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EXCELENTÍSSIMA SENHORA DOUTORA JUIZA DE DIREITO DA

4ª VARA CRIMINAL DA CIDADE E COMARCA DE CASCAVEL -


ESTADO DO PARANÁ

Justitia est constans et perpetua voluntas jus


suum cuique tribuendi.
Platão e Aristóteles. Ulpiano.

AUTOS N° 0030163-83.2017.8.16.0021

VINICIUS CONTICELLI DE PAULA, já devidamente


qualificada nos autos em epígrafe que lhes move o Ministério Público
do Estado do Paraná, por meio de seus advogados devidamente
constituídos, vem respeitosamente à elevada presença de Vossa
Excelência, para apresentar suas ALEGAÇÕES FINAIS SOB A
FORMA DE MEMORIAIS, o que faz com lastro no artigo 403 §3º do
Código de Processo Penal, pelos fatos e argumentos a seguir
articulados:
1. SINTESE FÁTICA E PROCESSUAL:

A Justiça Pública do Estado do Paraná, através da


presente ação penal, busca apurar a prática pelo Acusado do crime
de fraude a licitação, o qual é consubstanciado no artigo 90 da Lei
8.666/93, sendo que ofereceu denúncia contra o mesmo na
sequencial 1.1 destes autos.

A denúncia ofertada contra a acusado foi recebida


pelo MM. Juiz (mov. 9.1), o qual determinou a sua intimação para
apresentar defesa.

A resposta à acusação foi apresentada junto ao


(mov. 76.1, mov. 135.2) requerendo a rejeição da denúncia, pois o
acusado não teria praticado nenhuma conduta criminosa, além de
arrolar testemunhas.

Foram realizadas audiências de instrução em


diversas Comarcas. Foi ouvida a testemunha Paulo Henrique Wagner,
arrolada pela acusação (eventos 260 e 956). As testemunhas de
acusação e defesa Edinaldo Marcondes de Oliveira, Jaime Novais
Antun e Arnaldo Cikotski (evento 614).

As testemunhas arroladas pela defesa Eliane


Cristina de Oliveira Carnoski, Sueli Goiz da Silva, Juliano da Silva,
Rosimara de Zila, Adilson José Rizzo, Sandro Mattevi Dal Bosco,
Juarez Paim, Aguinel Marcondes Waclawovsky, André Tarcisio
Ultzeihimer, Marcos Abimael de Farias, Joaquim Martins Alves e
Edgar Bueno (eventos 530, 539, 614, 712, 787 e 986).

Na sequência, os réus foram interrogados (evento


986).
O Ministério Público, em alegações finais, narrou
materialidade e indícios suficientes de autoria de crime consumado
pelo Acusado, requerendo a condenação do mesmo nas penas do
artigo 90, da Lei n. º 8.666/93 em combinação com artigo 26 do
Código Penal.

Vieram os autos para alegações finais pela defesa.

Em síntese, esses são os fatos.

2. PRELIMINARMENTE

a. Da inépcia da inicial
Peça acusatória que não descreve fatos criminosos aptos a
permitir o exercício do contraditório e da ampla defesa.
Descrição genérica da conduta do acusado.

Excelência, em que pese o grande apreço que a defesa


nutre pelo Ilustre Representante no Órgão Ministerial, no presente
caso não houve individualização da suposta conduta criminosa
perpetrada pelo acusado. A Denúncia oferecida encontra-se em
desrespeito aos preceitos do nosso sistema processual penal, motivo
pela qual deveria ter sido rejeitada, tendo em vista não estar
amoldada aos pressupostos descritos no Artigo 41 do Código de
Processo Penal, não permitindo o provimento para a condenação do
acusado.

A doutrina e jurisprudência alinham-se ao apontar os


requisitos mínimos de uma peça acusatória, podendo-se citar, por
todos, as lições de Ada Pellegrini Grinover, Antonio Scarance
Fernandes e Antonio Magalhães Gomes Filho:
"A instauração válida do processo pressupõe o
oferecimento de denúncia ou queixa com exposição
clara e precisa de um fato criminoso, com todas as suas
circunstâncias (art. 41 do CPP), isto é, 'não só a ação
transitiva, como a pessoa que a praticou (quis), os
meios que empregou (quibus auxiliis), o malefício que
produziu (quid), os motivos que a determinaram a isso
(cur), a maneira por que a praticou (quomodo), o lugar
onde a praticou (ubi), o tempo (quando)’ (João Mendes
Jr.). (As nulidades no processo penal. 11ª ed. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p. 90-91.) ”.

No caso dos autos, da leitura da exordial em tela,


constata-se que o Ministério Público deixou de descrever
qualquer conduta comissiva ou omissiva atribuível ao acusado
apta a configurar a sua responsabilidade criminal pelo crime
descrito no art. 90 da Lei 8666/93, que trata da “fraude” a
competitividade de processo licitatório por ofensa à isonomia.

Tem-se que a acusação apenas afirmou que o acusado


Vinicius Leon Conticelli de Paula na qualidade de representante da
empresa V.C DE PAULA, em conluio com os demais representantes
das empresas, monopolizaram o veículo oficial e servidor público
especialmente designado pela administração para cumprir requisito do
edital, não mencionando, em momento algum, os prejuízos causados
aos cofres públicos, ou mesmo a intenção dos increpados em
danificar o erário municipal.

Por conseguinte, não constando da peça vestibular a


necessária descrição do nexo de causalidade entre a conduta
atribuída ao acusado e os fatos típicos nela descritos, verifica-se a
sua inaptidão para a deflagração da ação penal.
Nesse sentido:

PROCESSUAL PENAL. DENÚNCIA. REQUISITOS.


ART. 41 DO CPP. GOVERNADOR. FORO POR
PRERROGATIVA DE FUNÇÃO. STJ.
DESMEMBRAMENTO. CONCURSO DE AGENTES.
DESCRIÇÃO INDIVIDUALIZADA DAS CONDUTAS.
AUSÊNCIA. PREJUÍZO A AMPLA DEFESA. INÉPCIA.
REJEIÇÃO. ART. 395, I, DO CPP.(...)3. No
concurso de agentes, a denúncia deve
apontar individualizadamente a conduta de cada
coautor ou partícipe, salvo se todos tiverem
participado igualmente da ação criminosa ou se
suas condutas tiverem sido difusas, não sendo
possível distinguir a atuação de cada um. 4. Ocorre a
inépcia da denúncia ou queixa quando não
descrever fato criminoso, não imputar fatos
determinados ou se da sua exposição não resultar
logicamente a conclusão. 5. Na presente hipótese,
a denúncia não delimita a modalidade de
contribuição do acusado para a suposta prática
dos crimes dos arts.288 e 312 do CP, 90 e 92 da
Lei 8.666/93, tampouco demonstra a
correspondência concreta entre suas condutas e
as dos demais agentes, o que prejudica a
adequada representação dos supostos fatos
criminosos e impede a compreensão da
acusação que se lhe imputa, causando, por
consequência, prejuízo a seu direito de ampla
defesa.6. Denúncia rejeitada, por inépcia.(APn 823/DF,
Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, CORTE ESPECIAL,
julgado em 16/08/2017, DJe 22/08/2017.

Registre-se, por oportuno que, se a denúncia é


natimorta, preferível que se passe desde logo o competente atestado
de óbito, porque não há lugar maior para o extravasamento dos ódios
e dos rancores do que a deflagração de uma actio poenalis contra
pessoa reconhecidamente inocente.

No presente caso a denúncia não delimita a


modalidade de contribuição do acusado para a suposta prática
dos crimes tipificados na exordial, motivo pelo qual a denúncia
deveria ter sido rejeitada, porém agora, deve ser reconhecida a
improcedência da mesma, com a consequente absolvição do
acusado, por ser medida de direito e de Justiça.

3. DÓ MÉRITO

a. Da ausência de vedação legal quanto à participação em


procedimento licitatório de empresas do mesmo grupo
econômico, ou que possuam sócio em comum.

Excelência, a Lei de licitações n. º 8.666/93 não abrange


o impedimento de participação de pessoa física ou jurídica da qual
seja integrante sócio que possua relação de parentesco ou seja
membro de outra empresa concorrente. Não se pode admitir em
nosso direito a presunção segundo a qual a relação entre os sócios,
por si só, já implicaria em violação à isonomia e à moralidade,
acarretando em favorecimento a determinada pessoa física ou
jurídica, ou seja, não há que falar em fraude à licitação em razão da
violação ao princípio da não restrição à competitividade, todavia, as
referidas empresas devem atuar sem arranjos que possam
macular a competitividade do certame, e é o que ocorre no
presente caso.

