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Ensaios e Ciência: Ciências Biológicas,

Agrárias e da Saúde
ISSN: 1415-6938
editora@uniderp.br
Universidade Anhanguera
Brasil

da Silva Casatti, Gilzaneide F.


Projeto de intervenção social com gestantes e/ou puérperas, usuárias de drogas lícitas e/ou ilícitas
Ensaios e Ciência: Ciências Biológicas, Agrárias e da Saúde, vol. 15, núm. 1, 2011, pp. 97-120
Universidade Anhanguera
Campo Grande, Brasil

Disponível em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=26019329008

Como citar este artigo


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Ensaios e Ciência PROJETO DE INTERVENÇÃO SOCIAL COM
Ciências Biológicas,
Agrárias e da Saúde
GESTANTES E/OU PUÉRPERAS, USUÁRIAS DE
Vol. 15, Nº. 1, Ano 2011
DROGAS LÍCITAS E/OU ILÍCITAS

Gilzaneide F. da Silva Casatti


RESUMO
Pontifícia Universidade Católica de
Campinas
gilzafsc@hotmail.com Este projeto foi desenvolvido no Programa de Pós-Graduação, MBA em
Gestão de Projetos, na Anhanguera Educacional e teve por objetivo
“promover o processo de inserção social às gestantes/puérperas, usuárias de
drogas lícitas/ilícitas, visando uma reconstrução familiar fomentada no
trabalho em rede sob a perspectiva da proteção social”, conforme preconiza
a Política Nacional de Assistência Social, através do Sistema Único de
Assistência Social. A pesquisa-ação foi realizada no Hospital Universitário
da Faculdade de Medicina de Jundiaí entre setembro e dezembro de 2010,
em função da demanda e abrangência regional com uma média de 300
partos realizados mensalmente.

Palavras-Chave: gravidez; drogas; família; trabalho em Rede; políticas


públicas.

ABSTRACT

The present project, developed at the program an MBA degree in Project


Management at Anhanguera Educacional, aims at “initiating the process of
social integration of pregnant/puerperal women who are users of both
licit/ilicit drugs so as to allow family restructuring bred from networking
under the perspective of social protection”, in accordance with Política
Nacional de Assistência Social. Research took place at the University
Hospital at Faculdade de Medicina de Jundiaí from September 2010 to
December 2010, due to the high demand during that time of the year and the
Hospital’s ample regional coverage, with an average of 300 births a month.

Keywords: pregnancy; drugs; family; networking; public policies.

Anhanguera Educacional Ltda.


Correspondência/Contato
Alameda Maria Tereza, 2000
Valinhos, São Paulo
CEP 13.278-181
rc.ipade@aesapar.com
Coordenação
Instituto de Pesquisas Aplicadas e
Desenvolvimento Educacional - IPADE
98 Projeto de intervenção social com gestantes e/ou puérperas, usuárias de drogas lícitas e/ou ilícitas

1. INTRODUÇÃO

Diante do consumo de drogas: álcool, nicotina, maconha, cocaína, crack, pelas mulheres
em idade fértil e por gestantes, passa a ser fonte de preocupação a exposição do feto e as
possíveis consequências em curto, médio e longo prazo. Segundo o Manual Técnico sobre
Pré-natal e Puerpério, 2006, “o uso de drogas lícitas ou ilícitas é um dos fatores de risco na
gestação caracterizando-a em alta complexidade”, requerendo maior atenção dos diversos
profissionais envolvidos no atendimento à gestante pelas questões biopsicossociais, como
também, pela (de)formação do feto que se (des)envolve.

As literaturas sobre drogas, entre elas, Drogas e Álcool – Prevenção e Tratamento


(2001), Crescendo sem Drogas (2009), mencionam como fatores de grande influência na
prática do consumo de drogas por gestantes: as relações pessoais, as características
individuais, o meio ambiente, ausência de parceiro fixo, menor escolaridade, uso de
drogas pelo pai do concepto e histórico de violência antes e durante a gestação. Relatam
que os efeitos obstétricos devido à exposição às drogas na gestação dependem da
realização inadequada do pré-natal com menos de cinco consultas e maior frequência de
abortamento provocado, dieta inapropriada, idade materna, maior risco de aquisição de
doenças sexualmente transmissíveis e uso concomitante de outras drogas. Já, os efeitos
fetais são: síndrome alcoólica fetal, aborto espontâneo, morte antes do parto ou logo em
seguida, prematuridade, baixo peso, distúrbios do sistema nervoso central, presença de
tremores, exacerbação das respostas aos reflexos motores, menor capacidade de
habituação a estímulos visuais, distúrbios no padrão de sono podem desencadear
complicações à criança durante a sua vida escolar; como falta de atenção, dificuldade de
aprendizagem, hiperatividade, dificuldade de convívio social, entre outras.

Em geral, as pessoas que usam drogas tendem a serem mais irritadiças, agitadas,
deprimidas, impedindo um ambiente afetivo e sadio para que a criança seja respeitada e
se desenvolva conforme tem direito. Ou seja, a criança nem nasceu ou mal nasceu e seus
direitos já começam a serem violados, processando-se a reprodução dos problemas
geracionais, sociais e de saúde. E, estando a gestante e/ou a puérpera numa etapa
importante de sua vida, qualquer intervenção nesse momento, voltada às suas
necessidades, tem um efeito melhor que em outros períodos de sua vida.

