho foram adotadas nas mi­
influência do m om ento" e "idéias fundamentais às quais o ambiente, as leis da
hereditariedade e a opinião pública dão uma estabilidade muito grande” (The
Crouul, Londres, 1909, p. 68). Sobre as "crenças generalizadas", ver N. Smelser,
Tlieonj o f Collective Behavior (Londres, 1962), pp. 79-130, 202-203. * Ver pp. 150-151 e 157-158.

242 243
Esses Cruéis Vilões, os Moleiros, Padeiros, etc., Vendedores
nas e fiações, e os salários, como os preços, encontraram um nível de Farinha, aum entam os preços de Combinação com o preço que
"n atu ral" através da negociação direta entre patrões e emprega­ querem, de propósito, para provocar um a fome Artificial num a
dos. Assim, aos poucos, revogaram-se a velha legislação pro­ Terra de abundância.23
tetora contra o fechamento de terras, o açambarcamento e o
monopólio, a exportação de cereais e as antigas leis que davam
aos magistrados a autoridade de fixar preços e salários; e as Ocasionalmente, os pequenos consumidores e produtores
velhas idéias do "ju sto " preço e do "ju sto " salário, impostas pela urbanos, encontravam aliados entre a geração mais velha, ou
autoridade ou sancionadas pelo costume, deram lugar às novas mais conservadora, ou entre os que faziam oposição ao governo:
idéias predominantes de salários e preços "naturais" num mer­ magistrados e agricultores ou, como na França, nos parlements do
cado livrem ente com petitivo. A transformação estendeu-se Velho Regime. Por vezes, esses aliados reviviam ou aplicavam os
por 150 anos e seguiu um curso bastante parecido na França e velhos métodos (vimos exemplos disso nos motins de 1766 e
na Inglaterra. Nesta, ela começou mais cedo, mas, na primeira, 1775). Se isso não acontecia, o povo fazia justiça pelas próprias
recebeu um forte impulso nas décadas de 1760 e 1770 e na mãos: observamos o resultado nos motins do fechamento de
legislação da Revolução. Nos dois países, o processo estava em terras e da fome, no século XVIII, na destruição de máquinas
grande parte concluído em 1800. Não obstante, em ambos pelos luditas e trabalhadores rurais de 1830, nas excentricidades
perdurou um resquício de práticas antigas: na França, na so­ das "filhas de Rebeca", no princípio da década de 1840; e até
brevivência de m uitas tradições coletivas da aldeia; na In ­ mesmo (embora, no caso, o objeto não fosse nem o alimento, nem
glaterra, no Sistema Speenhamland, pelo qual os salários agrícolas os salários) na depredação dos motins antipapistas em Londres.
continuaram a ser subsidiados, até a década de 1830, com o E tais atos, como se acreditava, longe de merecerem censura ou
imposto para os pobres da paróquia.22 represálias selvagens, estavam moralmente justificados e eram
Já vimos como os pequenos consumidores e produtores da praticados como uma espécie de solene dever público. Pois se o
cidade e do campo reagiram a tais inovações. Apegando-se obs­ rei, enganado pelos ministros, "faltou ao seu juramento de Co­
tinadamente à velha legislação paternalista e protecionista que roação", permitindo assistência aos católicos romanos, ou os
estava sendo aos poucos abandonada por seus governantes, eles magistrados deixaram de usar seus poderes para a aplicação dos
apelaram ao Parlamento, aos magistrados e ao próprio rei, para velhos regulamentos, quem, senão o povo, podia reparar a situa­
ção? Ned Ludd, de seu posto na floresta de Sherwood, reivindi­
que fossem restabelecidos os velhos regulamentos ou para que
cava o direito de quebrar os teares mecânicos, de acordo com os
fosse imposto seu cumprimento: proibir o fechamento de terras,
termos da carta da Companhia dos Tecelões de Tear.24 O povo
derrubar as barreiras e pedágios, dar poder aos juizes para fixar
também podia esperar um pagamento pelo desempenho desses
preços e salários e regular a oferta e distribuição de pão e farinha.
deveres: vimos como os participantes de motins "Sw in g" cobra­
Durante a Revolução Francesa, eles foram ainda mais longe e
vam uma taxa para quebrar as máquinas de debulhar; os partici­
insistiram para que um máximo geral fosse imposto aos preços de
pantes dos motins Gordon recolhiam dinheiro "para a Turba
todos os artigos de consumo, reivindicando assim uma economia
pobre"; e os "m assacradores" de setembro, em Paris, obtinham
mais altamente centralizada do que qualquer das velhas leis e
sua recompensa em comida e bebida.
regulamentos tinham previsto. Da mesma forma, denunciaram
Uma conseqüência de tudo isso foi aumentar a separação
agricultores e negociantes como açambarcadores e accapareurs; e,
entre a multidão amotinada, que se apegava a esses velhos cos­
na França, desde a época de Luís XV, cresceu a persistente crença
tumes, e a aristocracia liberal, ou a classe média reformadora,
popular de que um pacte defam ine tinha sido planejado delibera­
radical ou revolucionária, voltada para o futuro. Wilkes teve a
damente para matar o povo de fome. Na Inglaterra, encontramos sorte de não enfrentar esse problema, já que Londres e o Middle-
tendência semelhante expressa num volante distribuído em Ret-
sex estavam relativamente livres de motins da fome e do fecha­
ford, em 1795:

245
244
mento de terras; mas Voltaire, como já vimos, não pôde deixar de noções em termos de "Igreja e rei" (como na Vendéia) ou elimi-
concluir que os amotinados dos cereais de 1775, que tão obvia­ ná-las totalmente. A guerra, em especial, expôs o rei, e não apenas
mente contribuíam para sabotar as reformas de Turgot, estavam seus ministros, à condenação pública e, por fim, à justificada
a soldo de seus adversários políticos. Gibbon Wakefield, em 1830, acusação de traição. E notável, porém, que sua popularidade
conseguiu fugir do problema com a suposição de que os traba­ entre o povo tenha sobrevivido a tantas crises; e, mesmo em
lhadores que quebravam máquinas e incendiavam as medas junho de 1792 (3 anos depois de iniciada a Revolução), a multidão
eram hostis apenas a seus inimigos, os donos de terras e o clero que invadiu as Tulherias e obrigou Luís a fazer um brinde "à
da Igreja Anglicana, e poupavam as propriedades de seus ami­ N ação" combinava sua familiaridade vulgar com um resíduo de
gos, os agricultores. Os revolucionários franceses da classe média reverência. Mas, após a queda da monarquia, em agosto, não foi
de 1792-4 não podiam ter essas ilusões: a hostilidade dos peque­ um líder individual, e sim a Assembléia Nacional, ou a "Sagrada
nos camponeses e dos sans-culottes à liberdade de comércio de M ontanha" (os jacobinos), que substituiu o rei como a figura
cereais, pão, carne e vinho ajudou a expulsar do poder os giron- paternal popular. Assim, nos motins da fome de novembro de
dinos — os mais decididos defensores do laissez-faire e, um ano 1792, vemos os camponeses e artesãos da Beauce, que fixavam os
depois, contribuiu para derrubar seus sucessores jacobinos.25 preços, invocar a autoridade não do rei, como os camponeses de
Estreitamente ligada à preocupação com a “justiça” era a 1789, mas da recém-eleita Convenção Nacional.27
crença no rei como protetor, ou “ pai", de seu povo. Sendo a Na Inglaterra, outro tema que se repete constantemente na
Inglaterra uma monarquia parlamentar, a tradição ali estava ideologia popular é o do "direito de nascença" ou "liberdades"
diminuindo, e os apelos à proteção, nos casos que mencionamos do inglês. A crença de que os ingleses "nasceram livres", e não
acima, dirigiam-se mais provavelmente ao Parlamento ou aos "escrav os", e não passavam fome nem usavam “ tam ancos" —
juizes do que ao rei em pessoa. Em países de monarquia absoluta, como os estrangeiros em geral e os estrangeiros papistas em
porém, o rei era ao mesmo tempo o símbolo e a origem de toda a particular — tinha raízes profundas, e isso desde os conflitos
justiça e legislação, e a fé em sua bondade paternal persistiu até religiosos e sociais dos séculos XVI e XVII. Na campanha contra
mesmo durante períodos de revolução e de revolta camponesa, a Lei do Gim de Walpole, de 1736, uma circular dirigida aos
quando os ministros caíam no descrédito e o próprio poder real destiladores de Londres declarava: "S e somos ingleses, mostre­
entrava em declínio. São numerosos os mitos populares sobre a mos que temos espírito* inglês e não nos sujeitemos mansamente
bondosa preocupação de imperadores, sultões, czares e reis fran­ ao jugo que está pronto para ser colocado em nossos pescoços."
ceses, de São Luís a Henrique IV e Luís XVI, com seu povo. “ Não E um tema que percorre, de uma maneira ou de outra, todos os
dispare contra nós", gritam os camponeses rebeldes do Volga ao motins londrinos contemporâneos, estando também ligado à
general enviado para debelá-los, “está disparando contra Ale­ atitude predominante sobre o crime, de que já falamos.28 Está
xandre Nicolaievitch, está derramando sangue do czar."26 Na relacionado ainda à xenofobia ou chauvinismo popular com que
França, os camponeses de Bordeaux, em 1674, amotinaram-se em as multidões londrinas, no século XVIII, se aliaram à causa de
nome do rei, contra o imposto sobre o sal; os amotinados do belicosos líderes nacionais como Pitt, o Velho, e seus companhei­
cereal de 1775 estavam convencidos' de que tinham o direito de ros da City, e rejeitaram as soluções mais pacíficas de homens
se recusarem a pagar o alto preço pedido pelos agricultores, como Walpole, Bute e os duques de Newcastle e de Bedford.
Antes e durante as guerras francesas do final do século, esse tema
moleiros e padeiros porque, como acreditavam firmemente, o rei
contribuiu, sem dúvida, para promover a causa do "Igreja e rei",
tinha mandado pagar um preço "ju sto ". E os camponeses de 1789
pois reformadores como Priestley, em Birmingham, e Thomas
apresentaram "ord en s", supostamente dadas por Luís XVI, lega­
lizando seus ataques aos castelos dos donos de terras. É claro que
essa situação paradoxal não podia durar para sempre: a Revolu­
* Trocadilho com a palavra "spirits", que significa ao mesmo tempo "álco o l" e
ção teria, mais cedo ou mais tarde, de fortalecer essas velhas "e sp írito ". (N. do T.)

246 247
Walker, em Manchester, foram estigmatizados como amigos dos dades radicais inglesas da década de 1790 usavam roupas sa-
franceses. Só os americanos, quando em guerra com a Inglaterra, xônicas e se organizavam em divisões baseadas nas tythings
escaparam a esse tipo de xenofobia. Não há mostras de antiame- saxônicas; e John Frost, o último líder cartista, atribuiu, em
ricanismo entre todos os outros preconceitos populares expres­
1822, as desigualdades existentes na riqueza ao "saq u e de
sos na época dos motins Gordon. A razão talvez não seja difícil Guilherm e, o Bastard o".31 Essas teorias voltadas para o passa­
de descobrir: não partilhavam os americanos, com os ingleses, de
do não eram peculiares à Grã-Bretanha. Enquanto os ingleses
um "direito de nascimento" comum e uma preocupação comum
ansiavam pelas "liberdades saxônicas e os galeses conclam a­
com a "liberdade" e a "causa protestante"?
vam os Homens de Harlech a expulsar os "filh o s de H engist",
Não se tratava apenas de defender as "liberdades" inglesas
os franceses da Revolução buscavam a "pureza original" dos
contra o ataque estrangeiro: havia o problema, ainda maior, de
costumes e instituições republicanos da Roma Antiga.**
restabelecer sua "pureza original" na Inglaterra. Mais uma vez,
As idéias milenárias e religiosas também tiveram um papel
havia ali um apelo constante ao precedente, às glórias de um
evidente nos distúrbios populares. O milênio poderia assumir
passado distante ou imaginário, e não às perspectivas abertas
uma forma secular ou religiosa, embora (ao contrário do ideal
pelo presente. Magna Carta, Conspiração Papista, Carta de Direi­
wesleyano) devesse realizar-se geralmente na terra, e não no céu.
tos e a "G loriosa Constituição" de 1689 eram, todos, recordações
As fantasias milenares estão presentes, sem dúvida, em muitos
da necessidade de lutar constantemente a favor dessas "liberda­
dos atos dos pobres durante a Revolução Francesa, mas em
des", contra a tirania interna. Mas uma das crenças mais notavel­
nenhum deles são tão evidentes quanto no súbito aparecimento
mente persistente era a de que "liberdades" perfeitas tinham
de esperanças despertadas entre os pobres pela notícia de que os
existido sob os reis saxões e tinham sido tomadas dos ingleses
Estados Gerais iriam reunir-se no verão de 1789. Essa notícia
"nascidos livres", juntamente com as terras, pelos cavaleiros
provocou o que os historiadores franceses, a partir de Taine,
normandos invasores, sob o comando de Guilherme, o Bastardo,
chamaram de la grande esperance: a esperança de que, finalmente,
em 1066. Esse mito do "jugo normando" persistiu até a época
as promessas do passado seriam cumpridas, o peso, em especial
cartista e foi transmitido por gerações de Levellers,* liberais for­
o da odiada talha, seria removido das costas dos camponeses e
mados nos "prin cípios da revolução", radicais londrinos do
uma nova era dourada começaria. O estado de exaltação que isso
século XVIII e democratas alimentados pelas mais recentes dou­
criou produziu igualmente seu corolário, a convicção — uma vez
trinas de "soberan ia popular" e "d ireitos do hom em ". Em
que tais esperanças pareciam correr perigo — de que sua realiza­
1780, a mesma comissão de reformadores de W estminster,
ção estava sendo frustrada por um complot aristocratique. Esse
cujas reivindicações antecipavam de meio século os Seis Pon­
fenômeno dual, já se argumentou, muito contribui para explicar
tos da Carta do Povo, exigiam a "re stitu iç ã o "d a igualdade de
o fervor quase místico com que o menu peuple perseguiu seus
representação, dos parlamentos anuais e do sufrágio universal
inimigos "aristocráticos" durante a Revolução.32 Ou, como na
que (dizia-se) "existiam substancialmente na época do im ortal
Inglaterra, as fantasias milenares poderiam estar revestidas da
A lfred o ".29 Um volante distribuído em Londres, em 1793, pro­
imagística poética da "Jerusalém " de Blake, ou das extravagân­
testando contra o uso de centros de recrutam ento e outras
m edidas governam entais opressoras, pergunta: "Teriam esses cias apocalípticas de um Richard Brothers, cuja Revealed Know-
ledge o f the Prophesies and Times foi publicada em Londres no
atos atrozes sido tolerados na época de A lfredo?"... "T erão
Sydney e Russell sofrido para isso ?"30 Os membros das socie­ princípio de 1794. Nessa época, as idéias jacobinas ainda circu-

Ou seja, em grupos de dez. (N. do T.)


Aristocratas franceses antes da Revolução tinham invocado também as "lib er­
* Niveladores, partido extremista que defendia reformas econômicas e consti­
dades" dos nobres francos "liv re s"; mas isso, provavelmente, teve pouca influên­
tucionais radicais, liberdade de culto e separação entre Igreja e estado. (N. do T.) cia na mitologia popular.

