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ANAMNESE CLÍNICO-OCUPACIONAL

Raquel Maria Rigotto

I. INTRODUÇÃO
As relações entre o trabalho e a saúde/doença dos indivíduos e dos
grupos humanos tem sido cada vez mais enfatizada por estudos e
pesquisas, colocando para os profissionais de saúde a tarefa de
abordar também a vida laboral de seus pacientes.

A Anamnese Clínico-Ocupacional (A.C.O.), ao incorporar esta


dimensão fundamental ao mais relevante procedimento semiológico,
pretende ser um instrumento para os profissionais de saúde na
abordagem daquelas relações, ao lado do estudo dos locais de
trabalho, dos estudos epidemiológicos e do estudo bibliográfico.

A A.C.O. pode ser realizada junto ao paciente trabalhador


individualmente ou em grupos, principalmente quando se trata de
trabalhadores que procedem de um mesmo local de trabalho: a
enquete coletiva (Cfr. LAURELL e NORIEGA, 1989; RIGOTTO,
1992; FACCHINI, 1992).

É um momento precioso, onde o profissional de saúde e o(s)


trabalhador(es) vão trocar informações e construir um saber que
interessa imediatamente àquela situação específica e que também
pode contribuir para o avanço do conhecimento sobre a saúde dos
trabalhadores. Nesta perspectiva, é importante estar atento a alguns
aspectos:

• os trabalhadores têm um saber próprio, nascido da sua vivência


cotidiana e da experiência de seu corpo no trabalho. Sua
linguagem e os elementos de seu raciocínio podem ser diferentes
do saber acadêmico, mas nem por isto seu saber é menos
relevante. Muitas vezes ele aparece - como o saber científico -
mesclado com informações, crenças e valores difundidos pela
cultura hegemônica através de seus instrumentos de poder. O
profissional de saúde deve esforçar-se para compreender, em
toda a sua complexidade, o universo do paciente-trabalhador.

• A “evolução” do Processo de Trabalho tende progressivamente


a expropriar o saber dos trabalhadores, separando concepção e
execução, fragmentando tarefas, isolando cada trabalhador em
seu posto, controlando-os. Por isto, muitos pacientes têm
dificuldade em falar sobre seu trabalho. Neste sentido a consulta
médica e a enquete coletiva podem ser oportunidades para que
ele explicite e organize as informações de que dispõe,
reconstruindo o processo de trabalho onde está inserido e
situando-se nele, num momento pedagógico potencialmente
desalienante.

• Ainda conhecemos muito pouco sobre os riscos ocupacionais já


introduzidos na produção. Mais do que isto, as constantes
mudanças tecnológicas e organizacionais que o capital realiza -
para manter a competitividade no mercado, por um lado, e a
subordinação dos trabalhadores, por outro - introduz novos riscos
à saúde. Desta forma, é necessário que o profissional de saúde
mantenha sempre a postura de pesquisador, pronto a captar
fenômenos novos que podem se lhe apresentar.

• Segundo Berlinguer (1983), a doença é um sinal de alterações


do equilíbrio homem-ambiente. Como tal, é também um chamado
à mudança. Cabe ao Serviço de Saúde ajudar o paciente a fazer a
leitura deste sinal. Os trabalhadores são sujeitos de suas vidas,
agentes da transformação de suas condições de saúde e de
trabalho. Conhecer para assumir-se como tal é importante
indicador de saúde (DEJOURS, 1986).

• Estar familiarizado com os locais de trabalho de diversos ramos


de atividades facilita a compreensão da vida laboral dos pacientes-
trabalhadores.

II. DEFINIÇÃO
A Anamnese Clínico-Ocupacional resulta da incorporação, na
Anamnese Clínica, de um conjunto de informações que visam
detectar e esclarecer os riscos a que está exposto o trabalhador em
sua vida laboral; as alterações de saúde, precoces ou manifestas,
que estão ocorrendo no seu corpo; as possíveis relações entre o
perfil de riscos e o perfil de saúde/doença do trabalhador.

