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Karen Horney

A médica psicanalista Karen Horney (1885-1952) enfatizou a preeminência


de influências sociais e culturais sobre o desenvolvimento psicossexual,
focalizou sua atenção sobre as psicologias divergentes de homens e
mulheres e explorou as vicissitudes dos relacionamentos maritais.

        Sua visão de que a repressão e a sublimação de impulsos biológicos


não são os determinantes primários do desenvolvimento da personalidade
levaram à sua remoção como instrutora no New York Psychoanalytic
Institute e a que ela fundasse, em 1941, o American Psychoanalytic
Institute.

        TEORIA DA PERSONALIDADE. Horney sustentou que o


desenvolvimento da personalidade resulta da interação de forças biológicas
e psicossociais que são singulares para cada pessoa. Na medida em que o
cerne de cada personalidade é um self real duradouro equivalente
parcialmente ao ego freudiano e parcialmente ao estado de ego infantil de
Eric Berne, o self real combina escolha, vontade, responsabilidade,
identidade, espontaneidade e vivacidade. Um processo natural em
desenvolvimento de auto-realização conduz ao desenvolvimento do
potencial humano em três direções básicas: em direção aos outros, a
expressão de amor e confiança; contra os outros, para a expressão de
oposição saudável; e para longe dos outros em direção à auto-suficiência.

        Embora as condições, durante a infância, possam bloquear o


desenvolvimento psicológico, o crescimento saudável é sempre possível se
os bloqueios internos são removidos. As crianças cujas situações familiares
as levaram a sentir-se sob perigo concentram em sobrevivência psicológica
e podem fazer isso desenvolvendo mecanismos de enfrentamento
esterotipados.

        Horney pensou que os atributos de passividade e sofrimento não eram


biologicamente específicos às mulheres conforme ensinados pelos analistas
da sua época e que personalidades masculina e feminina são, em realidade,
culturalmente determinadas.

        TEORIA DA NEUROSE. Horney definiu neurose tanto em termos


intrapsíquicos como interpessoais. Ela observou que seus pacientes
queixavam-se não das neuroses sintomáticas como fobias e compulsões,
mas de infelicidade, bloqueio e falta de preenchimento no trabalho e
inabilidade de estabelecer ou manter relacionamentos. Ela viu estes
pacientes como apresentando complexos sistemas de padrões defensivos
autoperpetuantes contra a ansiedade básica que iniciou na primeira infância
- neuroses de caráter. Busca de segurança. As crianças movem-se
psicologicamente em três direções para aliviar sua ansiedade, para tornar a
vida segura e previsível e para obter satisfação. Elas buscam afeto e
aprovação ou elas se tornam hostis ou elas se retraem. As crianças por fim
usam a estratégia de enfrentamento que melhor satisfaz suas necessidades,
mas se apenas uma estratégia básica é usada, as crianças tornam-se
limitadas em seu repertório de enfrentamento em sua experiência de si
mesmas e do seu mundo. Seu senso de segurança é tênue porque elas têm
perigo vindo de dentro de sentimentos e impulsos suprimidos ou
reprimidos. Se as condições ambientais desfavoráveis continuam, seus
sentimentos conflitantes são dirigidos para o inconsciente e tais crianças
são deixadas com um senso de desconforto, ansiedade e apreensão e com
um senso de self inseguro. Nesta junção, seu ponto de referência é
externalizado, padrões de comportamento enrijecem e crescentes bloqueios
ao crescimento se desenvolvem. Horney designou estas atitudes complexas,
relativamente fixas em direção ao eu e aos outros como tendências
neuróticas.

        TIPOS DE CARÁTER. Os três principais tipos de caráter de Horney


são embasados no modo predominante de relacionar-se com outros. O tipo
self-apagado, anuente resulta da operação defensiva de agarrar-se a
outros. Tais pessoas tentam obter o favor dos outros através de lisonja,
subordinam-se aos outros e são relutantes em discordar por medo de
perder favor. O tipo expansivo, agressivo resulta de manobrar contra outros
e colocar forte confiança em poder e domínio como um meio de obter
segurança. O tipo desapegado, resignado resulta de afastar-se de outros
para evitar tanto dependência como conflito. Eles são pessoas muito
privadas que, embora se recusando a competir abertamente, vêem-se como
se elevando acima dos outros.

