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SERGIPE OITOCENTISTA NOS ESTUDOS DE HISTÓRIA DA

HISTORIOGRAFIA

Samuel Barros de Medeiros Albuquerque (UFS)

Resumo:
A década de 1970 assistiu ao nascimento dos primeiros estudos de História da Historiografia
Sergipana, textos pioneiros da lavra de José Silvério Leite Fontes (1972), Vladimir Souza
Carvalho (1973) e José Calasans Brandão da Silva (1973). A partir de fins da década de 1990,
a trajetória dos fazeres historiográficos voltou a interessar os intelectuais de Sergipe d’El Rey,
notadamente Itamar Freitas (2002 e 2007), Jorge Carvalho do Nascimento (2003) e Antonio
Fernando de Araújo Sá (2013). A atenta revisão desses estudos nos permite acompanhar, para
além da recepção crítica, a trajetória da historiografia sobre Sergipe Oitocentista, principiada
com a publicação da Historia de Sergipe, do médico Felisbello Firmo de Oliveira Freire, em
1891. Nesse sentido, este trabalho tenciona contribuir com estudos dedicados às
historiografias sobre o Brasil do século XIX, perscrutando obras pioneiras sobre a História da
Historiografia Sergipana.
Palavras-chave: História; Historiografia; Sergipe; Século XIX.

Abstract:
The 1970s watched the birth of the first studies of the History of Sergipe Historiography:
pioneer texts written by José Silvério Leite Fontes (1972), Vladimir Souza Carvalho (1973)
and José Calasans Brandão da Silva (1973). During the late 1990s, the trajectory of
historiographical interest were back on the intellectuals minds of Sergipe d'El Rey, notably
Itamar Freitas (2002 and 2007), Jorge Carvalho do Nascimento (2003) and Antonio Fernando
de Araújo Sá (2013). A careful review of these studies allows us to follow, beyond the critical
reception, the trajectory of the nineteenth-century historiography of Sergipe, which has started
with the publication of the History of Sergipe, by the physician Felisbello Firmo Freire de
Oliveira, in 1891. In this sense, this paper intends to contribute to studies devoted to the
historiography of the nineteenth-century in Brazil.
Key Words: History; Historiography; Sergipe; 19th century
Campinas, São Paulo, julho de 1972. Entre os dias 9 e 15, a UNICAMP abrigou o III
Encontro de Professores de Introdução aos Estudos Históricos, evento que reuniu
profissionais do ensino superior de História de todo o país.

José Silvério Leite Fontes (1925-2005), professor de Introdução aos Estudos Históricos
do Departamento de História e Filosofia, representou a Universidade Federal de Sergipe –
UFS no encontro e apresentou o projeto Levantamento das fontes primárias da história de
Sergipe, cuja execução capitaneava em seu pequeno estado.

Mas qual seria a relação entre aquela comunicação de julho de 1972 e a História da
Historiografia Sergipana? Ocorre que o seu texto-base, publicado meses depois no Cadernos
UFS, possui um brevíssimo (porém pioneiro) estudo sobre a trajetória dos fazeres
historiográficos em Sergipe. Trata-se de uma espécie de introdução ao projeto divulgado,
dando conta do estado da arte no campo da História de Sergipe.A natureza do trabalho
justifica, inclusive, a sumaríssima análise que dele resulta. Aliás, o próprio Silvério Fontes
registrou que o tema mereceria “estudos mais acurados”, considerando que sua atenção se
voltou, apenas, para “alguns pontos relevantes” (FONTES, 1972, p. 4).

Da reflexão do professor de Introdução aos Estudos Históricos, a primeira observação


digna de nota é, sem dúvida, a definição de Historiografia Sergipana. Para ele, essa vertente
do conhecimento histórico era “obra dos filhos da Província e versando sobre sua terra natal”
(FONTES, 1972, p. 4). Certamente, o autor se referia aos “filhos” naturais ou adotivos de
Sergipe, considerando que incluiu em sua análise “homens de estudos” nascidos em outras
paragens, mas que viveram e estudaram o passado sergipano.

