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INQUÉRITO

POLICIAL
NATUREZA JURÍDICA

Quanto à natureza jurídica do inquérito policial, vem


determinada pelo sujeito e pela natureza dos atos
realizados, de modo que deve ser considerado como um
procedimento administrativo pré-processual.
ORGÃO ENCARREGADO
Como determina o art. 4º do CPP e o próprio nome indica, o inquérito é
realizado pela polícia judiciária.
De ressaltar o parágrafo único do art. 4º, determinando que a
competência da polícia não exclui a de outras autoridades
administrativas que tenham competência legal para investigar.
Ex. Sindicância; Comissões Parlamentares de Inquérito;

O modelo de investigação preliminar policial, de modo que a polícia


judiciária leva a cabo o inquérito policial com autonomia e controle.
A POLÍCIA BRASILEIRA NO INQUÉRITO
• POLÍCIA JUDICIÁRIA
• POLÍCIA PREVENTIVA

A polícia brasileira desempenha dois papéis (nem sempre) distintos: a


polícia judiciária e a polícia preventiva.
POLÍCIA JUDICIÁRIA
A polícia judiciária está encarregada da investigação preliminar, sendo
desempenhada nos estados pela Polícia Civil e, no âmbito federal, pela
Polícia Federal. Em regra, nenhum problema existe no fato de a polícia
civil estadual investigar um delito de competência da Justiça Federal
(como o tráfico ilícito de substâncias entorpecentes e demais delitos
previstos no art. 109 da Constituição); ou de a polícia federal realizar
um inquérito para apuração de um delito de competência da Justiça
Estadual. Contudo, em geral, a atuação de cada polícia tende a limitar-
se ao âmbito de atuação da respectiva Justiça (Federal ou Estadual).
POLÍCIA PREVENTIVA/OSTENSIVA
O policiamento preventivo ou ostensivo é levado a cabo pelas Polícias
Militares dos estados, que não possuem atribuição (como regra) para
realizar a investigação preliminar.

Em se tratando de inquérito policial, está ele a cargo da polícia


judiciária (não cabendo à polícia militar realizá-lo, salvo nos crimes
militares definidos no Código Penal Militar).
O MINISTÉRIO PÚBLICO NO INQUÉRITO
POLICIAL
O parquet é legalmente autorizado a requerer abertura como também
acompanhar a atividade policial no curso do inquérito. Contudo, por
falta de uma norma que satisfatoriamente defina o chamado controle
externo da atividade policial – subordinação ou dependência funcional
da polícia em relação ao MP –, não podemos afirmar que o Ministério
Público pode assumir o mando do inquérito policial, mas sim participar
ativamente, requerendo diligências e acompanhando a atividade
policial.

*Em definitivo, não pairam dúvidas de que o Ministério Público poderá


requisitar a instauração do inquérito e/ou acompanhar a sua realização.
Mas sua presença é secundária, acessória e contingente, pois o órgão
encarregado de dirigir o inquérito policial é a polícia judiciária.
Quanto aos poderes investigatórios do Ministério Público,
considerando as manifestações favoráveis por parte do STF,
fica nítido que o MP poderá instruir seus procedimentos
investigatórios criminais, devendo observar, no mínimo, o
regramento do inquérito.
Deverá ainda observar o rol de direitos e garantias do
investigado, previstos no CPP, em leis extravagantes (como a
Lei n. 8.906) e na Constituição, além de submeter-se ao rígido
controle de legalidade por parte do Juiz das Garantias
A Posição do Juiz Frente ao Inquérito Policial
• A efetividade da proteção está em grande parte pendente da
atividade jurisdicional, principal responsável por dar ou negar a tutela
dos direitos fundamentais. Como consequência, o fundamento da
legitimidade da jurisdição e da independência do Poder Judiciário está
no reconhecimento da sua função de garantidor dos direitos
fundamentais inseridos ou resultantes da Constituição.
• Nesse contexto, a função do juiz é atuar como garantidor 148 dos
direitos do acusado no processo penal.