Assim, o Projeto de Intervenção Social com Gestantes e/ou Puérperas, Usuárias


de Drogas Lícitas e/ou Ilícitas, foi desenvolvido no Hospital Universitário da Faculdade
de Medicina de Jundiaí, em função de sua demanda e abrangência regional, com uma
média de 300 partos mensais no período de set/10 a dez/10. Pautado no objetivo de
Gilzaneide Fernandes da Silva Casatti 99

“promover o processo de inserção social às gestantes e/ou puérperas, usuárias de drogas lícitas ou
ilícitas visando uma reconstrução familiar, fomentada no trabalho em rede social, sob a perspectiva
da proteção social”, conforme preconiza a Política Nacional de Assistência Social, através do
Sistema Único de Assistência Social e a Política Nacional de Humanização do SUS –
Sistema Único de Saúde.

Como ênfase no método dialético, a pesquisa-ação foi a metodologia utilizada


por ser, segundo Minayo (1992), “concebida e realizada em estreita associação com uma ação ou
com a resolução de um problema coletivo, há inter-relação entre os envolvidos e construção coletiva
do plano de ação aos problemas diagnosticados”. Pesquisa e ação caminham juntas quando se
pretende a transformação da prática. A pesquisa-ação utilizou-se de uma amostra
aleatória, independente de classe social, cor/raça, religião, idade e condição física ou
intelectual, coletando dados quanti-qualitativo, estimando-se no mínimo dez (10)
amostras.

A discussão do resultado da pesquisa-ação foi realizada com base nas


considerações organizadas pelo Professor Saulo Monte Serrat com apoio da Federação
Brasileira de Comunidades Terapêuticas, baseadas em experiências de Comunidades
Terapêuticas documentadas no livro Drogas e Álcool: prevenção e tratamento. Fortalecida por
Ana Rojas Acosta e Maria Amália Faller Vitale, organizadoras do livro Família, Redes, Laços
e Políticas Públicas, onde propõem pensar e repensar a família como uma exigência
fundamental, uma vez que esta tem sido percebida como base estratégica para condução
de políticas públicas. Neste sentido, tem-se questionado se essas iniciativas são eficazes
para o fortalecimento das competências familiares, se respondem às necessidades das
próprias famílias atendidas e se contribuem para o sucesso de inclusão e proteção social
desse grupo; e o Manual Técnico sobre Pré-Natal e Puerpério: atenção qualificada e
humanizada”, publicação do Ministério da Saúde, Série Direitos Sexuais e Reprodutivos, no
qual são descritos todos os protocolos e procedimentos necessários ao bom
acompanhamento técnico, durante a gestação e puerpério.

Entre os resultados, além de agregar valores às áreas de ciências sociais, humanas


e saúde, espera-se articular as diversas políticas públicas, desenvolvendo o trabalho em
rede e multiprofissional, respeitando os diversos arranjos familiares e promovendo a
inclusão social das gestantes/puérperas com a participação da própria gestante/puérpera
e familiares, garantindo o direito à vida, ao acesso aos serviços de saúde, assistência
social, convivência familiar e comunitária, sendo fundamental o encaminhamento com
humanização das gestantes/puérperas, usuárias de drogas lícitas/ilícitas à Rede de
Serviços e Proteção Social.
100 Projeto de intervenção social com gestantes e/ou puérperas, usuárias de drogas lícitas e/ou ilícitas

2. CASUÍSTICA E MÉTODO

Tendo como referência o método dialético, a pesquisa-ação utilizou-se de uma amostra


representativa e significativa. Através da entrevista estruturada foi estabelecida uma
relação de diálogo e confiança, buscando as condições objetivas e subjetivas (os motivos,
razões, circunstâncias, os significados...) dada a questão social, uso de drogas lícitas e/ou
ilícitas na gestação, com a valorização da participação da gestante/puérpera nesse
processo, visto que vivemos em sociedade, transformando-a e transformando-se, numa
relação dialética e complexa (entrelaçamento de causas). Coletando dados quanti-
qualitativo, estimou-se no mínimo 10 amostras e obteve-se dentro do universo, levando-se
em conta o prazo de 03 meses (set/10 a dez/10), o total de 14 amostras.

O projeto foi desenvolvido na Unidade de Internação de Ginecologia e


Obstetrícia do HU/FMJ e Pronto Socorro de Ginecologia, com Gestantes e/ou Puérperas.
Das participantes, 93% autodeclararam-se usuárias de drogas licitas/ilícitas em
atendimento no HU/FMJ, residentes em Jundiaí e municípios de sua abrangência
administrativa (Atibaia, Cabreúva, Campo Limpo Paulista, Itupeva, Jarinu, Louveira,
Várzea Paulista e Vinhedo), independente de classe social, cor/raça, religião, idade,
condição física ou intelectual.

Os instrumentos técnico-operativos utilizados foram: o Censo Diário de Pacientes


Internadas na Maternidade, o Termo de Compromisso para Utilização de Informações
Contidas nos Prontuários e/ou nas Fichas de Atendimentos, o Termo de Consentimento
Livre e Esclarecido, a Entrevista Social Estruturada1, o Formulário para o Plano de
Intervenção Social2, que sistematizou os problemas específicos de cada participante, o
Banco de Dados da Rede de Serviços e o Formulário para Encaminhamento Padronizado3
à Rede de Serviços.