Não há no rol do artigo 9º da Lei 8.666/93 uma vedação


expressa à participação em licitações de
empresas com sócios em comum, ou pertencentes à mesma família,
de modo que o referido rol deve ser interpretado restritivamente, não
podendo, pois, ser alargado pelo intérprete da Lei (art. 37, XXI da CF).

Vejamos o que leciona o artigo 9º da Lei de Licitações:

Art. 9º Não poderá participar, direta ou


indiretamente, da licitação ou da execução de obra
ou serviço e do fornecimento de bens a eles
necessários:
I - o autor do projeto, básico ou executivo, pessoa física
ou jurídica;
II - empresa, isoladamente ou em consórcio,
responsável pela elaboração do projeto básico ou
executivo ou da qual o autor do projeto seja dirigente,
gerente, acionista ou detentor de mais de 5% (cinco por
cento) do capital com direito a voto ou controlador,
responsável técnico ou subcontratado;
III - servidor ou dirigente de órgão ou entidade
contratante ou responsável pela licitação.
§ 1o É permitida a participação do autor do projeto ou da
empresa a que se refere o inciso II deste artigo, na
licitação de obra ou serviço, ou na execução, como
consultor ou técnico, nas funções de fiscalização,
supervisão ou gerenciamento, exclusivamente a serviço
da Administração interessada.
§ 2o O disposto neste artigo não impede a licitação ou
contratação de obra ou serviço que inclua a elaboração
de projeto executivo como encargo do contratado ou
pelo preço previamente fixado pela Administração.
§ 3o Considera-se participação indireta, para fins do
disposto neste artigo, a existência de qualquer vínculo
de natureza técnica, comercial, econômica, financeira ou
trabalhista entre o autor do projeto, pessoa física ou
jurídica, e o licitante ou responsável pelos serviços,
fornecimentos e obras, incluindo-se os fornecimentos de
bens e serviços a estes necessários.
§ 4o O disposto no parágrafo anterior aplica-se aos
membros da comissão de licitação.

Cabe anotar ainda que, é possível a participação de


empresas em processos licitatórios que tenham sócios em comum,
uma vez que, há que se diferenciar a pessoa física dos sócios da
pessoa jurídica das empresas, pois esta é constituída por uma
coletividade de pessoas físicas, possuindo atos próprios.

Observa-se que, diferente do que alega o Ministério


Público, não há nos autos qualquer elemento de prova no
sentido de que as pessoas jurídicas: R.F. DE OLIVEIRA
TRANSPORTES LTDA EPP, VC DE PAULA V.C. DE PAULA & CIA
LTDAEPP e TRANSTUSA TRANSPORTE SANTA TERESA LTDA
ME tenham sido criadas no sentido de fraudar ou levar vantagem no
processo licitatório, até porque, referidas pessoas jurídicas foram
constituídas em anos diferentes e distantes um do outro,
respectivamente:
a. TRANSTUSA TRANSPORTE SANTA TERESA LTDA ME –
CNPJ00.070.879/0001-48, constituída em 12 de maio de
1994.

b. VC DE PAULA V.C. DE PAULA & CIA LTDA EPP – CNPJ


15.343.458/0001-10, constituída em 15 de março de 2012;

c. R.F. DE OLIVEIRA TRANSPORTES LTDA EPP –


CNPJ08.587.006/0001-19, constituída em 11 de dezembro de
2006;

Em outros termos, ao agasalhar o entendimento sobre a


possibilidade de ampliação das causas de impedimento previstas no
art. 9º da Lei8.666/93 em virtude dos sócios das empresas
participantes do certame pertencerem à mesma família, por
resultar em restrição de direito e basear-se em entendimento
apriorístico quanto à potencialidade de influência nociva ao certame, o
julgador decidirá em contradição com o art. 9º da Lei 8.666/93, o qual,
conforme já mencionado, deve ser interpretado restritivamente, não
podendo, pois ser alargado pelo intérprete da Lei (art. 37, XXI da CF).

Excelência, não se pode presumir, sem qualquer ato


ou fato objetivamente provado, a existência de supostos
vícios na licitação do certame, resultante de hipotética influência
decorrente da relação entre os sócios das empresas licitantes,
tendo em vista que não há previsão expressa contida em lei.

Sobre o tema, observemos o voto do Relator Marcos


Vinicius Vilaça ao proferir decisão no Acórdão nº 010.468/2008-8 –
TCU – Grupo I Classe I Plenário:
“Hoje, diante do texto legal, tal como se encontra
redigido há mais de vinte anos, uma mesma
empresa não pode apresentar duas propostas, mas
nada impede que empresas distintas, embora
vinculadas a um mesmo grupo econômico,
apresentem diferentes propostas.
À luz do quanto foi acima exposto, pode-se afirmar,
com segurança, que a simples participação, nos
mesmos procedimentos licitatórios, de duas
empresas cujas ações ou cotas pertencem ao
mesmo grupo de pessoas, não configura violação ao
sigilo da licitação nem fraude comprometedora da
competitividade do certame. ”

Importante frisar ainda que não consta no edital 12/2012


qualquer vedação no que diz respeito à participação das empresas
com sócios comuns na mesma licitação ou que pertençam à mesma
família, até mesmo porque ao inviabilizar a participação de uma
empresa tão somente pelo fato de um de seus sócios ser integrante
de outra empresa participante do certame ou possuir laço familiar,
estará o Estado negando, de forma injusta e desarrazoada, o direito
daquela mesma empresa ter acesso ao mercado público e, dessa
forma, prestar um serviço e, consequentemente, perceber um
acréscimo patrimonial legítimo.

Em resumo, é cediço que, princípios básicos, com


guarida constitucional, regem o processo licitatório, dentre eles os da
isonomia (principal), legalidade e moralidade, sendo que condutas
caracterizadoras de fraude, conluio ou que visem à burla desses
princípios, comprometendo a competitividade do certame, são
vedadas e veemente rechaçadas pelos órgãos de controle.
Nesse viés, a participação, em uma mesma licitação, de
empresas com sócios com íntima relação de parentesco ou de
empresas pertencentes ao mesmo grupo, que possuem sócios em
comum, pode aparentar incompatibilidade com esses princípios,
entretanto, conforme já mencionado, em nosso ordenamento, a rigor,
uma pessoa jurídica não se confunde com as pessoas físicas ou
jurídicas que a integram e/ou a comandam, sendo cada qual titular de
direitos e obrigações de forma independente em relação às demais.

Ademais, embora a participação de empresas com


sócios parentes entre si possa eventualmente propiciar e até
mesmo facilitar a realização de “acordo” entre os licitantes, tem-
se que essa situação também é possível entre empresas que não
tenham sócios com relação de parentesco ou não pertençam ao
mesmo grupo.

Ou seja, a intenção de fraudar uma licitação independe


de como as empresas estejam organizadas ou de como sejam
representadas no certame. O cerne do problema reside, na verdade,
na índole de cada participante. Sua atuação concreta é que
evidenciará a prática de fraude, conluio, etc. ou não.

Deste modo, a participação de empresas com sócios


parentes entre si em licitação não configura por si só a existência de
conduta indevida, visto que para que essa seja evidenciado é
necessário que os licitantes se unam e atuem em conjunto com vistas
a obtenção de vantagem, o que em consequência causará prejuízo
aos demais licitantes e a própria competitividade do certame, e não é
o que ocorre no presente caso.

Nesse sentido o Tribunal de Contas da União já decidiu


que:
“Não se está defendendo a imoralidade ‘automática’
da participação de irmãos, como representantes de
diferentes concorrentes, em processos licitatórios
públicos, mas que este fato deve provocar maior
cautela da Administração e ser analisado em
conjunto com os demais aspectos do procedimento
licitatório, com atenção redobrada. ” - TCU. Acórdão
1.751/2008. Plenário.

A participação no certame de duas ou mais empresas


com sócios com o mesmo parentesco, não significa, de pronto, a
ocorrência de fraude, até mesmo porque, também vigora em nosso
ordenamento jurídico o princípio da boa-fé e o da presunção de
inocência.

Dessa forma, em que pese as empresas R.F. DE


OLIVEIRA TRANSPORTES LTDA EPP, VC DE PAULA V.C. DE
PAULA & CIA LTDAEPP e TRANSTUSA TRANSPORTE SANTA
TERESA LTDA ME possuírem laços de parentesco em sua
constituição societária, a realidade retrata uma atuação independente
de cada qual, não existindo motivo para a alegação de prática
indevida por partes das referidas, como se verá em tópico especifico.

