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29/08/2022 16:10 Arte e literatura na Antiguidade Clássica

Arte e literatura na Antiguidade Clássica


Prof. Milca Tscherne

Descrição

Expressões da arte na Antiguidade Clássica e manifestações


literárias, como Ilíada, Odisseia, Eneida e
Metamorfoses.

Propósito

Reconhecer as principais manifestações e características da arte e


da literatura greco-latinas na
Antiguidade Clássica para ampliar o domínio das diferentes linguagens
e seus contextos.

Preparação

Tenha em mãos um dicionário de literatura para compreender o


vocabulário específico da área. Na internet,
você acessa gratuitamente o E-dicionário de termos
literários, de Carlos Ceia, e o Dicionário de cultura básica,
de Salvatore
D’Onofrio.

Objetivos
Módulo 1

Arte na Antiguidade Clássica


Reconhecer as manifestações artísticas da Antiguidade Clássica.
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Módulo 2

A Ilíada e a Odisseia de Homero


Identificar os aspectos culturais e literários da Ilíada e da
Odisseia.

Módulo 3

Eneida, de Virgílio, e Metamorfoses, de Ovídio


Identificar o contexto e os aspectos literários de Eneida e
Metamorfoses.

Introdução
O que há em comum entre as cerâmicas gregas, as colunas dos templos romanos, a
Odisseia, de
Homero, e a Eneida, de Virgílio? Resposta: todos são
expressões da arte na Antiguidade Clássica
greco-latina.

A Grécia e a Roma antigas são importante berço da cultura e da arte ocidentais, com ricas
expressões estéticas na pintura, na escultura, na música, no teatro e na literatura. Por
isso, você está
convidado a conhecer, neste conteúdo, o maravilhoso mundo da arte e da
literatura na Antiguidade
Clássica.

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1 - Arte na Antiguidade Clássica


Ao final deste módulo, você será capaz de reconhecer as manifestações artísticas da
Antiguidade Clássica.

Contexto das expressões artísticas na Antiguidade


Clássica
A Antiguidade Clássica tem início no século VIII
a.C., quando a Ilíada e a Odisseia recebem as suas versões
escritas, e
termina no século V, com a queda do Império Romano, que sela o fim da Idade Antiga e
marca o
início da Idade Média. É um período extenso e, por isso, um tanto difícil de
sintetizar em suas várias
manifestações artísticas.

A Apoteose de Homero, por Jean


Auguste
Dominique Ingres (1827).

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A favor dessa sintetização, no


entanto,
está certa familiaridade com os valores estéticos e as regras de
composição
dos
antigos, pois muito do que produziram consolidou-se como tradição artística
sob
diversas
linguagens – até mesmo as mais recentes, como a do cinema e a dos
jogos
digitais.

Além disso, faz parte do


conhecimento
escolar a história antiga, sobretudo a da Grécia e de Roma, e suas
influências
na cultura ocidental, que vão desde o sistema político e legislativo a
modelos
canônicos de arte
e de literatura até hoje estudados, valorizados e
contemplados
museus afora.

Ao se entrar em contato com a literatura no ensino


médio, ainda que se negligencie a leitura integral de
obras literárias antigas que
impactaram toda a civilização do Ocidente, estuda-se a chamada Era Clássica,
que
abrange
os séculos XVI, XVII e XVIII, representados respectivamente pelo Classicismo da
Renascença,
pelo Barroco e pelo Neoclassicismo árcade.

Nesse período, valores clássicos,


como
os de proporção, regularidade, clareza e unidade, orientam a
composição das
obras. Mesmo que o Barroco tensione alguns deles, ainda assim reforça o
imitatio
antiquorum (o modo de imitação dos antigos). É contando
com
tal repertório que as manifestações
artísticas da Antiguidade Clássica serão
brevemente abordadas aqui.

A Última Ceia, por Leonardo da Vinci


(1945), obra do Renascentismo, que retoma e valoriza referências
culturais
da Antiguidade Clássica.

Os gregos e os romanos
A civilização grega antecede à romana, mas algo as conecta de modo indissociável,
pois,
quando Roma
domina a Grécia, os romanos passam a assimilar a sua cultura.

Como profundos apreciadores dos gregos, os romanos constroem um fecundo


diálogo
estético com eles. Embora seja possível verificar claramente os traços
peculiares de
cada civilização em suas manifestações artísticas, não seria exagero
afirmar que
os
gregos imitaram a arte dos egípcios e que os romanos imitaram a
dos gregos,
todos eles condicionados a uma lógica de admiração.

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Eneias foge de Troia em chamas, por


Federico Barocci (1598).

Poeta latino do século I a.C. e


autor da
epopeia romana Eneida, Virgílio buscou nas epopeias gregas do
século
VIII a.C. o modelo a ser imitado. No entanto, inseriu elementos novos, como
o
próprio imperador
Otávio Augusto, contemporâneo do poeta, como personagem.

A peculiaridade, nesse caso, além de


conferir à Eneida os valores augustanos, foi usar referências do
tempo
presente como matéria épica, e não só recorrer a um passado remoto, como era
próprio das epopeias.

A diversidade de manifestações
artísticas
Em princípio, são consideradas manifestações
artísticas a literatura, a música, a escultura, a pintura, a
dança e o teatro, porém
convém reconhecer o valor estético que inúmeros objetos com finalidades mais
utilitárias
ostentavam.

As joias, a tecelagem, os talheres,


os
escudos de guerra, a tapeçaria, os túmulos, as cerâmicas: tudo recebia
cuidadosa
e preciosa ornamentação, uma vez que as classes abastadas de nobres, reis,
imperadores e
aristocratas se destacavam por se cercarem de um ambiente e de
objetos absolutamente exclusivos. Se
arte (ars, em latim) significa
habilidade, não seria equivocado atribuir a um conjunto amplo de objetos o
apelo
artístico.

Ânfora grega do século VI a.C.

Tendo isso em vista, apresentaremos a seguir


algumas
expressões artísticas do mundo antigo greco-
romano em três
agrupamentos:

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A música, a poesia (literatura), a dança e o teatro

A arquitetura e a escultura

A pintura e a cerâmica

A música, a poesia (literatura), a dança e o teatro na


Antiguidade Clássica

O grande teatro de Epidauro, construído no século IV


a.C.,
no Santuário de Asclépio, na ilha de Epidauro, na Grécia.

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A poesia nasce identificada com a música. Tal


característica não é uma particularidade da cultura grega,
pois a poesia e a música
ligam-se a manifestações primordiais do ser humano dirigidas a divindades e
reservadas a
momentos coletivos de rituais.

Páris e Helena, por Jacques-Louis


David
(1788).

Não somente a poesia lírica, cuja


etimologia advém da lira, instrumento que acompanhava o ato de recitar
ou
cantar
os versos, está associada à música, como também a poesia dramática, com a
qual o
teatro antigo
se realizava, e a épica, cujos cantos ou parte deles eram
entoadas
pelos aedos, isto é, os poetas-cantores.

Desse modo, no contexto antigo, não é simples


dissociar a música da poesia e até mesmo da dança.
Embora Aristóteles tenha separado
as
artes miméticas segundo os meios e os objetos próprios pelos quais
cada uma se
realizava, a sua apreciação no mundo antigo se dava, em geral, em conjunto.

Quanto aos meios, Aristóteles opõe (e aproxima) a


manifestação
literária à música, à dança, à pintura, ao mesmo tempo que
estabelece distinções internas à própria literatura. Com exceção
da pintura,
que
se serve das cores e do desenho, os meios das
outras formas de arte mimética
são
o ritmo, a linguagem e a
harmonia, ora reunidos ora separados.
(BRANDÃO, 1976, p. 46)

A música emprega, portanto, a harmonia e o ritmo;


a
dança, apenas o ritmo. Já a literatura pode empregar
até mesmo os três meios juntos,
como no teatro antigo, por exemplo.

A propósito, quando se busca a origem do teatro


grego,
cujo ápice se dá no séc. IV a.C. com o florescimento
das tragédias e comédias, o que
se
encontra são os cantos ditirâmbicos, canto em louvor ao deus Dioniso

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(Baco para os
romanos), entoados em festividades em seu louvor. Aos poucos, foram acrescidos a
esse
tipo
de canto primitivo instrumentos musicais e dança, sendo instituído ainda um
coro de
cinquenta integrantes
do qual se destacava um solista, chamado de corifeu, com o
qual o
coro passou a dialogar.

A partir desse diálogo,


estabeleceu-se a
base do gênero dramático, que, no século IV a.C., passou a contar
com a
introdução gradativa de atores e de temas de origem profana. O coro
permaneceu
no teatro com
função mais lírica do que dramática, pois não participava da
ação
dos personagens: ele apenas as
comentava como uma voz coletiva em uníssono,
representando a origem coletiva do teatro quando ainda
não era composto por
atores individualizados.

O teatro antigo, portanto, não se


dissocia da religião nem da vida social. Por isso, ele sempre foi
acompanhado de
música e dança.

O Teatro de Dionísio em reconstituição do


século
XIX.

Sobre os instrumentos musicais, muito do que se


sabe
se dá por meio das artes visuais. Os romanos, por
exemplo, se valiam de uma
variedade
cuja origem era grega, etrusca, africana:

Cordofones (lira, cítara e alaúde)

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Membranofones (sinos, chocalhos, sistros, címbalos,


tímpanos,
tambores, órgãos)

Aerofones (bucina e corno, tuba, tíbia, ascaule e


flautas)
A associação entre ética e música, tão marcada na
cultura grega, não se repetia na romana. A música
estava em todas as ocasiões: do
contexto público de manobras militares com cítaras de tamanho de
carruagens a usos
privados na educação musical, considerada uma distinção social.

Outro momento em que as artes se misturavam era


durante os tradicionais jogos píticos. Iniciados no
século VI a.C., eles incluíam
competições de música, poesia e canto realizadas no teatro, enquanto os jogos
ginásticos
ocorriam no estádio.

