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determinados grupos específicos e incentivar a procriação através de incentivos as famílias que tivessem
três ou mais filhos legítimos
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é, compostos de hexâmetro que se alterna com pentâmetro. Conforme nos apresenta Paul
Veyne (2015, p.9) o ritmo elegíaco era empregado para poemas de amor, luto, versos
didáticos, sátiras entre outros). Criados pelos jovens poetas Catulo, Propércio e Ovídio,
esses poemas tinham a intenção de expressar de forma intensa e real as experiências
amorosas vividas por eles ao lado de suas amantes4. Poesia da alta sociedade, a elegia
romana “[...] defende o real apenas para introduzir uma imperceptível fissura entre ela
e ele; uma ficção que se desmente, ao invés de ser coerente consigo mesma e competir
com o registro civil.” (VEYNE, 2015, p. 10).
Uma literatura de caráter didático, Ars Amatoria (Arte de Amar) apresenta sua
composição interna estruturada em três livros onde o poeta apresenta conselhos para
quem quer versar-se na arte da sedução. No primeiro, ele dedica aos homens, ensinando-
os a escolher a mulher que deseja partilhar o seu amor: no segundo Ovídio argumenta
sobre as formas de conquistar e manter a mulher amada e no terceiro livro dirige-se as
mulheres, ensinando-as também as estratégias da arte da conquista.
Ars Amatoria (Arte de Amar) foi produzida e publicada entre a segunda metade do
século I a.C. Foi consumida pelo público leitor da alta sociedade romana de sua época,
mas também foi lida pelos leitores dos séculos seguintes. Sua obra circulou pelas
bibliotecas públicas conforme salientado por Grimal (1991, p.154) pois, devido ao
estimulo ao amor e à sedução que seus conselhos ofereciam ao público leitor romano, o
imperador Augusto “[...] julgou-se no direito de banir, por “imoralidade”, esses poemas
amorosos das bibliotecas públicas, [...]”. Seu estilo poético nobre, leve, delicado e
muitas vezes engraçado tornou seus poemas bastante atrativos. A influência de seus
poemas se fez presente no período da Antiguidade tardia e na Idade Média, bem como
nas artes e literatura ocidental.
4
Em sua obra, observamos que as relações entre os gêneros são representadas como relações de poder,
onde o proporcionar e receber prazer está intimamente relacionado a questão sexual romana do ser
passivo e ativo; o uso de diversas metáforas discursivas onde é possível perceber a relação de submissão
feminina para com os homens;
A mulher em atitude ativa: conselhos sobre a estética feminina, e o uso das vestimentas, a utilização da
voz e do corpo para sedução, uma série posições sensuais que devem ser usadas pelas mulheres no
momento do sexo;
Outro ponto que destacamos é a menção de um prazer compartilhado entre homens e mulheres,
desfazendo-se da oposição entre o papel ativo e passivo nas relações sexuais, colocando ambos em
posição de igualdade no campo sexual
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A importância de se eleger a sexualidade como objeto de estudo fundamenta-se
na perspectiva da nova História cultural que nasce da historiografia francesa da Escola
dos Annales (1929-1989). Esse campo do saber historiográfico é permeado pela noção de
cultura que abarca em seu conceito as linguagens, representações e práticas realizadas
pelos seres humanos, em relação uns com os outros e na sua relação com o mundo.
Segundo Burke (2005, p. 148-149) a nova História cultural expandiu os caminhos
de pesquisa do historiador, incluindo novos objetos, levando em consideração desde a
ficção até as imagens, entretanto o autor ressalta que novas fontes exigem formas próprias
de serem analisadas como evidências históricas. Inúmeros são os objetos da História
cultural face a dimensão do conceito de cultura que predomina nos meios historiográficos,
mas acreditamos conforme nos apresenta Roger Chartier (1990, p. 17) através do
conceito de representação que essa teoria metodológica nos oferece uma porta para que
se compreenda a produção de sentido das imagens, a reconstrução das práticas culturais
em termos de recepção das representações em suas diferentes formas de apropriação, além
de nos permite o diálogo com as outras ciências como a sociologia, arqueologia e a
antropologia.
