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TEOLOGIA DA

REFORMA
Libri mut magistri sunt

Sola fide
Sola Scriptura

LIBRI MUT MAGISTRI SUNT

Sola gratia
Sola gratia

Sola Scriptura
Sola fide

Prof. Jones F. Mendonça


Seminário Teológico Batista Carioca
Teologia da Reforma

Teologia
da
Reforma
Capa:
CRANACH, Lucas the Elder
Porta-retrato de Martinho Lutero (detalhe), 1527
Óleo e têmpera sobre madeira
Wartburg-Stiftung, Eisenach

Nov/2011

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Teologia da Reforma

INDICE GERAL

Introdução ............................................................................................ 04
1. Os pré-reformadores: John Wycliff e Jan Hus ...................................05
2. Erasmo de Hoterdã ........................................................................... 00
3. Martinho Lutero ............................................................................... 00
4. Ulrico Zwínglio................................................................................. 00
5. João Calvino ..................................................................................... 00
6. A Reforma radical ............................................................................. 00
7. A Reforma inglesa ............................................................................ 00
8. A contra-reforma ............................................................................. 00
9. A ortodoxia luterana e reformada .................................................... 00
10. Anexo 1 ........................................................................................... 00

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Teologia da Reforma

Introdução

Escrever sobre a teologia dos reformadores é uma tarefa que exige muita cautela.
Historiadores seculares tendem a enfatizar demais o aspecto político que o movimento
acabou ganhando. É verdade que sem o apoio da nobreza, interessada em libertar-se do
controle exercido pela Igreja, a Reforma não teria êxito. Entretanto, não se pode negar que
reformadores como Lutero, Zwínglio e Calvino foram movidos por uma intensa devoção.

Também seguindo uma tendência polarizada, alguns teólogos católicos mais


conservadores insistem em destacar apenas o impacto negativo que o rompimento de
Lutero com a Igreja produziu: revoltas populares, fragmentação do cristianismo em
inúmeras denominações, individualismo, etc. É preciso destacar que a degradação moral
do clero romano, tão denunciada pelos reformadores, era algo combatida até mesmo por
proeminentes cristãos católicos, tais como Nicolau de Cusa (1401-1464), o humanista
Erasmo de Roterdã (1466-1536) e o Papa Adriano VI (1522-1523), dentre outros. O
teólogo católico Richard McBrien chega a lamentar que o Papa e a cúria não tenham
compreendido a importância dos movimentos de reforma, “produto de uma série de erros
trágicos imperdoáveis e de atos corruptos por parte da liderança da Igreja, em especial do
papado”1. O Papa Pio IV, referindo-se ao “herege” Calvino, chegou a reconhecer que o
reformador francês não era seduzido pelo dinheiro, e que se tivesse servos como ele, seus
“domínios estender-se-iam de um oceano ao outro”2.

Por fim, há um grupo de protestantes que insiste em apresentar os reformadores como


heróis que obtiveram pleno êxito em devolver à cristandade os antigos valores e doutrinas
da igreja primitiva, abandonados negligentemente pela Igreja católica. Mas não podemos
fechar os olhos para o espírito pouco evangélico de Lutero expresso nos textos em que
incita a perseguição de judeus e camponeses. O reformador francês João Calvino, numa
carta a Farel, confessa que não pouparia Miguel de Serveto da morte caso colocasse os pés
em Genebra. Em 27 de outubro de 1553, após ter passado por um tribunal que tinha
Calvino como acusador, Serveto foi queimado vivo, mesmo após ter pedido clemência. É
verdade que tais documentos devem ser lidos em consonância com o ambiente contextual
no qual foram escritos, mas ainda assim tais atos não se justificam

Como se pôde notar é possível enxergar a Reforma sob diversos ângulos. O que pretendo
com este trabalho é dar ao leitor as informações necessárias para que ele possa formar o
seu próprio juízo a respeito dos acontecimentos que abalaram a Europa do início do
século XVI.

Rio de Janeiro, novembro de 2011.


Jones F. Mendonça

1 MCBRIEN, P. Richard. Os papas, p. 281.


2 Schaff, Swiss Reformation, 558 apud DURANT, Will. A Reforma, p. 399.

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Teologia da Reforma

I - OS PRÉ-REFORMADORES

1. Introdução

N
o século XI eclodiu uma série de movimentos de reforma que ansiava pela
restauração da vida religiosa. Tais movimentos se tornaram atrativos ao povo,
escandalizado com a lassidão moral, a riqueza da igreja e a rígida hierarquia
eclesial. Buscava-se uma nova espiritualidade, que estivesse mais de acordo com aquela
praticada entre os cristãos do período apostólico. A mudança na devoção se refletiu nas
imagens de Cristo, que passou a ser retratado não mais como juiz, mas como homem de
dores3. O modo de vida feudal estava em
decadência e em seu lugar floresciam as
cidades4, um ambiente fértil para a
propagação de idéias contrárias à Igreja.
Além disso, as cidades eram o reduto de
uma nova classe em ascensão que desejava
impedir a intervenção da igreja em assuntos
temporais: a burguesia5. Vale destacar que
Pedro Valdo, fundador de um movimento
considerado herético pela Igreja (os
valdenses), era um comerciante da cidade de
Lyon.

