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Gramsci cumpriu dez anos, morrendo numa clínica de Roma em 1937. Na prisão, escreveu os
textos reunidos em Cadernos do Cárcere e Cartas do Cárcere. A obra de Gramsci inspirou o
eurocomunismo – a linha democrática seguida pelos partidos comunistas europeus na
segunda metade do século 20 – e teve grande influência no Brasil nos anos 1970 e 1980.
Co-fundador do Partido Comunista Italiano, Antonio Gramsci foi uma das referências
essenciais do pensamento de esquerda no século 20. Embora comprometido com um projeto
político que deveria culminar com uma revolução proletária, Gramsci se distinguia de seus
pares por desacreditar de uma tomada do poder que não fosse precedida por mudanças de
mentalidade. Para ele, os agentes principais dessas mudanças seriam os intelectuais e um dos
seus instrumentos mais importantes, a escola.
Ora, a sociedade civil em Hegel é a esfera das relações económicas e ao mesmo tempo a sua
regulamentação externa segundo os princípios do estado liberal, e é conjuntamente sociedade
burguesa e Estado burguês: Hegel concentra nela a crítica da economia política e da ciência
política, inspiradas respectivamente nos princípios da liberdade natural e do Estado do direito
(Bobbio, 2002, p. 52).
O Estado, a ordem política, é o elemento subordinado, ao passo que a sociedade civil, o reino
das relações económicas, é o elemento decisivo (Idem, p. 53).
Em Hegel, a sociedade civil abrange todo o conjunto das relações materiais dos indivíduos,
no interior de uma fase determinada de desenvolvimento das forças produtivas. Abrange toda
a vida comercial e industrial de uma dada fase de desenvolvimento e, neste sentido,
transcende o Estado e a nação, ainda que, por outro lado, tenha novamente de se afirmar
perante o exterior como nacionalidade e de se organizar perante o interior como Estado
(Idem, p. 54).
2.2 Sociedade Civil em Marx
Para o esclarecimento da negatividade de política e Estado no pensamento de Marx, é preciso
compreender alguns conceitos básicos a respeito da teoria marxiana, entre alguns de suma
importância estão à estrutura e superestrutura.
“Na produção social da sua vida, os homens contraem determinadas relações necessárias e
independentes da sua vontade, relações de produção que correspondem a uma determinada
fase de desenvolvimento das suas forças produtivas materiais. O conjunto dessas relações de
produção forma a estrutura econômica da sociedade, a base real sobre a qual se levanta a
superestrutura jurídica e política e à qual correspondem determinadas formas de consciência
social. O modo de produção da vida material condiciona o processo da vida social, política e
espiritual em geral”. (MARX, 1859: Prefácio à Contribuição à Crítica da Economia Política
citado por Bobbio, 2002).
Por exemplo, na idade média a sociedade civil é, para Gramsci, a igreja, entendida enquanto
“aparelho de hegemonia do grupo dirigente, que não tinha um aparelho próprio, isto é, não
tinha uma organização cultural e intelectual própria, mas sentia como tal a organização
eclesiástica universal.
A sociedade civil, para Gramsci, compreende, não “todo o conjunto das relações materiais”,
mas sim, todo o conjunto das relações ideológico-culturais; não mais “toda a vida comercial e
industrial”, mas toda a vida espiritual e intelectual. Portanto, Gramsci vê a sociedade civil
“no sentido de hegemonia política e cultural de um grupo social sobre toda a sociedade, como
conteúdo ético do Estado.
O conceito de sociedade civil de Gramsci deriva não de Marx, mas sim de Hegel, tanto que,
se pode perceber que o conceito hegeliano de sociedade civil, tal como Gramsci o concebe, é
um conceito superestrutural.
Portanto, o que relaciona o conceito de sociedade civil de Gramsci com o de Hegel, não é o
sistema das necessidades (de onde partiu Marx), ou seja, as relações económicas, mas sim as
instituições que as regulamentam, das quais Hegel diz que, tal como a família, constituem “a
raiz ética do Estado, que se aprofunda na sociedade civil”, ou, em outro ponto, “a base estável
do Estado”, “as pedras fundamentais da liberdade pública”. Em suma: a sociedade civil que
Gramsci tem em mente, quando se refere a Hegel, não é a do momento inicial no qual
explodem as contradições que o Estado terá de dominar, mas a do momento final em que, por
meio da organização e da regulamentação dos diversos interesses (as corporações), são
fixadas as bases para a passagem ao Estado (Bobbio, 2002, p. 58).
Hegel desenvolveu a ideia de que a sociedade civil é uma instância desorganizada porque
nela predominam interesses particularistas, mas é também, contraditoriamente, um momento
de articulação e transição para o “Estado ético-político”, no qual se realizaria a identidade
entre a vida civil e a vida política (Soares, 2000, p. 92).