III. OBJETIVOS

• Possibilitar o diagnóstico da patologia ocupacional


• Orientar o tratamento adequado;
• Possibilitar o acesso do paciente aos benefícios do Seguro de
Acidentes do Trabalho do INSS;
• Informar o trabalhador sobre a gênese, evolução e prevenção de
sua patologia;
• Orientar o trabalhador, a empresa, e o INSS sobre as
possibilidades de retorno do paciente ao trabalho e sobre a
necessidade de Reabilitação Profissional;
• Acionar as ações de Vigilância relacionadas à melhoria das
condições sanitárias do ambiente gerador do caso; ao diagnóstico
precoce; à busca ativa de casos e ao traçado do perfil
epidemiológico da patologia ocupacional
• Reunir dados para produção científica, ampliando o conhecimento
sobre os agravos à saúde dos trabalhadores;
• Compreender e difundir informações sobre as relações entre o
trabalho e a saúde.

IV. ROTEIRO DE EXECUÇÃO

1. Identificação do paciente:
Nome, data de nascimento, naturalidade, cor, estado civil, profissão,
procedência, origem do encaminhamento.

3. Queixa principal (Q.P.):


Relato espontâneo, pelo paciente, dos motivos que o trouxeram à
consulta e de como ele percebe o seu estado de saúde.

4. História da Moléstia Atual (H.M.A.):


Descrever detalhadamente as queixas referidas acima e a evolução
da doença, incluindo a propedêutica e terapêutica já realizadas e
seus resultados. Registrar ainda:
• há relação do quadro relatado com o afastamento ou retorno ao
trabalho?
• as providências já tomadas em relação à Previdência Social:
afastamentos, perícias, notificações, etc.

5. História Ocupacional:
Neste item interessa conhecer toda a trajetória ocupacional do
paciente, desde seu primeiro trabalho (formal ou não), destacando o
tempo que permaneceu em cada um.

Posteriormente, estas ocupações deverão ser descritas para obter


as informações discriminadas abaixo. A prática clínica orientará o
grau de detalhamento adequado e necessário em cada caso.

Identificação da atividade/local de trabalho/ empregador/ empresa


empregadora atual
Informar onde trabalha o paciente (empresa ou local). Caso o
paciente tenha um emprego formal, informar: razão social, ramo de
atividade, número de empregados, endereço, telefone e pessoal
para contato, médico do trabalho.

a. Descrição do Processo Produtivo:


• matérias primas, subprodutos e produtos finais;
• etapas do processo produtivo (fluxograma) e atividades paralelas
• o processo de trabalho prescrito x o real

b. Descrição da Função:
• O que faz: substâncias, objeto de trabalho;
• Com o que faz: instrumentos e equipamentos de trabalho;
• Como faz: operações realizadas, posturas adotadas, grupos
músculo-tendinosos e movimentos demandados pela tarefa;
• Quanto faz: ritmo de trabalho, produtividade;
• Lay-out do posto de trabalho e suas interrelações com outras
áreas vizinhas;
Obs.: Atente-se para a possibilidade de que o trabalhador exerça
mais de uma função na empresa, substituindo colegas, por
exemplo, situações estas que também deverão ser descritas.

Descrição das condições ambientais de trabalho:


• Descrição dos riscos físicos, químicos, biológicos, ergonômicos,
de acidentes: fontes, intensidade, freqüência, medidas de proteção
coletiva e individual - adequação e eficácia

c. Organização do Trabalho:
• Tipo de trabalho: empregado público ou privado (tempo
indeterminado ou temporário), doméstico, conta-própria
(permanente ou eventual), terceirizado, tempo parcial, etc
• Salário/Renda (em múltiplos do salário mínimo)
• Jornada: horário diário e semanal, turnos, folgas, pausas, horas-
extras;
• Férias;
• Divisão do trabalho; forma em que o trabalho se organiza,
qualificação da tarefa exercida
• Grau de controle do trabalhador sobre o modo operatório e o ritmo
de trabalho;
• Mecanismos de controle: hierarquia, prêmios, promoções,
sanções, competitividade, outras formas de gestão;
• Absenteísmo, dispensa, rotatividade.