Mesmo assinalando a “preocupação historiográfica” do comendador Antonio José da


Silva Travassos, em seus Apontamentos historicos e topographicos sobre a Provincia de
Sergipe(1860), Silvério considerou Felisbello Freire, autor de Historia de Sergipe (1891) e
Historia territorial do Brazil (1906), o fundador da Historiografia Sergipana propriamente
dita.Felisbello seria a “estrela de primeira grandeza” da constelação de intelectuais que, “[n]o
último quartel do século XIX e [n]o primeiro do século XX”, integraram o “surto
historiográfico” consagrado a Sergipe (FONTES, 1972, p. 4).

O referido “surto” não era, segundo seu intérprete, fruto de “desenvolvimento


autógeno” e sim de “influências culturais estrangeiras, recebidas pelos estudantes sergipanos
que frequentam os meios universitários de Recife, Bahia e Rio de Janeiro, ou transmitidas por
eles aos radicados em Sergipe” (FONTES, 1972, p. 4).

Levados por um impulso anacrônico, a interpretação de Silvério nos faz lembrar o


conceito de “circularidade entre as culturas”, difundido no Brasil através, sobretudo, dos
trabalhos do historiador italiano Carlo Ginzburg, a partir de fins de década de 1980. Contudo,
dois estudos recentes nos ajudam a compreender o contexto no qual a proliferação de estudos
sobre o passado sergipano teria ocorrido. O primeiro é a dissertação de mestrado de Eugênia
Andrade Vieira da Silva, que investiga os caminhos e descaminhos das elites sergipanas do
século XIX em busca de instrução (trabalho referenciado ao final deste artigo). O segundo é a
monografia de Cristiane Vitório de Souza, que estuda a constituição do campo intelectual
sergipano nos primórdios da República (trabalho também referenciado ao final deste artigo).
A leitura desses estudos nos faz compreender, dentre outras coisas, o papel desempenhado
pelas antigas faculdades de Direito e Medicina do Segundo Império/Primeira República nos
diferentes processos de recepção e circulação de ideias produzidas, sobretudo, na velha
Europa.

Orientando sua análise, Silvério Fontes propôs uma periodização tripartite para a
Historiografia Sergipana. A primeira fase iria de princípios da década de 1890 a fins da
década de 1920, a segunda de fins da década de 1920 a fins da década de 1950 e a terceira
teria se iniciado em princípios da década de 1960.

Marcada pelo que Fontes denominou de “surto historiográfico”, a primeira fase da


Historiografia Sergipana contou com a singular contribuição de Felisbello Freire e com a
criação do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe.Referindo-se à Historia de Sergipe de
Felisbello Freire, Silvério afirma: “[obra] até hoje não superada como trabalho amplo, embora
escrita de acordo com a filosofia liberal da época” (FONTES, 1972, p. 5). Essa é, sem dúvida,
uma tese válida para o momento de sua defesa. Mas, felizmente, ela expirou à medida que a
Historiografia Sergipana, ainda na década de 1970, passou a receber significativas
contribuições de autores como Ibarê Dantas e Maria Thetis Nunes. Sobre essa questão,
consideramos que a contribuição de Felisbello foi superada, no que diz respeito à História da
Província de Sergipe, pela de Ibarê Dantas, que, em 2009, publicou a biografia Leandro
Ribeiro de Siqueira Maciel, estudando com afinco a política e a sociedade sergipana
oitocentista.
No mais, temos dúvidas quanto ao fato de Silvério Fontes ter lido o segundo livro de
Felisbello Freire, pois soa estranho o fato de o criterioso professor de Introdução aos Estudos
Históricos não ter indicado a superioridade da Historia territorial do Brazil (1906) em relação
à Historia de Sergipe (1891). O capítulo dedicado a Sergipe no livro de 1906 revela um autor
maduro e que, exercitando seu poder de síntese, retoma com mais rigor e precisão a história
de sua terra natal.

