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THEATRO COMICO

PORTUGUEZ,
C O LL E CC Ã O
DAS OPERAS
, P O R T U GU E ZA s,
Que fe reprefentáráo na Cafa do Theatro pú
blico do Bairro Alto de Lisboa,
O F F E R E C I D A S
A? MUITO NOBRE SENHORA
PE CUNIA ARGENTINA
- *
Por 米米米
~

Quarta Inprefsão.
TOM O SEG UNDO
Labyrintho de Creta. , -

Aº Guerras do Alecrim , e Mangerona.


Contém Variedades de Pºhºo.
Precipicio de Faetonte.

L I S. B O A:
Na Ofic. de SinÄo Τελοοεο FERREIRA. 1788.
com Licença da Real Meza da commi/São Gerat fokre
o Exame, e Cenfuri dos Livros.

Pende.{} ma mefma oficina.


# Foi taxado efe Livro em papel a trezen
tos e fefienta reis. Meza 19 de Abril de 179o. /
,
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- - Com tres rubricas. .


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2
L A B Y R IN T H o
D Е.

Que fe reprefentou no Theatro do Bairro Alto


de Lisboa, no mez de Novembro de 1736.
—m

A R G U M E N T O.

S Uccedendo matarem os Athenienfes em


hum torneio a Androgéo, filho de Mi
nos , Rei de Creta , efle para vingar
a morte do filho, depois de reduzir a
-Athenar á fua obediencia , como vence
dor lhe impoz hum rigorofo tributo,
de que lhe pagaria todos os annos fête
mancebos, que ferião forteadas, por
não haver excepção na qualidade das
pe/bas, de cujo feudo fe alimentava o
Minotauro , que exifiia no Labyrintho
fabricado por Dedalo. Cabio aquelle an
no a ſorte ſobre Tezeo, Principe de
Athenas , que fendo para efe efeito
conduzido a Creta , o intentairào come
- A ii ** im
indutrias libertar Fedra, e Ariadna, f
lhar do mefino Minor. Até a fahida de
Creta logrou Ariadna as primeiras efi
mações em Tezeo, ainda que,ao depois
perferiffe a Fedra, deixando a Ariadna
em huma deferta Ilha; porém como fó tra
zamos ne/ia Obra dos fucce/os de Tezeo em
Creta, por e/a razão fe manifefia a Tezeo
mais amanse de Ariadna, que de Fedra.
O motivo que fe toma para o en
trecho da prefènte Obra, he o confide
rar-fé a Tezeo já devorado pelo Mino
tauro , e fendo reputado por morto ,
manter-fé efie engano até o fim, triun
famdo do furor do Minotauro , do emleio
do Labyrintho, e das iras de Minos.

* I N T E R L OC U TO R. E. S.
Tezeo, Principe de Athenas, amante de Aria
N - * dna. -- -

Minos , , … Rei de Creta. , -

Lidoro, Principe de Epiro, amante de Ariadna.


Tebandro , Principe de Chypre g amante de Fedra.
Dedalo , Barbas. -

Licas , Embaixador de Athenas,


} Filhas delRei Mine.
Taş
-
;
Taramella , Criada de Ariadna.
Sanguicuga, Velha, criada de Fedra.
Esfuziote, Graciofo, criado de Tezeo.
Soldados.

A Scena ſe figura em Creta.

SCENAS DA I. PARTE.
I. Bofgue, e Marinha.
II. L- Templum de Venus , e Yupido.
III. Camera. *".. ~

IV. Gabinete. -

V. Sala Regia.

SCENAS DA II. PARTE, |,


I. Camera.
II. Labyrinthe.
III. Sala.
IV. Gabinete com efpelho.
V. Sala de columnata.
VI. Labyrintho. -
VII. Bo/que, e Marinha.

-
* * -

- - N , . - / .

PAR
・>養素ぐ->業姿。<・業・>素養ぐう-業巻ぐ下 ** *

PARTE I. w

S-C E N A --I.

Bo/que, e Marinha, • haverá no lado do Thet


tro huma gruta , e depois de fè ver no mar
bum4 armáda flušiuando com tëmpeliade, fa
biráõ por junto da marinha, Tezeo, e Esfu
ziote , tropeçando , e cabindo em terra fem
ver hum ao óutro. * - .

Tezeo. v r Alba-me o ceo Cahe.


Esfuz. Valha-me a terra ! Cahe.
Tezeo. Haverá, como eu, homem mais
infeliz ?
Esfuz. Haverá infeliz mais homem do que
eu ? * *

Tezeo. Pois parece que conjurados os Deofes,


os fados, e os elementos contra mim, nem
nos Deofes acho piedade , nem nos fados
n
fortuna, nem nos elementos abrigo.
JEsfuz. Pois a pezar dos ventos , das ondas , e
Tubarões me vejo são , e falvo neta praia.
Tezeo. Mas ai , infelices companheiros meus ,
fe naufragantes neffe golfo tiyaftes urna cryf
tallina, mais liquido monunfento nas minhas
lagrimas erijo , a vofas memorias , para que
lëu a Pofteridade nos Ceaotafios de meus fuf.
pi
de Cretá, - ‫ל‬
piros a vofla lembranya » e o meu agradeci
nncntO. - - .. . . .. .

Esfuz. Ora bom he contar, da tormenta , que


melhor he eftar: pingando nefta ribeira feito
chafariz da praia , do que fer fonte da pipa
em vafa barrís. -- . -

Tezeo. A eta deferta praia me conduzírão, as


minhas infelicidades, adonde até para o ali
vio me falta a communicaçáo dos viventes.
Mas que vejo ? Tu não és Esfuziote ? ;
Esfuz. E vós, Senhor, não fois Tezeo!
Tezeo. Tal eftou que não fei quem fou.; mas
dize-me , como indo a pique o noílo navio
te pudefte falvar! , !
Esfuz. Porque fempre fiz boas obras. . .
Tezeo. Já te julgava morto entre as ondas.
Esfuz. Senhor., a minha fortuna eteve em
achar huma ancora a que me agarrei, e fo
bre ella vim boiando, até dar comigo neta
praia, onde tenho a fortuna de te ver, pois
tambem entendi, eftarias a etas horas, cuberto
de limos , e caramujos. . . . .

Tezeo. Para que, foberanas Deidades, defen


! defles a vida de hum infeliz? Para que pro
picias me livraftes defe falóbre marinho moní
tro das aguas, fe quando me redemis da mor
te, he fó para perder a vida? -

Esfuz. Eis-aqui o que eu não aturo: de fórte,


Senhor , que quando te vias na tempeftade,
tudo erão votos , lagrimas, … e prome{las, e
agora ingrato contra o Ceo , depois que te
vês em terra firme , accufas a piedade dos
Deo
a w / -
3 Labyrintho
- Deofes, que te livrárão? Ora, Senhor Te
zeo , ponhamo-nos de joelhos , e com a bo
ca ña' arêa efcfevamosá coin i á lingua louvo
res a Bacho , que nos livrou de bebermos
agua falgada. * * : * 'tº , -

Tezeo. Deixa-me , Esfuziote , precipitar-me ou


• tra vez neffas ondas , para-que com efte ar
- rojo emmender o erro dos , fados. . -

Esfuz. Ifo hçe faltar. , ºr "

Tezeo. Pois tu ignoras o meu valor ? Não fa


bes que fou Tezeo. - , i , º - : ;
Esfuz. Eu bem fei que he o valerofo Tezeo,
Principe de Athenas, cujas façanhudas obras
fizerão, com que a fama deixaffe o clarim ,
para ficar com a boca aberta: item, fei, que
he aquelle Tereo companheiro de Hercules,
" que tem morto mais gente, , do que eu pio
lhos; porém falva pace, ainda me não conf
ta que algum dia fizefles a heroica acção de
té lançares ao mar , e morrer affogado. )
Tezéo. Pois para-que o vejas, e contes ao Mun
do , que Tezeo , como " valente, e Eftoico ,
antes que ignominiofamente perca a vida, pro
cura ſepultar-ſe neſſe monumento de cryſtal.
Faz que fe lança ao mar. *

Esfuz. Tenha mão, º Senhor; veja que aquillo


não he crytal, são aguas vivas, que matão
a gente: ora perfuado-me, que na tormenta
fizete algum voto de morrer afogado.
Tezeo. Deixa-me , Esfuziote, fer piedofo eta
vez comigo. . -

Esfuz; He boa obra pia querer matar-fe a f me{


mo! - Tezeq.
de Creta. ・9
Tezeo. Para quê quero eu viver ? - -

Esfuz. Para viver ; e he tão pouco? Pois em


quanto o páo vai, e vem, folgão as cotas…
Tezeo. Ai, mifero de mim !
Dent. Dedal. Ai, infeliz!
Tezeo. Não ouvifte, Esfuziote, huma funefta
voz ? -

Esfuz. Eu bem a não quizera ter ouvido, nem


ုဖ္ရင့္မား neta hora : ai Senhor , que ferá
lito : -

IDent. Ao bofque, á felva.


Dent. }}}bic te efconderás , cerdofo
-

bruto, cio acelerado furor das minhas fettas ?


Tezeo. Venatorias vozes são as que agora ouvi!
Esfuz. Aqui valerá mais a caça grofa do que
a fina. -

Tezeo. Em que Paiz eftaremos?


Esfuz. Pois fempre cuidei que etavamos em
alguma deferta praia, em que fómente reina
o birbigão com a ajuda das ameijoadas.
Canta fe dentro o feguinte Coro.
Chegai, moradores de Creta , chegai,
Offerecei , dedicai. -

A viétima pura de huma alma rendida | |


Ao Templo divino de Venus , e Anior... -
Tezeo. Efpera, não ouves ao longe fonoras vo
zes de feſtivos hymnos ? . .
Esfuz. Já que fupões que eu fou furdo , que
ro tambem imaginar que és cégo : não vês
defcer por aquelle monte huma formofa tro
pa de balhadeiras :
- Teze0.
\ -

TO Lahyrintho
Tezeo. Que variedade de afectos ao mefmo
tempo admiro neta que julguei barbara , e
tofca montanha! Que te parece ifto ?
Esfuz. Se o nofo navio aportafe em Creta,
para donde levava direito o rumo , difera,
- Senhor , que etavamos em o Labyrintho de
Creta. ' .

Tezeo. Oh, não me falles em Creta, que não


º foi pequena fortuna o não eftarmos nella;
mas afirmo-te que não pofo penetrar o mo
tivo de tão diferentes , e difcordes vozes;
\ pois quando da cavernofa boca daquelle roche
do ouvi o funeto eco, que dizia.....
Dentr. Dedal. Ai, mifero de mim! Aí infeliz !
Tezeo. E , ao me{mo tempo efcutar o vago ef
trepito de venatorias vozes , proferindo con
fuzas. . . . . * * * * * * ` ` `' . .”
Dentr. Ao monte, á felva, tó, tó. , ' ,
Tezeo. E ifto acompanhado de fonora melodia
de acordes accentos articulando alegres.
Capita o Coro.
Chegai, moradores de Creta , chegai
Ao Templo divino de ' Venos , . e. Amor. '.
- ‫تمدل‬ - ". . .. . -

Esfuz. Senhor, façamos aqui ponto de admira


cáo, que as Nintas já fe vem apropinquan
đo. * -* - * -* * *** - * . .. . . . . ..

Tezeo. Pois occultemo-nos neta gruta, fó por


: : - . . . .
ver ifto no que pára. . . -

\ Esfuz. Vá feito; mas a meu ver, ito não pá


ra aqui. - - - - ſ

- - A. º - Ef.
| de Cret4. I i.

Efcondem-fe na boca da gruta , e fabiráõ


humas Ninfas dançando ao fom do Coro, e fa
bem Sanguixuga, Taramella, e Fedra, e can
ta' 0 Coro. 3,

Chegai, moradores de Creta , chegai


Ao Templo divino de Venus , e Añor.
- -
'
2.

Sang. Anda rapariga, não te trefmalhes , e te


percas por effes montes. , º f : ..

Taram. Ai tia , que já vou mui canfada!


Esfuz. Se quizer defcançar, e fazer, penitencia.
comigo nefta cova, não faça ceremonia, en
tre cá para dentro. . ... . . .
-

Taram. Ai minha tia, que me fallárão daquel


la cova ! , - tº , Pai fe.
Sang. Foge, Taramella, que ferá algum Saty
ro falvage. c : . . . 炭常
Esfuz. Senhor , não fabe que traveflos olhos * ‫خي‬
são os daquella boginica ! , , …". .. * …!
Tezeo. Attende, e não falles. … … …
- Sahe Fedra. -->
Fedra. Náo íceffem , :Ninfas , os reverentes cul
tos, que em harmoniofos hymnos dedica o .
nofío affe&o; ás Deidades de Venus , e Cux
pido, por ver fe com a nofia melodia fe ap
placa o feu furor. * /
Tezeo. Vite mais peregrina formofura ? -

Esfuz. Atrenda, e não falle. - * - *

Fedra. Profegui o acorde facrificio de nolas


vozes, dizendo: . . 、 い 。
Sahe Tebandro.
Teband. Galharda Fedra , para que te ಸ್ಟ್ಗ'
c
Tiz Labyrintho
em fubir a efe elevado Templo de Venus,
e Amor, fe aqui nete lugar acharás as Dei
dades que procuras ? - º:
Fedra. Principe, não vos entendo.
Teband. Não bufcas a Venus, e Amor ?
Jedra. Effe he o meu reverente intento.
Teband. Pois fe bufcas a Venus , outra mais
bella fe admira em tua formofura; e fe que
res, amor, procura-o em meu peito, que nel
le o acharás. ^ ' ' -

Fedra. Não helefe o amor, a quem eu facri


*
º fico.… … é º . . ….… . - " -
-

Teband. Talvez que fofe bem empregada a vi


étima deffe affe&to nas aras defte amor , que.
fem a impropriedade de cégo , tem mais
º olhos do que Argos, para admirar-te, e mais
· chammas , que o Vefuvio para abrazar-me ;
: admitte pois. . . . . :
Fedra. Baſta Tebandro, baſta Principe de Chi
pre; fe me julgais Deidade, não queirais fa
crilego ultrajar o meu decóro com tão impro
*prios facrificios, que mais ofendem do que
. * applacấọ.
Tezco. Hirei impedir-lhe não pafle a mais o feu
- atrevimento; pois antes de ter amor, já fin
to zelos. - * .

Esfuz. Ui Senhor, vofa mercè he o guarda da


mas ? Deixe á gente fazer o feu amor? Quod
tibi non vis , alteri non facias.
Teband. Senhora, fe atrevido o meu rendimen
to chegou... . . . ' “ “
Fedra. Não mais, Principe, não mais: mas
al
…” - de Creta. 13
ai de mim, que já as Ninfas do Coro vão mui
diftantes ! Vou-me em feu feguimento. Vai-fe.
Teband. Ai de mim , que Fedra , cruel, con
tra o meu amor accelerada fe aufentou ! Po
rém fe te apartas, º tyranna, por não ouvir
as minhas vozes , o me{mo vento , , que te
deo azas Para a fuga, te levará os écos dos
meus fufpiros.
Canta Tebandro a feguinte
А к т А
Se foges, tyranna,
De ouvir meus fufpiros,
Sufpende os retiros; -

Porque de meus é cos (;


Náo pódes fugir. . . * *

Oh quanto te enganas.
No mal, com que abrazas;
Se amor, que tem azas
Te fabe feguir? Wai-ſe,
Sahem Tezeo, e Esfuziote da gruta.
Tezeo. Oh quanto me arrependo, Esfuziote»
de não haver fahido da gruta , para admirar
de mais perto aquella foberana beleza, e caf
tigar a temeridade daquelle atrevido Faetonte :
qüe intentou dominar' as luzes de tanto Sol!
Esfuz. Tudo quanto os Deozes fazem he por
melhor. * ; : ,

IDentr. Aº felva , ao bofque.


Dentr. Ariad. Deofes, valei-me; quem me focº
corre ? - / * .. . -

Tezeo. Daquele vizinho bofgue não ouvite fenº


tidas, e aflictas vozes de huma mulher!
Esfuz
-
14 - Labyrintho
Esfitz. Senhor, eu não fei que nas vozes ha
ja macho, e femea.
IDentr. Ariad. Deofes , valei-me ! *

Tezeo. De mulher he a vóz, não ha duvida;


em que me detenho , que não vou a foc
corrella 2 Quer ir-fe
Dentr. Dedal. Ai mifero de mim ! -

Dedal. e Ariad. Ai infeliz!


Tezeo. De huma me{ma caufa parece nafcem
º "tão differentes vozes: a qual das duas acodi
· rei primeiro ? -

Esfuz. Eu, Senhor, aqui não tenho voz aéti


va , nem paffiva. | -

Dentr.. Ariad. Não ha quem me foccorra ?


Tezeo. Sim ha. ) Waisſe.
-

Esfaz. Ah Senhor, efpere, não me deixe aqui


fó em poder deft'outra voz, que fou capaz
de ficar fem falla.
Sahe Tezeo com Ariadna defmaiada.
Tezeo. Que etranho fuccefo ! Que venturofo
º acafo! Pois a não fer eu , feria eta infe
liz belleza defpojo da ferocidade de huma féra!
Esfuz. He féra degraça He féra belleza !
He féro deſmaio !
Tezeo. Belliſſima Deidade, ceſſe o violento ecly
pfe de teus raios , que os Aftros dependen
tes das tuas luzes não pódem brilhar , quan
do desfalleceis.
Ariad. Montro feroz, e indomito: mas ai de
mim, que vejo!
2ezeo. Socegai , Senhora, que eu não fou a
féra que vos quiz offender. ‫می‬

- Ésf#Z.
de Creta. 15
Esfuz. Nem eu tão pouco.
Tezeo. Que extaſis vos ſuſpende os alentos ?
Ainda não credes que fou quem vos defen
de , e náo quem vos ofende ?
Ariad. Como ignoro o modo de agradecer tão
generofa acção, que muito me faltem as vo
zes, e me ſobrem as admiraçóes !
Tezeo. Huma caualidade náo he digna de agra
decimento ; más já que o detino me conci
liou a fortuna de fer eu o ditofo inftrumento
da vofia vida, quizera vos compadecefieis da
- minha , que em parocifmos já quafi falece ás
mãos de huma doce violencia.
Ariad. Eu vos prometto defender a vofa vida,
já que tanto me encareceis o feu perigo ; e
affim dizei-me , qual he o deliċto que vos
obriga a viver foragido entre efias brenhas ?
Que gentil prefença! " , ' á parte.
Tezeo. Senhora, fendo vós a culpada, eu he
ue fou o delinquente.
Ariad. Náo entendo efe novo modo de criminar.
Tezeo. Dai-me licença que me explique. ,
Ariad. Dizei. - ºf ,
Esfuz. Eilo ahi meu amo namorado! Eftamos
aviados ! ú parte.
-

Tezeo. Effa animada esféra de beleza, que, em


attra&tivos incendios , fendo luminofo iman de
meu peito , foi luzida remora de meu alve
drio , que perdendo efte a natureza de livre a
{e confidera prezo , para augmentar os defpo
jos no carro do amor. - - - -

driad. Que he amor 2 Etais loucº ? Aತ


16 2 Labyrintho
ue o ignorarès quem eu fou , e o achar
e obrigada a minha vida ao vofo braço,
*
faz com que reprima o caftigo defa temeri
dade. Oh dura lei do decóro ; pois me hei
de offender do mefmo que me agrada! á p.
:Esfuz. Toma lá efe pião na unha: ainda bem,
quanto folgo ! a parte
ºTezeo. Notavel he o vo?o rigor !
Ariad. Maior he o voffo atrevimento. Oh que
elpírito digno de animar o peito de hum Prin
' cipe ! > á part
Tezeo. Já que a vofa tyrannia he igual á vof
fa belleza, permitti ao menos, que vos ame
cá dentro em meu peito, para que os fumos
da viétima não efcureção as luzes da Vofia
Divindade.
Ariad. Para ifo não he necefario licença mi
nha , que não pofo impedir os efeitos do
º alvedrio. - - -

Tezeo. Vito ifo , poderei, amando comigo,


º efperar fer ditofo algum dia ?
Ariad. Bem podeis efperar; porém fem efperan
ça. Valha-me amor, ou não me valha, pois
º me quer precipitar! , ' á pare.
Tezeo. Defenganai-me, Senhora; para que ou s
com a efperança fe alente o meu amor, ou
acabe a minha vida na defefperação.
Ariad. Não fei o que vos diga. Vou-me an
tes que a lingua obedeça aos impulfos do co
ragáo._ á part. e Quer ir fe.
Tezco. Sem dar-me, repota , não he razão,
que vos vades; já que abatetes os voos ao
IllCul

\
de Creta: 17
meu amor, deixai ao menos voar a minha
eſperança. : *.

Esfuz. Senhor, olha que te deitas a perder no


- que pedes; pois fe queres que voe a tua cf
peranga, ficarås fem ella. - . . ..

Tezeo. Deixa-me, louco. Dizei-me, Senhora. »


- ferei feliz? - - - ** *- :

Ariad. Eu vo fo digo. - , ,

Canta Artadma a feguinte.


- - - - R. I. As

Dous fiños affe&los - * *

Nefta alma confervo : - e

Hum delles reſervo. * . .

Se he amor, cu piedade, . .
.*

Dizello não fei, - ….…


Porém fe no extremo
Porfias contante,
Affecto de amante ‫لیم‬--- *

• Que feja, farei. . . . Vaife.


Tezeo. Efpera , efquiva Deidade ; fe queres cor
rer mais ligeira, deixa o alvedrio que me le
vas, e leva as penas que me deixafte. .
Esfuz. Entendo que fe ágora viera outra Nin
fa, terceira vez te namoravas? ,

Tezeo. Ai , Esfuziote, que me finto abrazar eni


vivo fogo. N - . .
Esfuz. Pois lança-te agora ao mar, que he boa
occafião. Mas dize-me, Senhor, quando vite a
Fedra, não querias matar ao Principe de
Chipre com zelos della ? Pois como tão de
Preda te queres matar a ti pelo amor de
Senhora caçadora ? ‫محله‬
Tom. .AI, " . " . R. … . " . Te* -
18 Labyrintho - 7

Tezeo. Não injuría ao Sol quem antes de o


ver adorou huma Etrella, porém depois de
vito o feu refplandor, feria aggravo de fuas
luzes não preferillas a todos os atros.
Esfuz. Vês, Senhor ? Se eu te deixára lançar
ao mar, como querias , não tiveras vitto
agora tanta formofura ; não te arrebatáras;
não te namoráras; não te abrazáras, e....
Tezeo. E não te matára tambem ; pois fe me
náo inpediras lançar-me a elas aguas, náo
fcntíra agora eíta violenta chamma de amor;
e pois tu és a caufa delta violencia , fenti
rás parte do eftrago , que me arruina. Dá-lhe.
Esfuz. Ai Senhor, para que me dá agora efe
esfuziote ? Deixe por ora eles namoricamen
ros , lembre-fe que o epera a devorante goella
de hum Minotauro.
Tezco. Ainda por ifo duplícas mais a tua culpa,
|
pois com o precipicio do mar efcufára fentir
as furias detes montros de amor, e Mino
tauro. Ai tyranno Esfuziote, que me private
do maior bem, que era o morrer! * *

Esfuz. Ui, Senhor, não feja efa a duvida, fe


fó por huma caufa te querias matar, agora
que tens duas, toma duas mortes. .
Dentr. Dedal. Acabem-fe já por huma vez tan
tos pezares ; rebente a mina, unica idéa do
meu defatogo. - º

Esfuz. Ai Senhor, que ali ha mina? Vamo-nos


“ a ella , ai! Mina temos ? Grande fortuna me
e{pera. - . . . . . . .. .
· Ao ir.Je chegando Esfitziote para dentro da
| {r/4
"de Cretat. 19.
gruta, rebenta efia com efirondo, e labarede ,
e ficará Esfuziote Jubmergido debaixo das rui
nas , das quses fahirá Dedalo. .
Esfuz. Ai quem me acode, que dei á cofta na
mína!, * * * ** * :,,, , - - ... -

Tezeo. Que horrendo etampido Parece que a


terra Prefaga da minha ruina em etragos Pu
blíca, a minha defgraça... … *

- Sahe Dedalo. ,
Dedal. Valha-me o Ceo
Tezco. Que foi ifto, Esfuziote ? Levantate. Mas
que novo efpeétaculo fe offerece á minha ad
miração ! Quem és, efpantofo aborto defa
penha ? …, a , , --- - -

Dedal. Sou hum mifero ínfeliz, e tão defgra


çado, que a terra, fendo mái, commua pa
ra todos, a mini de fi me arroja, como ma
drafta. : ...…...… ‫۔‬ ‫۔‬
Esfuz. Senhor Tezeo, refufcíte-me deta efpe
lunca , adonde eftou enterrado, , . . .
Tezeo. Efperai, não vos vades em qüanto vou
acodir a ete, pober criado, que jaz opprimi
do debaixo da ruina daquella gruta...'' ' _ '
Esfuz. Ande deprefa, Senhor, que etas pedras.
me não edificão, muito.
Tezco. Ergue-tc, anda; he bem feito para caf
tigo da tua ambição: quem tc, mandou ir ver
a mina ? ... . . . . . :
Esfaz. Porque, tão"$aca he a minha ambição 2

que tivette pavorºle chegar a efa mina? Mas


ai de mim, que etou minado de dotes, e
tomara alguma contramina 2: quê gºº
B ii `

+ę:
-offos!
żo Labyrintho
Zezeo. Homem , quem querº que és, commu
nica-me a caufa das tuas penas, pois fegun
do o arrojo, que intentate, parece nafcida
de algum extraordinario imotive. ! :-"
-

IDedal. Se fuppóes extraordinaria a caufa , defte


* exceflo, como pofo fiar de tiº a narração de
ineus ſucceſſos fem faber" com quern fallo ,
'ois no filencio conferve à minha vida ? E
afim fabcmdo primeiro quem tu és, então fa
berás quem eu fou... ー・了。
Esfuz. Éte fem duvida he aquelle Senhor da
Y voz groffa , que nos metria Iñedo. " . _. .
Tezeo. Para que vejas que a minha curiofida
de he fincéra, quero dizer-te quem fou, pa
ra que da minha pefoa pofas inferir, que. -

:: fou capaz de fer inftrumento da tua felicida


* de: Depois que os Athenienfes barbara , e
...aleivofamente em hum torneio matárão ao Prin
"cipe Androgeo , filho de Minos , Rei de
Creta , ete jutamente indignado contra os
– Athenicnfes , fazefidò huma liga offenfiva com
T" ds f Principes do: Archipclago ,Te langäräo fc
bre Athenas, para refuciar com o etrepito
“das armas 5 marcial efpirito de Androgeo.
,.Trcs annos efteye Athenas- cercada , e redu
Izidá tá ultima miferia 5 até que para falvar os
*"protrados "fragmentos de tantas vidas , que
inermes pereciáo á ម្ល៉េះ da fome, e da
e
córrupção,
ment:; levantando-li
capitulárág o povoMinos
com ElRei tumultuaria
, offe
1.5gccndº:fe3''füa difcrição."
Fğuz. Tudò aquillo me contava
* .
-
minha
. . .

. ;
de Creta. 21
Tezeo O barbaro Rei vendo que de huma vez
não podia beber o fangue dos Athenienfes ,
impoz o rigorofo tributo, de que todos os
annos pagaffe Athenas fete mancebos para ali
mento de hum montro, que chamão Mino
tauro, que dizem habita dentro em hum La
byrintho. ... . . . .
Dedal. Ai de mim! : - , |
Tezeo, Que ? Supiras ? - -

Dedal. Profegui, que os meus fuípiros não são


ſem fundament9. - - - -
Tezeo. Era pois a fórma dete tributo fem ex
cepção de pefoa, alguma, por mais foberana,
que-foffe; para o que todos em huma urna
: lançaváo os.fcus nomes , e por fórte fe tira
vão fete mancebos, que º fe enviaváo para
Creta a ferem combuftivo feudo do Minotauro.
JErfuz. Se ifto não etivera em letra redonda,
avião de dizer que era mentira.
Tezeo. Ete anno ( ai infeliz !) entre os fete
do tributo fui eu hum delles; que nem o naf
cer filho delRei de Athenas , e fer o valo- .
rofo Tezeo, bem conhecido no Mundo pelo
meu valor, foi batante para ifentar-me deta
tributo; para o que preparada htima armada,
vinhamos para Creta, em cuja viagem os ven
ros , não feife propicios , ou ಣ್ಣ 9

depois de fer ludibrió das ondas , defpeda


Lando o noſſo baixel , ſem duvida perecèra.»
fe huma taboa delle não fora o delfim de
minha vida, º que piedofo me conduzio a ef
tas praias , fem faber aonde etou. E pois
13.
22 Labyrintho
já te tenho fatisfeito, fia agora de mim os
teus fuccellos, para que aches em minha
generofidade o favor que as ruas miferias
etão conciliando. * .
-

Æsføz. ို႔ႏွစ္တ
'agora o com que {e defearts
eſte ba O» - º *::

JDedal. Quando eu me confiderava o mais def


graçado de todos os homens, acho que ha
e outros que nafcêrão com mais infeliz ef
. trella. - - * * \ - . . ‫اة ؟‬
ºTezeo. náo nie tenhas fuípenfo.
Esfuz, Vaimos , ஆவார் toufa , .
ainda que feja huma fabula. . - éº
Dedal. Én fou generofo Principe , o infeliz
Dedalo, aquelle, que por fuas extraordinarias
máquinas , e fublimes invenções fe tem feito
conhecido por todo o Mundo... __*
* Tezeo. Baſta que ſois aquelle célebre Dedalo ,
cujas artificiofas idéas têm merecido os elogios
do Orbe ? Não fabeis quanto me alegro ver
... hum homem táo grande. . . . . . _ . _
Esfuz. Bafta que vofa, mercê he o Senhor De .
dalo, padre metre das minas a pezar do meu
corpo ? Ai, efpere; vofa mercê não he o
pai do Senhor Icaro? __ /**
Dédal. Tu conheceite a Icaro , meu filho ?
* Esfuz. Eu não Senhor , mas lembra-me de o
ver pintado com humas azas, que cahindo em
hum rio, fe foi como hum paflarinho."
Tezeo. Cala-te nefcio ; profegui Dedalo, .*
JDedal. Profigo : Vivendo eu na Corte delRei
Minos de రీ , com a etimação que me
- - - ՃCo
de Cret4. 23
recião as minhas raras idéas , fuccedeo que
* Venus indignada contra o Sol, que em cerra
occafião parenteou as fuas torpezas, não, po
dendo vingar-fe em fuas luzes, pedio a feu
filho Cupido , que contra a Rainha Pazite
fulminafe o feu rigor, fazendo Cupido a inf
tancias de Venus , que Pazife fe namorafe -

de hum Touro.
fisfuz. De hum Touro º Teye muito bom ‘go-િ
to a Senhora Patife. v . - ; — «…

: Dedal. Pazife combatida de táo torpe , e nefan


do amor , pedio-me que lhe défe remedio
** a tão louco incendio, em que fe abrazava,
fazendo com alguma máquina minha , com
que ella pudele lograr o feu intento , antes
que a fua cegueira produzife olhos, que vif
fem publicamente eta nunca vita temeridade
- de Cupido: eu em fim por efcufar maior ef
candalo, me refolvi a fabricar huma Vaca »
º com tanto artificio, que apenas fe diftinguia
das outras viventes; pois no movimento, e
apecto, parece quiz eta vez competir a ar
te com a narureza. … . . "

· Esfuz, E efla Vaca havia de fer deleite para


Pazife. * > * . . -

º Dedal. Fabricada afim a Vaca, por huma ef


cotilha, que nella fiz, fe introduzio Pazife ,
em cuja figuraº artificiofamente transformada
foi facil enganar, ao Touro, a quem amava;
o demais calla-o o filencio , porque fe não
offenda a modeftia. ' .
Esfuz. Sim, bem entendo º fim, Senhor ; o
Touro, e- a Vaca, &c. . JXe
* A.
. .. . .

24 . . . . 14byrinthoº - . .
J)edal. Defte nefando amor nafceo hum monf
tro de duas efpecies , pois era meio Ho
º mem, e meio Touro, por cuja caufa o cha
máráo Minotauro. " . ºr º:
# - O. : -
Defles montros ha muitos no Mua
-- - - !", º -

Tezeo. Ai Dedalo, que tu foſte a occaſiao da


minha defgraça! . . ; * * * * *

JDedal. E tambem da minha : ora attende: Ven


do º Minos naquelle monftro a fua perpétua
c"infamia, me ordenou que para morada del
le fabricafe hum etupendo, e grande, Pala
cio, com tão equivocas entradas, e fahidas,
º que quem nelle (e introduziffe, não pudefe
º átinar com a porta para fahir , ficando” prezo
-- na fua mefma liberdade ; que por efte Venre
• • dado artificio fe chamou o Labyrintho de:Cre
* . . [3. - - - - .. . . .

Tezeo. Segunda vez te confidero artifice de mi


* . nhas infelicidades. ; * , . .. .. . ...
… Esfuz. Que direi eu, que tenho o corpo ef
arramado ? - *** - ſ. - * *

Dêdal. Em fim, como não ha coufa que fe


náo faiba , quiz a minha defventura º que
· · · · chegafie á noticia delRei Minos , que eu ti
nha cooperado para o nafcimento do Mino
rauro", por cuja caufa me mandou encerrar
蠶 Labyrintho , que eu fabriquei , na
pake mais inferior delle , adonde a minha
indutria, e defefperação, fez com que mi
' ' nahdo com ardentes , materiaes as enttanhas
“a terra , fahific deita gruta , como Yಹ್ಲಿ
.‫صص‬
. . . • . đe Creta. 25
¿Tezeo. Vifio jflo eftamos em Creta , e ás
, portas do Labyrintho ? … * -

Esfuz. E ás porías da norte: Ora o certo he,


Senhor, que donde has de ir , não has de
mentir; por ifo, tanto que ep puz os nari
zes en terra , logo me cheirou a Labyrin
tho. ' , , . . . .. . . . . ..
Tezeg. Ninguem póde ifentar-fe da violencia dos
fados. . . T_ , T | • , _ _ _ _ _ _ ,º
Dedal. Principe , já que nete boflue de nin
guem fotes vito, efcondei-vos neta me{ma
mina , até que tinhais occafião de fugir da
morte, que vos efpera, '' ... _ ' ' '
:
-

Tezeo. Que quer dizer fugir? He acção que


nunca... exercitei. 9嵩 dirá o Mundo, fe, fe
differ que Tezeo fugio da morte, e que o
acovardou hum monfiro , quando tantos te
nho vcncido ? . . ..
Esfaz. Não tem que fe canfar, que ete. Se
nhor anda morto por fe matar.
JDedal. Como vos não quereis efconder, e cer
tamente haveis de ir parar ao Labyrintho,
eu por acompanhar-vos nelle me reſolvo a ſer
e outra vez habitador da fua confusão , para
que ao menos com a minha indutria pofais
vencer efe montro, e vingarmo-nos defe
tyranno Rei que á vofla Patria , e “a mim
tanto offende. -

Tezeo. O” Dedalo , eu te prometro que fe


entro em Athenas triunfante, feras em minha
Corte premiado, como merece tão gênerofa
acção. Pe
35 Labyrintho
2Dedal. Pois adeos, Principe, que lá te efpero.
Torna a ir.Je pela gruta.
Psfaz. Adeos, Senhor Dedalo, vofia mercê fa
ça muito boa jornada. - º

2 ezeo. Adverte, Esfuziote, que fe revelares o


, quc ouvifte , ferás caftigado por ElRei meu
pai, pois o braço de hum Rei chega a to
... da a parte; e fe fores fiel, e eu tiver a for
tuna de vencer ete montro , te prometto
... :hum premio igual á tua Iealdade. '
, Esfuz. Senhor, nem todos os criados hão de
, i fer lambareiros , peça a Deos que me te
nha mão na lingua , que eu da minha par
... te farei o que puder, ainda que me cute.
... , , , Sabe Licas Embaixador. . . . .
. Licas. Ai Tezeo, que infeliz ventura foi a mi
,nha ! Pois quando te julguei naufragante nef
fas ondas pela tormenta, em que tantos bai
xeis da noffa armada perecêrão, aqui te ve
nho a encontrar, depois de procurar-te por
toda efa marinha , para feres alimento do
. Minotauro: Oh que defgraça! *.

. Tezeo. Licas amigo, muito me alegro de ver


' te ; e pois que em Crcta vives com o cara
, éter de Embaixador de Athenas, para faze
res a funeta entrega dos fete infelices tribu
tarios do Minotauro, vem a aprefentar-me a
effe tyranno Rei , para que facie em nofo
fangue a fede de fua impiedade.
, Licas. Oh quem não tivera tal incumbencia !
- Esfuz: Ah Senhor Embaixador, º faiba Vofia
Senhoria, que eu não morri na வளை,
{
.. )
. de Creta. 27
. Licas. Eftimo a tua fortuna, Esfuziote; vamos
Tezco. ' - -

-Tezeo. Dizei-me primeiro quem era huma Nin


fa, que feguida de outras, em hum fetivo
coro por aqui paflou chamada Fedra ? ..
Licas. He huma Infanta, filha mais velha del
Rei, que com a bella comitiva hião para o
Templô de Venus , c Cupido , a qti&m fa
crificáo todos os annos, para que fe aplaque
o feu rigor, fazendo com que cefe a infa
me injúria do Minotauro,
Tezeo. E não era mais facil matar o Minotau
ro , para que cefe as fua affronta ? …...
Licas. Náo, que ete montro, como confagra
do a Venus, e Cupido, corre por conta def
tas Deidades a fua confervação.
Psfuz. E diga-me, Senhor Embaixador, quem
êra: · humaT femininfa_, , chamada Taramella ,
que tambem hia nefa, turba multa raparigá;
e por final que quando andava levantava os -
**
- pés do cháo? ._. . , , , ……...;
* * *
-
* **
.
· Tezeo. Náo te callarás ?. . . . '
. Esfuz. Ui Senhor, cada qual pergunta pelo que
lhe pertence. ، - ‫ملف‬.
• ‫م‬.

Tezeo. E quem era outra Ninfa, que no exer


cicioféra
ma
da ?caça a livrei da ferocidade de, hu
aw -

Licas, Seria fem devida a Infanta Ariadna , fi


lha tambem delRei Minos, que mais adora
a Diana nos bofques, do que a Venus nos
templos.
Tezeo. Ai Licas, que ela Ariadna. . . .
2Li•
28 Labyrintho
"Licas. Senhor, vamos: não cuides porora niño.
Tezeo. Foi a homicida. . . . -

Esfuz. Senhor, lembre-fe da fua alma, e dei


xe Ariadna. * ' . *P
Tezeo. Da minha vida primeiro, que o Mino
• *-* - . . . . . ; ; . . .” - -

. tauro. . . . -

Licas. Vamos, Senhor. * . . … - Vai-fe.


Tezeo. Vamos, Licas: ai Ariadna ? º Vaife.
“ Ëifuz. Ai Minotauro ! - Waiſe.
- - - . .. . . . . - t
- * >
S с EºN A. II. *3 : • --
**,
- - -
*.. . .
*- -~--> * . º 3 *, *, * ~ ºf " . * -

, Templo com as eftatuas de Kemus 3 e Cupido ,


· ý # buma pyra ardendo. _5ahe Lidoro , e ~
*..
-
-
- - - - cantafe o feguinte
--- * ------ *- -
-

гз", на в Со к о.

‫ س‬- ‫به مری‬
º‫های مشتاقهای‬,‫ده‬mora dores de Creta , chegai - * * - º
º
::* Ao .Temp lo divitio de Venus, e Añor.
‫ח‬c * . . -‫ג‬ 、い . . . . *s ○。、 ... -

Lidoro. Uiz anticipar-me nefte Templo


* :, … " de Venus, e Cupido, por ver
- ſe nelle encontro a bella Ariadna,
… e motra-lhe a fem, razão de fuandiotyrannia,
T. e. o jufto motivo” de meu ince ; s pois
· ſem que me valha o ſer Principe de Epyro ,
, e ter deixado a minha Corte, por vir a ef
ta de Creta , fó a pertender o ſeu ditoſo
"…" Himenêo, com tudo o feu rigor fempre im
* placavel fe moftra ás minhas fiñezas. O? Dei
dades foberanas de Venus , e Amor , em cü
: Jºs aras arde a viétima de meu coração,
- Z

de Creba, º, 29
zei que feja ditofo , º quem fabe fer amanº
te, . .. . ~

Ariad. Que violenta vinha, algum dia a efte


Templo de Venus, e Amor! Porém, depois qns
no bofaue vi aquelle... Mas quem eftá aqui à
Lidor. Quem ha de fer , fenáo huma , fombra
infeparavel do voflo Sol , que por influxo
· deflê mefmo Aftro fe confidera Clicie, de, vo(
fo refplendor ? . . .. 3. -

Ariad. Bem podéreis, Lidoro, deixar efalou


cura de vofo amor: não tem baftado tantos
defenganos, para defperfuadir-vos, que mais
facil ferá que o Sol, não allumie, que a ef
curidade ိိို , e que o fogo esfrie, que
no meu peito pofia haver amor , com que
correſponder-vos ? º. - -

Lidor. Em fim, Senhora, efe he o ultimo,de


fengano da vofa tyrannia? .. .
Ariad... Admiro-me que tenhais efte defengano
pelo ultimo, quando podéreis fazer effe con
ceito do primeiro. . . . . .
Lidor. Afim premiais as minhas finezas? ,
Ariad. Para que as obrates_fem minha licença,
fabendo que niño me ofendieis? , ," .
Lidor. Pois para que não vos ofenda quem fó
vos defeja agradar, eu me retiro dos votos
olhos, que fó por dar-vos efles prazer, ferei
cruel para comigo. .. . Quer irfes
Sahem o Rei, Fedra, e Tebandro. . ' '
Rei. Lidoro, que fisifo ? Quando todos vimos
a ete annual facrificio, que em oblação re
Verente confagia o nofo rendimento nas 鞏
- deſ
zo Labrinho
deas Deidades de Venus, e Amor, te re
tiras ?
Lidor. Senhor , a procurar-te hia, vendo que
tardavas. -

Rei. Fedra , Ariadna , não cefem as vofas


rogativas, para que elas deidades menos in-.
dignadas nos livrem da perpétua infamia defe
* Minotaúro , como labéo taffrontofo da nofIa
regia eſtirpe. Ai Pazife fragil , ſega a tua
- memoria abominavcl nos fecüios futúros ! "
Teband. Senhor, temo que ea melancolia te
'acabe a vida : lembra-te que és ElRei Mi
nos , para que com a tua contancia toléres º
os golpes do pezar.
Fedra. Senhor , Vofa Mageftade deve bufcar
algum meio eficaz , para que cefe a fua
mggoa , e a noſſa affronta.
Lidor. Tudo poderá ter remedio , excepto o
meu tormento. á parte.
Ariad. Senhor , fe etamos nefte Templo de
Venus , e Amor , porque não confultas o
feu Oraculo, para que nos declare, quando
º terá fim a vida do 'ိုီ႔ိ ... * *

Rei. Ariadna, effe confelho he filho do teu


fubtil engenho; pois attenção, que neta fór
* ma conſulto o ſeu Oraculo. Venus ſoberana,
compadecida a noffos gemidos , e grata a
"nofos, votos, declara-nos, quando terá fim a
vida do Minotauro, cuja exitencia aviva a
noſſa ignorancia.
- … T. . . . . .... . .. . . . ... . . .
.
.;
. .

* . - º
. . . - …
de Creta. " วิธ
canta º oratulo º fºguinte.
Quando defe biforme montro horréndo
Vires fer alimento combuftivo -

Hum vivo morto, e hum morto vivo.


Xei. Enigmatica , e prodigiofa he a repofta ;
pois diz , que terá fim a vida do Minotauro,
quando lhe fervir de alimento hum vivo mor
to , e hum morto vivo. Quem vio maior
confusão ! . -

Lidor. He etilo dos Oraculos refponderem por


enigmas. - -

Fedra. Que prodigio ! - -

Lidor. Ainda em maior duvida ficamos; pois


como poderá fervir de alimento hum mor
to vivo , e huın vivo inorto ?
Todos. Quem ferá efte morto vivo ?
Dentr. Licas. Tezeo, entra. -

Rei. Tezeo diferáo alli; parece myterio, e


que feria cafualidade. - -

Teband. Cafualidade he ; pois quem poderá


{er morto , e vivo ao mefmo tempo ? -

.$ahem Teze0 , Licas , e Esfuziote.


Tezeo. Eu , eu fou , ó Rei Minos , o Princi
pe Tezeo, hum dos fete infelices que Athe
nas envia para o feudo do Minotauro.
Licas. Tezeo , Principe de Athenas , foi fobre
quem efte ânno cahio a infeliz förte do tri
buto ; tão rigorofo he o efcrutinio, que nem
a fua regia pefoa fe póde izentar... __ .*.
Rei. Tudo o que vejo são prodigios! Vem,
e Tezco, a meus braços. -

Те с
3: " 'Labyrintho
Tezeo. Senhor, a teus pés fe oferece quem
já nem be fenhor da fua vida para dedicar
ta ; porém eftes, breves infantes , que o
alento fe me dilata , defcjára diminuillos ,
para que mais deprefia fe fatisfaça a tua von
, rade. *- ajoelh4.
Rei. Levantai-vos , efclarecido Tezeo , qüe fup
:pofto vos conduzifle a fortuna a táo infeliz
, etado , fetcis entre tanto refpeitado como
Principe , e não como réo.
Esfuz, 黑 muito boa confolação! Aquillo he o
me{mo que engordar para matar. -

Ariad. Ai de mim, que Tezco foi quem mc


„ livrou daquella féra, no boſque ! _ , á p.
Fedra. Oh quem pudera livrar a Tezeo de tão
funefta morte , pois a fua prefença conciliou
->
em meu peito , não fei fe amor, cu com
paixão! ã р.
Tezeo. Principe, finto com a minha vida não
poder remediar a vofa; porém o vofo valor
ferâ , o. lenitivo deffa infelicidade.
Iidor. Tezeo , os que nafcemos Principes izen
tos da jurifdicção humana, não nos podemos
... eximir da violencia dos aftros ,_ que influem
rigorofos; e afim não he necefario lembrar
vos de quem fois , para infundir alentos ao
. .. yefo e{pirito.
Tezeo. O meu agradecimento, e as vofas pie
dades neta occafião são inuteis.
Esfuz. Que efteja meu amo recebendo, em fua
vida os pezames da fua morte! He boa pa
chorra ! . . . - - - -

- Te
de Cretá, 33
Tezeo. Esfuziote , aquella náo he a Ninfa
que eu tive em meus braços defmaiada ? ..
Esfuz. Sim, Senhor, ela he a me{ma, e ve
體o que tem crefcido! Ah Senhor, e tam
em a outra he aquelloutra.
Rei. Dizei-me , Embaixador : e todos os fete
mancebos do tributo vem com o Principe
Tczeo ?
Licas. Como houve , Senhor, huma grande
tempetade , , em que o baixel naufragou ,
muita parte da gente pereceo , e dos tribu
tarios ſo ſe achäo ſeis com o Principe.
Rei. Eu não,heiº de receber menos numero.
e o de fete ; pois nem ainda todo efe
fangue he baftante para illidir as manchas de
voffas aleivofias. · · -

Esfuz. Efte Rei ferá amigo de farapatel º áp.


Tezeo, Senhor , , fendo eu Principe , parece
que valho por dous. ' - *

JLicas. E quando não, aqui etá ete criado,


ue completará o numero dos fete.
Esfuz. Irra: Ah Senhor Embaixador, faça-me
mercê de fe não meter com as vidas alheas :
he boa graça! - -

Licas. Não vês que ElRei etá teimofo em


que fejáo fete, e não ha fenáo, feis ; é co
mo tu eftás aqui , per força has de fer hum
delles ?
*蠶agetade.
Senhor
• ->
Minotauro , requeiro a Vofia
- - -

Tezeo. Adverte que ElRei chama-fe Minos,


e não Minotauro. - * -

Tom. II, ' Ç · £f.


34 Iabyrintho
Esfuz. De Minos a Minotauro pouco vai. _
Dicas. Senhor, Vofa Magetade faiba que ef
te homem he hurn tonto. - - .

Esfuz. Sim, Senhor, fou tão tonto, que def


fe montro não quero fer comido por conco
mitancia, e logo requeiro a Voffa Mageftade
que o Minotauro me não póde comer.
Rei. Por que ?
Esfuz. Porque he meu inimigo capital. tº
Réi. Por iffo mefmo te comerá. - ,;

Esfuz. Não, Senhor, que quem me quer mal


me não póde tragar.
Lião. Ó homem he divertido , quero apural
: homem , o Minotauro não fabe fazer
. lo
differença de amigos , e inimigos. ºr "

Esfuz. Ainda efa he peior! Pois, Senhor, eu


defengano , que fe o Minotauro me come,
bem lhe póde abrir a cova, que morre (em falta.
Lidor. Por que ? .2 。 - - -

Esfuz. Porque fou hum venerio. . . . .


Lidor. Tambem o Minotauro he venenofo, e
hum veneno não mata outro veneno. " ":
Esfuz. Para que fe cansão”, Senhores ? Sai
bão que eu para alimento fou muito indigeto.
Rei. Seja como for , elles háo de fer fete man
cebos os do tributo. &
Esfuz. A que de Vofia Magetade, Senhor,
por força háo de fer fete mancebos, * ----

Rei, Affim foi a capitulaçáo.» . .

Esfuz. Pois eu não pofio fervir para ifo.


Lidor. Porque não ? ! "
Elºá Porque não ; porque eu não fou fete
ma
mancebos , fou hum fó , e ainda effe fabe
Deos o que vai por cá.
Lidor. O Minotauro não ha de engolir os fe
te mancebos, juntos por huma vez , fenáo
- hum a hum. - *

Esfuz. Ui , Senhor , que tem o Minotauro


ue fe amancebar com a minha vida ?
Lidor. Senhor, o criado convém confervallo,
ue he galante. -

Reí. Andar, cuidaremos nife: o Embaixador


hofpéde a Tezeo ; Lidoro , vem comigo.
. . . Wai-ſe.
Lidor. Ainda fem efe preceito iria, fó por não
ver a huma ingrata, que tanto tyranniza os
meUIS eXtremOS. . . . Kai-ſe.
Fedra. Toda a minha alma occupa a pefloa de
Tezeo : verei fe acho algum meio de rédi
mir a fua vida. . á p. e vai-ſe.
Teband. Vamos, coração, a experimentar no
vas tyrannias em Fedra. á p. e vai-ſe.
Licas. Tezeo, vem. Pai-ſe.
Tezeo. Vai, que eu te figo.
Esfuz. Vá-fe cºos diabos Embaixador de huma
a figa, que eu lhe pregarei.
Tezeo. Beliflima Ariadna, que venturofa feria
a minha morte , fe eu levára a certeza de
que ao menos na tua memoria vivia confer
vado efte extremo de meu amor ! Lembra
te, bella homicida , não de me ifentares da
morte, que me e{pera, mas fim dete amo
rofo tormento, que me afflige.
Ariad. Tezeo quando neº- Vos ു.
. . . . ii О


36 Labyrintho
foraßeiro , reprehcndi o voffo- atrevimento ;
e agora que vos reconheço Principe , eſtra
nho muito o voflo delicto ; e pois quando.
me déftes a vida, prometti defender a vof
fa, etou prompta a cumprir a minha pala
avra. Ai amor, quem pudera declarar-fe ? á p.
Tezeo. Não peço recompenfa de huma acção,
que ao priñcipio náo foi executada a voíIo
refpeito , por fer cafual aquelle arrojo: do
meu valor, e natural obrigação. de hum ge
nerofo peito : fó defejára que não defprezafieis
efte bem nafcido affecto de meu amor.
Ariad. Principe , acceitai por ora a minhá recom
penfa, que quem vos ampara a vida, talvez
que a faça venturofa. - i

Esfuz. Acceita, Senhor» que ao máo pagador,


em farellos. * : * ‘. . -

Tezeo. E quem me afegura effa eſperança?:


Ariad. Se não vos fatisfazeis, da minha pala*
vra , folemnemente o jurarei nefia immortal
pyra de Venus, e, Amor. º,
Tezeo. Pois eu também para revalidar o meu
voto , nefa chamma de amor , , ferei Fenix
da minha fineza , para que das cinzas dos
teus etragos renafção os extremos dos meus
, ardores- * *

Canta Ariadna, e Tezeo o feguinte.


/Tezeo. O” tu candida filha do falfo elemento:
Ariad. O” tu céga Deidade, que as almas do
minaS »
Tezeo. Sabei º que eu amante » :
ፈrí
º - .
- 'de · Creta. - 37
Ariad. Sabei, que eu contante , ! . . .

Tezeo. Prometto abrazar-me de amor nos in


- incendios, -

Ariad. Promerto guardar do Principe a vida,


Tezeo. Com fé inviolavel , - -

Ariad. Com voto fagrado, - -

Ambos. Da morte , e da vida no ultimo efta


do. . . . . . .”. Pai-ſe.
Esfuz. Náo_ me póde efquecer alcovitar-me
o Senhor Embaixador , para que eu foffe
patinho do Minotauro ! Mas pelo fim, pelo
não, já que me acho recolhido no fagrado
dete templo, daqui não fahirei ainda que me
deitem a páos , mas ai que ahi vem aquella
moça chamada Taramella , que eu ví no bof
que ! Eu me efcondo atrás de(ta eftatua, pa
ra que me não veja, e obfervarei o que faz.
Poem-fe Esfuziote a traz da Eftatua , e fabe
Taramella com huma va/joira na mão.
Taram. Graças a Cupido, que já todos fe fo
rão, e poderei fem impecilhos exercitar o vo
to, que tenho feito, de varrer todos os dias
ete Templo de Venus , para que me cafe
com hum moço frança, detes de pata na
cabelleira, e relogio de pendurucalhos!
Esfuz. Ai que Taramella quer que Venus a ca
- fe! E ella o fará. Valhâ-me 'agora a induf
tria de amor. - - - - - - - - -

- - .. . " -

Marrendo o Templo Taramella, canta o feguinte.


Taram. Ai amor ,º fe me dás hum marido ,
Vaffoira vivente do Templo fº,
38 Labyrintha
Esfuz. Quero fingir que fou Venus. : *
Canta Esfuziote o feguinte em falfete.
Taramella, fe,queres marido - -

Aqui me{mo no Templo , no Templo o darei.


Taram. Ai que Venus me reſpondeo favoravel -
- á minha, petição.! Oº minha Deofa, dizei
me outra vez quem ferá o meu dirofo marido ?
Canta Esfuziote ofeginte Recitado em falfete.
"Teu marido ferá em teu conforto º
Hum morto vivo, e hum vivo morto.
Taram. Que galante repofta ! . Entendo.…que
nunca, cafarei; pois como póde fer meu ma
rido hum... yivo morto ? , "ĵ .:._ :്:

!'Sahe Esfuzíote. ."' ! ! ! !


Esfuz. Agora cง : Sapientiffima Taramella, h §
naufrangante peregrino, combatido das on
: das , mareado dps mares , açoirado dgs , ven
tos, e enjoado das marefas, vem hoje a of
ferecer „o traquete do feu amor aos joanetes
de teus pés, para que dependurado no tem
plo de tua formoſura, ſe oſtente troféo da tua
galhardia. º
- - ". . -

Taram. Que galante coufa !... Explique-fe..., que


eu ainda não fei o que vofia mercê me dife.
Esfuz. São efeitos do crepitante incendio, que
o bolcão de meu peito tranfpira pelos metos
do idioma. - -- ** * * * *
* Aram. Senhor Etrangeiro , eu não entendo
Palavra. - - -
Ei
w - de Crétd. - 39

Esfuz. Já que não entendes de eftylos crefpos,


te fallarei em frazes etiradas. Eu , Senhora
, ,Taramella , fou hum, Soldado da fortuna , que
a venho bufcar mais ditofa no conjugio de
' vofla mercè. ** - -

Taram. Tire-fe para lá não venha zombar da


gente; ande, va-fe , deixe-me acabar de var
rer, para que entre o lixo do Templo en
contre o marido, que a Deofa me pomette.
Esfuz. Sufpende, galharda Ninfa, effa'vofloira
dos fentidos, effa efcova das almas, efe baf
culho do coração, effe efpanador das poten
cias, e efle esfulinhador dos afectos; pois
já por ti me confidero louco varrido.
Taram. Ai Senhor, não me falle nifo, que
eu fou muito fizudinha, e huma moça don
zella , que etou aqui para honra , e cafa
INETTO. - . is ,

Esfuz. Se eftás aqui para honra , e cafamento,


tudo achafte em mim. : " "
Taram. E de qué fórte ? - - -

Esfuz. Eu te digo: fe efás para cafamento,


aqui tens marido, e fe para honra, honra
terás fe cafares comigo; e não digo o mais,
pois fem faber fe me queres, não te direi
quem fou . - "; , ,, ,
Taram. Pois fó faberei querer, quando fouber
quem vofa mercê he. " º : - ''">
:Esfuz. Pois Taramella , "promettes pôr o teu
nome na boca"?… , " " ":" " . . º.
Taram. Sou tão callada que não como por não
abrir a boca. sº E
s
4O Eabyrintho
Esfuz. Já que és tão fecreta, faberás, que eu
fou o Principe Tezeo fobre , quem cahio a I
fórte , ( ou o azar, para melhor dizer) de
fer alimento do Minotauro : eu para efcapar
deta comichão, me ajuftei por huma grande
fomma de dinheiro com hum criado meu ,
chamado Esfuziote , para que diffeffe que era
eu, e déle a vida por mim ; e como o cria
do me queria bem, não foi dificil d morrer
por mIm. - - - -

Jaram. E ha homens que fe matão por di


nheiro. -

Esfuz, Filha, todos morrem por dinheiro. Em


fim trocámos os veftidos, e os nomes; pois
y elle morre com o nome de Tezeo , e eu vi
vo com o de Esfuziote. -

Taram. Ai Senhor, Vofa Alteza, fendo quem


he, quer cafar com huma rafcoa, podendo
, º empregar-[e emº huma Princeza?, Ajoelha.
Esfitz. Levantai-vos: prometti a Venus em hu
ma tempeftade , que tive , cafar com a pri
meira mulher, que vifle em terra , que fote
tu , fe acafo te lembra hum bilifcáo , que
r:
te dei hojec.(,*, *-*.
bofques... vindo“ tu dançando por efles
-

Taram. Ai, he verdade ; bata que foi V.


Alteza !… … … *… tº -

| Esfuz. Fui eu que te quiz marcar com a unha,


para a todo o tempo te conhecer; pois que
dizes ? Etá juíto o teu amor, ou ainda pec
ca" em alguma defconfiança ? ... .
Taram. Senhor , tudo etá muito ‫معينة من‬
Çs

de Creta: 4f.
" Venus me diffe , que havia fer meu marido
hum vivo morto , e Vofa Alteza não he - *
-
...
- - - -- -
is "… i
morto vivo. · . . . . . . . . . -

Esfuz. Ifio he o que te parece; queres ver co


mo eu fou effe , que te diffe a Deofa ? Ora
attende, . .. . . . . * ,

so N в то. , :
!Eu fou , ô Taramella , o vivi morto , ` ` ` `.
器 por ti me imagino morto, e vivo, º
as não cuides, que vivo, porque vivo,
Pois ainda que vivo, vivo morto: i -> \º.
Na cova de hum defcem me enterras morto,
No aceno de hum favor me alentas vivo »
Se me affagas, deperto como vivo ,
Se te agatas, esfrio como morto : : -
Neta batalha, pois, de morto, e vivo , , , , ,
Na vida de hum favor me alentas morto,
Na morte de hum, deídem me matas vivo. º
Sou em fim morto vivo, e vivo , morto,
Se qual Fenix nas cinzas, quando vivo, º
Maripofa nas chammas, quando morto.
Taram. Já fei que Vofa Alteza he, o vivo,
e morto que me diffe a Deofa; mas como
cafa por voto, e não por amor, ferá o feu
matrimonio mais por força que por vontade.
ತ್ಗ Taramella, no amor toda a vontade he
orçada pois quem por feu goto ha de ap
petecer os fopapos de Cupido , e os pontapés
de Venus, que para adorno do feu rigor 'fa
zem galla da tyrannia , e gallacé do mar
пуrio : . … . . . . .”
- T4→
4? Labyrintho
Taram. Para que focegue a minha defconfian
2 ça » e acredite o ſeu amor, meta Voſſa Al
teza a mão naquelle fogo de Amor, no qual
fe experimenta dos amantes a contancia; fe
a chamma o não abrazar , reconhecerei que
me quer bem , e quando não, he certo
que quem fe queima alhos come , que efia
he a virtude éfpecial daquelle fogó.
Esfaz. E que o tern amor com os ahos º
Taram. Não vê que o alho defroe a virtude
do Iman, que he o fymbolo do amor?
Esfuz. Ifo he coufa de Poetas; mas fe queres
<que pelo meu amor meta a mão neffe fogo, ed
º farei , que "feelle não abraza a quem ama,
feguro eftou de offender-me o feu “incendio.
Taram. Ora vá, e não trema. ::
Cantão Esfuziote, e Taramella 4 feguinte º
onv: A R I A A D U O. 7
Taram. Meta a mão na chamma ardente, ,
: E verei, o feu amor." " * : *
Esfuz. Tu verás como valente
•t Náo me abraza o ſeu ardor ; '
… v. --, Mas ai, que me abrazo Mete, a mo.
La Mas ai, que me queimo ! * *
Taram. Aſſopra. . c. . . . . . .
üz-» Eu iaff9pro... … … … . … ***
T aram. Vá-ſe : ahi }*, *: . e'. Esfuz. quan
* -

. . Já fei me não ama. … … ಫಿ",:


Esfuz. Se vès, que me inflampmo , para : o ſeu
... -- Por iflo te amo, ♥ ♥, peito , e fa
Ambos. E feacafo ainda o duvidas, ram: pºrº º
Eíte fogo to dirá. pyra.,
.. . Tâ
de Cretă. 43
Taram. Já tenho entendido, Na palavra
Esfuz. Já tenho alcançado, 器 аратtа
Taram. Que o cégo Cupido, ງູ'a';
Esfuz. Que o montro vendado , fíz, e efie pa
Ambos. Ahi náo etá, . . .» ra a pyra,
- &ahe Sangmixuga.
Jang. Tambem efte motto to dirá, defawergo
nhada, louca, furadas do miollo ; tu aqui
cantando fó hum Duo com hum machacaz?
Ai mofinos feßenta e tres: annos!
Taram. Minha tia, não fe agate, que malfa
be o que vai. " .. … º
3'ang. Que vai, nem que vem ? Que fazias
ahi dando á taramella Yeom effe magano ?
Taram. Ai, que blasfemia ! Náo diga tal, que
mal fabe quem ali etá.… ** º

Esfaz. Sempre hei de encontrar com velhas!


He bom fadario ! , , , … . . -
Sang. Pois dize-me, que homem he effe 2.
Taram. He hum homem grande; nós falare
mos mais de vagar. * , - - -

Sang. . Homem grande he beta de páo, e tu


és beta em carne, que te deixas enganar de
femelhantes velhacos.
Esfuz. Que he iílo , Taramella ?s v... . . . . ?
Taram. Senhor., he minha tia, que fe vem
pôr aos pés de vofía Alteza. Tia”, faça o
que lhe digo, que não fabe a fortuna, que
nos efpera. ...й р.
Sang. Senhor, Vofa alteza dê-me os feus pés.
Esfuz. Se vos der os meus pés, ficareis com
quatro.
- - - . Sari
:44 Labyrintho -

"Sang. Senhor , Vofa Alteza releve a minha


defatenção, que eu o não conhecia.
Esfuz. Náo vos culpo o náo conhecer-me, que
… nós os Principes não temos fobrefcripto, e
ainda que o tivera , como não fabeis ler ,
não podieis foletrar no alfabeto de minha pef
foa os caracteres de minha nobreza: levantai
, , vos: como vos chamais ? -

Sang. Sanguixuga , meu Senhor. * .*


Esfuz. Sanguixaga ? Não vos peze, que em cer
ta parte valereis muito. _ -

Sang. Ifo são favores que Vofa Alteza me faz.


Esfuz. Pois ficaivos embora, e dizei a vofa
fobrinha, que vos partieipe o bem que lhe
efpera: guardai fegredo , que a vós tambem
vos cafarei com o meu Embaixador, para que
... a vofIa, defcendencia faia á luz. " . ' -

Sang. Ai Senhor , eu já fou quinquagenaria »


e não fei fe poderei cafar. . ‫بر‬
ಸ್ಟ್ಗ ¿A?gora , ainda eftais capaz de romper
umas fólas ; e no cafo que vos feja necef
r" faria menos idade , eu vos mandarei paflar
º huma provisão , para que tenhais fómente
quinze annos. .z., : - . ::: i Wai- e.
3ang. Rapariga', que diabo he ifto ? Conta-me ,
…º que: etou confufa.…. …" •
* Ҽ -

2 aram. Senhora, aqui não diſſo; vahe lugar


etimos para cafa , que lá faberá coufas nunca
-

„w viftas. Wāoſe. • *,
-
**

-
a + r., - - --
: , : ;n , ' ' . . . *_s::: , y
. .
rſ(. * 。": 、" : . . . . .. .. . ~ *- : *

*
* *

SCE
, de Creta: 剛覺

, s c E N A III.
cոաւ ..ŷabe Fedra.

Fedr4. Ꭰiⓐ que no templo vi ao Prin


cicipe Tezeo, não fei que doce at
tra&tivo fe occulta em fua pefoa, que por
mais que o defvie do penfamento, me pe
netra o coraçáo! Oh, ninguem eſtranhe os
precipicios de amor, que do mais ifento peito
fabe 'triunfar ! E pois me confidero amante ,
bem he que defenda a fua vida 1.
: ` ` :: &abe: Lidoro.
Lidor. Já o que as incriveis finezas de meu ex-.
tremo lamentáo os deprezos de Ariadna, rc-.
correrei: ao ultimo artificio de amor , que he
abrandar, o feu defdém com º outro defdém;
· para o que me quero declarar amante de Fe
dra. Mas ella aqui etá. , :" , ",
Fedra. Lidoro , que profunda trifteza vos pena
liza ? . Por ventura minha irmã não merece
jubilos em vofo coração ? -

Lidor. Bem he verdade, Senhora, que quan


- do cheguei a efta Corte de Creta a prèren
: der efpofaina Regia eftirpe de Minos, voflo
, pai por achar ao Principe de Chipre preten
dendo a vofa beleza, foi precifo por não
defgotar ao Principe no feu empenho, fervir
eu a Ariadna ; porém como efte rendimento
era mais hypocrifia da política, que rendimen
to de hum verdadeiro culto , fempre ardee
- 1ՔՂա
46 Labyrintho
impuro a vičtima , e violento o facraficio 3
porque 9 mefmo fufpiro , que o siricendia ,
era parocifmo , que o anniqüilava : e affim , ,
galharda Fedra, fe até aqui viveo opprimida
a minha inclinação a violencias de hum ref
peito, agora que impaciente a minha dôr, rom
pe o reverente filencio, defejara , não que
me premiaffeis a minha fineza, mas fim que
recebeffeis o tributo de minhas adorações.
«dra. Cuido , Lidoro , que o voíIo amor de
º generou em loucura. º, ºf º
--- Sabe Ariadna ao baftidor.
Ariad. Verei fe encontro a Tezeo. Mas aqui
etá Fedra com Lidoro: efperarei que fe vão.
Lidor. Só a vós, gaiharda Fedra, confagro os
- finos ardores de meu peito.…… "
Fedra. Ainda que º me fora licito acreditar efa
fineza, como toda a Corte fabe , que Pu
- blicamente fervis a Ariadna, feria indecente
defatenção correfponder eupa hum amante de
-.minha irmá … : ' ·· · · · · · ···· · · ¡ ” . '.
Ariad, Que ouço! Lidoro pertende a Fedra ?
Se eu lhe tivera amor", motivo: havia Para
-rrero zelos. *** 2 : *~ *, * º
Lidor. O motrar-me algum dia amante de Aria
dna, póde fe emendar com algum pretexto de
razão de eftado, que nos Principes helicito
... o variar de intentos ;.…pois fempre fe doura
a defatenção com os interefe" da Monarquia.
. Mas cuido º que ahi veio Ariadna…: eu me
retiro, Senhora, para que vejais que fó na
vofia vißa mc eicĝo.
- JEf.
r
de Creta. * ,\ 47
Efconde fé Lidoro junto ao bafidor, e fabe
Ariadma. :
Ariad. Agora verá Lidoro - fe fei vingar os
meus defprezos. - .
Sabe Tebandro do baffid6r. * : *
Tebrad. Vou receber de Fedra o ultimo defen
gano. Mas com Ariadna eftá ; eu me retiro
Ariad. Como na monarquia do amor o intere{
fe fabe dourar defatenções, por efe motivo
me animo a dizer-te, que como fei dedenhas
ao Principe Tebandro, e eu tambem por na
tural antipatía aborreço a Lidoro , que tro
quemos os amantes , para que na mudança
dos fujeitos mude tambem o coração de af
fectos.
Lidor. Ah tyranna inimiga, náo ſem cauſa eråo
os teus defwios. . . … Tv, ºs ºº ºº ººº *-*'
Teband. Ariada me favorecê , hão ferá défacer
to wingar-me de Fedra. . . . . .” . . .
Ariad. Só defa forte fera ditafo o nofo híme
nêo. Fedra, que dizes ? . . . . . . . . . .'; '
Fedra. Eu não troco a quem adoro por nenhum
outro amante; pois vivo tão fatisfeita com
o meu amor, que não acho outro equivalen
te que o pofía recompenfar." Ai Têzeo', '{ó
a ti fe dirigem os mudos fufpitos, 'de' ffieu
peito, … "' . . ... .
Tahand, Alma , refpiremos. . . . . ..
Lidor. Quem víra o feu amor tão premiado ! :
Ariad. Se fei deprezas a Tebandro, para que
affectas efe carinho , fó para que não tenha
a fortuna de ve-me querida delle ? Olha,
"que em Lidoro acharás melhores
-
fileza a
48 Labyrintho
Fedra. Porque defprezas a quem te fabe amar?
Ariad. Porque não fei amar a quem aborreço.
Lidor.Jº me falta o foffrimento'; voú-me an
tes que me acabe a deeperaçáo. Kai-fe.
Fedra. Se tu não pódes amar a quem aboreces »
eu não pofo aborrecer a quem amo.
-, , , , ...-. Canta Fedra a feguinte
- *** ** - A R 1 a.
.…...…. Querendo a quem amo, 2

, , ,__
… Não
AN3 bufce mais gloria, e º
• *, * * tº: , Não quero outro amor.
- -

..…_ No bem, que me inflammo


. . . . . Confegue a memoria -
Triunfo mayor, . . Qazer ir-fe,
- - &abe Tebandro.
Teband. Efpera contante Fedra; deixa que
rendido aó bello fimulacro de tua Deidade ,
confagre edorações quem fe acha favorecido
dos téus agrados. - - - - -

Fedra...NãoTeique, coufa vos motiva a efle.


rendimento ? *、*、* e -

Teband. O ver corre(pondida a minha fineza.


| Fedra. Que quer dizer correfpondida a vofa fi
neza ? Se eu entendera que o meu coração
era capaz
meu peito,defe fentimento,
tº a
o arrancára
… "
de
ſ.

Teband, Parece improprio effe defdem á vifta


' da confifsáo que agora fizeftes. -

Fedra. Quando as vozes fe encontrão com os


afectos, melhor he crer a etes, do que aquel
las. - z Waife.
-->

് - - - . . . . . .34:
de Creta. 49
/ Sahe Lidoro ao baftidor.
I.id. Impaciente em nenhuma parte focego. Mas
que vejo ! Tebandro com Ariadna ? Obferva
rei o feu intento. ;
Teband. Quem vio, Ariadna, o feu amor em
maior confuzão ! Já não quero amar a hu
ma ingrara, que me ofende; e pois fei que
para o teu agrado prefere á minha fortuna
a de Lidoro, quero feguir as luzes de teu ef
plendor , já que propicios allumião a esféra
de meu peito, e afim.... -

Ariad. Muito me ofendeis nefe vil conceito


que de mim formais; pois a fer pofivel que
a chamma do amor ardefe em meu peito,
não ferieis vós a caufa defe incendio; pois
naquelle, que me idolatra , _fobráo motivos
para o meu rendimento. Ai Tezeo, fó a tua
fineza ferá premiada. .. . á р.
Lid. Coração, torna a reviver.
Teband. Pois vós mefma não difeftes a Fedra,
que na mudança dos fujeitos mudaria o co
ração de affectos ? -

Ariad. Se vedes agora contrarios effes affeétos,


crede aos olhos, e não aos ouvidos.
Tebund. Já fei, que defenganado, fó amarei a
minha morte. Oh louco amor , que me{cio
he quem fe fia das tuas incontancias! Vai-fe.
.$ʼahe Lidoro. -

Lidor. Já fei, Ariadna, que não fou tão infe


liz como imaginava ; e fuppofto me confi
dere fem meritos, para alcançar teus fobera
, nos favores, a tua piedade, compadecida dº
. . - D pneú
50 Labyrinto ( -
meu tormento , já me coroa triunfante dos º,
teus repudios. . . . .
Ariad. Lidoro , como enfermais de amante , fem
duvida efia idéa ferá delirio da fantafia.
.
Lidor. Parece incompativel effe devio , e aquel
la exprefsão ; pois afirmaftes que naquelle
ue vos adorava, ( que já vê, que fou eu )
obravão motivos para o voffo rendimento.
Ariad. Não ha duvida que o meu amor, con s:
feffa rendimentos , e por ifo como rendido
vive prefioneiro de hum dedém , que he o
que fó triunfa na batalha da vofa porfia.
Lidor. Ah tyranna , cruel, inimiga, não era
melhor deixar , que a contingencia da fortuna
mudaffe o teu rigor, e não com o defenga
no fepultar a viva contancia da minha fé?
Ariad, Náo , que á voffa pórfia fó fe defvane
ce com hum total defengano.
Lidor. Já que defenganado morro ás violencias
defe nunca vito rigor , não e{tranheis os
delirios da minha magoa nos ultimos perio
dos da minha vida. -

Canta Lidoro a feguinte


А к і л.
Já que eu morro, ó féra Hircana,
Sem remedio a teus rigores,
Impaciente, louco, amante
Delirante, - - - -

Com gemidos, e clamores,


De ti aos Ceos me hei de queixar.
A minha alma ; vaga, errante,
Náe -
de Creta. . 5*

Não te afutes, quando a vires,


Que por mais que te retires,
Te ha de fempre acompanhar. Vai-fe.
Ariad. Ninguem pretenda violentar a vontade,
ប្ដ vive ligada ás violencias de outro amor.
i Tezeo, que as no las vidas ambas fe con
fiderão tributarias, fe a tua ao Minotauro,
a minha ao amor!
<Sabe Esfuziote com hum papel na mão, e ajoe
lba.
JEsfuz. Deos vá comigo: Senhora, hum reque
rente da fua vida vem hoje a pertender no
Tribunal de vofa piedade a renovação de mais
vidas em hum prazo foreiro á morte , que
o querem julgar por devoluto ao Minotauro,
ue intenta fer, o direito Senhorio deta vi
a; e fe Vofa Alteza, Senhora, me alcan
-ça a fupervivencia , eu lhe pagarei o foro
da confciencia com o laudemio de mil lou
wores.

Ariad. Levantai-vos; que he o que quereis?


Psfuz. Efte murmurial o dirá.
Ariad. Lede-o vós mefmo. - --

அ; Pois já que eu fou o pio leitor, "feja


ofia Alteza a piedofa. ouvinte. -

D E C I M A.
Diz hum pobre Esfuziote
Condemnado a não ter vida
certa morte atrevida
Lhe quer
-
P་ཏཱ་ཧྲུ་༑ bun
• U 11
calôte :
52 Labyrintha -

Que pois não he D. Quixote "


Para acções defta relé, º *.*

Pede humildemente que, *


Antes que morra em taes damnos a
Lhe dem de vida cem annos,
- E receberá mercè. : .
Ariadº Supponho que fois a quem o Embai
xador de Athenas ofereceo a ElRei meu pai
-獸 completares o numero dos fete do tri
utO. -

JEsfuz. Sim, Senhora, eu fou o proprio, a quem


impropriamente o Embaixador , que o diabo
o leve, me malfinou a Sua Magetade, que
Deos guarde. * : * ~ * 1.

Ariad. O Embaixador não andou bem.


Esfuz. Como havia de andar bem , fe ele he
zambro; pois não fendo eu nenhum dos fe
te , fobre quem cahio a fórte, como quer
deta fórte trocar a minha fórte, pois ifto fe
não deve fazer de nenhuma fórte ?
'Ariad. E vós a que vieftes a Creta ? . _ .
Fsfaz. Vim acompanhando ao Principe Tezeo.
Ariad. Sois feu criado ?
JEsfuz. Algo mas , fou feu gentil-homem , e ás
vezes em cafo de neceflidade firvo de ca
mareiro. :

Ariad. Na verdade que finto muito a defgraça


de-Tczeo.
Esfuz. Mais a fente elle; porém parece que
ele não fente tanto a morte, como outra cou
fa, que diz tem atravefada na garganta co
mo efpinha de cação. -

* . . - - Ariad.
de · Creta. 53
Ariad. Que coufa póde haver, que finta mais,
que o morrer ? - . .
Esfuz. Segundo o que lhe ouvi dizer hum dia,
parece que hum menino cégo, e nú, pef
pegou-lhe com huma fetta no coração , que
o partio de meio a meio; e efte golpe , por
lhe ter chegado ao vivo, o tem quafi morto.
Ariad. Pelo que dizes, Tezeo, padece o mal de
armor. -

Esfuz. Não Senhora ; eu cuido que he mal


de Ariadna, pois fempre o ouvi queixar : ai
Ariadna , que me matate ; ai Ariadna, que
me fizete, e acontecete ; com que Ariadna
he o feu mal, e não o amor.
Ariad. Pois dizei a Tezeo , que effa Ariadna. . .
- J'ai andando.
Esfuz. O que hei de dizer, Senhora ?
Ariad. Mas não, não lhe digais nada.
Esfuz. Sim, Senhora, eu lhe direi ifo ; po
rém , Senhora , terá defpacho o meu me
. morial ? - - .

Ariad: Bafta feres criado de Tezeo , para vos


apadrinhar. -

B് Ora não fe efqueça de fer minha ma


drinha_nefte, negocio. 3.
Ariad. Ouves tu, dize a Tezeo que não he elle
fó o que... mas não, não digas nada. Lou
co amor, não me precipites. 4. p. Vai-fe.
Esfuz. Que cata de recado he efte: Dize a
Tezeo , não digas nada a Tezeo ; a mim
me melem (e o nada deta Infanta não he al
guma coufa , e fenáo quem viver verá.
-
-
„Ул
-
54 Labyrintho
- Sabem Taramella, e Sanguixuga. " "
Taram. Senhor, Tezeo. , , , - * -

E;ftwz. Tá , tá , Taramella , náo me chames


Tezeo tanto ás claras , · que no Paço aré as
paredes tem ouvidos; trata-me por Esfuziote »
J em ordem a maior disfarce. -
-

• Sang. Meu Senhor, eta rapariga tem o mio


lo muito leve, por ifo não peza o que diz;
e Voffa Alteza (perdoe-me) fez muito mal
em communicar-lhe fegredo de tanta fuppofição.
Esfuz. Olhe tia. --

Sang. Ai Senhor , eu tia de Vofia Alteza!


Quem fou eu para tantº dignidade ? º
Esfuz. Não pofo tirar-lhe o gráo, que por af
finidade lhe pertence.
4'ang. Serei o que Vofia Alteza for fervido.
Psfuz. Mas, tia, como hia dizendo , não pu
de deixar de communicar a Taramella a mí
nha regia profapia; que quem ama devéras,
não fabe mentir. - -
Taram. Pois Senhor, he pofivel que eu de
criada hei de paffar a Princeza ?
Esfuz. E não he peior paffar de Princeza a cria
da ? Pois fabe que defas montrolidades fe
achão nas hiftorias; mas com tua licença ha
vemos mudar efte nome de Taramella, que
não he decente para huma Princeza de Athe
nas , pois taramelia he coufa que anda por
portas, e não por thronos." . . .
Sang...Tudo fe fará: mas diga-me, Senhor,
h Vofa Alteza diffe ao Embaixador, que eu
avia de caſar com elle ? . : ' * " !
- - vº Es-
; de Creta. 55
Esfuz. Sim, fim, já lho infinuei; e o Embai
xador , vendo que era goto meu efte fan
guixugal matrimonio, diffe que eftava promp
to; com que em, o vendo, falle-lhe na ma
teria. w -

Jang. Ui Senhor, pois eu fendo mulher hei


de falar primeiro a hum homem, em cafar?
Appello eu por mim! - -

Esfuz. Não fe lhe dê diffo, que o tal Embai


Xador he mefmo acanhado de fi , curto dos
nós, e vergonhofo. Ao menos não fe livra
rá o Embaixador do Minotauro defla velha. áp.
Taram. Tornando ao noflo intento , digo , Se
nhor, que já me tomára ver nefas limpezas,
para ver fe Fedra, e Ariadna são melhores
do que eu. . . . / -

Psfuz. E, talvez que então tu as não queiras


por tuas criadas. -

Taram. Effa me{ma grandeza me faz defcon


fiar da fua palavra. -

Sang. Ui tolla , tu chegas a dizer, que de


º confias da palavra de hum Principe ? Senhor,
- releve , que são raparigas, que cuidão que o
mefm9 são alhos que bugalhos.
Esfaz. % he cofume nas fenhoras mulheres
cuidarem que os homens fempre as enga
não : pois para que vejas que mais deprefa
faltará agua no mar , do que amor cm meu
peito, quero praguejar me, que he o verda
deiro juramento, dos amantes.
* - -

-- - - - -
* ‫ش‬ -Czht
56 - Labyriniho * ,

Canta Efuziote a fºguinte


A R 1 a.
Se cuidas menina, it. . . . ..
Que eu feja prejuro, …
Pois olha , eu te juro, - -

Hum raio me parta,


Me abraze hum corifco, ,
O diabo me leve, .

Se eu falfo te for. * - - -

Mas ai , Taramella, ". . .


Se és linda , fe és bella , -

Terás em meu peito - * -


Seguro o amor. - Wai-ſe.
Sahe Licas Embaixador. &

Licas. Vite a Tezeo por aqui? . * - -

Sang. Ainda agora daqui, fe vai..... Não he.


défpeciendo ô meu futuro noivo! *, á p.
Licas. Vou a falar-lhe, que importa. . . .
Taram. Efpere, Senhor, que minha tia tem
que lhe dizer coufa de importancia: falle, tia,
-Sang, Ai rapariga , deixa-me tomar o folego ,
que etou embaçada. - -

Licas. Diga deprefa, que não tenho muito vagar.


Sang. De fórte,, Senhor, que eu bem fei que
não fou capaz de fer fua criada. -

Licas. Que mais ? -

Aang. Que mais hei de dizer? Vofa Senhoria


não me entende já o que quero dizer ? .
Taram. Ora Senhor, não feja acanhado , que
ifo he não fer homem.
Líras. Que dizem, que as não entendo ‘sነšሼž
-
de Cretá. 57
Áfang. Não fe faça agora moquenco, já fabemos
que he curto dos nós. - -

Taram. Não disfarce o negocio; não feja ver


gonhofo. - - -

Licas. Etá galante hitoria ! Que he o que que


rem de mim ? ! -

Jang. O matrimonio. - - - -

Licas. Que matrimonio? Que he io? ، -٤ ‫د‬


Sang. Faça-fe agora de novas.
Licas. Deixem-me, doidas, que diabo querem ?
Jang. Taram. O matrimonio. -

Licas. Eftas mulheres etáo loucas; vão-fe já,


não me perfigão. Wai-ſe.
Jang, Taram. O matrimonio, Senhor Embai
xador , matrimonio. Wºo-ſe. - -

s c E N A iv. t

Gabinete. Sahe Tezeo.


Tezeo. A Gora acabo de conhecer > que hº
o amor mais valente, do que a
morte, pois quando por inftantes me fepara
a furia do Minotauro, vence na minha me
moria mais a tyrannia do amor , que o ima
ဖွံ့ႏိုင္ရ eftrago da fua crueldade. Mas ai, fo
rana Ariadna, º quanto finto., que a cruel
Parca corte o vital alente da minha vida,
pois quizera eternizar a minha fineza a pezar
da méfma morte ! - *
---
-

$abe Fedra. . , . -

Fedra. Invicto, e fempre efclarecido Tezeo;



38 Labyrintho,
º cujo valor , depois de fer adorado futo do r
Orbe, paffou a domiñar , as fufias do Coci
"to; commovida a minha piedade de que tão
generofo alento feja infeliz depojo defa fé
ra, intenta falvar a vola vida. !

Tezeo. Galharda Fedra, fe eu nas infelicidades


fou tão venturofo , devo etimar a minha
defgraça. : ?
* Sabe Ariadna ao baftidor.
Ariad. Aqui Fedra, e Tezeo ? Ai de mim,
que já o coração começa a temer! …"
്. Para triunfardes pois defle , invencivel
' monftro , dar-vos-hei huma certa confeição
compota de tão activo veneno, que ao mi
nimo contacto do Minotauro fique protrada a …
ſua furia, ſem que vos poſſa offender o ſeu
furor.* - * *

Ariad. Aquella fineza he mais que piedade: ze


los, não vos declareis, que ainda me não con
vem motrar-me amante.
Tezeo. Que recompênfa poderei achar em mim,
. que poila fer igüal á voffa generofidade : Ef
ta vida, Senhora, de cujos alentos", fois tu
telar divindade, vereis que como milagre do
agradecimento a dedicarei, nas aras da voffa
belleza. - . . . . . . . . . "

Artad. Ah falfo amante, não te- quizera agra


decido.-- -- I - ". . .
- - - . .

Fedra. Náo quero outra recompenfa máis que


vos lembreis de não fer ingrato a quem ex
· * Põem á fuá vida por redemir - ¿Vófiá.
-
rது. 6's

/
- de Creta, A 。分乡,
Tezeo. Quem víra efte amor em Ariadna , ou
a fua belleza em Fedra! -
- Sabe Ariadna. a

Ariad. Principe , como para a izençáo da mor


te não bafta fó vencer o Minotauro , pois
fempre ficarcis prezo no enleio do Labyrin
tho, e para que com a fuga completeis ef>
fa fortuna, quero prevenir o remedio da vof
fa liberdade. -

Tezeo. Ariadna fem duvida fabe o intento de


Fedra. á part. Senhora , fe Fedra compafliva
da minha defgraça.... . -

Ariad. Para que me contais o que eu fei?


Tºo. Foi precifo, que, agradecido..…
Ariad. Já lei que ágradecido vos motraftes á
fua fineza. -

Tezeo. Porém, Senhora, nunca o meu amor...


Ariad. Não tendes que fatisfazer-me: não fa
beis quanto me agrada faber que fois agra
decido , ne, em vofia pefoa cabião, defat
tenções; e para que tambem, eu o feja, na
vida, que me detes, quero dar-vos a liber
dade; para o que atareis na porta do Laby
rintho hum fio, que fendo farol naquelle pe
lago de confuzôés 3 vos conduzirá á liberda
de 2 e com ella podereis tornar para Athenas
voffa Patria.
Tezeo. Se cuidas que com a liberdade hei de
醬 dos meus olhos, nunca fahirei do
abyrintho , que ao menos em Creta não
vivo deterrado da vofa vita. ". . -

Ariad. Pois, eu acafo habito no Labyrintho =


Para que nelle me pofais ver ? Te
ⓃⓋ- Labyrintho
Tezeo. Se vos não encontrar no Labyrintho.
de Creta, fempre vos acharei no labyrintho
do amor. - -

Ariad. Muito tendes adiantado o voto penfa


mento ; náo cuideis que como amante vos
- ခ္ယုပ္ရု့
a induftria do fio para a vofa li
|
- berdade; pois fó o faço obrigada ao juramen
to , que dei de falvar a voffa vida , agrade -

cida á que me deftes.


Tezeo. Pois, Ariadna , fe o intento de redemir
me he fó como agradecida, e não como aman
te , protefto ás fupremas Deidades deffe fobe
rano Empirêo , que já não quero meios de
, falvar a vida, e a_liberdade; pois fem a cer
"teza da vofa correfpondençia, nem liberdade »
nem vida quero. …

Canta Tezeo a feguinte


.. .. . А в 1 А.
1 - Na magoa que finto , .
- No mal, que padeço, /
A vida aborreço ; º

Cue affliéto, e confufo,


Maior labyrintho
Encontro no amor.
Náo temo effe monftro , . ,
Que horrivel me epera;
¡ Só temo effa féra T. 2
Cruel tyrannia . . . ... •
De tanto rigor. Wai-ſé.
Ariad. Epera, Tezco, que fe o meu 燃 t6->

- Precipitá, a minha fineza te livrará, º Vai-fe.


' . . . ..*., . . . , SCE
' de Creta. 6ſ

s C E N A v.
4Sala Regia. Sabe ElRei.
Pei Gora fim, refpire alegre o meu co
ração , , , pois que hum Principe de
Athenas he hoje o tributo do Minotauro :
finta Athenas a pena de Taliáo, que fe alei
vofamente confpirou contra a vida de meu
filho Androgeo , bem he que Creta fe arme
vingativa contra Tezeo. v,

Dentro. Peguem nelle , peguem nelle.


.Sake Esfuziote.
Esfuz. Senhor, Vofa Magetade me valha.
*儘 Que tens ? que te fuccedeo ? c de quem
- ges ?
AEifuz. Fujo de Woffa Mageftade.
Pei. Se foges, de mim , como vens para mim ?
Esfuz. Porque fujo de Vofa Magetade juti
ceira, para Vofia Magetade commiferante;
fujo da jutiça para refugiarme na mifericordia.
Rei. Que te fuccedeo *
Esfuz. Que...ha de fer? Derão em dizer que
eu era hum dos fere peccados mortaes, que
vinha para o inferno do Labyrintho a fer
comido do biabo do Minotauro; e fem que
me valefe o fagrado de palacio , quizeráo
levarme á força , ó - invito domino , quan
do fei que Vofa Magetade não quer que fe
force ninguem. ---
Rei. Ainda que fegundo o paéteado com nas
-
Athe
v s.'
62. Labyrintho
nas, não devêra receber menos numero que
o de fete mancebos; com tudo eta vez que
ro difpenfar na lei para comtigo a inftan
cias de minha filha Ariadna , a quem hoje
deves a vida.
Esfuz. Não fabe quanto folgo com efa noti
cia; não por mim, que não temo a morte,
por não etar muito contente da minha vida;
fenão por quebrar a catanha na boca a mui
ta gente. - -

Fei. Porém entendão os Athenienfes, que pa


få o añño háo de fe: oito os do ííibiiió.
Esfuz. Sim, Senhor, e fará Vofa Magetade
muito bem ; porém Vofa Magetade fem ef
perar para o anno que vem , póde agora
memo completar o numero dos fete.
Fei. De que fórte ? `--

Zsfuz. Mandando Vofa Magetade que o Em


baixador fuppra eta falta, que como tem
grande cabeça , e muita carne no cachaço,
terá o montro que roer.
Rei. Os Embaixadores pelo direito das gentes
gozáo de inviolavel immunidade. -

Esfuz, Pois, Senhor, em minha confciencia


acho que fó o Embaixador era capaz de
º defempenhar aquelle lugar, que pelo feu bom
modo até com a morte havia de Ater bons
terľnOS. -

rei. E ru fenfio quizeres ir para Athenas , pò


derás ficar em Creta fervindo-me em palacio
Esfuz. Aceito o favor de Vofa Magetade; e
já que em palacio fico, tomára ter algum cm- -
pre
* de Creta. 63
prego, que cáfe me cafae com o genio;
que quando a occupação he forçada, até o
palacio he galé. - . . .
Rei. Elege tu a occupaçáo que queres, igual
• á tua esféra. - ് - - -

Esfuz. Como fou refpondáo , quizera fer repof


[C1TO. * - -

Tocão caixas deftemperadas.