A arquitetura e a escultura

O Parthenon, templo dedicado à deusa Atena, padroeira


da
cidade, construído na Acrópole de Atenas no século V a.C.

Há uma discussão acerca da natureza da Arquitetura


sobre ser ou não arte, dada a sua filiação com a
engenharia e outras ciências, como
a
Física e a Matemática. No entanto, ela conta a história da arte de
todos os
períodos,
sendo possível contemplar na arquitetura a sensibilidade estética e os valores
cultivados
por cada civilização nas construções de suas cidades.

É o que pode ser visto nas edificações públicas


que
restaram do mundo antigo, como:

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Templos

Arenas e estádios

Termas

Teatros

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Senados

Praças
A arquitetura também acolhe elementos escultóricos
que, no caso greco-romano, são muito evidenciados
por colunas e seus variados
estilos.
Além de, claro, ela também ser um receptáculo de outras artes, como a
escultura e a
pintura.

A escultura e a arquitetura na Antiguidade


Clássica se
expressam segundo as leis de:

Harmonia
Equilíbrio
Simetria das formas
Ambas são atravessadas pelo racionalismo clássico,
como é possível observar nas linhas retas das
edificações gregas e na regularidade
do
espaço intervalar das colunas. Já a arquitetura romana, além de
reproduzir
substancialmente a grega, ainda desenvolveu um estilo próprio marcado não só pela
beleza, mas
também pela rigorosa funcionalidade.

Suas diferenças em relação à arquitetura grega


advêm
sobretudo do uso de materiais mais leves, como o
tijolo, o concreto armado e o
ladrilho,
que favoreceram a criação dos arcos, das abóbadas e dos domos tão
característicos
das
construções romanas. As edificações mais leves dos romanos permitiram uma maior
versatilidade na criação de espaços mais amplos, circulares e sem a necessidade de
apoios intermediários.

Três ordens clássicas norteavam a arquitetura


grega,
que, por sua vez, foram revisitadas pela romana:

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Ordem dórica
A mais antiga e simples de todas, esta ordem remonta ao
século VIII a.C. As colunas em estilo dórico não
tinham
base. O capitel era despojado e o friso, liso, porém
elas
eram sólidas, esbeltas e elegantes, sendo
muito usadas
na
parte externa de templos de divindades masculinas. O
Império
Romano adaptou o dórico,
tornando-o mais leve e
constituindo, assim, o estilo toscano.

Ordem jônica
Surgida por volta de 450 a.C. As colunas são mais leves
e
fluidas que as dóricas, com capitel ornamentado
em duas
volutas e base larga. Elas eram muito adotadas em
templos
que abrigavam as divindades
masculinas. O templo de
Atena
Niké é um exemplo do estilo dórico.

Ordem coríntia
Típica do final do século V a.C., ela surge como uma
versão
mais ornamentada da ordem dórica. O capitel
apresenta
decoração exuberante com folhas de acanto. Outros
elementos
constitutivos da coluna também

são decorados, como o


entablamento e o frontão. As colunas coríntias eram
muito
usadas no interior dos
t l O di til í ti
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templos. Os romanos expandiram o
estilo coríntio por todo o império e o mesclaram com o
jônico, dando
origem ao estilo compósito, considerado
uma
versão tardia do estilo coríntio.

Quanto à escultura, o modelo grego seguia o


princípio
do ideal, ou seja, ao esculpir um corpo humano, um
rosto, o escultor não se atinha a
traços de um indivíduo em particular, ainda que fosse uma homenagem a
uma
personalidade
conhecida, como um político, um governante ou um vencedor dos Jogos Olímpicos.

Assim, na representação visual grega, como a pintura e a escultura, não se


encontra a
arte do retrato até o período helenístico (323 a.C.–33 a.C.), momento
que, sob o
domínio da Macedônia, a cultura e a língua gregas se espalharam dentro
dos
limites
do vasto império de Alexandre, o Grande, cujo intuito era introduzir
elementos
gregos na cultura persa.

Esse contato provocou uma fusão da cultura


ocidental
com a oriental, uma vez que as fronteiras do império
de Alexandre, um dos maiores do
mundo, estendiam-se até a Ásia. Provavelmente foi a arte helenística com
sua
expressividade que levou os romanos a desenvolver a escultura retratística.

Embora com oscilações entre retratos


mais idealizantes e de grande realismo, havia uma predileção na
escultura
romana
pelo busto e pela cabeça avulsa. Além de ambos serem mais acessíveis que o
corpo
inteiro, criou-se um gosto na cultura romana pela contemplação de formas
fisionômicas fiéis ao modelo
muito superior à do próprio corpo, das
vestimentas
ou de qualquer outro acessório

Quanto aos materiais utilizados nas


esculturas, era comum aos gregos o uso de metais, como o bronze, e
rara a
manipulação do mármore, o que talvez explique a escassez de esculturas
gregas
originais. É muito
provável que elas tenham sido transformadas em outros
objetos, como armas e outros aparatos bélicos.

Busto do Imperador Marco Aurélio, século II


d.C.

Já os romanos, hábeis no manejo do mármore,


elegeram-no como o material predileto tanto para a
infinidade de réplicas gregas que
fizeram quanto para a elaboração das próprias esculturas.

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A pintura e a cerâmica
Os gregos apreciavam as cores: a ideia de que eles
não
as usavam é um erro. Pouco restou, porém, dessa
arte tão prestigiada por eles – e
muito
do que se sabe vem das fontes literárias, como as descrições de
Plínio e Pausânias,
e
das cópias romanas. O maior acervo que permaneceu até os dias de hoje sobre a arte
pictórica grega é o encontrado na cerâmica.

Acredita-se que este afresco de Pompeia seja


baseado em uma Afrodite pintada por Apeles.

Os gregos conseguiram ultrapassar o


desenho plano e linear com técnicas de sombreado, produzindo, com
isso, a
ilusão
de tridimensionalidade. Elementos de perspectiva também foram introduzidos a
partir do
século V a.C., enquanto a paleta de cores foi ampliada.

As pinturas murais, por exemplo, eram realizadas


com
diversas técnicas. Elencaremos três delas a seguir:

Técnica de afresco
Utiliza pigmentos diluídos em água que penetram no revestimento
ainda
fresco da parede em argamassa de
cal.

Técnica de têmpera
Emprega uma mistura de corantes e pigmentos com um aglutinante, como
a
água ou o ovo, por exemplo.

Técnica de encáustica
Usa pigmentos misturados à cera ou a algum tipo de resina, que,
aquecida, era aplicada à pintura com o
pincel ou à espátula também
quente.

Um dos belos afrescos são os da Pinacoteca da Acrópole de Atenas.


Estudos recentes mostram
que até as
esculturas gregas, quando feitas em mármore, recebiam uma camada de
tinta.

Os romanos também se valiam das mesmas técnicas de


pintura. Eles, de igual modo, apreciavam as cores.

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Pinacoteca
Coleção de quadros de diferentes épocas.

Saiba mais

As escavações em Pompeia e Herculano, cidades próximas a Nápoles e


soterradas
pelas cinzas do vulcão
Vesúvio em 79 d.C., têm revelado, graças às pinturas
em
murais e em porcelanas lá encontradas, um
colorido intenso de verdes,
amarelos,
pretos e principalmente vermelhos. Trata-se, aliás, do vermelho
Pompeia, que
se
tornou uma tonalidade “oficial”. A pintura Os suplícios de Penteo
(séc.
I) é uma das
preciosidades encontradas em Pompeia na qual pode ser
contemplada a
beleza do verde.

As duas cidades ficaram soterradas por cerca de


1600
anos e começaram a ser escavadas no final do
século XVIII. Até hoje, as artes e os
modos
de vida dos romanos antigos não cessam de ser descobertos
graças a tais localidades
conservadas por sólidas camadas de cinzas e lama.

Embora subsidiária em parte da pintura grega, a romana abandona a pintura de


cavalete
praticada pelos gregos em benefício quase absoluto da mural,
privilegiando as
pinturas triunfais e o retrato de corte com traços naturalistas,
cultivando com
abundância a paisagem e a natureza morta.

Quanto à arte em cerâmica, os vasos foram o


suporte
mais utilizado pelos gregos. Neles, é possível
distinguir:

Uma variedade de estilos: Do abstrato ao mais


realista.

O motivo: Representações de figuras divinas, de


figuras
humanas em cenas do cotidiano e de cenas
épicas e mitológicas, além de
um
conjunto de cenas eróticas.

Já seus estilos são:

Pyxis com um cavalo como tampa da


alça.

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Protogeométrico e geométrico (1050


a.C.-900
a.C.)
Compunham-se de elementos mais
abstratos e
de padrões geométricos.

Ânfora de Dipylon.

Arcaico (750 a.C.)


Possuía figuras que lembravam as
pinturas
egípcias, com os pés posicionados sempre de lado, os rostos
de
perfil e
o olho voltado para frente. O estilo arcaico retratava tanto cenas
do
cotidiano quanto
mitológicas e heroicas, como as sequências de cenas
da
Ilíada e da Odisseia.

Niobid Painter, ânfora do século V


a.C.

Pinturas negras (700-600 a.C.) e vermelhas


(530 a.C.)
Trata-se dos estilos mais conhecidos.
Nas
cerâmicas em preto, o fundo permanecia em argila, enquanto
as
figuras
eram pintadas em preto e os detalhes, realizados com uma ferramenta
pontiaguda que riscava
e retirava a tinta preta. Nas cerâmicas em
vermelho, a técnica foi invertida: o fundo era preto, e as figuras
assumiam o tom vermelho da terracota (barro cozido).

Para concluir a rápida passagem por algumas das


manifestações artísticas da Antiguidade Clássica e
preparar o estudo dos módulos
seguintes, convém ter em mente a constatação de Arnold Hauser (1994, p.
58). O
historiador de arte afirma que, “em uma certa medida, toda a arte antiga é uma
resposta
ao desejo de

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fama e de consagração aos olhos dos contemporâneos e da posteridade”.


