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Grupo: Brenda Arantes Miranda Pereira, Carolina Barreto, David Dias, Ingrid Chaves,
Isabelle Silveira Paulo de Souza, Maria Clara Rabelo Bruno Löss, Mayara Ferron
1. Noções introdutórias
O nosso atual Código de Processo Penal – CPP de 1941, foi promulgado sob a égide do
chamado Estado Novo, época em que vigia a Constituição de 1937, chamada de Constituição
Polaca, visto que sua inspiração se baseou na Constituição fascista Polonesa, sem esquecer a
forte influência das constituições autoritárias da Alemanha, Itália e Portugal.
Nesse período, a base executiva nacional se fortaleceu, extinguindo com a autonomia
dos estados e com o federalismo. Os poderes legislativo e judiciário foram enfraquecidos e os
direitos individuais foram diminuídos e extinguiram-se os partidos políticos. Fortemente
influenciado pelo contexto desse tempo, o código mostra-se ultrapassado em alguns aspectos.
Desde então com a ordem democrática instaurada no Brasil com a Constituição de 1988
e com a entrada de Tratados Internacionais na ordem jurídica, o Código passou por mudanças
pontuais, sendo mantida sua estrutura originária, qual seja, inquisitorial.
Era notório a necessidade de mudança na nossa legislação processual penal para que sua
estrutura fosse adaptada a nova ordem constitucional e convencional, notadamente ao sistema
acusatório, à garantia de um juiz imparcial. A partir de uma interpretação mais teleológica,
observa-se que deixa de ser razoável aplicar o processo penal puramente com a finalidade de
exercer o ius puniend do Estado.
O processo penal começa então tutelar direitos e garantias individuais, pautado em
condutas probas, éticas, equilibradas e com regras definidas. O ser humano passa a ser visto
sob outra perspectiva, como um processo de partes, em que a função de julgar e acusar passa a
ser protagoniza por diferentes personagens dentro da relação processual, sendo sempre
oportunizado o contraditório e a ampla defesa, cabendo às partes desenvolver a atividade
probatória, e com isso convencer o julgador imparcial.
A partir desse contexto, nasce a Lei 13.964/19, chamada de “ Pacote Anticrime”
apresentado ao Congresso Nacional em 19 de fevereiro de 2019 pelo Ex Ministro da Justiça,
Sergio Moro, cujo objetivo era dar uma nova roupagem a legislação criminal e o processo penal,
implantando mudanças ao enfrentamento da criminalidade.
Por fim, o sistema acusatório e o juiz de garantias passam a ter nesse contexto, um papel
decisivo na direção de um processo penal democrático capaz de realçar o papel das partes e
seus direitos fundamentais.
Importante salientar que o Código português, é guiado pela busca da verdade material,
princípio presente em todas as fases, sendo por vezes, mitigado pelo “princípio da
necessidade”. A produção de prova somente é determinada de oficio ou a requerimento se ela
se mostrar necessária.
Por fim, o Chile conta com a presença da figura do juez de garantia, vez que o
magistrado atua apenas na fase investigativa, ficando o julgamento a cargo de outro
magistrado. O juez de garantia interfere em uma diligência de investigação quando houver
indícios de que este ato possa restringir, perturbar ou privar o indivíduo do exercício dos
direitos positivados na Constituição. Neste caso, seu cumprimento só se dará ante uma
autorização desse magistrado.
Observa-se no Chile que, em qualquer fase do procedimento em que o juez de garantia
fizer um juízo de valor e constar que o imputado não possui condições de exercer os direitos
que lhe outorgam as garantias judiciais consagradas no texto legal, pelas leis e pelos tratados
internacionais ratificados e que se encontrem vigentes, este poderá de oficio ou por
provocação adotar medidas positivas e necessárias que permitam o seu exercício.
Desta forma, o Juiz de Garantias está longe de ser novidade no contexto mundial e um
grande número de países já adota a prática, cada um com suas particularidades, a depender
de cada sistema processual penal e das divisões adotadas entre a fase investigativa e a de
julgamento, trazendo enorme debate e opiniões divergentes sobre a necessidade de sua
existência e o impacto da mesma diante do processo penal.