Rei. Mas que trite, e confufo fom rompe a
vaga raridade dos ventos ? - " * *

Esfuz. He hum moço que etá aprendendo a


tambor. : ...,

Sabem Lidoro, e Tebandro. . .


Rei. Lidoro , e Tebandro , que he ifto ?...
Lidor. He chegada a occafiáo de fer o Princi
pe Tezeo conduzido ao Labyrintho. . . ;
Teband. E certamente que o Principe não he
merecedor de ſemelhante infortunio. -

Rei. Náo Yಣ್ಣdi: de Tezeo, que al


fim he Athenienfe. .
Esfuz. Ai pobre Tezeo , tomáras tu fer Esfu
"ziote neta hora. - . A

3'ahe Fedra. * -

Fedra. Como a Tezeo já entreguei o remedio


da fua vida , não quero perder os inftantes
de vello. . . . . . - a á part.
- Sahe Ariadna. / . . . .
Ariad. Como Tezeo já tem o fio, com o qual
fe ha de livrar do Labyrintho , venho fem
fufto notar a afflicçáo do feu fentimento. >
. . . .
. . . . . . .
‫ که‬-4
$4 - Labyrintho
Sahe Licas, e da porta diz o que fe fºgue.
Licas. Entre fóTezeo, e fiquem os mais efpe
rando até a ultima refolução delRei.
'Rei. Eftáo promptos effes infelices, para ferem
conduzidos ao Labyrintho ? -

Licas. Sim, Senhor, que nunca foi remifa a


noſſa obediencia. . . -

Sahe Tezeo. -

Tezeo. Sinto , ó inclyto Rei Minos de Creta ,


que eta acção , que parece precifa, lei do
tributo , não feja voluntario feudo do meu
affecto, para que mais do que a morte na
vida , tenha imperio a vontade na obediencia. . ,
Esfuz. Aquillo he fazer da necefidade virtude.
* … . - ‘. . . á part.
º Rei. Sempre os Athenienfes forão mais loqua
zes que fieis. Tezeo, o fangue de Androgeo.
em purpureas linguas etá pedindo vingança
contra as vofas aleivofias, e afim não efpe
reis remedio na vofía defgraça.
Lidor. Senhor , Vofa Magetade fe compade- -

ça de Tezeo , que al fim o alenta o regio


.efplendor de Principe. - -

Teband. Adverte, Senhor, que he indigna da


Magetade a tyrannia; e afim perdoa a Tezeo.
ಸಣ್ಣ Aqui não obro como Rei, fenão como
U 12. -

Esfuz. Eu bem fei que fe pediffe a ElRei


por Tezeo, que o havia de perdoar, mas não
စ္တပ္အင္အ၀ dar-lhe eſſa confianga. . á part.
Fedra._Ainda fendo fingida aquela humildade
em Tezeo, he em mim verdadeiro o pezar..4p.
- 1ա -

j
- .”
Z -

e Creta. 65
Ariad. Parece realidadc o feu fingimento. á p.
JLicas. Rei, e Senhor, fe o motivo defeim
placavel rigor he o epartido fangue de An
-, drogeo , vede, que o não refufcitais com a
morte de Tezeo ; e mais quando a clemen
- cia nos, Principes he attributo infeparavel da
-- fua grandeza : perdoa, §.
Tezeo, que
tambem o perdão he hum generofo modo de
- caftigar. . . ** * * *

ARei. Inutil he o voflo requerimento. ... . .


Tezco. He definitiva, eſſa ſentença .
Rei. E não ha mais para onde appellar. O lá,
levai a Tezeo, e 2 efles miferos companhei
ros ao Labyriñiho , para fercm ီ|ိ
Minotauro. *** * བ་ ༩༧་༡ r ... .
Licas. Pois fabe , tyranno, Rei ,, que Athenäs
tomará cruel vingança da tua crueldade, re
duzindo a CretaTà ultima ruina. ''' }^ai-fe.
Rei. A mim com ameaços! Se não foras Embai
xador, pagarias com a vida efe atrevimento.
Esfuz. Era bem feito, que ElRei o mandaffe
· efquartejar. . . . . . ,...,4 £árte.
Lidor. O Tnmbaixador falloií''cóm infolénčia.
Teband. Sinto , Senhor, ver ultrajado o teu
refpeito. - -

Pei. Por ifo mefmo ferá Tezeo conduzido ao


Labyrintho, para o Minotauro o devorar.
Tezeo. Não cuides, tyranno Monarca, que has
de ultrajar o meu decóro , por me confide
rares reduzido a efta miferia, pois em qual
quer eftado fempre fou - Tezeo, que fa5erei
vingar a minha injuria. -

Tom. II. E Aei.


66 Labyrintho
Rei. Não fabes que és meu prizioneiro? Pois
como me tratas com tanta foberba , fabende
que te polo catigar? " . . . .
Tezco. E não fabes, que no meu braço con
fifte a tua ruina, e a minha felicidade ? "
Asfuz. Máo , máo , ifto , me vai cheirando a
carolo ::, queira Jupiter que Tezco não faça
* das fuas ! ' ' ' ' ' ' ' ' º á part.
Ariad. Temo , que Tezeo padeça maior infor
tunio. 2 á part.
Fedra. Ai de mim, que Tezeo quer defvanecer
- o remedio de fua vida ! , , , , á part.
Lidor. Se até aqui me compadeci de vós, agora
cremino a voa foberba. -
. * Teband. A não eftares tão perto da morte, eu
_deficaria a defatºlição da Magºftade... . .
| Rei. Bafta que ,oºrMinotauro
. . . tº
me vingue, levai-o. ; : - -
*: , . a t - Wai-fe.
Esfuz. Eu tão bem me vou, antes que me le
vem por erro. " | ... . . . , Wai-ſe.
Tezeo. Ai Ariadna, que por ti reprimo o fu
for de meu peito ! á part
e . . [
"; , ; , ; , ; , ; 11: . . . .
- - . . . .
º: . ... . . . tº

-º-º: , , , :
: : : : ..
-
de Creta. *67
Canta Tezro, º fºguinte Recitado, e depois can
tão as duas Damas, e os dous Principes
- · com ?Ieze0 -4. Aria.
a sº- , , -- 。
R. E. C I T A D O.
Barbaro Rei, eu vou ao Labyrintho, as º
Mas fabe que não finto ….……. … : - - :
Effa tyranna morte, que me efpera; … …
Que a fer poffivel , defcerei, á esféra
Defe fulfureo, e rápido Cocito , , , ; ;;
E do trifauce monltro a furia inçito , sº C.
Porque vejáo, que nada me intimída
Perder a cara. vida.: - * * * - -

De outro monftro 3 ( ai amor.!) {ó temo aira,


Que tyranno conpira i’ ... ".
Hum veneno tão forte, … - * * *

Que ainda por favor concede a morte; · · ·


Pois com doce influencia --- --~~~

Faz feja fympathia, o que he violencia.


Efte montro de amor, efta chimera -
Me horroriza , me affufta , e defe{pera.
A R i A. A 5.

Tezeo. Náo me acovarda a morte ,


Porque he vida -

Efte modo de morrer.


Lidor. Como intentas defla fórte
Sem refpeito
Hum decóro afim perder?
- * * 玩 ii Fed.
‘68 - Eabyrintho !

Fed. Ariad. Que ardor activo, e forte ºscº


-

ふ* “、最
Em meu peito ^ **" - º
. Chega amor hoje a incender!
Teband. Se nem da Parca o golpe s

s Te intimida, J & J -
w -

Nada deves de temer. -


/Tezeo. . . A morte não temo. - ** o "º 3,
Lid. Teb. A morte não temes"?… " e "" .
Tezeo. Náo, porque he vida
- Efte modo de morrerº I - e ;º: . **
.
Aed. Ariad. A vida defprezas * осі і ºf **
~ -
.
Tezeo. . Sim, porque heivida *'** ■ ^,',*. si *...*

- Ete modo de morrero º -

Todos. Que morte ditofa!!Que doce morrer', ¿


-Tebartd.rº - Sêu peito arrogante.Tr … 9 “ ) “ ' ' ,
Lidor. No brio, que oftenta,……… .. º " * * *
Fedra. Se a morté o alenta yary.rº - º … + +?
º Ariad. Se viveºna mortc., 3 ºf is ു º
| Tezeo. ' 器 -morreº de tamante ;:*:; y 'ele * :
Todos. Eterno ha de fers
º
ºf . ; ‫ن نه‬
‫ را‬: *. είi . οίπ t * *

胰 - º - - - º
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- * ふ r
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* *** P A. RT E. Ii.
. ‫ ہﮮ۔‬, ‫ جب ہم وجہ‬- ‫ ج‬- ‫ جب‬, ‫ امام‬,‫ هﻳم م‬, , , , ,
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,
S С E N A* I..."
:: * : *.* είναι : : : : : :αι: ... . . .
*.

-Camera. Sahem, , Sanguixuga , e Taramella,


‫ كـ‬." ‫؟‬ " ‫ في حالة‬. . ‫لا‬
ang. Aramella, vai-te enfaiando para
r…" , º Princeza , toma, bem a lição;
- *** .. . aprende de Ariadna a feveridade,
. e de Fedra o carinho; que temperar a .afpe
reza com affagos he a verdadeira maxima
:õo | reinar... , r-31: · ു.
Taram. Bofé , ; tia, e que me não canfarei com
– ifo ; porque fendo_Princeza, quer feja aze
da , quer dece , afim me há9 de tragar; po
rém fe tal for, que diráó de mim os mur
muradores? . Olhem a ranhofa , ha dous dias;
--mixella, e hoje Senhora de mão beijada! \º
Sang. E logo te hão de deſcozer a geração;
e ao fom do vilão tambem, eu hei de vir á
bailha, pois, não faltará quem diga : que feja
Poflivel , que a fobrinha de huma criſtalleira
nos, falle já por vidraças !? Hontem em chi
chelles, e hoje em berlinda! .………….…!
Taram. Olhe, tia, por amor defesa raios náo.
quero thronos. … > o , , , , …",
Sang. Ai filha , não fe te dè diffo , que tam
bem os Reis tem cotas ; tomâra eu cazar
2. . . . . coII?
‫סל‬ ..ohtnirybaf
com o Embaixador, porque fendo eu Embai
-xatriz , direi ao mar que rotique, e ao rio
que murmure. 彙 -

Sabem ao bafidor cada huma pela fua parte,


Ariadna, e Fedra, e cada huma combu
ma banda na mão.
Ariad. Amor me defcubra meios para o meu
intento. Mas alli etáo Taramella, e Sangui
xuga ; tomára que me náo viflem , por Tme
* não obtervarem os pafos.…… . . . gº
Fedra. Que importunó encontro :: Sanguixuga,
- e Taramella fe me vem com a banda, que
- levo ; poderáó: penetrar o meu defignio ; ef
ºperarei que fe váo... . . . . . * - ſº,
Sang. E que dizes tu, cuidarem todos em Pa
"lacio, que o Principe Tezeo he morto, não
o fendo ? E na verdade que quando ás vezes
ouço falar na morte de Tezco, não pofo futer
**6 m rizo. [...º . . . . . .. . : ; ジ f電つ1

Taram. A induftria todavia não foi má.………


º Ariad. Ai de mim , que já fei fabe que Te
· zeoº he vivo !`º · º · · · · ***.*.
Fedra. Ai infeliz, que fabendo-fe já que Te
*zeo não he morto , algum damno experi
mentarei! * *- : . . . .

Taram. Porém não nos dilatemos mais, que


as Infantas pódem procurar por nós. .….…
Jang. Pois, rapariga, não te defcuides de bater
o mato; tu bem me entendes.
* * r, -
-
3:1, - - : . - -

* - ** -
-
. ..
- -
- *
*-
. . . . . . . . .. . .”
* * * Wai-ſ:
de Cret4. • 71
Fai-fe Sanguixuga pela parte donde efá Fedra, e
… efia a fegue, depois que difer o feguinte.
Fedra. Vou a declarar-me coin Sanguixuga pa
-
ra que me guarde fegredo.
** Sabe Ariadna.

Ariad. Já que Taramella fabe que Tezeo etá
- vivo, não ha mais remedio, que fazer do la
dráo fiel. - - -

Taram. Que terá Ariadna etes dias, que anda


ſuſpenſa ? - á parte.
Artad. Taramella, como fei o muito, que me
amas , quero fiar, de , ti hum particular de
- meu peito, pois fó tu pódes remediar o meu
mal. -

Taram. Efe conceito merece a lealdade, com


que te firvo. , , , , •

Ariad. Defde que vi, a Tezco, infeliz Principe


de Athenas, communicando-me amor pela vif
ta o feu veneno, foi facil me cegafe o feu
precipicio; e alim , como amante preveni in
duftrias, que o podefem livrar do Minotauro.
Taram. Quero fazer-me ignorante do cafo. á p.
Ariad. E como ElRei vangloriofo de ver vin
gado o fangue de Androgeo meu irmão, com
a morte de Tezeo, para oftentação de feu
defafogo, tem preparado hoje hum faráo, em
que bavemos de dançar com os Principes ,
para o que quero que tambem Tezeo venha
a Palacio , pois, com o disfarce da mafcara
não poderá {er conhecido ; e para que (ó eu
o conheça , dar-lhe-has cíta banda azul para
..:diviía, ~, … . , , , Dá-lhe a banda.
- 4
72 Labyrintho'
Taram. Ah tyrannos zelos, que me deixais com
a alma a huma banda ! ) · · · á parte.
Ariad. E como tu, pela continuação, que tens
em hir ao Labyrintho comigo, já fabes os
caminhos, vai-te ao centro delle, e leva a
banda a Tezco, para que venha ao faráo ef
ta noite, e faberei agradecer-te como merece
a tua lealdade. * - “Wai-ſe.
-

Taram. Haverá no mundo mulher mais def


graçada! Quando eu cuidei, que fó fabia
que Tezeo era vivo, tambem Ariadna o não
ignora ; e demais a mais namorada delle ! Ai
como temo, que me tire a fortuna !E fobre
tudo fazer-me alcoviteira do meu me{mo aman
te! Que farei nefte cafo ? Se não levo o re-.
cado, e a banda , encontro as iras de Aria
'dna ; c fe a levo , atiço mais o feu amor;
não fei de que banda me vire. Eu bem pu
"dera com a raiva dos zelos romper a banda
em fanicos: Mas náo quero fenão cara a ca
ra dar-lhe com a fua talfidade nos narizes.
ahem Fedra com huma banda branca na mão,
* ** * ' e Sanguixaga. · ·· · ·
Sang. Vai-te daqui, Taramella , que ao depois
temos muito que falar. - -

Taram. Tambem eu : vou huma vibora.


- * * ;: ºn á part. e vai-ſe.
Fedra. Como tenho dito, libertei a Tezeo da
morte, e para que venha ao faráo eta noite,
leva-lhe cfta bañda branca, (dá-lhe a banda )
Para que faiba, que he o alvo de minhas
fidezas, e por efia divifa o pola coniཥ་
cIll
- ' ' de Creta: 73
Bem vês, que te contituo fecretaria de meu
peito ; efpero que não defmereças, o con
ceito, que faço da tua Prudencia. Já que o
fabe,
dizer.
ao menos tenha preceito
- * - a
para e ovai-ſe:
á part. não
Sang. E para dizer-me huma coufa, que eu já
fabia, eteve fazendo mil efcarcéos, toman
do-me duzentos juramentos. Porém que farei
eu agora defta banda , pois fe a lcvo a Te
zeo, dou armas contra minha fobrinha Ta
ramella? Ai, não permitta Deos que eu fe
ja traidor ao meu fangue, que primeiro eftão
Parentes do que dentes. - . …,
Sabe Tebandro. . ..

Teband. Sanguixuga , não me dirás, porque


motivo defpreza Fedra tão vepetidos extremos
do meu amor...? Por ventura não fei amar
não fó as perfeições, mas ainda os feus ri
gores ? Defengana-me já fe aquelle defdem
inventa a fua tyrannia, para apurar a minha
fineza , ou para defenganar a minha coní
a tancia. - .. . . . .
Sang. Senhor Tebandro, não fabe que huma
futura noiva fempre affecta repudios, defde
nha carinhos, inculca crueldades, e atropel
la finezas , e no cabo efiá defejando , que
já chegue a hora de fever nos braços de feu
epofo ? , , , , -

Teband. Aquelle defdem não póde fer appa


rente ; e fe me náo dás outra certcza de feu
amor, hirei fentir os feus defvios em Chi
pre; para que lá fó finta a memoria, e não
aqui todas as potencias. S4ng.
74 Labyrinthp -

sang. Que me dará Vofia Alteza fe lhe der


… huma certeza do feu amor ? Mas eu não fou
º interefeira ; agora mararei com hum cajado
· dous coelhos. á part.
Teband. Náo faças ludibrio de hum defgracado.
¿'ang. He táo verdadeiro o amor de Fedra ,
que te envia eta banda, para que entre os
mafcaras te pofa conhecer á noite no faráo.
º Dá-lhe a banda.
Teband. Que dizes ? Eu mereço os agrados de
Fedra ? - - -

Sang. Sabe Deos o que me tem cutado polla


em termos de dar a conhecer a fua inclina
ção: mas Vofia Alteza tudo merece.
Teband. Acceita por ora eta joia, como prin
º cipio do meu agradecimento. -

3'ang. Dadivas de Principe não fe rejeitão; ora


…já tenho prenda que dar ao Embaixador,
quando cafarmos ; porém Fedra enganada ,
e o Principe defvanecido tudo he hum.
- - - * - - á part. e vai-ſe.
Teband. Ainda não pofo acreditar a minha ven
"tura , pois quando a tea ardente do Hyme
nêo já quafi, fe extinguia aos afopros de hum
defengano, vejo que torna a incender-fe com
os alentos de hum fulpiro. Oh ditofo eu,
que depois dos pezares alcanço prazeres.
Canta Tebandro a feguinte ·
А к 1 л.
O navegante,
º Que combatido - . . .. .
de · Creta. A 75
De huma tormenta , -

· Logo experimenta ' ' ' '-


Quieto o vento * *
Tranquillo o mar. . .. . .
Como eu, nem tanto -

Se alegra, vendo, ...


醬 vai crefcendo
Minha ventura, , •* * > .
. E vai cefando * . . . * * * *

De meu gemido - . . . . "

O ſuſpirar. -

s c E N A II. º

Labyrintho. Sabe Tezeo.


‘. . . .”. " * - / ... - .
?Tezeo.. E. he a ultima etancia dete in
*-* trincado Labyrintho, aonde Dedalo
fixou a méta a feus artificios. Atarei o fio
de Ariadna a eta columna, para que me fir
va de Norte em o pelago de tanto enleio.
, Que... admiravel_ edificio '' Que variedade de
arquite&uras! Que pórticos!'Que marmores!
Que columnas! Aqui toda a confusão ale
gra, e toda a alegria fe confunde ; pois,
equivoco o horror, e a belleza, horrorifa o
bello, e deleita o horror, que nefte quadro
de luzes, e fombras, brilhão as fontbras,
e afIombrão as luzes. Porém Dedalo , , que
ficou de efperar por mim nefte lugar, fem
duvida arrependido da palavra, fe quiz apro
veitar da mina que abrio. . . ‫هک‬a
- -- - 4
76. Labyrinto a
‫ واة‬... ، ‫ء‬:::: ‫ ادلة‬. "
sabe Dedalo da efectilha, que efiará na boca
do Theatro. T,,
IDedal. Tezeo , Dedalo náo falta ao que º pro
mette , pois efcondido te e{perava na boca
defta mina , que vai ás ribeiras do mar , de
donde me vite fahir, quando te encontrei
Tezeo. Vem a meus braços, fiel amigo, e re
leva-me o errado conceito, que de ri formei:
mas quizera faber como etando eu no centro
do Labyrintho, não encontro ao Minotauro ?
Dedal. Ainda o não foltarião talvez, porque
o tal montro vive encerrado em hum funef
to carcere, e quando ha victima humana de
fua tyrannia , e foltão, para que enfurecido
venha por dirigido conducto a efte lugar ,
que lhe o campo da batalha do feu furor. * *
Tezco. Defejo, que já efe montro feroz ve
, º nha a accometter-me, que a pezar da fua vo
racidade, me verás triunfador. , , , , º
IDeda I. Eu efiou prompto para ajudarte neta
empreza , e vê fe queres que difcorramos
em alguma induítriofa máquina para o ven
_ceres, fem que perigue a tua vida: ..."
Tezeo. Se eu o quizera vencer a meu falvo,
remedio trago comigo, adminitrado por hu
ma Deidade, com o qual feguramente pofo
triunfar defe montro ; mas não intento valer
me de extraordinarios remcdios, quando no
meu braço tenho a defeza da minha vida. ,
Dedal. Ai, quanto temo que eta temeridade
feja a caufâ de tua ruinä ! . … … …*
Te i
de Creta. ‫לל‬
Tezeo. Não temas , que fempre a fortuna foi
, oompanheira da temeridade.
- Esfuziote… dentro diz o feguinte.
. Esfuz. Em boa etou mettido ! Ai que não
… atino com a porta! Vamos por aqui: peior!
Vamos por allí : repeior! Ai nmifero Esfu
ziote , que eftás quando º nada metrido nas
profundas do Labyrintho , e a cada paffo me
parece que encontro, o Minotauro. ~
Tezeo. Alli cuido que diferáo Minotauro.
Dedal. E pafos tambem ouvi: fem duvida já o
foltariáo. • Tezeo , outra vez te requeiro, te
não exponhas a tão evidente perigo; e fe pa
ra o vencer tens o favor defa Deidade, (já
que te: não queres valer do meu) não pere
2 gas como temerario; guarda o teu valor pa
ra mais heroica façanha. … … , , , ,
7ezeo. Mais val morrer; valente, que viver co
barde : retira-te tu que eu com fubito furor
2 fem mais zarmas que os meus braços, ven
cerei eſſa féra. "f t 。

º --- º“ Sahe Eifuziote. º - - -

-- - - - - - - tº . . " : ºf . . . . .. . .. "
Esfuz. Vamos por aqui, faia o que fahir. ,
H/conde fé Dedalo : põem-feTezco a traz do
"batidor, por onde fabirá. Esfuziote com a ca
ºra para o povo; e ao fibir, Tezºo o inveíte ! :ºx,’ ‘,
repentinamente,R e luta com elle. "+i .tº
- *** * *, -**''. f: ::: gº ºf: -; Q
Tezeo. Morrerás, ó montro, depedaçado em
meus braços. :::, :::, :::: , , , º . ‫ذبة‬
Psfuz. Ai de mim, que cahi nas garras do Mir
notauro! Quem me acode! Te
78 Zabyrintho
Tezeo. Efte he. Esfuziote : ora mui eficazº he
huma fantafia! . .. ; á part
Esfuz. Ai de mim, que me metteo a garra em
cheio pelo vazio; eu me finto molhado, não
feife he fangue, fuor ou outra coufa mais in
ferior. * -

Zarga Tezeo a Esfuziote, e efte eftará com as


mãos no roto.
Tezeo. Esfuziote, náo te afluftes. * -

Esfuz. Ai que o Minotauro já me fabe o


nome ! . .* ** * ‘. . . . .” -“. . .
Tezeo. Não me refpondes? Olha para mim.
Esfuz. De burro que eu tal olhe, quando nem
pintado o quero ver. *** * * r * , , ;

Tezeo. Que tens, que ficate immovel!


Esfuz. Eu bem fei o que tenho. Só a voz que
elle tem me faz amedrentar. * á part.
Tezeo. Deixa loucuras: dize-me, quem te trou
xe ao Labyrintho ?… ". … :: 3 * : : : *
#sfuz. Os meus peccados veniaes, que agora
são mortaes. 。 *。 。ー・

Tezeo. Falla, fenáo te depedaço aqui.


Esfuz. Senhor, voffa monftrofidade náo me fa
Ça pergúntas', que eftou corn a lingua pegá
- da ao ceo da boca; deixe-me hir embora em
cortezia; antes que o medo de tempere em
alguma defcortezia; pois não he razão que
depois de comer hum ಸಿಘಿಘೀ
o 'feu bandulho com a cafñe dúra, e ma
gra pelhancra de húm lacaio. 3*3* .tº . '
Tezeo. Quem cuidas tu que fou eu ? *** "
ಜ. Eu bem o fei. *** . * * * # : ;">
*** *- : --e - ; ri: : si Te:
de Creta. 79
Tezeo. Pois fabe que não fou quem tu cuidas,
Esfuz. Pois quem he ? Quem he ? ' >
Tezeo. Olha, e verás. - * * *

Esfaz. Senhor medo , com licença, deixe-me


abrir pifcamente os olhos. Ah que d'ElRei
que he a alma de Tezeo ! Ai que eftou fei
to hum tremedario ! Tira a mão dos olhos.
Tezeo. Nefcio: que alaridos sáo efes ? 3
Esfuz. Fantafma, chiméra, fombra, illuzão,
- coco , e papáo , que he o que me queres?
Tezeo. Olha que fou Tezeo. - *
Esfuz. Tanto fortius; não te chegues a mim,
alma vadia , errante, e vagabunda.
Tezeo. Vem cá, não fujas. ::
Jabe IDedalo. * * *
Dedal. Esfuziote, eu aqui eftou tambem, não
cuides que Tezeo morreo.
Tezeo. Graças aos Deofes que ainda etou vivo.
Esfuz. Eu bem fei que as almas nunca morrem.
Tezeo. Bafta que cuidafte que eu era morto ?
Certamente que o teu medo te allucinou."
Esfuz. Eu , Senhor , vendo que te chegavas
** para mim, que havia fuppor, fenáo que eras
coufa má , porque coufa boa nunca para mim
fe chegou ? ' ' .. . .
Tezeo. Como te atrevete a penetrar até o centro
do Labyrintho ? Não cuidei que tinha valor
para tanto. . . . . . . . . - ,
Fsfuz. Se eu fora lifonjeiro, bem te podia di
zer, que quiz vir acompanhar-te nas tuas pe
***nas , para ajurda-te a matar o Minotauro: po
rém , Senhor , a minha fraqueza lhe tal •
** - - que
8o Labyrintho
º que me não póde deixar mentir ; e foi o º
cafo: Depois que te rrouxerão para o La
byrintho , como o boi folto lambe-fe todo, .‫است‬

não me pezou o pé huma onça, e como tal.


de hum pullo entrei por huma porta; fahi
- pela outra, andei , defandei, corri, defcor
… ri para dentro , para fóra , daquí para alli ,
até que dei comtigo nefte lugar, nefte Laby
rintho, nefte diabo, que bem efcufado era
que o Senhor Dedalo fabricafe etes enredos;
mas por donde cada hum pecca, por ahi paga
JDedal. Já por meu mal: me não ºpoflo eximir
' deffa cenfura.:»; > .

Tezeo. Ainda te não fei encarecer a artificiofa º


máquina defte portento ! : * º
Esfitz. Tambem o filho da puta, que tal fez, º
merecia as mãos cortadas. . ! - ..

Tezeo. E que novas me das de Ariadna ? Sen


te muito a minha aufencia ? … , -

Psfuz. Muito, e com tanto extremo, que eta º


noite fazem hum faráo por exequias da tua º
mOTTC. - K.. ” - * * * * *** - . *, , ,
Tezeo. Cruel 'he a fua condição ! Pois não te
rº falou em mim ? ! º, “ . . * ** * - º

Psfuz. Nem falar nifo he bom, e mais ago- f


sºra que anda hum rum rum em Palacio, que
Lidoro cafa com Ariadna. se...;... a:
Tezco. Ai infeliz, que fe eu hei de ter vida
… para versa. Afiadna em poder de Lidoro, não
º refitirei ao Minotauro; que antes quero que |
- a fua furial me devore, do que, os zelos me
e ºtſ.
deſpedacemºi ç. ºr e º żºł, . . .Ճf-
-
; w
· de Cºia. . . 81
Esfuz. Poisoainda o Minotauro etá vivo º
Tezeo. Ainda ; e do feu furor me não hei de
eximir. - - -

Fsfuz. Bem aviados etamos! O Minotauro vi


vo, e eu aqui! Pois com licença, que eu
me não quero minotaurear agora , nem ef-
perar pela morte aqui a pé quedo ; pois eu
cuidava, que eftavas vivo, por teres morto
ao Minotauro. e - * -- -

Tezeo. Aonde "has de hir, que o pódes encon


trar ? Não te acobardes etando comigo. .
Esfuz. Por ventura Vofa Alteza...he alguma
coura danta, ou faia de malha , que me fa
ça impenetravel aos dentes minotaurinos ? E
quando afim feja, fe quizermos furtar-lhe a
volta, e fugir, como nos havemos efcafeder
daqui fóra , fe em cada pafo encontramos
mil barafundas , e circumloquios ?
Dedal. Mais facil ferá matar ao Minotauro, que
atinar com os caminhos intrincados do Laby
rintho. -
Tezeo. De hum , e outro me verás vićtoriofo.
Esfuz. A mim tambem náo me cheira.
Tezeo. Para que o faibas, attende.
Canta Tezeo a feguinte Aria, e
к Е с н т А п о.
Nunca piedofo o Ceo a hum defgraçado
Negou favores de hum ditofo aupicio,
Pois com anticipadas influencias ;
Antidotos prevenio a meus pezares,
Dando-me Fedra a
* Tom. II.
naಣ್ಣ: Peregrina
+" Do
82 Labyrintho
'Do triunfo do horrendo Minotauro:3, i swist *
Quando Ariadna com fubtil, idéa ,' , ° . -._. - - -

O fio me adminiftra, .
Que tecido farol neftes horrores… . . .
Me guia o pafo em tanto Labyrintho.… . . .
Mas ai, bella Ariadna. Se piedola . .
Me dás a liberdade , . . . as arri ... . .
Inuteis confidero ,0s teus,favores ; . :
-
Porque em tanta afpereza,
iiiii'aiiio me icö ëïã'belleza. . . --.
газ об л в 1 л. 3
Vem; 6 monfiro , a acerar-me,
Vem, cruel, a devotar-me; "º
Porém não ofendas " * ". º
Com furia inhumana ,
Abela Ariadna , , ,
5 " Que dentro em meu peito
Se oftanta feliz. . . . .
“-Seº morto* me *vires', -

… Só quero que entendas, " "


Que tu me não matas, . . ---

Amor ifo fim. º.º +.

Esfuz. Ainda que mo diga cantando, ou cho


rando, eu vou-me, que não quero etar aqui
hum minuto por amor do Minotauro.
.. . . " , " … Vai andando.
Ao ir-fe Esfuziote , fahe o Minotauro , e o atro
pella, e luta com Tezco. -

Esfuz. Mas ai, que elle he comigo! Senhor


Minotauro, olhe que eu não fou dos fete
do tributo. Ai , ai, ai. * ** -
- -
-
---

t
, Te
de Creta.. - 8;
Tezeo. O” tu vivo fepulchro de Athenienes,
hoje pagarás com a vida os miles que tens
º caufado. … ്. , - • ºr

Dedal. Aqui me tensº em tua defenfa. -

Tezeo." Retira-te à Dedalo, que eu fó doma


: rei o furor defte rhonftro. 3 - -

Esfuz. Ifo, iffo; com elle , e não comigo...


Tèzeo. Por mais que empenhes a tua furia, hei
e de triunfar de tua crüeldade , apertando-te
em meus braços, até que exhales o alento.
'Gahero"Minotauro na mina com bramidos. -
I)edal. Oº femper efclarecido Tezeo , ' agora
vejº, que ainda o teu valor he maior, que
a tua fama. -

Esfuz. Oh ſempre tremebundo Esfuziote! ago


ra vejo
que ; que o teu pavor ainda he maior,
o Minotauro. -- - v *.

Tezeo. Releva-me , Fedra , defprezar para a


morte do Minotauro o piedofo remedio, que
me adminiftrate ; que feria injuria do meu
valor bufcar fóra de mim induftrias para ven
cer ; porém fempre no meu agradecimento
fica recompenfada a tua generofidade.
it. -
Esfuz. Diga-me, Senhor: dar-fe-ha cafo, que
y a ಥಿ não ficaffe bem morta, e que pof
fa refurgir daquella buraca ? . . . .
Tezco. Com tal vigor o apertei em meus bra
ços , que nelles expellio o feu , vital alento.
Esfuz. Quem me déra ter hum abraço defes,
para dar ao meu amigo Embaixador. . .
Tezeo. Esfuziote, já que os aftros te definá
rão para companheiro de meus infortunios,
-
* - F ii quº
* 84
* * Labyrintho
quero valer-me de ti para outra empreza má
... ior , que, a do Minotauro. . . ° . : , ".

Esfuz. Senhor, fe. eu não pude com a menor»


Como hei de poder, com a maior ? . . . . . . -
Tezeo. Para communicar-me com Ariadna, pa
rece que amor te conduzio a ete Labyrin
uho. . * Ruido.
JDedal. Pizadas ouço, parece que vem gente.
Esfuz. Senhor, não ferá licito que te vejão,
, pois todos te julgão morto. . . . (…»
Tezeo. Dizes bem: Dedalo, aonde nos efcon
. . . deremos ? ' - - * > . . ~~

IDedal. No concavo defta diafana columna ha


hum pequeno , , e limitado gabinete, donde
* *. muito apenas cabem duas pefloas , no qual
nos poderemos efconder. iſ .

Tezeo. Pois vamos deprefa , que o rumor já


vem perto. - - -
Esfuz. Efcondão-fe cobardes, que eu fó refif
tirei aos Minotauros. -

Eſcondem-ſe Dedalo , e Tezeo atraz da co


lumna, que ha no meio do Labyrintho, e fabe
- Taramella com huma banda azul na mão.
Taram. Quero obedecer a Ariadna , fó para
invetigar os meus 2elos : mas entre tanto
enleio aonde acharei a Tezeo ?
Esfuz. Ay que he Taramella em carne, que
mc vem bufcar em offo de correr ! e fem
duvida que a indutria de fazer-me Principe
a tem feito andar numa dobadoura.
Taram. Mas elle ahi elá: ah fementido Prin
cipe» já vejo, que he certa a tua falfidade
Es
~

de Creta. - 8;
Esfuz. Taramella , já fei que o labyrintho.
da rua faudade te trouxe por teu pé a efte,
aonde por ti duas vezes me confidero per
dido. - !, -

Taram. Para que he lifongeiro! Logo me pa


receo, que o feu amor era fingido. Se adora
a Ariadna, para que me engana ? E fe ella
o bufca, para que me perfegue?
Tezeo. Que he o que ouço ? * ã р.
Esfuz. Menina, ifío são tramoias de tua tia, .
por ver fe nellas ecorrega o arlequim de
Theu a ITOr. º

Taram. Ainda fe atreve a negar, que adora a


Ariadna ? -

Esfuz. Eu a me
Ariadna?
cahio Apello eu! He mulher
que nunca em graça. …• **

Taram. Sim, que Ariadna havia de fazer ex


cefos por quem a não requeftafe primeiro
muito bem. . . . . . ... , ,
Esfuz. Se ella para querer-me achou motivos -
na minha gentilomeza, que culpa tenho eu ?
Tezeo. Que enigma ferá ete de Esfúziote com
eſta moga. * á part. *
*

Taram. Bem fei que ella he huma Princeza,


e eu huma criada; mas tenho a confolação,
que eu o não roguei para que me quizefle.…
Esfuz. Taramella,, não venhas a arengar: tan-
to fe me dá a mim de Ariadnas, como da
lama? da rua. Tu cuidas que eu faço cafo :
de Princezas ? he engano; pois mais me re
gala huma fregona defenxovalhada , que os
ºmelindres , c | fil-tarias de huma
-. - -
* . . Pic2 4°
*

86 Labyrintho,
Taram. Nada difo me entra cá, pois eu conhe
.go o genio de Ariadna, efei, que fem a
requetar lhe não havia mandar efta banda,
para com ella hir ao faráo, que fe faz em Pa
. . lacio efta noite. . . . . Dá a bandaar
Tezeo. Tomára já faber que banda, ferá eta
de Ariadna ? , á part
-

Esfuz. Pois Ariadna manda-me eta banda? Dar


fe ha cafo que me namore, fem eu o faber ?
Taram. Não fe faça de novas; e para que ve--
ja , que a mim me não engana, vá , vá ao
faráo, cafe com Ariadna, que eu me vin
garei em pedir juftiça ao e Ceo contra hum>
falfo enganador. Juftiça! jutiça! . . Vai-fe.
Esfaz, Efpera, Taramella , não feches a portar
á minha innocencia. a si, … . . .. .
- N ; , . . . . .”

tº . -
º Sabem Tezeo, e Dedalo. "
" ... -* * **~ * - - 2 ‫وی ﺍز "ر‬ -
Tezeo. Larga ela banda, infolente. . . . . . .
Esfuz. Por todas as bandas me vejo combatido,
<ahi eftá a banda. …… Dá a banda.
Tezeo. Que dizia de Ariadna efia mulher ? "
Esfuz. Foi galante cafo! Supponho que en
tendeo que eu era Tezeo , pelo circunfpecto:
da minha perfonagem, e da parte da Senhora
Ariadna deo-me eta banda, para que com
.clla foffe ao farão , que fe faz º cíta noite -
em Palacio. : ; 3്വ
Tezeo. Afim ferá ; porém fe cuidava que tu
eras Tezco , como te dava ciumes, e º indi
gnada contra ti foi pedindo juftiça. , ,
Esfuz, Ilo mefmo etava eu para te perguntar
- ... . . . ago
de Creta.', 87
agora. Dar-fe-ha cafo, Senhor, que Vofia
Alteza algum. dia bichancreafé efta criada?
Tezeo. Efás louco ? Mas tu para que lhe davas,
* *

- fatisfações ? "
Asfaz. Porque entendendo , que Vofía Alteza
tinha tinha de amor com efta rabujenta cria
da , não quiz deixaffe de comer por mal co
zinhado; e afim lhe fui refpondendo a tro
xe mOXe. - - , ' ..․" ، ". -

Tezeo. Não te quero apurar mais por ora; e ,


pois efta hera primeira fortuna , quc amor -
me facilita , º vamos , Dedalo, a procurar
mafcara, que quero hir ao faráo, que comº
ella de ninguem ferei conhecido , e fó de
Ariadna pela divifa deta banda.…" }

Esfuz. Giribanda me parece ifto: oh queira Ju


piter, queda nefa
tratempo dança não . .haja
fortuna. . ..
algum con-"

|
Tezeo. Vamos, não nos dilatemos. " -

Dedal. Sempre ficerei temcndo não fe te que-_


bre o fio, e te percas no Labyrintho. -*. . .
Tezeo, Quem com favores me alerta, tambem
com cautelas me defende defe cuidado. Vai-fe.

sc E
88. - Labyrinthe
*
* -
-

'. s C E N A III. '


Gºº
sala , cadeira sabem Tebandro com
e huma
mafcara cabida, e Lidoro fem ella, e depois.
põem Tebandro a mafcara; e no fim fe cor
rerá a corrediça do meio , e apparecerá toda
a Sala , em que haverá huma meza compof
ta em forma de banquete.
Teband. Idoro , vós fem mafcara , quan
- L do todos já vimos caminhando a
' efte lugar do farao!
Lidor. Déixa-me , Tebandro , voar nas azas das
minhas penas aos incultos defertos da Lybia ,
aonde não hajão memorias dete infeliz.
Teband. Não defprezeis efta occafião em que
as Infantas tambem danção, para que no con
taéto de tanta neve pollais, mitigar os incen
dios do volo ardor.
Lidor. Não quero merecer ao rebuço da maf
cara, o que fem ella não alcanço.
Teband. Tambem eu vivia na me{ma defefpe
ração; porém Fedra compadecida dos golpes,
que a fetta de amor fulminou em meu co
ração, para ligar as feridas me enviou eta
- banda.
Lidor. Goza tu , ó Tebandro , efa fortuna,
pois fofte mais feliz no teu amor; que eu
defenganado, por não morrer muitas vezes,
hirci morrer huma íó. Wai-ſe.
- º
º, YᏃio
-
-

-
/
de Creta. 89
JZão fabindo Ariadna , Fedra, Sanguixaga, e
- Taramella com mafcarilhas; põem Tebandro
a fua , fahe El Rei fem ella , , que fe affen
tará ; e em quanto vão fabindo, cantar-fe
ba o fºguinte.
Ο Ο R Ο.
Numa alma inflammada
De amor abrazada
Cruel labyrintho
Fabríca o Amor. -
Porém quem efpera
O bem de huma féra,
Acertos de hum cégo,
De hum montro favor ?
Rei. He tal o prazer , que tenho de ver vín
gada a morte de Androģeo com a de Tezeo,
que não cabendo em meu coração, o inten
to publicar neta exterior alegria.
Fedra. Já alli divifo a Tezeo pela fenha da ban
da branca ; defejára me tirafle a dançar... á p.
Ariad. Aínda não vejo a Tezeo aqui; fem du
vida fe quebraria o fio no Labyrintho, Oh
quantos fuftos padece quem ama ! , á part.
Sang. Quem pudéra conhecer ao Embaixador,
que o havia de facar a paffeio. - 4 part.
2Taram. Se Tezeo me fofIe amante leal, para
bem não havia de vir ao faráo, º á part. *
Jabe Tezeo com -mafcara.
Tezeo. A bom tempo chego: quem pudéra co
nhecer a Ariadna ! á part.
Ariad. Alli vejo Tezeo;. .já. . defcançará
.
o meu
C0Ia?áo. - á part. *
** -
*- - - - Ta
90 : Labyrintho
Taram. Aquelle da banda azul he Tezeo , que, 等,

, fem , ella o náo, conhecêra ; es pois táo ga


lhardamente fe foube disfarçar , certos são os
. meus males. - á part
Sabe Esfuziote com mafcara muito horrenda.
Esfuz. Só agora que tapo o roto, he que te
ſ
nho cara de apparecer. Queira Deos mc náo
perca nas voltas de Andreza. … …".
Sang. Ai que galante mafcara entrou agora !
Rei, Dè principio ao faráo , a canora armonia
dos intrumentos. -
Teband. Seja eu o primeiro, que na ordem do
amor devo preferir a todos. Aquella fem du
vida he Fedra; dançarei com ella. -

Fedra...Fortuna foi o conhecer-me · Tezeo. ' á p.


Teband, Galharda Ninfa, a permittida faculdade
... defta occafiáo feja o indulto defte atrevimento.
Fedra. Se a occafião o permitte, não póde a
vontade deixar de obedecer, , . .

... Danção , e cantão os dous o feguinte


. . . …" M I NU E T E.
Teband. Inda não creio . . .
O bem que gozo: " "
º " … Serei ditofo - . . . . º

... No meu amar? , " … … º


Fedra. , Eßas as voltas ` . . . . . . .. "
São da fortuna: …..... -

| -- · · Sorte opportuna . ; :- ' '


- , , , Amor te dá. : " -

Teband. Serás amante ?... --,


Fedra, , Serás conſtante : . .. . . . .”
- - - Am
º
de Creta... 91,
Ambos. Eta conftancia , , , , , , - - -, - ...”

Firmc ferá. . . a, , , . " . . .


*
Fedra. … Aº manhá á noite te efpero, na fala dos.
-

enganos do Labyrintho. ... á part. para Teb.


Teband. Amor, tanta fortuna junta , temo me
mate o gofto , de poffuiilas.', ' ' ' ' ' á parte.
Rei. Quem dançou com Fedra yifem duvida foi
- Tebandro , e o fez galhardamente. r ' á part.'
Faz Ariadna acenos para Tezzo-o .
Tezeo. Aquela por acenos me diz a site a danº
çar; em duvida he Ariadna , , que me co
nheceo pela banda. Oh, ಶ್ಗ são os:
Pafos de hum acelerado, de ciό! Formofā
Ninfa, para, que me não perca no labyrintho
da dança , permitti, que o norte, de vofas
- luzes feja o indice de meus acertos..….…..
* . .. . . . .. . á part. para , riâd.
:

Ariad. Bem he que aprendais acertos nefte


Labyrintho, para que no de amor não vos:
percais. á part para Tezeo.
Danção , e, cantão os dous o feguinte · · · ·.
* : M I N U E. T. E. ºf
Tezeo. Na pura neve ' ' ' ' '““““““ º
De feus candores * · * · · ·
Os meus ardores … . . .
Se ateão mais. -
Ariad. Se ea ventura " ”
Feliz alcanças, º
Nefas mudanças . . -

Temo o meu; mal.', º ***

... ( ) * 望な*
92. Labyrintho
Tezeo. Serás amante ? . .
Ariad. Serás conftante 2 - -

Athbos. Eta conftancia \, º

- Firme fera. a

s
Arial. Na sala dos enganos cipera-me á má
i nhá a etas horas." á part. para Tezeo...
Tezeo. Ao meu defejo, e ao teu preceito obe
gecerci. ~

Rei. O que dançou, agora com Ariadna , feria.


"Lidoro. Quem me dera ver já concluidas ef-º
Itâs ditofas nupcias! á part. -

Efuz. Aquella das ancas roliças he Taramella,


e ainda que o não feja, como imaginatio
facit caufām , fupponho que he ella; e já
º que he menina do açafate, dançarei com el
da huma giga. Senhora mafcarada, aqui to
;"ဗွီဝ8 fomos huns, erga o rabete, e vamos -
"dançando. " "" . . . . ..
- .
Tarani. Bem condizem as palavras com o gef s
"to; tenho entendido, que em tudo he ridículo.
Esfuz. “Ella, he fem duvida, que, agora a co
nheço melhor pelo falfo metal da voz: ora
entiricemo-nos em fórma dançatriz. * ~*
☆・
* :
A RIA A D GO ".
Em fórma de Minuete. "?
Esfuz. Inda que gafte --' '. .' .'. .' . - . '.” *3. º, - ..."
Duzentas folas, " ":" : ~ N.
Mil cabriolas ് : *
Por ti farei. . . .. . .. . . ;
ត្ Ai que
Taram. Q bichnicro!--*
ancro e ***

~
-*

-
" de Creta, 35
· Que horrenda cara!* - 9
Quem lhe cafcára , o , 7 * :* ~:

Hum cambapé. Faz Esf. que tropeça.


Zsfuz. Dá-me efia mão, - - . . -

Para me erguer. , ,
Taram, Vá-fe dahi , . . .. . . . ..
-Quem he voſé 2. ‘. . . .. º.

Esfuz. Sou quem por ti


Mil cabriolas , …, … - ; ; … - $ 3
Juntas farei; --- -
--

Queres tu ver?,
Ora lá vai, , , … -

Huma, duas, e tres, e quatro, e cin


- co, e feis. . Em pulos.
Ambos. Mui buliçofo, º “ -

Tens efe pé! , , -º *


Rei. Bafta, demos por acabado o faráo. Olá;
Preparem-fe as mezas, pois quero banquetear
eta noite aos. Principes.
Taram. Vamo-nos , tia , que os Principes que
rem cear. Ah , falfo Tczeo, eu me vingarei
de ti. á part. e vaisſe.
25'ang. E que fe paflaffe a noite fem haver hum
Embaixador, que comigo dançafe, para mof
trar as minhas habilidades! Paciencia , vamos
a codear. - - á part. e vai-ſe.
Corre-fe a corrediça do meio , apperece huma
meza, e tirão todos as maftaras, excepto
Teze0 , e Tebañdro.
Rei. Principes, tirai as mafcaras, que não ha
veis de comer com ellas. - - .

Tezeo. Eftou Perdido , fe. ElRei teima, º em


- ... ., ... : : quc :
- s

& Babyèinto . . .

que nos defcubramos, pois já me não pofo


retirar , {em que me veja , e fe? me for a
º fua vita, talvez que nip não confinta. Quem
já mais fe vio em tão apertado lance! á part.
Fedra. Ai de mim, que fe Tezeo tira a maf
cara, ElRei o conhece ! Não tires a mafca
ra, que nitio etá a tua vida. ***"
:: á parte para Teband.
Teband. A minha vida ? Não éntendo a Fedra.
í 1 á part.
Ariad. Que ferá de Tezeo , fe. El Rei porfiar
em que tire a mafcara?Tezeo, não tires a
imafcaza, que primeiro, eftá a túa confervaçáo.
". . . . . . . : 3 á parte para Tezeo.
'Tezeo. Bem fei, mas que hei de fazer? >
Rei. Que he ifo, Lidoro ? Que he ifo, Teban
: dro 3 náo tirais ás mafcaras?: Reeufais o meu
--. convite ? ... 'º a"、 : / “” cc 2.ー: * .

Esfuz. Eu por mim, Senhor, fem preceito de


- Vofia Magetade…já tirei a mafcarilha , fe
bem que para tacs funções ainda com maf
... cara mafcára. -

Teband. Fedra me diz º que não tire º a mafcá


ra, e El Rei ordena o contrario ; como ha
... de ifto fer ? . . . . . ? ? … 2: ¡ ' ‰ á parte.
Tezeo. Hoje ferá a minha total ruina. º á part.
Fsfuz. Não te diffe eu, Senhor", que º temia
neta dança algum contratempo" º : º
. . . … … … á part. para Tezeg.
Rei. Effa defobediencia he ludibrio do mieu đe
córo. Que receio tendes em vos defcobrires ?
"Alguma tráição indica eferecato, e efere
"buço. Olá da minha guarda. Ae
\
-- de Creta. . 95
:Fedra." Ai infeliz Tezeo, eu me vou, antes
que os meus olhos vejão tal defgraça. Quem
-- nunca tes mandára chamar ! . . á part. e vai-fe.
Ariad. Que infelicidade º á part.
JEsfuz. Eis-aqui os bailes ! Coufa de pés (em
pre dá na cabeça. - á part.
Tanto que El Rei chama a guarda , virão dous
Soldados , e com elles o Principe Lidoro com
- mafcara, pela parte donde eftá Tezeo, e efe
febirá logo , e El Rei eftará virado com as
- cota para elle, e Tebandro tira a mafcara.
Tezeo. Agora nefte tropel, e confuzáoj me
hirei. Pai-ſe.
Lidor. Não pude acabar comigo deixar de vir
ao faráo; mas cuido que já venho tarde. Á p.
Ariad. Já fe foi Tezeo: já refpiro com focego.
- … . . á part.
Rei. Agora fará o rigor, o que não pôde o
refpeito. 3 - - - -

Teband. Aqui não ha mais que obedecer. Se


nhor, Vofia Magetade não acute de remif
fa a minha obediencia, pois eu... eu...
º - Tira a maſcara.
Rei. Efá bem, Tebandro. E vós Lidoro nem
o exemplo de Tebandro, nem o meu pre
ceito he batante , para que acabeis de tirar
a mafcara? Porém não deveis de fer Lidoro,
· que a ſer , ſerieis mais attento ; e neſſa ſup
| º pofição: Olá, tirai a mafcara a efe homem,
- Para que depois de conhecido, pague com
… a vida o ofeu atrevimento.…… - - - -

Lidor.
cº-
Senhor, que diz-Vofa Magetade", ՇԵfe
96 Labyrintho
eu ainda agora, entro, fem que em nenhum
tempo fole inobediente a teu preceito ?-4,
- - -- . . . Tira a meſcara. :
Rei. He boa defculpa eta., Lidoro , querer
contradizer huma occular, evidencia. . . 7 - %.
Lidor. Hum Principe de Epyro nåo fabe men
tir ; e para que me acredites, pergunta-o a
:
elles Soldados , que comigo vieráo.''' , ..
Sold. I. Aflim he, Senhor, que o Principe Li
doro comnofco entrou. , … v ºs i v s%
Esfuz. Ifo etá muito bem, mas o caldoá part.
rá de neve.
eta -

Ariad. Eítimo que foffe Lidoro o culpado. á p.


Àei. Lidoro , eu creio o que me dizeis; po
rém deixaí que creia tambem aos meus olhos,
que viráo hum mafcara dançar com , Ariadna
a quem mandei fe defcobrife, cuja defobedi
encia foi tal, que para feu catigo me obri
gou a chamar a eftes Soldados de minha
guarda. . .. . . . . . .
Zidor. Pois, Senhor, eu não dancei com Aria
dna, que a minha fortuna fempre advería
me privou defe bem, por não querer confe
獸 favores no disfarce de quem na realida
e me deſpreza ; e aſſim peço-te , me dès li
cença para retirar-me á minha Corte, que
como ha em Palacio quem dance com Aria
dna, e ha nella repudios, que me deſen
ganáo, batante motivo parece que abona
o meu retiro., * * … Quer ir-fe.
Fei.. Náo vos aufenteis , Lidoro , levando hüm
efcrupulo tão indecente ao meu decoro... Eu
/ -
|
VOS
v \
· de Creta, A - 97,
vos protnetto averiguar quem foi o que dan
gou y com Ariadna, para o ques empenho, a
minha Real palavra. , , , , . ; :
Esfuz. Ifio afim ferá; porém a fopa esfriata ef.
Ariad. Lidoro, fe pelos meus defvios vos au
, fantais , digo que tendes razão; porém fem:
--pre andates defcomedido em dizer, que ha
.: em Palacio quem dance comigo ; quando não
- póde haver tão atrevido pentamento, que in
tentaffe com o diffimulo do disfarce, aprovei
tar-fe do conta&to da minha mão , pois fó.
com a permittida faculdade d'ElRei commer
terias, com eſſe indulto, eſſe deliéto. A
Lidor,s De táo ditofo crime defejara fer o cul
do ze - . ::- . . . . .
##ိ Senhores, guardem ifo para fobre me
za, pois, naquela babylonia de paios não fal
tão linguas para deslindar effe novo cafo da
- conſcicndia, . .. . . . . . . 4:: :: * : . . . f
Rei. Eu, confcffo, que eftou, perplexo , e aínda
não pofo crer que não dançates com Ariadna.
Lidor. Nem ao menos, pelo vetido pudetes.
- ಕ್ಲಿಕ್ಗ fe mc paticia eu com, effe ma{carä,.:
que dançou? , , , , , , , s- , , , , , , , , , ,
ARei. . ရ္ဟိမ္ဟုဖ္ရင္ဆိုႏိုင္ငံ os
annos me váo privando da
ಕ್ಲ?
do melhor -fentido, não fiz apre-.
, hensáo no, vetido; diga o Ariadna, e Te
bandro. . . . . . :, :
Teband. Náe ha duvida, que o vetido era dif-,
-
.ferente a efte de Lidoro. „ „ „
- - - . ‫„ ة‬
, ‫ مم‬:„
‫ة اية‬s;
‫ ثلاث‬- .
Ariad. Pois a meu ver nenhuma differenç * ggi
.nha ; S. Para que Lidorº.fe não atrevai?"
Ton. I. -I - mi - -
98 Labyrintho.
minha prefença a proferir tão inauditas ofen
º fas, Vofia Magetade me permittaºlicença,
pois que não polo caftigar o feu arrevimen- -

"to, ao menos me retire de ouvir táb loucas


"palavras. -.-" * Pai-ſe.
Psfaz. Ora ito já fe não póde aturar ; eu não
r hei de fer Tantalo , ainda que a efteiafnö Tn
…ferno; valhão-me as minhas rapantes habili
- dades, que com a difputafinha em nada te
… parâo a etas horas, . ... 2 º tº ºx!
Afonde-fe Esfuziote debaixo da meza yº eº de
quando em quando deita a mão em bumprato.º
Rei. O cafo etá duvidofo. i., fºi º sº??
Esfuz. Por ido vou commentando. Deita a mão.
Aéi. Lidoro, defcançai, que vos prometto, ave
…iguar quem foi, o que dançou com Aria
- dna; pois a não feres vós, º como dizeis, e
-Háb', Wetmos retiraf-fe o oútro!, que fe füp
pöem, não ſei quem poſſa ſer, ſalvo le for
"o vivo morto, que o Oraculo prediffe para
…total extinção de Minotauro. " " Kai-fé.
Esfuz. Iffo dizem todos á boca cheia. Comendo.
Teband. Vou confufo, fem faber, porque cau
fa me diria Fedra , que me não" defcobrife.
:Í: ºÄ°¡± ® · ¿ · 2: “ : ” á parte e Jai-fe..
Eidor. Quem vio maior confusão! * # : ;
Esfuz. Pergunte-mo a mim, que eu porei ifło
em pratos limpos. _ ._ , . á part. ,
Lidor. Que enleio fetá ete? Tudó em "Creta"
sáo labyrinthos, e enigmas Pois afirmar El
*Res; que eu dancei com Ariadna, quando
"vinha pars effe effeito , e o que * * hai
•;5 : - l- * , Q
de Greta.“, 99.
não apparecer, nem aber-fe quem cóm ella
dançou ; não, feio, que prefumo ! ,,
Esfuz. O fupino de prefumo he o prefunto, e
efte que não he mão ! , , , , á parte.
Lidor. Prefumir em Ariadna, que admitte ou
tro amante, he defacerto, por não haver em
Creta, quem a mereça : eu , vacilante, no
Oceano tempetuofo de tanta confusão, não
fei difcernir o que ferá ifto,
' Esfuz... He chourigo , que fabe como gaitas, á p.
Eídor. Oh nunca caprichára em não vir ao bai
le; que fe a tempo, chegafe, nunca haveria
- quem tanta fortuna confeguíra ! Oh que tor
mento me penetra o íntimo do coração, pois
em tanta duvida não polfo defcifrar a cáufa
de minhas penas !, -i … . . ,
Esfuz. Na verdade, que ifto he hum bocado,
a que fez não póde tragar : valha o diabo ao
cofinheiro , que deixou o gallo com efporões.
- ~, , , t
º -

- ** * * º - ‫هنر‬ •** *

Repete Lidoro o feguinte .


: - い○ſ'z … .. . .

so N E T o. - - º

Se ete mal, que padeço, hei de mottallo,


Perifrazis não acho a definillo;…
. Pois quando dentro d’alma fei fentillo , ,
Balbuciente he o gemido a declarallo: , ,
Por mãis que intento em vozes defcrifrallo;
. Me fuffoca o pezar ao- proferillo , • * ,

. Pois contém ete mal hum tal figillo,


- Que parece he ತಟ್ಟಿ o publicalie !
… - 11
IOO. Labyrintho º

Se o tormento, que n”alma fe refume,


Refide inexplicavel cá no interno * * ** -

* Do peito
Sómente , donde
caberá feu finto
mal hum vivo lume : · · ·
eterno, • **

*
* -
"Qu na língua do fogo do ciume, . . ...
*Ou na boca voraz do mefmo inferno. " :
Ésfuz. 照 d deú o motc , cá vai a glofa.
** *
Comendo.
3ʼahe, Taramella.
Taram. Já que o falfo Tezco correfponde a Ária-.
dna, pois com a banda, que lhe dei em feu
nome, veio ao faráo, e com ella donçou
com notorio defprezo de minha ºpofoa, que
*
epero, que me náo vingo etorvando
tentos do feu amor ? " * , * : *
ostº:*in
Esfuz. Lá vem Taramella, fe me não engano:
e como vem comifinha! .. . *

Taram. Senhor Lidoro tão fó por aqui a etas


horas? Já-me não pergunta por Ariadna? *
Lidor. Já fe acabou effe cuidado , que como
Ariadna tem quem dance com ella, não he mui
to que encontre mudanças na minha fortuna.
Taram. Tem muita razão Vofia Alteza, e mui
to mais dançando com quem dançou. ,
Esfuz. Temos o caldo entornado, que a mo
e ga he capaz , como eu aqui faço, de dar
com a lingua nos dentes.” ” ' . . … á part.
Lidor. Pois, Taramella, tu fabes quem dançou
* * , ;
** * * -
com Ariadna ? - * * * * *

Taram. Se guardas fegredo, eu to direi. Zêlos,


he tempo de derramar já tanto veneno. áp.
Erfuz. Vejão lá , fe Como me deu a bah - da
|
rºde Cretá. -101

da no Labyrintho, ſe a déſſe a Tezeo, que


tal feria ? . ." . . r

Lidor. Dize-mo, Taramella: e para que vejas


- o meu agradecimento, ahi tens neta joia o
anticipado premio do meu affe&o. Dá a joia.
Taram. Ai Senhor, para mim não ha mais joia,
蠶 o feu bom modo, e cortezia; que o mo
- do , con que fe dá , augmenta o valor...da
dadiva.
Esfuz. Porém fempre lambendo.— á ptrt.
Lidor. Dize, não tenhas pejo.
Eufuz. Eu cuido , que ella etá pejada, pois
a vejo em termos de vomitar. á parte.
Taram. Vigie não venha Ariada , que fe me
acha falando com Vofia Alteza fó por fó,
me matará certamente; pois diz, que nem
_coufa fua quer que com Vofa Alteza falle.
Lidor. Pódes dizer, que ella não vem agora..
Taram. Pois, Senhor, faberá, que quem dan
çou com Ariadna.... ai Senhor, veja por
fua vida náo venha ella.
Lidor. Dize que não vem; pois quem foi?
Taram. Foi Tezeo. - --

Lidor. Tezeo? Que dizes ? Como póde fer, fe


ele morreo no Labyrintho ? Vai-te, e deixa
3 ' me com cffis quimeras. ' º .
Esfuz. A mulher he capaz de defenterrar mor
tos. , .* '. -

Taram. Senhor Lidoro , Tezeo não morreo:


Ariadna fe correfponde com elle, e veio ao
baile , e por final. . . . .
- -

Lidor. Epera, que ahi vem Ariadna por aquel


la fala. T4--
-
η Ο2 * Labyrintho
2aram, Ai defgraçada de mim , fe aqui me
vê ! Efcondame em algures. . -

JEsfuz. Bem haja Ariadna, que veio; nunca te


º pé doa. .. . * , á part.
Lidor. Em quanto ella pafa, efconde-te debai
#xo daquella meza , que de outra forte não
º pódes hir, fem que te veja. " "
feran. Pois eu me efcondo, e avife-me quan
do fe vai, - - *

JEsfuz, Anda para cá, que eu te perguntarei, á p.


Econde-fe Taramella debaixo da meza , donde
eftá Esfuziote, e brigão de forte, que vi-º
rá a meza ao chão, º ---

Taram. Ainda etou fem pinga de fangue no


... corpo, . . . . . .. . .. . .. . . ..
Esfuz. Aqui fe pagáo ellas, velhaca, embuf
\ teira. • - - --

Taram. Ai, que não fei quem aqui etá! ;


Eifuz. Cala-te , marafona. - -

Târam. Ah que d'ElRei; acuda-me Senhor Li


d9ro ; acuda-me Voßa Alteza., Caĥeja meza.
Esfúz. Antes que te vejáo, Esfuziote, vai-te
- esfuziando... … :- . . . . . . Kai-ſe,
Lidor. Quem vai a hi! Quem he, Taramella ?
Taram. Elle ahi vai, veja fe eu falo verdade?
Lidor. Irei em feu feguimento..., ,, , Qker ir-fé.
.9'ahe Ariadma.
Ariad. Em feguimento de quem ? Que foi ifio,
Taramella? Que difturbio he ete? a
Taram. Vindo levantar a meza, etava hum
Xoáo toendo hum offo , foi elle , que má \
- quei
-
- ,,de: Creta. £103
o queria levar a carne da perra por amor, do
, offo, que para ambos foi de correr; cu para
· fugir , e o cáo para morder-me; e com o me
do tropecei na meza , e veio tudo ao chãº.
idor, Que não udeſſe diftinguir quem era
. .. o que fugio ! Mas quema havia i de fer feráo
- quem dife: Taramella.; que talvez por efle
- refpeito vieffe Ariadna a efte lugar, eftoryan
slo-me o feguillo ? • „ , á p4rt.
Ariad. Vai chamar quem levante a meza. Qu
ves, dirás a Tezeo, , que fe por acafo me
… não ouvio no baile, que o efpero na fala dos
enganos á manhá, á, noite. . . á p4rt.
Taram. Eu vou , Senhora. Olhe o negro cão
-, o futo que me metteo ! , , , , , , ,, ,
Lidor. Cuido , Senhora, que já vindes tarde ;
, mas quem he vivo fempre apparece. …
Ariad Não entendo efa nova fraze de falar-me.
Lidor. Não fem caufa erão os teus defvios,
, ingrata; pois defprezando a viva confiancia,
.… com que te adoro, idolatras a hum morto
-, na apparencia, que vive, em teu coração na
realidade. . . . .
Ariad. Ai befgrada ! Que be,o que ouço ? á p. '
Lidor. Agora morrerei com mais fuavidade, co
nhecendo a caufa de teus defvios; mas não de
fefperado na incerteza da caufa de teu defdem.
Ariad. Como defattento a meu decóro fabri
cais em vofo penfamento e Tes temerarios con
ceitos indignos de minha foberania ?
Lidor. Que offeaf, faço em dizer, que amas
a. ----
Tezeo , e • que
* Tºº
foi
* , ,
s'
quem comtigo dançºu
. . . . . . dif
- *-* -- - -
*

--
164 zabrinho
disfargado ? E fe hum Principe como Tezeo
he o teu emprego, em que fe póde offen
der o teu decoro ? º - "
Ariad. Que mais claro o ha de dizer? Louco 靴

Principe, bem fe vê que todas as máqui


nas, que fabrícas, são fundadas em aereas
"defconfianças; pois ainda que Tezeo podefe
º refufcitar agora , nem vós , nem elle , nem nin
guem podia contratar a minha ifenção: ide-vos,
ide-vos, barbaro, temerario , que elas fingidas
idéas não pôdem efcurecer as purezas do Sol.
Lidor. Advirti,
de amarquea Daphne.
o Sol com fer puro, não
deixou - .
‫گی‬

Ariad. Ide-vos, tenho dito. . - -


Lidor. Eu me vou; porém não fei; fe me tor
º + - - ... a ".
*
narás a ver; que os zelos, em que me abra
"zo, não cabendo dentro do coração, talvez
tação maior eftiago, do que imaginas. Vai-fé.
Ariad. Ai de mim, que Lidoro zelofo, faben>
do que Tezeo he vivo , o hirá communicar a
, º ElRei ! Que farei? Amor, influe acertos a meus
*
-
intentos , para que Tezeo, não fique oppri
mido a violencias de hum cégo ciume.”
º
Canta Ariadnía a feguinte ':
r
- í í A R I A. - -- -

• Confufa, e perdida', ...


Sem alma, e tem vida,
Alivio em meus males sy. “ . .
Aonde acharei ? - ‘. . .
Se a infiel ryrannia ; , r: >

De hum cégo me guia, * . . . . ..


Em tantos enleios : " > . . . , ,
Quc acertos terei : /aife. SCE
/~
:- ¿le Creta. " to;
. .. . . .. . . - - :- " ", r,”

-
... .
- - - -
s C E N A. IV. -
- - º --
§
" ſº s

Gabinete, e e/pelho no fim delle. Sabem. Te


- i. zeo, e Dedalo. . . . . ''',

IDedal. Nº Otavel foi a traça , com que te


. . . . fahifte do faráo ! E pois então
º lografte ela fortuna , não he juto entendas,
que fempre terás os fados propicios. . . º

Tezeo. Nunca me vi em tão evidente perigo;


- porém por maior que feja, nunca deixarei de
ver a Ariadna; que hum epirito, armado de
amor, não terme as iras de Marte. … * *
JDedal. Efas palavras são efeitos de hum ju
venil ardor; algum dia roputarás 'ignorancia
· o mefmo , que agora julgas : difcrição: A di
ga-o eu , quando fabriquei efte Labyrintho,
efpecialmente efte gabinete, no qual empe
nhei com particularidade a minha fciencia;
porém o que naquelle tempo foi vangloria da
- idéa , hoje vejo que foi erro da fantafia.
2 ezeo. Em todos os quartos do Labyrintho ad
"miro tanto artificio , que , não feiº difcernir
qual he o melhor; efte náo ha duvida que
admira, mas não excede. -. . ;
IDedal. Se tu , Senhor, fouberas a virtude que
tem, aquelle efpelho, verias o quanto ete ga
binete he digno de etimação. , , , ,
Tezeo. Não me dilates o goto de fabello. ….
Dedal. Aquelle efpelho, º que alli vez, fica fron
teiro áquella janella, da qual, ainda que mui
ΚΟ -
тоб Labyrintho
to ditante , fe vem os jardins de Palacio;
e fem embargo da fua diftahcia , he tal o 5 :
artificio com que fabriquei efe efpelho, que * ***
- àquelle. objecto remoto o avifinha tanto aos
olhos, que nelle fe diftingue a minima flor *:::
daquelle jardim: repara , e vê. * A
Tezeo. Não ha duvida. Que ameno penfil!. Mas t :
*#que muito , fe Ariadna oftentando-fe Flora វៈ
, , defe jardim, vete de purpuras aS rolas е !";
|

de can lores as aflucenas ! … : . . . . . .


Dedal. Conheces quem he aquelle, que lá vem? *\
Tezeo. Já vejo, que he Lidoro, e tão diftin
<iétamente, como fe eftiveffe aqui comnofco.
Por detraz do e/pelho apparece Lidoro.
Lidor. Ainda me não pofo capacitar, que Te.
zeo he vivo, fé pelo leve infor-me de Ta
-iramella; he neceffario maior averiguação pa
, ra' que com mais certeza o communique a El
- Rei em vingança dos meus zelos: bem fei,
, que as conjecturas são eficazes; porque ha
a ver quem com Ariadaa dançaffe, fem que fe
vife quem foi, e logo fahir hum homem de
- baixo, da meza, com arrebatada fuga ; ifto
a argue huma quai veroimilidade , de que Te
* Zeo he, vivo ; porém para condemnar não
baftáo indicios, … -- .... . . .. . .

IDed.tt. Mai trifle , e, penfativo eftá Lidoro! … V.


Tezeo. Sem duvida os defvios de Ariadna, são
a caufa de feus pezares.
JDedal. Lá vem Ariadna; vê que mais queres?
Apparece Ariadna por detraz do efpelho. \.
ºezro." E como vem galharda ! Ai Dedalo,
* * * . que
cde Grėta; тө7.
- ཤཱ་ཝཱརྱ་ * confidero naquelle efpelho as proprieda
-- des de Uftqfio g - pois na esféra de feus rajos
me abrazo Salamandra de fuas luzes, fe, já
- náo he „Telefcepio : » em que divifo. ar. bglla
e grandeza daquelle, afro-I , , ... ", -
Ariad. Aqui efábbidoro: quanto temo, que
dos feus zelos a furia finta Tezeo. ' Quero
e, defvanecellos.,,ºbnoftrando-rne amante; que nas
畿 de amor, vencer':',
clhor. yſtema.… ,
com enganos he o me
ു. á part.
Lidor; Vofar Alteza, Senhora, tão fó por efte
…jardim, podendo etar acompanhada no La
... byrintho ? . . . . . . . . . . .
Ariad. Lidoro , ainda fe vos, não defvaneceo
efIa fantafia ? Pois fabei , que a fer poffivel
º viver Tezeo; e seu capaz de amar, nunca
por Tezeo vos deprezara. ..., … … ...
Tezeo. Quem me dera poder ouvir o que fallão
Ariadna, e Lidoro , , , , , , , , , , , ,
ರಾಳ್ಲ!
A tanto não póde chegar a fciencia
- Ptica. , e : c . . .. . . . . , - . -

Tezco. Pois para que me facilitate o ver, fe


me haveis negar o ouvir ! º

¿idor. Se até aquí, cruel , me matavas, com de


fenganos, agorar com enganos me queres ty
rannizar? Não me defvaneças com pofliveis ca
ºrinhos a ifenção do teu peito, que bem ine
"formado: etou , que adoras a Tczeo vivo, -ou
• -ao menos as memorias de Tezco, morto ; pois
de toda a forte fei que o amas. , , ,
Ariad. Para defvanecer efe errado proje&o do
teu ciume, quero , violentando a minha tu
-* *
naº -
ToS Labyrintho -

"tural ifenção, obedecer a teu rogo: vai, § {


* Lidoro , dize, a ElRei meu Pai, que abbre 赏氹
* vie os nofos defpoforios, para que vejas, que
i o meu defvio não fe origina de occultos af
feĉtos. Perdoa , Tezeo ," eftasºfingidas vozes
de minha cautella, que todas são klirigidas á
º tua liberdade. : : : c ccf: X • á parte.
Tezeo. Que eftará Ariadna dizendo a Lidoro
com tanta eficacia ? - 2 orº . .. . .
JLidor. Bellifima Ariadna, agora conheço a te
méridade de meus ciumes. Porém quando não
forão indifcreios os zelos ? E pois com tantos
favores premeias os meus delictos, deixa que
protrado , novamente a minha liberdade te
facrifique. } .9% ºf
Põem (e Lidoro de joelhos, e Ariadna o levanta.
Tezeo. Que he o que vejo ? Ai de mim, Dedalo!
* Que importa etar aquiº ociofo o ouvido, fe
os olhos como teftemunhas de vita me in
- formão dos meus zelos ? Não vite a Lidoro
rendido aos pés de Ariadna ; e ella com , ale
gres carinhos recebendo a viétima de fuas ado
rações ? - . . . . ...; -

Dedal. Póde fer, que não feja de amor o mo


- rivo defe rendimento , maiormente quando
- não pódes ouvir o que dizem. * :

Tezeo.” Hum impaciente amante , como o Lido


ro, que a fumpto podia ter para as "fuas vo
zes, fenão expreſsões de feu amor ? Ai in
feliz, que como bafilifco dos zelos a mim
mefmo me mato , quando os vejo no dia
fano daquelle efpelho !
- Z
. ..
/
. ..;
ILí -
- de · Creia. - 109
Lidor. Porém já que o fuave efpirito de tua
fineza communica novos alentos á minha cf
perança, permitte-me algum final externo de
tua conſtancia. - - -

Ariad. Crefça o engano, augmente-fe a induf


tria. Suppofto que o abono de minha pala
_vra para me acreditares batava, com tudo
efte retrato meu ferá o fiador, para que creias
mais á copia , que ao original. .. ‘. . .
ºf , º, . Dá-lhe o rétrato.
Lidor. Com o favor dete retrato alentas ao
meu coração de vivas cores. es , ,
Tezeo...@ue dizes , Dedalo? Póde agora enga
nar fe a vita ? Náo vifte dar Ariadna hum
retrato feu, que no peito trazia, a Lidoro?
없 mais . clara evidencia de fua falfidade ?
Ah ingrara, Ah falfa Ariadna ! Eas eráo as
tuas ifenções ? Porém fe és mulher, que mui
to fejas mudavel . . . .. . .
Dedal. Oh quem nunca trouxera a Tezeo a efte
lugar! - - .
Lidor. Para que me pofa vangloriar de ditoio -
{ó falta que hum, favor me concedas. …; …
Ariad. Dize. - -

Lidor. Attende. . . . . . .. .. . . . .
cantão Lidoro, Ariadna, e Tezco a feguinte
Eidor. Se o tentas no pintado . . . . . .
- Contante o teu agrado, - , - a

Oh, peço-te náo feja, . … ',


Pintado º teu favor... , , ,… #
31o Labyrinto,
Ariad, Se o vario deflas: cores rià Â · § A
-} > (*** Adoras-por favores , ** · gy , №s *
· oº … Nas fómbras' da pinturas i . :. ::: 32 ;
- Mitiga o teu ardor. . ::: **ro t,
2Tezeö. Falfa , cruel, avára » * * * * * * * *
- t'r i ri Na duvida repara , , ozee ! . . . . .
Verás nefe retrato "
… … Copiada a minha dôr, … o Á …
Lidor. Dize , ferás conſtante ? „ , i, a
Ariad. A mim não mo perguntes;
riº a... O tempo tol dirá: …"; o " > * . * * *
Tezeo, Tyranna ; eu defefpero , , , , , , ,1
}
Eu me abrazo, en enlouquego, , , y
¿, Quem vio tormento igual
Lidor. A copia que me anima, , , cºn
Ariad. A gloria que me alenta, º s r. es º
Tezeo. A dôr que me atormenta, … gr. dº
Todos. Se intenta eternizar." 2 º ae
Lidor. Mas ai , que effa fortuna T: º : ·
* #; 3 - Náo pofo acreditar! ...oºop dº …...…
Ariad. Mas ai, que a tua idéa
Se póde allucinar ! ! ! . . . .
Tezeo. Mas ai, que o meu ciúme e . ": '
Me quer precipitar ! ... . .. .
铅 Ar. Pois que ouço,
វិញុំ Pois 蠶
fezco. Que ன்ே.
que vejo , " ⓞn
", tⓞ ່Ȥ.
‫مه آلمان‬ ۹ T}

- Wäo-fe Lidoro, e . Ariadna.


IDedal. Principe, não té entregues todo ao fenº
timento, deixa loucuras de amorº º
7 ezeo. Nada me digas; deixa-me feguir a hu
ma inimiga , queºna
•, 7 - -
feltibe !፲Iቧ

l
de Creta." 鲁曹覆

· dim fe oſtenta Venus daquelle Adenis y p6


rém o meu mavorcio furor em fanguinokenta
cºnitariioffofe:efcreverá nas folkàsi dis brancas
rofas as rubricas de minha vingança. . ._
- …… Quebra o e/pelho,
ZDedal. Que he o que interras ? - 5 sx,
Tezeo. Arrancar aquella traidora dos braços de
ſeu amente. i. * * * * * 1.
Dedal. Que culpa teve o crytal, para experi,
teu rigor, ੰ : fó 鷺 ‫لم‬erً‫ا‬
flexo vifke a caufa de tuas, penas! * * *
Tezeo. Ainda que errei o tiro, fempre acertei
o golpe , porque efpelho , º que foi theatro
dos meus zelos, he bem que em atomos def;
fallcça, para que ao eftrago de feus cryftães
fe reprefente melhor a tragedia de meu amór;
já que o furor , que me abraza, não fabs
liquidar
de
no epelho de: , ,meus
TT18U prantov
olhos . o. . erytà
, ºfi ri »- --- -
. . f*

Dedal. Em hum infante defvsnecete o traba


tho de tamtos annos. ' ' ' • ' • • • . 3
Tezeo. Dedalo , guia-me á fala dos engarigš,
aonde me diffe Ariadna a efperafe; etacribi
te; pois já o Delio Planeta em mal diftin
ctas lazes quaſi teca a diafana métà do uſº
timo horizonte. : ..ri: ‫له أو لم ؟‬
Dedal. Para que procuras a Ariadna, fe a vif
te feguir a Lidoro.
Tezeo. Por ifo mefmo para que na fala dos
enganos encontre o ultimo deſengano. Ai De
dalo, que ha no mundo mais labyrinthos do
que cuidas !
• ‫فلم۔‬- -
-Pe
-
ſ
f 12 . Labirintho -

JDedal. Não fei, que até aqui haja» outros,iffó


чra deíte. tº - - …, …;&, " . va !. na it
Jezeo, Pois fabe, que dentro dete Labyrintho
exite outro labyrintho. E º "C. e… ..." os
Dedal. Não entendo.
Tezeo. Para que me entendas, attende, e verás.
‫ "مه‬,
-
.
-
.
-
. . ،)...‫ن‬.‫داد‬
S O N E T O. . . . . . . ;
t ---
*
-
::..., * { .
Labyrintho maior, mais intrincado,
Tem amor, em meu peito conftruido, ..….
;- De quem fe oftenta aos golpes, do gemido », ,
# Sinzela magoa, artifice o cuidado. - … o
Na memoria-fe vè, delineado , . . . -ു
. O tormento de hum, gosto amortecido, a:
, - Na confusão da dôr o bem perdido … …
2.Nunca fe encontra , ainda quando achado...;
A2, máquina mental defia efitöðura . . . . . . . .
Adornão, em funetos parallelos, .. .. …,
...Lamina o, fufto , fombras á pintura: · Avi, ... V.
Columnas sáo os miferos defvélos,, ,,g.-s …!¡
, Eftatua o defengano fe afigura » ……...……,y
- Fio a efperança 麗 , monftros os zelos. Vai-fe.
•* .. . . . . . .” - ". . . . . . . . ; ,;
Dedal. Quem duvídas que amos he o maiºr
labyrintho? -- , Kaife.
::::r : ' , . .. ․ . . ‫ ﻭو‬، ، ، ، ، ، ، ، ، ، ، ، ،
v - ? tº . .. . * * * * **
2 y - * - . . . º. º . . .. ..
- . .. . . . . . . .. tº a c. , ſ: , . . . ." ºf , .
: : ; ; ; . . : ) . . . :)
… . - . ºf 'scE.
*

de Creta. 113

S C E N A V.

| Sala de columnas , que a feu tempo cahiráò , e


ficará tudo, em outra vila , e no fim da
fala haverá huma Vaca.
\

.5ahe Esfuziote..
s
Esfuz. A. que a boca da noite vai en
golindo o manjar branco do dia :
não digo bem ; agora que a lingua do Sol
fe vai encolhendo na boca da noite, a quem .
o cadeado do filencio lhe fura os beiços da
efcuridade, venho fegunda vez ao Labyrintho;
que fe a primeira vim , porque nelle me
perdi , agora venho porque_ fóra delle me
querem deitar a perder. Fiai-vos lá em
mulheres , que em tendo zelos são peiores
que cães damnados! Tomára perguntar a Ta
ramella , para que foi dizer a Lidoro pá pé,
tudo quanto lhe diffe, e por hum triz, que
me não apanha com o rabo na ratoeira: não
lhe perdo-o o máo cozimento, que me cau
fou com os futos; porém para me livrar del
les , e della , hirei buſcar a Tezeo ; que an -
tes quero viver no Labyritnho, que morrer
em Palacio; que póde fer, que fe lhes met
ta em cabeça, que eu fou Tezeo de verda
de , e me torção o pefcoço afim como quem
náo 體 a coufa ; pois çafáo daqui fóra. Oh ,
efta fem duvida hé a Vaca, que diffe Deda
lo fabricára para Pazife! Cá efiá a ecotilha,
... Tom. II. H. por
114 Labyrintho
por onde a tal Rainha vio os touros de pa
lanque! Mas eu , fe me não engano, aqui
vem gente ; feja quem for, efcotilha aberta,
juto pecca ; eu me efcondo dentro da Va
quinha feito Rainho , até que paffe quem
quer que he.
Eſconde ſe è sfuziote ոձ Vaca, e fahe Taramella
Tarant. Outro recado temos de Ariadna para
Tezeo. He para ver fe fe namorao a chu
cha callada ! Bem fiz eu em dizello a Lido
ro. Efta he a fala dos enganos para onde
hei de dizer a Tezeo, que venha : mas ifto
he quafi noite, para hir ao centro do Laby
rintho, e temo que me anoiteça no cami
nho ; o melhor ferá hirme embora, que af
fim como afim já não tenho mais que faber,
que certos sáo ós touros.
Esfuz. Mais certa he a vaca : eta he Tara
mella; não fei fe lhe falle, pois quando a
fua falfidade me e{conde , a fua belleza me
eſcancarea
Taram. Ai! Ainda aqui etá eta negra Vaca ?
Não fei como fe confente efte trate em fer!
Esfuz. Bom trafte és tu.
Taram. Só de a ver me tremem as carnes.
Esfuz. A rapariga tem tremendas, carnaças.
Taram. Oh maldito feja Dedalo , que tal fez
para occafiáo de tanta ruina! -

Esfuz. Oh malditas fejas tu, que táo lambarei


ra és ! - -

Taram. Ella fem duvida parece coufa viva.


Esfuz. Ora viva quem fe chega.
- . . T4
de Creta. 115
Taram. Para que mais, até a pelle tem cabellos.
Esfuz. A occafiáo pelos cabellos. Efpera, ca-
belluda Deidade, que hoje o pente de meu
carinho te tirará as lendeas de tua dcfconfi
ança. — Sabe da Vaca.
Taram. Ai! Quem me acode, que a Vaca fa
be fallar ? - -

Esfuz. Ha coufa mais eloquente cm hum_ban


quete, º que huma lingua de vaca ? Mas a
tua com tua licença merccia fal, e pimenta.
Taram. Ui ! Vofa Alteza cá eta na fala dos
enganos ? Não quiz deixar de obedecer a feus
amores? Fez muito bem, que ella tudo me
reCc. - -

Esfuz. Quem he efia ella, Taramella ?


Taram. Já lhe efquece? He aquella, com quem
dançou o noite paflada.
Esfuz. A noite paflada dançei comtigo.
Taram. Não me queira defefperar ; eu não o
vi dançar com Ariadna com a me{ma banda
azul, que lhe levei ao Labyrintho, e por fi
nal que dançou melhor que ninguem ?
Esfuz. Agora, já cftou mui pezado ; ifto he
chão, que já foi vinha.
7,
na ?
Logo não nega, que dançou com Aria
. - -

Esfuz. Não, filha, que eu não podia dançar


bem, fenáo comtigo. -

Taram. E a banda azul. \


JEsfuz. Azul he ciumes; quem os tem, anda
cêgo ; quem anda cégo, não vê; e quem
náo vê » náo póde ஆ.
- ii
de cores.
4•
1.16 Iabyrintho
Taram. Ora, Senhor, tenho entendido , que
Vofia Alteza faz zombaria de mim.
Esfuz. Já te de , que me náo altezees, que
o amor е а Magetade , fempre fa affentá
rão em iguaes tripeças.
Taram. Senhor, com que etamos ? Vofia A1
teza póde negar , que eu lhe trouxe huma
banda azul ao Labyrintho em nome de Ariadna 2
Esfuz. Afim foi, que a verdade manda Deos,
que fe diga.
Taram. Pôde negar , que agorá o acho aqui
neta fala dos enganos, na qual me difle Aria
dna a efperaffe Vofla , Alteža , , por fe acafo
não tivefle ouvido bem, o que ella lhe diffe 2
He ifto verdade ? ' .. . . -

Esfuz. Verdade he, que eu etou aqui. …


Taram. Logo digo eu bem , que namora a
Ariadna ? * , - , º .

Esfuz. Ifo he mentira.


Táram. Como póde fer verdade , e mentira ao
mefmo tempo. -

Esfuz. Porque nete tempo tudo são mentiras,


c verdades. .

Taram. Se ifo he conceito não o entendo.


Esfuz Pois eu era tão defcortez, que difeffe
conceitos na tua prefença ? -

Taram. E para mais prova, diga, que fazia de


baixo da meza cfcondido, fendo hum Principe ?
Esfuz. Etava para fazer certa prova.
Taram. Prova : De que ? - -

Esfuz. Da tua falfidade, pois fofte tão lingua


triz, que diflete a Lidoro, que eu etava vi
トユーヘ VO«

*
de Creta.' 117
- : vo. Dize , tyranna, affim defempenhas a ca
tarata do teu nome? Se és Tarâmella, por
que te não fechas? Mas fe , és Taramella de
vafa, por io te abrite, defenterrando mor
tos , para enterrar vivos : que dizes agora ?
Taram. Digo, que fiz muito bem; pois já que
eu o não hei de lograr , não quero que me
logre tambem; já que eu choro o feu def
vio , finta Ariadna o que eu padeço; mas
diga-me: por ventura quando fe metteo de
baixo da meza, já fabia o que eu havia de
dizer a Lidoro ? . -: -

Esfuz. Calte, tola, mecanica, não fabes , que


nós os Principes temos o dom de adevinhar ?
E para que o vejas, ela joia, que trazes no
peito, te deu Lidoro; não he verdade ?
Taram. He verdade, pois que temos?
Esfuz. Temos embargos a ifo : dize-me, info
Íente, leviana, fragil, pois tu aceitas joias
de Lidoro, eftando para cazar com hum Prin
cipe, de Athenas ? -

Taram. Elle não ma deu por mal.


Esfuz. Pois eu por mal a to- (Tira a joia.)
mo; larga ela joia, indigna futura Princeza,
que não he decente á minha honra , que
adorne teu peito falfo , diamantes finos. He
boa graça! Eftou ardendo! E quando nada
faquei a joia por bom modo. á part.
Taram. Com que Voffa Alteza me leva a joia,
ainda cm cin)a de me fer desleal ?
Esfuz. Olha, filha , aqui ninguem nos ouve;
eu bem fei que Lidoro te não deu por
-
監"
ᏮᎥᎥó
118 . . Labyrinto
efa joia; mas não he brio meu que tu tra
, _gas diches defe fevandija. -

Taram. Senhor, etava muito bem, fe Voffa


Alteza não amafle a Ariadna. -

Esfuz. Olha, permitta Deos, que fe eu cazar


com Ariadna, que berrando vá a minha al
e ma parar aos quintos infernos a fazer filho
zes com Plutáo. -

Taram. Quanto mais "jura, mais mente.


Esfuz. Que por amor de meu amo perca eu
efa tolá ! Ora vem cá , minha Taramella ,
façamos as pazes , tem latima dete amante
coração, que por ti chora pelas barbas abaixo co
mo huma criança. Não te compadecem os folu
ços de hum Ptincipe , que aſſoando o mon
co da magoa no lenço da ingratidão, deti
la o nariz da finºza o eftilicido do [offri
mento ? Digo alguma coufa ? *

Taram. Ai , శీ: , não feja importuno , an


tes que lhe perca o refpeito.
Esfuz. Perde-o muito embora, que nifo pou
co fe perde. -

1'aram. Pois já que me dá licença, ouça com


o devido refpeito.
Canta Taramella a feguinte
A R J A•

- Que tremulo marres,


Qne eſtatico morras,
Que etitico mirres,
Que morras , que marres , que mirres,
E a mim que fe me dá ?
Por
de Creta. 119
. . . . Por mais que em teus males
· Em ancias te eftales
E em prantos te eſtiles ,
De balde ferá. . º

Quer ir fe , e fabe Sanguixuga.


4ang. Esfuz. Efpera , aonde vás , Taramella 2
Taram. Deixe me que vou defefperada.
Esfaz. Oh, quanto folgo, que vieffe tua tia!
Samg. He poflivel , rapariga , que me faças vir
tropeçando por efes Labyrinthos, vendo que
nele entrate a eftas horas ? Que loucura
foi efla !
Tarum. He vir fegunda vez verificar os meus .
zlos , para que com duas teftemunhas de
vfta fentencce a efte falfo Principe a perpé
tuo defterro de meus carinhos. -

Estaz. Bem folgo eu, Senhora tia, que vief


e vofa Sanguixuguife, fó para ver a info
encia, com que fua fobrinha trata ao fegun
do filho primogenito d'ElRei de Athenas ,
fó porque a Infanta fe afeiçoou de mim; e
veja, tia, que culpa tenho eu de fer querido ?
Jing. Senhor , fe minha fobrinha lhe não ti
vetle amor, não teria zelos. Que fará fe ella
foubefle que Fedra tambem o namora ? á p. .
Hfuz. E foi tão infolente, que em vilipendio
da minha pefoa acceitou huma joia do Prin
cipe Lidoro.
Sng. Ai, Senhor, não feja ciumento, que em
, Palacio he eftilo darem os Principes jóias ás
Driadas do Paço. Olhe, eta que aqui vê,
ma deu o Principe de Chypre. Es

w
i zo Labyrintho
\ Esfuz. Inda mais efia temos? Venha, tia, effa
joia muito deprefa.
Sang. Ai! A minha joia? Para que ?
Esfuz. Para que fim, fenáo à fortiori lha vou
tirando. Arre lá, a tia vindoura de hum Prin
cipe de Athenas ha de trazer joias do Prin
cipe de Chifre! Ifo não ; não Senhora, em
quanto eu tiver o olho aberto. Já temos duas
joias. º - à parte.
Sang. De-me a minha joia, Senhor.
Esfiz. Nada, nada, não tem que fe ançar.
Que dirá o Embaixador , que "he zeloo co
mo os diabos , fe lhe vir efa joia ? Não
queira pelo pouco perder muito.
.Sang. Eu entendo que º iffo do Embaixdor
he palhada, pois ha muito que o não vejo:
Esfuz. Como recufava o teu matrimonio, mn
ei- o degredado para a fua Patria ; mas l
' go virá deitar-fe a teus pés. -

Tar.Tia, não gaftemos tempo; vamos que he tare.