248
249
lavam entre as “classes inferiores", e já se disse que homens como uma longa associação; e o metodismo, mesmo quando professava
Brothers — que entremeavam suas falas sobre " a prostituta da rejeitar o motim e depositar seus tesouros exclusivamente no céu,
Babilônia” e o "A nticristo" com denúncias dos grandes e pode­ trouxe com ele um novo fervor e uma finalidade moral que, mais cedo
rosos — podem ter alimentado aspirações políticas semelhantes ou mais tarde, teriam de deixar sua marca nos movimentos sociais
às de Tom Paine em The Rights o fM a n P Mas as idéias milenaris- populares. Foi, sem dúvida, o que aconteceu na Inglaterra e em Gales
tas, embora pudessem, em certas circunstâncias, estimular e não nos distúrbios de 1830 e da década de 1840; nos motins "Swing" e
enfraquecer os movimentos políticos existentes, poderiam agir Rebeca e no movimento cartista, o não-conformismo protestante,
igualmente como antídoto à militância popular ou como um tanto o wesleyano como os outros, teve um certo papel.36
consolo para a derrota política. Isso pode ter acontecido na Fran­ Também não devemos supor que essas idéias seculares,
ça, depois de Waterloo, e na Inglaterra, em 1838, no estranho caso racionalistas, como os "direitos do hom em " e outros produtos
da "batalha de Bossenden Wood” .34 do Iluminismo, serviriam necessariamente, quando empolga­
Nesse último caso, um certo número de trabalhadores de vam o povo, como um antídoto da religião. Era essa, sem dúvida,
Kent acreditava implicitamente que seu líder, o espúrio Sir Wil- a intenção de muitos pensadores racionalistas e reformadores ou
liam Courtenay, era o Messias. Mas este é apenas um dos disfar­ revolucionários aristocráticos e de classe média, na Inglaterra e
ces sob o‘s quais o motivo religioso pode surgir nos motins. Em na França, no século XVIII; e houve momentos, durante a Revo­
outras épocas, embora proclamado abertamente, ele pode não ser lução Francesa, em que eles pareciam ter conseguido êxito. Cer­
tão profundo quanto aparenta; ou, inversamente, pode estar tamente, o monopólio e a autoridade da Igreja católica oficial
submerso nos acontecimentos de superfície. Do primeiro tipo, os foram sucessivamente solapados e quebrados — e nunca foram
totalmente recuperados; e as multidões parisienses manifesta­
motins antipapistas, os ataques da "Igreja conservadora" às capelas
ram-se aos gritos de À bas la calotte! ("Abaixo os padres!” ) e
e salas de reunião metodistas ou presbiterianas e as explosões
representaram um certo papel, no auge do movimento de "des-
urbanas do "Igreja e rei" são exemplos óbvios. A parte de suas
cristianização", no outono de 1793, no fechamento de todas as
subcorrentes sociais, tais movimentos não foram nunca exata­
igrejas da cidade. Não obstante, o movimento popular anti-reli-
mente o que pareciam ser. Observamos que os lemas mal com­
gioso (distinto do movimento anticlerical) teve vida relativamen­
binados de "destruição dos presbiterianos" e "antipapism o"
te curta; ainda em junho de 1793, os parisienses do revolucionário
apareceram lado a lado nos motins de Birmingham; e um dos
Faubourg St. Antoine manifestaram-se pelo direito de preservar
condenados à morte pela participação nos motins Gordon disse,
a tradicional procissão de Corpus Christi; e o próprio Robespierre
quando interrogado: "Q ue diabo, não tenho religião; mas tenho buscou conseguir maior apoio popular para o Governo Revolu­
de aparentar para o bem da causa."35 Não é tanto que, nesses cionário lançando um novíssimo culto religioso, o Culto do Ser
movimentos, o elemento religioso não exista, ou seja um mero Supremo. Esta foi apenas a mais divulgada de numerosas tenta­
disfarce para outras questões (embora fosse essa a firme convic­ tivas de estabelecer uma fusão entre a religião e as idéias políticas
ção de alguns contemporâneos), mas sim que, neles, os motivos correntes. Em muitos distritos, o povo assumiu, ele próprio, a
religiosos, sociais e políticos estão espantosamente interligados. iniciativa, e a Revolução viu uma onda notável de novos cultos
Talvez, tendo em vista seu objetivo confessado de manter uma religiosos. Cerimônias solenes, acompanhadas por toda a mysti-
Igreja oficial como parte da ordem estabelecida, devamos tratá- que das velhas práticas religiosas, foram dedicadas a novos "sa n ­
los menos como movimentos religiosos do que como manifesta­ to s" locais ou aos grandes mártires populares da Revolução,
ções políticas anti-radicais. Marat, Chalier e Lepeletier.37 Mas, encerrada a Revolução, esses
O caso é diferente quando uma tradição religiosa dissidente cultos parecem ter deixado poucas tradições; e nem eles, nem a
serve antes como uma subcorrente do que como um objeto reco­ Igreja católica novamente oficial, nem os grupos religiosos mino­
nhecido de distúrbio. Em Londres, e no West Country da Inglaterra, ritários, parecem ter desempenhado qualquer papel significativo
em particular, a dissensão religiosa e o radicalismo popular tinham nas revoluções de 1830 e 1848.

250 251
Essa análise poderia ser levada ainda mais longe, mas, para idéias velhas e atrasadas tenham persistido e velhas form as con­
poupar os sentimentos do confuso leitor, proponho que fiquemos tinuem a se acotovelar com as novas. Além disso, as crenças
por aqui. O que vimos foi uma rica variedade de motivos e tradicionais podiam , em vez de serem abandonadas, transfor­
crenças, através dos quais as questões econômicas e os apelos aos m ar-se e adaptar-se para atender às novas necessidades: nesse
direitos consuetudinários existiam, lado a lado com novas con­ sentido, não há um afastamento radical em relação ao velho
cepções do lugar do homem na sociedade e a busca do milênio. desejo de "p ro teçã o " no ideal socialista de uma sociedade mais
Essa combinação de crenças e aspirações que, aparentemente, se am plam ente coletivista.39
ajustam mal não constitui, de modo algum, uma característica Assim, gradualmente, o padrão do protesto popular e as
peculiar à multidão pré-industrial: ela existe, com a mesma evi­ idéias a ele subjacentes sofreriam uma modificação. Em 1848, esse
dência, embora com diferentes ênfases e variações, nos distúrbios processo ainda não estava concluído, mas a nova multidão " in ­
de hoje, tal como existia nos tempos antigos e nos medievais. dustrial", com seu mais rico estoque de conceitos voltados para
Mas, em meio à confusão, surge um certo padrão, peculiar à o futuro, já era claramente visível no horizonte.
época. Dificilmente, porém, teremos consciência dele, a menos
que coloquemos os motins e rebeliões em seu contexto histórico
e comparemos os ocorridos em princípios e meados do século
REFERÊNCIAS
XVIII com os da Revolução Francesa e os que surgiram depois
dela. Mesmo assim, não veremos um desaparecimento constante
e gradativo dos apelos ao costume nem das fantasias milenaris- 1. M . M ortim er-Ternaux, Histoire de la Terreur (8 vols., Paris, 1862-81),
tas: estes persistiram, embora por vezes com menor vigor, duran­ VIII, 455; H. Taine, Les origines de la France contemporaine. La Révolu-
tion (3 vols., Paris, 1878), 1 ,129.
te todo o período que nos interessa aqui. Há, porém, momentos
2. The Crowd in the French. Revolution (Oxford, 1959), pp. 191-3.
significativos em que surgem novas concepções e, embora não 3. A rchives de l'Oise, B 1584.
eclipsando totalmente as velhas idéias, as transformam ou redu­ 4. P ara um a análise mais detalhada das provas, ver m eu The Crowd in
zem sua importância relativa. Esses momentos são a revolução the French Revolution, pp. 191-6.
de 1789 na França e o crescimento dos movimentos operários 5. V er m eu Wilkes and Liberty (Oxford, 1962), p. 59.
independentes, na década de 1830. 6. E.J. Hobsbawm, "E con om ic Fluctuations and Some Social M ove-
O professor Reinhard Bendix ressaltou o contraste entre m ents since 1 8 0 0 ", Economic History Review, 2a série, V, i (1952), 8.
tipos de protesto popular surgidos no período “ pré-democráti- 7. W .W . Rostow, British Economy of the Nineteenth Century, Oxford,
1948), p. 124.
co " e os surgidos no período “ democrático" da história da Euro­
8. The Crowd in the French Revolution, pp. 201-207.
pa ocidental.38 A questão é importante, pois, quando as idéias 9. E.P. Thompson, The Making of the English Working Class (Londres,
novas, e essencialmente voltadas para o futuro, dos “ direitos do 1963) pp. 70-71.
hom em " e da “ soberania popular" empolgaram a imaginação 10. A . Cobban, The Social Interpretation of the French Revolution (Londres,
popular, os motins e os distúrbios tenderam a adquirir uma nova 1964), p. 127.
dimensão e a assumir um conteúdo socioideológico que lhes 11. A . Young, Traveis in France and Italy (Everym an Library, Londres,
faltava antes. Mas, igualmente, a sociedade industrial em er­ 1915), pp. 172-3.
12. The Crowd in the French Revolution, pp. 196-9.
gente na França e na Inglaterra criou uma classe trabalhadora
13. A . Soboul, Les sans-culottes parisiens en l'an II (Paris, 1958) pp 505-
industrial, um movimento da classe trabalhadora e idéias po­ 648.
líticas da classe trabalhadora. Dessa forma, novas idéias e 14. A rch. de la Préfecture de Police, Aa 429 fo. 441.
novas forças sociais, desconhecidas em 1789, com eçaram a 15. Thom pson, op. cit., pp. 149-57.
surgir em primeiro plano: vimos exemplos na revolução fran­ 16. Ibid., p. 185.
cesa de 1848 e no movimento cartista na Inglaterra. Essas 17. G. Loveless, The Victims of Wiggery: A Statement of the Persecutions
transições não deixam de ser significativas, embora m uitas das Experienced by the Dorchester Labourers (Londres, 1837), p. 23.

252 253
18. V er G. Rude, J. Z acker, Sophie A. Lotte e A. Soboul: " I Sanculotti:
una discussione tra storici m arxisti", Critica Storica, I, iv (1962), CAPÍTULO QUINZE
369-98.
19. Citado por D.G. Barnes, A History ofthe English Com Lawsfrom 1660
to 1846 (N ova York, 1961) p. 136.
20. O ld Bailey Proceedings (Surrey Special Com m ission) (Londres,
1780), p. 11.
21. The Recollections of Alexis de Tocqueville, org. J.P. M ayer (M eridian
Books, N ova York, 1959), p. 150.
22. Ver pp. 45, 70 acim a; e Thompson, op. cit., pp. 67-8.
23. Citado por Thompson, op. cit., p. 67.
24. F.O . Darvall, Popular Disturbances and Public Order in Regency En­
gland (Londres, 1934), p. 170.
25. A . Soboul, op. cit., pp. 1025-1031.
26. Citado por E.J. Hobsbawm, Primitive Rebels (M anchester, 1959), p.
121 .
27. M . Vovelle, "L e s taxations populaires de février-m ars et novem bre-
décem bre 1792 dans la Beauce et sur ses confins", Mémoires et O Padrão de Distúrbios e o
documents, na XIII (Paris, 1958), p. 137.
28. G.Rudé, "T h e London 'M ob' of the Eighteenth C entury " , The His­ Comportamento das Multidões
torical Journal II, i (1959), 13-14; Thompson, op. cit., pp. 59-61.
29. C itado por S. Maccoby, The English Radical Tradition 1763-1914
(Londres, 1952), p. 36.
30.
31.
Old Bailey Proceedings (1794) p. 1327.
C. Hill, "T h e N orm an Y oke", em Democracy and the labour Move-
ment, org. J. Saville (Londres, 1954), pp. 11-66; Thom pson, op. cit.,
A té agora, examinamos os componentes da multidão, e não
a m ultidão em si mesma. Analisamos as classes sociais, os
grupos e indivíduos de que era formada a multidão pré-indus­
pp. 8 4 -8 ,1 5 0 ; D. W illiams, John Frost: A Study in Chartism (Cardiff, trial, as ocupações a que pertenciam e as idéias e motivos
1939), p. 50. subjacentes a suas ações. Pouco, porém, foi dito, até agora,
32. G. Lefebvre, Quatre-Vingt-Neuf (Paris, 1939), pp. 112-14. sobre a m ultidão como uma entidade coletiva, sobre as reações
33. Thom pson, op. rif., pp. 116-19. e o com portam ento de seus componentes como grupo, ou
34. P.G. Rogers, Battle in Bossenden Wood (Londres, 1961). Ver p. 163.
sobre o que Le Bon, e depois dele Georges Lefebvre, chamou
35. Old Bailey Proceedings (1780), pp. 446-52.
36. V er pp. 171-172; e Thompson, op. cit., pp. 350-400.
de "u n id ad e m ental" ou "m entalidade coletiva" das m ulti­
37. A . Soboul, "Sentim ent religieux et cultes populaires pendant la dões.1 Alguns autores, inclusive o próprio Le Bon, ressaltam
Révolution: saintes patriotes et martyrs de la liberté", Archives de esses fatores às expensas de todos os outros e, com isso, ten­
sociologie des religions, julho-dezembro de 1956, pp. 73-86. dem a reduzir a multidão a uma abstração pura, ou uma massa
38. R. Bendix, "T h e Low er Classes and the 'D em ocratic Révolution' " , rudim entar, como se estivesse desligada de suas am arras so­
Industrial Relations, I, i (outubro de 1961), 91-116.
ciais e históricas. Por outro lado, negligenciar totalmente esses
39. P ara um a tentativa de ir além do estudo fragm entado da m otivação
nos m ovim entos individuais, e de apresentar toda a gam a de idéias elem entos não seria uma posição mais realista, pois só em sua
e crenças subjacentes à ação social e política da época, ver m eu form a mais altam ente organizada, Qy.regimentada, como em
Ideology and Popular Protest (Londres, 1980). ocasiões estritam ente cerimoniais, pode-se dizer que a m ulti­
dão é apenas a soma total de suas partes.2
Assim sendo, ainda temos de formular certas perguntas
relacionadas com as ações e o comportamento da multidão. Qual
o padrão de comportamento da multidão pré-industrial e por que

