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I&rat*Zolberg
Tr:*'dução
AoseÍN,agib KÍouit
I nu*r
ADMINISTRAÇÃO REGIONAL DO SENAC NO ESTADO DE SÀO PAULO
Presidente do Conselho Regional: Abram Szaiman Sumário
Diretor dà Departamentokegional: Luiz Francisco de Assis Salgado
Superintendente Llniuersitário: Luiz Carlos Dourado
p*õ: r.gsɧ"de ce1!q lsm,elo_49,_dl{91e_ntgs Tul4-qs-{9-?rter ndss A idéia de desagregar a obra de arte tentando contextualizá-la,
" conforme sugeri no capítulo 1, é
alores se envolvem no processo de criar arte de novo, incluindo e ex- por,urtoil"@
até mesmo os
cluindo obras d a cate g9! 1- po,r eigs lnesaqq _dq{intc!,-Ele afirma que_a chocur,te'pãu t-,.ritÀ" especialistas em estética' Pois' se
capazes de aceitar o
definição do que constitui arte é relativamente albif.44i44§rcrylgAlo sociólogos decididamente predispostos à arte são
.t"is?;-coúeítát".*f-a. q"" art q*rfidades estéticas inerente à leitosocialemqueelajaz,esseenfoqueéesdrúxuloàorientaçãodisci-
oIiã ü-ã a-u, i*pÍi.rÇõã d"tte ula"*ã plinardaestéticatradicional.Nãoqueelesdivirjamabsolutamente
""G""ãpàiã- "áq""
singularidade e do gênio do artista individual. dos teóricos sociais, mas, enquanto a ciência social
repousa em base
como parte de urn processo,2 é bem mais provável tratar-se de uma simplisticamente, a arte a transações financeiras ou a armas políticas,
d9
estratégia de análise sociológica do que estética.3 eles admitem o fato de que a1llgl1o*est1g*:-Lt9g1de119ões-
mercado, que pode estar carregada d-e-i1t91e=sses f9fílit".t-"ttutuil il:
te."rci""ris nacionais, íe um lado, ou acadêmico-institucionais, -em
John Berger, Ways of Seeúzg (Londres: Penguin, 1981); e Arthur C. Danto, The Philosophical " segundo se deduz
DiserLfranchisement of Art (Nova York: Columbia University Press, 1986). a-Ãuitr Àaãi" ;;p"a;".'o, q-9 o-utr-o, linalmente,
Abordagens desse tipo são explicítamente examinadas por Hugh D. Duncan, Language
and Literature h Society (Chicago: University of Chicago Press, 1953); e por M. C. Albrecht
e outros em sua análise institucional The Sociology oJ Art and Literature: a Render (Nova
York: Praeger, L970), para citar apenas duas, e que, de um modo ou de outro, tratam de Gladys Engel Lang & Kurt
muitas formas de arte- Delas fazem parte também Wendy Griswold, Renaissance Reoiusls: Boston," em Media, Culttfte and society, n, 4, 7982, pp. 33 50; e
and Renown: the ôurvival of Artistic Reputations"' em American lounnl
City Cometly and Reoenge Tragedy in the London Theatre, 1576-1980 (Chicago: University of Lang, "Recogrrition
Chicago Press, 1986); Paul J. DiMaggio, "Cultural Entrepreneurship ln 19th Century of Sàciology, n" 94, julho de 1988, pp' 79-109'
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;
Para uma sociologia das artes O objeto de arte como processo social
de Bourdieu, a recepção da arte em si é um fenômeno plural, que se Artistas singulares, obras singulares
tradr]z na rrmanênit.ec.irçío?us .b.r, d" ,rt" , .ãai."tJi*'ru.
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736 737
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:T rbrr"S"* dtfur"r . As obras literárias ou cado pode parecer trivial (do ponto de vista estético), contudo tem
àilf*-o."utiru. up"t-,as parcialmente nesses f." "lrt"d" d"
t"."-ror sido uma medida razoavelmente constante e relativamente estável em-
su" esT."t"ra antrín;;;;-"t - ""r-sie pr. rir*ãi*i+ pregada pelos participantes do mercado de arte, sobretudo para as
Eeie
que também thes emprestam uma boa parte de seu valor sociaf incluin-
' obras de rotina que dominam as transações desse mercado.e
138 139
Para uma sociologia das artes O objeto de arte como Processo social
enobreceu as pinturas em um patamar acima dos objetos, cujas virfu- Múltiplos, reproduções, cópias: negociando
des maiores eram os materiais nobres, a perícia e a engenhosidade o valor artístico
neles empregados".tt
Além do fato de ser o nome do artista a dar valor a qualquer
Essas considerações foram desafiadas pelos artistas de vanguar-
conglomerado de matéria, ou do fato de que em geral os marchands
da desde o princípio do século XX e, para alguns intelectuais, acaba-
colocam preços mais altos Para,obras maiores do que para as meno-
ram sendo forâneas à avaliação da obra em si (capítulo 5). Elas conti-
,"r, o pàUt"-ã dã êiE§üIãriõad{ em si tem sido uma questão cadavez
nuam, todavia, a influenciar o valor monetário da obra de arte, como
mais cõffiãiãêTiseüãíéI. úiil de seus aspectos tem que ver com a
mostram as trilhas que deixaram na hierarquia de valor que veio a ser
copiagem ilícita ou a falsificação das obras de arte. Muito mais sutii é o
estabelecida graças ao empenho do rnercado de arte. Os componentes
p"-.igo para a singularidade e a qr.iginalidade quando as obras são, por
básicos do valor social incluem, prirneiramente, a designação do nome
sua própria,nature/a, múltiplgt/ não tendo, portanto, o atributo da
de um criador para a obra e, em segundo iugar, o valor dos materiais
singularidade. Ôs múlãplôíãío ao mesmo tempo uma bêl:T
de que é feita (tintas a óleo, pincéis de qualidade, telas preparadas; "_:m;r
arneaça ao artista e ao próprio mercado de arte. De um lado, abriram
pedras raras ou cuidadosamente: escoihidas ou outros materiais ca-
ros).12 Em geral, desenhos e aquarelas sobre papel continuam sendo
, ;["iulià J;ãã á;;;i;i ;; ;ãü;; *, À;ãó ." t-,
oi * *.t,u.,aí
menos custosos do que pinturas a óleo, ainda que feitos pelo mesmo
,Í91t1T 111qa@4; à"'Àã' -é'*;; ;-,'A;ã;d" ô"úi,.-o*"-
primentos de arte .o" ot p."' , ã-*
artista,l3 modelagens em gesso menos do que trabalhos feitos em már- ", "*iit,
tência;os múltiptôs .ãtiae com os significados simbóiicos atribuídos
more ou bronze. Isso valeria até para obras dos grandes artistas da
à arte. Por força disso, embora os múltiplos acabassem sobejando no
Renascença, como Leonardo, cujos desenhos são extremamente valio-
domínio da arte, sua legitimidade se alterou em graus variados. Entre-
sos, pois praticamente não tem havido trabalhos dele em outros meios
tanto, sua posição se ajustou com razoável intimidade a uma hierar-
à disposição do mercado em mais de uma década, e a probabilidade é
quia criada de valor simbóIico e econômico.