Por isso criou-se o juiz das garantias, nos termos do art.3º-C do CPP
(lembrar que está suspenso)- ADIn's n. 6.298, 6.299, 6.300 e 6.305.

“Art. 3º-C. A competência do juiz das garantias abrange todas as


infrações penais, exceto as de menor potencial ofensivo, e cessa com o
recebimento da denúncia ou queixa na forma do art. 399 deste Código. 
(Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)”
• O juízo das garantias é sem dúvida uma das mais importantes
inovações da Lei n. 13.964/2019 foi a recepção do instituto – já
consagrado há décadas em diversos países.

O juiz das garantias (nomenclatura utilizada também, por exemplo, pelo CPP do
Chile, mas igualmente consagrada ainda que com outro nome em Portugal,
Paraguai, Uruguai, e tantos outros países) ou “il giudice per le indagini” dos
italianos, não tem uma postura inquisitória, não investiga e não produz prova de
ofício. Também conhecido como sistema “doble juez”, como define a doutrina
chilena e uruguaia em representativa denominação, na medida em que estabelece
a necessidade de dois juízes diferentes, ou seja, modelo “duplo juiz”, em que dois
juízes distintos atuam no feito. O primeiro intervém – quando invocado – na fase
pré-processual até o recebimento da denúncia, encaminhando os autos para outro
juiz que irá instruir e julgar, sem estar contaminado, sem pré-julgamentos e com a
máxima originalidade cognitiva
POR QUE DO JUIZ DAS GARANTIAS?
• O Tribunal Europeu de Direitos Humanos (TEDH), especialmente nos casos
Piersack, de 1º/10/1982, e De Cubber, de 26/10/1984, consagrou o
entendimento de que o juiz com poderes investigatórios é incompatível com
a função de julgador. Ou seja, se o juiz lançou mão de seu poder
investigatório na fase pré-processual, não poderá, na fase processual, ser o
julgador. É uma violação do direito ao juiz imparcial consagrado no art. 6.1
do Convênio para a Proteção dos Direitos Humanos e das Liberdades
Fundamentais, de 1950. Segundo o TEDH, a contaminação resultante dos
“pré-juízos” conduzem à falta de imparcialidade subjetiva ou objetiva. Desde
o caso Piersack, de 1982, entende-se que a subjetiva alude à convicção
pessoal do juiz concreto, que conhece de um determinado assunto e, desse
modo, a sua falta de “pré-juízos”.
“A garantia da “originalidade cognitiva” exige que o juiz criminal — para
efetivamente ser juiz e, portanto, imparcial — conheça do caso penal
originariamente no processo (na fase processual, na instrução). Deve formar
sua convicção pela prova colhida originariamente no contraditório judicial,
sem pré-juízos e pré-cognições acerca do objeto do processo. Do contrário, o
modelo brasileiro que se quer abandonar faz com que o juiz já entre na fase
processual “sabendo demais”, excessivamente contaminado, já “sabedor” e,
portanto, jamais haverá a mesma qualidade cognitiva com a versão
antagônica (da defesa, por elementar). Não existe igualdade de condições
cognitivas, não existe contraditório real (pois impossível o mesmo
tratamento) e, portanto, jamais haverá um devido processo frente a um juiz
verdadeiramente imparcial.” (AURY LOPES, p. 190, 2020)
Por fim, chama-se atenção para uma questão que não está expressa na Lei n.
13.964/2019, mas que exigirá ampla discussão: como ficam os processos de
competência originária dos tribunais? Em que um desembargador ou ministro
é chamado a atuar na investigação preliminar, para autorizar medidas
restritivas de direitos fundamentais submetidas à reserva de jurisdição, e
depois participa da instrução e julgamento do futuro processo penal?