Todo esse clima favoreceu o afastamento de


um grande número de fiéis da rotina
paroquial, imaginando que a impureza dos
padres invalidava os sacramentos que
O Cristo sofredor numa Iluminura em administravam6. No imaginário católico
pergaminho de 1216. Pierpont Morgan Library,
New York. medieval a ineficácia dos sacramentos7
representava a condenação eterna, uma vez
que na doutrina católica eles tinham o poder que conferir graça (e a consequente
eliminação dos pecados). Como resposta a essas críticas radicais, os teólogos da Igreja
passaram a insistir que a administração dos sacramentos não dependia da qualidade moral

3 BOURGEOIS, Henry. História dos dogmas 3, p. 364.


4 Vários fatores impulsionaram o aumento das cidades: regiões privilegiadas por constituírem sede de
bispados; transformação de mosteiros em centros de comércio e castelos e fortalezas que funcionavam como
refúgio para os camponeses livres.
5 JANOTTI, Aldo. Origens da universidade, p. 43

6 FERNANDEZ-FELIPE, Armesto; WILSON, Derek. Reforma: o cristianismo e o mundo 1500 a 2000, p.

179.
7 Desde Pedro Lombardo os sacramentos foram fixados em sete: batismo, crisma (ou confirmação),

confissão, eucaristia, matrimônio, ordem e extrema-unção. Os sacramentos são, na teologia católica,


indispensáveis para alcançar a graça de Deus.

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Teologia da Reforma

do sacerdote, mas tão somente da obra realizada por Jesus Cristo ( ex opere operatum)8. A
ênfase na eficácia dos sacramentos como meio de graça e do papel dos sacerdotes como
intermediários entre Deus e o homem teve um efeito poderoso na exaltação do poder do
clero. Apesar disso, para muitos fiéis tais medidas não bastaram.

No anseio pelo retorno à igreja dos primeiros séculos, pautada nos valores dos Evangelhos,
surgiram dentro da própria igreja novas formas de vida religiosa, as ordens mendicantes:
franciscanos, dominicanos, carmelitas e os eremitas agostinianos9. Essas ordens religiosas
desejavam reformar a igreja por dentro e mantiveram-se submissas à liderança da Igreja.
Em Milão, Lombardia e no sul da França floresceram movimentos de reforma que tinham
como característica marcante a hostilidade ao papado, tais como os cátaros e valdenses.
Esses grupos, diferentemente dos primeiros, desafiaram a autoridade da Igreja, por isso
foram duramente perseguidos. Para suprimir o desenvolvimento dos grupos dissidentes a
Igreja organizou as cruzadas (extermínio da heresia pela força das armas) e instituiu a Santa
Inquisição (corte eclesiástica encarregada de localizar e julgar os hereges).

A ruptura profundamente traumática que se deu na igreja do século XVI, com Martinho
Lutero, teve antecedentes significativos nesses movimentos surgidos no início do segundo
milênio, porém, é possível destacar o nome de dois padres, considerados os precursores
mais importantes da Reforma protestante. São eles: John Wycliff e Jan Hus.

8 Os donatistas negavam a eficácia dos sacramentos caso fossem administrados por alguém que merecia a
excomunhão (ex opere operantis). Lutero usou esta última expressão num outro sentido, afirmando que o
sacramento só é eficaz quando a pessoa que o recebe faz bom uso dele pela fé. Cf. LUTERO, Martinho. Obras
selecionadas, p. 437, nota 28.
9 Franciscanos: ordem inspirada na vida e na obra de Francisco de Assis. Dominicanos: fundada em 1216 por

São Domingos de Caleruega, praticamente na mesma época do surgimento dos franciscanos, teve como
missão a pregação da doutrina cristã e a conversão dos os hereges. Carmelitas: ordem mendicante surgida no
século XI fundada por eremitas no monte Carmelo, daí a designação “carmelitas”. Eremitas agostinianos:
união de diversos grupos eremitas numa ordem com constituição mendicante sob a tradição agostiniana
(como determinava a bula Licet Ecclesiae Catholicae, 1256).

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