254 255
teve ela tendência a se comportar de determinadas maneiras, moderno de disputa trabalhista parece ter sido mais freqüente do
e não de outras? Como os indivíduos ou os grupos cresceram que na Inglaterra. A petição já tinha aparecido como a catali-
até se transform arem em multidões, e como um tipo de distúr­ sadora da ação popular: vimos exemplos das disputas dos
bio transform ou-se em outro? Como se desenvolveu a "m en ­ trabalhadores de Londres na década de 1760; e, em Paris, em
talidade coletiva” da multidão — seus ímpetos de violência, julho de 1791, a petição, concebida em linhas perfeitam ente
audácia ou heroísmo? Até que ponto foram organizadas ou "m od ern as” , foi o pretexto para o grande comício e massacre
espontâneas suas ações? Quais foram as relações da multidão do Campo de Marte.
com seus líderes, e como foram transmitidos os lemas e as Além disso, houve outras formas mais tradicionais de ação
ordens de marcha? E que verdade há na opinião de que essas que visavam também a persuadir pela manifestação pacífica, e
m ultidões, como quaisquer outras, foram instáveis, irracionais não pela violência. Foram os grandes desfiles populares e as
e inclinadas à violência destrutiva? Estes são alguns dos pro­ coloridas cerimônias, quase tão típicas da época como o recurso
blem as que analisaremos, ou simplesmente aflorarem os, no à justiça "natural” . Durante a agitação wilkita, em Londres, os
presente capítulo. seguidores de Wilkes, tanto das camadas "m édia” como "in fe­
Em capítulos anteriores, já comentamos o padrão geral do rio r", desfilaram freqüentemente com bandeiras desfraldas e
comportamento da multidão. Embora ela se tenha comportado tambores, gritando lemas e exibindo as cores de seu herói; em
de maneiras diferentes em diferentes situações, os elementos certa ocasião, que foi apenas uma entre muitas outras, "um
comuns foram a ação direta e a imposição de alguma forma de grande grupo de proprietários [de Middlesex], precedidos de
justiça "natural” elementar. Os grevistas mostraram a tendência uma banda de música, com bandeiras flutuando, marcharam por
a destruir máquinas ou "derrubar” as casas de seus patrões; os Pall Mall e pararam em frente ao Palácio, onde deram 3 grandes
amotinados da fome tendiam a invadir mercados e padarias e 'vivas', e a música começou a tocar” . Uma semana depois, a
impor um controle popular de preços, ou taxation populaire; os vitória eleitoral de Wilkes sobre seu adversário, o coronel Lut-
amotinados rurais, a destruir as cercas das terras que eram fecha­ trell, foi saudada na pequena cidade de Somerset pelo repicar de
das e as barreiras nas estradas, ou as máquinas de debulhar ou sinos, luzes e uma procissão solene, tendo à frente " 2 professores
albergues de pobres, ou então a incendiar as medas do agricultor da Escola Primária, representando a Liberdade", e "4 5 cavalhei­
ou do dono de terras; e os manifestantes urbanos tendiam a ros educados com rosetas azuis".3 Manifestações semelhantes,
"derrubar” as capelas e casas de reunião dos dissidentes, a des­ com pompa e disciplina, eram comuns em Paris, tanto antes como
truir as casas e a propriedade de suas vítimas e a queimar seus depois da Revolução de 1789, e foi uma exibição parecida de
inimigos políticos em efígie. Nas grandes ocasiões revolucioná­ bandeiras e pendões tremulantes que, 30 anos depois, seria tão
rias, como as de 1789-95,1830 e 1848, na França, tais formas de selvagem ente dissolvida pela m ilícia montada em St. Peter's
ação foram complementadas por outras mais heróicas, como os Fields, em Manchester. Pois, apesar de suas pretensões pacífi­
ataques armados à Bastilha, às Tulherias ou ao Hôtel de Ville, ou cas, essas exibições coloridas e maciças alarmavam as autori­
o levantamento de barricadas; em geral, porém, o padrão perma­ dades tanto quanto os próprios atos de violência. Hardy, o livrei­
neceu substancialmente o mesmo. Houve, contudo, importantes ro parisiense que registrou as paradas quase que diárias de
desvios dessa norma, e formas de ação associadas a épocas pos­ comerciantes e trabalhadores que passavam pela Rue St. Jacques
teriores já começavam a aparecer nos motins e distúrbios da era em direção à recém-construída igreja de Ste. Geneviève, em
pré-industrial. Em Manchester, por exemplo, em 1810, houve agosto e setembro de 1789, notou, depois de uma dessas paradas,
uma greve dos fiandeiros de algodão que já se assemelhava de que "m uita gente achava que havia alguma coisa de aterrorizante
perto às greves de épocas mais recentes;* e, na França, o tipo em sua organização, sua composição e seus núm eros"; e bem
pode ser que a m ilícia montada de "P eterloo” tivesse sido
provocada a atacar tanto pela disciplina dos tecelões de M an­
* Ver p. 70. chester quanto pelos lemas m ilitantes inscritos em suas faixas.4

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Tais receios não eram totalmente destituídos de fundamen­ des causas dos direitos e fraternidade do homem. Isso já aconte­
to, pois as manifestações cerimoniais podiam, se houvesse um cia nos anos intermediários e finais da Revolução Francesa, quan­
ato de provocação ou algum acontecimento inesperado, transfor­ do a fidelidade popular aos indivíduos estava dando lugar à
mar-se em formas de ação mais violentas. Isso era ainda mais fidelidade às causas ou às instituições revolucionárias, e esse
suscetível de acontecer numa época em que às "classes inferio­ processo chegou a uma fase muito mais adiantada de seu desen­
res", ou sans-culottes, eram negados praticamente todos os meios volvimento, e tornou-se mais arraigado, nas revoluções e na
de agitação pacífica para conseguir a reparação de uma injustiça. agitação cartista da década de 1840. De modo geral, porém, este
Não só elas não tinham direitos políticos, como as "com bina­ foi ainda um período no qual o apego e a aversão populares se
ções" e assembléias — o que os franceses chamavam de attroupe- focalizavam não tanto nas causas e instituições, mas sim nos
ments — estavam proibidos por lei e eram, com freqüência, heróis e vilões individuais. Assim como tinha seus heróis, como
reprimidas com rigor. Em conseqüência, a "explosão hostil" era Wilkes, lorde George Gordon, Marat ou a semimítica Rebeca, a
tão passível de incorrer nas penas quanto as demonstrações de multidão também tinha vilões, claramente identificáveis, na for­
tipo mais pacífico; além disso, a experiência mostrava que um ma do patrão individual, do comerciante, do monopolizador, do
ataque súbito tinha mais probabilidade de conseguir resultados padeiro, do dono de terras ou do funcionário; e esses homens
do que a agitação prolongada por meios pacíficos (negociação, tomavam-se os alvos naturais de sua vingança, quando os salá­
petição ou exibições cerimoniais) que, de qualquer modo, pouca rios eram ameaçados. Só gradualmente esses alvos pessoais fo­
relevância podiam ter fora das grandes cidades como Paris ou ram substituídos ou desapareceram em favor de princípios ou
Londres, Lyon ou Manchester. Além disso, era uma época na qual causas e, correspondentemente, só assim os velhos métodos da
os conflitos diretos entre as classes governantes, ou ricas, e as justiça "natu ral" começaram a desaparecer.
"cla sses inferiores" tinham mais possibilidade de ocorrer nos Não obstante, a memória e a tradição oral podem ter desem­
distritos rurais: era ali que as cercas e o fechamento de terras penhado também um papel no prolongamento da sobrevivência
ocorriam , as fiações e minas estavam sendo equipadas com dessas formas de ação até mesmo além das épocas em que teriam
novas m áquinas e súbitos aumentos no preço do trigo estavam sido mais úteis e adequadas. Em 1831, em Bristol, e em 1842, em
mais em evidência. Portanto, as circunstâncias da época não só Stoke-on-Trent, por exemplo, a "derrubada" de casas era um
eram uma provocação constante à desordem popular, como anacronismo: certamente, não era vista em cidades grandes como
também tendiam a determinar a natureza da explosão. Pois Paris e Londres há muitos anos. A mystique das barricadas —
qual poderia ser a forma adequada de protesto social nas áreas arma útil de defesa popular na Paris de 1830 e de 1848, ainda
rurais, nas aldeias de mineração, ou pequenas cidades-merca- em grande parte medieval — persistiu, depois que a capital
dos, ou mesmo nos subúrbios mais distantes de cidades indus­ francesa foi reconstruída sob Napoleão III, nas lutas de rua de
triais recém -surgidas, senão o recurso à ação direta da justiça 1871; e a revolução de 1848 na França foi perseguida, se não
"n a tu ra l", praticada por Ned Ludd em Derbyshire e Cheshire, confundida, pelas lembranças de 1789 e 1793. Os cam poneses
por Rebeca na Gales do Oeste, pelos m anifestantes "S w in g " franceses que, em 1775 e 1789, invocavam a autoridade do
no sul da Inglaterra ou pelos participantes dos motins da fome, próprio rei para fixar preços e incendiar castelos, estavam
na França e na Inglaterra, em 1766 e 1775? continuando a tradição de seus antepassados em Bordeaux,
Mas não foram apenas os fatores físicos que determinaram que, 100 anos antes, se tinham amotinado aos gritos de Vive le
a natureza dessas explosões, pois por que ainda teriam persistido Roi et sans gabelle!; e a marcha das m ulheres sobre Versalhes
em cidades como Paris e Londres até 1831? Uma outra explicação foi, num certo sentido, uma repetição de manifestações semelhan­
deve ser procurada na sobrevivência das idéias e valores tradi­ tes dos parisienses em 1709,1775 e 1786, embora suas conseqüên­
cionais. A circulação das idéias políticas radicais iria, no curso do cias fossem muito mais impressionantes.
século XIX, envolver os pequenos negociantes, artesãos e traba­ Na Inglaterra, o incêndio, em particular de medas de feno
lhadores de fábricas na luta pelos direitos políticos e pelas gran­ ou cereal, era uma arma tradicional nas disputas agrárias: "um

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argumento conciso, o fogo", escreveu Carlyle, que, como Gibbon mercados foram transformadas em manifestações de massa, ata­
Wakefield, podia pelo menos elogiá-lo por sua eficácia. Era am­ ques à propriedade e até mesmo insurreições ou rebeliões em
plamente reconhecido como um recurso peculiarmente britânico grande escala. Na França, em fins de abril de 1775, a recusa dos
e, ainda em 1854 (época em que não tinha, de modo algum, carregadores da pequena cidade-mercado de Beaumont em
perdido sua popularidade no campo inglês*), um italiano, figura pagar os altos preços pedidos pelos negociantes "d eflagrou ”
de destaque na Eureka Stockade da Austrália, escreve sobre "o um movimento que, dentro de uma quinzena de seu início,
selvagem grito inglês de "Fogo! Fogo!", e acrescenta que "o s tinha dominado a capital e meia dúzia de províncias vizinhas.
ingleses em geral, a terrível calamidade do fogo, eles a tomam Em Londres, em junho de 1780, a recusa do Parlamento em
como brincadeira, e se divertem com ela".5 Vimos também que a exam inar a petição anticatólica da Associação Protestante
destruição de máquinas, a "derrubada" de casas e o controle transform ou as multidões reunidas em W estminster em gru­
popular dos preços em motins da fome foram, todos, recursos pos de m anifestantes irritados, que ocuparam as ruas de Lon­
que tinham uma história de 150 anos ou mais. Em certos motins dres durante uma semana. Em 1830, vimos como a adoção de
rurais, como na França de 1789, os distúrbios seguiram caminhos m áquinas debulhadoras numa aldeia de Kent "d eflagrou ” um
muito trilhados e tradicionais. Assim, a memória e a tradição m ovim ento generalizado de destruição de m áquinas e incen­
oral, bem como as condições materiais ou relações sociais do diarism o que se estendeu a mais de 10 condados. E tanto os
presente, serviam para perpetuar as formas de distúrbio popular. m otins luditas como os de Rebeca desenvolveram-se a partir
Embora os motins tivessem tendência a seguir padrões de m odestos inícios semelhantes.*
tradicionais, mesmo o mais breve deles raramente surgia já pron­ Para ilustrar melhor esse ponto podemos, mais uma vez,
to. Até mesmo uma greve local, ou um motim da fome, ganharia tomar a Revolução Francesa como um modelo cômodo — parti­
força a partir de um começo modesto e teria pontos de partida, cularmente em suas fases iniciais, antes que a Guarda Nacional,
clímax e conclusão claramente definidos. As exceções foram as os clubes populares e as assembléias seccionais tivessem criado
operações militares mais organizadas, como o ataque às Tulhe- uma estrutura dentro da qual o desafio à autoridade pôde ser
rias, em agosto de 1792, ou os disciplinados desfiles de trabalha­ organizado mais sistematicamente. Exemplos clássicos desse ti­
dores convocados pelos clubes de Paris, em 1848. Esses, porém, po de transformação que estamos descrevendo são proporciona­
não foram típicos do comportamento da multidão, pois, no caso, dos pelas grandes insurreições parisienses de julho e outubro de
os participantes obedeceram, quase que do começo ao fim, às 1789. Na primeira, uma multidão de pessoas que dava um pas­
ordens de líderes reconhecidos. Em sua forma mais característica, seio domingueiro mais ou menos tranqüilo pelo Palais Royal foi
o motim ou rebelião que cresceu desde um início relativamente galvanizada por um vigor revolucionário pela notícia da demis­
pequeno num mercado, numa taberna, numa padaria, num açou- são de Necker e pelo chamado às armas, feito pelos oradores a
gue ou na casa de vinhos, ou foi "deflagrado" por uma palavra serviço do duque de Orléans, ou que pertenciam a seu círculo.
ao acaso ou por um ato de provocação e, graças a isso, ou por Disso seguiu-se uma seqüência de acontecimentos que não po­
outros meios, pôde assumir uma dimensão e um impulso que diam ter sido planejados nem previstos em detalhes nem mesmo
ninguém, nem mesmo o mais experiente dos líderes, poderia ter pelo mais astuto, esperto e decidido dos adversários da Corte: os
planejado ou esperado. Foi nessas ocasiões, freqüentes na França desfiles pelas avenidas com bustos de Necker e Orléans; os ata­
e na Inglaterra, tanto antes como depois da Revolução Francesa, ques aos postos alfandegários e ao mosteiro de St. Lazare; a busca
que as reuniões de pequenos consumidores nas mercearias e de armas nas lojas dos armeiros, casas religiosas e arsenais; a
manifestação de massa em frente ao Hôtel de Ville, onde o novo
governo municipal estava sendo formado; o ataque ao Hôtel des
* Dos 2.255 condenados ingleses masculinos mandados para a Austrália em
1846-7,89 foram degredados por incendiarismo e 32, num total de 2.422, em 1852,
que (exceto no caso da Austrália Oriental) foi o último ano de degredos (Tas. State
Arch., MSS. 2/282-2/321). * Ver pp. 62, 85,164-165,173.

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Invalides em busca de armas para a recém-criada m ilícia de Mas isso não teria acontecido sem uma longa série anterior de
cidadãos; e, por fim (o que foi em parte planejado, embora incidentes que lhes deram significação e se, acima de tudo, o
principalm ente resultasse de toda uma série de acontecim en­ clima político de rebelião não tivesse sido bem preparado. Na
tos fortuitos), o ataque frontal à Bastilha, que encerrou a pri­ verdade, as idéias políticas predominantes e o tipo de "crenças
m eira fase da Revolução. generalizadas" examinadas no Capítulo 14 foram ingredientes
Em outubro, houve um padrão semelhante de crescimento essenciais, sem os quais não teria haviado reação, e ainda menos
e desenvolvimento, embora as etapas finais da insurreição já uma reação popular, aos atos da corte. E os ataques dos campo­
tragam a marca de uma direção política mais consciente. Sem neses aos castelos, no verão de 1789, foram "deflagrados" pelos
dúvida, para a maioria das donas-de-casa e mulheres do mercado rumores de aproximação de "bandidos", que, por sua vez, foram
que se manifestavam reclamando pão no começo da manhã de 5 "deflagrados" pelas circunstâncias que cercaram a queda da
de outubro, como para o observador casual, as cenas iniciais do Bastilha, em Paris. Mas essa seqüência de acontecimentos, total­
levante devem ter parecido apenas uma continuação de toda uma mente fortuita em si mesma e imprevista, não se teria desenvol­
série de manifestações semelhantes, ocorridas em setembro. Até vido sem o profundo ódio tradicional dos camponeses pelas
mesmo a invasão em massa do Hôtel de Ville foi apenas uma taxas e obrigações senhoriais, e sem a esperança de justiça, des­
repetição, em escala maior, de formas semelhantes de protesto pertada pela convocação dos Estados Gerais em Versalhes.
nas semanas anteriores. Mas o encaminhamento das mulheres Quase tão notável, e aparentemente incongruente, é a se­
para Versalhes (em parte, resultado de semanas de agitação pelos qüência de causa e efeito que liga a epidemia de cólera em Paris,
"patriotas" e, em parte, da intervenção de Stanislas Maillard e em 1832, com a insurreição armada dos trabalhadores, em junho
seus volontaires de la Bastille) deu um conteúdo político totalmente daquele ano. A cólera teria feito 39.000 vítimas, muitas das quais
novo à sua manifestação. A partir de então, embora ainda profes­ nas ruas superpopulosas e nos cortiços que ficavam junto dos
sando principalmente objetivos econômicos, essa manifestação mercados centrais e do Hôtel de Ville. Circularam rumores de
se fundiu com a insurreição política lançada pelos "patriotas" e que o governo da burguesia tinha contaminado deliberada­
apoiada pelos contingentes da Guarda Nacional Parisiense.6 m ente os poços e envenenado os doentes internados nos hos­
Tais ilustrações lembram que, mesmo durante períodos de pitais e os detentos nas prisões; os historiadores viram o motim
comoção revolucionária, quando grupos políticos competiam de junho como resultado do pânico e do ódio que isso provo­
pelo apoio popular, os motins raramente seguiam padrões pre­ cou.7 M ais uma vez (se aceitarmos a proposição), devemos
determinados: as exceções estão representadas, é claro, pelos distinguir entre o "g atilh o "q u e deflagrou isso e a causa pro­
casos militares ou cerimoniais altamente organizados, que já funda, pois mesmo o terror criado pela cólera dificilm ente teria
mencionamos. Sob os outros aspectos, o elemento fortuito, como levado aos acontecim entos de junho sem a crise econôm ica, a
notamos, teve um papel notavelmente persistente e deixa sem pobreza, a degradação, os ódios exacerbados e as esperanças
sentido as idéias de muitos historiadores, contemporâneos e frustradas que cercaram a revolução de 1830.
posteriores, de que tais movimentos foram o resultado de "cons­ Da mesma forma, mesmo naqueles que, aparentemente,
pirações" concebidas com minúcia. Devemos, portanto, atribuir foram os mais espontâneos entre todos esses movimentos, um
considerável importância à espontaneidade na origem, desenvol­ certo grau de unidade foi sempre imposto, não só pelas idéias
vimento e clímax do distúrbio popular. subjacentes, ou "crenças generalizadas", como pelos lemas, líde­
Ao mesmo tempo, devemos ter cuidado para não exagerar: res ou alguma forma de organização elementar ou mais desen­
se ressaltamos as voltas e reviravoltas imprevistas das insurrei­ volvida. Já observamos o papel de lemas como Wilkes e Liberdade,
ções parisienses de 1789, não houve nada de puramente fortuito Abaixo o papismo e os tamancos, Viva o Terceiro Estado ou Pela
nos acontecimentos em si. Em ambas as ocasiões, as provocações República Democrática e Social na formação e no direcionamento
do partido da Corte em Versalhes serviram, claramente, como da opinião. Embora as "crenças generalizadas", de maior disse­
"deflagrador" dos distúrbios que se seguiram nas ruas da capital. minação, fossem essenciais no preparo de um clima müitante de