Oportuna a reprodução de decisão da Corte de Contas


da União sobre o tema, onde explica o representante do Ministério
Público que:

“Não há vedação legal para a participação em uma


mesma licitação de empresas cujos sócios possuam
relação de parentesco entre si. Essa circunstância,
por si só, não tem o condão de macular um certame
licitatório, pois não se pode reduzir a eficácia dos
valores sociais do trabalho e da livre iniciativa,
insculpidos no art. 1º, inciso IV, da Constituição
Federal, quando não há risco de afronta a outros
princípios constitucionais sensíveis, como, por
exemplo, os da moralidade e da impessoalidade na
Administração Pública. ”. TCU. Acórdão 2.725/2010.
Plenário.

E, em seu voto, o Ministro Relator do Acórdão


acompanha este entendimento, decidindo que:

“(...)5. Quanto ao primeiro aspecto, inclino-me a


acompanhar o parecer do Ministério Público junto ao
TCU, já transcrito no relatório que antecede este voto,
quando aduz que no caso ora em exame, a simples
participação de empresa em que os sócios possuam
relação de parentesco, ou mesmo de endereço, não
se mostrou suficiente a caracterizar fraude à
licitação, em especial ante a modalidade licitatória
adotada, o pregão eletrônico.
6. De fato, a questão da existência de sócios comuns
tem sido objeto de exame por parte desta Corte de
Contas em diversas oportunidades, a exemplo da
orientação contida no Acórdão nº 2136/2006 - Primeira
Câmara, verbis:
“9.7 com fundamento no art. 250, inciso III, do
Regimento Interno/TCU, recomendar ao Ministério do
Planejamento, Orçamento e Gestão - MPOG que oriente
todos os órgãos/entidades da Administração Pública a
verificarem, quando da realização de licitações, junto
aos sistemas Sicaf, Siasg, CNPJ e CPF, estes dois
últimos administrados pela Receita Federal, o quadro
societário e o endereço dos licitantes com vistas a
verificar a existência de sócios comuns, endereços
idênticos ou relações de parentesco, fato que, analisado
em conjunto com outras informações, poderá indicar a
ocorrência de fraudes contra o certame”.
7. De observar, todavia, que conforme orienta a
deliberação acima, há que se examinar a situação
em conjunto com outras informações. Neste sentido
foi a manifestação do Ministério Público:
“7. Caso bem diverso é o que ora se apresenta. Em
primeiro plano, observa-se que a licitação em tela
ocorreu na modalidade pregão, na qual o Poder Público
não pode de antemão escolher as empresas que irão
participar do certame, como ocorre em um simples
convite, havendo reduzido espaço para ajustes entre os
agentes públicos e as empresas concorrentes. Ressalte-
se que, na licitação sob exame, houve a participação
efetiva de 13 empresas, tendo sido habilitadas quatro
concorrentes para a fase de lances (fls. 295/297 do vol.
1), etapa em que resultou vencedora a empresa ora
recorrente após disputa acirrada com a empresa Grenit.
8. Ora, nesse cenário, não se vislumbra nenhum
movimento concertado das empresas Grenit e PCS com
o objetivo de fraudar o certame, tendo sido preservado o
caráter competitivo da licitação. Assim, não há suporte
fático ou jurídico para anular o Pregão Eletrônico nº
062/7029-2009, tampouco para infligir declaração de
inidoneidade às empresas licitantes, nos termos
aduzidos pela Unidade Técnica.
9. Cumpre reiterar que a empresa ora recorrente, Politec
Tecnologia da Informação S. A., foi a vencedora na
etapa de lances e apenas não lhe foi adjudicado o objeto
porque se constatou posteriormente que o prédio que
indicou para abrigar o Call Center não atendia aos
requisitos exigidos no edital do certame (fls. 394/404 do
vol. 1).”
8. Ante as percucientes considerações acima
exaradas pela representante
do Parquet especializado, tenho por bastante
razoável a argumentação trazida, razão pela qual
acolho-as como razões para decidir no sentido de
que não se pode concluir inexoravelmente, no caso
concreto sob exame, de que as empresas ouvidas
em audiência tenham agido deliberadamente no
intuito de perpetrar fraude contra a licitação em
apreço.
9. Todavia, a minha concordância com o MP/TCU se
limita a esse ponto. Não tenho como considerar afastada
a ocorrência de situação que, a meu ver, macula a
idoneidade do certame em si. Refiro-me ao fato de que,
embora as circunstâncias objetivas de identidade de
sócios, endereços e compartilhamento de
instalações e as demais circunstâncias que
envolvem o caso não sejam suficientes por si só para
ter por confirmada a existência de fraude, mas são
suficientemente indicadoras de que houve a quebra de
sigilo das propostas”.

Culta e honrada magistrada, pelo que foi exposto


conclui-se que, para a configuração de fraude à licitação, não
basta que haja uma relação de afinidade qualquer entre duas
empresas licitantes, sendo necessária a presença de outros
elementos que possam demonstrar uma ação concreta e
deliberada das concorrentes ou de agentes públicos para fraudar
o certame em seu caráter competitivo, todavia, apesar das
infindáveis laudas deliberadas pelo Órgão Ministerial com
criativas, deturpadas e fantasiosas alegações, nada no sentido
foi comprovado nestes autos.

b. Da ausência de demonstração da ocorrência de fraude ao


procedimento licitatório nº 19/2012, e da ausência do
elemento do tipo (dolo) - Artigo 90 da lei 8.666/93.
Absolvição.

Culta magistrada, é sabido que o objeto da norma penal


insculpida no art. 90 da Lei 9.666/03 é a proteção ao escorreito
desenvolvimento da atividade administrativa e o direito dos
concorrentes em participarem de um procedimento licitatório livre de
vícios que prejudiquem a igualdade entre os candidatos a contratarem
com a Administração Pública.

Com efeito, o tipo penal em análise é crime material,


uma vez que é descrita a conduta do agente e seu resultado, ou seja,
para que a conduta seja enquadrada no tipo em destaque, o agente
deve frustrar ou fraudar o caráter competitivo do procedimento
licitatório, mediante ajuste, combinação ou qualquer outro expediente,
com o objetivo de lograr, em seu próprio favor ou em favor de outrem,
vantagem decorrente da adjudicação do objeto da licitação.

Da análise minuciosa dos autos e de todas as provas


nele coligidas, vislumbra-se que inexistem provas produzidas sob o
contraditório que demonstrem de modo indene de dúvidas a
responsabilidade do acusado pelos fatos narrados na inicial, não
havendo conjunto probatório robusto a demonstrar ter o mesmo
mediante conluio com os demais, fraudado o caráter competitivo do
certame licitatório ora em discussão. As provas não demonstram
tenha havido adoção de qualquer expediente capaz de indiciar que
em comum acordo e de maneira deliberada, o acusado tenha buscado
fraudar o caráter licitatório do certame.

Não se sabe ao certo o que o Ministério Público


pretende com insinuações e acusações levianas em face do acusado,
pois, o tipo criminal imputado na Exordial não exige a existência
somente da fraude, mas é imprescindível que o ajuste, combinação ou
qualquer outro expediente, tenha o condão de obtenção por parte do
acusado, para si ou para outrem, de qualquer vantagem decorrente da
adjudicação do objeto da licitação, no entanto, o simples fato do
acusado ser sócio e administrador da empesa V.C DE PAULA não
é capaz de produzir qualquer prova sobre uma suposta fraude
perpetrada entre a mesma e os demais acusados, em especial,
em conluio com Valdecir Nath, com o qual o acusado não tinha e
não tem qualquer relação.

Não obstante, in casu, o fato descrito na denúncia não


demonstra a fraude aventada, pois não é possível afirmar que o
acusado VALDECIR NATH em conluio com o demais acusados fez
constar no edital da licitação a declaração de visita técnica como
condição imprescindível para habilitação das empresas, com o intuito
de beneficiar os demais, visto que a Administração Pública impôs
uma obrigação legítima para todos aqueles que desejassem
participar da licitação, respeitando o Princípio da Isonomia, e
diferentemente do que sustenta a acusação, a Lei de Licitações
autoriza que a Administração exija a realização de visita técnica pelo
licitante como requisito de qualificação, conforme se verifica pela
leitura do art. 30, inciso III da Lei nº 8.666/93, o qual dispõe: “a
documentação relativa à qualificação técnica limitar-se-á: (...) III –
comprovação, fornecida pelo órgão licitante, de que recebeu os
documentos, e, quando exigido, de que tomou conhecimento de todas
as informações e das condições locais para o cumprimento das
obrigações objeto da licitação”.