A abordagem inicial se deu através do Termo de Consentimento Livre e


Esclarecido seguido da Entrevista Social, devidamente estruturada. Comporam a coleta
de dados: a observação participante, a escuta, o diálogo aberto e a manipulação de
documentos como prontuários e/ou fichas de atendimento. As entrevistas foram
realizadas in loco ou na sala de atendimento social, conforme foi viável.

A partir dos dados coletados foi construído o Projeto de Intervenção Social com a
participação da gestante/puérpera e familiares (quando possível), desencadeando o
processo de reflexão ante os problemas levantados, possíveis alternativas de resoluções e

1 em anexo
Gilzaneide Fernandes da Silva Casatti 101

a necessidade de apoio profissional. Os dados coletados foram discutidos com o serviço


social e de psicologia do HU/FMJ. Através do Banco de Dados da Rede de Serviços foram
realizados contatos telefônicos com técnicos/profissionais da rede para discussão das
situações de vulnerabilidades sociais, verificação de acompanhamentos e agendamentos
de atendimentos, ocorrendo a articulação da rede e os encaminhamentos humanizados,
com dia, horário, nome do profissional e instituição que realizará os atendimentos.

Quanto à análise de riscos e benefícios à amostra estudada, o tipo de pesquisa-


ação não dispôs de riscos. As ações de articulação foram pautadas nos dados coletados,
caso estes não tenham sido verdadeiros, sinalizará importantes fatores psicológicos com
prosseguimento do projeto, uma vez que a participação da gestante/puérpera na pesquisa
foi de livre e espontânea vontade. A verdade será estabelecida a partir da qualidade do
trabalho oferecido pela rede de serviços, valorizando-se sempre a participação e a
colaboração da gestante/puérpera.

Quanto ao retorno de benefícios, a amostra estudada poderá se beneficiar com a


inclusão em Programas Sociais (PBF – Programa Bolsa Família, PRC – Programa Renda
Cidadã, Programas de Segurança Alimentar – visa à distribuição de alimentos e Grupos
de Convivência para fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários), com a
inclusão em serviços de saúde (CAPS AD – Centro de Apoio Psicossocial, tratamento da
dependência do Álcool e Drogas, PSF – Programa Saúde da Família e ACS – Agente
Comunitário de Saúde), incentivo a escolarização e/ou a profissionalização (Projovem e
Ação Jovem), de acordo com a oferta de programas e serviços em cada município, a partir
da proposta de proteção social oferecida pelo SUAS – Sistema Único de Assistência Social,
e principalmente, se houver adesão da participante.

Resumindo e tendo como referência o conceito de projeto “um esforço único com
duração definida e produz um produto, um serviço ou resultado exclusivo” do PMBOK4 temos a
seguinte WBS (Work Breakdown Structure), ou seja, EAP - Estrutura Analítica do Projeto
de Intervenção Social, na Figura 1.

4 É um guia de orientação aos profissionais sobre o conhecimento em gerenciamento de projetos. Trata-se de uma
102 Projeto de intervenção social com gestantes e/ou puérperas, usuárias de drogas lícitas e/ou ilícitas

Figura 1. EAP (Estrutura Analítica do Projeto).


Gilzaneide Fernandes da Silva Casatti 103

3. O RESULTADO DO PROJETO DE INTERVENÇÃO SOCIAL

Com um universo de 300 parturientes mensais, obteve-se uma amostra de 14 participantes


no Projeto de Intervenção Social com Gestantes e, ou Puérperas, Usuárias de Drogas
Lícitas e/ou Ilícitas, desenvolvido no Hospital Universitário da Faculdade de Medicina de
Jundiaí, no período de set/10 a dez/10. Essa amostra representa 1,5% ao mês do universo
e é significativa porque é uma amostra autodeclarada com participação de livre e
espontânea vontade.

O projeto de intervenção social articulou as diversas políticas públicas,


principalmente, a Política de Assistência Social, com o trabalho em rede, respeitando os
diversos arranjos familiares com a participação da própria gestante/puérpera e familiares,
garantindo o direito à vida, ao acesso aos serviços de saúde, assistência social, convivência
familiar e comunitária. Constatou-se que é fundamental o encaminhamento com
humanização das gestantes/puérperas, usuárias de drogas lícitas/ilícitas à Rede de
Proteção Social.

Para atingir o objetivo geral “promover o processo de inserção social às gestantes e/ou
puérperas, usuárias de drogas lícitas ou ilícitas visando uma reconstrução familiar, fomentada no
trabalho em rede social, sob a perspectiva da proteção social” foram desenvolvidas as seguintes
ações:

• Levantamento dos aspectos relacionais, sociais, econômicos, psicológicos,


biológicos, culturais, de saúde, de escolarização, ...;
• Promoção da reflexão quanto ao contexto das questões sociais e de saúde
em que a participante está inserida;
• Investigação sobre os tipos de famílias e se há ou não vínculos;
• Construção do Projeto de Intervenção Social com a gestante ou puérpera e
familiares (quando possível);
• Articulação da rede de serviços e proteção social, incluindo a família;
• Encaminhamento com humanização da gestante ou puérpera ao
atendimento social na instituição.

Essas ações resultaram na coleta das seguintes informações, agrupadas em


tabelas e gráficos, conforme seguem na Tabela 1.
104 Projeto de intervenção social com gestantes e/ou puérperas, usuárias de drogas lícitas e/ou ilícitas

Tabela 1. Dados Sociodemográficos.


