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Galeras, Paqueras & Doces Vinganças - Cathy Hopkins

Contra-capa:

“Eu me pergunto o que teria acontecido se eu tivesse encontrado você antes


de conhecer Paola”, disse Luke quando pegou minha mão e olhou fundo
nos meus olhos. Uma faísca de eletricidade percorreu meu corpo e eu puxei
a mão de volta, como se tivesse me queimado. ‘Isso não pode estar
acontecendo’, eu pensei.”

...

Quando Luke, o garoto que Paola estava namorando, declara um amor


ardente por TJ, ela não sabe o que a atingiu. Ela faz o máximo para evita-
lo, mas, quando se pede às escolas locais para trabalharem juntos num
projeto, Luke é escolhido como coordenador-geral, e TJ não tem opção se
não se reportar a ele regularmente. Enganos e problemas de comunicação
ameaçam a amizade das garotas e as dividem em dois grupos. Lucy e
Paola. Izzie e TJ. Será que o relacionamento delas irá sobreviver a isso? E
o que irá o namorado firme de TJ, Steve, pensar disso tudo?
Capítulo 1
Sua Anta !

— Você entra, TJ — disse Lucy, olhando para a Benwood House. — Vou


passear com os cachorros.
Caí no riso. A Lucy é pequeninha, não tem nem um metro e meio de altura.
O mais provável é os cachorros a levarem para passear do que o contrário.
— Até parece - eu disse. — Já dá até para ver a manchete. Você viu essa
garota? Loira, baixinha...
— Mignon — interrompeu Lucy.
— Desculpe, está certo, mignon. Vista pela última vez m Hampstead
Heath, sendo arrastada por três animais selvagens.
Izzie, Lucy, Paola e eu estávamos paradas tremendo de frio em frente à
entrada da Kenwood House, em Hampstead Heath, na manhã de sábado.
Ben, Jerry e Mojo estavam conosco. Ben e Jerry são os labradores da
família da Lucy, e Mojo é meu cachorro (da raça..., bem..., alguma mistura,
mas ele é bem bonitinho, preto, com uma pinta branca num olho, e é meu
melhor amigo... claro, isso sem contar Hannah, Lucy, Izzie e Paola).
— É — disse Paola, colocando uns fios de seu cabelo escuro para dentro do
gorro que ela abaixara a fim de cobrir as orelhas. — Aliás, o que estamos
fazendo aqui nessa chuva de novembro, quando poderíamos estar num
café, como pessoas normais, curtindo o aquecedor e bebendo grandes
canecas de chocolate quente?
— Se você está com frio, entre e dê uma olhada com aTJ - disse Izzie. —
Vou ficar com você, Lucy. Eu já estive aí dentro. É muito chato. Cómodos
velhos e escuros, cheios de quadros com pessoas carrancudas, com caras
feias olhando para você. Parece que eles estão chupando limão.
— Eu também já entrei - disse Paola. — Muitas vezes. E tem aqueles
quadros sem graça, alguns são do Rembrandt, Gainsborough, Reynolds,
tem até um do Turner. Acho que é uma construção antiga magnífica.
Izzie olhou para a casa branca e fez uma careta.
— Na minha opinião, parece um bolo de casamento gigante. Não faz meu
estilo mesmo.
— E neoclássico — eu disse.
Paola olhou para mim, surpresa.
— Nossa! Como você sabe essas coisas? — ela perguntou.
— Não sei — eu disse, encolhendo os ombros. — Acho que li em algum
lugar.
— Bem, você deve ler bastante — disse Paola. — Você sempre parece
saber tudo. Inteligente e bonita. Não é justo.
— Eu não sou bonita.
— Sim, você é - disse Lucy. — Você se lembra de quando aquele
jornalista, Sam Denham, visitou nossa escola, estávamos na sétima série, e
a chamou de Lara Croft? Não são muitas as pessoas que podem reivindicar
serem parecidas com a Angelina Jolie. O problema é que você não tem
confiança na sua aparência.
— É — disse Paola —, você poderia ser uma daquelas garotas de óculos do
cinema, sem maquiagem, que usam o cabelo preso atrás e trabalham num
laboratório científico ou algo do gênero. Aí ela encontra o herói, solta o
cabelo, tira os óculos e mostra que, na verdade, ela é uma gata.
— E o herói se apaixona por ela, dizendo: "Oh, senhorita Watts! Você é
liiiiiinda! — disse Izzie, rindo.
— Parem com isso — eu disse. Eu estava ficando constrangida, embora
fosse legal ser comparada a Angelina Jolie.
— Mas é impressionante — falou Lucy. — Como Paola disse, você parece
saber de várias coisas que nós não sabemos.
— Só o que eu considero interessante. Quero dizer, vocês não acham
incrível que haja quadros de todos esses artistas famosos pertinho de nossas
casas? Tipo, dez minutos de onde moramos. Algumas pessoas pagam uma
fortuna para ir a Veneza, Amsterdã, Florença e Paris para ver os grandes
mestres, e nós só temos que descer a rua. Isso não é fantástico?
Izzie fez um olhar de tédio.
— Não — ela disse.
— Tem um do Vermeer chamado A Guitarrista. Achei que você ia gostar
desse, Izzie, já que está envolvida com música. Ela exibe um olhar de
prazer. Não é como os outros quadros da época, nos quais, você tem razão,
as expressões são carrancudas. É como se ela tivesse sido a primeira de
diversos adolescentes a ganhar um violão e você vê como isso nunca muda
com o tempo. Mesmo naquela época...
— Que seja. E daí que ela ganhou um violão? Aposto que ela ainda assim é
muito feia. Todas essas pessoas em quadros antigos são — disse Izzie,
dando uma apertada brincalhona no meu braço. — Entrei aí há alguns anos
com a minha mãe. Não é uma experiência que eu gostaria de repetir. Não.
Vasculhar casas antigas não é mesmo a minha praia.
— Eu adoro vasculhar lugares antigos — eu disse. — Sentir a história,
imaginar como era antigamente, quem morava lá, o que eles usavam...
— Você é estranha, TJ Watts — disse Izzie.
Eu fiz minha careta mais estranha (olhos envesgados, com uma boca de
bêbado).
— Mas não se esqueça que também é um lugar muito utilizado em filmes.
Você tem que admitir que isso é bem legal.
— Quais filmes? - perguntou Paola.
— Palácio das Ilusões. Algumas partes foram filmadas aqui e... E também
Um Lugar Chamado Notting Hill. Você se lembra quando, perto do fim, o
Hugh Grant vai visitar a Julia Roberts e a personagem dela está atuando
num drama histórico? Aquela cena foi filmada aqui. Dá para ver a casa no
fundo.
— Não deixa de ser um lugar velho e chato — disse Izzie. — Mas se faz
você feliz...
Eu virei os olhos.
— Ah, ter pessoas tão sem cultura como amigas. Não sei se agüento.
— Bem, pelo menos você não tem que andar com uma nerd como nós
temos — suspirou Izzie.
— Neandertal — eu disse.
— CDF.
— Cabeça-de-vento.
— Espertinha.
— Ignorante.
— Anta.
— Anta?
— É — disse Izzie, com um sorriso largo. — Anta neoclássica.
Dessa vez, foi Lucy que virou os olhos.
— Pelo amor de Deus. Estou congelando. Quando vocês duas terminarem
de se criticar mutuamente, poderiam decidir o que vão fazer?
— E, sinceramente, se alguém aqui é cabeça-de-vento, se alguém sou eu —
disse Paola. — Izzie, você é tão devoradora de livros quanto a TJ, e não
finja ser o contrário. TJ, eu vou entrar e olhar com você. Faz parte do Jeu
programa de educação.
Paola passara recentemente por essa fase quando içou preocupada achando
que todas nós pensávamos que ela era vazia. Aí ela começou a sair com um
garoto chamado Luke e ficou paranóica que ele talvez não a achasse
brilhante. Até parece. Ela é muito inteligente, só não gosta muito de ler por
vontade própria. Ela é a verdadeira garota-diversão. Diversão, para ela,
significa "garotos" e, bem... Mais garotos. Algumas semanas atrás, ela
declarou que vai aprender "tudo". Eu não ligaria para isso se tivesse a
aparência dela. Mesmo usando aparelho, ela ainda está linda, e os garotos
caem a seus pés, seja qual for o seu QI.
Olhei para minhas amigas. Lucy estava batendo os dentes. Izzie estava com
o nariz vermelho de frio. O cabelo escuro pendendo na forma de tranças
molhadas que lhe caíam pelo rosto e a roupa preta da cabeça aos pés a
tornavam mais gótica do que nunca. Só Paola não parecia estar congelando,
mas talvez fosse porque ela é meio jamaicana, meio italiana, sua pele cor
de caramelo não fica branca como a nossa nesse inverno rigoroso.
Enquanto Paola e eu entrávamos na casa, Lucy e Izzie foram arrastadas
pelos cachorros na direção do café.
Quando entramos, Paola ficou olhando para o lugar à direita do hall de
entrada.
— Só uma olhadinha — ela disse, indo direto para a loja de presentes, onde
passou 15 minutos cheirando todos os géis de banho à venda e provando
todos os brilhos labiais. Por fim, optou pelo de cereja.
— Não precisamos dar uma volta pela casa — ela disse, entregando o
dinheiro à moça do balcão. — Há uma série de livros aqui que falam sobre
o lugar e têm fotos das dependências. Podemos dar uma folheada rápida
neles e teremos visto tudo que há aqui sem penarmos caminhando pela
casa.
"Eu desisto", pensei. Eu queria ir de cômodo em cômodo, sentar, olhar os
quadros e penetrar na atmosfera. Acho que não terei muita chance de fazer
isso com a Paola.
— Está bem: uma folheada rápida nos livros e nos juntamos às outras —
concordei
— Legal — disse Paola.
Foi aí que ela viu o livro de visitantes e começou a escrever. Fui assinar
depois dela e li o que tinha escrito.
"A Rainha Vitória esteve aqui com seu marido. Nós não nos divertimos."
"Se não pode vencê-los, junte-se a eles", pensei, escrevendo: "Kenwood é
demais. Animal!, assinado Mick Jagger", embaixo do que Paola escreveu.

Kenwood House é uma elegante casa neoclássica do século XVIII em


Hampstead Heath, North London.
A coleção de arte inclui trabalhos de Rembrandt, Vermeer, Turner,
Reynolds, Gainsborough, Van Dyck e Frans Hals.
Os filmes em que foi usada como cenário incluem Palácio das Ilusões e
Um Lugar Chamado Notting Hill.

Capítulo 2
O paraíso dos cachorros

Heath é o paraíso dos cachorros. Quilômetros e quilômetros de terreno


arborizado para eles correrem enquanto seus donos se espalham sobre os
bancos e os observam gastar sua energia interminável. Tinha parado de
chover, então soltamos Ben, Jerry e Mojo de suas coleiras e eles foram logo
para longe, abanando o rabo, com a língua para fora e sorrisos estampados
na cara quando cumprimentavam outros cachorros e seus donos.
— Finja que eles não estão conosco — disse Lucy, quando Ben
entusiasmadamente cheirou o traseiro de um poodle, que pareceu surpreso.
Quando sentamos, contemplando a colina que dava num lago no final do
campo, a conversa mudou para um dos nossos assuntos preferidos. Garotos.
Embora tenhamos interesses diferentes — Izzie pelas coisas New Age dela,
Lucy pela moda, Paola pelo teatro e eu pelos livros e por escrever —,
temos uma coisa em comum: o assunto de garotos e relacionamentos.
— Luke vai me levar para ver um filme estranho de arte hoje à noite - disse
Paola. — Acho que se chama Os Sete Samurais. Deve ser um clássico.
— E é. Você vai adorar — eu disse. — Depois, foi refilmado com o nome
Sete Homens e um Destino, sabe, o filme de caubóis?
Paola olhou para mim, perplexa.
— Está vendo? Aí vai você de novo. Mais uma coisa da qual você parece
saber tudo e eu nunca ouvi falar. E, sendo meu pai um diretor de filmes, se
alguém tivesse que saber sobre filmes aqui, este alguém seria eu. Você é
incrível, TJ. Como você sabe essas coisas?
Encolhi os ombros.
— Meu irmão, Paul, passou por uma fase em que gostava de todos esses
filmes antigos. Ele não parava de falar deles. Mas não sei um monte de
coisas. Sério. Não sou uma sabe-tudo ou algo do tipo.
Lucy colocou a mão no meu braço.
— Nós não achamos que você é - ela disse.
— Não, só uma... — começou Izzie.
— Anta neoclássica — Lucy completou para ela.
— Mas, ei, TJ — disse Paola. — Você não devia esconder que sabe um
monte de coisas ou se desculpar por isso. Eu teria orgulho disso, se fosse
você.
Abri um sorriso tímido. Eu só ando com a Paola, a Izzie e a Lucy desde
junho. Elas me adotaram depois que minha melhor amiga, Hannah, foi
morar na África do Sul, me deixando aqui sozinha. Elas têm sido ótimas
amigas e eu realmente quero ficar sintonizada com elas. Não quero que
achem que estou me mostrando ou algo tio gênero, tipo, tentando provar
que sei mais do que elas. Eu tenho um tio assim. Sempre que alguém
menciona um assunto — política, religião, livros, o que seja —, ele tem de
deixar claro a todos que é mais informado que nós, geralmente nos dando
uma aula de dez minutos. Ele é muito chato, tipo, a opinião dele é a que
realmente importa, e temos que nos sentir honrados com o fato de ele
dedicar tempo para nos atualizar.
— Quando sua irmã vai se casar, TJ? — perguntou Lucy.
— Na véspera do Natal — respondi.
— Que romântico.
— Não. É a única noite em que Marie consegue tirar folga no hospital onde
trabalha — eu disse.
— Eu adoraria desenhar um vestido de casamento — continuou Lucy. —
Sempre imaginei um de veludo branco com uma capa longa — Lucy quer
ser estilista. Ela tem um ótimo olho para moda e fez umas roupas
fantásticas. É pena que não esteja fazendo o vestido da minha irmã. Marie
não é nada romântica. É totalmente desinteressada e nem sequer foi a uma
prova de vestido ainda.
— Oh, eu vou sair e comprar qualquer coisa velha quando o dia estiver
mais próximo — ela disse na última vez que veio de Devon, onde começou
um novo emprego para ficar perto do noivo, Stuart. — Não estou nem um
pouco a fim de comprar um vestido branco. Qual é o sentido de gastar uma
fortuna num pedaço de tecido que você só vai usar num dia?
— Você não vai sair e comprar uma coisa velha — disse mamãe. — É o
seu grande dia e você vai ficar maravilhosa, quer queira, quer não.
Na hora, eu ri, pensando de quem seria o grande dia: se de mamãe ou de
Marie. De qualquer forma, vamos todos para o Sul no próximo final de
semana para, como mamãe disse, "falar sobre vestidos de casamento".
— Elas ainda estão discutindo se vai ser numa igreja ou num cartório? —
perguntou Izzie.
Eu fiz uma careta. Havia já muitas semanas que elas discutiam.
— É, e nada foi decidido ainda. Marie é a favor do cartório, mas ela quer
nos mostrar um lugar que arranjou para a recepção. Mamãe e papai querem
que ela se case numa igreja. E Paul acha que ela não devia ter falado a
ninguém sobre o casamento, que devia ter pego um vôo para o Havaí e
casado em segredo numa praia, descalça, sob as estrelas, com um hippie de
meia-idade conduzindo uma cerimônia que eles mesmos tivessem bolado.
— Parece fantástico — disse Izzie. — Seu irmão teve a idéia certa.
— Li sobre um casal que se casou sob o mar, usando trajes de mergulho —
disse Paola.
— Eles tinham um golfinho conduzindo a cerimônia, em vez do padre? —
perguntei.
— Ou uma baleia? — perguntou Lucy.
— Não vá parar de tomar seus remédios, Lucy — disse Izzie.
— Hoje em dia, é possível fazer qualquer coisa - disse Paola. — Inclusive
se casar pulando de bungee jumping, se você quiser.
— Não, obrigada — eu disse. — Acho que dar o salto para o casamento já
seria assustador o suficiente, deixa para lá essa idéia de, ainda por cima,
pular de uma ponte. De qualquer forma, nós vamos para o Sul discutir isso
no final de semana.
— É um compromisso grande — disse Paola. — Dizer “sim” para uma
pessoa pelo resto da vida. Tipo, você sabe se ele é realmente o primeiro e
único verdadeiro amor da sua vida?
— Ou o trigésimo primeiro? — disse Izzie. — No seu caso, com a rapidez
com que você passa pelos garotos, é provavelmente esse o número em que
estará quando chegar à idade da Marie. Ela tem vinte e seis, não é, TJ?
Eu confirmei.
Paola beliscou o braço de Izzie.
— Engraçadinha. Eu não tive muitos namorados.
— Mais do que nós — disse Lucy.
— Mas não eram namoros sérios — disse Paola. — Diferente do Luke.
— E o Simon? — perguntou Izzie.
— Com o Simon era normal, mas com o Luke é diferente. Nós estamos
mesmo apaixonados.
— Como você sabe disso? — perguntou Izzie. — Como sabe quando é
realmente amor? Quero dizer, você quer casar com ele?
— Dá um tempo — disse Paola, rindo. — Eu só tenho quinze anos. E você
não quer casar com todos que ama.
— Em algumas culturas, as garotas se casam ou escolhem um parceiro
quanto têm doze anos... — comecei e logo depois, já estava arrependida.
— É, você está certa: em algumas culturas, as garotas se comprometem
muito novas — disse Paola.
— Mas você não respondeu à minha pergunta — Izzie insistiu. — Como
sabe quando está realmente apaixonada, que ele é o cara certo? O que você
acha, TJ?
— Ah, Deus. Não sei. Pergunte quando eu for mais velha. Quando eu tiver
um pouco mais de experiência. Só namorei direito uma vez.
Eu estou namorando o irmão da Lucy, o Steve, há três meses e, embora
goste dele, não posso dizer de forma alguma que estou apaixonada. Apenas
gostamos de sair juntos. De nos divertir. Lucy estava olhando para mim,
curiosa. "Oh, por favor, não pergunte o que estou pensando que você vai
perguntar", pensei.
— Então. Você ama Steve? — perguntou Paola, antes de Lucy abrir a boca.
— É... Nós nos damos bem e...
Acho que Lucy percebeu meu desconforto.
— Não a deixe constrangida — ela disse.
— Está bem; você então. Você ama Tony? — perguntou Paola.
Lucy ficou vermelha. Tony é o irmão mais velho da Paola e, ultimamente,
ele e Lucy têm se visto bastante, ainda que os dois insistam que se trata de
algo sem compromisso.
— Não sei — ela disse. — Eu... Gosto dele mais do que de qualquer outro
garoto com quem estive. E, como vocês todas já sabem, não existiram
muitos. Hummm. Dois, na verdade. Então, é difícil dizer. Gosto muito dele,
mas sempre imaginei que, quando se trata de amor verdadeiro, você sente
de verdade. Os dois sentem. Não é como essa coisa entre mim e Tony.
Nenhum de nós consegue decidir o que quer.
— Ah, eu acho que Tony sabe exatamente o que ele quer — disse Paola.
— O que é...? — perguntou Lucy.
— Arrastar você para a horizontal.
— O quêêêê — perguntou Lucy.
— Você sabe: sexo.
Lucy ficou muito vermelha.
— Você deve estar certa — ela disse, com um suspiro. Mas tenho certeza
de que se eu... Bem... Se eu fosse para a horizontal, ele perderia o interesse
na hora.
— Não necessariamente — disse Paola.
— Ah, perderia, sim. De qualquer forma, não estou pronta. Não quero ser
pressionada. Quero fazer quando for o momento certo. Já foi suficiente me
preocupar se sou ou não uma boa beijadora. Não quero ficar me
preocupando se sou boa no sexo também.
— Eu acredito em almas gêmeas — disse Izzie. — Que, em algum lugar do
planeta, existe alguém perfeito e, se conhecê-lo, o sexo e todo o resto será
perfeito e você não terá com que se preocupar.
— Em algum lugar do planeta? — perguntei. — E se a sua alma gêmea
viver na Mongólia e vocês nunca se encontrarem?
— Também acredito em almas gêmeas — disse Lucy —, e, se ele morar
em algum lugar distante, o destino irá juntar os dois, num aeroporto ou em
outro lugar, como ímãs se atraindo irresistivelmente. Você estará quase
entrando no seu avião para Paris e ele estará descendo a escada rolante às
pressas e seus olhos vão se encontrar...
— E ele vai tropeçar e cair sobre a mala de alguém — Izzie —, bater a
cabeça, e, quando acordar, você estará parada perto dele...
— Com um coral de anjos celestes cantando Aleluia — acrescentei, rindo.
— Ah, caiam na real. Vocês têm assistido a muitos filmes água-com-
açúcar.
— Bem, talvez não dessa forma — disse Lucy. — Mas acho que se você
encontrasse sua alma gêmea, haveria algum tipo de reconhecimento mútuo.
Estariam na mesma sintonia e saberiam o que o outro estava pensando sem
precisar dizer nada.
— Talvez — disse Paola —, mas quem disse que você só tem uma alma
gêmea? Você pode ter várias.
— Vá sonhando — disse Lucy. — Eu li que almas gêmeas ficaram juntas
durante diversas encarnações. Então acho que Izzie está certa: que haveria
uma identificação mútua. Seria como reencontrar um amigo que não se vê
há muito tempo e haveria algo familiar entre os dois, pois, na verdade,
conviveram juntos durante muito tempo.
— Nossa, espero que não — disse Paola. — Parece horrível. Quero dizer,
casar com uma pessoa já soa mal o suficiente, mas toda uma eternidade
com o mesmo cara... Você teria que amá-lo demais. E a diversão? Desista
de achar o Sr. Ideal. Vou me acomodar com o Sr. Ideal do Momento.
— Se tiver que ser — disse Izzie —, será.
Paola fez uma cara de dúvida.
— Hummm. Seria preciso acreditar em reencarnação, e não sei se acredito.
A única forma de saber é morrer e descobrir. Aí dá para saber com certeza.
É o mesmo com as almas gêmeas: se eu encontrar uma, falo para vocês.
— Concordo — eu disse. — Acho que a noção de alma gêmea é só uma
forma romântica de dizer que existem garotos com os quais você se
identifica mais ou de quem gosta mais do que de outros. Fim de papo.
— Bem, espero que você encontre a sua alma gêmea nesta vida — disse
Izzie — para provar o contrário.
— Até parece — respondi com um sorriso.
Mas ninguém respondeu à pergunta da Izzie — disse LUCY. Como você
sabe se está realmente apaixonada?
— Você não consegue dormir. Não consegue comer. É como um vírus,
como ficar louca — disse Izzie. — É por isso que gosto de ficar celibatária.
É legal. Pacífico. Sem ter que me preocupar se ele vai telefonar, se meu
bumbum é grande demais e toda essa história.
Eu caí no riso.
— Como você pode ser celibatária se ainda não transou?
— Simples. Celibatário significa uma pessoa que não é casada ou alguém
que não está tendo relações sexuais — disse Izzie. — Então, tenho sido
celibatária há quinze anos. Mas voltando ao amor, reconheço que mexe
com a cabeça. Todas aquelas ótimas músicas românticas dizem isso. É
como ter uma coceira que você não consegue coçar. O vírus do amor. Ficar
com febre etc. etc. Não contem comigo.
Lucy balançou a cabeça.
— Mas é uma coceira gostosa.
— É — concordou Paola. — Tipo, você não consegue parar de pensar nele.
Mal pode esperar para estar com ele. O tempo passa devagar quando estão
separados e passa depressa quando estão juntos. É assim com Luke.
— Você é daquelas velhas românticas, Paola — provoquei. Estava
torcendo para ninguém me perguntar de novo se eu estava apaixonada pelo
Steve. Quero dizer, eu lealmente gostava dele, mas não pensava nele a todo
instante.
— Acho que você sente que é amor porque sente tudo formigando quando
está com ele — disse Lucy. — Como se estivesse realmente viva,
energizada.
— Você tem essa mesma sensação quando bebe algo da loja de comida
natural — disse Izzie. — Experimente uma bebida com ginseng.
Eu ri.
— Então, quem precisa de amor?
— Acho que se você encontrar O Cara, será capaz de ser a mais autêntica
possível — disse Lucy. — Conversar com ele vai ser bom, fácil. Você vai
ser capaz de ser você mesma sem precisar fingir nem sentir que precisa
impressioná-lo.
— Isso parece legal — eu disse. — Então acho que o Mojo deve ser O
Cara, porque é exatamente assim que me sinto com ele. Posso conversar
com ele sobre qualquer coisa e ele sempre parece estar interessado.
— Eu falei que você era estranha — disse Izzie. — Mas, falando sério, essa
pessoa ideal. Ela seria como você, com muitas coisas em comum? Ou seria
um caso de opostos que se atraem?
— Talvez seja só química — eu disse, enquanto via Mojo perseguir um
collie e dar aquele "oi" de cachorro, cheirando a traseira do outro. —
Feromônios. Puramente animal. Como os cachorros. Você gosta do cheiro
deles.
Paola riu ao ver os cachorros.
— Imaginem se fizéssemos isso! Seria hilário. De jeito nenhum vou sair
por aí cheirando traseiros. Não é muito romântico! Deve haver um jeito
mais digno de saber se ele é O Cara.
— Acho que todas nós saberemos se é amor quando a hora chegar - eu
disse.
— É — disse Izzie. — Tipo quando é quente ou frio. Você simplesmente
sabe.
— E, enquanto isso, podemos nos divertir ao longo do caminho - disse
Paola.
Por volta da hora do almoço, reunimos os cachorros e amarramos suas
coleiras ao banco. Fiquei tomando conta deles, para garantir que não
arrastassem o banco morro abaixo, enquanto as meninas iam ao banheiro.
— E aí, como foi? — perguntei ao Mojo, que estava sentando nos meus
pés, olhando para mim adoravelmente. — Você fez novos amigos?
— Primeiro sinal de loucura: falar sozinha — disse uma voz masculina à
minha direita.
Olhei e vi o namorado da Paola sorrindo para mim.
— É... hihi... Eu estava falando com o meu cachorro – disse.
— Ah. Ele fala sua língua, não é?
Eu ri.
— Você sabe que isso nunca passou pela minha cabeça? Talvez eu devesse
tentar francês?
— Ou italiano — acrescentou Luke, rindo, e se inclinando para dizer
alguma coisa para Mojo em italiano. Mojo pulou, pôs as patas sobre os
ombros de Luke e lambeu seu rosto com grande entusiasmo.
— Meu Deus — eu disse. — Acho que você deve estar certo. Mojo é
italiano com certeza. Oh, não. Agora eu vou ter que aprender a falar
italiano.
Luke riu de novo.
— Paola está com você? Ela ligou no meu celular e pediu que a
encontrasse aqui.
Fiz um sinal com o polegar, apontando para o banheiro feminino.
— Ela já volta.
Luke sentou e virou paia olhar para a casa à direita, atrás de nós.
—Vocês entraram?
— Só por um minuto — eu disse. - As meninas não estavam a fim de
entrar. Eu vou voltar e fazer uma visita direito num outro dia. Adoro
vasculhar lugares como esse.
— Eu também — disse Luke. — E uma de minhas coisas favoritas. Gosto
de imaginar como as pessoas que moravam aqui eram...
— Eu também — eu disse. — Tipo, quem eram eles? Eram felizes?
— É. Eles se davam bem? Tinham filhos? Existe uma vibração positiva ou
negativa lá dentro? Gosto de ler livros sobre lugares como esse: às vezes,
eles têm fotos dos moradores e suas famílias. Quando olho para os rostos
deles, fico me perguntando no que estavam pensando quando foram
pintados. Tipo: o que você tornou no café-da-manhã?
— É. Eu gosto de ficar lá, penetrando na atmosfera, vendo se, de alguma
forma, eu consigo me transportar para o passado...
— É — disse Luke. — E você não acha incrível que este lugar é aqui?
Algumas pessoas vão até Paris ou Roma para ver obras de arte, e nós temos
algumas obras fantásticas bem em frente às nossas casas.
Virei e olhei bem para ele. Eu não podia acreditar que ele estava dizendo
exatamente o que eu tinha pensado. Eu só tinha visto Luke uma vez e bem
rápido, com um monte de gente no restaurante dos pais dele. Eles são
italianos e tinham conhecido os pais da Paola quando eram jovens. Houve
um drama devido a um acidente que acontecera havia muitos anos e Paola
estava proibida de ver Luke. Agora, tudo resolvido, mas eu não tinha
conversado com ele ainda, já que não surgiu nem o momento, nem o lugar
apropriado. Eu nem sequer tinha olhado para ele direito. E agora, havia
alguma nele que parecia... Meio familiar. Senti que estava vermelha
quando ele olhou de volta para mim.
— Nós já nos encontramos? — ele perguntou.
Fiz que sim com a cabeça.
— Sim. Com a Paola, no restaurante dos seus pais.
Ele balançou a cabeça.
— Não. Antes disso. Eu me lembro daquela noite. Não é que... Você parece
familiar.
Eu balancei a cabeça.
— Não, acho que não.
Eu teria me lembrado de ter conhecido alguém tão notável como Luke. Ele
não era o padrão alto, moreno e bonito, embora fosse todas essas coisas
com uma juba de cabelo escuro. Fazia com que se parecesse com um poeta
do passado. Mas havia algo mais nele. Ele parecia ser interessante.
Inteligente. Ele ainda estava olhando mim e senti que estava ficando cor-
de-rosa. Levantei-me e comecei a brincar com a coleira do cachorro.
Quando olhei de volta para Luke, ele sorria, como se estivesse se
divertindo. Teria sido porque percebera que eu estava com vergonha e daí
ele estava rindo de mim? Ele devia ter esse efeito sobre diversas garotas.
Ou está se divertindo porque eu tinha pegado a coleira do cachorro toda
enrolada e quase tropecei e caí em cima do Jerry? Ah, diabos. "Que seja",
pensei. Paola tem sorte em ter um namorado tão lindo. Eu adoraria falar
mais com ele sobre casas antigas e quadros. Olhei para ele de novo,
enquanto ele se agachava perto do banco e tentava desenrolar as coleiras.
— Eu adoraria conversar mais com você sobre casas antigas um dia - ele
disse, olhando para mim. — Não há muitas pessoas que se interessam por
isso.
Engoli em seco.
— É... hihi — murmurei, quando Izzie, Paola e Lucy se aproximaram e
puseram um fim à nossa conversa.

Encontrando O Cara
Quem disse que você só tem um Cara? Se você tiver sorte, irá conhecer O
Cara, O Outro Cara, O Outro Outro Cara... e assim por diante. (Paola)
O Cara vai ser sua alma gémea por toda a vida. (Lucy)
Se tiver de ser, o destino vai uni-los nesta vida, assim como fez nas vidas
passadas. (Izzie) É uma questão de química. O Cara é só uma forma de
dizer que você gosta de alguém, e seus feromônios se atraem mutuamente.
(TJ)

Capitulo 3
"Não me deixem só!"

— Típico da Marie — disse mamãe, quando íamos para Devon no sábado


seguinte. — Ela sempre foi do contra.
— Achei que Paul fosse seu filho difícil, mãe - eu provoquei, lá de trás.
Meu irmão Paul enlouqueceu meus pais no verão ao largar a Faculdade de
Medicina e viajar pelo mundo. Agora ele está no Marrocos e vai voltar na
véspera do Natal para o casamento, antes de ir para a Etiópia no Ano-Novo.
Papai o chama de andarilho, já que ele ainda não decidiu o que quer ser.
— Vocês todos são difíceis — disse papai, guiando o carro para a A381,
em direção a um lugar chamado Bigbury Bay, em Devon.
— Mas, sinceramente, um trator-do-mar, aquela coisa estranha que eles
usam para chegar à ilha! - disse mamãe. — No que essa garota está
pensando?
— Bem, vamos dar uma olhada e tentar conversar com ela sobre isso —
disse papai. — Você sabe, apoiá-la em tudo, e aí tentar fazer com que veja
as coisas de uma maneira mais sensata.
Achei que o lugar era fantástico e me perguntei se devia avisar Marie sobre
a estratégia deles de "apoiá-la tudo". Pelo que parece, Marie achou esse
hotel numa ilha que organiza casamentos e o único jeito de chegar lá,
quando a maré está alta, é usando um trator-do-mar. "Excelente", pensei,
quando ouvi a notícia. Muda aquela chegada padrão ao casamento, de
limusine.
Mamãe não tinha acabado seu discurso.
— Como diabos ela pensa que vai levar todos os convidados para o hotel?
Não. A idéia é ridícula.
— Era bom o suficiente para a realeza — eu disse. — Procurei pelo lugar
na Internet ontem à noite. Faz bem o meu tipo: um hotel antigo cheio de
história. Aparentemente, qualquer pessoa que tivesse realmente imporia
costumava ir para lá nos verões da década de Edward, o Príncipe de Gales,
a Sra. Simpson, Noel Coward, Amy Johnson, Winston Churchill, para citar
alguns. De acordo com o site, era divino, com uma orquestra tocando numa
plataforma sobre a piscina natural, chamada Piscina da Sereia.
Mas eles continuaram resmungando, resmungando e resmungando. Tentei
fazê-los rir contando uma piada, mas eles não acharam graça. Não: eles
estavam achando muito mais divertido se lamentar.
— Londres teria sido muito mais conveniente para os convidados do Norte
— disse mamãe.
— E se o tempo estiver ruim? Será um pesadelo se ninguém conseguir
chegar lá — disse papai. — Não. Não estou com bons presságios.
— E tampouco é barato - disse mamãe.
Decidi fechar os olhos e tentar dormir. O Hotel da Ilha Burgh parecia a
opção certa para mim e, de qualquer jeito, era o casamento da Marie, e não
da mamãe ou do papai. Quando saí do ar, me peguei pensando em Luke.
Perguntei-me se ele conhecia esse lugar. Faz o tipo dele também. Ele tem
aparecido na minha cabeça durante a semana toda, vai e volta. Ficava
voltando e voltando àquela hora em que ele virou e perguntou se já nos
conhecíamos. Foi incrível, pois, normalmente, quando conheço um garoto
bonito, meu cérebro vira mingau e minhas cordas vocais ficam paralisadas.
Fico dominada por essa garota que chamo de Noola, que não consegue
dizer nada além de uhyuh, yuneewee e nihingyah.
MAS consegui ter uma conversa com Luke. Na verdade, foram palavras
faladas que formavam frases que faziam sentido. Era como se eu o
conhecesse há muitos anos. E na hora em que ele falou em italiano com
Mojo... foi tão engraçado... Mas não devo pensar nele. Ele é namorado da
Paola. Steve. Steve é meu namorado. Eu deveria estar fantasiando em
contar para ele sobre a Ilha Burgh comigo, e não para o Luke. Ele também
gosta de lugares com histórias interessantes. "Então por que você não
pensou em contar a ele sobre isso primeiro?", perguntou uma voz puritana,
lá no fundo da minha cabeça. "Ele não é tão bonito como Luke", disse uma
outra voz. Steve é bonitinho do seu jeito. Ele parece um Harry Potter de
dezoito anos, enquanto Luke é um supergato, com sua boca grande, cílios
grossos e...
"Ah, fique quieta", eu pensei. Fique quieta, fique quieta, fique quieta,
prometi contar a Steve tudo sobre a Ilha Burgh assim que voltasse.