que não haja no futuro. Mas esses não são critérios absolutos, como
inclicam as modernas possibilidades de cluplicação de obras de arte. Uma vez que desafia o mito da mão do artista, essa análise não
só se apiica à arte bidimensional, ou visual, como também a qualquer
obra que possa ser copiada com exatidão. Na.-e-scultuq"* virtude da
prática de muitos artistas de fazer pequenas(qnaquetes, jue são poste-
riormente duplicadas no tamanho desejado nasTuilfições ou cinzela-
das por cortadores de pedra, 9_1spe9!9 mão do a;1!.tt":P3ll,_9y_E
1.,
11
Nicholas Faith, Solúi: the Reaolution in the Art Market (Londres: Hodder and Stoughton, ll§alq Pt?-!t",Tjgo. Embora tal prática fosse corrente no século XIX,
L987), pp.29-30 e 85-95. Mencione-se de passagem que a receita Íederal dos Estados
Unidos permitiu durante décadas que colecionadores de arte deduzissem de sua receita
nos últimos tempos ela se radicalizou entre certos escultores moder-
bruta o valor estimado de mercado de pinfuras doadas a museus, independentemente do nos, que simplesmente dão instruções por escrito Para seus trabalhos
preço pago por elas; em contrapartida, os artistas que doassem suas obras só podiam
deduzir o custo dos materiais empregados!
(minimalistas sobretudo) serem construídos em oficinas. Em casos
'2 Joseph Alsop, The Rare Art Traditiolls, cit.; Raymond Moulin, The French Art Market, cil.; como esses, Presume-se que o artista tanto concebe a idéia quanto
John Berger, Ways of Seeing, cit., capitulo 5.
supervisiona o trabalho, ou pelo menos lhe dá os toques de acaba-
'3 Ralmond Moulin, The French Art Market, cit.
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Para uma sociologia das artes O objeto de arte como processo social
mento e, claro, sua assinatura. Mas as coisas assumem um aspecto Esse princípio é embutido no valor de mercado das obras de arte, em
diferente quando outros criam e recriam obras após a morte do artista. proporção direta à proximidade da obra com seu único criador: obras
Embora os escultores possam criar a form4 eles não podem supervisio- de arte cuja superfície tenha sido diretamente tocada pela mão do ar-
nar os moldes postumamente.la tista, como pinturas a óleo, desenhos e aquarelas, são m_aig.valio-111dq
. que aage-cUjo meio$qixa-o artjsta relatjvamente distantê. Xilogravuias;.,,
No extremo (a arte de múltiplos estào os objetos de produção '
i\' gravuras,-águâs-fortesi litografias, serigrafias e, mais' fecentemente;
gm TasJ q filmesf estatuetas chinesá{<alçõe;l qüe os"estetaile
trmbérÁ fotbgrafias co;"reêpõnãem a-uma crescente distância e, em
estudiosos jul§am esiàr além de seüs-limites e, portanto, indignos de
geral, à lràiliâ'ção-díécnicos especializados entre o artista e a obra
discussão. Até recentemente havia amplo consenso em torno da hie-
acaDaqa.
rarquia artística de valor, no qual a arte dos mei_os de_lgarylTgg i"
rylle q1e !,ry,|-Sgryf p3lr o s'g*{lg4: 991". até a criação da Esse princípio explica por que a fotografia e o eventual reclamo
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u p- qg_Eje nt e q ge d e_{!ni ç ô.. : _q-e_qggo J 9 !l r tg
s. E m b o r a de seus praticantes por aceitação social como artistas suscitaram cons-
muitos-estêfã§:1t'ôQressem rejeitado tal arte como indigna de análise, ternação,po arte. Na competição direta com a pintura de
{.!.Valter Benjamin exp.Jôrou as implicações dos valores estéticos atribuí- retrato, { fotografia gra vista mais como um produto da tecnologia do
dos à arte quándõ reprodüãIda em lar§a escaláIiCon eçando com sua q em vez de um artista. Seu
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Y-
Para uma sociologia das artes O objeto de arte como processo social
telas. Em seguida, associam a esses atributos critérios específicos do como em qualidades formais, à pintura acadêmica ou ligando-q u u4"
meio utilizado no múltiplo em questão. Isso geralmente implica dar de vanguarda. Stieglitz fez as duas coisas, sucessivamente. Hoje, a fo-
um valor mais alto a um estado inicial do que a um posterior, sob a tografia conquistou a indumentária institucional e a longinqüidade
alegação de que os estados iniciais são mais distintos em aparência do estética de uma forma de arte perfeitamente aceita.
que os posteriores.