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opinião, tais lemas serviram para unificar a multidão em si e de Wilkes e com os artesãos londrinos da Sociedade de Corres­
dirigir suas energias para alvos e objetivos precisos. Isso, prova­ pondentes de Hardy. Em todos esses casos, porém, a experiência
velmente, não aconteceu nos motins da fome e nas greves, onde teve vida relativamente curta, e só na década de 1830 as formas
as questões podiam ser bastante claras, em particular para os que estáveis de organização popular apareceram em caráter definiti­
sentiam o aguilhão das reduções de salários ou dos aumentos de vo, e não apenas por breves períodos. Sua chegada afetou, natu­
preços. Mas, nas manifestações políticas, foram um meio efetivo ralmente, a forma e o padrão dos distúrbios populares. O tipo
de angariar apoio e aterrorizar ou coagir os opositores. Cocardas antigo de motim da fome e movimentos espontâneos, como os
e faixas podiam servir a um propósito semelhante: a campanha ocorridos nas cidades oleiras em 1842, tornaram-se então uma
de Wilkes em Londres parece ter dependido muito, para seu exceção; e vimos a sólida contribuição dos clubes e organizações
sucesso, da distribuição de "rosetas" com a cor azul wilkita (a cor de trabalhadores para os acontecimentos de 1848, em Paris, e dos
reaparece nos motins antipapistas de 1780); e vimos o papel do sindicatos e da Associação Nacional da Carta para o Cartismo,
tricolor e do bonnet rouge em 1789, e o da bandeira vermelha dos na Inglaterra.*
clubes socialistas em 1848. Através desses recursos, grupos e Também os líderes desempenharam um papel na coesão e
indivíduos com motivações e crenças muito variadas podiam ser unidade da multidão, bem como no encaminhamento e direcio­
recrutados em apoio a uma causa comum e para dirigir seu namento de suas energias. Mas eles, provavelmente, nunca des­
protesto contra um alvo comum. frutaram da eminência solitária, nem tiveram o papel destacado
Essa unidade seria, é claro, ainda mais evidente nos movi­ que lhes foi atribuído nesses acontecimentos por Taine e Le Bon
mentos cujos participantes ativos eram membros de uma organi­ e por outros proponentes da teoria "conspiratória" da revolução.
zação comum. Na era que antecedeu o aparecimento dos sindicatos Le Bon, por exemplo, escreve que "tão logo um certo número de
de massa, dos partidos políticos e das associações de consumido­ seres vivos se reúne, sejam animais ou homens, colocam-se ins­
res, as organizações desse tipo raramente seriam completas. A tintivamente sob a autoridade de um chefe"; e acrescenta que os
exceção, mais uma vez, ocorreu nos casos em que os insurgentes líderes de m ultidões são "recrutados especialm ente das filei­
estavam organizados em unidades militares, como os Guardas ras das pessoas morbidamente nervosas, excitáveis, m ais ou
Nacionais que atacaram as Tulherias, ou a milícia dos sans-culot- m enos perturbadas, que estão no lim iar da lou cu ra".8 Caracte­
tes que expulsou os deputados girondinos da Convenção Nacio­ rizar os líderes das multidões, em todas as épocas e lugares,
nal, em junho de 1793. O caso foi um pouco diferente na Bastilha, nesses termos é, decerto, revelar uma tendenciosidade social
onde apenas uma parte dos insurgentes estava militarizada. Mais peculiar e reduzir os líderes, como a própria m ultidão, a uma
uma vez, houve ocasiões, mesmo no século XVIII, em que parti­ abstração pura. De fato, o estudo da multidão na história
cipantes de disputas trabalhistas se organizaram em sindicatos: sugere não só que o papel dos líderes variou entre os tipos de
vimos nos capítulos anteriores que isso ocorreu na França com m ovim entos, como também que eram homens de personalida­
os trabalhadores do papel, carpinteiros e tipógrafos, e com os des e origens sociais diferentes; e, acima de tudo, que é neces­
chapeleiros, alfaiates e tecelões londrinos e que, durante a Revo­ sário estabelecer uma distinção entre líderes que operam fora
lução, as compagnonnages, ou "com binações", tiveram certa in­ da m ultidão, líderes vindos da própria multidão e líderes que
fluência na greve dos carpinteiros, em 1791. Nas greves e motins agiam (ou pareciam agir) como interm ediários entre os dois.
rurais, um elemento de organização era sempre proporcionado No primeiro grupo estão os líderes que podem mais ade­
pela comunidade da aldeia. Em Paris, em 1793, os sans-cullotes quadamente ser chamados de "heróis" da multidão — homens
tinham chegado até mesmo a um certo grau de organização em cujo nome ela se amotina ou rebela, a cujas convocações (ou
política, por meio de suas sociedades populares e das assem­ supostas convocações) ela atende e cujos discursos, manifestos
bléias seccionais, o qual não diferia muito do grau mais tarde
proporcionado pelos partidos políticos. Alguma coisa parecida
aconteceu com os pequenos proprietários de Middlesex na época Ver Capítulos 11 e 12.

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ou idéias servem como um pano de fundo ou acompanhamento suas idéias adaptadas a finalidades distintas daquelas a que
ideológico para suas atividades. Esses homens foram Chatham, visava. Vimos como os sans-culottes parisienses, embora conti­
Wilkes e lorde George Gordon, em Londres, no século XVIII; nuassem a aclamar a liderança e as idéias jacobinas, harmoniza-
Robespierre, Danton, Marat e Hébert, na Revolução Francesa; ram -nas com suas próprias idéias, com resultados bastante
Ledru-Rollin, Louis-Napoléon e Louis Blanc, na Revolução de desagradáveis para seus promotores originais. Uma razão dessa
1848, em Paris; e os anônimos e originais Rebeca, general Ludd, ambivalência de liderança foi o fato de serem esses líderes, quase
ou mesmo (se é que existiu) o “ Capitão Sw ing", nos motins que que invariavelmente, provenientes de classes sociais diferentes
se seguiram às Guerras Napoleônicas, na Inglaterra. daquelas a que pertenciam seus seguidores. John Wilkes era filho
Ocasionalmente, longe de exercer a “autoridade muito des­ de um próspero destilador; lorde George Gordon era um aristo­
pótica" que Le Bon lhes atribui, eles foram líderes mais relutantes crata escocês, filho de um duque; e os líderes mais destacados da
do que entusiastas, ou até mesmo renunciaram totalmente à Revolução Francesa foram, quase que sem exceção, ex-nobres,
liderença que lhes tinha sido atribuída. Um exemplo notório da doutores, jornalistas, padres ou comerciantes prósperos. Uma
história mais antiga é Martinho Lutero, que, longe de elogiar os conseqüência disso foi a constante falta de concordância entre as
camponeses alemães que se amotinavam em seu nome, conde- aspirações sociais e políticas de líderes e de seguidores; outra foi
nou-os totalmente como “ Hordas de Campesinato assassinas e serem os líderes (e isso ocorreu particularm ente num m ovi­
ladras". Parece razoável dizer que Luís XVI desempenhou um m ento prolongado como a Revolução Francesa) forçados por
papel igualmente relutante nos distúrbios rurais na França, em vezes, a fim de m anter sua autoridade, a peneirar ou adaptar
1775 e 1789, quando pequenos consumidores e camponeses cita­ suas políticas para atender aos desejos da multidão. Foi preci­
ram sua autoridade para impor preços aos alimentos e ajustar samente o que aconteceu, como já vimos mais de uma vez,
contas com seus senhores. Estes são, é claro, exemplos extremos. quando os jacobinos cederam à pressão popular no controle de
Mais típico talvez seja o embaraço de lorde George Gordon em preços e distribuição de alimentos. Dessa maneira, os líderes,
Londres, em 1780. Suas palavras e atos, em particular seus vio­ longe de exercerem um controle indiscutido sobre seus segui­
lentos ataques contra os católicos romanos, provocaram, sem dores, podiam ser controlados por eles e, num certo sentido, o
dúvida, os motins antipapistas; não obstante, ele podia alegar papel de líder e seguidor se invertia!
com perfeita sinceridade que nunca pretendeu as conseqüências A comunicação entre os principais líderes e seus seguidores
provocadas por seus ataques. Essas situações ambivalentes po­ raramente foi direta. Demonstrações de oratória de massa eram
dem surgir nas revoluções: em 1793, tanto Marat como Robespier­ antes a exceção do que a regra; embora tais ocasiões aconteces-
re tiveram ocasião de denunciar atos praticados em seu nome; e sem, como o discurso de lorde George Gordon a seus protestantes
Louis Blanc, o líder socialista, dissociou-se claramente dos insur­ em St. George's Fields, como os comícios do Campo de Marte ou
gentes de Paris, em junho de 1848. Mais de uma vez, Wilkes como os discursos dos líderes de 1848 a seus partidários, da janela
reprovou seus partidários excessivamente entusiastas por usa­ do Hôtel de Ville, em Paris. Mas só em 1848, na França, e na época
rem seu nome em vão; e até mesmo Rebeca, que manteve um cartista, na Inglaterra, essas demonstrações tornaram-se relativa­
controle mais rigoroso do que a maioria dos líderes “ de fora" mente menos raras. E a imprensa, o Parlamento e os clubes
sobre as atividades da multidão, foi obrigada a suspender sua políticos foram escolhidos como foro, com mais freqüência do
campanha quando esta escapou ao seu controle. que a praça pública. A oratória de Robespierre limitou-se à
Isso não eqüivale, certamente, a sugerir que a influência do Assembléia Nacional e ao Clube dos Jacobinos; Wilkes escreveu
líder “ de fora", ou do herói, sobre movimentos semelhantes seus discursos e manifestos da prisão de King's Bench; Marat
tenha sido puramente casual ou incidental. Pelo contrário: foi uçou as colunas de seu jornal, L'Ami du Peuple; e Ned Ludd
indispensável para lhes dar unidade e direção. Mas, por sua lançava suas orientações a partir de seu quartel-general na flores­
posição “ fora" da multidão, o líder corria sempre o perigo, ta de Sherwood. Tais apelos e mensagens eram transmitidos aos
durante um período prolongado, de perder o controle ou de ver seguidores por vários meios: pela imprensa e por folhetos; em

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reuniões públicas; boca a boca, em oficinas, tavernas ou casas dadas à polícia, em 1775, por um trabalhador da lã, da cidade-
de vinho; nos mercados e nas padarias; e, nas grandes ocasiões mercado de Mouy;' e, depois da revolução de julho de 1789, em
políticas, por em issários ou líderes intermediários, que agiam
Paris, um carregador de sebo, interrogado pela polícia sobre
com o elos entre os líderes "d e fo ra" e a multidão, e que podiam
"quem os comandou (os insurgentes) quando foram ao Palais
tam bém ter transmitido os lemas e as ordens, e também (quan­ Royal e a outros lugares", respondeu com firmeza que "eles não
do a ocasião exigia) preparado as "lis ta s " de vítimas e dado as
tinham líder e cada homem era tão livre quanto o outro".10 Por
ordens de marcha.
mais surpreendente que pareça, isso bem pode ter sido verdade
Não havia, é claro, mistério sobre esses canais de comuni­
em relação a um pequeno setor dos motins, ou pelo menos assim
cação nas operações altamente organizadas, quando unidades
pode ter parecido a um dos muitos milhares de participantes.
militares (como em Paris, em 1792 e 1793) agiram sob as ordens
Nessas ocasiões, a polícia ou a milícia costumava prender não
de seus próprios comandantes. Em certas ocasiões, porém, o
tanto os líderes, em qualquer sentido reconhecido da palavra,
mistério permanece completo: quem, por exemplo, transmitiu os
mas sim os que se deixavam vencer momentaneamente pelo
lemas, idéias e levou faixas da Associação Protestante para seus
entusiasmo, mostravam mais animação, iniciativa ou ousadia do
partidários menos "respeitáveis" e mais amotinados nas ruas de
que seus companheiros, gritavam os lemas, praticavam atos de
Londres? E quem deu a ordem de ataque à casa de Priestley
violência mais espetaculares ou eram escolhidos e delatados por
em Birm ingham ? Em outras ocasiões, vemos fragm entos do
seus vizinhos. Houve, por exemplo, a trabalhadora de Yerres
processo de com unicação — no incêndio dos postos alfande­
que, ao ser presa como chefe de grupo nos motins da fome de
gários em Paris, por exemplo, ao sabermos, pelos depoimentos 1775, disse à polícia que "tinha sido levada pelo entusiasmo ...
de testem unhas, que os líderes locais — como Du Hamel,
que se excitara como toda a gente e não sabia o que dizia ou
ex-ferreiro — agiam sob ordens diretas do Palais Royal, quar-
fazia". O mesmo pode ter acontecido com outra mulher, Marie-
tel-general do duque de Orléans. E, nas "jo rn ad as" de outu­
Jeanne Trumeau, presa e condenada à morte (mais tarde, teve a
bro, vemos Stanislas Maillard dirigir as operações em consulta
pena comutada) por gritar lemas e incitar ao saque e ao incêndio,
com porta-vozes das mulheres; e vemos ainda Fournier l'Am é-
nos motins Réveillon de abril de 1789. Outros líderes locais, ou
ricain recrutar apoio para os manifestantes em seu próprio
supostos líderes desse tipo, surgem dos empoeirados arquivos
distrito eleitoral e incitar as m ulheres do m ercado de V ersa­
da polícia de Paris, entre eles afem m e Lavarenne, uma enfermeira
lhes a exigir a volta do rei a Paris.9 Na Inglaterra, no p rin cí­
analfabeta que, segundo Stanislas Maillard, agiu como porta-voz
pio do século XIX, os Ned Ludds e "S w in g s " locais e, em
das mulheres que marcharam sobre Versalhes; e Dumont (aliás,
G ales, as Rebecas e outros líderes locais, como os cartistas
Cadet), trabalhador das docas que desempenhou papel destaca­
Joh n Frost e Zephaniah W illiam s, que lideraram o ataque a do no ataque aos postos alfandegários de Paris, em 1789.11 Nos
N ew port, podem ter desem penhado um papel sem elhante. motins da fome franceses de 1775, grupos exploratórios locais
Em outros lugares, o m ecanism o da revolta popular pode eram por vezes chefiados por pessoas eminentemente responsá­
escapar-nos totalm ente; ainda assim , podem os talvez supor veis, como agricultores, professores, funcionários locais e até
que foi através de líderes secundários, como esses, que se mesmo o cura da aldeia.”
m antiveram os laços entre os líderes mais im portantes e a Na Inglaterra, houve os conhecidos "capitães" de motins,
m assa dos participantes. que reuniam seus companheiros de uma hora ou de um dia para
Mas esses homens eram também, em geral, "d e fora". Que destruir as debulhadoras, derrubar as cercas ou barreiras na
líderes a própria multidão escolheu, seja em ocasiões como as que
descrevemos ou em outras, como nas greves e motins da fome,
quando agia por sua própria conta? Em certos casos, pode não
ter havido, literalmente, nenhum. Vimos as respostas precisas * Ver p. 233.
** Ver pp. 29-30.