Segundo Aury Lopes Jr., p. 192, 2020: “Pensamos que a exigência de


imparcialidade do julgador é a mesma (ainda que se trate de órgão colegiado,
cada magistrado tem dever de imparcialidade) e, portanto, aplicável todos os
argumentos que justificam a figura do magistrado das garantias que não pode
participar do julgamento. Por coerência e óbvia necessidade de originalidade
cognitiva e imparcialidade, o desembargador ou ministro que atua na fase pré-
processual, desempenha o papel de juiz das garantias e não poderá participar
da instrução e julgamento”.
Art. 3º-B. O juiz das garantias é responsável pelo controle da legalidade
da investigação criminal e pela salvaguarda dos direitos individuais cuja
franquia tenha sido reservada à autorização prévia do Poder Judiciário,
competindo-lhe especialmente:
I – receber a comunicação imediata da prisão, nos termos do inciso LXII do
caput do art. 5º da Constituição Federal;
Comentário: diz respeito a prisão em flagrante;
II – receber o auto da prisão em flagrante para o controle da legalidade da
prisão, observado o disposto no art. 310 deste Código;
Comentário: Art. 310. Após receber o auto de prisão em flagrante, no prazo
máximo de até 24 (vinte e quatro) horas após a realização da prisão, o juiz
deverá promover audiência de custódia com a presença do acusado, seu
advogado constituído ou membro da Defensoria Pública e o membro do
Ministério Público, e, nessa audiência, o juiz deverá, fundamentadamente:
(Redação dada pela Lei n. 13.964, de 2019
III – zelar pela observância dos direitos do preso, podendo determinar
que este seja conduzido à sua presença, a qualquer tempo;

IV – ser informado sobre a instauração de qualquer investigação


criminal;
Comentário: Evita-se, com isso, a abertura de investigações que ficam
sem qualquer controle, inclusive de tempo e requisitos formais.
Importante sublinhar que o juiz das garantias não investiga, apenas
controla a legalidade da investigação

V – decidir sobre o requerimento de prisão provisória ou outra medida


cautelar, observado o disposto no § 1º deste artigo;
VI – prorrogar a prisão provisória ou outra medida cautelar, bem como
substituí-las ou revogá-las, assegurado, no primeiro caso, o exercício do
contraditório em audiência pública e oral, na forma do disposto neste
Código ou em legislação especial pertinente;

VII – decidir sobre o requerimento de produção antecipada de provas


consideradas urgentes e não repetíveis, assegurados o contraditório e a
ampla defesa em audiência pública e oral;

VIII – prorrogar o prazo de duração do inquérito, estando o investigado


preso, em vista das razões apresentadas pela autoridade policial e
observado o disposto no § 2º deste artigo;
IX – determinar o trancamento do inquérito policial quando não houver
fundamento razoável para sua instauração ou prosseguimento;

X – requisitar documentos, laudos e informações ao delegado de polícia


sobre o andamento da investigação;

XI – decidir sobre os requerimentos de:


a) interceptação telefônica, do fluxo de comunicações em sistemas de
informática e telemática ou de outras formas de comunicação;
b) afastamento dos sigilos fiscal, bancário, de dados e telefônico;
c) busca e apreensão domiciliar;
d) acesso a informações sigilosas;
e) outros meios de obtenção da prova que restrinjam direitos
fundamentais do investigado;
• XII – julgar o habeas corpus impetrado antes do oferecimento da denúncia;
Comentário: Hipótese limitada.

XIII – determinar a instauração de incidente de insanidade mental;


XIV – decidir sobre o recebimento da denúncia ou queixa, nos termos do art.
399 deste Código;
XV – assegurar prontamente, quando se fizer necessário, o direito outorgado
ao investigado e ao seu defensor de acesso a todos os elementos informativos
e provas produzidos no âmbito da investigação criminal, salvo no que
concerne, estritamente, às diligências em andamento;
XVI – deferir pedido de admissão de assistente técnico para acompanhar a
produção da perícia;
XVII – decidir sobre a homologação de acordo de não persecução penal ou os
de colaboração premiada, quando formalizados durante a investigação;
XVIII – outras matérias inerentes às atribuições definidas no caput deste
artigo.