As presunções de singularidade e de criação unitária foram, por-
A quálidade de distinção, embora tenha sido mais recentemente tanto, questionadas, embora em diferentes graus de intensidade, cle-
contestada por artistas, veio a ser avocada como o cânone de estética e pendendo da estrutura estética da forma de arte envolvida. Em gerai se
a perfeição técnica, como o oposto de estados posterioret que mos- supõe que poetas e romancistas e pintores e escultores trabalhem indivi-
tram sinais de desgaste ou parecem fenecidos, pelo menos para os dualmente na criação de suas obras, embora haja casos questionáveis a
especialistas. Embora esses percebam diferenças de qualidade em for- indicar que isso é simplificar demais uma atividade muito mais de cola-
mas tais como a xilogravura, pode-se argumentar que a questão é menos boração do que se acredita. No mínimo, como no caso do romancista
a de assegurar clareza de linha do que ter uma obra mais próxima da Thomas Wolfe, um editor pode ter um papel significativo na criação de
mão do artista e limitar o número de cópias. Isso se fundamenta no romances. Além disso, muitas pinturas foram feitas por grupos de apren-
fato de que a preferência por um estado inicial continua a ser usada dLes e assistentes, sob a supervisão do "renomado" artista.
como critério, muito embora os avanços tecnológicos nos recentes
processos fotográficos tenham reduzido consideravelmente as diferen-
A idéia de criação unitária, no caso de uma obra dramática ou
musical, contém a ambigüidade intrínseca de ser, no mínimo, refrata-
ças de um estado para outro. Embora os processos tecnológicos que
permitem a duplicação de imagens ou estátuas em números relativa- da através da lente de um intérprete.re De fato, muitas dessas obras
mente grandes tenham uma longa história, sua expiosão nos séculos requerem mais do que um único intérprete, um solista instrumental
XIX e XX criou problemas não apenas de autenticação entre obras ge- ou ator, para sua apresentação. Podem comprometer um grande nú-
nuínas e cópias, mas tambérn"d-e redefinição das obras de arte em si. mero de músicos ou mesmo todo um grupo de atores, além de dire-
tor, produtor e técnicos de cena. Quando se trata de gravações, rádio,
Nesse se.,tido,(u' rJtog.#ir'] aparentemente teria pouco que ver televisão, cinema e outros meios de transmissão ou reprodução, os
com o valor material bãseado-ém materiais preciosos. Mas, como to; nirmeros envolvidos alrmentam consideravelmente, porque tais mídias
das as outras formas de arte, ela também tem uma história de constru- exigem o complemento criativo e interpretativo de atores e de muitos
Çãã dõ^lor-{ s- outros participantes - verdadeiros times de trabalhadores relativamente
sava aos apreciadores de engenhocas, a fotografia torn ou-se um especializados, muitos dos quais, não todos por certo, se consideram e
passatempo para abastados e um ganha-pão d" psgrg4rs çq*qçtq - são reconhecidos como artistas, ou pelo menos artesãos especializados
tes, quãtdesde , ."-"õ, pare_elo- em seus setores.2o
m9m m9j!9,4N1 gglqlrqr "@cliçg
4e-s-:rqjtlslóLia,-entretanto, .certos Íotogt a-
fos tentaram transformá-la numa arte, associando-a, tanto em conteúdo
'e Embora alguns considerem o papel interpretativo como menos original do que o de um
compositor ou escritor, vale notar que Simmel toma o intérprete musical ou o ator como
18 Pierre Bourclieu et al., Un art moyen: essai sur les usages sociaux de la photographie (Paris.. um artista sério.
Editions de Minuit, 1965).
'?o Um indício dessa identificação de trabalhadores artísticos como artistas/artesãos e que
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Para uma sociologia das artes O objeto de arte como processo social
A despeito da óbvia multiplicidade de criadores cooperativos, os Apesar de a idéia de obras genuinamente originais ter sido às
críticos, no intuito de valorizar uma obra, tendem a buscar e imputar vezes valorizada (por exemplo, pedaços da Verdadeira Cruz e outras
responsabilidade por sua criação a um único indivíduo, às vezes post relíquias), cópias de obras de arte eram, já avançado o século XIX, qua-
factum. Dependendo da forma de arte, o artista indigitado pode ser o se tão aceitáveis quanto os originais. Muitos museus entesouravam
diretor do filme, o diretor musical da ópera, o regente da orquestra, o rotineiramente cópias de pinturas a óleo, modelagens em gesso de es-
encenador ou o escritor teatral, conforme o caso. A menos que um culturas clássicas, e abastados amantes da arte e colecionadores cosfu-
criador individivual plausível seja encont\ado ou designado, paira mavam encomendar a artistas cópias de pinturas. Conforme Paul
dúvida sobre a condição da pbra como arte. DiMaggio revela em seu estudo do Museu de Belas-Artes em Bostory
somente no começo do século XX é que as modelagens em gesso per-
Exemplos desse aspecto de designação de obras como "arte" sáo
deram legitimidade como peÇas de exibição em museu.22 A história da
numerosos e antecedem ao crescimento da reprodução mecânica da
l.lrs,fl*Çã"l"f"efa6Sinauçd
5 | r da arte mostra que
arte, como no cinema. Por exemplo, os marchands buscaram o auxí- .1 ' ( ""jI "r;r.d..*"*.t
_'_,__ __ I',
os requisitos de genuinidade e singularidade con\o critérios de valor
lio de especialistas para ajudar a dar nomes a pinturas cujo criador era
artístico não são fixos, mas negociáveis segundo o interesse de atores,
desconhecido. Duveen e Berenson formaram uma das mais famosas e
como parte de um processo social que envolve a introdução de novos
bem-sucedidas duplas marchand/connoisseur. Bernard Berenson de-
raciocínios; nesse caso, a noção romântica do artista cujo toque único
veu muito de seu sucesso à habilidade de atribuir nomes plausíveis de
faz com que a obra irradie a aura de seu criador.
artistas a obras anônimas. Mesmo quando não conseguia encontrar
nenhum nome específico de artista, Berenson afirmava discernir se- Como o valor de mercado de uma obra depende muito de ser
melhanças estilísticas entre obras anônimas de artistas aescor',heciãos, ela conÍiavelmente atribuída a S11 r!lper!?!Le_a{ig!q lCso deu ensej
enselo/
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E torl Se as-õbtas-Íossem;Í- no passado como agora, a uma.lindústria de falsifi.jÇrq Eliminar frau-
i[ããei.amente ãã;ôÀelú"t"t ãt a" q"rlq""r artista conhecido, mas des é uma importante ocupação.dos colecionadores, uma vez qgg_os
illestimeltos finanreirnq
inrzecfimenfnq qão altnq
altos. TambÍT
Temhám é ilgo.tante aAEzulg-
partilhassem entre si certô número de aspectos estilísticos comuns, ele fina4ceiros são ( imnnrfanfe lrenrrfa-
criava um artista, tal como 'lMestre de (o nome de uma cidade)" ou t-j.lS:o".iur4tr{, .o*giãr?gg§. g" uí" F§lstorirao."i'a" *t5[.