268 269
políticos; e observamos o radicalismo altamente sofisticado de
estrada ou saquear e destruir as casas das vítimas escolhidas.
George Loveless, líder dos trabalhadores agrícolas de Dorches-
Foram homens como Tom, o Barbeiro, porta-voz dos amotinados
ter, que não só foi deportado como militante, em 1834, como
antiirlandeses do leste de Londres no Goodman's Fields, em
também voltou, ainda militante, 3 anos depois.' Com a difusão
1736, e William Pateman, jornaleiro que fazia rodas de carros, e
das idéias radicais e socialistas e o crescimento dos movimentos
Thomas Taplin, mestre cocheiro, que chefiaram grupos de amo­
da classe trabalhadora, esse processo iria, é claro, muito mais
tinados durante os distúrbios antipapistas de Londres, em 1780.
longe; e uma das muitas características da nova sociedade indus­
E havia muitos outros, presos como tal entre as multidões que
trial foi o aparecimento, saídos da própria multidão, de seus
"derrubaram ” a casa de Priestley em Birmingham, queimaram
líderes e müitantes, já não mais ocasionais, esporádicos e anôni­
medas, destruíram máquinas debulhadoras nos condados do sul
mos, mas constantes e abertamente proclamados.
e atacaram propriedades em Bristol e nas cidades oleiras, nas
Resta-nos ainda uma série de perguntas finais relaciona­
décadas de 1830 e 1840.
Uma característica de todos esses líderes era ser sua autori­ das com o com portamento da multidão. Que verdade há na
afirm ativa de Le Bon de que a multidão (e ele freqüentemente
dade puramente local e temporária; é notável que, entre as
identifica "m u ltid ões” com "m assas” ) tende a ser inconstante,
várias centenas de pessoas degredadas para a Austrália pela
irracional, violenta e destrutiva?13 A inconstância, ou "m o b ili­
participação nos distúrbios de Bristol, dos condados oleiros e
do Capitão "Sw in g ", nenhuma delas pareça ter qualquer histó­ d ad e" da m ultidão, é, evidentemente, um mito que se santifi-
cou pela repetição. Uma das palavras inglesas para multidão,
rico subseqüente de atividade política ou radical. Sua militancia,
" m o b " , vem do latim mobile vulgus, não sendo de surpreender
como sua liderança (tanto real como suposta) era de fato limitada
que as classes ricas, sempre que foram impotentes para contro­
à ocasião, e não teve futuro nem continuidade: assim, mais uma
vez, a distinção entre os "m ilitantes e os participantes mais lar as energias da multidão, a tivessem considerado um m ons­
tro inconstante, ao qual faltava qualquer lógica. Até que ponto
ocasionais das atividades da multidão praticamente desaparece.
essa opinião é confirm ada por nosso estudo da multidão pré-
Houve, porém, exceções — mesmo no século XVIII. John Doyle
industrial? Evidentem ente, pouco se poderia dizer a favor
e John Valline, por exemplo, enforcados em Londres, em dezem­
dela, no caso das ocasiões mais organizadas ou cerim oniais,
bro de 1769, não eram simples participantes eventuais nem ho­
quando a multidão se reuniu para ouvir discursos ou para
mens de autoridade momentânea, mas líderes grevistas e mem­
colocar em prática instruções específicas de seus líderes. Isso
bros de comissões que tinham participado de várias das "transa­
é tão evidente que, talvez, nem valha a pena repetir. Mas até
ções” dos tecelões. Naquela época, esses casos limitavam-se às
mesmo essas dem onstrações podiam ser transformadas com a
disputas trabalhistas, e só com a Revolução Francesa vamos
intrusão de um pânico repentino: em "Peterloo” , por exemplo,
encontrar essa continuidade nos movimentos políticos popula­
quando a m ilícia montada atacou as fileiras disciplinadas dos
res. Nos choques no Campo de Marte, em 1791, foram presas 3
tecelões e suas famílias; ou nas Tulherias, em 1792, quando um
pessoas que tinham sido antes reconhecidas como os vitorio­
súbito grito de traição levou ao massacre dos Guardas Suíços
sos” da Bastilha; 4 outras estavam entre as que, um ano depois,
que defendiam o palácio. Em circunstâncias diferentes, vimos
foram mortas ou feridas no ataque às Tulherias; e muitos outros
como os cam poneses franceses, em 1789, abandonaram seus
militantes experientes, treinados nos clubes e armées révolution-
planos de enfrentar os "b an d id o s" m íticos em favor do acerto
naires, estavam entre os vários milhares presos e desarmados
de contas com seus latifundiários, mais proveitoso, e como o
depois do levante popular de maio de 1795.12
Ainda excepcionais naquela época, tais casos tomaram-se
mais freqüentes, tanto na França como na Inglaterra, depois de
1830. Em 1832, na França, vimos que os trabalhadores industriais
já estavam participando de sucessivos distúrbios econômicos e * Ver pp. 182 e 241.

271
270
pacífico desfile de Rebeca por Carmarthen foi transformado, passo que, em 1839, quando as velhas queixas tinham sido
depois da entrada da "ralé da cidade", num ataque violento ao substituídas por outras, novas, os centros têxteis é que foram
albergue dos pobres da cidade.' estim ulados pela "fo rça física" do cartismo, enquanto os in­
Em suma, a instrução do inesperado podia criar um pânico cêndios de medas caíram para seu ponto mais baixo em toda
ou afastar, por alguma outra forma, a multidão de seu propósito uma década.15 Isso apenas mostra, mais uma vez, a necessida­
inicial: nesses casos, a acusação de inconstância parece ter algu­ de de estudar o comportamento das massas, como o dos pró­
ma substância. Mas, em geral, essa "m obilidade" de comporta­ prios líderes, em seu contexto social e histórico. Essas ilustrações
mento não era típica da multidão amotinada. Já citamos numerosos mostram também que a multidão não era, de modo algum,
casos ilustrativos do oposto: a notável firmeza e discriminação "irra cio n a l", no sentido mais amplo da palavra. Podia ser
de objetivos das multidões, mesmo daquelas cujos atos parecem desviada ou provocada pelo pânico, como podia ser movida
os mais espontâneos. Vimos como os amotinados Gordon, em pelos sonhos utópicos ou pelas fantasias m ilenaristas; mas
Londres, e os participantes do movimento "Igreja e rei", em seus objetivos eram, em geral, bastante racionais e, com fre­
Birmingham, depois de escolhidas suas vítimas, tiveram o cuida­ qüência, a levaram, como já vimos, a escolher não só os alvos
do de evitar a destruição ou os danos às propriedades de como também os meios mais adequados à ocasião.*
vizinhos. Os destruidores de máquinas de 1830 parecem ter Mas se a multidão pré-industrial não foi notável por sua
discriminado entre os tipos de agricultor; os amotinados de Ré- inconstância ou irracionalidade, foi certamente dada a atos de
veillon, em Paris, saquearam lojas, mas só as de alimentos; Ned violência, acima de tudo à destruição violenta e metódica da
Ludd e Rebeca invariavelmente escolhiam seus alvos com cuida­ propriedade. Isso aconteceu com uma regularidade quase infalí­
do; as multidões que incendiaram os postos alfandegários de vel nas greves, motins e rebeliões, a tal ponto que dificilmente
Paris pouparam os que pertenciam ao duque de Orléans; os podemos atribuir esse fato ao acaso, ao acidente ou ao pânico
"m assacradores" de setembro só liquidaram as vítimas que tri­ súbito. Essa violência podia resultar de planos deliberados de
bunais improvisados consideraram culpadas; e o leitor deve líderes "d e fora", como nos motins ludistas e Rebeca, na Inglater­
lembrar-se dos mineiros de Cleehill, de 1766, que, como escreveu ra; podia ocorrer contra os desejos dos líderes "d e fora", como
o Annual Register, "entraram na cidade [de Ludlow] de maneira nos motins wilkitas ou antipapistas, em Londres; e, acima de
muito ordenada, dirigiram-se à casa, derrubaram-na e voltaram tudo, podia ocorrer quando a multidão agia sozinha, como nas
sem praticar nenhuma outra violência contra qualquer pessoa".14 greves, motins da fome, o caso Réveillon, em Paris, e (mais
De fato, o estudo da multidão pré-industrial sugere que ela se espetacularmente) nos motins "Sw in g" de 1830, na Inglaterra.
amotinou visando a objetivos precisos e raramente empenhou-se Em várias dessas ocasiões, como já vimos, a entrada de novos e
em ataques indiscriminados a propriedades ou pessoas. inesperados elementos modificou o curso dos distúrbios e levou
Igualmente, embora os motins pudessem espalhar-se por a ataques indiscriminados, fora dos alvos selecionados. Não obs­
"contágio", ou outros meios, para além dos limites rurais ou tante, mesmo sem essas intrusões, o número de casas, capelas,
urbanos dentro dos quais começaram, eles raramente estende­ cercas, barreiras nas estradas, máquinas e fiações destruídas ou
ram-se a áreas não atingidas pelos problemas que lhes deram danificadas teria sido bastante notável.
origem. Podemos tomar o exemplo de Wiltshire, afetado sucessi­ A destruição da propriedade é, portanto, uma característica
vamente pelos motins dos condados sulistas de 1830 e pela constante da multidão pré-industrial; mas não a destruição de
agitação cartista de 1839. Em 1830, os trabalhadores agrícolas, vidas humanas, que está mais ligada às jacqueries, revoltas de
incendiários de medas, chegaram perto dos centros têxteis, tradi­ escravos, rebeliões camponesas e explosões milenaristas do pas­
cionalmente combativos, das partes ocidentais do condado; ao sado, bem como aos motins raciais e distúrbios comunais de

* Ver p. 175. * Ver p. 258.

272 273
épocas mais recentes. Em nosso contexto específico, a famosa em 1789 é que os motins da fome foram acompanhados pela
"sed e de sangue" da multidão é uma lenda, baseada nuns poucos morte de vários padeiros' e moleiros. Não obstante, a Revolução
incidentes cuidadosamente escolhidos. Examinemos os fatos. Francesa, em Paris, com toda a violência destrutiva que a acom­
Nos grande motins ingleses da década de 1730 até a década de panhou, não foi particularmente marcada pela violência assassi­
1840, quer urbanos ou rurais, houve um número notavelmente na por parte das multidões. Nos motins pró-parlements de 1788,
reduzido de mortes entre as vítimas dos amotinados. Não houve as multidões não mataram ninguém, mas os soldados abateram
nenhuma morte nos distúrbios wilkitas, nem nos de Birmingham pelo menos 8 e feriram 14 pessoas. Nos motins Réveillon de abril
e Bristol, nos antiirlandeses, antipapistas e "Sw in g", e em outras de 1789, as multidões destruíram propriedades, mas não fizeram
manifestaçõs rurais; e nem mesmo no levante armado em New- nenhuma vítima fatal; os soldados mataram "várias centenas" (o
port, em 1839. Os motins da fome foram singularmente isentos número exato não é conhecido), e 3 supostos chefes de grupos
de danos à vida ou ferimentos graves: nenhum agricultor, molei­ foram enforcados posteriormente. No cerco da Bastilha, 150 ata­
ro, masgistrado ou açambarcador parece ter sido fatalmente feri­ cantes foram mortos ou feridos pelos defensores; quando ela
do nos motins de 1766. Por outro lado, os motins Porteous, em caiu, as multidões massacraram 6 ou 7 guardas suíços, o gover­
Edimburgo (1736), os motins ludistas e os motins Rebeca fizeram, nador da fortaleza, de Launay, e um funcionário municipal. Entre
cada um deles, uma vítima fatal. A morte pode ter sido mais julho e outubro de 1789, mais 4 pessoas (inclusive um padeiro)
freqüente nas disputas trabalhistas: um marinheiro foi morto foram linchadas pela multidão e 5 amotinados foram enforcados
pelos carregadores de carvão de Shadwell, em 1768, e um solda­ por estes e outros crimes. Em todos os distúrbios camponeses do
do, pelos tecelões de Spitalfields, em 1769. Esse balanço contrasta verão de 1789, registraram-se 3 vítimas, ou 4, no máximo. Em
agudamente com o número de vidas dos amotinados destruídas Versalhes, em outubro, a multidão matou 2 dos guardas que
pelos militares e tribunais. Vinte e cinco amotinados Gordon tinham baleado e morto um dos atacantes. No Campo de Marte,
foram enforcados, em 1780; 12 ou mais amotinados da fome, em em julho de 1791,2 homens foram linchados pela multidão e mais
1766; 8 carregadores de carvão de Londres e 2 (talvez 3) tecelões, de 50 manifestantes foram mortos pela Guarda Nacional de
em 1769; 37 ludistas ou mais, em 1812-13; e 39 participantes dos Lafayette. Não houve vítimas fatais em nenhum dos dois lados
motins "Sw in g", em 1830. Os m ilitares fizeram mais vítimas: 5 nos motins de maio-junho e setembro daquele ano. No levante
am otinados foram mortos em Norwich, em 1740; 10 foram armado final dos sans-culottes, em maio de 1795, as multidões que
m ortos e 24 feridos nos motins das barreiras nas estradas, em invadiram a Convenção mataram o deputado Féraud; nas repre­
1753; mais de 100 mineiros foram mortos ou feridos em Hex- sálias que se seguiram, 36 pessoas, inclusive 6 deputados jacobi-
ham, em 1761; 8 m anifestantes foram mortos a tiros em Kid- nos, foram guilhotinadas por ordem de um tribunal militar.'
derminster, 8 em Warwick, 2 em Frome e 1 em Stroud, nos motins Desse balanço de violência e represália podemos ver, por­
da fome de 1766; 11 manifestantes (dificilmente poderiam ser tanto, que foram mais as autoridades do que a multidão que se
considerados amotinados) foram mortos na hora ou morreram destacaram por sua violência contra a vida. Não obstante, houve
dos ferimentos recebidos nos motins Gordon; 8 foram mortal­ os dois incidentes excepcionais de agosto e setembro de 1792. No
mente baleados nos distúrbios luditas de 1811-1812 e 7, na batalha primeiro, 376 insurgentes antimonarquistas foram mortos ou
de Bossenden Wood; 110 foram mortos ou feridos nos motins das feridos pelos defensores, enquanto os atacantes, nas represálias
barreiras fiscais em Bristol, em 1793; 24 morreram em Newport,
em 1839; e, 20 anos antes, a milícia montada do Lancashire matou
11 e feriu 420 ou mais no massacre de "P eterloo".10 * Ver The Crowd in lhe French Revolution, pp. 37-8, 56, 67-75, 89, 96-8, 116-17,
Os motins rurais franceses, como os ingleses, foram também 155-6; G. Lefebvre, La Grande Peur de 1789 (Paris, 1932), p. 242; K. Tõnnesson, La
dm gidos contra a propriedade, e não contra as pessoas; e não défaite des sans-culottes (Oslo e Paris, 1959), p. 330. Omiti o levante monarquista
de outubro de 1795, quando 200-300 foram mortos de cada lado ( The Crowd in the
houve ferimentos fatais entre as numerosas vítimas dos amotina­ French Revolution, p. 173), já que não se tratava de um motim rigorosamente
dos nos distúrbios de 1775. Só com a grande onda de agitações popular.