Trata-se de cláusula genérica que, depois da determinação exemplificativa


de um rol de atos de competência do juiz das garantias, abre para a
possibilidade de sua atuação em outras situações não previstas, respeitados
é claro o limite de sua atuação procedimental (até o momento do art. 399
ou similar nos demais procedimentos) e a própria função do juiz das
garantias: ser o responsável pelo controle da legalidade da investigação
criminal e pela salvaguarda dos direitos individuais cuja franquia tenha sido
reservada à autorização prévia do Poder Judiciário.
Objeto do inquérito e sua Limitação
• O objeto da investigação preliminar é o fato constante na notitia criminis,
isto é, o fumus commissi delicti que dá origem à investigação e sobre o qual
recai a totalidade dos atos desenvolvidos nessa fase. Toda a investigação
está centrada em esclarecer, em grau de verossimilitude, o fato e a autoria,
sendo que esta última (autoria) é um elemento subjetivo acidental da
notícia-crime. Não é necessário que seja previamente atribuída a uma
pessoa determinada. A atividade de identificação e individualização da
participação será realizada no curso da investigação preliminar. Destarte, o
objeto do inquérito policial será o fato (ou fatos) constante na notícia-crime
ou que resultar do conhecimento adquirido através da investigação de ofício
da polícia. No que se refere ao quanto de conhecimento (cognitio) do fato,
deverá ser alcançado no inquérito;
Limitação Qualitativa
O inquérito policial serve – essencialmente – para averiguar e
comprovar os fatos constantes na notitia criminis. Nesse sentido, o
poder do Estado de averiguar as condutas que revistam a aparência de
delito é uma atividade que prepara o exercício da pretensão acusatória
que será posteriormente exercida no processo penal. É importante
recordar que, para a instauração do inquérito policial, basta a mera
possibilidade de que exista um fato punível. A própria autoria não
necessita ser conhecida no início da investigação.
O inquérito policial nasce da mera possibilidade, mas almeja a
probabilidade. Para atingir esse objetivo, o IP tem seu campo de
cognição limitado. No plano horizontal, está limitado a demonstrar a
probabilidade da existência do fato aparentemente punível e a autoria,
coautoria ou participação do sujeito passivo. Essa restrição recai sobre
o campo probatório, isto é, os dados acerca da situação fática descrita
na notitia criminis. O que se busca é averiguar e comprovar o fato em
grau de probabilidade.
O IP limita-se ao conhecimento das questões fáticas (plano horizontal)
e jurídico-penais (plano vertical) são limitados, não se permitindo a
ampla discussão sobre elas. Emprega-se uma limitação nas duas
dimensões, fazendo com que a cognição seja limitada, mera tutela de
aparência. É por isso que o inquérito policial busca apenas a
verossimilhança do crime, a mera fumaça (fumus commissi delicti), não
havendo possibilidade de plena discussão das teses, pois a cognição
plenária fica reservada para a fase processual
Limitação temporal
O inquérito deverá ser concluído com a maior brevidade possível e, em
todo caso, dentro do prazo legal. Ademais, não há que se esquecer do
direito de ser julgado no prazo razoável, previsto no art. 5º, LXXVIII, da
Constituição e já explicado anteriormente em tópico específico, cuja
incidência na fase pré-processual é imperativa e inafastável.

Assim, como regra geral, o inquérito policial deve ser concluído no prazo de
10 dias – indiciado preso – ou 30 dias no caso de não existir prisão cautelar
(art. 10 do CPP). Esse prazo de 10 dias será computado a partir do
momento do ingresso em prisão, pois o que se pretende limitar é que a
prisão se prolongue além dos 10 dias
Quando o sujeito passivo estiver em liberdade, atendendo à complexidade
do caso (difícil elucidação), o prazo de 30 dias poderá ser prorrogado a
critério do juiz competente para o processo (art. 10, § 3º, do CPP), desde que
existam motivos razoáveis para isso.