Categorias Frequência %
Sem documentação 64%
Documentação – RG
Com documentação 36%
Entre 15 e 20 anos 21%
IDADE
Entre 21 e 33 anos 79%
Solteira 57%
Estado Civil
União Estável 43%
Católica 50%
Religião Evangélica 21%
Sem religião 29%
Sem escolarização 7%
Fundamental Incompleto 57%
Escolarização Fundamental Completo 22%
Médio Incompleto 7%
Médio Completo 7%
Não trabalha 43%
Ajudante Geral 15%
Dançarina Boate 14%
Trabalho/renda Atendente Telemarketing 7%
Vendedora 7%
Atendente Balcão 7%
Manicure 7%
Jundiaí/SP 22%
Várzea Paulista/SP 22%
São Paulo/SP 22%
Atibaia/SP 7%
Naturalidade
Campo Limpo Paulista/SP 7%
Sorocaba/SP 7%
Planalto/BA 7%
Curitiba/PR 7%
Jundiaí/SP 43%
Várzea Paulista/SP 36%
Município de Residência
São Paulo/SP 14%
Jarinu/SP 7%
Própria 36%
Alugada 43%
Habitação
Cedida 14%
Em situação de rua 7%
Não dispõe 57%
Infraestrutura
Dispõe 43%
Não tem 29%
Assistir TV 43%
Lazer
Leitura e Redação 21%
Escutar Rádio 7%
Gilzaneide Fernandes da Silva Casatti 105

Fonte: Pesquisa de Campo HU/FMJ/2010.


Gráfico 1. Vínculos Familiares.

Apenas uma pessoa, 7%, em situação de rua e sem vínculos familiares em função
do uso de drogas; 79% mantêm os vínculos e são membros de famílias nucleares,
monoparentais ou extensas; enquanto 14% constituíram novos arranjos familiares,
valorizando os laços afetivos e vivendo sob o mesmo teto.

Fonte: Pesquisa de Campo HU/FMJ/2010.


Gráfico 2. Assistência Social.

O direito à assistência social não é acessado pela maioria, 57% não são assistidas,
não recebem nenhum benefício e também não são acompanhadas por quaisquer serviços
oferecidos através dos CRAS – Centros de Referências de Assistência Social e/ou CREAS
– Centros de Referências Especializados de Assistência Social; 22% participam do
Programa Bolsa Família e 21% ficaram distribuídas entre participantes do Bolsa Família e
Ação Jovem, beneficiárias do Programa Vivaleite e que fazem uso dos serviços de
106 Projeto de intervenção social com gestantes e/ou puérperas, usuárias de drogas lícitas e/ou ilícitas

Tendo como referência o conceito de saúde da VIII Conferência Nacional de


Saúde de 1986: “A saúde é entendida na relação saúde/doença como resultante das
condições de habitação, saneamento básico, meio ambiente, alimentação, educação,
trabalho/renda, acesso aos serviços de saúde, transporte, lazer”. E assim é representada,
acrescentando-se: o acesso à assistência social, previdência social, o papel fundamental da
família e de Deus em nossas vidas, ampliando-se o conceito de saúde.

Figura 2. Conceito ampliado de saúde.

Pelos dados já apresentados relativos à religião, educação, habitação, lazer,


assistência social e trabalho/renda dá para concluir que a saúde da gestante/puérpera
está comprometida mesmo antes de apresentar os dados coletados sobre a saúde. Imagine
a saúde do feto que além desse contexto social foi submetido e resistiu à exposição às
drogas lícitas e ilícitas.

Seguem os dados referentes à saúde:


Gilzaneide Fernandes da Silva Casatti 107

Fonte: Pesquisa de Campo HU/FMJ/2010.


Gráfico 3. Saúde.

Das gestantes, 86% acessaram as Unidades Básicas de Saúde realizando o pré-


natal, tratando de doenças como hipertensão e tireoidismo; e 14% não buscaram suporte
nos serviços de saúde, apenas o acessaram quando estavam em trabalho de parto. Todas
dispunham de informações quanto ao pré-natal. Segundo a amostra de 14% que “optaram
por não fazer o pré-natal”, alegaram que já sabiam como era o pré-natal, pois essa gestação
não era a primeira, mas a segunda ou terceira. O fato é que as gestantes que não
realizaram o pré-natal são solteiras, têm ensino fundamental incompleto, apresentaram
uma composição familiar extensa, incluindo a presença de um ou dois filhos, pais e
irmãos.

Fonte: Pesquisa de Campo HU/FMJ/2010.


Gráfico 4. Dependência química.

Quanto ao uso de drogas no período gestacional, as drogas mencionadas foram:


108 Projeto de intervenção social com gestantes e/ou puérperas, usuárias de drogas lícitas e/ou ilícitas

45% fazem uso de crack (deste percentual 29% declararam fazer uso somente de crack). A
maioria faz uso de crack e nicotina concomitantemente.

Fonte: Pesquisa de Campo HU/FMJ/2010.


Gráfico 5. Agravante Social.

Em virtude da dependência química, 43% relataram agravantes sociais.


Encontram-se cumprindo pena em liberdade, pois já estiveram reclusas ou o companheiro
está recluso.

Fonte: Pesquisa de Campo HU/FMJ/2010.


Gráfico 6. Recém-nascido.