Sobre a fundação do IHGSE na década de 1910, Silvério registrou: “É então fundado o


Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe, a 6 de agosto de 1912, que publicará durante
vários anos revista com valiosas contribuições aos estudos históricos locais” (FONTES, 1972,
p. 5). Sobre esse fato, sabemos que o Instituto passou a representar uma espécie de “armadura
defensora da História”, fomentando a produção e a circulação do conhecimento histórico
local. Desde 1912, gerações e gerações de intelectuais abrigaram-se na Casa de Sergipe,
encontrando morada acolhedora para estudos, pesquisas, debates e divulgação da História.

Na hierarquia de Silvério, os autores de maior relevância na primeira fase da


Historiografia Sergipana seriam, respectivamente: Felisbello Freire, com sua Historia de
Sergipe(1891); Ivo do Prado, autor de A Capitania de Sergipe e suas Ouvidorias (1919);
Carvalho Lima Júnior, autor da História dos limites entre Sergipe e Bahia (1918) ; e Oliveira
Telles, autor de Limites de Sergipe (1919). Os três últimos autores teriam se destacado
enquanto devotados estudiosos do “histórico da questão de limites com a Bahia” (FONTES,
1972, p. 5).

Outros autores foram relacionados por Silvério, que, sutilmente, teceu suas críticas ao
legado intelectual de parte deles. Sobre as corografias de Laudelino Freire e L. C. Silva
Lisboa, por exemplo, destaca o valor documental e não historiográfico dessas obras (ambas
referenciadas ao final deste artigo). Crítica similar fez aos autores que “relataram o
movimento republicano e a implantação da República, no Estado”, referindo-se aos trabalhos
de Balthazar Góes, autor de A Republica em Sergipe (1891); Manuel Curvelo de Mendonça,
autor de Sergipe republicano (1896); e F. Nobre de Lacerda, autor de A decada republicana
em Sergipe (1906).

Manoel Armindo Cordeiro Guaraná, autor do monumental Dicionário bio-


bibliográphico sergipano (1925), Liberato Bittencourt, autor dos dicionários Brasileiros
illustres (vol. 1, 1913) e Homens do Brasil (vol. 1, 1917), além do padre Antonio Carmelo,
autor de Olympio Campos perante a Historia (1910), estariam entre os intelectuais que
trataram de “exaltar” os “sergipanos ilustres” (Fontes, 1972, p. 5). Nesse sentido, o analista
parece depreciar a narrativa de apologia aos “grandes homens” que caracterizou os trabalhos
de Guaraná, Bittencourt e Carmelo. Poupados à crítica, aparecem os autores com “interesse
pela história literária e artística”, destacadamente Prado Sampaio, autor de A Litteratura
Sergipana (1908) e Sergipe artistico, litterario e scientifico (1928).

Vencido o “surto historiográfico” que, segundo Silvério Fontes, teria caracterizado a


primeira fase a Historiografia Sergipana, seguem-se períodos fastidiosos.

Segundo o analista de princípios da década de 1970, a segunda fase da Historiografia


Sergipana teve início em fins da década de 1920 e prolongou-se até fins da década de 1950.
Silvério construiu uma representação soturna do referido período, caracterizado, em oposição
à primeira, como uma fase de “decadência”, “arrefecimento” e “descrença” no poder criativo
dos estudiosos do passado local.