d. Atenção à Saúde e Dados Epidemiológicos:


• formas de acesso à assistência médica
• formas de acesso à informação sobre saúde, doença, riscos
ocupacionais e prevenção
• realização, conteúdo e resultado dos exames médicos
admissionais, periódicos, de retorno ao trabalho, de mudança de
função e demissionais.
• Informações sobre a situação de saúde dos colegas de trabalho,
ocorrência de queixas semelhantes às do paciente, rastreamentos
e/ou inquéritos epidemiológicos e ambientais realizados

e. Relação com o ambiente


• uso de recursos naturais
• geração de poluentes do solo, da água ou do ar: Tratamento e
destinação

6. Anamnese Especial (A.E.)


O levantamento da História Ocupacional permite ao profissional de
saúde identificar os riscos ocupacionais a que o paciente esteve
exposto, bem como o tempo de exposição a eles. O conhecimento
das patologias ocupacionais deve ser utilizado na coleta da
anamnese especial, dirigindo o Interrogatório sobre cada
sistema/aparelho para sinais e sintomas possíveis de ocorrer, face
ao perfil de riscos.

7. História Pregressa (H.P.)


• Valorizar o interrogatório dirigido às patologias e condições que
aumentam a susceptibilidade aos riscos ocupacionais detectados;
• Verificar se há relatos de Acidentes do Trabalho, notificados ou
não
• Verificar se há relatos de quadros clínicos mal esclarecidos à
época em que ocorreram e que poderiam estar relacionados a
patologias ocupacionais

8. História Familiar (H.F.)


• Estado de saúde dos familiares;
• Ocorrência de doenças heredo-familiares: tipo, evolução e grau de
parentesco com o paciente.

9. História Social
• Escolaridade;
• Habitação e meio-ambiente: saneamento; lixo; exposição da
família a contaminantes da água, solo e ar
• Participação social: grupos comunitários, grupos de trabalhadores,
sindicatos, associações, partidos, etc.

10. Exame Físico


• Ectoscopia;
• Dados vitais;
• Exame de cada aparelho.

11. Relação de Problemas


Listar os sinais/sintomas detectados em toda a anamnese e exame
físico, descrevendo suas características principais e agrupando-os
por sistema ou por síndrome, conforme o raciocínio clínico.

12. Relação de Riscos Ocupacionais


Listar os riscos ocupacionais detectados durante a Anamnese
Ocupacional, destacando os tempos de exposição a cada um deles e
sua possível interrelação (potenciação, sinergismo, etc.).

13. Hipóteses Diagnósticas (H.D.)


A partir do raciocínio clínico, tecer as hipóteses diagnósticas
adequadas aos problemas e riscos detectados e os diagnósticos
diferenciais cabíveis. Mesmo quando não existir quadro clínico
evidente, a exposição significativa a um risco ocupacional obriga à
suspeita e investigação da patologia correspondente.

14. Conduta
• Complementação de informações: estudo bibliográfico, visita ao
local de trabalho, consulta a fornecedores, etc.
• Propedêutica;
• Inter-consultas;
• Prescrições;
• Providências quanto à Previdência Social: emissão de atestados,
Comunicação de Acidente do Trabalho (CAT), encaminhamento à
Perícia de Acidente do Trabalho (PAT - INSS);
• Informação do trabalhador;
• Informação ao profissional que encaminhou o paciente ao Serviço
(contra-referência);
• Notificações Vigilância Epidemiológica e Sanitária, Sindicato;
• Discussão do caso.
ANEXO I
VISITA A LOCAIS DE TRABALHO
CHECK-LIST

0. Atividade prévia: estudo bibliográfico sobre o ramo de atividade e


entrevista com trabalhadores do local.

1. Identificação da empresa e da entidade sindical.

2. Aspectos históricos da organização da empresa e dos


trabalhadores.

3. Processo de produção: matérias-primas, meios de produção,


fluxograma, processos auxiliares e/ou paralelos, situações de
transtorno, subprodutos, produtos finais, resíduos.