O resmungo e a lamentação dos meus pais continuava enquanto


estacionávamos o carro no continente oposto à ilha onde ficava o hotel, e
descarregávamos nossas malas para o pernoite. Olhei para a baía e lá estava
o hotel, exatamente como descrito no site: "Um navio de cruzeiro em estilo
art déco encalhado em terra firme". Eu mal podia esperar para chegar lá.
O trator-do-mar era fantástico. Eu nunca tinha visto ligo assim. Era como
viajar num ônibus a céu aberto, com volantes gigantes e, antes que
notássemos, tínhamos atravessado a baía e um homem estava tirando
nossas malas e colocando-as num carro para percorrer a curta distância até
o hotel.
— Toda essa conversa — mamãe sussurrou quando passamos por um bar
chamado The Pilchard Inn. — E se nevar?
Estávamos no hotel havia cinco minutos e dava para perceber que as
objeções dos meus pais estavam desaparecendo rapidamente.
— Bem, acho que é mais legal quando se chega aqui — disse mamãe,
entrando no fantástico hall decorado em estilo art déco.
— Hummm — disse papai em tom de aprovação, caminhando por uma
dependência chamada Palm Court, que tinha um teto abobadado com um
vitral maravilhoso em cores vistosas.
— Legal? Mamãe, é incrível — eu disse, enquanto Marie vinha do Palm
Court nos encontrar.
— Incrível — ela disse. — Posso deduzir que você aprovou, então?
— Eu aprovo — eu disse.
— E os coroas? — ela sussurrou depois de abraços e perguntas sobre a
viagem, enquanto mamãe e papai se ocupavam em preencher a ficha e
pegar as chaves dos quartos.
Eu ri. Marie tinha adotado o apelido que eu tinha dado à mamãe e ao papai.
Comecei a chamá-los de "enrugadinhos" porque eram muito mais velhos
que a maioria dos pais das outras pessoas. Provavelmente não para Marie e
Paul, que já estão com seus vinte anos, mas eu nasci depois.
Acho que fui um bebê inesperado. Provavelmente foi uma surpresa, já que
tanto mamãe como o papai são médicos e devem saber melhor sobre
anticoncepcionais e coisas do gênero. Foi engraçado quando a mamãe teve
sua primeira conversa sobre sexo comigo e deu uma aula sobre "Como uma
vez já é suficiente" e "Erros acontecem". Eu perguntei para ela se eu tinha
sido um deslize e ela não sabia para onde olhar.
— Eles vão ficar bem — eu disse. — Só dê tempo a eles.
Depois de um almoço fantástico no Sun Lounge, os meus pais pareciam
estar mudando totalmente de opinião.
— Winston Churchill veio aqui, sabia? — disse papai, dando um trago num
charuto. Mamãe deu um gole no café.
— E Edward, o Príncipe de Gales, e a Sra. Simpson.
Papai sorriu.
— Quase dá para vê-los em suas roupas brancas, não dá? Correndo pêlos
corredores, dizendo "alguém quer jogar tênis?" um para o outro.
— E Agatha Christie escreveu aqui — acrescentei. — E foi usado como
cenário para o filme Assassinato num dia de Sol.
Mamãe suspirou satisfeita e olhou pela janela.
— É adorável. Como você achou isso, Marie?
— Stuart me trouxe aqui no mês passado e nos apaixonamos pelo lugar —
disse Marie. — Quando ficamos sabendo que eles tinham permissão para
fazerem casamentos, bem...
"Rá", pensei. Resolvido. Todos felizes.
— Só não me faça usar rosa no dia — eu disse.
Marie riu.
— Oh, achei que um rosa-shocking-claro seria legal. Com várias fitas e
laços... Dá um tempo. Você pode ser minha dama de honra de jeans e tênis.
Desde que esteja aqui, é tudo que me importa.
— Falando em roupas... — disse mamãe, fuçando na bolsa e tirando uma
série de revistas de noivas. — Trouxe para darmos uma olhada.
"Boa tentativa", pensei, olhando para Marie com simpatia.
Pouco depois, voltamos para o continente e foi aí que a confusão de
verdade começou. Era uma tarde adorável, com um céu azul, e Marie nos
levou para conhecer. Era incrivelmente bonita. Idílica, na verdade. Chalés
de telhado de palha, caminhos tortuosos em cercas vivas e pequenas vilas
curiosas. Depois de uma parada para uma xícara de chá numa loja à beira
da estrada, Marie saiu em busca de um banco e mamãe e papai se dirigiram
para High Street e começaram a olhar para as janelas de uma agência
imobiliária.
— O que estão procurando? - perguntei, alcançando-os. — Algum lugar
para alugar durante o verão?
Mamãe olhou para o papai.
— É... Não exatamente — ela disse.
— Só tendo uma idéia dos preços — disse papai, continuando a olhar para
a janela.
— Por quê? Você está pensando em investir em imóveis? — perguntei.
— Não — disse papai, e olhou para mamãe. — Hummm. É... Você diz a
ela, Maureen.
Mamãe respirou fundo.
— Nós queríamos falar com você sobre isso há um tempo, TJ. Estamos
pensando em nos mudar.
— Mudar? Por quê? Quando? Para quê?
— Não entre em pânico — disse mamãe. — Na verdade, estávamos
falando sobre isso já faz um tempo...
— Não comigo. É a primeira vez que ouço falar disso.
— Nós não quisemos falar nada até que tivéssemos certeza, mas seu pai
está pensando em trabalhar meio período e ir até Londres todos os dias.
— Sempre gostamos dessa parte do mundo e depois de olhar ao redor hoje,
bem...
— Mas por que você não pode trabalhar meio período e permanecer em
Londres, papai?
— Nós podíamos. Isto é... Era uma opção. Mas nós gostamos de uma
mudança de ares. E não vai demorar muito para nos aposentarmos. Sempre
quisemos nos aposentar perto do mar e agora Marie está morando aqui
também...
"Nãããããããããããooooooooo", eu pensei, quando o alarme soou no meu
estômago.
— Mas e eu? E a escola? E minhas amigas?
Papai hesitou por um momento.
— Uma mudança de ares vai fazer bem a você também. — ele disse,
finalmente. - Não sei se Londres é o melhor lugar para você e... Bem, esse
novo grupo com que você começou a andar agora...
— Novo grupo? Você está falando da Lucy, Paola e Izzie? Mas você mal
as conhece... — ele não conhecia mesmo, já que eu dificilmente as levava
em casa. Papai nunca gostou muito que eu levasse minhas amigas para casa
e, quando o fazia, ele sempre reclamava do barulho, bem mais simples sair
e ir até a casa delas.
— Eu as conheço sim, TJ. E aquela vez que eu as peguei fazendo uma
guerra de travesseiro, pulando para cima e para baixo na sua cama? Nada
maduro. Não é o comportamento de moças jovens e direitas. Na segunda-
feira, você fará quinze anos e já é hora de começar a agir conforme sua
idade.
— Mas nesse dia nós só estávamos sendo bobas. Geralmente, não somos
assim.
— E aquela Izzie, então? Você está lembrada daquele incidente com ela?
Acho que ela não deve ser uma boa influência.
— Izzie? Mas... por que a Izzie?
— A própria mãe dela estava preocupada com ela no verão. Ela estava
sempre rondando nossa casa, saía com um garoto estranho e estava
bebendo...
Soltei um riso irônico.
— Isso foi uma exceção. Izzie é a Rainha Orgânica. Ela curte muito as
coisas saudáveis. Sério. Ela não é uma má influência. De jeito nenhum. Eu
poderia mostrar para vocês garotas da escola que são más influências, mas
não a Izzie.
Falei a coisa errada.
— Exatamente — disse papai. — Então você admite que há garotas na sua
escola que são más influências?
— Não. Sim. Mas eu não ando com elas. Não. Mãe. Pai. Não. Nós não
podemos nos mudar. Minha vida toda acontece em Londres. Eu não posso
ir embora.
Mas meus pais tinham visto outra agência imobiliária do outro lado da rua
e foram direto para ela.
"Não. Não. Nãããããoooo, por favor, Deus", eu pensei. Quero dizer, eu gosto
de Devon e tudo mais, mas deixar Londres? Nãããããããoooo.

O Hotel Burgh Island fica na Ilha Burgh, que é uma de 10,5 hectares (26
acres), a 200 metros do sul da costa de Devon, entre Salcombe e Plymouth.
Pessoas famosas que ficaram lá incluem Noel Coivard; Agatha Christie;
Edward, o Príncipe de Gales, e a Sra. Simpson; Amy Johnson; Winston
Churchill.
Filmes que usaram o hotel como cenário incluem Assassinato num Dia de
Sol.

Capitulo 4
Projeto da Escola

— Mas você não pode ir — disse Lucy, quando nos reunimos na segunda-
feira seguinte. — Steve ficou muito mal depois que você contou para ele,
ontem à noite.
Enfiei os cartões de aniversário e presentes que elas tinham acabado de me
dar na mochila. Gel de banho de lavanda e sabão da Paola; esmalte
cintilante da Lucy; da Izzie, uma vela com cheiro; e Lucy tinha trazido um
cartão e um presente do Steve — uma coleção de CDs de músicas
românticas da última década. De alguma forma, os presentes tornaram o
fato de eu ter que me mudar ainda pior. Ainda que fossem presentes de
aniversário, pareciam presentes de despedida.
— E o que tem o Steve? — disse Izzie, envolvendo seu braço no meu. —
Eu estou muito mal. Nós vamos sentir bastante sua falta.
— Talvez você possa voltar nos finais de semana — disse Paola. — Você
pode ficar no meu quarto comigo.
— E nós iríamos visitar você nas férias — disse Lucy. — Eu gosto de
Devon.
— Eu também — disse, enquanto pegávamos nossos lugares na classe. —
Mas isso não significa que quero morar lá — eu estava completamente
triste. "Que aniversário, hein?", pensei. Quinze anos e parecia que minha
vida tinha acabado. Eu não ia conhecer ninguém em Devon. Começar uma
nova escola ia ser horrível, como reviver o que foi quando Hannah se
mudou para o exterior. E eu sei o que Hannah passou quando chegou à
África do Sul, ainda que ela depois tenha feito amigos. Mas eu não queria
fazer novas amizades. Não queria passar por tudo isso de novo. Eu gostava
de Lucy, Izzie e Paola. Nunca encontraria amigas como elas outra vez. E
não importava o quanto elas insistissem que iriam me visitar e manter
contato, eu sabia o que aconteceria. Já estava acontecendo com Hannah.
Prometemos nos corresponder por e-mail todos os dias, contarmos tudo
para a outra, porém já faz semanas que ela não mantém contato — sequer
um e-mail me desejando feliz aniversário. Mas pensando nisso, eu
tampouco mantive contato.
Era horrível pensar que a mesma coisa podia acontecer com minlias novas
amigas. Não. Mamãe e papai não podiam estar falando sério. Era uma ideia
maluca.
— Você poderia fugir sempre — Paola sussurrou no meu ouvido. — Nós
garantiríamos sua comida e outras coisas...
— Silêncio no fundo. — disse a Sra. Allen, olhando exatamente na nossa
direção.
Depois das notificações chatas de sempre, a Sra. Allen de repente sorriu.
— Agora, garotas, tenho algo especial a lhes dizer hoje. Um projeto
empolgante será lançado pelo prefeito e acho que muitas de vocês vão ficar
bastante interessadas...
Paola virou e imitou um bocejo para mim. Eu abri um sorriso.
— O objetivo do projeto é produzir um livro relatando em detalhes a
herança da cidade — continuou a Sra. Allen —, que será escrito e
pesquisado pelos estudantes da cidade. A versão final será vendida no
Museu Britânico. O projeto é aberto a todos os alunos a partir da oitava
série que desejarem participar. O prefeito solicitou que aqueles que
estiverem envolvidos pesquisem a Londres atual e como ela era no
passado. Assuntos como história, pontos famosos, prédios, vestuários ao
longo dos anos, contribuições de seus habitantes, artistas, escritores,
arquitetos... E a lista continua. Foram escolhidas escolas das quatro áreas
de Londres: Norte, Sul, Leste e Oeste. Nossa escola teve o privilégio de ser
solicitada para representar o Norte, ou seja, North London. Cada escola se
concentrará na região na qual se encontra...
"Parece magnífico", pensei. Eu adoraria me envolver, mas provavelmente
estarei morando lá onde Judas perdeu as botas, com pessoas que sequer
estiveram em Londres.
— O prefeito solicitou uma apresentação inicial logo antes do Natal, e isso
significa até o final do semestre —a Sra. Allen continuou. — Então,
precisamos nos preparar imediatamente. A primeira reunião para a região
de North London, para aqueles que quiserem contribuir, será amanhã à
noite, no Instituto de Ciência na Praça Pond, em Highgate, então...
Todas as jornalistas, historiadoras e artistas iniciantes que aí se encontram
tomem nota. Todos os coordenadores das escolas participantes se
encontrarão hoje à noite e indicarão um aluno para coordenar o projeto com
o auxílio de um grupo de professores. Mas, essencialmente, esse projeto é
de vocês, e eu espero que consigam transpor com sucesso o desafio e fazer
com que essa escola se orgulhe de seus esforços. No final do semestre,
haverá um dia dedicado à apresentação dos trabalhos até então
desenvolvidos, e a diretora da escola, Susan Barratt, e Sam Denham, o
célebre jornalista — que acredito que alguns de vocês conheçam da visita
que ele fez no ano passado —, estarão aqui. Os detalhes foram afixados no
mural do saguão. Quem desejar participar terá tempo para trabalhar no
projeto e pode combinar isso com o seu coordenador.
"Legal", pensei, enquanto a Sra. Allen continuava. Mesmo que exista a
possibilidade de nos mudarmos antes da finalização do projeto, mamãe
disse que pode levar muito tempo para encontrarem a casa certa, então
tenho pelo menos mais um semestre aqui, e aí eles terão vendido nossa
casa. Pelo menos, eu teria tempo para participar das etapas iniciais.
— Bem, pode me deixar de fora disso — disse Paola, enquanto íamos para
a primeira aula. — Nós já temos deveres de casa o suficiente.
— Pode ser divertido — disse Lucy. — Eu serei voluntária. Eu podia
pesquisar a evolução dos trajes ao longo dos anos. É uma desculpa para
vasculhar lugares como o Victoria and Albert Museum. Eu quero fazer isso
há anos e, nunca se sabe, pode me dar inspiração para os próximos
desenhos. Gosto de combinar o antigo com o novo.
— E você, TJ? — perguntou Izzie. — Você está a fim?
Eu fiz que sim com a cabeça.
— Acho que sim. Queria fazer alguma coisa sobre as casas antigas de
Hampstead e Highgate. Sabe, como a Kenwood House. Há muitos outros
lugares que eu queria pesquisar. Como a Lucy disse, é uma desculpa para
fazê-la e pode ser minha última chance antes de nos mudarmos.
— E você poderia explorar o lado espiritual de Londres — sugeriu Lucy,
virando-se para Izzie.
— Pode ser — ela disse. — É. Vou pensar nisso.
Paola fez bico.
— Odeio todas vocês. Agora me sinto excluída, ou pelo menos é o que vai
acontecer quando todas vocês participarem e eu não.
— Então escolha alguma coisa interessante para você — eu disse. — Você
podia pesquisar sobre a evolução do teatro. Ou grandes histórias de amor.
Paola parecia convencida.
— Acho que sim — ela disse. — E a Sra. Allen disse que haveria tempo
para fazer o projeto. Então, pode ser. E certamente não haveria mal algum
em ir ao dia dedicado à apresentação dos projetos no final do semestre.
Aquele Sam Denham era bem bonito. Eu não ligaria de vê-lo novamente.
Eu ri. "Tão típico da Paola", pensei, enquanto Lucy, Izzie e eu colocávamos
nossos nomes no mural, com nossa área de interesse.

Na terça-feira à noite, nos encontramos na casa da Paola, perto de


Highgate, trocamos de roupa e nos enfeitamos.
— Para o caso de haver garotos bonitos lá — disse Izzie, se enfiando numa
minissaia de sarja com um zíper na frente.
— Achei que você estava passando por uma fase celibatária — eu disse.
Izzie riu.
— Gosto de manter a mente aberta com relação a todas as questões.
— Decidi que não vou fazer isso — disse Paola. — Não tem a ver comigo.
— Então, por que está vindo? — perguntei.
— Luke estará lá. A escola dele é uma das escolhidas também.
— A do Steve também — eu disse. — Ele me contou hoje. Ele quer fazer
fotografia.
— E o Lal? — perguntou Izzie. Lucy riu.
— Não está interessado. Ele disse que é um trabalho muito difícil. E o
Tony, Paola?
— O diretor da escola dele recusou o convite. Disse que os alunos de lá
têm de se concentrar nos exames. O Luke também está fazendo provas,
mas o diretor dele pareceu não se importar. Pelo que parece, ele disse que
ficaria bem no currículo deles se o material fosse usado.
— Está mais para ficar bem no currículo da escola — eu disse. — Diretor
esperto, se você quer saber.
O saguão já estava cheio quando chegamos ao Instituto, e Paola viu Luke
do outro lado do lugar, lá na frente. Ele fez um aceno simpático, e eu fiquei
vendo Paola andar na direção dele. Ele abraçou-a e a conduziu a um
assento. Ele estava maravilhoso com um sobretudo e um cachecol
vermelho. Procurei por Steve, mas não consegui encontrá-lo na multidão.
A reunião logo começou, com uma das professoras de uma escola em
Cricklewood tomando seu lugar.
— Meu nome é Srta. Longbottom — ela começou. O nome dela era muito
engraçado e logo notei os ombros de Lucy sacudindo na minha frente. Não
é preciso muito para Lucy rir, o único problema é que é infeccioso.
Especialmente num lugar em que não se deve rir. Os ombros da Izzie
também começaram a sacudir e eu não prestei atenção na lista de categorias
que a Srta. Longbottom lia, pois também estava me esforçando para não rir.
Mas prestei atenção no que ela disse no final. Uma garota chamada Marie
Nash ia ser a coordenadora geral e as diferentes áreas de interesse teriam
seus coordenadores próprios, aos quais iríamos nos reportar.
Lucy tomou nota de quem estava encarregado da área de vestuário e de
quem estava no grupo dela. Steve ficou encarregado da área de fotografia
com um grupo de outros três alunos, e Izzie foi colocada com um garoto
chamado Trevor, encarregado do desenvolvimento espiritual de North
London. Eu me perguntava se ele sabia no que tinha se metido. Ele parecia
ser bastante sério e provavelmente estava pensando em pesquisar sobre
igrejas e sobre o desenvolvimento da cristandade. Com Izzie ao seu lado,
ele pesquisaria sobre bruxas, misticismo e linhas de energia, se ela fizesse
do jeito dela. Havia outros grupos para ciências, música, geografia,
arquitetura e, finalmente, a Srta. Longbottom chegou às casas famosas e a
seus habitantes.
— E agora chegamos aos habitantes e às casas históricas de North London.
Luke De Biasi coordenará essa área junto com... — ela olhou para a lista —
Theresa Joanne Watts, Sian Collins e Olívia Jacobs.
Paola virou para mim e fez um sinal de positivo com o polegar. Sorri de
volta para ela. "Legal", pensei. Terei a oportunidade de conversar direito
com ele sobre casas antigas.
— Muito bem — disse a Srta. Longbottom. — Agora, se vocês puderem se
dividir em grupos de acordo com as áreas de interesse e se apresentarem,
nós voltaremos a nos reunir dentro de vinte minutos.
Enquanto as pessoas se agrupavam, Paola me alcançou, quando eu andava
em direção a Luke, Olívia e Sian.
— É o máximo. Você vai trabalhar com o Luke — ela disse. — Fique de
olho naquelas duas outras garotas. Eu vi o jeito que aquela loirinha olhou
para ele. Tenho certeza de que ela se sentiu atraída.
— Acho que você não tem que se preocupar com isso — eu disse, olhando
ao redor, e Luke fez um gesto para que eu me juntasse a eles. — Ela não
chega aos seus pés.
— Bem, conte para mim se houver alguma coisa estranha, está bem?
— Claro que sim — eu disse. — Pode me chamar de Pequena Espiã 3.

E-mail: Caixa de Saída (1)


De: gatacomcerebro@psnet.co.uk
Para: hannahnutter@fastmail.com
Data: 25 de novembro
Assunto: Londres

E aí, Hannah, minha docinho de coco?


Desculpe por ter ficado por um tempo sem me comunicar — tem sido uma
loucura aqui. Como você esta? Eu ainda estou com saudades. A vida está
uma droga agora. Meus pais tiveram uma péssima ideia e decidiram que
querem se mudar para Devon. Sim, Devon. Não, obrigada.
Ainda estou andando com Izzie, Lucy e Paola. Elas são ótimas amigas, o
que só torna as coisas mais difíceis se eu tiver que ir embora de Londres.
A boa notícia é que estamos fazendo um grande pro-ieto (com várias
escolas envolvidas) sobre a história de Londres. Vou trabalhar com o novo
namorado da Paola, que é lindo demais. E muito legal.
Beijos, TJ

E-mail: Caixa de entrada (1)


De: hannahnutter@fastmail.com
Para: gatacomcerebro@psnet.co.uk
Data: 25 de novembro
Assunto: Mudança
Nossa! Coitadinha de você. Que praga na categoria problemas.
OK. Ouça a Titia Hannah.
Quanto à sua mudança:
Plano A: quando os agentes imobiliários enviarem pessoas para visitar sua
casa, se ofereça como guia. Durante a visita, comente que você tem
vizinhos psicóticos, com crianças barulhentas demais, e que têm ficha
criminal.
Plano B: diga aos compradores potenciais que a casa tem um fantasma.
Um fantasma horrível, que gosta de vagar com um braço amputado e bater
nas pessoas com o cotoco. Diga a eles que, à parte esse hábito, ele é
inofensivo. Hahaha.
Plano C: pegue um monte de lixo estragado, esconda em cada quarto e
diga aos compradores potenciais que há um problema sério de umidade na
casa.
Isso deve espantá-los. Sou ou não sou um gênio?
O que aconteceu com o Steve? Você não o mencionou. Vocês ainda estão
namorando?
Por aqui, estamos entrando no verão tórrido e é fantástico. Não se trata de
um consolo, mas você se lembra como eu me senti quando fiquei sabendo
que ia me mudar? Achei que minha vida tinha acabado. Agora eu adoro
aqui e fiz ótimas amizades. As coisas mudam. Você pode gostar de Devon.
Sei que não deve ser isso que você quer ouvir agora, mas as coisas podem
não ser tão sombrias quanto parecem.

Um grande beijo,
Conselheira sentimental, Hannah

Obs.: Escreva logo.

Obs. 2: Meu Deus. Acabei de ver a data e percebi. Foi seu aniversário
ontem. Ups. Hannah, garota malvada. Hummm. Cartão no correio.
Presente na... Na loja. Miiiiiiiiil desculpas. Vou compensar para você. Por
favor, não me odeie. Feliz, feliz aniversário, mesmo que atrasado. E
desculpaaaas, desculpaaaas, desculpaaaas, sou uma péssima amiga. Beijo
grande.
Por favor, mande um e-mail imediatamente e diga que me desculpa.

E-mail: Caixa de Saída (1)


De: gatacomcerebro@psnet.co.uk
Para: hannahnutter@fastmail.com
Data: 26 de novembro
Assunto: Aniversário
Você está desculpada. Não fiz nada de mais no meu aniversário. Por um
motivo: era uma segunda-feira e dia de aula. Meus pais me levaram para
um chá completo quando estivemos em Devon, o que foi legal, mas estou
anti-Devon no momento (hahaha, você é a Tia Hannah *(e eu sou a Anti-
Devon, sacou?), então não pude aproveitar muito. Mas ganhei um monte
de presentes legais das meninas e uma coleção de CDs do Steve. Mas, no
ano que vem, farei 16 anos e espero que você pegue um avião e apareça
pessoalmente.

Com carinho,
Anti-Devon

_______________________________________
*N. do E.: Tia Hannah = Aunt Hannah, em inglês.

Capitulo 5
Negócio Suspeito

— E que papel você quer que eu interprete, Luke? — perguntou Sian.


Luke pareceu pensativo.
— Hamlet — ele disse.
Sian jogou a cabeça para trás e soltou uma risada alta e estranha. Como um
burro relinchando. "Opa", pensei. O que Luke tinha dito fora engraçado,
mas não tão engraçado.
Estávamos em nossa primeira reunião na noite seguinte, num dos locais de
reunião, nos fundos da nossa escola, íamos utilizá-la como uma espécie de
oficina para nosso projeto. Sorte a minha que era na nossa escola, já que as
outras meninas tinham que ir para outras regiões. Lucy para uma escola em
Kilburn e Izzie para uma em St. John's Wood.
Luke se levantou e subiu numa das mesas.
— Então — ele disse, sorrindo para nós três —, aqui estamos, equipe. Sem
mais tumulto, declaro a reunião aberta.
Ele desceu e a reunião começou. Claramente, ele já tinha pensado muito a
respeito do projeto, pois estava cheio de folhetos, brochuras e detalhes
sobre casas antigas tirados de sites de Internet.
— Temos uma área enorme para cobrir, então, sugiro nos dividirmos. Se
nos concentrarmos em Hampstead e Highgate até o Natal, para nossa
primeira apresentação, já teremos muito trabalho para as etapas iniciais.
Podemos fazer o resto de North London depois. Então vou atribuir lugares
para cada um de nós visitar. É melhor começarmos neste final de semana,
já que não temos muito tempo. Sugiro que, nesse estágio, visitemos os
lugares, tomemos notas e nos encontremos novamente na semana que vem
para vermos aqueles que iremos manter e aqueles que iremos excluir.
— Ok. Kenwood House. Olívia, você fica com essa, tudo bem?
Olívia concordou e pegou a brochura que ele entregou a ela. Eu gostava da
aparência dela. Ela era alta e magra, com cabelos claros e ruivos cortados
em mechas curtas, atraente, mas não no sentido convencional, pois tinha
um nariz grande, mas ficava bem no rosto dela. Acho que se eu fosse da
classe dela na escola, a teria escolhido como amiga, pois ela parecia
interessante.
— Sian, você pode fazer a Burgh House. Fica atrás da vila de Hampstead.
Acho que você vai gostar de lá. Sian concordou.
— Tudo bem, chefe — em contraste com a Olívia, Sian era baixinha e
loira. Tinha um rosto fino, um corpo esguio, um bumbum grande e as
pernas curtas, o típico formato pêra. Mas ela parecia bem legal, com
vontade de se dar bem com todos nós e querendo agradar. Especialmente
agradar ao Luke.
— Agora, a Srta. TJ Watts, ou você prefere que eu a chame de Theresa
Joanne? - perguntou Luke, com um sorriso maroto.
— TJ está bom, muito obrigada — eu disse, parecendo a rainha dos
puritanos. — Todos me chamam de TJ.
— Então, TJ, será... - ele disse. — Bem, para onde devo mandar você?
— Eu estava olhando na Internet ontem à noite e encontrei várias
companhias que fazem visitas guiadas na região. Existe uma que sai da
estação de Hampstead às duas horas no domingo. Pode valer a pena fazê-la,
já que parece que eles cobrem uma vasta região e devem saber muito sobre
a história local.
— Excelente — disse Luke. — Na verdade, vou com você. Ouvi falar
desse passeio e sempre quis fazê-lo.
Sian parecia desapontada.
— Talvez todos devamos fazê-lo — ela sugeriu.
Luke balançou a cabeça, em sinal negativo.
— Não, dois de nós será suficiente.
Fiquei feliz que ele quisesse ir comigo e devia ter imaginado isso, mas Sian
olhou para mim de um jeito estranho e parecia que ia fechar a cara.
Entretanto, pareceu superar isso, e o resto da reunião foi muito produtivo.
— Tem a Avenue House em East End Road, em East Finchley — disse
Olívia. — Pode valer a pena visitar. É um lugar antigo e interessante, com
jardins adoráveis.
— E Lauderdale House, em Highgate — eu disse. — E, é claro, o cemitério
de Highgate. É fantástico e há muitas pessoas famosas enterradas por lá,
incluindo Karl Marx. Na verdade, algumas pessoas dizem que se trata de
uma conspiração comunista.
Luke e Olívia riram, mas Sian olhava para mim como se eu estivesse
maluca. Acho que ela não entendeu a piada.
— Sugestões excelentes, TJ — disse Luke. — E temos que incluir a casa
em que o poeta John Keats morava, e Fenton House, no topo de
Hampstead. É, nós vamos ter que trabalhar duro para cumprir o prazo, mas
será ótimo. Muito interessante.
O entusiasmo dele era contagiante e fiquei muito feliz em tê-lo como
coordenador. Não como a pobre Izzie. Colocaram-na para trabalhar com
um garoto chamado Trevor, da escola do Steve, que não só parecia ser
chato: Steve disse que ele de fato era chato. Izzie não estava planejando
passar muito tempo com ele.
Depois de uma hora de reunião, nós todos tínhamos uma clara ideia do que
devíamos fazer e eu estava entusiasmada para começar. Estava certa de que
havia boas chances de nossas contribuições serem publicadas se
apresentássemos nossa pesquisa de uma maneira interessante. Com Luke
coordenando, acho que isso não seria um problema.
Enquanto andava até o portão com Olívia depois da reunião, pensei mais
uma vez na sorte da Paola em ter um namorado como Luke. Bonito, um
cara legal e um líder nato. Nós seríamos uma ótima equipe. Já dava para
ver que Sian faria tudo que Luke pedisse e Olívia era tranquila.
— Luke parece ser hilário — eu disse, enquanto íamos até o ponto de
ônibus.
— Ah, sim, ele é. Ele sempre foi divertido — ela respondeu.
— Ah, você já o conhecia?
— Sim. Eu o conheço há anos. Ele morava na mesma rua que nós. Ele é
amigo do meu irmão, William.
— Então como ele é de verdade? Ele parece ser confiante, você sabe, ele
sabe exatamente o que quer.
Olívia encolheu os ombros.
— Sim e não. Ele não foi sempre assim — aí ela riu. — Ele demorou um
pouco para se desenvolver, se você me entende.
Eu não tinha entendido.
— Não — eu disse.
— Ele não foi sempre tão atraente. Ele meio que cresceu e se tornou o que
é nos últimos anos, mas, quando tinha treze ou catorze anos, ele era um
pouco desajeitado e nunca namorava ninguém. Mas, agora, ele é um imã de
garotas. Elas fazem fila por ele. E ele adora isso.
— É sério?
— Sim. Mas ele nunca fica com a mesma pessoa por muito tempo.
— Sério? Ah, droga. Ele está saindo com a minha amiga.
— Ai, nossa, desculpa. Eu não devia ter dito nada. E quem sabe? Talvez
ele tenha amadurecido um pouco. Tipo, não dá para saber quando o amor
vai acontecer. E que ele foi sacana com a minha amiga. Eu ainda não sei se
ela superou isso.
— Deus. Por que alguns caras são assim? Você sabe, ficam com várias
garotas...
— Eu acho que é por causa do pai dele.
— Pai dele? O pai dele quer que ele tenha um monte de namoradas?
— Não, boba — Olívia disse, rindo. — É como se ele tentasse provar
alguma coisa para ele mesmo. O pai dele é muito duro, às vezes. Sei disso
porque Luke se refugia na nossa casa, com o William. Meu irmão acha que
o pai do Luke afeta a confiança dele. Como se nada fosse bom o suficiente:
se ele tira uma nota razoável, por que não tirou uma nota excelente? — esse
tipo de coisa. Agora, Luke descobriu uma coisa em que ele sobressai:
faturar garotas. É uma área em que o pai dele não consegue interferir. E
nisso ele tira notas máximas.
— Então você está dizendo que, no fundo, Luke é inseguro?
— Acho que sim — ela disse, sorrindo —, mas, afinal, todo mundo não é
também, que-ri-da?
Eu ri. Ia comentar algo a respeito, mas percebi que tinha esquecido minha
mochila.
— Ai, droga — eu disse, quando o ônibus estava aparecendo na esquina.
— Esqueci minha mochila.
— Então, vejo você na semana que vem — ela disse, fazendo sinal com a
mão para o ônibus parar.
Quando voltei ao local de reunião, a porta estava trancada. "Que estranho",
pensei, já que eu tinha ido embora antes do Luke e da Sian. Bati na porta,
espiei pela janela e vi Luke e Sian sentados um perto do outro. Muito perto.
E Luke estava segurando a mão de Sian. Luke olhou e, ao me ver na janela,
fechou a cara. Um pouco depois, ele veio até a porta com a minha mochila.
— Esqueceu isso? - ele perguntou, entregando-me a mochila. Estava muito
claro que ele não queria que eu entrasse. Ele parecia desconfortável, como
se mal pudesse esperar para se livrar de mim e, atrás dele, Sian tinha uma
expressão que parecia ser de culpa.
— É... Obrigada — murmurei, e fui embora.
"Oh, meu Deus", pensei. Pobre Paola. Oh, pobre, pobre Paola.

No ônibus, eu fiquei agoniada pensando se devia ir imediatamente para


Paola e contar o que tinha visto. Mas o que eu tinha visto? Eu estava
confusa e não queria causar problemas desnecessariamente. Havia dez
minutos que eu tinha chegado em casa e estava prestes a jantar, quando o
telefone tocou.
— TJ, é para você. Digo para ele ligar depois? — mamãe disse do hall.
— Quem é?
— Alguém chamado Luke.
— Não, eu atendo — eu disse. E me levantei imediatamente. "Talvez eu
devesse confrontá-lo e ver o que ele fala", pensei e fui correndo até o hall.
— Oi.
— E aí, TJ? — disse Luke, animadamente. — É só para confirmar o
passeio de domingo. Que tal você vir até a minha casa e a gente ir de carro
até Hampstead?
— Hummm, está bem. Sim.
— E... Eu queria esclarecer as coisas com você em relação a Sian.
— Ah. Sim. Sian — eu disse, perguntando-me como ele ia sair dessa.
— Essa Sian é um pouco excêntrica - disse Luke. — Uma menina confusa.
Ela queria conversar com alguém e acho que eu estava mais próximo. Eu
estava tentando fazer com que ela se sentisse melhor.
— Ah, certo — eu disse.
— Eu não sei qual a impressão que você teve quando olhou pela janela...
— Eu... É...
— Sem intenções. Pelo menos da minha parte. Cá entre nós, ela meio que
gosta de mim. Não sei o que fazer a respeito disso. Você tem idéia?
"Bem, pelo menos ele confessou", eu pensei.
— Não sei. Hummm. Use um saco na cabeça.
Luke riu.
— E colocar o dedo no nariz. Você acha que isso vai desanimá-la?
Eu também ri.
— Talvez — eu estava me sentindo lisonjeada por ele estar se abrindo
comigo e querer meu conselho. Gostei disso. Corno na reunião: sempre que
eu dava urna sugestão, ele fazia com que eu sentisse que minha opinião
importava. Em alguns projetos em que trabalhei no passado, algumas
pessoas só estavam interessadas no que elas tinham para contribuir.
— E, olha, não há necessidade de contar à Paola sobre ela. Eu não quero
que ela cause nenhum problema. Corno eu disse, Sian é um pouco confusa.
Ela não precisa ter alguém pegando no pé dela quando não há nada
acontecendo.
— Claro — eu disse.
— Então, só entre nós? — ele perguntou.
— Só entre nós.
Depois que ele desligou, senti um alívio em não precisar dizer a Paola. Ela
com certeza ia tirar satisfações com Sian. E se não havia nada de mais, não
tinha por quê. Luke parecia ser legal, corno se quisesse ao mesmo tempo
ajudar Sian sem chatear Paola.

Algumas Casas Interessantes e Abertas ao Público na Região de


Hampstead e Highgate

1) Burgh House, New End Square, Hampstead, Lon¬dres. Construída em


1704.
2) Fenton House, Windmill Hill, Hampstead, Londres.
Construída em 1693 (uma das maiores e mais antigas casas da região).
3) Kenwood House, Hampstead Heath, Londres. O prédio original menor
foi transformado no atual nos anos de 1700.
4) Avenue House, East End Road, East Finchley. Construída em 1859.
5) Lauderdale House, Waterlow Park, Highgate. Construída por volta de
1580.
6) Keats House, Keats Grove, Hampstead, Londres. O poeta John Keats
morou lá entre 1818 e 1820.

