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Nosso objetivo neste breve relato é chamar a atenção e aguçar em farmacêuticos e enfermeiros a
curiosidade para um fato relevante e que até então encontra pouca importância no meio clínico. A ordem
de infusão escolhida para os protocolos de tratamentos utilizados em nosso dia a dia pode alterar o
mecanismo de ação farmacológico, podendo ser usada para benefício do paciente desde que se conheça o
mecanismo de citotoxicidade de cada fármaco.
Para corroborar tal afirmação utilizaremos o raciocínio explicativo das interações medicamentosas
passíveis de ocorrência em pacientes polimedicados. Contudo, abordaremos, neste breve momento,
apenas alguns pontos farmacodinâmicos envolvidos em alguns protocolos corriqueiramente utilizados
(escolhemos alguns de alta prevalência de prescrição).
Sabe-se que os protocolos de tratamento farmacológico utilizados em pacientes com câncer envolvem
complexos usos de vários medicamentos. A associação de dois ou mais fármacos baseia-se, geralmente,
no conceito de sinergismo de ação farmacológica e a intenção principal é a obtenção de resposta clínica
potencializada com menores toxicidades e menor risco de aparecimento precoce de resistência com a
utilização de estreita margem terapêutica.
A ordem em que os medicamentos são dados pode influir na interação; estes então devem ser
administradas de tal modo que não se encontrem (como, por exemplo, em horários distantes), diminuindo
a possibilidade de interação. O intervalo curto entre a administração de uma droga ou outra pode
aumentar a possibilidade de interação, por isso o conhecimento antecipado de interações entre os
fármacos permite a escolha de horários para administração, de modo a diminuir o máximo possível à
ocorrência de interações e reações adversas. A estreita margem terapêutica e os potenciais efeitos letais
tornam estes pontos fundamentais para discussão em oncologia.
Tal fato decorre das ações inibitórias, em parte, do 5-FU sobre a enzima timidilato sintase (TS) para a
formação do complexo ternário 5-FU-TS e folato reduzido. Muitas células tumorais têm níveis
relativamente baixos de folato reduzido podendo influenciar na eficiência de ação da inibição da TS.
Portanto, a administração em primeiro lugar do ácido folínico é um mecanismo otimizador das ações
farmacodinâmicas do 5-FU sobre a célula tumoral em protocolos clássicos para tratamento de carcinomas
de mama, colorretal, e cabeça e pescoço, já que o ácido folínico funcionaria como substrato para a célula
tumoral. Machover, 1997 também demonstra que o ácido folínico não altera padrões farmacocinéticos
referentes ao metabolismo do 5-FU in vitro ou in vivo .
Estudos de Baker, 1997 e Calvert, 1997 demonstram que interação importante também relacionada à
ordem de infusão ocorre quando utilizamos derivados da platina (Carboplatina ou Cisplatina) associados à
taxanes (Paclitaxel ou Docetaxel). Para tal raciocínio alguns pontos das ações farmacológicas devem ser
lembrados: 1)A carboplatina sofre eliminação renal mais rapidamente que a cisplatina; 2) O paclitaxel é
metabolizado via sistema microssomal hepático em metabólitos menos ativos pelas enzimas CYP3A4 e
CYP2C8; 3) O docetaxel, por sua vez, é metabolizado pelas isoformas CYP3A ainda não bem
identificadas. Baseado nestes pontos, estes estudos colocam que pode haver influência direta da seqüência
de infusão sobre as ações antitumorais dos compostos envolvidos, bem como sobre a toxicidade
decorrente da ação destes sobre células sãs.
Pelo exposto por Baker e Calvert é possível inferir que a infusão do paclitaxel antes da carboplatina induz
menor número de ligações cruzadas à molécula de DNA decorrentes do mecanismo de ação
farmacológica primária da carboplatina. Além disto, evita-se a excreção retardada dos metabólitos do
paclitaxel evitando toxicidade hospedeira aumentada. Schellens e colaboradores demonstraram
mecanismo explicativo similar para justificar a infusão de docetaxel primeiro do que cisplatina.
Protocolos com estes fármacos são utilizados com importância clínica destacada em tumores de alta
incidência como: ovário e pulmão.
É fato que a Terapia Oncológica moderna tem sido cada vez mais intervencionista e tem utilizado doses
de quimioterápicos, isolados ou combinados, cada vez maiores o que aumenta em muito as probabilidades
para a ocorrência de interações medicamentosas. Acreditamos que estudos devam ser implementados e
intensificados no sentido do uso racional dos protocolos quimioterápicos já existentes afim de que
possamos visualizar nos pacientes a melhor resposta clínica com a menor toxicidade. Isto pode ser
possível com boa vontade e boa formação farmacológica para os profissionais da área.
BIBLIOGRAFIA
• Baker SD. Drug interactions with the taxanes. Pharmacotherapy 1997; 17: S126-S32.
• Calvert AH. A review of pharmacokinetics and pharmacodynamics of combination
carboplatin/paclitaxel. Semin Oncol 1997; 24, S2: S85-S90.
• Crul M, Van Waardenburg RC,Bocxe S, et al. DNA repair mecahnisms involved in gencitabine
cytotoxicity and in the interaction between gemcitabine and cisplatin. Biochem Pharmacol 2003;
65: 275-82.
• Machover D. A comprehensive review of 5-fluorouracil and leucovorin in patients with metastatic
colorectal carcinoma. Cancer 1997; 80: 1179-1187.
• Schellens JHM, Ma J, Bruno R, et al. Pharmacokinetics of cisplatin and taxotere (docetaxel) and
WBC DNA-adduct formation of cisplatin in the sequence taxotere/cisplatin and cisplatin/taxotere
in a phase I/II study in solid tumor patients. Proc. Am. Soc. Clin Oncol 1994; 13: 132.