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Atividade racional: a intuição

e a razão discursiva
Antônio Ronaldo Costa Dias

Introdução
A atividade racional é uma das mais interessantes no ser humano, pois por meio dela pode-
mos obter conhecimento e julgar os acontecimentos. Além disso, ela nos possibilita ir além em
determinados campos da ciência. Segundo Marilena Chaui (2000 p. 81), “o raciocínio é conside-
rado o conhecimento que exige provas, demonstrações das verdades que estão sendo conhecidas
ou investigadas”.
Podemos tomar como exemplo um caçador que está em busca de uma raposa. Ele verifica
as pegadas, observa os galhos quebrados e, enfim, parte de pistas e indícios para uma conclusão
ou decisão final. Nesta aula, estudaremos os procedimentos racionais e suas bases principais, tais
como a intuição, a dedução, a indução e a abdução.

Objetivos de Aprendizagem
Ao final deste estudo, você será capaz de:

•• entender os conceitos de dedução, indução e abdução;


•• compreender as diferenças entre empirismo e idealismo.

Bons estudos!

1 Intuição
Para entender a intuição, imagine o esforço intelectual de um médico, que faz o diagnóstico
e compreende a causa da doença, já projetando os possíveis modos de tratá-la. Para Chaui (2000,
p. 81), “a intuição é uma compreensão global e instantânea de uma verdade, de um objeto, de um
fato. Nela, de uma só vez, a razão capta todas as relações que constituem a realidade e a verdade
da coisa intuída”. Ainda de acordo com a autora (2000), a intuição corresponde a um ato intelectual
de discernimento e compreensão.

2 Razão Discursiva
Diferente da intuição, a razão discursiva não se dá de uma só vez. Esta razão exige prova,
conexões entre ideias e passo a passo para uma conclusão.
2.1 Dedução
Segundo Chaui (2000), a dedução consiste em partir de uma verdade já conhecida - seja
por intuição, seja por demonstração anterior - e que funciona como um princípio geral ao qual se
subordinam todos os casos que serão demonstrados a partir dela. Aqui, aplicamos uma verdade
provada a todos os casos similares. Diz-se que a dedução vai do geral ao particular, isto é, tem
como ponto de partida o geral e como ponto de chegada o particular. O ponto de partida da dedu-
ção é uma ideia ou teoria verdadeira.

EXEMPLO
Tomemos como ponto de partida as definições geométricas gerais de ponto, linha
e área e deduzimos todas as figuras geométricas possíveis. Utilizamos uma defini-
ção geral que se aplica a todas as figuras geométricas e caminhamos em direção a
figuras que podem ser formadas segundo essa definição geral.

Figura 1- Pensamento dedutivo.


Fonte: Ollyy/Shutterstock.com

De acordo com Dicionário básico de Filosofia (JAPIASSU; MARCONDES, 1991), a palavra


“dedução” tem o significado exposto no quadro a seguir.

Dedução (lat. deductio).


1. Raciocínio que nos permite tirar de uma ou várias proposições uma conclusão que delas decorre
logicamente.
2. Na matemática, a dedução é sinônimo de demonstração.
3. Nas ciências experimentais, o método hipotético-dedutivo é aquele que parte de várias propo-
sições consideradas como hipóteses, retirando delas os conhecimentos necessários, que são
submetidos à verificação.

Quadro 1 – Etimologia e significado do termo “dedução”.


Fonte: JAPIASSU; MARCONDES, 1991, p. 49.
Outra definição para “dedução” é que se trata de “[...] uma inferência que vai dos princípios
para uma consequência logicamente necessária.” (ARANHA, 1986, p. 100).

Figura 2 - Teorema de Tales.


Fonte: NeydtStock/Shutterstock.com

SAIBA MAIS!
O livro Grande Sertão: Veredas, de Guimarães Rosa (2001), é um ótimo recurso
para se entender o procedimento racional denominado “indução”. A leitura desse
clássico de nossa literatura vale a pena!

Assim, podemos afirmar que a dedução é um procedimento ou atividade racional na qual


objetos particulares são conhecidos e investigados a partir de uma teoria geral. Sabemos que a
razão nos fornece regras para que possamos realizar a dedução; caso elas não sejam seguidas,
a dedução em si não possuirá validade e será considerada falsa. No próximo item falaremos a
respeito de outro procedimento racional: a indução.