Como
vimos, de fato, os antigos
conseguiram.

video_library
Arte greco-latina
Assista agora ao vídeo que traz uma conversa sobre
algumas das manifestações artísticas da Antiguidade
Clássica, destacando as pinturas
nos
vasos de cerâmica.

playlist_play
Vem que eu te explico!
Os vídeos a seguir abordam os assuntos mais relevantes do conteúdo que você acabou de estudar.

Módulo 1 - Vem que eu te explico!

A arquitetura e a escultura

Módulo 1 - Vem que eu te explico!

A pintura e a cerâmica

Todos

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Todos Módulo 1 Módulo 2 Módulo 3

Módulo 1 - Video

Arte greco-latina

Módulo 2 - Video

Ilíada e Odisseia

Falta pouco para atingir seus objetivos.


Vamos praticar alguns conceitos?

Questão 1

Deve-se reconhecer que as manifestações da arte na Antiguidade Clássica

eram diversas e incluíam desde a música, a literatura, o teatro e a escultura até as


A
ornamentações em objetos utilitários.

B eram expressões da linguagem que se circunscreveram à literatura e ao teatro.

representavam a expressão do talento individual restrito a determinado conjunto de


C
objetos.

evidenciavam a habilidade dos artistas expressada nos objetos e nas práticas apenas
D
populares.

E limitavam-se à arte do teatro, prática artística influenciada pela mitologia.

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Parabéns! A alternativa A está correta.


As expressões artísticas greco-latinas se deram em diversos suportes materiais e por meio de
diferentes linguagens, sendo marcadas pela diversidade. Até as peças utilitárias poderiam contar
Questão 2
manifestações artísticas em suas ornamentações ou seus adereços.
Como expressões de arte antiga, as cerâmicas

A têm nas pinturas negras e vermelhas os estilos mais conhecidos.

B em seu estilo arcaico, retratam cenas do cotidiano apenas.

C em todos os estilos, trabalham com formas geométricas e definidas.

D destacam-se pelo estilo abstrato e pela ausência de motivos eróticos.

E destacam-se pelas narrativas bíblicas em forma de pinturas.

Parabéns! A alternativa A está correta.


Há uma diversidade de estilos nas cerâmicas (alguns mais abstratos e outros mais figurativos),
destacando-se as pinturas negras e vermelhas. Os temas ou motivos também são diversos,
incluindo cenas cotidianas, narrativas míticas e até cenas eróticas.

starstarstarstarstar

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2 - A Ilíada e a Odisseia de Homero


Ao final deste módulo, você será capaz de identificar os aspectos culturais e literários da
Ilíada e da Odisseia.

A Ilíada e a Odisseia no contexto da Antiguidade Clássica


A Ilíada e a Odisseia são
extensos
poemas épicos atribuídos ao poeta grego Homero, que teria existido por
volta do séc.
VIII a.C. Ambos são poemas narrativos de caráter heroico que eternizaram, na cultura
do
Ocidente, os grandes heróis de uma guerra remota e muito questionada como
acontecimento
histórico,
ainda que ela fosse aceita como fato pelos gregos antigos.

Repleta de ornamentos lendários e


míticos, a Ilíada trata dos últimos momentos da Guerra de Troia,
conflito
que teria ocorrido entre 1300 a.C. e 1400 a.C., o que corresponde à
Idade do Bronze. Já a Odisseia centra-se
nas aventuras do retorno
para
casa de Ulisses (ou Odisseu), um dos grandes heróis da Guerra de Troia.

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O Cavalo de Troia, por Henri Motte


(1874).

Nas duas obras, figuram alguns elementos comuns:

O universo heroico e bélico dos aqueus (gregos) e dos dárdanos


(troianos).

O universo maravilhoso dos deuses e das divindades do panteão


grego.

Essas obras permaneceram como expressão oral por


alguns séculos até serem registradas em versos
escritos em finais do século IX e/ou
início do século VIII a.C. Por essa razão, as epopeias homéricas são
consideradas
epopeias primitivas, estando ligadas
a
uma tradição de poesia oral da Era Micênica, que
corresponde à última fase da Idade
do
Bronze.

Epopeias primitivas
As epopeias primitivas são aquelas gestadas e nutridas pela
oralidade durante a formação cultural de um
povo a ponto de ser difícil estabelecer o
momento exato de seu surgimento ou origem – e, por
consequência, a sua autoria.

A tradição oral dessas obras não é suficiente para torná-las composições


populares,
elaboradas e entoadas pelo próprio povo, pois elas foram cantadas por
poetas
considerados semelhantes a sacerdotes, isto é, portadores de uma verdade
soprada
por
divindades.

Os poetas primitivos responsáveis por cantar as


epopeias e as composições líricas eram os aedos. Nas
epopeias, os aedos resgatavam o
passado e o perpetuavam costurando elementos míticos, históricos e
lendários.

A Ilíada e a Odisseia não só


cantavam e eternizavam os grandes feitos heroicos dos gregos, como também
possuíam
um
caráter religioso e pedagógico ao ensinar crenças e valores que, no juízo grego, os
distinguiam de outros povos. Entre esses valores, destacamos a rigorosa ética
guerreira
baseada em dois
elementos:

A honra

(timé)
A excelência

(areté)
O filósofo grego Platão (428/427 a.C. -348/347
a.C.),
em sua obra A República (séc. IV a.C.), defende o valor

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da poesia épica
justamente como potência formadora, auxiliando no encorajamento da classe dos
guerreiros, embora condene as artes que imitam ou representam por meio da linguagem.

Homero

Dante Alighieri, Homero e Virgílio, em detalhe da


pintura
O Parnaso de Rafael Sanzio (1511).

A Ilíada e a Odisseia são


tradicionalmente atribuídas ao poeta grego Homero, cujo nome marcou um modo
de
pensar,
uma visão de mundo e um período glorioso da produção cultural da Grécia Antiga. Os
séculos XII
ao VIII a.C. são conhecidos como período homérico; os séculos
anteriores,
por sua vez, são tidos como pré-
homéricos.

Essa marcação temporal sugere a complexidade da origem tanto das narrativas


presentes
na Ilíada, que é a composição mais antiga da literatura ocidental, e da
Odisseia quanto a do próprio Homero. Atualmente, historiadores e
estudiosos
raramente defendem que ele tenha sido um homem histórico em função da
escassez e
das
controvérsias de dados acerca de seu nascimento e de sua
biografia.

No entanto, isso em nada reduz a grandiosidade dos


textos que sintetizam e dão unidade a toda a memória
grega antiga da qual a figura
de
Homero seria, então, a personificação de uma voz coletiva, possivelmente
de vários
aedos, a serviço da celebração épica.

A epopeia

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Andrômaca lamentando Heitor, por


Jacques-Louis
David (1783).

A epopeia é uma composição de caráter grandioso


tanto
pelas ações narradas quanto pela extensão da
narração. Ela lida com heróis,
semideuses,
reis e outros homens ilustres. O herói épico é virtuoso, e sua
superioridade é
exaltada.

Os episódios épicos desdobram-se ao longo de


tempos e
espaços variados, assim como possuem muitas
ações e um número extenso de
personagens.
Não à toa, os adjetivos “épico” e “homérico” passaram a
qualificar aquilo que é
grandioso.

Resumindo

Em síntese, o épico (épos = palavra ou narração)


é o gênero da palavra narrada . O narrador da epopeia não
expressa valores ou juízos subjetivos, não se ocupa dos próprios
pensamentos,
não faz confissões e não se
impõe sobre a narrativa.

Quando a epopeia se ocupa de modo mais detido de


algum
evento particular e íntimo de um herói, que é um
homem afeito à guerra, mas também
ao
amor, ela o faz com vistas a monumentalizar o seu caráter.

Exemplo

A tocante despedida do herói Heitor de sua esposa Andrômaca e de seu filho


ao
saber que iria duelar e ser
morto por Aquiles. Ela tem poucas e longas falas
que
são suficientes para caracterizar a coragem de Heitor.

É nesses momentos que os traços do lírico explodem


no
interior do épico. Todos os elementos de uma
epopeia estão a serviço de eternizar os
grandes feitos de uma coletividade na figura dos seus heróis a partir
de um passado
glorioso que mereça ser cantado.

Estrutura de uma epopeia


A epopeia possui uma estrutura fixa composta por:

Introdução expand_more

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Apresenta-se o que será cantado.

Dedicatória expand_more

Explicita-se a quem é oferecida a


epopeia.

Invocação expand_more

Conclamam-se as divindades a fim de


inspirar o poeta.

Narração expand_more

Apresentam-se todas as aventuras


heroicas.

Epílogo expand_more

Tem-se o encerramento.

Como é um extenso poema narrativo, a sua


organização
se dá por cantos. Os cantos ou livros são as
estruturas maiores das epopeias, as
quais,
por sua vez, subdividem-se em episódios.

A Ilíada
A Ilíada (do grego Ilias, relativo a
Ílion ou Troia) narra a cólera de Aquiles, filho do mortal Peleu e da ninfa
Tétis. A ambientação é a lendária Guerra de Troia em seus últimos momentos.

O herói Aquiles

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A Educação de Aquiles, por James Barry


(1772).

Príncipe dos mirmidões e um dos aliados reais de


Agamêmnon (o Átrida) no cerco a Troia, Aquiles
demonstrou a sua ira em vários
momentos.
Em todos eles, a consequência foi a seguinte: muitas mortes.

Reuniremos a seguir alguns momentos em que


ele se
irou:

Contra o próprio Agamêmnon, comandante do exército dos aqueus,


recusando-se a lutar.

Quando perdeu o melhor amigo Pátroclo, que, a seu mando, foi proteger
os
aqueus da ofensiva troiana e
morreu pelas mãos de Heitor. A morte de
Pátroclo provoca-lhe tamanha fúria que o faz voltar à luta.