Nos casos de crime de competência do da Justiça Federal, prevê o art. 66 da


Lei n. 5.010/66 que o prazo de conclusão do IP quando o sujeito passivo
estiver em prisão será de 15 dias – prorrogáveis por mais 15. Nesse caso, a
polícia deverá apresentar o preso ao juiz e a decisão judicial deverá ser
fundamentada, levando-se em consideração a gravidade da medida adotada.
Mantém-se o limite de 30 dias quando o sujeito passivo estiver em liberdade
Nos delitos de tráfico de entorpecentes, o art. 51 da Lei n. 11.343/2006
prevê que o inquérito será concluído no prazo de 30 dias se o indiciado
estiver preso e de 90 dias se estiver solto. Esses prazos,
substancialmente maiores do que aqueles previstos no CPP, poderão
ainda ser duplicados pelo juiz. Destaque-se a possibilidade de um
inquérito durar até 60 dias com indiciado preso.
Curiosidade:
A Lei n. 13.869/2019 – Abuso de Autoridade – estabeleceu que
constitui crime:

Art. 31. Estender injustificadamente a investigação, procrastinandoa em


prejuízo do investigado ou fiscalizado: Pena – detenção, de 6 (seis)
meses a 2 (dois) anos, e multa. Parágrafo único. Incorre na mesma pena
quem, inexistindo prazo para execução ou conclusão de procedimento,
o estende de forma imotivada, procrastinando-o em prejuízo do
investigado ou do fiscalizado.
Análise da Forma dos Atos do Inquérito
Policial
Atos de Iniciação – Art. 5º do CPP

O inquérito policial tem sua origem na notitia criminis ou mesmo na


atividade de ofício dos órgãos encarregados da segurança pública.
Formalmente, o IP inicia com um ato administrativo do delegado de
polícia, que determina a sua instauração através de uma portaria. Sem
embargo, a relevância está no ato que dá causa à portaria, que, em
última análise, carece de importância jurídica.

Por isso, dispõe o art. 5º do CPP que o IP será iniciado:


• De Ofício pela Própria Autoridade Policial

A própria autoridade policial, em cuja jurisdição territorial ocorreu o


delito que lhe compete averiguar em razão da matéria, tem o dever de
agir de ofício, instaurando o inquérito policial.

• por informação reservada;


• em virtude da situação de flagrância;
• por meio da voz pública;
• através da notoriedade do fato.
Requisição do Ministério Público (ou Órgão
Jurisdicional?)
• Quando chega ao conhecimento de algum desses órgãos a prática de
um delito de ação penal de iniciativa pública ou se depreende dos
autos de um processo em andamento a existência de indícios da
prática de uma infração penal de natureza pública, a autoridade
deverá diligenciar para sua apuração. Decorre do dever dos órgãos
públicos de contribuir para a persecução de delitos dessa natureza.
Em sendo o possuidor da informação um órgão jurisdicional, deverá
enviar os autos ou papéis diretamente ao Ministério Público (art. 40)
para que decida se exerce imediatamente a ação penal, requisite a
instauração do IP ou mesmo solicite o arquivamento (art. 28)
• Em definitivo, não cabe ao juiz requisitar a instauração do IP, em
nenhum caso, pois viola a matriz constitucional do sistema
acusatório;
• Em sentido estrito, a requisição é uma modalidade de notícia-crime
qualificada, tendo em vista a especial condição do sujeito ativo e a
imperatividade, pois dá notícia de um acontecimento com possível
relevância jurídico-penal e determina a sua apuração. De qualquer
forma, recebendo a requisição, a autoridade policial deverá
imediatamente instaurar o inquérito policial e praticar as diligências
necessárias e as eventualmente determinadas pelo MP.
Requerimento do Ofendido
Exige uma especial condição do sujeito (ser o ofendido), que, ademais de
comunicar a ocorrência de um fato aparentemente punível, requer que a
autoridade policial diligencie no sentido de apurá-lo. No sistema adotado
pelo CPP, nos delitos de ação penal de iniciativa pública, a fase pré-
processual está nas mãos da polícia, e a ação penal, com o Ministério
Público. Sem embargo, cabe à vítima atuar em caso de inércia dos órgãos
oficiais, da seguinte forma:
• requerendo a abertura do IP se a autoridade policial não o instaurar de
ofício ou mediante a comunicação de qualquer pessoa;
• exercer a ação penal privada subsidiária da pública em caso de inércia do
Ministério Público (art. 5º, LIX, da CB c/c art. 29 do CPP).
O art. 5º, II, § 1º, enumera determinados requisitos que conterão – sempre que possível –
o requerimento.
O primeiro é de ordem lógica, pois necessariamente deve descrever um fato, ainda que
não o faça “com todas as circunstâncias”, até porque um dos fundamentos da existência do
inquérito policial, como instrução preliminar, é apurar as circunstâncias do fato.
A letra b refere-se à indicação da autoria, cabendo ao ofendido facilitar à polícia os dados
que possua e fundamentar sua suspeita. Mas tampouco é imprescindível, pois outra das
funções do IP é exatamente a sua determinação.
A nomeação das testemunhas com dados que permitam identificá-las, sendo
desnecessário indicar a profissão. O que pretende a lei é que o ofendido indique dados que
permitam à autoridade identificar e contatar as testemunhas.
Tampouco poderá ser indeferido o requerimento por falta de indicação de testemunhas.
Em síntese, o que deve ficar claro é que se trata de um delito de ação penal de iniciativa
pública e que a polícia tem a obrigação de apurar, seja através do conhecimento de ofício,
através de notícia-crime realizada pela vítima ou por qualquer pessoa
EM CASO DE ARQUIVAMENTO