Esfuz. Diga-lhe primeiro, que faça as pazes o
migo; e para que não cuide, que amo a Art
dna , aqui me{mos nefte lugar quero cazr
com fua fobrinha ; ande , leve o diabo quén
não quer.
Sang. Ai menina , aproveita-te da occaſiio.
aram. Ah falfario, não cuides que me Hs
· de lograr. á part. Pois Senhor Tezeo , meti
fe outra vez na Vaca, e efpere por mim,
que eu vou bufcar luzes , para celebrarms
o matrimonio com luminarias. Tu verás coro
me vingo. á part. e vai*.
3anġ|
|
¿e Creta. 遭2愈
&g He pofivel que hei, de ver com etes
olhos esbugalhados a minha fobrinha Prince
za! Senhor, faiba Vofa Alteza, que por ef
ta obra pia de amparar huma orfá fem mái »
háo de os Deofes fazello vičtoriofo de feus
inimigos. Wai-ſe.
Esfuz. Eu fou o noivo, e levo o dote em joias:
com eta cata de gente fou eu gente. Apare
lha-te, Esfuziote, que hoje has de fenhorear
a melhor Deidade, que calçou cothurno. Ai,
que já eftou pulando ! Ora fem duvida, que
a fazer-me Principe muito me grangea na con
feitaria do amor : vamo-nos efconder na Va
ca; comece a obedecer , quem principia a
triunfar. -

AMete fe Esfuziote na Vaca. Sabem Tezco, e


1Dedal.
IDedal. Efta he a fala dos enganos: nella não
temas perigos, que no maior, em que efti
veres , te defenderci com hum certo artificio ,
que fó para mim refervei. .
Tezeo. Poís não te apartes nunca de mim , em
quanto efpero o 嵩 de Ariadna, para clari
ficar a opaca fombra dete cáos; e quando não
o Cometa de meus zelos ferá luzido farol,
que me allunnie.
Esfuz. Frito feja eu, fe aquella voz parda não
he de Tezeo azul no feu ciume: alguma can
caburrada temos!
3'ahe Tebamdro.
Teband. Mui valente he o amor, pois defpre
zando horrores , e confusóes, me ೧೦ndಣ್ಣ 3.
c1
- *

122 - Eabyrintho
eſte confuſo abyſmo de enleios, facilitando
me o caminho a eta fala dos enganos hum
., prático dete - Labyrintho.
Á4he Ariadna pela parte de Tebandro, e Fedra
** - pela de Tezeo. v,

Ariad. Não diffe bem, quem afirmou, que o


... amor carecia de olhos; que a fer cégo, não
me guiaria a efta fala dos enganos, fó a buf
car o bem que adoro. -

Fedra. Verdade falou, quem diffe, que o amor


, era lince , ( Sabe ) que a náo fer , mal me
conduziria a efte pelago de horrores, a pro
, curar a caufa de meu tormento
Tezeo. Pafos ouço; fem duvida he Ariadna.
Teband. Gente vem ; mas quem ha de fer fe
… não Fedra ? -

Tezeo. Vem , brilhante etrella de Venus, a


infiuir... mas que digo ? Tu não és a tyran
na , que me offendeíte ?
Esfuz. Etrella de Venus he etrella Boeira,
aqui deve de haver algum touro , que vem
namorar a eta Vaca. - -

Teband. Feliz mil vezes eu, que em anticipa


das luzes vejo confundir os raios da Aurora
com os refplendores da Lua. -

Esfuz. Se a Lua tem cornos , claro etá que


. . falla com a Vaca metaforicamente.
— Fedra. Es tu acafo aquele ingrato , que não
fabs correponder á minha fineza º para Tezco.
Tezeo, E tü , fem fer acafo , náo és aquella
mudavel, que grata, e carinhofa te oftenta
te com Lidoro eta tarde no jardim ? para 熟

-
-

^
de Creta. 123
Fedra. Vê que te enganas. º

Ariad. Oh quanto etimaras mais neta occa


fião, que eu não foffe eu, fenáo minha ir
mã , a quem como agradecido faberás fer
atn&ñtC. * para Tebandro.
*

Teband. Tu não fabes, galharda, Fedra , que


nunca Ariadna me mereceo hum cuidado? s

para Ariadna.
Ariad. Tezeo cuida que fou Fedra : ah cruel ,
due mal pagas hum conftante amor ! á part.
Esfuz. Que diabo de fufurro ouço aqui! Sem -
duvida ito he algum viveiro de cochichos :
Fedra. Não fei, que motivos tenhas, para fa
bricar effe penfamento contra a lealdade com
que te adoro ?
Tezeo. Se tu fouberas o como te vi com Li
doro, talvez que o não negafes; porém mal
poderáó as tuas vozes contradizer aos meus
olhos ? --- -

Fedra. Já fei que ifo he maxima , que inven


ta a tua falfidade, para que me falte o tem
po de dizerte, que fó etimas os favores de
minha irmã ; mas fe o teu amor não fora cé
go, talvez que fouberas avaliar as finezas,
que me deves.
Tezeo. Tu bem fabes , Ariadna, que fempre
fofte primogenita de meu amor , fem que lo
བླླ་ (༠ Fedra já mais as prerogativas de que
flol.2, - -

Fedra. Ai de mim , que Tezeo cuida , que fou


Ariadna ! Oh ingrato Principe, que m nunca te
conhecèra ! á part.
- „Es
124 Labyrintho
Esfuz. Muito tarda Taramella : eu confeffo
º que já não pofo etar embezerrado.
Teband. Já não fei, formofa Fedra , quando
º me verei completamente feliz.
Ariad. Deixa-me, ingrato, traidor, que já me
º falta a paciencia para ouvir as tuas falfidades
Teband. Jupiter com feus raios me abraze , fe
algum dia quiz a Ariadna, pois fó a ti for
mofa Fcdra. . . . !
Ariad. Cala-te: ai de mim, que cada vez me
ofendes mais ! - ..
Fedra. Bata que nunca idolatrate a Fedra ?
-Tezeo. Só tu , ingrata Ariadna , a pezar das
tuas falfidades foubete ufurpar toda a liberda
de de meu alvedrio. - * * , -

Fedra. Calla-te, defagradecido, que já te não


poſſo eſcutar. : ,
Tezeo. Fu nunca amei a Fedra , tu a Lidoro
fim ; deixa-me, ingrata, não te compadeças
da minha vida. . . . . . .

- Ruido dentro. .

Dedal. Tezeo, retira-te; ahi cuido que eftá


alguem. - *

· -Fedra. Retira-te por hum pouco , ingrato , que


\ fe me não engano, alli vem gente.
Tezeo. Será illusão ; mas com tudo por amor
de ti me retiro.
Esfuz. Ainda não vem eta maldita Taramella;
pois o verde de minha efperança fe vai mu
dando no amarello da defefperação. "


-

/
de Creta. 125
Eſconde-ſe Tezeo, e Dedalo. Sahe Lidoro com
e/pada na mão, e Taramella. -

Taram. Senhor Lidoro, efta he a fala dos en


ganos, bufque-o na Vaca, que elle lá etá
efperando pela Senhora Ariadna.
Lidor. Ah falfa cruel, hoje me vingarei de ti,
e defe tyranno, que me ofende. Mas quem
eftá aqui? Ariadna he fem duvida. -

Encontra-fe com Fedra.


Fedra. Quem ha de fer? Já me defconheces ?
He a tua Ariadna. -

Lidor. Náo me enganou Taramella. á part.


Teband. Querida Fedra, cuido que gente veio.
Ariad. Não fou Fedra, falfo traidor amante.
Teband. Ai de mim! Quem ferá ?
Lidor. Dize, ingrata Ariadna, ainda não achaf
te neta efcuridade a luz de teus olhos?
-
para Fedra.
Dedal. Efpera, Tezeo , aonde vás com efa
efpada ? -
-

Tezeo. A vingar injurias de meu amor; morra


o traidor que me offende.
Sahe Tezeo com e/pada, briga com Lidoro, e
com a confusão fe trocão as Damas, fican
do Fedra ao lado de Tebamdro , e Ariadna
ao de Lidoro.
Lidor. Morra o aleivofo , que me opprime.
Fedra. Que deſgraça ! Ampara-me Principe.
Ariad. Que infelicidade ! Sempre a teu lado
morrerei conftante.
Dedal. Oue confusão!
Teband. Fedra, primeiro etá a tua vida: vem
comigo. Es
-

126 Labyrintho
Esfuz. Nefta arrenegada da confusão fahio o
trunfo de efpadas: ainda bem, que etando o
meu Sol em Tauro, etou metido em hum fino
Taram. Ai, mofina de mim, que eu tive a cul
pa, difto! Hirei chamar quem acuda. Acudão
todos , acudão a etorvar a maior defgraça,
que já mais fe vio: acudão, acudão. Vai-fe
Tezeo. Debalde refiftes ao vigoro(o impulfo de
meu braço. *

Lidor. Por ifo ferá maior o meu triunfo: va


lente ſois ! * . . . .

Tezeo. Tenho amor, e tenho zelos... , , ,


Esfuz. He hum regalo ver touros de palanque
Teband. Fedra, fegue-mé.
Fedra. Como, ºfe etou quafi mortal? "
Ariad. Senhor, ampara a minha vida.
Dentro El Rei.
Rei. Cercai todos o Labyrintho , para que fe
, inveftigue a caufa defte alboroto. -

Dedal. Retiremo-nos, que vem ElRei. -

Tezeo.-Dedalo, agora he tempo para que a tua


induſtria me valha. - -,

Dedal. Anda comigo, que deta forte nos não


poderáó feguir. - A Retirãoſe.
Sahe ElRei, e hum criado com luz; e depois
que ElRei diz: Sufpendei as armas, vão-ſe
Tezeo, e Dedalo, o qual dará huma gran
de pancada, e cabem as columnas, e fica em
vifta de pateo. - - - -

Fei. Sufpendei as armas. Mas ai de mim, que


a fala toda vem vindo fobra nós! Etranho
ſucceſſo! º
Li
de Creta. - 127
Lidor. Iſto hé terremoto ſem duvida ! w
Todos. Deofes clemencia -

Esfuz. Senhores , que diabo ferá ifto ? Tanta


bulha, e algazarra ao redor da Vaca ? Sem
duvida ifto 懿 algum afougue! -

Rei. Perplexo, e confufo, não feio que pronuncie.


Ariad. Lidoro aqui, e Tebandro ? Tezeo fem
duvida fe retirou, antes que o vifem. Oh quan
to etimo que o não encontrafem!, á part.
Fedra. Aonde eftará Tezeo ? Talvez fe aufen
tou, vendo que vinha gente. á part.
Teband. Com quem brigaria Lidoro, não ef
tando aqui mais do que eu, e elle º á part.
Lidor. Tebandro foi fem duvida o com quem
briguei. - - á part.
- -

Rei. Ainda não etou em mim, confufo entre


tanto affombro. Lidoro , Tebandro ; que foi
ifto nefta fala? -

Lidor. Se bem reparo, Senhor , ifto não foi


terremoto, feria algum artificio de Dedalo,
que occulto etaria aqui; pois outro novo edi
ficio fe deixa ver, a pezar da artificiofa rui
na das columnas. - * * * *~*

Rei. Ifo he fem duvida; porém como Dedalo


ainda vive encerrado no Labyrintho, delle
mefmo me poderei informar ; mas por ora -
náo me importa faber io tanto, como a cau
ſa de voſſos inſultos , inquietando o ſilencio
da noite, e o fagrado dete Labyrintho com
defafios ; e o que mais he , ver eu,aqui as
Infantas nete fitio, e a etas horas , evós
Lidoro, com efia efpada na mão. ...
- - Ariad.
128 Labyrintho
Ariad. Eu , e Fedra , Senhor, vindo-nos a di
vertir, e admirar, como fempre, efte Laby
, rintho, fuccedeo, anoitecer nos ; e perdendo
... o tino na confusáo da noite , e do lugar ,
começámos a chamar quem nos adiº з с
os Principes, talvez informados das nofas vo
zes, e clamores , fe animarão a vir libertar
nos dete enleio. Efta he a caufa , Senhor,
de nos achares aqui, e Vofa Magetade me
premitta licença, que a fadiga do fufto me
obriga a que me recolha. Pai-ſe.
Fedra. Bem fingio Ariadna. á part.
JEsfuz. Tambem quem quer que he, mente que
trezanda. . - -

Teband. Como Vofia Magetade já etá infor


mado da verdade, não tendo mais que faber,
não tenho eu mais que efperar; mas fim a
Fedra. Ai louco amor, quando terão fim os
meus males ? á part. e vai-ſe.
Zidor. Por cuja caufa , Senhor, não havia vir
defarmado, vindo a efte lugar. Disfarcemos
. . ainda a falfidade de Ariadna. . . . á part.
Rei. Já tenho dito , que quando quizerem vir
ao Labyrintho , nác veñháo defacompanha
das; e já que fe fez inutil o meu preceito,
agora inviolavelmente ordeno fobpana de mi
nhas iras,
nhão que Labyrintho.
mais ao nem vós, nem Ariadna, vê • ,

Fedra. Senhor, Vofa, Magetade.... eu fe...


Esfuz. Aquella finge, que etá turbada.
Rei, Eu evitarei éftes fuftos : e vós, Lidoro ,
já tendes vito, que não ha em Creta, quem
- pu
º

de Creta. 129

pudefe dançar com Ariadna; e afim fatisfei


to o vofo efcrupulo, podeis eleger , ou o
hirvos para Epyro , como querieis , ou ca
far com Ariadna, como pertendo, por não
fazer infructifera a voffa vinda.
ALidor. Como já fei quem foi o que dançou
com Ariadna, ferá jufto que eleja, o hirme
para Epyro. -

Xei. Pois que efperais, que o não dizeis ?


Fedra. Que fera ifto ? Á.
Esfuz. Lá vai Tezco com os diabos deta vez.
Xei. Vede, Lidoro, não feja ifo delirio de vof
fos zelos.
JLidor. Não são delirios, são realidades, pois
me atrevo a moftrallo nefte mefmo lugar.
Esfuz. Agora ifo tomára eu ver pelo buraco
defta efcotilha. 2. -

Rei. Nefte mefmo lugar ? Aonde, fe aqui não


eftá ninguem ? - * * ,

Lidor. Dentro daquella Vaca acharás quem com


Ariadna dançou. -

Psfuz. Ai que eles comigo ! / Por aqui anda


Taramella.
Pedra. Tomára já ver quem dançou com Aria
dna. - á parte.
Xei. Olá , inveftigai efa Vaca, que fegunda vez
fe conferva para a minha afronta , já que
o meu defcuido a não reduzio em cinzas,
para que na minha lembrança fó fe confer
vae eta memoria.
Chega hum Soldado a tirar Esfuziote da Vaca.
ALudur. Agora me vingarei de Ariadna, á part.
Tom. HI. I , " Sol -
130 Labyrintho
...soldad. Quem ahi eftá faia para fóra.
Esfuz. Vaca não tem fala. -

Soldad. Vâ fe fahindo dahi.


Esfaz. A Vaca effa
Réi. Quebrem he Vaca.
de páo, e nãoDãopôde ºndar
na Vaca
Esfaz. Querem carne de chacina º Efperem =
que eu me patenteo antes que me met㺠ºs
tampos dentro. Pois que he ito cá ?... Sabe
Lidor. Que he o que vejo ! Ete he Tezcº.»
que me dife, Taramella ? - ^ á part
Rei. Que he
dançou comifo,Áriadna
Lidoro? Ete criado
? Vês he, º que
que tudo foi
delirio do teu ciume ?
Lidor. Não feio que reponda. Senhor, já ſei
que o meu ciume me pôde allucinar º mas náo
föïîëãîîíäãiñèñïõ. Éitou corrido! á p. e vai:|'
Esfuz. E eu parado. Senhor , firvº aqui deal"
guma coufa, fenão quero bufcar minha vida º
Rå`E ATEsfuzigre ,”que fazias dentro detia
Vaca ? Dize. ' " - -

Esfuz. He que eu fempre fui muito amigº de vaca


Aei. Refpohde a propofito. -

Esfuz. Senhor, como fou Filoſofo natural , me"


ti-me dentro da Vaca, por ver fefe dava vaca
im rerum matur4. -

Rei. Se não fallas a verdade, mando-te lançar


ao Minotauro.
Esfuz. O Minotauro já me , não metº medo,
para dizer a verdade : faberá V. Real Mageſ
tade, que fui criado de Tezeo, que º ºtºu"
ro Cocito haja; quando de mim fe apartou º
me pedio de joelhos com lagrimas de quatrº
- CՈՂ
de Creta. 1 31
em quatro , que fizeffe eu muito por lhe
apanhar alguns ofos feus , que fobejafem ao
Minotauro, e que os enviafe para Athenas pa
ra confolação de feu Pai; pois não queria,
que quem lhe comeo a carne, lhe roeffe os
ofios. Eu por lhe cumprir a fua ultima von
tade , entrei nefte Labyrintho, e cuidando,
que a vaca era carneiro , entrei nella, para
ver fe achava algum offo, a tempo que fear
mou huma briga, e veio Vofa Magetade, e
acabou-fe cfta hifloria. '
Rei. Por feres fiel a teu amo, te perdoo efte
exceflo; porém te ordeno , que não venhas
mais ao Labyrintho, aliáz te matarei.
Esfuz. Sim, Senhor, vá Vofa Magetade def
cançado. . .
Rei. Folgo que ficafle defvanecida a prefump
ção de Lidoro: vem, Fedra. Kaife.
Fedra. Eu te obedeço- Xai-fe.
Esfuz. Ifto já anda muito bolido com enganos,
e chifmes de Taramella ; hirei avifar a Te
zco , que fe gafe daqui para fóra , pois fe El
Rei me aperta mais , eu fem eftar bebado,
me esborracho , e lá hia quanto Ariadna
fiou. Pai-ſe.
Lidor. Todos fe forão, fó comigo ficou o meu
cuidado ; pois ainda que o que eftava efcon
dido na Vaca não era Tezeo, como me dife
Taram ella , com tudo póde fer que a pre
venção variafe o fucceflo , pois nem Tara
melº me havia de enganar, nem podia def
conhecer o fujeito, 獸 dentro na Vage
- ii Gi
132 Labyrinth,
efcondeo. Oh funeto labyrintho de amor »
aonde até os defenganos são confusões !
canta Lidoro a fegunte Aria , e <
R. E. C. I. T A D O.
Quem ferá, jutos Deofes ,
Ele Feliz amante , que econdido
De Ariadna no idolo elevado
Vičtimas facrifica ?
Quem ferá (ai de mim !) efe gigante
Que a tanto ceo de amor fubir pertende ?
Que fuppoto não veja efe incentivo
Cue meus zelos fabríca ,
Com tudo o coração fempre prefágo
Não fei que varicina;
Pois tímido , cobarde, e penfativo, -*

Cada objecto que vejo, he hum ciume,


E até do que não vejo zelos formo.
Que muito fe eu de mim, em taes defvelos »
Por amor de Ariadna tenho zelos !
A R 1 A•

Qual Leoa embravecida,


Oue fe vè deftituida
Do filhinho tenro, e caro,
Que com furias, e bramidos » :
Rompe a terra , e fere o ar :
Afim eu em meus gemidos
Bramo , peno , finto , e choro ,
Vendo (oh Deos ! ) o que eu adoro
Noutros braços defcahçar.
SCE
de Creta, 13;
S C E N A VI.
Labyrintho. Sahe Tezeo.
Tezeo. Rande confusão caufaria a fubita
ruina das columnas, entre cujo hor
ror pudemos fahir, fem fermos notados de nin
guem; porém que importa, que de hum fuf
to me redima", fe de hum cuidado me não fe
paro ? Quem feria ( oh , duras penas!...) aquel
le , que appellidando de ingrata a Ariadna,
uiz com inflrumento de Marte vingar offen
as de amor ? Mas quem havia fer , fenão
Lidoro , tyranno ufurpador de minha fortuna ?
- Sahe Ariadna. -

Ariad. Tezeo , o amor, e o medo, ambos me


derão azas para bufcarte.
Tezeo. Olha que vens enganada, pois entendo
que bufcas a Lidoro. -

Ariad. Deixa por ora efas loucuras , e falley


mos no que mais importa.
Tezeo. Haverá coufa, que mais importe , que
os meus zelos ? -

Ariad. Que zelos? Que Lidoro º Que delirio


he eſſe? -

Tezeo. Pergunta-o ás flores do jardim , que ref


temunharão os reciprocos carinhos, com 蠶
attrahifte a Lidoro, que ao depois na fala dos
ènganos , chamando-te ingrata , me inten
tOu matar.

Ariad. Quanto ao jardim, logo verás que mais


te defendo, do que te ofiendo ; e a -
ಇನ್ಜ।
I 34 Labyrinthe
fala dos enganos, ha mais que apurar na tua
incontancia, que na minha firmeza; pois cui
dando tu que eu era Fedra, por quem tal
vez efperavas, me difefte que nunca Aria
dna te mereceo hum fó cuidado. Vê agora
fe achas defculpa a efte delicto ? *:
Tezeo. Ariadna, a lingua não tem mais vozes
que as que lhe dista o coração, aonde fe con
ſerva eterno o original de tua belleza, me
lhor que a tua copia no peito de Lidoro ; e
affim não intentes recompènfar huma' fingida
offenfa com hum aggravo verdadeiro. ,
Ariad. Para que não fórmes effe conceito con
tra a minha lealdade , faberás que como a
Lidoro aborreço a pezar de feus extremos , me
dife hum dia, que a caufa de meus defvios
era, porque eu te adorava, pois fabia , que
tinhas triunfado do Minotauro. Confidera tu
que futos eftes para hum coração amente. E
para que zelofo o não communicafe a El
Rei, fui mantendo a fua efperança com fin
gidos carinhos, até que te vieffe avifar, para
que com a fuga nos itentaffemos dete, imi
nente perigo, que nos efpera. Vê agora fe
póde fer issical quem to finameme fabe
íer annante ? Mas como vejo que fó Fedra
te merece cuidados, já não helicito , que eu
te acompanhe, mas fim avifarte do perigº,
por não faltar ao juramento que dei de de
fender a tua vida , em remuneração da que
me dete no boque. Quer irfe.
Tezeo. Efpera, Ariadna, que não he juto que
a0
/

de Cretá. 135
ao mefmo tempo que me deixas agradecido,
te aufentes queixofa. Já fei o extremo do teu
amor ; não te perfuadas que º Fedra, fendo
capaz para a minha veneração , o pofia fer
Para a minha fineza; tu fó, belifima Aria
, dna , occupas ditofamente todo o meu cora
ção; de forte, que nelle não ha lugar que
poſſa accommodar outro objećto.
Ariad. Mal te pofio, acreditar, quando eta noi
te te ouvi differentes expreſsões. Deixa-me ,
ingrato, que efles afectos fó são para Fedra
Tezeo. Farás com que defefpere na incredulida
de de meus extremos.
Cantão Tezeo , e Ariadna a feguinte,
A R I A A D U O.
Tezeo. Tanto te adoro , tanto,
Que em ondas de meu pranto
Fluétua o meu amor.
Ariad. Tu dizes que me adoras,
Que gemes, e que choras,
Eu não te creio, não.
Tezeo. Pois, cruel, para que me creas,
Rompe o peito , abre efta alma ,
Verás nelle o meu ardor.
Ariad. Na tua alma, e no teu peito,
Que de enganos acharei ?
Tezeo. Sómente firmezas ,
Ariad. Nenhumas finezas
Ambos. Nefte peito cncontrarás.
Tezeo. Oh quem motrar pudera!
Ariad. Oh quem te conhecera !
Ambos. Ingrat; , mas talvez
Que
- *
136 Labyrintho
Que as chammas, que defprezas
Em cinzas acharás. Quer irfe Ariad.
Tezeo. Ariadna , não augmentes a minha def
graça com a tua femrazão.
Ariad. Ai que lá vem Fedra! Confidera, in
grato , fe_ha motivos para a minha queixa.
Tezeo. Se Fedra vem, não ferá, pois eu...
Ariad. Não he agora tempo de ouvir defculpas,
{ó tomára efconder-me, para que me não vife.
Tezeo. No concavo defla columna ha hum li
mirado gabinete, em que apenas cabem duas
pefoas , efconde-te , já que afim o queres.
Ariad. Obfervarei as tuas falfidades. E/conde-fe.
Tezeo. Qual ferá o intento de Fedra? Queira
amor náo fe encontre com o de Ariadna.
3'ahe Fedra.
Fedra. Tezeo, parece que querem os fados fe
ja eu fempre tutelar de tuas infelicidades , a
pezar de tuas ingratidões; e porque huma vez
empenhada a defender a tua vida não era juf
to defiftiffe defte nobre intento ; [abe que
já em Palacio ha claros indicios de que etás
vivo; e afim , antes que ElRei o chegue a
faber, trata de aufentarte com a brevidade
pofivel. *

Tezeo. Será forçofo feguir o teu confelho.


Ariad. Náo fei que intenta Fedra com tantos
extremos
Fedra. E pois não ignoras que eu fui o inf
trumento da tua t na morte do Minotau
ro, para que fe não venha a faber , que eu
dei armas contra ele montro, e finta a in
- di
de Creta. - 137
dignaçáo d'ERei, ferá forçofo que me le
ves comtigo para Athenas fe acafo o dar-te
duas vezes a vida te póde fazer menos ingrato.
Tezeo. Notavel empenho ! Que refponderei a
' Fedra , ouvîmdo-mc Aridna? , á part.
Ariad. E que viefe Fedra pôr o ultimo fim á
minha defgraça ! - á part.
Fedra. Não me refpondes? Porém nada me di
gas , que fe eu tivera os meritos de Ariadna ,
talvez foffe venturofa a minha.fupplica.
Tezeo. Não crimineis a Ariadna, pois nella nunca
encontrei huma fó piedade, nem creio que
huma lembrança; pois he fem duvida que
imaginará, que eftou morto. -

Ariad. Bem fez Tezeo em negallo. . .


Fedra. Como póde fer que Ariadna ignore
que tu és vivo , fe na fala dos enganos efta
noite, aonde te diffe, me efperafles, etando
tu comigo ? . . . - -

Tezeo. Efpera que eftás enganada, pois não in


do eu á fala dos enganos, mal te podia fal
lar. Oh que incentivo, para os zelos de Aria
, dna ! á part.
Ariad. Por ifo o traidor me chamava Fedra ,
cuidando que fallava com ella. ,
Fedra. Se huma evidencia intentis contradizer ,
já não tenho mais que te arguir; e afim ,
Tezeo. . . . . .
· Sabe Esfuzic:e.
Esfuz. Senhor, efconda-me por vida fua , que
ahi vem ElRei , , e fe me vê, certamente me
enlabyrintha para fempre. Ai defgraçado Es
fuziote ! Te
138 Labyrintho
Tezeo. Que dizes? ElRei vem ahi?
Esfuz. Sim Senhor, ElRei em pefoa : efcon
damo-nos depresta.
Fedra. Ai de mim fe ElRei me vê ; pois te
nho inviolavel preceito para não vir ao Laby
rintho ! Tezeo, efconde-me antes que peri
ue a minha vida. . - - -

ZAriad.Oue notavel defgraça fe ElRei vir a Tezeo


Tezeo. Efte fim, que he verdadeito labyrintho
em que me vejo ; pois não ha aonde efconder a
Fedra, fenão aonde etá Ariadna ! Que farão
fe fe .encontráo ? -

Fedra. Tezeo, efconde-me, e tu tambem para


que ElRei não nos veja.
Esfuz. Senhor, efconda-me a mim fe quer.
Tezeo. Senhora, o lugar que ha capaz para ef
fe miniterio , apenas he fufficiente para occul
tar huma pefoa; e afim hum de nós ha de
ficar expofto ao perigo de ElRei nos ver.
Esfuz. Senhor, veja que Dedalo da outra vez
dife , que ali cabião duas pefoas; e afim
eu , e a Senhora Fedra bem cabemos nelle
Fedra. Pois Tczeo, perigue a minha vida, an
º tes que a tua ; que melhor he confervar a
hum morto, que livrar da morte a hum vivo:
Ariad. Oh quanto inveſo aquella finezas de Fedra !
Tezeo. Não he razão, Senhora, que eu por
{alvar a minha vida, exponha a vofa ao pe
rigo ; occultai-vos, que o tropel já vem per
to. Perdoe Ariadna, que efia acção he filha
do meu brio, e não do meu amor. á part.
Fedra. E fe fores vito d'ElRei, que ferá de ti?
Te
de Creta. 139
Tezeo. O mais que póde fazer he matar-me; an
da, efconde-te já.
Esfuz. E eu, Senhor, aonde ? he boa graça!
Fedra efconde-fe aonde eflá Ariadna, e fahe efta.
Ariad. Pois náo ha de fer affim , / que Tezeo
não ha de ficar expoto ao rigor d'ElRei. Te
zeo, fe tu por falvar a Fedra expóes a tua
vida ; eu por redemir a tua offereço a mi
nha : anda, efeonde-te aonde eu eftava , que
ifto he faber confervar a tua vida.
Tezeo, Ariadna , effe 'exceffo tranfcende aos li
mitis da maior fineza; torna a efconderte,
enáo por Jupiter foberano te juro, que am
bos aqui ficáremos. -

Esfuz. Melhor ferá que nefe lugar me efcon


dão a mim. -

Ariad. Primeiro eftá a tua vida, -

Tezeo. A tua eftá primeiro. º' .


Fedra. Aquella he Ariadna; quem vio maior con
fusáo ? Ah traidor Tezeo - -

Tezeo. Occulta-te, Ariadna, que eu bufcarei


induftrias que me defendão. - -

Esfuz. Senhor, que diabo he ifto? Não ouvem


a etropeada já nefa cafa vifinha ? -

Ariad. Como te não queres occultar, quero con


fervar a minha vida, para defender a tua.
Efconde-fe Ariadna. Sahe ElRei fem olhar pa
ra Tezeo.
Esfuz. E agora, Senhor Tczeo ? -

Tezeo. Põem-te atraz de mim, e fegue os meus


movimentos.
Àei. Já parece que he tempo de perdoar * 3
14O Labyrintho
... dalo o deli3to de fabricar a Vaca para Pazi-.
fe , pois baftante caftigo he a dilatada, e hor
rorofa Prizão, em que eftá , e com o motivo
de fua liberdade poder-me-ha declarar todos
os artificios dete Labyrintho, que muito igno
ro , como o de cahirem as columnas na Tfala
dos enganos. . . . - -

Tezeo. Em grande perigo etou! Valha-me todo


o meu valor, e toda a minha induftria.
Esfuz. Eu etou aqui tão agarrado como pio
lho ladro em fovaco de almocreve.
J'ai-fe ElRei voltando para Tezeo.
Rei. Eu me refolvo; eu vou a libertar a Deda
lo. Mas ai de mim ! Que he o que vejo ?
... Parece que fe me igura naquella errada fom
bra a imagem de Tezeo! Ai infeliz, que os
cabellos fe me erigáo
Tezeo. ElRei fe afuflou de verme ; pois o feu
engano me valha. á part.
Esfuz. Ah Senhor, já que me leva ao reboque,
não haja por ora vento em popa.
Rei. Palida "fombra , vago horror da fantafia ,
que pretendes de mim ?
Tezeo. Barbaro Rei, efta que vês em corpo
rea fórma he a alma de Tezeo que erran
te por efte Labyrintho vem a noticiarte da par
te de Plutão, fupremo Juiz do Cocyto , a
tua malevolencia, e injutiça, com que ty
rannamente me ufurpate a vida, para que
vivas na certeza, que hão de os Deofes vin
gar a minha morte com o eterno fupplicio
que te epera.
Es
de creta. 14f
Psfuz. Ninguem faz papel de defunto como meu
amo! Andar, fe não fomos duas almas em
** hum corpo , ao menos fomos dous corpos
em buma alma. -

“Rei. Não me horrorizes mais, funeto efpe&ta


culo; já fei, que fui cruel para comtigo.
Esfuz. Aí que nos vamos fubmergindo! Não
"... ferá a primeira vez que os amos levem com
figo os criados ao inferno.
Tezeo com pa/os vagarofos fe metterá na mina
com Esfuziote, de forte que a efte o não
veja ElRei.
„Ariad. Com bella induftria fe livrou Tezeo! -
盤 Notavel idéa por certo !
JRei. Quafi que não tenho alentos para refpirar.
. Olá da minha guarda, acudão todos.
----- · Sahe Tebamdro , e Soldados.
Teband. Senhor , que te fuccedeo ? Que tens,
que tão pálido o teu femblante nos informa
de algum extraordinario fuccefo?
Rei. Não fei fe poderei dizer o que vi, que o
futo me privou do ufo de todos os fentidos.
Teband. Conta-me, Senhor, a caufa de tanto
exceſſo. , - - - &

Xei. Tebandor ,,eu vi díflin&tamente nefte lugar


huma agigantada, disforme , e horrorofa vi
zão, que caminhando para mim com pafos
lentos, e vagarofos, me diffe com voz irada,
e rouca , fer o efpirito de Tezeo , que ,
parte de Plutão me vinha notificar, que pela
injuta morte, que lhe dei , fe me efperava
"... húm eterno formento ; e com ifto ,
- - - - --" -
bine
c
142 Labyrintho
- fe a terra com gfpantofo bramido , o fepultou
em fuas entranhas.
Ariad. Sempre o. mcdo reprecnta maior, os
objectos. - - - - - , ,
Teband. He cafo verdadeiramente notavel! Vem,
Senhor, a prevenir algum remedio a efe fufto
Rei. Vamos, Tebandro: e vós outros cerraias
Portas dete Labyrintho com traveffas, além
das guardas, para que fique inhabitavel para
º fempre ete, cadafalfo, aonde ouvi a fenten
ça de minha condemnação. -
Teband. Senhor, e Dedalo, e o Minotauro?
Rei.. Morra Dedalo, pereça, o Minotauro ; pois
hum, e outro forão intrumentos de meu pré
cipicio. . . . . . . . . . Wäoºſe.
Sahem da columna Ariadna , e Fedra., !
Ariad. ElRei (ai, defgraçada!) manda fechas
.." o Labyrintho; como fahiremos daqui?
Fedra. A que fim, Ariadna, viete ao Labytintho?
Ariad. A repota que tu me havias de dar,
- º fe eu o mefmo te perguntara 蠶 , para
a tua pergunta; mas agora não he ប៊្រុ de
averiguar zelos, quando maior caufa nos aflige.
Fedra, Nunca me enganei, que Tezeo amava
a Ariadna. ... - . . á part.
Ariad. Que dizes, Fedra, da nota defgraça ?
Pedra. Deixa-me, que o coração dividido a fen
tir tantos golpes, náo fabe diſtingir os ſen
[1II)CITUOS, -

Ariad. Aonde eftará Tezeo ? Tezeo ?


M3 Sabem
Tezeo. Apenas mina Tezeo
da fajo,de , e Esfuziote.
hum ‫ ومن أن‬quando lo
"gº me vejo em outro maior! Es
de Creta. 143
Asfuz. Náo ha coufa como fervir a Principes ,
que ainda depois de mortos amparáo os criados.
Ariad. Não cuides, Tezeo, que quero arguirte
de tuas falfidades , vendo aqui a Fedra; fó
quero dizerte , que ElRei mandou fechar o
Labyrintho: vê como havemos daqui fahir,
com tal brevidade, que ElRei nos não ache
-, menos em Palacio; e quando por mim o não
faças, faze-o por Fedra, que tanto te merece
Esfuz. Ainda mais efa temos ? Em boa me vim
eu meter ! . -

Fedra. Não te perturbes, Tezeo, nem o meu


refpeito te obrigue a fer menos exrremofo pa
ra com Ariadna, de cuja vida compadecido,
vê como has de livralla , que pelo mefmo
caminho, que a libertares, me falvarei á fua
fombra º fó por te não merecer algum favor
epecial. - . ..
Tezeo. Que farei em tão precipitado empenho ?
Esfuz. Senhores, Vofas Altas Potencias deixem
Por ora coufas , que não vão , nem vem;
cuidemos em materias de vir , e hir daqui
Para fóra, não tanto pelas Senhoras Infantas,
º quanto por mim, que tenho occupação no
Paço, e não ferá razão que falte as obriga
ções d'ElRei meu amo. ;
Ariad. e Fedra. Que dizes, Tezeo ? ,
-
, , t
ø /

Esfuz. Senhor , diga alguma coufa pois já fe


não póde livrar das ballas deta, Infantaria. .
--Tezeo. Senhoras, não vos atdijais que tudo
terá remedio. Dedalo, Dedaloí, Pódes fubir
ſem ſuſto. - - - - - - - ..
.54
*44 ** Eabyrintho
• ‘’’ Sabe Dedalo da min4. *

JDedal. Que me ordenas? Mas que vejo! Aqui


§, Voßas `Altezás ? " . . · -

'Ariad. Dedalo , fabe que tambem viemos a fer


“_companhairas na tua defgraça.
*Fedra. Quem te difera, que para nofo etrago
fabricavas efte Labyrintho! - - -

“Tedal. Sáo altas difpofições dos Deofes , que


*_fe não podem evitar.
Tezeo. Dedalo, por fucceos de amor, e for
tuna, fe achão aqui hoje as Infantas ; o La
º byrintho por ordem d'ElRei etá fechado, vê
"por onde bavemos de fahir?
- *1)êdal. Por aquella- mina , que vai ter ás ribei
*"ras do mar, como fabes, pois não ha outro
** caminho. 2×.. .
* --

*Tezeo. Bem advertifte. *


Dedal. Oh quanto me P2 haver fabricado ef
"ťe Labyrintho!' ' ' ' ' '; : : : : : :
"Esfuz. O certo he que efte labyrintho, em
"qüe etamos, não o fabricou o Senhor Dedalo.
Ariad. Pois quem foi ? - - - -

Asfuz. Foi, ó amor, que he maior archite&to


que quantos Dedalos ha no mundo; e fe o
"… querem faber , dem-me attenção a ete.
S O N E T O.
Ser labyrintho amor, ninguem duvída,
º Que 'efte rapaz cruel, cego frecheiro,
. Frabricou, como quiz, metre pedreiro,
" Dentro de huma alma hum beco fem fahida.
O magano tomou bem a medida ; -

Valha-te o diabo amor, que és marralheiro ,


-- Pois
· de Creta. 145 ſ
Pois por dar cos narizes num fedeiro
No alfuje de hum rigor, lança huma vida!
Anda nefte Palácio , o mais i diffuſo,
O trite coração num corropio , , ,
Porque todo o querer he parafufo :
E por mais que da idéa arda o pavio,
m trocicólos mil fe vê confufo ,
Pois fempre no melhor Íe quebra o fio.
Ariad. Na tua tofca fraze difefte verdades puras.
Esfuz. Que me, faça bom proveito. -

Tezeo. E pois etá determinado, o fugirmos pe


la mina , para nos trafportarmos para ದ್ಮಿ
nas, ferá precifo que vá Esfuziote logo? com
joias a fretar huma não, e que junto á mina
tenha efcaleres promptos para o embarque,
fem que declare as peloas , que háo de hie
nella 3 e te efperemos na boca” da mefma mi
na, ao dares fenha, que ferá eta: Venbão ,
-Senhores : e já que até o prefente tens fido
fiel, efpero que com eta acção coroes a
tua fidelidade. - - -

Esfuz. E tá muito bem, mas faibamos por on


de hei de hir eu ? .
Tezeo. Por aquella mina , que vai dar ao mar.
Esfuz. Qual mina? Aquella onde cahio femivivo
o Senhor Minotauro! De burro que eu talvá.
Tezeo. Tu bem vite que o Minotauro cahio
morto, e já não pódes ter medo, pois, De
dalo, eu, e tu eftivemos agora neta mina,
Esfuz. Eu com o medo não fei aonde me meti
e era eu capaz naquella hora de metter-m
:2'от. Џ. K Peloº
146 Labyrintho
pelo fundo de huma agulha, que tão peque
no me reduzio o pavor : com que, Senhor
eu não vou pela mina, que o mefmo ferå
lembrar-me no caminho o Minotauro, que fi
car, tolhido fem poder dar hum palo.
mem OqueEsfuziote,
IDedal. tem medo.parece mal dizer hum ho- .
• ‘c " i ". .

Esfuz. Pois os homens são os que tem medo,


que quanto aos animaes, effes inveftem como
º brutos. " * " « -

Pedra. Pois como ha de fer , que cada vez fe


º difficulta mais a nofa liberdade ?
IDedal. Eu darei o remedio”: º como Esfuziote
º recufa hir pela mina, hirá pelo ar com hu
* mas azas, que lhe hei de pôr, e com ellas.
voará tão feguro, como qualquer ave.
5Tezeo. Agora não tens defculpa; que dizes, Es
fuziote ? - -

Esfuz. Ifo tem que cuidar: vamos, que enten


do que para_ito de voar não ferei defaza
do : venha , Senhor Dedalo. Wai-ſe.
JDedal. Tu verás o meu artificio. Pai ſe.
Pedra. Tezeo, efpero de ti que em Athenas,
º faibas agradecer as finezas que me deves.
.*
-
-

á parte e vai-fe.
Tezco. Tu verás a minha conftancia. áp. para Fed.
Ariad. Em fim me levas a mim, e a Fedra ?
Já fei que vou experimentar, ingrato.», as
tuas incontancias. -
Wai-ſe.
2'ezeo. Não temas variedades no meu amor. Oh
. Deofes foberanos, fe for ingrato a Fedra , não
1 me cremineis; pois náo podendo fer efpofo de
- апа

-
- aº de Creta. 147
ambas, e a ambas devendo iguaes finezas, ra
"
zão ferá que fique ifenta a vontade para
ferir a Ariadna.: a
pre
Pai-ſe,

, s c E N A vir.
Boque, e marinha, como no principio, e a mef
... ma gruta, mas desfeita; e dizem dentro
o feguinte.
Rei. Bಚ್ಡ todos as Infantas, não fique
penha, ou tronco, por mais inculto,
que o nofo cuidado não inveftigue. Dentro,
Lidor. Ariadna, aondej te: *e{condem os teus def
vios ? - * Dentro.
Teband. Querida Fedra-, quem te aparta dos
- "meus olhos? *: * - - Dentro.
Todos. Bufquemos as Infantas, que não appa
recemi. ് "; , , , , Dentro.
- $ahemʻ.yanguixtiga , e Taramella.
Sang. Ai defgraçada", que Fedra amolou as pa
langanas!
Taram. Que ferá de V. m. minha tia ?
Sang. Quc ferá de ti , minha fobrinha ? '
Ambas. Que ferá de nós º . . . .
Zaram. E o peior he que o Senhor Tezeo en
tendo fugiria com Ariadna, e hirá cazar com el
la. Ah cruel Tezeo, que me deixate burlada !
Sang. Antes cuido que hirá cafar com Fedra,
que por mim em certa occafião lhe mandou
huma banda. - - -

Taram. Ou cafe com huma , ou com outra,


eu fiquei chuchando no dedo. " - -

*: *. *
К іі Sangº
148 Labyrinthd
Sang. E eu fem Embaixador, por:meus peccados !
Taram. E fobre não cafar comigo, levar-me a
joia , que me deo Lidoro , que nella tinha o
meu dote !
,Sang. E a mim a joia , que me deo Tebandro !
, Taram. Oh Principe de huma balla , os diabos
te levem. - -

Sang. Oh Principe de huma figa, má raios te


partão. * * *.

Taram. Eu ſem Ariadna , e ſem joia ! * ~


*
:
*

Jang. Eu ſem joia , e ſem Fedra : .


Ambas. Que ferá de mim ? -

Wai-fe Sanguixuga , e ¡apparece Esfuziote com


as azas voando. *

Esfuz. Nenhum alcoviteiro fe vio até o prefen


te em maiores alturas ! Ito , he que he fu
bir de hum pullo ! Agora, nada me dá cuida
do com ter tantas penas, pois nunca me vi tão
defempenado como agora, que me vejo com
azas: eu em minha confciencia, fe quizer,
daqui pofo mijar no mundo. :

Taram. Cada vez que cuido naquelle infolen


te, não fei como não defe{pero. . ___
Esfuz. Ora olhemos agora cá para baixo. Mui
to grande he o mundo! Ai que lá etá. Ta
ramella feita mulher do mundo! Pois eu que
ro debicar hum pouco com ella: trás. Che
gandorfe ao ouvido de Taraniella. . . . .
Taram. Ai! Que bizouro me anda pelos ouvidos?
. Esfuz. Trás tris. . ..
Taram. Xó daqui maldito bizouro.
Esfaz. Adcos, Taramella, trás.
Tará
de Cretá. 149
Tezeo. Quem me falla ao ouvido, fe aqui não
eftá ninguem ? -

Esfuz. Taramella, Tezeo querte muito, mas


e aqui para traz.
Taram. Quem he que me falla 3 Ifto he encanto.
Esfuz. Amor , que tem azas, he o que falla.
Taram. Aonde etás ? -

Esfuz. Aqui atraz.


Taram. Que he o que vejo ? Náo és tu , fingi
do ingrato Tezeo, a quem fem duvida os Deo
fes, por catigo da tua falfidade, em ave te
convertêrão ? Anda cá para baixo, que eu te
abaterei os voos. -

Esfuz. A quem não attrahiráó aquelles doces re


clamos ? Defce. Ai Taramella, que já preza
a minha liberdade no vifgo dos teus olhos,
deixo por elles o ceo de Venus, em que me vi,
pela esféra de tua beleza, em que me abrazo.
Taram. Agora que cahio no laço, não me ef
capará. á part.
Esfuz. Vês, tyranna, que as tuas falfidades me
fazem aereo ?
Taram. Quem deo effas azas a Voffa Alteza ?
JEsfuz. Das penas que me dás, nafcêráo as azas
que me vês. "… "
Taram. Bem fei que penas lhe caufo, e fó
Ariadna lhe dá glorias. * :

Esfuz. Não queiras, traidora, com efe fingi


mento encobrir o engano de me mandares met
ter na Vaca, para tomar degoladouros na ef
pada de Lidoro, a quem duas vezes mixiriquei
ra intentate entregar-me; vai te, que já com -
- . . .” ti
(150 Labyrintho
tigo não quero nada , pois para fugir de ri
já tenho azas. - - - -

Taram. Quem me dera que viefe alguem, pa


ra o agarrar, e cntregallo, a ElRei; , porém
. eu o deterei com carinhos, á part. Meu Senhor»
meu efpofo, meu, bem, meu, meu ....
Esfuz. Calte,
mellando ? calte, Taramella,
.. .
que etás tara
. .; - で

Taram. Eu, . , porque foi o meu amor.... por


que os zelos . . . mas eu prometto...; .
Esfuz. Nada, nada, não admito lograções; já fou
paffaro Çafaro, que não caio com efa facilidade.
Taram. Olhe, verá que nunca mais , nunca mais.
Canta Esfuziote a feguinte Aria, e º
R E C I T A D o. *

Deixa-me , fucinhuda Taramella , ".

Que eu não quero cahir nefa efparrella ,


Tu falfa, tu cruel, tu aleivofa,
Com fucinho de gata langanhofa,
Querias em taes penas -

Que ficafe fem filho ElRei de Athenas?


Pois hum chuço amolado que te pafle ,
Huma faca fiamenga que te efpiche, . . . .
E huma bomba de fogo que te efguiche. …
. .
. . . . . . A R I, A. . . . * *
- Não ha coufa como ver , :
… Huma deflas prefumida, e .- -
. . ... Mui lambida , e deslambida, º, .. .. ..

- , - Som mil, chularias , …, . si g , … -- :


- Com caras de monos, ...
-: - Com unhas de arpias , . . , r ... 3
- - - -- Chu
de Creta. - 15t
Chupando-me o fangue , , , , ---
Roendo-me os oſſos, -

º
Deixando-me em pelle, ..…...
E depois de chuchado, roido, e lambido,
Me prega hum gataſio: " * -

. ' Ifto The Tamor ? 醬。 2 . . . . .


Hei de amarte ? Ifo não. ,
- Sahe Sanguixuga. . -

34ng. Ai rapariga, que quanto mais bufcão as


Infantas, menos fe acháo. n
Taram. Tia, agora, he tempo de recuperarmos
... as noflas joias; ajude-me a pegar nefte trai
dor : venhão, Senhores... ..." -, .
Pegão em Esfúziote, e lhe tirão as azas. ,
Esfuz. Defe me rio eu , pois tenho azas ad
volandum.
Taram. Arranquemos-lhe as azas para que não fuja.
Sang. Agora pagará tudo junto: venháo todos.
Esfuz. Não me agarres, Sanguixuga ; olha
que deito fangue.
Taram. Venhão, Senhores.
Esfuz. Calte, tolla, não digas tão alto: ve
nhão Senhores. --

Tezeo. Alli diſſe Esfuziote , ven håo Senhores


vamos fahindo. Dentro.
Sahem El Rei, e Tebandro por huma parte , e pe
la gruta hirão fahindo diante Dedalo, Fedra º
e Ariadna, que ficará com as coftas na gruta
Rei. e Teband. Que he ito aqui? . " ,
Taram. Eis-aqui quem te póde dar conta das -

Infantas. . . . . . . .
*- *- *
- - -
-
-

- - -
. *

-
.
-

.
Ari
--
#52 Labyrintho
Ariad. Ai de mim, que Esfuziote nOS êntre º

gou ! - - á part
Pedra. Fujamos outra vez. ' ' '
JDedal. Oh que degraça
Esfuz. Deta ninguem fe livra. " á part.
Aei. Traidoras, aleivofas, viboras mal nafcidas ,
como atropelando a minha authoridade , e o
vofo decoro deta forte.... Porém a minha
vingança fuprirá as minhas vozes.
* - - Pai para ambas.
Fedra. e Ariad. Não ha quem me ampare ?
Teband. Senhor, Vofa Magetade advirta.
Tezeo. Anda , Ariadna, defvia-te da boca da
mina; deixa-me fahir. - --

Ariad. Efpera hum pouco.


JRei. E tu , aleivofo Dedalo , como te atreves
a ver a face do Sol, e a minha quando a tua
infolencia... Tambores dentro.
IDentro. Arma , arma , guerra , guerra. *
- .$'abe Lidoro. T - - -

Lidor. Senhor, eftamos perdidos, pois de im


provifo nos vemos cercados de huma poderofa
armada de Athenas, e já muita parte dos Sol
dados tem defembarcado. . . . .

Rei. Pois vamos a refitir-lhes: ai de mim, quan


tos golpes penetrão efte afflicto coração!
Esfuz. §.". folgo! .

Licas. Não fique pedra fobre pedra, que não


fºroftrem as noffàs armas. ' Dentro,
Eidor. Senhor, he já quafi impofivel a defenfa,
__ Pois os efquadrões tudo vem deftruindo.
2 ezeº. Que he o que ouço? Devia-te, Ariadna.
Ariad: Efpera, não te fobrefaltes. Te
de Creta: 133
Teband. Vamos, Senhor, que o meu valor faberá
caftigar aos Athenien(es. . ..
Ao querer entrar , fahem Licas , e Soldados , e
- tocao tambores.
Licas. Dá-te á prizão, barbaro Rei; pois já te
não pódes livrar do nofo furor. , . "

Rei. Oh tyranna forte ! Para ifto me dilatafte


a vida , fupremo , Jove ? " * .
Licas. Para que vejas , tyranno Rei, que Athe
- nas fabe vingar a morte de feu Principe Te
zeo, já que cruel, fem atenderes a feu regio
fangue, o fizefte reo da mais afrontofa mor
te, em cuja vingança , deftruido o teu Rei
no, feras com toda a tua família levado para
Atenhas, a feres defpojo de nofas armas.
Teband. e Lidor. Que defgraça!
Ariad. e Fedra. Que defventura !
Esfuz. Que regias folganças ! : -

Rei. Oh quem tivera a Tezeo vivo ! Mas em


vão são os meus defejos.
Taram. Senhor, não fe amofine, que Tezeo ef
tá vivo, que he efte que aqui etá disfarçado
em Esfuziote.
<Sang. Sim, Senhor, eu , e minha fobrinha fó
fabiamos efte fegredo. -

Rei. Deixai-me , tontas.


Esfuz. Calem-fe cavalguduras.
Licas. Anda, Minos.
- Sahe Tezeo. … "

Tezeo. Efpera Licas, que ainda fou vivo, pela


piedade de huns generofos afectos, que conf
tantes me redemiráo , livrando-me do Laby
- - IIIl
154 Labyrintho
, rintho, e matando o Minotauro, ceffando a !
ruina da nofa Patria na extinção defe montro.
Licas. Deixa-me, Senhor, proftrar-me a teus
pés: que feliz nova para ElRei teu Pai, que
, já te julgava morto aos impulfos defa féra !
Zid. e Teb. Que extraordinaria maravilha!
JRei. Tezeo, a teus pés rendido te peço perdão
da inhumanidade, que utei comtigo ; e pois
-, das tuas armas me vejo 蠶 prifioneiro, pe
, ço-te te compadeças de uma defgraçada
, velhice.. . . .. . . . . . . .. . . . . . .
Esfuz. Vejão como defandou a roda ; e o que
vai de moer a fer moido , pois Minos de au
, thor veio a fer reo ! º

Pedra. e Ariad. E fe acafo, Senhor, as nofas


lagrimas tem algum valimento na tua piedade,
por ellas perdoa a nofo Pai.
Tezeo. Senhoras , bafta Minos fer voffo proge
nitor, para que não fó lhe retitua a liberda
de, mas tambem o Reino; e para completar
a minha , e a fua fortuna , Ariadna ha de fer
hoje minha efpofa, em premio das finezas
que lhe devo, e por não faltar ao juramen
to que lhe dei, º
Ariad. Ditofo amor que de tantos impoffiveis fe
vê já triunfante ! -

Fedra. Infeliz eu, que malogreitantas finezas! áp.


Rei. Venturofa bonança depois de tanta tormen
ta! E agora em Tezeo, que reputado por mor
to matou. o Minotauro , fe verifica o Oracu
lo de Venus, pois Tezeo foi o vivo morto
-, na extinç㺠do Minotauro.
Lidor.
へ -

… de Cretá. . . ‘I 55
Lidor. Ah cruel Ariadna, que para ver a tua
falfidade futentate de enganos a minha ef
|ို့ Logra tu ee Hymenèo
herei fentir a minha forte infeliz.
, que eu
.

Teband. Senhor, neta occafião he juto que os


favores de Fedra premeem as minhas firmezas.
~ JRei. Fedra, reconhece a Tebandro por teu epofo.
Fedra. Náo poflo refiftir ao teu imperio. Obe
deçamos aos fados. á part.
Licas. Oh quanto etimo eta concordia !
Tezeo. E tu, Dedalo, vem comigo para Athe
nas a receber o premio de tua lealdade,
Dedal. Não quero mais premio que a tua fe
licidade.
Jang. E que ficaſſe eu lograda, ſem joias - c.
ſem Embaixador ! -

Taram. Bata, Esfuziote, que me enganafte, di


കൾ: zendo me que eras Tezeo, para que tantas ve
zes enganaſſe a Lidoro ?
Esfuz. Não fe perdeo mais que o feitio; po
rém pofo afirmar-te , que te náo enganei ;
pois quem duvida que quando eu era meni
no, era infante º porém fe fó he Princípe,
quem faz acções generofas, eu quero fazer
huma etupenda que he cafar comtigo ; porque
em fua cafa cada hum he Rei, e fenhor de feus
narizes; venha a mão , Taramella, com li
cença dos Senhores.
Taram. Do mal o menos, vá feito.
Rei. Repitáo todos os vivas defta foberana gloria.
Tezeo. Efperai que primeiro Lidoro me ha de
dar hum retrato de Ariadna, que fingidamente
- lhc dọu. - Lidor,
156 Labyrintho de Crete: a

Lidor. Razão tendes; tomai-o que não he bem


que conferve a verdadeira copia de hum fal
fo original. Dá o retrato.
Tezeo. Agora fim, publiquem todos o maior tri
unfo de Cupido, confefando que fó o amor
he o verdadeiro labyrintho.
Esfuz... Vâ de fefta , e folía , celebrando-{e efte
depoforio com harmoniofas vozes.
С О R о. ,
Numa alma inflammada
De amor abrazada * -

Cruel labyrintho -

Fabríca o amor. ‫م‬

Porém quem efpera


O bem de huma féra,
Acertos de hum cégo,
De hum montro favor ?

F I M.

º GUER
º * - ... I 57

GUERRAS
A. L E C R I M,
M A N G ER O N A,
OPERA JOCOSERIA, `
Que fe reprefentou no Theatro do Bairro Alto
de Lisboa, no Calnaval de 1737.

INTER Lo c UT OREs.
ID. Gilvaz. , , ... tº .

D. Fuas. **, * **,

D. Tiburcio.
D. Lanferote, Pelho- «rt;. . º,. . º,.
•.
, ſ. . .

器 ལཱྀ་བཱུ་ར་མ་ } sobrinha de D. Lanfroté.


Sevadilha, Gracio/a, Criada. …, aº
Fagundes, Velha, Criada. =
Simicupio, Graciofo, Criado de D. Gilvaz.
, SCENAS DA I. PARTE.
I. Prado, com c4faria no fim. ! . .. . .
HI. Camera. , : í, i s ',
III. Praça. ': '
IV. Gabinete.. - -

- SCENAS DA II. PARTE..


Praça, …, …, V., , ; Camer&.

1II.
នុ៎ះ
Camera. Vi. មុំា
: '… WII. 3āla.
IV, , Prags. PAR-.
138 Gaerra: do Aletrim ;
***そテ**<登→**そう**そ
PARTE I.
S. C. E. N. A. I. : • ‘- -
• ". • * - * *

Prado, com cafaria no fim. Sabem, D. Cloris,


D. Wize, e Sevadilha com os roſtos cuber
tos ; e D. Fuas, D. Gilvaz, e Šimicupio ,
feguindo-as. , * & -

D. G. Iana deftes bofques-, ceffem os .


Ꭰ quando remora me fufpendeis, fois
acelerados defvios deferigor, pois
" iman , que ime attrahis. para D. Clor.
ID. F. Flora deftes prados, fufpendei a fatigada
porfia de volo de dem, que ella difcorde fu
ga com que me defenganais , he armonio a
attracção de meus carinhos; pois nos pafos def
fes retiros fórma compafios o meu amor., "
4. . . . . . para D. Nize.
Simic, E, tu , que vens atraz, ferás a firinga
detas brenhas; e para o feres com mais pro
priedade , deixa-te ficar: mais atraz , a
pezar dos efguichos de teu rigor, hei de fer
conglutinado raboleva das tuas coftas. -

‫تت‬ - ‫وحی‬ - - .para


Sevadilha
ID. Clor. Cavalheiro, fehe que o fois, peço
vos, me não figais, que mal fabeis o peri
gº, a que me expõe a vofa porfia, para D. G.
P. G. Galhardo impofivel, em
-
cuja: ''
* * * * * tste
e Mageroma. •* 159
esféras''Ardem occultos dous foes 3 e fe abra
za patente hum coração; permitti º que eta
vez feja fineza a defobediencia; porque feria
aggravo de vofos reflexos negar-lhe o inteiro
culto na vifualidade defe efplendor; porque
affim , formofa Ninfa , ou hei de ver-vos , ou
feguir-vos , porque conheça, já que não o
foi deffe oriente, ao menos o oriente deffe fol.
ID. Clor. Que ferá de mim, fe efte homem me
feguir ? “. - á part.
D. Niz. Já parece teima efa porfia: vède , Se
nhor, que fe me feguis, que impofibilitais
o meio para ver-me outra vez. · ºf

D. F. Para que são , belliffimo encanto, efes


avaros melindres do repudio ? Se já comecei
a querer-vos, como pofio deixar de feguir-vos?
Pois até não faber, ou quem fois, ou aon
de habitais, ferei eterno gyrafol de vofas luzes.
Sevad. Ora bata já de porfia, fenão vou revi
rando. " … " … … para Simicupio.
Simic. Tem mão, Sargeta encantadora, que
com embiocadas denguices feita papão das al
mas, encobres olho e meio, para matares
ente de meio olho: efcufados são efles efcon
erelos, pois pela unha defe melindre conheço
o leão defa cara. . ! . . .. . . . . . ." .
D. Clor. Iflo já parece teima.
D. G. Iſto he querer-vos. . ." . . . .. .
D. Niz. Ifo he porfiа. . . . .
IX. F. He adorar-vos - * ~ * * -

Jevad. Iſſo he empurraçáo. --


4'imic.. A?gora , ifto The bichancrear , pouco
mais, ou menos. I). G.
ſ z

16o Guerras do Alecrim ;


¿D. G. Senhor as, para que nos canfamos? Aín
da que pareça groferia não obedecer; enten
dei que a noffa curioſidade , e amor náo per
o-mittirá que vos aufenteis, fem ao menos com
…, a certeza de vos tornarmos a ver , dando
rinos tambem o feguro de onde morais, para que
a poffa o noffo amor multiplicar os votos na pere
"grinação defes animados templos da formofura.
D. F. Eis-alli, Senhora, o que queremos.
.Sevad. Em termos fem tirár, nem pôr.
ID: Clor. Pois, Senhor, fe fó por ifo efperais,
…baftará que efe criado nos figa; porque de
outra forte deftruis o mefmo” que edificais.
D. G. E admittireis a minha, fineza ?
ID. Glor. Sendo verdadeira, porque não ?
D. F. Admitireis os repetidos facrificios de meu
.: amor? , . - -

D. Niz. Sim, fe for amor contante. ---

D. G. e D. F. Quem efa dita me abona ? º

D. Niz. Efte ramo de Mangerona. para D. F.


D. F. Na minha alma o defporei, para que fempre
em virentes pompas fe oftente troféo da Prima
.* verą, - … .. -, . . .
D. G. Mereça eu igual favor para fegurança da
vofa palavra. . . , , , , , …… -

D.Clor. Ete ramo de Alecrim, que temas raizes


no meu coração, feja o fiador que me abone.
D. G. Por unico na minha etimação ferá efte
Alecrim o Fenix das plantas , que abrazando
fe nos incendios de meu peito, fe eternizar
.rá no feu me{mo ardor. º -

*imic. Ifio he bom, fegurar o barco, - -


mas a
· [aCl•
w *
* e ZMangerona.) * 161
º tacita hypotheca não me cheira muito digão
o que quizerem os Jardineiros. " " …
D. Clor. Cada huma de nós etima tanto qual
quer defas plantas, que mais facil ferá perder
a vida, do que -ellas percáo o credito de... Aver
dadeiras. f

Simic. Ai! Bafta, bata, já aqui não etá quem


:: falou: vofas mercês perdoem, que eu não
- º fabia que erão do rancho do Alecrim, e Man
gerona : reta-me tambem , que tu coinhei
rafinha vivas arranchada com alguma ervinha,
que me dês por prenda, pois tambem me que
** * ‘ro fegurar. ‫همراه‬.
º Sevad. Eis-ahi tem efe malmequer, que efte he
- o meu rancho; etimeo bem, não o deixe
º. ºx murchar. ; , ,
º Simic. Ditofo feria eu, fe o teu malmequer fe
murchaffe. - -- :

ID. Clor. Pois, Senhor, como etais fatisfeito,


defejarei etimaffeis efe ramo, não tanto co
mo prenda minha, mas por fer de Alecrim.
D. Niz.O mefmo vos recommendo da Mangerona.
D. Clor. Advertindo , que aquelle, que mais ex
. tremos fizer a nofo refpeito , coroará de tri
unfos a Mangerona , ou Alecrim , para que
fe veja qual detas duas plantas tem mais po
derofos influxos para vencer impofiveis.
D. Niz. Defejára, que triunfale a Mangero
tna. - Waiſe.
- D. Clor. E eu o Alecrim. º Wai-ſe.
Sevad. Cuidado no malmequer. Waife.
Simir. Cuidado no bem-mequer.
- Zºom. II. 1. - D. G.
; : 162 Guerras: do, Alecrim ,
e D. G. O? Simicupio, vai fegindo-as, para faber
mos aonde morão; anda, não as percas de vita
I Simic. Ellas já lá vão a perder de vita; mas
, , , eu pelo faro as encontrarei , que fou lindo
..., perdigueiro, para etas caçadas. Vai-fe.
D. F. Quem ferão , amigo D. Gilvaz efas duas
:: * ~ *mulheres ? • ‘* * ‫د‬. ، " ,

º D. G. Ela pergunta não tem repota, pois bem


-m : vites o cuidado , com que vendárão o roto,
-i … para ferir os corações como Cupido; mas pe
, , , lo bom tratamento , e aceio , indicáo fer gen
_*.*** tê. abaftada. ;: . . . . . . . - - -

D. F. Oxalá, que afim fora, porque em tal


e, cafo, admittindo os meus carinhos, poderei
, , com a fortuna de efpofo fer meeiro no cabedal.
D. G. Ai, amigo D. Fuas, que direi eu, que
... ando pingando, pois já não morro de fome,
por não ter fobre que cahir morto ? …
な D. F. Ellas foráo atordidas com palanfrorios,
> D. G. Já que do mais fomos famintos, ao m
.…, nos fejamos fartos de palavras. -

• * Sahe Simicupio.
* . . .
Simic. Já fica afinalada na carta de marear to
. da a Cofta de Lefte a Ocite , com feus ca
D.chopos , e moráo
G. Aonde baixos. ? -

• *
|
Simic. São as nofas vifinhas, fobrinhas de D.
Lanferote, aquelle mineiro velho, que veio
das minas o anno paflado.
D. F. Bata que sáo ellas Por io ellas cobrí
ráo o rofto. - -

Simic. Ifo tem ellas, que não são defcaradas;


º - ... an=
| -

* , e e- Afangerona,yo 163
anteswsáo tão fizudas , , que nunca encarárão
….… para ninguem, gºº e o 28o… .…… 2 |
D.G, Huma dellas fei eu que fe chama D. Cloris.
| Simic. E a outra D. Nize, ifo fabia eu ha mui
to tempo. - ! * ºf -

º D. F. E como faberei eu qual dellas he a da


... , Mangerona ?........ , : •. . ~ • l '. :...
.Simic. Ifo he facil, em fabendo-fe qual he a do
. LiAleerim, logo fe fabe qual he a da Mangerona?
D. F. Grande fubtileza ! Vamos D. Gil. º
. 14'imic. Já que fe vão, advirtão de caminho, que
…fegundo as noticias, que tenho, bem pódem
defiftir da empreza; porque o velho, he tão
º ciofo das fobrinhas, como do dinheiro; a ca
fa he hum recolhimento; as portas de bron
rze; asjanellas de encerado ; as freftas sáo ocu
los dever ao longe, que nem ao perto fe vem;
as trapeiras são zimborios tão altos, que nem
as nuvens lhe paísão por alto; as paredes do
º jardim são metras, e as chaves das portas
: difcipulas, porque ainda não fabem abrir ; mas
fó… hum bem ha, e he, que tendo tudo tão
forte, fó o telhado he de vidro. Com que, Se
P º nhores meus, outro oficio, contentem fe com
cheirar a fua Mangerona, e o feu. Alecrim ;
que amor , que entra pelo nariz, não he bem
que chegue ao coração. . .. ・ "*外・
D. G. Simicupio, não temo impofiveis , ten
do da ក្រែ parte a tua induftria, que efpe
x- ro de ti apures toda a força de teu engenho
- para os combates defa muralha. .
Simic. Ah Senhor D.
** *
Gပ္ပဒူ
L ii
, o meu Arier
, 1*
-
* 164 Guerras do Alecrim ;
…já fe: acha mui cançado com tanto"vai-vém,
pois nem todo o artificio de minhas máqui
nas póde abrir brecha nefa diamantina bolfa,
… que tão cerrada fe: difficulta aos meus mere
cimentos. - .. . . ... .. . . ;

:D. G. Simicupio amigo, tem animo, que fe


- montamos a burra de D. Lanferote , faltare
« mos de contentes. , , º - ºº ºº , * ºº '
·Simic. Tal he aºminħadefgraça , e a fua miferia ,
que ainda com effa burra me dará dous couces.
D. G. D. Fuas, ficai-vos, embora, que me vou
armar de eperanças, para que nos combates
v de amor, triunfe o Alecrim.] * * * *.
-D. F. D. Gil, vamos a forro, e a partido, pois
- que Simicupio he tão detro na materia. #
-D. G. Por ora não póde ainda: fet ;... deixai-me
- º primeiro tentar o váo, que vós tambem na
; vegareis -no mar det Cupido.i . . . . . .
1). F. Ifo náo merece a nola amifade. r.
JD. G. Se vós fois do rancho da Mangerona,
já me podereis conhecer por inimigo declara
º do, feguindo eu a parcialidade do Alecrim;
2- e como nas guerras deftas plantas havemos os
dous fer contrarios, mal poderei foccorrer-vos,
e afim ficai-vos embora, D. Fuas, eviva o
Alecrim. * * - Kaife.
Simic. E viva o malmequer.. . Pai-ſe.
D. F. Vivirá a Mangerona a pezar do mais in- .
tenivo ardor de oppotos Planetas.
Sabe, Fagundes com manto, e capello.…
Fag, He bom fumiço! Aonde eftaráő eftas me
-*" ninas, que ha mais de quatro horas, que fo
- -- . - - rão
:
\
, te Mangerona...? 1657.
ráo á Mifla , e ainda:náo ha fumo dellas",
*Meu Senhor, vofia mercê acafo veria por aqu º
duas mulheres com huma criada ? -

De F. Que finaes tinhão è , i izrc::


Fag. Tinha huma dellas huns finaes pretos no
...rofto , e a outra , huns finaes de bexigas. .- “
D. F. E que mais ? • * - -

Fag. Huma delas tem os olhos verdes, côr de


pimentáo , que não etá. maduro, e a outra
olhos pardos, como raiz de oliveira; huma
tem cova na barba, e a outra barba na cova;
huma tem a efpinhela cahida , e a outro hum
, leifenfo num braço. |. . … . „ ““
D. F. Com efes finaes nunca vi mulher neta vida.
Fag. Meu Senhor, huma dellas trazia hum ramo
de Alecrim no peito , e a outra de Mangerona.
D. F. Vi muito bem , que são as fobrinhas de
D. Lanferote. •... . *** * * * -

Fag. Eflas me{mas são: ora diga-me, aonde as vio?


D. F. Prómette vofa, merce fazer-me quanto lhe
eu pedir ? … -

- *鯊 Ai , que coufa me pedirá vofla mercè , que


e não faça, dizendo-me, aonde eftão as mi
> nhas rneninas ? , - tai :

D. F. Pois defcance , que ellas aqui eftiverão,


e agora forão para cafa. … . .. .
Fag. Aí, boas novas tenha. . . .
D. F. Ora pois, em alviçaras defla boa nova, que
rome diga, como fe chama. . . . . . .
Fag. Eu ? Ambrofia Fagundes para fervir a vof
fa mercè. * ・ ・。 . . . -

D. F. Digo, como fechama a que trazia a Man


gerona no peito : Fag
166 'Guerras do Alécrim ,
Fag. Chama-fe D. Nize. . :
D. F. Pois Senhora Ambrofia Fagundes, faiba
que eu adoro tão excefivamente a D. Nize.,
que em premio do meu extremo me franque
ou efte ramo de Mangerona.…… . .. . .
Fag. He verdade, que pelo cheiro o conheço,
^ que he o mefmo. - - .C.
D. F. E como me dizem os impofliveis, que
* ha de a poder communicar , quizeta dever-lhe .
a galantaria de fer minha protectora neta amo
rofa pretençáo; se fie de mimo que o premio
3 ha de fer igual ao meu defejo. , , , * ,
Fag. Meu Senhor, dificil empreza toma voff
. mercê ; porque além da excefiva cautella do
tio, que nilo náo fe falla, huma dellas etá
para cazar com hum primo, que hoje fe ef
pera de fóra da terra; e a outra qualquer dia.
vai a fer freira; com que, meu Senhor, de
fengane-fe, que alli náo ha que arranhar.
JD. F. E qual dellas he a que cafa? * . . .

Fag. Ainda fe não fabe; porque o noivo vem


º á efcolha daquella, que lhe mais agradar... "
D. F. Como o vencer impoliveis he proprio de
hum verdadeiro amante , nós havemos intentar
- efta empreza , faia o que fahir ; que a dili
gencia he mái de boa ventura: favoreça-me
vofa mercê, Senhora Fagundes, com o feu
voto , que eu terei bom defpacho ino tribu
na de Cupido: tenho dinheiro, e refolução,
etenho
tendo-o atriunfo
vofa, da
mercê da minha parte, certo
'Mangerona. * * * -

*8. Pois Por mim não fedefmanche a feta,


- - - que
- - -

è :AMamgerona. • … Y 167”,
que eu não fou defmancha prazeres: eta noi
fe o efpero debáixo º da janella" da cofinha ;
fabe aonde he ? ou º " ..."." (# ….…. nº es?
D. F. Bem fei. - -

Fag. Pois efpere-me abi, que eu lhe direi o que ,5,


ha., na materia. . . .. . . ºf . . . .. -
ID. F. Deixe-me beijar-lhe os pés, ó infigue Fa
gundes, feliz corretora de Cupido. . . . . .
Fag. Ai! Levante-fe, Senhor, não me beije os .
pés, que os tenho agora muitíuados, e hum
tanto fétidos: defcanfe, Senhor, que D. Nize.
ha de fer fua a pezar das cautellas do, tio , e ,?,
- das caricias do noivo. . . . . . *** * * * -

D. F. Se tal comfigo, não tenho mais que defejar. …


- Canta D. Fuas a feguinte
A R 1 a. -

Se chego a vencer ‘. . . . .. . .
De Nize o rigor, . . . . . . .. .
༈ཨོཾ:ཧྥུ༠fi་མ་ morret . . . . .
Vofé me verá. -

Porém fe hum favor . . . . . .


Alenta o viver » -* *...*
Quem morre de amor , - ... . . . .
Mais vida terá. Wai-ſe, ºv
Fag. "Eftes homens , tanto que são amantes,
logo são muficos; e eu nefte entendo terei
boa melgueira ; e mais eu que fou abelha me{- º
tra, que hei de chupar o mel da Mangero
na a e do Alecrim.
--- w

, sc E
168° Guerras - do Alecrim , .
. s c £ N A II. ' '.
camera. Sabem D. Nize, D. Cloris, e Sevadilha.
Sevad. A I Senhora , que ainda não creio
que etamos em cafa, pois fe vimos
mais tarde, não nos acha o Senhor velho ! …"
</
D. Clor. Em boa nos mettemos! . . . ..

D. Niz. Nunca tal nos fuccedeo; que re parece,


D. Cloris, a porfia daqueles homens em nos
querer conhecer? .. . . . . ºf

Sevad. Sim, Senhora, como fenós fofemos fuas


conhecidas. tº . . . . . . . . , N. . .

D. dio E facilidade com. que fc namoráo lo- , /


go etes homens, he o que mais me admira!
3evad. Pois o maldito do Criado, que tanto fe
metteo comigo, como piolho por cotura!
D. Clor. Que te veio dizendo ? ; -

Sevad. Mil depropofitos miturados com varias


finezas esfarrapadas. … ,? .
'Sabe Fagundes com o manto apanhado no braço.
Fag. Aínda effes Alecrins, e Mangeronas háo de
dar nos narizes a muita gente.
D. Niz. Que diz, Fagundes? . .
Fag. Digo, que bem ម៉្លេះ erão eftes futos:
ora digão-me , Senhoras , fe ·feu tio vieße , e~
as não achaffe em cafa, que feria de mim ?
D. Clor. Não fallemos nifo, que ainda etou
2 trenner. . . . » ..' . .. . . . . . . . . . .
Fag. Apotemos que ifo forão confelhos deta:
Senhora, que aqui etá?
*evad. Apellº eu, que tetemunho ! Olhe o 當
- e Magerona. * * * º', - 169, +

bo da mulher, parece que e me tem toma-º.


dos á fua conta! sy;

Fag. Coitada, como fe defconjura


Jevad. Ainda...por amor della, me hei de hir."
defta cafa. - ‘. .

* * *.ics Sahe D. Lanferote. . .. . . . . .


D. L. Fagundes, deprefa vá deitar mais hum
ovo nos efpinafres, que ahi vem meu fobri
nho D. Tiburcio, já que fou tão defgraçado
que por mais meia hora, não chega depois…
de jantar.… - * ,

Fag. Eu vou, meu Senhor ; mas cuido que o


| noivo a etas horas comerá novilho. Vai-fe.
D. L. Agora , minhas fobrinhas, he chegado
o vofo e{pofo; não tenho que encommendar
vos o modo com que o haveis de tratar.
JD. Clor. Já vem tarde. á part.
ID. Niz. Veremos a cara a efte noivo. á part.
.Sevad. Pois dizem que he hum galante lapuz... á p.
Sabe D. Tíburcio com botas veftido ridiculamente.
JD. L. Amado íobrinho, dá-me os braços. He
pofivel que vejo a hum filho de meu irmão !
D. T. Sim, Senhor; mas primeiro mande vofa
mercês ter cuidado naquellas choiriças, que
vem no alforje, não as dizime o Arrieiro,
que tem em cada mão cinco aguias rapantes.
D. L. Iffo me parece bem feres poupado; eu
vou a ifo.… \. Wai-ſe.
D. C. Que te parece, Nize, a difcriçáo do noivo ?
ID. Niz. Muito bom principio leva. A
Jevad. Parece que o feu genio mais ก่ i cafa
-

com o Alforje. . .. 1 á part


...} - ". . - - の Tー
173 Guerras -dov Alecrim ,
D. T. As primas não são más; porém a moça
me toa mais, - * á part:
-

- | šahe' D.… Lanferote: > . s'. * * .***


D. L. Socegai, Sobrinho, que já tudo etá ar- ".
recadado. ** * :
D.T.Agora fim, amado tio meu, por cujos huma
nos aqueductos circula em nacarados licores o !
fangue de meu progenitor, permitti que os meus
fequiofos labios calculem efTes pés,dedo por dedo.
D. L. Levantai-vos ; ſois diſcreto , meu ſobri
nho: pois voto pai era hum pedaço d’afno,
Deos lhe perdoe. - ്
D. T. Não efá mais na minha mão, em abrindo
a boca me chovem os conceitos aos borbotões..."
D. L. Fallai a vofas primas, e minhas fobri
nhas, D. Nize , e D. Cloris. - - - - -

D. T. Eu vou a iflo. . . . . . ."


.* ** S O N E T O. . .. . . . . .
Primas , que na guitarra da confiancia º .. :
Táo iguaes retinis no contraponto , , * * - * -
Que não ha contraprima neffe ponto, …) ".
em nos porpontos noto difonancia: ; ;
h falías não fejais neta jactancia; . &
Pois quando attento os numeros vos contos
Neffa bslieza harmonica remonto t“ n
Aó ple&tro da Phebina confonancia: … ·
Já que primas me fois, fede terceiras … . . .
De meu amor, por mais que vos agate
Ouvir de hum cavalete as frioleiras; * * * * *
Se encordoais de ouvir-me, ó primas, bate. .
De dar á efcaravelha em taes afneiras, . .
Que em fim ito de amor he hum lindo trate.
* - - -- - -* - … - - D. L.
v,
e Mangeron4.*** 171
D. L. Tambem fois Poeta, meu fobrinho ? ;
D. T. Tambem temos nofo entuziafmo, Se
nhori,tio ; ifto cá he vea capilar , e natural: *
D. L. Oli quanto-me peza que {ejais Poeta., ..
pois por força haveis de fer pobre. zº

D. T. A*gora , Senhor , eu fou hum rico Poe


·ta. Pois, primas, que dizeis da minha elo-º.
_ quẹncia ? Náo me refpondeis ? * * ** *
D. Clor. Os Anjos lhe reípondão.… wº
D. Niz. Ahi não ha mais quc dizer. * : *
D. T. Ah Senhor tio, efta rapariga he cá da
-obriga;áo de cafa ? ~ :
D. L. He moça da almofada. -

D. T.. Não he mal etreada ; e que olhos que


tem ! Benza-te Deos ! .
Sevada Quer. Deos que trago hum corninho,
por amor do quebranto. / -

ID. L. Eu cuido, Sobrinho, que mais vos agra


da a criada do que a noiva. "
D. T. Tudo o que he deta cafa me agrada muito."
ID. L. Agora vamos ao intento : §ಧಿ , mi
nhas Sobrinhas , que voflo primo D. Tibur
cio, filho de meu irmão D. Trifonio, e de
Dona Pantaleoa Reboldan, o qual tambem era
irmão de vofo pai, e meu irmão D. Blianís,
vem a eleger huma de vós outras para efpofa,
pela mercê que me faz; que a fer pofivel
cazar com ambas, o fizera fem ceremonia,
que para mais he o feu primor. -

JD. T. Por certo que fim; e não (ó com am


bas, mas até com a criada; pois, como digo ; de
fejo
cafa;
metter no coração tudo o que forI).defa
- L.
17z Guerras do Aleérina , .
D. T. Eu o creio, meu Sobrinho, hifo fahis º *

a? vosto Pai. " o ". .. . . .


IDI Clor. Náo vi maior afno! . . oirá part.
JD. Niz. Nem eu o maior fimples ! s á parte'.
º Diz identro Simicupio, º " . .
Simic. Quem merca o Alecrim ? * * *\
P. Clor. O? Sevadilha, chama a efe homem do
Alecrim , anda deprefIa. .* -

Sevad. Entrou. no fãdario! á part. " *

D. L. Sobrinho, não eftranheis efte excefo de º


minha fobrinha, porque haveis de faber, que º
ha nefta terra dous ranchos , hum do Ale
crim , outro da Mangerona; e fazem taes ex->
ceios por etas duas plantas, que fe mataráó.
humas ás outras. º –
D. T. E vofia mercê confente que minhas pri-º
mas figão efas parcialidades ? 5
D. L. Não vedes que he moda ; e como não |
cuta dinheiro, bem fe póde permittir? º

D. T. . Bem, fei querifo são verduras da mo- º

cidade, mas com tudo não approvo. " .. …"


D. L. E a razão ? * . . ... . . ..
• T). 7. Náo fei.” - - * *
D. Clor. Vofa mercê como vem com os abuíos º
do monte, por ifo etranha os etilos da Corte
D. Niz. Callai-vos , mana , que elle ha de fer
io maior apaixonado que ha de ter o Alecrimi,
. . e. a Mangerona. . .” *** * * * . .
D. T. Se eu enlouquecer, não duvio. . . .
Sabe Símicupio com hum molho de Alecrim ao 5
- bombro. ºr
Simic. Quem quer o Alecrim ? : : i
-*. - D. Cior
- y .. e AMangerona. :ºr73
# D. Glor. Anda para cá: tem mão, não o po
* *, nhas no , cháo. , . *. . .. . . . .
Simic. Pois aonde o hei de pôr ? . …"
D. Clor. Aqui no meu colo : ai, no chão o meu
..., Alecrim ?. Ifo" não. . . . . * **

- Simic. Pois não fó o ponha no colo, mas no


pefcoço. -

D. Clor. A quanto he o mòlho?


- Simic. A real e meio, por fer para vofa mercê.
D. Clor. Põem ahi cincoenta molhos. * \\
a Simic. Pelo que vejo, efia he D. Cloris, á part.
Eis-ahi tem todos os mólhos, reparta lá com a
ရွှံ့ပုိ့ခ္ရ , que fupponho tambem quererá o
* * ta raminho. : - º os ºs .……….
D. Niz. Ai, tira-te para lá, homem, com efe
mão cheiro. ‘. . ; , ; , . . . . Y.
Simie. Já fei que eta he a da Mangerona de
Fuas. ' , . , , * á parte.
D. T. Bem haja minha prima que não he def
· tas , invençóes. ! ! :º · · · ·!.!
D. L. porque he da Mangerona, por ifo abor
rece o Alecrim. sº º , -2, º .*

D. T. Reta-me que vofa mercê tambem te


º nha algum rancho. Nº …, .. . . . . .
D. L. Olhairvós , não deixo cá de mim para
mim de ter minha parcialidade. . ' : 'lºw
Aimic.. Ora demos principio á tramoia. 'ás part.
Ai Senhores, quem me acode? - "A XV
D. L. Que tens, homem ? cº,
Simic. Ai , ai , confiſsão. v . ' ', *'.
* * Cahe ®imicupio eftrabuxando , fingindo hufu
* T ・ ・ * accidente: , ; ,
º - - • *- : D. Chor.
174 Guerras do Alecrim
D.Clor. Coitado do homem! Que tens? Quete deo?
. Niz. Táo venenofo he o teu Alecrim , que
mata a quem o traz ? " "…ºf :ivº º "".
*ID. Le Olá , tragão agua… …" ", f, "º") \
Sahem Fagundes, e Sevadilha com huma quarta.
o Sevad. Aí, º Senhores, que ºito the accidente de
gota coral ! , - ºf
Semic. O coral de teus labios que accidentes não
… fará? f *; * .… … if … … á párt
ID. L. A unha...de, gráo, befta.herboa para ifto.
>. D. T. Puxem-lhe pelos dedos, que tambem he
1 , bom remedio.o., zo i st": r 2
o D. „Lanferote, D. Tiburcio, ſevadilha, e Fa
gundes pegão em Simicupio ,o enefte com o
aº # efinabuxamento fará cabir a todos. . ."
D. L. Motra cá o dedo. .? ; , ; ;
Simic. Agredeço o anhel. **+;, , . á part.
. D. T. E a força que tem o falvaje ! … ' ' .
"Sevad. Eu não pofio; com elle. " ". . . , :
Simic. Lá vai o dedo pollegar cos diabos! Eu
…etou capaz de tornar a mim, antes que me
deixem defpedaçado. tº. i. º. º.
--D. E. Borrifa-o, Fagundes. " " …, ...,
Fag. Ora deixem-no comigo. Borrifa-0.
Simic. Pó diabo! E o que fedem os borrifos da
velha! A maldita parece que tem a potema
.* no bofe. - º, . . a

D. Niz. Não fecanfem que ele não torna a


fi táo cedo. ‘. . . . . . • , , , , ,

Simic. Effa he a verdade. . . .


# Mas pelº fim pelº não, eu lhe vazo efia
"ºrtº; que quando Deos quer, agua fria.Wihe
nha.
… +…» e AMangerona., - 475
- Simic, Valha-te o diabo , que me deitate agua
na fervura! Eu não tenho mais remedio que
aquietar-me, fenão virá como remedio algum
, páo fanto fobre mim. á p4rt.
ఙ్ఞ; elle eftá mais, focegado depois
... da agua; venhão jantar que a meza etá pota.
D. L. Vai bufcar o meu capote, e cobreo-o,
que eftá tremendo o miferalvavel. º
- Simic. He maravilha que hum miferavel cubra
º, , ; Outro, , , , * * * * * * á part.
2 D. T. Aquillo são convulsões, mas bom he co
¿!, ¡brillo por amor do ar. . . . . cº,
Sahe Fagundes com hum capote. . .
· Fag. Eis-ahio capote; ſe elle o babar,babado ficarás
Simic. Anda, tolla, que não me babo.… á part.
a D. L. Tu , Sevadilha, tem fentido nefte homem,
em ಆನ್ಲ! jantamos: vinde,Sobrinho, Kai-fe.

-
D. T. Vamos, que tenho huma
v. * ' s fome ' ' horrenda.
i Waif-e.
D. Niz.He galante figura o tal meu primo, Kaife.
D. Clor. Fagundes, agazalha eſſe alecrim.
Fag, Tanto me importa; fe fora Mangerona,
ainda, ainda. : , Pai-ſe.
Jevad. Só ifto. me faltava, ficar cu guardando
a eſte defunto ! " . . . . ''. i. (3.

Simic. Vejamos quem he eta Sevadilha, que fi


cou por minha enfermeira, Ai que fuppombo
- , , que he a menina do malmequer , que lá traz
hum no cabello : Vamo-nos erguendo , por
ver fe_nos quer bem...; … Vai-fe erguendo.
... Sevad. 6ಿಸಿ deite-fe. Ai que o homem
tem frenefis ! Acudáo, cá. . . . . . . . .. .
- - ..Wi
176 -Guerras do Alecrim ,
* Simic. Calte, Sevadilha, não perturbes efia pri
- º meira occafiáo de meu "amor. "' ' ' ' '
Jevad... Deixe-fe eftar cuberto. 3" *** *º *
- Simic. Bem fei que o calafrio de meu amor
he tão grande, que fe póde cobriridiante d'El
- Rei; mas confefo-te que já não pofo aturar
· ·· ºo gravamen defle capote. ' … ¡'' ' “
Sevad. Ai que o homem etá louco, e furiofo!
- Simic. A furia com que te aufentas, me faz en
* * louquecer: não fujas, Sevadilha, que eu fou
… aquelle fujeito do malmequer, e tão fujeito
aos teus imperios-, que fouºhum criado de
, vofia mercè. *** : $ * " * : ***** , , ,
- Sevad. Eu te arrenego, maldito homem! Tu
"… és o deíta manhá? . . . * . * * * **
* Simic. Cuidavas que não havia faber bufcar
^ "modo para ver-te? …"… º…r_º
º Sevad. Queres" que vá chamar a D. Cloris,
--- º Ou D. ize 2 - - .
º Sevad. Logo irás chamar a D. Cloris; mas pri
meiro attende á chamma, de meu amor , que
fe o fogo tem linguas, e asºparedes tem óu
vidos, bem póde a dura parede de teu rigor
efcutar a levareda em que me abrafo: muita
coutinha te poderia eu dizer; porém a occafião
•* *4.
*-
º não he para ifo. . . . - - -

º Sevad. Nem éu etou para effoutro.


Simic. Eu o difera, quê o teu malmequer não
he para menos. -- ºf a - -

Sevad. Nem a tua pefoa he para mais.


"Simie, Pois ifo he de veras? Olha que defconfio.
ºvad. Bem aviada citou cu! Bom amಗ್ಗ f;
- - քհQ :
-

\
* !

e Mangeroná. 177
nho! Bonito eras tu para aturar vinte annos
de defprezos, como ha muitos que aturão,
levando com as janellas nos narizes, dor
mindo pelas efcadas, aturando calmas, fof.
frendo geadas, apurando-fe em Romances,
dando défcantes , feitos eftatuas de amor no
templo de Venus, e com tudo etáo mui
contentes da fua vida; e afim para que me
bufcas ? * , - . . . .

simic. Para que me defenganes, fe me que


res, ou não. * 、ギ .* -

.sevad. Pergunta-o ao malmequer, que elle to dirá.


.Simic. Se eu o tivera aqui , fizera efia expe
riencia- . . · .. | . : , , , . . ,
Javad. É aonde etá o que eu te dei?
3imic. Lá o tenho empapelado, que cuido que
o ar mo leva. . . . ' ', ,, … " -

Sevad. Afim te feve o diabo. . . . . .