274 275
3. Middlesex Journal, 13-15 e 20-22 de abril de 1769.
que se seguiram, massacraram 600 guardas suíços, depois que
4. Journal, de H ardy, VIII, 475; E.P: Thompson, The Making of the
estes receberam ordem de depor as armas. No segundo, nada
English Working Class (Londres, 1963), pp. 681-2.
menos de 1.100 a 1.400 prisioneiros, a maioria deles criminosos 5. Rafaello Carboni, The Eureka Stockade, org. G. Serie (Melbourne,
comuns e não aristocratas ou padres, foram arrastados das pri­ 1963), p. 179.
sões e massacrados depois de condenados por tribunais apressa­ 6. G. Rudé, The Crowd in the French Révolution (Oxford, 1959), pp.
damente improvisados.17É nesses incidentes que os argumentos de 220 - 2 1 .
Taine e Le Bon contra a "turba assassina" se baseiam, em grande 7. G. Vauthier, "L e choléra à Paris en 1 8 3 2 ", La Révolution de 1848, XXV
parte. Por mais revoltantes que sejam, nenhum deles é típico do (1928-9), pp. 234-41; L. Chevalier, Classes laborieuses et classes dange-
reuses (Paris, 1958), p. xix.
comportamento da multidão. O primeiro foi, principalmente, 8. Le Bon, op. cit., pp. 133-4.
uma operação militar realizada por homens que agiam sob or­ 9. Ver The Crowd in the French Révolution, pp. 48-9, 73-7, 229.
dens de seus comandantes e da recém-instalada Comuna Revo­ 10. A rchives Nationales, Z2 4691 (29 de julho de 1789).
lucionária de Paris. O segundo caso foi um pouco diferente. Foi 11. The Crowd in the French Révolution, pp. 230-31.
uma questão civil, e não militar; não obstante, ocorreu como 12. V er m eu Wilkes and Liberty (Oxford, 1962), pp. 101-102; e The Crowd
resultado do pânico provocado por uma derrota militar, pela in the French Révolution, pp. 108, 230-31.
penetração prussiana em Verdun e a convicção de que o inimigo 13. Le Bon, op. cit., pp. 16-17, 42, 73.
14. A nnual Register, IX (1766), 149.
que avançava, em conluio com os presos das cadeias, procederia
15. E.J. Hobsbawm, "E conom ic Fluctuations and Some Social Move-
a uma sangrenta vingança contra a população parisiense. En­
m ents since 1 8 0 0 ", Economic History Review, 21 série, V, i (1952), 8.
quanto a maioria observava com aprovação, as execuções foram 16. Ver meu Wilkes and Liberty, pp. 51, 203-204; R.W . W earm outh,
realizadas por pequenos grupos de massacreurs que operavam Methodism and the Common People of England of the Eighteenth-Century
(ou assim parecia) sob as ordens dos membros da Comuna e das (Londres, 1945), pp. 19-91; D. Williams, The Rebecca Riots (Cardiff,
Secções de Paris.18 Pode a multidão, então (no sentido em que até 1953), p. 253; F.O. Darvall, Popular Disturbances and Public Order in
agora usamos a palavra), ser considerada um agente ativo ou Regency England (Londres, 1934), pp. 1 0 4 ,1 2 0 ,1 3 0 ; E.P. Thompson,
op. cit., p. 687; M. Hovell, The Chartist Movement (Manchester, 1959),
passivo no caso? É um ponto discutível; de qualquer modo, o
p. 180.
incidente é isolado e não é típico das ações e comportamento da 17. The Crowd in the French Révolution, pp. 104-105,110.
multidão pré-industrial. 18. P. Caron, Les massacres de scptembre (Paris, 1935), pp. 76-102.
Em suma, a multidão foi violenta, impulsiva, facilmente
provocada pelo boato e inclinada ao pânico; mas não foi incons­
tante, peculiarmente irracional, nem geralmente dada a ataques
sangrentos a pessoas. Ao quadro convencional da multidão, pinta­
do por Le Bon e herdado por autores que se seguiram, não falta
a visão arguta e imaginativa; ele ignora, porém, os fatos da história
e é, em conseqüência, exagerado, tendencioso e enganoso.

REFERÊNCIAS

1. G. Le Bon, The Crowd (Londres, 1909), p. 26 (Título original: La


psychologie des foules); G. Lefebvre, "Foules révolutionnaires", em
Études sur la Révolution française (Paris, 1954), p. 273.
2. Lefebvre, op. cit., p. 272.

276 277
CAPÍTULO DEZESSEIS

Os Sucessos e Fracassos
da Multidão
7 ~ ) esta uma última e importante pergunta. Todo o vigor, heroís-
J-\.m o e violência contados e analisados nestes capítulos tive­
ram resultados positivos? Nessa fase de sua história na França e
na Inglaterra, o que conseguiu a multidão? Em termos de ganhos
imediatos, devemos reconhecer que obteve relativamente pouco.
Em movimentos grevistas e salariais, enquanto os sindicatos
foram fracos, dispersos e proibidos, os trabalhadores só podiam
ter esperanças de obter resultados de curta duração, e limitados.
Os trabalhadores parisienses de 1794, que fizeram greve numa
época de guerra e escassez de mão-de-obra, obtiveram salários
consideravelmente maiores, que, no entanto, foram mais do que
engolidos pela inflação dos meses seguintes. Os luditas, embora
não conseguissem acabar com o tear a vapor, obtiveram algumas
concessões temporárias dos fabricantes de tecidos do Yorkshire
e dos fabricantes de tecidos de malha dos condados centrais.
Também esses ganhos foram cancelados ou desapareceram na
depressão que continuou por muito depois de sufocados os mo­
tins. Nos motins rurais ingleses, tecelões, mineiros, arrendatá­
rios, proprietários e trabalhadores fizeram seu protesto social
por um ou dois dias; derrubaram cercas, "dem oliram " fábricas
ou moinhos e impuseram seus controles de preços sobre o trigo,

279
a farinha, a carne e a manteiga — até que a m ilícia chegou, abriu exercidas sobre a vida nacional francesa, e além da própria Fran­
fogo e prendeu os "ch efes” , que foram enforcados, presos ou ça, pela revolução de 1789 e, em proporções menores, pelas
degredados; e a “ normalidade” voltou a reinar. Os m otins da revoluções de 1830 e 1848.
fome franceses de 1775 alarmaram muito o governo devido à sua Mas por que algumas "explosões hostis” seriam bem-suce­
am plitude e sua ameaça à segurança da capital; Turgot, porém, didas, enquanto outras constituiriam um fracasso tão patente? É
reuniu uma consid erável força m ilitar e dom inou os am oti­ claro que, em seus aspectos mais amplos, essa pergunta suscita
nados, sem fazer a m enor concessão aos pequenos consum i­ uma série de problemas — alguns deles, sociais e ideológicos,
dores cujas dificuldades os tinham provocado. De fato, dos outros, políticos e administrativos — surgidos tanto antes como
m uitos motins de fome do período, foram provavelm ente ape­ depois do ponto de explosão.* Mas, neste breve capítulo final,
nas os da Revolução Francesa — em particular os de 1793 — focalizaremos principalmente os que surgiram depois da própria
que atingiram os objetivos a que se propunham. explosão. Primeiro, a deflagração e a "vantagem " inicial. Quanto
Além das revoluções, os motins urbanos não se destacaram a isso, a menos que os números fossem esmagadores, o sucesso
mais do que os rurais por seus sucessos. Nos motins Gordon, as precoce podia depender de fatores como um avanço rápido, a
multidões londrinas antipapistas dominaram as ruas por uma tomada de iniciativa ou a exploração das vantagens oferecidas
semana; mas a Lei da Assistência Católica, que as tinha motiva­ pela geografia. Nos motins rurais, por exemplo, foi relativamente
do, permaneceu. Depois dos motins de 1791, Priestley viu-se fácil conseguir vantagem considerável antes que a m ilícia pu­
forçado a deixar Birmingham e a refugiar-se nos Estados Uni­ desse ser convocada ou o exército entrasse em ação. Assim, em
dos, mas isso se deveu antes à constante hostilidade das autori­ 1775, os participantes dos motins franceses da fome percorre­
dades do que à violência do movimento "Igreja e rei” . Os motins ram à vontade os mercados e aldeias durante toda uma sem a­
urbanos franceses, antes de 1787, foram explosões menores e na, e tinham mesmo entrado em Versalhes e Paris antes que
conseguiram menos do que os ingleses. E os resultados de ex­ Turgot pudesse reunir uma força armada adequada para con­
plosões como as ocorridas em Bristol e Nottingham, em 1831, e tê-los. Em Londres, em março de 1768, as multidões que com e­
em Birmingham e nas cidades oleiras, em 1839-42, são difíceis moravam a primeira vitória eleitoral de Wilkes no M iddlesex
de avaliar por serem partes de movimentos mais amplos: o tiveram uma boa vantagem de tempo, enquanto os policiais
Projeto de Reforma, no primeiro caso, e o Cartismo, no segundo. estavam em Brentford, onde a eleição fora realizada. E, da
Mas, além dos fracassos, a multidão teve seus êxitos indis­ mesma forma, nos m otins parisienses da fome, em fevereiro de
cutíveis. Não só os motins Rebeca destruíram as odiadas barrei­ 1793, as multidões puderam ocupar as mercearias sem oposi­
ras fiscais, que não foram reconstruídas, como também o número ção, porque a Guarda Nacional estava, naquele dia, ocupada
delas foi reduzido, e foram criadas Juntas de Condado para com outros deveres em Versalhes.
administrar as velhas e impopulares concessões. Os sucessos de Em outras ocasiões, a deflagração quase simultânea de dis­
"Sw ing” não foram menos sensacionais, mas, em alguns distri­ túrbios numa ampla área tornava impossível até mesmo ao mais
tos, o conluio dos agricultores assegurou a não recuperação das astuto e decidido chefe de polícia ou comandante militar dispor, de
m áquinas danificadas pelos trabalhadores. Os distúrbios wil- maneira efetiva, das forças com que contava. Foi certamente o que
kitas, em Londres, não só conseguiram uma série notável de aconteceu nas fases iniciais dos motins Rebeca e luditas na Inglater­
vitórias pessoais para o próprio Wilkes, como contribuíram substan­ ra; e, em abril de 1848, a Convenção Cartista, por insistência de
cialmente para o crescimento do movimento radical de massa na Ernest Jones, planejou desviar a atenção das autoridades de Lon-
Inglaterra. O Cartismo, embora fosse um fracasso na época, não
o foi a longo prazo, já que 5 de seus Seis Pontos foram aprovados,
Ver N.J. Smelser, Theory o f Coüectwe Behavior (Londres, 1962), pp. 261-8,
por uma sucessão de Parlamentos, nos 100 anos seguintes. E,
364-79, para aquilo que o autor chama de "controle social" da tensão
finalmente, seria tedioso reexaminar as profundas influências distúrbio.

280
dres, onde ocorreria a operação principal, organizando manifes mentos.3Em junho de 1848, os soldados estacionados em Londres
tações simultâneas nas províncias “ para que os lacaios do poder para atemorizar os cartistas eram, ao que se dizia, "tão selvagens
no campo possam ser contidos pelos bravos homens de lá -1 que lorde Londonderry declarou ao duque de Wellington estar
É claro, porém, que esses recursos não podiam conquistar certo de que, se ocorresse um choque, os oficiais de seu regimento
senão uma vantagem temporária, a menos que houvesse outras não poderiam conter seus hom ens".4 Ainda mais notável, naque­
razões, mais sólidas, para o sucesso. E isso só ocorreu num dos le mesmo mês, foi a ferocidade com que as Gardes Mobiles
casos que citei. Em Londres, em 1768, mesmo quando a polícia parisienses, embora recrutadas entre os jovens trabalhadores e os
voltou de seus outros deveres, as forças da lei e da ordem foram desempregados, massacraram os insurgentes de junho nas barri­
inadequadas para conter a barulhenta manifestação de entusias­ cadas. Em 1830, foi a um grupo social um pouco diferente que o
mo entre os partidários de Wilkes. Em Paris, em fevereiro de duque de Wellington recorreu, a fim de acabar com os amotina­
dos "Sw in g ", em Hampshire:
1793, por outro lado, a volta da Guarda Nacional, com o cerve­
jeiro Santerre à frente, acabou rapidamente com os motins; e, nos
outros exemplos citados, as autoridades precisaram apenas de
Convenci os m agistrados [escreveu ele] a m ontarem eles
tempo para colocar suas forças em ordem, a fim de sufocar os
m esm os, cada qual à frente de seus próprios em pregados e agre­
distúrbios. Em 1775, Turgot preparou dois exércitos inteiros, um gados, cavalariços e guardas de caça, arm ados com chicotes, pis­
deles comandado pelo marquês de Poyanne, na íle de France, e tolas, espingardas de chumbo e o que pudessem apanhar, e a
o outro sob o comando do veterano duque de Brion, em Paris; atacar essas turbas em conjunto, se necessário, ou sozinhos, dis­
depois disso, os motins acabaram numa semana. Na Inglaterra, persá-las e apanhar e prender os que não pudessem escapar. Isso
iio verão de 1812, como já vimos, os luditas ficaram atemorizados foi feito de maneira animada, em muitos casos, e é espantosa a
ante um exército de 12.000 homens, maior do que qualquer outro rapidez com que a região foi tranqüilizada, e isso da melhor
convocado antes para enfrentar uma desordem civil.' Nos muitos maneira, pela atividade e ânimo dos cavalheiros.5
anos de agitação cartista na Inglaterra, grandes contingentes de
soldados regulares foram concentrados nas áreas afetadas: 10.500
homens, em 1839, e 10.000, em 1842; e, em abril de 1848, para Esses apelos animados" à classe podiam de fato, como
enfrentar a última ameaça cartista, cerca de 170.000 guardas neste caso, ser muito eficientes na mobilização da resistência aos
especiais foram admitidos e 7.123 “ regulares" e 1.290 agentes distúrbios. Houve, porém, ocasiões em que os ódios assim pro­
armados foram reunidos, só na capital.2 vocados, alienando ou indignando os não-participantes, pode­
Esses números eram impressionantes; não obstante, no riam repercutir negativamente contra seus patrocinadores e
cômputo final, não foram tanto os números em si mesmos que constituir antes uma desvantagem do que uma vantagem. Foi
tiveram peso decisivo, mas a disposição ou a capacidade que as certamente o que aconteceu com Lafayette e a Guarda Nacional
autoridades tinham de usá-los. Muito podia depender, como já parisiense, cujo zelo em abater manifestantes desarmados no
vimos, da rapidez e eficiência com as quais eram reunidos, e Campo de Marte, em julho de 1791, provocou paixões que não
muito mais ainda dependia da determinação dos magistrados, foram contidas facilmente. Resultados semelhantes, embora não
guardas e soldados de acabar com o distúrbio. Nos motins ingle­ tão drásticos, decorreram dos "m assacres" de partidários de
ses, houve numerosas ocasiões em que a ação rápida dos juizes Wilkes em St. George's Fields, pela Infantaria, em 1768, e dos
que gozavam de respeito provocaram o fim imediato dos movi­ tecelões do Lancashire, pela milícia montada, em "Peterloo",
meio século depois.
Mas não foi tanto o excesso de zelo quanto seu oposto que
* Antes do término dos motins Gordon de 1780/ havia 10.000 soldados acam­ pôde colocar em risco a autoridade e solapar suas defesas. Para
pados nos parques e praças de Londres. (P. de Castro, The Cjordoti R ioh [Londres,
cada magistrado vigoroso, respeitado e zeloso nos distúrbios
1926), p. 263.]