Entre os autores que, nas trevas da segunda fase da Historiografia Sergipana, não
deixaram desaparecer a chama do templo de Clio, estariam: Sebrão sobrinho, com suas
Laudas da História do Aracaju (1955); Epifânio da Fonseca Dórea, com dezenas de
trabalhos, sobretudo pequenas biografias e necrológios, publicados na Revista do IHGSE
entre as décadas de 1910 e 1960; Philadelpho Jonathas de Oliveira, autor de Historia de
Laranjeiras Catholica (1935) e de Registo de fatos históricos de Laranjeiras (1942); João
Dantas Martins dos Reis, que publicou trabalhos na Revista do IHGSE a partir de princípios
da década de 1940, tratando, principalmente, da história do poder judiciário em Sergipe; Felte
Bezerra, autor de Etnias sergipanas (1950) e de Investigações Histórico-Geográficas de
Sergipe (1952); e José Calasans, autor de Aracaju: contribuição à História da capital de
Sergipe (1942) e de Temas da Provincia (1944), além de outros estudos publicados na Revista
do IHGSE desde princípios da década de 1940.

Contundente em sua crítica, Silvério registrou que no referido grupo “predominam os


analistas de arquivos e de fatos isolados”, depreciando, assim, os estudiosos do passado mais
preocupados com a heurística que com hermenêutica (mais com “preciosos” documentos e
menos com a teoria/metodologia da História). Particularmente, acreditamos que Felte Bezerra
e José Calasans seriam as exceções ao perfil daquele grupo.
Sobre José Calasans, aliás, o autor afirmou: “grande conhecedor das fontes históricas de
Sergipe, ainda não produziu a obra de síntese que se espera dele” (Fontes, 1972, p. 5). Ao que
parece, Calasans jamais chegou a atender às expectativas de Silvério, que o representou como
um exemplo bem acabado de promessa não cumprida. Ainda assim, é preciso assinalar que a
contribuição de Calasans à História da Historiografia Sergipana superaria a contribuição do
seu crítico. Referimo-nos à clássica Introdução ao estudo da Historiografia Sergipana,
surgida em 1973 e publicada, somente, em 1992, no livro Aracaju e outros temas sergipanos.

As considerações de Silvério sobre a segunda fase da nossa Historiografia se encerram


com breves referências a autores de “estudos esparsos”, publicados a partir de meados da
década de 1940 – Bonifácio Fortes, Fernando Porto, Austrogésilo Santana Pôrto, Joel e Junot
Silveira.

A terceira e última fase da Historiografia Sergipana remeteria à década de 1960 e a um


contexto de lenta “retomada” e “transformação”, marcado pela criação da Universidade
Federal de Sergipe.

Para Silvério, no início da terceira fase a História estava “divorciada da perspectiva


local”. Mesmo na Faculdade Católica de Filosofia e, depois, na UFS o ensino de História “era
desenraizado, puramente livresco e sem oportunidades de incentivo à pesquisa, devido à
pobreza bibliográfica das livrarias, ao patrimônio sem renovação da Biblioteca Pública, e a
falta de utilização do acervo do Instituto Histórico e Geográfico” (Fontes, 1972, p. 6).
Contudo, transformações ocorridas no campo intelectual teriam incentivado o que ele chamou
de “recuperação” da Historiografia Sergipana, pois

A criação da Universidade (...) permitiu aos professores dedicarem


mais tempo ao estudo e ao ensino. A organização departamental
estabeleceu maior contacto e cooperação entre eles. Além disso, à
margem do processo didático universitário, começam a aparecer
espíritos da nova geração com outro modo de visualizar a História
(FONTES, 1972, p. 6).
Acrísio Tôrres Araújo, autor da Pequena História de Sergipe (1966) e de Aracaju,
minha capital (1967), e J. Pires Wynne, autor de História de Sergipe, 1575-1930 (vol. 1,
1970), foram destacados entre os autores de sínteses desprovidas de novidades, em termos “de
investigação e de interpretação”. Por sua vez, Jackson da Silva Lima, autor da História da
Literatura Sergipana (vol. 1, 1971), foi referenciado como um promissor estudioso das
práticas culturais do nosso passado.
A crítica feita por Silvério aos trabalhos de Acrísio Tôrres convergia para o
posicionamento de sua colega Maria Thetis Nunes, que, através da imprensa sergipana,
travaria uma longa polêmica com o estudioso cearense em 1973, enfatizando as
impropriedades constantes nos livros didáticos citados acima. Aliás, a querela intelectual que
envolveu Acrísio e Thetis já foi perscrutada por autores como Itamar Freitas, em sua
Historiografia Sergipana (2007), e Ibarê Dantas, na celebrativa História da Casa de Sergipe
(2012).