Capítulo 6
Passeio Guiado

— Exatamente o que eu queria! — disse Steve, agarrando um livro na


biblioteca local em East Finchley depois da escola, na sexta-feira.
Olhei por cima dos ombros dele. Era um livro com fotografias antigas do
vilarejo de Hampstead no início do século passado.
— Excelente — eu disse, vendo-o folhear o livro. — Por que você não
pega emprestado, identifica os lugares e tira fotos atuais deles? Ai você
pode expô-las lado a lado, para que as pessoas vejam a diferença.
— Ótima idéia — ele disse. — Minha equipe acha que também podemos
tirar fotos de algumas das figuras locais e mostrá-las ao lado das pessoas de
antigamente. Sabe, a doceira, o policial...
— Guardas de trânsito — eu disse. — Você os vê mais do que policiais.
Eles sempre me lembram vespas rodeando, esperando para atacar e dar
uma ferroada.
Steve riu.
— E eles realmente picam. Minha mãe recebeu uma multa outro dia. Foi
uma fortuna. Ela ficou muito brava.
— Devia ser ótimo antigamente — eu disse. — Imagine como era antes
dos carros e do trânsito.
— É — disse Steve. — Devia ser fantástico.
Depois de olharmos uns livros de fotografias, procuramos outros sobre a
região e Steve encontrou um que listava todos os escritores e artistas
famosos que tinha morado ali.
— É disso que preciso — eu disse, dando uma olhada no conteúdo.
— E se você conseguir achar os lugares em que moravam — disse Steve —
, tiro foto das casas para você. Por exemplo, o pintor John Constable morou
em Hampstead, e tenho quase certeza de ter visto uma daquelas placas
azuis que se coloca do lado de fora da casa, dizendo que uma pessoa
famosa morou ali, só não me lembro onde.
— Ele morou em dois lugares em Hampstead: um deles fica em Well Walk
— eu disse, folheando o livro. — E de acordo com isto aqui, há uma série
de outras pessoas famosas que moraram ali ou escreveram sobre aquele
lugar. Sei que Charles Dickens é uma delas, pois sempre passo pela casa
onde ele ficou quando estou a caminho da casa da Paola. Pode ser que haja
uma placa do lado de fora da casa dela quando ela for famosa.
A atriz Paola Williams morou aqui.
— Não se deprecie. Talvez tenha uma do lado de fora de sua casa — disse
Steve — quando você for uma jornalista e romancista famosa
internacionalmente — aí ele riu. — Lal queria fazer algumas dessas placas
e vender no Natal. É sua mais nova idéia de marketing. Quer que elas
fiquem iguais às originais, sabe, azul com as letras em branco, mas em vez
de serem feitas com gesso, ou seja lá o que eles usavam, ele quer fazê-las
com um plástico adesivo, de modo que as pessoas possam colar em suas
paredes.
— Mas se ninguém famoso morou na sua casa, qual é a utilidade disso?
— Ah, mas aí é que está o objetivo, pelo menos é o que Lal diz. Não se
trataria de placas em memória de pessoas famosas: elas seriam tributos a
nós, mortais, e as pessoas poderiam escolher o que seria escrito, tipo: "Sra.
Jones, a melhor mãe do mundo, morou aqui".
— Ou: Lal Lovering morou aqui. Ele é completamente maluco — eu
sugeri.
— É... Não. Acho que Lal pensou mais em algo do tipo: "Lal Lovering, o
melhor amante do mundo, morou aqui". Você sabe como ele é.
Eu ri.
— É de fato uma idéia fantástica. Eu compraria algumas. Uma para Izzie
dizendo: ''A mística Iz morou aqui. Astróloga, bruxa e investigadora". Para
Lucy: "Estilista extraordinaire". E para Paola...
— "Exibida e dramalhona" — disse Steve. Diferente dos outros garotos, ele
nunca se apaixonou por Paola, ao passo que Lal era completamente
apaixonado por ela e ficava bobo toda vez que a via.
— Ela não é bem uma exibida — eu disse. — Ela é só...extrovertida.
— Até parece. Uma exibida — disse Steve.
Depois, quando seguimos por caminhos diferentes naquela tarde, meus
pensamentos se voltaram para Luke e como eu achava que Paola tinha sorte
em tê-lo como namorado. Mas devia pensar na sorte que eu tinha em ter
Steve como namorado. Ele é tão fácil de lidar, um amigo de verdade, e sei
que faria qualquer coisa por mim. Como com o projeto: tem me dado tanto
apoio e tem se interessado tanto na minha parte quanto na dele.
Na manhã de domingo, fiquei nervosa em ter que me encontrar com Luke.
Acho que fui um pouco intimidada por ele. Passei muito tempo tentando
decidir o que vestir: não queria que parecesse que eu tinha feito muito
esforço, mas também não queria que parecesse que eu tinha acabado de sair
da cama. Depois de experimentar metade do meu guarda-roupa, escolhi
meu uniforme de sempre: jeans e suéter de lã. "Muito sem graça", eu
pensei, checando meu relógio e percebendo que era melhor ir andando.
Coloquei minha jaqueta de sarja e me olhei no espelho de novo. Sarja
demais, concluí, e troquei minha jaqueta de sarja por uma preta. "Nossa,
odeio isso", pensei, eu nunca consigo "colocar qualquer coisa e ficar
maravilhosa", algo que as outras parecem fazer sem problemas. Eu sempre
acabo no "coloque qualquer coisa e fique comum" .
Meu estilo é o estilo sem-estilo. Eu seria a candidata perfeita para aqueles
"antes-e-depois" que eles fazem nas revistas, só que eu seria o "antes". E
meu "depois" seria igual. Revirei minha cômoda e achei o conjunto de
chapéu e cachecol com listras em arco-íris que Marie tinha comprado para
mim no último Natal. "Hummm, me ilumina um pouco", pensei, olhando
para o espelho de novo, mas agora pareço aquelas pessoas animadas que
apresentam programas de criança na televisão e se vestem com cores muito
chamativas. "Que pena', pensei, dirigindo-me à porta, "vou ter que fazer
isso". E por que estou me preocupando em impressionar Luke? Com uma
namorada linda como a Paola, acho que ele nem sequer nota outras garotas,
não importa o que elas usem.
Cheguei à rua em que Luke mora uns dez minutos antes. Não queria
parecer muito ansiosa, então entrei numa cabine telefônica para passar o
tempo e reapliquei meu brilho labial. Depois de um tempo, me senti um
caçador espreitando a casa dele da cabine telefônica, então, respirei fundo,
andei até o portão e toquei a campainha.
— Já estou indo — disse uma voz de algum lugar lá de dentro. Um pouco
depois, Luke abriu a porta. — Entre, estou na cozinha.
Ele me conduziu até os fundos da casa e recomeçou a passar uma camisa.
— Quer alguma coisa para beber antes de irmos? — ele perguntou, tirando
a camiseta que estava usando.
"Uau!", pensei, olhando para seu peito nu. Eu me senti como Jim Carrey
naquele filme O Máscara, quando ele vê a Cameron Diaz pela primeira vez
e os olhos dele saem para fora das órbitas e caem no chão e voltam de novo
como se fossem molas. Foi aí que percebi que eu estava olhando, e olhei
para a porta. Então me dei conta de que devo parecer realmente boboca,
como se nunca tivesse visto um garoto sem camiseta. Eu tinha certeza de
que estava ficando vermelha. Forcei-me a olhar para os olhos dele.
— Unyah, na, nah, não obrigada — gaguejei.
Ele tinha um corpo fantástico. E estou falando fantástico, como se malhasse
regularmente. Os ombros dele eram largos, a pele era de uma cor morena
atraente e o peito dele era bem sarado, não musculoso, só... Perfeito. Já vi
meu irmão Paul várias vezes correndo por aí só de cueca, mas ele é
magrelo e o peito dele é meio para dentro. Eu até vi Steve quase nu, quando
estava se trocando para o tênis. Não bastaria dizer que ele não é um
candidato para o concurso de Mister Universo, pois ele é muito magro na
região do peito, como Paul, e é muito pálido. Mas Luke, ele era como
aqueles modelos da Calvin Klein em anúncios de roupas íntimas que você
vê nas laterais dos ônibus. Como diria Izzie, "hubba hubbà'. "Controle-se",
disse a mim mesma. "Você está agindo como uma adolescente bobà', disse
uma voz na minha cabeça.
— Não vou demorar — disse Luke, vestindo a camiseta que ele tinha
passado e pegando o casaco e o cachecol atrás da porta da cozinha. — Está
bem, Watts, vamos nos preparar para detonar.
— É, certo, detonar — eu disse, seguindo-o pela casa até o carro.
Chegamos a Hampstead uns quinze minutos depois e fomos em direção à
estação de metrô.
— Estou muito ansioso por isso — disse Luke, enquanto nos juntávamos a
um grupo de turistas que compravam ingressos de um homem com a
cabeça raspada do lado de fora da estação. Era o grupo de sempre: pelas
suas vozes, alguns norte-americanos, uns japoneses, alguns estudantes
australianos e uns alemães.
Depois de alguns minutos, mais turistas apareceram na estação, compraram
seus ingressos e nós partimos.
— Meu nome é Peter e serei o guia de vocês hoje — disse o homem com
os ingressos, andando em direção aos semáforos. — A visita durará cerca
de duas horas. Agora andem juntos e cruzem as ruas com cuidado...
— Estou me sentindo como uma criança no jardim-de-infância — sussurrei
para Luke, quando o grupo de cerca de vinte pessoas atravessou a rua atrás
do guia.
— Eu sei — riu Luke. — E certifique-se de que assoou o nariz antes de
falar com alguém.
Eu estava prestes a tirar um lencinho de papel, quando percebi que ele
estava brincando. "Controle-se, Watts", disse a mim mesma. Você está
agindo como uma burra.
A visita foi fascinante desde o começo, quando Peter nos contou que o
nome Hampstead veio de uma palavra que significava "velha propriedade
rural", quando não havia nada além de uma fazenda na região. Depois,
tornou-se mais popular, época em que as pessoas começaram a vir para a
região devido ao ar fresco e às águas.
— Ambos poluídos atualmente — riu Luke, quando uma velha van passou
soltando fumaça pelo escapamento.
— Até o rei Henrique VIII fez uso das águas daqui — continuou Peter. —
Toda sua roupa era lavada aqui e as roupas íntimas reais podiam ser vistas
a quilômetros de distância secando nas moitas. A popularidade das águas e
da região diminuiu depois que um médico declarou que, na verdade, o ar
marítimo era melhor, e todos escaparam para a costa. Depois disso, a região
se tornou muito conhecida por seus artistas e escritores...
Tanto eu como Luke escrevíamos às pressas para registrar tudo o que Peter
dizia, enquanto éramos conduzidos por uma adorável rua cheia de casas
georgianas, a Church Row, assim chamada porque havia uma igreja no
final dela. Demos uma olhada rápida na igreja e fomos para um cemitério
antigo. "Isso não se parece mesmo com Londres", pensei, enquanto
passeávamos entre as árvores e túmulos antigos cobertos por heras.
— Isso não se parece mesmo com Londres — disse Luke. — Parece o
campo.
— É exatamente isso que estava pensando — eu disse.
— Vão até o final do cemitério — disse Peter, apontando para um canto
tranqüilo — e verão o túmulo de um dos moradores mais famosos de
Hampstead.
O grupo foi na direção que ele havia indicado e lá, para minha surpresa,
havia um grande túmulo de pedra, ao lado do qual estavam gravadas as
palavras "John Constable" .
Eu estava inexplicavelmente comovida.
— Não acredito — eu disse. — É tão simples. Sem sinais ou anúncios
dizendo quem está aqui. Fica ainda mais impressionante ao nos depararmos
com isso. Achei que um pintor famoso como ele estaria enterrado num dos
principais cemitérios ou numa catedral, com uma placa enorme de ouro.
Luke fez que sim com a cabeça.
— Exatamente o que eu estava pensando.
— Mentes grandiosas pensam de forma similar — sorri de volta para ele.
— Constable pintou Beath mais do que qualquer outro pintor que veio aqui
— disse Peter. — Ele realmente amava o lugar.
— Então tem lógica ele estar enterrado aqui — Luke sussurrou para mIm.
Dos fundos da igreja, Peter nos levou para o outro lado, para uma outra
parte do cemitério.
— Diz-se que a escritora Jackie Collins e sua irmã Joan já compraram um
lote para serem enterradas aqui.
— Eu nunca soube que as pessoas podiam reservar o lugar em que seriam
enterradas.
— É. É meio mórbido, você não acha? Sabe, planejar a própria morte?
Luke concordou.
— É, mas acho que isso vai acontecer com todos nós em algum momento
ou outro. Não deve ser uma má idéia pensar em como seria seu enterro.
— Eu ia querer que um coral cantasse algo animado como Wish me Luck as
you Wave Goodbye — eu disse.
Luke riu de novo.
— Eu teria Cold as Ice ou algo apropriado, desse tipo. Ou talvez Voodoo
Child. E, depois, eu gostaria de ser empalhado e colocado no canto do hall
de alguém e usado como porta-chapéus.
Cutuquei o braço dele.
— Pare com isso. Tenho certeza de que você será um ótimo porta-chapéu,
mas é muito assustador falar sobre morte num cemitério.
— Dizem que a esposa de D.H. Lawrence o cremou, misturou suas cinzas
com concreto e fez uma lareira.
— Não acredito!
— Li em algum lugar, eu juro — disse Luke. Enquanto andávamos pelos
caminhos dos fundos, aprendemos muito com Peter sobre os antigos
habitantes de Hampstead, entre eles: John Constable, George Du Maurier,
George Romney. Mas também existiam rumores de que o ator Russel
Crowe tinha comprado uma casa do diretor Ridley Scott nas alamedas dos
fundos, logo depois da esquina; e de que o famoso chef James Oliver
morava na porta ao lado do bar Holly Bush.
— Não sei se ainda estão aqui — disse Peter —, já que não sou dessa
região, e podem ser apenas suposições.
Eu mal podia esperar para contar a Paola. Mesmo que fosse somente um
rumor de que Russel Crowe estava na vizinhança, ela ainda assim gostaria
de verificar se era verdade. Senti uma pontada de tristeza a respeito da
mudança iminente para Devon enquanto andávamos. North London estava
tão cheia de coisas interessantes e eu deixaria tudo para trás, quando ainda
havia tanto para explorar.
No topo de Holly Hill, paramos em frente a uma construção majestosa
chamada Fenton House.
— Esta é uma das casas mais antigas de Hampstead, construída em 1693 -
disse Peter. — Vocês notaram algo de estranho nas janelas?
— Algumas delas estão revestidas com tijolos — disse um dos turistas
norte-americanos.
— Alguém sabe por quê? — perguntou Peter. Eu levantei a mão.
— É... Nos anos de 1600, foi declarado um imposto que, quanto mais
janelas você tivesse, maior seria o valor do imposto. Muitos moradores não
queriam pagar os impostos extras e revestiram suas janelas com tijolos.
Eles diziam que o imposto era um roubo.
— Exibida — sussurrou Luke, cutucando meu braço e abrindo um sorriso.
— Adoro descobrir essas coisas.
— Eu também — concordei.
Andamos para cima e para baixo nas alamedas, enquanto Peter nos contava
sobre uma história intercalada com fofocas.
— Era na lagoa no alto de Hampstead que os viajantes costumavam parar a
caminho de Londres para lavar seus cavalos — ele nos informou. — Era
também aí que os salteadores costumavam se esconder, para que pudessem
surpreender os viajantes quando cuidavam dos animais. Dizem que Dick
Turpin era um deles e que até hoje ele assombra Spaniard's Inn, lá no final
da alameda. Também, era na região da lagoa que os salteadores eram
enforcados para servir de exemplo aos outros.
Quando prosseguíamos da lagoa para East Heath Road, havia uma casa em
que Elizabeth Taylor morou com Richard Burton, do outro lado da rua,
uma fantástica mansão onde Boy George morava. Fiz um lembrete para
pedir a Steve que tirasse fotos das casas para a apresentação.
Luke e eu conversávamos facilmente enquanto acompanhávamos o grupo e
descobrimos que temos muito em comum: livros, nosso interesse por
história, filmes antigos, teatro. Houve uma hora em que de pegou na minha
mão para me conduzir ao atravessar a rua e, por um momento, eu me deixei
imaginar como seria se ele fosse meu namorado. Foi só por um momento, e
aí me senti muito mal. Ele era o namorado da Paola. Como pude pensar
nisso, mesmo que por um segundo? Ainda tinha o Steve. Eu tinha o Steve.
Acho que ele não ficaria muito feliz se passasse e me visse segurando a
mão de Luke, não importa quão inocente isso fosse.
— Você está namorando o irmão da Lucy? — Luke perguntou, como se
tivesse captado meus pensamentos mais uma vez.
Soltei minha mão imediatamente.
— Sim. Desde o verão.
— Eu o vi por ai, mas nunca conversei com ele. Como ele é?
— Legal. Meigo. Ele é um amigo de verdade.
— Meigo, é? — Luke me olhou de um jeito estranho, como se estivesse
esperando mais, mas eu não me sentia confortável em conversar com ele
sobre Steve. Em lugar disso, fingi que queria prestar atenção em alguma
coisa que Peter estava dizendo a um dos turistas japoneses e me afastei de
Luke.
A visita terminou quando caminhamos pela Well Walk, cujo nome foi dado
porque lá se encontravam fontes de água. Depois, seguimos para Flask
Walk, onde a água era colocada em frascos para ser vendida. No caminho,
passamos pela Burgh House, que Peter disse se tratar de uma das mais
antigas casas de Hampstead.
— Eu pedi para Sian fazer o trabalho sobre esta casa — disse Luke —,
então não precisamos entrar. Vamos beber alguma coisa, em vez disso.
Acho que merecemos uma.
Depois da visita, fomos nos sentar no Coffee Cup na vila e conversamos
sobre o que tínhamos aprendido e sobre o que podíamos colocar na nossa
apresentação. Foi ai que comecei a ficar desconfortável. Andar com Luke
tinha sido normal, mas sentada do lado oposto ao dele e olhando direto nos
olhos, eu estava me sentindo estranha, como se meu cérebro fosse estourar.
E tinha certeza de que eu estava ficando muito vermelha. Não queria sentir
o que estava sentindo, e quanto mais tentava empurrar esses sentimentos
para o fundo da minha cabeça, mais eles pareciam querer ficar na frente.
No final, eu não olhava para ele. Em vez disso, olhava os pedestres
enquanto Luke falava, e a Terceira Guerra Mundial começou na minha
cabeça.
Você corre perigo de ficar igual à Sian, disse uma voz no fundo da minha
mente, e você sabe o que Luke pensa a respeito dela. Uma menina confusa.
Uma pessoa com uma queda muito grande por ele. Você será mais uma
numa longa lista.
"Mas ele é muito atraente", disse uma outra voz. Não só na aparência, mas
quanto à personalidade também. Não há nada de errado em apreciar a
beleza. Seria loucura não fazê-lo. Calma.
E as vozes continuaram:
"Mas ele é o namorado da Paola".
"E daí? Você não está planejando roubá-lo ou algo do tipo. "
"Não. Não estou. Mas também não devo flertar."
"Não se engane, achando que ele a paqueraria. Alguém como Luke nunca
olharia. duas vezes para uma pessoa como você, não como quem está a
fim."
"Mas eu acho que ele gosta de mim."
"E daí? Existe uma diferença entre gostar de alguém e estar a fim desse
alguém."
"Nossa! Quantas pessoas eu tenho dentro da minha cabeça?"
— Você está me ouvindo, TJ? — perguntou Luke. Parece que está a
quilômetros de distância. Em que está pensando?
— Ah! Nada. É... Desculpe — eu disse, levantando. Olha, é melhor eu ir
andando. Acabei de me dar conta do horário.
Ele parecia desapontado.
— Desculpe — ele disse. — Estive amolando você, não? Eu estava falando
demais?
— Não, não... Eu só tenho que ir.
Luke não parecia convencido.
— Está bem. Então, vejo você na terça-feira e nós vamos comparar nossas
anotações.
Comecei a me preparar para ir embora.
— Ei, tem certeza de que não quer uma carona? — Luke disse.
— Não. Obrigada. Tenho que correr — disse de costas para ele e me
apressei. "Eu devo ser maluca', pensei. Uma carona teria sido fantástica.
Agora tenho que ir sozinha para casa. Mas precisava de tempo para pensar.
Espantar a loucura que estava me dominando.
"Está bem", disse a mim mesma, voltando para casa, está bem, Luke é
classe A, cinco estrelas de atraente. Orlando Bloom também é. Certo. Eu
posso apreciá-los. Tudo bem. Não tem problema. Só olhar. Seria uma
loucura não reconhecer a beleza e apreciar uma pessoa que é legal e
interessante. É. Seria loucura não reconhecer. Então, não é nada demais.
Não é um problema. Talvez eu esteja pegando um vírus. É. É isso.
Provavelmente um vírus que faz com que eu me sinta estranha. Ficar fora,
no frio, com todos esses estranhos. Muitos vírus andando por aí nessa
época do ano. Gripe, resfriado, febre. Nada além disso.
Na hora em que cheguei em casa, eu me senti mais calma. Mais racional.
Peguei um vírus. Resolvido. Sim. Sem problema.

Algumas pessoas famosas que moraram em Hampstead

Kingsley Amis, escritor


W. H. Auden, poeta
William Blake, poeta e pintor (mais conhecido como poeta)
Richard Burton, ator
Elizabeth Taylor, atriz
Agatha Christie, escritora
John Constable, artista
Dame Judi Dench, atriz
Charles Dickens, escritor
Daphne Du Maurier, escritora
George Du Maurier, cartunista e novelista
Sigmund Freud, psicanalista
Thomas Hardy, escritor
William Hogarth, artista
Aldous Huxley, escritor
John Keats, poeta
D. H. Lawrence, escritor
A. A. Milne, escritor
Florence Nightingale, reflrmadora da enfermagem
George Orwell escritor
George Romney, artista
Dante Gabriel Rossetti, artista e poeta
Peter Sellers, ator
Sting (Gordon Summer), músico
H. G. Wells, escritor

Capítulo 7
A pior pessoa do mundo

Nós estávamos no cemitério atrás da igreja em Church Row. A neve caía e


tudo à nossa volta estava branco e parecia mágico.
— Você está congelando — disse Luke, tirando o cachecol de lã vermelho
e enrolando no meu pescoço. Aí ele pegou as pontas do cachecol e me
puxou em direção a ele. Dava para sentir o calor do corpo dele através do
seu casaco. Ele acariciou gentilmente as maçãs do meu rosto e deslizou a
mão até meu queixo, inclinando a cabeça em direção à minha. Olhei para
os olhos dele, enquanto seu rosto vinha em direção ao meu, e nossos
lábios...
— ARGGHHHHHHHHHHHHHHHHHH!
Sentei-me, suando frio. Onde eu estava? Oh. Casa. Cama. Calor. Eu me
deitei e puxei o edredom até o pescoço. Meu Deus. Sonhei que estava
beijando Luke. Meu Deus. Resolvido, não é? Estava tudo sob controle?
Peguei uma espécie de vírus? É, até parece. Posso ter minha mente
consciente sob controle, mas meu inconsciente claramente tinha idéias
próprias. E essas idéias estavam ficando próximas e muito íntimas do
namorado da Paola. Com certeza sou a pior pessoa do mundo.
Depois, na escola, eu me senti ainda pior. Paola foi tão legal comigo, mas
por que não seria? Ela não sabia que eu estava sonhando com beijos
obscenos com o namorado dela.
— Luke disse que você se divertiu no passeio — ela disse no intervalo,
enquanto voltávamos para o saguão.
— Sim. A gente se divertiu. Tinha tanta coisa para aprender. Temos um
monte de trabalho para fazer. Eu sabia que algumas pessoas famosas
tinham morado na região, mas não tantas quanto nós descobrimos.
Paola enrolou o braço dela no meu.
— Luke acha que você não gosta dele — ela disse.
— O quê? Por quê? O que pode ter dado essa impressão a ele?
— Não sei — ela encolheu os ombros. — É que, às vezes, você é um pouco
fria com as pessoas. Um pouco indiferente ou algo do tipo.
— Não. Não é isso. Eu sou... sou tímida... — na verdade, já tinha ouvido
algumas pessoas dizerem que sou indiferente, mas nunca foi de propósito.
É que quando não conheço as pessoas muito bem, fico quieta.
Mas não achei que tivesse sido assim com Luke. Achei que tínhamos nos
dado muito bem. Até demais.
— Foi o que ele disse? Que eu era indiferente?
Paola confirmou.
— Algo como você ter fugido assim que o passeio acabou, como se não
quisesse andar com ele mais do que o necessário. Disse que você é um
pouco misteriosa e não revela nada a seu respeito. Perguntou muito sobre
você.
Izzie levantou uma sobrancelha.
— Talvez ele goste dela. Cuidado, Paola, você tem concorrente.
Paola riu, então fiz o mesmo, talvez de forma exagerada.
— Nããão. É... Até parece... — eu disse.
— Mas eu acho que ele gosta de você, TJ. Disse que achou você muito
inteligente. Eu disse a ele que você é a pessoa mais inteligente que
conheço.
— Nossa, obrigada — fiquei sem palavras. E me senti um pouco magoada.
Ele gosta de mim porque sou inteligente. Mas namora a Paola porque é
bonita.
Paola pôs a mão no meu braço.
— TJ, por mim, seja legal com o Luke. Quero dizer, eu, a Iz e a Lucy
sabemos que você é fabulosa, mas, quando as pessoas não a conhecem, elas
podem se sentir intimidadas pelo seu jeito meio frio e indiferente. Tente
fazer um pouco mais de esforço para ser amigável.
Engoli em seco. Eu, distante? Fria? Rá! Se ela soubesse o tumulto que
aconteceu na minha cabeça algumas vezes. E ela querendo que eu seja mais
amigável com Luke, com certeza não tinha a menor idéia do que estava
pedindo. E que incrível! Luke achou que eu não gostava dele. Achei que
estava escrito na minha testa que eu gostava.
— Acho que é porque você é legal que Steve gosta de você — disse Lucy.
— Disse que você não é como outras garotas adolescentes, que gritam em
vez de falar e estão sempre histéricas.
— Verdade? — perguntei. "É estranho como as outras pessoas te vêem e
como você vê a si mesma , pensei. Essa pessoa que estavam descrevendo
não parecia nem um pouco comigo. Fria? Indiferente? Distante? Estou mais
para completamente mental. Garota mental da Mentalândia, sou eu mesma.
— Steve disse que ia ajudá-la — disse Lucy, envolvendo seu braço no meu
— a tirar fotos.
— Ah, sim — resmunguei. Oh, Deus. Steve. Senti que o tinha traído. Eu
devia estar sonhando em beijá-lo, e não em beijar o Luke. Por um
momento, senti muita saudade de falar com a Hannah. Somos amigas há
muito tempo e já conversamos sobre tudo. Ela saberia o que dizer. Como
lidar com isso. Olhei para Lucy, Izzie e Paola. Achei que podia falar com
elas sobre tudo, mas não podia mencionar isso de jeito nenhum. Elas me
odiariam para sempre e pensariam que eu era a pior pessoa do mundo, e
talvez eu fosse. Tipo: "E aí, gente? Adivinhem o que eu sonhei ontem à
noite? Estava beijando Luke e acho que gosto dele". Trata-se de uma regra
não dita: você deve manter as mãos longe do namorado das outras pessoas.
Depois da escola, Paola e Lucy iam para Highgate para encontrar Luke e
Tony, e elas me perguntaram se eu queria me juntar a eles e levar o Steve.
"De jeito nenhum", pensei: muitas pessoas intuitivas num espaço pequeno.
Apesar do meu comportamento aparentemente tranqüilo, um deles ia
acabar descobrindo o que estava passando pela minha cabeça, então dei
uma desculpa e fui para casa.
"Tenho que me manter ocupada', pensei, já no ônibus. Fique fora do
caminho de Luke. Nunca fique sozinha novamente com ele. Seja legal com
ele para deixar a Paola feliz. E tudo correrá bem.
Em casa, fiquei elaborando urna lista das pessoas famosas que moravam
em Hampstead, aí peguei uma cópia do mapa da região que eu tinha feito
antes na escola e passei a noite inteira colocando estrelas no mapa para
mostrar onde todas elas tinham morado. " Luke vai gostar disso", pensei,
visualizando meu trabalho. Tinha ficado muito bom. Os nomes das pessoas,
o que elas tinham feito e o período em que elas tinham morado em
Hampstead de um lado. O mapa com as estrelas mostrava onde eles tinham
morado no meio, com os nomes e endereços na parte lateral direita. Ficaria
ótimo quando fosse ampliado.
Num quadro ao lado, eu colocaria as fotografias das casas em que algumas
delas tinham morado, que Steve tiraria para mim. É. ficaria legal. Sim.
Legal. Como eu. Não.

Caixa de salda (1)


De: gatacomcerebro@psnet.co.uk
Para: hannahnutter@jastmail.com
Data: 1º de dezembro
Assunto: Garotos. Urgente.

Querida Hannah,
Por favor, responda esta mensagem assim que você recebê-la. Não. Na
verdade, leia-a primeiro e depois a responda. Haha.

Na verdade, não tem graça. Não há nada de engraçado na minha situação.


Acho que devo ser a pior pessoa do mundo. Gosto do namorado da Paola,
Luke. Sonhei que o estava beijando ontem à noite e agora me sinto muito
mal. E a Paola tem sido muito fofa, dizendo para eu fazer um esforço para
ser mais amigável com ele. Mais amigável?!!!

O que devo fazer? Devo desistir do projeto? Eu queria muito mesmo que
você estivesse aqui.
Escreva de volta logo.

Beijos, TJ

Obs.: Falando nisso, você acha que sou indiferente ou distante?

E-mail: Caixa de entrada (1)


De: hannahnutter@jastmailcom
Para: gatacomcerebro@psnet.co.uk
Data: 2 de dezembro
Assunto: Garotos. Urgente

Minha pequena TJ,


Calma. Eu gosto de um monte de namorados de amigas. Todo mundo
gosta. Qual é o problema? É completamente normal especialmente se eles
forem namorados do tipo bonitos, gatos. O que você podia fazer? Tirar os
olhos, ou algo loucamente bíblico? É muuuuuuuuuuito típico de você ficar
incomodada com algo assim, e isso ocorre porque você é uma boa pessoa,
com uma boa consciência. E daí que sonhou com isso? Não significa que o
beijou na vida real Então, meu conselho é: relaxe. Relaxe mesmo. Não
desista do projeto. Por que você não conta para a Paola? É sempre bom
ouvir uma amiga dizer que valoriza seu namorado, e aposto que vocês vão
se divertir com isso.

Com muito carinho e estou com saudades também, Hannah

Obs.: Não, eu não acho que você é indiferente, mas sei que outras pessoas
da escola, quando eu estava aí, ficavam intimidadas com o fato de você ser
tão inteligente. E você é tímida às vezes, então, talvez, as pessoas
que não a conhecem tomem isso como indiferença, ou achem que é
entediada porque não diz nada. São coisas que dizem. Como diz a música:
"Não vá mudar...”

Caixa de saída (1)


De: gatacomcerebro@psnet.co.uk
Para: hannahnutter@fastmail.com
Data: 2 de dezembro
Assunto: Garotos. Urgente.

De jeito nenhum vou contar para a Paola. Embora eu a ame, ela tem uma
boca grande. Se eu disser a ela que gosto do Luke, sim, nós provavelmente
nos divertiremos, aí ela irá contar para Izzie e Lucy. E para Luke. Eles já
conversaram sobre mim. E, se ela disser a ele, eu ficarei muito encabulada
de trabalhar com ele no projeto. Então, de jeito nenhum. Vóu tentar me
acalmar.

Relaxar. Relaxando. Relaxada.

Com muito carinho, a Rainha do Gelo de North London. Nossa, está frio
aqui. E não só porque estou esfriando a cabeça. É por causa desse
inverno.

Capítulo 8
Cabulando o trabalho

Na noite de quarta-feira, senti que eu tinha me reestruturado. Eu ia ser uma


profissional, competente e imparcial. Eu seria aquela pessoa que os outros
tinham visto em mim. Distante, fria. Ia conseguir fazer isso, sem deixar que
nenhum sentimento bobo interferisse.
Luke, Sian e Olívia já estavam no nosso local de trabalho quando cheguei
para a reunião do projeto e logo expusemos tudo o que tínhamos
descoberto. Obviamenre, Sian fez seu dever de casa e nos mostrou as
brochuras que ela rinha recolhido durante o final de semana.
— E há uma outra visita guiada — ela disse, olhando esperançosamente
para Luke —, só que dessa vez é na região de Highgate. Domingo à tarde,
às 13h45.
— Excelente — disse Luke. — Você pode fazer?
Sian fez que sim com a cabeça.
— Está bem, você e a Olivia fazem essa visita — ele continuou. — De
fato, há uma área grande para cobrirmos, então, acho que é melhor se vocês
duas se concentrarem em Highgate, e eu e a TJ nos concentramos em
Hampstead.
— Ah, não me importo de fazer Highgate — eu disse —, se Sian quiser
fazer Hampstead com você.
Luke balançou a cabeça e olhou para as minhas listas e para os meus
mapas.
— Depois desse seu ótimo começo? De jeito nenhum. Na verdade, TJ, eu
queria dar uma olhada na casa de D. H. Lawrence, em Vale of Health, se
não tiver problema para você.
— Hum, claro.
— Está bem. Sian, Olivia, agüentem firme aqui, que eu e a TJ vamos dar
uma passada lá. Há muito para vocês fazerem. Escolham os lugares que
querem destacar em Highgate.
— Sim, senhor — disse Olivia, zombando com uma continência.
Sian fez que sim com a cabeça, mas não parecia estar muito feliz.
— Mas eu queria discutir o ângulo que vamos adotar na pesquisa — ela
disse, apontando para tudo que ela tinha pesquisado.
— Nós vamos fazer isso — Luke disse, colocando seu casaco. — Eu ligo
para você e a gente se reúne, está bem?
Dessa vez, ela pareceu mais feliz quando concordou.
— Na verdade — disse Luke —, vamos acelerar um pouco as coisas. A
gente se encontra de novo aqui amanhã à noite?
— Está bem — disse Sian. — Ótimo.
— Na verdade — Luke continuou —, nós deveríamos nos encontrar quanto
mais vezes for possível, até resolvermos as coisas. Ternos que acelerar isso,
deixar para lá nossos outros deveres de casa, até que saibamos o que vamos
apresentar. Ai, podemos recuar e relaxar um pouco.
Creio que Sian achou que ele estava falando de reuniões somente com ela e
pareceu estar contentíssima, mas Luke virou-se para Olívia:
— Você está nessa?
Olívia fez que sim.
— TJ?
— Vou fazer o meu melhor.
Pobre Sian. Sua expressão tinha desanimado de novo. Parecia que ela
nunca ia ficar a sós com Luke.

Fornos até Vale of Healm, e Luke estacionou o carro no alto da alameda. É


um lugar extraordinário, logo depois de sair de East Heam Road, e muitos
habitantes locais nem sequer sabem que existe. É corno urna vila do
campo, escondida no fim de Hampstead Heam.
Nós logo encontramos a casa em que D.H. Lawrence morou, pois havia a
tradicional placa azul do lado de fora.
— Eu não sabia que era urna propriedade privada — disse Luke,
desapontado, olhando para a casa com terraço. Pela bicicleta no jardim
frontal e pelo computador na janela lá de cima, essa casa com certeza era
habitada.
— Eu também não — disse. — Achei que seria corno aquela de Keats
Grove, que é um santuário em homenagem a Keats. Ah, bem, deixa pra lá.
Vou pedir para Steve fotografar mesmo assim.
— Acho que podemos ver a Keats House — suspirou Luke. Então, abriu
um sorriso e olhou para o relógio. — Ou nós podíamos cabular o trabalho.
— Cabular e fazer o quê?
— Cinema.
Meu primeiro impulso foi dizer "não", mas aí me lembrei do que a Paola
tinha dito sobre ser mais amigável.
— Sim, claro. Onde?
— Você nunca foi ao cinema Everyman em Hampstead?
Balancei a cabeça.
— Passei por lá algumas vezes, mas nunca entrei. Nós sempre vamos
naquele que fica perto de Finchley.
— Então, se prepare, pois você vai gostar. Por minha conta. Eu ganhei
umas gorjetas na semana passada, trabalhando no restaurante dos meus
pais.
— Isso é incrível — eu disse, enquanto a lanterninha indicava nossos
lugares vinte minutos depois.
Luke parecia muito satisfeito.
— Eu sei.
Ele pagou o preço mais caro, para podermos sentar nos assentos de cima,
no balcão privativo, onde havia algumas poltronas de couro estofadas e
sofás.
— Sentem onde quiserem — disse a lanterninha. — Está tranqüilo hoje.
— Onde a senhorita gostaria de sentar? — perguntou Luke, depois que ela
foi embora.
Eu me estatelei numa cadeira enorme nos fundos.
— Qualquer lugar é ótimo — eu disse.
— Este é o meu favorito — disse Luke, sentando num sofá na segunda fila
dos fundos.
Eu me sentei ao lado dele. Era fantástico. Muito luxuoso, e parecia que
éramos as únicas pessoas no cinema, com um filme só para nós. Alguns
minutos depois, as luzes se apagaram e começaram os trailers. Luke se
enrolou feliz no seu canto do sofá.
— Legal, não é? — ele disse.
— Demais — eu concordei.
Quando o filme começou, achei difícil me concentrar. Eu estava prestando
muita atenção na proximidade com Luke. Numa hora, ele se sentou e
nossos joelhos se tocaram e a pressão da perna dele contra a minha já era
suficiente para revirar minha cabeça. Eu movi minha perna e, alguns
minutos depois, nossos braços se tocaram e parecia que o calor dele estava
me queimando. Ai Luke tirou os sapatos e se estirou.
— Recline-se — ele sussurrou. — Aproveite o máximo.
Eu fiz como ele sugeriu e ele colocou seus pés sobre o meu joelho e sorriu
para mim.
— Paraíso, não é?
— Ãhãn... — sussurrei. — P... Paraíso.
”Bem, Paola”, eu pensei, olhando para Luke enrolado confortavelmente
como um gato, "pelo menos estou fazendo como você me pediu". Não dá
para ser mais amigável do que isso!

Depois do cinema, Luke sugeriu que tomássemos um cappuccino no bar lá


de baixo. Mais uma vez, meu instinto foi dizer "não", mas eu tinha saído
correndo da última vez que tomamos café e eu não queria que ele falasse
isso para a Paola de novo. E eu me lembrei do que Hannah tinha escrito.
Relaxe.
Todo mundo gosta do namorado da amiga, especialmente se ele for bonito,
gato. Bem, Luke certamente o era. E nós nos dávamos bem e tínhamos
muito em comum. Decidi relaxar e curtir o momento. Não tinha nada de
errado com isso.
Quando Luke foi ao bar, me sentei numa das poltronas e olhei ao redor.
"Fantástico", pensei, "eu gosto muito daqui." A atmosfera era uma mistura
de sofisticação e boemia, com iluminação fraca, paredes escuras, sofás e
poltronas de veludo, e havia quadros com fotografias em preto e branco de
filmes antigos de Bollywood, como é chamada a indústria de filmes da
índia. Eu me senti muito adulta, sentada lá com as outras pessoas, bebendo
seu vinho e beliscando tigelas com azeitonas.
— Muito bacana — sussurrei para Luke, quando ele voltou com as bebidas.
— Vejo que eles servem azeitonas aqui, e não a velha e tradicional pipoca.
Umas garotas entraram, olharam para Luke e depois para mim, com inveja.
Eu não pude evitar de me sentir muito bem em ser a garota que estava com
ele.
Assim como no passeio, a companhia de Luke foi interessante, e nós
conversamos sobre filmes de que gostávamos e sobre aqueles que
queríamos ver. Justo quando eu estava começando a relaxar e a me divertir,
Luke ficou em silêncio por alguns minutos e olhou profundamente para
mim. Ninguém nunca tinha olhado dessa forma para mim, tipo, ele estava
realmente olhando para dentro de mim. Senti que eu estava ficando cada
vez mais vermelha.
— É gostoso estar com você, TJ Watts — ele disse. finalmente. — Fico me
perguntando o que teria acontecido se eu a tivesse conhecido antes da
Paola.
— Ãhn... É...
Isso era eu fora de mim. Quero dizer, o que deveria fazer? Ele tinha me
tirado completamente do eixo.
— Ah... É... Não sei, ahh. Você quer outro café? Não? Ahh. Eu quero. E lá
estava eu em pé, andando em direção ao caixa antes que ele dissesse mais
alguma coisa que mexesse com a minha cabeça.
Quando retomei, Luke não me pressionou por uma resposta. Olhou para o
relógio dele, enquanto eu bebia as pressas meu café escaldante, e começou
a olhar para mim de novo. Meu coração começou a bater muito forte.
— Acho que é melhor eu ir andando — eu disse, levantando.
Assim como no Coffee Cup, no domingo, ele ficou desapontado, mas não
fez nenhuma objeção.
— Claro — ele disse, levantando-se e colocando seu casaco. — Sim, eu lhe
dou carona.
Enquanto andávamos em direção ao carro, havia muito trânsito e, por um
breve momento, quando cruzamos a rua, ele pegou a minha mão. Corri com
ele para a calçada do outro lado da rua e, quando olhei para a minha
esquerda, notei que alguém estava nos olhando. Era Lal. Lal, assim como
Steve, era irmão da Lucy. E estava com um olhar zombeteiro. Aí ele se
virou abruptamente e dobrou a esquina.