Pela oitiva da maioria das testemunhas ouvidas em


Juízo, comprovou-se que as estradas são irregulares, em alguns
locais de difícil circulação, expostas a intempéries e demais
circunstâncias que extrapolam a vontade das empresas em explorar
vias em perfeito estado de conservação. Desta forma, para se
contratar e obter um serviço de qualidade, de expressivo valor e
complexidade, é razoável a exigência de visita técnica para que o
licitante tenha pleno conhecimento de todos os detalhes da prestação
do serviço.

Não foi demonstrado qualquer relação de amizade entre


o acusado Vinicius e o ex secretário de educação, o que por si só,
mesmo se existisse, não seria capaz de comprovar qualquer conluio
entre ambos com a finalidade de frustrar o caráter competitivo da
licitação.

Por outro lado, Excelência, se houve qualquer tipo de


irregularidade no certame... exigência de visita técnica, ausência de
servidores para acompanhar os concorrentes e de roteiro ou itinerário
para as visitas... o expediente não foi adotado pelo acusado de modo
predeterminado a fraudar o certame, até mesmo porque, os
concorrentes não são responsáveis pela fase interna da licitação,
conforme disposto no art. 38 da Lei de 8.666/93.
Frisa-se também que o acusado não foi o responsável
pela inabilitação dos demais concorrentes que não cumpriram
requisitos do Edital.

De igual modo, a afirmação do Órgão Ministerial de


que, a empresa V.C de Paula, representada pelo acusado,
monopolizou o servidor responsável pelas visitas e o veículo
oficial no município, não tem qualquer respaldo lógico, uma vez
que, além do acusado somente ter cumprido um requisito do
Edital, o qual não teve qualquer ingerência na elaboração, é
dever do Município propiciar condições para que todos aqueles
que pretendessem participar da licitação pudessem realizar a
visita técnica, de modo que, essa responsabilidade não pode ser
transferida ao acusado, ou seja, a ausência de servidores para
acompanhar os concorrentes, a ausência de veículos e de
roteiro/itinerário para as visitas, não vinculam o acusado à
qualquer responsabilidade, pois, repita-se à exaustão, o mesmo
não é responsável pela fase interna da licitação - art. 38 da Lei de
8.666/93.

Não há nenhum indício materializado nos autos que


demonstre tenha o acusado deliberadamente levado qualquer tipo de
vantagem com a pontual suposta irregularidade existente - declaração
de visita técnica como condição imprescindível para habilitação das
empresas, tampouco, tenha dolosamente buscado mitigar o caráter
competitivo do certame mediante expediente irregular com o intuito de
levar qualquer tipo de vantagem de caráter pessoal.

Pela prova judicializada também restou demonstrado


que, as empresas que não concluíram o percurso das linhas,
demonstraram desinteresse, visto que aproveitaram a vinda à
Cascavel e se destinaram ao Paraguai para Turismo, ou seja, não foi
a Secretaria de Educação que impossibilitou a realização da visita
técnica, tampouco o acusado tem qualquer responsabilidade.

Oportuno mencionar que, em momento algum o


acusado participou da elaboração de qualquer projeto/edital, fato este
demonstrado na ação civil pública que embasa a presente ação penal,
bem como pela prova testemunhal produzida, ou seja, não há nos
autos demonstração de que o acusado agiu com dolo, de forma
livre e consciente no intuito de fraudar o certame em comento,
devendo o mesmo ser absolvido das acusações que lhe foram
imputadas na exordial, vejamos:

O elemento subjetivo do crime de fraudar licitação é o


dolo, genérico e específico, que consiste na vontade de obter
vantagem econômica em detrimento do erário público. Se não houver
o dolo, existe a atipicidade do fato, e, além disso, o erro de tipo
exclui o crime.

A essência do crime acha-se na intenção. O dolo


genérico é a vontade consciente de praticar o fato definido como
crime na lei penal; o segundo é o interesse do sujeito ativo em causar
dano ao erário, para que ele ou terceiros dele disponham.

A fraude, além do dolo, necessita de outro elemento


subjetivo, que está contido na elementar "para si ou para outrem", que
indica o fim de assenhoreamento definitivo. É necessário que aja com
o denominado animus furandi, que é a intenção de apoderamento
definitivo.

Nesse sentido também estão relacionados os


entendimentos jurisprudenciais sobre o crime em comento, que
colacionamos a seguir como base para absolvição do acusado pelo
crime supostamente cometido:

DIREITO PENAL –ART. 90 DA LEI Nº 8.666/93 –


AUSÊNCIA DE PROVAS SUFICIENTES À
CONDENAÇÃO. ABSOLVIÇÃO –1-O crime tipificado no
art. 90 da Lei nº 8.666/93 pressupõe que o agente
frustre ou fraude o caráter competitivo de procedimento
licitatório, mediante ajuste, combinação ou qualquer
outro expediente, com o objetivo de lograr, em seu
próprio favor ou em favor de outrem, vantagem
decorrente da adjudicação do objeto da licitação. 2-
Diante da ausência de provas suficientes de que o
acusado agiu dolosamente com o intuito de fraudar
o caráter competitivo da licitação, a absolvição é
medida que se impõe. TRF 4ª R. –APen 0000091-
12.2009.4.04.7119/RS –4ª S. –Rel. Des. Fed. Leandro
Paulsen.

PENAL E PROCESSUAL PENAL –CRIME DO ARTIGO


90 DA LEI 8.666/93 –LEI DE LICITAÇÕES –FRAUDE
AO CARÁTER COMPETITIVO DO PROCEDIMENTO
LICITATÓRIO –INSUFICIÊNCIA DE PROVAS QUANTO
À PARTICIPAÇÃO DO ACUSADO NO EVENTO
CRIMINOSOEXISTÊNCIA DE DÚVIDA RAZOÁVEL A
FAVOR DO RÉU –ABSOLVIÇÃO COM FUNDAMENTO
NO ARTIGO 386, VII, DO CÓDIGO DE PROCESSO
PENAL –1-No crime previsto no art. 90 da Lei nº
8.666/93 pune-se a frustração ou fraude do caráter
competitivo do procedimento licitatório mediante
acordo ou qualquer outro instrumento para alcançar
esse fim. É a eliminação da competição ou a
promoção de uma ilusória competição entre
participantes da licitação por qualquer mecanismo.
2-Se as provas arregimentadas aos autos não
dissipam as dúvidas acerca da contribuição do réu
para o evento criminoso, não havendo elementos
nos autos no sentido de que tenha sequer
previamente consentido com a prática ilícita, não há
como lhe imputar a responsabilidade penal. 3-
Evidencia-se necessária a absolvição do acusado
diante da fragilidade dos indícios existentes, com
base no princípio in dubio pro reo, que tem
fundamentação no princípio constitucional da
presunção de inocência, segundo o qual se impõe a
absolvição quando a acusação não lograr provar a
participação do réu no evento criminoso. 4-Ação
penal improcedente. TRF 1ªR. –APen 0034852-
31.2013.4.01.0000/MT –Rel. Des.Fed. Ney Bello;

Não é outro o entendimento do Tribunal de Justiça do


Estado do Paraná em caso semelhante, senão, vejamos:

APELAÇÃO CRIMINAL. FRAUDE E FRUSTAÇÃO AO


CARÁTER COMPETITIVO DO CERTAME. ARTIGO 90,
DA LEI Nº 8.666/93. SENTENÇA CONDENATÓRIA.
PRETENSÃO RECURSAL DA DEFESA.
ABSOLVIÇÃO. VIABILIDADE. AUSÊNCIA DE
PROVAS ACERCA DO ELEMENTO SUBJETIVO.
CONTRATO DE LICITAÇÃO PARA FORNECIMENTO
DE SERVIÇO DE PUBLICIDADE. CERTAME
IRREGULAR. PARTICIPAÇÃO DE DUAS EMPRESAS
COM A MESMA SÓCIA COTISTA. FRUSTRAÇÃO DO
CARÁTER COMPETITIVO. AUSÊNCIA DE
ELEMENTOS A INDICAR QUE OS ACUSADOS
TENHAM TIDO PARTICIPAÇÃO DIRETA NESSE
EXPEDIENTE. NÃO DEMONSTRAÇÃO DE
VANTAGEM DE QUALQUER NATUREZA PARA OS
ACUSADOS. CONLUIO ENTRE OS ACUSADOS,
ADEMAIS, NÃO DEMONSTRADO. FRAUDE OU
FRUSTRAÇÃO DO CARÁTER COMPETITIVO DO
CERTAME NÃO EVIDENCIADO. PROVAS
INSUFICIENTES PARA AMPARAR UMA
CONDENAÇÃO.ABSOLVIÇÃO QUE SE IMPÕE.
EXTENSÃO DA ABSOLVIÇÃO AOCORRÉU QUE NÃO
RECORREU. ART. 580 DO CPP. RECURSO DOS.
RÉUS PROVIDORECURSO DO MINISTÉRIO
PÚBLICO.PREJUDICADO. Apelação Criminal n°
0000998-29.2012.8.16.0065Vara Criminal de
Catanduvas/PR.

