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UNIDADE CURRICULAR: Literatura e Artes Visuais

CÓDIGO: 31095

DOCENTE: Maria do Rosário Lupi Bello

A preencher pelo estudante

NOME: Maria Gertrudes Soares Chaves Magalhães

N.º DE ESTUDANTE: 1400551

CURSO: Estudos Europeus

DATA DE ENTREGA: 25-11-2019

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TRABALHO / RESOLUÇÃO:

Écfrase não surgiu com a literatura, era um conceito grego para desenvolver a
oralidade, daí o termo ter origem em duas palavras que no seu conjunto
significam falar para fora, descrever algo. Era uma técnica de oralidade em que
os alunos observavam uma pintura ou escultura e descreviam o que viam,
“pintavam com palavras”. Esta técnica aparece nos estudos sobre retórica em
Dionísio de Halicarnasso¹, também nos primórdios da Era Cristã por Hélio Teão
ao descrever pessoas, ações, lugares estações entre outros. O arquiteto grego
Hermógenes estudou retórica e deu instruções específicas sobre como
elaborar a écfrase.

Como surge então a écfrase na literatura? Os poetas procuraram ampliar as


fronteiras da escrita começando a estudar os pintores com o objetivo de dar
voz às obras de arte, para que a pintura conseguisse falar através de um
poema utilizando a écfrase como intermediária no ato da criação. Tanto
escritores como pintores² passaram a utilizar obras de outros como inspiração
para os seus trabalhos tornando a poesia semelhante à pintura e vice-versa.

Embora Homero desconhecesse a écfrase como técnica de escrita, entendia-a


como uma mais-valia, daí que a descrição que faz do escudo de Aquiles é a
mais antiga que se conhece na utilização da écfrase, pois dá uma descrição
detalhada de uma sociedade, ou seja faz um retrato cultural e social de um
povo. A écfrase aqui tem um sentido histórico e também antropológico pois
permite-nos passados séculos, perceber a identidade de um povo, da época
em que viveram e da organização da sua sociedade. É uma descrição repleta
de dinamismo, cor, som e vários planos de pormenor. Comparando-o à pintura
é como se fosse um fresco a evoluir à medida que se vai lendo.

Esta comparação entre pintura e poesia já vem de Simônides de Ceos³ que


disse: “A pintura é uma poesia silenciosa e a poesia é uma pintura que fala”
criando uma relação entre imagens e palavras.

Mas foi à volta da frase escrita por Horácio – “Ut pictura poesis”⁴ que surgiu o
conceito comparativo entre poesia e pintura, o qual foi interpretado de múltiplas
formas chegando ao século XVIII envolto em muitas discussões. É neste

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contexto que surge o crítico alemão Lessing⁵ que fez um estudo exaustivo
sobre o tema usando por base o poema de Virgílio⁶ sobre Laocoonte e os
filhos e a respetiva escultura descoberta em Roma em 1506. Ao fazer o
paralelo entre estas duas obras, traça a natureza das artes visuais e da poesia.
Como resultado do seu estudo elaborou um ensaio “Laocoonte”⁷ no qual
desmitifica toda a controvérsia envolta do tema. Nele descreve as caraterísticas
da poesia e da pintura mostrando que cada uma tem a sua própria estrutura, o
seu próprio eixo, o seu domínio e natureza, pondo por terra a ideia até então
aceite como sendo artes similares, com os mesmos princípios e regras. Assim,
relaciona a poesia como arte da linguagem em que a noção de tempo lhe é
sujeita e a pintura como arte da imagem adstrita ao espaço num determinado
momento.

A escultura e o poema descritivo de Laocoonte, se apresentam ao público de


forma a lhes transmitir a dor sentida sem lhe destruir a beleza. Segundo ele, na
escultura, o artista fez a boca de Laocoonte entreaberta antevendo o perigo
que lhe acercava e a dor (pathos) sentida realçando ao mesmo tempo a beleza
do conjunto, mas se a boca estivesse totalmente aberta a visão seria
completamente diferente, a dor seria exposta de forma horrorizada, roubando-
lhe toda a beleza. Na poesia, com a écfrase não há risco de perder a beleza do
poema porque este apenas entra no campo da imaginação, não se materializa.
Como se desenvolve no tempo, não permite excessos de dor porque é
composta por quadros com ações antes e depois como é exemplificado no
poema de Virgílio. Não existe erros na descrição de Laocoonte, porque cada
um tirou partido da sua arte para melhor descrever a morte de Laocoonte e os
filhos.

Tanto neste poema como na descrição do escudo de Aquiles a écfrase permitiu


expressar vivacidade e clareza ao descrever objetos artísticos imaginários⁸.
Em suma, a poesia é composta por símbolos linguísticos e, conforme o ensaio
de Lessing, com uma representação progressiva e com uma sequência no
tempo, desta forma o poeta não arruína qualquer efeito estético do conjunto.
Lessing com a sua visão veio abrir novos horizontes na literatura moderna.

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Notas:
1) Historiador e crítico literário grego, nascido no I século a.C.;
 
2) Giotto e Fra Angélico, pintores italianos do século XIV passaram para a tela
inúmeras passagens bíblicas;

3) Poeta grego, o melhor autor de epigramas da época arcaica;

4) Na sua Epístola aos Pisões;

5) Poeta, dramaturgo, filósofo e crítico de arte nascido em 1729;

6) A Eneida é um poema épico do século I a.C.;

7) Uma escultura composta por três figuras humanas, o sacerdote troiano


Laocoonte e os dois filhos sendo atacados por duas serpentes conhecidos
apenas pela écfrase clássica da Eneida;

8) A morte de Laocoonte e dos filhos, até ser descoberta a escultura no século


XVI, apenas era conhecida pela literatura.

Bibliografia:

AVELAR, Mário (2018), "Poesia e Artes Visuais. Confessionalismo e écfrase". Lisboa,


Imprensa Nacional Casa da Moeda, pp. 35–66, 93-110;

MORA, Carlos de Miguel – Os limites de uma comparação: ut pictura poesis. Aveiro:


Universidade de Aveiro, 2004. Ágora. Estudos Clássicos em Debate;

UNIANDRADE: BREVES ANOTAÇÕES SOBRE O CONCEITO DE ÉCFRASE [em linha].


Atual. junho 2017 [Consult. 21 de novembro de 2019]. Disponível na Internet
˂URL:http://teorialiterariauniandrade.blogspot.com/2017/06/breves-
anotacoessobre-o-conceito-de_8.html ˃.

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