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Curso Tecnólogo em Gastronomia

Disciplina Introdução à Gastronomia Código


CH Total 60 h CH Teórica CH Prática Período Letivo 2019.2
Professor(es) Ednilson da Silva Andrade

TEXTO 1: ARCHESTRATUS X BRILLAT-SAVARIN

Archestratus foi considerado o primeiro gastrônomo da história. Criador do termo


Gastronomia, fez emergir seu sentido ligado ao prazer de comer bem. Haja vista a forma
como denominou sua obra: (Hedypatheia ou “Tratado dos Prazeres”). Infelizmente, a maior
parte dessa obra se perdeu.Conta-se que Archestratus era tão apaixonado por gastronomia
que acabou gastando verdadeiras fortunas nas viagens, em busca de iguarias, e arruinado,
preferiu suicidar-se a viver na miséria.

Jean Anthelme Brillat-Savarin (1755 – 1826) foi um dos mais famosos epicuristas e
gastrónomos franceses de todos os tempos. Nasceu na cidade de Belley, Ain, e dedicou-se
nos primeiros anos da sua vida ao estudo do direito, química e medicina, em Dijon, tendo
chegado a praticar advocacia na sua cidade natal. Em 1789, no estopim da Revolução
Francesa, foi nomeado deputado da Assembléia Nacional Constituinte, onde adquiriu
alguma fama, particularmente devido à sua defesa pública da pena capital. Adotaria o
apelido “Savarin” após a morte de uma tia sua, que lhe deixara toda a sua fortuna sob a
condição que adotasse o seu último nome.

Numa fase posterior da Revolução, a sua cabeça ficou a prêmio, e Brillat-Savarin


procurou asilo político na Suíça. Mais tarde, mudou-se para a Holanda, e depois para os
Estados Unidos, onde permaneceu durante três anos, dando aulas de Francês e de violino.
Regressou a França em 1797 e obteve a magistratura, exercendo até ao fim da sua vida
como juiz do Supremo Tribunal. Publicou várias obras de direito e economia, mas a sua
obra mais conhecida foi mesmo “Fisiologia do Gosto” (Physiologie do Goût), lançada em
Dezembro de 1825, dois meses antes da sua morte. Brillat-Savarin é o autor de frases
famosas como “Diz-me o que comes, dir-te-ei quem és” e “a descoberta de uma nova
receita faz mais pela felicidade do gênero humano do que a descoberta de uma estrela”.

FONTE: FREIXA, Dolores; CHAVES, Guta. Gastronomia no Brasil e no mundo. Rio de


Janeiro: Senac Nacional, 2008.
TEXTO 2: TENDÊNCIAS DA GASTRONOMIA

Lourdes Barbosa1

Refletir sobre como a gastronomia vem se desenvolvendo é um exercício salutar para


curiosos e profissionais da área. Não se trata de fazer futurologia (embora o artigo se
encerre com uma pergunta sobre o futuro), mas de realçar alguns parâmetros que
influenciam a alimentação e a culinária de hoje.

De saída, convém lembrar que o conceito de “alimentação” envolve os vários aspectos


da atividade econômica e cultural relacionada à comida. Já “culinária” está mais próxima das
receitas para a preparação dos pratos, enquanto “gastronomia” tem a ver,
simultaneamente, com a cozinha (preparação) e a mesa (apreciação). Em todas as três
esferas, tem havido mudanças importantes, como veremos.

O primeiro destaque é que o pensamento dos consumidores contemporâneos está


centrado na saúde do corpo e da alma. Técnicas de preparação mais saudáveis, a exemplo
dos grelhados e dos cozidos a vapor, ou no forno, são valorizadas e constantemente se
aprimoram. Os pratos se tornam mais leves, evitando-se a utilização de gorduras ruins e de
ingredientes com aditivos. Há uma maior utilização de alimentos funcionais, que contêm
substâncias ou nutrientes úteis à prevenção ou ao tratamento de doenças.