Simic. Levará que he muito capaz diflo. Pois em
que ficamos? Bem me queres,ou mal me queres?
Seyad. Apanha aquelle malmequer, que efiá jun
to aquella porta, e perguntalho, que elle to dir4.
Simic. Pois acafo nas folhas do malmequer eftão
.efcritos os teus amores, ou os teus defdens?
Sevad. Da mefma forte que a buena dicha na
palma da mão. º
<Simic. Eu vou apanhar o dito malmequer. Pai-ſºº
-Sevad. Quem me dera que ficafe em malme
quer , para o fazer andar á prática! -

..... Sabe Simicupio com hum malmequer. __ *


«Simic. Eis-aqui o malmequer: ora vamos a ifo =
ue fe ha flores que são defengano da vi
3 om. II. M då,
-

178 Guerras do Alecrim ;


º da , eta o fera do amor. Sevadilha, toma
fentido, vê fe fica no bem me quer.
sevad. Ito he como huma forte.
simic. Queira Deos náo, e convert㺠mal me
-

º
*
霄 em azar. Tem fentido, Sevadilha: amor,
-
-

, fe {ahe a coufa como eu quero, eu te promet


to hum arco de pipa , e huma venda nos
Romolares em que ganhes muito dinheiro
-
canta Simicupio a feguinte
- A R I. As .. . .;
*
*... -
Oraculo de amor
- - - - --- -
-
- t

**
*- *
Propicio me refponde
-
* *
- -
-
--
. *. :. * * *. ,. . . .
* . * Nas ancias defte ardorº º . . .º.º.º.
Bem me queres, mal me, queres ,
. Bem me queres, mal me queres, º
~ Mal me qüeres, diffe a flor. · · · ~
Ai de mim, que me quer mal " "; º
*:
Teu ingrato mil me quer ! " ... ." sº
* "Acabou-fe o meu cuidado, * * *
- Que mais tenho que, efperar ? "
- ' ' Vou-me agora a regalar $ ... : . . .
** ** Levar boa vida, comer, e beber.
** :)'; ' _ '. Sabe IX. Cloris. … ... … , . _
". Clor.E tão
Simic. Ohbom,
quanto
quefolgo, que nunca
parece que já etejas bom!
tive nada.
D. Clor. Com que farate? . ..
Simic. Com o mefmo mal; porque tambẹm hà
ID.males
Clor. que
Quevem por que
dizes, bem.te não
. enténdo-?
. -

Ef
tás louco? " " . - -

simic. Meu amo ainda o cítá mais do que eu s


deíde que tº vio afim por maior, e พื้นma
- Ÿ}ካጾ 5
- e Mangerona. s
179
nhã; e afim para fignificar-te a tremendifima
º eficacia de feu amor, aqui me manda a teus
:pés, minto aos teus átomos , para que com
os disfarces do Alecrim-pofa merecer os teus
agrados. -

D. Clor. Sevadilha, pôem-te a efpreitar não ve


nha alguem. . . . . . . . .”
Sevad. Sim , Senhora, Arrelá com o ardil do
homem! - . . .; Wai-ſe.
D. Clor. E quem he efe teu amo, que tanto
me adora ? - … * s -

.Simic. He o Senhor D. Gilvaz cavalheiro de tão


lindas prendas, como verbi gratia Londres,
e París. - . -

D. Clor. Que oficio tem? -

Simic. Ha de ter hum de defuntos quando morrer.


D. Clor. E em quanto vivo, em que ſe occupa è
Simic. Em morrer por vofia mercê..
D. Clor. Falla a propoſito. º, *

3'imic. Senhora, meu amo não neceffita de ofi


cios para manter os feus eftados, porque tem
varias propriedades comfigo muito boas; além
difo tem huma quinta na femana, que fica
entre a quarta, e a feta, tão grande, que
he necefario vinte e quatro horas para fe cor
rer toda. º ---, ' ,
JD. Clor. Quanto fará toda de renda ?
.Simic. Não fe póde {aber ao certo ; fei que
tem varias rendas em Flandes, e outras em Pe
niche, e etas bem grofas; tambem tem hum
foro de fidalgo, e hum juro de nobreza.
JD. Clor, Bata que he fidalgo? ' ' ‫م‬-
- M ii SÍ•
18о ( Guerrat do Alecrim , *
Simic. Como as etrellas, que as vê ao meio dia ,
e a cítas horas não vê outra coufa; e certa
mente lhe polfo dizer , que he tão antiga a fua
defcendencia , que diz muita gente, que def
cende de Adão.
ID. Clor. Se ifo, he afim, talvez que me in
cline a querello para meu efpofo. -

Simic. Venha a refpota, Senhora, que meu amo


eftá efperando com lingua de palmo.
D. Clor. Pois ouve o que lhe has de dizer-, º
Canta D. Cloris a feguinte :
: . . . . A R Ae . . .. . .
, , , , Dirás ao meu bem » -

Que máo defconfie , *


Que adore, que efpere,
- Que não defefpere,
t . . . Que á fua firmeza
* Confiante ferei. .
- Que firme eu tambem • *
A tanta fineza , , ,, - - , .
Amante, contante. , -

Extremos farei.
Pai-ſº. . . . . .

Simic. Vencido, etá o negocio, mas o capote


do velho, cá não ha de ficar por vida de Si
…micupio ; que fe a occafião faz o ladrão, hei
de fello por não perder a occafião. ... -
Kai-Je com o capote.
* .$abe $evadilha. -

«Sevad. Efpera, homem, onde levas o capote?


E foi-fe como hum cefto roto! Ai mofina def
graçada , que ha de fer de mim , fe meu amo
n㺠achar º feu rico capote :
-.",
s . |4--
- - - *-
/
. , e AMangeroma: '' 181
*_ _ _ _ sahe D. Lanferote... ' ' ' '.
D. L. Já farou o homem, Sevadilha? .

*Sevad. Sim Senhor. - s


D. L. Já fe foi? . - º
.5evad. Simº * Senhor. * *

JD. L. Guarda{te o capote ! ! ! ! -

Sevad. Ahi he ella. á part -

D. L. Náo ouvcs ? Guardaftê ọ capote ? |


*.
-

Sevad. Qual capote ? -

D. L. O meu. * . . . ..
Sevad. Qual meu? . . . . .
JD. L. O meu de Garagoça: º
Sevad. Ah,fim, o capote do homem do Alecrim ?
D. L. Qual homem ? * * * ,

&evad. O do accidente. -

D. L. Tu zombas ?
Sevad. Zombaria fóra, ohomem levou o capote;
D. L. O meu capote ? ' … …" -

«Sevad. Eu não fei fe elle era de vofa mer


cê; o que feihe que o homem do Alecrim
levou hum capote, com que etava cuberto. -
ZD, L. T. como o levou ? r
'
Sevad. Nos hombros. . ---

D. L. O meu capote furtado ? . - - -

4evad. Pois nunca fe vio furtar hum capote?


D. L. Náo, bribantona, que era hum capot
aquelle, que nunca ninguem o furtou. Oh,
- dia infeliz, dia aziago, dia indigno de qué
… o Sol te vifite com os feus: raios! - -
Sevad. Santa Barbára ! ~ ~ … :-* **** s = n
D. L. Tu, defcuidada, has de pôr para ali o
meu espotes ou do corpo to hci ಚ ge
º ...?
T82 Guerras do Alecrim ,
Sevad. Como mo ha de tirar do corpo, fe eu
o não tenho ? - • ** {… . ..
JD. L. Deſta forte. . . . . . .
Cantão D. Lauferote, e Sevadilha a feguinte:
A R I A A D U O. .

D. L. Moça tonta, defcuidada, tº


Sevad. Ha mulher, mais defgraçada '7,
Nefte mundo ? Não, não ha. . . . .
ID, L. Se náo dás o meu capote , :

Tua capa hei de rafgar.......


Sevad. Não me raígue a minha capa.
D. L. Dá me, moça, o meu capote , , .
Sevad. Minha capa.
D. L. Meu capote. º -

Ambos. Trata logo de o pagar. . . . . .


D. L. Meu capote afim furtado ! ".
.Sevad, Meu Adorno aflim raígado ! &
Ambos. Que defgraça! .. …, a "
JD. L. Centra a moga . .
fevad. Contra o velho - , ,, , , |
Ambos. A jutiça hei de chamar: -

Meu capote donde etá? Wºoſe.


s C E N A. III. e. 3 ;
Praça : no fim haverá huma janella. Sabe D.
: ُّ‫ ‘‘کُل‬- - - * '
(ンーſ ... . . . . . . .. . .

←G← Ꭰ Ife, a Simicupio que aqui o efpê


rawa ;2 mas tarda:tºnio', que entendo
º apanhárão na empreza. Mas fe ferá aquel
ºlº que ali vem? Não he Simicupio, que
ele não-tem capote. Quem ferá?… , ,
/ Ja
e Mangeron4. , 18;
Sahe Simicupio embuçado em hum capote. , ,
Simic. Lá etá hum vulto embuçado no meio
do caminho; queira Deos não me cheguem
ao vulto ; não feife torne para traz, mas
peior he motrar cobardia; eu faço das tripas
coração, vou chegando, mas fempre de longe.
D. G. Ele fevem chegando , , e eu confeffo
, que náo eftou todo trigo.
Simic. Ete homem não etá aqui para bom fim;
eu finjo-me valente: afafte-fe lá, deixe-me
paſſar, aliàs o paflarei. -

D. G. Voffa mercè póde paffar. . .. . .


Simic. Ai, que he D. Gil! Pois agora farei
com que me tenha por valorofo. 還器
ahi ? Falle, quando não defpeça-fe deta vi
da, que o mando para a outra... ,
D. G. Primeiro perderá a fua, quem me inten
ta reconhecer.. . ‫است‬
3'inic. Tenha mão, Senhor D. Gilvaz, que
fou Simicupio. . ..
D. G. Se não fallas, talvez que a graça te fi
hiffe cara. .. .
Sinic. Igual vota mercê, que fe o não conhe
ço pela voz, fem dúvida, Senhor D. Gilvaz,
| he prégo com o feu nome, na cara, , _ _.'
ID, G. Deixemos iffo , dá-me novas de D. Clo
is; dize , podeſte dar-lhe o recado?, v z
Sinic. Náo fabe que fou o Cefar dos alcovitef.
_es? Fui, vi, e, venci. , , , . .

D. G. Dá-me hum abraço, meu Simicupio.


Afinr. Não quero abraços, venhão, as alviceras,
... feláe emmudeci como Oraculo..., D. ώ
---

$84 Guerras do Alecrim ,


D. G. Em cafa tas darei: conta-me primeiro;
que fazia D, Gloris?" - -

Simic. Ifo são contos largos, etava toda rodea


' da de brazeiros de Alecrim , com hum gran
de mólho delle no peito, cheirando a Rainha
de Hungria, mafcando Alecrim, como quem
mafca tabaco de fumo; e como acabava de
jantar, vinha palitando com hum palito de Ale-
crim, e finalmente, Senhor, com o Aleerim •
"anda toda tão verde, como fe tivera tiricia.
JD. G. E do mais que pafate ! :
Jinjic. Iffo be para máis de vagar , bafta que
faiba por ora, que apenas lancei o anzol no
már da fimplicidade de D. Cloris, picando lo
蠶 minhoca do engano, ficouhas,engafgalha- -
da com o engodo de mil patran que lhe
* encaixei a mão tente. .
JD. G. Incriveis são as tuas habilidades: e que
* capote he eſſe? - -

Jimie. Efte he o depojo do meu triunfo ; jo


*'guei com o velho os centos, e ganhei-lhe ef
ie capote, e ſe voſſa merce ſoubera a virude
F que ele tem, paímaria.
p. G. Que virtude tem ?
Simíe, He hum grande remedio para farar acci
dentes de gota coral.
3D, G. Conta me ifo,
· _ _ sabe p. Fuas embuçado.
Simie. Fallemos de manfo, que ahi vem um
homem, " "…
D. F. Eſta he a janella da coſinha de D. Nize,
, que a pezar dá efcuridade da noite, a onke
- * cc.

|
e ÆMangeronæ. 18;
"… ee e meu intincto pelos efluvios odoriferos,
que exhala a Pancava daquella Fenix.
D. G. Simicupio, hum homem ao pé da janella
de D. Cloris ? ifto não me cheira bem.
*Simic. Como lhe ha de cheirar bem , feito
aqui he hum monturo?
í Apparece Fegundes á janella.
Fºg. Cé, he vofa mercê me{mo ?
HD. F. Sou eu me{mo, e não outro que impa
ciente efpero novas de meu bem. ,"

ID. G. Não ouvifte aquillo, Simicupio?


Simic. Aquillo he que não cheira bem, Se
- * nhor D. Gilvaz. º ~

Pag. Não bata que vofa mercê diga que he


· mefmo ; he neceffario a fenha, e a contrafenha,
D. F. Pois atenda. º

canta D. Fuas o fºguinte "…


\ M I NU E T E. . -

tº __ Já que a fortuna … … - …
- Hoje me abana a “ . . .. . .
“ A Mangeroña •.: a , joe .** *
Quero exaltar. . .. . . . . ..
No feu triunfo l.
Oue a fama entoa ,
· Palma , e coroa , **:::: · · · · · ··
Ha de levar. . . . . . . … :: ::
_ Ha de por certo, º . - *.
Oue a fua rama · ¿ · · · ·
Na voz da fama … · · · · ·
Sempre andara.
p. o EEEel. fenha di Mang: româ .
is86 Guerras do Alecrim ,
rona: , que te parece, Simicupio, o quanto
tem adientado o feu amor ? *

: Simic. Quidquid fit, o primeiro milho be dos


pafíaros , o fegundo he, cá para os melros.
JFag. Suba por efia efcada. . Lançº a efcada.
D. F. Segure bem. - . Tobe.
Simic. Senhor D. Gil, agora he tempo de fubir
tambem; pois etamos em era de arrepar; não
... perca a occafiáo. . . ,
D. G. Vem tu tambem. - ſobe.
.Simic. Eu tambem vou a render á efcala vita
eſſe caſtello de Cupido. -

Pag. Tenha mão, Senhor, que he o que quer ?


JD. G. Mangerona.• : : • ...
Fºg. Vofa mercê, meu fidalgo, quem procura ?
.Simic. Tambem Mangerona em lugar de Seva
dilha , que tudo, faz bom tabaco.
Fag. Ito cá etá por etanque, não entra
quem quer: " * * -
Simic. Se não entra quem quer, entrará quem
não quer. • * * -

Fag. Vá-fe dahi, que não conheço Framengos


a ſincia nolte.
4
Simtc. Tem mão, não me empurres.
Fag. Náo ha de, entrar. ... "

Simic. O mulher, não me precipites, que fou.


capaz de te efcalar.
Fag. Va-fe cos diabos, feja quem for.
. Empurra a efcada, e cabe com Simicipio.
Jimic. Ai, que me derreafte, bruxa infernal!
Tu me pagarás o fimicupio que me fizete
***ºmar. E{ks são os ofios do oficio; mas pa
-- tº * ra
e Mangerona. , 187
ra que tudo não fejão ofos, vamos levando
eta efcada, que fempre valerá alguma coufa;
ao menos fe não morri da quéda, vou pa
ra cafa em huma efcada. , . . . . tº \

J'ai fe Simicupio, e leva a efcada. .


- s c E N A iv.
Cabinete. Sabe Fagundes trazendo pela mão 4
D. Fuas, e detraz virá D. Gil embuçado.
-
** *
. . .
Fag. Pº de manfinho, que fe acorda, fe
- rá para nos enforcar. tº .

D. F. Recontou a D. Nize os axtremos com


que a idolatro ? 3. . . . . . . * .

Fag. Não me ficou nada no tinreiro: meu Se


nhor , nefa materia tenho tanta elegancia, que
- fou outra Marca Tulia Cicerona. .. e ::
D. F. Ai , Fagundes, fe cafará D. Nize com o
primo ! Mas quem etá aqui atraz de nós?
D. G. Não quero dar-me a conhecer a D. Fuas,
por ver fe.com os zelos defiíte da empreza ,
· para que fó triunfe o Alecrim. . . 4 part.
ID. F. Cavalheiro, vós daqui não haveis de paf
…far, ou ambos ficaremos aqui mortos, fem
- dizer-me primeiro o que buícais nefta , cala ?
ID... G. O meímo que vós bufcais. . g. - -

D. R. Q que eu bufco náo vos póde pertencer.


D. G. Nem o que me partence podeis vós bufcar.
Fag. Senhores meus, accomodem-fe, que Pó
de acordar o Senhor D. Lanferote, e o da»
mno ferá de todos. . .. y ºf
ID. F, Queres que me calle á vifta dos meus zelºs?
-twº y ‫رده که‬ -

*
እ88 'Guerras do Alecrín
- Sahe D. Nize. !

3D. Niz. Que ruido he ete, Fagundes?


D. F. Sinto, Senhora Dona Nize, que a pri
meira vez que me facilitais efta fortuna, Tme
hofpedeis com zelos. , º
D. Niz. Não fei que motivo haja para os haver.
D. F. Efte Senhor embuçado, que aqui me vem
, feguindo , e diz que procura o me{mo que
eu buco. , , , * .
D.Niz. Sabe ele por ventura o que vós procurais?
D. F. Elle que diz que fim, certo he que o fabe.
JD. Niz. Senhor, vós acafo vindes aqui a meu
refpeito? - para D. Gil.
ID. G. Nada hei de reponder. á parte.
D. F. Quem calla confente: não averiguemos
"… mais, Senhora Dona Nize , fó finto que a fua
Mangerona admitta enxertos de outra plantas.
D. Niz. Fe he o pago que me dais, de ad
mittir a voa correpondencia, de obrar ete
º exceto a vofo refpeito, e de me expôr a ef
· te perigo por vofia caufa ? . . . -

D. F. Melhor fora defenganar-me, que effa era


a melhor fineza que vos podia merecer. :
ZD. Niz. Pois eu digo-vos, que etou innocen
te, que não conheço efte homem; e me pa
rece que bata dizello para º me acreditares.
... : 1). F. E 'baflava ver eu o 'contrario , para náo
- acreditar efas defculpas. . …" º "º" : {
D. Niz. Pois vito ifo, fiquemos como dantes.
, P. F "De que forte ?
e. º
. . . f . .º . . "
º JD, Niz, Deſta ſorte. * :* ~ * : * *
こぐッー・リ ー 2 :封、? : ;ſ. . 。 "... ‫" ي م ت ن د‬. .
\\ Can
, e AMangerom4.. , 189
Canta D. Nize a feguinte : , : a;
A R 1 A. -

Supponha, Senhor, -

Que nunca me vio, , - . .)

É que he, o íeu amor . . . .. .


- * Afim como a flor, , , , , y
Que apenas nafcco , , , , , , .…..
E logo murchou. . . . . . . . . . . . .
Pois tanto me dá . . . . . . .
De ſeu pertender, ... | | : .
Que firme fupponho . . . . . . . ."

Seria algum fonho» . . . . . . . .


Que pouco durou... , ... | Paife:
Id. F. Nize cruel, iflo aínda he maior tyran
.nia ; efcuta-me... ---, - Wai-ſº.
Jag. Vá lá dar-lhe fatisfaçõcs, que ella he bo
nita para efas graças. E vofa mercê, Senhor
rebuçado, a que fim quiz profanar o fagrado
defta cafa? - - - - -

XD. G. A ver o bem que adoro...…


స్ధ Vofia mercê etá zombando ? Aqui não
, , ha quem poffa fer amante de vofla mercè ;
pois bem vê o recato, e honra deta cafa.
D. G. Eu bem vejo o recato, e honra deta ca
fa. Que? Aquillo de fubir hum homem por
huma janella, e hir-fe para dentro atraz de hu
ma mulher, não he nada? . . . .
Pag. Aquelle homem he primo carnal da Se
º nhora D. Nize. - -
P. G. Feis ºu tambem quero fºr muitº com
***

-
*
196 Guerras do Alecrín ;
to da Senhora D. Cloris : ora faça-me o fa
vor de a hir chamar,
Pag. Que diz ? A Senhora D. Cloris? Olha tu
lá D. Cloris não te enganes ; fim a outra,
que anda cuberta de cilícios , jejuando apão,
e agua; tire dahi o fentido, meu Senhor.
D. G. Se a não fores chamar, a hirei eu bufcar.
Pag. Ai Senhor, vofa mercê tem alguma le
giáo de diabos no corpo ? E que reñedio te
nho fenão chamalla, antes que o homem
faça alguma afneira, que ele tem cara de ar
remeter. *... . “. . . . Wai-ſe.
ID. G. Venha logo, que eu não pofo efperar
muito tempo. À velha queria corretaje: bata
que lha dê D. Fuas. t * * *

º Sahe D. Cloris.
ID.com
Clor.tantos
Senhor , vofia
excefos? A mercê" que pertende
quem procura ? •

D. G. Eu , Senhora D. Clotis , fou D. Gilvaz ,


aquelle impaciente amante que atropellando
impofliveis vem, qual falamandra de amor,
a abrazar-fe ,rias Chathmas do “feu Alecrim ,
· como vičtima da mefma ''chamma. -

D. Clor. Senhor D. Gilvaz, como entendo o


feu amor fó fe encaminha ao licito fim de fer
meu efpofo, por ifo lhe facilito os meus
agrados, mas não tão francamente, que pri
"rneiro não haja de experimentar no crifol da
T conſtancia os raios do ſeu amor.
P.G. Mui pouco conceito fazeis da vofa bel
#*# pois fefympithis
. ºcculເຂໍs antes de admirar efa ami
foubetes formofura.
[Q*>
- QS

f
… 'e Mangeroma. ……. · 1pt;
dos os meus affectos, como depois de admi
rar o maior portento de perfeição , poderia
haver em mim outro cuidado mais que o
de adorar-vos com táo immovel conftancia »
que primeiro , fe moveráõ as eftrellas fixas,
que fejão errantes as minhas adorações ?
ID. Clor. Iflo he de veras, Senhor D. Gil?
D. G. Se eu morro de veras, como hei de fal
lar zombando ? f.º. t ". . . . ºf ...' . .
. . . . ." tº iº E “. . . . . . .”
S O N E.T. O. , ,
Tanto e quero, ó Clori, tanto, tanto;
E tenho nefte tanto tanto tento, - ;
Que em cuidar que te perco, me e pavento;
E em cuidar que me deixas, me ataranto.
Se não fabes (ai Clori! ) o quanto o quanto
Te idolatra rendido o penfamento , . ,
Digão-to os meus fufpiros cento a cento, º
Soletra-o nos meus olhos pranto a pranto.
Oh quem pudera agora encarecerte | . . .
Os exquifito modos de adorarte
Que amorfoube inventar para quererte -
Ouve, Clori; mas não, que hei de afluftarte;
Porque he tal o meu incendio, que ao dizcrte.
-Ficarás no perigo de abrazarte. 1 · ···· … *
-- - 2て . ſ: G;? * '
D. Clor. Senhor D. Gil, as fuas finezas por.
encarecidas perdem a etimação de verdadei
ras; que quem tem a lingua tão folta para
os encarecimentos, terá preza a vontade pa-
_ ra os extremos. º - -

D. G. Como ha de havet experiencias na


- + - Th

-- - -

º
292; 'Guerras do Alecrin ,
- nha confiancia , feráo os fucccfos de minhas
finezas os chronitas de meu amor.
: .
Canta p. Gil a feguinte
- * * * л к і А. . . . . ;

Vite, ó Clori, a flor gigante, , .


* - ¿Que “procura firme , amante , ' . . . . . . )
'': Seguif :femprega-luz do Sol ?
Deſſa ſorte, ſem deſmaios, ..
Sol que gyra são teus raios,
E meu peito Gyrafol. ,
Mas ai, Clori, que a luz putz . :
De teus raios mais "fe apura -

e "De meu peito no crifol.


D. Clor. Cefa, meu bem, de encarecer-me o ,
teu amor; já fei são verdadeiras as tuas ex
/ prefsões. Oh fe eu tivera a fortuna que ef>
fas…vozes as não levaffe o vento, para aug;
mentar com elas a força de fua incontancia!…
; Sahe Sevadilha. . . . . . . . . .
Sevad. He bem feito! He bem empregado!
IP."Glor. O que, Sevadilha ? . . . . .
Sevad. O Senhor, que etá acordado. . ..
D. Clor. Náo póde, er a etas horas; náo te º
creio , que és huma medrofa. -

«Sevad. Fallo verdade, e não minto. . .' '


Canta Sevadilha a feguime
‫ ﺍﻭ له‬، ‫مه‬ , , v“,

- Senhora, que o velho.


. Se quer levantar! •º -
-

JMa
....... e AMangerona. ~ 193
Mofina de mim, -

Que ouvi efcarrar, - ..


. . . . Rallar, ei toſir ! , , ,, , : .
. Senhor, vá-fe embora, … para D. G.
Vá já para fóra, º #, -
• Senão o papão , , ……
- ; ; ; e Nos ha de engolir.
Fag. Ui , Senhores, ifto hc coufa de brinco ? O
Senhor feu tio etá com tamanho olho aber
cºto , que parece-hum leão, que eftá dormin
… do ; deite fóra efe homem, e venha-fe aga
zalhar, que já vem amanhecendo. .”" . . .
D. Clar. Pois deitem fóra a D. Gil: meu bem,
eftimarei - que as fuas obras corrcfpondáo : ás
, fuas palavras. . . . .''...' . Vaife.
f : Sahem, D. Nize , e D, Fttas. . . .

- D. Niz. Fagundes, encaminha a D. Fuas, que


meu tio eftá acordado. - . . . . .
D. F. Ainda o embuçado aqui eftá ? He para
-:2ver . Ah. cruel : á part.
-

D. Niz. Anda , Fagundes.


_Fag. Senhora, que não ha efcada para defcerem.
D. Niz. E aquella por onde fubio aonde etá ?
…Fag. "Empurrei-a com hum homem , que tam
, bem queria fubir, - - -

: D. G. Devia fer Simicupio, á part.


-D. F...Pois como ha de fer?
Sevad.Não ha mais remedio que faltar pelajanella.
Fag. Mas vejão não caião, no alfuje, º , , , ,
D. G. Em boa. etou metido ! - 4.pa’t.
D. F. Aonde etá a chave da porta ? " " .
Seºad.: A chave tem guardas, c etá agºzalha
..Tcm. II. N da
J94 Guerras do Alecrim ,
da no travefleiro do velho, por não dormir
n’uma porta. . . :

D. L. Fagundes, venha abrir efia janella que


já vem amanhecendo. Dentro.
Fag. Eis-aqui vofas mercês o que quizerão !
D. L. Fagundes, que faz que não vem? Dentro.
Fag. Etou enxotando o gato da vifinha: çape
º gato. Senhores efcondão-fe aonde for. ***
D. Niz. Ai que defgraça ] ,, , " ":
D. L. Sevadilha, que he ifo lá? - Dentro.
.Sevad. He o gato di vifinha, çapc gato... Dentro.
Simic. Abrão a porta que fe queima a cafa: fo
* #go, fogo. * * Dentro.
*Fag. Ai que ha fogo na cafa! São Marçal.
ID Niz. Eu eftou morta ! -

D. Clor. Ai que fe queima a cafa, que defgraça !


D. F. Peior he eta! . ( Sahe.
. . .

D. G. Ha horas minguadas ! • .

Simic. Abrão a porta, que ha fogo, fogo. Dentrº.


Sevad. Mofina de mim , que lá vão os meus
tarecos ! - . . .º.
…Simic. Não ouvem ? Pois lá vai a porta pela
: • porta fóra. Dentro.
-Sabe Simicupio com buma quarta ás cofias , e
ao mefmo tempo fabe D. Lanferote em fral
da de camiza , e D. Tíburcio embrulhado
em hum lençol, com huma candeia de gara
vato na mão. i .. . .
Simic. Fogo, fogo. . •.

Fag.isAdonde he, meu Senhor, .*


ID. T. Que he ifto cá 2 .
D. L. Fogo aonde, fe. cu não vejo fumo º
… ', Jimic.
. . , erAMangerom4;•:... 195
imic, Como ha de ver o fumo , fe o fumo
faz não ver ? , , , , , , ,,
D. T. Aqui me cheira a Alecrim queimado.
D. L. Dizes bem : Cloris, accendete algum
Alecrim ? . ; , ;
D. Clor. Eu, Senhor, não... foi ... porque
{empre. . . . . . . . . . - r * a * * * *.

D. L. Calla te , , que eu , porei o Alecrim com


dono; ha mais mofino homem! Lá vai o fuor
… de tantos annos. a. z .
Simic. Com elle podiavofa mercê apagar efte fogo.
D. G. Eftou admirado de ver a traça de Simi
cupio ! . á part.
D. T. Senhores, acudamos a ifto, que fe acaba
a torcida. - -

JD. L. Vede, fobrinho, ainda afim não fe en


torne o azeite. - *,

D. Niz. Ai os meus craveiros de Mangerona :


D. Clor. Ai os meus olhos de Alecrim!
Fag. Ai a minha canatra! /
Sevad. Ai os meus tarequinhos !
D. L. Ai a minha burra! - - -

D. T. Ai o meu alforje ! - -

Simic. Ai com tanto ai! Senhores aonde he o fogo.


D. L. Vejão vofas mercês bem por efas caías
aonde ferá. -

Simic. Entremos, Senhores, antes que fe atee


o incendio.
JD. G. e D. F. Vamos. z

Entrão Simicupio, D. Fuas, e D. Gil,


e logo tornão a fabir.
D. L. Vereis vós trampofinha, que fim leva o
Alecrim. , , ' N ii D.Clor.
196 Guerrastido;Alecrínt ;
Ciclor.O Alecrim não tem fim,que nunca murcha.
Sahem os tres. ' *-* · ··n srt
D. G. Náofe autem , que máo he nada.
D. F. Já fe apagou, Deos louvado. : i ….….
D. L. Aonde foi º -- - , , , , º, tº

Simic. Foi no almofariz, que eftava ao pé da ifca.


Sevad. Pois eu não fui a que petifquei... :
Fag. Pois eu nem no ferrolho... … , " ... "
Simic. Pois eu ainda efiou em jejum, : " …
D. L. Ora, meus Senhores, vofas mercês ime
"vivão muitos annos pela honra, que me fizerão.
D. G. Sempre buſcarei occaſióes de fervir a eſta
.: cafa. Wai-ſe.
D. F. E eu não menos.….…… , … º Vai-fe.
Simie. Agradeça-nos a boa vontade não º mais.
Fag. Se não houvefem boas almas, já o mun
do eftava acabado. * , .

ID. Clor. Eu eftou pafmada do fucceflo: … á part.


D. Niz. E eu não eftou em mim! - á part.
D. T. Ora com licença, meus Senhores, que
º me vou pôr em frefco. Wai-ſa.
D. L. Eu todavia ainda não etou focegado
Vio vofa mercê bem na chaminé? . .*.**
A imir. Para que vofa mercê defcanfe de todo,
º vazarei efta quarta nos narizes daquella velha,
que são duas chaminés. . . . -

Fag. Ai que me enfopou ! Senhor que mal lhe fiz?


Simic. He dar he a molhadura de cerra obra.
.
Di. L. Que fez vofa mercê º . . . . . . *.
4 mic. Deixe, Senhor, ito he para que felem
bre, e tenha cuidado no fogó que falcilmen
refe póde atear por hum accidente.
| Fag.
, se ?Mangèrom4a-w ?i i97
Fag. Vou mudar de camifa. „aif.
2. Niz; Pomára ijprovićiti; os cačosi pata a tai
nha Mangerona. -
D. L., Eta advertencia merece eta roa, que
he humia defcuidäda 鷺 feus defnúazellos
me deixou furtar hum capote.
Cantão D. Lanferote, Sevadilha, Simicupio,
D. Cloris, e D. Nize a fºguinte
| ‫و ه ﺑه‬.
D. L. Tu moça, tu tonta . -*
… , Sentido no fogo, ,
Senáo tu verás. . . . * *

Sevad. Debalde che o ſeu rogo, º


Que fogo fem fumo . .. . . .. .
- . Não he bom final. º
Simic. Quelinda pilhage
. Num fogo ಘೀ
Que lambe voraz! .
D. Clor. Não fente quem ama. ി
I).Niz. Náo temo eſa: chamma. . * " |

Ambas. Que he fogo de * , ,


D. L. Cuidado no fogo. e , … " …"
Sevad. Debalde he o ſeu rogo. : ,
D. L. e Jev. Q
fogo fem fumo. . . ..

:; ; Não he bom final.…….……


D. L. Sentido, cuidado. .
.Simic. Que fogo falvage. , o .
Todos excepto D. L. Que he fogo de amor.
Todos. Cuidado, pois, cuidado,
, , , , Que algum furor vendado, º
Fulmina tanto ardor. -* *

r - . - , PAR
198 Guerr4gs do Alecrim ,
*
-
-- * > ... " ... tº : ty -

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: P ARTE II.
. . . . . sº E N A I. . .
t ... -" " - ‫אלא‬, -
.
Praça." Sabem D. Gil,。 e simieuplo.
・ア ſ、A
D. G. A Inda não fei cabalmente applau
-

dir a tua induſtria, 6 inſigne Si


micupio.
Simic. Nem applaudir, nem agradecer, Senhor
|D. Gilvaz. r, ºr ºf . , . . ... . . *

D. G. As tuas idéas são tão impofiveis de ap


plaudir, como de agradecer; pois todo o pre
mio he diminuto, e todo o louvor limitado.
Simic. Vito ifo eu mefmo tenho a culpa de
não fer premiado; porque fe eu não fervira
tão bem, etaria mais bem fervido. Senhor
meu , eu nunca fui amigo de palanfrorios;
mais obras, e menos palavras; eu quero que
me ajufte a minha conta.
D. G. Para que ? -

Simic. Para pôr-me no olho da rua, que ferei


mais bem vito. !. 3
ID. G. Simicupio, nem fempre o diabo ha de
etar arrás da porta. -- -

4ímic. Sim, porque entrará para dentro de cafa- -


D.G. Calte, que fe configo a D. Cloris com
ſeu dote , e arras, eu te prometto, que an
des n'uma boléa. Simte.
e AMangeron4.....……. 199
Simic. Senhor, não me ande com a cabeça á
roda com efas promefas ; era melhor que
os premios andeflem a rodo.
Sahe Fagundes.
Fag. Lá deixo a D. Fuas metido n’uma caixa,
para o introduzir com D. Nize em cafa fem
futos , como da outra vez; tomára achar
hum homem, que ma carregafe.
D. G. Lá vem a velha, criada de Dona Cloris.
Simic. Retire fe vola mercé, e deixe-me com ella.
D. G. Pois eu aqui te c{pero. · Vai fe.
Fag. O filho, por vida vofa quereis levar-me
uma caixa ? * . -

Sitnic, . Com que achou-me vof a merce com


hombros de mariola ? -

Fag, Pois perdoe-me, que cuidei que era ho


· mem de ganhar. =~
Simic. Todos nefta vida fomos homens de ga
nhar; porém o modo he que defauthoriza.
Fag. Ito não era mais que levar huma caixa
as coſtas. - -

.Simic. Pois fe não he mais do que ifo, enten


do que não eftará mal, á minha peloa .
Fag. Qual mal? Antes lhe eftará muito bem.
Simíc. Mas advirta que ifto em mim não he
officio , he huma méta curiofidade.
Fag. Ora Deos lhe dê faude; olhe, ella Peza
pouco, e vem aqui para caía de D. Lanferote.
3imic. E de quem he a caixa ? -

Fag. He minha, que a que eu tinha, toda fe


desfaz em caruncho. -

Jimic. Pois eta não fe livrará da traça, que


- - ... in
. Sº 2 5 …." -
2ෆෆ් Guerràs do Alecrim , -

intento uar com ella. á parte. Vamos, Se


nhora. . ' + -- Kai-ſe.
Fag. Ande, meu filho." … Yai-f&.
.. - Sabe D. Gil. -

D. G. Aonde hirá Simicupio com a velha? O


maldito não perde occafião: com femelhante
jardineiro não murchará o Alecrim de Dona Clo
ris; porém elle lá vem com huma caixa ás coftas.
Aabe Simicupio com buma caixa ás cofia , e ho
- go a põem no chão.
Simie. Defencontrei-me da velha, que andará
tonta por mim. *

ID. G. Que he ifto , Simicupio ? -

Simic. Não lhe importe, vá-fe enrolando, que:


fe ha de metter aqui dentro, e hei de levar
º efe corpinho a cafa de Dona Cloris.
D. G. Ifo he quimerá; como polo eu caber ahi ?
Jimic. Ifo não me importa a mim; abata as
prefumpções, que logo caberá em toda a parte.
ID G. E como havemos abrilla, que eftá fechada ?
.Simic. Náo fabe , que a irmá gazúa fempre me
acompanha ? Eu a abro. abre.
ID. G. Etta tramoia he mui arrifcada: que tem
dentro ? - . . -

Simic. Eu vejo huns trapos eftendidos: Ande,


ande , que nos importa a nós.
D. G. Ora vamos a iſſo: ai Cloris, quanto me
cutas ! \

Mete fe D. Gil na caixa, e a fecha Simicupio,


º-e lógo a põem ás coltas , e dentro tambén
virá D. Fitts.
Simic. Náo ha de fermá eta encaixação. Arre
o que peza a criança ! D. F.
• y
• * e Mangerona. '' zoº.
D. F. Ai que me efmagáo os narizes! , Ä
D. G. Quem etá aqui? Efpera, vejamos o que he.
Simic. O que for lá fe achará. “. . . . . . . tº
-> r,
D. G. E{pera, que ifto he traição. -
** *

JD. F. Homem dos diabos não me esborraches.


D. G. Aque d'ElRei, não ha quem me acuda ?
Simic. Calle-fe, tamanhão, que para boa cafa
º vai. . - º - Pāo-fe.
s C E N A II. ' ' º

Sala. Sabem D. Tiburcio, e Sevadilha."


* D. T. S Evadilha , agora º que éftamos, fós
quero-te pedir hum confelho. * ,

evad. Se volta mercê acha que lhos pofio dar,


Proponha, que eu refolverei. ‘.
D. T. Tu bem fabes que eu vim para cazar
com huma detas duas primas minhas: amº
bas são bellas, ao que entendo ; fó me reta
faber as manhas de cada huma, para que ef
colha do mal o menos. -

«Sevad. Senhor, ambas são mui batantes mo


ças, a . Senhora Dona Cloris he mui perfeita,
fabe fazer os ovos moles muito bem; a Se
nhora Dona Nine tem melhor juizo; muito
aflento, quando não etá de levante; grande
$apacidade, e tanto , que fendo táo rapariga ,
já lhe nafceo o dente do fizo; porém na con
dição he huma vibora aflanhada. -

P. T. Não fei, Sevadilha, o que faça nete cafo.


«Sevad. Não cafar com nenhuma.
-P. T. Pois eu vim cá por beta de páo ?
&evad. Eu digo o que entendo em minha confº
enciencia, - J. D. T.
・ノ
2O2. - Guerras do Alecrim ,
D. T. Oh fe pudera eu cazar comtigo , Seva
# lha , porque fó tu me cahite em graça!
Sevad. Ai que graça ! Diga me ifo outra vez.
D. T. Não zombo, que não etou fóra de fa
' ... zer cu huma parvoiffe.. :. . . -- -

Jeyad. Náo , ferá a primeira. · · · -

D. T. Queres tu que fujamos? Olha, que ef


.tou com minhas tentações de te fazer dona
da milha cafa, . . . . -

sevad. Diga-me defas, que goto difo.


D. T. Sevadilha , não percas efta fortuna.
4evad. Quem he, a fortuna ? -

D. T. Sou eu, que te quero.


Sevad. Se he fortuna, ferá incontante. ... }
JD. T. Ai que a moça me falla por
Es, di(creta.
ⓥivoco !
Seved. Ora va-ſe com a fortuna.
Sahe Simicupio com a caixa ás cofias.
Simie. Quem toma conta dete arcaz ?
ID. T. Quem a manda ? . . . . -

Simic. Huma mulher, já de dias grandes, por


que era batantemente velha.
D. T. A mim me melem feito não he já al
guma preparação para o cafamento.
simic. Voff mercê parece que advinha , pois pa
ra cafamento he, fegundo ouvi dizer a hum
terceiro. . . . tº .
ID. T. Sabes o que virá ahi dentro º
Simic. Cuido que he hum vetido.
D. T. E que tal ? .. .
„Simtc. 鬣 ခ္ရင္ဆိုႏိုင္ရ , bordado , com huns ví
, tha.
vos branços » e de cores• táo,
faltando." • ,
vivas. 9
ao vivas, 弊
eftão
.... e AMangerona.•… 2O3:
}D. T. He de mulher, ou de homem ?" ..."
Simic. Tudo o que aqui vem he para mulher
D. T. Cuidei que era para mim... * * *
Sevad.. Aquelle he Simicupio; ele que carrega
a caixa , não he fem caufa. á þart.
.Simic. Sevadílha lá me eftá deitando huns olhos,
que fe vão os meus traz delles. . … á part.
ID. T. Já te pagárão ? .. …
.Simic. Não Senhor; mas eu efperarei pela velha.
D. T. Pois, Savadilha, em que ficamos ? Ajuf
temos o negocio ?, … . . :
Sevad. He boa efta, ouvindo-me Simicupio !
tº á parte.
D. T. Olha, Sevadilha, eu te quero tanto, que
fecharei os olhos a tudo, fó por cafar comtigo.
*Simic. Tome-felá, o que etavão ajuftando os
dous! Eu lho efiorvafei. á part.
ID. T. Que dizes, rapariga? " "
Simic. Ah Senhor, pague-me o carreto da caixa.
D. T. Efpera, que logo vem a velha.
*Simic. Sim, pois a moça logo vai. á part.
D. T. Tu ainda és menina, não fabes o que
té COnVcm.
.Sevad. Eu não neceffito de tutores.
D. T. Olha, que eu fou Morgado na minha
terra , e terás tantos, e quantos.
Simic. Senhor, pague-me o carreto da caixa»
que não pofio efperar. * .
D. T. Logo, efpera: ora,Sevadilhaiffo ha de fer ,
dá-me “hum abraço. º'... . . .
Simic. Venha o carreto da caixa; he boa efia?
&evad. He * têIII]2-,
- *. D. T.
. . ºw
104. Guerras, do Alecrim ;
D. T. Pois dá-me ao menos efe r:malmequer por s"
. .. . . . .. . .. .
a prenda atua. ' n a - -

Simic. Ora venha já efe carreto, fenão: tudo


trvai cos diabos.. :) ,e º … .. . . *- -
D. T. Efpera homem, ouve, mulher." " - .
«evad. Va-fe dahi, mal creado, aleivofo mali
º gno ; he o que me faltava! " ...
… . .º. .# .
. . ~~
-

...'. … ',
Canta sºsevadilha a feguinte
: " .. . . . . . . . . . . . -
. ::
* * * * * *--

. . . . . . : ARIA۰ . . . . . ‫مناه‬
Que hum tonto jarreta ,
: - "… Que hum. neício pateta º , º
.… Me falle em amor ,
… . Ou he… para rir, º

. . Ou para chorar.
… . .. Não cuide em amores,
se Que nees ardores,
Se póde fregir , ' . . . * . -
Se póde abrazar. - ' … Xai-fe.
Simic. Regalou-me eta Aria: vou dizer a Se
vadilha , diga a Dona Cloris que alli, etá
meu amo, e finjo que me vou. Senhor, adeos:
eu virei n'outra occafião. ... Wai-ſe.
Sahe D. Lanferote com hum cºfiçal, e vela ace
za, e a porá em cima da caixa , donde
ao depois fe affentaráõ.….…
D. L. sobr: o, º, # #e hum hof.
, P*de , paffados os tres dias logo fede , como
cavallo morto; ifto não he dizer que fedeis,
masºvos afirmo, que me não cheira bem ef.
fa G irrefolução, vendo que indecifo 蠶
» à .'.' . - - 2.
•. e Mangerona, . 2oş
da não elegetes qual vofas primas ha de fer
voſſa conſorte.
D. T. Senhor, as perfeições de cada huma são
táo peregrinas , que vācilla a vontade! naºelei
ção dos fujeitos; pois quando me vejo entre
Cloris, e Nize, me parece que efiou entre
Scylla , e Caribdis.* £ ' ' * * ** * *
D. L. Pois, Sobrinho, refolver, refolve logo,e já.
D. T. Pois Senhor, fe a hum enforcado fe dão
tres dias , eu qúe no cazar noto a meftha
… propriedade, pois bem fe enforca quem mal
fecafa, peço tres dias tambem para me refolver.
D. L. Tres dias peremprorios concedo ; e para -

que não hajão duvidas no dote, aflentai-vos,


X e fabereis o que haveis de levár. ಟ್ಗೊಳ್ಲ!
D. T. Ifo he fanto e bom, para que não feia
a noiva de contado, e o dote de ိုီရိိို
D. L. Eu, meu fobrinho, fuppofto tenha corri
do muito mundo, com tudo me acho alcançado,
ID. T. Ifo he bonito .. :) :) : ).
D. L. Primeiramente cada huma de minhas fº
brinha tem muito boa limpeza.…" -> *
D. T. Sim Senhor, são muito afeadas, nifo
não ha duvida. " .…… … . . … **
D. L. Além difo: etailattento, meu fobrinho,
e não deis falabancos com a caixa, que ifo He
manha de beftas. ' ' - ''rai Bole' a caixa.
P.T. Eu etou com os cinco fentidos bem quietos.
D. L. Como digo, fabereis , que todo o meu
... cabedal anda fobre as ondas do mar. Náo éỄ
tareis quieto ? : : :: : Bole a caixà.
D. T. Não fou eu por vida minha. ρή k~

» .‫من‬
zල6 Guerras do Alerin s
2D. L. Não vedes, a caixa a faltár? … …
D. T. He verdade; ferá de contente. -

, , -- Cabe a caixa com es dous.


D. L. Ito agora he mais comprido.
JD. T. E ifto he mais etirado. - -

D. L. Ai, quem me acode com huma luz!


«Sabem Dona Cloris, Dona Nize, Fagundes, e
* * ** Sevadilha com luz.
T*
Todos. Que fuccedeo ? * * * * * -

D. T., Q maior cafo que virão as idades.


D. L. Eu, que na maioridade vi o maior cafo.
D. Niz. Pois 體 foi,? -

D. Clor. Que fuccedeo, Senhores ? " … "


.Sevad. 3ས་ཨཱ་ he, 紫丘 * Qu he ifto ? -

Fag. Que foi? Que fuccedeo ? Que he ifto ?


¿D. L, .Efta arca. •. . . . . . . . .
JD. T.Que em torcicolos. . . .
JD. L. Que, em bamboleios.
L. T. Com pulos. **

I). L. Com ſaltos. * . .

JB.T. Deitou-me no chão. -


D. L. No chão, me eftendeo.
D. Miz. He raro cafo ! -

D. Clor. He cafo raro! .


Sevad. He, não has duvida: ai que ella torna
a bolir ! Fujamos, Senhores.
Fag. Valha-te o diabo, D. Fuas, que tão in
quieto és ? … ; : á parte. ”
D. L. Efta caixa tem algum encanto, abramo-la,
P. 7: Diz bem; abra-fe a caixa. __
JD. Niz. Ai de mim, que ferá de D. Fuas! :4P,
- D. Clors
e AMangerona.' …! 207
P. Clor. Que ferá de D. Gil!". á part.
JD. T. Vá o tampo dentro. * -
Sevad. Tenhão mão, que póde vir dentro al
gum diamante , que nos mate aqui a todos.
Fag. Ai ſanto breve da marca ! .
D. Niz. Senhor, fe fe abre a caixa, defmaia
mos todos aqui. - '.
D. L. Vamo-nos, que a prudencia he melhor
que o valor. - . . . Pai-ſt.
D. T. Pois fó não quero fer valente. " "
- Pai fe , e leva a luz.
3evad. Ai, Não feique pés me hão de levar!
Ande, Senhora. ** . . . . .
D. Clor. Fazes bem em disfarçar até ao depois.
- - - Vaife.
Fag. A caixa parece que tocou a recolher.
D. Niz. E não foi o peior o ficarmos ás ef>
curas, que afim teráó todos medo de vir aqui:
ora abre a caixa, e dize a D. Fuas que faia.
Fag. Ai, a caixa eftá aberta! Seria com os fa
labancos: faia, meu Senhor, e perdoe o def
commodo. -

Abre a caixa, e fabe D. Gil.


D. G. Q” tu nocturna deidade, que no caligi
nofo bofque deftas fombras brilhas carbuncú- .
lo da formofura, aqui tens fegunda vez no
theatro de tua belleza reprefentante a minha
confiancia na Tragicomedia de meu amor.
* Fag. Senhora, quem ás efcuras he tão difcreto,
que fará ás claras * · · ···· -

D. Niz. Já vou acreditando, meu bem as tuas


finezas; Porém.... 3. -

- - 4
208 Guerras do Alecrim ,
.…,\; … Sabe D. Fuas da caixa. O ***";
JD. F. Porém o teu º engano, falfa, inimiga,
-- fegunda vez fe repete para meu defengano,
- e tua affronta. : -** . . .

D. Niz. Que he ifto, Fagundes? Que tra


•3 moias sáo. cítas ? ... * - : ". . .. . ...
Fag. Eu etou beta, pois fó a D. Fuas meti
*na**caixa !:..:::* r..… : " , , .…. v Qy
JD. Niz. Pois como ha aqui outro fóra D. Fuas ?
Pag. Eu não fei, em minha confciencia, que
.…não he má. __ .*. * .
D. F. Senhora D. Nize, para que são efies fin
gimentos ? Peleije agora com Fagundes, para
fe motrar innocente. - , , , , , , , ,,
D. G. Efta he Dona Nize; eu me recolho ao
vetuario, até que venha Dona Gloris. … .
-> e . Meteºfe D. Gil na caixa. ; , , , ,
JD. Niz. Já diffe, Senhor D. Fuas, que a mi
.sinha sontancia vive iíenta defas calumnias.
D. F. A que d'ElRei, Senhora, quereis.… que
… dê com a cabeça por efas paredes? He pof
fivel que ainda intentais negar. o que táo
repetidas vezes tenho experimentado ?
JD. Niz. Senhor, he pouca fortuna de minha
…firmeza, encontrar fempre com accidentes de
e falfidade. , , ,, , - - - - -

Fag. Senhor D. Fuas, não cuide vofa mercê


que fomos cá nenhumas mulheres de cacara
cá; mas alli, vem gente. - . . ..
D. Niz. Recolha-fe outra vez, que eu em tanto
# aqui, me retiro. Andal, Fagundes. Kai-fé.

Fag.
*.
Senhor, nós já tornamos..… ... ... * 蠶 e - e.
… ... " e Mangeron4. ** . 2o9 .
2D. F. Mais á minha confervação, que ao teu
refpeito, obedeço. " " . . . - -

Efronde-fe D. Fuas na caixa, e fahe D. Cloris.


ID: Clor, Que fe expozefIe D. Gil ao perigo
de vir em huma caixa a meu refpeiro! Ora
o certo 'he que não ha mais extremofo aman
te; porém os fumos de Alecrim tem a mef
má virtude, que o incenfo nos pombos, que
* os faz tornar ao pombal. Mas adonde eftará
aqui a caixa ? Efta fupponho que he. Já meu
bem pódes fahir fem futo.
Sabe D. Fuas da caixa.
D. F. Sim, tyranna, pois já me náo afutão
as tuas falfidades." - . . .

D. Clor. Que falfidades? Que dizes? Enlouque


cete, ou ignoras com quem fallas?
JD. F. Comtigo fallo , que com outro amante duas
vezes infiel te encontrou a minha infilicidade.
JD. Clor. Cuido que não são tantos os encon * * * > --
tros que temos tido. . " ... •

D. G. Aquella voz he de D. Clotis eftou ar


dendo com zelos ! á part.
ID. F. Já etou defenganado da tua falfidade.
Já fei que ef'outro amante, que vive encer
rado nefa caixa , he o que fó merece os teus
agrados. - -

ID. G. E como que o merece, pois fó ele he º


digno defe favor ; e a quem o impedir, lhe
meterei eta efpada até as guarnições...ººº
ID. F. Vês, ingrata, fehe certa a minha fufpeita ? -
ZD. Clor. Eu etou confufa, e não fei a quem º
fatisfaça ! . . . . . .. . . . . . . . -

Tont. II, O 1). G.


210 Guerras do Alecrim,
ID, G. Ainda continúa , infolente?, Náo fabe
que eta Dama he coufa minha ? ", ; "
¿D. F, Jā ag9ra.pgt capricho, a pezar das -

aleivofias heide dar a vida por, mi dama.


. Clor. Senhores, que defgraça!…, ...
D. G. Se náo. cftivera ás elcuias , tu fcrias o
alvo de minhas iras. . . . . .. ...,
I). F. Pois fe náo fora á cfcuridade, eu tc'f
zera ver o meu brio; mas ainda afim, eu
vou dando, dê donde der. . .
D. Clor. Senhores, dem de manfo, não os ou
ça meu tio... , , , , , ,,
º :: - ‫۔‬
‫'ن‬ .
'' ‫ ( ﻧے‬---- . • - - -

Cantão D. Fuas, f). Gil, e Dona Cloris a


,, ,,- ,, - feguinte . º

D.، G. . Se л к і л л 3.
- não fora por não fei que,
: Y → ,. .k.

__ . Te matára, mefmo aqui. , -

I). F. Se não fora o velho alli,


, Te fizera hum não fei que. , º,
D. Clor. De manfinho, pouca bulha, , ,
, , Calte gralha, calte grulha, , , ·
__.Porque o velho ha de acordar…
D. G., …Pois aqui mui manfamente , ,
* , , **** - ម្ហ efte '' , - . .

ID. F. … Tambem, eu pela, callada, , , , …


I).
eça
Clor... De , vaġar, ná9. deni de rijo, , , ,
,
.., … Porque o velho ha de acordar. . .
º4º- A Quem pudera em tanta luta ... , .
Sua dôr defabafar ! _
… v (v, . .” D. F.
• e AMangerona..… C 2 11(
ZD.F.D.G. Se não grito nete cafo, " |
- Sou capaz de rebentar." -

D. Clor. Mais que eftalem, e arrebentem, …


Não fé ha de aqui falar. * *
Todos." Não fe póde ifto aturar! Vão-fe. -
* ”。; ・ - ?' ・ ''
Sabe Sinnicupio pela mão de Sevadilha.
Simic. Donde me levas, Sevadilha?
Sevad. Ande, náo me faça perguntas.
*Simic. Não ha huma candeia neta cafa que feme
meta na máo', que citou morrendo pór te ver ?
Sevad. Melhor fineza "he amar por fé. * *
Simic. Como, fez eu não dou fé de ti?
Sevad. Ande , que o amor.fe pititaºcego.
simic. Muito vai do vivo ao pintado." -
«Sevad. Afim etamos mais à nofa vontade."
Simic. Andar, fupponho que tenho o meu amor
na ¡Noroega : más!ainda aflim ifto de eftar ás
efcuras , náo he grande coufa para hum ho
mem dizer á fua Dama quatro hiperboles,
- pois ºfe… não vejo, como podereiº dizer-te,
que és eftatua de alabaftro fobre plintos de ja[
pe , neve vivente , e raciona!'forvete , mas:
fó carapinhada , pois negra te confidero nefta
Ethiopia: oh negregada occafão, em que por
falta de huma candeia não fahe á luz a tua
-formoſura ! : :, :) :) :
Sevad., Pois o fogo de teu amor "não bata pa
ra allumiar eta cafa ? . . .".
Simic. Se a luz excetiva faz cegar. támbem a -
minha chamma por excefliva não allumia ; mas
com tudo ito n ão nos metamos no elctrºsº
•º. - O ii - fal
*

21 2 - Guerras, do Alecrim ,
fallemos claro: como etamos nós daquillo,
que chamamos amor?
Sevad. E como etamos nós do malmequer,
que efe he o ponto ? -

simic. Cada vez etá mais viçofo com a copio


fa inundação de meu pranto.
3evad. E teu amo com : o "Alecrim ?
Simic. Ifo são contos largos, o homem anda
doido ; , tudo, quanto vê lhe parece que he
Alecrim; eft'outro dia eftava teimofo, em que
havia de cear fellada de Alecrim, mais que
o levaffe o diabo. Olha, para contar-te as
loucuras que faz, affentemo-nos, que ito fe
não pode levar de pé.
24/entafe Simicupio na caixa, que eftará com
o tampo levantado, e cabe dentro da cai
xa , que fe fechará com a dita queda...
Simic. Mas ai Sevadilha, que cahi n’um poço
fem fundo ! ! - - -
- -
*

Sevad. Aonde, eflás, Simicupio ? -

Simic. Não fei aonde eftou; fó fei que etou aqui.


Sevad. Aonde he aqui? º
- -

.Simic. He aqui.….
.Sevad. Aqui, aonde ? .. "

.Simic. He boa pergunta! Eu fei cá donde são


os aquis na cafa alheia? Sei que efiou aqui
n'um tole, como criança que nafce implica
da , mas fem ventura. - . .. ..
Sevad. Pois fahe dahi, e anda para aqui. ;
Simic. Ifo he… fc eu foubera hir daqui para ahi.
4evad. Quem te impede ? - -

Simit, Eltou cntupido, , ,, , , , , …


".. ‫هل‬es
- 'e*?Mangerom4.**y 21 ;
.fevdd.. Dá dous iefpirros. … . . . . . ” . *

Simic. Falta-me a Sevadilha, que a não acho,


: por mais que ando ao cheiro della. Ora filha,
z tira-me daqui, tu náo ouves ? "
-Sevad. Eu bem ouço; porém não vejo aonde etás.
Simic. Bufca-me fóra de mim, porque não ef
tou dentro em mim metido neta fepultura,
donde fó campa por infeliz aminha defventura.
A evad. Calte Simicupio, º que "ahi vem gente
com luzes; adeos até logo. *.*… , Vai-fe.
Simic. Eftou º no mais apertado lance , que nin
guem fe vio ! - º

sabem D. Lanferote cont huma luz, e D.


- Tiburcio., --

#5.7. Apuremos efte encanto. Sobrinho, nós


havemos ver o que fe encerra neta caixa,
E ainda que o cabello fe arripie. A >
D. T. Se for coufa deta vida, ficará fem ella,
emundo.
fe for da outra , a mandarei paraº, o outro
x - - - - - - -

JB. L. Pois fobrinho, abriefla caixa com intre


pido valor. . - .

D. T. Abra voffa mercê, que he mais velho,


e em tudo tem o primeiro lugar. -

D. L. Deixai cumprimentos, que a occafião não


he para ceremonias. º, *

JD. T. Por nenhum modo: não tem que fe can


çar, que lhe não quero tirar a gloria deta.
> empreza. s . - ? *: , . ** -

JD, L. O magano contralogrou-me; pois eu con


a feffo que eftou tremendo de medo... , á part.
** . T.
214 Guerras do xterrim
ID. T. Queria arrumar-me oºgigante ? He hem.
, efperto.'' · ~·· . . . ' · ŝ · · á parte..
D.L. Ora pois, heide ir eu, ou haveis de ir vós?
D. T. Vá, não haja comprimentos, que eu fou
, de cafa, · cº, o, ് : " .':്.
D. L. Não ha mais remedio que irieu em,
, corpor e alma, a ver eta alma fem, corpo,
ou ete corporfem alma. Deos, vá comigo,
Anjo da minha guarda, e todo o Flos San-,
. &torúm me defenda...;... , , , , , , , , ,,
P.T. Ande tio, não tenha medo que eu etou aqui.
D. L. Pois fe não fora ifo, já eu deitava a correr.
- ... * - ‫ هم‬- º á part.“
simic. Ai! que fem duvida efoilha caixa, em
que trouxe a D. Gil, e fegundo o que aqui
ouço dizer, me intentáo reconhecer: eu lhes
, tocarei La caixa. . .* * *, voy ( .. .
Chega-fe D. Lanferete á caixa , e tanto que a
'. , deita Simicupio, º cabeça de fora,.…?
: e dá huma/opro na véla. ; , ,
ID. L. O' tu quem quer que és, que efiás nef
ta caixa... mastiai, que me apagárão a véla
com hum aſſopro ! . . . . . .
I).T. Aſſopro ! ! *:: , " … . . . . . . .. . .
Simic. Mui fraca era aquela luz, pois de hum
affopro: a derribei, z. º .
D. L. Sobrinho, vós etais ahí ? -t,
D.T. Como fe nào eftivera. ... . . . . .. .
Ib. L. Quem feria oo cruel,. que'táo aleivofa
mente matou huma innocente luz a afopros
-frios ? : . . . : rri ra , t- .*, * r ** * Y \ . .

JimirDo
tu
sh Perdoe, que era huma luz a
* * * * . - toe
e Mangerona. 21;
todas as luzes boa; mas eu quero Çafar-me
da lui, e temo marrar denarizes com alguem ;
ni༡༤:ཤཱ་༔ remedio ? * . - -

D. L. Agora vos chegais para mim, cobarde


-ºfobrinho? Hide , que por voffa culpa não aca
bei de deſencantareſte encanro. *

P. T. Veja vofa "mercê como chama cobarde ?


D. L. Calai-vos,
-*quem ſois. ' . abobora, que degenerais de
- t -

AÐ. T. A mim abobora ? " -

.Simic. Agora he boa occafiáo de hirme; porqu


- ainda quê encontre com algum, cuidaráó que
- são murros: lá vai o primeiro. Dá.
D. L. O' mal enfinado, pondes mãos violentas
' -iernº voßío *tió-?” “` ***

Simic. Eu abrirei caminho deta forte, dando a


troxe' moxe. ' ' ' ' · · · · · Dá.
D. T. He boa efa, Senhor tio, afim fe dá
n'um barbado ? " .
D. E. Calai-vos, maganão, que não haveis de
"cafar: mas ai, que me détes huma bofeta
da com a mão 'aberta ! A que d'ElRei fobre
efte magano de meu fobrinho! Kaiſe.
D. T. A que d'ElRei fobre efte caduco de meu
' tio ! - ` ` * * * * Vai fe.
Simic.
- **
A* * que" d'ElRei que já me deixárão! Fai-fé.
. . .. . . ..
-

-
-
-
º,

*...* , ; - -* *

SCE
3.16. - Guerras, do Alecrim , .
s & E N A III. I, '
Camera. Sabem D. Gil , e 2 wize: º
JD. G. S㺠Dona Nize , fe acafor em vof
fa piedade póde achar amparo hum
defgraçado, peço-vos que me oculteis; pois
já a rubicunda Aurora em rifonhas vozes nos
avifa da chegada do Sol, aflim a vofla Man
gerona fe veja coroada de louro no Capi-,
tolio do amor. * , 4- , —: ~ r k ye º s º …ʻ.v° ü.
JD Niz Já o Alecrim pede favores á Mangerona ?
JD. G. Se D9na, Cloris náo apparece, que que
reis que faça ? . . .. ..
JD. Niz. Pois cícondei-vos nefa alcova, em quan
to a vou chamar..., # * ,

Efronde-fe D. Gil, e fahe D. Fuas.


D. F. Aonde vás, tyranna ? Procuras acafo o teus
amante ? Oh murcha ſeia a tua Mangerona,
que como planta venenofame tem morto. .
ID. Niz. Homem do demonio ou quem quer
que és , que em negra hora ,te vi , e amei ,
que defconfianças são efas? Que amante, he
efe , com quem me andas aqui apurando a:
__paciencia, e fem que, nem para que , def
"compondo a minha. Mangerona ? - . .
ID. F. Pois quem era aquelle, que fihio da cai
» xa a dizer-te mil colloquios P
JD. Niz. Que fei eu quem era; falvo fofle. ...
Mas retira-te que ahi vem gente.
D. F. E.fconderine-hei aonde for. .
2 <r e/der-fe onde efá D. Gil. -
- - JD, Niz.
- we Mangeront. D z17
XD. Niz. Não te efcondas ahi, Ai de mim, que
fe D., Fuas vê a D. Gil, fará o feu cinme
verdadeiro ! … ist … oig- f á part.
JD. F. Não queres, que me e{conda ahi 2 Ago
__ra, Por ifo me{mo..." e "…, aº e à
JD. - Niz. Tem mäo , adverte.,.,… -, n - -- w.f
JD. F. Qual advertc? Tens ahi acafo efcondido
... o teus amante ? ' ' ” . Aº … , . ….. ...,
İD.: Niz. Näo,-,D.Fuas , porque fó tu... , ,
D. F. Que he ido? Mudas de cor : # { …
D. Niz…Se a cor_he accidente, efiou para def.
maiºr, vendo a femrazão com que me iminas.
: :::: ahe D. Cloris. a a
D. Clor. Nize , que alarido he efe? Queres
que venha o tio, e ache aqui efefeftafermo :
P. Niz. São loucuras de hum zelofo fem caufº.
ID. F. São zelos de huma caufa (em loucura.
E fen㺠diga-me, Senhora D. Cloris, por vi
da do Senhor feu Alecrim, não he para ter
a zelos ver, repetidas vezes, a hum, fujeito pro
curar a D. Nize com táo repetidos extremos
' 9ue huma coufa: he vello , e óutra dizeiio 33
fuPPonho o tem agora efcondido naquela al
cova de donde me defvia para econder-me 2
IP. Clor: Ifio verei eu, que tambem, me impor
ta effa averiguação.' '!,T[ ``'`
JP Viz. Cloris não te cançes, que não has de
ver quem ahi eflá. E flou perdida ! … --á part.
P. F. He para que veja , Senhor; a razão que
tenho. Ah tyranna!", , , , , , , º, , ,
Jº Clor. Já agora por capricho bei de ver quem
ahi eflá. Vofia mercê he, Senhor D. Givaziº
. . . Cue
|

218 Guerrardos)Alearim ;,
º Que he fo? Quer enxertar o méu Alecrim
~ : còm• a:Mangeronà', de-Doña5Nize. í •'' ^'
D. G. Ha cafo femelhante !
iD. F. Falfó, traidor º amigo, como fabendo
que eu pretendo a D. Nize, te expões a em
baraçar o mcu empreğo? tit : -
D. G. E). Cloris, D. Fuas, para 蔥 “ef{es
extremos, quando a Senhora D. Nize nem a
vós vos ofende, nem a mim me correponde?
p. F. Ninguem fé efconde fem delicto?' : '\
ip Glor. Ninguettiº ſe occulta ſemi motivo. A
D. Niz. Ora…agora não quero dar "fitisfações,
nem a huma loúča, nëm a "hum temerario :
ºethe Ymuita verdade ; efcondi a D. Gil, porque
: lhe quero bem; pois que temos?" " ..." .
| Ap.1 F. ¡ Queiifio -föffta á miinhá paciencia! Ah!
...ingrata ! # ###go " " " " " " % .* *
#D. Clor. *Que ifto tolerem os meus zelos ! Ah
-- falfo amênte : · * ** * * * *
JD. G. A Senhora D. Nize eftá zombando, e
eo aquillo nella he galantaria. - *
3D. Niz. Não he fenão realidade, e tenho dito.
. . .. . . . . . . . . . . . . . Wai-ſe.
D. F. Não fe vie mais defcarado rigor! Efpéra
º cruel, e verás com os teus olhos os ultrajes,
que faço á tua Mangerona. " " … Kaife.
D.
.** Alecrim. . D.
Clor. Senhor Gil,". venha
I
deprefa o meu
. ; ;3 it': : ..",
D. G. O teu Ateerim he inſeparaveFđe meu peito. -
D. Clor. Deixemos graças, que eu não zombo.
- P.°“G, Póis éntenáêsí que “D.''Nize falla de
verás? " of ó
. -, * ---
--
-- - - I). Clor.
, ve Mangeronesas:S 219
D. Clor. Quer fallafe: de veras, quer não, ve
nha, venha o meu Alecrim. , , , ....…
D. G. De que forte queress que - te fatisfaga?
: Ignoras açafo as firmezas de meu amor : **,

* - "Ganta D. Gil å Jºguinte


: : ... ng mga rin? :o
- sa ·
:· ?·
… … . . , ^ * * *• r … - … …",
, , — Borboleta namorada, , , , ………
- Que nas luzes abrazada,; ??・9 ſ
xa ... , Quandonefpira nog incendios: i ....….?;
Solicita o mefmodarderivas za crp.
- e Tal, ó, Clori, me imagino, a .
e , º Pois parece que q definez a .
is º . Quer, por mais que tu me mates, a
: … Que appereça o teu rigor." , º riº
" " Sabem simicupio, e Sevadilha." ?
4imic. Senhor D. Gilvaz, nunca Simicupio fe
_vio em calças mais pardas. … º c * *
D. G. Porque ? , , , ,, , , , , , , , , , ,
Sevad. Porque o velho já ahi vem caminhando,
como huma centopeia.… … g. , … ;º,
D. Clor. Anda, D. Gil, para dentro até que
- haja occafião para fahircs. . . .." .
D, G, Vas a inda com efcrupulos na minha con
ftancia ? . ....-. ‫ دي‬: : -: -
D.Clor. Cá dentro apuraremos cfasfnezas. Kai [:
D. G. . O? Simicupio, vês como havemos fahir
e daqui, que bem fabes, que, tenho de cfcrever. "
hoje para o correio... … . . , Kaife.
Jimic. Tomára que o fizefcm em potas, e o,
- levafle barzabú ás vinte. "
- - - -- -
º
- *
‫ه‬ * - - * * 8
216 Guerras do Alecrín ;
Sevad. E fe lhes não dizemos que vinha ó vê
|lho, ainda fe não hião. º - -

Simie. E hia-fe, aº hiftoria fem nós fazermos


noffo papel de Alfazemas por caufa do Alecrim.
-Sevad. Não me dirás , Simicupio , , em que ha
de parar toda eta barafunda ?
Simic. Em algum cafamento, ifo já fe fabe;
tomára eu tambem que me difefles em que
havemos nós parar º
Sevad. Em correr, que fe paramos aqui, talvez
que nos envidem ioorefto. ? . ' “
simic. Não embaralhes o fentido em que te fal
lo. Ai Sevadilha , que não fó me chegafte
ao coração, mas tambem aos narizes! E af
fim não ponhas por etanque os teus favores;
antes affavel dá-me alguma . amo{trinha de tua
- inclinação. " " " ". . .
Sevad. Quem te metteo efes fumos na cabeça!
Simic. O dó que tenho de te ver tão matadora.
Sevad. Vai-te dahi ., . . que
* , gar-me a ti. tº
tenho nojo de che2.
** * * , º* .

Simic. Eu não te mereço que me defcompo


º nhas o carinho, com que te trafo. Ai Seva
dilha, que finto affar-me nos efpetos quentes de
"º reus olhos, aonde os repetidos efpirros de
| meu incendio. . . . - . .. .

Sevad... Se me differas iffo em dous dedos de pa


pel , ainda re crèra. · '.

Simie. Não fó em dous. dedos, mas em toda a


… mão da folfa, donde verás de teu Simicu
º Piº as finas claufulas de fuas fimicopadas. …
Catí
, ve Mangerona; ) 22 r
. . . . . .

- Canta Simicupio, efpirrando no fim de cada


" νεr/o, a fºguinte . . . .
‫ه‬s : ‫ﺑه‬. ੂ
Não pofo, ó Sevadi .. .. . .
Dizerte, o, que pade... . . . * ~ * *

Que o meu amor travê..... \ " , , ‘Y .


Chegando-me aos nari ..... -

N'um moto continuo me faz efpirrar. "


Mas fe he tafullaria.
Efte vicio de querer-te ,
Toda inteira hei de forver-te, º
Por mais que me veja morrer, e eftalar.
- . . . & T. ...' . ~ ~ Xai fe..
Sevad. Ora Deos o ajude com tanto efpirrar.
Sabem D. Lanferote, e D. Tíburcio. . .
P. L. Bafta fobrinho que não fotes vós, o que
me derreaſtes ? * … . . . . . . . ..
D. T. Pois acha vofa mercê que havia pôr,
as mãos violentas nas reverendas barbas de vof
fa mercê ? Igual eu me podia com mais ra
-zão, queixar de vofia mercè, que me fez em
etilhas, . . . . . . . . . . . e. . . . . -
:::

D. L. Eu, fobrinho ? Ifo he engano; eu havia


erguer a mão para vós, quando fó as devo
levantar ao Ceo para dar-lhe graças, por dar
me para huma de minhas fobrinhas hum noivo
tão gentil-homem ? . . . . . .
P. T. Não vai a dar quebranto. … ... .".
Jevad. E elle, que he mui bello. á part.
P. T., Pois fe nenhum de nós reciprocamenta
deu hum no outro, quem feria ? 15 *
22.2 Guerras do Alecrim ,
D; L. Eu também não pofio atinar; o que fei
"he ¿ que á caixa, para 'nós foi âè geefta.”
Sevad. E para o noivo, de tartaruga do Além
tejo- ... . . . . á part.
D. L. Sevadilha, anda cá, não o neguês: quem
andará neta cafa, ha hum par de noites que
finto grande reboliço"?…::: … " …
Sevad. , Senhor, eú, tenho para mim que eta
caanás efcuras he, aflombrada.
D. L. Tens vito alguma coufa ? : '#
Sevad. Ai Senhors, tenho vifto tantas coufas,
que não me atrevo a dizellas. " " "
D. L. Dize , rapariga. v . . . . . . . . .
Sevad. Só em cuidar no que vi, etou para me
defmaiar. . . . oo si Na , . .' ' ' ' ' ' '
ID. L. Era coufas do outro mundo ?ºx. ) -

Sevad. Qual do outro mundo, fe eu a vinete ?


- * * * * * *
JD. L. Era fantafma ? º, , ; * * * *

Sevad. Q que he fantama? es º sí .


D. L. He huma coufa branca que põem os olhos
'em alvo.…… # : ; , … ** # : * * ** *
Sevad. Senhor, eu não fei o que he; fei fó
mente que vi fahir de huma caixa huma
· coufar como furacáo de ventó ,º que me deu
emuita pancada. о гом и с п а
ID. L. Vedes, fobrinho? He, o mefmo que nos
"fuccede, em carne. .….. . ri f, *.*** ! -

D. T. Na carne aliás. : 1 : 7
ID. L. Aqui não ha outro tremedio mais que
-çafares logo, e já, e levares vofa mulher com-º
vofco…, que eu ponho efcritos has cafas, e º
muda-mc ás carreiras... . . … o ºs fiº º_º
• *-*. - D. T.
- \ , we Mangerona, es: 32;
Z. Τ. ITo hê. odycrdadeiro. o n};#t; らー . . …
D. L. Sevadilha, vai chamar as raparigas, que
. venhão. cá .depreffa, oia avi >;iii;r : … . . . .*}
Sevad. Genro, e fogo não os vi mais betas!
... - … .….!, ¿, ¿ß. ..!-, e á parte, e vai-fea
D. T. Para que manda vofia mercê chamar a
minhas primas tão deprefa?" - , , …,
D. L. Logo vereis. . . . . . . . . . . .
- - -- - ன்ே.ே
Cloris, e D. Wize. .. . .
Ambas. Que nos ordenas, Senhor? . * . * *
D. L. Sobrinhos, ellas ahi etáo, recolhei huma
das duas para vota efPofa… . … " " A v
D. Clor. Eu fiz, voto de fer freira, e afim não
...poffo cazar.', ' .....
.. :' );:) :) :) :
JD. L. Pois: cazς D. Nize.ºss tº: . . . "
ID. Niz. Eu pegos, quero fer donzella.,
D. L. Ifio já não póde fer, que dei a minha
palavra, que val mais que, tudo. 2.a e
D. T. Eu já me refolvêra a aturar a rifpida con
dição de Dona Nize, mas fem receber o do
te , não me recebo, , , , , , , , , , , , , ,
D. L. Andai, que fois hum, impolitico : algum
homem que tem brio fala em dote? ”.
ID. T. E algum homem, que quer dote, atten
,ta em brio 84㎝。 : 。い* m 、V. 。

Sabem D. Fuas, D. Gil, e simicupio veftidos


de mulher com mantos. . .
Simic. Senhor, eta induftria nos valha, que pa-1.
ra fahir fempre foi boa huma faia. . .
XD. G. Quem ferve a Cupido, não he muito -
que fe affemine. . . . . . . ;. . . . á part. *

: '
224. Guerras do Alecrim ;
D. F. Até nifto moftra o amorº que he cobar,
- de. ':ெ . . . . . . ...' ' á part.
D. L. Que mulheres são efas, que fahem da
: nofIa alcova o o . . . . - - -
D. Clor. Etou tremendo não fe defcubra a tra
- mola. ,--:- *' " * -* ^.^ f i á part.
Simic. Senhor D. Tiburcio, as mulheres hónra
das, como eu, (e não tratão deta forte, º
D. T. Senhora , vofla - mercè vèm enganada. .
D. L. Que helifto , fobrinho??ºº . " ' ' '
D. T. Eu o não #fei em "minha confciencia. *
D. L. Senhoras, como entrates neta cafa?"
Simic. Eftea Senhof: fobrinho-de vöfla mercê rhe
1ecia que lhe defem duas facadas, pois fem
alma, nem confciencia, depois de o intro
duzir na minha cafa, para cazar com huma
de minhas filhas, que vofia mercê aqui vê,
teve taes ardis, que enganou a ambas, e de
ambas triunfou ; e para mais penas fentir,
- eta madrugada nos mandou vieffemos a eta
cafa , que diffe era fua , e no cabo fei que
náo he, en efá para cazar com huma fobrinha
de vofla mercê. Ah traidor, ladrão, não fei co
mote não efgadanho, e te arranco e I goellas--
D. L. He notavel cafo ! Sobrinho defalmado,
que he o que fizetes? , - . . *
* - -
º

JD. T. Senhor, eu eftou tolo de ver mentir ef


- -

ra mulher !
Tº, G. Ah telfo D. Tiburcio , o Ceo me vin- .
gue de ruas talfidades. " - -

, F. Ainda nega o magano? Tal efiou que


lhe arrancára efias barbas, º "" , |
Simic,
e AMangerona. 225
Simic. Deixai, filhas, deixai, que ainda no
· Ceo ha raios, e no inferno a caldeira de fºcto
Botelho para catigo de velhacos. Vamos, me
ninas. - - Pio-ſe.
D. Clor. Já etamos livres dete futo, á part.
D. Niz. O criado val hum milhão. á part.
JD. L. Senhor (obrinho, vofa mercè a tem fei
to, como os feus narizes , bafta que voffa
mercê he ufeiro, e vifeiro a enganar moças?
D. T. Senhor, eu não conheço taes mulheres.
D. L. Se não tendes outra defculpa , effa não
me fatisfaz, e agora vejo, que por ido di
lataveís o cazar com volas primas fingindo ir
refoluções, e regateando o dote.,
D. T. Senhor, permitta Deos, que fe eu ....
ID. L. Nże jureis falfo; dizei me, e tive[tes atre
vimento de meteres mulheres em cafa, fem
artenção ao decóro de votas primas?
D. T. Primas do meu coração, eu etou para
enlouquecer, pois etau tão innocente....
D. Clor. Calle-fe, tenha juizo; bata, que com
ee feitio nos queria lograr º * **

D. Niz. He o Senhor fizudo que não appro


vava os ranchos de Alecrim , e Mangerona !
D. T. Ora bata que digº eu que não conhe
ço taes mulheres. - * ,, , ,

D. Clor. Calle-fe, tonto. " -

1). Niz. _Calle-fe , fimplez. . . "


D. Clor. Basbaque. - * - -

ID. Niz. Infolente.


Ambas. Que º Agora cazar ? Aqui para traz.
- - Pāo-ſe.
2Гот. II. - F - 1). T.
f

‫ و‬:6 Guerras do Alecrim ,


D. T. Senhor tio, deme atençãº, fenão de
fefperarei. v - --

Canta D. Lanferote a feguinte


- A R 1 A• *

Eis aqui: eu etou perdido,


Gafko feito , noiva prompta , *

Porta aberta, e cafa tonta ; -

Ah fobtinho! Mas que d།སྦྲུམ་མ་


Empre (tai-me a vofa efpada,
Que me quero degollar. ,
Oh prudencia defgraçada ,
/ Pois não faço huma falada
Por ninguem me ouvir gritar. -

D. T. Que ito a mim me fucceda ? Não ha


homem mais infeliz!
S с Ε N A IV.

Praça. sabem D. Gil, e Simicupio.


I). G. H Uma, e muitas vezes te confidero,
* . Simicupio . prodigiofo artifice ôc
meu amor, pois comhalamo,
erigindo o retorcido as ruas que
máquinas
ha de Vás
fer
throno do mais ditofo Hymento. *

Simic. Já diffe a vofia mercê, que mais 'obras,


e menos palavras: Simicupio, Senhor, já º
acha mui cantado, tomara que me apofen
tafe com meio foldo, que efte oficio de al
cofa he muí perigofo, que fuppoto tenha azas
. Para fugir, tambem as azas tem penas Pº್ಲಿ
e AMangerona. . 227
D. G. Simicupio, já o peior he paflado: acabe
mos de deitar efta não ao mar, que então
teremos enchentes. -

.Simic. E no cabo de tantas enchentes tudo nada.


D. G. Anda, não defmaies, que hoje havemos
moftrar ao Mundo os triunfos do Alecrim.
Simic. E a Mangerona todavia náo menos vi
çofa com os borrifos de Fagundes.
D. G. Mas a galantaria he, que todas as fuas
idéas redundão em nofo proveito.
Simic. Ahi he que etá a filagrana do jogo,
Fagundes a femear e nós a colher.
3'ahe Sevadilha com mantilh4.
D. G. Aquella que lá vem, não he Sevadilha ?
Simic. Pelo cheiro afim me parece.
D. G. Que novidade he effa, Sevadilha? Tu fó
Por aqui? -

Sevad. Que ha de fer? A maior defgraça do


mundo. - -

.D. G. Que? Morreo o velho ? -

Sevad. filo então feria fortuna. º


D. G. Pois que foi? . . . º
Sevad. Foi que D. Tiburdio com a pena de
fever accommertido de tres mulheres, corno
-- vofla mercè fabe ; á vifta das noivas , e se,
fogro tomou tal paixão, que lhe deu eta noite
huma colica , e eftá quafi indo-fe por hum
fio; e afim eu por huma parte, Fagundes,
e o Galego por ambas, vamos, a chamar º
Medico. Ãdeos, que me não pofo deter."
D. G. Efpera. - -- - -

' P ii Sevad.
228 Guerras do Alecrim ,
'8evad. Náo poffo, que D. Tiburcio eftá mor
rendo por inftantes.
*Simic. Não te cantes, que já o achas morto:
ande cá , tenha feição, e faça paleftra com
os amigos. -

D. G. Que faz Dona Cloris ?


2ỹevad. Náo me detenha , adeos.
Simic. Dize-me primeiro, que tal te pareci em
trages de mulher? -_. - *

Sevad. Não eltou para ifo, deixe-me hir, que


eftou depreſſa. . . . ..

...Simic. Ha tal prefa Como fe eftivere alguem


para morrer ! .
Sevad. Não vê que vou acodir a eta grande
neċeffidade. . .
Simic. Vai te , filha; vai-te, não te fofras.
Sevad. Bem puderas tu poupar-me efas pafia
, das , e hir chamar hum Medico ás carreiras.
Simic. Vai defcançada, que eu chamarei o Medico.
JD. G. Sim, com muito goto. . . -

Sevad. Ora faça-me efe favor, e adeos. Vai-fé.


D. G. Anda deprefa, vai chamar o Medico.
.Simic. Que Medico? Cuide n'outra coufa. ".
ID. G. Iño he zombaria ? Não permitta Deos,
que o homem morra por nofa omifsão. —
ASimic. Vamos, que eu, e vofia mercê have
mos fer os Medicos na enfermidade de D.
Tiburcio. a -

D. G. Efás louco? Pois nós fabemos Medicina?


Siunic. Afim como ha Filofofia natural, porque
_ não haverá narural Medicina ? ~

P. G. E fe o doente morrer por falta de r;medio ?


e AMangeroņ4. 229
Simic. Mais deprefa morrerá por muitos remedios.
D. G. E que lhe havemos applicar ?
Simic. Tudo o que não for veneno; porque o
que não mata, engorda.
I). G. Iſſo he temeridade.
.Simic. Vamos, Senhor b e Deos fobre tudo.
.5'ahe 1D. Fuas.'

D. F. Epera, traidor D. Gil.


.Simie. Ai, que ito he alguma efpera!
D. G. Oue me quereis, D. Fuas ?
D. F. Que metais a mão a efia efpada.
D. G. Para que ? … , ,
.Simic. He boa pergunta! Para que ferá ? He
para fazer alfeloa magana. , , , ,
ID. F. Vereis que fabê o meu valor cagigae
offenfas de hum amigo desleal : pois faben
do vós, que Dona Nize era o idolo da mi
nha veneração, chegaftes a profanar o meu
culto com ' os facrilegos votos de voffos fa
crificios, a quem fuavifarão os odoriferos ha
litos da Mangerona.
.Vimic.. Ahi cos diabos ! - *

D. F. E. aſſim metei a máo a eſſa eſpada, pa


ra que fe conferve Dona Nize , ou fegura no
templo de meu peito, ou no de vofo coração.
Simic. Senhor , aqui não he lugar de defafios,
vamos para Val de cavallinhos a jogar os cºuces.
ID. G. D. Fuas, etais louco ? Vede que fem.
... caufa he a voffa queixa. -

D. F. Não quero fatisfações, vamos puxando.


*

Sinjic. Efte homem vem puxado. . *

AD. G.
-
23o Guerras do Alecrim ,
D. G. Pois para que vejais que o fatisfazer-vos
náo he temer vos. . . . -

• '.$abe Fagumdes com mantilha.


F8g. Cé , ah Senhor D. Fuas , huma palavri•
nha deprefa, que importa. -

D. F. Aquella he Fagundes; que me quererá ?


Efperai, D. Gil, em quanto falo a eta mulher.
Siniº. Senhor, não confinto, ou falar, ou brigar.
D. G. Deixai mulheres, e brigai, que etou
prompto a fatisfazer vos por ete modo.
Fig. Senhor, venha já deprefa. -

Simic. Já vai, que quer aqui primeiro meter a


º efpada pelo olho a hum amigo. -

Fag. Ande fenåo vou-me. -

D. F. Efpera, que eu vou.


1D. G. Briguemos , D. Faas. - *

Simic. Vamos a iffo, antes que fe acabe a cólera.


D. F. D. Gil, fe tendes brio, efperai, que eu
venho já. Vai para Fag. -
Simic. Ora vá de feu vagar, que eta penden
cia não he de ceremonia. Senhor D. Gil, aba
, lemos com os cachimbos , que brigar com
loucos he fer mais louco. Pai-ſe.
D. G. Tomo o teu confelho. Vai fe.
Fag. Sim, Senhor, a cafa etá revolta; D. Tibur
cio nos articulos da morte, e quafismoribun
do ; o velho banzando, e tudo banzeiro; e
á vita dito póde vofa mercê introduzir fe em
cafa o mais depref, que puder, em alguma
fórma que intentar a fua induftria, e adeos. "
J). F. Cu?a cả. - -

Pag. Não pofo, que vou á botica. . . .


w JD. F.
*

-
e Magerona. 231.
D. F. Pois efa ingrata de Dona Nize ainda....
Fag. Não eftou para ouvir nada.
D. F. E{pere, tome lá effes vintens pelo trabalho.
Pag. Moftre cá deprefia.
D. F. Ora diga-me , pois Dona- Nize. . . . . .
Pag. N'outra occafião fallaremos , venha ifo
depresta. - -

D. F. Tome lá : mas diga-me, em quanto tiro


a bolſa, eſſa falſa, eſſa cruel... -

JFag. Ai » moftre cá , náo me detenha. -

D. F. Efpere, que tenho o boldrié por cima da


algibeira. - -

Fag. Pois Senhor, fe a fua bolfa etá aferro- -


lhada, a minha lingua etá ferrugenta. Vai-fe.
D. F. Muito interefeira he efta velha! Mas aon
_ de eflá D. Gil 2: D. Gil ? Foi fe o cobarde ;
mas á fé de quem fou, que as não ha de per
der comigo; e tu, ingrata Nize, hoje hirei
s verte disfarçado ; que á vifta das túas falfi
dades he juffo , que me revifta náo fó de ou
tro habito, mas tambem de outro afecto.
Canta D. Fuas a feguinte
- А в 1 А.
De hum' amigo , e de huma ingrata
Offendido, e ultrajado ? , , ** *

Quem me dera ver vingado!


Oh não fei como ainda cabe
* No meu peito tanta dor!
Mas fim cabe, porque as penas
Nos eftragos” repartidas -

clas bocas das feridas


Sahirá com mais vigor. Pai-ſe.
- SCE
232 - Guerras do Alecrim ,
-
.: .
S C E NA V. - x
Camera. Haverá huma cama, e nella efiará D.
Tiburcio deitado, afiftido de D. Lanferote, ,
* Dona Cloris, Dona Nize , e Sevadilha.
D. L., Que tarda eſte Medico!
Sevad. Não póde tardar muito ; pois me
diffe que já vinha.
D. L. Como etais agora, meu fobrinho ?
D. T. Depois que arrotei, acho-me mais aliviado.
D. Niz, Vafo máo não quebra. á pArt,
D. Clor. Se fora coufa boa não havia de efca
3 ſ. á parte.
D. L. Náo ſabeis quanto folgo com a voſſa me
|lhora, pois me etava dando cuidado o enter
ro, e me podeis agradecer a boa vontade, pois
vos feguro que havia fer luzido , vós o vericis.
D. T. Outro tanto defeje eu fazer a v. m.
Aaham D. Gil, e Simicupio vejtidos de Medico.
.Simic. Deo gratias. . - -

JD. L. Entrem, meus Senhores Doutores.


D. G. Em boa me meteo Simicupio ! Eu não
fei o que hei de dizer. á parte.
Simic. Qual de vofas mercês he aqui o doente?
D. L. He efte que aqui etá de cama.
Simic. Logo me pareceo pelos fintomas.
«Sevad. Senhora, que são Simicupio; e D. Gil.
para D. Clor.
IP. Clor. Bem os vejo : Nize, que te parece?
P. Aiz. Que faz melhor efeito o teu Alecrim,
que a minha Míangerona.
Ja
• e Mangerona. 23;
Sabem D. Fuas, e Fagundes.
Fag. Entre Senhor Doutor, aqui vem efte Se
nhor, que tambem fe entende muito bem.
, D. F, Néfte inftanté chego de fóra da terra ,
quando logo me chamou eta mulher, que
viefe ver a hum enfermo.
D. L. Já era efcufado, porém entre, e fente-fe.
D. Clor. Nize , D. Fuas compete nas finezas .
* com D. Gil. -

D. Niz. Náo me peza. - -

D. F. Aquelles sáo D. Gil , e Simicupio ; efton


ardendo ! á parte
Simic. Ah Senhor, não vês a D. Fuas tambem
D.como
G. Jágente
fei. ? para D. Gil. a * *

D. T. Ai minha barriga, que morro ! Acuda


me , Senhor Doutor. -

.Simic. Agora vou a ifo: ora diga-me,que lhe doe?


D. T. Tenho na barriga humas dores mui finas.
Simic. Logo as engroflaremos: "e tem o ventre
tumido, inchado , e pullulante? -

D. T. Alguma coufa. -

3'imic. Vofia mercê he cafada, ou folteira ?


D. T. Porque, Senhor Doutor ? *

simic. Porque os finaes são de prenbe. "


D. L. Não Senhor, que meu fobrinho he macho.
.yimic. Dianteiro , ou trazeiro ?
D. L. Ui , Senhor Doutor ! Digo que meu
ſobrinho he varáo. * -

.Simic. De aço, ou de ferro ?


D. L. He homem, não me entende ?
Simic. Ora acabe com i{{o: eis-aqui como por
234. Guerras do Alecrim , -
*

falta de informação merrem os doentes; pois


º fe eu não efpeculára ifo com miudeza, enten
w dendo que era macho, lhe applicava huns cra
, vos,. e fe fofie varão , humas limas ; e co
mo já fei que he homem, logo veremos o
que fe lhe ha de fazer. -

D. L. Eis-aqui como goto de ver os Medicos


afim epeculativos. .

Simic. Pois o mais he afneira: diga-me mais,


ceou demafiadamente a noite paffada?
D. T. Tanto, como a futura, porque defde que
efe me acabarão as chouriças, que trouxe no
alforge , me tem meu tio poto a páo , e
laranja.
D. L. Aquillo são delirios, Senhor Doutor.
3imic. Afim deve fer por força, ainda que não
queira, pois conforme ao atorifmo, Cium bar
: riga dolet , cetera membra dolet. -

D. T. Não são delírios, Senhor Doutor, que,


eu etou em meu juízo perfeito. -

Simic. Peior, pois quem diz que tem juizo,


Il2O O tem •
D. L. Senhor Doutor, o homem etá allucina
do depois que huma fantafma, que fahio de
huma caixa , o defancou 5 e fobre ifío a gran
de pena, que tem tomado de humas moças,
que aqui introduzio em cafa, enganando-as,
de cuja infolencia fe me veio aqui a mái quei
xar, que era mulher de bem, ao que parecia.
Simic. Ella he muito criada de vofia mercê.
D. T. Deixemos ifo; o cafo he que a minha
barriga não etá boa.
Si
• e /WManjerona. 235
.Simic. Cale-fe, que ainda ha de ter huma boa
.- barrigada: deite a lingua fóra.
D. T. Ei-la aqui. ~
Jimic. Deite mais, mais.
D. T. Não ha mais. -
Simic. Efia baftará : he forte linguado ! Tem
mui boa ponta de lingua ! Vejão voflas mer
cês , Senhores Doutores. " -

ID. G. A lingua he de prata.