As noções de práticas e representações culturais concebidas por Chartier (1990,
p.17) são perspectivas da história cultural que se interessa pelos sujeitos produtores e
receptores de cultura. As práticas sociais relativas a essas produções podem ser
consideradas como os modos de ver e modos de fazer, ou seja, como os homens se
comportam em uma sociedade: como se vestem, falam, senta-se ou andam, morrem ou
adoecem, como tratam-se entre si e aos estrangeiros, visando uma legitimação dos
comportamentos. Inserida nesse campo historiográfico, a literatura apresenta-se como
uma fonte histórica onde é possível perceber maneiras de produção da representação da
construção histórica-social.
Considerada como uma forma de representação do mundo social, a literatura
reproduz a maneira de pensar e agir, ou seja, valores que a sociedade de um dado período
deseja e espera encontrar. Desse modo conforme argumenta Cardoso (2003, p.264) as
obras literárias podem ser estudadas enquanto documentos sociais, reconhecendo-as
como “[...] retratos da realidade social”. Através dela é possível reconhecer a riqueza da
diversidade cultural que compõe uma dada sociedade, partindo das experiências pessoais
dos indivíduos que dela fazem parte.
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A obra literária Ars Amatoria5 (Arte de Amar) de Ovídio, escrita em três livros
publicada6 no início de nossa era (Séc. I d. C). Falar sobre o amor e erotismo em Roma,
é imprescindível mencionar Ovídio, poeta latino que encontrou para história romana
como um revolucionário do amor, destacando sobretudo o papel da mulher como
personagem ativa e independente na arte da sedução. Suas exposições o levaram a ser
acusado pelo imperador Augusto de imoral e incitador ao adultério, acarretando sua
expulsão de Roma e exílio para a cidade de Tomos, na costa do mar negro.
Publicada em um momento em que o imperador Augusto tentava restabelecer de
todas as formas os tradicionais costumes romanos, Ars Amatoria (Arte de Amar), foi
considerada uma obra extremamente audaciosa. Os temas explorados por Ovídio, embora
sejam escritos de forma delicada e nobre, em um tom poético e leve, reflete as mudanças
ocorridas no final da República referente a emancipação feminina, a transformação da
sua mentalidade e atitudes, que acompanharam o início do Império. As medidas
reformadoras de Augusto visavam especialmente reafirmar as tradicionais virtudes
romanas da austeridade, sobriedade e fidelidade matrimonial, mesmo que não diretamente
por parte do homem, mas ao menos garantir a estabilidade matrimonial familiar.
Diante desse contexto, Ars Amatoria (Arte de Amar) mostrou-se contraria as
intenções do imperador, pois os escritos de Ovídio baseavam-se na constatação pública
dos comportamentos sexuais que os homens e mulheres romanos já viviam, apontando
que o “[...] prazer sexual para ser plenamente satisfatório, tinha de ser mútuo, e a relação,
livre e espontânea por ambas as partes.” (CUATRECASAS, 1997, p. 132). Em se tratando
de uma obra literária, é preciso salientar a importância da literatura como uma forma de
produção da representação da construção histórica-social.
Segundo Cuatrecasas (1997, p.133) na época de sua publicação, essa obra foi
considerada bastante ousada, haja vista esse período é o momento em que a mulher se
encontrava em pleno processo de emancipação e o governo de Augusto tentava ressuscitar
5
A versão utilizada em nossa pesquisa é a segunda tradução, publicada em 1992, elaborada por Natália
Correia e David Mourão-Ferreira, texto bilíngue português-latim.
6
De acordo com Leni Ribeiro Leite (2013, p. 85) a principal maneira de divulgação dos textos literários
nesse período era a recitação pública, e talvez de alguma forma equivalente a publicação modernamente
entendida. Em geral, nesse tipo de recitação pública, a voz leitora é do próprio escritor que faz a
publicação de seus textos. Publicare, naquele momento, antes de tudo refere-se ao “tornar público, seja
por meio oral, seja por meio escrito.