Prevê o § 2º do art. 5º que do despacho que indeferir o requerimento


de abertura do inquérito policial caberá “recurso” para o chefe de
polícia. É um recurso inominado, de caráter administrativo e de pouca
ou nenhuma eficácia. Pode-se também:

• impetrar um Mandado de Segurança contra o ato do delegado, que


será julgado pelo juiz;
• levar ao conhecimento do Ministério Público, oferecendo-lhe todos
os dados disponíveis, nos termos do art. 27.
Comunicação Oral ou Escrita
É a típica notícia-crime, em que qualquer pessoa, sem um interesse
jurídico específico, comunica à autoridade policial a ocorrência de um fato
aparentemente punível. Inclusive a vítima poderá fazer essa notícia-crime
simples, quando comunica o fato sem formalizar um requerimento.

No Brasil, como regra, a notícia-crime é facultativa, pois aos cidadãos


assiste uma faculdade, e não uma obrigação de denunciarem a prática de
um delito que tenham presenciado ou que sabem ter ocorrido. Em
sentido oposto está a notícia-crime obrigatória, que no nosso sistema é
uma exceção.
Como exemplos de notícia-crime obrigatória citamos o art. 66
da Lei n. 3.688/41, segundo o qual constitui a contravenção
de omissão de comunicação de crime o ato de deixar de
comunicar à autoridade competente crime de ação penal de
iniciativa pública incondicionada de que teve conhecimento
no exercício de função pública.

O inciso II do referido dispositivo prevê a punição de quem


teve conhecimento, no exercício da medicina ou de outra
profissão sanitária, de um crime de ação penal pública
incondicionada e cuja comunicação não exponha o cliente a
procedimento penal.
Atos de Desenvolvimento: Arts. 6º e 7º do
CPP
• Com base na notícia-crime, a polícia judiciária instaura o
inquérito policial, isto é, o procedimento administrativo pré-
processual. Para realizar o IP, praticará a polícia judiciária
uma série de atos – arts. 6º e seguintes do CPP –, que de
forma concatenada pretendem proporcionar elementos de
convicção para a formação da opinio delicti do acusador.
•   Art. 7o  Para verificar a possibilidade de haver a infração sido
praticada de determinado modo, a autoridade policial poderá
proceder à reprodução simulada dos fatos, desde que esta não
contrarie a moralidade ou a ordem pública.
 Art. 6o  Logo que tiver conhecimento da prática da infração penal, a autoridade policial
deverá: I - dirigir-se ao local, providenciando para que não se alterem o estado e
conservação das coisas, até a chegada dos peritos criminais; II - apreender os objetos que
tiverem relação com o fato, após liberados pelos peritos criminais; III - colher todas as
provas que servirem para o esclarecimento do fato e suas circunstâncias; IV - ouvir o
ofendido; V - ouvir o indiciado, com observância, no que for aplicável, do disposto
no Capítulo III do Título Vll, deste Livro, devendo o respectivo termo ser assinado por duas
testemunhas que Ihe tenham ouvido a leitura; VI - proceder a reconhecimento de pessoas
e coisas e a acareações; VII - determinar, se for caso, que se proceda a exame de corpo de
delito e a quaisquer outras perícias; VIII - ordenar a identificação do indiciado pelo
processo datiloscópico, se possível, e fazer juntar aos autos sua folha de antecedentes;
IX - averiguar a vida pregressa do indiciado, sob o ponto de vista individual, familiar e
social, sua condição econômica, sua atitude e estado de ânimo antes e depois do crime e
durante ele, e quaisquer outros elementos que contribuírem para a apreciação do seu
temperamento e caráter. X - colher informações sobre a existência de filhos, respectivas
idades e se possuem alguma deficiência e o nome e o contato de eventual responsável
pelos cuidados dos filhos, indicado pela pessoa presa.  
INCOMUNICABILIDADE