D. F. Humida eftá baftantemente.
Simic. Venha o pulfo : eftá intermitente, lan
guido, e convulfivo: ó menina tomou as aguas?
3evad. Ainda não veio o aguadeiro. -

Simic. Pergunto fe o doente fez a mija ?


D. T. Nefta cafa náo ha ourinol.
Simic. Pois tome-as, ainda que feia n’uma fri
gideira em todo o cafo , quia per orinis optime
cognofcitur morbus. -

D. L. Ah Senhores, grande Medico!


D. Niz. E D. Fuas como etá melancolico
para D. Cloris.
JD. Clor. Eftará cuidando na receita.
Simic. Ora Scnhores , capitulemos a queixa.
Efte Fidalgo (fe he que o he, que ifto não
- pertence á Medicina) teve huma colorica pro
cedida - de paixõës internas porque o efpirito
agitado da reprefentação fantafinal, e da in
veftida feminil, retrahindo-fe o fangue, aos va
fos linfaticos , deixando exauridas as matri
zes ſanguinarias, fez huma revolução no in
tetino recto; e como a materia crafa , e vif
cofa , que havia nutrir o fucco pancreatico »
pela
z;6 Guerras do Aiecrim ,
pela fua turgencia fe achaffe detituida do vi
gor, por falta do appetite famelico , dege
nerou em liquidos : etcs pela fua virtude
acre, e mordaz vilicando , e pungindo as tuni»,
cas, e membranas do ventriculo, exaltáráo-fe
os faes fixos, e volateis por virtude do aci
do alcalino, de forte que |. com que, o Se
nhor andaffe com as calças na mão toda eta
noite : in calfis andatur, qui ventre evacua
tur, dife Galeno.
D. L. Eu não lhe entendi palavra.
D. T. Eu morro, fem faber de que.
3'inic. Conhecida a queixa, votem o remedio,
que eu, como mais antigo, votarei em ul
timo lugar. -

ID. G. Eu fou de parecer que o fangrem.


D. F. Eu que o purguem.
Simic. Senhores meus, a grande queixa, gran
de remedio ; o mais efficaz he , que tome hu
mas bichas nas meninas dos olhos , para
ue o humor faça retrocefo debaixo para
Ima.
D. T. Como he ifo de bichas nas meninas
dos olhos ?
Simic. He hum remedio topico; não fe aflufte,
que não he nada. - -

JD. T. VofIa mercê me quer cegar ?


Simic. Calle-fe ahi; quantas meninas tomão bi
chas, e mais não cégão.
D. L. Calai-vos , ſobrinho , que elle Medico
he, e bem o entende.
ID, T. Por vida de D. Tiburcio, que primeiro
- ha
e A4angeroma. 237
ha de levar o diabo ao Medico, e á receita,
que eu em tal confinta. Ergue-ſe.
Simic. Deite-fe, deite-fe: o homem eftá má
niaco , e furiofo. -

D. L. Aquietai-vos, fois alguma criança º


D. Niz. Ora Senhores Doutores , já que vofas
mercês aqui fe achão, bem he que os in
formemos, eu , e minha irmá, de varias quei
xas que padecemos.
Simic. Inda mais effa ? Ora digáo. -

D. Clor. Senhor., o nofo achaque he tão fe


melhante, que com huma fó receita fe pó
dem curar ambos os males.
D. Niz. Não ha duvida que o meu achaque
he o mefmo em carne que o de minha irmá.
Simic. Achaque em carne pertence á Cirurgia.
D. Clor. Que como dormimos ambas, fe nos
communicou o mefmo achaque; e afim, Se
nhor, padecemos humas ancias ne coração,
humas melancolias n'alma, huma inquietação
nos fentidos, huma travafura nas potencias;
e finalmente , Senhor Doutor , he tal efte
mal , que fe fente fem fe fentir; que doe
fem doer ; que abraza fem queimar ; que ale
gra entriſtecendo, e entriftece alegrando.
*Sinuic. Bafta, já fei, ifo he mal Cupidita.
JD. L. O que he mal Cupidita,que nunca tal ouvi ?
Simic. He hum mal da moda. - -

AD. Niz. Que remedio nos dão vofas mercês?


*D. F. Eu difera , que o óleo de Mangerona
era excellente remedio. -

3D. G. O verdadeiro para efa queixa são as fu


maças do Alecrim, JD. F.
338 Guerras do Alecrim
D. F. Ui Senhor Doutor, a Mangerona he hum
excellente remedio. . ^

D. G. Nada chega ao Alecrim, cujas excelentes


virtudes são tantas, que para numerallas não
acha numero o algarifmo; e não faltou quem
º difcretamente lhe chamafe planta bemdita.
D. F. Se entrarmos a efpecular virtudes, as
da Mangerona são mais que as da herva fanta.
.Simic. Daqui a polla no altar, não vai nada.
D. F. A Mangarona he planta de Venus, de
cujos ramos (e coroa Cupido , e para o mal
Cupidifta não póde haver melhor remedio.
que huma planta de Venus; pois fe notar
mos a perfeição com que a natureza a revef
tio daquelas mimofas folhinhas, para que to
do o anno ſeiio jeroglifico da immortalidade,
aquelle fuavillimo aroma, de cuja frangran
cia he hidropico o olfato, ella he a delicia
de Flora , o mimo de Abril , e a efimeralda
º no annel da primavera. - -

.Simic. He verdere ; não ha dúvida.


D. Niz. Eftou tão contente ! -- á part.
D. G. O Alecrim, Senhor , pela fua exccllen
cia he titular na republica das plantas, cujas
flores, depois de ferem bella imitação dos ce
ruleos globos , são a doçura do mundo , nos
melifluos ofculos das abelhas . . . *

Simic. Todavia a materia he de apieibus.


D. G. Ele he a coroa dos jardins, o lenço ve
getavel das lagrimas da Aurorai: nas cham
rº.as he Fenix , nas aguas Rainha ; e final
mente he o antidoto univeral de todos os ma
les ,
e AMangerona. z39
lés, e a mais fegura taboa da vida, quando º
no mar das queixas affoprád os ventós infi
cionados; e para prova dete fyftema repeti
rei traduzido em Portuguez hum Epigramma
do Proto-Medico Avicena , Poeta Arabico. '
S O N E T O. ~

Hum dia para Siques quiz amor


Huma grinalda bella fabricar , . ∞ -

E por mais que bufcou, não pôde achar


Flor do feu gofto entre tanta flor.
Deſprezou do jaſmim o ſeu candor ,
E a rofa não quiz por fe efpinhar, / .
Ao gyrafol moftrou não fe inclinar,
E ao jacyntho deixou na fua dôr.
Mas tanto que chegou Cupido a ver
Entre virentes pompas o Alecrim, * - -

Hum verde ramo pretendeo colher; --

Tu fó me, agradas, diffe, pois em fim


Por ti defprezo, fó por te querer, º
Jacyntho , gyrafol , roza , ejafmim. *
D. Clor. Viva o Senhor Doutor, eu quero as
º fumaças do Alecrim. * *

D. T. E morra o Senhor doente : ai minha


barriga ! * * * - - .

D. F. Se verfos pódem fervir de textos, efcu


te huns de hum Antegoniſta deſle Author a
"... favor da Mangerona pelos mefmos confoantes
-
.
- , , ,, - . . - *. t -

* ് - - - so
240 Guerras do Alecrim ,
S. O N E T O.
º

Para vencer as flores quiz amor


Settas de Mangerona fabricar :
Foi defcreta eleição, pois foube achar -

Quem foubefle vencer a toda a flor.


O jafmim defmafou no feu candor ,
A roza começou-fe a efpinhar , .
No gyrafol foi culto o inclinar,
Ais , o jacyntho deu de inveja , e dôr.
Entre as' yêncidas flores póde ver
Retirar-ſe fugido o Alecrim, -
. .

Quc amor para vingar-fe o quiz colher;


Canrou das flores, o triunfo, em fim,
Nem os defpojos quiz, por não querer,
Jacyntho , gyrafol , rofa , ejaímim. * f.
* *

D. Niz. Viva o Senhor Doutor, eu quero o re


mcdio da Mangerona.
D. L. Náo cuidei que a Mangerona, e Ale
crim tinhão, taes virtudes. Vejamos agora o
que diz o Senhor Doutor.
D. T. Que tenho eu com ifo ? Senhores, vof
fas mercês me vieráo curar a mim , ou ás ra
parigas ? Ai, minhas barrigas!
Siinic. Calado eftivc ouvindo a eftes Senhores
… da Efcola moderna , encarecendo a Mangero
na , e Alecrim. Não ha duvida que, pro utra
-º que parte ha mui nervofos argumentos , em
que os Doutores Alecrinifias , Te Mangsronif
tas fe fundão; e tratando Diofcorides do Man
geronifmo, e Alecrinifmo, affenta de pedra f е
-\ ^ ‫)ولمة‬
•*e A}angerona. '' 34t
· cal, “que pa#'o mial Capidífta sáo remedios
inares; porque tratando Ovidio do remedio
amoris , não achou outro mais genuino con
tra o mal Cupidita que o Malmequer, por
virtude fympatica, magnetica, diatoretica , e
diúretica, com a qual curatur amoreni, Re
petirei as palavras do mcfmo Ovidio. "
r S O N E T O. . . * *
* -

Rfa que em cacos velhos fe produz *

Mangerona miſercima fem flor, •

"Efe pobre Alecrim, que em feu ardor "",


Todo fc abraza por fahir á luz. -

Ainda que fevejão hoje a fluz. . . . . ,


Desbancar nas baralhas do amor, -

Cuído que ellas o bollo háo de repór,


_ Se não negro feja eu como hum lapuz.
O Malmequer, Senhores, ido fim , . .
* Que he flor que defengana, fem fazer º
No verde da e{perança amor fem fim. :
Deixem correr o tempo, e quem viver …..?,
-º Verá, que a Mangerona, e o Alecrim,
-
As plantas beijaráó do Malmequer. ' ' ~
- * * - --
- -: - -
-

- - - - - - - - - CŞ.
Sevad. Viva, e reviva o Senhor Doutor, e já
que he tão bom Medico, peço lhe me cure de
humas dores tão grandes, que parecem feitiços.
Simic. Dá cá as pulfeiras. Ah perra que ago
a rate agarrei Tu etás maramodica, e im
piamatica. Ah! Senhor, logo, logo, antes que
fe pcrpetue huma febre pôdre , The neceffario
· que efta rapariga tome Thuns Simicupios.. :
Тот. II. Q 36
242 Guerr4s.de.4iearim, ,
####r$iMieyP'Sá ea? He ceuſarque abomino.
Simic. F.: defencarcgoa, minh#confciencia, c
7 ao fou mais obrigado.… ….", : ; …,
D. L. Ela não rem, querer, ha de fazer o que
a voffa mercè mandar. . . . . ::--: , , , , , ,
Evg. Eu tambem fou de carne, tenho annos,
e tenho achaques. , , , ………q , , , ,,..…
Simic. Pois cure-fe primeiro dos annos, lógo
fe curará dos achaques. . -

Fag. Não, Senhor , que efte achaque não hè


annual, he, diario: " ' t , το τι..."
Simic. Se fora nocturno , não era máó.í Pois
que achaque he o feu, Senhora velha ? ;
Fag. Que ha de fer? He eta madre que me
perſegue. . . . . . .
Simic. Ui, voffe com efics annos, ainda tem
madre? E o que ferá de vclha a fenhora fua
madre ! Filha, ifo não he madre, he avó. »
Fag. Talvez que por iflo: tão rabujenta me
perfiga. E que lhe farei, Senhor Doutor ?
.Simic. Achuma madre velha, que fe lhe ha de
fazer ? Andar, ponha-lhe oculos, e muletas,
e deixe-a andar... .. …...… i z ř;
D. L. Ifto aqui he hum hofpital, graças a Deos:
*i fó , cu ncfta - cafa fou sáo: como rhum.'peros,
oi a pezar de duas fontes, e huma funda. ,
A inic. Oh dirofo homem que, vive fem males !
ID. T. Senhores, o meu mal devia fer conta
--giofo, porque depois da minha doença todos
2 adoecerão. Ai minha barriga!) .. …"
D. L. Pºis em que ficamos? … ….……… e,
simir. Senhºr meu falando em termos, ou do
.* A lºt en
- . '*e Mangerona. . . 244
« ente fangre-fe no pé; voffa mercê ná bolfa ;
· ás fenhoras fuas fobrinhas tres banhos'; 'á mo
- ga Simicopios; e a velha lancem-na''ás ondas;
- que etá danada. . ..
Pag. Ai qua galante couſa ! … v º\.
D. Clor. Eu não quero mais remedio , -que ºs
. fumos do Alecrim. . . .. . .. . . -

º
D. Niz. E eu os da Mangerona. - - -
Simic. Não feja efia a duvida, ainda que não fou
defe voto , com tudo cada hum he fenhsk
º da fua vida, e fe póde curar comº quizer ;
lá vai a receita. - . . . ‫ د‬. ٤;- •
* , e - e. ‫همادا مع‬...
, , Canta Simicupio a fºguinte , , ***
* A . .. . А в 1 A• ". . . . . ! …, : ;

Si in midicinis v , , ... ,
. .: , Te vifiramus , - - " " " ، ، ، ، ، ، ‫ماس‬

- Non aſniamus s
* --- Sed de Alecrinis, A CA
----- Et Mangeronis · · · · · · · · ·
Recipe quantum º
*Satis anâ. . . . . .
. . . .. . ; º º \
_ _ Credite mihi, . . . . . . . . . .. ;
… s Qui fum , peritus , . . :
“ Non mediouitus .
De cacaracá ,
ID. L. Efperem, Senhores, vofas mercês per
"doem, lá repartão efa ninharia entre todos,
que eu não etou aparelhado fenão para hum.
Jimic. Venha embora, que fó efte he o ver
dadeiro fimptoma da Medicina. Wai-ſe.
, Q ii Д), G.
#44. Guerras do Alecrim ,
D. G. Ai Cloris, que quando o malhe de amor,
- fó 9 morrer he remedio ! . . . . Wai-ſe.
D, F. Finjo, que me vou , por ver fe pofio apu
rar a falfidade de Dºnal Nize.. Vai fe.
D. T. Mande-me cerrar efte miombo, que vou
º entrando em hum fuor copiofo, abafem-me bem,
D. L. Aqui fervia o meu capote : paciencia !
vamo-nos , e deixemo-lo fuar, ninguem lhe
í falle á máo. Vai fe.
HA. Clor. Vainos , Nize , a moralizar os extre
; -mos deftes annantes. · - Ôai fe.
ib. Niz. Tanto me importa, vamos a regar os -

nofſos craveiros. }'ai fè.


Fag. O diabo de Simicupio temo que me met
ii cm hum chichéllo com feus árdis. Pai-fe.
Sevad. He para ver_fc o meu Malmequer tam:
bem entra em retea. Wai-ſe.
3ahe D. Fuas. -

D. F. Já todos fe forão. Quem me dera encon


trar a efta ryranna , cruel, falfa , inimiga.
Sabe Fagundes, -

Fag. D. Tíburcio fica a fuar como hum caval


lo. Mas ai ! Quem eftá aqui?
D. F. Sou eu, Senhora Fagundes, não fe afute.
Fag. Senhor, que temeridade he eta? Vofia
mercê não vê que ainda he luzque-fufque ?
Como fem deixar anoitecer penetra etas pa
T. redes, aonde , até o Sol entra ás fortadelas ?
ID. F. Não reparei, que ainda era dia ; pois no ,
.abyfmo de meu ciume fempre etou às efcu
_ras. Aonde eftá eta cruel Dona Nize?
Fag. Eftará no jardim. . . ** 。 . . ..
". - D. F.
. * e Mangeroma. 245
JD. F. Pois vamos lá, e de caminho quero me vá
- dizendo de meter-me na caixa a mim,e a D. Gil.
Pag. Vamos, que eu lhe contarei o que foi ;
ande por aqui com pés de lá. Ai Senhor D.
Fuas quanto me deve ! . . . . .. . .

sc E N A vi. "
Fifta de quintal, em que haveráõ alguns alegre:
tes, e huma capoeira, e vem D. Gil, e fí
micupio defcendo por buma corda. . . º
IX. G. S Imicupio, deixa-me defcer eu primei
\D ro, para que fe não quebre a corda
com o pezo de ambos. . 3 Defcé.
Simic. Agarre-fe bem á corda , e daixe-fe, cf.
corregar. » . . . -

D. G. Ora já cá eftou; mas eu não paro aqui,


até encontrar com Dona Cloris. … Vai-fe,
,, $ahe D. Lanferote.
D. L. Eſte quintal he o meu divertimento, e
encanto; hum homem aqui affentado, e to
, mando o frefco , náo ha maior regalo.
Simic. Agora já poderei defcer afoitamente.
D. L. Que he ifto , que cahe fobre mim ? Quem
me acode! .. . r .

Ao defcer Simicupio cahe fobre D. Lanferote.


*Simic. Não he nada, efcarranchei-me no velho
cuidando que era poial; eftou bem aviado ! á p.
D. L. Mas que vejo ? A que d'ElRei, ladrões!
3’imic. Não o diffe, eu ? . . . . . . . . ..
D. L. Ladrão, velhacão, tu defcendo por hu
* -*1f
ma corda os altos muros de meu quintal
· -
?cQ£
~346 Guerras dowxflecrim ,
:: com , effa mefma corda te atarei de pés, e
.” mãos até que amanheça para entregar-te á
jutiça. » ºft . . . . . . . * ... ." .
Simic. He bem feito, já que eu me{mo dei
a corda para me enforcar. , , ; , , , . }
7D. L. Dá 'cá os braços. -

3'imic. Já etá meu amigo? Quer-me abraçar?


D. L. Anda cá, ladrão, motra cá os Pulfos.
simic. Não tenho febre. " " * * *
D. L. Anda, que atado has de ficar. * . .
Simic. Senhor, por fua vida que me não ate;
- bata o enleio em que me vejo. : " " " .
3D. L. Dize, a que viete a ete quintal ?
<imic. Ora Senhor, ate-me muito embora, mas
-13mão-me aperte por ifo. __ . .. .. .
D. L. Por io he que eu te aperto.; has de
confefar al que viete. , , , , , ... -
3imic. Eu etou átado, não fei o que lhe ref
ponda. - '. ' ' ' á parte.
ID. L. Qual foi o fim que aqui te trouxe? :>
3'imic. A dar fim a minha vida, por dar prin
cipio á minha morte por meio, defla corda,
ue falfa me entregou nas mãos de vofa mercê
D. L. Víete "roubar-me, não che verdade ?\ .\
Simic. Sim, Senhor, mas foi a roubar-lhenas
attençóes. . * **"..."
* ( * *
2D. L. Anda, ladrão finho, para a capoeira don
de ficarâs atado. . . . . . , ºr - -
Jimic. Para onde, Senhor ? o… "… . . . .*. * i
JD. L. Para a capoeira, até que venha o Solda
fer testemanha do teu latrocinio. . . . . . .
ºimic. Pois vofia mercè quer aஆ
§s
• "è"Añangeront. "* . . 247
"º Graças a Deos que não fou cá nenhuma
º gallinha; mas fabe porque falla º porque me
acha aradó,juando não haviamos jogar as critas.
ID. L. Anda, ladrão, que aqui ficarás até amá
- nhecër. - • . - ! : - 鷲
Simíc. Ora criado Senhor Simicupio : já fabe
º mos que ifto he meio caminho andado pa
ra a forca; mas he bem feito que íto a
mim me fucceda. Que tinha eu cá com D.
Gil? Pois para que ele foffe gallo, me ve
jo, eu feito galinha, fe bem que já podia fer
"ཨཱ་༣i།བླླ་མ་ pelo
estrangalhado; o magano etará
a etas horas entre glorias, e eu entre penas;
elle voando na esféra de amor , e eu de aza
cahida na gema dos ovos. * メ

ºf Sahe Fagundes. , ºr . ‘. . .

Fag. Que mais me falta para fazer? Eu já fiz


a cama a todos; já fiz a fellada" de rabos pa
racearmos; já temperei as gaitas para o gal
lego ; já afei o fricafé; já cozi hum guar
diñapo 3 agora me falta deitar os arenquês de
molho, para ficar com as mãos lavadas. Ora
fou huma tonta, efquecia-me o melhor, que
he matar
trazia humanagalinha
a faca mão para o doente,
para ifo: . e mais t

Simic. Eu o eflava dizendo ; grande defgraça


he fer hum homem galinha pois até de huma
mulher tem medo. " . >

Fag. Mas confefo que não fou para ver fangue


que logo definaio; porém eu fecho os olhos,
e meto a faca, que alguma ficará efpichada.
Simic. Oh mulher! Dºbs te tire ifo do penfa
Júcrltº, - Fag.
a

248 Guerras do 4lecrim ,


Fag:. Qual! Eu fou muito melindrofa, e fu
zilanima ; , não tenho valor para matar huma
formiga. Ora, lá vai a Deos, e á ventura.
Simic. Sem fallencia eu morro de morte galli
nhal: não ha mais remedio quê falar, áve
lha ; mas fe lhe fallo, he capaz de acordar
o cão do velho, que etá dormindo, e en
cerrar-me em parte mais apertada: não fei o
que faça ; pois tal etou, que fe a velha me
mata, não tenho no corpo pinga de fangue
para deitar. ‫م) و‬ , , tº . . . . .

Fig. Para que he cançar en náo fou languinolenta.


- Sahe Sevadilba. . . **

Sevad. Fagundes , o Senhor etá defefperado


por vofé , que faz ahi 2 | . . .. . . .

Pag. Já que viete, matarás huma galinha, que ~

eu não me atrevo. , , ,, , Wai-ſe. ,


Simic. Lá vem a Sevadilha: ora o certo, he que
donde a galinha tem os ovos , ahi fe lhe
vão os olhos, -

4evad. Aborrece-me gente melindrofa; vejão


agora que dó póde haver de matar hum
animal? Verão como eu faço ito brincando.
Simic. Não são bons brincos effes, Sevadilha ;
mas fe tu já me tens morto , para que me
queres tornar a matar? * --
Sevad. Aí que etamos em tempo que faláo
os animaes! Ete pela voz he Simicupio. - º

Simic. Eu fou que te falo de papo; he o teu


Simicupio que eftá feito fimigallo... A ...
Sevad. ႕ႏိုင္ရ
te metteo ahi ? , Jสฯ
:

Simic. O velho, por eu fer metedifo., ...


...}. -- .
e Mangèromá. A - 249
Sevad. Pois como foi? . . … os a .….…?,
3ímic. Já me não lembra, que seu tenho me
moria de gallo. . . . .. . .
Sevad. Anda că para.föra. . . ... :
3'imic. Não pofo, fem tu me enxotares daqui.
3'evad. Como não pódes fe eu fei, que mui
to póde o gallo no feu -poleiro ? ` `
...Simic. Ifo feria fe o velho me náo de azára.
-Sevad. Não fabes o bem que me pareces nefa
capoeira! Eftás guapo! Efiás frança! … º.
<Simic. Sim, eftou frança, porquejetou feito gallo.
-Sevad. Pois dá-me das tuas penas para hum regalo.
.Simic. Pois tu te regallas com as minhas penas?
Sevad. Náo, mas folgo de verte feito alma em
. º pena... 2 : * *
.Simic.. Que fará fe fouberas que eftou... todo
coberto de penas vivas ? Ora anda, Sevadi
lha, tira me de más penas. , , ,
Cantão Simicupio, e Sevadilha a fºguinte
л к 1 л л В v о. º . . ".. º

Sevad. Meu frangainho . . .. .


Tupetudo - -

Como, he galantinho a
Que lindo , que etá!... . . .
Simic. …Minha bella -
* *** *
#2
* *
"‫ہﻤ س‬
*
‫ء ﺍلله‬
-
- * -

. . . . . Malfazeja ,
Cahi na efparella,
Liberta-me já. -
Jevad. , Coitada da pila, . . .., ',
Pila, pila, pila , . . . . . . ,
Que te háo de pilar.
350 Guerras do Alecrim , s

Simic. Acode-me, filha, º * * * **


-º a odº Que efiou ha meia hora a . s .
A cacarejar. … . . . . ;
Ambos. Que trifte cantar : .. . . .. .

... , ſº He o cacatejar: . . . . .
Sevadº. Mas não te agates, º "? …
$器 eue vou-te a ſoltar. -

Simic.ºi. Vem já, que não pofio º! .º


..fºr cº, Mais tempo penar. - •* :

Ambos. Que he pena, que he magoa,


-“ … Que huma ave de pena
º … Não pofia voar.
\ e. ! 2: . . . . . . . - - - - - - - * **

dimic. Anda, deita-me pela porta fóra, ainda


que feia aos coices. ' . Wai-ſe.
sşvad.Ora vamos. . . ' + ' "… Vai fe.
, tº : • 3ahe D. Faas. ". -

D. F. Para efte quintal ou jardim , ou o que


for, me diffe Fagundes, viera Dona, Nize a
regar a fua Mangerona ; mas em quanto ella
não vem, me e{conderei atrás dete canteiro
de Alecrim , pois da Mangerona não quero
auxilios para encobrir me dos ?rgentados ef
, plendores da Lua, que tão clara fe oftenta
eta noite, talvez avifando-me na clara inconf
tancia de feus raios a variedade de Dona-Nizé.
Efconde fe da banda do Alecrim.
Sabe D. Gil. , , , ;
D. G. Grande temeridade foi a minha, pois fem
avifar a Dona Cloris , me expuz a penetrat
os quartos deta cafa, com o perigo de me en
contrar D. Lanferote; mas fem duvida Cloris
- virá
‫لهم‬ v,
, , * ex Mangeromat.3.3 251
virá a eſte ſeu i jardimra namorar of ſeu Ale
chim 3 e aflim efcondido: nás fombras deftas
e:'plantas . . . . Mas ai que he Mangerdna ! Per
doa; Cloris, que efia acção foi hum acafo,
e não eleição... ……… , , 1-82.5*li
Efconde.fe da banda da Mangerona.
sah pönä Νίτε, ειδήμασί žáda buma
em
pela fita parte contregadores na #tão, re
· ¿gando , e cántando o figuinte .…..r.
D. Niz. Sois. no ceo de Flora,
Mangerona bella , , . . . . . . .
... rº o Náosfó verde cetrella , f , f s.
Mas luzida flor. -

ID. Clor. Alecrim florido ,· · ·


Que de Abril na esféra
:: Sois ña primavera … *. & cº.
Frågranre primor. /

Ambas. Eítă pura neve , t w- -- ----

Gue tributa Flora, "


São rifos da Aurora,
E lagrimas de amor. º, ſº
... " … fºr í … - 1 L f 7- * ! …_… "
R Е с тА D О.
D. Niz. Mas que vejo ? (Ai de mim !) Quem
ºr arrogante ; ; * ***.
, Da» Mangeronaoufarpa o fer fragante ?
D. G. o Quem, ó Nize; efcondido amante sepera
o O Sol que, adoro neta verde esféra.
. . " :‫דש זי‬:‫ט‬t " ‫ז"ל‬ .Jabe
JO. F. Pois traidor, como afim*yranhg interitas,
Roubar-m e a Nize, que meu peito adora ?
- Y. Aſahe. E.
252 Guerras do Alecrim ,
… . . . E tu falfa inimiga. Mas ai trifte,#
, "Que ma! a tanta pena a dor refifte!
3D. Ci. "E tu falto D. Gil, que em torpe infulto
Buſcas a Mangerona amante occulto,
Deixa-me , fementido. . . . . . ….…." ,
D. G. Attende, 6 Clori, i
de fem caufa fulminas teus rigores, º
*

º Quando em puros ardores | | -**| - ". . .


Nas chammas do Alecrim feliz me abrazo.
dº Niz. Sem motivo, D. Fuas, me criminas 2

porque eu firme... . . . ....”


JD. G. E eu contante... .. …" * *

#D. G. e D. Wiz. Fielte adoro, eltebufcoamante.


-
- -
* *
. .. . . . " s .. .

А к г. А "л" 4. о! ". "o" , , ,


。 リ: リ、・. s: 、「} +

D. Gil. Attende, 6 Clori, attende


Verdades de quem fabel
D. Clor.
Ser firme; em
Suſpende te adorar.
infiel, ſuſpende .………
Injurias de quem fabé2
Já mais tee acreditar. H
2D. Fwas. Ņize ingrata , infiel amigo,
Cele a barbara indecencia,
Que a evidencia ºf . . . . . .
Não fe póde equivocar. w

?. g. e D. N. Pois tu ió querida prenda, -

- F. e D. C. Já não creio os teus enganos *


JPG e D.A. Nas purezas de meu peito
* * Felizmente vivirás 2

P. Fe D. Cl. Nos rigores de men peito . . ".


- Teu catigo encontrarás. -

-
، ‫هننم ډ‬.، То
* * \
, we, Mangeroná. º. . 253
Todos. … e Mas, ó cégo amor tyranno,
Como pofo em tanto damno…
… , º cza. Teu ceftrago idolatrar ? . . . . .

" " " Sabe Fagundes. .. . .


Eag. Já acabárão de cantar? Pois agorá entrem
• *a. chorar.…{ . . . ; *.. . . . : .; ‫؛ ور؛‬.‫ و‬، ‫و‬
D. Glor. Porque, Fagundes? • * ** .

Fºg.. Porque o Senhor feu tio diz, que logo


vem ao quintal, afirmando que ha ladrões
sem cafa; e diz que fe não ha de deitar eta.
noite, ainda que faça rofa divina. ,
D. G.pAonde eftará Simicupio ? . . . . -

Fag. Nåo apparece ; Senhores, efcondáo-fe, e


: não digão ao depois que duro foi, e malfe cozeo.
D. Niz. Metão-fe neta capoeira entre tanto.
D. G. . E que remedio, já que Simicupio não
apparece ? º, . . . . . ."
D. F. A necefidade,fabe unir a quem fe deze
ja feparar. Nize cruel, eu me efcondo. na ca
¿'poeira , que fó, o lugar das penas he, o cen-.
- tro de hum amente infeliz. Meteºfe na capoeira,
D. G. Quem ferve a Cupido, ás vezes he leão,
- ás vezes galinha... º Mete-fe na capoeira.
Fag. Ah Senhores não, me efmaguem os ovos
o de huma gallinha, que abi etá de choco.
Sabem D. Tiburcio, e Sevadilha,
Sevad. Senhor, não me perfíga:. . . olhem
ybo do homem!… S。 * + .
o dia w - -

D. T, Ahi no quintal te quero. Mas aqui etá


Cloris, e Nize, remediarei o negocio. Eta mo
**, *

a
354 Guerras do Alecrim , -

ça fazl zombaria demim :: deixa-me tu caiar ,


que eu teoporeira caminho." "
D. Clor. Queilhe, iffo , Primo:?. ¿Como eftando
doente , e tão, perigofo a vem a etas horas
ao fereno ? *-* *-* ' ººº
D. T. Ques ha de fer fe, vóffésÈnáo fabém en
finar eta rapariga, pois nada lhe digo, que
não faça as avefas ? De forte, que me fez
< vetir; e, fahir atrás dellai, e como defefperado.
das perrices, que me faze : leºnitº os freº
D. Niz. Tu não queres, Sevadilha , ºfenáo fer
defcortez a men Primo ? * . :::: - , "tir.“
Fag. Vofas mercês não querem - crerá que fê
º ha de fazer deta moça apete, fome |ိ
Sevad. Para que eftamos comarcas encoiradas ?
O Senhor D. Tiborcio anda-me ao fucarió, e
- náo me deixa ,hama horã, nºm'itiftatite.o ,º ,
D. T. Calte , mentirofa. - : ºº is
Fagºt, Iffo tem ellai, que fevantai.hum tetemu
- nho, como quem levanta huma palha- . . .
JD. Clor. Não nos importal effa averiguação; fó
.: digo, Senhor D. Tiburcio, que parecé mui
to mal eftar voffa mercè aqui cbmnoſco a ef.
…tas horas, e que póde vir meu Tio, e achar
, º nos com vofa mercè , que fuppofto feia ·pri
mo, e com tentagóes de Enoivo, ſempre o
recato, e decencia fe deve confervar;, e afim
lhe pedimos em córtezia fe vá para o feu quarto.
Sevadº Ande, vá defpejando o beco.…" …, …
D. T. Nem eu quizera que meu Tio me achaf
fe aqui por nenhum modo. Mas coitado de
*"}"
vifle.
que ele lá vem º Tomâra que me Se
não
.*,
, • e AMAngeron4.s• y 255
Sevad. Pois efconda-fe, nefa capoeira.* # : ;
- D. T. Dizes bem... , … :ores ao r. tº . . . "

I), Clor. Efiás louca, Sevadilha ? Meu Primo


ha-de-fe dá metter n’uma capoeira ? Ifo não.
ID. T. Não importa, que para confervar o feu
recato me metterei na parte mais, immanda. %
* † : . . … …; … Entra inacapoeira.
ZD. Niz. Eftamos perdidas, que lá, ferencontra
, com os dous ! Que ,fizefte , maldita ? · · · ·
-Sevad. Eu bem fei o que fiz: verão que peça
, lhe prego. …no . " : : : : : :
D. G. Efe deve fer Simicupio. Esto, Simicupio ?
JD.T. Qual Simicupio ? Sou huma.Simibalapa
ra elle: quem etá aqui? O Sevadilha, abre
me a portar, que eu quero fahir, corra a agua
por onde correr, , - , , , ,
Sevad. Calle-fe, que ahi vem o velho. …i…
D. F. Que tal me fucceda! º ºr
D. G. Eitou tremendo!… … : " . . .”
D. Niz. e D. Clor. Eftamos, perdidg8!, …. 35
Sabem. D. Lanferote com huma duz, na mão, º
Simicupio vetido de Mimitro com vara :
- ... . та тйо.p * , ; *" -
Simic. Não fe afuftem, minhas Senhoras, que
ifto não he mais que huma diligencia..…"?
3D. L. Vofa mercè poupou-me" o trabalho de o
hir procurar de manhã para lhe entrégarhum
_ladrão que tenho prezo naquella capoeira. .
Simic. A ifo me{mo venho, que já tive quem
diffo me avifaffe. -- - -

ZD. Niz...Que ferá ifto? … : … ! . A parte,


¿D. Clor. Sáo infortuniosemcus. · … á parte.
. . . . Pag
256 Guerras” do Alecrim , -

Pag. Déomes.com ó pé na peia. X * " á parte.


Sevad. Folgo por D. Tiburcio. á :
4im'c. Hoje todos hão de mamar o chafco, que -

a ninguem me hei de dar a conhecer. Ora,


1. meu Senhor» como foi efte cafo? * : *
D. L. Supponharvoffa mercè, que acabada hu
… majunta de Medicos, que vierão afiftir a meu
, fobrinho, #fendo já quafi noite, etando seu
affentado junto daquella Mangerona, que máo
e me deixará mentir, veio defcendo hum ho
mem por huma corda; e cuidando que eu era
; cpoial me poz" o "pé no; cachaço. … .
Simic...Iffó º foi, o mefimo , que por o pé no pef
- coço: não ha maior defaforo! … º , º
D. L. Afutei me, não ha duvida, quando me
vi daquella forte opprimido; mas tornando a
mim , fui fobre elle , e conhecendo que era
ladráo, o prendi nefa capoeira; donde a pre
picaz diligencia de vofa mercê faberá melhor
0brar do que eu fallar... … * *, .. .
*Simir.… E como conheceo vofla mercê que era
ladrāo ?:, , , , * . tº
D. L. Pela cara, que era a mais horrenda que
: "meus olhos virão. . - **

Simic. Etou já defenganado, que fou feio, á p.


¿D. L., Ande vofa mercè , e verá.: , , . .

A'imic.. Ah fô ladráo , faia cá para fóra. ·


D. F. Vofia mercê vem enganado, porque eu
(Sabe ).ha maior defgraça ! fou hum homem
bem nafcido. . . . . .*
*Simic. He D. Fuas; quem me dera ver a D. Gil,
… quc he o que cá fine traz... … á parte.
D. L.
e AMangerom4. 257
P. L. Senhor, efte não he o ladrão, que eu
encerrei.
.Simic. Já fe vê, que efte não he tão feio, co
nao vofa mercê diz; vejamos fe etá lá mais
algum ? Oh cá efá mais outro; venite ad cam
para foram. Ai, que he D. Gil! Já eftou def
cançado. á parte.
ID. L. Tambem não he ete o ladrão, que eu
aquí encerre1.
ID. G. Claro etá, que não fou eu, pois eu, gra
ças a Deos, não neceflito de furtar. -

D. L. E que fazião vofas mercês aqui, fe não


erão ladrões ?
Sinnic. Effa inquirição me pertence a mim , que
fou juiz privativo deta caufa; e vofa mercê,
meu amo, não fe coftume a mentir aos Mi
nitros de vara groa, dizendo-me , que o
ladrão era feio, e horrendo, quando vemos,
que eftes Senhores são mui bem etreados.
ID. L. Senhor Juiz, por vida minha , que era
o mais feio homem, que vi em meus dias.
.Simic, Calle-fe, não minta, que o hei de man
dar carregar de ferros. -

D. L. Ora, Senhor, torne vofia mercê a ver a


- capoeira , que affim como achou dous , que
eu não metti, talvez que ache o que eu encerrei.
.Simic. Já não tenho mais que bufcar:
D.ainda
L. Faça-me efe goto , que póde lá etar
mais algum. , , t →

4evad. Iffo que fe perde? Veja, Senhor Doutor.


Simic. Bem fei que vou debalde, mas eu vou:
mas não , entre vofa mercê , que me não
- Tom. II. R. - que
(
258 Guerrar do Alecrim ,
quero encher de piolhos; ande, que lhe dou
patente de quadrilheiro. -

D. L. Eu vou, que quero agora apurar efte eni


gma. Ai que elle aqui eftá! Não o diffe eu ?
.Simic.. Traga-o cá para fóra. s

D. L. Eilo aqui. Mas que vejo! Não fois vós,


. meu fobrinho ? - -

D, T. Eu fou por meus peccados.


D. L. Eu eftou beta em befta.
Simic. E te fim , que he o ladrão, que tem
horrendiífima cara ; todos tres venhão Comigo.
ID. Niz. Ai D. Fuas , que eftou fem alma ! á p.
ID. Clor. Ai D. Gil, que etou fem vida!
D. L. Senhor, advirta que efte he meu fobrinho.
Simic. Por fer feu fobrinho, não póde fer ladrão ?
D. L. Senhor, ele mal podia defcer pela cor
da , pois eftava doente de cama.
.Simic. Pois acafo elle dorme na capoeira ?
D. L. Náo Senhor. – ".

Jimic. Se não dor-me, que fazia nella feito fo


cius criminis detes dois machacazes ? "
ID. L. Sobrinho, a que vietes á capoeira ?
D. T. Eu Senhor estando.......
Simic. Chiton , não me ufurpe a jurifdicção;
... já diffe que etas averiguações fó a mim me
pertence: vamos andando ad cagarronem.
D. L. Náo importa; hide fobrinho, que Deos
- he grande. - -

D. T. A minha innocência me livrará. -

D. L. Como he a fua graça, meu Senhor ? -

*Simic., O Bacharel Petrus in cunflis, Juiz de fó


ra daqui com alçada na vara até o ar.
JD. C.
º
º

* Mangeroná. . 259
\
P. L. Pois Senhor Bacharel Petrus in cunflis,
faiba voffa mercê de caminho, que tambem
me furtárão hum capote de Qaragoça em mui
to bom ufo. - * - -

Simic. Capote de Garagoga he caſo de devaſſa:


notificados vofas mercês todos para que em
amanhecendo venhão jurar a minha cafa fo
bre eſte furto.
D. L. E aonde mora vofa mercê?
Simic. Junto a hum D. Gilvaz, que mora. . ..
D. L. Já fei, eu perguntarei. -

Simic. Pois lá etará quem lhe reponda.


ID. G. Ai, que he Simicupio ! Agora reparo ,
já eftou fem fufto. á parte.
*Simic. Vamos: á manhã todos a minha cafa,
, fobpcna de prizáo. Vai fe.
D. F. Ai Nize, que as tuas falfidades me po
| zeráo neíte eftado ! á parte e vai-fe.
Z). T. Tio , trate lego de foltar-inc. , Kai-fe.
D. G. Quem não deve, não teme. Vai-fe.
JD. L. Que mal focegarei efta noite, indo pre
zo meu fobrinho , e não apparecer o ladrão
que eu prendi: não ha homem mais defgra
çado ! , : Waiſe.
JD. Niz. Tal etou de fentimento, que até me
faltáo as lagrimas para o alivio. ". Kaife.
Fag. Eis-aqui os Alecrins, e Mangeronas: cou
…fas de ervas he para betas. Yai.fr.
Sevad. E de que efcapou Simicupio ! Tambem
alguma alma boa rezou por elle. Kaife.
ID. Clor. Ai D. Gil , que a tua defgraça ferá a
caufa de minha morte! * Kai-ſe.
' R ii . SCE
z6o Guerras do Alecrim , * *
J . -**

S C E N A VII.
Sala , em que haverá hum bofete, tinteiro, pa
pel , penna , e cadeiras , e fahem D. Gil , e Si
micupio veftido ainda de 3uiz, -

JD. G. Áo te perdo o o futo, que me fi


zefte levar. * .
Simic. Nem eu o chafco da capoeira, que me
. . fez foffrer. - - . . .

ID. G. E agora , que determinas com effa devaf


fa, que queres tirar ? - -

Simic. Logo verá. º- ."

D. G. E porque não foltas a D. Fuas, e a D.


Tiburcio , que eftão fechados naquelle quar
to eſcuro 2 -

.Simic. Não poderei tambem ter meus fegredos,


fem que ninguem o faiba ? O certo he que
como os trouxemos ás efcuras, entendem'fi- '
xamente que eftão em rigorofa prizão. Mas
ahi vem gente, e vofa mercê faça vezes de
Efcrivão. -
D. G. Ahi parou huma fege: fe feráo ellas?
Simic. Lá eftá quem as ha de encaminhar ; fe
dete, que ahi vem fubindo a primeira tefte
…º munha. " - . . .

$abe D. Lanferote. ... "

D. L. Senhor, aqui eftamos todos á ordem de


voffa , mercè. , ... . .. -

3ímic. Venhão entrando hum a hum. .


2. L. Pois, Senhor, lembre-fe do meu capote.
Jimir. Eu já tenho tomado ifo a mim; vá def
- - Call
ve Mangerona. 261
cançado, que eu puxarei bem pela jutiça,
e farei quanto ella der de ſi. -

D. L. Não tenho mais que dizer. Wai-ſe.


D. G. Homem, tu me tens attonito com as tuas
induſtrias | -

Jimic. Bem he que as reconheças: ah Senhor,


efteja de meio perfil, para que o não conhe
ça D. Nize, que lá vem.
Sahe D. Nize. -

D. Niz. Venho morta: nunca em tal me vi!


Simic. Huma vez de a primeira: fente-fe minha
Senhora , defabafe-fe, fupponha que etá
en fua cafa. - - -

D. Niz. Ai Senhor, não fei que refpeito in


funde a cara de hum Juiz, que faz titubear
o mais valente coração!
Simic. E mais eu, que pareço hum, Papiniano
afanhado ! Diga o feu nome: vá lá 蠶
do , Senhor Efcrivão.
ЛD. Niz. Chamo-me D. Nize Silvia Rufina Fa
bia Lizarda Laura Anarda , e. . . . . . -

Simic. Bafta, Senhora, e póde voffa mercê com


todos effes nomes? -

D. Niz. Ainda faltão quatorze.


Á’imic. Vito ifo he vofa mercê a mulher mais
nomeada que ha no mundo. Que idade tem?
ID. Wiz. Quinze annos efcaffos.
Simic. Liberal andou a natureza: em tão pou
cos annos tanta perfeiçáo ! E do coftume ? .
JD. Niz. Näo entendo. ” -

Simic. Ponha lá , que do cutume jejua. Sabe


Q uem furtou aquelle
- que capote
po ao SenhorD.
feuNiz.
tiº ?
262 Guerrás do Alecrim ;
D. Niz. Prefumo que foi hum criado de D.
'Gil, que entrou disfarçado a vender Alecrim.
3imic. Tenho largas notícias defe criado, e me
dizem que, he ardilofo quantum fatis.
D. Niz. Ido he pafmar ! -

3inric. E fabe fe aquelles homens da capoeira


ferião ladrões ?
D. Niz. Não Senhor, porque hum era D. Gil,
, e outro D. Fuas , que ambos. ...
Simic. Diga, não fe faça rubicunda.
D. Niz. Senhor , os ditos homens vierão por
caufa de amor; e como veio meu tio, fe ef
conderão na capoeira. --།།

Simic. Rapaziadas. Ora ande, va-fe ahi para den


tro, e não faça outra: feja fizuda, e virtuo
fa, que afim manda o direito, honefè vivere.
İD. Niz: A? obediencia de vof[a merce: Yai-fé.
D. G. Homem, acabemos com ifo, venha D.
Cloris, por quem eftou fufpirando. -

- 3ahe Fagundes.
Pag. Muito bons dias , meu Senhor.
.Simic. Chegue-fe para cá; olhe para mim, vof
fa mercê a meu ver tem cara de teftemunha
, falfa., on eu me enganarei.
Fag. Serei o que vofá mercê quizer.
.Sinic. Como fe chama ? . - > . .

Fag. Ambrofia Fagundes Birimbea Franchopa


:

'3ia e_Gregotil.
simii. Ifo são nomes, ou alcunhas ? "
Egg: Será o que vota mercê for fervido. "
-#inic. ತ್ವ , ou folteira ? -

fég. Nem cafada, nem folteira, afim, affim


- Si
e Manjeron4. • 263
Simie. Afim como? -
Fag. He que tenho o marido no Brafil ha qua
renta e fete annos.
Simic. De que annos cafou ? • ,

Pag. De quarenta jutos, que os fui fazer á


porta da Igreja. -

.simic. Que annos tem ?


Fag. Vinte e cinco bem puchados.
*Simic. Não he nada, cafou de quarenta , tem
o marido no Brafil ha quarenta e fete annos,
e diz que tem vinte e cinco de idade! Vá-fe
dahi bebada, falfaria, que a hei de amarrar
a huma efcada , e deitalla por efia janella fóra.
Fag. Eu não fei contar, fenão pelos dedos:
ouça vofia merce, que eu quero dar a minha
quartada. --

*Simic. A quartada dei eu; ande, não cuide que


fe ha de lavar com huma bochecha d’agua;
vá-fe para dentro. -

Fag. Eu vou rebolindo. - Wai-ſe.


D. G. Acaba já com ifo.
- Sahe Sevadilh4.
3evad. Sou criada de vofa mercê. .
Simic. Ai, que já a juftiça começa a abrir os
olhos para ver a Sevadilha! Eu encoto a va
rara, que etou varado. Menina, como he o
ſcu nome ?
Sevad. Sevadilha fem mais nada.
Simic. Que annos tem ?
Sevad. Sete mui fanados. *

Simic. Só fete ? Não fois má cartinha para hum


fete levar. Cafada, ou folteira ? Ꮽ
- - - - e

*.
264 Guerr4s do Alecrín ;
Sevad. Etou para cazar com hum criado da
qui do feu vifinho D. Gil, que ainda que feio,
he mui carinhofo. -

Simic. Effe foi o que furtou o capote a feu amo?


Áevad. Efe me{mo. - -

.Simic. Logo he ladráo ? -

Sevad. He o vicio que tem, que fe não fora


* ifo, era hum moço perfeito. -

3’imic. Ai Sevadilha, que efe ladrão.....


Sevad. Que tem, meu Senhor?
Simic. Nada , nada : e por hum triz, que não
deponho a judicatura, e perco o juizo : afina-te
aqui em branco, que eu eftou pelo que diferes
Sevad. Eu não fei efcrever.
<Simic. Porém fabes muita letra: vai-te ahi Pa
ra dentro. A rapariga me poz a ver jurar
teftemunhas.
Sevad. Eu já vi huma cara, que fe parecia com
a defte Juiz, Wai-ſe
.Simic. Entre quem falta.
D. G. Refta Dona Cloris , Simicupio , perdoa
que heí de fallar-lhe.
Jimic. Faça o que lhe digo, e não tenha gra
ças comigo. -

JD. G. Como etás inchado !


3imic. Se queres ver o villáo, mette-lhe a va
ra na mão. - -

Sahe D. Cloris. ! . . . ."

P. dor. Senhor juiz, logo declaro, que eu de


furtos não fei nada, e fó que D. Gil foi hum
dos da capoeira, e etá innocente, porque...
P. G. Porque foi precifo obedecer-té , querida
Cloris Levanta ſe. D. Clor.
e AMangerona. 265
D. Clor. Que vejo! D. Gil? Cobre alentos, o
meu coração. -

D. G. Não te admires dos fuccellos de meu


amor; que os influxos do teu Alecrim fabem
triunfar dos maiores impoíTiveis.
Simic. Aliás, que hum Simicupio fabe fazer pof
fiveis as maiores difficuldades. Ahi tem, Se
nhor D. Gilvaz, o feu bem de portas a den
tro: tenho cumprido a minha palavra , e fe
não eftá bem រ៉ែ, bufque quem o faça
melhor. - -

D. Clor. Huma vez que me vejo em tua ca


. fa, não porei mais em contingencias a mi
nha fortuna. -

.Simic. Ifo mefmo ; quem diffe cafa, cafa.


Jabe D. Lanferote.
D. L. Que he ifto, Senhor Doutor ? As tete
munhas vem, e não tornão ?
3ímic. Já eftá concluida, e fentenceada a devaffa.
D. L. Quem são os culpados?
.Simic. As Senhoras fuas fobrinhas, que são hu
mas finas ladras.
D. L. Minhas Sobrinhas ladras? De que fórte ?
Simic. Defta fórte ; vamos fahindo cá para fóra :
Kai Simicupio trazendo a todos para fora , e
diz o feguinte:
Porque vitos eftes fuccellos, conta, que a Se
nhora D. Nize furtou o coração do Senhor
D. Fuas , e a Sonhora Dona Cloris o de D.
Gil; e afim he de razão, que lho reflituão,
cafando com elles ; porque no matrimonio
fe entregão os corações com 15 YON I). F.
º
266 · Guerrasdo Aleerim ;
D. F. Em cumprimento da fentença , eu a exe
cuto pela minha parte igualmente alegre, e
admirado defta rara inve&tiva de Simicupio.
JD. Niz. He de juftiça efta acção: que alegria!
D. G. Dona Cloris, dá-me o coração, que me
tens, na mão que te peço. … .
Simic. Iffo he fallar com o coração nas mãos. Se
nhora Dona Cloris,cafe-fe,mas não fe arrependa.
JD. Clor. Senhor D. Gil , o meu coração lhe
- entrego ; em recompenfa do 醬 lhe roubei,
fe acafo he furto, o que fe dá por vontade.
Simic. D. Tiburcio tenha paciencia , e pague
as cutas de premeio com o Senhor D. Lan
ferote , já que forão tão basbaque, que fe
deixárão enganar de mim. Simicupio, tantos
de tal mez , &c, -

D. T. Senhor tio, feja-lhe para bem, que aqui


já não ha para onde appellar.
JD. L. Nem eu me pofo aggravar , quando o
matrimonio he o ditofo fim detes excefos.
Sevad. Quem cafa a tantos, porque fe não cafa a fi?
Simic. Não me falles em remoques; já fei, Sc
vadilha, que queres cafar comigo ; e pois a
fentença pafou em caufa julgada, demos as
mãos, e a boa vontade.
Sevad. Oh difcreta máo que efcreveo tal fentença
Fag. E que ha de fer de mim , Simicupio , que
nefte negocio tambem dei minha pennada ?
3evad. Em vindo a frota, virá teu marido.
D. G. E pois te confegui galharda Cloris , pu
blique a fama os vivas áo Alecrim , que tri
unfou de tantos impofiveis. -

2D. F.
\

e Mangerona. 267 .
D. F. Tende mão, que não he juto, que rou
beis á Mangeronà a parte que lhe toca no
applaufo , que merece ; pois á fombra de fuas fo
lhas confeguiftes muita parte da dita,que pofluis.
Pag. Ifo he verdade;fenão diga-o a efcada,e a caixa.
D. T. Foi boa caixa.
D. G. Que importa que a Mangerona abrie
os caminhos aos favores, fe o Alecrim fere
nava as tempeftades na tormenta dos enleios?
Simic. E fenão diga o tambem o fogo falvaje,
a Medicina, a Miniftrice, e a mái de duas filhas.
D.T. Pois que vai,Senhor tio? He bico,ou cabeça?
D. L. Paciencia por força. .

D. Clor. Não fe póde negar que venceo o meu


Alecrim, pois elle tocou a méta, pondo fim
a noffos defejos. - *.

D. Wiz. A Mangerona fó merece appalaufos ,


porque deu principio a efte fim. _ *

Simic. Então, vito iffo venceo o Malmequer ,


pois elle foi o meio entre o principio da Man
gerona, e o fim do Alecrim.
«Sevad. Pois viva o Malmequer.
D. G. Tenho dito, venceo o Alecrim.
D. T. Se a eficacia das razões náo bata a con
vencer-vos , eta e{pada fará confeflar o tri
unfo da Mangerona. -

Simic. Deixe eftar a folha, que as da Mange


rona não são o Alcorão de Mafoma, para que
fe defendáo á ponta da efpada ; e pois eftou
feito Juiz, pela authoridade que tenho, de
claro . que ambas as plantas vencêrão o plei
to, pois cada huma fez quanto pode ; e Ιάλ
Pa
~

_ே. . .
268 Guerras do Alecrim
ra que, fe acabem eas guerras do Alecrim ,
e Mangerona , mando , que os dous ranchos
fação as pazes, e fe ponha perpétuo filencio
' . nefta materia fobpena de ferêm affumptos de
minuetes, e andarem por boca de Poetas, que
he peior que pelas bocas do mundo.
Todos. Pois viva o Alecrim, e viva a Mangerona.
Simic. E viva todo o bicho vivo.
D. L. Vivamos todos, meu Sobrinho.
ID. T. Effa he a verdade.
*Simic. E como não ha triunfo fem acclamação;
em quanto o Coro não principia a feftejar ef
te applaufo, coroemos eta obra com as ra
, mas da Mangerona,
-
º Alecrim.
с о к о.
D. Niz. e D. F. Viva a Mangerona
Perpétua no durar.
ZD. Clor. e D. G. Viva o Alecrim
Feliz no florecer.
Todos. Viva a Mangerona
- Viva o Alecrim ,
Pois que hum foube vencer,
E a outra triunfar.
20. Niz. e D. F. No templo de Cupido
Troféo de amor fcrá.
ID. Clor. e D. F. Nas aras da fineza
- - . Em chammas arderá.
Todos. Viva a Mangerona ,
- Viva o Alecrim ,
* , Pois que hum foube vencer ,
- E a óutra triunfar.
- -

- . F I. M. AS
269
AS VA RIE D A DES
D E

P R O TE O,
o PER A QUE SE REPRESENTOU
no Theatro do Bairro Alto de Lisbao,
no mez de maio de 1737.

A R G U M E N T O.
S Endo Polibio cabeça de huma parcialidade,
que em Egypto fe fulminou fobre a depofição
de hum AMonarca daquella Coroa ; prevalecendo o
poder contrario , foi precifo a Polibio retirar-fe
com buma filha unica chamada Cyrene; e chegan
do a Beocia », por caminhar mais occulto, deixou
em huma ruftica Aldea daquelle Paiz a Cyrene,
até que achaffe feguro porto a fua errante fortu
ma. Chegando: 4 Flegra , Cidade do Archipelago.
foi recebido delRei Ponto, com diftinção nas ef
timaçôes ; mandando-o outra vez a Beocia para
conductor da filha daquelle Monarca , tambem
chamada Cyrene, para Efpofa de Nereo feu filho.
Em Beocia foube Polibio fer fallecida de pouco
aquella Princeza, por cujo motivo , incitado Po
libio da ambição de ver coroada fua filha, dif>
fimulando a embaixada, a conduzio a Flegra pa- .
ra efpofa de Nereo , afirmando fer a filha del
JRei de Biocia.
No me/mo tempo chegou Dorida, ou Doris,
filha delRei de Egnido, para e/pofa de Proteo,
$4M

-
27o
tambem filho delRei Ponto ; porém inflamma
do Proteo excellivamente na formofura de Cyre
ne, valendo-fe das variedades da fua fórma (pri
vilegio, que lhe concederão os Deofes) intentou
com extremos perfuadir-lbe o feu amor, que im
pedindo-lhe Polibio na brevidade, que intentava
do Hymenêo de fua filha, Proteo o quiz matar,
cujo golpe cafualmente recebeo Cyrene, procuram
do impedillo ; e fendo achado o punhal na mão
de Polibio , foi condemnado ao facrificio de
Afirêa; e para mo/trar a fua innocencia, e evi
tar a vištima da fua vida , foi precifo a Gyre
ne declarar , que Polibio era. pai. Vendoே
Nereo o engano, levado da altivez do fem ge
mio, Pa Cyrene, a quem recebeo Proteo ,
eſtiman o como fortuna o mefmo engano ; fican
do Dorida para efpofa de Nereo, e ambos fa
tisfeitos na mudança das e/pofas.
Servem de Epifedio a eta obra as Varieda
des, e trasformaçóes de Proteo, para confeguir
os favores de Cyrene. - -

* . . . -
** *

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* ノ。 ప ><>< §§: *
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注ナX 《 米 ºʻw …
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-

- - - - - * -

- н N.
- 27, ,

INTER Lo cU T o RE s.
Cyrene, Reputada Princeza de Beoria ;
- deftinada # e/pofa de Nereo.
Dorida, Princeza de Egnido, deftinada ef
pofa de Proteo.
鰲} Filhos delRei Ponto.
Ponto, 449narca de todo o Archipelago.
Polibig , Pai encuberto de Qyrene.
Mareſia , Criada de Dorida.
Caranguejo, Criado de Proteo.

A Scena fe reprefenta em Flegra.

sCENAs Do I. Acro.
!. - 4elya , e mar com ponte.
II. Y Gabinéte. -

III. Sofue, e montanha.

I.
-

.Sala. scENAs Do II. ACTO. . *

II. Gabinete. -

SCENAS DO III. ACTO.


I. 3}ardim. º

II. 3'ala.
III. Templo de Afiria.
PᎪᎡ
?‫צל‬ - .As
Variedades

->養素ぐテ業業<た姿。->孝雄を#<・>蒸素-ぐ

P A R T E I.
s C E N A I. -

Porto de mar, em que haverá huma ponte, aon


de chegaráõ efcaleres para o defembarque de
Dorida, que o fará pela ponte acompanhada
de Proteo, e nella efiará Ponto, Caranguejo,
e mais Criados; e antes difto apparecerá huma
máo á véla: e ao mefmo tempo” paffará bum
coche pelo Prefcenio do Theatro, que ferá de
Selva, e nelle virà Cyrene, e Polibio, e re
colhendo-fe, fabiráõ os mefmos. Tudo fe execu
tará em quanto fe toca a Sinfonia, e cantão
alternadamente os Cór0s. -

с о к о.

1. Coro. M hora ditofa


- - Venha Cyrene,
2. Coro. Em hora fetiva
Dorida venha. - -

1. Coro. A fer de Nereo , -


2. Coro. A fer de Proteo ,
Ambos. Epofa feliz. * *
1. Coro. Os prados com flores, º ... … C :
2. Côro. Com perlas os mares , .. . . . •
Ambos. Qs Sceptros efmaltem. . .
. . . C eterno matiz. -

. . . . Jęei.
w

- Ας Proteo. 273,
Àei. Huma, e muitas vezes repitão as Naiades
idos bofques , e as Ninfas do mar o fuave
| Melibeo'de alternados vivas , para que fe eter
. . nizem os applaufos no mar , c nã terra , ao,
me{mo ཌྷ་ཎ།:
-que fe multipliçáo as felicida
= des, em ambos os elementos. Em hora feti
va, e ditofa, tornem a repiter, que fejão bem
vindas á minha Corte de Flegra as illutres
, Princezas de Egnido, e Beocia 3 para que nas,
regias nupcias de meus filhos. Próteo, e Ne
...;rco, [e perpetue a femidea eftirpe das mari
„timás Deidades. . .... . . . . . .
Cyrºn já que a forte me definou, ó excelo
onto Monarca do Archipelago , ás fortunas
de epoa, de ನಿ , com a gloria de filha
tua, não invejo o throno de Juno, nem os
. . dominios de Thetis...
º - a -

Neres. Nem eu , ó Cyrene


_ me, com ea belleza >

o Solio de Jove, e o liquido Imperio de Neptuno. .


Rei. Cyrene, quando em hum fó dia fe encon
| tráo tantas felicidades , fejáo mudos interpretes
de meu alvoroço os internos jubilos do co
ração. E tu, foberana Dorida, vem a meus
braços, em quanto nos de Proteo te não en
laça amor no mais ditofo Hymenêo.
Dorid. Os vinculos, com que amor me enlaga
em Proteo, primeiro ferão cadeas de minha
efcravidão, que voluntaria ofereço a Vofa.
Mageftade, a quem já refpeito como pai, e ;
venero como Senhor. . . .”

Porteo. Ai de mim, que fó eu na maior ventu


ra fou o mais infeliz! á part.
Tom. II. S ' ' ¿Reí.
‫לג‬2 . As rariedades -

Rei. Proteo, fem dúvida que o prazer dete


dia fe faz inexplicavel nas tuas vozes, no
tando no teu filencio a tua fufpensão."
Proteo, Pois com efeito Dorida vem detinada para
efpofa minha, e Cyrene para meu irmão Nereo ?
Rei. Effa pergunta parece ociofa, pois antes do
º tranfporte das Princezas já etava detinada Cy
rene para Nerèo, e Dorida para épofa túa.
Proteo. Não tem remcdio o meu tormento. 4 part.
Poderia fer, Senhor que mudafes o primei
ro intento, achando, que as riquezas de Egni
do ferião mais convenientes a Nerêo, como
mais moço, 蠶 me fobrava o P్స
"rio patrimonio àe Beocia ; quc a minhã von
· tade náo fe rege por outro imperio”, que o
“do teu přecelto. * - . . . . .
Carang. Adeos minhas encommendas: Proteo,
náo he nada , 'ora efcutemos. _ ' _ á part.
Nereo. Enganasire, Proteo, na ambição que
me fuppões nas riquezas de Egnido, pois ef>
timo tanto a Cyrene Princeza de Beocia , que ,
a jို့ infeparavel do feu eftado; que o re
gio fangue de feus progenitores a faz digna
-¿le maior Imperio , e a raim me inhabilita pa
ra outro defejo; e tanto que a fer menos re
gia, e mais opulento o feu eftado , a não re
cebêra e{pofa.
Polibio. Quê ouço ! Grande arrojo foi o meu ! á p.
Carang. Proteo todavia parece que defeja albor
car a noiva; pois eu não trocarei huma cou
finha que lá vejo, nem por quantas Prin
cezas tem a Berberia. - á part.
Kei.
Ale Proteo. ..., 275
* Rei. Principes, a forte eftá lançada: Cyrene he
º de Nerèo, Dorida de Proteo ; e Polibio , que
conduzio a Cyrene, venha comigo a receber
as etimações, que fe devem a fua pefloa ;
e pois toda a Corte impaciente nos efpera com
fetivos applaufour, não dilatemos a nofa,
entrada. " .. .. . - Wai ſe.
Nereo. Vamos, formofa Cyrene. : Pai-ſe.
Cyren. Polibio, não te apartes de mim hum
inftante. : Pai-fe.
Proteo, Vamos, Dorida , vamos. Oh quem pu-.
dera trocar a fórte , fe he fórte a que me
a acompanha!... : rozº'. … - , á parte , e vai-fe.v
Dorid. O coração prefágo não fei que me va
ticina. ... , á parte , e vai-fe.
AMare/. Vou cambaleando, pois me parece que,
ainda etou no navio. , , Quer ir-fe.
Carang. Efpere, menina ; dondez fevais meter |
entre a barafunda das carroças ? D?ixe-fe ef-5
tar, que em vazando a maré, fe. embarcará.
na fua carruaje. ..…….….… -- . . .

Afaref. A mim me farão lugar em toda a parte.


Carang. Não vê a encangalhação que lá vai??
Vá, mas veja que ha de fuar bem para fe me-.
ter na fua etnfa.… zº . . º.º.
Maref. Parece que afim he : ora voffa mercê…
viva mil annos pela advertencia. . … - - -
Carang. Como poderei viver annos mil, fe en-3
contro mil mortes em cada olhadura de vof
· í at mercê ? * : * * * *
AMaref. Tão2 máos olhos tenho eu 。下。
----
que démº, as
-
f . -

* * *
S ii C4
,
276 As Wariedades
Carang. Não são máos, pelo que são em vof>
fa mercê, mas fim pelo que finto em mim.
A4aref. Pois que fente ? , ! -

Carang. Sinto-me mui aquebrantado. : - ;

Maref. Nunca vi dar quebranto em coufa má.


Carang. Se as almas são coufa má, bem má cou
fa (ou eu; não pelo que tenho de defalma
do, mas porque toda a alma defa formofura
a tenho transferida em mim amente Pythagorí
co de tua belleza. - • * * *

Afaref. Infolente, defcomedido, que fraze he.


efla de fallar-me ? - - - ^^ í »
Carang. Não fei frazear melhor; e fe cada hum
-enterra (eu pai como póde 35? eu refufcito o
, meu amor cómo fei... - * . ..
Maref. Para que fe lhe defvaneça efa tentação,.
faiba logo em continente, que tenho feito a
Diana hum voto folemne de perpétua catidade.
Carang. Não por meu voto. : - "v ,
Mare/. E afim epero que eta feja º a ultima
vez, que tal couta, ouça; porque o meuve
to náo_he coufa de' briñco.” “ ” ' ., … :
Carang. E quem vetou nifo ? : " " … .….……
Maref. A minha devoção. " " … _, º
Carang. Pois antes queres fer cafta que caftiça ?
Afaref Hei de fer folteira para que em mim,
fe acabe a minha geração. . !.

Carang. Vejão lá de que cata he ella? Pois eu


te armarei, huma rrempe, que tu te verás em
fºiºs Pardas : Ora diga, e não póde anularº
ceſſe voto ? , ci ; : . . " .*

*"ºf Etá revalidado com trezentos juramentos.


de Proteo.º. 277
Garang. Pois, filha, fe não desfazes efe voto,
... terás todos a froxo para te facrificarem.
r»Tocão os inſtrumentos do Coro.
AMaref. Como he ifo 2, ... }
Carang. Náo he tempo agera de o faberes,
pois a comitiva já fe vai pondo em marcha.
44a ef. Dize mais duas palavras: como he ifo
| do facrificio ? *

Carang. Tu o faberás anda deprefa para o teu


carrinho, que em Palacio to direi.
-)

Canta o Coro.
S C E N A II. . . . .
g

r
Gabinete. Sabem Proteo, e Caranguejo. .
--། ། º

Proteo. D. , não me perfigas, que


*- não ha, maior tormento para hum:
· infeliz, que a privaçáo do retiro.
Carang. Senhor Proteo, que manía he efia ?
. Ao me{mo tempo que te vês စ္သစ္တံုးျပဳ႕ * .
cafar te vejo proximo a enlouquecer? Não ef
peravas com alvorogos a Dorida Princeza de.
. Egnido ? Não dizias muitas vezes lamentando
nas cofias | do mar :_(_fe he que o mar
tem cotas) vem querida Dorida, e fe por fal
ta de aguas encalhou o teu navio, as dos meus
olhos te traraó ao reboque ? Não andavas fa
zendo Sonetos a huma `aufencia , e cantando
minuetes a huma faudade? Pois como agora
depois de pofuir o que defejavas, parece que
não defejas o que polues. P -

… . rQ•
178 As Variedades -

Proteo. Tudo ifo afim he; porém às vezes ha


incidentes tão fortes, que detroem o mais
firme penfamento. -

Carang. Por ventura, ou por defgraça, não he


. Dorida muito bella, e fenhora de hum Reino ?
Proteo. Afim he. * - - w

Carang... Pois que mais defejas ? O certo he,


que dá Deos nozes a quem não tem dentes.
Proteo. Sabes tu o que he amor?
Carang. Oxalá que o não foubera tanto ! Amor,
ainda que mal pergunte, nos homens he o
me{mo que querer bem ; nas b ftas muares
mormo, e nos outros animaes appctite.
Proteo. Pois como queres que não enlouqueça,
fe cu tenho amor ? . . -

Carang. Para que são efes terremotos, quando


etas quafi propinquo a ter em teus braços a
Senhora Dorida ? " .
Proteo. Ai! fe fouberas que... mas não ; fe
pulte-fe comigo a caufa do meu tormento.
Carang. Se he por ifo, diga-mo, que em mim
º ficará fepultado efe (egredo.
Proteo. Bem fei que não defmereces a etima
ção que de ti"faço ; porém.... -

Carang. Porém que? Com que etamos? Que


res que to diga?
Proteo. Não, não me prives da gloria de o pro
nunciar. - -

Carang. ITo he gloria do ceo da boca.


Proteo. Cyrene he a caufa do meu tormento.
Carang. Não o difle eu ? Oh cerro he certo
º ditado da galinha da minha vifinha! …
Pr0
... de Porteo.º. 279
Protºo.jpgopfeffo-te que tal foi a violencia, corq
que me arrebatou a fua em tudo peregriná
,bellezá, que, náo tive acordo ಶ್ಗಳ್ಗ
a inclinaçáo: vite aquella perfeição que im
mortalizando-fe nas fuas galhardias fe fez ado
ºrar como Deidade? Vite aqueles olhos que
fe adoptáráo atros para adornar a esféra da
fua formofura? Vite aquella neve, que der
., retida de melhor etrella, foube congelar os
corações? Vite aquelle ondeado epilogo de
luzes,, em cujos annéis, preza a memoria não
fe lembra de outra igual maravilha º Vite...
Carang. Efpere, Senhor, com quem fala? Ifo
he comigo ? - , ,,, ,, ,,, . . . . .
Proteo, Sim , porque veja fe tem defculpa a
- minha loucura.,…….… . . . .
Carang. Agora, vejo, que illo he loucura refina
da. Eu por ventura vi nada difo que dizes?
Eu vi atros, etrellas, Deidades, nem luzes?
mulher, ou huma
uma m
Eu vi mais que huma
Princeza, que tudº, he mulher? formofº fim,
porém não agora, lá coufa do fete etrello._
Proteo. Calte, fíefcio, que o tepígenio groffcia
ro náo fabe diftinguir perfeiçöês. … T …, .
Carang. Eu cá no meu amor figº outra, filº
, fofia mais natural; a formofura cá para mimha de
fer clara, palpavel que todos a entendáo ,
, como as paftoras do tcmpo, antigo. . ,. . .
Proteo. Oh quanto inveio a fortuna de Nereo,
e quanto temo que efte incendio, em que
|
me abrazo , confüma facrilegamente ós facri
ficios
、「
de ambos os Hymeneos е24
*.
--
28o . As rariedades
Carang. E que determinas com ela defordena
* da inclinação ? , " " * {
Proteo. Deixár a Dorida , e perteadºr á Cyrene
a pezar de todos os impofiveis.
Carang. E Nereo teu irmão que dirá nefe cafo?
Proteo, Perdoe Nereo, que eu não reger
* * - • * - - . . . . * * -

a violencia da minha inclinação; Numen fu


perior parece que a domina. , , , , * -

Carang. Em quanto a Nereo, já não be a du


vida; porém Cyrene como há de correfpon
º der-te , fe he ñoiva , e Princeza ? e o fallar
_ lhe em amor fera crime deleza magºftade. f

Proteo. Tudo vence o tempo." - •,


;; *,: *.
".
Carang. E fe faltar o tempo ? " " . * -

Proteô. Não faltaráó ós ext:emos, pois fon Pro


teo , que me fabetei transformar em varias fór
mas, para pofuir os favores de Cyrene. , .
Carang. Se náo fora Gyrene Princeza, te dif
fera que te transformafes fempre em ouro ,
que he a melhor fórma para attrahir."
Proteo. E não ಘೀ ameſ
, ma virtude de trasformar,pelo que pôde fucceder.
Carang, Eü ; Senhor 3}} a º • . -

g
-

Proteó. Sim , tü:?```````` ``````````,` _ (* *


Carang. Se eu fou capaz difo, já me começº
" a transformar º na tua vontade , e me verás
e não fó transformado, mas formado na faculda
Je amatoria ; e ainda que fou Caranguejo,
farei muito que ahde" para diante o teu
º* ***
amor.
* *「 。・・ ・ -
* *、、 *・ ・
*r,*・.* …。・・、。 Vai-fi.
: "

-*Y
،، ، ، :‫این ر‬ ‫نان را به‬
- - 4'á
, de 'Protè6. «º 28r:
| &abe Cyrene…; e Proteo voltado com as
- toftas para ella.
Cyren. Principe ? . * . ... . . . :
Proteo. Que ordenas, ó Princeza ? .
Cyren... Cuidei que era Nereo. -

Proteo. Já fei que não ha maior infelicidade


- que fer Proteo. . - .. . . . .
Cyren. Porque ? ... ; :

Proteo. Porque {endo Nereo, tivera a fortuna de;


merecer-te effe cuidado.
Cyren. Nereo, em quanto Nereo, não merecê.
; mais que Proteo, em quanto Proteo; a quali
dade de efpofo que etá para confeguir, he
º que fórma a differença de Nereo a Proteo.
Porteo. Effa qualidade, ó Cyrene, he a que mais
º qualifica a minha defventura. :

Cyren. Se a formoſura de Dorida nao pudeſſe fa-


zer ditofo ao mais defgraçado, poderia quei
xar-fe de infeliz a tua fórte : mas como na ,
fua belleza etáo vinculadas as fortunas, mal,
pódes apetecer as de Nereo por inferiores. . . .
Proteo. Mas com tudo a fer pofivel que os
atros mudafem de apeóto, er que os Plane
º ras, que influírão no meu horofcopo , pudef
fem commutar os feus influxos entre mim , e
Nereo, eu fora mais ditofo não fendo Proteo,
do que o mefmo Nereo com a dita que goza. A
Cyren. Enigmas parecem as tuas palavras. º
Proteo. Se Nereo foubera, Senhora.... ‫ةاو‬
- Sabe Dorida.
Dorid, Oh quanto te agradeço, Cyrene, que
divirtas as melancolias de Proteo; mas cuido
sº. que
-
282 As Mariedades
que ferá etilo em Flegra receberem-fe as ef.
pofas com pompa funèbre... .
Proteo. Sempre as coufas intenfas produzem ef
feitos contrarios ;, pois affim como ha lagri
mas de goto, porque não haverá trifteza
º que feja alegria ? - . . . .

Dorid. Nem fempre sáo contínuos effes finaes


no exceſſive affecto. - - . ."

Cyren. Dorida, porque e não ferá o affecto, fe.


o amor for excetivo ? ‘. . . .

Dorid. Porque affecto que não fabe mudar


- de affećło, he affectada demonſtração da von
tade. Proteo , bem fei que as tuas prendas
merecião mais bella Princeza , e mais digna
a eſpoſa ; a tua triſteza me perſuade o deſgoſ
to de no To Hymenêo; e porque não perigue
- a realidade na conječtura, defengana-me(que ain
da he tempo){e acafo eu motivo os teus pezares?
Proteo. Tu Dorida, tu és a caufa de minhas penas.
Dorid. Infeliz fui; porém..... -

Proteo. Náo te aute eta expresáo , que co


a mo na gloria do amor ha fomabras de inferno,
que muito me entrifteça o mefmo, que me
alegra ? Pois quando comtigo vejo a gloria
que me eleva, vejo tambem em ti o abyfmc
que me penaliza.…
Cyren. Que bem exprefado extremo! **
IDorid. Que mal fingida fineza ! - *

Proteo. Que mal entendido affecto á parte.


· de Porteo. | 28;
Canta Proteo a feguinte º
- A R 1 A - * * .

Em ti me{ma confidero • * *

De meus males o motivo, º

Por ti morro, por ti vivo,


Tu me matas , tu me alentas,
- Pois comtigo eftá meu mal,
E comtigo etá meu bem.
Deixa, pois, que trifte viva
Quem alegre bufca a morte,
E verás que dela fórte
Efta vida me horrorifa ,
E eta morte me convém. Pai-ſe.
Dorid. Que te parece, Cyrene, ete novo mo
do de querer ?
Cyren. He que o feu amor não he vulgar.
JDorid. Achas acafo em Nereo femelhantes ex
prefsões ?
Cyren. Ainda não houve occafião para a experiencia.
!, Sahe Caranguejo.
Carang. Se eu deta me faio bem, tenho mui
*
| to que contar: lá etáo as duas Princezas, Cy -

renes, e Doridas, eu darei o recado de fór


te que Cyrene me entenda, e Dorida fique
em jejum; finjo-me patéta, e mentecapto. Ain
a que me matem náo hei de cafar.
Cyren. Que homem he efte ?
Dorid. Será algum tonto, com quem os Prin
cipes fe divertem. . ,
Carang. Tenho dito: contra minha vontade não
{e canfem. D0
384 As Pariedades
Dorid. Não fei que graça achão netes tontos?
Vai-te daqui. - * * * * *

Cyren. Deixa-o, que góto de o ouvir.


Carang. He boa teima ! Digo que não quero
cafar. Irra! Aº força me querem encaixar hu
ma mulher á queima roupa !
Cyren. Q: tens , tonto ?
Carang. Digo , que não quero, vá-fe a noiva
para a fua terra. |
Dorid. Que noiva ? -

Carang. Tu cruel, vaite com Satanás.


Dorid. Arrebatado no feu frenesí imagina que
falla com alguem. l .
Cyren. No caſar he a ſua reima.
Carang. Ai adorado impofivel, que fó tu me
- regalas efta alma ! . .. . . -

Cyren. Com quem fallas? -

Carang. Comtigo , comtigo hei de morrer a pés.


juntos: efpera, não fujas, que dos braços de,
teu amante te arrancarei. Pai-ſe. -

Dorid. As palavras dete louco não fei que º


éco formárão na idéa , que me penetrarão
o coragáo. - - * -
3

Cyren. Não faças cafo de hum fimples.


Dorid. Se o coração não eftivera ferido, com as
triftezas de Proteo, deprezara aquellas vagas
floucuras; porém ás vezes são prefagios as ca
fualidades; pois temo... . . . . . . . ..
Cyren, Que temes ? . . . . .
Dorid. Ai Cyrene, que os temores não fe: fa- ,
· bem tanto explicar como fentir.
* -
- * ,
-

. . . .
- ". . . *. .
* * * *
* *
: *... …
*
º
v de Proteo.« 285
*"": " “ Canta Dorida a feguinte º . ..
• . . .. . .. . ; A R A. . . . )
… .. … Não tenhas por delirios &
* Meus temores, … - . :
. .. .. Que em amores … - - -
* , Em duvida he melhor , " "; " |
* Temer, que confiar. " ":" " …i's *
* * Oh credula náo fejas . . .. .
* De amor no cégo engano, º
º Que em tal damno … tº
…+ y
e º Dos males o peior, º " : "__":
* - -
º •
Devemos efperar… …,
*
.* z”
-
-
a Fai-fe.
tº gº :

Cyren. Aº vita daquelas exprefsôss de Proteo,


- venho a entender que não são fem fundamen
to os temores de Dorida, nem verdadeira a
fimplicidade do Criado. Oho cégor amor , que,
de abfurdos vás fulminando, e que de horro
r res vás produzindo ! . . . .. . . . .
;: i . Sahe Polibio. , a se
º Polib. Filha Cyrene , não feife me peza do
º engano ; que tenho fabricado, trazendo-te pa
ra efpofa de Nereo, em lugar de outra Cy
a rene , verdadeira: Princeza de Beocia; queren
do-me aproveitár do feu obito, e do teu no
me femelhante ao della; pois já com as ef
- timações de verdadeiras Princeza fe me difi
culta o ver-te as vezes que o meu paternal.
amor defeja. ºf , * -

Cyren. Pai, e Senhor , fe não houvera outro


mal, que temer, effe com facilidade fe podia
*cmediar. Pa
285 As Kariedades
Polik. Pois que receias, levando tão bom prin
cipio a noffa induftria ?
Qyren. Temo que fe chegue a defcobrir, que
a verdadeira Cyrene, Princeza de Beocia , The
falecida, e que tu és meu pai, e eu intrufa
Princeza , e póde fer que , fe converta em
luto toda eta pompafetiva, e nupcial apparato.
Polib. As emprezas difficultofas não fe intentão
fem perigo , e fem futo não fe adquire
huma Coroa. Bem fei e o a minha vi
da pela tua elevação; porém confiderando a
brevidade com que fe ha de effeituar ete
Hymenêo, e que quando fedeícubra o en
gano te acharás Senhora do alvedrio de Ne
, çeo,“prezo nos laŷos de tua formofura , e ef
timando como fortuna o feu, engano, terá di
tofo fim o nolo premeditado intento.
Qren. Oh queiráoros Deofes profpetallo!
----, -, * * Saheb Nereo.
Nereo. Cyrene , como fei eftimas o exercicio
da caça, por te dar, ele alivio , tem ElRei
º meu Pai determinado divertir-te) em huma ca
gada creal, donde vejas a detreza, e valor
dos nofos စ္တပ္ႏိုင္ဆိုႏိုင္ရန္သူ *હતા. *

Gyren. Impulfos: são da benignidade delRei , a


ஃ agradeço, e a ಳ್ಗಿ
cuidado
ide men divertimento. ~ *, *, *, *: ... "
Nereo. A tão alta Princeza todo o exceto he devido.
Polib. Parece, Senhor, que apoftáráo os fados
a fazer-te ditofo, unindo na efpofa, que pof
fues, a ultima perfeição da formoſura. . . |
Nereo, Polibio, huma-formofumaºnáo faz ditofo |
,、镇
' . #e Proteo. . . . 287
hum Principe : os illuſtres Heroes, de quen
defcende Cyrene, a fazem digna da minha
veneraçáo: a belleza he vulgar attraótivo de
hum animo plebeo : a regia aſcendencia he
digna eftimação de hum Principe : a formo
fura caduca com o tempo : a nobreza fe im
mortaliza na pofteridade'; e aflim , Polibio ,
pódes entender , que a fer Cyrene menos
regia, abandonara o thalamo, e deſprezira
a formofura, não fendo adornada da Mage{
* rade. . . . .“, и . . a х3 . Wai-ſe.J.
Qyreh. E que dizes agora , senhor? Etimºra Nº.
reo com a fortuna de pofluir a minha belle
za o feu engano? Vês cahida por terra a ba
fe, aonde erigias as tuas máquinas ?" Ai de
mim, Senhor, quanto melhor me fora viver
occulta, como etava, nas rufticas aldeas de
Beocia , que ver-me quafi propinqna a cahir
da eminencia de hum throno no abyffho de
tua ambição! -

Polib. Não me afflijas com efa ronderaç㺠: po


rém não foi pequena fortuna poder no an
ticipado defengano de Nereo bufcar o reme
dio dete iminente damno; e no em tanto pro-º
curar defwanecer-lhe com profiados carinhos i ais
violeneia de fua inclinaçáo.
;
Canta Polibio a feguinte **

- ‫ م‬8 | A
' * Na onda repetida
- 'Po Zefiro itºpcliida
'Falvez a dura periha.
Ama". -
288. As Pariedades
ao 2 Amante não-defdenha : …. ' ….. :
se -1.-:
adair Seu liquido, criítal. . . . . . . . . .
25 o , … Se pois a clara efpuma .. … º -:

Trofeo de hum monte alcanga,


-o.… si Bem
-a: póde haver
Na inftancia mudança ,…
dos carinhos ‫ פיי‬-a
-

- -
** *** -- .
. ... . Do genio feu fatal. ::: : * : , , Pai-ſe.
- Sahe A4arefia. :) - -
Ataref: Dorida, te refpera , Sénhota , para irem á
- montaria. . .. . . “…" . . .” -\!
Cyren. Eu vou. Oh louca ambição, a quantos
- precipitas' *・? - を 22さ* 。 Pai-ſe.
AMaref. Tomára que, Caranguejo me acabaffe
-- des explicar aquella arenga do, Sacrificio , que
adhe, não pude perceber com a bulha das can
rºtatollas ; : fe tal he, antes hei de dar hum
…olho ao demo, que huma máo ao amor.
† : , Sábe: Caranguejo. .
Garang. Eu afim como tollo dei a entender, a
Cyrene o intento de Proteo , , c ella, a meu
…ver me não deixaria de entender, que tem
… olhos de grande tubercula. - …;
Maref. Senhor Caranguejo. ……….
Carang. Senhora Marefa minha. Senhora.
A4aref. Ha muito que nos não vemos.
Carang. Que ha de 醬 Eta occupação de So
ta-Miniftro de Venus náo me deixa huma ho
ra livre para ter o meu regabofe.
A4aref. Bom oficio deve elle fer.
Carang. Bom he; mas para o meu genio nãº
he muito coufa; eta tarde facrificámos qua
trº mºças, como quatro torres, por não que
-
- rç
- de Proieo. 289.
rerem cafar ; e confefo-te , que quando le
vantei a machadinha para defcarregar o golpe,
que me fugio o fangue do corpo. - -

Maref. Ai de mim coitada! Diga-me, Senhor


Caranguejo. . . . . .
Carang. O que ; Senhora Caranguejola? -

AMaref: Effa lei fe cumpre tantō á rifca , que


todas que não casão morrem ? -

čarang. Ui , como dous, e tres são nove: fai


ba, (fe he que o não fabe) que toda aquel
la mulher que fe motra efquiva; e def
denhofa, como v. g. aquellas que tudo me fe
de, fe não abrandar a condição , ha de fer
- facíificio de Venus como Dêofa dos amores.
Maref. Não ha lei mais barbara do que efia,
, querer violentar a vontade!
Carang. Bem fe póde cafar fem vontade; pois
quantos fe casão contra vontade ? ;
Maref. Cafamento fem vontade não he cafamento,
Carang. Agora nâo ; olha, a vontade he coufa
que fe não vê, é vendo hum homem a noi
va, não lhe abre o coração para lhe ver a von
tade, pois bata faber que tem as tres potencias
da alma, memoria, entendimento, e vontade;
porque ifo de cafar fempre vai na fé dos
padrinhos. -

Maref. E quem feria o magano , que tal lei


_ inventou ? 2 ..
Carang. Calté, não fejas blasfemia; olha que
foi Apóilo em defpique do rigor de Daphne.
A4áref. Bºm haja ella ; o mefmo fizera eu. Por
força? Ifo não, ainda que feja hum Sol; e
Tom. II. T - além
290 As Wariadades
º além diffo tenho feito voto de catidade a
Diana, que me impofibilita o cafar, e hei
de cumprillo, mais que me matem.
Carang. Por mim faze o que quizeres, que if
to não he mais que infinuar; que {uppofo não
fejas minha proxima, pois do teu carinho vi
vo apartado, com tudo és criada de Dorida,
e tenho dó dos teus poucos annos, Coitadinha,
que latima tenho de ti! Não olhes para mim,
que cada vez que te vejo, fe me parte o coração.
Mareſ. Năo te compadeças de mim.
Carang, Náo póde fer , que fou mui maviofo ;
em apertando os olhos logo choro.
Afaref. Iffo vai de ter bom coração. -

Carang. Antes vai de ter bons olhos, que a mim


nunca me chorou o coração no corpo, como
as crianças na barriga. -

Maref. Pois, Senhor Caranguejo, Marefia não


ha de defcer da burra ainda que a leve o diabo.
Carang. Pois eu montarei a cavallo, e irei dar
parié á juftiça 5, e fómente por defcargo de
minha confciencia te torno a lembrar a rigo
º rofa, fevera, e fulminante lei de Apólio, a
qual de cabo a rabo he a feguinte per forma
~ lia yerba , ibi.
D E C I M A.
Toda a mulher que não for
° Inclinada ao matrimonio ,
Ha de levalla o demonio,
* Se a não levar o amor:
Trate logo de depòr ·
- - Scu
-- · de Porteo: “.. - 2.91.
· Seu tyranno defdenhar ; … ,
, . Porém fe não abrandar *

Seu rigor, deve efcolher


Ou cafar, por não morrer, ** * * *

, , . Ou morrer, por não cafar, . __ Yai.fe.


Maref. Ha entaladura femelhante ! Náo fei o
que hei de fazer nete cafo! Se cafo, he ma
tar-me, ; fe não cafo, he morrer: oh que,
apertado cafo! Pois fe tudo he morrer, ef
colhetei a morte, que me for mais fuave: ".
Canta Mareſia a feguinte *
- - ...A R I. A. º -

Náo ha qüem me diga


Por efta cidade , , !
º Se devo caſar, -

Se não, ou fe fim?
…. . Porém que verdade
- Me podem dizer,
**. Se eu hei de morrer .
Aflim como affim?. . , Yai fe.
s c E N A III.
Bofgue. Haverá bum Monte matizado de flores,
e ao fom de huma Sinfonia de trompas birão
Jahindo varios monteiros com intrumentos ve
matorios, e Je veräo cruzar o Theatro varios
animaes filvetres, e fahirão encontrados Cy
rene , e Nere0.
Nereo. Yrene, não te empenhes tanto no
—a feguimento defas féras , nem por
hum divertimento aventures a tua vida : eſ
- -
T ii - pe
!

29? As Variedades - -

pera, e verás , que aprefento nas aras de


tua formofura o mais feroz javalí, que occul
tão eftesbofluºs. -

Cyren. Não , Principe; fufpende o excefo do


teu valor, que temo em ti a tragedia de Adonis.
Nereo. Tendo a ventura de morrer nos braços
defa melhor Venus, ambiciofo bufcarei a morte.
Qyren. Se me compáras a Venus, já fei ferá
fingida efa fineza.
Nereo. Fingida, por que?
Cyren. Porque a formofura per fi não te póde
obrigar a nenhum excefo, não fendo anima
do do Regio fangue.
Nereo. Afim he; mas quando á Megetade fe
une a belleza, são mais venerados os Idolos
da formofura: mais formofa, ao que parece,
he a Lua, mas por fer tão baixa a fua ef
féra, não merece tantos elogios de bella, co
mo a minima etrella, pelo elevado folio, em
que fe oftenta galharda maravilha dos Ceos.
Cyren. Vito_ifo, a não fer eu Princeza, não
feria objecto de teu amor ?
Nereo. Não fupponhas hum impofivel, quando al
“ cango a fortuna de pofuir-te Princeza,е formofa.
Cyren. Pois adverte, (já que me appellidas de
Venus ) que como Deidade etimarei mais os
cultos de formofa , que os tributos de
Princeza. , - .

/ Nereo. Para mim não ha mais formofura que


a nobreza; e amando-te como Princeza, te ado
ro como bella. - . .

Cyren. Deſſa ſorte impoſſibilitas o Hymenêo,


.* -
º
- գաe
de Proteo) 393 /
… que defejas; e para o confeguirês, has de ima
__ginar-me fem qualidade de Princeza, aliás...
Nereo. Que ?
Sahe El Reí. "
Rei. Que te afflige , Cyrene?
Cyren. Achar, Senhor, hum efpofo, que me
adora por política,mas não por affecto. Quer irfe.
Rei. Efpera. -

- Sahe huma fêra correndo.