Das participantes, 14% permaneceram com a gestação em curso; 36% tiveram


seus bebês em condições de permanecerem em alojamento conjunto, recebendo alta
tutelada seja pelas mães, sogras ou madrinhas, conforme determinação judicial; 50%
tiveram seus bebês encaminhados à UTI Neonatal com notificação da situação de
drogadição ao Juiz da Vara da Infância e Juventude, como medida imediata de proteção
às crianças.
Gilzaneide Fernandes da Silva Casatti 109

Fonte: Pesquisa de Campo HU/FMJ/2010.


Gráfico 7. Inserção na Rede de Proteção Social.

Todas as gestantes/parturientes, participantes do Projeto de Intervenção Social,


foram encaminhadas com humanização à Rede de Proteção Social, envolvendo o total de
oito equipamentos públicos, oito profissionais e quatro municípios (Jundiaí, Várzea
Paulista, Jarinu e São Paulo). Tendo como resultado: 29% (04) foram encaminhadas para
inserção na rede de proteção social em Jundiaí, precisamente no CRAS do Jardim São
Camilo; 29% (04) foram encaminhadas para inserção na rede de proteção social em Várzea
Paulista, via CRAS Norte; os demais apresentaram um percentual de 7% corresponde a
uma amostra para cada instituição. Enfim, esses são os dados que expressam os
resultados esperados do projeto.

É preciso retomar o Gráfico 1, ora traduzido em tabela, que retrata os vínculos


familiares, para falar da qualidade desses vínculos e o que esses percentuais em ordem
decrescente nos dizem:

Tabela 2. Vínculos familiares em declínio.


Reside com os pais 79%
Reside com amigos(as) 14%
Em situação de rua 7%
Total 100%

Foi notável através da observação e do diálogo que o morar com, nem sempre
quer dizer conviver, compartilhar e ter laços afetivos; assim como o não compartilhar
110 Projeto de intervenção social com gestantes e/ou puérperas, usuárias de drogas lícitas e/ou ilícitas

em relação ao núcleo familiar. Tanto que as 21% (correspondente as 14% que formaram
novos arranjos familiares mais os 7% em situação de rua) das participantes solicitaram o
contato com pai, mãe, tia, irmã para que viessem até o Hospital Universitário efetuarem a
alta, trazerem roupas tanto para elas quanto para o bebê, na esperança da alta conjunta
(com o parto há uma maior sensibilização e visualização de possibilidade de barganha por
parte dessa mãe/parturiente).

Ao contato telefônico, os familiares não estavam receptivos para com essas


puérperas, usuárias de drogas; não desejavam mais tê-las por perto e muito menos
acolherem os bebês, pois já tinham a guarda de pelo menos um ou dois de seus filhos. E a
dependência química foi o fator que se destacou na recusa. Relataram cansaço, descrença
na possibilidade de mudança, não sabiam mais o que fazer e como fazer. Alguns disseram
que não aceitar mais na residência foi o último recurso para manter os demais membros
da família juntos.

Um caso do percentual de 79% que residem com pais e demais familiares se


destacou por duas variáveis mostrando o processo de desagregação familiar:
primeiramente porque são os próprios pais que financiam o uso da droga e alegam o fazer
sob ameaça física e psicológica por parte da própria usuária; segundo, por já ser a terceira
gestação, os pais que têm a guarda dos dois filhos, também via judicial, conseguiram a
determinação de laqueadura e não acolheram o novo bebê alegando não suportarem mais
a situação de dependência química. Analisando este caso a partir do declínio apresentado
na tabela 2, é bem provável que essa usuária, que ainda reside com os pais, venha morar
com amigos (as) e/ou consequentemente seja uma pessoa em situação de rua. O
diferencial está no suporte familiar e na capacidade de resiliência da família, apesar dessa
ter contado com paliativos no período gestacional, como internações hospitalar e
voluntárias, inserção em programas sociais e ações via determinações judiciais. Porém, em
que momento foi ou vai ser tratada a questão dependência química?

4. DISCUSSÃO
“Um povo escravo da droga é facilmente dominado e perde, junto com a sua dignidade,
a capacidade de lutar por seus direitos e de construir seu futuro”.
(SERRAT, 2001, p. 150)

As informações obtidas com a pesquisa-ação mostrou o contexto social da maioria das


gestantes/puérperas, usuárias de drogas lícitas e/ou ilícitas: mantém vínculos familiares
(79%); são solteiras (57%); são católicas (50%) apesar de não praticante; não têm RG (64%),
perderam; têm idade entre 21 e 33 anos (79%); tem ensino fundamental incompleto (57%);
Gilzaneide Fernandes da Silva Casatti 111

as participantes sem e com menor escolarização; são filhas naturais de Jundiaí (22%),
Várzea Paulista (22%) e São Paulo (22%), igualando-se em número de amostras
participantes no projeto; o Estado de São Paulo representou 86% das amostras; residem
em Jundiaí, seja em imóvel próprio, cedido ou alugado, sendo este o de maior uso (43%);
sem dispor de infraestrutura (57%); quanto ao lazer, assistem televisão (43%) ou não tem
(29%); não tem acesso à assistência social (57%), não recebem nenhum benefício e também
não são acompanhadas por quaisquer serviços oferecidos através dos CRAS – Centros de
Referências de Assistência Social e/ou CREAS – Centros de Referências Especializados de
Assistência Social; acessaram as Unidades Básicas de Saúde realizando o pré-natal (86%);
fazem uso de crack e nicotina concomitantemente (45%); não relataram agravantes sociais
(57%); tiveram seus bebês encaminhados à UTI Neonatal com notificação judiciária (50%);
todas as gestantes/parturientes, participantes do Projeto de Intervenção Social, foram
encaminhadas com humanização à Rede de Proteção Social.