4. Organização do Trabalho: Divisão do Trabalho. Controle de ritmo,


produtividade e modo operatório. Política gerencial, de cargos e
salários. Relações sociais na empresa. Jornada de trabalho
Rotatividade.

5. Instalações - Lay out.

6. Condições ambientais de trabalho: riscos físicos, químicos,


biológicos e de acidentes (natureza, dose, fonte, pontos
críticos).Medidas de proteção individual e coletiva (adequação,
manutenção, eficácia, uso efetivo).

7. Relação com o meio-ambiente. Poluentes do ar, água e solo,


formas de tratamento. Contaminação de vizinhos. Informações ao
consumidor. Embalagens. Transporte de cargas.

8. Observação de funções/postos de trabalho específicos.


Identificação dos trabalhadores. O que, com o que, como, quanto
fazem. Conteúdo da tarefa (qualificação, requisitos,
responsabilidade, repetitividade, monotonia, decisão, iniciativa).
Mecanismos de controle do ritmo de trabalho e do modo operatório.

9. Descrição das condições ambientais no posto de trabalho.

10. Percepção dos trabalhadores sobre o trabalho.]

11. Assistência Médica.

12. SESMT

13. CIPA

14. Dados Epidemiológicos.

15. Educação/Informação do trabalhador


16. Desdobramentos:
• Discussão da visita;
• Registro escrito da observação - elaboração do mapa de risco;
• Vigilância Sanitária;
• Vigilância Epidemiológica;
• Informação do(s) trabalhador(es).
ANEXO II

ANAMNESE CLINICO-OCUPACIONAL
CHECK-LIST

1. Identificação

2. Queixa principal

3. História da Moléstia Atual

4. História Ocupacional (Atividades Anteriores/Atividade Atual)


• Identificação da empresa/Sindicato de Trabalhadores;
• Processo de produção: matérias primas, meios de produção,
fluxograma, processos auxiliares, produto final, sub-produtos e
resíduos;
• Organização do Trabalho: contrato de trabalho, salário. Jornada
diária e semanal, pausas, horas extras e férias. Relacionamento
com colegas e chefias. Percepção do trabalhador do seu trabalho,
grau de satisfação/realização no trabalho. Divisão do trabalho.
Mecanismos de controle do ritmo, produtividade e modo
operatório. Política de cargos e salários.
• Instalações da empresa: área física, tipo de construção, ventilação
e iluminação dos ambientes. Banheiros, chuveiros, lavatórios,
bebedouros, vestiários, refeitórios, área de lazer, lay-out.
• Descrição da função/Posto de Trabalho: o que o trabalhador faz,
onde faz, como faz, com o que faz e quanto faz. Relação com
postos de trabalhos vizinhos;
• Descrição das condições ambientais de trabalho: área de trabalho,
suas condições de ventilação e iluminação, a presença de riscos
ocupacionais (físicos, químicos, biológicos, ergonômicos,
mecânicos). Medidas de proteção coletiva e individual: existência,
sua adequação e eficácia em relação aos riscos ocupacionais;
• Percepção do trabalhador sobre o seu trabalho;
• Atenção à saúde: assistência médica, exames médicos, atuação
do SESMT e da CIPA, dados epidemiológicos sobre a saúde dos
colegas de trabalho;
• Educação/Informação do Trabalhador;
• Relação empresa e meio-ambiente.

5. Anamnese Especial

6. História Pregressa

7. História Familiar

8. História Social

9. Exame Físico

10. Relação de Problemas

11. Listagem de Riscos Ocupacionais

12. Hipóteses Diagnósticas

13. Conduta:
• Complementação de informações: estudo bibliográfico, visita ao
local de trabalho, consulta a fornecedores, etc.
• Propedêutica;
• Inter-consultas;
• Prescrições;
• Providências quanto à Previdência Social: emissão de atestados,
Comunicação de Acidente do Trabalho (CAT), encaminhamento à
Perícia de Acidente do Trabalho (PAT - INSS);
• Informação do trabalhador;
• Informação ao profissional que encaminhou o paciente ao Serviço
(contra-referência);
• Notificações Vigilância Epidemiológica e Sanitária (CRT/INSS),
Sindicato;
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA

BRAVERMAN, Harry. Trabalho e capital monopolista. 3a. ed. Rio


de Janeiro: Zahar, 1981.