Igualmente é a jurisprudência do Tribunal de Justiça de


São Paulo, vejamos:

AÇÃO PENAL. ART. 90, DA LEI 8.666/93. FRAUDE À


LICITAÇÃO. ART. 288, DO CP. DOLO.
INSUFICIÊNCIA DE PROVA. PRELIMINARES.
INÉPCIA DA DENÚNCIA. PROVA EMPRESTADA.
I – A matéria relativa a inépcia da denúncia já foi objeto
da análise, quando seu recebimento. Não conhecimento.
II – Não há nulidade a ser declarada quanto à prova
emprestada, uma vez que a testemunha foi ouvida e
inquirida pela defesa, neste feito.
III – A prova judicializada não foi conclusiva sobre o
dolo na ação dos agentes, no sentido de terem
atuado no processo licitatório para favorecer um dos
réus. Insuficiência probatória que importa no édito
absolutório.
IV – Não restou demonstrada a reunião dos acusados
para a prática delitiva, impondo-se a absolvição.
PRIMEIRA PRELIMINAR NÃO CONHECIDA.
SEGUNDA PRELIMINAR AFASTADA. AÇÃO PENAL
IMPROCEDENTE. RGL Nº 70051561215 (Nº CNJ:
0462715-86.2012.8.21.7000) 2012/Crime

Por oportuno, importante frisar que, as circunstâncias


objetivas no que se refere aos sócios, endereços e compartilhamento
de instalações e as demais circunstâncias que envolvem o caso, não
são suficientes por si só para ter por confirmada a existência de
fraude, haja vista que há que se examinar a situação em conjunto com
outras informações. Os aspectos operacionais e societários em tese
compartilhados pelas duas empresas não são suficientes a
caracterizar fraude à licitação, nos termos do parecer do MP/TCU -
ACÓRDÃO 2725/2010 - PLENÁRIO.

Ademais, nestes autos não se comprovou a


\"combinação e ajuste\" e o \"forjamento de propostas\" que teriam
sido utilizados para fraudar e frustrar o caráter competitivo da
licitação, para obtenção de vantagem decorrente da adjudicação do
objeto, conforme o entendimento do Tribunal de Justiça do Estado de
São Paulo em caso semelhante, in verbis:

APELAÇÃO-CRIME. LICITAÇÕES. LEI Nº


8.666/93. ART. 90. FRAUDE OU FRUSTRAÇÃO DO
CARÁTER COMPETITIVO DO CERTAME
LICITATÓRIO. FALTA DE PROVA DA COMBINAÇÃO
E AJUSTE DE PREÇOS. DOLO NÃO COMPROVADO.
MANTIDA A ABSOLVIÇÃO DOS DENUNCIADOS. Em
que pese a confusão nas administrações das
empresas que participaram do certame licitatório,
com o poder de comando de todas elas nas mãos de
um único grupo familiar, não se comprovou a
"combinação e ajuste\" e o \"forjamento de
propostas\" que teriam sido utilizados para fraudar e
frustrar o caráter competitivo da licitação, para
obtenção de vantagem decorrente da adjudicação do
objeto (empresa na prestação de serviços de coleta
de lixo orgânico e hospitalar). O conluio e prévio
ajuste não podem ser presumidos, sob pena de os
réus sofrerem condenações em virtude de todos os
procedimentos licitatórios a que foram convidados
(licitação na modalidade carta-convite), e somente
por isto, objetivamente, sem aferição do dolo da
conduta e da participação individualizada, valendo
dizer, ainda, não haver prova de superfaturamento e
prejuízo ao erário municipal. APELO MINISTERIAL
DESPROVIDO, POR MAIORIA. (Apelação Crime Nº
70061624243, Quarta Câmara Criminal, Tribunal de
Justiça do RS, Relator: Ivan Leomar Bruxel, Julgado
em 26/02/2015).

Assim sendo, não obstante as indicações constantes na


denúncia, em atenta análise dos autos, vislumbra-se que inexistem
elementos suficientes coligidos capazes de demonstrar que
efetivamente ocorreu a frustração ao caráter competitivo do
certame, e diante ausência de dolo na conduta do Acusado, a
absolvição é medida que se impõe, e que se requer ao final.
4. DA INDIVISIBILIDADE DA AÇÃO PENAL.

Prima facie, ao compulsarmos os autos, verifica-se, sem


demandar maiores esforços de ordem exegética e hermenêutica,
Excelência, que são totalmente inverídicas as acusações articuladas
pelo Ministério Público no tocante ao acusado, não sendo possível,
destarte, nem mesmo proceder-se a subsunção fática do mundo
fenomênico às normas.

E isso fica claro, Eminente Julgadora, desde ab initio,


pois pelos argumentos esposados pelo próprio Ministério Público em
sua petição inicial, os quais já demonstram que em que pese o zelo
pela "coisa pública" o que é mesmo seu dever constitucional, in casu,
referido Órgão tenta vincular o acusado com a fase interna1 da
licitação, quando a mesma era apenas um concorrente.

Conforme a legislação, a condução da fase interna da


licitação cabe exclusivamente a Administração Pública, não possuindo
os Acusados qualquer interferência no procedimento, determinação
do artigo 38 da Lei 8.666/93.

Culta e honrada julgadora, a participação em uma


licitação como concorrente não vincula o acusado aos atos decisórios
do certame, os quais sequer foram praticados por ele ou tiveram pelo
mesmo qualquer tipo ingerência, visto que foram formalizados por
pessoas que nem fazem parte do Processo.

Resta clarividente que o Ilustre Promotor deixou de


incluir na peça inaugural as demais pessoas que supostamente teriam

1
O procedimento tem seu início internamente (fase interna), em que há a abertura do processo
dentro do órgão que vai realizar a licitação, definição do objeto e indicação dos recursos para a despesa.
alguma participação na hipotética e ilusória fraude que culminou na
denúncia.

Desta feia, ação penal seja ela pública ou privada é


indivisível, sendo que compreende sem distinção todos aqueles que
“supostamente” cometeram um ilícito, de acordo com seu livre
convencimento e, todas as provas constantes da instrução criminal.
Em outras palavras, se for admitida qualquer das supostas infrações
penais cometidas pelos Acusados, é certo que haveria a participação
de outras pessoas na empreitada criminosa, ao passo que o Ministério
Público deixou de oferecer denúncia em face dos demais, em total
desrespeito ao princípio da indivisibilidade da ação penal.

Destaca que a legalidade da Licitação é de


responsabilidade da Comissão e da Autoridade Superior que
homologa o ato, não estando tais servidores incluídos como
responsáveis neste processo, havendo ilegalidade, eis que o referido
Processo Licitatório foi realizado pelo Departamento “Compras” do
Município.

O art. 6º, XVI, da Lei nº 8.666/1993 contém a seguinte


definição: Comissão -comissão, permanente ou
especial, criada pela Administração com a função de
receber, examinar e julgar todos os documentos e
procedimentos relativos às licitações e ao
cadastramento de licitantes.

À míngua de outras provas que evidenciem participação


do acusado na suposta fraude no processo licitatório nº 19/2012, por
óbvio todas as demais pessoas envolvidas no referido processo
deveriam ser rés e, igualmente, condenadas.
Desta feita, é evidente que as ilações e conjecturas
elaboradas pelo representante do Ministério Público em desfavor da
acusado não encontra respaldo ou são corroboradas por qualquer
outro elemento de prova apresentado, pelo que não merecem amparo
ou mesmo credibilidade.

Diante do argumento acima esposado, requer a total


improcedência da denúncia, por restar caracterizado afronta ao
princípio da indivisibilidade.

5. DA ABSOLVIÇÃO POR AUSÊNCIA DE PROVAS

Na verdade, Excelência, basta uma perfunctória análise


dos autos para se concluir com toda a segurança que no vertente
caso se encontram ausentes os requisitos legais inerentes ao crime
pelo qual o acusado foi denunciado, conforme restou demonstrado ao
longo da instrução.