Caixa de saída (1)


De: gatacomcerebro@psnet.co.uk
Para: hannahnutter@fastmail.com
Data: 3 de dezembro
Assunto: Socoooooooorro!!!!

Querida Hannah,
Nossa, estou numa encrenca: a Paola disse para eu ser mais amigável
então, eu fui, e Luke sugeriu que cabulássemos o trabalho e flssemos ao
cinema. Fui e ele segurou a minha mão quando cruzamos a rua, e Lal
Lovering nos viu, e Luke me perguntou o que eu acho que teria acontecido
se ele tivesse me conhecido antes da Paola. Meu Deus, o que ele quis
dizer? Talvez nada, mas ele pegou na minha mão (pela segunda vez, a
propósito). Isso significa alguma coisa? Talvez não, pois ele é italiano e
acho que é um tipo de pessoa naturalmente calorosa, talvez eu esteja
imaginando coisas. Oh, Deus, Hannah, volte para a Inglaterra. Eu não
tenho ninguém com quem conversar aqui e isso estd me levando à loucura.
Estou começando a achar que a mudança para Devon pode ser boa, no
final das contas.

Diga-me o que FAZEEEEEEER! Eu preciiiiiiiso de você.

Com carinho, da sua amiga,


Pessoa maluca

E-mail: Caixa de entrada (1)


De: hannahnutter@Jjastmailcom
Para: gatacomcerebro@psnet.co.uk
Data: 4 de dezembro
Assunto: Socoooooooorro

Hahahahaha. Minha pequena desesperada. Que estado divertido você está


a viver aí em terras britânicas. Primeira coisa. Respire fundo. Segunda
coisa. Respire fundo de novo.
Parece que esse tal de Luke está te paquerando. Está testando você, com
certeza. Sim, o lance de segurar a mão pode ter sido inocente, mas acho
que não se tratou disso. Pense a respeito. Nos seus sonhos mais malucos,
você teria perguntado a ele o que acha que teria acontecido se você o
tivesse conhecido antes do Steve? Não. Exatamente. Compreendi? Esse
cara parece ser problema. Tenha mucho, mucho cuidado.
Tente evitar situações em que esteja sozinha com ele. E não revele nada,
pois aí ele terá pegado você.
Ainda está abafado aqui. No momento, não estou gostando de ninguém, o
que é muito legal, pois tem um grupo de solteiros que só sai junto.

Com muito carinho, beijos,


Titia Hannah

Capítulo 9
Semana dos Infernos

— Lucy telefonou — disse mamãe, assim que entrei pela porta, depois de
ter ido ao cinema com Luke.
— Quando?
— Faz uns cinco minutos.
— Ela deixou recado?
— Ela só falou para você telefonar assim que chegar.
— Como ela estava?
— O que você quer dizer? Ela estava como a Lucy. Por quê? Está
acontecendo alguma coisa?
— Não.
Corri pelas escadas e olhei para o telefone. Como eu ia sair dessa? Mojo
estava raspando a porta, então, deixei-o entrar, e ele pulou na ponta da
minha cama, onde se deitou e abanou o rabo.
— Nossa, eu queria muito que você falasse, Mojo — eu disse, quando ele
se virou e eu fiquei coçando a barriga dele. — Vamos, fale comigo. Mojo,
eu estou numa enrascada.
Mojo se levantou e me deu uma lambida enorme no rosto. Pela sua
expressão ansiosa, ele estava fazendo o seu melhor, mas decidi perguntar a
alguém que falasse
apropriadamente a minha língua. Mandei um e-mail para Hannah, deitei-
me na cama e olhei para o teto. Dois minutos depois, o telefone tocou de
novo. Deixei tocar e não atendi na minha extensão.
— TJ, é para você — mamãe disse das escadas. — É a Lucy.
Respirei fundo e peguei o telefone.
— E aí, Lucy? — eu disse, na minha voz mais animada.
— E aí, o que está acontecendo? — perguntou Lucy.
Lal obviamente não tinha perdido tempo para contar o ocorrido.
— Ah, o de sempre, o de sempre — eu respondi, tentando evitar o tom da
voz dela. Eu sabia exatamente o que ela queria dizer por "acontecendo".
— Você e Luke — disse Lucy. — Lal me disse que viu vocês.
— Ah, isso.
— Sim, isso. Lal disse que você e Luke estavam de mãos dadas.
— Na verdade, não.
— Bem, ou vocês estavam ou não estavam.
— Estávamos, mas não de mãos dadas de mãos dadas, se você entende o
que eu quero dizer. Ele pegou minha mão quando fomos atravessar a rua, é
isso. Segurança de trânsito. Ele deve ter sido um escoteiro, treinado para
ajudar pessoas idosas a atravessarem a rua. Não está acontecendo nada.
Lucy, você sabe que eu nunca...
— Você gosta dele?
— Nãããão. De jeito nenhum. É claro que não. Quero dizer, sim, ele é
bastante atraente, mas não faz meu tipo. E, de qualquer forma, Lucy, você
sabe, eu nunca faria isso à Paola. Ou ao Steve. Ei, Lucy, pelo amor de
Deus, vocês são minhas amigas.
— Bom, tudo bem. Só estou conferindo, porque sei que Steve e Paola
ficariam desolados se você estivesse mantendo um relacionamento com
Luke.
Eu estava quase chorando. Realmente queria contar tudo para ela, mas não
ousaria, pois podia me expressar mal e tornar as coisas ainda piores.
— Mas eu não estou. Sério. Lucy, você tem que acreditar em mim.
— Então, onde você esteve?
— No cinema. Luke queria cabular o trabalho e eu ia dizer que não podia
ir, mas Paola disse para eu ser mais amigável com ele. Você se lembra?
Você estava lá. Eu nunca, nunca, nunca tiraria o namorado de ninguém.
Especialmente da Paola. Você tem de acreditar em mim.
Houve uma pausa de alguns segundos.
— Eu acredito. Desculpe. Deve ter sido só por causa do Lal, você sabe
como ele é, chegou aqui todo alvoroçado com o que tinha visto. Você sabe
que ele tem uma queda pela Paola. Ele provavelmente estava torcendo para
que você fugisse com Luke, para que ele pudesse entrar em cena e
confortar a Paola. Desculpe. Eu devia saber que você era inocente.
Depois de desligarmos, eu me deitei na cama. "Pronto", pensei. "Menti para
uma das minhas melhores amigas." Era verdade que eu não seria desleal
com a Paola e nada estava acontecendo de verdade. Mas estava na minha. E
eu gostava de Luke. Tipo, sou louca por ele. Oh, diabos. Que semana. A
semana dos infernos. E era só quarta-feira.

Na escola, na quinta-feira, Lucy estava normal, radiante como sempre, e


Paola não mencionou o episódio das mãos dadas, então presumi que Lucy
tinha achado melhor manter segredo. Fiquei aliviada que nossa amizade
continuasse da mesma forma. Só queria que tivesse acontecido o mesmo
com a minha cabeça.
Por mais que tentasse, eu não conseguia parar de pensar em Luke a todo
instante, na forma como ele como ele me olhara quando pergunto o que
poderia ter acontecido se ele tivesse me conhecido antes da Paola. Em
como foi quando ele tirou os sapatos e colocou os pés sobre meus joelhos,
como se fôssemos bons e velhos amigos. Em como tinha sido quando ele
pegou minha mão ao atravessarmos a rua. E não conseguia parar de
imaginar como seria beijá-lo. Só de pensar nisso, eu já tremia dos pés à
cabeça. Tentei tirá-lo da cabeça, mas não dava certo, e eu não conseguia
evitar a ansiedade pela reunião depois da aula, para vê-lo novamente.
Entretanto, na reunião do projeto, ficou claro que Luke não estava sentindo
a mesma coisa. Ele me deixava no vácuo, isto é, falava comigo, dizia o que
eu tinha que fazer, mas não olhava para mim. Não direito. Nem uma vez.
Era como se ele não conseguisse olhar nos meus olhos. Eu me perguntava
se talvez ele se sentisse mal por ontem à noite, sentisse que tinha sido
desleal com a Paola. Fiquei desapontada, por um lado, mas, por outro, me
senti aliviada. Fez com que fosse mais fácil lidar com isso e, mais uma vez,
eu disse a mim mesma para superá-lo e segurar a barra.
Quando cheguei à reunião na sexta-feira, Luke já estava lá e foi totalmente
o oposto do que tinha sido no dia anterior. Ele olhava diretamente para
mim, começou a reclamar do seu pescoço e pediu que eu fizesse uma
massagem. No começo, eu ia dizer "não", mas que justificativa eu poderia
dar? Que eu não ousaria tocá-lo? Ele podia achar que sou maluca ou um
caso triste, como Sian, com uma paixão colegial patética por alguém que
não pode ter. Ou talvez eu devesse ter sido transparente e ter dito que não
me sentia à vontade por causa da Paola. Mas aí ele podia pensar que sou
uma pessoa pudica. Ele só tinha pedido uma massagem no pescoço. Ele
não tinha me pedido para beijá-lo. E, se qualquer outra pessoa tivesse me
pedido uma massagem no pescoço, eu não teria visto problema algum. Eu
teria simplesmente feito.
Minha preocupação logo desapareceu, quando comecei a massageá-lo. Só a
sensação de tocar nos ombros e no pescoço dele era incrível, e ele
suspirava, como se estivesse gostando também. Sei que não estava
imaginando que o ar ficara pesado e, uma hora, ele deixou a mão sobre a
minha por alguns segundos, aí inclinou-se para trás, encostando-se em
mim, e ficamos assim por um tempo. Nada foi dito. Tive essa sensação
estranha, uma mistura de tristeza e intimidade, pois eu sabia que não
podíamos ir muito além de uma inocente massagem no pescoço. Tenho
certeza de que ele estava sentindo o mesmo, porque disse uma coisa
estranha do nada:
— Não dito, mas não desconhecido — ele disse.
E isso foi tudo. Entendi o que ele quis dizer. "É só uma massagem no
pescoço, é só uma massagem no pescoço", fiquei dizendo a mim mesma,
mas parecia muito mais do que isso. Porém, quando ouvimos Sian e Olívia
se aproximando, ele saltou rapidamente e fingiu estar ocupado. Ele não
teria feito isso se fosse inocente, teria?
Talvez meus sentimentos não fossem tão unilaterais como pensei. "O que
diabos está acontecendo?", me perguntei pela centésima vez naquela
semana.

No sábado, íamos ter uma nova reunião rápida, mas me atrasei, pois meu
ônibus ficou preso no trânsito. Espiei pela janela antes de entrar e, dessa
vez, quando cheguei, Sian estava sozinha com Luke. Eu mal podia
acreditar no que estava vendo, pois ela estava massageando o pescoço dele.
Senti nojo ao pensar que ele tinha pedido para outra garota fazer isso, e
parecia que ele estava gostando. Olívia chegou um pouco depois de mim e
me viu olhando pela janela. Quando ela os viu juntos, olhou para mim e
levantou uma sobrancelha, como que dizendo: "O que está acontecendo
aqui?". Eu me perguntava o mesmo e, durante a reunião, fiquei muito
confusa. Achei que existia algo especial entre mim e Luke. Teria sido
imaginação da minha parte. Eu não tinha dúvidas de que gostava muito de
Luke e, embora não tivesse intenção de de que isso se concretizasse, não
podia negar esses sentimentos.
Deve acontecer muito com as pessoas. Você conhece uma pessoa, começa
a namorá-la, aí conhece outra pessoa e começa a gostar dela. Não quer
dizer que você deixou o primeiro namorado. Seria tudo isso fruto da minha
imaginação? Seria eu igual a Sian? Mais uma garota numa longa lista de
garotas que eram apaixonadas por Luke.
Eu queria muito poder falar sobre isso com as minhas amigas,
especialmente com a Paola. Se se tratasse de qualquer outro garoto, ela
seria a pessoa certa com quem conversar, já que o assunto garotos e sua
especialidade. Mas por ser o Luke, o namorado dela, eu me lembrava pela
milionésima vez que não podia mencionar o assunto. Eu me sentia muito
mal e confusa. Não queria ter nenhum dos dois sentimentos, mas, de vez
em quando, o olhar de Luke cruzava com o meu por alguns segundos, e o
olhar dele era muito carinhoso. Meu estômago revirava e dava
cambalhotas. Havia algo ali. Havia. Não podia ser minha imaginação,
podia? Por um breve momento, senti vontade de bater nele e gritar: "Não
me olhe assim! Pare de brincar com meus sentimentos". Mas ele deve ter
pensado que eu era louca. E Sian e Olivia certamente pensaram! Uma vez,
Olivia notou que eu e Luke estávamos nos olhando, e desviei o olhar
rapidamente. "Tenho que dar o fora daqui rápido", disse a mim mesma,
mas parte de mim queria ficar e olhar para os olhos dele mais uma vez.
Depois que a reunião terminou, por mais que eu tentasse, não consegui ir
embora quando Sian e Olivia partiram. Fiquei remexendo no meu casaco,
revirei meus papéis, arrumei e desarrumei minha mochila até que,
finalmente, Luke olhou.
— Você queria alguma coisa? — perguntou Luke, arrumando suas coisas.
Eu me senti desconfortável. Devia ter ido. Partido. Pegado o ônibus. Senti
como se tivesse vestido o corpo errado. As roupas erradas. Minha cabeça
não combinava com o resto de mim.
— É...Nós precisamos conversar... — comecei e, quando Luke virou os
olhos, lembrei que Paola tinha dito que essas eram as três palavras que os
garotos mais temiam. — É... Na verdade não é nada — continuei tentando
manter minha voz num tom leve. — Bem... Como está o seu pescoço?
Luke girou o queixo.
— Melhor.
— É, notei que você pediu a Sian uma massagem no pescoço — a frase
saiu antes que eu pudesse evitar e sei que meu tom foi de ciúmes.
Luke parou o que ele estava fazendo, suspirou profundamente e olhou para
mim.
— Você não vai ficar estranha comigo, vai?
Senti meu coração afundando.
— O que você quer dizer?
— Sian. Massagem no pescoço. É tudo inocente, sabe?
— Sim, eu sei.
— Ótimo. Porque você é inteligente o suficiente para não ver nas coisas o
que não existe.
— Sim, claro — a atmosfera ficou pesada, tudo errado. Estava me
torturando. Carente. Permanecendo junto de quem não me desejava, na
esperança de mais um olhar, uma palavra de encorajamento, qualquer coisa
que mostrasse que eu não estava sozinha no que sentia.
Luke colocou a jaqueta.
— Então nos vemos.
— É. A gente se vê.
"Arrghhhhh", pensei, vendo-o se afastar. Não ver nas coisas o que não
existe? Ele estava se referindo a nós ou a Sian e ele? Diabos. Eu queria
muito perguntar, mas aí podia fazer papel de muito boba. Desesperada.
Grudenta. E sei o quanto os garotos detestam isso. E, além do mais, tinha
que pensar em Steve e Paola. Luke pode ser totalmente inocente e, se eu
falasse muito sobre meus sentimentos, ele podia pensar que eu era a pior
namorada do mundo e a pior amiga. "Não revele nada", Hannah tinha dito.
Estava enlouquecendo e precisava desesperadamente de alguém com quem
pudesse conversar. Mas quem? Paola estava fora da lista por causa de
Luke. Lucy estava fora da lista por causa de Steve. Mojo não servia e
enviar e-mails para Hannah não era suficiente. Ela estava longe demais. Eu
precisava de uma pessoa que conhecesse todos os envolvidos. Alguém que
pudesse me dar um bom conselho.
"Pare de parecer uma boba”, eu pensei. Você não tem nada a perder.
Decidi me arriscar: peguei meu celular e telefonei.

As três palavras que os garotos mais temem:


Nós precisamos conversar.

Capítulo 10
Praticantes de Ioga

— E aí, doutora? — disse Izzie com um sorriso, ao me receber na casa


dela, e em seguida subimos as escadas e fomos para o quarto dela.
— Ah, nada — eu disse, quando chegamos ao quarto dela, e me joguei na
cama.
— Quer almoçar alguma coisa?
Balancei negativamente a cabeça.
— Não estou com fome.
Izzie sentou-se à mesa.
— Você disse que precisava conversar comigo. Parecia urgente.
— É. Não. Quero dizer... Só para nos atualizarmos.
Como estão as coisas? Sabe, a sua parte do projeto?
Izzie abriu um sorriso maroto.
— Vão bem. Na verdade, estou trabalhando a todo o vapor com Trevor.
Aos poucos, ele está pensando da mesma forma que eu. Disse a ele que de
jeito nenhum podíamos nos concentrar no desenvolvimento da cristandade
da região. Agora estamos pesquisando todo tipo de coisa. Todas as
religiões. Caça às bruxas, misticismo, mágica... Ele está começando a
gostar. Eu até o convenci a cortar o cabelo num estilo decente.
— Da próxima vez, você irá convencê-lo a fazer uma tatuagem — eu disse,
rindo.
— Não é uma má idéia. Mas tem sido bom. Descobrimos uma série de
coisas interessantes, tipo, você sabe aquele lugar em Highgate, Pond
Square?
Fiz que sim com a cabeça.
— Bem, não há mais nenhuma lagoa lá, mas havia. Duas. E uma delas era
usada para afogar mulheres...
— Bruxas?
— Não. As mulheres que importunavam seus maridos! Vou sugerir que
eles tragam a tradição para os pais que importunam seus filhos. Minha mãe
seria freguesa.
Eu ri. A relação de Izzie com sua mãe era tempestuosa na melhor das
situações. Elas eram opostos totais. A mãe dela gostava de limpeza, era
organizada e super convencional. Izzie era atirada, curiosa e tinha a mente
aberta. Geralmente, elas colidiam quando Izzie descobria uma nova moda,
religião ou terapia e decidia
mudar sua vida pela milionésima vez.
Izzie trouxe uma cadeira para perto da cama.
— Você sabe que, se precisar falar, TJ, eu terei prazer em ouvi-la, e não
somente das coisas do projeto.
— Eu sei... Eu... - queria conversar com ela desesperadamente. Pôr tudo
para fora. Mas ainda existia uma parte em mim que temia que ela me
odiasse. Izzie e Lucy se conheciam havia muito tempo, desde o jardim-de-
infância, e eram as melhores amigas desde então. E ambas eram amigas da
Paola havia mais tempo do que eu. E havia o fato de que Steve era o irmão
da Lucy, e ela o protegia muito. Eu não queria ficar do lado errado com
relação a Lucy, já que o lado errado incluía a Izzie. Mas, por outro lado,
Izzie também era minha amiga e, à parte todas as suas idéias malucas, ela
era boa em dar conselhos.
— Nossa, é tão complicado... — comecei.
— Experimente — disse Izzie.
— Não é nada sério, é que... Ah... Não sei... Não sei por onde começar...
— Alguma coisa está incomodando você, e pôr para fora é sempre melhor
do que guardar.
Decidi confiar nela. Eu ia sofrer um colapso mental se não confiasse.
— Se eu contar para você, você promete não contar para mais ninguém?
— Prometo.
— Está bem. Eu... Eu acho que estou ficando completamente maluca. Sabe,
aconteceu isso recentemente e não consigo parar de pensar nisso, e não
quero pensar nisso, mas não consigo evitar. E quanto mais tento me conter,
mais penso nisso...
— Ah — disse Izzie. — "Isso". Um garoto.
Confirmei. Sabia que ela entenderia.
— Não se trata de qualquer garoto.
— Não é Steve?
Balancei negativamente a cabeça.
— Não é o Steve.
— Ah. Quem, então?
— É... Err... É... — eu olhei para o carpete. — Luke.
— Luke? Oh!
— Eu sei. "Oh".
— Alguma coisa aconteceu entre vocês?
— Não. Não aconteceu. Não vai. Não. Está tudo na minha cabeça imbecil.
— Bem, ele é um gato — disse Izzie.
— Você gosta dele? — eu perguntei.
— Acho ele deslumbrante, mas não, não rola uma química e não importa
quão bonita uma pessoa é, se a mágica não está nela, não está nela. E não
está entre nós.
Isso me fez pensar novamente. Química. Com certeza havia química entre
mim e Luke. Sempre que nos víamos, ele era como um ímã, e eu era uma
limagem de ferro.
Eu não tinha escolha, exceto ser atraída em direção a ele. Eu não podia
evitar. Era química.
— É... Olha, eu sei que ele é o namorado da Paola - eu disse - e respeito
isso. Nunca correria atrás dele. É que... Como você disse, química.
— É, mas você pode sentir química por diversas pessoas, mesmo por
aquelas de quem não gosta ou com quem sabe que nunca daria certo. Senti
a mesma coisa por aquele idiota nas férias de uns anos atrás. Ele trabalhava
na praia e era muito convencido, correndo de lá para cá como se fosse um
salva-vidas garanhão, quando, na verdade, ele tinha pernas finas, era
branquelo e seu trabalho era recolher dinheiro pelas espreguiçadeiras. A
química era muito forte, mas de jeito nenhum teria continuidade. Era
estranho. Sentir atração e repulsão ao mesmo tempo.
— Eu sei. Eu sei. E algumas pessoas estão fora do nosso alcance. Pensei
muito a respeito. É como quando as pessoas se casam. Não quer dizer que
elas não se sentem atraídas por outras pessoas, mas elas fizeram um voto de
fidelidade, então, se elas sentirem química por outra pessoa, na maioria das
vezes elas deixam a química para lá.
— Certo — disse Izzie. — Mas Luke e Paola não são casados.
— Mas ela é minha amiga. Para mim, isso significa tirar as mãos do
namorado dela. Minhas amigas significam muito para mim.
— Para mim também — disse Izzie.
— E minhas amigas são o motivo principal pelo qual não quero me mudar
para Devon. Ou não queria. Não sei mais. Agora, com essa coisa com
Luke... Talvez seja melhor...
Izzie parecia surpresa.
— Tanto assim, é? Pois bem. Pelo que entendi, você sentiu uma vibração
pelo Luke, é isso?
— Acho que sim. Quero dizer, sim. Definitivamente, mais do que
definitivamente, mas eu nunca concretizaria isso. Sério. É que é difícil ter
que fazer o projeto com ele e tudo o mais. É muito forte. É como se
estivesse sendo arrastada pela correnteza de um rio, mas sei que não vou
conseguir continuar com isso, então estou nadando contra a corrente. Está
me desgastando.
— Hummmm — disse Izzie, abrindo um sorriso. — Então saia do rio!
— O quê? Como?
Ela virou para a mesa, pegou uma folha de papel e leu em voz alta: "Se
você quer um amor simples, siga-me".
Esperei ela continuar. Mas ela não continuou.
— O que isso deveria significar?
— Budismo — ela disse. — Estive lendo sobre isso. Sabe, existem muitos
tipos de amor, embora utilizemos a mesma palavra para todos. Nós
amamos nossos animais, amamos nossos pais, amamos nossos irmãos,
amamos nossos amigos, amamos chocolate. Sempre a mesma palavra:
"amor", mas trata-se de diferentes níveis e cada nível tem sua própria
complicação. Amamos alguns garotos. Esse é o tipo de amor mais
complicado de todos. Traz insegurança, ciúmes, perda de foco, loucura.
— Fale mais sobre isso para mim — pensei na diversidade de emoções
pelas quais passara nos últimos dias: empolgação, insanidade, altos e
baixos, carinho, expectativa, desapontamento, tristeza, alegria, desespero...
— Buda diz que a fonte de toda a infelicidade é o desejo — continuou
Izzie. — Um desejo sempre leva a outro, e é por isso que nunca nos
contentamos. Nós conseguimos uma coisa, queremos outra. Nós atingimos
um objetivo, ótimo, eba. Na semana seguinte, não gostamos mais disso e
vemos um que queremos mais ainda, e por aí vai, e nós sempre pensando
que conseguir essas coisas nos fará felizes. Mas não faz. Torna-nos
agitados. Nós gostamos de um garoto. Queremos segurar a mão dele, beijá-
lo e assim por diante...
— Sim. E daí? Todas essas coisas são totalmente normais. Como você pára
isso?
— Indo além do desejo. Buda chama isso de "roda", sempre em
movimento. O que você tem que fazer é ir ao centro da roda por meio da
meditação, e lá encontrará paz e tranqüilidade.
Ela fez com que isso soasse tão simples. Ai pegou um de seus livros de
ioga e me mostrou uma meditação em que eu tinha de bloquear a narina
direita com meu polegar e respirar pela narina esquerda, e, depois, bloquear
a narina esquerda com meu dedo do meio e respirar pela narina direita.
Repetidamente.
Ao final da minha visita, eu estava me sentindo levemente mais calma,
sobretudo pelo fato de ter me confundido várias vezes com a narina pela
qual devia respirar e com qual dedo devia colocar em cada lugar, então
minha mente desviou-se de Luke por um breve momento.
— Podemos praticar ioga — disse Izzie.
— Hummm. Talvez. Não sei se entendo isso — eu disse.
Ela garantiu que a prática levava ao aperfeiçoamento, então decidi tentar.
Eu ia praticar ioga, sair do rio e encontrar o centro da roda. Ou algo do tipo.
Centrada, em paz. Fora do ciclo de desejo. "Estou livre", disse a mim
mesma ao chegar em casa. Inalando por uma narina, exalando pela outra.
Aí me perguntei o que faria se estivesse resfriada e meu nariz estivesse
entupido. Seria esse o fim da calma interior?

No domingo, todo o grupo combinou de se encontrar no Costa, em


Highgate, para nosso costumeiro bate-papo de domingo de manhã. Lucy
chegou primeiro com Tony. Aí Izzie chegou com suas narinas. Logo depois
dela, Paola entrou com Luke e, logo que os vi, comecei minha meditação.
Bloquear uma narina, respirar com a outra...
— Você precisa de um lencinho de papel? — perguntou Lucy.
— Não — eu disse. — Estou meditando.
— Então medite num lugar mais reservado — riu Lucy. — Parece que você
está tirando sujeira do nariz.
— Meu visual mais atraente — sorri para ela. Izzie sorriu para mim. Daria
tudo certo.
Enquanto contávamos sobre nossa semana e o que tínhamos feito, tratei de
não olhar diretamente para Luke. Entretanto, não pude deixar de notar quão
amigável ele foi com todos. A mão dele no braço de Izzie, quando ele se
entusiasmava com o projeto; a mão sobre os ombros de Lucy, quando ele
se levantou e perguntou se alguém queria algo do balcão. "Sim,
definitivamente ele é uma pessoa calorosa", pensei. Ele segurando minha
mão no outro dia foi só mais um exemplo. Não significava nada. Pelo
menos, não para ele. Mais umas respiradas-de-narina e eu ficaria bem. Um
acidente. Um contratempo. Nada de mais.
Porém aí a Paola levantou para ajudar Luke a trazer as bebidas e, quando
estavam na fila, começaram a se acariciar e logo todo o café estava
testemunhando um beijo digno de um Oscar. Paola nunca se intimidou em
ser observada. Eu tentei desviar o olhar, mas não consegui. Foi horrível.
Senti que alguém tinha me apunhalado com uma faca. Ciúmes. Pode
machucar muito. Era óbvio. Luke estava totalmente envolvido com Paola e
eu tinha uma triste paixão colegial por ele. Era tudo da minha cabeça. E
sempre seria. Eu era patética. Triste. Deplorável.
Aí notei que Lucy estava me olhando.
Então, Izzie olhou para Paola e Luke, e depois para mim.
Aí Lucy viu Izzie olhando para mim.
E Lucy olhou para mim. E para Paola e Luke. De volta para Izzie. E de
volta para mim.
Eu me senti como um coelho na berlinda, pois as duas estavam me
olhando. Izzie com preocupação. Lucy, com perguntas.

"Lucy sabe", pensei. Ela sabe que algo está se passando pela minha cabeça.
Tentei a respiração pela narina sem colocar o polegar nela, mas parecia que
eu estava segurando um espirro. "Pelo visto não sou mesmo grande coisa
como praticante de ioga", pensei, levantando e indo para o banheiro
feminino, no fundo do café, onde chutei a parede e quase quebrei o dedão
do pé. "Não posso continuar com isso", pensei. Todos conseguem ver
através de mim e, a qualquer minuto, Steve e Lal também vão chegar aqui.
Lal, que já suspeita de alguma coisa, vai continuar a suspeitar, e Steve, que
é como a Lucy, esperto para valer, num instante vai me ler como um livro.
Só existia uma coisa para isso.

Meditação de Ioga

1) Sente-se confortavelmente, com a espinha ereta.

2) Para esta técnica, você vai inalar e exalar por narinas alternadas.
Primeiro, coloque a mão direita no rosto. Encoste levemente o polegar no
lado direito do nariz.

3) Repouse o indicador na testa e deixe o dedo médio próximo à narina


esquerda, na posição correta, para quando você precisar. A mão se
encaixa confortavelmente nessa posição.
4)Quando estiver pronta, aplique uma leve pressão com o polegar,
obstruindo a passagem nasal direita.

5)Agora, respire devagar pela narina esquerda, segure por dois tempos,
aplique uma leve pressão sobre a narina esquerda com o dedo médio (tire
o polegar da narina direita quando fizer isso) e exale lentamente pela
narina direita.

6) Então, com o dedo médio ainda descansando sobre a narina esquerda,


inale pela narina direita, devagar, segure por dois tempos, tire o dedo
médio da narina esquerda e exale por ela, fechando novamente a narina
direita com o polegar.

7) Tente algumas vezes para ajustar os movimentos e faça lentamente dez


vezes. Depois que dominar a técnica, você pode sentar e fazer durante dez
minutos ou mais. Isso irá lhe proporcionar uma sensação de calma e
concentração (a não ser que você seja a TJ).

Capítulo 11
Outro nível

— Mamãe, tem uma coisa que quero lhe dizer.


— Você voltou cedo, TJ — disse mamãe, olhando da cadeira em que
estava sentada, fazendo palavras cruzadas. — Achei que tinha saído com as
garotas.
— Eu tinha, mas estive pensando e quero lhe dizer uma coisa agora
mesmo.
— O que é?
— Sobre Devon. Mudei de idéia. Eu quero ir. Mamãe sorriu e pôs o papel
de lado.
— Achei que você fosse mudar de idéia no final, mas...
— Quando nós vamos?
— Mas o que trouxe essa mudança repentina?
— Nada. Vai ser bom ter um novo começo. É... Eu quero ser escritora.
Experiência nova, campos novos etc. Esse tipo de coisa. Pois bem. Quando
vamos?
— Oh, TJ. Há tantas coisas para resolver, e nós começamos a pensar nisso
agora. Nem sequer colocamos a casa à venda e ainda há muitas coisas para
o seu pai resolver quanto à posição dele no hospital.
— Está bem. Então, que tal eu ir morar com a Marie nesse meio-tempo?
Para me acostumar com a minha escola nova.
Mamãe tirou os óculos de leitura e me examinou.
— TJ, o que está acontecendo? Sente-se um pouco. Alguma coisa
aconteceu?
Andei de lá para cá atrás da cadeira perto da lareira.
— Não. Por que você sempre tem que pensar que alguma coisa aconteceu?
Simplesmente mudei de idéia e agora acho que Devon é uma coisa legal.
Quanto antes, melhor. Pois bem. Devo ligar para Marie?
— Não. Você não vai ligar para Marie. Ela já tem coisas demais para lidar
nesse momento, a começar pelo trabalho novo e pelos planos de casamento.
Alguma coisa está acontecendo. O que é, TJ?
— Nada. Sério — eu respondi, saindo da sala de estar. — Eu falaria se
tivesse alguma coisa.
Mamãe pareceu acreditar em cada palavra que eu disse. Que nada. Mas o
que diria a ela? Estou apaixonada pelo namorado de uma das minhas
melhores amigas e estou ficando louca aos poucos. O que ela diria? O que
qualquer um diria, além de "supere isso, sua tola''.

"Preciso repensar o plano", pensei, deitando na minha cama por dez


minutos depois, olhando para o teto, como se fosse encontrar magicamente
a resposta escrita lá.
Preciso repensar o plano. Minha mente tinha ficado a mil. O que eu iria
fazer? Eu não encararia a escola se todos soubessem. E se a Izzie tivesse
contado para Lucy o
que eu falei para ela? E se ela tivesse contado para Paola? E Paola tivesse
contado para Steve e para Luke? E... meu Deus, meu Deus, meu Deus...
Um pouco depois, ouvi o telefone tocar. "Oh, não", pensei, colocando o
travesseiro sobre a cabeça. Deve ser uma das garotas, e vou ser arrastada
em frente ao juiz e ao júri. Não fui eu, meritíssimo, sério, sou inocente.
— TJ — disse mamãe. — Telefone para você. É o Luke?
Luke! "O que diabos ele quer?", eu me perguntei, pegando a extensão. Oh,
por favor, Deus, Jesus, Buda, Krishna, na verdade, qualquer um que estivel
cima e estiver ouvindo, por favor, faça com que ma pessoa tenha dito a
Luke que gosto dele.
— E aí, Watts? — ele disse. — O que está fazendo?
— Nada de mais — eu disse. Ficando completamente louca seria a resposta
correta, mas eu não ia dizer isso para ele.
— Que tal irmos ver a Keats House, no sul de Hamstead? — ele perguntou.
— Está aberta hoje à tarde.
Ele parecia bastante tranqüilo. Talvez estivesse tudo bem e ninguém tivesse
dito nada a ele.
— Achei que você fosse fazer alguma coisa com a Paola — eu disse.
— Sim, eu ia, mas aí Lucy entrou em pânico por causa do projeto e pediu
ajuda para Paola. Então, ela saiu com Lucy. Que tal a Keats House?
— Desculpe. Não dá.
— Achei que você tinha dito que não estava fazendo nada de mais.
— É... Tenho lição de casa, sabe...?
O tom de voz de Luke mudou de repente de do para sério.
— Por favor, TJ. Eu... Eu... Olha, acho que... Você estava cerra no outro
dia: nós precisamos conversar. Você pode me encontrar em meia hora?
Precisamos conversar? Oh, diabos. Alguém tinha dito alguma coisa.
— Sobre o quê?
— Não pelo telefone. Por favor, venha.
Ele parecia tão sério que a curiosidade me venceu e concordei em ir.
Quando fiquei pronta e rapidamente fui me encontrar com ele, minha
mente estava sendo revirada. Precisamos conversar?
Sobre o quê? Sobre o projeto? De alguma forma, eu duvidava. Talvez sobre
Sian novamente? O quê?
Enquanto seguia pelo caminho da frente da minha casa, notei que minha
mãe estava me olhando da janela.
— Tchau, volto depois — eu disse e acenei para ela. Ela estava com uma
expressão preocupada. Espero que não faça um interrogatório depois. Não
havia nada que eu pudesse dizer a nenhum deles. Nem sabia o que estava
acontecendo comigo mesma.

Luke estava me esperando do lado de fora da livraria em South End Green.