Quando arrastou o corpo de Heitor com seus cavalos e se recusou a


devolver
o cadáver para que os rituais
fúnebres fossem cumpridos, levando os
deuses a
intervir ao reconhecer a loucura do seu coração.

A ira é um elemento importante do ethos


(caráter) de Aquiles e precipitará um conjunto de ações na Ilíada.
Na
Invocação, logo nos primeiros versos, tanto o motivo do canto épico, que é a cólera
de
Aquiles, quanto os
seus efeitos já são revelados.

Canta, ó deusa, a cólera de Aquiles, o Pelida


(mortífera!, que
tantas dores trouxe aos aqueus
e tantas almas valentes de
heróis lançou no Hades,
ficando seus corpos como presa para
cães e aves
de rapina, enquanto se cumpria a vontade de Zeus),
desde o momento em que primeiro se desentenderam
o Átrida,
soberano dos homens, e o divino Aquiles.
(HOMERO. Ilíada. São Paulo: Companhia das Letras,
2013. Canto I, versos 1-7)

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Aquiles, referenciado como o de pés velozes, tem


um
destino ao qual estava fadado e que conhecera desde
cedo. Entre as duas opções que
lhe
foram dadas, uma vida longa e sem glória ou uma vida breve e gloriosa,
a bela morte
é a
que o seduzia.

De todas as personagens da Ilíada,


Aquiles é
o único que pratica o canto poético. Acompanhado da cítara
em sua tenda, o herói
canta
para Pátroclo justamente o que Homero canta na Ilíada: os grandes feitos
heroicos e a elevada honra que é escolher a vida breve.

Comentário

Escapar da velhice é uma forma de ultrapassar a morte para os gregos, uma


vez
que a morte e a idade
avançada equiparam-se para eles.

A morte heroica, ou seja, a bela morte, acontece


na
integridade da potência vital do herói, de sua força física,
da leveza do corpo e da
agilidade e segurança nos movimentos. Ela contém todos os valores que compõem
a
areté viril ainda no seu auge, antes de ele vivenciar qualquer decrepitude.

Algumas ações da Ilíada


A Ilíada abarca os acontecimentos do
último
ano do conflito entre os gregos e os troianos. Ela começa in
media res (do
latim “no meio das coisas”), ou seja, pelo meio. Os antecedentes da guerra, como o
rapto
de
Helena por Páris, não estão no início da Ilíada.

O Julgamento de Páris, por Peter Paul Rubens


(1639).

No conto, que já era conhecido pelos gregos, a


deusa
da discórdia Éris, enfurecida por não ter sido
convidada para o banquete de
casamento
que Zeus ofereceu aos pais de Aquiles, chega à festa com uma
maçã de ouro em cuja
inscrição havia uma provocação: “Para a mais bela”. Foi dada a Páris, filho de
Príamo,
rei de Troia, a tarefa de escolher entre Hera, Atena e Afrodite quem era a deusa
mais
bela.

Cada uma lhe ofereceu um suborno. Páris escolhe a tentadora oferta de Afrodite: a
mulher mais bela do mundo. Nesse momento, ele se torna vítima da deusa do amor
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e
se
apaixona por Helena, esposa de Menelau, rei dos aqueus (gregos).

Sem alternativa, Páris a rapta. Tal injúria exige


uma
retaliação por parte dos gregos. Comandado pelo
supremo da Grécia (Acaia como Homero
a
chama), o rei Agamêmnon, irmão do rei de Esparta, Menelau, e
esposo de Helena,
convoca
os príncipes que deviam lealdade à Grécia para se unirem contra Troia. Em
seguida,
eles
partem em uma numerosa expedição.

Príamo suplica a Aquiles pelo corpo de


Heitor, por Gavin Hamilton (1775).

A seu favor, os gregos têm Hera e


Atena.
Afrodite, por sua vez, está do lado de Páris. Desde o início da
viagem,
tensões
sérias entre Agamêmnon e Aquiles se instalam a ponto de o grande herói se
rebelar e
desistir da luta.

No trecho da Invocação, Aquiles é


tratado não só como divino, mas também como causador de muitas
dores aos
aqueus.
Algumas de suas ações trouxeram inúmeras mortes de grandes heróis pelas
quais
Aquiles é responsabilizado por lançar no Hades.

Entre essas ações, temos:

Sua insurgência contra Agamêmnon, comandante do exército grego.

Sua rejeição à proposta de reconciliação feita por Agamêmnon.

Seu abandono das lutas.

A partir do Canto XIV, há uma crescente


concentração
na figura de Aquiles à medida que as suas tragédias
pessoais começam a tomar vulto.
A
morte do amado Pátroclo no canto XVI, que o faz retornar à batalha, é
uma delas.

Nesse momento da epopeia, já se conhece a fundo o


inimigo troiano (chamado também de dárdano,
dardânida ou dardânio) e o motivo da
guerra,
ambos explicitados no Canto III, bem como Heitor, o maior
guerreiro troiano, que é
analisado em minúcias no Canto VI.

Em seguida, em uma adaptação agora em prosa da


Ilíada, a morte de Pátroclo é narrada e descrita. Aquiles,
embora ausente,
é
referenciado pelo discurso provocativo de Heitor e pela ameaça de Pátroclo.

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Quando Heitor viu o magnânimo Pátroclo recuar, ferido


pelo
bronze afiado, ele se atirou, [...] golpeou-o no lado com uma
lança que o
atravessou. [...] Vangloriando-se, Heitor, insultou-o
com estas palavras:
“Pátroclo, você estava esperando, sem
dúvida, para saquear nossa cidade e
levar
nossas esposas
cativas em seus navios para sua amada terra natal? Louco! É
para
protegê-las que os cavalos rápidos de Heitor o levaram a
lutar [...]. Os
abutres
comerão você, desventurado, e nem Aquiles
com todo seu valor, ajudará você
[...].” E Pátroclo, mal
respirando, respondeu: “Heitor, agora você se
vangloria,
porque
Zeus, o filho de Cronos, e Apolo lhe deram a vitória, foram eles
que
facilmente me mataram. Eles próprios arrancaram a
armadura de meus ombros.
[...]
Você não vai viver muito e sua
morte está bem perto de você, e seu
inexorável
destino é morrer
nas mãos de Aquiles”. Tendo dito essas palavras, a morte
envolveu-o [...].
(HOMERO. A Ilíada. São Paulo:
Ediouro, 1996, Canto XVI)

Outro trecho que vale a leitura e se relaciona com


o
retorno de Ulisses à luta é o seu encontro com o
fantasma de Pátroclo em sonho.
Aquiles
retoma os combates, cumpre as exigências feitas por Pátroclo,
como os devidos
rituais
fúnebres, e, por fim, enfrenta e mata Heitor, filho mais velho do rei Príamo, irmão
de
Páris e o principal guerreiro troiano.

Em um belíssimo embate entre dois


grandes heróis, é possível contemplar quão potente cada um é. Eis uma
característica da glória épica: nunca aceitar acordos covardes. O duelo
entre os
dois grandes heróis se dá, e
Aquiles vence.

Para triunfar completamente e fazer


jus
à sua ira, Aquiles perpassa o tornozelo de Heitor com fibra bovina e
arrasta
seu
corpo em uma quadriga,
ostentando-o como um troféu. Não só ultraja o cadáver,
transgredindo
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os princípios da virtude grega, como também o toma para si e


leva
ao acampamento dos gregos.

Aquiles abate Heitor, por Peter Paul


Rubens (1635).

Quadriga
Carro antigo puxado por quatro cavalos.

Para convencer Aquiles a devolver o corpo do herói


troiano, os deuses interferem. Zeus convoca a deusa
Tétis ao Olimpo e ordena que ela

ao acampamento do seu filho Aquiles e lhe diga que os deuses estão
irados com ele
por
causa da loucura de seu coração.

Ao mesmo tempo, Zeus envia Íris, a mensageira dos


deuses do Olimpo, para aconselhar o rei Príamo a
resgatar o corpo do filho no
acampamento dos aqueus, levando presentes como compensação. A conversa
entre Aquiles
e
Príamo é comovente.

O rei dos troianos faz referência ao pai de


Aquiles,
lamenta que já perdeu os seus cinquenta filhos na guerra,
dezenove do mesmo ventre,
que
são os filhos de sua esposa Hécuba. Aquiles se comove e chora pela má
sorte de
Príamo e
pela perda de Pátroclo, aceita os presentes e devolve o corpo, comprometendo-se a
não
atacar Troia durante os ritos fúnebres.

Príamo estabelece nove dias de choro por Heitor,


com o
funeral no décimo dia, o sepultamento no décimo
primeiro dia e, se necessário, a
retomada do combate no décimo segundo dia. Aquiles aceita.

A Ilíada termina com o funeral de Heitor. O povo chora nos portões da


cidade. Em
uma sequência de lamentações proferidas pelas mulheres, a mãe Hécuba,
a
esposa
Andrômaca e a cunhada Helena enaltecem a grandeza de Heitor.

Essa obra tem uma forte presença do elemento


trágico,
culminando na morte de Heitor. Seu encerramento
não se dá exaltando a vitória dos
gregos, até porque ela não alcança o desfecho da guerra, e sim com o
ritual fúnebre
do
admirável Heitor, considerado o maior dos troianos.

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A Odisseia

Ulisses na caverna de Polifemo, por Jacob


Jordaens (século XVII).

Se nos 24 livros da Ilíada a ira de


Aquiles é cantada,
nos 24 da Odisseia canta-se a astúcia de Ulisses, rei de
Ítaca, uma
ilha grega do Mar Jônio. Após o término da Guerra de Troia, vencida pelos gregos
graças
à
inteligência de Ulisses, inicia-se a sua longa viagem de regresso ao lar, que
durará
dez anos.

