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isbn: 978-989-702-296-8
depósito legal: 428072/17
1.ª edição: Julho de 2017
LEONOR FIGUEIREDO
Prefácio . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11
Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 21
I PARTE
A «bolha» . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25
Os Comités Amílcar Cabral . . . . . . . . . . . . . . . . 29
Pequena burguesia «fraca» . . . . . . . . . . . . . . . . 35
Dúvidas iniciais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 38
Massacres . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 44
Em nome do MPLA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 48
Encontro com Agostinho Neto . . . . . . . . . . . . . . 54
A importância da cor da pele . . . . . . . . . . . . . . 60
Lúcio Lara e a juventude . . . . . . . . . . . . . . . . . 63
Pepetela entre os CAC . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 69
Neto exige nomes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 73
Kifangondo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 85
O alvo Wanga . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 88
Depois da batalha . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 92
Primeiras prisões . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 97
A Organização Comunista de Angola . . . . . . . . . . 109
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O Fim da Extrema-Esquerda em Angola · Leonor Figueiredo
II PARTE
No 27 de Maio . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 153
Maria . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .167
A casa da malta . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 172
Noite de «facas longas» . . . . . . . . . . . . . . . . . .184
Torturas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 189
Cadeias abarrotadas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 195
Armas e traidores . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .199
Primeira greve de fome . . . . . . . . . . . . . . . . . 202
Alegria e medo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 208
Novas greves . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 211
Braço de ferro . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .217
Depois da clausura . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 224
O que fica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 230
Siglas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 233
Documentos e anexos . . . . . . . . . . . . . . . . . . 237
Bibliografia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 259
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Prefácio
L
eonor Figueiredo já nos tinha brindado com uma muito
esperada e belíssima biografia de Sita Valles, uma das figu-
ras-chave para o entendimento do mais trágico momento
das lutas políticas internas do MPLA desde sempre – o 27 de Maio
de 1977. Desta vez, oferece-nos um texto não menos importante,
embora menos trágico, sobre as lutas políticas que caracterizaram
o pós-25 de Abril de 1974, em Angola. Uma fase em que os movi-
mentos de libertação anticoloniais, saídos das respectivas áreas de
guerrilha, iriam começar uma nova fase de luta, transpondo para
o mundo urbano os seus combates fratricidas, iniciados em plena
luta armada anticolonial.
Verdade seja recordada: a luta armada anticolonial em
Angola estava globalmente num beco sem saída no momento em
que se dá a queda do regime salazarista, e nenhum dos três movi-
mentos de libertação (FNLA, MPLA e UNITA) podia reclamar para
si qualquer hegemonia político-militar, para lá de discursos propa-
gandísticos. No caso do MPLA, o 25 de Abril encontrara-o no meio
de mais uma crise interna. Pior do que as precedentes, esta última
arrastava-se há anos, reduzindo a actividade militar do movimento
a um estado quase nulo em muitas frentes de combate.
É, portanto, um MPLA ainda muito enfraquecido que entra
nas cidades após ter assinado acordos de cessação de hostilidades
com representantes das novas autoridades portuguesas na colónia.
À sua chegada aos centros urbanos, e mais precisamente a Luanda,
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O Fim da Extrema-Esquerda em Angola · Leonor Figueiredo
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prefácio
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prefácio
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O FIM DA
EXTREMA-
-ESQUERDA
EM ANGOLA
«À noite, o preso é chamado para interrogatório […]. O carcereiro,
acompanhado do agente, abre a porta com estrondo e chama o
preso em altos berros […]. Pelo caminho […] faz comentários à
sessão que se seguirá, «lá dentro está doce… agora é que vais
ficar doce…» Ao entrar na sala de interrogatórios o preso é rece‑
bido a pontapés, murros, empurrões e insultos, ao mesmo tempo
que é instado, em altos berros, a responder a perguntas sobre
vários assuntos ao mesmo tempo. Depois de cair e de se levantar
várias vezes, é encostado à parede. Um agente dá estaladas nos
ouvidos, outro interroga, um terceiro chama mentiroso e com
grande ferocidade dá uma chuva de murros e pontapés. Tenta‑se
que o preso não pense, mas que fale. […] Enfiam‑se os cigarros
acesos pelo nariz. O chicote é um cabo eléctrico de 1 cm de diâme‑
tro, com a ponta descarnada […]. Geralmente, bate‑se até cansar.
Recorre‑se a outras torturas bárbaras e sádicas. […] O preso
acaba por desmaiar, sendo acordado com um balde de água. A ses‑
são continua indefinidamente. […] Os presos que ficavam nas
celas adjacentes à sala de interrogatórios passam a noite acorda‑
dos, já se vê. O mesmo preso é torturado durante dias e depois
colocado numa cela onde se encontram outros dois ou três tortu‑
rados […]. Na sequência deste tratamento, indivíduos tiveram
[…] fracturas de ossos e de dentes; problemas psíquicos graves;
membros paralisados durante meses; problemas nos órgãos geni‑
tais; feridas e queimaduras.»
19
Introdução
A
ngola viveu um período intenso de democracia no pós‑25
de Abril de 1974, que durou cerca de ano e meio, até perto
da independência, a 11 de Novembro de 1975. Desde então,
essa liberdade nunca mais existiu. Até hoje. Naquela época, os
jovens de esquerda, estudantes e outros, tiveram um papel fulcral.
Ao longo destas páginas, contamos a história de um desses grupos,
os Comités Amílcar Cabral (CAC), criados por estudantes da Uni-
versidade de Luanda que em nome do MPLA foram ocupar o
espaço deixado vazio pela ditadura.
Quando os dirigentes do MPLA chegaram a Luanda, meio ano
depois da revolução em Portugal, os CAC tinham lançado o Poder
Popular, uma das suas âncoras, com uma invejável facilidade de
mobilização de massas. Agregavam jovens de várias raças, grupos
sociais e raízes culturais distintos, que se tinham encontrado no
movimento estudantil e nos bairros negros circundantes, após os
massacres perpetrados por brancos racistas.
Com o embate ideológico ocorreram as primeiras prisões polí-
ticas, antes de Agostinho Neto anunciar unilateralmente a inde-
pendência. Os CAC desapareceram e nasceu a sucessora, a
Organização Comunista de Angola (OCA). Apesar da repressão
impiedosa, estes jovens da esquerda radical continuaram na clan-
destinidade, até serem vencidos por vagas de prisões. Com idades
entre os 16 e os 20 e poucos anos, enfrentaram com propaganda a
estrutura político‑militar do MPLA. Corajosos, ingénuos e, por
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O Fim da Extrema-Esquerda em Angola · Leonor Figueiredo
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