BREILH, Jaime. “Bases para el replanteamiento del método


epidemiológico”. Conferencia para el Curso Internacional de
Verano en Medicina Social - Universidade Autônoma
Metropolitana Xochimilco( mimeo).

DEJOURS, Cristophe. A Loucura do Trabalho. 2a. ed. São Paulo,


Cortez, 1987.
------------------. “Por um Novo Conceito de Saúde”. In Rev. Bras.
Saúde Ocupacional,14 (54), 1986 p.p. 7-11.

FACCHINI, L.A. “ Porque a Doença: a Inferência Causal e os Marcos


de Análise” e “Uma Contribuição da Epidemiologia: O Modelo da
Determinação Social” In RIGOTTO, R.; BUSCHINELLI, J. T..;
ROCHA, L. E. (Org.) Isto é Trabalho de Gente? Vida, Doença e
Trabalho no Brasil. São Paulo: Vozes, 1993.

INTERNACIONAL LABOUR OFFICE. Encyclophaedia of


Occupational Health and Safety. Genéve: ILO, 1983, 2v.

KOSIK, Karel. Dialética do Concreto. 2ª ed. Rio de Janeiro: Paz e


Terra, 1976.

LAURELL, Asa Cristina e NORIEGA, Mariano. Processo de


Produção e Saúde. São Paulo: HUCITEC, 1989.

MAFFESOLI, Michel. O conhecimento Comum. São Paulo:


Brasiliense, 1989.

MARX, Karl. “Manuscritos Econômico-Filosóficos” in FROMM, Erich.


Conceito Marxista do Homem. 8ª ed. São Paulo: Atlas, 1983.

MARX, Karl. Questionário de 1880 in THIOLLENT, M. J. M. Crítica


Metodológica, Investigação Social e Enquete Operária 5ª ed.
São Paulo: Pólis, 1987.
MINISTÉRIO DO TRABALHO. Portaria 3214/78 In ATLAS, Manuais
de Legislação. Segurança e Medicina do Trabalho 31ª ed. São
Paulo: Atlas, 1997.

ODDONE, Ivar, et al. Ambiente de Trabalho. São Paulo: Hucitec,


1986.

RIGOTTO, R. M. “Investigando a Relação entre Saúde e Trabalho” in


RIGOTTO, R. M.; BUSCEHINELLI, J.T.; ROCHA, L. E. (Org.) op.
cit.

THIOLLENT, M. J. M. “A Enquete Operária” in __________, op. cit.

SARTORELLI, Emílio. Tratatto di Medicina del Lavoro. Padova:


Piccini, 1981, 2v.

SELIGMAN, Edith. “Crise Econômica, Trabalho e Saúde Mental” in


ANGERAMI, V. A. (org.) Crise, Trabalho e Saúde Mental no
Brasil. São Paulo: Traço, 1986.

BERLINGUER, Giovanni. “O capital como fator patógeno”. In:


Medicina e Política. São Paulo: CETESB-Hucitec, 1983
A Anamnese Clínico-Ocupacional como Instrumento de
Investigação da Relação Saúde/Doença-Trabalho

1. Introdução

2. Conceito

3. A Anamnese Ocupacional na Anamnese Clínica

4. Objetivos

5. Abordando situações de trabalho

6. Roteiro de Execução

7. Sobre o diálogo profissional de saúde - paciente trabalhador

------
Conceito

A Anamnese Clínico-Ocupacional resulta da incorporação, na


Anamnese Clínica, de um conjunto de informações que visam
detectar e esclarecer os riscos a que está exposto o trabalhador em
sua vida laboral; as alterações de saúde, precoces ou manifestas,
que estão ocorrendo no seu corpo e avaliar as possíveis relações
entre o perfil de riscos e o perfil de saúde/doença do trabalhador.