Ao todo, Ulisses se ausenta por duas décadas da


sua
rochosa Ítaca, da sua amada Penélope e do seu filho
Telêmaco, de quem se despediu
quando
ele acabara de nascer. Nesse trajeto repleto de aventuras e de
obstáculos, Ulisses
precisa a todo tempo dar provas de sua competência, virtude e excelência
(areté), uma
vez que o seu regresso se dá sem o socorro dos homens ou dos
deuses.

Os primeiros versos da Odisseia anunciam


o
tema como é de praxe: falar do homem astuto que muito
vagueou após o fim da guerra e
o
esforço para retornar à pátria.

Fala-me, Musa, do homem astuto que tanto vagueou


Depois que
de Troia destruiu a cidadela sagrada,
Muitos foram os povos
cujas cidades observou,
cujos espíritos conheceu, e foram
muitos no mar
os sofrimentos por que passou para salvar a vida,
para conseguir o retorno dos companheiros a suas casas.
(HOMERO. Odisseia. Trad.
Frederico Lourenço. Lisboa: Livros Cotovia, 2010, Canto I, versos 1-6)

Dos dez anos de regresso, sete deles Ulisses passa


isolado na ilha da ninfa Calipso. No início do oitavo,
após o Concílio dos deuses se
reunir, a deusa Atena determina que Hermes vá à ilha da ninfa Calipso,
Ogígia, e
anuncie
que é vontade dos deuses que Ulisses regresse à sua casa.

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No entanto, nos próximos 2 mil versos da


Odisseia, as aventuras de Ulisses cedem lugar às de seu filho,
Telêmaco.

A estrutura da Odisseia
É possível dividir a Odisseia em três
partes:

Penélope e os pretendentes, por


John
William Waterhouse (1912).

Cantos de I a IV (Telemaquia)
Expõem a situação de Penélope e os
esforços
de Telêmaco para assegurar o trono do pai durante a sua
ausência.
Com o
conselho e a proteção da deusa Atena, Telêmaco sai em viagem
em
busca do pai e
encontra vários combatentes de Troia que
lhe
dão notícias da guerra e da possibilidade de Ulisses estar
em uma
ilha.

Atena e Telêmaco viajam para Pilo, cidade onde governa


o
ancião Nestor, e, em seguida, para a
Lacedemônia, onde
reinam Menelau e Helena, recebendo honrarias e presentes
de
hospitalidade.

Os deuses em assembleia se posicionam


favoravelmente ao regresso de Ulisses, e
Hermes
transmite à
ninfa Calipso a ordem de Zeus para libertar
o
herói.

Esboço de Circe, por John William


Waterhouse (1914).

Cantos de V a XIII (Apólogos)


Eles contêm os relatos de Ulisses.
Nesses
cantos, são narradas, entre outras aventuras, as seguintes
ações:
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O doce e amargo cárcere na ilha de


Calipso seguido de sua despedida.

O naufrágio próximo à ilha de


Esquéria e
o encontro com os feácios.

A advertência da feiticeira Circe


quanto
ao canto das sereias. Com cera nos ouvidos, Ulisses pede
para
ser amarrado ao mastro como medida de
segurança.

Os perigos na ilha dos Ciclopes, onde


Ulisses consegue, com seus ardis, embebedar, cegar e
fugir
disfarçado de ovelha do gigante Polifemo.

A partida de Odisseu da Terra dos


Feácios, por Claude Lorrain (1646).

Cantos de XIV a XXIV (Mnesterofonia)


Narram as seguintes ações:

A chegada de Ulisses à sua pátria.

O reencontro com a esposa, o filho e o pai.

A vingança contra os pretendentes de Penélope.

Nessa última parte, Ulisses chega


oculto à Ítaca sob o risco de ser morto. Encontra o seu palácio
tomado
por exploradores que se instalaram junto de Penélope, vivendo de
festas
e banquetes e dissipando a sua
fortuna, enquanto Penélope, astuta
como
Ulisses, tecia e desfazia o sudário do sogro para adiar a escolha
do
pretendente.

Finalmente, após todas essas tribulações, os


deuses
decidem, em Concílio, que chegou a hora de Ulisses
finalmente seguir viagem. Hermes
é
enviado para anunciar à Calipso que Ulisses precisa ser libertado e que
chegará à
terra
dos feácios, parentes dos deuses, na fértil Esquéria, e que lá será recebido como um
deus e
ganhará um tesouro superior ao espólio de Troia.

A despedida de Ulisses da ilha de Calipso


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Hermes ordena a Calipso que liberte Odisseu,


por
Gerard de Lairesse (1670).

Ao partir, Ulisses faz Calipso prometer que não


preparará para ele nenhum sofrimento. O caráter heroico da
sua partida é
caracterizado
pela jangada na qual viajará. Segundo o próprio Ulisses, nem as velozes naus
conseguiam
atravessar o abismo dos mares sem o vento favorável de Zeus.

Calipso, então, lamenta a partida dele e diz que


não é
inferior a Penélope, pontuando que não é possível às
mulheres mortais competir em
beleza
e corpo com as deusas.

Ulisses cuidadosamente a acalma, dizendo:

Deusa sublime, não te encolerizes contra mim. Eu próprio


Sei
bem que, comparada contigo, a sensata Penélope
É inferior em
beleza e estatura quando se olha para ela.
Ela é uma mulher
mortal; tu és divina e nunca envelheces,
Mas mesmo assim
quero e desejo todos os dias
Voltar para casa e ver finalmente o
dia no meu regresso. [...]
(HOMERO. Odisseia. Trad.
Frederico Lourenço. Lisboa: Livros Cotovia, 2010, Canto V, versos 215-224)

Após se despedir de Calipso, que o vestiu com


roupas
imortais e abasteceu a sua jangada com suprimentos
em abundância, Ulisses parte.
Chegando ao país dos feácios, é recebido com muitas honrarias e põe-se a
contar a
sua
história após a rainha Arete lhe perguntar quem era ele.

Por meio de analepse, recurso também conhecido como flashback, Ulisses recorda
e
conta tudo o que se passou. Tal procedimento das narrativas épicas subverte

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radicalmente a ordem cronológica dos acontecimentos ao mesmo tempo que


causa
surpresas e acrescenta elementos até então sonegados ao leitor pelo
narrador.

É revelado, por exemplo, como Ulisses, ao perder


todos
os seus companheiros, ficou agarrado à nau e foi
resgatado e alimentado por Calipso,
com
quem ficou por sete anos completos. Por meio da analepse, ele
também conta como foi
a
derrota dos troianos por conta do envio do cavalo de madeira repleto de gregos
prontos a
incendiar e saquear Troia, a rica cidade de comerciantes.

A chegada de Ulisses a Ítaca

A vingança de Ulisses sobre os pretendentes de


Penélope, por Christoffer Wilhelm Eckersberg (1814).

Quando Ulisses finalmente chega a Ítaca, mata


todos os
pretendentes de Penélope em uma verdadeira
carnificina. Até mesmo o aedo Fêmio,
responsável por alegrar os banquetes durante a sua ausência, quase
foi degolado.

Além de suplicar pela vida, Fêmio usa um argumento


baseado na sua condição de aedo, o que indica a
distinção social, no contexto no
mundo
grego, de que desfrutava um poeta-cantor. Por fim, a pedido de
Ulisses, ele ajuda
com a
sua música a abafar o barulho provocado pelo morticínio, entoando canções de
noivado.

Ulisses e Euricleia, por Christian


Gottlob Heyne.

Após restabelecer a sua honra,


Ulisses
vai até seu pai, Laertes, informando-lhe que matara todos os

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pretendentes ao
palácio. No entanto, Laertes, muito idoso, não reconhece o filho e pede um
sinal
inconfundível.

Ulisses mostra-lhe a cicatriz na


coxa
causada por um javali em sua juventude durante uma caçada. Ambos
se abraçam
a
ponto de os joelhos e o coração do pai se enfraquecerem e de Ulisses quase
desmaiar.

Após a matança de tantos homens


ilustres, as famílias resgatam os corpos e, revoltadas, querem causar
uma
nova
guerra, agora contra Ulisses, pois, além da matança do palácio, ele é
acusado de
levar os mais
valentes homens a Troia e perdê-los todos.

A Odisseia chega ao fim sob a intervenção


da
deusa Atena dissuadindo Ulisses em relação à guerra. Ele
obedece, alegrando-se no
coração.

Últimas palavras
As grandes narrativas épicas apresentadas são
fundamentais para a compreensão dos valores sociais
gregos, como a ética e a
virtude,
bem como suscitam reflexões mais amplas, como a tensão entre sacrificar
o privado em
prol do coletivo ou vice-versa.

Mesmo com a consciência da subjetividade que se tem hoje, muito diferente da


visão de
mundo homérica, sempre voltada para o coletivo, tais textos continuam a
ecoar
profundamente no leitor contemporâneo.

Não é à toa que a Ilíada e a


Odisseia moldaram a sociedade ocidental, exercendo, em todos os tempos,
forte
influência sobre a literatura e as artes. Isso se deu não somente por ambas
iluminarem a
compreensão da
história, do pensamento, da religiosidade e dos afetos do homem da
Grécia
Antiga, como também por elas
suscitarem reflexões da psicologia e da antropologia
contemporâneas a partir das imagens e das narrativas
simbólicas das quais o mito é o
seu
núcleo irradiador.

video_library
Ilíada e Odisseia
Assista agora a um vídeo que aborda o texto épico
na
Grécia Antiga, destacando a Ilíada e a Odisseia, de
Homero, com
seus
heróis e mitos.

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Vem que eu te explico!
Os vídeos a seguir abordam os assuntos mais relevantes do conteúdo que você acabou de estudar.

Módulo 2 - Vem que eu te explico!

A epopeia

Módulo 2 - Vem que eu te explico!

O herói Aquiles

Módulo 2 - Vem que eu te explico!

A estrutura da Odisseia

Todos

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Módulo 1 - Video

Arte greco-latina

Módulo 2 - Video

Ilíada e Odisseia
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29/08/2022 16:10 Arte e literatura na Antiguidade Clássica

Falta pouco para atingir seus objetivos.