Cyren. Mal poderei, até não vingar neta féra
:7 as offenças de outra. . '- Pai-ſe.
Rei. Que foi ifto , Nereo ?
Nereo. Senhor, permitte-me que evite em Cy
-- rene, algum perigo no feguimento daquella
féra. Wai-ſe.
Fei. Efta condição de Nereo auftéra, elevada, e
foberba, fem duvida motivou em Cyrene al
gum defgoto; não he afim Proteo, cujo ge
nio mais docil he o attra&tivo dos corações. Fe
-- liz Dorida ferá com tal efpofo:mas ella ali vem.
- - - · $4be Dorida. -

-
Rei. Dorida , eftimarei aches alivio no diverti
mento da caça. -

IDorid. Antes me penaliza, por não achar a fé


ra, que bufco.
-Rei. Se efconderia talvez temerofa do teu valor.
Dorid. Antes pudera eu efconder-me temerofa
da fua ferocidade.
Rei. Se a temes , como a bufcas ?
Dorid. Para defenganar-me da qualidade da fua
efpecie, pois tendo a vito varias vezes, não
fei diftinguir a fua natureza. Aei
€4.


294 As Pariedades ~ |

-Rei. Declara-me effe enigma ; ou dize-me aon


de habita elasféra ? . . . ..
Dorid. Em palacio. . . . * , . . . .”
Xei. Em palacio que féra póde haver como ef
' fa que dizes ? * ^ * ^ * : * : * º *
Dorid. Quem? Proteo. . . . … :)
Aei. Proteo? Como ? Declara-te , náo me: te
nhas confufo. .. . . . . . .! ‫نده‬
Dorid, Proteo , Senhor, cujo genio indomito
nem o politica o perfuade a fer mais atten
to, nem a razão de e{pofo o obriga a fer *. . .
mais amante. ..
‫ه‬. . ‫ﻭ‬

Rei. Proteo ! Não me perfuado." " …A


Dorid. Vês por ventura aqui a Proteo, ao me
“ nos para lifongear-me com as afitencias de
ੇ , ao mefmo tempo que Nereo feguin
do a Cyrene, adora os feus vetigios ?
Rei. Não imagines em Proteo menos attenção
“ á tua peffoa3 a cafualidade de feu defvio nef
ta occafião não feja argumento de feu defa
mor. Ah fe fouberas a`fuave indole de Pro
teo, verias que não cabem em feu peito as
ferocidades, que lhe imaginas! . . . .
Dorid. Ah fe fouberas, que ainda lhe não mê
recí hum fó agrado !
Rei. A não ferem tão dignas de fé as tuas pa
"lavras, as duvidára por incriveis. Proteo, óu.
mudou a natureza , ou perdeo o juizo ; po
rém , , antes que fe accumulem novos incen
i tivos á queixa , na brevidade do Hymenào
remediarei as defordens da mocidade, á part.
* J4
de Proteo. 295
- Sabe AMarefia. -

Maref. Senhores, que huma féra mui féra vem


correndo atrás de mim ! Ai que ella ali vem!
Acudáo-me todos. -

Pei. Seguilla ferá forçofo. Dorida, retira-te , que


cedo darei providencia a teu fentimento. Vaife.
Dorid. Segue-me tu, que os inftantes que aqui
me dilato fem Proteo, são continuadas offen
fas do meu decóro. - Paiſe.
Maref. Tomara-me já daqui cem legoas!
Ao querer ir-fe Marefa, lhe fabe ao encontro
Caranguejo transformado em porco montez.
Carang. Náo ferá facil.
A4aref. Ai de mim, que porco tão porco!
Carang. Queira amor que a faça limpa:
Maref. Ai, que o porco me invete! Vai-te da
qui, não me emporcalhes. .. . .
º Carang. Náo fujas , que eu fou o mais affea
do porcalhão que tem o Mundo. -

AMaref. Nem alentos tenho para fugir. Senhor


, porco montcz , por vida de feus bacorinhos ,
que não fuje o feu dente com o meu fangue.
Carang. Attende primeiro a efla amante porca
ria, fenão fico entendendo que te não pafia
da garganta eſta alporca.
Inve/te, e cabe Marefa definaiada, e torna Ca
-
ranguejo na fua fórma. -

Maref. Ai de mim! Quem me acode que morri?


Carang. Ora eu a fiz como os meus narizes !
Definaiou-fe Marefa fem dizer aqui eftou !
O’ Marefia, ó rapariga, defaccidenta-te, defº.
morre-te, olha que fou eu Caranguejo, que
-
*
- 人 - cm

-
296 24: Pariedades
em efquálida fórma quiz comer a bolota de
tua formofura. Mas ai de mim a que ella já
etá fria ! Se eftará morta? Mas não, que el
la me{ma he huma neve: porém ella não ref
pira, morta etá: mas não , que importa que
não refpire , fe ella he o meu alento ? Mas
, ai que agora me defengano que eftá mor
ta de todó, que já me fede o feu defdem !
Anda cá para os meus braços, que te quero
receber á hora da morte. (Toma 4 nos braços.)
Oh nunca tornes em ti cadaverica Deidade,
pois fendo tu a defunta, eu fou o que tenho
o jazigo quando te tenho? / - -

Afaref. Ai de mim ! - -

Carang. Meus peccados, que fe vai acabando a


prazo , que amor me concedeo! "
Maref. Ai Caranguejo, que foi ifto?
čarañg. Foi ifto mefmo. - - -

Adaref. Aonde etá o porco ? -

Carang. Aqui torce a porca, o rabo.


Maref. Ora dize, aonde etá o porco, que me
queria engolir ? - -

Carang. Ainda não etáfóra de te papar.


. Maref. Mataſte-o º
Carang. Morto etá ele ha bem tempo.
Maref. E agora donde etou eu?
Carang. Nos meus braços. •
# Nos teus braçºs ? Ai de mim defgraça º

da mulher! Não fei fe quebrei o voto que º


fiz a IDiana. ' - -

. Carang. Tão vidrento he o teu voto, que com


hum abraço fe quebre º ,
- AMá-.**
-

- " de Proteo. * 297


Mareſ Sou mui eſcrupuloſa neſſa materia: di
ze, Caranguejo por tua vida, achas, que que
brei o voto, eftando em teus braços ? ?
Carang. Não etou bem certo; deita-te outra vez
nos meus braços, para ver com mais circunf
pecção fe quebrate o voto.
Afaref. De{graçada de mim ! Eu nos braços de
hum homem! Que me fará Diana fe o fouber ?
Carang. E quem lho ha de dizer? Eu por mim
1iyre eßâs, -

Maref Antes o javalí me emporcalhára que


* ver-me em teus braços.
Carang. Para que tanto rigor? -

Maref. Por não querer que Diana me mate,


Carang. Pois porque fugias da féra º
Adaref. Por não perder a vida.
Carang. Pois tolla, fe fugias por querer viver,
porque não fóges da morte, que te e{pera no.
facrifio de Venus, pela rebeldia do teu defdem ?
Maref. Porque afim como és de fegredo, para
não dizeres a Diana que eftive em teus bra,
ços, tambem o ferás para náo contares a Ve
nus que fou defdenhofa, -

Carang. A Diana òderei fer desleal, mas não


, a Venus , que fou feu facerdotifo ; e affim ,
Mareia, deixa-te defas loucuras; trata de buf
car marido, não queiras experimentar o rigo
rofo golpe do facrificio. > -

Maref. Pois tu, que és o verdugo, não has de


ter dó de me matar ? " " .
Carang. Dó terei, mas ha de fer depois da tua
morte. Marefa, não zombemos, olha ༈་མ་
● 。
‫في وه۔‬ As Pariedades -

fe te não refolves, que eu mefmo-hei de fer


... o beleguim , que te leve ás áras de Venus.
ZMaref. Que tens tu, que eu morra? .
Carang. Porque quem te avifa, bem te quer.
Canta Caranguejo a fºguinte
л к т л.
്. Quando vires o duro cutélo
Na tua garganta luzente vibrar,
s Me dirás; bata , bata, eu me cafo;
Porém fem remedio, que então grogotó.
Buſca amante o ditoſo conjugio, e
2..… E dize a Diana que vá bugiar, -

E antes te aperte o nó do Hymenêo,


Do que na garganta te aperte outro nó.
. . . tº ºf , - Waiſe.
À4aref.. Oh defgraçada Marefa ! Para ifto vim
seu cá acompanhando a Dorida? Não me fo
… ra melhor fer no mar alimento de hum tuba
ráo, que fer em terra defpojo de Carangue
jo? Oh voto, quem nunca te fizera! Mas que
digo? Ainda que morra não hei de cafar. Vaife.
*. .. . . .. . Sahe Cyrene.
. Cyren. Que loucura ferá eta com que andão
: #eftes criados, pois antes querem a morte do
que cafar? Porém para a fadiga da caça, pa
rece que efte virente monte, a quem a Auro
, , ra bordou de perolas, e Abril de flores , me
eftâ perfuadindo com vegetantes linguas , que
… nelle defcance, em quanto não chega a comitiva:
. . ; raj ,.. e reclina fè n0 m0nte.)
\ -
o -

*…
a de Profeo...”. * 299
-"e Gh deliciofa habitação dos "bofques, ditofa
quem iogra a tranquilidade de tua delicia ,* on
= … de mais fegura vive a innocencia nas pelles dos
paftores , que nas purpuras dos Principes!
Vai fe infenfivelmente desfazendo o monte, em
… que efiava: Proteo transformado,, em cujos bra
ços fica Cyrene reclinada como de antes, fem
-- ver a Proteo. : - - \ ºn v \
- Aqui as fertas do amor, tendo mais por on
2 de voar, não ferem com tanta violencia,
Proteo. Te enganas, Cyrene, pois até efte mon
$ te fe, fentes abrazar em amorofas chammas.)
Cyren. Quem he o que me refponde ? Levanta-fe,
Proteo. Quem eternamente fora monte, a não
ficar em duvida, fe as penhas fabem amar.
Gyren. Proteo , que arrojo he ete ? Mas aon
de eftá o monte aonde me reclinei? …»
*Preteo. Não te admires, que defappareça hum
monte de flores, quando em feu.lugar eftás
vendo hum vefuvio de fogo., donde fe fra
“guão, não as armas de Marte, mas fim as
fettas.de Cupido. . . ..
- .

Cyren.
ſulto.
Ainda não pofo comprehender
- • .
o teu in
ー、ヘ.…. "

Proteo. Qual he o amor que não tem por azas


"…" o atrevimento ? Se amor (e contivera fó, na
º extenção de feus limites, não feria excetivo;
remontar-fe á esféra do Empyrèo he timbre
de feu poder ;, e affim náo me crimines , Cy
rene, que violando as leis do decóro, da po
º litica, e do fangue 2 rompa o meu amor nef
tes excefíos , que fobrenatural affe&lo , que
- - - ęín

/
360 As Jºariedades º

em ti me arrebata, póde defculpar o meu ar


rojo, e contraſtar a tua iſenção.
Cyren. Louco Principe, que intentas com teus
extremos? *** **,

Proteo. Amar-te. (. . . . *

Cyren. Para que, fe fabes que não pofo cor


reſponderte 2 ….... . . .

Porteo. Para querer-te não neceffito da tua cor


- repondencia ; que feria menos pura a cham
ma de meu amor, fe para arder necefitaffe
de teus favores. -

Cyren. Pois fe amas independente, para que me


bufcas amante? , ,- - -

Proteo. Para que não ignores o meu facrificio.


Gyren. E, que importa 蠶 de, o ſaber?
-Proteo. Scria ufurparte a gloria defe triunfo ,
occultando-te o defpojo da vitoria.
Cyren. Vito io, como etás fatisfeito, fica-te
cmbora. ; : ".
Proteo. Epera. f - , .

Cyren. Què mais queres , fe fatisfeito eftás ?


Proteo. Que te lembres do meu amor.
Cyren. Para que, fe não hei de premiar-te ?
Proteo. Por não fer precifo tornar-te a fignifi
a car o quanto te adoro. ~

Cyren. Por evitar eta occafião, fó por ifo me


lembrarei. -

- Proteo. Adverte, que fe te diffe que não ef


perava favores, não he juto que experimen
tes defprezos. - * -

Cyrºn. Não fé que meio haja entre amar , e


' aborrecer. - -

P, 0
de · Proteo. 301
Proteo. Huma inclinação, que nem he amor,
nem deixa de o fer. - -- -

Cyren. Mas poderá fer amor. -

Proteo. Se o for, ferá benignidade tua , mas


não que eu o efpere. -

Cyrén. Oh, que feefta chamma ardefe em Ne


reo , fem fufto confeguiria a Coroa !

Canta Proteo o Recitado que fe fogue, e de


pois &antão os dous a Aria a duo.
R. R. C 1 T:A D Ge

'Beliffimo prodigio , amado encanto,


Se te eu difera o quanto
Finamente te adoro ,
Julgáras fabulofa a realidade,
Com que me abrazo amante -

Maripofa de amor nefes teus olhos, º


Oue animadas etrellas º

Nortes luzidos são de hum peregrino,


Que em votivos ardores -

Offerece lacrimofo em teus altares


Dous liquidos incendios em dous mares.

. - A R iſ A.
%ož As Wariedades

А в 1 л л о u o: . .
.*
.
* *
- * ..", * ; :*

Proteo. Se acafo te efqueceres ' ' .


Das lagrimas que choro, -

A fé com que te adoro, - *

Lembrar-te faberá. . . . . . .

Cyren. Náo loco


"... º Teu cabe defvario,
na memória . `y

. Pois de teu pranto o rio "… …


f Do Averno fó ferá. .

Proteo. Ah, lembra-te de mim;


器 terno te adorei. |

Cyren. Efquece-te de mim , \ * --

ue tua não ferei.


Proteo. Mal poderei eſquecer mes
Cyren. Mal poderei lembrar-me,
Ambos. De tão vilento ardor.
Proteo. Porque tanta impiedade, º

- Cyrene infiel, porque ? -

Cyren. Porquê faltar não devo =


De efpofa á facra fé.
Ambos. Oh falte o meu alento º - *

Mas não o meu amor. º

} .
-
º

. <!!ు

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de Porteo. ' 333.
「 ?” z
*
・>巻*ぐテ*着そ寮・>恭着ぐう。恭金。

is C E N A I. . . .
º

Sala. Sabem ElRei, e Polibio.


. Reí. J:das dasque deſatençöes
as Princezas vivem etimula
de Nereo, e Pro
· teo , abbreviar as nupcias ferá o unieo
remedio, para que cée o feu etimulo. Po
libio , tenho determinado que hoje fe conclua
o regio Hymenêo de meus filhos: efpero da
tua diligencia, que no exterior aparato co
nheção as Princezas a etimação que dellas faço
olib. A teus pés protrado, Senhor, te rendo
as graças por tão grande mercê , pois tam
bem me competem as glorias âche dia.
Rei.A ti , porque ? ' . . -

Políb. Por ter a fortuna de ver coroada a Cy


i rene , já que tive a dita de fer feu conductor.
Rei. Com ifto fe atalháo as defordens dos Prin- '
cipes ; que a dilaçáo ás vezes he caufa de
grandes ruinas. - - * * * 2

Polib. Acertos sao da tua prudencia: na brevi


dade confifte a minha fortuna. á parte, e vai-fe.
.$abe Dorid4. -

Dorid. Vofa Magetade, Senhor, me permitta


a licença de embarcar-me para Egnido na ar
* * * $Jiãº

*
304 - As Pariedades. ·

nada, º me trouxe infautamente a Flegra,


porque fe não augmente maior injuria á mi
nha pefoa; pois quem antes de fere{pofo me
defetima, que pofo efperar depois, quando
- as faculdades de marido ignorarem totalmente
os eftylos do carinho ? -

Rei. Dorida, a efa defconfiança brevemente fatis


farei; e adverte, que Proteo he meu filho,
e não faltará às obrigações de feu fangue.
Sahe Cyrene. -

Cyren. Senhor, como no Principe Nereo não


bufco honras, nem eftados , pois eftes, e
, aquelles me deu a fortuna , e a ñatureza , ain
.dá que feudataria a teu váfio Ímperio ; e co
mona doce união de Hymenêo deve fó re
ger a vontade ás leis do amor , e náo ás da ra
2ão de efiado, e em Nereo túdo são politicas
> no feu amor, digo , Senhor, que quero ir-me
para Beocia, por não foffer o meu genio,
que haja de fe amar em mim, ou a poteri
dade, ou a afcendencia , ficando vacilante na
divisão do culto a independencia do amor. 蠱

Xei... Rigorofos Deofos , como aflim ides tro


cando em pezares as minhas bem fundadas ef
- peranças ? Princezas, efas defconfianças são
öemafiados cfcrupulos de huma fantazia indif
creta. Em Dorida a queixa he mais bem fun
dada; mas em ti, Cyrene, he fem fundamen
to o efiroulo; pois não pofo comprehender
efa metafyfica de amor. Em fim, Senhoras, por
que não fufpeite o Mundo neffes regrefTos maior
caufº do que efia , hoje fe completará eſſe
- Hy
*
i de Proka. . 305
Hymenêo, e então vereis defanecidos os voſ
foś temores | | | | | | | |
Dorlds, e Cyrene com os lenços nos olhos.",
Dorid. Já não ha tempo de efperar efe defen--
º gano; eº quando não me permitas licença,
nas correntes .'de)്. meu
Egnido. . . .pranto
º," navegarei ſ para
** * t -

Cyren. E eu voarei para Beocia nas azas de


minhas penas.
** * * * **
,, * - * TT*... « »
, " " ""
• ‫_۔یء‬:_a * ,
" - - - --
… -

Rei. Haverá quem po la refira tantos martyrios !


*
-

---

• *
-
*, *,
S.*, * -
'Canta ElRei a feguinte :
---> ": A ‫ ﻭ‬R I A. . . . . . .
º- . . .. . . . . s -
*
, ,
-- . . .

… Refrea o pranto, Do rida "... 3, • * .. . . ;


-
...… . Cyrene, não lamentes, ,
- - - - - 2 * * --- 3 - .. ‫ﻭ بے‬ ، ' ‫' ة‬..i

…, , , Não mais, não me attormentes, -


‫ة‬72 ‫ یہ‬: ' 2
ºប
As mágoas em prazer. " " "
. . . ,. ,. Defierra 9 mºdo panico , Para Cyren:
-
′.4. . . ..,Alęnta
Alenta,nópois
-
feccio
que , creio,
` ` `ºP«rá D{}id. ! r
. . r

:... . . . tº *
A , 9ue contra o meu imperig '. " ,
* r* : * --
mal não tem podeº"."
--- J* “* *・上* -
•‫ ﻭ‬،،
- -
، ،
- **
.
-

cyren. E que dēfgraçaº foi 'a' nofla , Děčida, ou.


para melhor dizer a minha, pois tenho hum
-$fpofo, que adora mais os meus progenitores,
o que a 醬 porque tudo he encarecer-me,
º minha afecndenciº, amando mais o paladó 2
' do que “o preféáte ! "" "*.
Dorid. Pois eu, Cyrene ; em nenhum tempo
fou amada;
Töm. II.' ‫ی‬.vê * tu,qual
* ** ...
he
y maior ínfélicidade
--- Gy-º? •** **

*
ſ - \ * .

f 3o6 | As Pariedades
Cyren. Em Proteo ferá refpeito efe defwio; pois
me conta he extremofo amante.
Dorid. Sabes mais do que eu. * * * * *

Sabem Caranguejo, e Marefa cada hum por fna


º parte , fem verem as Princezas , - como fal
. . . ` ` ; _* lando
. 、 rト・ fo comfigo. r
-

Maref. Por mais que me matem não hei de cafar.


Carang. Não hei de cafar ainda que me matem.
Dorid. Ha loucura femelhante ! O peior he que
efta criada etá com o mefmo delirio ! Ma
refia, que tens ? Dommunicou-te efte fimpleza
tua loucura ? * - ** -

Carang. Aquí fe defcobre á patranha. á part.


AMaref. Minha Senhora, quero embarcar-me pa
ra a minha terra; porque neta, ou, hei de
morrer , ou hei de cafar; e eu nem quero
cafar, nem morrer, - * * * - - -

Dorid. Ainda mais efa pena tenho que fentir,


vendo-teneffe etado! Etá tambem a louccon
firmada 9器 te parece, Cyrene ? , ,
Cyren. Será força de atro , que influa nefte
hemisferio. º º

Maref. Senhora, eu me quero embarcar por


não morrer... , * 3.
* ** * --
* * * * ;*

Dorid. Ha cafo igual! . .. ... -

Carang. Senhoras, digão-lhe que fim, que fe


lhe contradizem, he capaz de fé matar.
Maref. De fórte que eu fiz voto de catidade a
Diána; e afim........ " " . -

Carang: Sim, fim , o que tu quizeres, º


A taref. Não me deixarás, Caranguejo?" * * *

- Ca
**de, Proteo.º , 307
Girang. Mui doidinha eflas : Vai-te dahi; não
vez que etás diante das pefoas Reaes ? .
A4aref. Pois eu aqui não hei de dar a ofada,
iflo não. . . . . . Kaife.
Cyren. E a ti louco, quem te ha de reprehender?
Garang. Eu louco? He mui boa cata de lou
…co efte ! Louco feria eu, fe por amor de meu
irmão me cafafe contra vontade : ifo não; ain
º da que meus pai me lançaffe a maldição com
º a mão direita. ; ; , . . .. f

Dorid. Calla-te, necio, que te aborreço. -


Gyren. Muito fe declara: ੰਡ ſimplez á part.
- Quem he teu amo? , " , , ,
Carang. Eu fou huma virgula delRei Ponto,
º quando etamos juntos fazemos ponto, e vírgula.
Dorid. Cyrene, diverte-te com o louco, que eu
…vou fentir meus males. 1 # 2 … - Kaife.
Gyren. Anda cá, fingido; cuidas que não pe
- metro as tuas fimuladas frazes ? 4 :
éTarang. Ifo mefmos he o que eu queria.
Cyren. Quem tão atrevidamente te induítriou ?
Carang. Hum louco de amor. -

Gyren. Quem het effe louco ? ----'

Carang. He cá huma creatura, que por mais


º que lhe dife, Senhor Proteo, seja que a Se
nhóra Cyrene, que afim fe falla em aufencia,
º here{pofá de feu irmão Nereo, e que não pó
de cafar com ella ; porque ainda que queirão
os contrahentes, háo de haver grandes impe
º dimentos ; mas elle, aferrando os dentes,
batto e pé na cafa, e pondo a mão, no peito
dife; ou Cyrene ha de fer minha, ou eu não
"hei de fer eu. V ii Су
308 . As, J'ariedades
Cyren.Com: que Proteo, concébe6 táb' atrevido
enſamenio3 of: r2 -:::::::, : : . . . .. .
Caiang. ENáo Senhoras não foi Proteo, fei cá
.·brma creatura. - ti : oii
Cyren. Adverte que, ar não queres fazer publica,
- efla temeridade, experimentarias lor caftigo de
º teu arrojo. Vai-te daqui infolente, antes que
a cólera domine a prudencia, lo 2: Er
Carang. Tudo ifo lhe difereui: parece que ade
vinhava, pois lhe dife; olhe: creaturar que
a Senhora, Gyrenepfe há-de enfadarC; . vaiya
creatura, e diz-moi: oHomo temedio, quando
vires, que fe agata, dizegº que efás loucº :
, comºlque, Senhora y não faça cafo do que,
diz hum louco; e afimotoriando ao meu luci
do" intervalló, digo, que, náq hei de gaar a
…ainda que me matem.fsri.ausim işigiK4i/e.
Cyren. Quem fe vio em maior enleio! Maskjá,
que a ambição dei meu pai fabricou efe, en
gano, porque não quizetes, injuflos .#3dos?
que viefe detinada efpota de Proteos) no qual,
a cegueira de feu, amor não diftingüiria qua->
lidades para amar, como em Nereo que……
* * * * * : Sahe-Nereo. Hº . , toº y
Aereo. Venturofo Nereo, que opvio prºnungiar
o feu nome nefel vivo Oraculo de Venus!,
Cyren: Ai de mim!"Se me ouviria ? Não ouvifte
mais que o irem nome? ... ri to ", o st,
Nereo. Eſſa foira ultima clauſula queste, ouvi.
Cyren. Bem efiou. á part. Pois ºfe não ouvifte
"maís, ouve agora, o que não ouvifte, o ºrº
? ': ''' (:) :്: : ...": ; , ; , ; , " :
- ... / - .ti4
‫כ‬ :3 ': 4
- ... *
tº de Proteo.º. 329
ce s - 9the Proteo șo, bafiidor. . c.; 3
Proteo. Bufcando venho o prodigio que adoto;
- mas com Nereo etá; ai infeliz!" … o
Nèreo. Náo dilates o venturofo difcur{o de querA
foi afumpto á minha felicidade, º º

Cyren. Dizia, pois, que feja pofivel que não


"encontre em Nerco hum verdadeiro amor , que
- desluſtre o luzido da ſua chamma com os fu
mos da politica! Que ame em mim mais o
fangue dó que as vēàs ! Que venere o pincelº,
e náo etime a copia ! Oh, que indigno amor !
Ito dizia, Nereo; efe queres deftruir este
- conceito, muda o efytema do teu amor.. ?
Àereo. Effa divisão que intentas fazer ida for
mofura, e da qualidade, he impraticavel… na
minha idéa ; dize-me: feria decente,
que para efpofa minha efcolhefe outro fujei
to menos que huma Princeza? . . 2.
Cyren. Ai de mim ! á pate.
Nereo. Reſponde. . . . . . . . , ,
Cyren. Aſſim he. .*.*.* ... . .''
-

Aereo. Refponde-me mais: feria licito que in


"flammado em huma vulgar formofura, abatef
« fe o efplendor da Magèftade ,º antepondo o
meu ardor ao meu decóro ? Como fe confer
varia , a nobreza fe fó o amor foffe, o dire
ctor dos Hymenêos ? Em fim, Cyrene, não
imagines que defetimo a tua formofura por
etimar a tua grandez: ; que quando as adoro
unidas, não fei dittinguir a caufa de meu amor.
Proteo. Quer ouça ito, e que viva! … . …; …
Gyren.
- -,
O amor, Nereo, deve farditindo,
c -
31o As Kariedades
e não indiferente; que quanto maior he a cau
fa , donde fe originar, tanto mais, efficaz he
o feu efeito: a qualidade póde infundir vene
rações, mas não amor; a formofura he aquet
le vinculo mais forte, que prende a vontade;
é como fó a chamma, 蠶 ha de arder:
na facra têa de Hymenêo, faltando-te a oc
cafião defe amor, não fera luzido o teu
. Hymenêo. . . .. . .. . .
Proteo. Notavel capricho de Cyrene
Nereo. Enfina-me a fazer efa diferença, para
"faber no que erra o meu amor, —
Cyren. Has de imaginar-me, não Princeza, po
rém huma particular formofura, a quem fó co
mo amante ributes adoraçóes. - -

Nereo. E para que he ela differença ?


Cyren. Porque fe algum dia perturbarem os fa
dos eta profperidade, que gozamos; arrui
nado o thronô , quebrado o Tfceptro , e mur
cho ofoulaurel, não me defetimes, porque já
não Princeza. i.
Nereo. Quando tal aconteça , contentar-me-hei . .
com que tenhas fido Princeza; e porque re
não canfes com mais explicações de amor,
ete he o ultimo defengano que te dou.
Canta Nereo a Aria que fe fºgue , e o feguinte |
* в є c 1 т л в о. *

Deixa, Cyrene, deixa eſſe exquiſito -


Novo mºdo de amar, que em meus ardores
Náo diftingo outro modô de querer-te
| | | | | Neſ.
de.Porteo. 311
Nefte extremo de amar-te , -

Mais que hum puro adorar-te,


Com táo céga violencia,
Que confundo em meu peito o requifito,
Que em enigmas propões a meus fentidos,
Pois que està formofura me perfuade – .
Que selleza náo ha fem Magetade.
A R A. \-,

Se em Maio oftenta a rofa


Os timbres de formoſa,
Não deve á formofura
As glorias de Princeza,
器 a Purpura, que vete,
Lhe deu a inveftidura
De bella Imperatriz. .
Pois fó fé na belleza
Amor fe vinculára,
Que cedo lhe acabara
Do tempo nos eftragos
A pompa dos Abrís. Vai fe.
- .Sahe Proteo.
Proteo. Acafo , bellifima Cyrene, vive ainda
na tua memoria aquelle efficaz extremo de
meu amor ?
Cyren, Náo me lembres tanto, que ás vezes o
muito lembrar faz efquecer.
Proteo. Pois nem queres que te lembre a mi
nha conftancia ? -

. Cyren. Para que, fe me não efquece ? Que mais


queres ?
Prote0. Nada mais; eu me retiro. Quer ir-fe.
Су
31, - as ºridad,
** . . . . * * º

Qyren. Ouves? Não tornes mais a lembrar-me


... ] "., Faz, que.fe vai.
Proteo. _Adverte , qué te náo has de efquecer.
Cyren. De que ? -

Proteo. Que defejára, fe pofivel fofe, não fe


Cyren. Para que? - t
Proteo. Para amarte independente da tua grande
za, pois batava para fazer-me feliz, poluir
a tua belleza em qualquer etado da for
tuna. . . . . . . . . .. -

Cyren. Que ouço * Apurarei a fua fineza, á part.


Não vês, que não etaria bem ao teu cara
éter menos epofa, que ಕ್ಲಿಕ್ಕಿ Princeza º
Proteo. Em hum, Principe fem amor afim he;
mas ပ္ရဲမ္ဟု fe fente abrazar o coração na
formofura , rompem fe as leis da politica , e
' fc promulgáo as de Cupido.
Cyren. Pois a não fer eu quem fou, me adorá
... T ras com o mefmo Acxtrémo?
Proteo. Eu não adoro em , ti mais que a bel
- leza , de cujo peregrino imperio ambiciofo de
ra pelo confeguir, quanto pofuo: ainda he
pouco , dera a liberdade : nada encareço , dera
a me{ma vida , fe tudo já tivéra confagrado
em os tyrannos altares de teu rigor. -

Cyren. Como fabes fer impoffivel deixar de fer


quem fou, por ifo affectas efa fineza.
Proteo, O' Cyrene, pelos Deofes do imperio
do mar, e do abyfmo te juro , que as expref
4, 89°º º que, me ouves, não são fantaficas, fe -
-
-
** * *

n㺠verdadeiros efeitos de meu amor.


Cy
º de Proteo. 313
Cyren. Baſta , Principe, que ifo he mais que
"… lembrar-me o teu querer. " " * #"
º Prote). He lembrar-te
com que te adoro. ’com as circumſtancias.
. ".*** ºf firi
. Cyren. Mas já fabes que fema efperança do prêmio.
"Proteo. Bafta-me não viver ignorado na tua idéà,
por não haver premio, que correfponda a meu
amor, nem merecimentoº que contrate a tua
- ** ifenção. . . - - - - º, -- དཱ་ར་ན་རྡོ་
. . .. . .'s O N E To... º.
Náo intento favores merecerte. " 2
Cyrene, quando chego a idolatrar-te, . ":"
Que excedendo os limites fó de amar-te,
* Nunca os principios toco de querer-te. * * ---

, . Com razão poderias cfender-te, , "," ,


t Se ambiciofo chegára a defejar-te, º ‘. . .
Que para fer mais fino po adorar-te. -- *
-
*

Sém premio o facrificio hei de incender-te.


Amar, não he querer, que impura ardêta
' A chamma de Cupido , fe efperära , v**'
"Frutos, adonde tudo he Primavéra; º "º"
'''''E fé acafo', 6 Cyrene , imaginára , *,' |
Que na tua bélleza premio houvéra , Ø
Pelo premio a beleza deprezára: Kaife.
Gyren. Se direi a Proteo quem fou, para efia
" belecer melhor a minha fortuna? Mas como,
fe Dorida, e Nereo embaráção a minha prof.
peridade? Em Nereo vacilla a Coroa; em Pro
teo tenho, confiante Sceptro : oh defgraçada
. Cyrene -(-! A- -'stua felicidade
& . . . . te faz mais 'º
infeliz.
-
. . ് . :) Ly
$14 As Pariedades
- .” 54he Polibio, S.
Polib. Chegou o venturofo dia, em que fe hão
... de coroar as noflas efperanças com o diade
ma da pole; pois ordenou ElRei que hoje fe
concluão os Hymenêos dos Principes.
Cyren. Mas º Senhor, não te lembrão as pala
. . . vras de Nereo ?
. Polib. Nem tudo o que fe diz, fe executa.
Cyren. E fe o executar? _ / -
:
Polib. "E que remedio , fetiáo obedecer aos fa
dos ? Que fe todos os fucceos fe premedita
fem, nenhuma acção {xtraordinaria fe inten
taria. Vamos, que na brevidade confifte mui
ta parte da noſſa fortuna.
Cyren. Efpera , Senhor, que póde fer que fem
futo a configamos, - * , -

Polib. Dize. , ,
Cyren. Proteo me adora tão excefivamente, que
chegou a publicar entre varias exprefsöes do
feu amor , que ainda a não fer eu Princeza,
como fuppõe, me faria efpofa fua, e reva
lidou com taes juramentos, que me fez pre
fuadir a fua realidades,
Polib. Saberá acafo que tu és minha filha ?
Cyren. Náo, Senhor : e parecia-me, que fe pu
deffe eu fer de Proteo , e... -

Polib, Cala-te não pronuncies tal, que para idº


" affim fer dependia do confentimento delRei ,
da vontade de Nereo, e do beneplacito de
Dorida; quanto mais, que pretexto decoro
fo para ifo poderia haver ? Sigamos o pre
, meditado defiĝñio 3. que os Deofcs nos ferão pro
picios. Vai-fe. * Су
de Protes. 315
Gyren, Já nem c{peranças, tenho de fer feliz,
# Pois vejº fruftrados todos os meios que Po
dião fazer-me ditofa. "
'*'
3:-
:' ' Canta Cyrene
: " ,
feguinte
a "; ,; ,
: ;
-
, , 4 * ! A: ,
Mifera já não pofo, , ,, ,
:::. . ... Fugir ...á crueldade , ... - . ...
- Se hum pai me perfuade , , , ,
. . . Que figa o yil, deftino . **
-º-, . De hum barbaro furor. -

.. . . . Parece-me, que vejo


: «… . Nos braços de Nereo.
· · · · · A morte por trofão -
… " Do feu cruel amor. Wai-ſe
-- , S C E N A II. -,

Gabinete adornado de cadeiras, e hum Relogio,


- - - - e fahe Mareſia. -
Maref. S E Dorida me não manda para a mi
nha terra , fou capaz. de me enfor
car pelas minhas mãos; pois antes quero fer
eu carrafca de mim me{ma, que dar efe gof
to a Carangueijo. Mas ai de mim, que me
não pofo ter em pé, que de continuo con
fiderar na materia, caio com virtiges ! Ai,
ai, que tenho o miolo fofo! Se me não fen
to, caio de narizes, Que feria de mim, fe
não fora o balfamo apopletico, que me cor
robora o celebro º -

Alfenta-fe em huma cadeira , que


-
- - -

-
ாத .*
**
316. t A. rafiedade,
fe transforma em Caranguejo" em quem fi.
º cará apentada Marefa #ಟ್ಟಂ' qiee eftá
‫}} ۔‬4-7?‫ ! د‬..․, ,C 4 ‫ھ‬
na cadeira. * -------

Carang._Já que Mareja efá desafente, verei


ſe poſſo ſurrepticiamente aproveitar-me de ſeus
culatraes favores, já que tão atrazado efiou
no feu amor. : *idi *** #. -

Ataref. Se não fora efte voto de catidade, que


me déra a mirn"de cafar ?q triº i 93
Carang. Agoro que amor navega vento em pop
pa, verei quanto péza ete Índiatico planeta.
AMaref. Se eu tivera a certeza-, que Diana fe
não havia enfadar, já me cafára rebolindo :
mas eu peccadora, como o hei de faber ?
* Bem podia Dianaº, vendo a barafunda em
que me acho, não digo cara a cara, mas di
zer-me ao ouvido o que nete cafo devo obrar.
Garang. Gafar... . . . . . . . . et a cois a *
A4aref. Que ouço! Ditofa orelha, que tal ou
viſte! Logo poſſo ſem offender-te caſar ? .
Carang. Até rebentar." * * * * . * * *
Maref. Bem: vito ifo o voto máo val de nada ?
Carang. Nada." " º " º " , º
Marºf. E a promefa val de pouco? - -
Carang. Como hum coco. Pºr * :

24aref. Não tenho mais que ouvir: vou-me


* deprefìa a ºdar ordem a namorar-me para ca
far antes que Dia a fe arrependa. . .
* Quer levantar fe , e a detém Caranguejo."
carang Supendi.
ಶ್ಗ Quem . . . . : . . . . ºr. .* .‫די‬.
me agarra 2. '

ărăng. A minha garra. … … … s. y...".


º Л44
- το da Ρartroικ 盛
ef. F:№rsu. Garanguejo? Ha major infelen
ಸ್ಟ್ರಿ gom9 fai ifto?.
que ſei he que eſº
Carang. E G #o direi : oు
r
etando aţie! ·్ప ‫تا ا‬2
‫و‬f
"…e te fºnt###ás minhas cadeiras… º sei,
31are/, Tafnfiava com as virigens, que não
.rºr pº ៣ a,be, ndo
u, fe១rqu:
T"nâó dëfŷïaft£3 .iռլո f ::
Garangą:staracdarmindo » E n㺠te fentis:)
Maref. Borilogu င္တူ Paoss.
º . ស្ ទុ :
Pºrvifº ºu tambem d 'ಘೀ
ċään
que molle he eta afeptada. E logo alentei.
comigo, fazer藍 humafianίο ho canhepho,
懿 rººm9ria; inoV up e
_d,'que
. . .
########## #####mbsit cu guyi********
Carang. ಟ್ತಿಲ್ದಳ್ತಿ tº 1940:15 oilº,
A4arsfi,Nāiāhāizeiiu
Carang. Não quero º dizêR19, 12 m - º oxige,
4araſ, Eº miº htigliºri ſem su, dizer: : )
ಶ್ ಗ Āiz¢ Ħr disei
en å ggue: Sivigihuahyoi, og hum
ಫ್ಲಿ ಕ್ಡ# ԲHC
Afaref; 蠶 #ಸಿ өёп , тºs. .
Carang Cafar diria ,,ain acilgeºu não ouvi, mais
do.us aZat, Pⓞ Kazaktudeⓞs
meimº, . . . ‫מ‬4
‫נכח"כ‬:ro, fri; o‫ינוי‬. ‫כ‬N
enganei, no que ouvi. கடி
G4r4ng, Pºis-qºfºla?, zodio zo sonru ‫כ‬ut‫"ח‬a‫יעו‬.
- 繁 濫 င္ဆိုႏိုင္ဆိုႏိုင္ဆိုႏိုင္ဆို ~}

ாே
-tº
:Air - - - - - -
*

#18 Atº Pariedades -

nio de inqueredor; o que me importa abar.


- he , fe ainda etás com eftomago de fer facri
" ficada que o tempo fe vai acabàndo, e Ve-º
<nus já me preguntou: efia moça cafa, ou não
cafa? E eu fiz que a uão ouvia; por ouvir
º te o Eltimo defengano: pois que dizeseirº
Maref
ta'.a. Senhor Caranguejo,
-d eu já1.
efiou refouY
*, º f:

Carangº Euferpre dife que tu morrías por cafar,


- # ಕ್ಲಿ
que hei ::‫יידויי‬
Carang. Que dizes minha Marefa * Daca ht
_> abraço em ಶ್ಗ defa boa nova." ?"
Afaref; Abraço? Huma balla. ...ºº ºº ººº
carang. Que defaballádo rigor! "S" …"?
AMaref, Qüero que Venus:?ne"deva 蠶鶯
Carang. Ella te agradecerá ; porémagóra he ne
cefário efcolher marido" logo';ºe já” – ºº
Mare. Ahi comº tanta prella Heide etolher
muito de meu vágar." º "?", º 么*?
Carang: Quàl*vigat # Venus he mui executivà ;
ိို盟 #9com
ſſ.
ເodsefIê
distⓞm, indºnⓥººk
pretextỏ nứnca
phi'mº
càfariấợ :, háo ,
Senhora, efcolher logo, º ou para melhor di
.zer, não efcolher, ºfenão "fechar os òlhos, e
**è# នុ៎ះ com quem for. * * * * *
fef.:ERÍo, agoña #eriais apertado:º 2: (+.
Carang. Não tem 醬 . . . gº.
鷲心. que##de cafar fé não conhe>
ço ninguem ? " !!!
Carang. Lança os olhos por etaºcáfa. }. wહ ; કે
fe achas áqui"cómº quem teº ém gies. º
Agartf. "Aqui fórê°efeimão ཤི:#fff; m. * *
- º de 'Proteo. '. 狂I9°
Carang. Pois cafa com efe ele. -

AMaref. Que ? Comtigo ! . . . …


# Carang. Comtigo não, comigo: "" º
s - Ataref. Pois hei de cafar comigo.
Carang. Não , com "eu. º • *
" …" . ... º -

Maref. Ora ifo he o que me faltava ; ante ?


morrer, que cafar comtigo. " " *
Carang. Pois eu fou mais feio que a morte?
_ AMaref. Sim , que pódes fer morte da morte.:
* Carang. Não. me mortifiques, com eſſe elogio
** fundbre ີ ່ ູ່ ໍ
º Mare/. Era o que me faltava.; I. -

Carang. Talvez que te falte quando me bufcares.


AMaref. Se for 'para ifio nunca', tu appareças.
* canta Mareja a feguinte
º A R ‫ز‬I A • • • • , , , ...".
ſt - Não vem o meu noivo
|. Como he galantinho e º
- Gom effe fucinho en -
{ * Queria mulher? ºr rir º -

º Que tolo, que ſimples,que necio he voſsê?


Bern fei náo mereọơ
Táo lindos amotes ; * * * *
Porém taes favores aí se º
… , Os lanço de mim, co-a ponta do pé.
: ; r് "് . ````
Carang. Qra ; Senhores, digão o que quizerem;
a tal Marefa fe não federa, era huma galan>
º
temocetona; porqueºainda que me não quer,
diſle-me quanto quiz. tº " " οπι - κι ,
… -ºtitoladº e…? Veiii …
-: , , , - ‫هک‬a
3wo; . A: Kariedades -

Jabe'ſ Gyrene, º, . . . . . . . .
Cyren. Louco que fazes ahi ?… . . , , , , , .
Carang. Eftava'vendo, efte relogio , que he hu-;
ma galante pefa; e me diferão que, dava ho
ras por minuetes, que parece gente, que cantas,
Gyrºn. Começa com as tuas loucuras. . . . . .
Carang. Não , Senhora, agora ão tenho o relo
:sia defconcerrado: mas e pere, que ele come
9a,a darihotas.a , : , ego . . . . .
***** * Chiia Proteổó f gainie” ... "
-

M I. Nºtſ' E. T. E. 9 º' -- * *

ча...“, р е , . , S . y

،‫ فهة‬، 37 ‫ة‬ ‫ي‬ alma'ို့


…နှံ့
a minha ... ...… º

ie: abraza, amante » . ,. .


E a 蠶 醬。 - tº
Morrendo eftá, » -

Mais que os minutos , ,:


São meus ardores só ºº
Nos teus vigores, lºs …,3;
- -Conta náo 13. º sº.) *

###low 2: … Mas ailtyranna».oi… ::4)


- , Se agHệm te adoraa. ;: º -

Fofe eta-hora … º T
Hora de amar ! гэг. rг улс “
.‫ز‬ ‫ن‬:i
Cyrén.c Ifio
‫تي‬ ‫ين‬t;g
o;-mais
he F ۰ Hiiiri .‫نلې‬, f ,'l
artificio '_‫ي‬9 Con
humano!
: fufaa:Estouchp o oỆsib . gr. ;'. 2 : * } ***** }
Carang. Eºu vendo que ha de vir tempº, em
; quq os relegios comão, e cafem, tenhão, filhos
Cyren. Quem me dera que tornaffe a repetir ef
ta fuaviffima confonancia. ' *

- * 7. - Cat
--Carang. O relogio he de repetição; fe o quer,
tornar a ouvir, toque-lhe naquelle ferrinhos
e verá. . . .. . .” . . s 2
Cyren. Tu parece que fabes o fegredo defte relogio.
Carang. Sim, Senhora, o fegredo dete relogio.
ſó eu, e elle o ſabemos. -i o . º
Cyren. Pois faze com que repita. . . . .*

Carang. Para que? Toque. Voffa Alteza mefmo


com o feu altifimo dedo; que tem mais ga
lantaria a mão de huma Senhora no motra
dor de hum relogio. * . . . . .

Cyren. Pois eu toco. Mas ai de mim ! Proteo,


-
como affim. . . . . . . . . . .º. 5 -

4ºca Gyrene no relogio, e efe fe transforme


em Proteo. " " " "
Proteo. Não te admires, Cyrene, que bufque.
o meu amor artificios, para communicar-te ;
que donde não vence a força dos carinhos,
venção as fubtilezas da induítria»r Tu fabes o
quanto te adoro; não ignoras o extremo comi
. . que, te idolatro ; e quantos máis timpo!Tiveis
encontro para pofuir-te, mais incentivos, me
arraftão para guerer-te. : s in tog t
Gyren--Principe, o teu amor, ou o teu, delírio.
não póde ter recompenfa: não-fabèso que ef
!"
tou detinada efpofa de teu irmão, e que ef.
sitás eleito conforte de Dorida ? Como poderá
huma paixão céga vencer tantos impoffiveis 2.
e difficuldades 2 . . е. у кој“ и „“...
Proteo. Logo fe as não houvéra, confeguiria a
[u-2 belleza ? ºn tº . ‫الله‬ ‫ عمة‬،، . " : -

*
*** A reitadº
Qyren. Para, que, fe, tu amasº independente do.
. premio? ¿por: 2 ' 'pº: - … --> -º

Carang. Se dá corda ao relogio, não parará hum


.inftante. - º 3º …: :''' ·· · · · á parte.
Proteo. Ainda que ame fem efperança, não def
mereço o premio. - ... "

Cyren. Iffo mefmo he efperar o premio do me


recimento. 3 - *

Proteo. Não, que bem pofo merecer fem efperar.


Carang. Se e{pero que ito fe acabe, tenho bem
que eperar. .. á parte , e J'ai-fe.
Proteo… Só huma fupplica te faço. *, ;
Cyren. E. he * - -

Proteo. Que, não bufques os braços de teu cf


pofo, que não ferão tão firmes, como os meus:
Sahe Polibio ao baftidor.
Polib. Que vejo!, Cyrene, e Proteo Oberva
: rei o que dizem. - - - .……. e º *

Cyren. Náo fei fe mes declare com Proteo , que


o aquella, fineza náo hc para defprezar. á part.
Proteo. Queste ſuſpendeo, Cyrene ? Imaginas
cinos (obftaculos , que propozefte ? Pois (abe
e que arenho no mar poder, e no peito fogo Pa
ra confumir a mais forte oppofição.….……
Gyreni, Ai, Proteo, quem pudera experimentar a
-ì iua fconfłànciaº! Mas temo declarar-te. .. ... •
Polib.i Ai de mim, que Cyrene fe declara!"
Proteo. Náo Geéees :quc défeftime a occafiáo de
s poffuir efla eventura, que me negas i tyranna.
Cyren. Promettes, Proteo ? Ai de mim! Não
# fei o que ºdigo! Se acafo fouberes. . ... Que
enlcio me embaraça ? * : . . . ...;
ふ ... .sa Po
*

de Porteo.'' ' 32;


Polib. Eftou perdido, fe lhe declára o fegredo!
Proteo. Que receas ? Não fabes o meu amor?
Cyren. Pois Proteo, já que o teu extremo me
fegura o receio, faberás que eu....
Sahe Polibio,
- Polib. Eu lho eftorvarei. á part. Senhora, вl
Rei ordena que venhas já , para que fe ef
feitue hoje o Hymento, -

Cyren. Ai de mim !
Proteo. Hoje me{mo?
Polib. He vontade delRei.: w

Proteo. Não póde haver dilação? - *

Polib. Nenhuma: vem, Senhora. -

Proteo. Efpera, Polibio, que celeridade he effa ?


Polib. He"òbedecer aos imperios do Soberano.
Proteo. Obedece, mas não excedas; que ifo
3 mais_parece violencia, que: obediencia.';
Polib. Mais val o excefo em hum vafallo, que
a defobediencia em hum filho. º
Proteo. Tu me reprehendes, barbaro, foraſtei
ro? Não te lembra que viete de Beocia a
mendigar favores em Flegra ? Se não fora. . .
Cyren. Senhor, Políbio nos feus annos tem a
defculpa de feu excefo. . ..

Polib. Senhor", como ElRei manda que não


vá fem a Princeza, todo o exceflo he louva
vel. Senhora, não te dilates. * ,,

Cyren. Principe, he força obedecer. -

roteo. Pois vás com effeito ao Hymenºo ? . '.


Polib. Infallivelmente. - -

Proteo. Não te pergunto Xa ti;


- -
com Cyrene
ii , : : .
falo.
Po
324 As Variedades
Polib. Pois eu por ella refpondo, que deixar ír
ferá impofivel.
Proteo. E eu tambem por ella repondo 3. que -

ír não póde.
Polib. Eu fem ella náo hei de ir.
Proteo. E eu mando que vás fem ella.
Polib. Cyrene não he Dorida. - -
-

Proteo. E eu fou Proteo, que huma vez em


penhado em impedir-te que leves a Cyrene,
o não has de confeguir. -

Cyren. Principe, que te perdes Polibio, que fazes ?


Polib. Obedecer a ElRei. - º

皺 Principe , adeos: vou fem alma ! á part.


Proteo. Efpera. Ai de mina , que a vida, e o co
* racáo me levas ! . ." á part:
Polib. Venha vofa Alteza, que afim importa
Proteo. Pois barbaro intrumento de minha mor;
te roubarei a tua vida, em recompenfa da que
me levas. - - - - -

Puxa Proteo bum punhal contra Polibio, e fe


re a Cyrene, que fe mete de premeio, e ca- ,
* - he deſinaiada. ,
Polib. Que intentas ? • * . .. . -

Cyren. Sufpende, Senhor: mas ai que me ferif


te , e o fangue. . . . ai de mim !
Proteo. Que vejo! Cyrene (ai infeliz !) enfan
uentada ! Ah cruel, que tu fote a caufa. . .
Polib., A tua imprudencia... Ha tormento igual!
Senhora ? Cyrene ? - -

Proteo. O fangue he copiofo. Mas eu vivo, e


Cyrene, defmaiada! Eu me tirarei a vida pa
ra. ºftigº de meu innocente delicto: morre,
eliz Proteo. -40
*' de Proteo. » 325
Ao querer ferir-fe Proteo, Polibio: o detem , ti
rändo-lhe o punhal, e fica com elle na mão.
Polib. Senhor, que fazes ? Não fejas homicida
de ti me{mo. -

Proteo. De que me ferve a vida , vendo fem


vida a Cyrene ?
- Polib. Larga o punhal; náo te mates. º

Proteo. Não he neceffario mais intrumento pa


ra a minha morte que a minha pena. Vai-fé.
Jahem El Rei , Nereo , Dorida , e Marefia.
Rei. Que exceffo he efte ? -

Nerêo. Ai de mim! Cyrene enfanguentada !


Dorid. Sem alentos Cyrene ! -

Rei. Que foi ifto, Polibio ? -

Polib. Quem fe vio em maior afficção! á part.


Rei. Em mudeces ? Não refpondes ? -

Nereo. Queres mais refpofta que aquelle punhal,


e aquelle fangue ? +

Rei. Retirem a Princeza , e cuide-fe exaélamen


te na fua faude. - - ... .
AÁaref. Vamos: "coitadinha ! Ainda afim, o fan
gue real he vermelho como os outros fangues.
- - Leva a Cyrene.
Rei. Dize , infame temerario , que efpirito fa
crilego animou efe braço para tanto infulto ?
Nereo. Não perguntes; catiga fem dilação.
Polib. Senhor, que direi? Efte braço não fe
armou contra Cyrene, porque. . . . -

Rei. Pois quem , fe efe punhal te contradiz? :


AVereo. Aquella, ferida te condemna. º

Dorid. E aquelle fangue te accuſa.


Polib. E eta vida me falte, fe eu....
* * AWe•
º

3:6 As Variedades
Nereo. Em vão negas, quando vemos em ti o
punhal, e em Cyrene o golpe. .

Polib. Oh Deofes! Quem fe vio em maior conf


ternação ? Pois fe criminino a Proteo, ha de
º provalecer a fua defeza, e a minha innocenº
cia perecera. - á part.
Rei. Nenhuma defculpa das ?",
Polib. Cyrene o dirà. -

Jºei. Pois em quanto o não diz, levem-no á


torre de Palacio, aonde fe apure o feu deli
éto, e da fua culpa o caftigo fique ao arbi
trio de Nereo, como parte mais offendida.
Polib. Não póde haver caftigo aonde não ha culpa.
Canta Polibio o feguinte Recitado , depois do
º qual cantão ElRei, Dorida, Nereo, e o
mefino Polibio a Aria a quatro.
- - R E C L T A D G).

. Não me afufta, ó Monarca efe caftigo,


Que me intímas irado, * - -

-Que o fangue de Cyrene idolatrado - -

Derramar não procura , quem o etima,


Qual outro_pai; porém fe a forte impia
Pretende afim que eu morra,
Morrerei fatisfeito : mas adverte,
Se acafo a minha vida
A fua duplicára hoje no throno,
Eu feria homicida de mim me{mo,
E já na morte exangue
Lhe fervirá de purpura o meu fangue.
* ,a . - -- - - - -

** *- : * : * ~, ºr tº -
-

| 23 de Proteo... 327.
-
-
-

* . - *** - _ டி. - _ * * * . *
*
** *
- - -
-
: . * …A…
:: *,R* r"
- , º # A#,
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t → … .* *. .
-->
* ** * ‫د۔‬ sº * **
--> * -
... *

Polib.
登 ﹑
* Sem
*v
culpa aº fupplicio
Me : leva Fhum tigof.', . .
Rei. Infame, traidor,
Sem ºculpa não he."
‫سی‬
s
y
Nereo. Não he; porque a culpa
+ -

• • • •• # : ; Bem clara fe vê... i. :


-Políb. -
… … Teu rogo propicios Para Dorid;
* * * *'. , , , Senhora interceda e….… … ,
Por efte infeliz. .. .… , …",
IDorid. Náo poflo , que a culpa
---o-
… … Defculpa não tem. "> .
* - ".

Polib. e… … Não há quem acuda * * º

. Por a eftejinfeliz?… .. f
Dor. Rei. Ner. Não ha , porque a culpa … : -

… … Bem clara fe vê. …, .….….


Poli. …x … Que eu morro innocente , º
; ry - - -

* . .. 2 …, Vós, Deofes-fabeis.) ... ;


- Dor. Rei. Ner. Dá juíta, vingança… … #
*
*! . . *}
di ci . . O exemplo féreis... de… . . .
Polib. Da injuíta vingança … " …,
Aos, Ceos clamarei. |

JDor. Rei. Ner. Os Deofes fulminem', ' ' . , y


- *: * * * * * , Hum grave caftigº, ..."
Que a hum barbaro dè. . --
s
- . . . ; 4. - * .* - * •‘
--

** - - -
-

* --- - - - -l. e
* -- ~ * - -
- -
,,-
- - -
-
- - 4. * : /* , * s

- -
- -
º …

- -
* -
* *
- * *** !, - a *: - * - -
328 As Pariedades W

•థ *చై-శతి!@#® - *శి:
Pf "A RTE III.
º i **, * * * * * * -

S C E N A I. -

*.
-

- **- -

3ardim, em que efiará fobre huma pilafra bum


, ... vafo \de amor perfeito, e em outra mais infe
rior outro de cravos amarellos , e Jabe El
Rei Ponto. - - - - -

J.' * >* > . * * - º


Pei. Uem me aconfelhará em tantos com
Q a efte affiicto coração? Deixo as im
bates de duvidas, quantos afialtão
prudencias dos Principes na defattenção das Prin
cezas, como mal que pôde ter remedio; mas
a ferida de Cyrene não tem cura na minha
magoa. Que furor fulminado do cavernofo
Abyfmo impellio o peito de Polibio para tan
to exceflo? Não cabe na imaginação o feu
atrevimento... - -

- Sahe Cyrene.
Cyren. Senhor, a teus pés. ... -

Rei. Que excefo he ete, Cyrene ? como te


vejo nefte lugar ainda mal convalecida ?
Cyren. A ferida não foi tão grave como feima
ginou , pois a penas penetrou a região da cu
ti: ; porém ainda que fora mortal, nem por
ilo deixaria de vir a teus pés.
Eei. Que caufa póde obrigar-te a tanto exceto?
de Proteo. 329
Cyren. A liberdade de Polibio, por quem Se
nhor intercedo; e fe o meu valimento póde
º merecer-te alguma attenção, efpero da rua beni
gnidade fatisfaças ao empenho do meu defejo.
Rei. Quando eu cuidava que vinhas a fomen
tar o feu caftigo, vens a interceder pela fua
liberdade?
Cyren. Por ifo me{mo, porque a vingança não
!!! - cabe em peitos generofos.
· Rei. E que diria o Mundo, vendo impunido
~

- hum táo, grave deliého ? *

Cyren. Melhor he que o Mundo ignore que


houve atrevimento em hum vaffalo para cri
me tão execrando , que ha cafos ás vezes, em
que he melhor diffimular a culpa, que cati
gar o deličto. . . . .
Rei. E não pódes penetrar o defignio defa te
meridade de Polibio, ou que intereffe bufca
Va na tua morte ? - -

Cyren. Não fei mais que pedir-te a fua liberdade.


Xei. A Nereo , como parte mais offendida , en
treguei a culpa de Polibio; delle depende a
ſentença ; a elle pôdes recorrer. Wai-ſe.
Cyren. Ai de mim! Que fendo Proteo o que
me ferifle , feja Polibio o culpado ? Mas Po
libio , que fe defculpou com Proteo , moftran
do a fua innocencia, fem duvida que o quer
: confervar para o fim de feus intentos. Ai ama
do pai, quantos extremos te devo, pois pe
la minha fortuna ofereces a tua vida! Mas
Para que nefte oceano de confusões faiba o
norte que devo feguir, lhe enviarei hum 赞
* * *, *, Ο
33O As Variedades
<fo occulto nas flores de hum ramilhete, para
que com eta cautella fe encubra o meu de
fignio. Efte amor perfeito feja o intrumento
de minha fortuna. -

Ao tirar hum ramo de amor perfeito, defappa


rece a pileira , e o vafo ficando em Proteo,
em cuja mão fe une a de Cyrene, cuidando
que pega na flor. >
Ai de mim ! Que vejo ? Atrevido Proteo ,
e, folta-me a mão, não queiras com os disfar
ces de flor encubrir os venenos de aſpide,
e, que tu não és o amor perfeito , que eu bufco.
… Canta Proteo o feguinte Recitado, e Aria.
R E C i'. T A D os

Amor perfeito , fou Cyrene bella ,


Que inundado da copia de meu pranto
Ao Empyreo/fe eftende a minha rama; -:

Gue fó no "Ceo de fogo bufco a chamma,


Como cegtro feliz de Tmeu incendio ;
E fe aqúella ferida ,
Belliffimfia homicida,
Augmenta teu rigor nefa impiedade,
Huma cafualidade -

(Ai de mim !) detruir não póde aquella


Doce efperança, que me promettias; - .

Mas fe a innocente culpa que não tenho,


Teus! rigores augmenta , -

Verás (oh impia fórte ) -

Bufcar na minha dor a minha morte. . .


А R І А.
de · Proteo. *331
A R A.

º Se Amor, fe a Parca irada -

Qualquer tirar-me intenta . . . .


A vida que me alenta ; -

Mais val que eu feja, (ó bella) -


º - Triunfo, não da morte, -

Defpojo fim do amor.


: Pois quando afflicto intento
Bufcar maior tormento ,
Morrendo fó de anmante, º -

Será o penar maior. Quer ir-fé»


. .. . l -

Cyren. Efpera, Proteo, que não te crimino =


para te catigares; bem fei que eu me{ma
me
rir. a.entreguei
Polibio. . .ao . T.
golpe, quando intentava fe
- f ,

Proteo. Tambem fei que eu ainda que inn


cente, fui o intrumento de teu eclypfe; e
ainda que no fagrado de tua belleza acha im
munidade a minha culpa, permitte-me, Cy
rene, que a fatisfaça morrendo. - -

yren. Não he tempo agora de ouvir finezas;


fabe que Polibio. . . . . . .
Proteo. Já feiº que a Polibio fe imputou o de
ličito de ferir-te , е que prezo eftá na torre
de Palacio. - • *

Gyren. E fabe que por te não criminar, con


fentio mudamente no crime que fe lhe im
Poz : agora Proteo he efcufado lembrar-te a
obrigação, em que etás de o libertares, co
mo Principe, e como generofo; que he ra
- Z30
1332 As Variedades
záo te empenhcs em defender huma innocen
te vida, que pela tua tranquillidade fe ex
põe ao mais funebre cadafalfo.
Proteo. Suppofto feja Polibio o inftrumento de
minha ruina na celiridade deteu Hymenêo,
com tudo, como te empenhas na fua liber
dade, por ella exporei a minha vida; que mor
rer por ti, ó Cyrene , não he novidade no
IT& kl 21700t. -

Cyren. Não he neceffario por ora tocar o ulti


mo extremo da fineza; vença a induítria pri
, º meiro, e depois a defefperação; e fó efia ac
ção poderá perfuadir-me a tua confiancia.
Proteo. Pois ainda della duvidas ?
Cyren. Sim; pois até o prefente não experimen
- rei em ti mais que varidades na tua fórma:
deixa pois o mudavel, e sè firme na efica
- cia de tua fineza. -

Proteo. Ainda que tenha por natureza o muda


- vel, ifo he quanto ao exterior, pois todas
-, efas mudanças são demontrativos de mi
' nha firmeza. . .
Cyren. Pois, Principe, na liberdade de Polibio
a experimentarei.
JProteo. Na likerdade de Polibio o verás.
Ao irem-fe , fahem 40 encontro Nereo a Cyrene ,
e Dorida a Proteo.
Dorid. O que ha de ver, Cyrene ?
Proteo. Na vida de Polibio o cafiigo de fua te
meridade. - Wai-ſe.
Nereo. Que intentas experimentar? . -

* - Су
de · Proteo. 333
Cyren. A tua fineza na liberdade de Polibio,
a pezar dos empenhos de Proteo.
Nereo. Ah tyranna, que bem percebo a tua in
duftria ! f Á parte.
Cyren. E afim, Nereo, e pero da tua genero
fidade, que libertcs a Polibio ; que com ef
te premio lhe fatisfago o fer ditofo intrumen
to de eu pofluir a felicidade de efpofa tua ,
na condução de Beocia para Flegra.
Nereo. Parece que algum futo, ou perplexi
dade te fez mudar a intenção de tua fuppli
ca. . . . Ah tyranna : a part.
Cyren. A ancia que tenho de libertar a Poli
bio, quando me aflige o coração, não me
perturba o acordo para pedir-te a fua liberdade.
Nereo. Para te otentares generofa , bata faber
fe, que intercedete por Polibio; mas eu co
mo duas vezes ofendido na fua vida, vinga
rei as minhas ofenfas. Wai-ſe.
Cyren. Que fe falte ao refpeito a huma efpofa
e a huma Princeza ! D6rida , intercede tam
bem por Polibio, que talvez feja mais ven
turoſa a tua ſupplica.
Dorid. Pede a Proteo, que não deixará de fa
tisfazer ao teu empenho; que eu me embarco
para Egnido fem dilação, pois já conheço
a caufa , donde nacem os devios de Proteo
Cyren. Donde, Dorida ? . ...
Dorid. Donde não imaginava, Cyrene. Vai-fe.
Cyren. Ai infeliz, que Proteo me intenta pre
cipitar com feus extremos, pois do femblan
te de Nereo, e das palavras de Dorida infi
ΚΟ
334 As Pariedades -

ro os zelos, em que fe abrazão! Ah Proteo,


já que tu és a caufa de todos os meus males,
sê algum dia intrumento de minha fortuna.
Canta Cyrene a feguinte
A. R. I. A.

Fortuna que inconftante


Te oſtentas rigorofa,
Quando ferei ditofa :
Quando ferei feliz ?
Sufpende por hum pouco
Teu moto acelerado,
Não feja fempre o fado
Cruel a huma infeliz. Vaife.
- - Sahe Mareſia.
AMaref. Agora me difle Dorida que me prepa
rafe, que nos haviamos embarcar para a noffa
terra; ifo já havia fer ha mais tempo; e fem
izer nada a Caranguejo, me hei de defpe
dir em Grego , que ainda he peior que em
Latim; e quantos trates, e cacaréos tiver ,
- tudo hei de levar comigo. E para facrificar à
Diana , Deofa dos bofques , levarei efte cravei
ro de cravos amarellos, ena memoria da de
fefperação, em que me poz o facerdotifo Ca
ranguejo;
que feja aoecollo
afim: já o vou levando, ainda
w

Ao tomar Marefia o craveiro nos braços, fe


transforma efte em a figura de Caranguejo,
e diz Marefia o feguinte
À4aref. Mas ai! Que diabo he ifto ?
Carang. Não he diabo ; fou eu mefmo que
fou endiabrado. -

º AMa
“de Proteo. - 335
Mare. Es tu? Deixa-me negro mofino.
Carang. Mofina és tu, que nenhum favor me dás.
A4áref. Larga-me, fe não hei de chamar á que
delRei. -

Carang. E eu hei de chamar a que de Venus.


Maref. Tu não queres ? - * *

Carang. Quero, quero. –


AMaref. Pois toma. Atira com elle ao chão.
Carang. Só ifo me pódes dar ; mas cahindo a
teus pés não quero maior fortuna.
ÀMaref. He muito atrevido:com enganos comigo?
arang. Deixemos ifo Marefa, que já não ef>
tamos nefles termos , pois fó a teus pés prof
trado põe a boca hum Caranguejo amante; e
te pede com lagrimas de fangue, que fe has
de efcolher marido, que feja efte pobre men
digo de teus favores, pois nifo farás huma
obra pia; porque fou hum moço orfão fem
pai, nem mái. - -

Maref. Já não fe me dá de Venus, porque ho*


je me embarco, e mais Dorida, e nos va
mos deta maldita terra. . . . . . . .
* *

Carang. Iffo he fallar. : -


* *

Ataref. Quando o vires, ou quando me não vi


res, cntao o creras. - - .." . "

º Carang. Não podéras ter feito ifo ha mais tem


po , e cfcufar de andar dando tratos ao juizo,
empenhando-me com Venus , pedindo-lhe amo
ratorias para te efperar, ficando eu por teu
fiador, abonando a rua pefoa ? Ito tudo te
nho obrado a teu refpeito, e agora que ha
de fer de min ? : * : ***
AM4
336 As Variedades
Maref. Cada qual forra a fua pelle.
Carang. E a minha ha de ficar cativa para Ve
nus me tirar do coiro a fiança ? -

A4aref. Que tenho eu com ifo ?


Carang. He boa efa ! Não, Senhora, que eu
fiquei por vofsê que havia de cafar mais dia,
menos dia ; e agora quer efcapolir ? Nada:
mandado de fegurança no cafo. -

Z4aref. Eu não vou por minha vontade, que


· Dorida me leva.
Carang. Pois cafa primeiro antes que te vás,
ainda que feja comigo, e vai-te depois mui
to embora, que ifo baita para eu ficar liber
to no forro interno.
ZAaref. Qual cafar? Se eu por amor difo me
vou, e comtigo muito menos.
Carang. Effe menos he que he o mais.
Maref. O que pofo fazer, he defpedir-me de
ti: fe queres direi que te fiques embora.
Carang. Eu fempre ouvi dizer que quem fe def
pede fe abraga, e fe me has de abragar , def
peçamo-nos já.
AAaref. Hum abraço Francez não fenega a nin
guem. - Abraç4-0.
Carang. Ora feja pela vida, e faude do Senhor
feu pai: abraçada feja a tua alma todos os
dias da tua vida. -

Cantão Caranguejo, e Marefia a feguinte


a R 1 A•

À4aref. Senhor Caranguejo,


Adeos que me vou.
c.
-

- a de Porteo. 3, $37
Carang. Lá, vai o . meu bem» e, * --

Meu mal, me matou. . . … * . .


Maref. Náo chore barbado , , , . - 3,
... [ . . Vofsè he rapaz? . . . . . . . .
Carang. Amor he que chora, º " . ,
- ** ﹑ 蠶 amor. he , rapaz. ; : * ~* * * ... ".
Maref. Adeos, que me vou . . … , , , ; ,
Carang. Náo digas yranna, , , , , , , , ,
Ambos. Adeos que me vou: … .. …; …,
Mareſ Oh quanto me cuſta … ,
, Deixar-te ſem mim !, º' .. . .
Carang. Oh quanto me aſſuſta
..., … Ficar-me [em ti! …, … e ,
Ambos. Porém paciencia». , , , , , , ,
Que na agua do 'pranto : Aí .......
Amor fe afogou. . . . . ... Vai.e.
, - . ..
...' s : . . 江

' s c E N A If. '".', 'I -


, -stº. " ... * º ... ſo * : : : : - rr . " . ,
« . : ; 3'ala. Sahem Nereo, e Qyrëre, . .* ് *

‫ " و‬. ‫ " كافة‬، " : - ‫سنة‬ 3 . . ‫س‬ -----' " :çe ;
Gyren, H E polivel Nerⓥo, tº os rogs
{} de huma efpefa não tenhão vali
i mento na tua attengão?
Nereo. Por ifo me{mó que para que fe faiba
§ .
o quanto etimo a minha e pola, 醬 de moí
trar o quanto feivingar a fua ofenfa. ..
Cyren. Se eu demitto de mim efa ofenfa, já te
não fica ឆែ្ក"
- َ‫مَھ‬ º : -
caftigâr, … ,
AÑerea, As, o enfas, da efpofa são recipro as
º

eſpoſo; e ſe da tua parte demittes ႏိုင္ဆိုႏိုင္ငံ


da minha não perdoo a ofenfa: ó lá, tra
… Tom. II. * : Ү " gão
338 As Pariedades | -

gão aqui a Políbio , para que veja Cyrene


no feu caftigo o meu amor. "
Cyren. Barbara fineza he eſſa, Nereo : quem vio
* **
maior defgraça! ¡ °°°°° ° ¡ “ ' á parte.
'_Sahe Põlibio com cadeas; e Guarda: -"
Polib. Aº tua prefença chega o infeliz Polibio,
e tão infeliz, que pela mefma acção, que
devêra fer primiado , (e vê na conternação
de perder a vida. º º vº
Cyren. Malpoflo conter as lagrimas.'''
' Nereo. Polibio , já fabes * que fou o Fifcal de
tua culpa; do caftigo não duvides; porém pa
ra que feja menos horrorofo o epectaculo,
quero me digas, qual foi o fim de tão enor
mc delićło ? ***
Polib. Que delicto? a el
Nereo. Ainda te, atreves a negar, ou imaginas
que não delinquite ? " "…
Polib. Sim, porque não ofendi a Cyrene.
Nereo. Não intentes negar hum delicto, que não
tem defeza , que quafi aos nofos olhos foi
commertido; fó quero me digas quem te impel
lio a tanto exceo º º"
*-,

Polib. Senhor, eu não ofendia Cyrene; ella


", fabe a minha innocencia. * ** * *
ereo. Pois quem? , "," " " . .
- 鷺*驚醬。
Cyrene, fe queres a. vida de
ZWereo." - -
. ..
Polibio;
_ porque, não declaras o ofenfor? - - -

ಛಿ। A infeliz! Que


hum amante
farei entre hum pai, e
| | à part.
Nereº. Que dizes? Mas nada digas, que o fi•
- >
teu * * *- º
- de Proteo. 339
* "filencio eloquente me diz que foi Polibio;
que fe não foffe, quando lhe defejas a liber
- dade, accufarias o delinquente: não tenho mais
º que averiguar: feja Políbio conduzido ao Tem
plo de Atréa, aonde no 蠶 da juítiça pa
-

gue com a vida o. feu deli о.“ . . .


Chegão os guardas a levar a Polibio.
Cyren. Eperai, que Polibió náo he o delinquente.
Nereo. Pois quem , Cyrene? . . . "

cyren. Que direi ! Oh a6yfino de confuzões! á p.


Nereg. Levai a Polibio, que Cyrene o condemna.
Polib. Vamos, que hum refpeito me crimina.
. . . . - J'ai andando.
Cyren. Vença ao amor a natureza : fufpendei,
que eu Keclaro quem foi o delinquente.
Nereo. São efcufados efes artificios para fuípen
der a execução: levem a Polibio, que elle
he o delinquente. .*.*-* * * * *
Cyren. Não he, Nereo; não he: eu he que fui
a delinquente. * * • * *
Nereo. De que fórte ? ... t

Qyren. Defta fórte: como determinava ElRei •


• T-brewidade do noffo Hymenêo.... -

Sabe Proteo com e/pada , e Soldados tambem


- com ellas, e Caranguejo armado.
Aereo. Que he iflo, Proteo ?f.
#Profeo. Libertar a Polibio , para que a fupplica
de Cyrene não fique femfatisfação decente á
fua peſſoa. *:::

ſ Nereo. Pois tu intentas defpicar as injurias de


º minha epofa e º Y ii --
Pro
340 As Wariedhdes ~

Proteo. Não : mas as injuriasºde huma Dama


- offendida, afim. の"r"^、 , ºf sº ºr "..

n., Maior damno: fe ¡vai,originando... á part.


-Polib. Proteo i obra como Principe. . . á part.
Carang. Hoje ha de ir tudo com Berzabú, º
Nereo. Proteo, enlouqueceſte 2. Náo fabes o pe
rigo a que te expóes ? e
Proteo. Já fei.… oºi 2 - .. . .. . . . . Tº
Nereo. Pois que intentas, fe, o -fabes ?. . . …
JProteo. Defender' a Polibio. . . . . . . . . ,… ,
Nereo. Como ? , . . . . - -

Proteo. Deta fórte. __ . . .:: .:: … º Brigão.


Carang. Ai que aqui etá o homem! Que he ifo lá ?
Neren. Inſolente Proteo, ſaberei caſtigar a tua
temeridade. ". . . . . . . . . . . tº ºt,
Polib. Valha-me osvalог de Poteš? . . . . . .
qyren., Nereo, Proteo, que intentas? Ai de mim!
Polibio, retira-te. a7 , r * -
'Polib, Náo poffo, que as prizóes me embaraçáo,
Proteo. Polibio, ſegue-me.
Nereo. . Não em quanto eta e pada fe unir a
f ' efte ibraço. 。 ºt.” : :: :o) sº. ! . . . ." . . ;
,-

Carang. ရှံ႕ႏွံ့ဖြုံ့နှ့ံဖွံ့ဖ္ရင့္ ဂ္ယီ deo fentiri o Mun


do as mordeduras dete Caranguejo. -
- . 5El Rei , e Dorida.: * *".
' 3'ahem
Rei. Que infulto, he ete? Que he ifo, Prin • *
cipesa Supendicas armas. . . . . .
-Proteo. Fruftrou-fe, o meu intento... … , á parte
7Dorid. Que latimofa tragedia ! *

carang. Bom padrinho tiverão. . . .


Rei. Nereo, que excefo foi ete? __ . ....
Nereo. Arrojo de Proteo que com eta violencia
s. IIIe --
*
*.
de 'Proteo.”» 34г.
M ·· intentou libertar a Polibio por fatisfazer aos em*
ºpenhos de Cyrene. ..
Rei. Temerario Proteo, como fem attençáo ao
decóro dete Palacio com máo armada alim
bº o profanas? , , , * 2-,
Carang. Ponto de interrogação, … **

Proteo. Senhor, hum precipitado empenho não


- repára em artenções; que a céga 蠶, que
… predomina em meu peito, não fabe diftinguir
--a purpura i, mais que a do fangue , que in
…tento verter pela liberdade de Polibio. .….:
Rei, Barbaro louco, imprudente, affim me refpon
º des? Não fabes que fou teu pai, e teu Rei? Le
e vem-no prezo , éjunto com Polibio feráó ambos
viétimas de Aftréa. Quem viomaior infulto !
Carang, Ponto de admiração. . Y.
Proteo. Mais me vanglorías com efe catigo, pois
quando não pofo defender a Polibio, ao me
nos me fervirá de defculpa o não ter vida pa
ra libertallo. : i:
Cyren Efpirou a minha efperança,e eu com ella, áp.
Dorid. Sem embargo das ingratidões de Proteo,
por elle fupplico, Senhor. -

JRei. Náo peças por hum ingrato. . . .º


IDorid. Bata-lhe ter o nome de efpofo meu.
kei. Deika, Dorida ; deixa', que Tfe vinguém
em hum fó catigo tantas ofenfas: fejão levados,
como digo, ao Templo da Juftiça, aonde no
ſeu ſangue ſe purifiquem as ſuas culpas.
Polib. Não vala minhaínnocencia contra efe rigor?
Cyrem.Náo póde o meu pranto abrandar effa dureza?
Proteo. Não fez attende ao meu caracter? .
**. s a 63,

~~
$42: As Wariedades
Rei. Não póde, não val, não feattende: le
vai-os. - : z: Wai-fe.
Carang. Aquillo he:ponto final. ... . . . . .
Cyren. Cruel efpofo, porque não tejaótes que
triunfas de minhas lagrimas, não has de ter
o prazer de quê eu veja a execução de tu
civingança; pois defe{perada bufcarei quem m
_ vingue deta injuria. .. …;; # 1 Vai-fe.
Polib. Os Ceos motraráó a minha innocencia.
-: ". . et - # Vai com os guardas.
Nereo. Vá tambem efe tyranno irmão perturba
…dor do focego de meus fentidos. . .
Proteo. Não ha de ter efia jactancia.… á part.
Dorid. Vê, Nereo, que contra hum irmão he
indigno efe procedimento.
Nereo. Se fouberas, Dorida, o que eu não igno
~º:ro , náo , intercedèras.per elle. … …, ` ` ` ,
Dorid. Quem nunca o foubera! - á part.
Carang. São boa cata de irmãos eftes ! Por el
les Te pδde dizer: quando fratres funt boni ,
funt bonifrates. . . . . . . -

Nereo. Em que vos detendes, quer o não le-,


vais ? •º c-. » . . . "
Proteo. Na fórma delRci me transformarei. áp.
Trasfórma-fe Proteo, na figura Ri. , ºy,
Nereo. Lévai-o: não me obedeceis : º

Sold. A quem, Senhor?… : . . . . ~~


2Vereo. A Proteo, s o ; , , ,
Sold. Proteo náo eftá aqui. º, 2 - .
Nereo. E efe quem he ? Mas que, vejo ! Se
** abor, Volla Magetade como aqui, e Proteo ?
Fou confufo! Que illusáo he eta, ? -
Pros
, , de Proteo. - S 343.
* Proteo. Se, Proteo não apparece bufquem-no ;
, que importa não ficar fem catigo. . . Vai-fé.
Carang. Ficárão paímados: o certo he que eu,
e … e meu_amo ,, fomos dous. _ ,
Nereo. Dorida, não vite a Proteo ficar entre
º os guardas, quando fe aufentou ElRei?
Dorid. Não ha duvida. » ** * *

, Nereo. Pois como Proteo , fem que o viflemos,


: defappareceo? e ElRei etava entre os guardas?
Carang. He que foi precifo fazer dous pontos
.…., na Toração. I ... ... ``,,,......
* ** : " . -

Ilorid. He caſo ល្ហុ » . ‫اند‬


* *
-

Äereo, Que fugifle Proteo, fem que delle pu


, defem os meus zelos vingar-fe! O lá, toda ef
- fa comitiva, que armada veio com Proteo na fu
blevação, feja conduzida ao mais efcuro carcere.
=Carang. Boas noites tenhão vofas mercês.
Nereo. E haja particular vigilancia nefle criado.
Carang. Sempre obrigado : cá para nós não he
ſ . _ necefíario ceremonias, He.bem feito ! á part.
Dorid. Nereo, efe, criado he louco.
Carang. He verdade; nem tal me lembrava.
Nereo. E
Dorid. como
Pelo fabes varias
ter vito que vezes.
he louco? /ー ,

Garang. Effa ainda, he melhor! Que? Prender


me pará cafar? Pois defenganem-fe, queei n
da que me matem, não hei de cafar.
Dorid· Com aquella teima anda fempre.
Nereo. Efe por louco, pois o abona Dorida,
º
y
fique, e guardas
Levão os levem osos mais.
que vierão . com. Proteo. -

Carang. De boa efcapei! Vi a வைகள்,dos


*. , - QlhOS
'344 * As Pariedades
olhos. O certo he que a vida dos nefcios,
*
e loucos
* ...
*
he maior \ -que
. . . .” 7,3 - !r
a ados entendidos.
parte, .
e”vai-ſe,
IDorid. Nereo, não te aflijas com tanto excef
º fo;'bufcando "na túa peñá a tua morte, que
mais importa a tua vida. _ " "
Nereo. Ai Dorida, que o meu fentimento por
inexplicavel he mais fenfivel!" * * *
Dorid. Aprende de meu foffrimento, pois fen
· · · tindo ô mefmo malº, que tu padecês , pro
curo fuavizallo com o retiro. Paife.
Nereo. Dorida com prudencia me deu a entén
der os feus zelos : ai infeliz, que já com du
º plicado''indiclo póåe defafogar públicatnente
- a minha dôr nos zelos de Cyrene! Ah Prin
º ceza indigna de tão foberano epitheto ! Oh
Proteo aleivofo, digno de eterna infamia nos
annaes da memoriá! Huma contra as fobera
º nias do caracter, outro contra as leis da leal
· ···· dade, e da natureza fe armáráo inftrumentos
de minha magoa
. . . . .. . . .. . .
no tormento de meu ciume.
. . . . . . . . .* * * * * * , , , ,
ºº 、Canta Nereo a feguinte
。・・。。。
: º :
「下s.: , ." . ‫فء‬ ‫ء‬
• , ,, , , . . . . . > - - A R ‫ "هم‬si
sº * :* : º

: ; ; , ;, ; ; ; ; ... . . . . . . . . . .
• Selvàtica -féra * * ... ". . . . . . . tº rº

, , , "Da brenha mais tofea º ് … º


Se encrepa, fe enroca, -º
- Se a cará confórte a '' º ``
. . "". Nos braços encontra º 'º ' .
. . * De amánte rival. . . . . . . . . . . . .
.
*- - - - Se
z de Pröteo. 345
‫וו‬ Se o rutico intincto ... s.
- De hum bruto padece , . . . . . . … v.3
º - Defculpa merece , º,
Huma. alma abrazada | | | · · ··
Dos zelos no mal. …….… , º Kaife.
( * : *** * - ً‫نا تا‬- ، ، ، ، ۶ ‫خ سے‬ ‫' د‬، ‫ ء‬sº * }
... . ... S C E N A ' III. 1 . . .
Templo de Afiréa, com fimulacro da 3ufiga.
-
{ . ' ' '.' s .5ahe
. . . . .AMarefia:
. .. . . '”..;``````.
.. .. ... . . . .. . . . .
Maref. C Om ' eftas embrulhadas , de; Palacio
党 . \-a anda tudo tão mexido, e remexi
do , que eftou vendo como fe ha de fahir def
ta mexuda: o que mais finto… he dilatar fe o
nofo embarque por caufa das traições do Se
º nhor Polibio, que fem alma nem confciencia
quiz tirar fangue donde o não havia : pois hei
de regalar-me de o ver pernear. tº . ..
º
* - *: * * * * Sabe Caranguejo. " ., eº
Carang. Aqui fe pagão elas: vês como o teu
peccado te trouxe por teu pé ao miferando
•*• fupplicio no Templo: de Venus ?., si,
Mare Que dizes ? Ete he de Venus o Templo?
Carang. Afim dizem os comtemplativos.… :
-Maref. Pois á Eftatua de Venus he daquella fºrte?
Carang. Sim , Senhora; mas não me admira
que não conheça a Venus quem não quer cafar.
Mare/. Vcnus. com os olhos tapados, mais me
parece Cupido, que Venus.
Carang. He que a formofura tem o amor nos olhos.
A4aref. Mas fe he mulher, porque traz efpada ?
Carang, Por amor dos virotes que dá na 紫
-..." 4
346 As Pariedades 3.

'AMaref. E as balanças que fignificáo ?


Carang. He para pezar as finezas; mas adver
te, que aquellas balangas náo tem fiel, por
que todas as Venus são falfas. -

Maref. Ora muito me contas. s …


Carang. E tu nada me dizes do cafamento ?
A4aref. Verdade he que já fazia tenção de cafar.
Carang. Filha, as tenções livrão as almas, mas
náo os corpos... _ . ' “ ' . . . --
Maref. Eu fim cafára comtigo; porém não fei
que te diga. ... . . . .
Carang. Não fei como a Marefia te não faz
…vomitar tudo quanto tens no bucho.…
Mare/. Náo fei como és; náo fei, que te fal
ta, para feres de meu goto. - -

Carang. Nada me falta , porque o teu rigor


...me tem acabado. - - - * - -

Maref. Acabado fim, mas não perfeito.


Carang. E plufquam perfeito: ora dize, leve o
diabo paixões, aonde havias tu achar quem
mais te quizeffe? Por ti fendo muito limpo,
me fiz huma porco ; ti me fiz cadeira de
abraços, para ter pé de te poluir; e finalmen
te por ti me amortalhei em hum : craveiro de
º cravos de defuntos, para renacer como bicho
de feda no capulho de teu agrado ; e fe tu
do ifto te não move , vê 蠶 que forte me
ºueres, que para tudo fou de cera. "…
:t . . . . -
º -
. .- * - - * .
* .
sde Protea. , . 347
- - , canta Caranguejo a Jeguinte …
º * : :"... . . ; ‫و ﺍﻭ رﺍ ﺑﻬ نﺍﻡ‬ A.R.1 + A ‫و‬ - 「 や ら "
Tomára fazer-me , 'a g... , . . . .
- -. . Em mil pedacinhos, º, tº . . .
Por ver fe os carinhos .
Te poffo colher : : ...:..' , , ,
--e-- , Se queres, me ver ... ... _ . . . . ..~, ,
- Gigante, aqui etou: Faz fe Gigante.
-,, Về lá como fou . . .. . *
- Afim tamanhão ? : ~~~~ , ,
. Se ques que me abaixe *
Serei hum, Anão. . . Faz-fe Anão.
Mas não , Anão, não, … . . i. .

- ? Que Anão he agoiro, º .. .…… --------

Serei tamanhão... … Faz-fe Gigante.


s
-
Se afim náo te agrado,
Serei degraçado, ,
Mas não feanchão. ,, , , , , , ,
-- * . . . . . . . .. .. .. . . . - 24 * .
Afaref. Bafta com tanto defengonçamento. Mas
…ai, e{pera, deixa-me efconder naquelle canti
inho ique lá vem hum homem correndo a qua
tro-Pés, muito afrofurado com huma faca na
. máo. ºf e- jij:
Carang. Efpera, aonde te vás efconder ? ;
Sabe. Proteo com hum-punhal na mão.…….
Proteo. Junto á ara do, facrificio de Aftréa, me
occultarei, e com eſte punal mararei o barbá
ro executor da jutiça, quando intente tirar a
vida a Polibio. . . ' . ' . . . . . . . . . . . , s
Carang. Ah cafo igual! Senhor, vens-te metter
na boca do lobo? Já que te Hanfomal em
• *** - .bºon!
348 As •Variedades
Ponto tão pontualmente para efcapar das gar
ras de Nereo, como lhe queres agora cahir
nas unhas ? Para que Senhor *******
Proteo. Ou para matât , ou para morrer ; que fe
hei de perderº a Cyrene, que importa que
perca a vida ? ; 13 * 。 *い。 。「い

Carang. Ainda afim, aquillo de viver he bom


*** pata a -faude. * ** - - - -

Proteo. E tu como pudete efcapar acompanhan


do-me tambem ? - "… "…
Carang. Pelo privelegio de louco, que he mui
-" 醬 que fe eu tivéra entendimento, don
e etaria a etas horas ? , ºsº
Proteo. E. Cyrene, (ai de mim!) que diz?
Carang. Ela ali vem, e Dorida. * *
Proteo. Occultar-me quero, como diffe. Amor,
fe és Deidade, favorece os meus intentos.
Afronde-fe Proteo junto, á Eftatua da 3ufiiga;
e ſahem Cyrene accellerada, e Dorida de
*** * * * *-*.* tendo-4. tº tº .
3Dorid. Cyrene, que exceo he ete? Náo atten
*** des ao teu decóro? Aonde caminhas precipitada?
*Cyren. Dorida, não etou em mim; que que
*res que faça huma defe{perada, huma aflicta,
e huma infeliz?· · · ·ibt , ! ♥
JDorid. Retiremo nos antes que fe horrorife a
Pº vifta com o funeflo ੰ de Polibio,
que já caminha para efte Templo de Atréa.
Cyren. "A ifo mefmo he que venho, não por
ver a fua tragedia, mas por impedir a fua morte.
*Dorid. Para que te empenhas em hum impofi
"vel, quando Nereo impelido, não fei de que
* - - - OC«
--~~~
z ... de Proteo.', 349
occulto fentimento intenta, vingat-fe , na fus -
vida ? Porém já occupados os pórtiços de hu
ma immenfa turba, mal nos poderemos retirar;
. . . . Tocio tambores. . . . .
Carang. Grande trovoada fe vai armando !
Cyren. Ai que a vida ferme vai acabando! Nem
Proteo apparece para maior pena minha! Que
farei fó,e affiiéta em tanta multidão de pezares?
.Sabem ElRei Ponto , Nereos, e depois Políbio
com guardas ; e fahe. Mareia, donde efta
va eſcondida. . . . . .
Ryi. Com efeito não tem apparecido Proteo ?
ereo. Parece que a terra: o tragou por caftigo
de ſeu delicto. .. , , , , , , ..
Rei. Ai Proteo ! Quem pudéra..... Mas não,
não merece piedade hum filho, ingrato. -

. . Nereo. Agora verá Proteo . ' {e pੰarਂ


Políbio , que nas Aras de Atréa hoje ha de
fer vičtima de feu rigor. , , , ei , a , asso
• º : ^ ſſi tſ . く。 .*, *.
Canta Polibio 4 , Aria, e ºJºguinte…,
º

*
...” . . `... ·::º : . . ·· · · 2) `q c`~ (`` ぶ。
к є c 1 т А ц» і о., - ,,
- * *

*** - ,, * * t.* * * ºr . . 、 "Nー


Atrés sobetana, , , ,
Sagrada filha do brilhante, Oyimpo, ; , ","
Como afim confentes que huma innocencia
- -* *
Profane teus altares......' ーr ſ e: 、 .。
-

No impuro faćrificio , 3 , s, t q} அ1. * :

號as jáineender, hoje intenta huma impiedade 22


ſei; infeliz, que como és céga ...
Não verás da fentença a iniquidade; ". . U
.
* .
-

/ -

35o As Variedades -

· Ohve ao menos os mizeros clamore, º -sa i |


EDeta inculpavel vida, , , , , , , , , , f .
Pºis não pede a jutiça, " " " … .
Ver no Templo de Atréa huma injutiça.
" " ' ". 5 ºf A. R. i A. : " ' ' '
2’
' "" -
* ■*;
Se o resto intrumento,
Que vibras ingente º
º Bºhប់ក្ocente -

*** Caftigo não he: …" : --~ *


*** Impávido
Ao diiro fupplicio · · ·· · · ·
vou. * * * v

* * * * * * Não fujo, não temo º


tº ಶ್ಗ '' - -

- Que a rigida epada


، ، ،‫ان‬:: - ಘೀ -

* Já mais penetrou.", " "…


9uerendo Polibio caminhar para a Eftatuá de
*** * Aſtré4, o impede Cyrene.
Cyren. Aonde vás ; Políbio? Epera. "
Polib. Quem me defende? . . -

Cyren: Cŷrenë fe ampâra. ** -


Rei. Tu não pódes impedir a execução da jutiça:
Nereo. Execute-fe a fentença. *
Carang. Embargos temos. á part.
Cyren. Não póde executar-fe a fentença; porque
fendo falfa a culpa, não póde fer a pena ver
dadéira. í F…" * * * “ -

Nereo. Se ele a não contradiz, que mais evi


dencia póde haver ? Morra Polibio. -

Cyren. Polibio' eftá innocente; affirmo que me


náo, podia offender. - * - * - * -
Rei, Porque º - a tºº... ."
Cy
r º. 35t
º de Proteo. *

· Qyren. Rompa-fe o filencio por huma vez, á part.