282 283
ingleses, podia-se geralmente encontrar outro cuja fatuidade, tancialmente fiel, qualquer ameaça ao governo ou à ordem esta­
arrogância, timidez ou cautela podiam afastar os simpatizantes belecida foi desprezível, ou inexistente. Em teoria, era possível
ou confundir e paralisar os guardas e os comandantes militares imaginar que um grande número de civis, se tivesse acesso a
à sua disposição. Além disso, a antiquada maquinaria da ordem, armas e munições, poderia armar-se e tomar o poder com tal
em particular as anomalias que cercavam a execução da Lei do rapidez que o exército não teria tempo de oferecer resistência ou
Motim, levavam a uma confusão interminável; e o gabado "d i­ descontentar-se. Na verdade, porém, isso nunca aconteceu antes,
reito de resistência" dos ingleses contra a opressão, em particular e nem depois. Na Inglaterra, o exército permaneceu obstinada­
quando a oposição parlamentar o explorava, podia ser quase mente fiel ao rei e ao Parlamento durante todo o período —
interpretado como um "direito de rebelião .6 Houve ocasiões, embora em certos momentos, em 1839 e 1840, o general Napier,
também, nas quais os magistrados (e isso aplica-se tanto à França que tinha o comando do norte, expressasse receios de que seus
quanto à Inglaterra) não só foram cautelosos e tímidos na convo­ soldados estivessem contaminados pela propaganda cartista.7
cação dos soldados, como simpatizaram, aberta ou secretamente, Na França, apesar de toda a impopularidade dos ministros,
com a causa dos amotinados. Até mesmo nos motins dos cereais o exército nunca hesitou seriamente em sua fidelidade ao rei, até
franceses de 1775, que foram ativamente reprimidos, alguns ma­ o outono de 1787 — tanto assim que Sébastien Mercier, escreven­
gistrados, embora não questionando abertamente a autoridade do em 1783, julgou inconcebível que uma cidade tão bem policia­
de Turgot, inclinavam-se a favor dos amotinados. Nos motins da como Paris ficasse exposta a tumultos como os que Londres,
Gordon, em Londres, muitos magistrados da municipalidade por falta de tais defesas, tinha sofrido por ocasião dos motins
hesitavam ainda mais em cumprir com seus deveres: sendo tão Gordon.8 Mas ele iria descobrir logo', é claro, que não era uma
hostis à assistência aos católicos quanto a própria multidão, eles simples questão de aritmética: a eficiência dos exércitos nos
praticamente toleravam suas atividades, até que os amotinados distúrbios civis depende muito menos dos números do que de
se tornaram uma ameaça não só às propriedades católicas, como sua disposição de obedecer. E era precisamente isso que o exér­
à propriedade como um todo. Esse conluio entre magistrados e cito francês, em 1788, e, mais ainda, em 1789, não estava disposto
amotinados podia ir ainda mais longe: na França, em 1788, não a fazer. O descontentamento começou não entre as fileiras, mas
se podia esperar que os parlements tomassem medidas firmes entre os oficiais. Estes, que vinham em grande parte da peque­
contra os que se amotinavam a seu favor; e, em Birmingham, 3 na nobreza provinciana, tinham queixas, há muito, sobre sua
anos depois, houve uma forte suspeita de que os principais situação social e oportunidades de promoção, e a "revolta
instigadores dos motins Priestley seriam encontrados, se as au­ aristocrática" proporcionou uma ocasião admirável para ex­
toridades quisessem, entre os próprios magistrados. pressarem tais queixas. Na Bretanha, na Dauphiné e em outras
Mas foi apenas em circunstâncias excepcionais, como as da províncias, eles mandaram que seus soldados não disparassem
"revolta aristocrática" francesa de 1788, que a insubordinação ou contra os m anifestantes, recusaram-se a prender magistrados
o conluio dos magistados pôde dar mais do que uma vantagem rebeldes e, em geral, deram a seus soldados, que também
temporária aos amotinados ou rebeldes. Geralmente, isso só tinham queixas próprias, um exemplo de desobediência que
pôde assegurar seu completo sucesso em operações limitadas e não tardaria a ser copiado.
negativas como as empreendidas em nome do Igreja e rei . Em Em fevereiro de 1789, antes mesmo que a Revolução tivesse
última análise, foi sempre ao exército que a autoridade, tanto na começado, Necker advertiu o rei de que o exército já estava
França como na Inglaterra, recorreu para defender-se contra os demasiado descontente para ser digno de confiança como instru­
distúrbios populares; e, enquanto o exército permaneceu subs­ mento para reprimir a desordem civil; e, a partir de então, foram
principalmente os recrutas estrangeiros, ou soldados de provín­
cias distantes, que foram levados até Versalhes para defender a
* V er pp. 29, 62,101 e 158. Corte e, mais tarde, atemorizar a capital. Em Paris, as Gardes

284 285
F r a n ç a is e s foram bastante fiéis para disparar contra os amotina­ seus poderes militar e policial".11 Essas afirmações são bastante
dos Revéillon em abril; mas, em junho, desfilavam aos gritos de verdadeiras em si, mas não constituem a verdade total, e tendem,
Vive le Tiers État! e, em julho, tiveram um papel crucial na tomada mesmo quando apresentadas em termos tão puramente milita­
da Bastilha.9 Depois disso, surgiu um novo exército nacional, que res, a suscitar uma outra pergunta, muito mais importante: por
proclamou sua fidelidade à nação e às novas autoridades repu­ que o exército se recusa a obedecer, ou por que o governo perde
blicanas; mas este foi mantido longe de Paris, cuja defesa foi o controle de seus meios de defesa? Essencialmente, é uma ques­
confiada à Guarda Nacional. Esta, a princípio solidamente bur­ tão antes social e política do que militar. Pois se os magistrados
guesa, foi eficiente, como já vimos, na supressão da manifestaçao toleram os motins e os soldados confraternizam com os rebeldes,
de julho de 1791; mas tornou-se gradualmente o instrumento dos ou se recusam a atirar neles, é porque os laços de classe, ou da
sans-culottes, tanto quanto da Assembléia. E só quando convoca­ filiação política, são naquele momento mais fortes do que a fi­
ram novamente o exército, em maio de 1795, foi que se encerrou delidade à ordem estabelecida ou ao governo.
a longa série de distúrbios populares que marcara todo o curso Já vimos provas disso nas ações dos oficiais aristocratas
da Revolução em Paris. franceses, em 1788, e de suas tropas, no ano seguinte; e, em
Em 1830 e 1848, a defecção das forças armadas foi, mais fevereiro de 1848, os Guardas Nacionais que abandonaram Luís
uma vez, decisiva para assegurar a derrota do governo real e Filipe mostraram claramente — na verdade, assim o disseram em
o sucesso do desafio revolucionário. Não obstante, o padrão outras tantas palavras — que tinham, como seus companheiros
não foi o mesmo de 1789. A deflagração de 1830 foi curta e, negociantes, sido contaminados pela exigência de reforma polí­
depois de 3 dias de lutas nas ruas, Carlos X foi afastado e Luís tica feita pela classe média. Mas isso, em si mesmo, não podia
Filipe instalado para os próximos 18 anos. Em fevereiro de assegurar o sucesso da revolução de fevereiro: ele dependeu não
1848, foi a defecção da Guarda Nacional em Paris, mais ainda só da Guarda Nacional, mas também de sua cooperação com os
que a do exército (passivo, e não abertamente rebelde), que jornalistas radicais de classe média e os elementos sociais muito
expulsou, por sua vez, Luís Filipe para o exílio. Dessa vez, as diferentes que formavam a multidão revolucionária. Por motivos
forças populares que desafiaram a autoridade do novo gover­ sociais e políticos, a aliança teve vida curta e, em junho, a insur­
no revolucionário e da Assembléia eram muito mais fortes, e reição popular fracassou porque teve pouco, ou nenhum, apoio
estavam muito mais bem organizadas do que em 1789. Não entre seus aliados de fevereiro. Da mesma forma, em 1789, as
obstante, foram dominadas, não depois de 6 anos, mas depois grandes insurreições e comoções populares foram realizadas
de apenas 4 meses. Isso, em parte, devido à construção das através de uma operação conjunta dos sans-culottes — o principal
estradas de ferro, que tornaram possível levar os soldados elemento que formava a multidão revolucionária— e uma varia­
mais depressa à capital; e talvez ainda mais à fidelidade da da combinação de grupos de classe média, e até mesmo liberais
maior parte da Guarda Nacional e da Guarda Móvel, os verda­ e aristocráticos. Quando essa combinação de forças sociais des­
deiros vencedores da insurreição de junho. moronou, como ocorreu finalmente na primavera de 1795, o povo
Parece, portanto, quase um truísmo dizer que o fator-chave parisiense não teve mais possibilidades de obter vitórias pelas
para determinar o resultado da rebelião e do distúrbio popular é manifestações e motins de rua, tal como os pequenos camponeses
a fidelidade ou o descontentamento das forças armadas à dispo­ e consumidores de 1775.
sição do governo. "É obvio", escreve Le Bon, "que as revoluções Na Inglaterra, como já vimos, essas vitórias foram muito
não ocorreram nunca, e não ocorrerão, a não ser com a ajuda de menos freqüentes do que na França; e a Inglagerra, provavelmen­
uma importante facção do exército."10 E o professor Crane Brin- te, só se aproximou da revolução em 1831, quando a inquietação
ton diz quase a mesma coisa, quando escreve "que é quase certo irlandesa, os distúrbios rurais e a agitação popular e de classe
dizer que nenhum governo será, provavelmente, derrubado en­ média em relação ao primeiro Projeto de Reforma se combinaram
quanto não perder a capacidade de usar de maneira adequada para levar o país à beira da guerra civil. Isso não aconteceu

287
286
porque o metodismo, ou qualquer outro movimento religioso, válidas; não obstante, há um sentido mais amplo no qual a
afastasse os homens da luta terrena, evitando com isso uma multidão pré-industrial, a despeito de seus fracassos ou sucessos
revolução; mas, pelo menos até a década de 1840, nenhum movi­ imediatos, marca uma fase importante do processo histórico. Tal
mento de insurreição das "classes inferiores" inglesas, quer na como a sociedade mudou, também a multidão mudou com ela e,
cidade ou no campo, teve qualquer possibilidade de êxito sem o ao mudar, deixou seu legado às gerações posteriores. Assim
apoio de alguma combinação de outros grupos sociais. E, na como o sans-culottes, o pequeno proprietário e o arrendatário
Inglaterra, tal apoio raramente aconteceu; quando houve, foi deram lugar ao operário de fábrica e ao trabalhador agrícola,
demasiado breve para dar resultados mais do que limitados. No assim também o quebrador de máquinas, o incendiário de medas
movimento wilkita das décadas de 1760 e 1770, o radicalismo e o amotinado do "Igreja e rei" deram lugar ao sindicalista, ao
popular conquistou algumas vitórias, mas isso apenas enquanto militante trabalhista e ao consumidor organizado da nova socie­
a agitação da multidão nas ruas foi apoiada pela agitação dos dade industrial. Um novo vinho foi, em certas ocasiões, realmen­
pequenos proprietários do Middlesex e dos artesãos, lojistas e te posto em garrafas antigas; mas, em geral, talvez não seja
comerciantes de Londres. Da mesma forma, nos motins Gordon, absurdo ver essas provas de força antigas, imaturas e, com fre­
a multidão pôde ocupar as ruas enquanto os magistrados da qüência, grosseiras, mesmo quando destinadas ao fracasso, como
Municipalidade e os pais de família toleraram suas atividades; as precursoras de movimentos posteriores cujos resultados e
mas, quando essa sanção foi retirada, o movimento não teve sucessos foram significativos e duradouros.
futuro. Em Birmingham, em 1791, é duvidoso que a multidão do
"Igreja e rei" tivesse conseguido destruir a casa de Priestley e
expulsá-lo da cidade sem a aprovação tácita, ou ativa, de vários REFERÊNCIAS
de seus magistrados. As "filhas de Rebeca" deveram seu sucesso
1. Citado por F.C. M ather, Public Order in the A ge ofthe Chartists (Man-
não à defecção dos militares, que acabaram sendo mobilizados em
chester, 1959), p. 22.
números suficientes para contê-las, mas ao apoio que tiveram entre 2. E. Lavisse, org., Histoire de France depuis les origines jusquà la Révo­
toda a população agrícola — e mesmo, em parte, à disposição do lution (9 vols., Paris, 1911), IX, 33; F.O. Ç arvall, Popular Disturbances
governo de acabar com os principais abusos que tinham provocado and Public Order in Regency England (Londres, 1934), pp. 259-60; F.C.
o motim. Os Cartistas falharam em seus objetivos imediatos porque M ather, op. cit., pp. 152, 163; M. Hovell, The Chartist Movement
seu número, embora considerável, foi insuficiente para compensar (Londres, 1918), p. 290.
3. Ver, por exemplo, Darvall, op. cit., pp. 244-5; e Mather, op. cit., pp.
a falta de apoio da classe média. E, ainda assim, a longo prazo, a
60-61.
maioria de seus Seis Pontos foi realizada precisamente porque esse
4. M ather, op. cit., p. 180.
apoio, recusado na década de 1840, seria dado mais tarde. 5. Citado por D. W illiams, ]ohn Frost (Cardiff, 1939) pp. 59-60.
Mas, finalmente, devemos julgar a importância da multidão 6. E. Halévy, A History of the English People in 1815 (3 vols., Londres,
na história exclusivamente em termos de seus êxitos e fracassos? 1937) 1 ,193-8.
E indiscutível que seu impacto sobre os acontecimentos foi muito 7. M ather, op. cit., pp. 177-81.
mais marcado em certos casos do que em outros. Nesse sentido, 8. L.S. M ercier, Tableau de Paris (12 vols., A m sterdam , 1783), VI, 22-5.
9. V er m eu capítulo sobre "T h e Outbreak of the French R évolution",
as multidões revolucionárias de 1789 e 1848, tanto em sua matu­
a ser incluído em The New Cambridge Modern History, vol. VIII.
ridade como em sua realização, podem pretender, com justiça, 10. G. Le Bon, The Psychology of Révolution (Nova York, 1913), p. 49
uma precedência sobre as multidões que se dedicaram aos obje­ [título original: Lapsychologie de la Révolution), citado por N. Smelser,
tivos mais primitivos e, com freqüência, aparentemente fúteis, de Theory of Collective Behavior (Londres, 1962), p. 372
destruir casas em nome do "Igreja e rei", de derrubar barreiras 11. Crane Brinton, The Anatomy of Révolution (Nova York, 1960), pp.
fiscais e danificar máquinas ou de impor controles de preços de 266-7.
curta duração nos motins da fome. Essas distinções são bastante

288 289
BIBLIOGRAFIA

O
m aterial docum ental em que este livro se baseia já foi
discutido na Introdução, e não pretendemos expô-lo deta­
lhadamente aqui. Algumas fontes primárias, inclusive publica­
ções contemporâneas e manuscritos ocasionais, são registradas
nas referências no final dos capítulos; outras podem ser procura­
das em obras secundárias (livros e artigos) consultadas, das quais
as mais importantes estão relacionadas a seguir.