Finda a leitura das reflexões de Silvério Fontes, é possível flagrar algumas ausências na
“galeria de historiadores” da qual ele foi curador. Não sabemos ao certo o que o levou a
ignorar as contribuições, por exemplo, de Elias Montalvão, autor de Meu Sergipe (1916), e
Clodomir Silva, autor do Album de Sergipe (1920) e de Minha gente (1962). No mais, o texto
parece ter sido escrito para leitores familiarizados com a produção historiográfica sergipana,
posto que o seu autor não teve a preocupação de relacionar os trabalhos da maior parte
intelectuais citados.

É preciso registrar que o legado intelectual de Silvério Fontes conta com pelo menos
dois outros estudos circunscritos no campo da História da Historiografia e que merecem uma
análise detida. São eles: Quatro diretrizes da Historiografia Brasileira Contemporânea
(1975) e Marxismos na Historiografia Brasileira Contemporânea (2000). Quanto aos estudos
de História da Historiografia Sergipana, sabemos que foram cultivados por outros intelectuais
da década de 1970, notadamente pelo jovem itabaianense Vladimir Souza Carvalho e pelo
festejado professor José Calasans Brandão da Silva.

O magistrado e intelectual itabaianense Vladimir Souza Carvalho (1950...) está entre os


pioneiros nos estudos de História da Historiografia Sergipana. Sua contribuição ao referido
campo de estudos e pesquisas se deu ainda na juventude, quando da publicação do livro
Santas Almas de Itabaiana Grande (1972). Na época, ele contava pouco mais de vinte anos e,
como bem assinalou o prefaciador José Augusto Garcez, seguia conservando viva a tradição
dos Carvalho de Itabaiana, “historiadores do quilate de Francisco Antônio de Carvalho Lima
Júnior e José Sebrão de Carvalho Sobrinho”.

Após mencionar importantes testemunhos setecentistas e oitocentistas sobre Sergipe,


alguns, inclusive, com “feição de História”, Vladimir concluiu que “a maior experiência no
ramo” remetia ao legado intelectual de Felisbello Freire. Nesse sentido, a análise do jovem
historiador converge com a do experiente professor José Silvério Leite Fontes, que
perscrutamos anteriormente. A novidade, contudo, está no olhar preciso que Vladimir lançou
sobre os dois livros de Felisbello, destacando o valor do capítulo dedicado a Sergipe na
Historia territorial do Brazil (1906). Para o analista, os livros de Felisbello seriam “os dois
maiores monumentos” da Historiografia Sergipana, “a ponto de, depois deles, não aparecer
nenhum outro de destaque e mérito equivalentes” (CARVALHO, 1973, p. 12).

Algumas das ausências notadas na análise de Silvério Fontes não foram ignoradas por
Vladimir Carvalho. O álbum de Clodomir Silva, por exemplo, ocupada lugar de destaque em
seu estudo sobre os fazeres historiográficos em Sergipe. Segundo Vladimir, com o Album de
Sergipe (1920), Clodomir havia dado “excelente contribuição”, com significativos avanços
heurísticos, “que fazem de seu trabalho um livro sério e paciente”, e com a divulgação de uma
farta documentação fotográfica referente à capital e aos municípios sergipanos de princípios
do século XX.