l
Professor de (o nome de um conhecido pintor)".21 Paradoxalmente, entretanto, a tentativa de faldificação pode agregaY
valor e, por isso, uma aura adicional ao artista, pois significa que sua
obra merece tal empenho.
muitos de seus sindicatos são chamados de guildas. Por exemplo, o Writer's Cuild inclui E, como a descoberta de uma falsificação ou, mais inocentemen-
empregados que não são escritores de criação artística, mas pesquisadores, cujos textos
são extremamente úteis, e que não são responsáveis por um produto acabado, mas operam te, de uma atribuição equivocada pode levar tempo, a contrafação con-
dentro de uma divisão complexa de trabalho no seio de organizações burocraticamente tinua sendo uma empreitada lucrativa.23
estruturadas.
?1 A idéia de um nome ou de um "nome de marca" veio, nos tempos modernos, a ser
representada por uma assinâtura agregada também ao desenho de moda - ver Pierre
2 Paul J. DiMaggio, "Cultural Entrepreneurship in 19th Century Boston", cit., e "Classification
Bourdieu & Yvette Delsaut, "Le couturier et as griffe: contributions à une théorie de Ia
magie", em Actes cle la Recherche en Sciences Sociales, no 1, janeiro de 1975. No caso de obras in Art", em American Sociologícal Reaiew, n" 52, agosto de 1987, pp.440-455.
D Por exemplo, um importante colecionador de desenhos renascentistas, Ian Woodner, fez
reproduzidas mecanicamente, a atribuição de valor é mais complexa. Está sujeita a alg'um
debate, conforme sugeri, uma vez que é verdadeiramente diÍícil apôntar responsabilidade sua primeira aquisição em 1959 do que acabou se revelando um falso Rafael. Somente
única a obras de fatura coletiva. depois dê cinco anos é que a contrafação foi descoberta pelo Museu Britânico, quando o
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Para uma sociologia das artes O objeto de arte como processo social
guias verdes. Entre as seleções de três estrelas está a pintura num inteiramente à mostra durante quatro séculos e meio, dizia-se que
retábulo de altar, um políptico, conhecida corr.o O ]uízo Final, de Rogier quase nada fora publicado a seu respeito, até sua casual redescoberta,
Van der Weyden. Localizada na cidade duas estrelas de Beaune, na quando foi milagrosamente resgatado de séculos de sujeira acumula-
região de Burgundy, a pintura é o principal ornamento do complexo da e camadas de pintura por um jovem profissional da arte que por
Hôtel-Dieu de duas estrelas. Fundado ern 7443, funcionando como acaso passava pela cidade.30
hospital desde 1971 e ainda usado como casa de repouso para idosos,
o albergue é agora basicamente um lugar "digno de uma visita ou até Cerca de quarenta anos mais tarde (final do século XIX), em seu
de um desvio de rota". O retábulo de altar foi removido para uma sala livro sobre a obra, o padre Boudrot o capelão do hospital, abre sua
especialmente construída em seu museu de uma estrela,2s e continua narrativa com o relato daquela redescoberta, citando extensamente
sendo a única atração de três estrelas da cidade. uma carta que lhe fora escrita pelo descobridor, o agora (maduro) pre-
sidente da Comissão de Antiguidade da região. Recordando como fi-
Talvez sem isso o turismo florescesse de qualquer modo. Afinal
cara espantado ao encontrar uma obra tão magnífica (à época, atribuí-
de contas, Burgundy e justamente renomada por seu vinho e culiná-
da a Van Eyck), ele repete o próprio julgamento a respeito do valor da
ria; do ponto de vista histórico, Beaune teve importância política como
peça. Na declaração do antiquário, fica claro que ele se refere ao valor
sede dos duques de Burgundy; do ponto de vista arquitetônico, o ca- monetário. É história, conforme contada pelo padre Boudrot, que
ráter da cidade foi cuidadosamente preservado, melhorado ou restau- "mu
durante muito tempo foi iida como um relato preciso, sendo ainda
rado. Nas palavras dos redatores do Michelin, "visitar os vinhedos é o hoje usada nos textos dos guias turísticos. Entretanto, Akrich lança
complemento indispensável de uma visita a Beaune: os amantes da dúvidas a respeito dessa história, mostrando qlle a obra não era tão
arte e os apreciadores do bom vinho ficarão igualmente satisfeitos".2e desconhecida como afirmavam seus "redescobridores". Ela argumen-
Desse modo, parece que a cidade tem tudo a ganhar explorando os ta gue o próprir: processo de mitificação exige que milagres e mistérios
dois aspectos, a vinicultura e a cultura. se incorporem à arte como elemento essencial de soerguimento de va-
ior. O que a "descoberta" do retábulo conseguiu fazer foi despertar a
Madeleine Akrich Ievanta questões a respeito de como o retábulo
atenção de outros especialistas em arte, que passaram a escrever a res-
ganhou importância e valor, Ao respondê-las, ela reapresenta a obra,
peito de sua atribuição, iconografia e valor estético.