Por todo o acima exposto, importante agora frisar que o


ônus da prova no processo penal é integralmente atribuído à
acusação, consoante esclarece a melhor doutrina:

É necessário que enxerguemos o ônus da prova em


matéria penal à luz do princípio da presunção de
inocência, e também do favor réu. Se a defesa
quedar-se inerte durante todo o processo, tendo
pífia atividade probatória, ao final do feito, estando o
magistrado em dúvida, ele deve absolver o infrator.
A responsabilidade probatória é integralmente
atribuída à acusação, já que a dúvida militar em
favor do demandado. A balança pende em prol deste,
já que o art. 386 do CPP, nos incisos II, V VII, indica que
a debilidade probatória implica na absolvição. (TÁVORA,
Nestor. ALENCAR, Rosmar Rodrigues. Curso de Direito
Processual Penal. Salvador: Editora JusPodivm, 2010,
p. 364). (destacamos);

“(...) o juiz deve absolver o acusado em caso de


dúvida, não só quanto à autoria e aos elementos do
tipo penal, como também em relação às excludentes
de ilicitude e de culpabilidade. Aliás, diante de tal
princípio, todo o ônus da prova incumbe à acusação,
não havendo uma ‘distribuição’ do ônus da prova
nos moldes do que ocorre no processo civil.” e
(BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivanhy. Ônus da
Prova no Processo Penal. São Paulo: Editora Revista
dos Tribunais, 2003, p. 204). (destacamos).

“Dessa forma, claro nos parece que se o Ministério


Público tem que narrar um fato criminoso com todas
as suas circunstâncias, o ônus de provar que esse
fato é típico (encontra perfeita adequação na lei
penal, portanto que se trata de uma conduta
proibida); é ilícito (contrário ao direito) e que não
está açambarcado por nenhuma excludente de
ilicitude e que seu autor é culpável, ou seja, se
possui as condições mínimas indispensáveis para
atribuir-se-lhe esse fato, o que significa dizer, se
está mentalmente são ou conhece a antijuridicidade
do fato, lhe pertence. Não há como entregar ao réu,
dentro de um Estado Democrático de Direito e que
tem como fundamento a dignidade da pessoa
humana (art. 1º, III da CRFB), o ônus da prova de sua
inocência. A persecução penal é exercida pelo
Ministério Público afastado que foi o juiz do seio do
conflito de interesses diante do sistema acusatório.
O juiz é um sujeito processual e não parte na relação
jurídica. O Ministério Público é parte instrumental, mas
também fiscal da lei, pois uma posição não exclui a
outra, mas se completam entre si. Se o Ministério
Público não lograr êxito em provar a acusação que
fez em sua peça exordial o resultado do processo
não pode ser outro que não a absolvição do réu. (...)
Enfim... o réu alega, mas o ônus da prova, hoje,
diante da Constituição, é exclusivo do Ministério
Público. A regra inserta no art. 5º, LVII da CRFB deve
ser vista como inversora total do ônus da prova e
qualquer dúvida que restar diante da não comprovação
do fato imputado ao réu pelo Ministério Público deve,
obrigatoriamente, ser resolvida em seu favor. Trata-se
da aplicação do princípio do “in dubio pro reo”. (...) A
regra do ônus da prova deve assim ser vista a luz de
um novo século, amparada em uma Constituição
Garantidora dos direitos individuais fundamentais e
não naquela que manda o réu provar sua inocência.
(Rangel. Paulo. O juiz garantista. Disponível em: <
http://www.mundojuridico.adv.br/sis_artigos/artigos.asp?
codigo=171. Acesso em 11 de fevereiro de 2011.>
(destacamos).

“Se ao investigado e ao réu é dada a presunção,


repita-se, constitucional, de inocência, não pode a
legislação ordinária inverter o ônus probandi e exigir
(o absurdo) que o presumido inocente faça prova da
inocência! (CARVALHO, Esdras dos Santos. O Direito
Processual Militar numa visão garantista. Rio de Janeiro:
Editora Lumen Juris. 2010, p. 55). (destacamos).

No mesmo sentido, cumpre transcrever o brilhante e


contundente acórdão recente do Supremo Tribunal Federal:

AS ACUSAÇÕES PENAIS NÃO SE PRESUMEM


PROVADAS: O ÔNUS DA PROVA INCUMBE,
EXCLUSIVAMENTE, A QUEM ACUSA. - Nenhuma
acusação penal se presume provada. Não compete,
ao réu, demonstrar a sua inocência. Cabe, ao
contrário, ao Ministério Público, comprovar, de
forma inequívoca, para além de qualquer dúvida
razoável, a culpabilidade do acusado. Já não mais
prevalece, em nosso sistema de direito positivo, a
regra, que, em dado momento histórico do processo
político brasileiro (Estado Novo), criou, para o réu,
com a falta de pudor que caracteriza os regimes
autoritários, a obrigação de o acusado provar a sua
própria inocência (Decreto-lei nº 88, de 20/12/37, art.
20, n. 5). Precedentes. - Para o acusado exercer, em
plenitude, a garantia do contraditório, torna-se
indispensável que o órgão da acusação descreva, de
modo preciso, os elementos estruturais ("essentialia
delicti") que compõem o tipo penal, sob pena de se
devolver, ilegitimamente, ao réu, o ônus (que sobre ele
não incide) de provar que é inocente. - Em matéria de
responsabilidade penal, não se registra, no modelo
constitucional brasileiro, qualquer possibilidade de
o Judiciário, por simples presunção ou com
fundamento em meras suspeitas, reconhecer a culpa
do réu. Os princípios democráticos que informam o
sistema jurídico nacional repelem qualquer ato
estatal que transgrida o dogma de que não haverá
culpa penal por presunção nem responsabilidade
criminal por mera suspeita. (HC 84580, Relator(a):
Min. CELSO DE MELLO, Segunda Turma, julgado em
25/08/2009, DJe176 DIVULG 17-09-2009 PUBLIC 18-
09-2009 EMENT VOL-02374-02 PP-00222 RT v. 98, n.
890, 2009, p. 500-513) (destacamos)

Portanto, o Ministério Público não conseguiu


desincumbir-se de seu ônus, eis que inexiste prova hábil a
demonstração indubitável dolo ou até mesmo da autoria do acusado
em fraude ao procedimento licitatório.

Destarte, resta evidente que não se pode atribuir, sem


existir uma dúvida razoável, a conduta descrita na exordial acusatória
ao ora acusado, eis que inexistem provas suficientes a sustentar uma
condenação.

Neste sentido, cumpre apresentar ilustrativo arresto do


Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, vejamos:

APELAÇÃO CRIMINAL. ART. 90 DA LEI 8.666/93.


AUSÊNCIA DE PROVA DO DOLO. ABSOLVIÇÃO
MANTIDA. Inexistiu, a partir das provas coletadas,
demonstração do dolo de fraudar ou frustrar o
procedimento licitatório indevidamente fracionado e,
menos, do intuito de obter vantagem decorrente da
adjudicação do objeto. A irregular escolha da
modalidade licitatória nos dois certames vencidos pela
mesma empresa não se mostrou suficiente para
caracterizar o dolo do crime previsto
no art. 90 da Lei 8666.93, mesmo que tenha o acusado
sido condenado pela prática de ato de improbidade por
ofensa aos princípios insculpidos no art. 11 da
referida lei. Na dúvida, deve ser o réu absolvido.
APELAÇÃO NÃO PROVIDA. (Apelação Crime Nº
70069700110, Quarta Câmara Criminal, Tribunal de
Justiça do RS, Relator: Julio Cesar Finger, Julgado em
01/09/2016)

Impunha-se que, além dos indícios que autorizaram


o recebimento da denúncia e o processamento da ação, fosse
demonstrado na instrução processual que os acusados
efetivamente ajustaram entre si o favorecimento das empresas, o
que não ocorreu, não sendo suficiente a alegação do conluio,
sendo necessária a apresentação de fatos concretos sobre esse
acontecimento.