Vamos praticar alguns conceitos?
Questão 1
Assinale a alternativa que permite identificar um aspecto cultural comum à Ilíada e à Odisseia.

São tragédias que eternizavam ações heroicas e dissociavam elementos históricos dos
A
aspectos míticos ou lendários.

Destoavam da tradição dos aedos e do resgate de acontecimentos passados por meio


B
elementos míticos.

São cantos épicos que celebravam feitos heroicos e possuíam função religiosa e
C
pedagógica.

Eram fonte de educação para os latinos e de exaltação de crenças e valores da mitologia


D
romana.

Possuíam valor estritamente literário, sem implicações na preservação de crenças e


E
valores gregos.

Parabéns! A alternativa C está correta.


As obras atribuídas a Homero dentro da tradição lírica e épica dos aedos exaltavam os feitos
heroicos e possuíam um caráter pedagógico e religioso, contribuindo para a preservação dos
Questão 2
valores da cultura grega.
Sobressaem na Ilíada

A a cólera de Aquiles e a chegada de Ulisses a Ítaca.

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B a cólera de Aquiles e a Guerra de Troia.

C a morte de Aquiles e o retorno de Ulisses.

D a paz e a aliança entre gregos e troianos.

E a Guerra de Troia e a viagem de Ulisses.

Parabéns! A alternativa B está correta.


A Guerra de Troia, em seu nono ano, marca o início da narrativa do poema épico Ilíada. Aquiles é o
herói que retorna à guerra depois de a ter abandonado por um tempo movido pela ira diante da
morte de seu amigo Pátroclo – a tal ponto que consegue matar Heitor, o comandante dos
troianos.

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3 - Eneida, de Virgílio, e Metamorfoses, de Ovídio


Ao final deste módulo, você será capaz de identificar o contexto e os aspectos literários de
Eneida e Metamorfoses.

Contexto da expressão literária da Roma Antiga


Como a matriz da cultura ocidental é a
Antiguidade
Clássica greco-romana, neste terceiro módulo
apresentaremos duas grandes expressões
da
literatura latina:

Eneida (19 a.C.)

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Metamorfoses (8 d.C.)
Os poetas Públio Virgílio Marão (70 a.C.-19 a.C.),
autor de Eneida, e Públio Ovídio Naso (43 a.C.-17 d.C.), de
Metamorfoses, viveram em um período de construção de um novo regime
político em
Roma. Ambos
nasceram nos últimos anos da República Romana (507 a.C.-27 a.C.),
momento em
que houve uma
acentuada expansão das fronteiras, embora Roma ainda não estivesse no
apogeu de suas conquistas.

Primeiramente como um dos cônsules da República


Romana
e, em seguida, como ditador absoluto, Júlio
César (100 a.C.-44 a.C.) participou da
transformação do regime de República para o de Império. Em
testamento, ele deixou
registrada a adoção de Gaius Iulius Caesar Octavianus Augustus (63 a.C.–14 d.C.),
que,
sob o título de Augusto, se tornou o primeiro imperador romano.

O regime recém-nascido experimenta então a chamada Pax Romana, período de


pacificação
interna que se estendeu até 180 d.C., já que as guerras externas eram
consideradas
uma atividade econômica.

Sem conflitos civis (a não ser um de curta


duração), a
cultura em Roma vive um momento de ebulição. A
literatura conhece o seu auge na
prosa e
na poesia com poetas como Virgílio, Horácio e Ovídio.

Os poetas e a política
Nesse contexto de novo regime político, o poeta
Virgílio, nascido em Mântua, deixa o norte da Itália e se
associa ao poder do
imperador
Otávio Augusto, tornando-se, em certa medida, corresponsável pela nova
Roma que
surge no
período pós-republicano. O poeta estava inserido no círculo poético do rico e
influente
Caio Mecenas, conselheiro do imperador, em cujo grupo a posição de Virgílio era a de
maior destaque.

Entusiastas do novo sistema


político, os
poetas desempenhavam uma função publicitária em seu favor.
Ovídio, por sua
vez,
participava do círculo de Messala Corvino, político que havia sido cônsul na
República
Romana.
No círculo intelectual do refinado Mecenas, os poetas se reuniam, liam para o
imperador e a corte,
conheciam a produção literária uns dos outros e
recebiam o
apoio de Mecenas.

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Recepção na casa de Mecenas, por


Stefan
Bakałowicz (1860).

Mecenas
Nome do qual deriva o termo “mecenato”, que indica justamente
o
patrocínio e o incentivo a artistas e a
atividades culturais de forma geral.

Virgílio desfruta até o fim de grande admiração do


imperador. Isso, porém, não acontece com Ovídio.

Em 8 d.C., Ovídio é banido de Roma por Otávio


Augusto
e exilado em Tomis, atual cidade de Constança,
na
Romênia, por razões nunca totalmente explicitadas. Contudo, ele supunha que o
banimento se deu por
imoralidade em razão do conteúdo de
A arte de amar e por um erro que teria cometido, uma vez que o
imperador
Otávio
Augusto defendia os “valores da família”.

Eneida – uma epopeia


para
Roma

Eneias na corte de Latino, por Ferdinand Bol


(1663).

Para os antigos, a arte era uma manifestação


estética,
sem dúvida, para a fruição, porém também tinha um
compromisso com a instrução e as
funções rituais e políticas. A poesia, por exemplo, era uma forma
sagrada de
expressão.
A poesia épica, aliás, era considerada perfeita para eternizar as origens de um
povo.

Roma, como um império jovem, reivindicava uma epopeia que lhe desse um
passado
grandioso no qual pudesse espelhar o presente e celebrar o governo de
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Augusto.
Como estratégia, Virgílio projetou mitologicamente Roma e o imperador
na
Eneida. Por buscar refletir o modelo homérico, a epopeia romana é
considerada
uma epopeia reflexa.

Bem diferente das epopeias gregas, Eneida


nasce escrita com data e autoria definidas, pois foi sugerida (ou
encomendada) por
Otávio Augusto e planejada e escrita por Virgílio no final da sua vida. Trata-se de
uma
história mítica criada para a Roma Imperial, a qual, aliás, é chamada por Virgílio
de
Eneida, que significa “de
Eneias”.

Eneias, o herói da epopeia romana


Eneias, príncipe e herói sobrevivente de Troia,
era
casado com Creúsa, irmã de Heitor e filha do rei Príamo.
Ele fugiu de Troia em
chamas
com a missão de reconstruí-la em outro lugar.

Na Eneida, revela-se que Eneias não viu


quando os gregos saíram de dentro do cavalo de madeira e
invadiram Troia. Por isso,
Heitor lhe aparece em sonho e lhe dá os comandos da fuga: confia-lhe os objetos
sagrados, os deuses-lares (penates) e os troianos (os sócios), orientando que Eneias
busque um lugar para
os sobreviventes no além-mar.

Com o velho pai, Anquises, nas


costas, o
filho e os sobreviventes troianos, ele deixa Troia. Uma das fontes
para
conhecer
Eneias é, sem dúvida, a Ilíada, que traz, nos versos de 208 a 241
do
Canto XX, um embate
com Aquiles, no qual Eneias detalha a sua linhagem e se
apresenta como filho do mortal Anquises e da
deusa Afrodite (Vênus para os
romanos).

Embora mortal como o pai, Eneias


aponta
a sua ascendência divina não apenas por parte de mãe, como
também revela
Zeus
como ancestral distante, além do seu parentesco com o rei troiano Príamo.

Fuga de Eneias de Troia, por Federico


Barocci (1598).

Com tal origem, Eneias, ao ser escolhido por


Virgílio
para ser o fundador mítico de Roma, dá sustentação ao
passado distante, mítico e
aristocrático que todo universo épico precisa evocar.

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A lenda de Eneias tinha o mérito de dar a Roma títulos de


nobreza, fazendo remontar a estirpe dos seus fundadores às
origens dos
tempos
históricos, atribuindo-lhes antepassados
divinos: Zeus e Afrodite. Além
disso, a
grandeza de Roma parecia
ter sido predita pelo próprio Homero. Roma parecia
realizar, no
seio do seu império, a reconciliação das duas raças inimigas,
os
troianos e os gregos.
(GRIMAL, 1993, p. 136)

Ornamentar as façanhas guerreiras com lendas e


mitos
revela o engenho do poeta épico, tarefa que Virgílio
cumpriu à risca ao conceber os
ancestrais míticos de Roma até chegar a Otávio Augusto. Doze gerações
separam Eneias
de
Rômulo e Remo, gêmeos nascidos em Alba Longa, cidade fundada por Ascânio, um dos
filhos
de Eneias.

Comentário
Há outras versões consideradas obscuras que relatam ser Eneias o fundador de
Roma ou que Rômulo e
Remo eram dois de seus quatro filhos. No entanto, a
versão
virgiliana é a que se impôs e sobreviveu a partir
do século I d.C.

Eneida e sua estrutura


A Eneida apresenta 9.826 versos
distribuídos
em 12 cantos, ao longo dos quais é possível perceber a
evolução do príncipe troiano
Eneias. Apesar de começar com certa fragilidade, ele, aos poucos, demonstra
toda a
sua
virtude guerreira.

Veja os versos iniciais de Eneida nos


quais
se anuncia o que será cantado, seguido de uma breve síntese da
história de Eneias:

As armas canto e o varão que, fugindo das plagas de Troia


por
injunções do Destino, instalou-se na Itália primeiro
e de Lavínio
nas praias. A impulso dos deuses por muito
tempo nos mares e
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em terras vagou sob as iras de Juno,


guerras sem fim sustentou
para as bases lançar da Cidade
e ao Lácio os deuses trazer— o
começo da gente latina,
dos pais albanos primevos e os muros
de Roma altanados.
Musa! recorda-me as causas da guerra, a
deidade agravada;
por qual ofensa a rainha dos deuses levou um
guerreiro
tão religioso a enfrentar sem descanso esses duros
trabalhos?
(VIRGÍLIO, Eneida. Trad. Carlos
Alberto Nunes. Brasília: Editora da UNB, 1981, Canto I, v 1-10)

Eneida, como prevê a tradição épica,


começa
in media res. Até o Canto VI, temos o relato da longa viagem de
Eneias até
a
Península Itálica, a sua nova pátria; do Canto VII ao XII, as ações bélicas para
conquistá-la:

Do Canto I ao V

Vênus aplica um bálsamo na ferida de Eneias,


por
Giovanni Francesco Romanelli (1650).