mostrando a cada vez sua transformação por meio dos olhos de outro
indivíduo ou grupo, sempre no contexto de seus interesses, sejam eles 'I'alvez não seja surpresa, mas o resultado do reconhecimento do
basicamente ideológicos, estéticos e econômicos, sejam parte do ufa- suposto valor da obra foi que alguns funcionários do hospital começa-
nismo cívico. Graças a essa estratégia rashomônica, ela nos obriga a ram a falar em vender o retábulo, a fim de melhorar as condições
reexaminar nossas concepções de grandeza artística à luz de sua cria- orçamentárias da instituição, mas encontraram resistência. No con-
ção, de sua recriação mitificada e das conseqüentes modificações da texto do renascimento religioso de meados do século, e levado pelo
obra, tanto físicas, mediante restauração, quanto simbólicas, aplican- desejo de realçar o caráter religioso-caritativo da instituição, o padre
do-se a ela novos discursos. Assim, embora o retábulo tivesse ficado Bouclrot liderou a facção religiosa que pretendia conservar o retábulo
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Para uma sociologia das artes I O objeto de arte como processo social
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Mas as releituras da obra não pararam. No século XX, graças à do Akrich, parecem ter sido as forças ligadas ao comércio, isto é, os
crescente influência da medicina tecnocrática e aos financiamentos do empresários de Beaune. Eles mostraram que entenderam o público de
Estado previdencial (Welfare State), a secular predominância das or- um modo congruente com o que Bourdieu e Darbel36 revelaram em
dens caritativas de freiras, cada vez mais debilitadas pelo declínio de seu estudo sobre os museus públicos. Usando seu conhecimento de
vocações e pela insuficiência dos recursos disponibilizados por funda- marketing, os comerciantes de vinho conseguiram transformar uma
ções benemerentes, chegou ao fim. Em Beaune, como alhures, cons- pinhrra esotérica, originalmente destinada a glorificar a religião e seus
truiu-se um novo hospital e transformou-se o antigo numa instituição mecenas e a atemorizat os moribundos para que se arrependessem,
menor. Se antes a instituição servira de centro para atividades religio- numa obra de "absoluta beleza" para motoristas exaustos e suas famí-
saq festivais até, agora a vida em Beaune passava a se concentrar nas lias famintas.
atividades de cunho sobretudo econômico do mercado de vinho.3s
Em outras palavras, em vez de ver o quadro como vinho velho
Nesse entretempo, a questão do status do retábulo voltou à bai- repetidas vezes despejado em garrafas novas, é importante lembrar
la. Durante a Segunda Guerra Mundial houve um processo de negocia- qtre o próprio vinho não permanece inalterado. No processo de enve-
ções em que os grupos divergeítes pelejaram para impor à obra a lhecimento, ele pode melhorar e se tornar mais valioso, ou pode dete-
definição de sua preferência. Finalmente, dois pontos de vista predo- riorar-se. Não obstante a definição, §ua qualidade é um juízo negocia-
minaram: o da Alta Comissão para Monumentos Históricos, uma agên- do e um gosto adquirido junto a uma série de atores sociais ern
cia federal, que pugnava por uma renovação historicamente fiel; e o constante mudança.
dos administradores locais do Hôtel-Dieu, que, com o término de seu
Pelos critérios dos historiadores cle arte, connaisseurs ou estetag o
efetivo funcionamento como hospitaf buscavam usos alternativos para
os edifícios. A idéia de aumentar sua atratividade para os turistas sur- estudo de Akrich é um fracasso, porque a autora não vê a obra de arte
giu como um movimento geral da comunidade cada vez mais afluen- por seus próprios méritos. Sua descrição do políptico é tão vaga que
te. Isso implicava colocaÍ a obra num novo local, supostamente para não fica claro quantos painéis o compõem, em quais lados estão os
mantê-la em melhor estado. de conservação/ mas ao custo de eliminar retratos dos doadores, que cores foram usadas pelo pintor e uma série
seu contexto funcional. de outras informações que são a moeda corrente dos profissionais da
arte. Do ponto de vista da sociologia, entretanto, a análise de Akrich é
Numa controvérsia qLre durou anos, com posições e alianças se notável. Sua força está na análise perceptiva que oferece dos momen-
alternando, os atores com objetivos pessoais e interesses atribuíveis a tos históricos decisivos por meio dos quais essa peça se tornou uma
suas posições ou a grupos que representavam batalharam em torno oeLz)re d'art. Segundo suas palavraE "o objeto e as redes em que está
da questão durante sucessivas administrações. Os vencedores, segun- situado são indissociáveis [...] pois vimos, por meio dessa relativa
construção de um absoluto, a construção simultânea do objeto e
das redes"-37
monumentos religiosos, incluindo santuários ou crucifixos gigantes, foram construidos,
mormente em lugares altos, para que fossem vistos das cidades circunvizinhas ou usados
como metas de jornada por peregrinos.
s De acordo com Frank J. Prial, o colunista de vinho do Neru York Tintes, a instituição é s Pierre Bourdieu & Alain Darbel, L'amour et l'srt: le musée et son public (Paris: Éditions de
proprietária de cerca de 140 acres de vinhedos, doados à caridade ao longo dos séculos,
Minuit, 1969).
e que produzem valiosos vinhos borgonha (New York Times,30-11-1988). 37
Madeleine Akrich, "Le jugement demier", cit., p.277.
754 155
Para uma sociologia das artes O objeto de arte como processo social
O resultado líquido desse estudo é desmistificar explicitamente no conflito. Sem detalhar a controvérsia estética que cercou a seleção
os passos que compõem os processos sociais de revalorização e que do projeto vencedor, minimalista, compreendendo uma parede negra
transformam coisas em obras de arte. Longe de ser um absoluto de e sem adornos, composta de dois segmentos em ângulo obfuso, os
perfeição desde o começo, a miraculosa emanação de um gênio artís- autores assinalam que seu desenho (selecionado entre 1.400 projetos)
tico, é no "1uízo final" da sociedade que O Juízo Final obtém sua repu- foi veementemente contestado. Depois de muita discussão, errrbora o
tação. Na verdade, implicita em seu relato está a idéia de que se trata monumento básico tenha sido aceito sem quaisquer modificaçôes
apenas do "mais recente" julgamento em uma cadeia de reavaliações. óbvias, outra obra, as estátuas de três integrantes das forças armadas,
feita por um escultor em estilo figurativo, foi colocada nas vizinhan-
ças, embora fora de visão da parede.3e Por fim, sobre um mastro lon-
E pluribus unum ou EÍ uno plures? go, colocou-se a bandeira norte-americana, para completar o conjunto.