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ANAMNESE OCUPACIONAL NA ANAMNESE CLÍNICA

IDENTIFICAÇÃO

HISTÓRIA DA MOLÉSTIA ATUAL

HISTÓRIA OCUPACIONAL
ANAMNESE ESPECIAL

HISTÓRIA PREGRESSA

HISTÓRIA FAMILIAR

HISTÓRIA SOCIAL

IDENTIFICAÇÃO DE RISCOS OCUPACIONAIS

RELAÇÃO DE PROBLEMAS

HIPÓTESES DIAGNÓSTICAS

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Objetivos

• Possibilitar o diagnóstico da patologia ocupacional


• Orientar o tratamento adequado;
• Possibilitar o acesso do paciente aos benefícios do Seguro de
Acidentes do Trabalho do INSS;
• Informar ao trabalhador sobre a gênese, evolução e prevenção de
sua patologia;
• Orientar o trabalhador, a empresa, e o INSS sobre as
possibilidades de retorno do paciente ao trabalho e sobre a
necessidade de Reabilitação Profissional;
• Acionar as ações de Vigilância relacionadas à melhoria das
condições sanitárias do ambiente gerador do caso; ao diagnóstico
precoce; à busca ativa de casos e ao traçado do perfil
epidemiológico da patologia ocupacional
• Reunir dados para produção científica, ampliando o conhecimento
sobre os agravos à saúde dos trabalhadores;
• Compreender e difundir informações sobre as relações entre o
trabalho e a saúde.

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Roteiro de Execução

1. Identificação do paciente:
Nome, data de nascimento, naturalidade, cor, estado civil,
procedência, origem do encaminhamento.

2. Identificação da empresa empregadora atual:


Razão Social, ramo de atividade, número de empregados, endereço,
telefone e pessoal para contato, médico do trabalho.

3. Queixa principal (Q.P.):


Relato espontâneo, pelo paciente, dos motivos que o trouxeram à
consulta e de como ele percebe o seu estado de saúde.

4. História da Moléstia Atual (H.M.A.):


Descrever detalhadamente as queixas referidas acima e a evolução
da doença, incluindo a propedêutica e terapêutica já realizadas e
seus resultados. Registrar ainda:
• há relação do quadro relatado com o afastamento ou retorno ao
trabalho?
• as providências já tomadas em relação à Previdência Social:
afastamentos, perícias, notificações, etc.

5. História Ocupacional:
Neste item interessa conhecer toda a trajetória ocupacional do
paciente, desde seu primeiro trabalho (formal ou não), destacando o
tempo que permaneceu em cada um.

Posteriormente, estas ocupações deverão ser descritas para obter


as informações discriminadas abaixo. A prática clínica orientará o
grau de detalhamento adequado e necessário em cada caso.

a. Descrição do Processo Produtivo:


• identificação da empresa/local de trabalho
• matérias primas, subprodutos e produtos finais;
• etapas do processo produtivo (fluxograma)

b. Descrição do Posto de Trabalho e da Função:


• O que faz: substâncias, objeto de trabalho;
• Com o que faz: instrumentos e equipamentos de trabalho;
• Como faz: operações realizadas, posturas adotadas, grupos
músculo-tendinosos e movimentos demandados pela tarefa;
• Quanto faz: ritmo de trabalho, produtividade;
• Onde faz: Instalações da empresa, Lay-out do posto de trabalho e
suas interrelações com outras áreas vizinhas;
• Em que condições faz: Descrição das condições ambientais de
trabalho: riscos físicos, químicos, biológicos, ergonômicos, de
acidentes. Medidas preventivas: adequação e eficácia.