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A Bisgambilia, Antoine 240


Blanqui, Auguste 182,185,187
Anos Quarenta da Fome 200 Bolton 74, 83,89,199, 203
Argenson, marquês d' 22, 52 Bordeaux 19, 22, 46,116,119, 246,
Armées révolutionnaires 111, 228, 259
270 Bossenden Wood 163,250
Ashton-under-Lyne 201 Bretanha 109,148, 285
Assalariados, ver Trabalhadores Brie, 28, 29, 30,126
Assignats 116,122,138,142 Briggs, Asa 9, 212
Associação dos Trabalhadores de Bristol 35, 83, 274
Londres 195 e os motins de 1831 163, 259,
Associação Nacional da Carta 268 260,269, 274, 280
Attwood, Thomas 196 Bruxelas 149,150
Austrália, 226, 260 Buckingham, Buckingamshire 41,
degrego para a 123, 218, 224, 46,167,171
225 Burke, Edmund 6, 9

B c
Babeuf, Gracchus 182, 239 Caen 22,116,149
Barère, Joseph 127,142 Cahiers de doléances 108,134,135
Camisards 19
Barnave, Pierre-Joseph 116, 237
Campo de Marte (Paris) 4,105,267
Barreiras fiscais 259
e petições e "massacre" de ju­
Bastilha 4, 6,12,115,136,153,188,
lho de 1791 111, 116, 216,
216, 221, 222, 224, 232,235, 256,
225, 270, 275, 283
262, 263, 270, 275, 286
"Capitão Swing" 178, 266
Beauce, e os motins da fome de ver também Motins "Swing"
1792 117-122,126,127, 247 Cardiganshire, 171-177
Beaumont-sur-Oise, 24,109 ver também motins Rebeca
e os motins de cereais 24,25,28, Carlos X, rei da França 181, 286
30, 260 Carlyle, Thomas 7, 260
Beauvais, Beauvaisis 27,126, 233 Carmarthen, Carmarthenshire
Bendix, Reinhard 252 171, 272
Berkshire, 41, 42, 43,165, 217 ver também motins Rebeca
Bethnal Green (Londres) 76,81 Carta do Povo 164, 195-196, 197,
Birmingham 44, 46,152,153 198, 203, 204, 207, 241, 248
e o Cartismo 195,196,197,198, Cartismo, cartistas 13, 195-207,
199 248, 267, 268, 273, 280, 281-285,
e os motins de 1791 34,153,154- 188
160, 205, 207, 247, 250, 267, Católicos romanos
269,271,274,280,282, 288 ver também motins Gordon, An-
ver também " Igreja e rei", Pris- tipapistas 35,61,147, 223
tley. Cavaignac, Eugène 189-190

294 295
Champanhe 24, 28,30,109,185 Gardes Françaises 101, 104, 107, Kennington Common (Londres) Lyon 128,134,150, 258
Chartres 116,117,121 285-286 198
Chester, Cheshire 84, 91, 93, 201, Glasgow 200 Kent 163,165, 261 M
203 Gloucester, Gloucestershire 36,41,
Chevalier, Louis 215, 219 45, 75,165 L McDouall, dr. Peter 196, 204
Cidade de Londres 53, 55, 61, 65, Gordon, lorde George 61, 62, 66, Maillard, Stanislas 224, 262, 268,
81,83,95,158,220,223,238,247, 223, 259, 266, 267 Labrousse, C.E. 21 269
288 Gordon, motins 62, 205, 250 La Chapelle (Paris) 179,192 Manchester, 70, 83, 90,153, 258
Club des cordeliers 138,139,216,239 Gossez, Rémi 191, 219 Lafayette, marquês de 275,283 e os massacres "Peterloo" 83,
Clube de Fita Verde 34 Grande Medo (Grande Peur) 5,109 Lamartine, Alphonse 185 241, 274, 283
Comissão de Luxemburgo 185,187 Grenoble, 23,108,116 Lancashire 88,93,196,203, 241 e os motins de 1792153-154,247
Compagnonnages 134,138,264 Greves, ver disputas trabalhistas, Le Bon, Gustave 1,8 ,1 2 , 214 e o Cartismo 199, 200-203, 204
Complô aristocrático 109, 249 Ludismo Le Chapelier, lei de 139,141 Mantes 22,28
Comuna de Paris 6,107,112,137, Guarda Móvel 190,191, 283, 286 Marat, Jean-Paul 5,138,251
Ledru-Rollin, Alexandre 183,187,
140-142,148, 224, 276 Guarda Nacional 111, 112, 121, 266 Marselha 116,150
Convenção Nacional 111,125,127, 122,125,137,216,224, 262, 264, Marx, Karl 7,181,197, 231, 243
Leeds 35,91, 200
142,153, 238, 247,275 275 Lefebvre, Georges 5,255 Massacres de setembro 245, 272,
Cornwall 37,38,41,46,69,226,234 Guérin, Daniel 143, 213 275-6
Leicester, Leicestershire 84, 85,
Corvéia 20 Guerra das farinhas, ver motins dos Mathiez, A. 128
167, 203
Courtenay, sir William 163-164, cereais "M ês Sagrado" 199
250 Lei do Gim 247
Guizot, François 181 Lei dos Pobres 3, 34,175,196-197 Métayers, 21
Coventry 96,159 Michelet, Jules 5, 211,227
Croquants 19 Lei das Milícias 34,35
H-I Lei dos Cereais 34,83,178,242 Middlesex 59,234
Leis dos Motins 72,284 Middleton 89,90
D- E- F Halévy, E. 165 Leis Tudor 46,81 Motins da fome 38, 258
Hammond, J.L. 164 Liga Contra as Leis dos Cereais Motins dos cereais 37,236,273,274
Derby, Derbyshire 84, 87, 258 Hampshire, 41, 43 178,197, 204 M otins, ver também Gordon,
Destruição de máquinas, ver Dis­ e os motins "Swing" 164, 283 "Liberdades" saxônicas 248 "Plug-Plot", Porteous, Rebeca,
putas trabalhistas Hanley, Staffordshire 203,205,206 Liverpool 72,90 Réveillon, Sadieverell, "Swing",
Devonshire 41, 46, 75 Harney, Julian 197,203 Londres 4 Wilkitas
Disputas trabalhistas 4, 256,267 Hébert, Jacques-René 129,141,224 e ós motins urbanos do século Movimentos milenaristas 242,249,
Dissidentes protestantes 152,154, X VIII34, 49-50, 236 273
Hereford 35,167
156-158,159,169, 250, 288 e os motins de 1736 35,53,54-57 Multidfies, como "turbas", canai-
Hobsbawm, Eric J. 5, 65,136,151
Dorchester, Dorset 165, 271 e "Wilkes e Liberdade" 34, 59, lle, etc. 5,37, 211,214, 23^ 234
Hôtel de Ville (Paris) 105,183,256,
Doyle, John 79, 80, 270 238 como "o povo" 7, 211
263, 267
Huddersfield 83, 91, 93, 95, 203 e os motins Gordon 62,63, 237 na História 3-4
Edimburgo 36, 61, 274 e os motins do princípio do sé­ na sociedade pré-industrial 6,
Enragés 127,129 culo XIX 83,163
Igreja Anglicana (conservadora) 13-14,159,213, 244
Espanha 148 e as disputas trabalhistas do sé­ na sociedade industrial 3,5,252
ou High Church 34,53,232, 250
Estados Gerais 99, 102, 103, 238, culo XVm 69, 70, 256 comportamento das 3, 255-276
"Igreja e rei" 66,147-160, 247
249 e o Cartismo 195,196,199 composição das 220-226
ver também Birmingham, Bruxe­
las, Nápoles, Priestley, Vendéia Loveless, George 241, 271 forma de açâo das 256-260
Faubourg St. Antoine, 104, 112, Lovett, William 195,196 motivos e crenças das 231-253
íle de France 30,126
115,123,188,189,192, 216, 220, Ludd, Ned (Edward) 85, 90, 94, e o crime 214-220
Irlandeses 55,63, 220, 274, 287
251 268, 272 e líderes 265-270
ver também Paris e Joumées ver também Ludismo e organização 272
Faubourg St. Mareei 123,125, 220 J-K Ludismo, Luditas 74, 83-96, 245, e pânico 272
Fisiocratas, ver Turgot 273, 282 e violência 273-176
Fronda 19 Jacobinos, 7, 53,139,197, 247, 275
Luls XV, rei da França 20, 51,127, e forças armadas 281-287
Frost, John 199, 249, 268 Jacobitas 53,66, 232
244 e o apoio da classe média 287
Jones, Ernest 197, 281 Luls XVI, rei da França 6, 23,105,
Jorge III, rei da Inglaterra 59, 61,
G 66, 70, 75,147, 232
266 N- O
Luls Filipe, rei da França 136, 286,
Joumées, 101, 217, 226, 237 287
Garde mobile, ver Guarda móvel Nantes 116,149
ver também Paris

296 297
Nápoles 149,151, 243 e a revolução de fevereiro de S Trabalhadores assalariados, tra­
Necker, Jacques 102,105,136, 261 1848 182-185, 286
Newport, Monmouthshire 199, balhadores, m ovimento de tra­
e a insurreição de junho de 1848
268, 274 236-237,243 Sacheverell, motins 34 balhadores, 3, 37-38, 182, 190,
Norfolk 167 Parlements 9, 54, 245, 284 St. G eorge's Fields 4, 61 239
Normandia 24,109,148,185 Pembrokeshire 171-174 St. G erm ain-en-Lye 2 7 ,1 0 9 trabalhadores agrícolas 164-171
Normando, Jugo 248 ver também motins Rebeca Sans-culottes 1 0 1 ,1 1 1 , 289 carpinteiros 138, 264
Northamptorv Northamptonshire Perceval, Spencer 83,95 definição dos mineiros, mineiros do estanho
35,167 Picardia 24, 27,109. Shadwell (Londres) 72, 73, 274 36, 69, 75, 274
Norwich 35, 44, 46, 274 Place, Francis 195, 220 Sheffield 3 5 ,1 9 9 , 240 carregadores de carvão 70, 72-
Nottingham, Nottinghamshire 35, Place de Grève (Paris) 4,102,104 73, 274
"Plug-Plot", motins 199,201 Shoreditch (Londres) 53, 79, 81,
70,83,85,156, 280 tecelões, tecelões da seda, da lã,
ver também Cartismo 220
Pontoise, 27, 29,30,109 Sindicatos 3, 7 1 ,1 3 9 , 204, 264, 289 do algodão 85-88
a Connor, Feargus 197, 207
Oficinas nacionais 187 Porteous, motins 36, 274 v e r também Campagnonnages ceramistas e oleiros 204
Oldham, 201 Preços de alimentos 21, 22, 29,30- Smelser, N.J. 8, 212 ferroviários 193, 240
Oleiras, cidades 200, 204-7, 216, 31,36,4 3 ,6 5 ,8 4 Soboul, A . 212 marinheiros 70, 72
218, 265, 269,280 Pristley, dr. Joseph 34, 154-155, tosquiadores 91-92
259,280 Socialism o, socialistas 182, 196,
Orléans, orleanês 24,121,128 Tudor, leis, ver Leis Tudor 46.
ver também Birmingham e "Igre­ 270
Oxford, Oxfordshire 35,167,169 Turgot, A.-R. 23, 232, 282.
ja e rei" S o c ie d a d e C o rre s p o n d e n te de
Projeto de Reforma Londres, 153, 240 Tyburn, Tybum Fair 73, 220
P Tyneside 37, 69, 201
Pujol, Louis 188 Sociedade Lunar 1 5 2 ,1 5 7 ,1 5 8
Pacte de famine 244 Sociologia, sociólogos e a multidão
Paine, Thomas 240 R 7-9 V-W Y
Palais Royal 105,137, 269 Somerset 38, 75, 257
Paris Radicalismo, radicais 34, 240, 258 Valline, John 8 0 ,8 1 , 270
Southw ark (Londres) 57, 62, 63,
e os motins de cereais de 1775 Rebeca, motins 164,171-178, 245 Vendéia, 148 ,1 4 9 , 247
28, 46, 216 Rennes, 22 220
Speenhamland, sistema 46, 244 Versalhes 6, 263
e os motins urbanos do século Réveillon, motins (Paris) 104, 216,
232 Spitalfields (Londres) 35, 61, 75, e os motins de cereais de 1775
X V III49, 50-52, 236
e os motins Réveillon 103-104 Revolta aristocrática 101, 284 274 27-28
e a revolução de julho de 1789 Revoltas camponesas 3, 274 Staffordshire 38, 203 e outubro de 1789 108, 222, 281
105, 215, 216, 269 do Século XVII, 19 Stephens, rev. J.R 1 9 6 ,1 9 9 Viena 149
e outubro de 1789107, 261-262 do Século XVIII, 20-2 Voltaire, François-M arie A rouet
na Revolução Francesa, 108- Stepney (Londres) 76, 77
e a petição e “massacre" de ju­ 25, 232, 245-246
lho de 1791110, 256-257 110, 235, 238, 240, 246, 259, Stockport 89, 90, 200
e a derrubadá da monarquia 262-3, 266, 272, 274-5 Stoke-on-Trent 205, 259
Sussex, 1 6 5 ,1 6 7 Wakefield, E. Gibbon 164, 246, 260
111, 217, 275 ver também Vendéia
Revolução Francesa de 1789-9913, Walker, Thomas 153, 247-248
e a expulsão dos deputados gi- "S w in g ", motins 167, 268, 283
rondinos 111 99-122, 260 W alpole, sir Robert 54, 55
e os motins da fome 122-126, Revolução Industrial 3, 70, 74-75, W earm outh, R.W . 38
281 179 T W est Riding (Yorkshire) 35, 91
e a insurreição de setembro de Rheims 22,116 Whitechapel (Londres) 52
1793 129, 238 Robespierre, Maximilien 7, 127, Taine, H. 215, 249, 265, 276 Wilkes, John 12, 66, 236, 267, 281
e a insurreição de março-maio 212, 266, 267 Taxation populaire, 31, 3 8 ,1 0 8 ,1 2 6 , Wilkitas, motins; "W ilkes e Liber­
de 1795111, 239 Robson, L.L. 219, 225 193
Rochdale 89, 203 dade" 34, 59,
e a insurreição monarquista de Terceiro Estado (tiers état) 9 9 ,1 0 3 ,
Roma 149 Wiltshire 35, 42, 72, 75
outubro de 1795113, 275 212, 263
e as disputas trabalhistas do sé­ Rose, R.B. 38,157 e os motins "S w in g" 164, 273
Terray, abade 27 e o Cartismo 196
culo XVm 134 Rostow, W.W. 164, 237
Rouen 22,133,136,184 Terror branco 150 W orcester, W orcestershire 35, 41,
e as disputas trabalhistas de
1789-94 136-144, 235-236 Rousseau, J.J. 52 Tocqueville, Alexis de 21 ,1 8 2 ,1 8 9 , 42, 4 6 ,1 5 7
e os motins de 1832 181, 263 Roux, Jacques 127,129 193
Toulouse 2 3 ,1 0 8 Young, Arthur 1 0 3 ,1 3 6 , 239

296
299

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