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Para uma sociologia das artes O objeto de arte como processo social
guerra, a primeiÍa questão era compreender por que afinal se ergueria lítica conservadora. Segundo, e de modo inesperado, o comportamento
um monumento. Costumeiramente, um monumento se presta para dos visitantes em relação ao monumento altera sua aparência todos os
lembrar um glorioso evento/ mas nesse caso havia pouco a ser lembra- dias, assunto a que retornarei. Os autores mostram como o conjunto,
do, exceto por aqueles cujos filhos, esposos, arnigos e amantes hou- em seu todo, consegue expressar "ao mesmo tempo a unidade e as
vessem sido mortos.ao Com base nas transcrições publicadas dos de- contradições da sociedade"al - a persistente ambivalência acerca de
bates na Comissão de Belas-Artes do Congresso, os pesquisadores um passado ainda doloroso. Em contraste com o que Durkheim e a
sugerem que o monumento foi especificamente destinado a reunificar oratória oficial reivindicaram no passado e com o que Robert N. Bellah
o país, dilacerado pelas dissensões em torno da legitimidade do assinalou em sua análise da religião civil,a2 os autores asseveram que a
envolvimento dos Estados lJnidos no conflito e pela derrota que a na- memória coletiva não há de provir apenas do passado tido como posi-
ção sofrera. Buscou-se um meio de Íazer isso ao mesmo tempo que se tivo, mas daquele "aspecto que melhor articula as opiniões e preocu-
tentou atenuar o acontecimento em si. Para tanto, a comissão adotou a pações do presente".a3
estratégia incomum de excluir qualquer conteúdo político explícito :
da concepção da obra, mas eigiu que ela incluísse a lista de todos os A par do exegético, conforme indiquei, os autores analisam tam-
:!
mortos. Fixado esse objetivo, pareceu sensato que a comissão selecio- bém o comportamento dos visitantes. Eles notam que, numa cidade
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nasse um desenho abstrato, situasse o monumento em um local no- com tantos monumentos, esse memorial atrai enormes multidões de
bre, porém quase subterrâneo, em uma posição discreta em relação a amigos/ familiares e turistas em geral, o que o torna um dos locais
outros menos controvertidos. mais populares. Antes de ser definida como um objeto estético, a pa-
Íede evoca emoção e convida a oferendas, mementos, mensagens es-
O monumento não é apenas uma parede negra coberta de no- critas, como se fora um local de peregrinação religiosa.aa De fatq pare-
mes. Dois acréscimos significativos mudaram seu caráter, como assi- ce que a parede com os nomes dos mortos atrai muito mais atenção e
nalam wagner-Pacifici e schwartz. Primeiro, em consonância com a devoção do que as estátuas. Se a interpretação dos autores é correta,
composição pluralística da nação e com as diferenças de atitude em então o memorial está obtendo o sucesso pretendido por seus mentores,
relação ao conflito, o resultado do concurso foi contestado com êxito, pois chama a atenção para o sofrimento individual das pessoas, em
e, graças a um compromisso, as estáfuas figurativas e a bandeira fo- vez de fazê-lo para o término inglório de uma guerra impopular. E
ram colocadas no luga4 a fim de satisfazer as objeções da opinião po_ mais, representa a própria nação, composta por aqueles que, como as
partes díspares do monumento, "permanecem juntos sem se tocat".as
4 Interessante notar que talvez a g,erra ig,almente impopular da Coréia, em que perto de
seis milhões de soldados estiveram envolvidos durante sua curta (três anos) durafão, teve
quase o mesmo saldo de mortos que a Guerra do vietnã (57 mil). Todavia, como assinalou atRobin Wagner-Pacifici & Barry Schwarz, "The Vietnam Veterans'Memorial", cit., p- 7.
um editorial, o máximo que o conflito obteve como monumento foi um filme para o cinema 4 Robert N. Bellatu "Civil Religion in America", em Beyontl Belief: Essays on Retigion in a Post-
Traditional World (Nova York: Harper and Row, 1.979), pp. 168-189.
198Ç os veteranos encontraram muita dificuldade para convencer o presidente Reagan a a Robin Wagner-Pacifici & Barry Schwarz, "The Vietnam Veterans'Memorial", cit., p. 8.
Íazer as indicações necessárias do grupo que definiria o local do monumento (na alameda a Deve-se notar que o mesmo acontece em relação a outros monumentos que trazem
junto do memorial do vietnã). os recursos da iniciativa privada custaram a chegar, mas nomês como principal substância, como o Memorial do Holocausto, em Bruxelas, e os
cet'ca de metade dos primeiros 2,5 milhões de dólares foi doação de uma fábrica coreana memoriais aos militares mortos nas guerras modernas.
de automóveis - ver Nezr York Times, 11-11-1988. s Robin Wagner-Pacifici & Barry Schwarz, "The Vietnam Veterans'Memorial", cit., p. 7.
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Nesse sentido, eles concordam com Walter Dean Burnham, a estava o monumento. Ele defende seu estilo como ,,humanístico,,, em
quem citam/ segundo o qual a década de 7970 e o início da de 1980 contraste com a abstração de Liru que define como ,,niilista,,, como
foram um período de mudança fundamental nos valores coletivos e "arte no vácuo"; qualifica a propria arte de "democracia em ação,, e de
na autoconcepção, um "movimento de revitalização reacionária,,. Se populist4 e a dela, de "elitista"; diz que sua arte tem consciência da
esse é o caso, então a concepção que os autores têm da obra como trágica perda de rapazes de 19 anos, enquanto a de Maya Lin é um
composta de uma mescia de gêneros, e sua colocação ou posicionamento, "desprezo à vida". Apesar dos termos claramente ideológicos de seu
que inclui as negociações, políticas e estéticag juntamente com a atitu- argumento, ele culpa Maya Lin pela politização da controvérsia, por
de subseqüente e um tanto inesperada dos visitantes, tal concepção ter ela insistido numa parede negra, enÍatizando a morte e um momento
coincide com a ação e edição coletivas de Becker, com as sucessivas negro da história, e que interessava aos liberais contrários à guerra, e
releituras de Bourdieu e com o ponto de vista de Akrich de que a não numa parede branca, que teria dado dignidade aos ,,rapazes d.e 79
redefinição artística é permanentemente dinâmica. anos, não aos generais". Ele dava a entender que, se ela não tivesse se
recusado a transigir em seu projeto, aceitando um fundo branco, não
Em sua tese, Wagner-Pacifici e Schwartz não sondam as orienta-
teria havido a necessidade de convidá-lo para erguer as estátuas. Maya