Ele sorriu quando me viu, e meu coração quase parou.
— E aí? — ele disse. — Obrigada por vir. Vamos beber um chocolate
quente antes de irmos?
— Claro — eu disse. — Sim. Chocolate. Bom.
Luke me conduziu ao café e deu uma olhada para dentro.
— Está um pouco cheio lá dentro. Vamos ficar aqui fora? Com mais
privacidade?
Eu concordei. Mais privacidade? A intuição que eu tinha tido de que ele
não queria conversar somente sobre o projeto se confirmou. Ihh. Estava
muito frio do lado de fora, mas, se ele queria privacidade, eu não ia discutir
e, com um pouco de sorte, o frio poderia impedir que eu ficasse vermelha
toda vez que ele olhasse para mim. Quando ele entrou para pegar as
bebidas, meu cérebro ficou a mil por hora de novo. O que será que ele
queria falar para mim que ninguém podia ouvir?
Ele voltou alguns minutos depois e nós nos sentamos em silêncio. Percebi
que o que quer que fosse que ele queria dizer, não estava sendo fácil para
ele, e tentei sorrir para lhe transmitir confiança. Eu podia escutar. Podia ser
como a Izzie. Talvez eu devesse falar para ele sobre budismo e sobre a
técnica da respiração pela narina. Mas talvez não. Izzie conseguia se safar
com conselhos de auto-ajuda estilo New Age. Eu não. Ele acharia que eu
sou louca. A garçonete nos trouxe duas grandes canecas de chocolate
quente, nós sentamos e bebemos durante um tempo, em silêncio mais uma
vez. "O silêncio é uma coisa engraçada'', pensei.
Pode ser confortante, desconfortante, pacífico, tenso, longo e prolongado,
concentrado, sonhador, amigável. Esse era estranho.
Depois de um tempo, eu não conseguia mais suportar. — Então, sobre o
que você queria conversar?
Luke olhou para a calçada, depois para o café, para a rua e para as árvores.
— Paola — ele disse, depois de uns segundos.
— Paola?
Luke confirmou.
— Paola.
''Até agora, é uma conversa interessante", pensei: ele diz um nome, eu
repito.
— Ela disse alguma coisa? — perguntei, dominada pela paranóia, e tentei
me preparar mentalmente para ficar sabendo que Izzie tinha divulgado meu
segredo.
Luke parecia confuso.
— Disse alguma coisa? Tipo o quê?
— Não sei. Er... Vamos voltar a fita um pouco. Pois bem. Paola?
— Sim, Paola. Eu preciso falar sobre o que fazer a seguir.
"Ah, não", pensei. Ele vai me pedir um conselho sobre Paola. Eu devia
saber. Eu sou amiga dela, ele provavelmente quer informações internas.
Uma vez Lucy me disse que isso sempre acontecia entre os garotos e Paola.
Eles sempre se aproximavam de Lucy para perguntar como sair com ela,
namorá-la ou algo do tipo. Mas Luke já estava namorando-a, então o que
ele poderia querer de mim?
— Está bem — eu disse. — O que fazer em seguida. Em que sentido?
Luke suspirou e olhou de novo para a calçada.
— Não está dando certo.
Não está dando certo? Nãããão. Isso não faz parte do roteiro. Pelo menos
não do roteiro na minha cabeça.
— Quero dizer, ela é ótima — Luke continuou —, é que... Não tenho
certeza se quero estar tão envolvido quanto ela quer. Aconteceu tudo muito
rapidamente e... Ah, não sei...
"Eu também não sei", pensei. Por que dizer isso para mim? O que ele quer
de mim? Como dizer a ela? Como dar as más notícias?
— Eu... É... Ela tem idéia disso? — perguntei. Luke finalmente olhou para
mim e, como sempre, meu estômago deu uma cambalhota.
— Não. Não tem idéia, eu acho. Eu não quero magoá-la. Eu gosto dela. Ela
é ótima — ele sorriu. — Alta manutenção, mas ótima. Com você é muito
mais fácil...
— O que você quer dizer com alta manutenção?
— Ah, você conhece a Paola. Ela é uma estrela, e as estrelas precisam ser o
centro das atenções toda hora. E ela quer que eu fique com ela em período
integral, e não sei se quero a mesma coisa, pelo menos não com ela. Sei
que a maioria dos garotos deve achar que sou louco. Ela é deslumbrante,
mas, no final, bem, tem que existir algo a mais, não tem? Química.
— Mas achei que vocês tivessem... química — eu disse, pensando no beijo
hollywoodiano que eles tinham dado na fila do café e em tudo que Paola
tinha dito sobre eles estarem apaixonados.
— Eu também achei. Mas aí eu... É como na escola. Há química e há
química avançada, se você entende o que quero dizer - nessa hora, ele
buscou meu olhar. — Eu posso falar com você. Com você é mais fácil,
bem, por um lado é, mas por outro, é mais complicado. Steve. Paola. Não
quero magoar ninguém, mas... — ele pegou minha mão e acariciou
delicadamente com seu polegar as costas dela. Eu puxei a mão.
— Não faça isso.
Luke pareceu magoado.
— Por que não?
— Porque... Eu... — eu não estava muito certa do que ele estava dizendo
sobre a Paola. Ou sobre mim... "É difícil romper com uma pessoa e ele só
deve estar precisando de uma mão para acariciar", eu disse rapidamente a
mim mesma. Mesmo assim, não estava conseguindo lidar com o efeito que
isso causava em mim. Não conseguia ficar lá sentada, segurando a mão
dele, confortando-o porque as coisas com Paola não estavam dando certo.
Mesmo que ele fosse terminar com ela. Parecia desleal.
— Porque você o quê? — Luke perguntou, pegando minha mão
novamente.
Era demais para mim e puxei a mão mais uma vez.
— Porque eu não consigo lidar com isso — deixei escapar. — Você pode
estar só segurando a minha mão, mas... Para mim... Eu não consigo evitar,
mas... Eu...
Luke colocou as duas mãos sobre as minhas e segurou-as, para que eu não
as puxasse de novo.
— Acho que você sabe que não estou só segurando suas mãos.
— Mas você segura a mão de todo mundo. Eu o vi envolvendo tal pessoa
com seu braço, recebendo uma massagem de outra...
— Ah, você está falando da Sian? Eu disse a você: não há nada ali. Não é
como nós. Acho que você sabe que com a gente se trata de um outro nível.
Não revele nada, disse a voz da Hannah no fundo da minha cabeça. Eu
queria muito perguntar-lhe o que ele queria dizer com "outro nível". Ele
quis dizer "amizade especial"? Platônica? Que tipo de nível? "Relaxe",
disse a mim mesma. Não se faça de boba. Ele quer um conselho sobre
como terminar com Paola e acha que pode falar disso com você. Um dos
caras, é bem assim que eu sou, só mais uma amiga. Meu vizinho, Scott,
costumava dizer que gostava de mim por essa razão: porque eu não era
ameaçadora. Um dos caras. "Não gostável", foi isso que ele quis dizer. Isso
é um nível que deixa muito a desejar. Luke quer um conselho e é fácil
conversar comigo. É isso. "Não interprete nada além disso", disse a mim
mesma. Ele certamente está chateado por ter que terminar com Paola e é
por isso que está segurando minha mão. Eu não devo, não devo confessar
nada sobre a loucura que passa pela minha cabeça. É a última coisa que ele
precisa agora, depois de tudo isso.
Vesti a camisa dessa coisa de "um dos caras".
— Luke, acho que você tem que conversar com a Paola sobre isso, e não
comigo. Desculpe, mas ela é uma das minhas melhores amigas e me sinto
desleal. Não posso dizer para você o que fazer ou falar e não posso
intermediar isso. Sei que é difícil, mas, se não está dando certo, então você
tem de dizer isso a ela. Deixe que ela saiba antes que outras pessoas. É
justo com ela.
Luke soltou minha mão, esvaziou sua caneca, concordou com a cabeça e
olhou para mim com tristeza.
— Sim, claro. Eu entendo — ele disse. — Claro.
Levantou e se sacudiu, como que sacudindo seu humor.
— Está bem, Watts — ele disse com uma voz mais animada. — Vamos ver
a Keats House. Pelo que parece, o poeta John Keats estava apaixonado por
uma mulher que morava lá, chamada Fanny Brawne — ele riu.
Ele riu. — Todas essas pessoas se lamentando por pessoas que não podem
ter. Voltas e voltas. A vida é dura, não é?
E ele seguiu na direção da Keats Grove. "Ufa'', pensei, seguindo-o. Acho
que deu tudo certo. Acho que era a coisa certa a fazer, a dizer. Mas pobre
Paola. Ela não vai ficar feliz com essa situação, nem um pouco. Vou fazer
tudo que puder para ajudar e vê-la superar isso.
Enquanto andávamos perto da Keats House, Luke voltou ao normal,
falando sobre o projeto, e era fácil responder nesse nível. Eu contei o que
tinha lido sobre os poetas do período de Keats e ele pareceu impressionado.
Não mencionou mais Paola. Minha mente, entretanto, não conseguiu se
livrar tão facilmente e ficou pensando e repetindo as coisas que ele tinha
dito, o jeito como tinha me olhado, como tinha sido quando ele pegou na
minha mão. O que ele quis dizer? Pessoas se lamentando por pessoas que
não podem ter? Keats? Sian? Paola? Ou eu? Será que ele se referiu a mim?
E o que ele quis dizer quando falou que o que nós tínhamos era em outro
nível? Nível de bons amigos? Nível de liga-dos-pelo-nosso-interesse-pela-
história? Nível de nós-conversamos-facilmente-um-com-o-outro? Ou o
quê? "Não entre nessa", disse a mim mesma. Não entre nessa de "Ou o
quê?". Se, por um milagre, Luke sentisse por mim a mesma coisa que sinto
por ele, dessa vez era ainda pior. Ninguém pode saber. Gostar de Luke
quando ele estava namorando a Paola era uma coisa, mas concretizar isso,
nem que fosse da forma mais leve, quando ele estava prestes a terminar
com ela, seria ainda pior. Ela vai se magoar o suficiente sem que uma de
suas melhores amigas a prejudique. "Não", eu pensei, quando Luke se
inclinou em direção a um mostruário para ler um livro antigo e fez um
gesto para que eu lesse o que dizia: "Não dá para acontecer nunca". Nunca.
Nunca. Nunca.

Citado de uma carta que John Keats escreveu para Fanny Brawne

''Amo você demais para me aventurar em Hampstead. Sinto que não é fazer
uma visita, mas adentrar um incêndio”.

Capítulo 12
Gêmeas não correspondidas

Eu estava temendo a próxima reunião do projeto, na quarta-feira, e, nesse


meio-tempo, observava Paola de perto, buscando pistas de que Luke tivesse
dito alguma coisa a ela. Claramente nada, pelo jeito que ela se comportava
e falava, como se tudo estivesse normal. Lucy, por outro lado, estava
preocupada com meu relacionamento com Steve.
— Ele sentiu muito sua falta, quando você partiu às pressas no domingo -
ela disse no intervalo, na segunda-feira.
— É, desculpe, não estava me sentindo muito bem — eu disse. — Fiquei
meio doente.
— Achei que você não estava normal, não é, Izzie? Você se lembra que eu
disse a você?
Izzie levantou uma sobrancelha, mas não disse nada.
— Você está bem agora? Você está deixando de gostar do Steve? —
perguntou Lucy. — Ele disse que você tem andado meio sumida
ultimamente.
Balancei negativamente a cabeça.
— Tenho estado ocupada. Há tanta coisa para fazer do projeto e tão pouco
tempo.
Quando Lucy não estava olhando, Izzie levantou sua outra sobrancelha.
Será que isso era um novo tipo de meditação? Sobrancelhas em vez de
narinas... Ou ela estava tentando dizer alguma coisa? Nunca se sabe,
quando se trata da Izzie.
Lucy fez que sim com a cabeça.
— Sim, sei o que você quer dizer. Tem sido corrido. Mas você vai dizer ao
Steve se for terminar com ele, não é? Eu detestaria vê-lo magoado, e quero
estar preparada para qualquer reação.
— Sim. Claro. Mas meus sentimentos por ele não mudaram. Sério — eu
disse. Era verdade. Eles não tinham mudado. Eu ainda gostava de Steve,
sempre gostaria, mas não podia negar que o que sentia por Luke estava em
outro nível. Oh, diabos. Ai está essa expressão de novo. Será que Luke quis
dizer a mesma coisa que eu com em outro "nível"? Como o tipo de nível
gosto-loucamente-de-você, ou nunca-me-senti-assim-antes? "Ah, fique
quieta, fique quieta, fique quieta", disse a mim mesma, quando fomos para
a aula de matemática.
Por volta de quarta-feira, eu estava me sentindo um pouco mais sensata.
Tudo estava normal com as garotas. Nitidamente ninguém tinha dito nada,
e tinha bem claro na minha mente que se conseguisse passar pelo projeto e
cuidar da Paola durante seu rompimento com Luke, eu não precisaria vê-lo
novamente. Acabaria tudo. E aí nós nos mudaríamos para Devon, onde
definitivamente nunca mais o veria.
Eu me preparei para ver Luke na reunião e para ficar bem tranqüila, mas,
quando cheguei, Sian era a única por lá. inclinada sobre algumas anotações
numa das mesas.
— Ei — eu disse, quando entrei. — Os outros ainda não chegaram?
Sian balançou a cabeça.
— Eles não vêm — ela disse. — Luke quer ver umas coisas com a Olívia.
Acho que não somos desejadas.
Senti uma mistura de alívio e de desapontamento.
— Ah, tudo bem — eu disse, deixando minha mochila ao lado da dela na
mesa.
Sian parecia agitada.
— Você acha que ele gosta da Olívia?
— Da Olívia? É... Acho que não. Eles são amigos há muito tempo. Ela me
disse. Ele é amigo do irmão dela.
Sian suspirou e mexeu nuns papéis. Depois de alguns instantes, ela olhou
para mim.
— TJ. Posso falar com você?
— Claro.
— Promete não contar a ninguém?
''Ah, não", pensei. Ela vai me contar sobre a paixão dela por Luke. Balancei
negativamente a cabeça.
— Não, eu não vou contar para ninguém.
— É sobre Luke — ela começou. Sem surpresas até aí, pensei, sentando na
mesa e esperando ouvir sobre seu amor não correspondido. - Ele... Bem,
ele...
— Você gosta dele, não é? — perguntei. Achei que ia facilitar para ela.
Afinal, nós estávamos na mesma situação. Ela certamente estava confusa,
perguntando-se se Luke beijava todas as meninas com quem ele passava
seu tempo. Ela estava preocupada com a Olívia. Eu estava preocupada com
ela.
Ela confirmou.
— Eu não espero que você seja capaz de entender... — ela continuou.
"Ah", pensei. Você sabe pouco, mas não podia ter pegado alguém mais
perfeito para entender. Emocionalmente, éramos gêmeas. Ambas
experimentando o amor não correspondido.
Decidi que iria ouvi-la e daria o mesmo conselho que Hannah tinha me
dado. Luke era um gato. Várias pessoas eram apaixonadas por ele, mas
Sian tinha de tentar superar isso. Ficar fria. Seguir em frente.
— Sabe, é muito difícil... — Sian continuou.
— É...
— Sei que a Paola é sua amiga, então você não deve dizer a ela que eu sei,
mas ele vai terminar com ela. Não está dando certo entre eles.
— Sério? — estava surpresa que ele tivesse dito a Sian. "Estranho", pensei.
Mas eu tinha sido tão inútil no domingo que ele devia ter achado que
precisava recorrer a outra pessoa para receber um conselho, ou a um ombro
para se lamentar.
Sian fez que sim com a cabeça.
— Eu me sinto mal por isso, mas o que está acontecendo entre nós é tão
forte que, bem, ele não ia conseguir continuar com a Paola, não seria justo
com ela.
"Dããã", pensei. Eu perdi alguma coisa aqui?
— É... O que você quer dizer com "acontecendo entre vocês"?
— Eu e Luke.
"Pobre Sian", pensei. Ela realmente pensa que tem chance, mas, depois do
que ele disse para mim sobre ela, ela vai ficar muito decepcionada.
— Sian — eu disse. — Sei que Luke é adorável, mas acho que muitas
pessoas gostam dele. E ele é tão aberto e amigável com todos que às vezes
é possível ficar confuso com o que ele diz, se você me entende. Interpretar
as coisas além do que elas são. Você tem que cuidar de si mesma. Você não
quer elevar suas esperanças e se magoar quando nada acontecer...
— Ah, eu tenho certeza de que não estou confusa com o que ele diz...
"Nossa, nossa, isso mexeu mesmo com ela", pensei. Ela realmente tem
interpretado as coisas além do que elas são nas horas em que passou com
ele.
— Sian, Luke é do tipo de cara bastante caloroso. Não é sempre que tem
significado e tem que ser uma coisa recíproca para funcionar.
— Eu sei. E é.
— Mas como você sabe disso, se nada aconteceu entre vocês?
— Mas aconteceu. Ele me visitou na segunda-feira à noite. Agora não
tenho dúvidas de que ele sente o mesmo.
Senti um tremor horrível na boca do estômago.
— Mas como?
Sian ficou tímida por um momento.
— Ele me beijou.
Isso me calou. Ele a beijou? "Mas... Mas", eu pensei, "ele me disse que ela
era uma pobre menina confusa. Que ele nunca gostaria dela."
— Ah, desculpe, TJ, você parece chocada. Sei que a Paola é sua melhor
amiga. Desculpe. Não queríamos que ninguém se magoasse. Mas ele vai
terminar com ela. Ele só está esperando pelo momento certo para dizer a
ela, aí poderemos ficar juntos.
Parecia que meu cérebro ia explodir. "Teria sido isso que ele queria me
dizer no domingo?", me perguntei. Não só terminar com a Paola, mas
começar a namorar a Sian...? Não, com certeza não. Mas... Talvez. Oh,
Deus. Como eu posso ter sido tão boba? Falando em ficar confusa com o
que ele diz, interpretar mal os sinais. Eu ganho o prêmio. Prestes a dizer
para Sian quão tola ela era com seu amor não correspondido, e como tudo
estava na cabeça dela, quando, durante todo o tempo, era eu que tinha tudo
na minha cabeça, e não podia ter me enganado mais a respeito de tudo. Oh,
Deus. Eu tinha tanta certeza de que havia algo especial entre nós. Todos
aqueles olhares prolongados que ele me dera. E... Talvez ele estivesse
brincando com todas. Comigo, com Sian, com Paola. Todas nós. Não. Ele
não é assim. Está tudo na minha cabeça tola. Ele tinha beijado Sian, não
tinha? Mas... Não pode haver algo especial entre eles, se ela está tão
preocupada com o fato de ele estar passando tempo com a Olívia. Ela não
pode estar tão certa quanto a ele. Talvez ele só esteja acumulando garotas,
para ver quantas ele consegue faturar. Olívia tinha me avisado no começo.
Ele gosta de provar para si mesmo que pode ter qualquer uma. Não. Não.
Ele é um cara legal. Oh, Deus, estou confusa.

E-mail: Caixa de entrada (1)


De: hannahnutter@fastmail.com
Para: gatacomcerebro@psnet.co.uk
Data: 8 de dezembro
Assunto: Cara atraente

E aí, caracteres especiais?


O que tem acontecido por aí? Espero que tudo esteja bem com o Luke. Me
conte.

Beijos, Hanahlulu

E-mail: Caixa de saída (1)


De: gatacomcerebro@psnet.co. uk
Para: hannahnutter@fastmailcom
Data: 10 de dezembro
Assunto: Cara atraente

Oi, Hannah
Este é o pior dia de toda, toda a minha vida. Eu nunca me senti tão triste e
confusa. Acontece que Luke não gosta mais da Paola. Ou de mim. Ele está
gostando dessa menina estranha chamada Sian. Pelo menos, eu acho que
ele está. Ela acabou de me dizer que eles já se beijaram. Eu estava prestes
a dizer que ela estava interpretando maIos sinais dele e que se tratava de
uma causa perdida, quando ela confessou que eles tinham se beijado. Dá
para interpretar erroneamente mãos dadas, mas um beijo é um beijo. Não
tem como interpretar erroneamente isso. Eu me sinto uma boba. Infeliz.
Burra. Não posso confiar nos meus sentimentos, não sei se posso confiar
nos sinais que estou recebendo de Luke. Em quem devo confiar?

Com muito carinho, Bobona de Finchley

E-mail: Caixa de entrada (1)


De: hannahnutter@fastmail.com
Para: gatacomcerebro@psnet.co.uk
Data: 10 de dezembro
Assunto: Cara atraente

EM MIM! Idiota. Você pode confiar em mim. Nada estd acabado até que a
moça gorda cante, ou algo do tipo. Ouça. Eu jd beijei pessoas de quem não
gosto. Lugar errado. Sol demais. Perda tempordria de sanidade. Todos os
tipos de razão. Acho que você tem que resolver isso com o cara atraente.
Vér o que realmente acontece na cabeça dele quanto a você, a esta garota
Sian e à Paola. Vócê não tem nada a perder com o que vai ouvir e,
conhecendo você como conheço, sei que não é daquelas que se deixa
derrotar pela imaginação. Mantenha-me informada. Parece que a vida por
aí é muito mais empolgante do que por aqui. Não estd acontecendo nada.
Não estou gostando de ninguém.
Very chato. Estou me sentindo uma freira.

Com carinho,
Sóror Maria Conceptua Hannah

Capítulo 13
A vida antes dos garotos

"Horrível. Não dá para a vida ficar mais horrível", pensei, depois que
cheguei em casa. A hora que passei com Sian tinha sido dolorosa, com ela
falando sobre Luke, sem perceber que a cada palavra era como esfregar sal
numa ferida.
— O jantar está na mesa — disse mamãe da cozinha. "Bem depois", pensei.
Estava me sentindo enjoada, como se nunca mais quisesse comer. Eu me
joguei na cama. "Odeio esse sentimento", pensei. Quero muito voltar ao
normal. Antes do Steve. Antes do Luke. Voltar para quando eu tinha uns
oito anos e tudo o que eu pensava sobre os garotos era que eles eram
criaturas barulhentas que enfiavam o dedo no nariz, tinham meias que
cheiravam mal e deviam ser evitados a todo custo. É uma droga gostar de
garotos. É uma droga ser adolescente. É uma droga ser eu.
Eu respondi um e-mail da Hannah, atualizando-a sobre meu último
pesadelo, depois tentei fazer alguma lição de casa, mas minha mente não
conseguia se concentrar. Experimentei a meditação da Izzie para tentar me
acalmar, mas a paz de espírito parecia estar a quilômetros de distância e eu
não conseguia tirar da cabeça a imagem de Luke beijando Sian. Precisava
de algo para relaxar que fosse fácil de fazer. "Um banho aromático",
pensei, "isso deve ser eficaz". Da última vez que eu tinha visto a Izzie, ela
tinha me dado uma lista de óleos que você coloca na água para combater o
estresse, tirada do livro dela sobre os princípios básicos dos óleos. Procurei
nas minhas loções e poções e encontrei um com lavanda que a Paola tinha
me dado no meu aniversário. Lavanda é um dos óleos da lista, então enchi
a banheira e pinguei umas gotas. Tinha um cheiro muito bom, mas, quando
entrei, eu me senti culpada de estar lá deitada, sentindo um cheiro adorável
dado a mim por uma amiga a quem eu sabia que iria decepcionar.
Depois do meu banho, verifiquei meus e-mails e, felizmente, Hannah tinha
respondido depressa. Fale com Luke, ela disse. Primeiro eu pensei "de jeito
nenhum, não posso", e enviei um e-mail para ela dizendo isso. Qual é o
objetivo? Eu tinha tido minha chance de falar com ele no domingo e
estragara tudo. Em vez disso, tive a conversa com ele na minha cabeça,
imaginando o que ele diria. Repetidas vezes. Cada vez eu mudava o roteiro.
Talvez devesse falar com a Paola? Contar sobre Sian. Ela merece saber.
Não, eu não posso fazer isso. Isso é responsabilidade do Luke e, além do
mais, eu não sei direito como é a história ou o que está acontecendo com
eles.

"Isso é loucura", pensei, depois de um tempo, "por que eu não me entendo


com Luke?". Hannah estava certa. Eu não tinha nada a perder, não mais.
Minha sanidade se fora semanas atrás. Fale com ele. Descubra de uma vez
por todas o que está acontecendo, com Sian, com Paola, comigo.
Eu fui até o telefone, peguei-o, fiquei apavorada e o coloquei de volta no
gancho.
Depois de algumas respirações profundas, peguei de novo e disquei o
número. Meu coração estava batendo contra o peito, quando começou a
tocar.
— Alô — disse uma voz que parecia de um indiano. — Bem... o Luke
está?
— Acho que você discou o número errado, minha querida — disse a voz e
desligou o telefone.
Chequei os números, peguei o telefone e disquei mais uma vez. "Eu
consigo fazer isso, eu consigo fazer isso", disse a mim mesma, quando o
telefone começou a tocar. Logo que ouvi alguém atender, a porta do meu
quarto se abriu, e mamãe entrou com uma torrada com queijo num prato.
Quase tive um ataque cardíaco e desliguei rapidamente o telefone.
— Mamãe!
— Desculpe, querida. Você estava falando com alguém?
— Não. Quero dizer, sim, quero dizer... Acabei. Mamãe colocou o prato na
mesa e sentou-se no pé da cama.
— Está tudo bem, TJ?
— Sim. Claro. Por quê?
— É que ultimamente você não tem agido de forma normal. Há algo que a
incomoda?
— Não. Bem, está tudo bem. Tenho estado ocupada. Projeto da escola. E,
claro, estive pensando em Devon. Mas, sim, está tudo bem.
Mamãe suspirou e levantou.
— Coma seu jantar e eu lhe trarei uma xícara de chá — ela disse, indo para
a porta, onde parou. — Se precisar falar comigo sobre qualquer coisa,
estarei sempre aqui.
Por um breve momento, pensei em falar com ela. Ela já fora uma
adolescente, havia muitos anos. Talvez tenha passado por algo assim.
Talvez compreendesse. Eu estava prestes a abrir a boca, quando o telefone
tocou, fazendo com que eu desse um pulo de novo.
— Você vai atender? — perguntou mamãe. Fiz que sim com a cabeça e
atendi. Era Luke. Coloquei a mão no telefone.
— É para mim — sussurrei para minha mãe. Mamãe fez que sim com a
cabeça e saiu.
— E aí, Watts? — disse Luke. — Foi você que acabou de me ligar?
— É... Não, isto é, sim...
— Eu achei. O telefone tocou, mas quando atendi ninguém respondeu,
então vi no identificado de chamadas o seu número.
— Ah, sim... Minha mãe me atrapalhou...
— Em que posso ajudá-la?
Respirei fundo e decidi começar.
— Eu acabei de ver Sian — disse, esperando que ele me dissesse o que
tinha acontecido entre eles.
— E daí? — ele disse, depois de uma pausa.
— E daí que ela me contou o que aconteceu entre vocês.
Luke riu, ou melhor, recuperou o fôlego do outro lado da linha.
— Aposto que sim.
— Então você não está negando.
— Ei, Watts — disse Luke. — Eu contei para você que ela tinha uma
queda por mim.
— É, mas ela disse que você sente a mesma coisa.
— É, até parece — Luke tomou fôlego de novo.
— Ela disse que você a tinha beijado.
— Oh, ela contou agora?
— Bem, você beijou ou não beijou?
— E você se importa, Watts?
— Eu? Não, é claro que não. É que depois do que você disse no outro dia
sobre a Paola...
— Ouça — disse Luke num tom sério. — Sian me beijou. Há uma
diferença. De jeito nenhum isso foi uma coisa recíproca, se você me
entende. Ela me pegou desprevenido, me convidou para sair, dizendo que
queria ver as coisas do projeto da região de Highgate, e eu, como um
completo imbecil, caí nessa. Eu disse a você: de jeito nenhum eu ia gostar
de Sian. Ela não faz meu tipo. De jeito nenhum. Está tudo na cabeça dela.
— Ela acha que você vai namorá-la depois que terminar com a Paola.
Eu ouvi Luke suspirando.
— Droga — ele disse. — Eu vou ter que falar para ela explicitamente, não
é?
— Não sei — eu disse. — Acho que sim — minha mente estava oscilando.
Eu queria acreditar nele. Parecia que ele estava dizendo a verdade, mas
havia uma sensação de desconfiança martelando no fundo da minha mente,
dizendo que alguma coisa não estava certa.
— Eu realmente não a beijei — disse Luke, como se captando a minha
necessidade de que ele me tranqüilizasse um pouco. — Eu deixei que ela
me beijasse por cerca de... um microssegundo. Eu não queria... Você sabe,
tipo... Empurrá-la. Isso teria sido cruel. Pode ser difícil saber como jogar às
vezes. Como você decepciona uma pessoa? Quero dizer, ela é uma menina
meiga, e eu não queria magoá-la. Você deve saber como isso pode ser. Às
vezes você dá o beijo, às vezes você é beijado, às vezes é totalmente
mútuo. Mas de jeito nenhum foi mútuo com Sian.
Eu me senti estranha em conversar sobre diferentes tipos de beijo com
Luke. Trouxe muitas imagens à minha mente. De que eu gostava. Então
não havia nenhum beijo com Sian. Mais uma vez, Hannah estava certa, e
era possível estar numa situação em que você acaba beijando (ou é beijada
por) uma pessoa com quem não queria estar. Então ele não gostava dela,
mas eu ainda não sabia o que ele sentia por mim. "Eu preciso perguntar
para ele", pensei, mas não sabia como começar. Eu precisava de tempo para
pensar em como formular, sem me entregar totalmente nisso e parecer uma
completa bobona. Mas eu precisava saber.
Eu precisava muito saber se o que sentira nas últimas semanas tinha sido
minha imaginação ou se ele sentia a mesma coisa.
— Ouça, Luke...
— Sim?
— Err... Amanhã, depois da escola... É... Você pode, a gente pode se
encontrar?
— Você está me chamando para um encontro, Watts?
— Não. É claro que não. Nada de encontros. Conversar — aí me perguntei
quando o meu inglês tinha se desintegrado em fala de Tarzan — tipo, eu,
Tarzan, você, Jane. Eu, TJ. Você, Luke. Uga-uga. "Estou além de qualquer
ajuda'', pensei.
Luke riu.
— Oh. Nada de encontros? Conversar — ele disse. — Por que não
podemos conversar agora?
— Er... Não pelo telefone. Eu... Eu quero falar pessoalmente.
— Hummm. Parece sério, Watts. Está bem. Sim. Dá para eu fazer isso.
Seja boazinha. A que horas? — a voz dele parecia calorosa.
— Lá pelas sete horas? Sob as árvores da Pond Square.
— Eu estarei lá — ele disse.

Princípios básicos de óleos para ajudar a relaxar

Coloque de seis a oito gotas de óleo essencial na água da banheira enquanto


a torneira estiver ligada. Espalhe bem o óleo, para que não fique num só
lugar.

Camomila
Cedro
Sálvia-esclaréia
Lavanda Manjerona
Cânfora Patchouli
Laranja-azeda
Rosa
Pau-rosa
Sândalo
Ylang- Ylang

Capítulo 14
Planeta Terra chamando Planeta Watts

No dia seguinte, na escola, parecia que eu estava flutuando nas nuvens.


Nuvens escuras, cheias de trovões, chuva e relâmpagos, talvez, mas uma
nuvem com certeza, e meu estado de espírito não passou despercebido.
— Você está prestando atenção, Theresa Joanne? — perguntou a srta.
Watkins, na aula de educação social.
— E o que é tão divertido, senhorita Watts? — perguntou o sr. Johnson, na
aula de Inglês, quando me pegou olhando pela janela.
— Chamando TJ Watts, TJ Watts — disse a sra. Elwes, na aula de artes. —
Planeta Terra chamando Planeta Watts. Volte.
Eu tinha tanta coisa em que pensar. Mudar-me para Devon ainda estava em
pauta, e a minha vida e todas as suas complicações aqui poderiam ficar
todas para trás. Eu não sabia ao certo como me sentia em relação a isso.
Ficava mudando. E Steve. Eu mal o vira desde que o projeto começara e,
embora geralmente nós só nos encontrássemos no final de semana,
costumávamos nos falar pelo telefone durante a semana. Ambos estávamos
ocupados, e ele tinha muito trabalho com sua equipe de fotografia, mas eu
me perguntava se ele se importava de eu não estar mais ligando tão
freqüentemente quanto antes. E ainda havia Luke. Parte de mim estava
ansiosa pelo encontro que eu ia ter com ele hoje à noite e parte de mim
sentia um ímpeto de empolgação. Para evitar que alguma das garotas
suspeitasse do meu estado de espírito e começasse a fazer perguntas, dei
umas desculpas na hora do almoço e me escondi na biblioteca, fazendo
pesquisa. Elas ficaram tranqüilas quanto a isso. Todos os envolvidos no
projeto estavam sob pressão, já que a apresentação do trabalho até então
desenvolvido seria na próxima semana e tínhamos que terminar tudo.
Depois da escola, corri para casa para me aprontar. Eu estava muito
nervosa. Nunca me sentia assim quando ia me encontrar com Steve. Era
como se eu tivesse bebido seis xícaras de café forte. E eu ficava de lá para
cá e de cá para lá.
Decidi usar botas, camiseta e parca, já que fazia frio lá fora. Soltei os
cabelos, em vez de deixá-los como sempre usava, preso atrás com uma
trança. Uma rápida passada de brilho labial, uma borrifada de perfume e eu
estava pronta.
Cerca de dez minutos antes de sair, ouvi a campainha tocar e, um pouco
depois, minha mãe chamou lá da escada.
— TJ, Steve está aqui. Eu e papai estamos saindo para nosso show agora.
Até mais tarde.
"Steve?!Oh, meu Deus!", eu pensei, ouvindo seus passos subindo as
escadas. O que vou dizer? Um pouco depois, a porta do meu quarto se
abriu e ele entrou.
— Ei, você está bonita — ele disse, parando para me dar um beijo, mas eu
me inclinei para dar um abraço nele e virei levemente o rosto, para que ele
beijasse minha bochecha. Depois, virei novamente o rosto, para que ele me
beijasse na boca, mas aí ele tinha se afastado.
— Ah, obrigada.
— Vai sair?
Fiz que sim com a cabeça.
— Para onde?
— Bem... Highgate. Coisas do projeto.
— Você quer que eu vá? — perguntou Steve. — Para fazer companhia?
Eu estava me sentindo como uma mosca pega na tela.
— Bem... Não. Vai ser chato. Você sabe, essas drogas de reuniões.
Steve pareceu desapontado.
— Vai se encontrar com Luke?
Confirmei de novo. Steve encolheu os ombros e pegou a mochila que tinha
trazido, de onde tirou um cartão-postal e uma foto.
— Achei que você ia gostar de ver isto.
Inclinei-me para olhar depois que Steve os deixou em cima da minha mesa.
— O quadro se chama Trabalho e é de Ford Madox Brown — ele explicou,
enquanto eu olhava para o cartão-postal de um quadro antiquado, com uns
homens cavando com as mangas das camisas arregaçadas. — É muito
famoso — ele apontou para a fotografia. — E este é o lugar que ele pintou.
— Ah, uau — eu disse, comparando os dois. — Fica em Greenhill, logo na
saída de Hampstead High Street. É o lugar em que a mamãe sempre
estaciona quando vamos fazer compras lá.
— Eu sei. É incrível, não é? Achei que ia ficar bom como parte do seu
mostruário.
— Vai ficar. Muito obrigada — eu disse, olhando para o relógio.
— Desculpe. Estou atrasando você? É que eu estava passando e... Bem,
quando fiz as associações, não pude esperar para mostrar para você — ele
pegou a mochila de novo e tirou mais fotos dela. — E aqui estão todas as
fotos das casas em que as pessoas famosas moraram.
Dei uma olhada nelas e estavam maravilhosas. Certamente, ele tinha
passado muito tempo perambulando para tirar essas fotos para mim. Eu me
sentia uma pessoa horrível.
— Steve, isso é fantástico. Olha, desculpe eu estar com pressa, mas tenho
de ir. Tenho de estar em Highgate às sete.
Steve foi até a porta.
— Sem problemas. Vou com você.
Eu me sentia a Rainha da Maldade. Dava para ver que ele estava fazendo
um grande esforço para parecer animado, como se estivesse tranqüilo
quanto a tudo, mas a atmosfera era forçada e artificial. "Má, má, má", dizia
uma voz na minha cabeça. Por um momento, pensei em ligar para Luke e
cancelar. Eu não queria ver Steve magoado por nada, mas Luke já teria
saído para me encontrar, e eu sabia que, se nosso encontro fosse adiado, só
prolongaria a agonia pela qual eu estava passando.
Quando chegamos ao final da rua, dei um grande abraço extra em Steve.
— Falo com você mais tarde? — perguntei. — Talvez a gente possa fazer
algo amanhã.
— Sim, claro — disse Steve timidamente. — É. A gente se vê.
E ele caminhou na direção oposta. Dava para ver, pelo jeito que ele curvou
o ombro, que eu o tinha chateado. "Talvez Izzie tenha tido a idéia correta'',
eu pensei, quando ele desapareceu ao virar a esquina. Celibatária. Ou talvez
eu tenha que adotar a dica de Hannah. Tornar-me freira. Seria muito mais
fácil optar por sair desse jogo de namoro de uma vez por todas. Era
doloroso, não importando o lado em que você se encontrava.
Cheguei a Pond Square por volta das sete e dez, mas não havia sinal de
Luke. Olhei para o relógio novamente e ao redor. Esperei até sete e meia e
ainda não havia sinal dele. Eu não queria ligar para ele para não parecer
desesperada, mas, lá pelas sete e quarenta e cinco, eu estava congelando e
meus dedos do pé tinham virado blocos de gelo. "Ele me deixou na mão",
pensei. Foi bem feito para mim. Decidi esperar mais alguns minutos e
telefonei para ele.
A mãe dele atendeu.
— É... Luke está aí — perguntei.
— Sim — ela disse. — Mas ele está dormindo. Cochilou em frente à
televisão. Você quer que eu o acorde?
"Dormindo?", eu pensei. Dormindo!!
— É... Não o acorde. Eu falo com ele depois.
— É a Sian, não é? — disse a sra. De Biasi. — Eu falo para ele que você
ligou.
— Não, não é a Sian. É... Não. Não se preocupe. Não é importante. Eu falo
com ele depois.
Desliguei o telefone e me estatelei num dos bancos. Eu não queria falar
com ninguém enquanto estivesse me sentindo assim, para baixo. Izzie
provavelmente diria que isso era carma. Ela diz que a lei do carma é: o que
você planta, você colhe. Em outras palavras: você tem o que você merece.
E eu provavelmente merecia isso. Tinha dado o fora em Steve e agora Luke
ia me dar o fora. Mas dormindo?! Eu não podia acreditar. E a mãe dele
sabia o nome da Sian. Ela devia ligar muito para lá. "Bem, aí está a sua
resposta, TJ Watts", eu pensei. É exatamente esse o valor que Luke dava
para esse encontro. Tanto que ele adormeceu e se esqueceu. Eu me levantei
e andei cansadamente pela rua até o ponto de ônibus. "Nossa, detesto me
sentir assim", pensei. Talvez eu me torne freira ou me junte àquelas pessoas
hare krishna, que renunciam ao mundo, raspam a cabeça e entregam rosas
nos aeroportos. Qualquer coisa, qualquer coisa tinha que ser mais fácil do
que isso.