• A incomunicabilidade do investigado está regulamentada no art. 21


do CPP, dispondo que “dependerá sempre de despacho nos autos e
somente será permitida quando o interesse da sociedade ou a
conveniência da investigação o exigir”. Trata-se de instituto que tem
por objetivo impedir que o investigado preso obtenha auxílio de
terceiros, que com ele mantenham contato, no intuito de apagar
provas, instruir testemunhas ou de qualquer forma dificultar o êxito
das investigações policiais.
Na atualidade, há divergências quanto à recepção dessa previsão pela
Constituição Federal vigente. De qualquer forma, independentemente
da posição que venha a ser adotada no caso concreto, um aspecto é
indiscutível: a vedação introduzida pelo art. 21 do Código de Processo
Penal não pode, em hipótese alguma, impedir o contato do investigado
preso com o seu advogado, pois a este, conforme reza o citado art. 7.º,
III, do Estatuto da Advocacia, sempre será facultado comunicar-se com
seus clientes, de forma pessoal e reservada, quando se encontrarem
presos. Assim, as divergências existem unicamente em relação à
subsistência do instituto como forma de evitar o contato do preso com
terceiros (v.g., parentes, amigos etc.).
Primeira: não recepção da incomunicabilidade pela CF/1988. A Constituição Federal
estabeleceu, entre as garantias fundamentais do art. 5.º, a de que toda a prisão será
comunicada imediatamente ao juiz competente e à família do preso ou pessoa por
ele indicada (inciso LXII) e a de que o preso terá direito à assistência da família e do
advogado (inciso LXIII). Em nível infraconstitucional, o Estatuto da Advocacia (Lei
8.906/1994), no art. 7.º, III, estabelece que o preso não pode ser privado de contato
com o seu advogado. Ora, se o direito à assistência familiar e o contato com o
advogado não podem ser coibidos, de nada adianta privar o preso de se comunicar
com terceiros, pois o objetivo da incomunicabilidade, qual seja, o de evitar que
ultrapassem as portas da delegacia informações importantes ou instruções do
investigado tendentes à manipulação de provas, fica de qualquer modo prejudicado.
Mais: de acordo com o art. 136, § 3.º, IV, da CF, na vigência do Estado de Defesa,
quando há a supressão de inúmeras garantias individuais, o preso não poderá ficar
incomunicável. Sendo assim, por uma questão de proporcionalidade, a mesma regra
deve ser observada nos estados de normalidade constitucional, em que as garantias
vigoram na sua plenitude. Desta posição comungam, entre outros, Tourinho Filho,
Júlio Fabbrini Mirabete e Guilherme de Souza Nucci.
Segunda: recepção da incomunicabilidade pela CF/1988. A
incomunicabilidade subsiste no ordenamento jurídico, devendo-se,
contudo, observar a regra do art. 21, parágrafo único, do CPP, no sentido
de que não poderá exceder a três dias e deverá ser decretada por
decisão fundamentada do juiz, a requerimento da autoridade policial ou
do Ministério Público. E não procede o argumento de que a restrição,
sendo vedada no Estado de Defesa, não se justifica nos estados de
normalidade constitucional. Isto porque a vedação à incomunicabilidade
no Estado de Defesa ocorre apenas em relação aos presos políticos e não
aos criminosos comuns. Entre os adeptos dessa orientação, estão
Damásio E. de Jesus, Hélio Tornaghi e Vicente Greco Filho.
SIGILO
O sigilo está previsto no art. 20 do CPP, ao estabelecer que “a
autoridade assegurará no inquérito o sigilo necessário à elucidação do
fato ou exigido pelo interesse da sociedade”. Andou certo o legislador
com esta previsão. Sendo o inquérito policial um procedimento de
natureza administrativa, inquisitiva e preliminar à ação penal, descabe
submetê-lo à mesma publicidade que rege o processo criminal,
podendo e devendo a autoridade policial preservá-lo do acesso de
terceiros supostamente interessados em verificar seu andamento ou
tomar conhecimento das diligências realizadas, quando entender que a
confidencialidade é essencial para o êxito das investigações ou assim o
exige o interesse da sociedade.
Perceba-se que o sigilo que poderá ser conferido ao inquérito policial é,
unicamente, aquele que impedirá as pessoas do povo e o próprio
investigado de manusear os respectivos autos ou tomar contato direto
com o resultado de diligências realizadas no seu curso.