ções dos próprios artistas. Embora estudos de arte recentes costlmem
ser cautelosos em relação a declarações de intenção de artistas ou, mais
Lin, por s1)avez,justificou sua escolha do negro por ser,,mais calmo e
ainda, em relação à maneira de reconstruir as intenções de artistas há suave que o branco". "O mármore branco pode ser muito bonito,,,
muito falecidos (pouco se sabe, por exemplo, do pensamento de um disse ela ainda, "mas não se pode ler nada nele. Eu queria uma coisa
Rogier Van der Weyderç o pintor do retábulo de Beaune), visto que o que fosse suave aos olhos e ficasse feito um espelho quando polido. O
Memorial é uma obra contemporânea, e os artistas ainda nào silencia- objetivo é Íazer gue cada um se veja refletido nos nomes,,.a7
ram, suas idéias podem fornecer subsídio adicional às muitas vozes da Em vista da natureza abstrata do projeto de Lin, pode não ficar
obra. É interessante notar que o projeto vitorioso de Maya Lin desa- claro por que e como se conseguiu ler mensagens nele, políticas ou
gradara muita gente que fazia objeção a uma série de aspectos: ao de- outras quaisquer, seja pelas pombas liberais, seja pelos gaviões conser-
senho da obra em si (neg-ro, austero, minimalista); ao fato de ela ser vadores. A abstração minimalista, afinal de contas, não tem outro con-
mulher, jovem estudante de Yale (nível de bacharelado) e sino-norte- teúdo senão o que se vê. Mas a história dos movimentos políticos e
americana. Como resultado do protesto, cleram a Frederick FIart, o estéticos dos últimos cem anos mostra uma longa, embora um tanto
único escultor figurativo a ser premiado no concurso (terceiro lugar), inconsistentg associação de liberalismo com arte abstracionista, e de
a oportunidade de modificar a concepção geral de seu projeto, de modo conservadorismo com realismo figurativo. Embora as artes e a política
que o acrescentasse ao conjunto, e assim ele o fez. não estejam intimamente relacionadas nos termos sugeridos, no geral,
certos estilos de arte de "vanguarda", incluindo romantismo, realis-
Numa entrevista um tanto mal-humorada,a6 Hart afirma que,
quando o projeto de Maya Lin foi anunciadc, uma torrente ,,demo- mo, naturalismo, impressionismo e cubismo, são normalmente asso-
crática" de cartas de protesto inundou a Casa Branca, sendo elas enca- ciados a (em seu contexto histórico) movimentos liberais ou de ten-
mirúradas ao secretário do Interior, James Watt, sob cuja competência dência esquerdista, ou a orientações políticas. são exceções honrosas
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indivíduos como Degat que se aliou aos opositores de Dreyfus, rene- sentação visuaf eles encaixam a análise numa moldura de tempo trans-
gando dessa forma muitos de seus amigos íntimos e colegas do mun- seccional, que enfatiza um pluralismo excessivamente abstrato. Eles
t
do das artesi certos pintores simbolistas, senão todo o movimento em ,:?
I negligenciam os diferentes ritmos de desenvolvimento da sociedade e
si; os vorticistas ingleses e os futuristas italianos, que eram mais aber- .1 do país, não esclarecendo que o processo de anúncio do concurso, de
tamente elitistas e antidemocráticos do que muitos. De fato, entre os julgamento dos candidatos, de escolha do vencedor e da construção
futuristas, alguns se aliaram a Mussolini e ao movimento fascista.as r:;;
do monumento abrangia e coincidia com uma mudança de governo
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em nível presidencial (de Carter para Reagan), que durou oito anos,
O comentário adicional de Frederick Hart revela a base politizada Í
tÍ com conseqüências imediatas para as nomeações do executivo. As con-
do processo seletivo, em que a administração conservadora conseguiu
seqüências da eleição do novo presidente foram r.nenos imediatas ou
impor suas preferências, embora sem reprimir'completamente as for-
duradouras em nível parlamentaq, ao passo que seu impacto sobre o
mas simbólicas a que se opunha.4e No geral, isso fundamenta a inter-
judiciário foi provavelmente de muito maior duração, independente-
pretação de Wagner-Pacifici e'Súwartz, mas sugere a necessidade de
mente do clima da opinião pública. visto que foi a mudança na presi-
maior atenção a um elemento que eles incorporaram inadequadamente,
dência que coincidiu com o movimento de revitalizaçáo reacionária
elemento esse que é fundamerital à análise de Akrich - a natureza
de Burnham, a administração seguinte pôde promover mudanças drás-
longitudinal do processo. Trata-se de uma crítica que pode parecer
ticas no ramo executivo do governo, rejeitando as nomeações ideolo-
infundada, porque os autores argumentam especificamente contra a
gicamente de direita e optando por outras de caráter tecnocrático, in-
contemporaneidade mítica da microanálise, ao reconstruir os discur-
dependentemente do partido que está no poder. por fim, embora o
sos usados pelos atores em várias instituições. Eles interpretam expli-
monumento se destinasse a reunir uma sociedade piuralista, que era o
citamente o passado à luz do presente, considerando o monumento
no contexto da mudança em direção ao "movimento de revitalização
plano cle um veterano do Vietnã preocupado com o que julgava ser
negligência dos companheiros, e com o apoio de pessoas físicas (o
reacionária" de Burnham. Mas não vão longe o suficiente, pois, embo-
ra o período de tempo em questão seja breve, menos de uma década e
milionário texano Ross Perot) e doações de milhares de outros vetera-
nos,s, há pouca evidência de que os grupos na sociedade norte-ameri-
meia no máximo, as maiqres mudanças dos anos 1970 não apontam
cana divididos pelo conflito tenham sido reintegrados numa unidade.
todas para uma única direção ou para o mesmo tempo, e não fica claro
se tais mudanças representam o verdadeiro aparecimento de uma for- O que isso sugere é que o pluralismo, em sua variedade, não
ça política no país como um todo ou a atração por um único indiví- pode ser abrangido pela análise de um único monumento, não impor_
duo, um presidente muito popular. ta quão extraordinário seja ele. Mas o método, embora limitado em
amplitude, é capaz de revelar em cores vívidas aspectos da sociedade
Apesar da intenção dos autores de contextualizar os eventos po-
que poderiam não ser notados com métodos mais convencionais. A
Liticamente, sob uma interpretação nuançada do discurso e da repre-
exemplo do retábulo de Beaung o Memorial dos veteranos do vietnã
será lido e relido daqui para a frente, e tarvez de modos inesperados.