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as velhas tradições. Nesse contexto, seu livro representou uma verdadeira ruptura na Arte
do Amor. Embora tenha sido acusado pelo imperador Augusto de imoral e incitador ao
adultério, para Cuatrecasas (1997, p. 133) Ovídio não apresenta nenhuma novidade em
seus escritos. Ele escreve sua obra baseado na constatação pública e reconhecimento do
comportamento sexual que os homens e mulheres romanos já viviam onde o “[...] prazer
sexual, para ser plenamente satisfatório, tinha de ser mútuo e a relação, livre e
espontânea por ambas as partes.” (CUATRECASAS, 1997, p.133). Outros poetas, como
Catulo, Tíbulo e Propércio já haviam escrito sobre o amor, mas traziam em suas
exposições somente seus testemunhos pessoais. Ovídio, ao contrário de seus
predecessores não se inspirou em suas experiencias apenas, ele é “[...] testemunha de sua
época. [...] representa fielmente a opinião de seus contemporâneos sobre o amor, a ideia
que faziam de seu papel na vida das criaturas, [...]” (GRIMAL, 1991, p.155).
Ars Amatoria (Arte de Amar) é considerado um “[...] depoimento mais direto,
mais vívido sobre os amores dos romanos no período que separa a República do começo
do Império” (GRIMAL, 1991, p.153). Sucessora das obras Amores e Heroides e completa
a trilogia composta por Remédios do Amor (Remedia Amoris) e Cosméticos para o Rosto
(medicamina Faciei). Os versos dessa obra interagem com o poema Amores porquanto
Ovídio não se inspirou apenas em sua experiencia pessoal, mas na opinião de seus
contemporâneos sobre o amor. Não apresenta novidades: Catulo, trinta anos antes, Tíbulo
e Propércio já expressaram em seus poemas seus mais intensos sentimentos deixando sua
contribuição na elegia erótica romana. Considerado o último dos elegíacos, Ovídio faz
“[...] faz uma espécie de balanço de um meio século de amores do qual Roma saía
transformada, após uma crise moral que destruíra velhas concepções de sete séculos.”
(GRIMAL, 1991, p.156).
Os textos literários, conforme salienta Ferreira (2015, p. 61) são considerados
pelos historiadores sobretudo nas últimas décadas como documentos passiveis de
múltiplas leituras, oferecendo um campo rico de significados para a compreensão dos
valores culturais, sociais e das subjetividades vivenciadas por homens e mulheres no
tempo. Portanto, todos os textos literários que possam oferecer essa compreensão podem
ser usados como fonte para a pesquisa histórica. Considerando que o discurso literário é
produzido por alguém que traduz os valores de determinada sociedade, Chartier (1999, p.
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200) discorre que a escrita não é do autor ou ator, mas a soma do pensamento da
sociedade.
A literatura latina nos permite através de seus renomados escritores, perceber
valores sociais e culturais sociedade romana que influenciaram grandemente o
pensamento ocidental. A contribuição da cultura clássica na formação da sociedade atual,
tendo o modelo Greco-Romano como elementos centrais é incontestável. Segundo
Bezerra (2015, p. 9) por meio das produções literárias romanas é possível “[...] conhecer
o pensamento de nossos antepassados, e, consequentemente, ajuda-nos a compreender
mais claramente o presente.
O poeta, em Ars Amatória se mostra como alguém douto nos assuntos do amor,
iniciando seu livro com um chamado bem peculiar, convidando a quem se interessar a
conhecer as artes da sedução. (OVÍDIO, Ars Am. I, 1-4). Ovidio vai organizando suas
estratégias demonstrando três importantes passos que segundo ele precisam ser
observadas pelos aspirantes ao amor: escolher a mulher com quem deseja partilhar seu
amor; conquistar seu coração e manter o amor conquistado. OVIDIO, Ars Am. I 39-48).
Essa organização elege os jovens romanos, cortesãs e libertas como protagonistas. Para
validar os seus conselhos, o poeta deixa evidente que sua sabedoria vem da sua própria
experiencia, evidenciando com essa alusão um dos traços que compõe a elegia romana
(OVÍDIO, Ars Am. I 33-37).