APELAÇÃO-CRIME. LICITAÇÕES. LEI Nº


8.666/93. ART. 90. FRAUDE OU FRUSTRAÇÃO DO
CARÁTER COMPETITIVO DO CERTAME
LICITATÓRIO. FALTA DE PROVA DA COMBINAÇÃO E
AJUSTE DE PREÇOS. DOLO NÃO COMPROVADO.
MANTIDA A ABSOLVIÇÃO DOS DENUNCIADOS. Em
que pese a confusão nas administrações das
empresas que participaram do certame licitatório,
com o poder de comando de todas elas nas mãos de
um único grupo familiar, não se comprovou a
\"combinação e ajuste\" e o \"forjamento de
propostas\" que teriam sido utilizados para fraudar e
frustrar o caráter competitivo da licitação, para
obtenção de vantagem decorrente da adjudicação do
objeto (empresa na prestação de serviços de coleta de
lixo orgânico e hospitalar). O conluio e prévio ajuste
não podem ser presumidos, sob pena de os réus
sofrerem condenações em virtude de todos os
procedimentos licitatórios a que foram convidados
(licitação na modalidade carta-convite), e somente por
isto, objetivamente, sem aferição do dolo da conduta e
da participação individualizada, valendo dizer, ainda,
não haver prova de superfaturamento e prejuízo ao
erário municipal. APELO MINISTERIAL DESPROVIDO,
POR MAIORIA. (Apelação Crime Nº 70061624243,
Quarta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS,
Relator: Ivan Leomar Bruxel, Julgado em 26/02/2015).

Guilherme de Souza Nucci ensina que o tipo penal em


comento exige dolo específico para sua consumação, nos seguintes
termos:

Elemento subjetivo: é o dolo. Exige-se o elemento


subjetivo específico, consistente no “intuito de obter, para si ou
para outrem, vantagem decorrente da adjudicação do objeto da
licitação.” Não há a forma culposa.

Nesse sentido:
PROCESSO-CRIME. PREFEITO MUNICIPAL.
AQUISIÇÃO DE ÔNIBUS PARA TRANSPORTE
ESCOLAR. FRAUDE À LICITAÇÃO E DESVIO DE
VERBA PÚBLICA. INOCORRÊNCIA. Não se vislumbra
fraude ao caráter competitivo do procedimento licitatório
realizado para aquisição de ônibus escolar. Dúvida
sobre o elemento subjetivo do tipo, indispensável à
configuração do delito previsto no art. 90 da Lei nº
8.666/93. Desvio de verba pública em proveito próprio
ou alheio. Reconstituição probatória insuficiente à
imposição de juízo condenatório. Ação penal julgada
improcedente. Unânime. (Ação Penal - Procedimento
Ordinário Nº 70040266561, Quarta Câmara Criminal,
Tribunal de Justiça do RS, Relator: Aristides Pedroso de
Albuquerque Neto, Julgado em 23/01/2014) (grifado)

Excelência não resta nenhuma dúvida de que inexistem


nos autos provas suficientes para ensejar uma condenação do
acusado, tendo em vista que no decorrer da instrução processual o
Representante do Ministério Público não obteve êxito em comprovar
as suas alegações constantes da denúncia, e por consequência a
absolvição é medida que se impõe diante da inexistência de provas
para ensejar uma condenação.

Acrescenta-se ainda que, a condenação exige certeza e


não basta sequer, a alta probabilidade, que apenas é um juízo de
incerteza, de nossa mente em torno da existência de certa realidade.

Nesse sentido não há qualquer discrepância na doutrina


e jurisprudência de nossos Tribunais: A dúvida em matéria criminal
é sinônimo de ausência de provas.

Sobre o assunto o Eminente Jurista Heleno Fragoso,


cita e recomenda as seguintes decisões de nossos Tribunais:

“O direito penal não opera com conjecturas. A


condenação criminal exige certeza da existência do foto
punível, da autoria e da culpabilidade do agente. Esses
princípios basilares em nosso processo penal foram
reafirmados pela la C. Crim. do antigo T.A. de
Guanabara, na Ac. 7.822, relator o eminente LUIZ
JORGE ALBERTO PROMERO. Sem a certeza total da
autoria e da culpabilidade não pode o Juiz Criminal
proferir uma condenação.” (Do. 28.9.73, 12.998 (...) (Em
Jurisprudência Criminal, Forense, 4a ed., l982, pág.
507).

Não comprovada sequer a autoria, desnecessário


afirmar que, de igual modo, não há comprovação do elemento
subjetivo exigido para caracterização do delito em tela, qual seja o
dolo, portanto, é imperioso o reconhecimento de que as provas
colhidas até o presente momento não são capazes de levar a outro
caminho, senão o de absolvição do Acusado.

A jurisprudência assinala que:

APELAÇÃO CRIMINAL. ART. 90 DA LEI 8.666/93.


FRAUDE AO CARÁTER COMPETITIVO DA
LICITAÇÃO. DÚVIDA. INTERPRETAÇÃO DE
EXIGÊNCIA LEGAL. DOLO NÃO COMPROVADO.
FALTA DE PROVAS. ABSOLVIÇÃO MANTIDA. Pratica
o crime previsto no art. 90 da Lei 8.666/93 quem frustra,
mediante ajuste, combinação ou outro expediente,
caráter competitivo do procedimento licitatório, com o
intuito de obter, para si ou para outem, vantagem
decorrente da adjudicação do objeto da licitação. Na
hipótese dos autos, imputa-se aos recorridos a
adoção de expediente que culminou na inabilitação
de uma das empresas concorrentes, por meio da
exigência de documento não previsto na legislação,
qual seja, o demonstrativo de fluxo de caixa. A prova
colhida, entretanto, aponta para a possível interpretação
equivocada da legislação aplicável, que foi modificada
pouco tempo antes dos fatos. A prova é demasiado
parca a apontar o dolo na conduta por qualquer das
pessoas investigadas e, menos, que a ação se deu
para beneficiar a empresa vencedora, em que pese a
demonstração da existência de parentesco entre um
dos proprietários e o vice-prefeito. Na dúvida, deve
ser mantida a absolvição operada na origem, por falta de
provas. APELAÇAO NÃO PROVIDA.(Apelação-Crime,
Nº 70077501351, Quarta Câmara Criminal, Tribunal de
Justiça do RS, Relator: Julio Cesar Finger, Julgado em:
16-05-20

A mera probabilidade do comportamento criminoso é


insuficiente para o reconhecimento da responsabilidade penal.
Indispensável a prova de que houve a criação de uma situação de
risco para o bem jurídico protegido, com o afastamento ou esforço
tendente a afastar a competição da disputa, o que a acusação não
logrou provar.

Sobre a necessidade de prova escorreita para a


prolação do édito condenatório, trazemos à colação os seguintes
precedentes:

APELAÇÃO CRIMINAL. LEI Nº 8.666/93. DISPENSA


IRREGULAR DO PROCEDIMENTO LICITATÓRIO.
CRIME DE RESPONSABILIDADE DE PREFEITO.
DECRETO-LEI Nº 201/67. PECULATO-DESVIO.
DECISÃO CONDENATÓRIA. INSURGÊNCIAS
DEFENSIVAS. DESNECESSIDADE DE PREJUÍZO.
DOLO ESPECÍFICO PARCIALMENTE
DEMONSTRADO. PRESCRIÇÃO. [...] DISPENSA DE
LICITAÇÃO. DESCLASSIFICAÇÃO. Embora vigore no
ordenamento jurídico brasileiro a obrigatoriedade de
licitação, o certame poderá ser dispensado em hipóteses
específicas, no que se insere a situação emergencial.
Contudo, no caso dos autos, demonstrado que o
procedimento licitatório foi realizado na modalidade
convite, embora de forma fraudulenta, não restam
configuradas as hipóteses de dispensa ou inexigibilidade
de licitação, previstas no artigo 89 da Lei nº 8.666/93,
impondo-se a desclassificação da conduta para o artigo
90, da Lei de Licitações. FRAUDE À LICITAÇÃO. Os
réus e os representantes das empresas participantes do
procedimento licitatório, mediante ajuste, combinaram
entre si a escolha de uma das licitantes, de forma
fraudulenta, a fim de garantir a suplementação no valor
de dois veículos de transporte escolar adquiridos pelo
Município. DOLO ESPECÍFICO EVIDENCIADO PARA
ALGUNS RÉUS. (I) Para a configuração do crime
previsto no art. 90 da Lei nº 8.666/93, é indispensável
a demonstração do dolo específico, consistente na
intenção do agente em fraudar ou frustrar o
procedimento licitatório, causando dano à
Administração Pública, conforme entendimento
unânime firmado no âmbito dos Tribunais
Superiores. (II) Em relação aos réus L.E., O.R.S.,
A.A.T.B., I.G.K. e S.A.M., o dolo de fraudar a licitação
encontra-se evidenciado diante das especificações
contidas na solicitação de abertura da licitação e no
envio das cartas-convite, na participação de
empresas cujos representantes eram sócios entre si,
bem como nas propostas ofertadas por cada uma
das participantes, havendo uma mínima diferença
entre cada valor, todos se aproximando do montante
limite disponibilizado pelo Município. (III) Por sua
vez, quanto aos acusados J.C.L., M.S.S.P., N.Y.N.L.,
F.B. E O.M.F., há dúvidas quanto à efetiva intenção dos
agentes em colaborar com a fraude no procedimento
licitatório, não estando configurado o elemento subjetivo
necessário ao reconhecimento do tipo penal em apreço.
Absolvição que se impõe. DESNECESSIDADE DE
PREJUÍZO. Caracteriza-se o crime de fraude à licitação
como delito formal, cujo bem jurídico tutelado é o próprio
caráter competitivo do procedimento licitatório e a
probidade administrativa, sendo desnecessária a efetiva
ocorrência de prejuízo econômico ao poder público.
Precedentes deste Tribunal. PECULATO-DESVIO. [...]
PRELIMINAR REJEITADA. APELOS DOS RÉUS L.E.,
O.R.S., A.A.T.B., I.G.K. E S.A.M. PARCIALMENTE
PROVIDOS. APELOS DOS DEMAIS RÉUS PROVIDOS.
(Apelação Crime Nº 70065306144, Quarta Câmara
Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Sandro Luz
Portal, Julgado em 19/04/2018).

PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSOS


ESPECIAIS. FORMAÇÃO DE CARTEL E FRAUDE À
LICITAÇÃO. CONFLITO APARENTE DE NORMAS.
ART. 4º, II, DA LEI 8.137/93. AUSÊNCIA DE
DESCRIÇÃO DA CONCENTRAÇÃO DO PODER
ECONÔMICO. AJUSTES PRÉVIOS COM O FIM DE
FRAUDAR PROCEDIMENTO LICITATÓRIO.
FORMAÇÃO DE CARTEL AFASTADA. CRIME DO
ART. 90 DA LEI 8.666/93. PRESCRIÇÃO DA
PRETENSÃO PUNITIVA. RECURSOS ESPECIAIS
PROVIDOS.
[...]
5. O delito do art. 90 da Lei 8.666/93 tem natureza
formal, ocorrendo sua consumação mediante o mero
ajuste, combinação ou adoção de qualquer outro
expediente com o fim de fraudar ou frustrar o caráter
competitivo da licitação, independentemente da
obtenção da vantagem (adjudicação do objeto
licitado para futura e eventual contratação).
Precedentes do STF e do STJ.
6. Transcorrido lapso temporal superior a 8 anos entre a
data dos fatos e o recebimento da denúncia, configura-
se a perda da pretensão punitiva estatal quanto ao delito
do art. 90 da Lei 8.666/93, porquanto os fatos são
anteriores à Lei 12.234/2010.
7. Recursos especiais providos.
(REsp 1623985/SP, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO,
SEXTA TURMA, julgado em 17/05/2018, DJe
06/06/2018).

Portanto, ausente prova da fraude à licitação, a


retirar a sua natural competição, o conluio e prévio ajuste não
podem ser presumidos.

Pelo exposto, da analise minudente dos autos e de


todas as provas carreadas, verifica-se que inexistem provas que
demonstrem a responsabilidade do o pelos fatos narrados na inicial,
não havendo conjunto probatório seguro a demonstrar ter o mesmo
juntamente com os demais, mediante conluio, fraudado o caráter
competitivo do certame licitatório ora em discussão.

Nesses termos, diante do que foi produzido ao longo da


instrução, a improcedência da denúncia é o decreto que se impõe.
6. DA DESCLASSIFICAÇÃO DO DELITO CAPITULADO NO
ARTIGO 90 DA LEI 8.666/93 PARA O CRIME PREVISTO NO
ART. 93 DA LEI 8.666/93.

Excelência, pelo que foi produzido sob o crivo do


contraditório e ampla defesa, restou evidente a ausência de qualquer
respaldo para uma condenação do acusado, eis que para a
configuração do crime do artigo 90 da Lei 8.666/1993 exige-se a
comprovação do dolo específico por parte do agente, revestido na
finalidade de agir com a intenção de obter, para si ou para outrem,
vantagem na licitação, fatos estes que não lograram êxito de
comprovação pelo Órgão ministerial, todavia, por amor ao debate,
caso o entendimento de Vossa Excelência não seja no sentido da
absolvição pelo delito em comento, o que não se espera, requer a
desclassicação para o crime previsto no art. 93 da Lei 8.666/93,
vejamos:

“Art. 93. Impedir, perturbar ou fraudar a realização


de qualquer ato de procedimento licitatório: Pena -
detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa. ”

Guilherme de Souza Nucci analisa o tipo acima descrito:

"Análise do núcleo do tipo: impedir (obstruir, não deixar


acontecer), perturbar (atrapalhar, causar embaraço)
e fraudar (iludir, enganar) são as condutas mistas
alternativas, que têm por objeto qualquer ato do
procedimento licitatório. Quando a Administração realiza
a licitação, visando à escolha de quem irá fornecer
algum bem ou serviço, deve respeitar uma sucessão de
atos formais e previstos em lei, desenrolando-se por
várias etapas e, como regra, durante diversas semanas.
Por isso, aquele que não permitir o desenvolvimento da
licitação, conturbar o seu andamento ou promover
alguma ação para frustrar os propósitos do certame
deve responder criminalmente, com base neste tipo
penal." (In: Leis Penais e Processuais Penais
Comentadas. 4. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo:
Revista dos Tribunais. p. 859 - destaquei)

Segundo o entendimento do ente ministerial houve


fraude no edital de licitação n.º 19/2012 quando da inserção da
exigência da visita técnica à todos os concorrentes, necessário,
portanto, nova capitulação jurídica dada à conduta, e em virtude da
pena máxima cominada ao crime, por tratar-se de crime de menor
potencial ofensivo, tem-se que a competência para julgar o fato é do
Juizado Especial Criminal, sendo cabíveis em tese, os benéficos da
TRANSAÇÃO PENAL E SUSPENSÃO CONDICIONAL DO
PROCESSO, e é o que se requer ao final, conforme posicionamento
do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, in verbis:

EMENTA: PENAL E PROCESSUAL PENAL.


FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO PÚBLICO.
RECLASSIFICAÇÃO PARA O DELITO PREVISTO NO
ARTIGO 93 DA LEI 8.666/93. COMPETÊNCIA DO
JUIZADO ESPECIAL FEDERAL PARA
PROCESSAMENTO E JULGAMENTO DO FEITO. 1.
No presente caso, resta evidente que o objetivo do
agente, ao usar o documento espúrio, era enganar/iludir,
para frustrar os propósitos do certame de licitação, pois
visava obter indevidamente sua habilitação para
participar do procedimento licitatório. 2. Sendo assim,
evidente a elementar "fraudar" procedimento licitatório,
mediante uso do referido documento espúrio, o conflito
aparente de normas resolve-se pela aplicação da lei
especial, no caso, o artigo 93 da Lei 8.666/93. 3. Diante
da nova capitulação dada à conduta, ressalto que a
pena máxima abstratamente cominada ao delito é de 02
(dois) anos de detenção, tratando-se, portanto, de crime
de menor potencial ofensivo. Desse modo, tenho que a
competência para processar e julgar o fato é do Juizado
Especial Federal Criminal, sendo cabíveis, em tese, os
benefícios da transação e da suspensão condicional do
processo. (TRF4, ACR 0000222-40.2006.4.04.7200,
OITAVA TURMA, Relator VICTOR LUIZ DOS SANTOS
LAUS, D.E. 10/07/2012).

Pelo que foi exposto, em eventual não acolhimento da


tese defensiva, o que não se espera, requer a remessa dos autos ao
Juizado Especial Criminal, por ser medida de direito e de Justiça.

7. DOS PEDIDOS:

Diante do exposto, a defesa de VINICIUS CONTICELLY


DE PAULA, requer a TOTAL IMPROCEDENCIA da denúncia
ofertada pelo Ministério Público, reconhecendo-se a preliminar de
inépcia da inicial.

No mérito, requer digne-se Vossa Excelência, em


absolver o acusado da imputação delitiva que lhe foi feita na
peça inaugural, nos termos do artigo 386, incisos I, II, IV, V, VII do
Código de Processo Penal, com fundamento nos argumentos
elencados na petitio, porém, caso não seja este o entendimento de
Vossa Excelência, o que não se espera, requer a desclassificação do
delito previsto na peça acusatória para o capitulado no artigo 93 da
Lei 8.666/93, conforme argumentação supra, por ser medida de inteira
e absoluta de Justiça!!!

Nestes termos,
Pede deferimento.

Cascavel, 19 de março de 2020.

Assinatura digital
LAURI DA SILVA
OAB/PR 27.557

JÉSSICA VIANA DA SILVA GERON


OAB/PR 70.753

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