Destarte, é evidente que esse sigilo não poderá atingir o Juiz e o


Ministério Público.
Em relação ao advogado, é consagrado pelo art. 7.º, XIV, da Lei 8.906/199621 o direito de examinar, em
qualquer instituição responsável por conduzir investigação, mesmo sem procuração (ressalva-se aqui a
hipótese de ter sido o sigilo formalmente conferido, caso em que a procuração é indispensável, ex vi do
art. 7.º, § 10), autos de flagrante e de investigações de qualquer natureza, findos ou em andamento,
ainda que conclusos à autoridade, podendo copiar peças e tomar apontamentos, em meio físico ou
digital, regra esta aplicável tanto a processos e procedimentos físicos quanto a eletrônicos (art. 7.º, § 13,
introduzido pela Lei 13.793/2019), estabelecendo, ainda, a Súmula Vinculante 14 do STF que “é direito
do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já
documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia
judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa”. Portanto, ainda que decretado o sigilo, não
fica o advogado privado de acessar os autos do inquérito. Atente-se que o acesso amplo assegurado pela
referida Súmula à defesa não é sinônimo de acesso irrestrito, devendo ser facultado ao advogado desde
que não comprometa o andamento regular das investigações. Isto quer dizer que o direito que assiste ao
advogado regularmente constituído pelo investigado é o de acesso às provas já produzidas e
formalmente incorporadas ao inquérito, excluindo-se dessa prerrogativa as informações e providências
investigatórias em execução e, por isso mesmo, ainda não documentadas no caderno policial, muito
especialmente aquelas que, por sua própria natureza, não possam ser divulgadas à defesa sob pena de
comprometimento da respectiva eficácia. Não é outro o teor do art. 7.º, § 11, da Lei 8.906/1994 ao
dispor que, “no caso previsto no inciso XIV, a autoridade competente poderá delimitar o acesso do
advogado aos elementos de prova relacionados a diligências em andamento e ainda não documentados
nos autos, quando houver risco de comprometimento da eficiência, da eficácia ou da finalidade das
diligências”
CONCLUSÃO OU ENCERRAMENTO DA
INVESTIGAÇÃO
Esgotadas as investigações, o delegado de polícia deverá encerrar o
inquérito. Esse encerramento não significa, necessariamente, que tenham
sido dirimidas todas as dúvidas a respeito do fato investigado e elucidada de
forma inequívoca a infração penal que gerou o procedimento, mas apenas
que, a juízo da autoridade policial, todas as diligências possíveis para a
respectiva apuração já foram realizadas.

Neste momento, determina o Código de Processo Penal que a autoridade


policial faça minucioso relatório do que houver apurado, encaminhando, a
seguir, os autos do procedimento a juízo (art. 10, § 1.º, do CPP) juntamente
com os instrumentos e objetos que interessarem à prova (art. 11 do CPP).

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