Obs.: Atente-se para a possibilidade de que o trabalhador exerça


mais de uma função na empresa, substituindo colegas, por exemplo,
situações estas que também deverão ser descritas.

c. Organização do Trabalho:
• Jornada: horário diário e semanal, turnos, folgas, pausas, horas-
extras;
• Férias;
• Grau de controle do trabalhador sobre o modo operatório e o ritmo
de trabalho;
• Qualificação da tarefa, divisão do trabalho;
• Mecanismos de controle: hierarquia, prêmios, promoções,
sanções, estímulo a disputas pessoais, outras formas de gestão;
• Absenteísmo, dispensa, rotatividade.
• Contrato de Trabalho, salário (em múltiplos do salário mínimo).

d. Atenção à Saúde e Dados Epidemiológicos:


• formas de acesso à assistência médica
• formas de acesso à informação sobre saúde, doença, riscos
ocupacionais e prevenção
• realização, conteúdo e resultado dos exames médicos
admissionais, periódicos, de retorno ao trabalho, de mudança de
função e demissionais.
• Informações sobre a situação de saúde dos colegas de trabalho,
ocorrência de queixas semelhantes às do paciente, rastreamentos
e/ou inquéritos epidemiológicos e ambientais realizados
• atuação da CIPA

e. Relação do processo produtivo com o ambiente


• uso de recursos naturais
• geração de poluentes do solo, da água ou do ar: tratamento e
destinação

6. Anamnese Especial (A.E.)


O levantamento da História Ocupacional permite ao profissional de
saúde identificar os riscos ocupacionais a que o paciente esteve
exposto, bem como o tempo de exposição a eles. O conhecimento
das patologias ocupacionais deve ser utilizado na coleta da
anamnese especial, dirigindo o Interrogatório sobre cada
sistema/aparelho para sinais e sintomas possíveis de ocorrer, face
ao perfil de riscos.

7. História Pregressa (H.P.)


• Valorizar o interrogatório dirigido às patologias e condições que
aumentam a susceptibilidade aos riscos ocupacionais detectados;
• Verificar se há relatos de Acidentes do Trabalho, notificados ou
não
• Verificar se há relatos de quadros clínicos mal esclarecidos à
época em que ocorreram e que poderiam estar relacionados a
patologias ocupacionais

8. História Familiar (H.F.)


• Estado de saúde dos familiares;
• Ocorrência de doenças heredo-familiares: tipo, evolução e grau de
parentesco com o paciente.

9. História Social
• Escolaridade;
• Habitação e meio-ambiente: saneamento; lixo; poluição de água,
solo e ar
• Participação social: grupos comunitários, grupos de trabalhadores,
sindicatos, associações, partidos, etc.
10. Exame Físico
• Ectoscopia;
• Dados vitais;
• Exame de cada aparelho.

11. Relação de Problemas


Listar os sinais/sintomas detectados em toda a anamnese e exame
físico, descrevendo suas características principais e agrupando-os
por sistema ou por síndrome, conforme o raciocínio clínico.

12. Relação de Riscos Ocupacionais


Listar os riscos ocupacionais detectados durante a Anamnese
Ocupacional, destacando os tempos de exposição a cada um deles e
sua possível interrelação (potenciação, sinergismo, etc.).

13. Hipóteses Diagnósticas (H.D.)


A partir do raciocínio clínico, tecer as hipóteses diagnósticas
adequadas aos problemas e riscos detectados e os diagnósticos
diferenciais cabíveis. Mesmo quando não existir quadro clínico
evidente, a exposição significativa a um risco ocupacional obriga à
suspeita e investigação da patologia correspondente.
---------

Sobre o diálogo profissional de saúde - paciente trabalhador:


• o contato entre dois mundos distintos e pouco conhecidos
• o saber, a linguagem e os sentimentos dos trabalhadores
• o vasto universo do desconhecido na patologia ocupacional
• o caráter pedagógico do diálogo

--------

Identificação de agravos à Saúde dos trabalhadores: Condutas

1. Complementação de informações:
• estudo bibliográfico
• visita ao local de trabalho
• consulta a fornecedores, etc.
2. Propedêutica
• Análises Toxicológicas
• Patch - test
• Radiologia
• Audiometria
• Outros

3. Inter-consultas

4. Prescrições

5. Providências quanto à Previdência Social:


• emissão de atestado
• Comunicação de Acidente do Trabalho (CAT)
• encaminhamento à Perícia (de Acidente do Trabalho) do INSS
- o laudo médico
- os benefícios