Trabalho foi pintado por Ford Madox Brown, pintor pré-rafaelita, entre
1852 e 1865, e representa trabalhadores escavando canos de esgoto em
Hampstead. Atualmente, estd exposto na Manchester City Art Gallery, em
Manchester, Inglaterra.

Capítulo 15
Encrenca tentadora
Quando cheguei em casa, estava tudo muito silencioso, já que meus pais
ainda não tinham chegado do show em Barbican. Mojo estava enrolado no
sofá da sala de estar e olhou para mim com uma expressão de culpa quando
me ouviu entrando. Ele sabia que não podia dormir sobre os móveis, pois
tinha sua própria cesta na cozinha, mas, sempre que meus pais saíam, se
acomodava no sofá.
— Não se levante, Mojo — eu disse, sentando-me junto a ele. Ele olhou
bem para mim, levantou-se e lambeu meu rosto. Soltou um ganido fraco,
como se dissesse que entendia, aí deitou enrolado, apoiando-se nas minhas
pernas, com a pata em cima do meu joelho. Ele é incrível quando estou
tristinha. É como se sentisse isso e gostasse de ficar o mais próximo
possível, tentando me confortar.
— É duro — eu disse a ele
— Ruff — ele concordou e afundou sua cabeça no meu colo.
Liguei a televisão e zapeei pelos canais por um tempo,mas nenhum dos
programas ficava registrado na minha cabeça.Minha concentração estava
arruinada.Depois de um tempo, eu me enrolei junto a Mojo e fechei os
olhos.
Devo ter cochilado, porque a próxima coisa de que me lembro foi de ser
acordada pela campainha.Olhei no relógio. Nove horas. Cedo demais para
meus pais terem voltado, e eles nunca saiam sem as chaves. Fui até a
janela, e espiei pela cortina. Meu coração parou por um momento quando
vi o Luke lá. Ao perceber um movimento na janela, ele olhou, mas sai de
vista rapidamente. A campainha tocou de novo. Um longo instante.Ouvi
sua voz pela caixa de correspondência.
— TJ. TJ. Sei que você está aí.
Fui na ponta dos dedos até o hall. Ele abriu a caixa de correspondência, e
dava para ver seus olhos olhando para dentro.
— Vá embora — eu disse
— TJ. Deixe-me entrar.
— Não quero falar com você.
— Por favor TJ. Olhe, você tem todo o direito de estar brava. Desculpe ter
deixado você na mão. Não foi por querer. Não sei o que aconteceu. Eu me
estatelei no sofá, e a única coisa de que me lembro depois foi ver que já
passavam das oito. Tentei ligar no seu celular, mas você não atendeu, e eu
vim direto para cá. Sinto muito. Deixe-me entrar.
Nessa hora Mojo tinha ido ver do que se tratava todo o barulho. Ele olhou
pra mim, depois para a caixa de correspondência, de volta para mim, como
que dizendo "que tipo de criatura tão pequena que consegue olhar através
da caixa de correspondência?”
— Oi, Mojo — disse Luke, fazendo com que Mojo fosse até a porta e o
lambesse através da caixa de correspondência. Então eu o ouvi dizer "eca!".
Tive que rir. Mojo estava abanando muito o rabo, aí ele se posicionou no
tapete de dentro, de modo que ficasse cara a cara com Luke.
— Vamos, TJ. Por favor — disse Luke. — Eu estou ajoelhado aqui — aí
ele riu. — Eu realmente estou. Estou olhando nos olhos do seu cachorro e,
por mais que eu goste dele, não foi por ele que vim até aqui.
— Cinco minutos — eu disse firmemente,enquanto o deixava entrar. Eu
estava verdadeiramente brava com ele. Já chegava. Era mais do o
suficiente, e agora eu só queria minha vida e minha sanidade de volta.
Como sempre, Luke estava super-sintonizado com o que eu estava
sentindo.
— Esta brava comigo, não é ? — ele disse enquanto se levantava, com um
largo sorriso.
Eu não ia me entregar facilmente.
— Pode-se dizer isso. Eu esperei muito tempo. Estava congelando.
— Sinto muito mesmo. Eu queria estar lá. Em geral, sou o Sr. Confiável.
Não costumo adormecer no começo da noite, mas ultimamente... Não sei,
eu não tenho dormido muito bem... Muitas coisas na cabeça...
— Nem me fale — eu disse, voltando para a sala de estar.
Luke me seguiu
— TJ ...
— Sua mãe achou que eu fosse a Sian. Ela sabe bem que tem uma pessoa
chamada Sian não é?
— Sim, mas eu contei a você que não se trata de uma coisa recíproca —
disse Luke, seguindo-me. — Está completamente na cabeça dela.
Não pedi para ele se sentar, já que não queria que ficasse, então, ficamos
em lados opostos da sala, como lutadores de boxe examinando o oponente
do rinque.
— Não tenho mais certeza disso.Quero dizer, como vou saber se posso
confiar em você? Você brinca com o sentimento das pessoas, e acho que
não sabe o quanto isso as afeta.
— Ei, isso não é justo.Eu nunca dei corda para a Sian.
— Você deixou que ela o massageasse, eu diria que isso é um incentivo
considerável.
— NÃO NA MINHA CASA. TODO MUNDO SEMPRE FAZ
MASSAGEM NO PESCOÇO E NAS COSTAS DOS OUTROS. NÃO
SIGINIFICA NADA.
"OH", EU PENSEI, "ENTÃO ISSO SIGNIFICA QUE A MASSAGEM
QUE EU FIZ NELE TAMBÉM NÃO SIGNIFICOU NADA?"
— E quanto a Paola? Você certamente lhe deu corda e ela certamente não
planeja terminar com você. Se isso não é brincar com o sentimento das
pessoas, não sei o que significa.
— Sim, mas...
— E você flerta muito com as pessoas Luke De Biasi.
Eu o vi segurando a mão de meninas, dando confiança à Sian. Acho que
você provavelmente deve gostar de atenção.
— Olha, TJ, eu já disse isso a você. Não há nada acontecendo com Sian.
NADA
— É. Assim como você disse que não estava dando certo com a Paola, mas
não vi nenhuma atitude sua que mostrasse isso a ela.
Luke suspirou.
— Ah, bem, isso é difícil — ele disse. — Eu detesto decepcionar as
pessoas. E de qualquer forma, você ainda está se encontrando com Steve,
então não pode falar nada.
— Steve? Steve? O que ele tem a ver com isso? Por que eu não estaria com
Steve?
Luke olhou diretamente nos meus olhos
— Por causa de nós!
— Nós! Nós? O que isso deveria significar? Que "nós"?
— Você sabe o que está acontecendo entre nós está em outro nível.
Era o bastante. Normalmente, eu não perco meu equilíbrio, mas, dessas
vez, fiquei vermelha.
— Pare de falar isso! E o que significa exatamente em outro nível? Que
nível? Isso pode significar qualquer coisa. O que devo pensar? Você usa
essas expressões e elas podem ser interpretadas de qualquer jeito; não é a
toa que a Sian acha que você gosta dela. Você deve ter dito a ela que o que
existe entre vocês está em outro nível também.
Luke se atirou no sofá.
— Estou descendo para outro nível — ele sorriu para mim.
Não ri da piada dele.
— Eu nunca disse nada a Sian, nada que pudesse estimulá-la a ir adiante.
— ele disse. — Sério.
— Está bem. Sério então. E a Paola? Como você se sente em relação a ela?
De verdade?
— Acabou. Eu sei, eu sei que ainda não disse a ela, mas como posso? Você
sabe mais do que qualquer pessoa como será difícil fazer isso.
— Lá vem você de novo. Por que eu "mais do que qualquer pessoa"
saberia?
Luke pegou minha mão e me puxou em direção a ele. — Vamos TJ, você
não pode negar isso.
— Negar O QUÊ? — perguntei, afastando-me dele.
— Por favor TJ, sente-se — Disse Luke, batendo na almofada ao lado dele.
Eu não queria olhar para ele, pois, embora ainda estivesse brava com ele,
não dava para negar a química que pairava na sala. O ar estava tão denso
que dava para cortá-lo com uma faca. Em vez de me sentar ao lado dele,
sentei-me no chão, à direita do seu pé, de costas para ele e cruzei os braços.
Ele se posicionou atrás de mim, comigo entre os joelhos dele, e colocou as
mãos sobre meus ombros.
— Vamos, Watts — ele disse. — Você sabe que há algo especial
acontecendo entre nós. Eu sei que você sabe.
Ele começou a massagear gentilmente meu ombro e atrás do meu pescoço.
Fiquei paralisada, mas quando ele começou a brincar com meu cabelo,
fiquei arrepiada. Era fantástico, e estava começando a ficar perigoso. Tentei
repeli-lo com os ombros.
— Vamos, relaxe — ele disse calmamente. — Deixe-me fazer uma
massagem no seu pescoço. Você precisa relaxar um pouco. Relaxe.
O que ele tinha acabado de dizer para mim, sobre nós termos uma coisa
especial, tinha perturbado minha cabeça. Eu não sabia mais o que dizer,
então fiquei lá sentada, deixando que ele acariciasse gentilmente meu
pescoço e meu cabelo. Parecia que tinha dado um branco na minha mente,
como se tudo tivesse sido desligado ou esvaziado, exceto a sensação de tê-
lo atrás de mim e o calor de suas mãos nos meus ombros.
Depois de um tempo, ele se levantou e foi até o aparelho de som.
— Você tem algum CD bom?
— Ai. Não tenho certeza — eu disse. — Os meus estão todos lá em cima,
mas acho que há alguns do meu irmão por aí. Ele os deixou aqui quando foi
fazer as viagens dele. Eles estão ali, à direita do rádio — "sim", eu
pensei. "Música. Boa idéia." Qualquer coisa que me distraía dos
sentimentos que estão provocando distúrbios em mim.
Ele tirou um CD, pôs no aparelho e ligou.
— Acho que você vai gostar deste — ele disse, sentando-se mais uma vez
atrás de mim e recomeçando sua suave massagem nos meus ombros.
Quando o CD começou a tocar, eu mal podia acreditar no que estava
ouvindo. Nunca tinha ouvido aquela banda, mas era a escolha perfeita. As
cordas dominaram a sala, depois um piano e, depois, a letra da música. Era
sobre dançar perto do fogo, com avidez para pegar o fogo. Encrenca
tentadora, pronta para jogar o Jogo.
Quando a música tomou a sala, as mãos de Luke de repente pararam de
massagear. Ele me virou, para que eu ficasse de frente para ele, e colocou
sua mão no meu queixo, para eu olhar para ele. Quando nossos olhares
se cruzaram, comecei a sentir que estava perdendo a resistência, como se
estivesse me transformando em bolacha. Ele se inclinou na minha direção,
escorregou as mãos pelos meus braços e me puxou na direção dele. Aí
inclinou-se novamente e foi como se tudo tivesse ficado em câmara lenta, o
rosto dele se aproximando cada vez mais do meu. Parecia que eu ia
derreter, aí os lábios dele tocaram os meus. Eu queria muita corresponder,
mas de repente vi os rostos de Paola e Steve na minha mente.
— Não... Não, Luke, nós não devemos. Temos que pensar na Paola e no
Steve. Mesmo se terminarmos com eles, isso só vai gerar sentimentos
ruins.
Luke soltou um gemido fraco.
— TJ, você está me matando. Isto está me matando.
Ele parecia tão triste sentado ali. Eu detestava vê-lo assim e percebi que
não tinha pensado nos sentimentos dele. Ele olhava para mim suplicando, e
pegou minha mão de novo.
— TJ, por favor. Não posso continuar assim.
— Mas... A Paola...
— Eu vou falar para a Paola. Prometo. Eu vou. Venha aqui...
Dessa vez, quando ele me puxou em sua direção e pôs os braços na minha
cintura, coloquei meus braços ao redor de seu pescoço, seu rosto veio em
direção ao meu novamente e, finalmente, nós estávamos nos beijando
direito. Um beijo longo, profundo e suave. Nada mais existia. Era como se
tudo tivesse ficado preto, e o que eu sentia era a mais sublime sensação dos
lábios dele tocando os meus e de seu corpo próximo. Êxtase.
Um pouco depois, ele se afastou e sorriu.
— Eu queria fazer isso há muito tempo. Você está bem com relação a isso?
Eu estava mais do que bem. Parecia que eu estava no céu. Tudo o que eu
queria era mais, então me inclinei de novo e beijei-o novamente.
Nós devemos ter passado as duas horas que se seguiram com os braços
envolvendo o outro, nos acariciando e nos beijando até que minha
mandíbula ficasse dolorida. Nunca senti uma coisa assim antes, beijar
Steve nunca tinha sido assim. Eu queria continuar para sempre.
Estávamos nos acariciando, eu com a cabeça no peito dele, de mãos dadas e
ouvindo outro CD, quando ouvimos o carro dos meus pais estacionar na
frente da casa. Eu dei um pulo, em pânico. Perdera completamente a noção
do tempo. Olhei o relógio. Era quase meia-noite.
Fazia três horas que estávamos lá.
— Oh, Deus, eles vão me matar.
— Porta dos fundos? — disse Luke, levantando-se num salto e dirigindo-se
para o hall.
— Cozinha — eu disse, e nós dois corremos para os fundos da casa.
Quando o levei para o jardim, ele me beijou rapidamente e nós dois demos
uma risadinha; ao ouvirmos a chave da porta da frente, ele correu pelo
jardim.
— A gente se vê, Watts.
— TJ, TJ? Você está aí? — perguntou mamãe, vindo direto para a cozinha.
— O que você está fazendo aí?
— Sim. Estava levando Mojo para tomar um ar fresco no jardim —
respondi, entrando e trancando a porta dos fundos.
Mojo escolheu esse momento para vir da sala de estar e entrar na cozinha,
estragando minha história. Mamãe olhou para mim e depois para o
cachorro.
— Mas...
— Ah, aí está você — eu disse, e dei uma risadinha. Eu me sentia como
uma bêbada. — Menino mau, Mojo. Vamos, garoto — comecei a
destrancar a porta.
Mojo abanou o rabo e foi para o jardim.
— Pelo amor de Deus, feche essa porta — disse papai entrando e juntando-
se a nós. — Está deixando o ar frio entrar — aí ele trancou a porta. — O
que aconteceu com seu rosto?
— Rosto? — eu disse, colocando a mão no meu queixo. Dava para sentir
um machucado. "Oh, Deus", eu pensei. "Eu me arranhei durante o beijo".
— O que você quer dizer?
— Seu rosto — disse papai, olhando de perto. — Está todo vermelho na
linha do maxilar.
— Ah, isso! — eu disse, rindo como uma idiota. — Ah, sim. É... Eu fiz um
tratamento facial. Perdi o controle do esfoliante e... É... Tirando todas as
pústulas.
Papai fez uma careta e mamãe ficou olhando para mim com ar zombeteiro,
enquanto eu me dirigia para o hall e para as escadas. Acho que ela não
acreditou em uma palavra sequer. "É melhor sair daqui rápido", pensei,
"antes que eles suspeitem do que eu realmente estive fazendo". "Deitada no
sofá beijando um garoto que não era nem meu namorado, durante toda a
noite", provavelmente não ficaria muito bem no livro deles.
Mais tarde, quando me deitei na cama numa leve letargia, ainda sorrindo à
toa, eu pensei: isso não pode estar errado. Isso é de verdade. Realmente. E
eu, TJ Watts, pela primeira vez na minha vida, estou total e absolutamente
apaixonada.

E-mail: Caixa de saída (1) De: gatacomcerebro@psnet.co.uk


Para: hannahnutter@fastmail.com
Data: 12 de dezembro
Assunto: Amor verdadeiro

Querida Hannah,
É uma da manhã aqui e eu não consigo dormir.
Tinha de contar para você, já que preciso contar para alguém. Estou
apaixonada. Apaixonada de verdade verdadeira. É oficial. Luke veio aqui
hoje e eu tive a melhor noite de toda a minha vida. Acho que ele é minha
alma gêmea. E o que é ainda melhor é que ele sente o mesmo. Ele não
gostava da Sian no final das contas. É incrível. Eu não consigo dormir,
pensando nele. Também vou enviar um e-mail para Steve, pois acho que é
justo contar a ele o quanto antes: não quero que ele ouça de ninguém.
Além do mais, ele é um cara legal. Eu vou fazer isso depois pessoalmente,
já que acho muita maldade fazer isso por e-mail, mas não posso arriscar
que alguém diga a ele antes, eu detestaria que isso acontecesse.
Com muito amor, TJ

E-mail' Mensagens Enviadas (1)


De: gatacomcerebro@bsnet.co.uk

Para: jamesblonde@bsnet.co.uk
Data: 12 de dezembro
Assunto: Nós

Querido Steve,
Estou escrevendo para dizer que não posso mais namorar você. Eu sinto
muito e espero que você não fique muito triste. Não é você: acho que você
é fantástico. Sou eu. Mas não vou insultá-lo, explicando ou tentando dar
justificativas. Nunca é fácil terminar uma coisa, e estou tentando fazer uma
versão sucinta, já que é a centésima versão que escrevo e não consegui
encontrar as palavras certas em nenhuma delas. Espero que você sempre
seja meu amigo, pois você realmente significa muito para mim e eu
realmente gostei de namorar você, e sinto muito por fazer isso via e-mail,
mas depois eu falo por que eu tive que fazer dessa forma.

Da sua amiga, TJ

Capitulo 16
MARCAS REVELADORAS

— Deus, o que aconteceu? — perguntou Izzie no dia seguinte, na escola,


olhando para a irritação da pele do meu rosto. — Alguma coisa mordeu
você?
— Mais ou menos, é... Mas não é mordida - respondi timidamente. Eu
tinha tentado de tudo que encontrara no banheiro quando me levantei. Os
cremes que aliviam da mamãe, Germaline. Gel de aloe vera. Mas o meu
rosto
ainda estava inflamado e os cremes só irritaram mais.
Izzie parecia confusa.
— Foi uma irritação de pele causada por um beijo — eu disse.
— Oh! O Steve não tem se barbeado? Eu detesto quando os garotos têm
aquela barba curta que arranha. Pode machucar bastante. Vou ver se há um
bálsamo ou algo no meu livro de princípios básicos dos óleos para você.
Balancei a cabeça.
— Não foi o Steve.
— Então, quem...? Oh, meu Deus. Foi com quem eu estou achando que...?
Eu confirmei.
— Nós não conseguimos evitar, Izzie. Tentamos não fazer isso, mas... Foi
forte demais. Ele vai falar com a Paola. E eu já contei para o Steve. Você
acha que eu tenho que contar para a Paola?
Izzie balançou a cabeça veementemente.
— De jeito nenhum. Isso é responsabilidade do Luke. Você tem certeza
quanto a isso?
— Cem por cento. Eu nunca me senti assim. É totalmente, totalmente
incrível. Foi tudo tão... Tão perfeito. Acho que Luke é minha alma gêmea.
Izzie soltou um suspiro.
— Uau! Caramba! Achei que você fosse aquela que não acreditava em
almas gêmeas.
— Eu sei, mas isso foi antes de Luke. É como tudo que você e Lucy
disseram... E mais.
— Duas vezes "uau". O que posso dizer?
— Você me odeia?
— Não. É claro que não. Se ele é a sua alma gêmea, não dá para discutir
com o destino, mas, diabos, pobre de você e pobre Paola. Não vai ser fácil.
Eu ficaria na minha no caso de Luke já ter contado para Paola. Fique fora
do caminho dela até que ela se acalme.
"Não vai ser fácil. Isso nem precisa ser dito", pensei, enquanto Izzie ia até a
chapelaria para pendurar o casaco dela.
Lucy não foi tão amigável quando chegou ao saguão da escola cinco
minutos depois e me encarou logo de início:
— Steve me contou que você deu o fora nele. Por e-mail. Isso é um pouco
frio, não é? Achei que você podia ter, pelo menos, feito isso pessoalmente.
Olhei para o chão. Ela estava certa. Eu sabia que tinha sido um jeito
horrível de dar o fora em alguém, mas não estava pensando direito ontem à
noite e parecia a coisa certa a fazer na hora. À luz do dia, vi que deveria ter
esperado. Onde eu estava com a cabeça ao pensar em contar para Steve
sobre Luke e eu no meio da noite?! "Acho que o amor pode fazer com que
você fique meio avariada, eu pensei. Eu me senti tão nas nuvens e tão bem
ontem que achei que as coisas iam dar certo, que as pessoas entenderiam.
Trata-se de amor verdadeiro, e tudo deve ser perdoado. Quando acordei
hoje de manhã, eu me amaldiçoei por ter sido tão impetuosa. Se
vivêssemos na época das cartas, eu podia ter rasgado, mas com os e-mails,
basta uma apertada de botões e tudo se vai para sempre.
— Desculpe, Lucy. Sei que não foi uma de minhas melhores idéias, mas
eu... Eu queria que ele soubesse assim que possível, caso ele ouvisse de...
De outra pessoa.
— Por quê? Por que o quanto antes? Você conheceu outra pessoa?
Eu fiz que sim com a cabeça.
— Desculpe, Lucy. Eu não queria machucá-lo mais do que o necessário.
Ele está bem? Como ele está?
— Como você acha? Ele realmente gostava de você.
— Eu sei. Eu também gostava muito dele. Ainda gosto. É, por isso que
achei que seria melhor se ele soubesse o quanto antes. Não seria justo fazer
de outra forma. A... É... Não havia mais química e eu não queria mentir
para ele. Você certamente concorda com isso, não?
Lucy não parecia convencida.
— Que seja, mas há modos de desapontar as pessoas. E quem é o novo
garoto? Você o tem mantido bastante em segredo.
— Oh... Uma pessoa...
— Deve ser bem especial para você ter que terminar com o Steve por e-
mail.
— Ele é. Muito especial, é que... Ele estava... Está envolvido com uma
pessoa também, e nós não queremos ficar juntos em público até que ele
termine com a namorada dele também.
Lucy parecia ofendida.
— Tudo bem. Que seja. Não me conte, então.
— Lucy, eu não posso contar para você ainda...
— Eu detesto segredos e achei que fôssemos amigas...
Justo nesse momento, Paola apareceu atrás de nós.
Senti que estava me curvando de medo por dentro. Eu não, sabia se Luke
tinha dito a ela e, se tivesse, se ele tinha me mencionado ou não.
— E aí? — ela sorriu e viu meu rosto. — Ei, ei, TJ Warrs. Eu estou vendo
o que estou vendo? Pele irritada por causa de beijo. Parece que alguém aqui
se divertiu. Não achei que o Steve fosse desse jeito.
— Irritação por causa de beijo? — disse Lucy, examinando meu rosto
cuidadosamente. — Ah, sim. Uau. Você não perde mesmo tempo, não é?
— Do que você está falando? — disse Paola. — Ela está namorando Steve
há muito tempo.
— Não foi o Steve — disse Lucy. — TJ terminou com Steve e conseguiu
um novo namorado. E ela não quer me dizer quem é.
Paola levantou uma sobrancelha.
— Ah, sério? Não quer contar, é? — ela disse, e se inclinou e puxou meus
braços para trás, como se fosse um policial e estivesse me prendendo. —
Nós temos meios de fazer você falar, senhorita Watts. Vamos, Lucy, nós
vamos arrancar dela de um jeito ou de outro.
Eu ri e tentei brincar com ela, como se tudo estivesse normal. Pelo visto,
Luke ainda não tinha contado para ela, mas, até aí, era só a manhã seguinte
e, provavelmente, ele tinha decidido que o melhor meio de fazê-lo era
pessoalmente, e não por e-mail. Enquanto imitávamos uma luta no
corredor, Izzie estava saindo da chapelaria e veio correndo em nossa
direção.
— Ei, deixem-na em paz — ela disse, separando-nos. — Ela não quis
magoar ninguém.
Paola me soltou e nós todas olhamos para Izzie por uns instantes. Ela logo
notou seu deslize. Do ângulo dela, quando saiu da chapelaria, deve ter
parecido que Lucy e Paola estavam judiando de mim.
— Izzie, elas só estavam brincando... — eu expliquei. — É. Ela tem um
novo amor e não quer contar para a gente quem é — disse Lucy.
— E por que diabos nós judiaríamos da TJ? — perguntou Paola.
— Você está usando drogas?
Balancei a cabeça para Izzie, tentando dizer para ela não contar.
Infelizmente, Lucy me viu.
— Você sabe quem é, não é, Izzie? — perguntou Lucy. Paola fez bico.
— Então por que você contou para Izzie e não para nós? — ela perguntou.
— Achei que fôssemos todas amigas. Por que nós não podemos saber?
Izzie parecia sem palavras, enquanto Lucy e Paola olhavam para ela com ar
acusativo. Aí Lucy olhou para mim e estreitou os olhos. Pude ver a ficha
cair para ela.
— Oh, não — ela falou, ofegante. — Oh, não. TJ?
— O quê? O quê? — perguntou Paola. — O que está acontecendo com
vocês hoje?
Lucy ficou com uma expressão de frieza.
— Nada. Vamos, Paola, vamos embora.
Ela colocou seu braço no de Paola e a puxou em direção ao auditório.
Izzie olhou para mim e fez careta.
— Diabos, droga — ela disse. — A m... acertou o ventilador.
Eu queria me virar e correr. O brilho que estivera me cercando desde ontem
à noite de repente evaporou e foi substituído por um sentimento frio de
ruína. "Por que, oh, por que o amor tem que ser tão complicado?",
perguntei a mim mesma, enquanto Izzie me puxava gentilmente em direção
à reunião.
Lucy arrastou Paola assim que a reunião terminou e eu vi as duas se
dirigindo para a chapelaria logo que o sinal das aulas soou. Eu queria correr
para fora dos portões da escola, ir para casa e me esconder, mas como eu
explicaria isso para alguém? Não conseguia imaginar minha mãe me dando
um bilhete para me dispensar das aulas.
— Conte para elas a verdade — disse Izzie. — Paola só pode matar você.
Fiz que sim com a cabeça.
— Vou contar. Você acha que devo alcançá-las?
Izzie confirmou.
— É melhor acabar com isso. Quer que eu vá com você?
— Por favor.
Enquanto íamos para a chapelaria, eu me lembrei da cena de um filme que
tinha visto sobre um homem condenado à cadeira elétrica. Chamava-se Os
Últimos Passos de um Homem.
— Os Últimos Passos de uma Garota — eu disse a Izzie, quando ela
envolveu seu braço no meu.
— Continue respirando — disse Izzie, que parecia tão preocupada quanto
eu.
Paola e Lucy estavam com o rosto próximo uma da outra no canto da
chapelaria e, quando entrei, elas olharam. Felizmente, nós éramos as únicas
lá, o que era um alívio, pois eu teria detestado se alguém da nossa classe
estivesse ouvindo tudo às espreitas e depois passando para a escola inteira.
Lucy olhou para mim desafiadoramente.
— Tive que contar a ela, TJ. É justo. Você disse que Steve merecia saber o
quanto antes, então Paola também merece e... — nessa hora, ela deu um
olhar de reprovação. — Ninguém mais por aqui foi corajosa o suficiente
para fazer isso.
Olhei para Izzie, que parecia estar chocada, e depois para Paola.
— Eu realmente sinto muito...
Paola encolheu os ombros.
— É. Eu também. Mas não tem problema, TJ, eu sei que deve ter sido
difícil para você e eu sinto muito que tenha sido preciso vir à tona dessa
forma...
Não entendi e olhei para as garotas de maneira inquisitiva
— Ela já sabia — explicou Lucy.
— Você já sabia? — perguntei. Então Luke contou para ela? — Quando?
Quando ele contou para você?
— Ah, faz muito tempo, quando vocês começaram a trabalhar no projeto
juntos...
"O quê?", eu pensei. Ele nunca mencionou isso para mim. Ontem à noite,
ele disse que ainda não tinha dito a ela.
Paola pôs sua mão no meu braço e olhou para mim com simpatia.
— Deve ser muito difícil para você...
"Difícil para mim?", eu pensei. O que diabos estava acontecendo?
— O que Luke disse para você exatamente?
— Ah, você sabe — Paola suspirou. — Que você é apaixonada por ele. Ele
me contou tudo, já que não sabia como lidar com isso. Disse que não queria
ferir seus sentimentos, já que você era minha amiga... E eu não queria dizer
nada para você, pois também não desejava que você se magoasse. Quero
dizer, é meio embaraçoso, não é? Eu sei que você está com Steve, então,
gostar do Luke... De jeito nenhum. Eu sabia que você nunca daria em cima
dele, até me perguntei se ele não tinha interpretado mal alguma coisa. Sabe,
massagear o ego masculino e tudo mais.
— Eu... Eu... Então ele disse alguma coisa?
— Ele disse que queria que eu soubesse, caso você o tenha interpretado
mal. Ele diz que acontece toda hora, que as garotas interpretam mal os
sinais. Ele queria que eu tivesse certeza de que sua paixão estava só na sua
cabeça. Que o que eu e ele temos está em outro nível, para eu não me
preocupar.
Eu me senti como se alguém tivesse me apunhalado com uma faca.
— Mas... Mas... Eu... Oh, Deus. Que bagunça. Eu... Então, você não falou
com ele hoje, falou?
— Hoje? Não.
— Oh, Deus, desculpe, Paola...
— Não precisa se desculpar. Fico feliz que agora esteja tudo às claras e
possamos conversar sobre isso. E entendo completamente. Luke é
maravilhoso e, como eu disse, muitas garotas se apaixonam por ele. Não
posso dizer que culpo você...
Lucy não parecia tão generosa e olhava para meu queixo com ar acusativo.
— Mas isso não explica... — ela não terminou sua frase e desviou o olhar,
não antes, porém, de Paola notar para onde ela estava olhando.
Eu vi a confusão passando pelos olhos de Paola. Izzie parecia horrorizada,
mas não tanto quanto eu. Eu estava muito brava com Luke. Ele tinha dito
exatamente a mesma coisa para nós duas. Então ambas estavam em outro
nível? Não. Não. Eu sabia que não era assim. Não depois de ontem à noite.
Era especial, daquelas coisas que só acontecem uma vez na vida.
Paola suspirou profundamente.
— Eu tinha esquecido... Não foi Steve que provocou essa irritação por
causa de beijo, foi?
Eu não respondi.
— Acho que ele gosta de você porque você é muito inteligente — disse
Paola tristemente. — Beleza e cérebro. Eu sempre disse que era uma
combinação letal.
— Mas... — eu comecei. Nessa hora, a senhorita Watkins enfiou a cabeça
pela porta.
— Theresa Watts, Izzie Foster, Lucy Lovering, Paola Williams. O que
vocês estão fazendo aqui? Vocês não ouviram o sinal? Mexam-se. Agora!
Enquanto a seguíamos em fila, meu coração batia forte contra o peito. Eu
estava brava.
"Preciso falar com Luke", pensei, “O quanto antes". Descobrir o que ele
tem dito e dizer a ele tudo o que penso sobre essa situação.

Entrei angustiada na aula da senhorita Watkins. Lucy e Paola estavam


sentadas atrás de mim e eu olhava ao redor sempre que podia para tentar
adivinhar o que se passava na cabeça delas. Lucy olhava firmemente para a
frente, e não deixava seu olhar cruzar com o meu. Paola parecia triste e
rabiscava o caderno. Izzie também ficava olhando ao redor, depois para
mim e virava os olhos.
— Izzie Foster — disse a senhorita Watkins. — O que é tão interessante aí
no fundo da sala hoje? Talvez você queira compartilhar isso conosco.
— É... Não, nada, senhorita — gaguejou Izzie. — Desculpe.
— Se você não começar a prestar atenção apropriadamente, vai ficar aqui
depois da aula e de castigo. Entendido?
— Entendido — disse Izzie, e pôs o nariz no livro.
Eu estava me sentindo completamente infeliz. Provavelmente, Lucy e Paola
nunca mais falariam comigo, e eu consegui colocar Izzie numa encrenca
não somente com a senhorita Watkins, mas também com Lucy. Ela deixou
bem claro na chapelaria que achava que Izzie devia ter dito algo à Paola
sobre mim e Luke. "Minhas novas melhores amigas", eu pensei, "e eu ia
perdê-las". Isto é, se eu já não as tivesse perdido.
No intervalo, Paola teve obviamente a mesma idéia que eu. Saiu correndo
da sala, com Lucy atrás dela, e tirou o celular da mochila.
Aguardei até que todos saíssem, exceto Izzie, que tinha esperado para ficar
comigo. Eu rapidamente tirei meu celular e liguei para o número de Luke.
Tinha que avisá-la. E mais: precisava descobrir o que estava acontecendo
de verdade. Caiu na caixa postal.
— Droga, caixa postal — eu disse. — Acho que a Paola chegou primeiro.
— Tente de novo — apressou Izzie. — Ele pode ainda não estar no
intervalo, então pode ter desligado. Às vezes, o horário do intervalo é
diferente entre as escolas.
Fiquei lá discando. E discando. E discando novamente. De repente, ouvi o
telefone tocar e a voz de Luke do outro lado.
— Luke — eu disse.
— E aí, Watts? — ele disse animadamente. — Ontem foi o máximo.
— Sim, certo. Eu achei a mesma coisa na hora.
— Ei, qual é o problema? Sua voz está estranha. O que você quer dizer?
— Você disse alguma coisa para Paola sobre terminar com ela?
— Opa. Dê-me um tempo. Ainda estamos na manhã seguinte...
— Acho que ela sabe...
O tom de Luke de repente ficou sério.
— Como?
— Lucy adivinhou. Estava prestes a vir à tona...
Eu ouvi Luke suspirar profundamente do outro lado. — Está bem. Certo.
Está bem. Agora, acalme-se, TJ.
— Acalme-se?! Ela disse que sabia tudo. Que você disse que eu sou
apaixonada por você e que você queria que ela soubesse que tudo estava na
minha cabeça. Do que se trata isso?
Luke ficou em silêncio por alguns instantes.
— Ah, isso. Sim. Ouça, TJ. Eu estava... É... Testando para ver como ela
reagiria. Olha, deixe que eu cuido disso do meu jeito. Eu preciso de tempo
para pensar...
— Está tudo na minha cabeça?
— Você é quem me diz, TJ.
— Oh, por favor, não comece com tudo isso de novo. E ontem à noite?
Deu para ouvir o suspiro de Luke novamente.
— Não comece a tornar as coisas mais difíceis para mim. Foi um beijo,
nada de mais.
"Nada de mais?", eu pensei. Como ele pôde dizer isso? Um beijo que durou
quase três horas e agora ameaçava acabar com duas das minhas melhores
amizades e já tinha acabado com meu relacionamento com Steve. Minha
mente estava entorpecida, e eu não sabia o que dizer em seguida.
— Olha, tenho que ir — disse Luke. — Coragem! Vou resolver isso.
— Não, não vá — eu disse. — Eu preciso saber onde me encontro.
Ao meu lado, eu ouvi Izzie respirar fundo e balançar a cabeça. Sei que não
respeitei a regra do “Você tem que ser sempre tranqüila” e acabei
parecendo uma desesperada. Mas eu não ligava.
— Onde você se encontra? — disse Luke alegremente.
— Eu não sei. Onde você está?
— Na sala de aula, na escola.
— Bem, então é aí que você se encontra — ele disse, e riu. — A menos que
você esteja sentada.
Eu não disse nada. "Como ele está fazendo piada numa hora dessa?", eu
pensei.
— Ei, TJ — disse Luke. — Anime-se. Não seja tão densa. Vou resolver
isso e mantenho contato.
Ele desligou.
Izzie estava olhando para mim preocupada, quando desliguei o telefone e
comecei a chorar.

Curas para irritação provocada por beijo

Adicione duas ou três gotas de rosa, camomila, ou ambas, numa tigela de


água quente. Mergulhe uma toalha de rosto na água e aplique na região
afetada por alguns minutos.
Alternativamente, adicione algumas gotas dos mesmos óleos {to seu
hidratante e aplique na região.