Eneias está navegando, fugindo de Troia. Juno


(Hera)
intervém e sempre se coloca em posição contrária
aos intentos dele. Ela representa o
símbolo de obstrução às ações do herói. Sua missão é sobreviver e
fundar uma nova
Troia,
que será Roma.

Apesar da tempestade, sua tropa sobrevive e Eneias


chega a Cartago (cidade que será muito inimiga de
Roma no futuro). Encontra Dido
(rainha
de Cartago), e eles se apaixonam. Eneias narra a sua história a Dido
(valendo-se da
analepse, assim como visto na Odisseia).

Esse amor, entretanto, é um problema. Eneias,


afinal,
precisa cumprir o seu destino:

Predito por sua mãe, Vênus (Afrodite).

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Reiterado por Júpiter (Zeus).

Retardado por Juno (Hera).

Lembrado por Mercúrio (Hermes), deus mensageiro.

Eneias despede-se de Cartago. Em seguida,


Dido se
mata.

Do Canto VI ao XII

A morte de Dido, por Heinrich Füger (1792).

Eneias chega a Cumas, onde encontra uma sibila


(sacerdotisa) do Templo de Apolo, deus caro aos troianos.
Ele pede à sibila que o
leve
ao mundo dos mortos para ver o pai.

Eneias se encontra com Anquises, que lhe mostra os


Campos Elíseos. Aponta para Otávio Augusto e
anuncia que aquele será o descendente
de
ambos e faz profecias sobre o futuro glorioso de Roma.

Após ter certeza de que a descendência deu certo,


Eneias se fortalece. A partir desse momento, ele é um
herói completo e está pronto
para
disputar o território onde Roma será fundada. Chega ao Lácio e pede
abrigo ao rei
Latino.

Ele lutará contra um grande inimigo instigado por


Juno: Turno, rei dos rútilos (povo itálico antigo) e
prometido de Lavínia, filha do
rei
Latino, com quem Eneias se casará. A luta será pela região do Lácio, região
central
da
Itália, onde Roma se erguerá.

Eneias fundará a cidade lendária de Lavínio em


homenagem à sua esposa e cujos habitantes serão
chamados de latinos. Já o filho de
Eneias fundará Alba Longa; dessa linhagem, surgirão Rômulo e Remo,
fundadores de
Roma.

Se a Ilíada é a narração de uma guerra e


a
Odisseia, a volta de um de seus heróis para a pátria, Eneida
consegue
ser uma síntese de ambas ao trazê-las à memória do leitor – só que na ordem inversa.

O tema da fuga como transgressão ao épico


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Trabalhar com a perspectiva dos vencidos da


Guerra de
Troia não foi uma novidade, pois Eurípides já o
fizera no teatro, como nas tragédias
As troianas e Hécuba. Entretanto, apresentá-la em uma epopeia foi
algo
inusitado.

Virgílio conseguiu um grande feito


com
Eneida, pois o tema da fuga no universo épico está associado à
covardia, e é difícil incorporá-lo como parte de um ato heroico. Ademais, a
fuga
não se dá de modo
periférico; pelo contrário, ela constitui o cerne da obra,
pois é dela que Roma nasce.

No entanto, mesmo sendo difícil


enquadrar a fuga como um valor positivo no épico, ela acentuou a força e a
grandeza de Eneias, herói impregnado de altos valores morais, fiel à família
e
aos deuses e bom amigo e
virtuoso guerreiro. Ele é considerado, em suma, o
melhor depois de Heitor.

Eneias e Turnus, por Luca Giordano


(século XVII).

Após os troianos aportarem em Cartago, Ilioneu,


mensageiro de Eneias, dirige-se à rainha Dido e apresenta o
herói. Destaca suas
virtudes
guerreiras e relata tanto a fuga de Troia quanto a tempestade que os seus sete
navios
acabaram de enfrentar, pedindo e recebendo acolhida.

Eneias foi nosso rei, o mais justo e piedoso dos homens,


De
comprovado valor nos combates; em tudo, o primeiro.
Se os
fados ainda o conservam e as auras vitais ele aspira,
Sem para
as trevas terríveis haver até agora baixado,
Não tem medo de
nada nem tu de nos teres salvado.
(VIRGÍLIO, Eneida. Trad. Carlos
Alberto Nunes. Brasília: Editora da UNB, 1981, Canto I, v. 544-548)

Ao contar a saída de Troia, Ilioneu diz que Eneias


“foi nosso rei”. Em outro trecho, exalta sua excelência
como pai dos teucros
(troianos),
reconhecendo, desse modo, que Eneias já era o pai da pátria. Ainda que

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seu povo
estivesse sem território fixo, Eneias, cumprindo as profecias de Afrodite sobre o
destino grandioso
que o filho teria, liderava os troianos rumo à nova Troia.

Tal construção de herói aderiu-se aos ideais


augustanos a ponto de Virgílio ter sido considerado o seu
melhor
intérprete, uma vez que o poeta se esmerou em reproduzir os valores filosóficos,
morais,
religiosos e
políticos de Otávio Augusto. Ao mesmo tempo, ele conseguiu evocar toda
a
tradição épica de Homero em
Eneida.

Eneias e Dido, por Pompeo Batoni


(1747).

Além da desejável leitura integral


de
Eneida, vale também ver e ouvir a ópera em três atos Dido e Eneias
(1689),
de
Henry Purcell (1659-1695), com libreto de Nahum Tate (1652-1715). A ópera
apresenta o Canto IV
de Eneida, que narra o mito do amor trágico entre
Eneias e
a rainha de Cartago, Dido, que se imola após
saber que ele partirá para
cumprir
o destino que os deuses lhe haviam traçado.

Dido tem uma importante simbologia na


Eneida.
Ela, afinal, simboliza:

O poder de Cartago, uma das maiores potências militares e comerciais


de seu tempo, destruída pelo
exército romano em 146 a.C., no desfecho da
Terceira Guerra Púnica.

A mulher do Oriente na figura de Cleópatra (69 a.C.-30 a.C.), rainha


do Egito, a qual, em vão, se uniu ao
general romano Marco Antonio (83
a.C.-30 a.C.) para se proteger de Roma. Ela teria se suicidado, tal como
Dido, por não aceitar ser levada e exibida em procissão triunfal como
uma das glórias da vitória romana.

Comentário

Ovídio, o próximo poeta a ser estudado, também revisitou o mito de Dido


n’As
heroínas (Heroides).

Metamorfoses de Ovídio
A obra intitulada Metamorfoses (8 d.C.),
de
Ovídio (47-17 d.C.), é um longo poema épico-mitológico. Ele está
dividido em 15
livros
escritos em versos em hexâmetros dactílicos, ou seja, no padrão do metro épico, do
qual
fazem parte cerca de 250 pequenas narrativas poéticas.

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Ovídio recupera toda a tradição épica de Homero e Hesíodo (séc. VIII-VII a.C.),
Apolônio de Rodes (295 a.C.-215 a.C.) e Virgílio, seu contemporâneo, e consegue
produzir uma verdadeira bíblia da mitologia dada a riqueza do repertório que
reúne:
dos primórdios, como os mitos cosmogônicos do poema Teogonia, de
Hesíodo,
até
as fábulas romanas.

Nos primeiros versos do Livro I, o poeta revela o


seu
intento: contar como os seres assumiram novas
formas. Atribui a transformação aos
deuses, a quem ele pede um favorecimento na condução do poema
para que, de modo
ininterrupto, consiga narrar da origem do mundo até o seu tempo.

Apolo e Dafne, por Piero del


Pollaiolo
(1480).

Dessa forma, o poeta latino expõe,


de
modo poético, um número grande de micronarrativas com enfoque
nas
mutatas
formas in noua corpora (“formas em outros corpos mudadas”), algo
muito
presente nos mitos
em que deuses e homens transfiguram-se em plantas,
animais,
pedras e rios.

Do ponto de vista formal, Ovídio


também
operou uma metamorfose no gênero literário, pois existe uma
mistura do
lírico,
do trágico, do cômico e do épico em Metamorfoses, algo incomum nas
literaturas de índole
clássica. Embora essa obra contenha muitas narrativas
míticas, elas não se sucedem sem um
encadeamento narrativo. É evidente que o
tema da transformação já constitui um elo entre essas narrativas,
mas Ovídio
mostra o seu engenho com mais refinamento ainda.

Uma sequência interessante é aquela na qual o


poeta
narra o nascimento dos seres e das feras pós-dilúvio,
criando um fio condutor para a
história de Píton, a serpente aniquilada por Apolo. Tal episódio, por sua vez,
suscita
um comentário sobre os jogos píticos feito exclusivamente para mencionar que ainda
não
existia a
coroa de louros como prêmio a ser colocado na cabeça do vencedor,
preparando,
dessa forma, o
encadeamento com o mito de Dafne e Apolo/Febo.

Para que o contato com o texto de Ovídio, ainda


que
traduzido, possa ser estabelecido, apresentaremos
adiante a metamorfose da ninfa
Dafne
em loureiro durante a sua fuga de Apolo.

Atenção!
Habilmente descrito por Ovídio, esse movimento da metamorfose foi capturado
em
mármore pelo artista
barroco Gian Lorenzo Bernini (1598-1680), que, em
tamanho
natural, esculpiu Apolo e Dafne (1622-1625).
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Confira alguns versos:

Dafne foi o primeiro amor de Apolo,

A ninfa filha de Peneu, a quem

O dirigiu não a Fortuna incerta,

Mas sim a cruel ira de Cupido.