Nessa mesma linha, a preocupação com a segurança vem crescendo muito. Objeto de
pesquisas científicas, as normas de produção, manipulação, transporte e conservação dos
alimentos, visando garantir sua integridade, têm sido mais e mais incorporadas à prática dos
que produzem ou comercializam a comida. Também já existe uma consciência ambiental
(cujo produto é a chamada “comida ética”), que orienta a escolha dos produtos e dos
lugares onde os consumidores se alimentam ou se abastecem.

O atendimento rápido e acessível é outra das demandas do consumidor


contemporâneo. Mas também se observa a busca de alimentos e ambientes com
características únicas, o que leva ao emprego de conceitos altamente especializados,
visando à diferenciação de produtos e serviços. Destaque, nesse último aspecto, para as

1
Lourdes Barbosa é professora de Teoria e Prática de Alimentos, Coordenadora do Curso de Hotelaria na UFPE
e Integrante do GAAB – Grupo de Antropologia da Alimentação Brasileira, da Fundação Gilberto Freyre.
Endereço eletrônico: lourdesabarbosa@terra.com.br.
variadas combinações de sabores, cores e texturas. Afinal, os cinco sentidos devem ser
estimulados. Em relação às novas práticas culinárias, as principais novidades ocorrem na
interação entre produtos, técnicas e mentalidades. Ganha importância a mescla entre a
cozinha artesanal e a industrial. A inovação deixou de ser, apenas, o aperfeiçoamento de
uma técnica clássica para se tornar um genuíno exercício de criatividade, do gosto pelo
novo. O ideal é o equilíbrio entre a tradição e a inovação, mas esta só tem valor se for uma
busca da qualidade e do prazer. Há uma democratização da cozinha e a sua difusão por
grupos sociais os mais diversos. A capacidade de preparar alimentos deixou de ser uma coisa
que se adquiria com o pai, ou com a mãe. Passou a ser ensinada de forma rigorosa,
profissional. E muitos dos que receberam esse treinamento se tornaram personalidades de
destaque, independentemente de sua origem familiar.

A dinâmica do terroir (valorização das raízes locais) ganha espaço, mas há uma mescla
entre passado e presente. Além disso, um ponto de destaque nesse contexto é o papel das
ciências exatas: a Física e a Química têm contribuído para a evolução tanto dos
equipamentos como das técnicas de preparo.

Os ingredientes têm um papel primordial na concepção dos alimentos e na forma que


as pessoas se relacionam com o que comem. A qualidade com que são produzidos,
armazenados e distribuídos faz diferença para quem os utiliza na cozinha e para quem
consome os pratos resultantes. Elementos exóticos são pesquisados e utilizados pelos
chefes, no intuito de realçar os sabores e o visual dos pratos. Nessa tendência, ganham
destaque produtos locais, ainda pouco conhecidos, tais como os encontrados na Amazônia
(tucupi, jambu, maniva, pirarucu, muçuã, pupunha...); em várias partes da América Latina
(pimentas, cactos, insetos, ervas...); ou na Ásia (sementes, ervas, especiarias, composições
agridoces ...).

Aguçar os sentidos é, também, o objetivo das produções gastronômicas e o chefe de


cozinha tem um papel fundamental nisso, como um artista que produz suas obras. A
composição estética dos pratos é uma arte. Além disso, todo o ambiente e atmosfera
(decoração, utensílios, aromas, cores, sons) do restaurante devem contribuir para tornar
extraordinária a experiência de saborear uma comida.

A gastronomia científica assume a forma da cozinha molecular, definida pela


exploração dos componentes técnicos, artísticos e relacionais, uma prática em que se
combinam ingredientes com composição molecular compatível. Impera aqui o conceito de
“desestruturação de preparações”, ou de “desconstrução” da gastronomia: a negação de
paradigmas; (talvez) a formação de um novo saber.

Diante de tudo isso, há dois grupos que percebem as mudanças de formas


diferenciadas: os contemporâneos, mais tradicionalistas, e os pós-modernos, mais ousados e
inovadores. A coexistência de duas vertentes sugere uma pergunta: estamos vivendo uma
crise da cozinha tradicional ou a quebra de um paradigma para a construção de uma nova
gastronomia?

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