CAPITULO 17
Amigas de tempo Bom

O resto da manhã parecia uma eternidade. Eu estava morrendo de vontade


de saber se Paola tinha falado com Luke e o que ele tinha dito a ela, mas
não havia como perguntar, já que ela tinha ficado bem fora do meu
caminho e Lucy estava evitando Izzie e eu, como se fôssemos uma praga.
Parecia que Paola tinha chorado, e tinha sido tudo por minha causa. Eu
estava me sentindo uma pessoa má. E lamentava muito pela Izzie, pois ela
não tinha feito nada.
— Eu sinto muuuuuuuuuuito — disse, na hora do almoço, quando eu e
Izzie nos sentamos perto de um aquecedor no saguão da escola. Nós duas
tínhamos sanduíches à nossa frente, mas nenhuma de nós estava com
apetite. — Nada disso é culpa sua, e agora parece que a I,ucy está brava
com você também.
— Bem, eu estou brava com ela agora — disse Izzie. Quero dizer, qual é o
problema dela? Ela é minha amiga há muito tempo e nem mesmo tentou
ver as coisas sob o meu ângulo ou sob o seu. Ela apenas saiu pisando com a
Paola e sequer nos deu chance de explicar alguma coisa. Que amizade,
hein? É como se fôssemos amigas de tempo bom, amigas se tudo estiver
bem. Amigas devem conversar sobre as coisas, resistir às tempestades.
Manter a amizade aconteça o que acontecer. Resolver problemas. E não, no
primeiro sinal de encrenca, dizer: "Oh, não vamos falar com você". É
patético. E agora estou brava. E pelos olhares que a Lucy tem nos dirigido
durante toda a manhã, ela também está.
— Acho que ela está agindo assim para proteger Steve e Paola. Estou me
sentindo muito mal. Paola está muito triste. Duas pessoas a decepcionaram,
eu e Luke.
Izzie suspirou.
— Eu sei, deve ser duro para ela. Mas você não desviou do seu caminho
para ficar com Luke. Ele é quem deve pedir desculpas. Por tudo que me
falou, você tentou resistir.
— Eu tentei. Realmente tentei. Queria que ela me deixasse explicar. De
qualquer forma, tudo isso tem sido uma enorme perda de tempo. Parece
que perdi duas das minhas melhores amigas e terminei com Steve, e para
quê? Uma noite com Luke e somente um arranhão no queixo para mostrar.
Luke não está nem aí para mim. Ele estava tão estranho no telefone,
dizendo que tinha sido só um beijo, para eu não dificultar as coisas.
— Eu gostaria de dificultar as coisas para ele — disse Izzie. — Para ver se
ele se toca. E você devia fazer o mesmo, TJ. Quero dizer, poxa, o cara está
usando as mesmas frases para você e para a Paola, e quem sabe para
quantas mais? Ele tinha de se responsabilizar pelas ações dele. E pelas
palavras dele. Mas os garotos podem ser covardes às vezes e todos eles
odeiam confrontos. Deve ter sido um choque para ele quando você
telefonou. Quando atacados, a primeira defesa deles é atacar de volta. E
quem sabe onde ele estava quando você ligou? Você pode não tê-lo pego
sozinho. Se havia outros garotos por perto, ele pode ter agido de forma fria
porque eles estavam ouvindo... Sabe, para manter a imagem de macho, essa
coisa de "eu sou o bom". Patético.
Olhei para o outro lado do saguão, onde Lucy e Paola estavam numa
conversa particular, de costas para todo mundo.
— Não é com Luke que me importo agora — eu disse.
— É com a Paola e com a Lucy. Realmente valorizo a amizade delas.
— E eu achei que elas valorizassem a sua — disse Izzie olhando para elas.
— Isso é ridículo.
— Você não precisa sentar comigo se preferir ir até lá.
— Eu sei — disse Izzie. — Eu quero sentar com você. Vou falar com elas
quando eu estiver bem e me sentir preparada.
— Queria poder consertar as coisas.
— Acho que você tem que soltar os cachorros no Luke. É como se ele
estivesse saindo livre de um assassinato. Quando é a próxima reunião do
projeto?
— Hoje à noite.
— Você vai?
— Não sei.

Durante a aula de inglês à tarde, em vez de trabalhar no ensaio que o sr.


Johnson tinha dado para a gente, eu escrevi uma carta:

Queridos Sian, Olívia e Luke,

Sinto muito, mas não posso mais ir às reuniões do projeto devido a


circunstâncias que vão além do meu controle, pois apareceram alguns
problemas com os quais preciso lidar. Espero que vocês compreendam e
eu sinto muito. Mas não vou desapontá-los e asseguro que todas as partes
do projeto em que estava trabalhando ficarão prontas a tempo para a
apresentação. Já está quase tudo pronto, só que não posso mais ir às
reuniões.

Tudo de bom para vocês, TJ

Assim que as aulas acabaram, eu corri até o local das reuniões e deixei a
carta na mesa em que um deles se sentaria. Então, fui rapidamente para o
ponto de ônibus, rezando para não trombar com um deles no caminho.
Fiquei no ponto, com a gola do casaco levantada o máximo que dava e com
o cabelo no rosto, na esperança de que ninguém me visse.
Infelizmente, enquanto eu esperava, um carro parou e Olívia saiu dele.
— E aí, TJ? — ela disse. — O que você está fazendo aqui? Você não vai à
reunião?
Eu balancei negativamente a cabeça.
— Não... É... Desculpe, surgiu uma coisa, mas estive trabalhando nas
partes que eu disse que faria e vou entregá-las para vocês a tempo.
— Está bem, legal — ela disse. — A Sian já está lá?
— Hum, acho que não. Por quê?
Olívia encolheu os ombros.
— Ah, por nada. Como está sua amiga Paola? "Oh, meu Deus, ela sabe?",
eu me perguntava, enquanto o pânico tomava conta de mim. Mas como ela
podia saber?
— Hum, a Paola está bem. É... Por que você está perguntando? — eu não
queria lhe dizer que ela não estava falando comigo, já que pretendia
consertar as coisas com Paola mesmo que fosse a última coisa que eu
fizesse.
Olívia ficou desconfortável.
— Eu... Eu não sei se devo lhe dizer, mas... Olha, eu conheci a Paola e
gosto dela e, bem... Eu só fico me perguntando se uma de nós deve avisá-
la...
Meu sentimento de pânico foi substituído por um sentimento de pavor.
— Avisá-la a respeito de quê?
— A respeito de Luke. Você se lembra que eu lhe disse que ele é amigo do
meu irmão?
— Sim.
— A Paola realmente gosta dele?
— Eu... Sim, ela gosta, gostava, gosta. Por quê?
— Acho que Luke está pronto para fazer o que costuma fazer. Ele
conheceu outra pessoa, e o tempo da Paola acabou...
— Sério ? É... Outra pessoa? Quem?
— Não tenho certeza, mas tenho uma idéia. Ele disse ao William que,
dessa vez, ele realmente se apaixonou. Pobre garota, já que ele se sente
assim por no máximo três meses. De qualquer forma, parece que a Paola
vai levar um fora.
Fiquei me perguntando se ela sabia alguma coisa sobre mim e Luke e
estava se fingindo de morta.
— Mas por que dizer isso para mim? — perguntei.
— Bem, achei que ele podia ter falado com você. Você sabe, sobre a Sian...
— Sian?
— É. Bem, só pode ser ela, não é? Quem mais? Eu sei que ela não faz o
tipo dele, mas ela deixou escapar na outra noite que algo aconteceu entre
eles. Devo dizer que fiquei um pouco surpresa, mas Luke deve ver algo
nela. Eu não sabia se devia dizer alguma coisa, mas sei que a Paola é sua
amiga e, bem... Parece que ela pode se machucar. Eu conheço Luke há
muito tempo, lembre-se que eu falei para você...
Fiz que sim com a cabeça.
— Sobre seu prazo de encerramento. Parece que a Paola nem vai chegar
nos três meses.
— É. Ele sabe que a pegou, então precisa fazer uma nova conquista. Acho
que ele ainda está tentando provar que é o Sr. Atraente e consegue fazer
com que todas se apaixonem por ele.
— Então a Paola não passa de mais uma conquista?
— Provavelmente não é tão frio assim. Acho que ele realmente se apaixona
pelas garotas com quem namora, mas aí ele conhece outra pessoa e não
resiste: tem de ver se consegue conquistá-la também. E é aí que tudo fica
uma bagunça, já que ele não é muito bom em ser transparente e deixa uma
série de garotas se perguntando que lugar elas ocupam na vida dele. É um
pouco covarde quando se trata de confrontação.
”E nesse meio-tempo, ele não percebe o estrago que gera,” pensei. “As
amizades que ele consegue destruir.”
Bem, ele não vai destruir a minha só para provar algo para ele e mesmo."
— Eu sei que é o Luke quem deve contar para a Paola — disse Olívia —,
mas, conhecendo o passado dele, sei que vai evitar a situação, então, diga a
ela, se quiser. Avise-a para que ela se prepare. De qualquer forma, é melhor
eu ir andando. A gente se vê.
Quando ela foi embora, fiquei mais confusa do que nunca. Luke ainda
estava envolvido com Sian ou essa garota por quem ele estava apaixonado
seria eu? Ou ainda outra garota? Não que eu quisesse ter um
relacionamento com ele. De jeito nenhum. Perder minhas amigas era um
preço alto demais a ser pago por um relacionamento fraco, com um garoto
que não sabia o que ou quem que ria. Eu só gostaria de descobrir o que
estava acontecendo. Enquanto estava lá parada, perdida em meus
pensamentos, vi Luke aparecer na esquina e caminhar em direção à escola.
Meu coração começou a bater contra o peito. "Talvez ele tenha vindo mais
cedo na esperança de me pegar sozinha, antes que Sian e Olívia chegassem
da escola delas", pensei. Ou talvez ele queira falar com Sian. "Não, não",
disse a mim mesma, ele me garantiu muitas vezes que não havia nada entre
ele e Sian, e eu acreditara nele. Talvez eu não devesse fugir como uma
covarde. Talvez devesse falar com ele e descobrir o que estava
acontecendo. Sim. Ele podia ter medo de confrontações, mas eu não tinha.
Queria recuperar minhas amigas, então, tinha que saber precisamente o que
estava acontecendo antes de falar com elas de novo. Saí da fila do ônibus e
comecei a andar em direção a ele. Assim que me viu, ele virou para a
direita e chamou uma garota do primeiro colegial que tinha acabado de sair
da escola.
Não podia acreditar. Ele tinha me ignorado. Eu me senti desintegrando por
dentro. Felizmente, meu ônibus apareceu na esquina um pouco depois,
então me juntei às pressas à fila, mergulhei no ônibus e fiquei lá sentada,
bêbada, a caminho de casa. Quando cheguei, disse à mamãe que não estava
me sentindo bem, que não queria jantar e que estava indo direto para a
cama.
Uma vez debaixo do meu edredom, tentei entender o que tinha acontecido.
Por que ele tinha desviado de mim, como se não tivesse me visto?
Certamente estava esperando me encontrar na reunião, então, por que me
ignorou na rua? "Será que devo ligar para me entender com ele?", me
perguntei. Mas a coragem que sentira antes tinha desaparecido, e fiquei
cansada dessa história toda. "De qualquer forma”, disse a mim mesma, "ele
só ia me pedir para não dificultar as coisas de novo". Ele disse que
resolveria. Talvez eu devesse deixar que ele o fizesse. Mais cedo ou mais
tarde, provavelmente ligaria e, quando ligasse, minhas perguntas estariam
prontas.
Olhei para o telefone e torci para ele tocar. Mas ele devia estar na reunião
com Olívia e Sian. Ou talvez estivesse com uma carta igual à minha para
entregar, dizendo que também não iria mais às reuniões. Eu esperava que
não. Que bagunça. Seria uma pena estragar o projeto depois de todo o
trabalho que tínhamos feito. Talvez eu devesse ligar para Paola. Ela devia
estar em casa num estado muito similar ao meu. Questionando tudo. Eu me
sentia muito mal por isso. Talvez estivesse me criticando para todos que
quisessem ouvir.
Deu um nó no meu estômago só de imaginá-la falando com Tony, ou Lucy
na casa dela falando com os irmãos dela, e todos eles me odiando. Como eu
podia voltar a ser amiga deles? Eles nunca permitiriam. Todos pensariam
que sou uma pessoa horrível e talvez eu seja. Uma ladra de namorados. E
não qualquer namorado, eu roubei o namorado da minha melhor amiga.
Paola foi tão incrível quando Hannah mudou para a África do Sul, no ano
passado, e eu estava sentindo que não tinha nenhum amigo no mundo. Ela
me fizera sentir bem-vinda na casa e na vida dela, e como eu retribuía sua
amizade?
Oh, Deus. Eu me odeio. Devia ter resistido ao Luke ontem à noite. Devia
ter pedido que fosse para casa. Por que não fiz isso? Porque sou a pior
pessoa do mundo. Sim, eles provavelmente devem estar sentados numa
roda agorinha, comentando a pessoa horrível que sou. E Luke? Quem sabe
o que está se passando na cabeça dele? Teria eu feito o papel de uma
completa idiota? Por que eu o deixei entrar ontem à noite? Mas depois da
nossa sessão de maratona de beijo, eu tinha tido muita certeza de que os
sentimentos dele eram tão fortes quanto os meus e, agora, eu não sabia o
que pensar.
Teria eu sido desesperada por ter me entregado tão facilmente? Mas não
parecia ter sido dessa forma na hora; tinha sido maravilhoso, perfeito, como
se fôssemos feitos um para o outro. Quando os pensamentos passaram a dar
voltas na minha cabeça, minha mente começou a ficar exausta. "É isso que
é ficar apaixonada?", me perguntei, quando me lembrei da conversa que
tivera sobre isso com as garotas semanas atrás. Sentir-me doente, como se
quisesse deitar enroladinha e dormir e, ainda assim, ontem à noite, eu
estivera no topo do mundo, no céu. Agora eu estava no inferno, inferno,
inferno.
Não muito depois de eu ter ido para a cama, mamãe veio com um
termômetro. Pôs a mão na minha testa e olhou para mim ansiosamente.
— Não parece que você esteja com febre — ela disse, segurando o
termômetro —, mas vamos colocar isso na sua boca para ver.
Não me opus. Como dizer a ela que eu tinha dor no coração? O vírus do
amor. Deve ser interno, mas dói tanto quanto qualquer doença física. "Se
pelo menos houvesse um comprimido que eu pudesse tomar para aliviar a
dor", pensei, "fazer com que tudo isso vá embora”. É tão fácil com um
resfriado ou uma gripe, você só tem que tomar um analgésico e bebidas
quentes. Com uma perna quebrada, você coloca gesso, mas com o coração
partido, o que você toma? O que você pode fazer? Não existe uma pomada
ou gesso que possa reparar isso.
Depois de alguns minutos, mamãe tirou o termômetro e verificou se eu
tinha febre.
— Não, sua temperatura está normal, TJ. Como você está se sentindo?
Quais são os sintomas?
Eu gemi e me virei para a parede. Ela estava sendo tão gentil comigo. Se
pelo menos ela soubesse a má pessoa que sou. Eu podia sentir os meus
olhos lacrimejar, e não queria que ela me visse chorando.
— Dor de cabeça — eu disse. — Só preciso dormir um pouco.
— Vou trazer um paracetamol para você — disse mamãe —, e depois, se
você quiser, me fale sobre alguma outra coisa.
— Obrigada. Vou dormir agora.
Esperei que ela fosse embora, mas dava para ouvir que ela ainda estava no
meu quarto. Dava para sentir que estava olhando para mim, mesmo eu
estando de costas para ela.
— TJ, você quer conversar sobre alguma coisa? Tem alguma coisa
incomodando você?
— Não, só preciso dormir — eu disse. Tudo o que eu queria era ficar
sozinha, para poder chorar bastante.
— É a mudança para Devon que está lhe chateando? Porque...
— Não. Não, não é isso. Eu disse para você que não me importo de ir
agora; na verdade, acho que vai ser melhor.
Mamãe sentou ao pé da cama e pôs a mão na minha perna.
— Então o que é, querida? Você pode me dizer.
— Não posso. É que... Você já... Você já quis voltar no tempo?
— Milhões de vezes — disse mamãe. — Teria isso... Alguma relação com
um garoto?
Eu estava sentindo as lágrimas correndo pelos meus olhos.
— Sim. Não... É que... Eu cometi um grave erro... hesitei. Eu não
conseguia me abrir com ela. Simplesmente não conseguia. Estava com
muita vergonha. Ela parecia tão preocupada, sentada ali, olhando para mim,
que senti que tinha de dizer alguma coisa. — Ah, não se preocupe. Eu não
estou grávida, nem usando drogas ou algo do gênero. É que... É uma coisa
de amizade. Eu... Bem, eu vacilei com as minhas amigas. Mas eu... Eu vou
resolver isso.
Mamãe pressionou minha perna.
— Nós todos erramos de vez em quando, TJ. É assim que aprendemos na
vida. Pode ser duro, às vezes, mas sempre conseguimos fazer dar certo.
Acontece que, quando você cai, você tem duas escolhas: ficar deitada aí,
sentindo pena de si mesma, ou levantar e tentar consertar o que quer que
tenha feito. Não é um crime cair. O único problema é ficar caída — aí ela
se levantou para ir embora. — Ninguém é perfeito. Talvez você não deva
ser tão dura consigo mesma. O que quer que tenha feito, eu estou certa de
que existe uma forma de consertar. Durma bem. As coisas sempre parecem
melhores depois de uma boa noite de sono.

E-mail: Caixa de entrada (2)


De: mwatts@fastmail
Para: gatacomcerebro@psnet.co.uk
Data: 12 de dezembro
Assunto: Vestidos

E aí, TJ?
Eu peguei os vestidos já prontos para nós experimentarmos amanhã.
Espero que você goste do seu. Acho que vai gostar. Não é excessivamente
feminino.

Nos vemos em breve. Com amor,


Mari

E-mail: Caixa de entrada (1)


De: hannahnutter@fastmailcom
Para: gatacomcerebro@psnet.co.uk
Data: 12 de dezembro
Assunto: Amor verdadeiro

Oiê, amiga,
Uau! Parece algo surreal com Luke. Por favor, me convide para o
casamento e eu comprarei um chapéu. Posso ser dama de honra?

Da sua amiga, Hannah

E-mail: Mensagens Enviadas (1)


De: gatacomcerebro@psnet.co.uk
Para: hannahnutter@fastmailcom
Data: 12 de dezembro
Assunto: O amor é uma droga

Querida Hannah,
Nada de casamento. Exceto o da Marie, é claro. Não. Nada de história de
amor também. Estourou tudo na minha cara e eu perdi minhas amigas e o
Steve. Nunca me senti tão horrível na vida (pior do que da última vez que
me senti horrível) e agora tenho que brincar de feliz dama de honra, pois
amanhã vamos para Devon para a prova do vestido. Acho que vou chegar
à igreja e gritar: "NÃO faça isso. O amor é uma droga”: Deve haver um
aviso do governo contra isso. Explico melhor depois.

Com muito amor, TJ

CAPITULO 18
VOU LAVAR O CABELO PRA TIRAR AQUELE CARA DA
CABEÇA

No dia seguinte, eu me levantei e me aprontei para ir a Devon, mas, quando


desci as escadas, mamãe olhou para mim e disse para eu voltar para a
cama. Sabia que minha aparência não era das melhores, com bolsas
embaixo dos olhos, que ainda estavam vermelhos da noite anterior. Tentei
colocar um pouco de soro fisiológico que achei no armário do banheiro,
mas não ajudou muito. Ainda parecia que eu tinha ficado acordada durante
a maior parte da noite. O que era verdade.
— Você está horrível — ela disse. — Como está se sentindo?
— Não estou cem por cento, mas vou ficar bem.
— Você deve ter pego alguma coisa. Há muitos vírus no momento. Meu
consultório está cheio de pessoas com resfriado e tosse. Fique na cama por
mais uma hora ou algo assim, já que não vamos sair antes do meio da
manhã. Se ainda não estiver se sentindo bem, aí você vai ter que ficar aqui.
Eu não discuti. Estava me sentindo muito mal. Voltei para a cama e
consegui descansar por meia hora, até que fui acordada pelo meu celular.
Fiquei em pânico. E se fosse Luke? Ou a Paola?
— Alô? — eu disse, como tentativa.
Era Izzie.
— E aí, como vai?
— Estou bem. Exceto pelo fato de minha mãe achar que estou doente.
— Você está?
— Na verdade, não, mas não estou me sentindo bem. Você falou com a
Paola e com a Lucy?
— Com a Lucy... Mais ou menos.
— E o que ela disse?
— Não muito. Estou no Costa, em Highgate, já que eu tinha combinado de
me encontrar com ela e com a Paola antes de toda essa história maluca
começar. Achei que elas fossem aparecer, mas duvido que estejam
esperando que eu venha. De qualquer jeito, Lucy estava esperando pela
Paola e nós discutimos. Ela me acusou de ser parcial. Você acredita? Como
se ela não tivesse feito o mesmo com a Paola. Então eu a acusei de ser
parcial também. Aí ela disse algo do tipo "o que você esperava?", que eu
devia ter dito o que estava acontecendo, mas se eu tivesse dito... Bem, teria
traído a sua confiança, não é? O que poderia ter feito? Eu não ia ganhar de
jeito nenhum, independentemente do que eu fizesse: de qualquer jeito ia
magoar alguma de vocês. Bom, eu disse que tinha prometido não contar e
que você tinha ficado muito mal com tudo isso. Ela disse "como se a Paola
não tivesse ficado", como se eu não me importasse com os sentimentos da
Paola. E que se nós fôssemos amigas de verdade e confiássemos todas uma
na outra, eu ou você teríamos deixado a Paola ou ela a par do que estava
acontecendo. E aí ela saiu enfurecida.
— Ah, que droga. Eu sinto muito, Izzie. Eu nunca devia ter contado para
você, aí você não estaria nessa bagunça.
— Eu fico feliz que você tenha contado. Você tinha que contar para alguém
e eu sou sua amiga. E entendo por que não quis contar para a Lucy ou para
a Paola naquela hora.
— Deus, eu queria poder voltar o relógio, Izzie. Só alguns dias. Apagar a
fita. Rebobinar. Mil desculpas. Queria poder consertar as coisas.
— Parece-me que você tem uma escolha. Luke ou Paola e Lucy. Não é
muito tarde para se entender com elas. Mas se escolher Luke, acho que
Paola e Lucy não serão mais suas amigas. Pelo menos não por um tempo.
— Eu não quero mais o Luke, de jeito nenhum. Nenhum garoto vale mais
do que as amizades. De qualquer forma, acho que Luke nem quer conversar
comigo agora. Eu queria me entender com ele, mas, quando o vi depois da
escola ontem, ele me ignorou.
— Ah — disse Izzie. — Mas isso pode significar qualquer coisa. Você se
lembra que eu disse que a defesa dos garotos que sentem que estão sendo
atacados é atacar de volta?
— Sim.
— Bem, os que não usam essa tática fazem como os avestruzes, sabe, que
enfiam a cabeça na areia. Tentar ignorar toda a situação e esperar que
passe.
— Então por que ele estava vindo para a nossa escola, se está tentando
ignorar as coisas? Ele deveria saber que ia trombar com alguma de nós.
— Aí você me pegou. Eu acho que ele não pode abandonar as reuniões do
projeto, já que é o coordenador e a apresentação é na semana que vem.
— Então, o que você vai fazer agora?
— Esperar pela Paola — disse Izzie. — Eu me recuso a jogar esse jogo do
não-vamos-nos-falar. Somos amigas há muito tempo. E apesar do que Lucy
acha, eu me importo com os sentimentos da Paola. Também acho que você
tem que ligar para ela. Não desista.
Depois que ela desligou, deitei na cama e olhei para o teto. Tenho olhado
tanto para ele nas últimas semanas que o conheço intimamente, cada
rachadura, cada pincelada de tinta. "Minha escolha”, Izzie tinha dito.
Minha escolha. Minha amizade com as meninas ou Luke? Luke, sobre
quem eu nem sequer tinha certeza. Luke, que, de acordo com Olivia, tinha
uma data de encerramento para todas as namoradas. Não havia como
competir. Podíamos ter passado uma noite incrível na quinta-feira, mas isso
estava começando a custar um preço alto demais, e eu queria minhas
amigas de volta.
Respirei fundo e liguei para Paola. Caiu na caixa postal dela, então deixei
uma mensagem, pedindo para ela retomar a ligação.
Meia hora depois, Izzie telefonou de novo.
— Estou no banheiro — ela sussurrou —, então não posso falar muito. Más
notícias, eu temo. Paola chegou e eu tentei falar para ela que nada disso era
culpa sua e...
— E?
— E ela está bastante tranqüila. Ela não está brava comigo como a Lucy.
Mas ela viu Luke ontem à noite depois da escola e ele não disse nada sobre
terminar. Disse que ele ainda quer namorá-la e que ela significa muito para
ele. Dá para acreditar? Ele é desprezível. Na verdade, ele vem aqui se
encontrar com ela mais tarde.
— Ela disse alguma coisa a meu respeito?
Izzie ficou em silêncio.
— Por favor, Izzie, mesmo se for ruim. Eu preciso saber.
— Ela falou algo sobre Luke ter dito que você o pegou desprevenido e que
você meio que se jogou em cima dele.
— O quê? — eu senti o estômago revirando. — Foi isso que ele me disse
quando o interroguei sobre a Sian. Ele disse que ela o tinha beijado e que
ele não queria ter correspondido, mas que ela se jogou em cima dele. E
Paola acreditou no que ele disse sobre mim, não é?
— Acho que sim. Sinto muito, TJ. Sei que você realmente achou que ele
fosse O Cara.
— É, eu e uma lista de idiotas, pelo que parece — eu disse. — A Paola me
odeia?
— É... Digamos que agora você não está na lista de pessoas preferidas dela.
— Alguém tem que falar para ela como Luke realmente é, Izzie. Eu tentei
ligar para ela, mas caiu na caixa postal.
— Você quer que eu tente de novo?
— Você pode tentar, mas acho que é melhor se isso partir de mim. Você
vai ficar até que Luke chegue?
— De jeito nenhum. Eu daria um soco nele se o visse. Acho que ele é um
verme. Na minha opinião, ele está brincando com as duas.
Depois que ela desligou, fui tomar um banho. É como se eu quisesse tirar
tudo isso com a lavagem. Enquanto estava lá, encharcada, dava para ouvir
um dos CDs favoritos do papai tocando lá embaixo. É a trilha sonora do
filme South Pacifico Tem uma música que fala: "Vou lavar o cabelo, para
tirar aquele cara da cabeça. "Certo demais", eu pensei, pegando o xampu.

A viagem para Devon durou cerca de quatro horas, e mamãe me enrolou


num cobertor no banco de trás, então consegui descansar um pouco. No
restante do tempo, fiquei olhando os campos pela janela. Pensei no que
Izzie tinha me dito e fui ficando cada vez com mais raiva. Como Luke
podia ter mentido sobre mim para Paola? Eu me perguntava se ele tinha
idéia do sofrimento e da confusão que estava gerando. Sabia que ia ser
difícil, mas tinha de conversar com a Paola e, de alguma forma, conseguir
falar para ela que seu namorado era um mentiroso.
Chegamos no final da tarde e fomos direto para o chalé que Marie e Stuart
tinham comprado. Era um lugarzinho fantástico, mas estava uma bagunça,
já que eles tinham se mudado recentemente e muitas coisas ainda estavam
em caixas. Mamãe logo se ocupou, colocando luvas de borracha e
começando a limpar o guarda-louça na cozinha, enquanto papai foi ver o
jardim e uma estufa em más condições, o que foi ótimo, pois me deu tempo
para ficar a sós com Marie. Mesmo ela sendo muito mais velha que eu,
sempre a achei uma pessoa fácil de conversar.
— Como está se sentindo? — ela perguntou, enquanto tomávamos chá no
quarto dela. — Mamãe disse que você estava indisposta.
— Mais ou menos.
— Vírus da gripe?
— Na verdade, não.
— Encrenca com meninos?
— Como você sabe?
Marie sorriu.
— Conheço os sintomas. Desatenta. Olhos tristes e vermelhos. Parece que
o peso do mundo todo está sobre suas costas. Quer conversar comigo sobre
isso?
— Não tenho muito a dizer. Exceto que arruinei minha vida, perdi minhas
amigas, magoei um garoto muito legal e sofri uma decepção com o único
garoto que já amei, ou pensei que amava.
— Ah. Então não é nada de mais, não é? — ela brincou. Eu abri um sorriso
fraco.
— Como você sabia que Stuart era O Cara, Marie? Ela sentou na cama e
bebeu um gole do chá.
— Ah, nossa. Muitos motivos. Ele me faz rir. Adoro estar com ele. Não
consigo imaginar a vida sem ele.
— Sim, mas como você realmente sabe que ele é O Cara?
— Ele simplesmente é. Isso parece certo. É diferente de estar com qualquer
outra pessoa. Eu sei que ele está lá para mim. Ele faria qualquer coisa por
mim e eu sinto o mesmo por ele. Ele me passa uma sensação familiar no
sentido que eu sei que ele está cem por cento do meu lado. Eu confio
completamente nele.
Quando ela falou a parte sobre confiança, senti meus olhos lacrimejarem.
— Ei — disse Marie. — Não pode ser tão ruim assim. Você quer conversar
disso comigo?
— Promete que não vai me odiar? — perguntei
— Nunca — ela disse, segurando a minha mão, enquanto eu contava a
história toda para ela. Quando terminei, ela olhou amavelmente para mim.
— Minha pobre TJ. Parece que você tem que conversar com esse
garoto. E com a Paola. Para esclarecer algumas coisas.
Balancei negativamente a cabeça.
— Não dá. Todos me odeiam, exceto a Izzie. A Paola não está falando
comigo, e a Izzie acha que Luke está agindo como um avestruz. Sabe, com
a cabeça enfiada na areia?
— Então tire a cabeça dele para fora da areia. Fale com ele. Pergunte com
quem ele acha que está brincando.
— Eu tentei ontem à noite depois da escola, e ele me ignorou. Foi horrível.
De qualquer forma, o que há para dizer? Quando tentei falar com ele antes,
pediu para eu não dificultar as coisas e disse que eu estava exigindo
demais.
— Bem, se ele já pensa isso de você... Conhecendo-a como eu conheço,
não consigo imaginar isso, pois você não é um tipo de pessoa exigente.
Mas se ele pensa que você é, então você não tem nada a perder. Você quer
suas amigas de volta, então resolva com ele. Seja exigente. Pergunte qual é
o jogo dele. Se um garoto tem algum respeito por seus sentimentos, ele lhe
dedicará algum tempo para ouvir como você está se sentindo. Os seus
sentimentos são tão importantes quanto os das outras pessoas nisso tudo, e,
pelo que parece, você passou por maus bocados. Sei que algumas pessoas
ficaram magoadas, mas você também se magoou e você também é
importante. Ligue para a Paola. E ligue para ele — ela apontou para o
telefone perto da cama e se levantou para ir embora. — Não há momento
como o presente. Vou manter os enrugadinhos ocupados e garantir que
ninguém entre aqui.
Acho que eu não parecia convencida, pois Marie se virou para mim quando
chegou à porta.
— Ligue — ela insistiu. — Você não pode passar o final de semana inteiro
sem saber o que está acontecendo. Telefone para eles.
Depois que ela foi embora, eu fiquei sentada, olhando para o telefone por
alguns instantes, aí eu o peguei e liguei para a Paola.
Ainda estava desligado, então, mais uma vez, deixei
uma mensagem.
Depois liguei para Luke. Ele atendeu.
— E aí, Watts? — ele disse. — Eu estava pensando em você agora. Nós
vimos a carta que diz que você não vai mais às reuniões. Do que se trata?
Ele parecia tão animado que me pegou de surpresa. "Como ele podia estar
tão feliz quando eu me remoía naquela aflição", eu me perguntei.
— Por que você me ignorou ontem?
— Ah, isso? Eu queria falar com você, mas a Paola estava a uns nove
metros atrás de você. Você estava de costas para ela, então não pôde vê-la.
Eu não queria que ela nos visse juntos. Não queria magoá-la mais do que o
necessário...
"Mas não tem problema me magoar", eu pensei.
— Então você fugiu?
— Não. Na verdade, não. Quando você entrou no ônibus, eu fui falar com
ela. Ela estava muito brava comigo.
Eu decidi confrontá-lo a respeito de tudo. Marie estava certa: eu não tinha
nada a perder.
— É, aí, você disse a ela que eu me joguei em cima de você. Você sabe que
não foi assim.
— É claro que sei — disse Luke, numa voz baixa. — Foi fantástico.
— Então porque você mentiu?
Luke suspirou no telefone.
— Ah, por favor, TJ. Nós temos que fazer isso?
— Sim. Nós temos. Eu preciso saber o que está acontecendo. Izzie me
contou que você e a Paola ainda estão juntos. Achei que você tinha dito que
ia terminar com ela.
— Eu termino. Eu vou terminar, mas preciso fazer isso no meu tempo.
Gosto da Paola e, como disse, não quero magoá-la. Tudo estava
acontecendo rnuito rapidamente, então eu pensei em ir levando com ela por
um tempo e desapontá-la aos poucos.
Eu não podia acreditar que ele estava prosseguindo com isso e, por um
momento, fiquei sem palavras.
— TJ, você ainda está aí? — perguntou Luke.
— Sim.
— Vamos nos encontrar na semana que vem. Eu quero muito vê-la — ele
disse, com uma voz rouca novamente. — Tenho pensado muito em você e
na quinta-feira à noite. Mal posso esperar...
Eu ouvi passos atrás da porta.
— Olha, eu tenho que desligar. Tchau, Luke.
Era a Marie. Ela colocou a cabeça pela porta.
— Trouxe uma coisa para acalmar seus olhos — ela disse, segurando duas
fatias de pepino para mim. — Está tudo bem?
Eu queria gritar.
— Nããão. Não está tudo bem. Eu não posso acreditar. Ele ainda quer me
ver. Disse que tem pensado em mim. Ele disse que quer desapontar a Paola
aos poucos e que vai terminar com ela no tempo dele.
Marie veio e sentou perto de mim na cama.
— Hummm. Essa história me é familiar. Você realmente, realmente gosta
desse garoto?
— Eu... Eu acho que não. Não, eu não posso. É uma confusão. Tudo parece
ser tão complicado, e eu não quero perder minhas amigas por causa dele.
— Então diga isso a ele — disse Marie — e para elas.
— O que você quis dizer agora há pouco com "história familiar"?
Marie levantou e foi se certificar de que a porta estava bem fechada.
— Promete que não conta para a mamãe ou para o papai?
— Prometo.
Marie sentou na cama.
— Quando você me perguntou antes como eu sabia que Stuart era O Cara,
eu disse que era por causa de confiança... Bem, essa foi uma lição que eu
tive de aprender de uma forma dura.
— Por quê?
— Você se lembra que eu estava namorando um cara chamado Matthew
durante um tempo?
Eu confirmei.
— Vagamente. Há uns anos? Um que era médico no hospital em que você
trabalhou em Bristol? Mas eu nunca o conheci porque você nunca o levou
em casa.
— Bem, existia um motivo para isso — disse Marie. Sabe, o que eu nunca
contei para nenhum de vocês é que ele era casado. É por isso que eu disse
que a história me soava familiar. Eu fui uma idiota, TJ, muito inocente. Ele
me disse que o casamento dele não estava indo bem, que eles iam se
separar e que eles basicamente não tinham mais um relacionamento. E eu,
como uma boba, acreditei em cada palavra. Ele sempre estava me dizendo
que eu era o grande amor da vida dele, e que a deixaria no seu próprio
tempo, pois não queria magoá-la mais do que o necessário etc., etc...
— Eu não sabia disso.
Marie olhou para a porta.
— Ninguém sabia. Mas, na época, estava bom, achei que realmente o
amava, que era algo verdadeiro, e que ele deixaria sua esposa por mim...
— E o que aconteceu?
— Um dia, pediram para eu substituir uma colega na clínica de pré-natal e
adivinha quem estava na sala? A esposa dele. Sua adorável esposa, grávida
de cinco meses. Era muito para um relacionamento que estava terminando.
Quando perguntei para ele sobre isso, ele disse que foi só uma noite e que
ainda pretendia deixa-la depois que o neném nascesse. Dava para perceber
pela consulta que ela não tinha idéia disso e que estava aguardando
ansiosamente o nascimento da criança.
— Eu sinto muito, Marie, você deve ter sofrido bastante.
— Eu sofri. Fiquei de coração partido e me senti uma pessoa desprezível.
Eu não teria me envolvido se não achasse que o casamento dele estava
acabando. Ele fez com que eu acreditasse que sua esposa era um monstro
cruel, mas ela era uma mulher adorável. Mas ele me fez perceber que, se
estava enganando a esposa, na época em que ela mais precisava dele, e
dizendo mentiras pelas costas dela, podia estar fazendo a mesma coisa
comigo. Fez com que eu percebesse que a coisa mais importante num
relacionamento é a confiança. Ah, eu sei que é diferente com você, TJ.
Você é bem mais nova e tenho certeza de que Luke não é como Matthew,
mas eu só queria avisá-la que há homens assim, e Luke pode fazer para
você o que está fazendo para a Paola. Parece-me que ele não sabe o que
quer, ou é um covarde, como Matthew era.
— E o que aconteceu com Matthew?
— A última vez que fiquei sabendo dele, ele ainda estava com a esposa.
Terminei com ele assim que percebi que estava mentindo para mim, mas
precisei de tempo para superar isso. Eu me sentia muito mal. Má. Ficava
vendo a esposa dele na minha imaginação e eu me sentia muito má.
— Eu sei. Foi assim que me senti quando vi quão triste a Paola ficou
quando soube que Luke a tinha traído comigo. Mas agora ele está
enrolando ela de novo e, em vez de ficar brava com ele, Paola acha que eu
me joguei em cima dele e está brava comigo.
— Ele vale a pena, TJ?
Eu balancei negativamente a cabeça.
— De forma alguma. De jeito nenhum eu vou desistir de duas das minhas
melhores amigas por alguém que, alguns meses depois, pode chegar à
conclusão de que outra vítima ingênua é o amor da vida dele, e eu vou me
encontrar na lata do lixo.
— Exatamente — disse Marie. — Mas o mais importante é: você confia
nele?
Eu neguei com a cabeça.
— Não mais.
— Você confia na Paola?
Fiz que sim com a cabeça.
— Cem por cento. Ela não consegue mentir ou guardar um segredo nem se
tentasse.
— Então, aí está a sua resposta — disse Marie, levantando, indo até o
guarda-roupa e tirando dois maravilhosos vestidos marrom-acinzentados
com flocos de neve brancos bordados ao longo da bainha. — Mas,
enquanto isso, um casamento se aproxima, então, vamos esquecer essa
história do Luke por um tempo e experimentar esses vestidos!