2.2 Indução
A indução é o procedimento mais importante, pois possibilita a descoberta de características
ou propriedades de materiais, objetos etc. Segundo Chaui (2000, p. 82), percebemos que a indução
realiza um caminho oposto ao da dedução. Mas como exatamente? Bem, com a indução, partimos
de casos particulares iguais ou semelhantes e vamos à procura de uma lei, definição ou teoria
geral que subordina e explica todos os casos particulares.
A indução também deve seguir as regras da razão para se tornar válida, ou seja, não deve
haver violação dessas normas sob penalidade de o resultado ser considerado falso. “A dedução
e a indução são conhecidas com o nome de inferência, isto é, concluir alguma coisa a partir de
outra já conhecida. Na dedução, dado X, infiro (concluo) a, b, c, d. Na indução, dados a, b, c, d infiro
concluo X.” (CHAUI, 2000, p. 83).
Para que tenhamos um entendimento melhor a respeito de indução, realizamos o seguinte
experimento: colocamos para ferver diferentes líquidos e observamos sua vaporização. Induzi-
mos, a partir das observações, que o fogo desempenha um papel importante, promovendo a eva-
poração dos líquidos. Logo, concluímos que essa propriedade é o calor.

FIQUE ATENTO!
A dedução e a indução são procedimentos racionais que se opõem. Enquanto a
indução parte dos vestígios para chegar ao todo, na dedução parte-se do todo, de
uma lei geral, e estuda-se os casos particulares.

Observamos que cada um dos líquidos de nosso experimento evapora em um determinado


tempo. Procuramos a causa para isto e concluímos que se trata de alguma propriedade ou carac-
terística intrínseca ao líquido, que o faz evaporar em uma velocidade X. Podemos, então, formular
uma teoria geral a respeito da evaporação de líquidos relacionada às propriedades de cada um
deles. Com os conhecimentos adquiridos a respeito da indução, partimos agora para o terceiro e
último caso, que é a abdução.

2.3 Abdução
Entenda a abdução como a busca de uma conclusão pela leitura e interpretação racional de
sinais, indícios e signos. De acordo com Chaui (2000), a abdução é uma espécie de intuição que
ocorre passo a passo até se chegar a uma conclusão.
Um exemplo clássico e mundialmente conhecido de abdução são os contos policiais nos
quais os detetives e investigadores coletam pistas e vão decifrando o evento principal aos poucos,
até que finalmente formam uma teoria para o caso que investigam. Abdução é um meio que a
razão dispõe para iniciar um estudo de um novo campo científico ainda inexplorado (CHAUI, 2000).
O caso da abdução é muito utilizado por historiadores, por exemplo.
Podemos concluir, portanto, que a indução e a abdução são procedimentos racionais que
empregamos para a aquisição de conhecimento. Já a dedução é usada na verificação ou compro-
vação de uma verdade, de um conhecimento adquirido.

SAIBA MAIS!
O livro “As aventuras de Sherlock Holmes”, de Sir Arthur C. Doyle, é uma boa fonte para
que você possa visualizar na prática a técnica da abdução, bem como os outros procedi-
mentos racionais estudados nesta aula. Confira: <https://books.google.com.br/books?i-
d=mzcdDAAAQBAJ&lpg=PT2&dq=as%20aventuras%20de%20sherlock%20holmes%20
sir%20arthur%20conan%20doyle&hl=pt-BR&pg=PP1#v=onepage&q&f=false>.
Figura 3 - Sherlock Holmes, personagem famoso por utilizar métodos de investigação racionais.
Fonte: Prill/Shutterstock.com

EXEMPLO
Em A Liga dos Cabeça-Vermelha (2011), uma entidade misteriosa fornecia dinheiro
a determinados homens com cabelos ruivos. Um personagem chamado Wilson, que
possui cabelos ruivos, tenta a todo custo se associar a essa misteriosa liga. Quando
consegue, em um dia comum vai ao escritório e se depara com a porta trancada e a liga
dissolvida. Sherlock Holmes segue sua excelente dedução para elucidar este mistério.

Como vimos, a dedução, a indução e a abdução são atitudes racionais que utilizamos na
busca de novos conhecimentos. Sem estes procedimentos, ficaríamos estacionados no que já é
conhecido e comprovado, o que dificultaria tecnologias e descobrimentos.

FIQUE ATENTO!