A partir das grandes transformações económicas, sociais, políticas e culturais da segunda
metade do século XIX, a caótica e disforme sociedade civil, conhecida por Marx, vai
ganhando uma nova configuração. Isso ocorre quando as classes subalternas se vão
organizando e assumindo, na sociedade civil, posições de força que antes estavam reservadas
somente à “sociedade política”. Nesse novo contexto histórico, em que a sociedade civil
começa a “transitar” do económico para o político, o exercício do poder, por parte dos grupos
dominantes, não pode mais se efectivar sem o consenso dos governados. Esboça-se, assim,
uma nova característica do Estado que Gramsci conheceu e procurou apreender teoricamente
(Soares, 2000, p. 93).
É a de elevar a grande massa da população a um determinado nível cultural e moral, nível (ou
tipo) que corresponde às necessidades de desenvolvimento das forças produtivas e, portanto,
ao interesses das classes dominantes”.
O autor distingue duas instâncias educativas do Estado, uma com função positiva, a escola, e
outra com função negativa, os tribunais, mas enfatiza que, para o processo educativo estatal,
“predominam uma multiplicidade de outras iniciativas e actividades chamadas privadas, que
formam o aparelho da hegemonia política e cultural das classes dominantes”.
Deste modo, o momento “ético” do Estado refere-se ao “aparelho de hegemonia política e
cultural” de um grupo social e é formado pelas numerosas “sociedades particulares” que
constituem a sociedade civil. Em tais sociedades particulares
Mostrando as contradições da sociedade civil, Gramsci esclarece que esta se organiza tanto
como forma de resistir à repressão do grupo dominante – constituindo-se como o lugar da
associação dos interesses contrários à orientação governamental – quanto como espaço onde
os grupos dominantes buscam vencer a resistência dos outros grupos sociais, convencendo-
os, persuadindo-os (Soares, 2000, p. 93).
O esforço de Gramsci consiste, pois, em mostrar que o estado moderno se amplia quando se
organiza uma esfera nova do exercício do poder, a sociedade civil, cuja especificidade, está
calcada na “religião” e não nas “armas”, no consenso e não na força, na hegemonia e não na
ditadura.
Contudo, a classe burguesa não tem um projecto social universalizante, pois isso implicaria a
sua eliminação como classe porque, hipoteticamente seriam suprimidas as diferenças entre
“burguês” e “não-burguês” e, assim as diferenças de classe. Ao contrário, ela quer que os
seus interesses privados e a sua dominação se perpetuem, mantendo para isso os elementos
repressivos de governo. A burguesia não propõe a auto-regulação porque o convívio social no
tipo de sociedade por ela organizado não é pacífico e sim calcado em relações de produção
que escravizam o homem pelo homem. Dai a conservação do Estado como força, coerção,
ditadura.
Nessa nova situação histórica, a estratégia revolucionária, diz Gramsci é a da “hegemonia
civil”.
É dentro dessa linha de raciocínio que Gramsci discute a organização da escola, pois a
considera uma das mais importantes instituições que movimentam o conteúdo ético estatal,
isto é, as ideologias que circulam na sociedade civil seja com a finalidade de legitimar o
grupo dominante tradicional ou de lutar contra ele para fundar uma nova sociedade. Nessa
última direcção, o autor apresenta como proposta a “escola unitária”.
Paul Monroe (1970 citado por Soares, 2000, p. 193), considera que quando um grupo social
se torna consciente de seus objectivos e dos meios através dos quais pode alcança-los, atinge
sua “forma suprema” de selecção social”. Ao tronar-se dominante, um grupo social passa a
definir os métodos por meio dos quais será formado o carácter dos membros que constituem
esse grupo mediante o que autor chama de “um procedimento auto-consciente”.
Por que poderíamos designar a educação pública como modalidade “positiva” de selecção
social? Para responder a esta questão, Monroe contrapõe as duas formas de selecção social, a
legislação e a escola pública, e indica dois pontos importantes. Em primeiro lugar, o facto de
que ambas se propõem a fins idênticos:
Formar as pessoas para viverem numa sociedade em que uma dessas partes tem
clareza daquilo que quer e dos meios para consegui-lo, enquanto as outras se devem
amoldar aos objectivos da primeira. Essa formação requer, portanto, um conformismo,
isto é, todos os indivíduos devem aceitar a direcção que é dada pelo grupo social
dominante.
Bibliografia
Bobbio, N. (2002). Ensaios sobre Gramsci e o conceito de sociedade civil. 2ª Edição. Brasil:
Paz e Terra.
Palos, C. M. C. (s/d). A actualidade do pensamento de Gramsci na construção de um projecto
de sociedade sustentável. Disponível em: http://www.aps.pt/cms/doc. Acessado a 28 de
Outubro de 2013.
Soares, R. D. (2000). Gramsci, o Estado e a Escola. Brasil: Editora Unijui.