Febo, soberbo da recém vencida

Píton, viu o menino com seu arco,

Fletindo as pontas pelo fio teso,

E lhe falou: “A que te irão servir,

Menino lépido, tais graves armas?

[...]

Cupido então: “A tudo ferem, Febo,

Tuas flechas, e a ti ferem as minhas,

[...]

Disse e, fendendo o ar co’ agudas penas,

Pousou alígero ao frondoso alcácer

De Parnaso, tirou de sua aljava

Duas flechas de efeitos diferentes:

Aquela faz, esta repele amor:

Áurea a que faz luzindo à ponta fina

[...]
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Assim assente o pai, mas o que queres,

Dafne, tua beleza veda a ti,

E tua forma nega o que suplicas:

Apolo a ama e à vista dela anseia

Pela união conubial, e espera

Por aquilo que tanto anseia, assim

O iludem suas próprias predições.

[...]

Apolo vê os cabelos de Dafne soltos ao pescoço e

Diz: e se os penteasse? Vê seus olhos

Vibrarem flamejantes como os astros,

Observa os lábios, cuja vista apenas

Não lhe é bastante; louva os dedos, mãos,

Os braços que se estendem nus aos ombros,

“Talvez melhores se cobertos?”, pensa…

E ela foge, mais célere que o ar,

Nem se detém às súplicas de Apolo:

“Ó ninfa, para! rogo-te, não sigo

Como inimigo! ninfa, para! Assim

A ovelha foge ao lobo, assim o cervo

Foge ao leão, assim as pombas à águia,

Assim qualquer um foge ao inimigo:

Amor é a causa que me faz seguir!

Ai de mim se caíres inclinada,

Indigna de feridas, se teus pés

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Encontrarem espinhos ao caminho

E eu te causar imerecidas dores!

[...]

Querendo dizer mais o deus Apolo,

Foge-lhe a ninfa em passo trepidante,

Deixando ao curso esclusa a sua fala.

O corpo dela se desnuda ao vento,

Vibram-lhe as vestes e a suave brisa

Impele para trás os seus cabelos:

Tão bela Dafne lhe parece em fuga…

Porém o deus não se contém ao zelo,

E enquanto lhe aconselha amor loquaz,

Apressa o passo impetuoso a ela.

[...]

Assim vão Febo e Dafne: àquele move

Sua esperança e a esta o seu temor.

Porém o que a persegue, guarnecido

Pelas asas do amor, é mais veloz,

Não para e, estando na iminência dela,

Chega a soprar-lhe a coma solta atrás.

Findada a força, a ninfa empalidece.

Vencida pelo esforço de escapar,


Dirige o olhar às ondas do riacho:

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“Ó pai, se tens mesmo o poder dos rios,

Concede ajuda àquela cuja forma

Por ser tão bela não pode ser vista,

E faz perder-se enfim a transformando!”

Assim mal Dafne finda sua prece

E súbito um torpor lhe invade os membros:

Fina casca lhe cinge o seio ameno,

Se faz em folhas seu cabelo e em ramos

Os seus braços; seus pés, antes velozes,

Se fixam lentamente ao solo em rígidas

Raízes e ao seu rosto todo envolto

Nada resta senão um brilho escuso.

Ainda Apolo a ama e põe a mão

Direita sobre o tronco: lhe é possível

Sentir pulsar o coração de Dafne.

E envolvendo as ramagens com seus braços,

Beija a madeira, que recusa os beijos.

Diz-lhe o deus então: “Já que não podes

Ser minha esposa, tu serás minha árvore.

Te portarei, ó louro, para sempre

Na lira, nos cabelos e na aljava.

Estarás entre os líderes do Lácio,

Com leda voz a modular vitórias

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E a ver do Capitólio imensos faustos.

Disposta à entrada do palácio augusto,

Serás fiel vigia dos portões

E, ao centro, irás velar pelo carvalho.

Sobre meus cachos tenros não cortados,

Tu portarás da fronde eterna glória.”

Calou-se enfim; e, com aqueles ramos,

Pareceu-lhe o laurel ter assentido,

Meneando no topo as suas folhas.


(OVÍDIO.
Metamorfoses. Trad. Domingos Lucas Dias. São
Paulo: Editora 34, 2017, 452-567)

É importante saber que cada mito possui muitas


tradições e versões diferentes.
Há certamente as mais
consagradas, que se tornam fontes de referência para
escritores e
artistas das gerações seguintes,
como
aconteceu com Teogonia, de Hesíodo, e Metamorfoses.

Ovídio tinha como intento superar a tradição e, em certa medida, conseguiu. Uma
das
mais admiradas sínteses cosmogônicas encontrava-se em Teogonia, obra na
qual Hesíodo não associou a ideia do deus primordial Caos à confusão e à
desordem.

Pelo contrário: esse deus se associava à ideia de


separação, amplidão e espaço vazio primordial. Ovídio
recobriu Caos com as figuras
da
desordem. Tal versão se consolidou como uma nova tradição na literatura,
nas artes e
até
nos dicionários.

Para finalizar, em um amplo arco que começa com o


Caos
e termina com o destino de Júlio César,
Metamorfoses atende a todos os
pressupostos de uma obra clássica (entre elas, a universalidade e a
temporalidade),
conseguindo ultrapassar mais de dois milênios com o vigor e a atualidade que somente
os
grandes clássicos conseguem manter.

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29/08/2022 16:10 Arte e literatura na Antiguidade Clássica

Eneida e Metamorfoses
Assista agora a um vídeo que trata de algumas das
principais contribuições literárias da Roma Antiga:
Eneida, de Virgílio, e
Metamorfoses, de Ovídio.

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Vem que eu te explico!
Os vídeos a seguir abordam os assuntos mais relevantes do conteúdo que você acabou de estudar.

Módulo 3 - Vem que eu te explico!

Eneida – uma epopeia para Roma

Módulo 3 - Vem que eu te explico!

Metamorfoses de Ovídio

Todos

Todos Módulo 1 Módulo 2 Módulo 3

Módulo 1 - Video

Arte greco-latina

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Módulo 2 - Video

Ilíada e Odisseia

Falta pouco para atingir seus objetivos.


Vamos praticar alguns conceitos?
Questão 1

Eneida pode ser considerada uma epopeia para Roma, porque

reflete os valores da cultura grega no contexto latino a partir da exaltação da democracia


A
e da rejeição ao imperador.

foi escrita em latim por poetas romanos contratados pelo imperador com a finalidade de
B
rejeitar a mitologia grega.

apresenta temáticas relacionadas com acontecimentos históricos ocorridos


C
exclusivamente na cidade.

D foi concebida e escrita por Remo e Rômulo, fundadores da cidade de Roma.

espelha, por meio de recursos literários e de figuras míticas, a cidade romana e seu
E
imperador Otávio Augusto.

Parabéns! A alternativa E está correta.


Eneida, seguindo o modelo homérico de epopeia, representa mitologicamente a cidade romana e
Questão 2
seu imperador. A obra foi escrita pelo poeta latino Virgílio para contar a saga de Eneias.

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A obra Metamorfoses pode ter seu título justificado, pois

A narra poeticamente as transformações pelas quais passa seu autor, Ovídio.

B conta poeticamente as transformações dos seres, mudança atribuída aos deuses.

conta poeticamente as mudanças dos deuses da mitologia romana em divindades da


C
mitologia grega.

desenvolve um poema em que o lírico, épico, o trágico e o cômico se mantêm inalterados


D
e não se misturam.

E narra, de forma histórica e documental, as transformações por que passaram os romanos.

Parabéns! A alternativa B está correta.


Ovídio conta, por intermédio de mitos e linguagem poética, além de misturar diferentes gêneros
literários, o modo como os serem passam por mudanças e assumem novas formas. Essas
metamorfoses são atribuídas às divindades da mitologia romana.

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Considerações finais
Conhecer a arte e a literatura da Antiguidade Clássica é
uma condição para se compreender bem o que se
produziu depois dela, seja na literatura, no
teatro, na pintura, na escultura, na música ou, mais recentemente,

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no cinema, nos jogos


digitais, na psicanálise e até mesmo na publicidade.

Por isso, você estudou neste conteúdo diferentes


manifestações artísticas da Grécia e da Roma antigas ao
verificar as características e as
dimensões estéticas dessa riquíssima produção. Nela, podemos encontrar
clássicos, entre
outras criações artísticas e literárias, como a Ilíada e a Odisseia, de
Homero; Eneida, de
Virgílio; e Metamorfoses, de Ovídio.

Esperamos que esses estudos sejam um fator de motivação


para você ler alguns desses clássicos da
cultura ocidental!

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Podcast
Para encerrar, ouça sobre os
principais aspectos relacionados com a arte e a literatura na
Antiguidade
Clássica.

Referências
BRANDÃO, R. O. A tradição sempre nova. São Paulo:
Ática, 1976.

GRIMAL, P. Dicionário de mitologia grega e


romana. Rio de Janeiro: Bertrand, 1993.

HAUSER, A. História social da arte e da


literatura. São Paulo: Martins Fontes, 1994.

Explore +
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Leia este artigo para aprofundar seus estudos sobre a


Ilíada:

VERNANT, J.P. A bela morte e o cadáver ultrajado.


Discurso. n. 9. USP. 1978.

Assista ao filme sobre a guerra de Troia em que Brad


Pitt interpreta Aquiles e Orlando Bloom, Páris:

TROIA. Direção de Wolfgang Petersen. EUA:


Warner Bros., 2004. 163 min.

Veja os seguintes vídeos (no formato de entrevista)


disponibilizados pela Univesp em seu canal no
YouTube:

Literatura universal – Odisseia (Homero) - André Malta - Pgm 02.

Literatura fundamental 12 – Eneida – Paulo Martins.

Literatura fundamental 35 – Metamorfoses, de Ovídio, com Alexandre Hasegawa.

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