Porque he meu pai. .. … . ... ." . ,
AVereo... Rei.. Teu pai Polibio?.Que dizes? ..
Polib. Cahio a máquina de minha idéa. Á part.
Cyren. Senhor, meu pai he Polibio, não o duvides.
Polib. Não fou pai de Cyrene : não dilates,
Senhora, com effe engano o teu Hymenêo;
deixa que eu morra; que pouco preço he hu
ma vida para comprar hum Reino." .
Rei. Que mais podia excogitar a tua induftría
para libertar a Polibio ? -T _ -

Nereo. A ſentenza ſe execute ſem dilazáo.


Cyren. Soberano Monarca, não são induftrias
da idéa, são realidades da natureza; Polibio |
he meu pai. Te & e º . .. . . .
Rei. Como póde ifo fer fe tu és filha delRei
de Beocia ? , ,. . . . º
.... . ... .

Cyren: Attende-me , e faberás: Náo' ignoras as


revoluções, e 嚮 que houve, em Egy
º pto, aonde Polibio foi cabeça de huma par
cialidade; e como eta ficae fuperada, fe re
º tirou a Beocia comigo, e ahi me deixou oc
culta em a ruftica montanha de huma Aldêa ,
', para que o furor inimigo náo triunfaffe de
minha innocencia: pafou Políbio a Flegra a
fervir-te, como fabes, a quem défte o cará
éter de Embaixador" para Beocia a conduzir
a ſua Princeza para eſpoſa de Nereo: che
º gando · Polibio á Beocia : achou º fers falecida
:
aquella -Princeza, tambem chamada Cyrene;
e diffimulando o motivo, me trouxe a mim
para Nereo; querendo com eta induítria ver
me coroáda Princeza. Pro
~,

፰5:ሯ As Variedades
Proteo. Se ferá:illusáo.o:que ouço? ~ r á part:
Cyren. E já que efte impenfado acafo defcobrio
ete engano, a teus pés, Senhor, eu e Poli
…bio pedimos perdão deta temeridade, para
…que hum delicto verdadeiro feja indulto de ou»
. . atro que o náo he.… * * * * -
*

Rei. Ha cafo mais extraordinario ! , .


Nereo. Nem alentos tenho para refpirar.
Dorid. Prodigiofo fuccelo! : - -

AMaref. Quando eu vi que tinha o fangue ver


melho como o meu, logo duvidei que fof
ferde ſangue Real. … - … á part.
Carang. E o que mamou de Altezas à chucha
o calada ! . . .. . - r á part.
Polib. Deta forte, Senhor, conhecido quem
12 fou, bem fe vê que não podia intentar a
morte de Cyrene. - * -

Rei. Pois como tinhas o punhal na mão ?


Polib. Porque querendo mattar-me Proteo, Cy
- rene commovida do amor de filha, fe met
-:teo de premeio , e cafualmente a ferio Pro
teo;ic ficando o feu punhal por outro feme
- lhante incidente na minha mão. -

Rei. Quanto defe crime etás perdoado; mas


, não ficará fem catigo efe que maquinafte
-cº para coroar a Cyrene. Dize , atrevido, e in
::: fame, Polibio , como, fabricafte táo perniciofo
- engano em ludibrio de minha Coroa, perden
* do por tua caufa Proteo a Patria, e eu a fua
*- º companhia 2. !. - ſs s .. f. -

<Nareo. Deixa, Senhor, que eu vingue effa of


fenías Pois eu era o alvo do feu engano;
-
. . - *, &
de Porteo. . . 353
e afim, fementido, barbaro, traidor, em
meus braços....
\
Ao accommetter Nereo a Polibio , fahe Proteo. % \

Polib. Não ha quem me feccorra ?" … * . .A


Proteo. Proteo te defendera , ſuſpende o furor,
Nereo. - * - .
Cyren. Oh extremofo amante! ” á parte,
Xei, Proteo , és tu , ou he engano da fántafia
Q
o que vcjo ? : . . . - - - - - - - -

Nereo. Ainda intentas amparar a hum traidor ?


Cyren. Nereo , fe acafo aquelle apparente nome *
de efPofa póde conciliar no teu peito algum
afecto indifciéta
:buma , rogo-teamibição.
que releves
^ os exceos de ** . . . . .x *

Nereo. Ainda te atréves, fernentida, tyranna,


a lembrar-me o nome de efpofa ? Por if(oin- '
tentávas com cautelas que te adorafe como
bella, e não como Princeza ? Pois agora, que
não variei de fytema, não fendo tu quem
eu imaginava, defprezo a tua formofura, por 3.
- náo fer adornada de Mageftade. ** -

arang. Elo mimo quiere la mona. i.


Proteo. Pois na minha efimação tanto val a for
mofura de Cyrene, como a mais egregia Prin
ceza; e afim, Rei, Pai, e Senhor, a teus…
pés proftrado te peço, me dês a Cyrene por
efpofa, que fuppoto não feia filha delRei de
Beócia, o nobre fangue de Polibio , e a fua
belleza , pódem compenfar thum incidente da
fortuna. * * .. . . . .
Rei. Que dizes, Proteo ? Enlouqueeſte acafo
Proteo. Se me negas eta ventura, com ete puº
Тот. И w Z nhal
354 & As Variedades -

nhal, me tirarei a vida, pois fem Cyrene


tudo he morrer. - - - •! :::>rr
Rei. Eva Dorida como feo ha de fatisfazer º ge.
IDorid. Aº vifta daquelle extremo de amor , que
pole epetar? Logre Cyrene ela fortuna. L ,
Pei. Como Dorida confente no defejo de Pro
.teo, Xe Nereo demitte: a Cyrene , náo pofio',
difficultat atna fupplica: Cyrene he tua, Proteo.
Proteo. Amada Cyrene, na tua beleza oomfigo
o maior imperie.i ... ... :: :: :: :: :: :: … , “f.
Cymen. E eu no teu amor a maior fortuna." "3
Polib, Sempre fe logrou o meu intento: dihofa idéa!
Rei, Dorida,...fe acafo quizeres que Nerto {e
ja teu feliz efpofo , com efa dita (e alcan
cară bmm complete prazet. 3, i ri? o v...
Dorid. Não poffo refitir ao teu preceito..."; º
Nereo. Nem eu deixar de agradecer efia bene
volencia, quando achei em tiº a qualidade ;
que fó ladoro dunida á tua belleza. 3.…..o …
Carang. Martifia, eueres tu agora facrificar-te, a
cafar comigo por de cargo de tus conciencia º
Afaref. Mais val hum ruim concerto, que hu-º
ma boa demanda; anda cafemos, que ao me
nos em hum marido tenho hum efcravo, art.
Carang. Pois então leve o diabo paixões; todos
ficáó accommodadas , e fatisfeitos com as £ua
confortes, e Proteo mais que nenhum , pois
"com as fuas variedades, e mudanças, nao trou
a maior firmeza nosº atmores de Cyrene, ….'
Proteo. E já que os fados profperárão os meus
intentos s repita outra vez o alternador acccn
ro em fetivos jubilos. * 2.
& - . . c0
_de Proteo. 49s
﹑丁廷q
с о як,
† о.

1. Coro. Em hora ditofa : " " .


Venha Cyrene, - -

2. Coro. Em hora fetiva ; , ;


º Dorida venha. … … .. ..….. I c.
1. Coro. A fer de Nereo , , , , , , , ,- -

2. Coro. A fer de Proteo ,


Ambos. Epofa feliz. - — ---------
1. Coro. Os prados com flores,..
z. Coro. Com perlas os mares, . . --

Ambos. Os Sceptros efmaltem


• *. º -- - - ***... •º - -
º : "", "Y"
* * * *** ,
· “De eterhoºmatiz. 9 ' ' ** **'s ·
- ...sº . . . . º º * , * - … * > . v,ʻ‘ sº . .. -
*
º
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* * * - * .
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356; .**** *
P. R. E. CIPICI O
“ о к“ -

в А в то N тв,
'O PER A QUE SE REPRESENTO U:
no Theatro do Bairro Alto de Lisboa ,
no mez de Janeiro
***:
de 。1738. ... . . .

AR GUME NTo.
Т Ages, irmão, .de Tirreno, Rei de Italia ,
ufurpa efte Reino, o qual pertence a Ege
ria, Ninfa do Eridano, e filha de Tirreno. Fae
tonte, filho do Sol, e reputado por filho de hum
Paftor de The[/alia , vendo o retrato de Egeria ,
rendido lhe tributa orfeu amor; e para melhor
o dar a conhecer a Egeria, fabe de Thefalia,
e fe occupa na Italia em acções do agrado deta
Ninfa; por cuja caufa fabê de Thafalia o Ma
gico. Fiton em feguimento de Faetonte, para o
defwiar defe amor; por quanto ainda nefte tem
po ignorava Faetonte o feu verdadeiro pai, e
Fiton lhe receava a ruina, quando o chegafe a
conhecer. Eftabelecido Faetonte nos agrados de
Egeria. efia para reftaurar o Reino pelas ac
ções daquelles, que a pretendião , para efte fim
afa occultamente prometter a mão de efpofa a Me
cenas, e a Faetonte, em que confiftem os maio
res lances defla Hifioria. Albano, Principe de
Liguria, pretende fer epofo de finene,
º :: *.*
*: e
-:

357
de Tages. Efte, quando Faetonte fe declara fi
lho do Sol, o pretende para efpofo de Ifnene",
e para o de Egeria a Albano, os quaes fingida
mente fe decláräo amantes com a # dos ze
los. Apparece Apóllo, e declára a Faetonte por
feu filho: efe lhe pede faculdade para gyrar na
caroça do Sol. Reffie Apollo; porém inftando
Faetónte , lho concede , e efle depois, á vifta de
Egeria fe vê precipitado no Eridano. O mais fe
verá no contexto da Hifloria. . . . "
-º-'. -

I N T E R Loc U T O REs. “
tº ºrº " . . .. º... . . . . .
Faetonte, Filho do ſol. . ; , , . . . ... :
Albano, Principe de Liguria.
Mecenas.: · ¿ ¿ . ” ' ' ' . . ., …
Tages, Rei. -

Fiton , Barbas, Magico. . ..


Chichisbeo, Criado de Faetonte. : *- : *

Egeria, Primeira Dama , fobrinha de Ta


ges. ~ ~ * * : *, *, *, *, *
Ifmene, Segunda Danta, filha de Tages.
Ohirinola , Criada de Egeria.

º
! - . . “A - - - - SCE
$48 -

. . .. . . . * : *, * * ** * * : * ~ * º *
* ..

* * **
* ----------> * * -

... . . . . SCENAS DO I. ACTO.


º . . . . .. . .. . . . . ." “. . . • . . . . .

-I, Bafque fromdof, nas Ribeiras do rio Eridano. i


II. sala. . . . . . . “ ' • ·· -

III. Camera. '


-* ** * --- ** **** * * *
*
* *
- '' ' ' ' ' ' '
* ,
-
,t -

-
• *, * *
.*** *
-
t
*

SCENAS DO II. ACTO... º ' '


T. Sala. --- ***------------- -- - - -- --

II. Selva.a @ r -- c, ( , : ;: i : , , , * * *
* **
* * * * *

III. Gabinete bem adomado. • *

IV. Templo de
-
Hymeneo. º
-- ** * * * * > .. . . . . . *

scENAs Do III. Acro. '


1. Camera. º.º.º.
!: ಸ್ತ್ರೀ. ; ., ; }\. .
___ • . . ‘. . "
- ſº
· III, ºBofgue,
sº.
como no principio.
*
-

* * * .*.
a.
** **
* * *
** *
*', r s
***
º *
.*
*.
º * ~*
* * *
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-** º -
* **
" .. : $ ) tº- º

v
Precipicios de Faetonte. & 359.
; ㎝・・ ・ …e g s、()
* **త్రికఃఖ-ఢీ:®: º, ſº tº r + i tº ºt,

нэр A RT E"I. : , f>tt? .;v


s с. É N Á 1.
Bు frondofo nas Ribeiras cdo rio Brideiro.
m quanto Faetonº canta º feguinte Recita
do, irá fahindo Egeria em huma cantha tira
da por dous l)elfíns... …" : crº
*,
в ѣ с к т л о o. . ...
- tº ºccº ſº. *:::: *
Faet,, - Geria! peregrina 3 * * * :)

... It, Do agada Eridang Nimfa bella ,


Deixa o ceruleo, errante, trono vago,
Em que habitas Deidade; "… A
Que fe aguas procuras em taes mágoas
Vem a meus olhos, que tambem tem agoas.
-- 3 , , , , , , , Canta o Coro.'s va e a e N.
- Alenta, refpira, • * : * > . . . . -

Galhardo Paftar , . . . . º
Pois vês, que a teu: ************ สรุงโ*
-Partido. ੰ டி. * ് ." 2"。
Se abrazáo as aguas, es ecºs º
Em fogo de amor..……. º , º cºm 4
tº - . …? stººl . . . . . . . . cº º A.
Faet. Se da Italica esféra : : s ...
Tutellar Divindade te appellidas ,
Ampara hum peregrino,
- f * * Que
\

. 360 .: Precipieiosi: i
Que a teu facro Eridano facrifica
# 3 Outro rio em feu pranto : oh quanto temo,
' Que unido o facrificio á Divindade,
Se inunde o Obe em liquida impiedade!
* 3. , : co в o. . º:
Alenta , refpira,
Galhardo Paftor , &c.
Faet. Outra vez, e mil vezes º s㺠º
Te bufco ſimpaçiente, . **
… * . Por ver fe rigorofo meu defino
Nos influxos brilhantes de teus raiosº
Acha feguro afylo, e o pafo errante
De humanimo contante -

Encaminha propicia, porque vejas,


Que idolatra ºnuméral em vagos gyros à
. …" Tantos os votos, quantos os մufpiros.
«о зае: , . asй с о к о. 23 _

Alenta, reſpira, i si
2 · 3.tr Gadhardo Paftor ,, &c... * * * * *
; :*
، ‫ يذة‬. ‫ د‬:: . . . .. . . . . -----,
." * \ -

canta a do
ria , eclaufula
A efta ultima figuinte Aria , e Ege
Coro, defembarca ſ

RE c t r Ai Dio
Hum peregrino affe&to : egg . *{
Me occupa o coração, quando cinquiéto;
Nem as águas do mar, ou meus fufpiros,
Surcando em dous mil gyros e, -: * *

Me deixão refpirar, porque em meu peito


Me abraza o cégo ardor de amor perfeito.……
‫اژه‬ ‫ به راههای‬.vii 1 " :
. : ; I്. :്.
А к 1А
. . . . . . *

de Faetonte. : 361
, , , ' A R -1 ‫م‬. . . ; : , , ,.*
-- i > … Não fei que novo afecto * * * *
Sinto no amante peito; …… …
x …Só fei; que o feu efteito i ' ' ...º '.
Me obriga a te adorar. , ,
. . .. . … º Do, teu doce attractivo …" * ".
… , . Já º fente o amante peito ; "> ..… º
E á vida não compéte ‘. . . . . .
Goto mais fingular. * * * .* .
- - - • * -

Eger. Errante peregrino, a cuja vita commovi


do o Eridano divide o crytal de fuas aguas,
para multiplicar a tua fórma nos feus efpelhos;
que incognito attractivo occultas em ti, pois
até eu como Deidade detas aguas, te eftou
amando, fem faber a caufa porque te quero?
Faet. Não fei, Egeria , não fei; pergunta aos
Aftros, de cujos influxos fe origináo, as fym
- patias: fó fei que haverá tres dias, que oc
- culto me tens inefie frondofo bofque', 'verdes
obeliftos do Eridano, mais como foragido,
que como habitante.o , … ” ' ;: . . .

Eger. Tambem fabes, º que era todo efectem


não merecêráo os meus agrados arrancar
-- do profundo filencio de reu peito quem és,
• e a caufa de tua peregrinagäö. . ' '^ ;
Faet. Náo ſei mais de mim , que ſerhum Paſ
…tor, com efpiritos tão altamente, nafcidos, que
:f intentáo · competit com os Deofesiimais, bri
lhantes do · Firmamento. > ·= ',2 - !
Eger. Como pódem ein hum Paftor caber ráo
o s altos pen[amentos?..… : ru… ... aº us ::
v Paet.
462 º Precipieio
Faet. Porque a alma, que me anima , ou não
|
he defe corpo, ou efte corpo não he daquel
la alma. tº a tº . . ; ,

Ager. Dize-me ao menos o teu nome , e a


|
tua patria ? . . . . . .
Faet. Faetonte he o meu nome, e a minha...
Eger. Efpera:Faeionte te chatnas? Ai de miin ! á p.
Faet. Que tens, Egeria? Afuflou-te o meu nome?
Eger. Sim, Faetonte, pois ao ouvillo pronun
ciar ,'ವಿ' 蠶 em hum vivo "షి
,:Faet. Em fim,
… em tudo, Senhora,
Thefalia 蠱 tue — té „O
patria. edeş3.

Eger. E, porque della le apartate ?


Faet. Ai de mim! Quem pudéra declarar-fe!á part.
Eger. Emmựdeces? :| , , , - ,
Faet. Como queres (e contivefe em Thefalia
o hum côvação, que não cabe em todo o mun
…a do; pois lóo nas ethereas Regiões, terá limi
-… teua mimba ambição ? º' : z º.º.
Eger. Agora entendo, Faetonte, que algum pro
. picio Numen te conduzio a Italia , para feres
venturofo intrumento das minhas idéas; pois
-#fó os teu valor, e a tua ambição poderáó fuf
nº pender a roda de minha infaufla fortuna
Raet. Pois em que te dilatas? Propôe, galhar
da Ninfa , que a teu refpeito ' ( fe peceffario
- for ) roubarei aseluzes ao Sol, a Neptune o
sufo, tridente, e, os raios a Jupiter, para que
-ı com rgnies, tridente , e luzes, pofı triunfar
do Sol , do Mar , e do Empytgo. …
« Eger, já qué a aktivez de reusèpenfameutos me
Perfuade a minha ventura, fabe, que eufou
al
de Faetonte. .363
a
- ., a infeliz Egeria, filha de Tirreno, Rei que
| —, foi deta Região; o qual deixando-me pupil
la debaixo da tutella de Tages, feu irmão,
e meu tio, efte tyrannamente me tem ufur
o pado o Sceptro, intentando perpetuar a minha
Coroa na fua defcendencia , fazendo com que
Ifmene , fua filha, feja herdeira de minha for
tuna, cafando-a com Albano feu fobrinho,
Principe da Liguria. Ah cruel Albano ! Ah
falo amanre ! - í p4rte.
JFaet. Que foffiáo os Deofes femelhantes
Ager. Albanq pois , com as armas da Liguria
... intenta fegurar o throno de Ifmene; e alim
- defwallida, e fem amparo, confintº etavio
lencia, efte attentado, e efta injuria, até
que o teu valor, animado de tão altos efpi
ritos faiba fegurar-me o horno, que me utur
pa huma tyranna , para que ambos configa
mos, eu a minha Coroa , e tu aminha mão.
_ Faet. Pois eu , . Egeria , hei de fer Rei de Italia?
Eger, Cuidei que perguntavas fe havias, de
fer meu efpofo. .. . . ․ . . ‘‘
Faet. Sem o caracter de Rei, teu είpoίo como
poderei fer ? , , , , , , , , , , , , , , ,.. "
Eger. Sim poderias, pela violencia, com que
... me attraheº teu nome ; e a tua pefoa; e
pois da minha parte etá o amor, steja da
wº tua a fortuna. - - ºf . ºf -

- Faet. E para que a tua fe etabeleça, difcor


ramos o meio para a confeguires. , , , ...
Eger. Não acho outro mais eficaz que feres tu
homicida de Ifmene, e eu de Albano, para
- - - - que
‘364 Precipicio
que de huma vez fe correm as efperançar de
"º reverdecer o laurel nas fuas cabeças; pois ex
e º tincta afim, a etirpe Real, por força me ac
* clammatáó Princeza hereditaria.
º Faet. Não feria melhor que Albano ficaffe ao
*", arbitrio de minhas iras, e Ifmene ao das tuas,
para que na igualdade dos fexos ficafe fem
perigo a refoluçáo ? "
º Eger. Não, porque fe não ha de prefumir, que
"huma mulher haja de fer homicida de hum
homem; e afim no maior disfarce (e enco
** brirá o maior veneno; e pois neta quinta vi
finha ao Eridano vive El Rei, a ella te enca
– "… minha aonde efpero introduzir-te. Mas ai, Fae
º tonte , não feife me fabetás correfponder!
- Faet. Não fabes que a infidelidade não cabe
"… em meu peito ? E fe me não acreditas, fede
*#: me teftemunhas vós Padre Eridano , vós ce
- º ruleas Ninfas, que neffes pelagos habitais, de
que já mais ferei infiel a Egeria; e fe o for,
permitti que ejáo as volas aguas os fica es
do meu delićto. º
Eger. Bafta, Faetonte; mas (ó te advirto, que
has de fer o homicida de Ifmene. . )
Faet. Para que me lembras efa circumflancia?
Eger. Para que não aches defculpa na fua formofura.
Faet. A que eu adoro he objecto tão peregrino
que não admitte hofpedar-fe em meu peito
'" outra qualquer beleza; e afim a de Ifmene
, não poderá fer remora de meu impulfo.
Eger. , Não me deſvaneças com affećtados pê
* #riodos. " *- … , "; ;: -, , ," .
* *z. -

- • F4¢t.
de Faetonte. - 365
Faet. Que mal, cntendes aonde fe dirigem os ,
meus fufpiros! á part. Mas tambem adverte
que has de fer homicida de Albano. . . .
# Eger. Para que me ratificas o que eu fei?
Paet. . Náo fei o para que ; fó fei que Alba-,
no he Principe,, e podcrofo ; e tu defvalida ,
e fem amparo. . . . .- -

Eger. Só no teu braço feguro a minha fortuna.


Faet. Pois , Egeria , a emprender. . . .,.,., ,
Eger, Pois, Faetonte, a confeguir: mas lem-A
bro-te outra vez , que has de fer Monarca de
Iralia, e que Ifmene he formofa ; cinge a v.
. Coroa nos olhos, para que fejas Cupido da
tua ambição, e não do teu amor. .. .
-

: * - . .. . . ‫ن‬. " ‫أ‬ . ‫أ‬ e * * *


Egeria , e. Faetonte -4 Jeguinte
, Cantao '• ‘

А в л л о w o. ', ' • *
。“ノー”。ざ 。 * .4: * ~ **

Eger. Se acafo a formofura ، : {


O golpe te fupende , , , , * ,
- . " Na Tufpensão aitende ` . . . . . . .
Aº gloria do reinar. . . . . . . . . . . .
Faet. A” copia, que idolatro . . . . . . . .
- Tributo extremo tal, , ,, , , ,
- Que íó no original s . .. . . . .
Me poſſo retratar. . . . .” -
º,
Eger. Oh Peço-te não fejas,…, , , ,, º
A tanta fé traidor!…] '; e , , …;
Faet. Oh rogo-te que creias . . . . . . .
As véras deffe amor. ºx: ' '. º * .
Ambos. Que affecto tão contante . . . . .
Mudavel não ferá.….… . . , , , ……
- - Eger,
;
366- - Precipicio
Eger. Na fé que the pomettes º
*** - Socega o meu cuidado:
ºn -
Faet. O meu amor protrado
. Fiel ferá comtigo.
Anbos. Fois vê com fegurança
· ······ “No ben , que ámaníe figo, ''''
A gloria que terá. Vai fe Egeria.
Dentr. Por aqui foi; fegui-o todos. - º
Faet. Que rumor ferá ete? Será conveniente
-occultar-me. ് -

Efronde fe : Faetonte , e fahe Fiton com ham


livro na mão, que ao depois o lançará no
chão, e fe defpe.… º " ' • < …
Fiton. Aonde achará refugio hum infeliz? Def
pojar-me quero defta' recopifada feiencia , que
inutil, me não ampara; e, para que mais dif>
farçado pola efcapar dete barbaro furor, ferá
precifo mudar de trage; e ainda que me pren
dão, dizendo que não fou quem bufcão, dei
xarei ao menos vacilante o feu intento. Oh
{ciencias,até quando deixareis de fer perfeguidas !
Dentr. Vamos ao Eridano. -

Fiton. Oh tu frondofo Bofque , së propicio re


fugio de hum defgraçado , occultando-me em
teu verde labyrintho. Mas quem eftá aqui ?
Ao bir efronder-fe , emcontra-fe com Faetonte.
Faet. Que vejo !' Tu náo és Fiton ?
Fiton. Faetonte, he pofivel que te encontro?
Faet. Náo te déixei em Thetfália ?
Fiton. Sim;, mas como foube que precipitada
mente vinhas a Italia a buícar o original da
- quel
de Ftetomte. 367
la copia, que cafualmente veio ás tuas mãos,
foi precifo feguir-te, para que te não arruinaf->
- fem os teus penfamentos.3 Oh nunca , te eu
difera que em Italia habitava efia formofura!
Faet. Pois já que eftamos em Italia, º porque
ime não declaras quem he effa foberana bel
leza? Para que me occultas o original de táo
bella copia, quando vês que vagando por ef
<tas regióes , venho louco amante a verife
encontro o idolo, que adoro em fombras, e
me abraza em chammas? ; : . . .. .
Fiton. Faeronte, convém á tua confervação o
ignorares de quem he o retrato; pois tenho
alcançado pelas minhas fciencias Magicas, e
Atrologicas, que o original dea copia ha de
fer... a caufa do teu precipicio; e "Ye longe do
(perigo te recatei o dizer-to , agora qud' eftás
perto do damno , como to, podereit declarar *
Faet. Como? Defta fórte: arrancando-te do pelº
to, o coração, já que não polo o fegredo,
que me occultas. + +* v , -
…i t.

…. Luta Faetonte com Fiton. ; , , , …


Fiton. Louco mancebo, que fazes ? : #; - #
Dentr. Cercai, todos efe, boque. º sº. --
Fiton. Efpera , não queiras, que ambos aqui
pereçamos, pois feiº que eta tropa ºvempa
ra, nos prender. Com efte engano retorvarei
o ſeu furor. * (; º . \ ' á parté.
Fuet, Deixo-te com vida, para em melhor oc
cafião faber a caufa de meu precipicio: anda,
. . .", ºn * * ** • , /ai-fe.
Pitou. Vamos, que por mais que te empenhes,
o não has de faber. Vai Je. $4
368; Precipicio
..….… … ? Sahe Chichisbeo, ºcº , º
Chich. Ora fou bem afno! Mas não tenho ver
Igonha de o dizer: que venha eu palmilhan
do defde Thef>lia até aqui atraz de hum lou
co", ou de hum Faetonte , que tudo he o .
me{mo! E o peior he que me defencontrei
delle, e ando perdido pelo moço ! Que ha
de fazer o pobre Chichisbeo, poíto no cen
tro de Italia, fem faber aqui aonde são as
cafas locandas, e o que mais he, fem qua
trini ? O que me val he fer eu Chichisbeo ,
que terei entrada franca em toda a cafa. Mas -
que he lifto que alli etá? Ora vejamos: oh,
he hum vetido que «ftá defpido: ora fabia
-Deos que já ete meu etava por hum fio:
de me chegará ? e.Vejamos: bello! jutamen
te! Alguma alma algebibifta fez compadeceo
da minha piranguice. Olá, temos mais hum
livro? Não ha duvida, he livro ; º eche de
razão que o veja: ora bem dizem, que em
Italia nafcem os livros, como º nafcem as mal
vas: vejamos ſe achamos nelle alguma cou
fa, pois dizem que tudo fe acha nos livros."
AÍentafe, e conteça a folhiar o livro. Abra
imos, e vejamos o que contém : Liber, afiro
lomagico: Irra!… Magico ! Pafia fóra: vejág
1á que materia tão peçonhenta contém o tal
livrinho! Libera me ! Ora ainda aſſim, ſal
va, a confciencia, vamos vendo o index re
lum notabilium. Capituto primeiro, de fifono
$imi43 quod eft marigorum confrontatio : ifto
hatºde. fer galante.、 、Capitulo

fegundo,
:- - º «a út
degro
Ni
de^ F4et0nte. 369
romantia ; ifto he coufa, de negros: negra .
ಶ್ಗ he eta! Eu não quero ver mais, que
fe me vão. arripiando os cabellos.
Pao fabindo por detrás de Chichisbeo Mecenas ,
* eー" :: e: osd Soldados... ' * ^ :* '''.
AMecen. Aquelle fem duvida he oNigromantico
ºs que bufcamos; vamos de manfo, e levemo
-ºlo prezo, com o roto tapado para que nos
-" não ofenda com algum encanto. . , !
Chich. E o diabinho me etá dizendo o que tor
ºne outra vez a abrir o livro: fórá tentação;
- não ſei ſe conſinta nella. ; : -

Chegão os Soldados, tapão o rofio a. Chicbif.


- beo, e o vão levando.
Mecen. Levem-no deprefa, , tr: ; ( . .
Chich. Eu o différa! Fugite, encantadores, que
z-me quereis? Não me fecheis os olhos, que ain
da não eftou para morrer. − 1 = -

Mècen. Callefe ahi: levem tambem cfe livro..


Chich. Deta ninguem fe livra. -
AMecem. Vamos, vamos. :- - .. . . . .
Chich. Para onde ? Para o inferno 2 , , , ,
Mecen. Lá o verá. … º: , , ,” ºr , ,
Chich. Lá o verei, ºfe me detaparem os olhos.
* , , ºr ; ; . . . . . .. Wºo-ſe.
" : ; , ; , ‘ v - ' . -

r: . , . . . .. . .. -

- ***.*. ; : :: ** :
… ','º
rr: : : : : : : : : : . . . . . . . . .. . .
tº . . . . - .* . . . .. . . . . ;

: ; ; ; ;. '് ': ു.
* * … ." *: . . .. " . - - ‫اد‬، º! º
?Tom. II. A4 SC E
?‫סל‬ ,Frecipicio
. ‫من جهة‬ .
" , " s C E NA II. . ..
• " .
º५’, sala. Sabe Albano." "
‘ '``: '' या २:` ९• • • • • • •: .' ; ; ;
-

Alban. Uando ,\,\ó bella Aurora, has de


*.. amanhecer rifonha, e alegre a bum
- " extremofo amante , para que, nas
a delicias de; Ifmene fe: acabem as minhas efpe
ranças? Mas que diria Egeria da minha in
- gratidão? Razão tem ; fui-lhe ingrato ; º mas
s como podia não fer, ºfe amor, e ambição ven
cêrão a minha confiancia, fehe que era conf
-\tancia, contancia que fe mudou ? . . .
- Sahe Egeria. . o. \

Eger. Dizem-me, Albano; que a mão de If


mene te fublima hoje ao throno de Italia, e
· affim como, mais intereflada nos teus triunfos
venho a dar-te os parabens de tanta fortuna.
, 4ban. Que has de refponder , ingrato, cora
ção ? ... i + . . í á parte
Eger. Quem já poderá refitir a teu poder ? Se
· aos dominios de Liguria , unes as provincias
do Eridano, que inimigo te poderá refiftir ?
. . Como: feráo copiofos os teus exercitos !. Tra»
...ta de, erigir templos á tua fortuna , e altares
á tua bella efpofa, por não feres ingrato;
porque a ingratidão, ó Albano , he huma
mancha, que desluftra o peito mais foberano.
Albano. Bem entendo a Egeria; vou-me fem
refponder-lhe. á parte. Quer irfe.
Eger. Que he ilo 3. Te vás fem reſponder-me?
Já te.3e(vanece o futuro dominio * . Repára
*" て を * .
ao
, . ,: IIlõ=
-
de Faetonte. 371
menos, que para o refpeito , ainda que fou
defvalida ,, fou filha de Tirreno , Monarca
… que foi deta Região.
Alban. Egeria, em mim não he defatenção
º efte retiro; he compadecer-me da tua defgraça.
Eger. Bem o motras, fomentando a minha rui
na , por enthronizar huma tyranna: dize, in
rato , não promettefte defender a minha
juftiça , ou ao - menos fazer-me Princeza de
Liguria ? - - പ

Alban. Afim he; mas não feife te diga que...


Fger. Que has de dizer, ingrato ? Sabe que
já não neceffito dos teus favores, pois a pie
dade de Amfitrite me fez Ninfa do Eridano,
aonde efpero triunfar de hum tyranno, que
* me ufurpa a Coroa , e de hum falfo amante ,
que cruel me offende. -

Alban. Pois, Egeria, fe já como Deidade te


vás immortalizando", não neceffitarás de meus
º auxilios. -

Eger. Mas tu neceffitarás de minhas piedades.


Alban. Eu de tuas piedades? De que fórte.
- - Sabe El Rei Tages.
Rei. Albano, aqui fe me avifa que Fiton,
aquelle celebre Magico de Theſſalia, ſe acha
néfta Provincia ; dei ordern que mo trouxef.
º fem de qualquer parte onde efteja, para que
delle faiba os occultos fegredos, que importão
* á minha Coroa ; para que afim com mais
focego_pofa completar o teu Hymenêo...
Alban. O teu preceito, Senhor, he a ក្រៅ
vontade.
Aa ii Eger.
s • *-
372 . Precipicio
Eger. Permitão os Deofes fazer propicias as
tuas idéas. ... ? . .. . - *.

Rei. Sim farão , pois os tenho gratos com re


- petidas victimas. . . .. . . .
Eger. A melhor viétima he facrificar a razão
nas aras da Juftiça... .
Rei. Náo entendo. . . . . .
| Ager. Pois para que me entendas, me explicarei
melhor : bem fabes invicto Tages, que naci
| hereditaria Princeza de Italia , como unica
filha de Tirreno, que foi Monarca deta me{
ma Italia ; tu Senhor me tens ufurpando o
Reino , com o pretexto de feres irmão de
meu pai; coufa que nenhum direito o permitte.
Rei. Egeria, eu eftou bem informado que co
mo irmáo de Tirreno devo preferir-te , pois
tenho a qualidade de varão; e outra vez não
tornes a propor-me femelhante idéa; que di
. putar coni os Reis he crime de lefa Mageftade.
Eger. Effe he o privilegio da razão, que póde
entrar no mais iniquo Tribunal.
Rei. E{tá bem. . . .
Sahe Mecenas com Chichisbeo , e Soldados.
Chich. Ora, Senhor, bata já de cabra céga.
Deſcobrem-no.
JMecen. Efte que vês, Senhor, he o Nigroman
tico Fiton, que junto ás margens do Eridano
... o achámos, e fegundo as confrontações do
traje, Thefalico, e efte livro de Magica com
caracteres Gregos, que na mão tem, me per
afuade fer - o proprio que bufcamos. -

Chich. Ito fem duvida he algum Palacio enಣ್ಣ


.." *
- - -
5, do s
de: Faetontë.: 373
ds! Efta gente ferá coufa fingida ? Vejão lá
.-: o livrinho de que cafta he !… , … á part.
Fei. Fiton, vem a meus braços; não temas,
que em Italia terás melhor fortuna que na
Grecia. - - - - 1.
ſ.
Chich. Afim fou eu afno, que lhe refponda ;
bém fei que tudo ifto, he apparente. " á part.
Rei. Não refpondes? ". . . . . . . . .

º Alban. Adverste, que he ElRei.


Cbich. Sim, Rei por encantamento, que he o
me{mo que coufa nenhuma... -. á part.
Rei. Se náo reípondes , te mandarei juftiçar. . .
Chich. Todavia, a Magica, deve fer negra: eu
e lhe refpondo; porque aos Reis ainda em fom
- bras fe lhe deve refpeito. , , á parte.
Jtei. Que, dizes, Fiton ?, ¿ -
Chich: Senhor, que não fou Fiton; fou hum
… pobre Chichisbeo, criado de outro pobre, mais
: pobre do que eu ; pois tem obrigação de
- fuftentar-fe a fi, e a mim. . . . . -

Rei. Não te encubras, que fe , por algum deli


éto te aufenta{te de Thefalia, aqui te não pó
- dem ofender: as fuas leis; e pois tenho a for
tuna de pofuir-te em meu Reino, re efpero
º honrar, como merece a tua fabedoria.
Chich. Que fabedoria, Senhor? Eu fou hum idio
º ta: Vofa Magetade não me quer entender?
: Pois acha que fe eu fora Magico quâ Ma
- gico , que me havia deixar prender ? ' >
Afecen. Da forte que te prendi , não podias
ufar das tuas Magicas. *

chich. Poderia adevinhar, e não efiar naquellº


ficio. - - /Me
374 Precipicio a
XMecen. A Magica não a devinhar o futuro. -
Chich. Mas podia adevinharito, que me fuc
s cede i de prefente. “. . . s rat
-Alban. Sempre, foi proprior:dos, homens doutos
negarem o que fabem. -

Rei. He o maior homem do Mundo ! !


Chich. O certo he que o ponto etá em dize
rem que hum homem he -fabio, que á for
ça o ha de fer , ainda que feja hum padaço
d'afno, … :: - --
á part.
Rei. Fiton, tem entendido que etou batan
temente capacitado de quem , és , e saffim fa
berás que ha tres noites que em fonhos fe
- me reprefenta , que hum mancebo, filho do
Sol, habita occulto em Italia; tomara me de
clarafes aonde etá, para que como filho de
_Apollo lhe confagre os cultos que fe lhe devem.
ger. Filho do Sol! Quem, ferá ? á parte.
Chich, Iffo etá muito bem ; mas fe eu não fou
adevinhão, como polfo dizer aonde etá ef
fe fenhor filho do Sol? E demais , Senhor,
…º que renho para mim, que ifo foi fonho.
Rei. Ainda afim , he tão repetida eta visão,
que me perfuade não fer erro da fantafia:
Chích. Pois, Senhor, não he erro crafiífimo
entender que o Sol tem filho? Bem fei que
pela regra do Sal, Sol, ac mugil, que o Sol
he mafculino, e nem por ifo fe fegue , que
tenha filho; porque Mufa, Mufe, he fe
"minino , e com tudo as Mufas são catas:
ºrg? &c. não fei fe me explico ?
*ei. Já illo he teima: tem entendido que, ༥༠
\

de Faetonte. ‫?על‬
… has de dizer, aliàs fe acabará com a tua vi
# da a tua ſciencia. Wai-ſe.
Alban. Homem, vê lá em que te metes; trata
de fazer a vontade a ElRei. . . Vaife.
Chich. Ha femelhante, entaladura ! Querer Sua
Mageftade á força que eu feja feiticeiro! E
º dado cafo que: o fora , eu por ventura fou
... cá á roda dos engetados para feber dos filhos
alheios? Ah Senhor, Vofia Senhoria defenga
… ne a ElRei, que eu ifto de Magica não fei
por onde ela corre. . . . .. ..
Mecen, Fiton, acho que efa repetida negá
:ção he já imprudencia : todos fabemos quem
« és ; e pois a fórte te conduzio: a efte Paiz ,
a atua fciencia ha de fer o meio da nofa tran
uillidade; porque Egeria , efta Princeza que
. . vès , vive efpoliada - do throno de feu pai pë
las violencias delRei, que intenta \enthronizar
… 2, filha, cafando-a com Albano Principe de
Liguria; mas iftohe efcufado dizer-to, pois
tu como Magico o náo has de ignorar.
Chich. Não me diga nada , então verá fe eu
fei alguma coufa. .* * -

Eger... Que intentas, Mecenas ? * ,, , ,


AMecen. 'Communicar a Fiton os nofos intentos,
蠶 que poffamos triunfar , ainda que feja
agicamente. ‫ی‬۰
-

Eger. E tens a certeza que todos os Magicos


sáo fieis , e leaes ?
AMecen. Não ; mas come elles tudo alcanção pe
la fua fciencia , não ignorará o pacto que
temos celebrado de reítituir-te ੰ de
`, , - UCU
$76 Precipicio , -

•* 點 paii com … a fortuhaz de fer eu *téu ef


.” О- - ** - *

. Pois, Fiton, fe a tua fciencia , tudo al


cança, peço-te… que a empenhes toda, para
, que comfiga a Coroa, que me ufurpa a am
| biçáo delRei meu..tio : favorece os intentos
, de Mecenas; pois confeguindo, a fortuna, que
epero, te prometto fer agradecida. , Paife.
Chich. Senhor Mecenas, com quem efteve fal
… lando agora aquella Senhora Egeria, que por
nome não perca ? ' .
AMecen. Comtigo. . . . . . . . .... .
Chicb. Comigo ? he boa telma! Pois acha Vof
fa Senhoria que fe eu pudéra dar Coroas,
- que as não tornara para mim , por não seftar
ás ordens, de ninguem ?: ,, , ! -

Afecen. Deixa loucuras: bem vês o empenho,


em que etou de coroar a Egeria; patrocina
os meus defignios, que do feu bom exite pen
- de toda a minha fortuna; pois te confeflo, Fi
ton, que ardo em hum vivo incendio de amor ,
a se cégo_intento emprender por Egeria as maio:
res difficuldades. 、・・・。で :: * * *

Chich. Ahi vai parár tudo: já me a mim ad


mirava que o trampofo do rapaz não havia
metter a fua colherada! :, :.: -;
Canta A4ecenas a feguinte .
、*、 — А к гл.
Naquella Deidade : . . . . . . . . .
Galharda , que vifte , . . . . .
Confi(te . . . .
". De minha ventura - . . .. . . .
A gloria feliz. . Se
de Faetorſte. 477

do Ser a fórte me néga · · · · · · ····ici
Fortuna tao bella, ' ' ' , , ,
"Sem ella . . . . . . .. . .;
Serei defgraçado, … " - __…_
Serei infeliz. l, n. Yairfe.
-
‘. . . . r ,
.. . .. . . -

* - * * * *,

Chich. Ito já vai de foz em fóra; cu entende


… que ifto he realidade pura, e não Magica fo
nhada; e o peior he que eu fou o que faço na
- s oraçáo , e cuidáo que fou Magico : Em ne
gra hora apanhei o tal viftido , e o tal livri- .
nho! Mas ainda afim, devo muito a todos,
. pois hum me defcobre o feu peito", outro
… me vomita o feu bucho; e eu com tanta
… coufa eftou para rebentar. . … º', ºt

... -- Aahem Faetonte , e Fiton. . º


Faet. Ainda não creio que me veja habitar em
palacios: quanto me agradão etes marmorés !
Quanto me recreia eſta magnificencia! Pare
ce que netas altas torres habitão os meus
penfamentos ; neftes edificios fe eleváo os
meus efpiritos! Etes pórtidos são polidos ef
pelhos de minha ambiçáo; etas columnas tal
vez fe erígiráo para nellas fe collocaremos
meus triunfos! . . .. . . . ・・、ー ・ .…。

Fiton. Não gaftes o tempo em aereos penfamen


tos, quando fabes que és filho de hum Pator.
Faet. Tambem Apollo foi Paftor de Admeto: .
nada me injurías com io. -

Fiton. Oh quem pudera declarar-te quem és !


Reprime efe genio ; não bufques efia cópia»
- - TOI«
*
478 - Precipicio,
torno-te a recommendar; pois malfabes a rui
na que te efpera, Faetonte.
Chich. Faetonte difle ? Ai que alli efá meu
amo! Pois por vida minha que hoi de magi
: car com elle. . . .. . . . .
Faet. Já que me não queres dizer o que te per
sº 醬, recorrerei a outro Magico, que me
- diffe agora Egeria habitava em Palacio, e el
… le me informará, quem he o adorado enigma
que adoro: mas aquele he, fegundo os fi
maes que - me deu Egeria. -

Chich. Elle comigo. . : , ,.


Faet. O tu, fabio portento da Nigromancia ,
compadece-te de hum peregrino, que inflam
mado de amor procura, o original de huma
cópia , que. . . . .
Chich. Que achete em Thefalia que te dife
rrão; etava em Italia; que vens em cata del
i la ; náo heifto ; Faetonte ?
Faet. Que ouço Nada ignora : Fiton, que te
parece ? * - - -

Fiton. Quafi, que me confundo.


Paet. Pois dize-me; de quem he efte retrato!
- . . . . . . . ' ' . . AMoftra o retrato.
Chich. Vidoamus ; queres que to diga? Mas ao
depois talvez, que te arrependas.
Fiton. Não lho digas, fe achas que lhe póde
fucceder algum damno. - -

¿Faet. Deixa-me cruel; que damno póde caufar


a formofura? w - - -

Chich. Que damno ? Muito grande; porque ha


formofuras damnadas: olha, huma mulher for
- - 1unQ

t
*
de Faetonte. 372
mofa por força ha de fer prefumida; da pre
fumpção fegue-fe o fer tolla , da tollice o fa
zer afneiras; das afneiras o dar couces; quem dá
couces, tem matadaras: com que Senhor »
quem albardar huma formofura, ha de aturar
o fer raivofa , zelofa , comichofa , pedincho
na , defvanecida ; pois fe tiver accidentes da
madre, ainda são outros quinhentos.
Faet. Se tudo iflo são efeitos da formofura,
nada temo , tendo tão foberana caufa; dize
me, não me tenhas fuípenfo. ~ -

Chich. Com efeito queres que te diga de quem


he o retrato ? -

Faet. Dize. . . . .

Chich. Ao depois não te arrependas.


Faet. Dize, que me não hei de arrepender; da
quem he ? , , , - .*.*.*.* .
Chich. Hede huma, mulher. · · · ·. - .

Faet, Mas que mulher he efia, e aonde etá :


Chich. E{tá pintada em cobre , não a vê ?" …
JFaet. Ifo he a pintura. :,はイ*

Chich. Sim, a pintura; pois que pergunta vofº


fa mercê ? * . .. -

Faet. De quem he o retrato ?


Chich. Parece-me que he de Apelles; ou eu
me enganarei. ~

Eaet. Já me defefperas: dize-me, e defengana


me já qual he o original defe retrato ?
Chich. Ifio he outra coufa : já me retrato; e pa
ra lho dizer com mais certeza , deixe-me ver
nos meus alfarrabios. . . * - -

. Fo
48ο Precipicio
... « ‫ ه ﻭ ﺑه مدتی ﺑه‬، « ‫و‬ - :* ~ *: * ~*
Fabiando Chihiko º livro, tantº a feguinte
**, *, *, :
" -
- - -

; :- . - A R As . . . .. . v;

- º Vagos epiritos ; …..…


* ***
-** Do negro Cocito
Refpondei-me já · · · · "º …a

s" <> Por magica, megica, migica,


Quem he de Faetonte 7- - -

• * : … A bella Fregona,
--sv: "Seu pai, feu avô, , , º
Quem he, quem ferá ?
:º, s. Que a furia fomente
Do abyfmo fervente
' De huma mulher *. - -

Saber poderá. … - *

tº ; ; - ... . -

Eiton. Senhor, agora reparo, aquele he o meu


livro, e o meu veftido: efte homem deve
º fer algum velhaco. ‘. . . . -

Faet. Afim me parece ; já fei que és hum fin


ido ignorante. - - - *
Chich. Sabes mais do que eu. : -
Fiton. Quem te deu effe livro.
Chich. Ninguem porque o achei.
Eaet. Pois como infolente , me pretendias
enganar º - * .

Chich. Venha cá; tão-louquinho etá, que me


não conhece? Não vê que fou Chichisbeo ?
Faet. Agora repáro: Chichisbeo, he pofivel
_que_teívejo à vence " " … __ -
Chich. O ver-me he o menos, que ido fará quem
não for cégo: o achar-me feito MagicoJPaet.
· #ìais.
he o -
de Faetonte. - 381
Faet. Como he ifo º Conta-me. . .. ..
Chich. Depois que de Thefalia partimos atrás
, do original daquelle maldito retrato , chegá
mos a Italia , quando em duas palhetadas,
embrenhando-fe vofa mercê pelos bofques do
Eridano, o perdi de vita, fem que a foroa
da diligencia o podefe defencovar : neta fof
frogicidade andava, quando palavras não erão
ditas, porque eu não dizia palavra; eis-que
acho ete vetido, e ete livro; eis-que ape
nas eu o abri; eis-que me prendem , e me
, prefentão a ElRei em pefoa, afirmando ,
que cu era Fiton, aquelle Magico de Thef
falia, que eu nunca vi ; e por mais que mº.
defempulhei, não foi pefivel tiras-lhe dos caf
... cos que eu era Fiton. ..." - ',
Fiton. Mais feguro etou agora disfarçado em
Chichisbeo. / á part.
Faet. Já que tens efa fortuna, vai vivendo com
o tempo.
Chich. Ifo fim; mas fe me pedirem que fa
, ga alguma magica , como ha de fer fe, eu
... fou defazado para ifto de pa&tos._ . . . ..
Fiton. Não tenha medo diffo, que fará quan
to quizer. . . . . ,
Chich. Ah Senhor, s quem he ete lapuz, que
tambem fe quer metter em reflea magica : ".
P4et. He hum criado que tomei na tua falta.
Chich. Pois vofsê me fegura que hei de fa
… zer magicas ? . . . ... . .
Fiton. Parece-me que fim, que quem tem efe
- livro faz quanto quer. . . . .
- -
. di്
Cbi-

|
38? Precipieio
Chich. Com tudo ifo não he pofivel adevinhar
quem he hum filho do Sol, que em Italia
habita; e diz ElRei que lho hei de dizer,
porque elle o fonhou, e que fenáo, me ha
de feparar a alma do corpo.
Paet. Filho do Sol?
Fiton. Como fe altera Faetonte! á part.
Faet. Chichisbeo , em todo o cafo tu has de
º dizer a ElRei que eu fou o filho do Sol,
para com efe pretexto completar as minhas
= idéas. " - -

Fiton. Ai de mim, que Faetonte procura a fua


ruina ‘. . . á part.
Chich. E fe depois apparecer o verdadeiro filho
do Sol, e me apanharem na mentira ?
Faet. Nunca tal fuccederá, porque não ha filho
do Sol ; e fe o ha ferei eu, pelo elevado
- epirito, que me anima. ,
- -

Chich. Se vofa mercè tivéra os cabellos louros,


ainda, ainda.
Fiton. Que intentas? Não fabes; que, he facri
légio appropriar-te a ti a dignidade de filho do
Sòl, e que Apollo irritado póde caftigar-te, e a
quem para ifo concorrer ? "… -

Chich. He verdade que eu fou o concurrente:


= não temos nada feito. -

Faet. Deixa-me, infame etorvo de minhas fe


licidades: que tens tu que me arruine? Ho
mem, dize que eu fou o filho do Sol,
Chicb. Se és hum filho das ervas, como que
* res fer filho do Sol ? - - -

Faet. Adverte, que nifo te faço hum


- \
sº 3
- de Faetonte, 383
favor ; porque tu, ou hasíde dizer quem he
... o filho do Sol, ou "te háo de matar,
| Chich. Effa razão concluio-me: vofa mercè hg.
o filho do Sol, e tenho dito.: Confituate
filium $olis.* * * : º v . . . . . .",
Fiton. Oh violento poder dos fados! Quem pó
de refiftir a teus imperios ? á part.
Faet. Não fabes quanto eftimo efta occafião,
para que afim pofa frequentar fem perigo ef
- te palacio , e fervir aos defignios de Egeria,
huma Princeza....'' . . º 'º,
Chich. Sim, Senhor, huma Princeza filha de quem
Deos tem efporiada do throno; não he afim? • * *
Faet. Muitò º fabes. . . . ". .. .
Chich. Não vê que fou Magico ? Pois ainda
fei mais. . . . . . . r1 -

ளே,
N ੰ fäberg 露ப.
Chich. Não pofo, que etá Jub, fgillo magicali.
Faet. ಳo bel>
lo original dete retrato, pois quanto intento,
he para ver fe defcubro cfte encanto de amor.
' : Canta Faetonte a feguinte . . . . ..
* . a R ! A. ' '' …
* . Nas pupillas de meus olhos . . .
" . O meu bem hei de bufcar, º
E, verei {e pofìo achar **, * * * * * *

** Entra a cópia de meu pranto … * …


}
Defta cópia o exemplar, , , . .
Se te encontro, objecto amado, ºs
Acharás nefta alma amante : - *

* Hum morrer a cada infante, ...


Hum viver por te adorar. - ۶ ‫مه‬
l
384 Precipicio
Fiton, Vai-te errado mancebo , que algum dia
te pezará do engano que intentas fabricar... á p.
Cbich. O vofsè? T.g .-g.7. ‘. . .; X
Fiton. Que diz?i, ou … … , , " ".
Chich. Não diga a ninguem que eu fou Magi
co, entendeo-me? ****** . . . . -

Fiton. Bem entendo; mas eu farei com que te


, tenhão por Magico, exercitando na tua pefoa
- varios encantos, para que fiquem na certeza,
º de que és o Fiton , que bufcáo, e eu livre
de chegar ás máos delRei... : Wai-ſe.
***

3ahe Chirinola. , ,.
Chirin. Venho pé antepé a ver efte Magico, que
tem alvoraçado, todo ete palacio, e he cou
fa que nunca vi em minha vida. ..
Chich. Que etará epreitando aquella moça º O”
- menina, procura alguma coufa ? :
Chirin. Vinha a ver hum Magico, que etá em
palacio. , *** * *, * : .
Chich. E para que? ' ' ' ' --> *
Chirin.Só por ver como he a cara de hum feiticeiro.
Chic. He como eta que vofia mercê etá vendo.
Chirin. Pois vofa mercê me{mo he o feiticeiro?
Chich. Para fervir ao diabo, e a vofa mercê,
que tudo he hum. -

Chirin. Ai, chegue-fe para lá que fe me arre


piáo os cabellos! 5 ;; , ; -

Chich. De que te alutas? Que cuidas tu, que


he fer Magico ? * º * , , , … :::
Chirin. Com licença º de vofa mercê , dizem
que he gente que falla com o diabo.
Сbi
de Faetonte, 385
Chich. Efes são outros, que eu cá não fallo
com o diabo, o diabo he que fala comigo.
Chirin. Ifo tudo vem a fer o me{mo.
Chich. E a ti que fe te dá dio ? Tomáras tu ,
que hum Magico defes te amafe, então ve
rias. . . . . não digo nada.
Chirin. Deos me livre!
Chich. Queres tu que eu feja teu Chichisbeo ?
Zombaria fóra.
Chirin. Para que ? Não jure, que bem lho creio.
Chich. Hei de ſer o mais fino Chichisbeo, que
ha de haver em toda a Italia.
Chirin. Vá-fe dahi, que he hum feiticeiro.
Chich. Feiticeira és tu , que me tens enfeitiçado.
Chirin. Só de huma fórte me poderá render.
Chich. Como º
Chirin. Renunciando o paéto, e depondo a Magica.
Chich. Se nifo confite, já renuncio, não fó
o pacto , mas tudo que te pofa dar pena;
pois fó quero , que voe o meu amor á ef
féra dos teus olhos. -

Chirin. Eftamos jutos; porém veja lá o que


faz: agora o apurarei. à part. Ora dize, co
mo me chamo eu ? -

Chich. Se eu já não fou feiticeiro, como pofo


adevinhar o teu nome? Efá galante a Chirinola!
Chirin. Náo temos nada feitõ; va-fe dahi, que
ainda he quem de antes era.
Chich. Porque ?
Chirin. Diffe-lhe que me adevinhaffe o nome,
e mo efcarrou na bochecha
Chich. Eu o teu nome ? De que fórte ? -

Tom. II. Bb Chi


386 Precipicio, -

Chirin. Náo diffe Chirinola? Que mais havia


de dizer ? ->

Chich. Pois tu te chamas Chirinola ? , - I.


Chirin. Sim, Senhor, faça-fe de novas. .
Chich. O Chirinola, em chirinola me torne eu,
fe eu fabia que tu te chamavas Chirinola.
Chirin. Pois para que diffe Chirinola ? -

Chich. Nunca fe vio hum lapus nominis º Se


havia de dizer charamella, diffe chirinola.
Chirin. Ora admitto a defculpa, mas não lhe
fucceda outra. - -

Chich. Qual outra ? Eu quero mais encanto,


que ela beleza , nem mais adevinhar que
os teus peníamentos, nem mais pacto, que
effe Cyfne de Venus, de cujas azas formou
Cupido as fuas, de cujas penas armou as fer-
tas para ferir, e para voar ? Teu Chichisbeo
hei de fer, e fe o não for, não feja embora.
Chirin. Veja lá o que diz, olhe bem para mim.
Chich. Tenho dito. -

Immediatamente lhe crefce o mariz a Chichisbeo


- com desformidade. . . -

Chirin. Ahi que nariz Ito atura-fe? Ha ho


mem mais mentirofo ? - -

Chich. Que fiz eu ? Que nariz? Explicate não


, falles pelos narizes. . . . .
Chirin. Como queres que creia , . fe. ao mef
mo tempo, que dizes não has de fer Magi
to, facas por hum nariz tamanho como ho
i^,» e_á manhá? - - ** *

Chich. He verdade! Crefceo-me o nariz! Ha


de Faetonte. 387
* cafo igual! Oh Chirinola, efte não he o meu
|_ nariz, e nifto pódes affentar.
Chirino Vá-fe dahi, embufteiro, Magico, feiticeiro.
Chich. Filha do meu coração, eu etou innocen
te; verdade he que me rebentou efte nariz
á flor da cara, mas eu não concorri para ifo.
Chirin. Não? Fui eu ?
Chich. Vê tu não feja ito algum leicento.
Chirin. He nariz em nariz. -

Chich. Tu tens razão; he forte penca!


Chirin. Arre lá ! com nariz mais da marca ? If
fo não featura: ande, vá-fe, antes que lhe
chegue aos narizes,
- Canta Chirinola a feguinte
A R 1 A.

Se quer adorar-me,
Da Magica fuja;
* Se quer defprezar-me ,
Fará o que quizer:
- . Que he muito fenhor
Do Senhor feu nariz.
Bem fabe não goto
. De feitiçarias,
º Que são rapazias, - *

Que eftalão num trás,


º
; E etão por hum triz. . Pai-ſe.
º
Chich. Vio-fe nariz mais intrometido do que
º efte meu ! E que por amor delle vá Chiri
nola ventando por ahi fóra! Ifto deve fer con
tagio do tal livrinho : arre com tal nariz!
Mas aonde etá ele? E/conde fe-lhe o nariz. Su
- - - b ii -- --- mio
388 Precipicio
mio-fe? Sem duvida foi o nariz atrás de Chi
rinola a pedir-lhe bom quartel; mas eu vou
a pedir-lhe as alviçaras: ó Chirinola, efpera,
que já eftou defnarigado. * Kai-ſe.
s C E N A III.
Camera , em que haverá hum bofete, e ಛಿ
efte bitma véla accefa ; e haverá mais huma
cadeira. Sabem. Ifmene, e Albano, e efte não
pájará do batidor.
Ifinen.
Alban.
Ᏼ Limitada
Afta até aqui, Albano.
esféra para tanto Sol.
Jfmen. He etilo do decóro, e da politica pôr
limites á entrada dos efpofos , aonde habitáo
as e{pofas ; e afim já fabes que aqui não
pódes eſtar, e he preciſo retirar-te.
Alban. Poderia fe o nofo hymenêo voara mais
acelerado. -

Ifmen. Não bata a certeza da pode para fuavi


zar o martyrio da efperança ?
Alban. Náo, Ifmene, que toda a poe he du
vidofa, que tem a efperança por fiadora.
Jmen. Quando eu, e ElRei a abonamos, fe
guro pódes eftar. -

Alban. Pois Senhora, já que não tenho licen


ça para me dilatar, nefte papel verás a cau
ſa de men tormento.
J’ai-fe Albano, dando hum papel a lfinene, e
éta afenta fe a lello, e fabe ao batidor Ege
riº; e Faetonte com búm punhal na mão,
e Imene efiará de forte, que lhe nãoEger
veja
o rofiro.
- de Faetonte. 389
Eger. Chegou o tempo da nofia vingança; alli
tens a Iſmene; a occaſińo he opportuna, eſ
grime o valerofo braço, pois para te coroa
res neceffitas da purpura daquelle fangue, J'ai-fe.
Faet.ºrEftou immovel, pois parece efpecie de
cobardia matar huma mulher.
lfinen. Enigmas me parecem as cifras de Alba
º no;quero repetillas para as comprehender melhor.
JFaet. Mas em que reparo, fe muitas vezes a
… tyrannia
throno ?
he o primeiro degrão… para
a
fubir ao
Ifmen. Senhora, (diz Albano aqui) ete excef
fo delRei em procurar o filho do Sol me per
fuade, que ੰ, quererá dar-lhe a glo
… ria de teu efpofo, para divinizar com hum fi
.s lho de Apollo a fua defcendencia. Quem ferá ef
: , te filho do Sol? . . . --

Eaet. Não pareça a dilação cobardia;triunfe Egeria.


Jfmen. Diz mais : E temo, Senhora , que ef
te filho do Sol, ufurpando me a fortuna de
teu Hymenèo, feja intrumento da minha mor
te, tirando-me a vida. ** * * * *
Paet. Morre , infeliz..... o ar . Sahe.
Ao bir levantar o braço para ferir a 7/mene,
:_ a vê, esfe fufpende, e ella fe levanta.
IÍmen. Ai de mim! Como , traidor , afim... :
Faet. Que he o que vejo! Não he, efte o bel
... lo original da copia que adoro 2 Immovel
eſtou ! Deixa cahir o punhal.
JÍmen. Olá, acudi, que hum traidor....
Faet. Sufpende: a voz, Ifimene; não digas trai
dor, amante fim. 驴
390 Precipicio ,
Jfmen. Com hum punhal. ... : . . . .
Faet. Achou a occulta caufa de feu incendio.
Jmen. Intenta tirar-me a vida. -) - ,, ,
Faet. Sem ella etou, vendo tão infeliz acafo;
pois te afirmo, que te não podia ofender. -
Ifmen. Mas intentavas matar-me ? … : *** t »
Paet. Sim; mas tanto que te vi, me fufpendeo
o braça o afecto, com que te adoro.
Ifmen. Tu adorar-me ? Querés com huma offen
fa apadrinhar hum deliéto? Acudi todos, an
tes que o traidor fe aufente.
Faet. Senhora, que intentas? . . .. . . .
Dentr. Accudamos ao quarto da Princeza. "
Paet. Ai de mim, que he infallivel a minha
ruina! Bem o diffe Fiton: aonde me efcon
derei? - . . . # Quer efconder-fé.
I/men. Efpera, traidor, que te não has de aufentar;
que tambem tenho valor para te fufpender.
Ifimene pega em Faetonte, e efte intenta lutanº
* , do , tirarfe das mãos della. -

Faet. 5Não me fejas duas vezes homicida, dei


xa me ao menos aufentar. -

Jfmen. Sem catigo não has de ficar. •

Faet. Oh, quem différa, que me abrace Ifine


ne, e que eu fuja de feus braços! Deixa-me
. . Ifmene. . . º: .
-
:Dentr. Aqui são as vozes. -. .
Faet. Não . ha mais remedio, queApaga
apagar aa luz.
luz.
. . . . J

Imem. Que fazes ? "; - -

Paet. Fugir de ti, para bufcar-te outra vez.


- - - Wai-ſe.
Sat
*
de Ftetonte. 391
Sahem Albano, Egeria, e bum criado com luz.
Alban. Que tens, Ifmene ? Quem te motiva a
dar vozes ? - - - - -

Eger. Que te fuecedeo 2 Ai de mim, que fe


fruftrou o meu incento ? - á part.
1men. Encontrate acafo hum traidor, que bar
bara, e aleivofamente me quiz tirar a vida ?
Alban. Quem feria o atrevido, que concebeo
: - táoºhoirivel 'penfamento º 3 ó 7" … ,
:Eger.-Aindá náo-creio que eftás com vida.
# para onde fugio ? 1üz . --

#fmtn. Não fei, porquê apagou à luz, para com


' fombras 醬 , Al
bano, que o traidor não poderá eftar longe,
e caftiga a fua temeridade. "
Eger. Ai infeliz, Faetonte! . . . á part.
Alban. Eu vou á 'bufcallo ; verás como wingo
al tua'·offenfa.© ! * -ti 2. . . . . ..; º - - *

2ger. Aonde vás, ingrato º Tanta fineza te me


rece Ifméne , para "expores a tua vida -á dé
fefperação de hum infiel agreflor.…" … :
Alban. Não fabes que fou amante, e efpofo?
Deixa-me, Egeria: º "" : :
I[men. Vai não te dilates. * #", º"… .
Eger. E a fua ivida ? ':'s ‫ا‬ ;‫ر‬، (; ‫? ﮨاں درد‬ ei
Ifmem. Os Dèofesta ‘ defenderá3. ßb sñʻ|^i ºq,
Eger. Para que he bufcar remedios extraordi
narios, quando fem efe recurfo o podemos
evitar? Afim darei tempo para que fuja Fae
tOthte. á part.
Alban. Que tens com a minha vida? Não me
dercnhas.
*『aふ Eger.
392 Precipicios
Eger. A palavra que me déte de fer meu epofo.
Alban. Palavra de efpofo ?
JFaet. Sim. -

-Alban. Ifmene , Egeria.delita ; eu vou caftigar


ao traidor. -

J/men. Efpera, averiguemos ifo; que as offen


{as da alma devem preferir ás do corpo,
Alban. Vê que o traidor fe póde aufentar; e
para que vejas, que Eg ria fe allucina, ve
rás na minha fineza convencido o feu ergano.
Canta Albano o feguinte Recitado > e depois С0т8
Egeria , e .IJmene 4 Aria 4 3•
R E c I T. A. D* O. .

Donde te econderás de meus furores,


Fementido traidor? Mas náo te occultes , , ,
Que ainda que te fepultes .. . ."
Nas concavas cavernas defe, abyfmo,
E em trifte parocifmo … … . . . . . . . . ..
Entre as-fombras do Averno te disfarces , , , ,
Lá me{mo encontrarás o teu caftigo,
Oº perfido inimigo , ... , _. . . . . . ------

Por não creres com barbara impiedade


Ser incapaz da morte a Divindadc. . . . .
º
- *** 2° ºr . .. º . ; : . . º.
--- - a
** --- * ** * * ** * * * * -
* - -
-
; : *: * > .
-
. . .. ;> - ſ n •,

-
- -
- . - - -
- - -

- - - : * , , ſ: . .. . . ii. . . . . .. ..
de Faetonfé, -
39;
A R I A A ‫ ه‬3۰
&
Alban. Na minha vingaça,
Imene verás
Meu fino querer.
Eger. Efpera, fuipende,
Cruel, que a mudança
Me chega, a offender.
- Jmen. Valente, caftiga
A mão, que meu fangue
Intentava verter.
Εger, Firmeza
Jmen. Vingança } is pego.
Alban. Firmeza, é vingança
Eger. Firmeza * -

J/men. Vingança em meu peito. }


2dos. Sómente acharás.
4lbam. De amor inflammado, *

lmen. De ardor abrazada,


#ger. De horror congelada,
Todos. Minha alma verás.
* * : r :

'''' ‫ئی خاص مانﻨد ہ ہے_ ؟‬ ‫ ما‬- r

º ". . . . . . . . . .. **

" . . . .
*. !!, . . . . • *,
* - - - * *
- - - - " " i C. * ** * * -

*
394 Precipicio

*窓*楽姿-冬恐判蒸蒸判恐き-さ***登*

P A R T E II.
S C E N A I. º
Sala. sabe Alban. .
Alban. Ậo he poilivct apparecer o trai.
dor, fem que tenha omitrido o
nseur cuidado toda a diligencia,
como poderia entrar ete, inimigo, e fahir,
ſem ſer viſto de ningueni.
3ahe Chichisbeo.” “ -

Chich. Donde eftará ete Faetonte, que não he


Poffivel atinar com ele? Eis-aqui para quan
do hum homem havia fer feiticeiro, •
* Alban. Fiton. : ; ;
Chich. Que manda Vofa Alteza muito ferenada?
Alban. Que me declares quem foi o traidor,
que quiz offender a Ifmene eta noite; e já
neſte diamente te, anticipo o premio de tua
fciencia. ** # ^ Dá-lhe hum anel.
Chich. Aceito o diamante, porque me ferve cá
para certa coufa de minha fciencia desfeito em
vinagre; pois que diz Vofa Alteza ?
Alban. Saber quem foi o traidor de Ifmene,
que a quiz matar eta noite.
Chich. A que horas 2
Alban. Scriáo dez.
Chiçb.
*

de Faetonte. 395
chich. Fazia luar, ou efcuro º r
Alban. Náo · reparei. * : -, * *, *

Chich. Nem eu, mas fem efa circumflancia paf


faremos; e diga-me mais, o traidor chegou
a ferir a lfmene ? … . . .” -

Alb n. Náo, porque acodi a defendella. .


Chich. Pois faiba vofia Alteza, que a não mas
a tou, e que viva etá; quer faber mais algu
ma couſa 2 ºr a * †, , i.

Alban. Quem he o traidor he que me impor


ta faber, e aonde eftá.… … e .***
Chich. Sabe Volla Alteza por onde ele hiria ?
Alban. Se eu o foubera, não to perguntara.
Chich, Pois tambem eu lho não perguntára fe
: o ſoubera.” - . . .:
Alban. A ti nada te he occulto , pois novo?
... lume dos aftros lès todos os fuccefíos do Mundo.
Chicb. IIIo aflim he, mas he cóm bculos, * * .
! Alban. Não me entretenhas com frivolas def>
culpas; eu etou empenhado a que me digas
o que te pergunto, quando" não aqui ficarás
fepultado. . . … o ºr " * ** *
Chich. Não me ameace, que por mal ainda he
င္ရစ္သီး olhe, Senhor, fe quer faber quem
e o traidor , vá ao bofque do Erídano, e
o primeiro homem que ahi entontrar, eflehe:
- porémºfegredo no cafo; porque eu cá não
fou homem de mexericos. -ó * : * : ***
Alban. Pois, Fiton, fe acho certo o que me diz
zes, ainda ferá maior o meu agradecimento
. . .. . . ." . っ} . i Waiºſe.
Chich. Vai-te cos diabos y pois fó por me༽་ཟ་
398 ?Precipicío -

vre daquella fanguixuga, lhe diffe que efta


va no Eridano : não me lembrou dizer-lhe
que etava nos quintos Infernos, por ver fe
o hia lá bufcar. **
4Sahem ElRei , e , Mecenas.
'Rei. Fiton ? -

Chich. Avie-fe: outra impurraçáo temos. á part.


Rei. A tua, fciencia neta occafião fó me póde
livrar de hum empenho. Quem foi o que
- a Iſmene.....
Chich. Quiz matar eta noite, ferião dez ho
º ras? já diffe a Albano, que fofe ao Eridano,
ue lá o acharia.
Rei. Prodigiofo homem! Vem cá, Fiton , fe
eras tão infigne Magico, para que mo negavas?
Chich. Por não ter applaufos; pois fou tão ini
migo de rompantes laudatorios, que por ifo
fugi de Theffalia. -

'Mecen. Até niffo moftra que he verdadeiro Sabio.


Rei. E como etamos do filho do Sol?
Chich. Já o tenho quafi defcoberto até o pef
coço; falta-me fó ver-lhe a cara para o conhecer.
Rei. Pois quem º te impede o feu total conhe
cimento ? -

Chich. Os vapores crafos da terra, que etão ef.


:< curecendo o brilhante dos atros; mas a pe
, zar de tudo hei de trazello aqui pelos cabel
los, fobpena de enforcar os livros.
À4ecen. Senhor, lembro a Vofa Magetade,
.. que Albano pretendeo algum dia a Egeria ef
pofa , e não fei, fe o traidor feria. ...
Rei. Cala-te, Mecenas: bem te percebo; ಛಿ
de Faetonte. 397
|
H …bano he Principe; e quando o não fofle, mais
*
‫ا‬. ,*
intereffe acharia em Ifmene, que em Egeria
- Wai-ſe.
AMecen. ElRei muito confia em Albano; e as
minhas idéas muito fe retardão na execução,
por não achar a opportunidade que defejo
Ai Egeria, que a tua infelicidade me ſuſpen
de o arrojo, e me efconde a occafião ! Mas
fó tu , ó Fiton , compadecendo-te , do meu
amor, pódes remediar o meu empenho ; que
me refpondes , Fiton ? Fiton , náo cuvcs ?
Arrebatado em extafis eftá. Fiton ?
Chich. Não me deixará , Senhor Mecenas, que
etava agora ideando aquillo, que Vofla Se
nhoria me recommendou ácerca da Senhora
Egeria, e o tinha já quafi concluido, fe me
náo chama ? - º

AMecen. Até nifo fou infeliz; mas bafta-me pa


ra alentar a minha efperança , faber que te
não efqueces da minha pertenção; mas fó te
digo, que defejára que Albano cahile do va
limento, por não confeguir o Hymenêo, que
pretende
trarlO.
, e unir maior poder ao meu con
Chich. Tudo bem fe fará. -

<Sahe Chirinola ao baftidor, e Mecenas a vê,


Chirin. Graças a Deos, que já achei efte Me
cenas! Tomára falar-lhe fó por fó, fem que
me wi{Te o meu Chichisbeo. `Cé.
AMecen. Que me quererá aquella : Criada ? Fi
ton , retira-te que importa ficar fó; depois
fallaremos. - - - - - -

Օbi
398 Pricipicio
Chich. Tambem fe não fallarmos importa pouco.
. Mas eu quero efpreitar o que ifto he. á part.
- - Efconde fe.
Mecen. Qie ha de novo, Chirinola ? "
Chirin. Egeria te avifa , que Albano, e Ifme
ne fe achão divertindo em huma caçada nas
-, ribeiras do Eridano ; que obferves os feus mo
: vimentos , que póde fer aches alguma occa
fiáo para o intento.
Mecen. Dize-lhe, que a repota he a obedien
_cia com que executo os feus preceitos. Vai fe.
Chich. Temos a Chirinola feita alcoviteira !
Chirin. Eu não fei quando fe aquietaráó eftes
. Senhores. . -

Chich. Quando não houverem alcoviteiras. Sahe.


Chirim. Falle claro, e não me dê remoques.
Chich. Ora não fiava de ti que tivefes tão bai
. xo officio , fendo tu a primeira terceira, que
eu vi táo deftemperada neffa materia !
Chirin. E quem to difle ? -

Chich. He boa pergunta efa ! A hum Magico


não fe pergunta quem lho dife.
Chirin. Perdoe, que cuidava que já não era
Magico. -

Chich. Ai, que me não lembrava da promefa,


que te fiz ! Etou zombando , eu não fei
nada. “. . "

Chirin. Logo não fou alcoviteira ?


Chich. Qual alcoviteira ?
Chirin., Bem fe conhece o remendo que não
-_he de, mefmo panno. -

"Chich Ah Chirinola, fabe Deos as linhas com


- que
de Faetonte, 399
que cada hum fe coze: deixemos galantarias
amatorias, e fallemos em cou(as fizudas.
Chirin. Pois que ha de novo ? .
Chich. O meu amor. . . . -

Chirin. Pois ifo já não he velho ? -

Chich. Não vês que os velhos são duas vezes


meninos ? -

Chirin. Pois que quer o menino ?


Chich. Quer nanar. -

Chirin. Pois bufque quem o embale.


Chich. Sempre me andas embalando com effe
rigor ! Não vês que feu teu Chichisbeo, a
quem fe devem os carinhos de jure, e por
ta franca os agrados ?
Chirin. Ainda mais carinhos, ainda mais agra
dos dos que lhe eu faço ?
Chich. Ifo fim ; mas...
Chirin. Mas que ? Diga: mas que ?
Chich. A mim me tinhão dito, (muito femen
te nefte mundo ! ) que os Chichisbeos abra
çavão as fuas Chichisboas ; que erão duas al
mas n’um corpo; o que hum queria , outro
queria; que a fé amante era inviolavel; a af
fiftencia contínua: o cuidado frequente; e que
etavão olhando hum para o outro fempre
fem petanejar, e no cabo nada difto acho em
| Italia: que ferá ? -

Chirin. Eftás muito alheio no cafo.


Chicb. Agora, eu etou muito bem certo nas
leis do Chichisbeato.
Chirin. Nada fabe fenão ter atrevidos penfa
mentos: não fabe que hum
- -
clidiു. с
4ෆථ Precipicio - -

de querer com tão cato amor, que não há


de pafar os limites da politica ? -

Chich. Filha, ifo de amor Platonico he coufa


ideada, que não exite in rerum natura; he
huma capa, que fe deita (obre os olhos de
Cupido, para o cegar mais , e para cegar
tambem aos circumftantes; e não me puxes tu
pela lingua, que eu direi o que finto nefa materia.
Chirin. Seja o que for, ifto he o que cá feufa.
Chich. Vamos com a moda, que do mal o menos.
Chirin. Ifo me parece bem.
Chich. Pois ouve, e verás fe fou Chichisbeo de
verdade.
Canta Chicbisbeo a feguinte
A R I Ae -

Cara mia , cara , cara


Per te il mio cor trafitto
Smarrito, sbigurrito
Il dardo fenti d'amor.
Moriró, má qual Fenice
Che nel fuoco 鷺 felice
Più bella revive allor. Vaife.
Chirin. He o mais galante Chichisbeo que te
nho vifto ! Wai-ſe.

SC E
de Faetonte. 401

s c E N A II.
selva. sabem Egeria, e Faetonte.
Eger. Uanto, Faetonte, ſinto ſe |ಂಜ್ಞal
+ fe tão bem premeditada acção !
Fitet. Bem vês, Egeria, como obedeço aos
teus, preceitos, e como defempenho a minha
palavra; falta cumprires da tua parte com a
morte de Albano.
Eger. Ainda não falta o tempo: cuidemos pri
meiro em falvar a tua vida, pois he certo,
que de Ifmene fofte vito, e fe fazem dili
gencias para te prenderem; e alim ferá 醬
cifo, que feja outra vez efte bofque do Eri
dano verde afylo de tua pefoa.
Faet. Ai de mim, que mais finto o cruel def
terro, que perder a propria vida, pois qui
zera que Ifmene me viffe mil vezes traidor !
Eger. Para que he tão inutil acção ?
Faet. Para executar a minha fineza nos conti
nuos ſacrificios a tua formofura. * :

Eger. Muito te devo. º


IDentr. Ao bofque, á felva , tó , tô. -

Eger. Mas allí vem Iímene; põe em execução


º o teu intento , que eu me retiro , e occiiita
nete arvoredo eftarei obfervando o teu valor :
(afim fingirei, que o vejo, para que fe alem
te na execuçáo , á part.) que húma coufa he
.defejar a morte ; outra vella executar. Fai-fe.
Faet. Efpera, Egeria, mas ai de mim! Quém
fe vio em maior conternação! Pois efetar
ふケ・、yr
v
Cc .E‫ئ‬e
462 Precipicio.
Egeria pela morte de Ifmene, Ifimene aquel
le fobcrano idolo de amor, cuja cópia ado
rei primeiro_, que o feu original ! Ver-me
ಶ್ಗ agrefor, e ver eu a Ifniene amante !
Oh que intrincado labyrintho de amor ! Mas
ella já vem chegando, e eu para fatisfazer
a ambos os empenhos, fingirei , que me de
fencontro , e no em tanto gozaráó os olhos
por entre etas ramas o bello Sol , que me
\ abraza. - ... Eſconde-ſc.
Sahem I/mene com arco, e fettas, e alguns
monteiros.
Ifmen. Ali fe movêrão ramos, fem duvida que
alli fe embrennou, a féra. Epera veloz jero
lífico do vento , que eu com eta fetta te
uſpenderei a fuga. * * * ,

Atira bum4 份, e dá em Faetonte, e cabe


atravellado, cam ella 4os pés de Ifmeno.
Faet. Ai de mim, tyranna, que me matate!
Ifmen. Que vejo! Ai infeliz, que cuidei eras
a féra, que vinha feguindo! Levanta-te, ho
mem, que as minhas piedades farão menos
horrivel a tragedia deſte acaſo. Levanta a.
Faet. Com tão feliz remedio ferá ditofa a mi
nha morte : . pcrdoe Egeria, que a occafiáo
náo permitte attengões. . . . . á p4rte.
jmen. Aonde (foi a "ferida ? -

- act. No. peito, -". - i: ; ; , ;; *


鷲 ຕetrantc >
Chegou-me ao coração. … . . - ….…
Faet.
Ifnien. Aº coração ? Se afim fora não etarias
cbnm V í - -

... " "ч" - э . , с. :


*** Fret.
- de Faetonte. 403
Faet. Effe he o privilegio do teu golpe , que
immortaliza a mefma morte.
Ifinen. Agora vejo que etás mortal, pois que
deliras: levai efte homem , e de fua ferida
o remedio correrá por minha conta.
Quer finene írfe, e Faetonte a detem, e can
ta ' 4 feguinte *
*... . A R - l, A. . . . . .
Deixa que eu morra -

Defta ferida , : "...


器 he melhor vida
-

º orrer por ti. * ,

Se me defejas sº, º
Da morte izeñto , ' * ''' *'''
Não te retires; -

Pois fó me alento .

Com ver-te aqui. Cabe.


Ifmem. Levai, levai efe homem, que me hor
rorifa ver tanto fangue. " Wai-ſe.
3abem por huma parte Albano, e da outra lo
go depois Mecenas, Fiton, e Chichisbeo.
Alban. Efperai: que homem he efe? Quem o ferio?
AMonteir. Ifmenë com huma fetta.
Alban. Sem duvida, que efte he o traidor, que
quiz matar a Ifmene, pois he o primeiro 點
mem que encontro nos 'bofques do Erídano ,
como me diffe Fiton; e pelo conhecer Ifine
_ne, valerofa fe quiz vingar pelas fuas mãos.
Faet. Ai de mim! Eipera, não te vás, tyran
na roubadora da minha vida, pois com a mi
- Cc ii nha
-
- 4Q4 Precipicio.
nha morte não extingues o ardor, em que
mè abrazo. .. …*I . . Levantando-ſe.
Alban. Ainda fulminas vinganças, infame , trai
dor ? Mas fe femivivo te deixou a piedade de If
mene, a minha vingança te acabará de huma vez.
Puxa por hum punhal, e fahem Mecenas, Fi
ton, e Chicbisbeo.
Faet. Ainda que exangue me vês, fabe que te
nho efpiritos para fuppeditar o teu arrojo:
larga o punhal, e vem a meus braços.
Chich. Em grande perigo etá Eaetonte! O en
gano me valha. Sufpende o braço, facrilego
Albanos enas, eite he o filho do Sol,
por quem tão fufpira ElRei.
Mecen. Que dizes?
Alban. Efte não he o filho do ‫و‬o‫آ‬S he o trai- -

dor de Ifmene, e nelle quero completar o ref


' to da vingança , que deixôu Ifmene principiada.
Chich. Ora não o faberei eu? e fenão pergun
te-lhe, e "verá o que ele diz.
Faet. Deixa, Fiton, pois lhe val a fua igno
rancia, para, que Apollo , como a facrilego ,
o náo caftigue com feus raios.
Fiton. Não ha mais remedio que obedecer aos
fados, para que não perca Faetonte a vida;
e para maior evidencia de que elle he o filho
do Sol, fará oApollo que, e mováo etas ar
vores, mudando o fitio, em que habitão. ,
A4ovem fe as árvores de huma parte para a outra.
Todos. Prodigiofo fucceo
Faet Grands Magico
.. *-
he Fiton !
5 -
á Cbf
þátt.
deoKaetonie: 40;
- Chich.'Së : eu - foubéra fazer difto , δενε duas fi

gas na inveja. º. " " , ' á part.
º
l
*** *
;:* >
Mecen. Que mais evidencia queremos? Vem,
venerado filho do Sol, a ennobrecer efta região.
Alban. Fiton, Senhor, he o culpado no meu
1. excefo, pois me diffe que o primeiro ho
mem que' encontraffe' nosº bofques do Erida-'
no , que efe era o traidor, que quiz matar
- a Ifmene ; e como fofte o primeiro , que en
· contrei, e o ver-te ferido por-Ifmene , me
º perfuadi, que eras o traidor; e afim defculpa
o meu atrevimento, pois fó Fitón por enga
nar-me merece o caftigo. s:
Chich. Não nego , que eu dife" que o primei
º ro homem que encontrafe, era o traidor;
- porém Faetonte, (que afim fe chama efte Se
- nhor filho do Sol) não he femideos: logo
náo : o engansi.: "Ti i 3 : : ... Yº
Faet... E o ferir.me Ffmene foi hurriaº cafualidade.
A4ecen. Vamos , Senhores, não dilatemos o dar
a ElRei ete prazer : vem, efclarecido Fae
tОfltČ. ºr ". . . Kaiſe.
Faet.Bom principio leváo os meus intentos.''Paife.
Alban. Vou fem alma, pois temo nete filho,
''' do Sol o eclypfe do meu amor.…….. Vai-fe.
Fiton. Oh quanto em vão pretende a prudencia
humana fufpender o movimento das etrellas!
-:- : ,: , " o " Vai fe.
Chich. Ora vejão as coufas dete mundo como
霹 são, pois eu fendo hum afno em pefoa, ef-*
' tou, feito fátrapa em carne; e Faetonte fen
~
do hum ninguem, lá vai a fer venerado como º
-
-
4ാ6, Precipiaiosi, i
filho do Sol! Se ito não parar em alguma,
detampação, temos vida para cem annos.
* * * * * * * * &abe, Egeria. . . .
- -

Eger. Cuidadoſa venho ſem ſaber ſe Faetonte exe


cutaria o intento; mas allietá Fiton, elle me in-,
formará : Fiton vem a tirar-me de huma duvida.
Chich. Não pofio, Senhora, que anda tudo re
volto com o novo fuccefo, que agora acon
têCEQ. . ºf Pai-ſe.
Eger. Que fuccefo ? Efpera: mais confufa ef
tou ! Mas quem duvída que ferá a morte
- de Ifmene ? Porém que vejo! Alviçaras, co
ração ; todo efte prado etá inundado de fan
- gues, não ੰ mais feguro indicio,
, pois haver fangue no lugar , aonde deixei a
- Faetonte , e Ifmene , dizet-me Fiton accele
ºrado, que andava tudo revolto com humano
vo faċceſſo, que póde fer fenáo o que imagi
no? Oh valeroſo Faetonte ! Oh extremoſo
amante! Só o teu valor me podia coroar de
triunfos. . . . . . . . .. . . . . . .
. . .. § $abe Chirinola. - -

Chirin. Senhora, que ferá ito? Todo ete pra- .


do cheio de fangue, e alli encontrar a Albano
…pallido , como fobrefaltado , e Mecenas, que
levavão hum homem como prezo ? -

Eger, Vite que homem era ?. ::


Chich. Não o pude diftinguir, por ir cercado
de muita gente. ... . . . . . . . . .T. - 'Y
Eger, Ai de mim que ferá Faetonte! Sem du
#Vida que morta Ifimene, não poderia efcapar!
Chirin. Pois, Senhora, que feria ito º
Eger.
de Fuetonte. 407
Eger. Huma-felicidade , e huma defgraça ao
mefmo tempo ; aquelle que vifte hir prezo ,
era (ai de mim !) o mais extremofo amante
que me adorava: chegando a tanto a fua fi
--neza, que chegou a 'dar a morte a Ifmene ,
cujo fangue, he efte, que matiza efte prado.
Chirin, Ora já, fe acabárão os teus cuidados á
- cuta do fangue alheio. * -

Eger. As armas da jutiça são mui poderofas.


Chirim. Agora, º Senhora, que te vês fem op
: pofição no throno, lembrar-te da minha lealdade.
Fger. Ainda não creio eta fortuna. "Oh ambi
| ção de reinai a quanto obrigas ! Oh cégo
amor a quanto te deliberas!
- . Canta Egeria a feguinte
tº ‘A-R i A. . . . .

Verdesºlouros , do Eridano , - . . .
Só affim no folio ufano
- Deffe famgue matizadös
-3. Vós” me haveis de coroar.
-- Mas ó tu ditofo amante,
Que por mim penando vas,
A teu peito fiel confiante
… Eu prometro libertar. . . . Wai-ſe.
., , , , „ S G E N A III.
Gabinete bem adornado. Sabem Faetonte,
* : *. e Chichisbeo. ' “ -
Chich, O Ra Senhør filho de Sol, feja-lhe mui
to parabem a vofa femideidade, pois
que fe vê palaciego, venerado dos grandes ,
ado
408 Precipieio , -

adorado dos pequenos, e appetecido das Da=


mas; agora peço-lhe, que já que o Senhor
feu pai he o pruduétor do ouro 3 de vinte e
quatro quilates, que reparta comigo dos feus
mineraes; quando não , hei de pollo no olho
da rua, como quem he. … ",
Faet. Bem fei, Chichisbeo, que efia epiquéa
com que me fallas, he huma, rigorofa critica
de meu nafcimento; mas fe o nafcer nobre
he acafo da fortuna, com o meu valor, e
a tua induftria emendarei effe acafo. .
Chich. E como eflás da ferida?: 1 , . . ° ;
Faet. Quaſi sáo á forga de a&tivos-remedios.
Chich. E quem te ferio? . . … .. ... a,
Faet. Ifmene cafualmente com huma fetta, que
para hum bruto a defpedio do arco.
Chich. Andar, nunca errou o tiro.
Faet. E mais fentira fe o errára.
Chich. Não entendo efa filoíofia.
Paet. Porque Ifmene he o bello original daquel
la copia, que de Thefalia, me trouxe em fre
netico delirio. . .
Chich. Ifmene mefma ? *: * ~ *

Faet. Imene, porque aquella belleza fó de hum


animo Real poderia fer adorno.
Chich. Caro te cutou o achalla, pois zomban
do , zombando, te hia cuſtando a vida. -
Faet. Tambem o não achalla me cutaria o
me{mo. - º

Chich. Que pretendes agora, depois de filiado na


cafa do Sòl? - . . ~ * : - . .

Faet. Efcufada pergunta 3. quando ſabes: os ex


- tic
- -
-
-- - - *
*

- de Ftetonte, 409.
tremos que fiz por Ifmene , quando pinta
da: pois quem tão finamente adorou as fuas
. fombras, como deixará de idolatrar o claro
de fuas luzes? -º « ' » … … -

Chich. Eu o creio; mas com tudo não falta quem


diga, que huma mulher he melhor pintada,
que viva; pois o pincelhe como o folimão
que mata os defeitos. : ir tº
Faet. Em Ifmene tudo são perfeições. . . …
Chich. Com que Egeria já lá vai cºos diabos?
Faet. Não tem que fe ofender Egeria, pois
-, primeiro vadorei a Ifmene. g . . . . . . . .
Chichu Na verdade , que fe fouberas o que ha …
, na imateria entre Egeria, e Mecenas , que ha
mais tempo que a havias ter repudiado. -
Faet. Conta-me, para que pola cohonetar o
meu defvio.…… >) -- . . . . .
Chich. Senhor, eu não fou de mexiricos; nefa
- certeza faiba vofa mercê, que Egeria fez aº
Mecenas efcrito de cafamento, ou coufa que
o valha, efe lhe mete na cabeça, que
de pôr a Egeria no throno; e não deixão
: deter ſeus colloquios amatorios. º. - . .” -
Faet. Quem to diffe ? … ** **,
; сbith. Eu, que o ouvi com eftes olhos ; epre*
2
, tendêrão, que eu défe algum foccorro ma
gico na materia; com que, Senhor, ifto an
da mui folapado , , e combalido ; faze o teu
negocio , gema quem gemer; já etás feito
filho do Sol, e como ral pódes. cafar, aonde
puzeres o dedo meminho ……. -

Faet, Náo ſabes quanto eſtimo eſſa


-, * → .
hi с
410. Precipicio ,
rde Egeria, para que, fem efcfupulos da con
s,ftancia pofa livrementc pertender a Ifmene ?
Chich. Sim, Senhor, límene , e mais Iímene,
que o mais he craváo de facaria.
:; ''' sahe nene.
Ifinem. Cuidadofa da tua faude venho exprefiar
te o quanto eftimarei a tua melhora, para que
no allivio da queixa fe mitigue o pezar de fer
eu a caufa da tua moletia. .*

Euet. De melhor vontade recebêra os parabens


da ferida , que os da melhora ;...pois morren
sido aos golpes da tua ferta , acharias no fa
e crificio da minha vida os cultos de quem te
adora como Deidade. Oh, quantas vezes , If
- mene , abomino, a arte que inventou antido
tos para curar-me ; pois quizera no mortal
E da ferida immortalizar a minha, fineza! -

Ifinem. Bem intruido etás nas lifonjas da Cor


: re; mas como efes affectos são mais efeitos
* do entendimento, que da vontade, te agra
e daráó mais os elogios, que a correfponden
cia; e pois fatisfeita vou, vendo te convale
cido , premitte-me que me retire. Quer 濫
Faet... Náo te vás., t.fem que primeiro te infor
-, mes, de outra enfermidade maior, que padeço ;
- que ife 醬 te oftentas com os males do
corpo, ferá razão que propicia te encontre no
º mal que minha alma padece.…
€bich. Aquelle mal d'alma , como coufa occul
ta: fé a mim me pertencia dizello, a quem
º toca revelar os fegredos animaes; porém digº
- Ο
de Faetonté. 41
o Senhor Faetonte, que em fim mais fabe o
*
º:
tollo no feu, que o difcreto no alheio. :
Faet. Haverá hum anno, formofa Ifimene, que .
te vi, ou para melhor dizer, que ceguei de
· te ver ; e affim como o Iman procura o fer
ro, o Eliotropio o Sol, e e fogo o ar, af
。 fim defde Thefalia, onde te admirei, a pro
curar-te veio o meu afecto duas vezes pere
º grino : deixo de encarecer-te os defvélos, os
, cuidados, e os fufpiros, que me motivate,
por te não horrorizar a tragedia do meu
tormento.

