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Flávio Aguiar**
(*) Texto escrito originalmente para o livro Castro Alves, edição comemorativa
dos 150 anos de nascimento do poeta, patrocinada pela Odebrecht S.A e
Fundação Banco do Brasil.
(*•) Professor de Literatura Brasileira do Departamento de Letras Clássicas,
FFLCH/USP.
AGUIAR, Flávio. A praça, o povo e o p o eta L íngua e L itera tu ra , n° 23,
p. 47-62, 1997.
O p o e ta b a ia n o p e rte n c e a u m a g eraç ão de in te le c tu a is q u e
vicejou no a m b ie n te a g ita d o d a s F a c u ld a d e s de D ireito de P e rn a m
b u c o e de S ão P aulo. Ali su rg ia m e to m a v am fo rm a a s n o v as id é ia s
do tem po. N ão p o r a c a so C a stro Alves conviveu com pelo m e n o s d o is
colegas q u e fizeram c a rre ira n a política: o ta m b é m b a ia n o R ui B a r
b o s a e o p e rn a m b u c a n o J o a q u im N abuco. A m bos viveram b em m a is
do q u e o am igo. R ui B a rb o s a m o rre u com m a is de 70 a n o s, em 1923;
N abuco, ao s 64, em 1910. C a stro Alves, com 2 4 a n o s, em 1871.
N as fa c u ld a d e s de D ireito, a po lítica e a p o e sia e sta v a m n o ar.
E ra m a lim e n ta d a s, em p rim eiro lu g ar, p ela tra d iç ã o o ra tó ria d a c u l
tu r a ac ad ê m ica . O g osto p e la o ra tó ria a c o m p a n h a v a os e s tu d a n te s
do início ao fim do c u rso . T in h a raízes a n tig a s e p ro fu n d a s n o B r a
sil, m a s ag o ra a a rte de fa la r em p ú b lico e ra e s tim u la d a pelo fervor
p atrió tico . O e n sin o d a s leis im p u n h a -s e com firm eza. A n tes, e ra
m o d a e s tu d a r em C oim bra. O h á b ito se m an tev e a in d a a lg u m te m
po d ep o is d a In d e p e n d ê n c ia , em 1822. P a ss a d o s a lg u n s a n o s , po-
L ín g u a e L itera tu ra , n° 23. p. 47-62, 1997. 49
Nossa prim eira geração rom ântica, que havia criado o nacio
nalism o literário, era form ada por hom ens sisudos, íntim os do paço
imperial, a exemplo de Gonçalves de M agalhães e Araújo Porto Ale
gre. Tinham u m a formação ainda clássica. De certo modo, eram
rom ânticos por força das circunstâncias: queriam produzir u m a li
te ra tu ra nos m esm os moldes das correntes estéticas européias d as
prim eiras décadas do século XIX. No gosto, eram dados a um certo
ecletismo. Diziam que não se pautavam exclusivam ente pelo rigor
dos clássicos nem pelo desalinho dos autênticos rom ânticos.
A geração seguinte, que andava n a casa dos 30 quando C as
tro Alves mal chegava nos 20, teve como figuras de proa hom ens
como Jo sé de Alencar. Mais independentes do paço do que os a n te
riores, podem ser visto como um grupo de decididos seljm ade-m eri
literários. Pretendiam m odernizar a sociedade brasileira, ac ab ar
sem trau m as revolucionários com o trabalho escravo e com o des
potism o às vezes licencioso d a antiga família patriarcal.
No teatro, um dos heróis d essa geração será o engenheiro
Rodrigo de O Crédito, de Jo sé de Alencar. O engenheiro lu ta pela
modernização tecnológica e m ental da Corte, aju stan d o -a a um p a
drão burguês de convivência: trabalho como valor de m ercado e o
casam ento consolidado pelo livre consentim ento baseado no amor.
Os rep resen tan tes d essa fase vão lu ta r pela modificação da consci
ência social dom inante, m as serão com edidos em su a s propostas:
com a m elhor das intenções, m u itas vezes ten tarão convencer os
senhores de que a escravidão era tão prejudicial a eles quanto aos
próprios escravos.
tas do rom antism o francês, e Lord Byron (George Gordon Noel, 1788-
1824), poeta rom ântico inglês. As leituras que farão desses au to res
será vital p ara im pulsionar os m ovimentos de transform ação da
sociedade brasileira. Mais um a vez, destaca-se a figura de C astro
Alves - tam bém , diga-se aqui de passagem , por su a atividade como
trad u to r ou livre-adaptador de autores franceses e de o u tras nacio
nalidades. C astro Alves foi um leitor ávido de diferentes escritores
de diferentes épocas: em su a obra se encontram ressonâncias de
Homero, da Bíblia, de S hakespeare, de Lam artine, de Alexandre
H erculano e de C hateaubriand, entre outros.
o uso excessivo que se fez de seu s versos nos livros e salas escola
res, reforçando-lhes a tonalidade bom bástica e cadenciando-lhes o
ritm o, n u m arrem edo de m arch a m ilitar. Uma análise equilibrada
não abala seu posto de um dos m ais im portantes poetas brasileiros.
Na vertente am orosa e n a social, su a obra parece quase sem
pre com posta de fragm entos de um grande poem a sobre o significa
do da existência h u m an a. É como se houvesse um encontro violen
to do poeta com seu tem po e a nós fosse perm itido ver, ler ou ouvir
p artes n arrativ as desse em bate épico. A palavra se realiza então
como força unificadora em meio a u m a consciência dividida e a um
universo problem ático. Não se discute que a H istória significa pro
gresso p ara a h um anidade, m as o acesso a esses significados não é
evidente e deve ser laboriosam ente construído.
• o Homem e a natureza;
• o Homem e o amor;
• o Homem e a sociedade.
Ao desejo de d esfru tar a vida pode tam bém se opor a prom essa
de u m a vala, que lem bra a sorte de u m a “vala com um ” posto que é
com um a todos, como em:
ele reúne em um só, por força da energia poética que a tudo quer
igualar em nom e do ideal: são esses tipos o africano, o mouro, o
escravo propriam ente dito e até mesmo o brasileiro, definido como
tipo mestiço que é, n a verdade, um escravo... da escravidão.
Esse mestiço não aparece na poesia de Castro Alves apenas
como racialm ente mestiço, m as como socialm ente mestiço, pois ele
é, ao mesmo tempo, senhor e escravo; senhor n a alm a e escravo n a
condição. Veja-se o Lucas, ainda de A Cachoeira de Paulo Afonso:
ABSTRACT: The auihor presents the Castro A lves" poetry path and
relation to the social political environment ai the time.