A minoria está inserida neste mesmo contexto com agravantes, ou seja, está todas
em situação de alta vulnerabilidade social refletindo diretamente na saúde mãe-bebê,
devido uma questão social maior e não tratada, não cuidada que é a dependência química.
E assim afirma o Professor Saulo Monte Serrat, “Um povo escravo da droga é facilmente
dominado e perde, junto com a sua dignidade, a capacidade de lutar por seus direitos e de construir
seu futuro”, explicando o porquê da dependência química não ser tratada, pelo contrário,
ser ignorada e quando não, utiliza-se de paliativos como a Política de Redução de Danos,
que no Brasil tem como principais atividades desenvolvidas: disponibilidade de
equipamento estéril e descartável para injeção, disponibilização de material informativo,
disponibilização de preservativos, aconselhamento, encaminhamento aos serviços de
saúde e assistência social, vacinação contra hepatite B, ações de advocacy (advogar em
favor de uma causa) e comunicação social, vigilância epidemiológica, formação
continuada de agentes redutores de danos (agentes treinados que efetivam as ações de
campo com os usuários de drogas e suas redes de interface), seguidos de avaliações
sistemáticas das ações citadas. Ou seja, não tratamos, ignoramos, ou nos tornamos
aliados. Jamais prevenimos.

Assim, todo o ônus fica com a família porque a ideologia predominante é de


culpabilização: “os pais que não souberam educar”, “os pais que foram trabalhar e não protegeram
os filhos das drogas”, “os pais também são usuários de drogas e não deram bons exemplos” e “n’s”
possibilidades que culpabiliza o núcleo familiar. Acosta e Vitale, organizadoras do livro
Família, Redes, Laços e Políticas Públicas propõem pensar e repensar a família como uma
exigência fundamental, uma vez que esta tem sido percebida como base estratégica para
112 Projeto de intervenção social com gestantes e/ou puérperas, usuárias de drogas lícitas e/ou ilícitas

condução de políticas públicas, não podendo ser vista apenas como estratégia dessas
políticas:
[...] a tese aqui defendida é homeopática: defende o trabalho socioeducativo e militante,
adota a família como lócus do protagonismo social para usar o feitiço contra o feiticeiro,
usando o mesmo remédio para obter efeitos contrários, em lugar da disciplinarização a
liberdade, em lugar do isolamento a abertura ao coletivo. A escolha da família se
justifica graças à sua principal característica, o valor afeto. Sua eficiência depende da
sensibilidade e da qualidade dos vínculos afetivos. O perigo é que, por essas
características, ela possa se tornar instrumento privilegiado de sustentação do poder:
uma união de indivíduos atomizados e reprimidos pautada por fidelidade pessoal e
agressão a tudo o que é diferente; o poder transvertido de amor (uma forma de inclusão
perversa, eficiente, onde se associa amor, autoritarismo e respeito, troca afeto por
obediência, a submissão é sentida como amor, para ter afeto dos pais é preciso
obedecer); confundir intimidade com democracia e liberdade – a proximidade não
aumenta o calor humano, segundo Sennet “quanto mais chegadas as pessoas, menos
sociais, mais dolorosas serão suas relações” (1989:412). (SAWAIA, 2010, p.44)

Sawaia ainda nos lembra, os crimes em família que aparecem com frequência na
mídia, destacando que a causa relatada pelos assassinos é a necessidade de recuperar
aquilo de que foram privados ou que julgam ser seu de direito – a ação repressiva dos
pais, o uso de drogas, a falta de amor, a falta de dinheiro e a loucura. Todos esses motivos
alegados tem em comum a supremacia do culto ao individuo, a busca individual e
solitária da felicidade. Os dados estatísticos da pesquisa refletem essa realidade
apresentando como agravante o fato de que as gestantes/parturientes já estiveram
reclusas ou o companheiro está recluso. E reforçam uma das hipóteses apresentadas de
que a gestante/puérpera, usuária de drogas lícitas e/ou ilícitas, traz consigo o resultado
de vários problemas, a reprodução de situações impostas por um contexto social e a busca
por uma solução individualista, até mesmo quando se recusam a fazer o pré-natal.
Tentam ser protagonistas de suas histórias marcadas para serem assim e devido à ausência
de escolarização e educação vivem na mais absoluta alienação.

Segundo o Manual Técnico sobre Pré-Natal e Puerpério: atenção qualificada e


humanizada para implementar as atividades do controle pré-natal é necessário identificar
os riscos aos quais cada gestante está exposta, incluindo uma série de fatores, entre eles,
gravidez na adolescência, uso de drogas, intercorrências clínicas crônicas, ... . Isso permite
a orientação e os encaminhamentos adequados em cada momento da gravidez. É
indispensável que essa avaliação do risco seja permanente, aconteça em toda consulta e
em cada nova gestação. Significa que é fundamental a adesão da gestante ao pré-natal
para o bom acompanhamento técnico. Quando a adesão não ocorre sinaliza que direitos
da mãe-feto estão ameaçados ou violados, seja por parte da mãe, da família, da sociedade
ou do Estado.