Após indicar aos homens os princípios da arte da conquista, o poeta termina seus
dois primeiros livros, incentivando seus alunos a aclamar sua sagacidade, considerando
como “mestre na arte do amor”, e declarando sua intenção de também dedicar ao público
feminino conselhos que lhes permitam apreciar e desfrutar das delícias do amor. O poeta
deixa explícito a mulher a qual direciona seus conselhos: as libertas, e não as romanas
livres. Sua obra não teve a intenção de se dirigir as matronas, mulheres romanas
pertencentes aos estratos sociais mais elevados, destinados à maternidade. Ao evidenciar
a homens e mulheres romanos que reconhecessem nos espaços urbanos lugares para
conquistar e viver seus amores, Ovídio entra em contradição com a vontade imperial que
deseja utilizar a cidade e seus monumentos para representar sua autoridade (OVÍDIO, Ars
Am. II, 742-752).
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Ovidio atribui ao homem a responsabilidade de preparar as estratégias para
conquistar o amor daquela que foi por ele a escolhida, mostrando seu papel ativo na
relação amorosa (OVÍDIO, Ars Am. I, 34-39). Ao tomar como exemplo a relação de
subserviência do soldado para com o seu superior, o poeta inverte a posição ativa do
homem em relação à mulher, e essa atitude numa sociedade que o status quo a priori seria
de dominação masculina, causou de fato, grande polêmica (OVÌDIO, Ars Am. I, 69-
79/83). Ao mencionar o prazer compartilhado entre os amantes, Ovídio coloca-os em
posição de igualdade no campo sexual. Seus conselhos são resultantes de suas crenças,
pois “[...] é testemunha de sua época. (GRIMAL, 1991, p. 155).
Ao descrever o ato de amar como uma relação de prazer mútuo, o poeta apresenta
as mulheres como protagonistas, parceiras, um ser que almeja o prazer tanto quanto o
homem, procurando junto com ele o direito a satisfação sexual, assumindo assim a
posição ativa nas relações. Ao aconselhar os homens a demonstrar a sua amada o
sacrifício que fariam para tê-las, Ovídio exalta a paixão amorosa, algo que causava temor
entre os romanos, alterando o comportamento masculino esperado (OVÍDIO, Ars Am, I
45-53).. Ovídio traz a cena as mulheres libertas, prostitutas, cortesãs, desimpedidas no
sentido moral e social. O poeta não se refere ao matrimônio, nem as mulheres destinadas
a ele, pois considera que essa instituição não seja o lugar dos prazeres da conquista, haja
vista o amor segundo ele, não está ligado a obrigação do relacionamento (OVÍDIO, Ars.
Am. II, 236-239, 252-253).
Por fim, observamos que as palavras de Ovídio se mostram contrarias as leis Lex
Iulia de Adulteriis Coercendis, a Lex Iulia de Maritandis Ordinibus publicadas em 18 d.C.
afim de revitalizar a instituição do matrimonio e proibir práticas que contrárias a decência,
honra e o pudor. Ao ressaltar o valor dos versos, das palavras nas relações amorosas,
Ovídio reforça a influência que os poetas tinham no contexto social. Era na poesia
elegíaca que os poetas romanos encontravam a forma de traduzir o poder do amor e suas
consequências na vida humana.
Ovídio expõe que para ser amado e manter sua amada, não basta ao homem ter
um rosto belo e um corpo impressionante, é preciso cultivar a cordialidade, generosidade
e afeto nas palavras e atitudes diante de sua amada. É preciso desfazer-se dos
comportamentos que estabelecem a questão sexual romana, pois o poeta não se concentra
apenas no prazer da conquista, mas na manutenção e compartilhamento do amor nas
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relações amorosos. O poeta utiliza o termo domina, para enfatizar o domínio da mulher
na relação, pois assim como o escravo estava submetido a autoridade de seu amo, o
homem deveria curva-se ante ao poder de sedução de sua amada. O homem adquire assim
uma atitude passiva ante a posição ativa da mulher (OVÍDIO, Ars Am. I, 385-388/501-
504).
Referências Bibliográficas:
Documentação
OVÍDIO. Arte de Amar: Ars Amatoria. Versão bilíngue: latim/português. Tradução
Natalia Correia e David Mourão-Ferreira. São Paulo: Ars Poética, 1992.
VEYNE, Paul. Elegia erótica romana: o amor, a poesia e o Ocidente. São Paulo: Editora
Unesp, 2015.