3.1. Constitucionalidade
A figura do juiz de garantias, tema deste trabalho, tem como fundamento o art. 3º-B do
Código de Processo Penal, redação dada pela Lei 13.964/19. In verbis:
Tal função, com diversas atribuições, vem sendo alvo de variados debates acerca de sua
constitucionalidade, e suas alegações serão explorados neste tópico.
Destacam-se os seguintes argumentos:
a) O juiz de garantias trata-se tão somente de uma nova delegação aos juízes de direito, e
não a criação de um novo cargo. Sendo assim, não há de se falar em violação a separação de
poderes por parte do legislador, nem ao art. 96, I da Carga Magna;
b) A competência para legislar sobre normas processuais é privativa da União, com fulcro
no art. 22, I da Constituição Federal. Além disso, é competência concorrente entre a União,
Estados e Municípios legislar sobre procedimentos em matéria processual (art. 24, XI da
CF/88), desde que a União se limite a estabelecer normas gerais (art. 24, § 1º da CF/88).
Embora a própria Constituição não estabeleça o que são normas gerais e o que são
normas específicas, tal lacuna é suprida pela doutrina. Vejamos então as características das
normas gerais de acordo com Moreira Neto (1988, p. 149), conforme citado por Felipe Braga
de Oliveira (2020, p. 163):
Portanto, fazendo uma análise do texto normativo objeto deste estudo, vemos que o
mesmo preenche os requisitos doutrinários, logo, não há de se falar em vício de competência
na criação desta norma.
Por fim, cabe o questionamento do jurista Lênio Streck (2020, n.p.) acerca das Ações
de Declaração de Inconstitucionalidade na atualidade:
3.2. Inconstitucionalidade
O juízo de garantia fora estabelecido no art. 3º-B do Código de Processo Penal. Por tal
dispositivo, tal juízo seria responsável pela legalidade dos atos praticados na investigação
criminal, como na deliberação sobre prisões cautelares, bem como teria a incumbência de
proferir decisão de recebimento da denúncia ou queixa.
Segundo Renato de Lima (2020, p. 114):
d) Violação à determinação do art. 169, §1º, da CF/88, tendo em vista que a instituição
do “juiz das garantias” implicaria, necessariamente, aumento de despesas, sem
correspondente previsão orçamentária.
Conforme ADI 6298 MC/DF, “a ausência de prévia dotação orçamentária para a
instituição de gastos por parte da União e dos Estados viola diretamente o artigo 169 da
Constituição e prejudica a autonomia financeira do Poder Judiciário, assegurada pelo artigo 99
da Constituição”.
De acordo com o art. 113 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, a
proposição legislativa que cria ou altere despesa obrigatória deve ser acompanhada da
estimativa do seu impacto financeiro, o que não ocorreu na lei supramencionada.
In casu, sob uma leitura formalista, poder-se-ia afirmar que, ao instituírem a função
do juiz de garantias, os artigos 3º-A ao 3º-F teriam apenas acrescentado ao
microssistema processual penal mera regra de impedimento do juiz criminal,
acrescida de repartição de competências entre magistrados paras as fases de
investigação e de instrução processual penal. Nesse sentido, esses dispositivos teriam
natureza de leis gerais processuais, definidoras de procedimentos e de competências
em matéria processual penal, o que autorizaria a iniciativa legislativa por qualquer dos
três poderes, nos termos do artigo 22 da Constituição.
Com a devida vênia aos que militam em favor desse raciocínio, entendo que essa visão
desconsidera que a criação do juiz das garantias não apenas reforma, mas refunda o
processo penal brasileiro e altera direta e estruturalmente o funcionamento de
qualquer unidade judiciária criminal do país. Nesse ponto, os dispositivos
questionados têm natureza materialmente híbrida, sendo simultaneamente norma
geral processual e norma de organização judiciária, a reclamar a restrição do artigo 96
da Constituição
(STF. ADI nº 6.298/DF, Relator: Min. LUIZ FUX, DJ 22/01/2020, 1ª Turma)
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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