Pode também ocorrer o não acesso ao pré-natal pela ausência de UBS e de


ginecologistas, em determinados territórios, pelo processo (longo, demorado,
Gilzaneide Fernandes da Silva Casatti 113

burocratizado) de acesso à unidade de saúde, ou até mesmo pela ausência de estratégias,


para mostrar que os serviços são reservados e confiáveis, não os caracterizando como
atendimentos que dão suporte e apoio, sem emitir juízo de valor, desde o atendimento de
pré-consulta ao pós-consulta. Restando às gestantes, usuárias de drogas lícitas e, ou
ilícitas a única porta de acesso aos serviços de saúde, o hospital, no momento do trabalho
de parto.

Sem adesão ao pré-natal as ações educativas não acontecem e sem confiança nos
serviços ofertados, também não. Profissionais e cidadãos de mãos atadas, sem diálogo,
não se envolvem, não participam nas resoluções dos problemas sociais e de saúde, ficando
estas a cargo do Estado – um Estado máximo para o capital e mínimo para o cidadão. Um
Estado que pactua com um sistema de mercado neoliberalista: cortes de despesas
públicas, liberalismo econômico, privatização do domínio público, prioridade absoluta no
combate à inflação, transformação do direito em judicialização e num formalismo jurídico
processual, progressiva preeminência da mercadoria acima de qualquer outra
consideração. A saúde e a educação foram transformadas em mercadorias desde então,
tornaram-se sem qualificação tanto na esfera pública como privada. Tudo isso representa
sinal de crise, frutos de um sistema que oprime, manipula, destrói gerando uma enorme
concentração de renda e uma grande massa de excluídos sociais.

As políticas públicas são meros paliativos apesar de ser uma construção social,
através da participação nos conselhos paritários (representatividade: 50% governo e 50%
sociedade civil), ainda são excludentes, os que mais precisam são exatamente os que
menos têm acesso às ações de prevenção, promoção e recuperação ao binômio
saúde/vida. Em pleno século XXI as relações de favor e de privilégios ainda prevalecem,
seja no acesso à saúde, à educação, à seguridade social, ao mundo do trabalho formal, ao
lazer, à habitação, ... “A ideologia do favor atravessa a formação política brasileira, o favor é a
nossa mediação quase universal” (IAMAMOTO, 2007).

Junqueira e Proença (2010) citam através de dados da SEADS – Secretaria


Estadual de Assistência e Desenvolvimento Social, os princípios norteadores dos
programas de atenção à família:
[...] é preciso consolidar e aprimorar a assistência social; a família representa o principal
eixo articulador e integrador das políticas públicas; centrar as ações nos focos de
exclusão social; avaliar os resultados via indicadores; introduzir projetos geradores de
renda, criando condições às famílias para inserção produtiva e sua auto-sustentação;
mapear a rede de proteção social em todas as áreas: saúde, educação, habitação, cultura,
esporte, lazer; manter um cadastro único para beneficiários da assistência; valorizar e
recuperar a rede de proteção social mantida pela própria comunidade, integrando-as as
políticas públicas.
114 Projeto de intervenção social com gestantes e/ou puérperas, usuárias de drogas lícitas e/ou ilícitas

E Blanes (2010, p.232) alegando que existem muitos indicadores quantitativos


utilizados nas diversas ciências desafia-nos a estabelecer indicadores qualitativos, que meçam
em quanto aumenta a autoestima de um indivíduo que participa de um grupo
terapêutico, se houve ou não melhoria na sociabilidade dos jovens que vão ao teatro, os
avanços na forma de participação das famílias nas atividades socioeducativas, ...; enfim,
mensure o quanto uma família se desenvolveu ao longo de um processo de trabalho
devidamente planejado e conjuntamente construído, envolvendo a própria família, para
que de fato, enquanto profissionais envolvidos e corresponsáveis pelos processos de
trabalho possamos avaliar nossas ações, rever a direção de nossos atos e atitudes (as ações
são coerentes com os objetivos propostos e metas estabelecidas?) pois até então, reforçam
mais uma das hipóteses ao problema em questão: “os profissionais e os cidadãos não se
envolvem, não participam nas resoluções dos problemas sociais e de saúde ficando estas a
cargo do Estado omisso, porque assim o convém financeiramente”.

Assim, quando Acosta e Vitale propõem pensar e repensar a família como uma
exigência fundamental independente dos novos arranjos familiares, porque é um forte
agente de proteção social de seus membros: idosos, doentes crônicos, dependentes,
crianças, adolescentes e desempregados, não podendo ser vista apenas como estratégia de
políticas. Reforçam ainda “não podemos ignorar esse potencial protetivo sem lhe ofertar
apoio”, despertando-nos à responsabilidade e compromisso de todos os envolvidos:
cidadão, família, sociedade, mercado e Estado.

A pesquisa também reforçou que a família precisa de apoio, tem resiliência,


suporta até onde os limites permitem sem apoio e somente quando se percebe totalmente
sozinha, sem suporte, sem proteção para continuar protegendo desiste, dobra-se ao
mercado e desagrega-se.

Segundo Dowbor (2010) é importante lembrar que as políticas públicas apesar de


todo gosto que temos em criticar o Estado, constituem de longe o instrumento mais
eficiente de promoção de políticas sociais, e em todo caso as únicas que permitem o
reequilíbrio social. A razão é bastante simples:
[...] uma empresa privada quer ter mais clientes, o que no caso da saúde significa mais
doentes, com isso se perde a visão essencial da prevenção; na educação, o processo é
semelhante, com as universidades privadas aumentando simplesmente o número de
alunos por professor: aluno é dinheiro, professor é custo.