        MEIOS COMPLEMENTARES PARA ALIVIAR A TENSÃO INTERNA.


O superdesenvolvimento de um dos três estilos interpessoais básicos
suprime os outros dois. De um modo análogo aos complexos de Jung, os
impulsos reprimidos continuam ativos e produzindo conflitos. Uma harmonia
artificial é obtida pelo uso de mecanismos mentais como pontos cegos,
comportamentalização, racionalização e técnicas de enfrentamento como
autocontrole excessivo, arbitrariedade, elusividade, cinismo e
externalização.

        Imagem idealizada. Durante seus anos de adolescência, os futuros


pacientes neuróticos criam uma imagem ideal fantasiada que, caso atingida,
promete terminar com seus sentimentos dolorosos e supre o
autopreenchimento. A imagem idealizada contrabalança a alienação dos eus
centrais pela qual as pessoas neuróticas passam porque as técnicas de
sobrevivência que elas adotaram anteriormente as forçam a anular seus
desejos, sentimentos e pensamentos genuínos. A imagem idealizada cobre
todas as contradições, oculta a natureza defensiva do seu comportamento e
restaura um senso de integridade. A energia anteriormente disponível para
a auto-realização é usada em esforços para tornar-se como a imagem
idealizada. Por exemplo, uma pessoa que adotou a estratégia de mover-se
em direção aos outros e é conseqüentemente dependente de outros para
obter afeto e aprovação experimenta o medo de auto-asserção razoável
como humildade imaculada e a consideração pelos outros.

        Porque o eu ideal é imaginário, as pessoas neuróticas são


prontamente machucadas por confrontos com a realidade e elas
trabalharam demasiado arduamente para provar que elas são, de fato, os
seus eus ideais. Fazer isso resulta em um tipo de perfeccionismo que insiste
em excelência imaculada na qual "eu deveria" substituir "eu quero" ou "eu
preciso". Isso também resulta na ambição neurótica de ser o primeiro e em
um forte impulso de vingança sobre os percebidos como tendo interferido
em que eles se tornassem seus eus ideais.

        Reivindicações, deveres e auto-ódio. Apesar da sua freqüente


autodepreciação, as pessoas neuróticas esperam ser tratadas como se
fossem seus eus ideais. Estas reivindicações a tratamento especial, quando
frustradas, produzem raiva, indignação e ressentimento os "Deveres",
demandas auto-impostas de que eles devem viver à altura dos seus eus
idealizados são irracionais e não relacionados às realidades da vida
cotidiana. Os "Deveres" são projetados e experimentados como demandas
feitas por outros e são também exigidos dos outros. Fazer isso resulta em
que a pessoa neurótica seja crítica dos outros e sensível ao criticismo.

        O auto-ódio resulta quando surge a ameaça que as pessoas neuróticas


podem ser incapazes de atingir seus eus idealizados. Se o apoio não fosse
necessário para o self idealizado, as alegações, "os deveres" e o auto-ódio
não seriam partes tão importantes do aparelho psíquico.

        Orgulho neurótico e o mecanismo do orgulho. Aspectos


glorificantes do self idealizado, orgulho neurótico substitui autoconfiança
saudável. Deste modo, quando seu orgulho é ferido por outros, as pessoas
neuróticas tornam-se enfurecidas e buscam vingar sua mágoa e ocultar sua
autodecepção obtendo uma vitória vingativa sobre a pessoa ofensiva. Junto
com apoiar alegações e deveres, o orgulho neurótico e o auto-ódio formam
uma rede defensiva ou mecanismo do orgulho que protege o self idealizado.
Qualquer tentativa de reduzir elementos do mecanismo do orgulho é
experimentada como um ataque sobre a pessoa. Apesar da couraça da sua
rede defensiva, as pessoas neuróticas não estão em paz porque elas estão
em conflito interno com as forças que as protegem. O conflito entre o
mecanismo do orgulho e as forças impulsionando em direção à auto-
realização saudável é o conflito interno central.