o
4 Renato Poggioli, certo é que no futuro ele terá impactos diferentes nos visitantes, que
The Theory of the Aaant-Garde (Cambridge: Harvard University press,
.1971.); e Theodore Chipp, Theories of Modern Árt (Berkeley: University of Calífomia press,
l 1973).
a' Elizabeú Hess, 1â Tale of Two Memorials", cit., il lbid., p.'127
p.724.
il
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interpretarão sua importância à luz do novo e sempre renovado pre- namentais tenham obras, de caráter artístico ou decorativo, deixa-as
sente em que se encontram, numa situação ainda mais ambígua do que obras cujo propósito prin_
IJsar obras de arte, a exemplo do que fazem Akrich e Wagner- cipal seja comemorativo. Quando obras de arte são adquiridas para
Pacifici e Schwartz, como medidas ou indicadores de processos sociais exibição pública, basicamente para fins artísticos ou decorativos, elas
e reflexos da cultura política teria aparentemente pouco que ver com a
podem desencadear controvérsia por conta de sua aparência estética
singularidade enfatizada pelos estetas. Há pouca ou nenhuma dúvida ou por motivos políticos, ou ambos. A poiêmica em torno do Arco
inclinado, de Richard Serra, colocado na praça de um importante edi-
quanto à proveniência, genuinidade e gênio (embora as obras possam
ser julgadas, e o foram, mais ou menos favoravelrnente por alguns
fício do governo federal, na cidade de Nova york, tem sido geralmente
críticos e autoridades do mundo das artes). O que se sugere aqui é que vista como exemplo de desacordo estético, mas Judith H. Balfe e
a natureza das obras, sua localização, auspícios e função fazem com Margaret wyszomirskisr fornecem evidência de que também essa obra
se enquadra na categoria de repugnância ideológica.
que os critérios adequados para aplicação em outras formas de arte se
tornem secundários. A arte pública é diferente da arte que se colecio- Embora basicamente um objeto estético, não uma obra come-
na. Como regra, ela não é movivel e, quando se deteriora, pode ser morativa, colllo o monumento de Maya Liry o Arco inclinado é urna
restaurada, sem levantar clúvidas sobre se houve excesso de restauro, enorme peça semelhante a uma parede. Não está abaixo do nível do
coisa que os museus hoje evitam que aconteça com suas obras de arte. chão, nem é de cor preta brilhante, mas (inicialmente, pelo menos) de
Esse é inquestionavelmente o caso do Memorial do Vietnã; o retábulo aÇo corten. Não traz nomes que possam despertar ligações sentimen-
de Beaune é diferente, e mais ambíguo. Sua quase venda pelo hospital tais concretas nos espectadores e desse modo aliviar seu enorme tama-
que o possuía testemunha uma forma de diferença e o fato de seu nho. Presumivelmente, a função comemorativa é da alçada do pró-
excessivo restauro, outra. Agora que se tornou lrm monumento públi- prio ediíício, que abriga escritórios do governo federal, e que leva o
co, sob o controle de uma agência estatal, sua venda (segundo a legis- nome do falecido senador Jacob Javits. segundo Balfe e wyszomirski,
lação francesa) está efetivamente proibida. Embora pertença à nação, seu significado político prende-se exclusivamente ao fato de ter sido
não é um monumento nacional no mesmo sentido de urna represen- contratado durante a administração democrata e à necessidade de satis-
tação de cultura política. Íazer a "porcentagem de arte" que se exige na construção de edifícios
federais. Não há evidência, claro, de que seria mais bem apreciado por
Não obstante as obras que cornpõem o Memorial do Vietnã te-
rem sido objeto de debate em termos estéticos, no momento ele funcio-
democratas do que por republicanos conservadores. De qualquer
na mais como as lápides e estelas que marcam a cabeça-de-praia da modo, a peça já foi removida.
Normandia na Segunda Guerra ou o campo de batalha dos Bosques se a história do projeto para o desenho do mural dos correios no
de Belleau na Primeira Guerra do que como uma obra de arte. tempo do New Deal serve de guia, parece que os interesses locais, pelo
ffieflos nos anos 1930, estavam freqüentemente em confiito com os
Conforme mostraram aqueles que costumavam denunciar a es-
desenhos aceitos pelo órgão federal. Como mostra Karar Ann Marling,
cultura oficial do século XX (agora novamente em voga), é raro um
monumento público conseguir ser esteticamente vitorioso e politica-
mente funcional. O fato de a legislação obrigar que os edifícios gover- t Judith H. Balfe & Margaret Jane wyszomirski (orgs.), Art, kreorogy and poLitics (Nova york
lraeger, I985).
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ffii'-
cada agência dos correios. As divisões políticas regionais dos Estados ,_ài Sigmund Freud,
Unidos podiam ser acomodadas nessa forma de arte, porque as agên- "Dostoiévski e o parricídio,,, em
' y
cias e, portanto, as obras eiam segregadas umas das outras pela dis- Collected pnpers, vol.
tância. Nenhuma delas carregava o peso que wagner-pacifici e schwartz
tão acerbamente analisam no Mômorial do Vietnã. Eu não acredito em regras... Acredito em artistas. Acredito que, se
Michelângelo trabalhasse com palitos de fósforo, todos acharíamos os
Wagner-Pacifici e Schwartz analisam adequadamente o proces- palitos de fósforo maravilhosos.
so de sua criação, a natureza de sua modificação e sua recepção pelo
Kirk Varnedoel
público como indicativos da cultura política norte-americana, mas ô
interesse central dos autores não é a estética da obra em si, exceto e na Todo trabalho artístico, como toda atividade humana, envolve a ação
medida em que isso reflete o pluralismo norte-americano e serve para conjunta de certo número de pessoas, freqüentemente de um grande
modificar a teoria durkheimiana. Eles delineiam um modo de com- número delas. Craças a essa cooperação, a otrra de arte que eventual_
preender a sociedade por meio da arte, sem reduzir uma à outra. Na mente vemos ou ouvimos acontece e continua a acontecer.
melhor das hipóteses, essas análises conseguem apresentar a socieda- F{oward Becker,
de e a arte abrangendo seus diferentes tipos de singularidade, que é Art Worlds
renovada e modificada ao longo do tempo, tanto estética quanto poli-
ticamente.
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