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rapidez, com toda a energia, e liberta-te definitivamente devemos tomar qualquer atitude senão quando encontrarmos

desses teus falaciosos deveres! Repara bem no conselho o momento certo para o fazer; mas quando ocorrer esse
que te dou: em meu entender tens de libertar-te desse momento tão longamente desejado, há que saltar logo
tipo de vida, ou de deixar a vida, sem mais. Mas penso a agarrá-lo! Se nos preparamos para a fuga, diz ele, não
também que deves proceder gradualmente, que é preferí- poderemos deitar-nos a dormir; e mesmo para as situa-
vel desatar do que cortar os laços em que, para teu mal, ções mais difíceis haverá sempre esperança de salvação se
te enredaste, na condição, porém, de estares disposto a nem nos precipitarmos antes de tempo, nem hesitarmos
cortá-los se não houver maneira alguma de os desatar. quando chegar a hora. Imagino que desejarás agora conhe-
Ninguém é tão medroso que prefira estar sempre em cer a posição dos estóicos. Ninguém terá autoridade para 7
4 desequil..tbrio a cair de uma vez por todas. Entretanto, e lançar-lhes a acusação de temeridade: os estóicos são mais
para começar, não te metas em mais trabalhos; contenta- prudentes ainda do que corajoso~.
-te com as ocupações a que te comprometeste, ou, como Possivelmente esperarias que te dissessem: "É uma
pareces preferir dizer, a que as circunstâncias te compro- vergonha ceder ao peso das responsabilidades; cumpre com
meteram. Não deves abalançar-te a novas tarefas, ou então os deveres de que foste incumbido. Um homem forte e
não terás mais pretextos para acusar as circunstâncias! valoroso não foge ao seu dever, antes pelo contrário, as
Dizeres, como é habitual: "Não podia fazer de outro modo, próprias dificuldades aumentam a sua força de ânimo!"
embora o não quisesse, a necessidade a isso me obrigava!': Sim, estas serão as palavras dos estóicos enquanto valer a 8
não passa de falsas desculpas. Ninguém é obrigado a pro- pena mantermo-nos firmes no nosso posto, enquanto não
curar a felicidade a passo de corrida; já é qualquer coisa formos constrangidos a fazer ou a suportar nada que seja
que, embora não lutemos contra ela, pelo menos paremos indigno de um homem de bem. Se não for este o caso, o
e não nos deixemos levar pela fortuna! estóico não se arruinará num esforço indigno e ultrajante,
5 Não vais ofender-te se eu, não me limitando a acon- não se manterá activo apenas para se manter activo! Não
selhar-te, invocar em meu auxílio a autoridade de outros, fará sequer aquilo que esperarias vê-lo fazer, ou seja,
mais experimentados do que eu, a cuja opinião me arrimo aguentar permanentemente o embate das grandes mano-
sempre que me vejo forçado a tomar uma decisão? ! Vais bras políticas. Quando o estóico se der conta de que está
ler uma carta de Epicuro dedicada precisamente a este envolvido numa situação opressiva, dúbia, ambígua deve
problema, a carta a ldomeneu. Epicuro exorta o amigo a recuar; não voltar as costas, mas sim retirar-se gradual-
despojar-se de todo o seu poder tão rápido quanto possí- mente para lugar seguro. Não é difícil, caro Lucílio, fugir 9
vel, antes que intervenha alguma força maior e o prive da às ocupações quando se não atribui qualquer valor aos
6 liberdade de retirar-se. 2 Acrescenta, no entanto, que não benefícios dessas ocupações. Quem se deixa enlear e reter
por elas fá-lo em virtude deste raciocínio: "Ai de mim!
Então hei-de renunciar a tão belas promessas? Hei-de reti-
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Epicuro, fr. 133 Usener. rar-me antes de fazer a colheita? Hei-de ver-me abando-

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