        Conflito também existe dentro do próprio mecanismo do orgulho. O


orgulho neurótico e as reivindicações estão associados à imagem idealizada
glorificada; auto-ódio e "deveres" estão associados aos aspectos
inaceitáveis do self. Quando tentativas são feitas para satisfazer ambas as
forças simultaneamente, o conflito surge. Tentativas de evitar estes
conflitos envolvem alienação adicional do self.

        Alienação. A alienação do self é uma das conseqüências mais sérias


do desenvolvimento neurótico. A alienação resulta da combinação entre
negação repetida da realidade externa e a repressão de pensamentos,
sentimentos e impulsos genuínos. À medida que o processo de alienação
continua, as pessoas neuróticas perdem contato com o cerne do seu ser e
não mais podem determinar ou agir sobre o que é certo para elas. Seus
sentimentos podem variar de incerteza e confusão à morte e vazio internos.

        TRATAMENTO ANALÍTICO. Horney não considerou as pessoas


neuróticas adultas como recapitulando experiências infantis, portanto, não
focalizou na recuperação de memórias da infância. Ela lidou, ao invés disso,
com o processo neurótico autoperpetuante. Ela enfatizou a importância dos
sonhos em análise e, posteriormente, a exploração do relacionamento
paciente-analista. Ela foi uma das primeiras analistas a reconhecer e fazer
uso construtivo de seus próprios sentimentos em relação aos pacientes.
Para Horney, a psicanálise é um empreendimento cooperativo que capacita
os pacientes a liberarem-se de suas estruturas neuróticas e a mobilizarem-
se em direção à auto-realização. A responsabilidade do analista é auxiliar a
liberar os pacientes de bloqueios, forças que impedem o crescimento
saudável.

        Cedo na terapia, durante o processo de desilusão, os dois tipos de


bloqueio são identificados e examinados. O primeiro grupo de bloqueios
orientados à segurança, os bloqueios protelares, ajudam a evitar a
ansiedade causada pela autopercepção. Os bloqueios protetores incluem
silêncio, atraso, depreciar o analista, o uso de drogas e até mesmo o uso de
auto-acusação para evitar exploração adicional.
        Os bloqueios de valor positivo reforçam a satisfação dos pacientes
consigo mesmos e apóiam seus eus idealizados. No processo de desilusão, o
analista identifica ambos os tipos de bloqueio, expondo os bloqueios
protetores antes de expor os bloqueios que defendem a imagem idealizada.
Analisar os bloqueios de valor positivo primeiro despertaria medo excessivo.

        Qualidades do analista. As qualidades do analista, posteriormente


descritas por Cari Rogers como condições oferecidas pelo terapeuta,
incluem maturidade, crença construtiva em resolução de conflito e a
habilidade de comunicar esperança e respeito. O analista escuta, esclarece,
provê direções e sugere resoluções alternativas para conflitos. Horney
enfatizou a necessidade do analista ajudar a tirar os pacientes de sua
alienação e sugeriu que os terapeutas sejam flexíveis, talhando suas
intervenções às necessidades dos pacientes no momento. Ela não enfatizou
usar o divã ou um número preestabelecido de sessões por semana.

        Processo terapêutico. Homey acreditou que mudanças


fundamentais são o melhor meio para mudar comportamentos
autoderrotadores, auto-alienantes. Ela criou um cenário no qual os
pacientes eram capazes de avaliar a si mesmos como pessoas livres para
descobrir e escolher valores pessoais que se encaixam com seus eus reais.
Este tipo de reorientação inicia após a fase de desilusão do tratamento. À
medida que os pacientes começam a questionar seus valores presentes e
seu processo idealizador diminui, eles são capacitados a revisar seus
valores e desenvolver valores mais flexíveis consoantes com seus eus
interiores. Os sonhos são usados em todas as fases do tratamento para
levar os pacientes em melhor contato com seus eus reais. Como tentativas
inconscientes para resolver conflitos, os sonhos podem mostrar forças
construtivas em funcionamento que não estão ainda discerníveis nos
pensamentos conscientes e no comportamento do paciente.

        À medida que os pacientes mobilizam suas forças construtivas, eles


experimentam a luta entre o sistema de orgulho e o eu real, No processo,
eles experimentam incerteza, dor psíquica e auto-ódio. À medida que o
conflito central é resolvido exitosamente, os pacientes passam para a fase
final do tratamento, a descoberta e o uso dos seus eus internos reais.