Assim, não basta apenas lamentar a dissolução da família é preciso repensar todo
o processo de construção social, pois ansiamos pelo sentido das coisas (não há sentido o
dinheiro pelo mais dinheiro; o poder pelo mais poder, se isso traz sofrimento, violência e
guerra). A questão não é apenas a gestante/puérpera ser usuária de drogas, dependente
Gilzaneide Fernandes da Silva Casatti 115

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Quando as pessoas trabalham juntas, constroem
confiança e respeito e se tornam capazes de
solucionar problemas”. (ELINOR OSTROM, 2009)

A estrutura analítica do projeto é simples apesar da complexidade pela questão social que
o envolve e o tempo que requer. O seu desenvolvimento dentro do hospital é
fundamental para garantir o acesso às políticas públicas lembrando que 57% das
participantes da pesquisa, não haviam acessado o direito à assistência social e 14% não
realizaram o pré-natal. Valorizar a participação da gestante/puérpera e de seus familiares,
demais profissionais e rede de proteção social é de suma importância, assim como,
realizar todo o processo de desenvolvimento do projeto com humanização, via diálogo,
estabelecendo vínculos, respeitando os diversos arranjos familiares, promovendo a
inclusão social das gestantes/puérperas e garantindo o acesso aos direitos e proteção
social para criança, puérpera-mãe, família.

Dos resultados esperados com o projeto, o primordial “todas as


gestantes/parturientes, participantes do Projeto de Intervenção Social, foram
encaminhadas com humanização à Rede de Proteção Social” traduz-se na necessidade de
sua implantação. Primeiramente pelo fato de seu desenvolvimento ser dentro do hospital,
local que consegue abranger e atender a todas, nem que seja somente no momento do
trabalho de parto; segundo porque é uma forma clara de implantação da Política Nacional
de Humanização: a mãe-puérpera, independente de receber alta hospitalar acompanhada
ou não pelo seu bebê, tem o direito de acessar as políticas públicas, afinal através do
projeto adquire-se informações potencializadoras sobre programas, serviços e direitos,
que se bem utilizadas podem ser o começo à reinserção social, à convivência familiar e
comunitária. Caso contrário, daqui a aproximadamente um ano, esta pode retornar ao
hospital para um novo parto reproduzindo todo o processo e sem ter tido nenhuma
intervenção social entre uma gravidez e outra, salvo os casos que, via judicial, sofreram a
intervenção cirúrgica de laqueadura. Como também, sem nenhum suporte quanto à
questão da dependência química.

O encaminhamento à rede de proteção social caracterizará por parte do


profissional, o seu compromisso ético-político com a população usuária para além da
judicialização do direito garantido à criança quanto à questão de protegê-la de sua própria
mãe, fundamental à sua vida; porém, é preciso oportunizar a essa mãe-puérpera o
caminho possível ao acesso de seus direitos, assim como é importante à rede de proteção
social está aberta às novas inserções, configurando sua razão de ser assumindo seu
compromisso social.
116 Projeto de intervenção social com gestantes e/ou puérperas, usuárias de drogas lícitas e/ou ilícitas

A primeira mulher ganhadora do Prêmio Nobel de Economia, em 2009, Elinor


Ostrom, afirma: “Quando as pessoas trabalham juntas, constroem confiança e respeito e se
tornam capazes de solucionar problemas”. É em torno desse lema que enquanto
idealizadora deste projeto, vejo-me inserida na “rede que leva a outra e outras porque
ninguém faz nada sozinho, as instituições também não, o trabalho de uma complementa o
da outra” (Prefeitura Municipal de Várzea Paulista, 2009). E o diferencial está nos seus
recursos humanos, nas pessoas envolvidas.

O Projeto de Intervenção Social com Gestantes e, ou Puérperas, Usuárias de


Drogas Lícitas e/ou Ilícitas foi desenvolvido com sucesso, sendo o seu desempenho
auferido através de sua efetividade, eficiência e eficácia relacionando-os respectivamente
aos resultados alcançados, recursos alocados e utilizados tendo seu objetivo alcançado,
principalmente, porque contou com o trabalho de profissionais comprometidos e que
assumem sua responsabilidade social.

REFERÊNCIAS
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dependência, sejam reguladas por esta Portaria.
______. Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República. Direitos Humanos
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Gilzaneide Fernandes da Silva Casatti 117

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SERRAT, Saulo Monte (org.). Drogas e Álcool: prevenção e tratamento. Campinas: Komedi, 2001.

Gilzaneide Fernandes da Silva Casatti


Assistente Social Graduada pela Faculdade de
Serviço Social/PUC-Campinas; Servidora Pública
lotada no CRAS Norte/Prefeitura Municipal de
Várzea Paulista; Pós-Graduação, MBA em Gestão
de Projetos, pela Anhanguera Educacional.
118 Projeto de intervenção social com gestantes e/ou puérperas, usuárias de drogas lícitas e/ou ilícitas

ANEXO 1 - ENTREVISTA SOCIAL ESTRUTURADA


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ANEXO 2 - PLANO DE INTERVENÇÃO SOCIAL


120 Projeto de intervenção social com gestantes e/ou puérperas, usuárias de drogas lícitas e/ou ilícitas

ANEXO 3 - ENCAMINHAMENTO PADRONIZADO

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