6. Notificações:
• Vigilância em Saúde (SUS)
• Delegacia Regional do Trabalho/MTb

7. Informação:
• ao sindicato de trabalhadores
• à empresa
• ao profissional que encaminhou o paciente ao Serviço: contra-
referência

8. A Informação ao trabalhador

-----

Lei 8.213, de 24 de julho de 1991


Regulamentada pelo Decreto 2.172, de 05.03.97

Art. 60. & 3º - Durante os primeiros quinze dias consecutivos ao do


afastamento da atividade por motivo de doença, incumbirá à
empresa pagar ao segurado empregado o seu salário integral ou, ao
segurado empresário, a sua remuneração.
------
Art. 22. A empresa deverá comunicar o acidente do trabalho à
Previdência Social até o primeiro dia útil seguinte ao da ocorrência e,
em caso de morte, de imediato, à autoridade competente, sob pena
de multa variável entre o limite mínimo e o máximo do salário-de-
contribuição, sucessivamente aumentada nas reincidências, aplicada
e cobrada pela Previdência Social.

&1º Da comunicação a que se refere este artigo receberão cópia fiel


o acidentado ou seus dependentes, bem como o sindicato a que
corresponda sua categoria.

&2º Na falta de comunicação por parte da empresa, podem


formalizá-la o próprio acidentado, seus dependentes, a entidade
sindical competente, o médico que o assistiu ou qualquer autoridade
pública, não prevalecendo nestes casos o previsto neste artigo.

&3º A comunicação a que se refere o &2º não exime a empresa de


responsabilidade pela falta do cumprimento do disposto neste artigo.

&4º Os sindicatos e entidades representativas de classe poderão


acompanhar a cobrança, pela Previdência Social, das multas
previstas neste artigo.

Art. 23. Considera-se como dia do acidente, no caso de doença


profissional ou do trabalho, a data do início da incapacidade
laborativa para o exercício da atividade habitual, ou o dia da
segregação compulsória, ou o dia em que for realizado o
diagnóstico, valendo para este efeito o que ocorrer primeiro.

------

Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo


cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido nesta lei,
ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade
habitual por mais de quinze dias consecutivos.
Art. 61. O auxílio doença, inclusive o decorrente de acidente do
trabalho, consistirá numa renda mensal correspondente a 91% do
salário-de-benefício.
--------

Art.62. O segurado em gozo de auxílio-doença, insusceptível de


recuperação para sua atividade habitual, deverá submeter-se a
processo de reabilitação profissional para o exercício de outra
atividade. Não cessará o benefício até que seja dado como
habilitado para o desempenho de nova atividade que lhe garanta a
subsistência ou, quando considerado não-recuperável, for
aposentado por invalidez.
---------

Art. 42. A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando


for o caso, a carência exigida, será devida ao segurado que, estando
ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e
insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe
garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta
situação.

Art. 44. A aposentadoria por invalidez, inclusive a decorrente de


acidente do trabalho, consistirá numa renda mensal correspondente
a 100% do salário de benefício.

Art. 45. O valor da aposentadoria por invalidez do segurado que


necessitar de assistência permanente de outra pessoa será
acrescido de 25%.
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Art. 86. O auxílio-acidente será concedido, como indenização, ao


segurado quando, após consolidação das lesões decorrentes de
acidente de qualquer natureza, resultar seqüelas que impliquem
redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia.

&1º O auxílio-acidente mensal e vitalício corresponderá a 50% do


salário-de-benefício de segurado.
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Art. 93. A empresa com 100 ou mais empregados está obrigada a
preencher de 2% a 5% dos seus cargos com beneficiários
reabilitados ou pessoas portadoras de deficiência, habilitadas, na
seguinte proporção:
I - até 200 empregados: 2&
II - de 201 a 500: 3%
III - de 501 a 1000: 4%
IV - de 1001 em diante: 5%
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Art. 118. O segurado que sofreu acidente do trabalho tem garantida,


pelo prazo mínimo de doze meses, a manutenção do seu contrato
de trabalho na empresa, após a cessação do auxílio-doença
acidentário, independentemente da percepção de auxílio-acidente.

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