 Feminista à frente do seu tempo, Karen Horney  estudou psicanálise


freudiana em Berlim. Descrevia seu trabalho como sendo uma extensão do
sistema de Freud e não como uma tentativa de suplantá-lo
 
   Karen Horney nasceu em Hamburgo, na Alemanha. O pai era capitão de
um navio, homem religioso e taciturno, muito mais velho que a esposa,
mulher ativa e liberal. Ela deixava muito claro a Karen que desejava a
morte do marido e que se casara apenas por medo de permanecer solteira.
Rejeitava a filha e demonstrava nitidamente a preferência pelo filho mais
velho, de quem Karen sentia muita inveja simplesmente por ser menino, e
o pai a menosprezava por causa da sua aparência e inteligência.
Consequentemente, ela se sentia inferior, inútil e hostilizada (Sayers,
1991). Essa falta de amor por parte dos pais provocou o surgimento, mais
tarde, do que ela chamou de *ansiedade básica, outro exemplo da
influência da experiência pessoal na visão do teórico. Um biógrafo
comentou: "Em todos os trabalhos psicanalíticos de Karen Horney era
visível a sua luta para encontrar o sentido da própria existência e para
superar as dificuldades" (Paris, 1994, p. xxii).
 
   Precocemente, já aos 14 anos, Horney teve várias paixões de
adolescente na busca frenética do amor e da aceitação que não encontrava
em casa. Criou um jornal que chamava de "órgão virginal para
supervirgens" e andava pelas ruas frequentadas por prostitutas. Em seu
diário escreveu: "Na minha imaginação não há sequer uma parte de mim
que não tenha sido beijada por uma boca ardente. Na minha imaginação
não existe depravação do mais baixo nível que eu não tenha
experimentado" (Horney, 1980, p. 64). 
 
   Contra a vontade do pai, Horney ingressou na escola de medicina da
University of Berlin, recebendo, em 1913, o título de Doutora em Medicina.
Casou-se, teve três filhas (duas das quais se submeteram a análise de
Melaine Klein) e começou a sofrer de profunda depressão. Ela afirmava
sentir-se muito tempo infeliz e oprimida e passar por dificuldades no
casamento. Apresentava sintomas como crises de choro, dores de
estômago, cansaço crônico, comportamento compulsivo e incapacidade para
trabalhar, além de pensamentos de suicídio. Depois de manter vários casos,
divorciou-se para continuar a busca incansável pela aceitação pelo resto da
vida. Seu relacionamento mais duradouro foi com o psicanalista Eric Fromm
e, quando a realção terminou, ela ficou arrasada. Resolveu submeter-se à
psicanálise para tratar da depressão e dos problemas sexuais. Seu analista
freudiano disse-lhe que a busca por amor e a atração por homens mais
fortes refletiam paixões edipianas que da infância pelo pai severo (Seyers,
1991).
    Quando Horney percebeu que a análise freudiana não estava ajudando,
passou para a auto-análise, prática que adotou pelo resto da vida.
Impressionada com a observação de Adler sobre a falta de atrativos físicos
como causa dos sentimentos de inferioridade, concluiu que, estudando
medicina e adotando uma vida sexual promíscua, estava agindo mais como
homem que como mulher. Essa atitude a ajudava a sentir-se superior, mas,
mesmo assim, nunca desistiu de encontrar o amor.
    De 1914 a 1918, Horney estudou psicanálise ortodoxa no Berlin
Psychoanalytic Institute. Mais tarde, tornou-se professora do instituto e
começou a atender pacientes particulares. Escrevia artigos de revista
abordando os problemas da personalidade feminina, descrevendo alguns
pontos discordantes em relação a conceitos de Freud. Em 1932, seguiu para
os Estados Unidos para ser diretora adjunta do Chicago Institute for
Psychoanalysis. Lecionou também no New York Psychoanalitic Institute e
continuou a atender seus pacientes. O crescente descontentamento com a
teoria freudiana logo a levou ao rompimento com o grupo. Fundou o
American Institute of Psychoanalysis e ali permaneceu como diretora até a
morte.
 *Ansiedade básica: definição de Horney para a solidão invasiva e a
impotência, sentimentos que dão origem a neurose.

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