Assinalemos que existem mais encontros que desencontros entre as análises de Vladimir
e Silvério. A avaliação que fazem, por exemplo, da contribuição de Acrísio Tôrres de Araújo
e J. Pires Wynne são convergentes. Mesmo notando certa superioridade de Pires Wynne em
relação a Acrísio Tôrres, Vladimir concluiu que “tanto um como o outro seguem de perto as
pegadas de Felisbelo Freire, perdendo-se a partir do instante histórico (1855) em que o
historiador itaporanguense encerra seu [primeiro] trabalho” (CARVALHO, 1973, p. 12). O
veredito é, a nosso ver, justo e preciso: “nada de novo trouxeram”.

A análise de Vladimir possui conclusões dignas de nota. Esse é o caso da avaliação que
fez da tinta gasta com a questão dos limites entre Sergipe e Bahia. Plenamente de acordo,
transcrevemos sua conclusão:

Tivessem os historiadores sergipanos se dedicado à história de Sergipe


como se entregaram, em certa época, à questão dos limites de Sergipe
e Bahia, estaríamos hoje em situação diferente. A polêmica dos limites
foi o tema que mais suscitou pesquisas, e quem quer que soubesse ou
não um pouquinho de História, entrou na liça com um trabalho
publicado, embora por vezes irrisórios (CARVALHO, 1973, p. 13).
Outro mérito da análise de Vladimir é a atenção dada aos estudos sobre os municípios
sergipanos, lugares que “vêm sendo palco de acontecimentos importantes nos destinos da
província desde os primeiros passos dados pelo elemento branco entre nós” (CARVALHO,
1973, p. 13). Autores e trabalhos que trataram de Aracaju, Simão Dias, Laranjeiras, São
Cristóvão, Santo Amaro, Maruim, Propriá, Campo do Brito, Carira, Frei Paulo, Riachão do
Dantas, Tobias Barreto, Santa Luzia, Capela e, evidentemente, Itabaiana foram brevemente
analisados.

Interessante é, também, a avaliação que fez o autor do perfil dos trabalhos dedicados à
história dos municípios, evidenciando o caráter mais memorialístico que historiográfico dos
mesmos. Vejamos:

[Material que] em linhas gerais não pode ser desprezado nem


tampouco louvado. Precário, subjetivo, isolado, restrito e familiar de
um lado, é por outro lado o primeiro caminho a ser percorrido pelos
que tomam no peito a responsabilidade de traçar alguma linha sôbre a
história de qualquer município sergipano (CARVALHO, 1973, p. 15).
O cotejo das análises de José Silvério Leite Fontes e Vladimir Souza Carvalho (somado
ao estudo das obras por eles arroladas) lava-nos a concluir que, até fins de 1972, os principais
“textos historiográficos” sobre Sergipe oitocentista eram: Historia de Sergipe (1891)
eHistoria territorial do Brazil (1906), de Felisbello Freire;Album de Sergipe (1920), de
Clodomir Silva; além de estudos sobre a capital de Sergipe, como Aracaju: contribuição à
História da capital de Sergipe (1942), de José Calasans; A cidade de Aracaju (1945), de
Fernando Porto; e Laudas da História do Aracaju (1955), de Sebrão sobrinho.

Ao que tudo indica, não houve uma interlocução direta entre as interpretações de
Silvério Fontes e Vladimir Carvalho acerca da História da Historiografia Sergipana, posto que
a segunda contribuição, publicada em 1973, teve sua redação final concluída em princípios de
1972 (conforme nota do autor), meses antes, portanto, da veiculação da primeira nos
Cadernos da UFS. Nesse sentido, o nome de dois bacharéis em Direito, José Silvério Leite
Fontes e Vladimir Souza Carvalho, refletem ações pioneiras nos estudos de História da
Historiografia Sergipana, campo que logo seria alargado por outro bacharel, José Calasans
Brandão da Silva, de cuja contribuição trataremos oportunamente.
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