Dicas para tratar vermelhidão e cansaço nos olhos

1) Mergulhe dois sachês de chá de camomila em água quente. Quando a


água esfriar, retire os sachês, deite-se e aplique-os sobre os olhos.

2) Corte duas fatias finas de pepino. Deite-se e aplique-as sobre os olhos.

CAPITULO 19
Confrontações

— Oi, eu poderia falar com a Paola? — perguntei. Era sábado à noite e


meus pais estavam terminando de jantar com Marie e Stuart na cozinha. Eu
estava sem apetite, então pedi licença e fui direto para o telefone do quarto
da Marie. Tudo o que eu queria era pegar o telefone e recuperar minhas
amigas.
— Espere um momento, eu vou chamá-la — disse Tony, que tinha
atendido o telefone. Ele voltou alguns minutos depois: — Ela disse que não
está em casa.
Depois tentei ligar para a Lucy. O celular dela estava na caixa postal, então
deixei uma mensagem rápida, dizendo que precisava falar com ela. Ai
liguei para a Izzie. Felizmente, ela estava em casa, então contei para ela
sobre meu telefonema para Luke.
— Eu falei para você — ela disse. — Ele está dizendo uma coisa para você
e outra para a Paola.
— Eu vou contar para a Paola — eu disse. — Isto é, se eu conseguir falar
com ela.
— E eu vou falar com a Lucy — disse Izzie. — Isto é, se eu conseguir falar
com ela. Eu vou até lá amanhã e vou ficar sentada na varanda da frente se
ela não me deixar entrar.
— Talvez eu vá junto com você, dependendo da hora em que voltarmos. Eu
podia levar uma faixa dizendo "desculpe".

No domingo, nós não saímos de manhã tão cedo quanto eu tinha esperado,
pois papai queria ver umas agências imobiliárias e Marie e mamãe ainda
tinham de tratar de planos de casamento. Fui com o papai olhar as vitrines
das agências imobiliárias. Deve ter sido minha imaginação, mas ele não
parecia tão entusiasmado quanto antes, e era eu que parecia a mais ansiosa
de nós dois, embora estivesse começando a me arrepender de ter dito à
mamãe que me sentia feliz com a mudança. Por um lado, seria um novo
começo para mim. Um novo capítulo era tudo o que eu queria depois que
eu corrigisse o erro com Lucy e Paola. Ali, ninguém me conhecia nem
sabia o que eu tinha feito. Por outro lado, se eu conseguisse acertar as
coisas com as minhas amigas, a última coisa que eu queria fazer era deixá-
las.
No almoço comemos o espaguete à bolonhesa da Marie. É sua
especialidade, e a única coisa que ela sabe fazer. Eu me perguntava se
Stuart já havia descoberto que, a menos que ele cozinhe, está fadado a
comer comidas para viagem ou a mesma comida para o resto de sua vida.
Após o almoço, todo mundo queria fazer algumas compras de Natal num
mercado que ficava numa cabana de escoteiro da região. Vi um monte de
coisas lá que eram perfeitas como presentes para Paola, Izzie e Lucy.
Quando perambulávamos, comprei algumas coisas (incluindo um livro de
receitas para Marie) e pensei que não conseguiria imaginar a vida sem as
garotas mesmo depois de mudarmos para Devon. Eu sempre pensaria em
Izzie quando visse um cristal ou um kit de aromaterapia. Maquiagem com
brilhos e gel de banho sempre me lembrariam Paola, e qualquer tipo
romântico de roupa ou qualquer tecido adorável me fariam pensar na Lucy
e na sua paixão por moda. Fiquei triste de comprar presentes para elas,
pensando que aquele podia ser o nosso último Natal na mesma cidade. Eu
não conseguia suportar a idéia de que tudo podia acabar assim. Comprei
uma pulseira de prata e ametista para a Izzie, um cachecol de veludo
vermelho para a Lucy e uma bolsa pequena com enfeites felpudos para a
Paola. Eu esperava que elas aceitassem meus presentes, que ainda fossem
minhas amigas e que passássemos as próximas férias juntas, conforme
tínhamos planejado antes de todo aquele fiasco com Luke começar. Eu
tinha me decidido: Luke era passado. Eu só esperava que Lucy, Izzie e
Paola fizessem parte do meu futuro, independentemente de onde eu
morasse.
Tratei de chegar cedo à escola na segunda-feira de manhã e fiquei
esperando nos portões para pegar a Paola e a Lucy entrando.
Lucy foi a primeira a chegar. Ela pareceu confusa quando me viu, como se
não soubesse como reagir.
— Lucy — eu chamei. — Posso falar com você?
Ela hesitou por um momento e veio.
— Eu queria dizer que sinto muito, muito mesmo eu falei prontamente. —
Nunca quis que nada disso acontecesse e quero que você saiba disso. Por
favor, vamos ser amigas de novo? Eu faço qualquer coisa. Sei que cometi
muitos erros e que lidei de forma errada com tudo. Mas acabou tudo entre
mim e Luke. Prometo. Eu fui uma tola.
Lucy parecia desconcertada.
— Eu vi Izzie ontem. Ela veio à minha casa e não queria ir embora antes de
me contar tudo.
Eu sorri.
— Ela armou uma barraca na varanda da frente da sua casa?
Lucy sorriu de volta.
— Algo assim. Ela disse que não ia embora enquanto não falasse tudo e
que tinha trazido sanduíches e um saco de dormir e que ia dormir no abrigo
se eu não a deixasse entrar. Bem, ela me contou tudo sobre você e Luke e
tudo o que aconteceu, e... E... Acho que eu fui um pouco precipitada ao
julgar você.
— Isso significa que podemos ser amigas de novo? Eu sei que foi por
pouco tempo, mas pareceu uma eternidade. Eu senti muito sua falta, e foi
uma tortura não poder falar com você.
Lucy concordou.
— Também senti sua falta. Tipo, neste final de semana, parecia que alguma
coisa não estava certa. Mas... Olha, TJ, eu quero ser sua amiga, mas vamos
esclarecer uma coisa: amigas se colocam em primeiro lugar e contam tudo
para a outra. Você devia ter dito alguma coisa sobre gostar de Luke.
Eu concordei.
— Eu sei. Eu realmente, realmente sei, mas... Eu estava com medo de
vocês me odiarem.
— Eu não odeio você. Não dá para controlar de quem se gosta, mas você
consegue controlar o que fazer a respeito disso.
— Eu sei, e nunca mais algo assim vai acontecer. Prometo que, daqui para
frente, vou contar tudo, tudo para você...
— Fechado — disse Lucy, sorrindo.
Eu lhe dei um abraço enorme, bem caloroso.
— Sério, realmente não queria que isso tivesse acontecido — eu disse. —
Eu fui muuuuito burra... E tão infeliz...
— Acho que o amor nos faz ser um pouco burras às vezes...
— Fez com que eu percebesse muita coisa...
Nessa hora, Paola surgiu na esquina. Ela pareceu espantada de ter me visto
toda amigável com a Lucy e virou para andar na direção oposta.
— Paola — eu chamei.
— Depois — ela disse, andando na direção do auditório.
"Não ia ser fácil reconquistar a Paola”, pensei.
— Alguma idéia? — perguntei a Lucy.
— Rebaixar-se pode adiantar — ela respondeu. — Se isso não adiantar,
tente o suborno: fornecimento de chocolate até o fim da vida ou algo do
tipo. E eu vou tentar falar com ela no intervalo.

No intervalo, Lucy foi direto até Paola, quando ela saiu da sala, e eu rezei
para que conseguisse falar com ela. De qualquer forma, quando voltamos
para a aula, quinze minutos depois, Lucy olhou para mim e balançou a
cabeça negativamente.
— Vou tentar no almoço — disse Izzie. — No mínimo, ela tem de ficar
sabendo como Luke é.
— Obrigada, Iz — eu disse. — Mas acho que deve partir de mim.
— Bem, vamos esperar que ela não atire na mensageira — disse Izzie com
um olhar severo — nem tente estrangulá-Ia. Mas aí, pode nos dar uma
chance de praticar habilidades de primeiros socorros.
Cutuquei levemente seu braço. "Obrigada pela Izzie, Senhor", eu pensei.
"Ela me manteve sensata durante isso tudo."
No almoço, eu estava pronta para confrontar a Paola.
Quando saiu da sala, ela viu que eu estava esperando e seguiu em outra
direção. Lucy e Izzie saíram logo depois e fizeram um gesto com a cabeça
para eu ir atrás dela, então, a segui e a alcancei.
— Paola — eu disse. — Nós temos que conversar.
— Não tenho nada a dizer — ela retrucou.
— É sobre Luke...
— Eu disse "nada a dizer". Ele me falou como você se jogou em cima dele
— aí ela se virou e olhou para mim.
— Como você pôde fazer isso, TJ?
Eu respirei fundo.
— Eu sinto muito, Paola, eu realmente sinto muito. Mas não foi como ele
disse que foi.
Ela fez um gesto com a mão, como que dispensando o que eu estava
dizendo.
— Sim, sim. Que seja.
— Não. Não. Paola. Não é "que seja'. Não estava tudo na minha cabeça,
você tem de acreditar nisso. Luke esteve mentindo para nós duas.
Ela balançou negativamente a cabeça.
— Você simplesmente não entende, não é? — ela perguntou. — Ele gosta
de mim. Ponto final. Agora arrume seu próprio namorado — e começou a
andar pelo corredor.
Eu não podia deixar que ela se fosse dessa forma. Ia ser a coisa mais difícil
que já tinha feito e eu sabia que iria magoá-la, mas ela tinha de saber a
verdade.
— Falei com ele depois que ele contou para você aquela história de eu ter
me jogado em cima dele e...
Vi que ela começou a ir mais devagar, então a alcancei de novo.
— Escute, Paola, eu sinto muito de ter de lhe dizer isso e... E... Eu tenho
certeza de que Luke gosta de você. Ele me disse que gosta de você, mas ele
também me disse que vai terminar com você.
Paola parou. Ela não olhou para mim, mas dava para ver que ela estava
ouvindo.
— Ele... Ele disse que quer ficar comigo e que não quer magoá-la, então
ele vai continuar com você por mais um tempo e desapontá-la aos poucos.
Eu nem sequer sei se isso é verdade, mas acho que você tem de
saber o que ele está dizendo pelas suas costas.
Paola não disse nada.
— Eu sinto muito, muito mesmo. E eu não me joguei em cima dele, sério.
Houve uma única vez em que nos beijamos. Uma vez... E não fui eu que
me joguei em cima dele. Não foi mesmo. Ele ficou comigo durante três
horas...
Paola finalmente olhou para mim. Sua expressão era de raiva e mágoa.
— Ele disse para você que vai terminar comigo?
— Sim. Você não percebe o que ele está fazendo, Paola? Ele está dizendo
para nós duas coisas diferentes....
— E... Quando ele a beijou, ele ficou com você por três horas?
Eu confirmei.
Paola passou a mão no cabelo e parecia perturbada.
— Está bem. Está bem... Deixa eu ver se eu entendi. Então você está
dizendo que Luke mentiu para mim sobre você?
— Sim. Você se lembra do meu arranhão de beijo?
— Perguntei para ele sobre isso, e ele disse que Steve devia ter feito isso
em você.
— De jeito nenhum. E, de qualquer forma, você já viu o Steve. Ele
dificilmente tem de se barbear. Eu sei que é difícil de ouvir, mas foi Luke.
— E você está dizendo que ele está planejando me dar o fora?
— Foi isso que ele disse.
— Está bem. Está bem. Então... Se ele me der o fora, você vai namorá-lo?
— Nããão. De jeito nenhum. Eu não posso confiar nele. Nem você. É por
isso que estou lhe dizendo tudo isso. Mas você pode confiar em mim,
Paola. Estou sendo completamente sincera com você agora. E também não
acho que somos as únicas garotas que ele está enrolando. Sian também
acha que ele quer ficar com ela.
— Sian? Aquela garota loira?
— Sim. Ele me disse que não gostava dela. Disse que não era o tipo dele,
mas aí ela me contou que ele a beijou e, quando eu o confrontei,
perguntando sobre isso, disse a mesma coisa que disse para você sobre
mim. Que ela se jogou em cima dele.
Paola parecia chocada.
— Sian? Eu não acredito.
— Bem, não dá para saber o que se passa na cabeça dela, mas eu não acho
que a culpa é inteiramente dela de pensar que tinha chance com ele. Luke
não consegue dizer a verdade para ninguém. Acho que ele quer saber se
pode ter todas nós. Mas eu me enchi dele. Não quero mais nada de mal-
entendidos, essa coisa de não saber o que está acontecendo. Eu quero estar
com pessoas que são totalmente sinceras, em quem posso confiar e que
confiam em mim. Quero que sejamos amigas de novo mais do que tudo
neste mundo.
Paola me deu um olhar longo, duro e frio.
— Eu vou matá-lo — ela disse, virando-se e indo embora.
Olhei para ela, perguntando-me se devia segui-la, quando Izzie chegou
atrás de mim.
— Deixe-a — ela disse. — Ela provavelmente precisa
ficar sozinha durante um tempo.

E-mail: Mensagens enviadas (1)


De: gatacomcerebro@psnet.co.uk
Para: hannahnutter@fastmail.com
Data: 15 de dezembro
Assunto: Amor

Querida Hannah,
Nossa, como sinto sua falta. Tem acontecido tanta coisa por aqui e eu
aprendi tanto, principalmente que a coisa mais importante em qualquer
relacionamento é a confiança. Eu realmente gostava de Luke, mas não
posso confiar nele, não como confio nas minhas amigas. Eu realmente
espero que eu possa recuperá-las.

Com amor, TJ

E-mail: Caixa de entrada (1)


De: hannahnutter@fastmail.com
Para: gatacomcerebro@psnet.co. uk
Data: 16 de dezembro Assunto: Amor

Minha pequena T],


Mim achar que você é muito sábia e eu só quero que você saiba que,
mesmo que estejamos a quilômetros de distância agora, eu confio
completamente em você. Amigos são para sempre, e eu vou torcer daqui de
longe para que elas sejam sensatas e façam as pazes com você.

Com amor e outras coisas mais, Hannahlulu

CAPITULO 20
A APRESENTAÇÃO

— Ele acabou de entrar — disse Izzie, vindo para o estande em que eu


estava com a Olívia afixando nosso trabalho para o projeto. Era o dia da
apresentação, e todos os envolvidos tinham sido dispensados da escola à
tarde para ir ao Instituto em Highgate a fim de se preparar para a noite. O
saguão estava fervendo com o barulho dos professores e alunos, andando
de um lado para o outro, fazendo os últimos ajustes, todos ocupados,
tentando mostrar o melhor de seu trabalho no espaço delimitado.
— Eu acho que é hora de enfrentar as dificuldades eu disse, olhando por
cima do ombro e vendo que Luke vinha na minha direção.
— Conte-me depois como foi — disse Izzie, apontando para o outro lado
do saguão. — Eu vou ficar logo ali, caso você queira que eu arranque a
pele dele.
— O que aconteceu com a sua filosofia budista de não fazer mal a
nenhuma criatura viva?
— Eu não o mataria — ela disse, com um sorriso —, só o mutilaria.
— Obrigada, Iz — eu disse, virando-me para o quadro e começando a
afixar meu cartaz que detalhava todas as pessoas que tinham morado em
Hampstead. O nosso espaço estava impressionante. De um lado, estavam
todas as fotografias que Steve tinha tirado para mim antes de termos
terminado, fotos coloridas ampliadas das casas que visitamos. À direita,
estavam meus cartazes de todas as pessoas famosas que tinham morado na
região, um mapa de onde elas moraram e uma seleção feita por Luke de
citações dos escritores e de fotos de alguns dos quadros da região. Sian
tinha feito umas ilustrações fantásticas das ruas, lojas e casas, e Olívia tinha
feito um ótimo trabalho ao representar todos os fragmentos de informação
entre elas. O efeito geral era bem profissional e chamativo.
— Está começando a tomar forma — disse Olívia, olhando de longe,
quando Luke se juntou a nós. — Acho que vai ficar bom, você não acha,
Luke?
Luke olhou para mim, e não para o trabalho.
— É, está ótimo. Desculpem pelo atraso. É... Olívia ele disse, colocando a
mão no bolso e tirando a chave do carro —, você podia começar a tirar as
caixas do porta malas do meu carro? Tenho um monte de brochuras sobre
as casas para as pessoas levarem, se quiserem. Só preciso checar algumas
coisas aqui e já vou ajudá-la a descarregar.
— Claro — disse Olívia, dirigindo-se para a porta. Continuei a afixar o
trabalho.
— Por que você não retornou nenhuma das minhas ligações? — perguntou
Luke. — Eu estou enlouquecendo.
— Ah, acho que você sabe exatamente por quê — eu disse, sem me virar
para olhar para ele.
— Na verdade, eu não sei — ele disse. — Acho que precisamos conversar.
Eu não pude resistir.
— Oh, nós temos que fazer isso agora? — perguntei.
— Sim. Preciso saber o que está acontecendo...
— Ah, não dificulte as coisas, Luke — eu disse, virando-me para ele
finalmente. — Hoje é a grande noite.
— Você sabe que eu terminei com a Paola, não sabe?
— Eu sei que a Paola terminou com você — eu disse. Lucy me contou. —
Pelo que parecia, Paola não tinha perdido tempo e terminara com ele no
mesmo dia em que falei que ele estava mentindo.
— Então significa que isso não será mais um problema entre nós.
— O quêê? — eu não podia acreditar em como ele era descarado. — É...
Vamos parar um instante para cair na real, Luke. Eu acho que há um
grande problema entre nós, alguns, na verdade. Um, você é um mentiroso.
Dois, você parece ter algum tipo de problema em ficar sozinho, e três, eu
não posso confiar em você. Ah. E quatro, eu não o namoraria nem se você
fosse a última pessoa no planeta.
Luke parecia surpreso.
— Mas... Eu achei que tínhamos algo especial.
— A Paola também achou isso, e a Sian também, e quem sabe quantas
outras idiotas. Agora, se você me dá licença, acho que vou ajudar a Olívia
com essas caixas.
Nessa hora, Sian chegou e olhou recatadamente para Luke. "Ele é todo
seu", eu pensei, atravessando o saguão. Izzie me alcançou na porta.
— Está tudo bem?
— Claro. E você? As suas coisas estão prontas?
Izzie fez que sim, com a cabeça virada na direção de seu estande. Ela
conseguira vários pôsteres dos líderes das diferentes religiões, e uma
grande estátua do Buda Sorridente imperava sobre uma mesa na frente, e o
bom e velho Steve tinha fotografado todas as igrejas da região para ela. Ela
até tinha convencido Trevor a se vestir como um swami, embora ele não
parecesse muito à vontade com isso, pois as pessoas passavam por ele
cantando Hare Krishna.
De repente, os olhos de Izzie se voltaram para a porta.
— Oh, meu Deus — ela disse. — Alerta grande de gatos. Ding dong. Olhe
para a esquerda. De que escola é aquela aparição divina?
Eu me virei para onde ela estava olhando e vi que um garoto alto tinha
entrado atrás da Olívia. Ele era deslumbrante, tipo, ele podia ser o irmão
mais novo do Orlando Bloom.
— Não sei, mas ele com certeza é um hubba hubba cinco estrelas — eu
disse, examinando-o. — A Paola já está aqui?
— Ela está lá no fim do saguão, ajudando a Lucy — disse Izzie, apontando
para a direita do saguão, onde Lucy estava ocupada vestindo um
manequim, enquanto Paola dava instruções. Aí Izzie riu. Parece que elas
notaram o garoto gato também.
Eu olhei e vi que Lucy e Paola estavam olhando na direção do garoto. Lucy
nos viu olhando e acenou para nós. Quando acenamos de volta, Paola
desviou o olhar e se virou quando me viu.
— Como está a Paola, a propósito? — eu perguntei.
— Ela tem estado bastante quieta durante a semana toda — disse Izzie. —
Ela ainda não está falando com você?
— Ela falou comigo ontem — disse —, quando saímos da aula de
matemática. Mas para dizer que ela nunca mais falaria comigo.
— Ah — disse Izzie. — Então ainda há esperança.
— Como assim?
— Ninguém nunca pode dizer nunca. Ontem, ela disse que nunca mais
olharia para outro garoto e olhe para ela agora. Ela definitivamente está
examinando o garoto hubba hubba. Se ela pode quebrar a promessa de
nunca mais olhar para um garoto em vinte e quatro horas, ela pode voltar a
ser sua amiga.
Alguns instantes depois, Lucy atravessou a multidão e se juntou a nós.
— Ei, vocês viram aquele garoto ali?
— Ah, sim — disse Izzie. — Mucho gostoso.
— Foi exatamente o que a Paola falou — disse Lucy.
— Acho que ela pode estar no caminho da recuperação.
Luke passou pela porta e olhou para mim, para Lucy e para Izzie, e depois
para Paola, do outro lado do saguão.
— Tenho que pegar umas cópias que foram feitas de última hora — ele
engoliu em seco e desapareceu rapidamente.
Na meia hora que se seguiu, nós nos ocupamos com as preparações. Eu
fiquei longe da Paola. Sentia que a bola estava na quadra dela e não havia
nada que eu pudesse dizer ou fazer para tê-la de volta. Nesse meio
tempo, Izzie veio me ver, e foi ver Paola e Lucy. Aí a Lucy veio até mim
enquanto Paola me olhava do estande de moda, e eu a olhava do estande de
história.
Depois de meia hora disso, olhei para ela e peguei-a olhando para mim. Ela
colocou a língua para fora e fez uma cara de boba. Aí ela me olhou com
uma sobrancelha levantada, que era como um desafio, como que dizendo "o
que você vai fazer a respeito disso?". Fiz minha pior careta de volta para
ela. Eu a praticara em frente ao espelho anos atrás. Coloquei o dedo
indicador no nariz para arrebitá-lo, estiquei os cantos da boca com meus
dedos mindinhos, coloquei a língua para fora e envesguei os olhos.
Nessa hora, quem passou, se não o garoto hubba hubba? Ele parou e olhou
para mim. Atrás dele, vi Paola caindo no riso.
— Hummm. Bem feminina — disse o garoto.
— Eu tento — eu disse. — Me disseram que é um olhar muito sedutor.
O garoto riu.
— Inesquecível — ele disse, e foi embora.
— Querendo faturar de novo? — disse uma voz familiar alguns instantes
depois.
Era a Paola.
— Sim, mas acho que ele não caiu no meu olhar supersensual — eu disse,
rindo.
— Covarde — disse Paola. Mas ela estava sorrindo quando falou isso.
— Eu sinto muito, muito mesmo...
— Que chaaaata — bocejou Paola. — Nós já passamos pelas desculpas e
pelos distanciamentos. Olha. O principal é que eu sinto a sua falta. E, acima
disso, Lucy e Izzie não podem passar a vida ficando entre nós.
Segurei a respiração por um momento. Ela estava fazendo as pazes?
— Está bem. Chega de desculpas, mas você tem que saber que eu sei que
estive fora de mim, mas que nunca, nunca teria sonhado em fazer o que fiz
se não achasse que Luke era muito especial. Você se lembra semanas atrás,
quando falamos sobre almas gêmeas. Eu... Eu achei que Luke era minha
alma gêmea. Sei que parece a maior estupidez agora que sabemos que ele é
um mentiroso, mas... Eu estava com todos os sintomas que a Izzie
descreveu. Doente, boba, indisposta, não conseguia dormir, não conseguia
pensar direito. Achei que fosse daquelas coisas que só acontecem uma vez
na vida.
Paola não disse nada durante um tempo.
— O Cara, é?
— Sim. Salafrária.
— É. Grande salafrária.
Por um momento, achei que ela ia ficar brava comigo por ter dito que Luke
era minha alma gêmea. Decidi mudar de assunto.
— Então, você estava dizendo... Pobres Lucy e Izzie. Se não nos falarmos,
vai ser cruel com elas.
— É, por que elas sofreriam se Luke é que é o ser desprezível nisso tudo?
Onde ele está, falando nisso?
— Lá atrás, em algum lugar. Mantendo-se fora do caminho. Desde que
arrumamos nosso estande, ele deu diversas desculpas para desaparecer.
Acho que ficar no mesmo lugar conosco é meio difícil para ele, além do
fato de Lucy e Izzie olharem furiosas para ele do estande delas.
— Ótimo — disse Paola. — Se eu nunca mais o vir, ainda vai ser pouco.
Lucy e Izzie chegaram.
— Ei, vocês estão conversando.
— Sim — disse Paola. — Achamos que devíamos isso a você e à Izzie.
Vocês vão se esgotar ficando entre nós duas, então, por causa de vocês e
somente por isso, nós vamos fazer as pazes. Está bem, TJ?
— Está bem duas vezes — eu disse.
— Excelente — concordou Lucy.
— Agora, o mais importante — disse Paola -, vocês devem ser burras o
bastante para acreditar que encontrarão O Cara e serão racionais nesse
processo, mas eu, a única pessoa sensata aqui, sei melhor que há muitos
Caras por aí. Então. Quem é aquele gato atravessando o saguão?
— Eu o vi primeiro — disse Izzie.
— Não, fui eu — disse Lucy, dando um leve empurrão em Izzie.
— TJ, você quer fazer valer seus direitos antes que a batalha comece? —
perguntou Paola.
— Você gostou dele? — perguntei para Paola.
— Dãã, sim. É exatamente disso que eu preciso no meu momento de luto.
— Então ele é seu — eu disse.
— Covarde — riu Paola. — Bem, nós nem sabemos ainda quem ele é. Mas
eu pretendo descobrir.
— Achei que você tinha se enchido de garotos — disse Izzie.
— Não — disse Paola. — Só daqueles como Luke. Há muito mais peixes
no oceano, e nem todos são traíras.
— Muito sábia — disse Izzie. — E se você não obtiver sucesso logo no
início...
— Tente, tente, tente outra vez — Lucy terminou por ela.
— Não — disse Izzie. — Se você não obtiver sucesso logo no início, pular
de pára-quedas não é para você.
Nós todas caímos no riso. Lucy olhou para nós três e abriu um sorriso
largo.
— Nossa, estou tão feliz por sermos amigas de novo. Essa última semana
foi um inferno. Estou muito feliz por você ter conseguido ver as coisas do
ângulo da TJ, Paola...
— É — disse Izzie. — Ela também passou por um momento difícil e, para
toda história, há dois lados.
— Ou três, se você estiver envolvida com Luke — disse Paola.
Eu quase ia dizer "quatro, se você incluir a Sian", mas me contive.
— É — disse Izzie. — É como aquele ditado: antes de criticar uma pessoa,
ande uma légua com os sapatos dela.
— Ah, muito sábia, Obi-Wan Kenobi — disse Paola. Mas há uma outra
parte desse ditado: Antes de criticar uma pessoa, ande uma légua com os
sapatos dela. Dessa forma, quando criticá-la, você estará a uma légua de
distância e terá ficado com os sapatos.
Nós todas rimos de novo. Eu me sentia ótima. Pelo canto do olho, vi Luke
entrando. Ele olhou para nós e mudou de direção abruptamente. Eu não
liguei. Na verdade, estava aliviada por ele ter desaparecido. Eu mal podia
acreditar. Aqui estávamos todas: eu, Izzie, Lucy e Paola juntas, nos
divertindo, como costumávamos fazer. Só havia mais uma pessoa com
quem eu precisava acertar as coisas, e era Steve. Eu o tinha notado logo
que chegara ao saguão: ele estava lá, à esquerda, arrumando suas
fotografias no estande dele. Steve tinha se mantido cabisbaixo o tempo
todo, como se estivesse num mundo próprio. Lucy me viu olhando na
direção dele.
— Ele está bem — ela disse. — Ficou chateado, mas vai ficar bem.
— Eu me sinto mal por ele — eu disse. — Mal mesmo. Steve merecia mais
do que a forma como terminei com ele.
— Ele vai superar. Steve não é do tipo de ficar se remoendo.
Estremeci por dentro, pois pensei em como ele deve ter se sentido ao
acordar, ligar o computador e achar a minha mensagem lá. Tipo: "Bom-dia,
você levou um fora. Com amor, TJ". Como eu podia ter desconsiderado
tanto os sentimentos dele?
— Deve haver um jeito certo de terminar com as pessoas — eu disse. — É
como se eu tivesse ido para um extremo com o meu e-mail idiota,
confiando na minha política de "tenho que ser sincera, agora mesmo". E
Luke foi para o outro extremo, ao evitar a confrontação, sem dizer nada a
ninguém, exceto o que as pessoas queriam ouvir. Nós dois acabamos
magoando as pessoas. Deve haver um meio-termo de fazer isso.
— Pelo que parece, há cinqüenta formas de terminar uma relação — Lucy
riu, e começou a cantar a música Fifty ways to Leave Your Lover do Paul
Simon. Tentei tapar a boca da Lucy, pois sua voz foi ficando cada vez mais
alta.
Eu queria muito ir lá e falar com Steve, voltar para o que éramos, amigos,
divertindo-nos, pois, embora eu não quisesse voltar com ele, sentia falta de
sua companhia. Por um instante, compreendi por que Luke achava difícil
terminar relacionamentos. Talvez uma pessoa não seja o grande amor da
sua vida, sua alma gêmea, O Cara, mas, como com Steve, você ainda goste
dela. E, por isso, você certamente não gostaria de magoá-la.
"Você pode amar as pessoas de modos diferentes", pensei, como diria
Luke, "em níveis diferentes". É difícil saber que você vai magoar uma
pessoa ou, no meu caso, que você magoou uma pessoa. Acho que, por Luke
não ter dito nada, deve ter sido uma opção fácil. Mas ainda assim as
pessoas se magoam, eu me lembrei.
É ruim ficar enganando uma pessoa com falsas pretensões, dando-lhe
esperança onde não existe nada. Só prolonga a dor. Mas, ao ver Steve,
pensei: "Talvez Luke não tenha sido tão desprezível quanto covarde". É um
problema enfrentar a responsabilidade de ter um relacionamento com uma
pessoa que gosta realmente de você, pois você segura o coração dela nas
mãos. Eu não quero ser uma covarde. Um dia, muito em breve, vou ligar
para Steve e falar com ele sinceramente sobre tudo o que aconteceu. Só
espero encontrar as palavras certas e que ele ainda seja meu amigo. Não
meu namorado. Amigo. Mesmo que as coisas não tenham dado certo com
Luke, eu não posso negar que o que eu tinha sentido na noite em que ele
veio a minha casa tenha sido muito especial. Eu quero mais daquele
sentimento fascinante de estar desesperadamente apaixonada, mas sem
as complicações das pessoas se magoando, os segredos e as mentiras.
Às seis e meia, todos estavam prontos, e houve um silêncio de antecipação
quando a Sra. Allen mostrou o saguão para Susan Barratt, a diretora da
escola, e Sam Denham, o jornalista. O saguão estava maravilhoso, pois
alguns alunos do ginásio tinham enfeitado uma árvore gigante de Natal no
palco, e o espaço estava com um cheiro festivo, com um delicioso cheiro de
canela e cravo vindo do ponche sobre a mesa de refrescos preparada para o
público.
Tanto Sam como a Sra. Barratt pareciam muito impressionados e pararam
para conversar com quase todo mundo nos estandes. Sam passou um pouco
mais de tempo no estande de moda, falando com a Paola. Ela parecia muito
satisfeita, olhou para mim e deu uma piscada depois que ele foi embora.
Quando Sam e a Sra. Barratt deram a volta pelo saguão, as portas se
abriram e os amigos e as famílias encheram o lugar.
Mamãe e papai pareciam interessados de verdade em tudo e, depois que
papai deu uma volta em todos os estandes, ele voltou e passou um tempo
examinando o nosso.
— Você adora morar aqui, não é? — ele perguntou, olhando para o meu
mapa de Hampstead.
Eu confirmei.
— Há tanto para fazer e ver. Lembre-se daquele dita do de Samuel
Johnson: "Canse-se de Londres e você estará cansado da vida.”
— Ele estava certo — disse papai. — Nessas últimas semanas, percebi o
quanto amo Londres também. Adoro ir a shows em Barbican. Adoro andar
em Heath. Adoro os teatros, os cinemas, restaurantes. Está tudo aqui perto.
— Então por que vamos nos mudar?
Papai sorriu.
— Boa pergunta. Uma pergunta que eu tenho feito a mim mesmo muitas
vezes nessas últimas semanas. E sua mãe também. Então, nós decidimos.
Não vamos nos mudar. Ainda não. Ainda não estamos prontos para
abandonar nossa vida de Londres. Não. O novo plano é que eu permaneça
meio período no hospital e use meus dias de folga para curtir Londres. Nós
moramos aqui há tanto tempo, mas ainda há muitas coisas que não fizemos.
Estivemos muito ocupados trabalhando! Não quero ir para um lugar calmo
e não ter nada para fazer além de trabalhar na estufa o dia todo. Não. Nós
vamos ficar quietos no lugar. Então... Como você se sente quanto a isso?
Eu olhei para Paola, Lucy e Izzie.
— Como me sinto? — eu lhe dei um grande abraço. — É assim que me
sinto.
Quando meus pais foram buscar um ponche na mesa de refrescos, notei um
casal que tinha acabado de entrar no saguão. Com eles estava o garoto
hubba hubba. Eu não tinha sido a única a vê-los porque, quando eles
vieram na direção do nosso estande, de repente Paola, Lucy e Izzie
apareceram todas atrás de mim.
— É meu — disse Lucy.
— Não, é meu — disse Izzie.
— Não, é meu, meu, meu — insistiu Paola.
Eu ri ao vê-las se acotovelando, quando Olívia saiu para cumprimentar o
casal.
— Oi, mamãe e papai — ela disse, e se virou para mim.
— Esta é TJ, que trabalhou no projeto comigo.
— Oi — eu disse.
Aí ela se virou para o garoto hubba hubba.
— E este é meu irmão, William.
Eu fiquei de queixo caído.
— Mais um de seus olhares atraentes — ele disse, sorrindo, quando fechei
a boca.
— Tenho vários — eu lhe informei, quando ele foi para trás de mim para se
juntar aos pais dele, que estavam olhando para o trabalho de Olívia. Eu
rapidamente me virei para as garotas, que estavam todas à direita da
divisória. Apontei para o garoto.
— É o irmão da Olívia — eu sussurrei. — O irmão da Olívia é o melhor
amigo de Luke.
— William? — perguntou Paola.
Eu confirmei.
— Eu ouvi Luke mencionar o nome dele, mas nós nunca nos encontramos
— ela disse.
O garoto se virou e deu um longo olhar para Paola.
— O concurso acabou — disse Lucy. — Não há dúvida em quem ele está
interessado aqui.
Izzie morreu de rir.
— O irmão da Olívia é o melhor amigo de Luke. Legal! — ela me cutucou
para olhar para o estande onde Luke estava sentado com Sian. Parecia que
ele ia ficar doente. Seu olhar cruzou com o meu e senti uma corrente
elétrica correr por mim. O olhar dele estava tão triste quando olhou para
mim que, por um breve momento, senti uma ponta de arrependimento pelo
fato de as coisas não terem acontecido de um jeito diferente. Ele havia dito
que achava que tínhamos algo especial. Eu acho que tínhamos, mas...
Como eu podia acreditar nele? Esse é o problema com mentirosos: você
nunca sabe se eles estão dizendo a verdade ou se estão enganando você. Eu
desviei meu olhar.
Paola também olhou para Luke, virou-se de costas e agitou os cílios na
direção de William.
— Hummmmmm — ela disse, sorrindo para nós. — O melhor amigo de
Luke. Isto pode ser muito interessante.

Anúncio de casamento

Na quarta-feira, 24 de dezembro, Marie Watts se casou com Stuart


Callaghan em Bigbury Bay, em Devon. Os convidados do casamento
viajaram em um trator-do-mar para o Hotel Burgh Island, onde ficaram
presos durante dias, devido a nevascas não previstas. A dama-de-honra, TJ
Watts (15) disse: "Meus pais estão muito contentes. No final das contas, a
minha irmã teve um casamento branco!”

FIM

Comunidade: Digitalizações de Livros


http://www.orkut.com.br/Main#Community.aspx?cmm=34725232

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