Na abdução, há a presença da indução, mas com uma única diferença: há a consta-


tação ou conclusão do que foi levantado em uma só etapa.

Agora faremos um estudo a respeito de técnicas utilizadas na busca da verdade e da razão.


Continue acompanhando!

3 Diferenças entre empirismo e idealismo

3.1 Empirismo
Podemos compreender o empirismo como a busca do conhecimento, da razão e da verdade
por meio da experiência. Antes de nossa experiência, nossa razão é como uma folha em branco,
em que nada foi escrito (CHAUI, 2000, p. 88). A partir de nossas experiências, vamos preenchendo
essa folha em branco com referências.
Ao longo da história da Filosofia, muitos filósofos defenderam a tese empirista, dentre os
quais podemos destacar: Francis Bacon; John Locke; George Berkeley; e David Hume.

Figura 4 – O filósofo John Locke (1632-1704), adepto do empirismo.


Fonte: Alphaspirit/Shutterstock.com

Segundo Chaui (2000, p. 88) os empiristas afirmam que “nossos conhecimentos começam
com as experiências em nossos sentidos, isto é, nossas sensações”. Os objetos exteriores excitam
nossos órgãos dos sentidos e vemos cores, sentimos sabores e odores, ouvimos sons etc.

3.2 Idealismo
Para que possamos entender o “idealismo”, devemos primeiramente entender o que é realismo.
Chaui (2000) afirma que o realismo é a posição filosófica que pressupõe a existência objetiva da
realidade externa como uma realidade racional em si e por si, e que podemos acessá-la por meio da
razão, conhecida como razão objetiva.

FIQUE ATENTO!
O idealismo difere do empirismo pelo fato de o primeiro estar baseado na realidade
racional por meio de nossas ideias, ao passo que o segundo é um procedimento no
qual adquirimos experiência por meio de nossas sensações e sentidos.

Devemos entender que há uma diferença entre a realidade e o conhecimento racional que dela
temos. Embora a realidade externa exista em si, só podemos conhecê-la por meio de nossas ideias,
certo? Por exemplo, nossa percepção do mundo exterior, dos lugares e das pessoas a nossa volta é
subjetiva e pode ter diversas interpretações. Essa posição filosófica é chamada de idealismo.
Fechamento
Assim, finalizamos o conteúdo a respeito dos procedimentos racionais. Compreendendo
seus principais componentes e situações.

Nesta aula, você teve a oportunidade de:

•• perceber que o homem adquire e testa o conhecimento por meio dos procedimentos
racionais;
•• ver que esses procedimentos possibilitam avanços em diversas áreas do conheci-
mento humano;
•• compreender a intuição, a dedução, a indução e a abdução;
•• identificar a diferença entre o empirismo e o idealismo.

Referências
ARANHA, Maria Lúcia de Arruda; MARTINS, Maria Helena Pires. Filosofando: introdução à filosofia.
São Paulo: Moderna, 1993.

CHAUI, Marilena. Convite à Filosofia. São Paulo: Ática, 2000.

COTRIM, G. Fundamentos da Filosofia: História e grandes temas. São Paulo: Saraiva, 2000.

DOYLE, Arthur Conan. As Aventuras De Sherlock Holmes. Rio de Janeiro: Companhia Editora
Nacional, 2013. Disponível em: <books.google.com.br/books?id=mzcdDAAAQBAJ&pg=PT2&l-
pg=PT2&dq=as+aventuras+de+sherlock+holmes+sir+arthur+conan+doyle&source=bl&ot-
s=X0NKBUkfnM&sig=zg1ezlO4BT6dpShtczwSPCZ93RM&hl=pt-BR&sa=X&ved=0ahUKEwjN-
tvjPlYfOAhWCGZAKHQOrAOk4FBDoAQghMAE#v=onepage&q=as%20aventuras%20de%20
sherlock%20holmes%20sir%20arthur%20conan%20doyle&f=false>. Acesso em: 22 jul. 2016.

JAPIASSU, Hilton; MARCONDES, Danilo. Dicionário básico de filosofia. 2. ed. Rio de Janeiro: Zahar,
1991.

MICHAELIS. Dicionário escolar da língua portuguesa. São Paulo: Melhoramentos, 2009.

PESSANHA, José Américo Motta. Sócrates – Coleção Os Pensadores. São Paulo: Nova Cultural, 1987.

ROSA, Guimarães. Grande Sertão: veredas. 19. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2001.

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