Jfmen. Se nunca fui a Thefalia , como nella


me podias ver? - *, *

Faet. Nefte retrato. : AMofira o retrato.


Chich. Eu fou muito boa teftimunha, e mais
Por final que o vio em jejum, e logo ficou
não fei como. "| ... ." . .. . . ;

Imem. E, de que forte veio a teu poder? …..…


Paet. Achando-o nas ribeiras: do mar , entre os
fragmentos de hum naufragio. ﹑
Cbicb. Ah, Senhor, peça perdão a Sua Alteza
de achar o feu retrato na praia, que não he
lugar decente. . - 2 2 *

Ifmen. Ai de mim, que efte he o meu retrato,


4ue fe enviou aó Principe de Rhodes , qué
infeliz naufragou com elle, vindo-me receber
por epofa ! + -- á part.
Faet. Te: enterneca ver, o teu retrato , :t oü de
ouvir os meus fufpiros? - - - - -

Ifmem. De ambas as coufas : o retrato pelo ver


fem dono , e os teus fufpiros por மத்
Aft,
412. Precipicio -

Paet. Se eu pofuo o retrato, como não tem dotte 2


Chich. Ifio afim he pela regra do ufo capiam,
e de ferem inuteis os fufpiros, tambem pu
- déra dizer alguma coufa pelo direito de ter
ceiro; porém acho que Vofa Alteza não ha
de defprezar hum filho do Sol legitimo, que
º fó por ter por avó de feus filhos ao olho
- do Sol, podéra dar os olhos da cara.
lmen. Para que tanto te empenhas por Faetonte?
ich. Porque a Apollo feu pai devo o que fei,
, por fer o Metre em artes Magicas, e Af
- trologicas. -

Ifinen. Faetonte, tarde chegárão aos meus ou


vidos os teus fufpiros, pois já fou de Albano.
Paet. Para que me defenganas, cruel? Deixa.
ao menos manter-fe a minha efperança na vai
idade de que pofio, merecer os teus agrados.
Chich, Ahi vem ElRei. º' -

Jfmen. Eftimo por atalhar os feus difcurfos. á p.


{ c ***.. * . * … , Sabem ElRei.
Rei. Ditofa, Italia ! Ditofo Monarca, que tem a
e fortuna de pufoir o filho do Sol nos ambi
etos do feu dominio ! Permitte pois que prof
trado a teus pés confagre a teu refpeito repe
tidas venerações. __ . . Faz que ajoelha.
Faet. Senhor, Vofa Magetade não deve eftar
defa forte ; os meus braços ferão o throno
.donde melhor fe colloque a tua foberania.
Rei. galbardo afpe&o!, Ves, Fiton , que o que .
fonbei não foi erro da fantafia?
Chich. He que Vofa Magetade fabe mais dor
mindo, que acordado. . . . . .
Rei.
de Fuetonte. 413
Rei. Mas fempre te agradeço o feres tu o di
tofo intrumento do bem que pofuo.…
Chich. Pois na verdade que bem me cutou a
· dar com elle.
Reifor Refia agora que me defcubras o agref.
de Iſmene. - se -

Chich. Paulatim, não vai a etafar. …


Áei. Supponho, Faetonte, que já terás releva
do a Imene a caualidade de ferirte no bof
que ; e para que com huma acção fatisfaça
a dous empenhos , vem comigo ao templo de
Hymenêo, donde depois de facrificar a Apollo,
grato ao beneficio de permittir habite comigo
Jhum filho feu, afliftirás aos defpoforios de If
menc.com Albano,para que com teu influxo feja
fempre faufto , fempre dirofo o feu Hymenèo
Paet. Que ouço ? Ai 'infeliz! . . . . . … á parte.
Chich. Lá vai quanto Martha fiou ! " … á parte. >
Rei. Vem, Faetonte. , "
Faet. Senhor..... Ifmene..... o Hymenêo.....
... poderia....porque.... Não feio que digo. 4 P.
Rei. Que tens ? Que te perturba !! ¿T... ?
Chich. Náo repare Vofa Magetade, que todos
os filhos do Sol matigáo as palavras, e engo
...lem os conceitos: quer dizer, que fe podia
dilatar o cafamento; porque ainda fe achama!
convalecido, e lhe tremem tanto as pernas
que não póde dar huma Paflada. , ..… #
Rei. Perto fica o templo; pois convem não di
latar, antes que outro traidor impulfo sinten
tc malograr as minhas idéas. Vem Senhor.
: „a a . . . . . Kaife.
- - Faef.
414 Precipicio -

Faet, He precifo obedecer : Imene, lembra-te


de mim. Pai-ſe.
Chich. Ande, Senhor, que honra, e proveito
não cabe n'um facco. Pai-ſe.
:Jfmem. Que tarde viete, filho do Sol, outra
vez torno a dizer, e que accelerado voas Hyme
nêo de Albano ? A prefa de hum , e a tar
dança de outro são hoje os incentivos da
minha magoa.
Sahem Egeria, e Chirinola, de forte que não
veja a Ifimene.
Chirin. Senhora, recolhamo-nos deprefia ao teu
… quarto, para que fe não fufpeite em nós al
guma traição; quando Faetonte confefe o de
licto, daremos a nofla quartada, dizendo que
eftivemos: em caía.
*ger, Pois anda, que até náo faber de Faeton
te, não focegará o meu coração; e 器" já
o Ceo me vingou defla tyranha, de feu fan
gue efmaltarei a minha Coroa. Mas que he
o que vejo ? Ai de mim! Ие а јmene.
Chirin. O que? O que, Senhora ? He verdade!
* A que delRei, não fui eu ; não fui eu, Ifmene.
Eger. O alento me falta; Ifmene, não crimi
nes a minha innocencia porque Faetonte. :.
mas ai de mim ! … -Defmaia fe.
jfmen. Que he ifto? Que perturbação The ef?a ?
Egeria, torna em ti. Dize tu, que foi ifto?
ºf . . Para Chirinola.
Chirin. Tomára-me defmaiar; mas não pofio.
lfmen, Ha confusáo femelhante De que te al
fombras? Sou alguma fantafma ? Chi
* ta
de Faetonte. 415
.Chirin. E[piere 鵲 já vou perdendo o medo;
... pois Vofa A teza he mefmo Vofía Alteza ?
4/men. Pois quem hei de fer ? " ー">

Chirin. Deixe-me apalpar. . .. . .. . .


J/men. Para que? - . . . . . .".

Chirin. Com que Vofia Alteza não morreo ?


Jfmen. Náo: me vês ? . . .
Chirin. Bem vejo ; mais não fei fe he algu
. . ma coufa do outro Mundo.
I/men. Deixa defpropofitos, acudamos a Egeria:
Egeria ? Egeria ? ' - - -

Eger, Perdoa-me, Ifmene, que eu fui....


Chirin. Ai que fe declara! Senhora, Senhora ,
que náo he imorta a Senhora Ifimene, não a
matou o javalí na caça como diferão ; não
tcnha fufto. **

Eger. Ai de mim! Que horrivel fantafia !


- - - - - Levanta-ſe.
Ifinen. Que foi ifto , Egeria ? Que enigma
he ete º ** - -- * - * *

Chirin. He o que eu diffe, Senhora, pois nos


- afirmárão, que hum javalí defpedaçára a Vof.
fa Alteza , que Jupiter guarde, se por final
º
nos moftráráo o fangue; nós efpavoridas , in
*
ventando outra vez a moda do arripiado,
viemos correndo a bom correr, para talhar
%
º
hum par de choradeiras; quando de repente a
vimos a Vofa Alteza; e como fomos medro
fas, cuidámos que era huma cadavera.
Eger, Bem remediou: á parte, Ifmene , dá-me
hum abraço, que a tua morte muito me tem
cutado; e porque o futo ainda me occupa.
- - - rnu1•
º
416 . Precipicio
, muita parte dos fentidos, permitte que me
* retire. ºf Vai-ſe.
Chirin. Arrelá com a mentirinha, que nos hia
dando na cabeça! - - - Rಿ
Ifmen. Que enigmas ferão etes! Egeria afuta
da; imaginar-me defunta; pedindo-me perdão,
e que a não crimine? Não fei o que conje
… &ture! Mas ai infeliz, que aquelles futos, e
aquellas palavras, aínda que mal-explicadas ,
dizem muito! Oh fede de reinar, quão im
pia, e facrilega he a tua ambição! Que maqui
nas não inventas! Que tyrannias não executas!
- -
- • *

- ,: ; Canta Iſmene a feguinte e . *


* . . -
* - , - -

A R H A. -

,- -'-º'ſ * . . . . . .. . .
... : Ditofa Paflorinha ,
ue alegre em verde prado,
§ 蠶 no feu gado
· · ·· Ao fom' da melodía , “
. . . . . . Que infpira a rude frauta
'. . . . v. Do amante feu Paftor.? . ' s -
. . . Politicas não ufa, º * #
. .. . . Nem maximas inventa , * * * *
... - , * Ufana fe contenta c ***»*
… -- lDas flores, que tributa -- a

… … Aº fé de hum cato amor. Vaiſe.


- ; 3., sº ºf . º. -- ** *
de Faetonte. 417
- - s
: .
S C E N A IV.
Templo de Hymeneo, em cujo fimulacro Je verá
bäma téa incendida. Sahem Chicbisbeo , e
Chirinola.
Chich. A. depreffa,
fe queres ver o noi
vado, antes que fe intupa o tem
plo de gente. - - -

Chirin. Ha de ter muito que ver, pois dizem


- que o filho do Sol tambem affite muito bizarro.
Chich. Põe-te ahi , e dahi te não bulas. -

Chirin. Sim Senhor, mas a mim me conta


que votê ainda he hum refinado Magico, e
que anda adevinhando o feito, e o por fazer.
Chich. Se eu etivéra mais de vagar, eu te dif
fera por onde o gato vai ás filhozes.
Chirin. Eu bem fei por onde vai.
Chich. Por onde ?
Chirin. Pela trapeira.
Chich. Pela tripeira has de dizer, pois tudo quan
to faço he por amor da tripa : ah Chirino
la, que bella occafião para nos cafarmos!
** Olha não te faz က္ဆိုႏို့ ver alli o Deos dos
“ · ca[amentos com a fua luminaria ateada na cha
-
mine de Cupido , em cujo fogo falvage_fe
abrazão os miferaveis do jugo amatorio? Di
ze, não tenhas vergonha. -

Chirin. Vofè tem a culpa de não ter o que defeja,


pois fe não fora feiticeiro, cafáramos agora.
Chich. Ainda crês que fou defes ? -

Chirin. Eu fou alguma tolla ? Não vês que


« Tom. II, ‘ Dd quem
418 Precipicio
quem o demo toma, fempre lhe fica hum
geito ? -

Chich. Eu não fei que geito hei de dar a ifo:


Se lhe declaro a tratada, perde-fe Faetoate,
fe me callo, perco a Chirinola, e eta occa
fiáo que ainda he mais calva que Chirinola. á p.
Chirin. Que diz? Ficeu pafmado ? -"

Chicb. Bom fei, que quem quer bem, diz do


que fabe , dá do que tem ; mas tu has de
guardar hum 'fegredo daquelles de maço , e
mona, e então faberás coufas, ainda que fo
nhadas , nunca viltas.
Chirin. Ifo corre por minha conta; pois que he ?
Chich. He hum ſegredo. -

Cbirím. Dize-o. - -

Chich. Não to pofo dizer, pois fó eu o fei,


e mais certa pefoa; e fe tu o fouberes já não
he fegredo ; porque paflando de dous acabou
fe o fegredo. - • -

Chirin. Pois dize-mo fem fer em fegredo.


Chich. Então que fineza te faço eu em dizer
huma coufa que não he de fegredo ?
Chirin. Pois de que fórte o hei #e ſaber?
Chich. De nenhuma, pois não fabendo tu o fe
ខ្ល vens a faber que ha fegredo, que
e o que te bata.
Chirin. Va-fe dahi; volè he o que fe preza de
* ့te ? Voffè he Chichisbeo 2. He huma
alla. º,
-

ania,
de Faetonte. 419
º - Canta Chirinola a feguinte ... º.

- - 3 - A R J A. " -

Se não fias de mim o fegredo,


Eu do teu amor me náo quero fiar ;.
Que fe não póde dar confiança,
Em quem defconfia feu peito motrar.
Fia, pois, fe não queres que defconfie
Do pouco que fias de mim te fiar;
Porque na fiança daquelle fegredo :
Fiada confio os extremos de amar.

Chich. Aballemos daqui, que para efte lugar vem


correndo muita gente. Retirão fe a bum lado.
Sahem Faetonte , e Fiton. . .

Faet. Fiton, fabe que eu etou quafi, defefpe


rado. Albano, e Ifmene hoje fe defposão; e
eu fe tal chego a ver morrerei infallivelmen
te; e fe por evitar os meus precipios tanto me
recatate dizer , que era de Ifmen e aquelle
retrato; agora que o fei, e que o não fer
minha me ha de cutar a vida , remedea a
minha mágoa no infallivel de minha morte.
- Kai-ſe.
Fiton.” Dos dous males o menor fe ha de ele
ger; e pois dizem que o fabio domina os
atros, verei fe pofo emendar com hum
蚌 ecipicio outro precipicio. á part.
o Anda ca ... ੋ ainda não tens nome
nefta Hiftoria ; como te chamáo ?
Fiton. Chichisbeo.
Chich. Chichisbeo fou eu defta menina,
Fiton. Pois eu o fou de meu amo,
* IJd ii Cbi
、/

42O Pricipicio
Chich. E elle que te queria que te efteve fa
lando com braços, olhos, e nariz, mui af
froflurado ? …?
Fiton. Vofia mercê como he Magico não necef
fita que lho diga. .

Chich. Eu já diffo não fei nada, que efta menina


me deu anacardina para fó me lembrar della.
Chirin. Aquillo he galantaria. --

Chich. Não he; que fallo em meus finco fen


tidos.. .….. * * *-- -

Chirin. Eſtás colhido.


Chich. Não eftou colhido. .
Chirin. Eftás; pois fe dizes que te dei anacar
dina, como ainda tens todos os finco fenti
dos; que fe afim fora havias perder hum delles?
Fiton. Tem razão. * - -

Chich. Mas falta-lhe a jutiça, porque eu por


meus peccados tinha feis fentidos , não me
nos; os finco já fe fabe. .
Chirin. E o outro qual he ?
Chich. He o que tenho em ti.
Chirin. - Mas qual delles perdete: por amor de
mim ?
Chich. Perdi o ver ; mas tu és tal, que não fa
| zes carreira a cégo. -- -

Fiton. Menina, o Senhor Fiton fe etá disfar


çando , que elle he Magico como ninguem.
Chich. Magico fetá elle, e fe não fora... mas
elles lá vem, tu me pagarás.

}70
de Faetonte. 421.

Wio fahindo ElRei, Faetonte , AMecenas . 卒


mene, e Albano, coroados de flores.
Canta o Coro.
… . Na tëa luzente ' , ' “
· · · · Do facro Hymenèo
* Se accenda brilhante
O raio flammante
… Do filho do Sol. . … . .
. .

Rei. Aquella ardente tea, que illumina o facro


Hymenêo, feja immortalizada com as luzes
de Apollo , para que fempre clara a minha
defcendencia, configa perpétua duração a pezar
- º dos etragos do tempo.
Alban. Propicio amor, j á pozefte limite a mi
nhas efpéranças. · · · :;

Faet. Já me vai faltando a paciencia, para to


lerar efte violento rigor do fado. á part.
Ijmem. Faetonte não aparta os olhos de mim. á p.
Chich. Olha, aprende bem, Chirinola, as cere -

monias matrimoniaes , para quande chegar a


- nofia occafiáo. - 2.
Rei. Ifmene, reconhece a Albano Principe de
Liguria por teu efpofo , e naquella fàgrada
têa de Hymenêo, que em brilhante pyra ao
Ceo.fe dirige, abraza o teu coração no reve
rente amor conjugal, a quem profperem os
Deofes , e felicitem os fados. , , , - ..
Ifmen. Sem ufo do alvedrio me conduz, a efte
templo o teu preceito, como viétiva de Hy
% - meneo. fa
422 Precipicio
Faet. Vai-fe concluindo a minha vida; mas eu
'morrerei mais nobremente. á part. para Fiton.
Fiton. Efpera, não te febrefaltes.
Chich. Çafimentº no meio da galhofa nunca
tal vi!
Alban. Princeza, já que a fórte me detinou
tāo alta fortuna, firma com a tua mao o de
creto do propicio fado , que reverente a re
ceberei com ambas para maior fegurança da
minha felicidade. Quêr dar a mão.
Faet. Efpera, ai de mim ! , .
Fiton. Repára, e vê. Apaga-fe a luz do Hymenêo,
Alban. Que dizes, Faetonte ? . _*

Faet. Que vejas a luz de Hymenêo , que ao


dares a mão a Ifmene, fe extinguio.
Rei. Infaufto prefagio ! Sufpenda-[e o Hymenào ,
pois a fua |ိ , occultando a luz, nos
avifa de alguma fatal ruina. . . . . .
Faet. He cafo nunca vito
Mecen. E nelle ſe encerra prodigio grande.
Alban. Se Hymenèo occultou a chamma he por
que fobrava a de meu amor, em cuja pre
fença não podia luzir. a fua, bem como as ef
trellas á vifta do Sol; e aflim permitte , Se
nhor, que defprezado ete, que imaginas pre
fagio , fe effeitue, o noffo Hymenêo.
Rei. Sofiticos, fundamentos não pódem prevale
cer a tão extraordinario acontecimento, até que
· · · Fiton e nos declare a caufa de extinguir-fe
aquella luz. o a * : *

/
-Faet. Diga Fiton. . . ; e … * .
C". Sou chamado a confelho. e o . . .
... " ……" Al
de Faetonte. #23
Alban. Da tua fentença pende a minha vida.
vºs: * . á part. para Chichisbeo.
rei. Dize , Fiton , porque motivo fe apagaria -

aquella luz? , , , . º, . .* . . . .
* *
.

Chich. Porque fez acabou a torcida. " " . -

Faet. Refponde ferio, e vê lá o que fazes. "


- á part. para Chichisbeo.
Alban. Fiton com aquella galantaria vem a di
zer que foi cafualidade, e não my teriofa a
extinção daquella luz.", " " - º #
Chich. Tal não digo, e eu não fou tão efcuro
que necefite de pai velho para commentar
me: refpondi afim, porque, não quero dizer
que o Deos Apollo pai das luzes não leva a bem
ete matrimonio, e a razão difto eu a direi a
Sua Magetade fó por fó no feu gabinete.
Iſmen. Ha enleio femelhante! :

Faet. Viva a minha efperança, º á part.


Pei. Vês, Albano, que não foi fem mytério ?
E pois devemos, obedecer , aínda, ao minimo
. aceno dos Deofes, já não póde Ifmene fer
tua, pois que Hymenêo efconde a luz, pa
v ra ſepultar em fombras o teu defejo. ;
Canta Albano a fºguinte Aria, e º
к в с 1 т л ь о.
Oh infeliz, oh trifte fem allivio,
Mifero amante, como fem Imene
:Vivirei? Morrerei, ao duro, golpe e... . .
Pa entença cruel, que me fepara
-Aquella alma fublime dete corpo, e º
Cuja união amotº ligou confiante.……… … . Oh
‫و نام‬ -
~

424 * Precipieio º
Oh Jupiter piedofo , defa esférar ”,
O trifulco furor de teu incendio
Contra hum peito infeliz fulmina ingente » :
Que para provocar os teus furores
Incentivo não ha mais *ိုႏိုင္ၾ 2 - )
Que nafcer infeliz hum defgraçado. º
sºs
A R I A.
**.

Irada , elanguente , -

Frenetico, e amante,
O” injufta Deidade,
Da tua impiedade
A Jove fupremo
Me quero queixar.
Se a luz me ufurpate
Do facro Hymenèo ,
º r Cruel te enganafte,
- Que em chamma mais pura
-- Minha alma confiante -

:- Se fente abrazar. Vai fe.


-
-*

Chich. Parece que lhe ardeo a jeropiga! á part.


Rei. Deofes foberanos, em que póde ofender
vos e Hymenêo de Albano, para que me pri
veis da gloria dete dia ? Mas quem póde com
prehender as vofas altas difpofições! Vem »
Faetonte a facrificar como diffe, a Apollo teu
pai, não fó para gratificar a tua vinda, mas
tambem para applacar a fua indignação, re
petindo o mefmo Coro, para que a lembran
çº da culpa feja incentivo da piedade. … :
- CQs
de Faetonte, 423
с о в о.

Na tea luzente , ,. . .. .
Do, facro Hymenéo º
Se acenda brilhante
- O raio flammante
Do filho do Sol.
4. - * * ... .

ఇ.,
ᏱᏉᏫ?

>క్షXష్ణోXXక్ష<
贰部 - *

w 7±: R *

,本 **

".

. |
2

º PAR
#26 Precipieios
*穏3恐輩登-冬登登蒸窓登塗-受蒸*登号を

PARTE III.
Camera. Sahem Faetonte , e Fiton.
/

Faet. Em , Eiton, a meus braços, pois


á tua fciencia devo a vida , que
refpiro; que fe não extinguias aquel
la luz em Hymenêo, em cinzas me reduzi
ria a fua chamma. . .
Fiton. Faetonte, agora , que de todo tens fupe
rado o violento furor dos fados, e te vès nef
ta profperidade ifento do grande damno, que
te eperava, te declararei o que tantas ve
zes recufei dizer-te. Sabe que tu és na rea
lidade o verdadeiro filho do Sol, e de Cli
mene, aquella infauta belleza, que expota
aos rigores de Diana entre os montes habi
ta como féra. -

Faet. Ai de mim ! Que fempre has de fer cruel


para comigo! pois ao mefmo tempo confun
des a delicia de hum prazer, com o rigor
de hum pezar !
Fiton. E afim releva-me o não haver-te com
municado ha mais tempo efte fegredo; porque
como etava decretado dos fados, que a fabe
res tu quem eras, efia fciencia havia de fer
О
de Faetonte. 427 e
…e teu precipicio por caufa de huma formofu
邻 ra, por io te occultei ete ಳ್ಗ
; porém
agora que fupponho triunfas de feus decretos,
razão he que triunfes tambem do meu filencio.
| Faet. Puderas dizer-mo, em tempo, que mais
* to agradeceffe; mas fempre etimo faber cu
jo filho fou, fe bem nada me dizes de no
vo, pois a altivez de meus penfamentos não
poderia ter menos progenitor: eu te relevo o
roubo, que me fizete do tempo, que igno
rei a gloria de me jactar filho do Sol.
Fiton. Era precifo obedecer ao influxo dos aftros. .
Faet. Náo creas neffas quiméras : de meus fuc
ceffos pódes colligir o quam errada he a ju
diciaria efpeculação, das etrellas, cuja fciencia
_tanto veneras: mas retira-te que ahi vem Egeria.
Fiton. Eu te obedeço. . . . . . . . Wai-ſe.
.$ahe Egeria. . . . . . . 5
Eger. Para que, Faetonte, me occultavas quem
eras ? Bem me parecia a mim que o teu
briofo alento tinha mais foberana origem.
Faet. Quiz occultar quem era, para que o amor
preferife ao repeito na tua inclinação.…….
Eger. Se eſſa brilhante Deidade, quaſi immor
raliza a vida , que temes que não acabas de
executar a morte de Ifmene , pois já por duas
vezes deixate burlada a minha expectativa ?
Faet. Como fei que Mecenas tem a me{ma
incumbencia, já não poderei executar os teus
defignios. º, r \
- - - . . . .
-

Eger. T Verdade he que Mecenas compadecido


da minha defgraça, intentou retituir ao thro
- IlO
N
\
f.

428 Precipicio
… no de meus pais; mas não fei em quere
poffa offender a fua piedade.
Faet. Em fer piedade; pois he certo que eta
_fó refide, em hum coração puramente fino.
Eger. Se da fua parte eftá o amor, da minha
- etará a contancia, com que te adoro; porém
cuido, Faetonte, que effe aftectado ciume fe
origina de algum motivo occulto.
Faet. Occulto motivo, he ; , pois fe eu difera
- que tambem refervas a vida de Albano, não
fei para que fim, talvez não acharás affecta
" … do o meu ciume.
Eger. Para que vejas que não etimo a vida
de Albano, mudemos de fyftema, como ao
principio pretendias: fè tu homicida de Alba
no, que eu o ferei de Ifmene, para que na
igualdade dos fexos fique fem perigo a refolução;
e defia fórte, nem a formofura de Ifmene te fuf
penderá o golpe , nem a vida de Albano a
i zelos te incitará. -

Faet. Para cabal fatisfação de meus zelos tu


se mefma has de fer homicida de Albano ; aliäs
entenderei, que a piedade te retira o braço,
-- e o amor te fupende o golpe.
Eger. O me{mo pofio eu dizer de Ifmene pa
ra comtigo. . . . . .. -

Faet. Para defvanecer efIa fufpeita, bafta inten


tar o golpe duas vezes, ainda que de nenhu
ma fe confeguie; e alim náo tens que te
eximir, que Albano fica ao arbitrio de tuas
: iras. Affim fegurarei a vida de Ifmene, á part.
* *

J'4
-

de Faetonie. 429
Sahem El Rei , e Chichisbeo. " : " ' **
Rei. Bafta , que effa foi a caufa porque fe ex
- tinguio a luz do Hymenêo ?
* Chich. Sim, Senhor, que he vontade de Apollo,
** que feu filho Faetonte feja genro de Vofia
! Magetade, e a Senhora Ifimene nora, e Vof
'' • fe Mageftada fogro de Faetonte , e efte ma
º rido da dita Senhora. . }. < * , ºf
| Rei. Faetonte , como o obedecer aos : Deofes
he primaria obrigaçáo de hum Monarca, mal
º . poderei refitir aos mudos preceitos de Apol
º lo teu pai ; pois he fua vontade que If
mene feja tua efpofa, e não de Albano, por
º cuja caufa ufurpou a luz no feu Hymenêo.
* Chich. Do que não ha a menor dúvida, atten
* . to fecreto magicali. . á part.
# Eger. Ai infeliz, que ouço ! .. . . . .. .
# Faet. Ai feliz, que ouvi! " …..… … ;
Rei. E pois tu, como filho de Apollo, etás
mais obrigado a obedecer-lhe, entendo te fu
- 醬 ao feu imperio : bem conheço que em
fmene faltáo meritos para fer epofa de hum
: filho do Sol ; porém huma céga obediencia
não repára em qualidades. .. .

Chich. Pois que lhe ha de fazer, fe he vontade


* ・ do Senhor feu Pai? Feche os olhos, e diga
º que fim, que no acceitar
- • * ,
vai opara
' ' á part. ganho. …"
- Faetónte,
9 Rei. Que dizes , Faetonte * . a
Faet. Que hei de reſponder, ouvindo-me Ege
º ria? ---, á part.
| Rei. Emmuděces ?
Chi
426 Precipicio
Chich. He vergonhofo em lhe falando em ca
far: diga, Senhor, que fe as belezas são Dei
_dades, Ifmene em nada o defmerece.
Eger. Muito me aggrava Faetonte naquelle fi
lencio. á part.
Paet. Bem fei que a formofura de Ifmene he
digna do mefmo Jupiter, pois Europa, Da
nae, e Leda não tivérão mais bellas perfei
góés ; porém. . . Ha deſgraga ſemelhante ! á p.
Chich. Porém, que ? Que diabo ? Etá balbu
ciente ? A culpa tenho eu. á part.
Aei. Quei. refolves, Faetonte ? .
·Chich. Senhor, não tem que refolver, porque
elle neta materia não tem voto: eu fou o
que hei de dar a refofução ; e afim digo a
. Vofia Magetade que elle quer, e requer,
que fe faça logo, e já o cafamento, e eu,
que entro a fazer o requerimento, certo he
que tenho muita razão para o faber.
Rei. Afim. o entendo, e da boa indole de Fae
tonte outra coufa fe não podia efperar; e pa
ra que fatisfaça á pretençáo de Egeria , fup
pondo que tem algum dominio á herança def
ta Monarquia, quero que cafe com Albano,
· pois com o Principado de Liguria , fica (ain
da que não em tudo), em parte fatisfeita a
fina queixa. * . ºr .

Eger. Áinda que Vofa Mageftade pudéra repar


tir os domiñios de Liguria , náo poderá con
tratar o alvedrio de Albano, que adorando
a Ifmcne, o confidero agora fobre amante →
zelofo. º

* Azei.
de Faetonte. 431
Rei. Quando o não vença a razão, o convencerá
a violencia: vem, Fiton, que importa comº
municar.te materias de importancia. Vai-fe.
Chich. Valha-me Deos Tomára fer privado de
fer privado. . .. . . . .. Wai-ſe.
Faet. Egeria , a que mais póde afpirar o teu
defejo ? Já confeguifte o Hymenêo de Alba
no : ferás Princeza de Liguria, e comas ar
mas de teu efpofo poderás reftaurar a tua Coroa.
Eger. Sendo tu o Monarqa , c e auxiliado dos
raios de Apollo, que exercito te refiftirá ? Pois
s para ficar vencido bafta ter por contrario ao Sol.
Faet. Se afim foffe, eu me deixára vencer, fó.
para que tu triunfafes. . . . . ヘ'〉 *

, Canta Faetonte a feguinte * *

º
* і л к і л. - -
. . Serèa encantadora o . . .. . . .
. Affaga o navegante, " . ./
º Que intrepido, se nadante , ,
Fugindo do feu canto : is tº
Intenta triunfar.
Repára que a belleza s.
- Contém tal harmonia, º - -, .
Que em doce melodia * , a

-Obriga a naufragar. . Kaije.

i.
Eger. Que affectadas finezas! Ah tyranno aman
te, que o teu genio ambicioamente elevado
te fará efquecer do meu amor.
-
~,

". . s - - Ꮽ4
432 Precipicio
Sahe Alb4no.
Alban. Quem me dera faber o que terá reve
lado Fiton ácerca da extinção daquella luz de
meu infeliz Hymenêo ; pois pendente o co
ração da fua repota, nem bem vivo , nem
bem morto etá. - -

Ager. Vēs, Albano , como os Deofes caftigáo


- a hum prejuro » a hum falfo , e a hum trai
, dor amanté! - -

úAlban. Ignoro o que dizes.


'Eger. Pois fabe, para que o não ignores: De
clarou Fiton , que a extincção daquela luz
... era hum mudo imperio de Apollo', 'infinuan
do_fer fua vontade que Faetonte fe defpo
zaffe com Imene; no que ElRei conveio por
não defobedecer á infinuação de hum Deos.
Alban. Immortal devo de fer, pois não rendo
a vida a golpe tão cruel.
Eger. Se foubera que havia de fer tão peno
fa para ti eta noticia, não taº déra ; e afim
efcufarei de dizer-te, que infallivelmente Fae
tonte fe defpofa com Iſmene, e tu ficas ex
cluido da gloria de pofuir fua belleza.
Alban, Venção os acertos da prudencia as vio
lencias de hum pezar, á parte. Não fabes,
Egeria, o quanto etimo efa mudança de meu
º Hymenêo, para que defenganado das inconf
tancias da fortuna, em que até agora naufra
guei, pofa tomar o norte, que perdi: A teus
… Pés, Egeria , fe protra a minha culpa; não quero
acumular defculpas ao delicto, por não dif
ficultar o perdão. Ajoelh4.
* ~ * - Eger.
de Faetonte. 433
Eger. Qué fazes, Albano ?
Alban... Revalidar o primeiro voto , que confa
grei nas aras de teú amor.
Pger. Ainda que pudéra vingar-me de teu alei
º
vofo proceder , quero fer extremofa comtigo ;
pois fe não houvéra ingratidões não haverião
finezas. Aflim conven para os meus intentos.
ſ: á parte.
Alban. Pois , Egeria , fe a tua piedade me am
pára, eu te prometto preparar te o throno, atro
pellando todas as difficuldades. Morra Faetonte.
Demtr. Viva Faetonte.
Eger. Morra Faetonte, e tambem Iſmene.
Demtr. Viva Ifmene.
Eger. Que encontrados écos refpondem ás nof
fas idéas ? -

Dentr. Viva Faetonte , viva Ifmene.


„Sahe Chirinola.
Chirin. Senhora, que etá tudo alvoroçado com
danças, córos, e bailes, applaudindo o no
VO •ုပ္ဖ္ရ
de Ifmene, que dizem he hum fi
lho do Sol, que eu por final vi junto com
Ifmene, tão refplandecente, que era huma
couía nunca vifta. Ai Senhora, efpere para o
ver, que ele para cá vinha caminhando.
Eger. Por ifo mefmo irei mais deprefa. Oh
cruel pezar, não fejas ufurpador de minha vi
da , em quanto a fortuna me não facilita o
meio da vingança! Pai-ſe.
Chirin. Vamos, vamos Senhora, deprefa. Vai-fe.
Alban. Haverá homem mais infeliz ? Para que
injuítas Deidades, vos empenhaftes a fazer
Тот. II. .* Ee mc
2434 Precipicio -

me ditofo, fe depois que me elevei ao auge


de tanta ventura, me havieis de defbenhar do
bem, que cheguei a pofuir? Mas tu, ó cruel
Monarca, fe me ufurpate a ventura com a epo
fa injutamente , eu jutamente te arrancarei
com o Sceptro a ambição; porque a juftiça
de Egeria me dará armas para triunfar da tua
crucldade
.Sabe J[mene.
Imen. Confufa, e vacilante no procellofo mar
de tantas variedades até me falta norte para na
vegar, fegura na perigofa carreira de tão ino--
pinados fucccfos. Mas quem etá aqui ?
Alban. Quem ha de fer ? He huma fombra de
Albano , que fe vê já privado de toda a luz,
depois que perdeo o 湛 de tua formoſura.
Ifmem. Pois fe és fombra, como não defappa
reces ? Que com os refplendores do Sol fo
gem as ſombras.
Alban. Já fei, tyranna, que como Ave do Sol
te queres eternizar nas luzes; mas não he ra
zão, que religiofamente negues o teu coração
a Cupido, para fazer delle facrificio a Apollo.
lmen. Que queres, Albano, que te reponda,
fe hum Pai, hum Monarca, e huma Divin
dade são triplicados vinculos, que me pren-2
dem o alvedrio ? Supõe que nunca me vifte;
fupõe me a mais cruel, a mais tyranna féra
das hircanas brenhas , para que troques em
odio , o que foi amor.
Alban. Amor que foi, fempre he; pois não tem
mais que hum tempo, e por ifo fe pinta menino.
Sa
de Faetonte. 43s
3'ahe Faetonte.
Faet. Galharda Iímene, não póde chegar a mais
o exceflo, a que fe fublima a minha for
tuna, do que a ver-me coroado com as ver
des ramas da efperança de poluir te.
Alban. Ha tormento mais cruel! Sem dúvida,
Faetonte, que ainda te não pofo encarecer,
o quanto te venéra toda a Italia.
Paet. Já fei, Albano; porém adverte, Ifmene,
que menos etimo nafcer filho do Sol, que
renafcer na esféra de teus braços.
Alban. Se nos meus dominios te poffuíra , ve
rias arder toda a Liguria em maiores demonf
trações de prazer.
Faet. Eu o reconheço. Bem quizera, Ifmene,
-

ſ
motrarrte, que aquella ferta, com que me
atraveffafte o peito, te deu amor para ferir
me, cuja cicatriz ferá o mais vivo figillo,
ue eterno acredite a eficacia de meu querer.
Alban. Eu defefpero. á parte. Porém , Faeton
te, para reconheceres o meu afecto...
Faet. Deixa-me, Albano, que etás importuno.
Alban. Pois cala-te, Faetonie, que cftás infup
portavel.
Faet. Se te peza de ouvir me, retira-te , e dei
xa-me ſignificar á minha bella Iſmene , os ex
tremos, com que a idolatro.
Alban. Nem poffo deixar-te, nem pofo ouvir
te: bem fei, que hum fupremo Numen te
detinou eta fortuna ; mas náo ignoras, que
adorei a Ifmene com attenções de efpofo, e
o ciume hc hum monftro infofrivel.
Ee ii - JFaet.
436 Precipicio
Faet. Pois, Albano , que remedio , fenáo facri
ficar a vontade ao imperio dos Deofes? Bem
fei, que te fobráo motivos para a tua mágoa ;
porém fentirás agora o mefmo mal, que eu
padeci. -

Alban. O mefmo náo ; que fe o padecefte , foi


em tempo , que não tinhas alcançado os fa
vores de Ifmene , e mal póde fer o fenti
mento, que hoje me penaliza, igual á aflic
ção , que te arraftava antes de favorecido;
que então fentias como zelofo pretendente,
e eu padeço hoje como zelofo defefperado.
Faet. Se defefperate, já te não fica mais que
eperar.
Alban. Enganas-te , Faetonte , que ainda me fi
ca a efperança de faber o meu valor catigar
a caufa da minha defefperação.
Faet. Pois tu tens oufadia, para te oppor a hum
filho do Sol ? -

Alban. Ainda contra o mefmo Sol fe ha de ani


mar a minha arrogante temeridade, porque a
cegueira , com que os zelos me allucinão,
me não dá lugar para ver as impofibilidades,
que emprendo.
Faet. Barbaro, verás no poder de meu braço
o catigo, que merece a tua oufadia arrogante.
Empunhão as e/padas.
Ifmen. Que intentas, Faetonte? Albano,que fazes?
Alban. Perder a vida; que fe em te perder fico
fem alma, bem he que quem tyrannamente
me ufurpa a alma , feja violento verdugo,
que me tire a vida.

de Faetonte. 437
finen. Acudáo todos, que fe matáo.
Bentr. No quarto da Princeza he a pendencia.
Sahem El Rei, e Soldados.
Pei. Albano , Faetonte , que atrevimento he eR
te? Afim fe ultraja o meu decóro ? Suípen
dei o furor da voſla indignagão. ,
JFaet. Senhor , Albano me provocou de fórte ,
que com precipitada arrogancia cheguei a pro
fanar a immunidade do Palacio, fem attender...
Rei. Pois tu, Albano, fem attenção ao meu
refpeito, fem temor das minhas iras, tivefte
oufadia, para romper em tão inopinado infulto :
Alban. Huma paixão céga não póde attender a
repeitos, quando fó refpeita o defafogo, que
intenta confeguir na vingança; e afim. . .
Xei. Náo pertendas córar com apparentes _def
culpas o teu deliéto, que nenhuma fatisfação
póde , condecorar a táo grande culpa. Per
doe Albano , que primeiro eftá a anciofa am
bição , com que intento divinizar a minha
regia eſtirpe. |__ , á parte.
Alban. Não imagines, tyranno Monarca, que
perrendo accumular defculpas á temeridade ,
em que me empenhei; que o meu intento fó
fe encaminha a fignificar-te a razão, que te
nho , para caftigar as femrazões , com que
me ufurpas a vida, na efpofa que me negas.
Fei. Pois tu , Albano , empenhas-te , contrári
ando irreligiofamente os divinos decretos ?
Alban. Sim; que decretos injutos, nem são di
vinos, nem decretos; porque nenhum decre
*s, * • * to
-, *
438 Precípicio
to fem jutiça póde violentar a liberdade dos
alvedrios. E fe eu adoro a Ifimene com tão
fino extremo, que fendo em nós duas as von
tades, he unico o querer, como me queres
tu peruadir que os Deoes pertendem contran
ger duas vontades , as quaes reciprocamente
unio o amor ?

Canta Albano ofegninte


R E C L T A D Oe

"Se me negas o bem, que fino adoro.


"Aonde recorrerei,
Senão ao forte valor, que ha em meu peito ?
Se nelle mais perfeito
* Tenho o rancor feguro, e o caftigo :
Porque vingue dos zelos a violencia,
Que efte falfo traidor, efte inimigo
Origináo em minha alma,
Levando-me com barbara indecencia
* Em Ifmene Divina a cára vida ?
Sinta pois, (ai de mim!) minha vingança,
Quem a vida me ufurpa em tal mudança.
A R I A • A 4

Alban. Os Deofes não pódem


* -
** *
Dous finos affečtos,
Gue amor vinculou,
Já mais feparar.
Aei. Se os Deofes o querem ,
Quem o ha de eftorvar ?
Alban. Amor , que os unio,
Que os quer confervar.
* 、.s" Paeg.
º'º,
*﹑
**。
º:
.. . .
de Faetonte. 439
- Jaet. Amor he mudavel,
Tal não póde obrar.
- Alban. Que dizes, Ifmene,
A tanto pezar?
Jmen. A tantos decretos
Náo pofIo : faltar.
. Alban, Se a vida me falta
Na tua mudança,
Que poo eperar?
Alban.
Todos. }
padecendo
Do fado a violencia
Dos zelos o mal.
.Alban. ^ Do injuto decreto,
Rei • Da iniqua fentença,
Ifmen. Da minha efquivança,
Fazet. Da tua mudança ,
Todos. Aos Ceos pedirei ,
Soccorro, clemencia
Em mal tão fatal. Wāoºſe.
S C E N A II.

3'ala. Sahe Chirinola.

Chirin. Alha-me amor, e a Deofa da cu


rioidade, (fe he que ha curioi
dade nos Deofes!) Que tenha eu paciencia,
para fupportar ha tanto tempo hum appetite
difto , a que chamão querer faber o que fe
pafla, e que pafle fem fazer aquelas extraor
dinarias diligencias , que todas cotumamos,
pa
. . . 443 Precipicio.
para facar afim do bucho a Fiton ete fe
gredo, que tanto me occulta! Tomára já apa
nhallo , que o hei de fazer vomitar logo pá
pé tudo quanto fabe. . . . . -

- 5'ahe Chichisbeo.. ; - -

Chich. He boa eta! Efta Faetonte por am


de mim enthronizado, logrando de alento os
agrados de Ifmene, e eu por amor delle ef
tou de aza cahida nos favores de Chirinola !
He defgraça não poder voár a minha efperan
ça, á esféra de fua acceitação ! . . . .
Chirin. Elle cá vem: darei fatisfação á minha
curiofidade. - *

Chich. Faetonte, como digo , eftá afando ca


tanhas no afiador da correfpondencia; e eu ef
tou foffrendo os eftouros nas brazas dos def
prezos: eftou ardendo ! - -

Chirin. Senhor Fiton ? --> .*&


Chich. Senhora Chirinola ? , , …
Chirin. Vofia mercê deve andar mui occupado
com a fadiga da fua privança ; pois já ha
tanto tempo que me privou da fua vita ?
Chich. Grandes sáo os negocios que eu, e El
Rei remos por ora entre mãos; porém nunca
eftes ferão batantes, para dar de mão á lam
buje dos teus favores; e para que yejas , que
não he a privança a que me faz efquecer de
ti, já não quero fer privado delRei mas fó
teu, minha Chirinola. -

Chirin. Meu, porque ?


Chich. Porque na minha etimação és a mais ce
lebre Privada para hum privado. .
- Chirin.
\,
de Faetonie, +441
- Chirin, Guarde-fe para lá, que não creio pala
vras lifongeiras: não venha zombar da gente.
Chich. Se eu amo, de véras, como polo fallar
zombando ? - < * ,

. Chirin. Pois fe ama de véras, diga-me por on


, de andou , que ha tanto tempo que me náo
vê ? He Chichisbeo , e falta ás condições da
Chichisbetice! - -

Chich. Não foi por minha culpa.


Chirin. Pois de quem? -

Chich. De ElRei, que andamos confultando va


: _ _ rios negocios pertencentes, ás razões 3 de eftado.
| Chirin. Efiado de que? --
Chich. Eftado de Ifmene; náo fabes que já fe
náo deſpoſa com Albano ? . - * *

Chirin. Pois com quem ? ' '


Chich. Com Faetonte; fobre ifo he que eu em
penhei a efficacia da minha fciencia ; e: ain
da que me fuou o topete, li no volume dos
aftros , que ella havia de fer fua , porque a
extinção da têa de Hymenêo não foi, por lhe
roerem os ratos a trocida, ou por lhe chu
parem os, morcegos o azeite. . . . . . . .
Chirin. Pois que ផឺ៖ lºw . .
Chich. Foi huma muda infinuação com que o
Delfico Planeta quiz motrar, que o Senhor Fae
tonte havia de fer o ligitimo marido da Senhora
%
Ifmene , e a Senhora Ifmene a legitima mu
lher do Senhor Faetonte; mas com tal pa
&o, e condição, que Sua Magetade havia de
dar o Reino , para ligítimar efe matrimonio.
Chirin. Com que vofa mercê, foi o que deci
frou eſſe enigma ? Chich.
442 Precipicio - -

Chich. Eu fui o legitimo decifrante, porque nas


cifras defe ceruleo globo li as juítas caufas,
que havia , para afim fe difpôr; e tambem
vejo as batardas defculpas, com que tu engei
tas o meu amor, e me tens feito andar com a
º cabeça á roda , confiderando na caufa dos
* teus repudios. -

Chirin. Qual amor, nem que alforjes de lá pre


ta? Eu não quero nada com Magicos.
-::: · ' - Sabe Mecenas ao baflidor.
“Mecen. Que não pofa eu alcançar de Fiton al
uma infinuação, que facilitando os meus de
* fignios fegure as efperanças de poffuir com Ege
ria o Sceptro, que pertendo ! Mas elle aqui
etá com Chirinola : efperarei
-r” : ヘー・ル・ Ficaque
ao fe vá.
baftidor.
ざ・
Chirin. NãoSahe
queroIÍmene
nada ao
combatidor.
feiticeiros.
Iffinen, Aonde_achárá huma deÍgraçada allivio ás
fuas aflicções? Mas aqui efá Chirinola com
" Fiton : eu me retiro." . Fica ao batidor.
Chich. Chirinola, eu não fou feiticeiro.
Chirin. Porque ? v

Chich. Porque não fou Magico. "


Chirin. Se não he Magico como decifrou tan
to enigma 2
Chich. Ahi he que etá enigmatica a minha def
- ventura.
‘ Chirin. Declare-fe.°ʻ ʼ
Chich. Não pofo.
· Cbirin. Porque ?
-- - Chicb.
de Faetonte. 443
Chich. Porque he fegredo; e temo. . . .
Chirin. Que teme? *.

Chich. Que dês com á lingua nos dentes, e me


tiremas ganas de comer. -

Chirin. Não me falle por entredentes, que eu


não entendo equivocas.
Chich. Eu vomito-lhe o fegredo aos bocadin os,
que já não pofo aturar a purga dos despre
ZOS4 - - - á parte.
Chirin. Não quer abrir a boca para falar? Pois
feche os olhos, para nunca mais me ver.
Chich. Efpera, Chirinola; não vires as cotas
á minha efperança, deixa navegar a náo de
meu carinho no mar da tua correfpondencia,
que eu prometro defcarregar na falúa de teus
ouvidos a commifsão dete fegredo, ainda que
beba o falgado trago da morte. . . . .s..
Chirin. Pois dize, meu rico Fiton , que eu te
prometto dar hum bom refrefco, e fegurar o
teu amor com as amarras de meus braços.
Chich. Quem não dará á cota no mar daquel
les braços! Adeos fegredo , boa viagem,
que enjoado nas ondas dos favores vomito as
tripas. Pois alto Chichisbeo, defembucha, e
padeça quem padecer ; que primeiro eftá o
falvamento do teu amor, do que o bom fuc
ce fHo de Faetonte : In «quali periculo debet
quis fibi prius confulere.
. Chirin. Que diz, Senhor Fiton ?
Chich. Eu não fou Fiton , Chirinola, fou femi
criado daquelle que fe quer fazer femideos:
Não fou Magico, filha; porque nunca adevi
… nhei mais que os teus penfamentos. ՀԲ
444 Precipicio
... Ifmen. Ai Albano, que não foráo fem caufa ás
tuas defconfianças ! -

…" " Mecen. Póde haver mais eftranho fuccefo ! * -

Chirin. Para que difete, que era filho do Sol?


Chich. Para que ElRei me não tirafe a vida,
lue ateimou em dizer, que havia defcobrir
- -otº filho do Sol. -
Meren. Não ouço mais; vou dar parte a ElRei,
para que catigue efte infulto. - -

* Chirin. Para que difete da extinção da luz de


Hymenêo ?
º Chich. Porque Faetonte quiz que atiçaffe a El
º Rei, para (e não apagar a luz da fua efperan
, , , ga; pois tambem queria accender no cafamen
… to da Senhora Ifmene a fua luz. ·
- Gbirin.. Faetonte não ama a Egeria ?
Chich. Foi antes de ver a Ifmene, que ao de
… pois ficou Egeria a perder de vita.
<Chirin. E quem he efte Faetonte?
Chich. He hum Pator afim chamado filho de
-*"hum homem, que nunca ouvi nomear; e de
. * huma mulher, que habita entre as féras de
Diana. :

º Chirin. Vai-te embora que és hum refinado Magico.


<Chich. O Filha, fe me não crês, aqui com to
… da a folemnidade o jurarei.
de Faetonte. 445 -

* Cantão Chichisbeo, e Chirinola a fºguinte , º


А к і А. А о u o. * *

Chich. Se cuidas, que polo . .


;: Da Magica uſar, ". .
s Te enganas menina , -:
Que eu diffo não fei.
Chirin. Não creio efe engano. - -

Chich. Bem me pódes crer. - .


Chirin. Sabendo outra couía, .
Iffo não farei. - .

, Chich. Eu fallo verdade. -

Chirin. Náo falla , infolente »


Voffè mente.
Chich. Não minto, não, não.
Chirin. Pois jure.
G`bich., Eu juro,
Ambos. E, πεjuίξ -

| Que leve o diabo,


". Quem Magico he. -

. Chirin. Se juras, já fei....…


" Chich. Pois crê, que jurei.
Ambos. Não fer feiticeiro,
Quem não adevinha, --

Bem claro fe vê. Vaiſe Chicb.


.. 5ahe Ifinene.
Imen. Epera, Chirinola, que tu has de fer o
ditofo intrumento das minhas felicidades.
Chirin. Eu , Senhor ? De que fórte ?
| - •Sá
446 Precipicio º
Sabe Albano ao baftidor.
Alban. Aonde achará hum infeliz refrigerio, pa
ra lenitivo do mal, que o penaliza , fe pa
ra qualquer parte, que caminha, corre para
o maltratar com acelerados ់ a fua defgra
ça ? Mas aqui eta Ifimene ! Ah ingrata! Re
tiro-me , que não quero ver tão cara a cara
a caufa das minhas afficções. . . "

Ifmen. Não negues; já fei que não he Fiton,


he Chichisbeo.
Chirin. Meus peccados ! Lá vai o fegredo c'os
diabos! Pois Vofa Alteza me{mo ouvio tu
do da me{ma fórte ? Ai defgraçada de mim!
Imen. Tudo ouvi.
Chirin. Ora diga-me, Senhora: e que Faetonte
não era filho do Sol? -

Alban. Que ouço ! Alma refpira, que já não


he difficultofa a tua felicidade.
Ijmen. Tambem ouvi ifo, não ha dúvida.
Chirin. Senhora, veja por fua vida, fe ouvio,
que eu não quero ficar em má conta com
Chichisbeo ? - -

Imen. Dize que eu te empenho a minha Real


palavra, para apadrinhar a Chichisbeo.
Chirin. Afim foi, Senhora, mas veja não me
engane, que fe o não ouvio, eu não quero
faltar ao fegredo; porque ainda que rapariga»
não fou cá de mexericos, ifo não.
- finen, Decança: Tu has de dar a ElRei eta
noticia, e a Albano, para que com tão feliz
annuncio alente a fua amorofa pretenção.
$4
de Faetonte, 447,
Sahe Albano.
Alban. Albano, Senhora, já a teus pés com
reverente acatamento quer gratificar a felici
dade de fe ver favorecido na tua lembrança.
Ifmen. Vai, Chirinola, noticiar a ElRei efte
defengano. *

: Chirin. "Ui Senhora, Vofia Alteza não fabe,


que Chichisbeo me recommendou, tanto o fe
gredo ? E então que conta poffo eu dar de
mim , fe o fouber ElRei, e todo o Mundo ?
:
Oh curiofidade , em que afficções me me
tefte ! - Wai-ſe.
Jmen. Vai , e não te dilates. Ai Albano, e
que pouco conheces o júbilo, que em meu
peito amante caufou efte feliz defengano!
Alban. Eu o reconheço ; pois fempre na balança
de minha etimação foube contrapezar os re
quintes, a que fe fublimáráo os quilates de
teu fino amor; por ifo fenri com tão vehe
mente degoto o duro golpe, que com in
juíta violencia quiz cortar o eftreito vinculo ,
com que Cupido nos unio os corações; mas
agora , que me confidero outra vez unido ao
m, de quem me fuppunha feparado, com
continuos agradecimentos correponderei a táo
fucceivos favores.
Ifinen. Na minha firmeza acharás eterna a leal
dade, com que contante te adorei.
Alban. Nella eterniza amor a gloria de ſuas fe
licidades.

Can
448 Precipicio
Canta Albano a feguinte

Imene querida,
Meu bello portento,
Não mudes de intento;
Pois mágoa feria,
Que chegue a morrer ,
Quem morre de amor. -

Na tua lembranga
Só viva a memoria
Da célebre ಳ್ಗ 9 -

Que caufa hum favor. Vaí-fę.


Jmen. Que he ifto, que por mim pafia ? Al
bano por hum cafual accidente ficou fentindo
o duro golpe de minha apparente mudança;
Faetonte com cautelofos enganos pretendia
{eparar os eftreitos vinculos, Tcom que amor
º nos enlaçou os affe&tos ao mefmo tempo,
que com reciprocas finezas fe correponde
com Egeria ! Oh queira amor não fejão maio
res os fingimentos de Faetonte, para eu não
ter mais impofibilidades que vencer no Hy
menèo de Albano
t
!
3'ahe Faet0nte.

Faet. Que tens, adorada Ifimene ? Se Albano


te occafionou algum motivo de fentimento,
faze-me participante da queixa , que logo com
a fua morte verás fatisfeita a tua pena.
7"nen. As minhas penas , Factonte , nafcem das
pe
s

de Faetonte. 449
º penas que me dás; não voes tão alto, que
… logo a minha deígraça abaterá as ázas com,
que, ligeira corre , para difficultar as minhas
3. felicidades.…. | '''' - - .
Faet. Náo te entendo , Ifmene. . . . .

Ifmen. Pois bem me entendo, Faetonte; e tor


no-te a advertir, que o muito voár não he meio
º eficaz para fubir ; mas motivo infallivel pa
– ra hum ambiciofo fe abater. . . . . Vaisſe.
JFaet. Ai de mim, que as palavras de Ifmene
infundirão em meu timido coração, não fei
que occulto vencno, que parece não cabe, já
* dentro em meu peito, e quer de mim fahir,
-監點 fé achar bem comigo! Mas eu em
. , Ifmene apurarci, as confusoes defte enigma:
; - epera, Imene... , , , , , , .. . .
at . . .; ag Sahe Egeria. . . . .
Εger, Que ha de eperar, falfo, traidor aman
e te? Que efquecido ao juramento », que fizef
…te, de defender a minha caufa, fem, caufa ,
... nem motivo, que pofa condecorar a tua in
-2 felicidade, bufcas a Imene, para me offen
der ingrato, - * *

Faet. Deixa-me, Egeria; fe a defgraça cuidado


fa te fegue, para que me peregues tu táo
º diligente, fé não motivo as tuas infelicidades?
Eger. Já te deixo, infame ; já fujo da tua vif
, ta , fementido ; porque não quero ver na
fortunas de Ifmene a occafião da minha mor-
te: e afim como Ninfa do Eridano vou já
- inundar a cópia de fuas cryfallinas aguas, com
as correntes de minhas, enternecidas lagrimas,
.3T9m. II. º 器 - até
450 Precipícios -

até que o Ceo, compadecido da minha def


ventura, e jufticeiro à tua infilicidade, vin
--gue com teu precipicio a minha queixa. Vai-fe.
Faet. Valha-me o Ceo ! Ifto he fonho , ou rea
lidade ? Ifmene advertindo-me, que á ambi
*ção de fubir he tropeço para me defpenhar,
e Egeria culpando-me de perjuro, pedindo ao
Ceo juftiça! Jutos. Deofes, que varicinios
são eftes, que amedrentão efte tímido cora
ção ? He verdade que eu prometti a Egeria,
defender a fua caufa, para cingir a Coroa; mas
º foi fem faber , que havia de comprar a Fur
, pura á cufta do fangue de Ifmeme: pois mal
poderia tirar a vida ao original , quem pri
: imeiro entregoe á cópia toda a almä. Ai If
mene , que tu és a motora das thinhas def
venturas ! Porque fe fige à caufa de Egerias
"precifo me a tirar-te a vida, e na precisão da
tua vida fico fem alma : Se deixo a Egeria,
para te feguir, tenho contra mim a perfegui
ção dos Deofes; pois concorro na culpa de
º pejuro. Mas aí de mim, que ahi vem Ifme
ne com ElRei ! Retiro-me , pör háð ver a
huma ingrata. Retiráfº ao bajidor.
завет Eikei. jniene Albaно, Afecenas , e
…, …, … ... . {\ri \: Cbirinola. . . . .. .
rei. Póis Faetorite, he huth pobre Pafter, e náo
"filho do Sol? …" *, * * * * *
Faet. Ai de mim ! Que ouço ? Etou fem alma!
Alban. Affîm o cörïeffa Čhichisbêe y coriipade
cido º do "nofio" engano. . ‫ر ؛‬:‫ه‬: ‫و‬۰۰‫ه‬، ٤ .
* * * . Fast.
de Fartŵnie. 45 tº
Faet, Ah infiel , Fiten, que tu me precipitate!
Afecen. e Ifnen. Eu o ouvi dizer a Chirinola.
Chirin. Agora entro eu: queira Júpiter, que eu
o diga de forte, que fempre fique em fegre
do por não faltar á Chichisbeo. -

| Rei. Chiritinola, defefigaria-nos: Quem te diffe,


* qué Chíchigbís, étaffaetófite 3” ' ' ' _ ' '
Chirin. Sebhor, em lê o pofo dizer em fegre
doºf Se Vola Magetade promette não revelar
nada, eu então direi, que he hum Pator, e
· põrº{¡ifål , gefna insi he dutra, atora, que
- 驚 às férás de huma Doná Diana, que he
* Xephorá dos b6fqués. …" … * .
Rei. Oh como, andei accelarado efn addiittit a
* Faetônte por fio do Sol, e ém crer as finº
gidasi infi ಘೀ co ! Përdoa , Alba-
- no, a injuſta repagtantia do teu Hymenêo ;
· · fftas còrnó, fabes ; que a extinçáo dá luz me
- dětí apparentéš flotivos , párá fuppôr éra infi
ºitação dos Deofes a demóra das nupcias, en
, tendo , que me fobráo fundamenttis para á mi
º tiha defculps; e para qué à alegria da pode
furvize o défgoto da defefperação, já Ifmene
ferá tua felt efpofá a pezat dos fingimentos
… dö Enga; ႕ ႏိုင္ရ
, é ?affo Faétontë, · · · · ·
ស្អំ ភ្ជំc Hé d
# ಘಿ precipicio -
Afban. Sênhór”, m.
* foi advertencia'; pó
#ဂ္ယီဒီး’်ိမ္ႏြဲ'todos
fer culpa o que não
6 me
* fwb etigan&. ~ºʻʼʻ° ‘" : , , ‘ º‘ i , , ,
Chirin. Vofa Magetade háo diga nada a nin.
* #; peço-lhe pela 器 da Séfthofa Hime
- > - - k! ne
452. Rrecipicio",
ne; e para que o não, diga, ha de me pro
metter huma couſa. ". . . . ..**. **. . . . . . .
Jºei. Que he ? . . . . . . . . . . . . . . . . . .
Chirin. Que não ha de fazer mal, a Chichif.
beo, porque ele não teve culpa netas aren
... gas : ¿omo fabe, fua Alteza. ' , -> -
-

Rei. Não merece perdão, tão grande culpa; am-


- bos padeceráó o rigor de minhas, iras..…. :
Chirin. Senhora, lá fe avenha , ha de me fa
__zer boa a palavra, que me deu..…. , , , ,
Jfmen. Senhºr, eu prometti, a Chirinola a vida
de Chichisbeo, fe ella confeae; e alim...
Rei. Bata, Princeza; eu lhe perdo-o, pois tu
с о apadrinhas.... ് ..", ‘. . . . . .- : * :
Alban. Pois,·Senhor, fe eu.qual Arabica' Fenix
das cinzas do efquecimento renafço para ter
, nova vida na, esféra, de ម្ល៉ោះ, Peço
te, que não catigues a Faetonte; porque que
... ro antes, que morra aos golpes de huma fu
riofa defé{peração, do que, ཨཱ་";.Pཆ་༥e! avi
da aos fios de humicutélo; e afim...
Rei. Bem etá: fique muito embora padecendo
. . as violencias dé huma morte fucceffiva nas
mãos da defefperação; ue a loucura, que
o incitou a tão inopinado infulto, fica inca
A.5'' catigo. Vamos, Albano.
Alban. Obediente te ſigo. . .. . . .
. . . ." ra . -- ~. ElRei.Yão-fe todos COM1

Chirin. Ainda que não guardei o fegredo, te


nho fegura a vida de Chichisbeo, que he o
g que mais importa. . , , .
Patt: Immortal devo fer, pois não perco
- - ... : * " " "
"..."
da
-

‫عسكستئص‬
de Paetonte, 45;
º da no dia,
`s ne efpera.
2
em que perco a Hímene !
. . ;* :
Ifme.
*.si:
- - - -

'g'' . . . º.
Jfmén..Que queres, Faetonte ? … º . . * ''''
y Paet. Que te lembres de minha amorofa cont;
º tantiá, para que afim mitigue com a confi>
duro golpe ...de . desfa
***ဂ္ယီဖွံ့ဖ္ရစ္သစ္လူ႕ႏိုင္ဆိုႏိုင္ဆိုႏိုင္ငံမ္ဟ
. . ;
ုဖ္ရ

"vorecido; porque hum amor. . . .


¿finen. Que dizes, Faetonte?} Airida a tua louca
* temeridade preſiſte no mefmo delirio ? Adver
:
ºte; que fe permitti etas affectuofas expre
"sões, quando te confiderei filho do ဂြို့ဖွံ့
ºra que conheço feres hum humilde, Pator,
º te não pofo conceder o me{mo indulto: vai…
, te; que em Egeria acharás propicia a fortu
. ' ria , fára veres premiado o teu amor. * * * *
-º-, , --
ºf
-
3 º - 'º.
- - -
- !
-
-- Paz que fe vai,
Faet. Senhora.... _* * * * *** *
Afinen, Não mais, Faetonte. " " * * *
Fäet:'Adverte.... ' ' ' ' * * * " * *
inen. Náo ha que advertir,
FaetºQue eu fempre... . '' …"
Ifmen. Não quero ouvir-te." :' ' ' ***
Aaet. Rendido. . .. .. . .. .. . . . . ."

Jmen. Não pafes adiante... -

Faet. Te dediquei o meu amor. * *


Ifimen. Deixa-me , Faeronte. -

Paet. Como te pofo deixar, fe (empre defvela


da te bufca a minha fé ?
Imen. Chirinola, chama quem prenda efe louco,
Chirin. Eu vou, Senhora, " " . . Vai-fe.
Faet. Louco fim; mas he porque defirante o
meu cuidado enferma de adorar-te. E que Pou
/ - CQ

3
454 Rtstipicig, -

… so correpondgs, Iímene, aos delirios dete


fino amor ! * ** . ~~
Ifmtn. Vai-te, Fusiºnis; não qusitas que a mi
nha indignaçẠte precipiteriº, º , ,,
Fael. Que mais Precipicio, que º dº minha
e{perança, cahindo ဂ္ယီဒီ့
ra o abyfmo da minha defefperação? Ai If
dra belleza pa

- mene, quei me tyrannizas a alma! E para que


vejas, que defetimo a vida, vou buícar a
minha morts; que fe morto por ti, quando
te adorº, quando te percº, bem hé que per
' . ca a vida, . . . .. . .
- Kaife.
Ifm¢n. Fprtuna , pois eftamos (ós 3 rcfpondeas
queixas de huma infeliz, (Se he que a hu
ma infeliz, ouvia as fuas queixas a fortuna.)
Se querias, que admittife a Faetonte, por.
que 'não anticipafte a occafiáa de vello, para
lhe dar a primazia na correfpondencia? Pois
fe fó Albano logra as primicias de meu amor A
ara que me perfegues com as ºppofições dº
盟 ? Oh , fufpende, a,roda, de tùas ia*
cotancias, para que, eu fºgure as firmezas do
minhas felicidades! . . . . . . . . .
. -- * ... …' . . . .
Cant4 lfinenf 4 figųinkę , ,
.‫יי‬8 .‫ י‬- •
- - - º . . .” A kº, M.A. º. cº . . -

e. * . . . . . .
Fortuna, que inconſtante i
, . Te oftentas rigorofag . .. , , ;.
… Quando terei ditofa? , ,, ,, …
: - Quando fetsi feliz: "… .
-- - -
de Fuetoots. 4திர
Sufpende por hum pouco
Teu moto accelerado, -

Não feja, fempre o fadó


Cruel a huma infeliz..." . Vai-fe.
s C E N A 111. , . ''''
| Bofiue , como ao principio.
- e Fiton. &abem
" Faetonte,
* * ... • *
Y. - - * * , >
Demtr. Uardem do louco , guardem do
- louco. … . ºn tº -

Faet. Vês, infiel Fiton, que já etou feito al


vo da irrisão popular ? , , : : :?
Fiton. E qual he a caufa, que move tal ludibrio ?.
Paet, . A tua infidelidade; pois, difefte não era
eu filho do Sol: e fe pela tua aleivofia che
go a tal opprobrio , com a tua morte darei
fatisfação ás minhas iras. Puxa por hum punhal.
Fiton. j não º te precipites, que e{\ás
enganado : (primeiro etá que tudo a minha
vida) como podia eu negar, o que, já tan
tas vezes confeflei? Tu és o verdadeiro filho
.do Sol; e para que te defenganes, chama a
. Apollo* teu pai, que ellei refponderá benigno
ás tuas vozes..… … : - º
Aet.: Inuteis confidero todas as profias'; que as
vozes de hum infeliz nem ainda o vento as
ouve ; mas fe a diligencia he progenitora da
fortuna, não quero malogar as fortunas por
omifsão da diligencia.… , … ": -

& “
- *…. . .. . ºf . . .
- - Carl
ദ്ര - - Precipieio's -

N « . , - -
º Canta Faetonte a feguinte :
---
. . .. . . . . .. . . . .
…५ • • • • • • * १ १; , ,
O” tu luzida antorcha , , , ,, ,
Que nea etherea Sala predominas
A brilhante cáterva .….….….… . . .
De "todos os 'Planetas, … ,
Ouve os écos, as vozes, os clamores
De hum mizero infeliz, a quem a fórte
Dá na origor då mefina förte.
4'ala Imperial do Sol, em que apparecerá 然
* ló, que defeerá em huma nuvem, a qual tra.
a rá na parte e/querda outro afento para Fae
. tonte , " e cantão ambos alternativamente o
ifeguinte * * * * * ... ºr -

! * ** * * R E є і т5 л го о- . . ..
* *
Apol. Quem he que ternamente . . .
* #*# … Remette ao Deos Apolfo a fua queixa º
Faet. Faetonte te bufca, ó Deos luzente,
** * Para que a tua piedade - . |
" ... Lhe dê honra, nobreza, e Magefiade:
es º Hum humilde Pator todos me chamáo, • * * *

E afim faber pertendo, . … . .


… Quaf he minha nobreza; pois prefumo, .
- Que a fer filho do Sol, não permittíra
Ver com tanta ignominia ultrajado , º
- O regio efplendor, que tenho herdado.
Apol. Sufpende , Faetonte , efla quiméra o
Du tu a fantafia ;
Do Sol herdas os raios, com que brilhas :
de Faetonie. 4列
E fe. queres defierrar, effe tensor,
Pelo Lago Averno aqui te juro
De te facilitar todo o feguro. .. ...
Faet. Se me dás faculdade , * * *
Apol. Para tudo ta dou, º ". …
Faet. O que te peço …". -

. Me leves ao celefte Firmamento ,


E do carro fiammante, . . . .".
· Em que gyras o Orbe, … - .…….
Me entregues o dominio. ' ' {
Apol. Impoffivel : * / * # *r -
- Será de confeguir.… . …; .. …"
Jaet. Porque ? .… . x»i ' . . . .”
Apol. Porqüe temo o teu perigo, o … .\"*,
Faet. Não temas, não recees: … ...……
: Apol.
Aaet.
Confidera. ‫ﻭ‬............-- ، ، ، ، ، ، ، ، ، ، ، ، ،
Nada čonfidetd.sri pas.rr: .…. *
Apol. Adverte , Faetontel : icat : ; **
Faet. Nada ha que advertir; ,
Defe carro flammante … .. …
Hei de governar hoje a luz brilhante,
Para que toda a esféra. Orbicular
Conheça a fidalguia,
ºr. Que me alenta, ennobrece, e fabe honrar..
Apol..…Nada valem comtigo os meus termores?
Faet. Inuteis sáo , e ſem fruto efla porfia , .
Que quem do Sol herdou os refplandores
* * *As luzes do me{mo Sol, fabe feguir, .
: cc , , Quak Aguia Imperatriz , que...efla luz pura
... :: :: :: Segue [em remor,o bufca com ventura.….
º Efe nas mãos do defprezo hei de acabar,
* * Melhor fetá, que morra. … "… …"
-...". - - * - Hon
458 Prisipicia . .

. , Honrado, e etinobrecido , £ 5
Como filho do Sol reconhecido.
Apol. Vença, pois, hoje, a indufris
A violencia áos fados, a … :: ::
Que inftruido primeiro :: :: ::
Girará com venturą g r, p k
º Effe globo celete.…... .. …..
F4et. ue refpondes, Apollo ? * *
Appl. Sóbe comigº, e vem ao Firmamento
Deffa gelefte esféra, ºf A *

Aonde cumprirás o teu intento. * *


Faet. Já gotofo te figo, º ##
Pois já nobreza tenho. " .. … º
Apol. Nobreza terás o c - º: …...…. "--

44mb01. Е indo Gomtigo…


-

Comigo.- , . . .ir…
. . .". ".
. . … \
.ºvº a

Com pompa luzida º | > sbºz! ".


Se ha hoje de ver." .. ………A -
No claro farol . . . .. . . . .
. A gloria ſubida, ºr * : * '.
2 com que replandece º ab r
# O filho do Sol.» = " " …e encº:
- i.r si ‘’’ s , ;
Sóbe Fãetônte elevado de huna columna até fe
fentar na nuvem.}άο-fe *, e defapparece 4
Sala, ficando em bofue como ao príncipio.
. . . . , , , , , ! :39, :്
Fitos. Oh queira Jupiter ache Faetonte a fortu
na profpeia , para':fuperar o rigor dos fados;
mas como temo, que a remontada eminencia,
a que º fua ambiciofa cegueira o eleva, fe
12 mein que orleve cautelofa para o mais
**** emi
---
* / º

, d 14. ஆ
* స్ట్రో ! Mas, aqui vem Chichi{
º
Ερο: είito me,
y៣ºs…
pan obίωνει ο εμι πιο.
.,.{_‘‘ ‫ یہ‬: "it; ; : ‘‘‘‫ ’؟‬، ‘‘ ’’ 'ყ•:

alt Dρι εν 畿
"to , 醬 hum ನಿ! 鷺 ":
* ຊໍ້.
* …

… do com muitº fizo, como fez º meu am


aetonte, que para motrar, que não era de
todo tollo , poz 9 corpo em grzecada;#8 , 9
º 4]མ༥༥ '' 器驚im fo:
d

Hitpn. „Ná9 foras tų nęfčio. „, o 3 i á Part,


醬 Éⓛio ເaiⓛ: Viດ Pagrobrº ໐ 蠶
- 10.
... tornado , º que fez?_9eu ás palanganas, 3ei
#ando a Perrixil de Chichibéo para Patinho
º fenfadº das iras delRei; que a :
န္ဒီ 'ಘೀ ಘೀ'ಥಿ

ir a logaç㺠da minha Ma#c3 ... e Bem, P\}


*樱 razão ಳ್ಗ
não heefte ಘೀ ႔ရွိႏိုင္
fo, gne, fe paſſa trag મિંદ , i i >
Fitºu. Por na culpa fe vê [Qnps, propihquo
* , , , s parte.
ao maior precipicio, , ,,,,, ...r -

Qhich. Ainda afim; era bem, feito, que ElRei


ឍPoវើe ខ្ញុំ ខ្ញុំos, a\oa, Ke
eu tive a culpa de todos etcs enredos isque
º fe me não meuêra a
,ysia ೫.
ဂ္ယီဒီ့
aº Sol, a minha mentira.º.
‫ اندر‬.42 - ۹ 76 Chiri :ε "Η - oιoι πºί
- Cbirin, Por mais que ‫ ما يلي‬difcorrą,
* n㺠pofo encontrar a Chichisbco, para lhe ,
w intimar a fua ventura , na farfuma , que stewe
* Ana.benignidade delRei. Mas aí, que ele aqui.
! etá! Defcança coração. Chichisbso ? ... e
si i - Chich,
4ఠరి - “Precipitia º,
chich. Ainda me tu appareces, falfa chirinola?
º Dize-me, embuteira, tanto pejo te fez hum
fegredo , que no mefmo inftante, em que o
còàcebefte', o vomitafte nas bochechas delRei?
Fiton. Emstiboa *
"revelar. fecietaria
* :
o meteo, para fe não
*。 - ; : º - * - - ---

Chirin. E que havia eu de fazer, fe Ifmene fu


*º do ouvio *: * '' . . . . .
s Chich. Negar a troxè moxe; * : * : *
Chirin. E que fazia com_ifo? … " " "..
Chich. Pôr o cafo em dúvida, porque o cafo
"hegado nunca he bem provado; e em quan
"rofe averiguava a verdade, tinha eu tempo
de pôr o vulto na guardaroupa da fegurança,
e por tua culpa "etou agora em termos de
#veres pendurado no cabide da forca.
Chiriq. §ão temas ta!', que Imene pedio • tua .
Evida a ElRei; * * * * *
Chich. Vito"ifo não morro deta tratada? ...
- Chirin. Trata tu de te livrar de outra, que def
_ta etá livre a tua vida. " ", , ,
chich. Vivas muito annos: fempre agradecido
ao livramento da foltura, que me não podião
#zer bom cabello as ligaduras da “morte."
-

Fiton. Vafo máo nunca quebra."" -

Chich Gra dize-me; Chirinola, que fe diz em


ºfflho -
fer,
* , * # , Ifmene (entio não.* tº
Palaciodo deSolFaetonte? -

: Chirin. * 1fmeneº de nenhuma forte; antes pare


獻醬 О. eſtimou.;; -* , " * - º ----

• - E. ria ana'Aiz tvranniá, - с

・「、、、。 /
*_ Ghirin.
de, Faetontº. 461
Chirin. De Egeria não fei nada; fó. fei, que
impaciente fe aufentou para as aguas do Eri
dano , aonde habita como Ninfa, ...
Chich. Hiria tomar banhos de paciencia para re
frigerio do calor da defefperaçáo, eni que á
pozerão as chammas dos zelos; mas tem tu
mão que fe me não ီ|ိ'ံီ" ella an
da pafleando a pé enxuro as aguas de Erida
- no : cheguemos nós para lá pé ante pé, pa-,
rapefcarmos alguma coufa do que ela diz. -
Defcobre-fº a marinha, e apparece Egeria nº
"tarro como ao prinčipio ; e canta a feguin-*
-. r - "
-
!. .. te Aria, e
. . ...
○f; "C(_*}_* _ 〈'' (. !
; : .. . . .. . .
""" κ ε c ι τ Α Ρ o. -

, , -- "
. .- -
. -*- -* :-
.. .. .
* ~*

Q Deotⓞ foberano, fºols juto , , ,


Como afim permitis injuftameñte,ºfj ..…….
uc hum traidor, fementido, a 3: .
N
Falfo , e perjuro,amante, , . … , F … g
Hum affečto conſtante . . . . . . . . 22,
Depreze, fem temor de vofias, iras? , ,
eixando-ms ultra ada ‫م و‬o -o، ‫بر‬
Afflicta, e impaciente, , , , , ,, ,
Dos zelos padecendo o activo, ardor , , ..…
Sem alivio, fem remedio a tanta dor? : #
: a r :4.
- . . - “. . . . . . . .. . . . . . .* *
... . . Nas chammas dos zelos , , , ……..
• * Minha alma abraza łº! . . . . . . . . . t
, Com furia ardente,
* ** . . *
* *

•*
-
'
" " -:

.. 器* ir •
. . . . .. . . .. . ... . .
. . . . . . . . . .;
“**, от ‫ه‬си:
‫ ماه م‬. , ' ', De
,
- *
* . .” \
-
482: "νεfριείο"
« i, pe'huñ fûlf3°athant€”×” :'' ^ ”
- ** … Aos Deofesºłupreinos', '' '' ·· ··
- Sº ប៉ុនែ្ត ,
. # * .. .
* * *Wingan º , c * ... oo 2:
- in Contra effe inlimigo y
-;.5 tº ©s 'Ceōs “fiie′′háö′de°dat.' ** * . .
: :: . : ; ; ; ;
Cºith,
pos: Chega-te
aquiff, he "ံို႕မွီဒီး’
para efa, e apara-lhe os fopa
rëfinada. θp
---- - - -, -------- • *. … ، . ‫في ماء‬ "‫" ع‬

Appdete Faetonte'cénte
いー・こてい
no als
- .carro.ein hinreſtlande
- -- -- -

Eger. Para quando, ó Deofes,fobetanos, guar


dais a vofía indigna;áo , fe a hum falfo aman
te, que tanto butlóu as tmrñhas epéranças,
deixais ifento de cátigos? # ftprethơ
para quando sáo es ráios; fe não abrázais
peito 'fementido , que tád tibió egrrefpondeó
äos incendios de hum_fiñó athor?, Oh wctibíu
as voflaš vídg####, -par, que 8 Marido, co
nhecendo o catigo , reconheça a équidade
da vofa jutiça, , , , " " "
Faet. Agota'qué'én faminofo tatto (coris fub
tituto de meu pai Apofo) afento os Plane
tas com raios, e revolvo, a celeftial esféra com
gyros, quero gyrar a esféra terretre, encami
nhando o ក្រៃ curfö” ás caudalofas
gorrentes do Erídano', para que ffrtrene fe af
fombre em hum epílogo de luzes, já que me
fubmergio em hum pelago de deférézos. Ve
rá Tages, e verá toda a Itatíz énthronizado
em
de Faetonte. 46%
em folio de refplendores o me{mo a quem con
fundio com abyfmos de humildades. *-*
Fiton. Já Faetonte fe vê no radiante carro do
e ſejáo,
Sol : queira. Jupiter, que as minhas fciencias
fabuloſas. . . . . ºf

Faet. Já divifo a Região de Italia; já divifo as


crytallinas enchentes do undofo Eridano; pois
º que faço , que não encaminho os meus gy
ros aos feus criftaes , para retratar, helles: a
grandiofa pompa de meus luzimentos?" Mas
ais de mim, º que os brutos enfurecidos cor
º remº fem governo! Mas que muito fe difeor
rem guiados da minha infelicidade ? ,
- . . . . . . . a o Ruido dentra.
Dehtr. Déofes, piedade! Jupiter, foccorro! ^_>
Outros. Que me queimo! Que me abrazo!
Outros. Ciemencia, Deofes! Favor, Júpiter!",
** ** re: Sabiráõ todos , , !
Fiton. Ai infeliz. Faetonte, que não forão fem
e fundamento as minhas cautelas! -

Faet. Inureis são todas as porfias: ai Egeria,


que os Deofes, conjurados contra mim , que
rem que pague com meu precipicio a culpa ;
que commetri, faltando ao juramento que te dei
Pafa humoraid atraveffando ocoarrq , e Arabe
- Faeronte nos braços deu Egeriu... º
Eger. Ai de mim infeliz ! Mas que vejo? Não
és tu o fementido Factonte, a quem os Deo
ſes, compadecidos da minha injuria, precipi
º tão juíticeiros para caftigo da tua infidelidade ?..
2. Olhai, fe as aguas do Eridano não faráo, as
que te erigíráo decente tumulo, para fepultar
--!: 3.
\
464 . Precipicio ,
…a tua ingratidão; as correntes de meu pranto
fejão as que purifiquem as manchas de tua
o incontancia para que fe patenteem os realces
ºs da tua firmeza? Mas ai ! Ai que já entregou
nas mãos da morte os ultimos efpiritos, para
rº deixar de todo fem alentos a minha efperança!
Todos. Horrofo caftigo ! …….… … *

-Rei. Qual ferá a caufa de tanta conternação ?


Piton.He tempo de romper as prizões ao filen
* Ício, que perdido Faetonte, já não ha mais
· que perder..… 24 … ¡ º á parte.”_º · Sabe.
* Éu , fou invicto Tages , o infeliz Fiton , que -

feguindo a Faeronte vivi disfarçado no teu


. .::Reino 'com o nome de Chichisbeo.
Chith. O meu nome feito capa de velhacos! Se
não fora. ElRei. . , .. * " * : * ^ * . s

Fiton. Porque a iminha folicita diligencia quiz


triunfar da tua porfiada vigilancia; pois a faber
º Factonte quem, era, efta mefma fciencia lhe
havia de fervir de maior ruina por caufa de
. * huma formofura. E como agora fe faz preci
- fa a narração dete tão inopinado cafo, não
. pofio: occultar-te quem feu , nem deixar de
manifeſtar-te o infortunio de Faetonte.
chicha Ouçamos , que, ifto ha de fer galante,
Fiton. Sabe, que efte-me quiz tirar a vida (re
fentido das ignominias comº que fe vio ultra
jado, de ti, , e de...todos, de teu Reino ) fe
-, lhe não certificafe o illuftre brazão de fua fo
º beraná origem; e como ele he o verdadeiro
… filho do Sol, e, como tal fempre das minhas
ciencias refpéitado, intentei, para, def
gel
eäFastönte. ‫و‬64N
«Agolpe ,osae á minha vida arnea;sa a ultima
ao rigor dos fados.",
a Chicb.u E fez, muito bem , que, primeiro"eftão
dentes, que parentes: Charitas-bene ºrdinata
incipit
Fitor, E:
瑩lhe9. infinue
..
is o
~,

modo , "com que


, --, -º

havia de invocar a Apollo , feu pai : efte def


ceo a recebello ggip pompa niageftofa , e ggg
amefma .imageftide o cóndaziö á celeft* £f.
éra, para governar o carro do Sol, do qual -
cahio defpenhado para os braços de Egeria.
Chich. O certo he que zombando fe dizem as
verdades. .g.: if ºf . . . . . . . * * * * * * * *
- - - - - * r
Rei. Não forão cillusões, mas verdades, as que
- - - -

ſonhei. 11.92×3 ºz. " : **: ;」; * 、"


Fiton, Efta, Senhor, foi a caufa que "me"inci
tou a viver disfarçado no teu"Reino; efe o
infortunio do infeliz Faetontê, que de nenhu
ma forte puderáoras minhãš fêiências 點
antes me parece , que todos os principios,
que intente para reparodo precipicio, foráo
meios infalliveis com que lhe aceletei o defpenho.
Chich. Ifo foi o mefmo, que errar os princi
pios de meio a meio por todos os principios.
Todos. Etranho cafo!*** * * * * *
Chich. He cafo que em nenhum cafo fe póde
cafar com outros cafos. . .. * --

Rei. Temo, Fiton, que Apollo refentido do


injuto defprezo, com que ultrajei a Faeton
te, com injuta indignação empregue em mim
o poder de fuas iras. " " … :
Fiton. Apollo, Senhor, bem conhece que igno
- Tom. II. - Gg rº
466 - Preripicio -

.… ravas quem era Faetonte; e como º caflige


prefuppóe advertencia de culpa y onáo haven
e do em ti.advertencia de culpa, "defculpa tens
... para terientates do caligo... - - -
… *** ** *~~~ar
… º De repente defrei-Apollo em huma nuvem.",
‫"ت‬. . .‫ة ل‬. :. ‫أ‬. . . . . ‫ة‬. . ‫"… ي‬,‫ ي" ا ل‬:‫ن م‬
.... ...
• .. º .
" i r * *.

‫ خدا‬. . . . . " : "* *


Sabei , que ,Apolla fou o Deos flammante,
Que na esféra brilhante ºs revo… …, ... -
Deffe. celefte globo, ; : oº Prº dº, c...": ,
Com · luzida influencia s.:-p :: :·:· S t r .* *XO
A todos os Planetas illumino. . ..…brº
剑 Faetonte dou por filho caro o ri” .
e ſemideos a gloria ſempre excelſa, i
Nova vida cobrando, | oº 122 . , | i # 5
* Para que refufgite # … ….. . .. . . . .
· Novo, amante des Egeria. y. ... rº …::::::
IÍmene ferá dé Álbàño elpofa :(, , · · · · ·
E em doce. Hymenêo todos unidos, …
Imene na Liguria.com Albano . . . .
Faetonte na Italia, te Eridano , . . . …··
Reinaráó; porque fique deta fórte | | ">
Egeria fatisfeita , .. . . . . .. . .
Pois com pompa luzida ,, , , , , ,
Ao feu Reino (e vê retituida. . .

Todos. Prodigioſo ſucceſſo!


Sahem Faetonte, e Egeria do mar.
Cþicb. `È mais prodigiofo para Faetonte, pois
parº, cá vem com bom ficceflo. b , , ,
Ateí. Não pofio contrariar preceitos tão jutos"
*:: - ...º maior
a'
ി .de Átetomte. 46.7%
- maiormente quando reconheço a jultiça" de
Egeria na fuccefsão deta Monarquia. .. * .
Chich… Ifor he fazer da necefidade virtude. …".
Feet, Feliz milbvezes , quem refufeitando vive
-Para confagrarmnas atas de tua belleza huma
nova vida, estáo nova :::::::
não viver comtigo me conduzio ás mãos da
morte ; efta, me encaminha para a vida ,
#Pois vivo já de morrer por ti.
Fger. Da morte, dos defprezos pafou o meu
amor para a vida dos favores.
Chich. IfIo he paflar da morte-para a vida, co
mo, quem paffa da vida para a morte.
Ifmen. Albano, fe como Princeza fui alvo de
teus favores, agora não permittas, que eu
feja o obje&to dos teus defprezos. **
Alban. Enganas-te, Ifimene; não ha maior im
perio, que o da tua beleza, da qual fempre
vafallo fe confefa o meu amor. -

Chich. Chirinola, já vês, que enforquei os li


vros da Magica: acorda-te de mim.
C ΟΨJo
Eu fempre fonhei em te querer: Tua
Chich. Pois então que fazes ? Dá cá efa mão
de papel, que quero imprimir nella as cifras
da minha afeição.
AMecen. Perdida Egeria, com o amor voou a ef
perança de reinar.
Chich. Senhor Mecenas contente-fe vofa mercê
netes caíamentos com o feu nome, que me
lhor fe ha de cafar com o officio de padrinho.
Rei. Efclarecido Faetonte, releva-me os deípre
リ Gg iü ZO$
468). Precipiti, º, º

2os paflados ; e peist bem dabes forão domina


dos de huma indifereta ignorancia.… * #
Faet. Antes os devo etimar, por ferem ventus)
refos motóres de minhas felicidades: e já que º
databyfmo; da humildade , em que me confi
derei abatido, º me, acho agora enthronizado
na gloria de filho de Apolla; "repita o Côro
poni, melifluas confonancias ypublicandora ma
getade fuprema, a que me elevou a fortuna n6s
veígeiros, que configo como filho do Sol."º
.9 :: ‫ לי‬: 7 - ‫יתגיי ' ל‬
-്: , ', ' sºc oºo..." . . . . ºf ‫مد‬.‫ ل‬,'')D
з за * tº * 3. º . . . . . ."
-f, - ¿Na teaxiuzantealo • Ž· · ····· “ … · S
t". --'r' Do síacro Hymenêo… .….……º etc;
Se aceada brilhantergº ci: i e o riº,
-*** *× 0. raio flammance! . ‫جوم و‬1 º *...*.
“* .º º
. Do. filho do
Sol. E º
:
। .…… … … … … … …
•: 2- i-retºn 3.jp . 23 ii Rio : ...!32 ‫ביא‬-‫" וי‬.
.. . : . . . . : . : . . . :s
» T FIM-EQ SEGENDO TOMO. *všD
.‫י מר' גז‬
- - -
- * *, *- -

‫ور‬ar : :.‫ *هم م‬,


-
- -- - º ...”
‫اگر‬
- “.
- ** * - - - . . . .. *. --

: ... ºr ." § ºf , º, ø, º, ºr . . ; ; **
- , , , : r, l, r, то
.:: : :ioст :o t: * * * гiтэз ! .:t* * .**. *.
-
-

- -
- - ດrrາ: :: :: :: : ::
-
- - - - -
.‫ مجد‬: ‫ يو‬،‫ ر ب ا‬. . . . . . . . . ‫از دو‬ ‫ " را‬: - .‫لادن‬
-
-- - - º * - -- " -- ... ."
, -്, 201ttº,
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PR o TESTAÇÃo.
Do Co.LLECTOR.
A Spalavras Deufes, Numen, Fa
do, Divindade , Omnipotencia , e
Sabedoria, fe devem fomente entender
no fentido Poetico, e não de nenhu
ma outra maneira ; porque fomente fe
ufa dellas neftas Obras como necef
farias para adorno da compofição Dra
matica, e exprefsão dos Epifodios Co
micos, e não com intenção de ofen
der em coufa alguma aos dogmas da
Santa Madre Igreja , a quem como
obediente filho me fujeito em tudo o
que ella determina.
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DAS OPERAS, QUE CONTEM .
efte fegundo Tomo.

L Abyrintho de Creta. Pagina 3.


Guerrar do Alecrim , e Mangerona.
Pag. . . . . . . . . 157.
As Variedade de Proteo. Pag. . 269.
Precipicio de Faetonte. Pag. . . 356.
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