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ISSN: 2179-8869
A
té o início dos anos 1930 os historiadores brasileiros vinham, em sua
grande maioria, sendo formados em outras áreas do conhecimento.
Os cursos universitários de Geografia e História só começaram a
serem criados naquela década no Brasil, com a fundação das primeiras
Faculdades de Filosofia, Ciências e Letras (ROIZ, 2012; FERREIRA, 2013).
Antes dos anos 1930 tínhamos mais “historiadores por vocação”, isto é,
“pessoas, [que] apesar de sua formação profissional ter sido feita em outra
área do conhecimento, dedicavam-se à história”, conforme definiria Raquel
Glezer (1976, p. 234). A organização de grupos de especialistas aptos a
exercerem o ofício de historiador no Brasil, tornou-se profícua, desse modo,
com a criação dos primeiros cursos de Geografia e História. E que
inicialmente estiveram estruturados com vistas a formar mais professores
para suprirem as necessidades do ensino “secundário”, em todos os estados
do país, do que em definir o perfil de um novo profissional, o “historiador”,
e que começaria, aliás, a ser analisada tal condição, apenas a partir dos anos
1940 e 1950 (GLEZER, 2011; ROIZ, 2012; FERREIRA, 2013).
Antes da década de 1930 a formação de profissionais em nível
superior no Brasil estava limitada às áreas de Medicina, Direito e Engenharia
(COELHO, 1999; MOTA, 2006). Foi com a Reforma do Ensino de 1931,
efetuada pelo então Ministro da Educação e Saúde Pública, Francisco
Campos (1891-1968), que houve as primeiras tentativas de formação de
pessoal qualificado para suprir as necessidades do ensino “primário” e
“secundário” no país. Ao mesmo tempo em que se começava a discutir o
aparecimento da figura do “filósofo”, do “cientista social”, do “geógrafo” e
do “historiador” profissional na sociedade, muito embora o processo de
profissionalização do ofício de historiador (bem como o de outras áreas,
criadas naquele período) no país não fosse concomitante ao da criação do(s)
(respectivos) curso(s).
A Universidade de São Paulo (USP), criada em 1934, esteve articulada
a um conjunto de iniciativas (de letrados vinculados ao movimento da
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e que viria a balizar suas pesquisas e suas docências? Em que medida essas
regras apareciam em suas obras e de que maneira foram usadas para mediar à
fundamentação do ofício de historiador, quando se dedicaram a tal questão
como professores universitários? Como aplicavam esses princípios ao
avaliarem outros trabalhos de pesquisa?
Neste artigo, pretendemos explorar essas questões, primeiro,
procurando sintetizar como cada um deles formulou as “regras do método
histórico”, entre os anos 1930 e 1940, e como elas davam subsídios para
fundamentarem a escrita de suas histórias. Em seguida, buscaremos analisar
como eles aplicavam esses princípios para avaliarem outros trabalhos. Para
alcançarmos esses objetivos estaremos utilizando tanto às correspondências
passivas e ativas de ambos, como os textos que elaboraram durante os anos
1930 e 1940. Além disso, também faremos uso dos relatórios da cadeira de
História da Civilização Brasileira do curso de Geografia e História da Faculdade
de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo (FFCL/USP),
da qual AEJ era então seu catedrático. Assim como dos relatórios e atas das
bancas de doutoramentos, livre-docência e/ou de cátedra, em que eles
participaram entre meados dos anos 1940 e 1950. Durante esse período
foram defendidas 21 teses de cátedra (entre 1939 e 1952), 12 de livre-
docência (entre 1940 e 1952) e 84 doutorados (entre 1942 e 1952), na
FFCL/USP, das quais AEJ participou de 2 livres-docências e 17
doutoramentos, e SBH de 2 teses de cátedra e 1 de livre-docência1.
Muito embora essas fontes sejam riquíssimas, deve-se alertar, de
imediato, que apenas sintetizavam as arguições dos avaliadores da banca e as
respostas proferidas pelos candidatos aos títulos (e/ou cargos) pretendidos.
Isso porque, além de serem o relato sucinto de um secretário que
acompanhava a seção, em muitos casos, certos detalhes não eram anotados,
outros eram omitidos. Há situações em que a própria documentação se
perdeu, ou foi extraviada no processo de arquivamento da instituição. Além
1 Esses dados foram levantados e podem ser coligidos nos Anuários da Faculdade de
Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo, relativos ao período de 1939-1949,
1950, 1951 e 1952.
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Essa é uma das poucas missivas que conseguimos ter acesso de AEJ,
escrita em abril de 1948, onde esboça de maneira cristalina o seu modo de
avaliar o aprendizado dos alunos. Não somente isso, ele nos indicava como
colocava em prática as “regras do método histórico” que foi desenvolvendo
desde os anos 1930, como catedrático da cadeira de História da Civilização
Brasileira no curso de Geografia e História da Faculdade de Filosofia, Ciências
e Letras da Universidade de São Paulo (FFCL/USP).3 E é tendo em vista
essas questões que devemos pensar a sua escrita da história, e o modo como
avaliava este tipo de produção.
Em sua escrita da história, ele tentava mostrar que primava pela
“verdade”, pela “objetividade” e pela “imparcialidade”, com vistas à
elaboração de um discurso científico, em cuja tarefa se detinha desde os anos
1920, quando começou a se dedicar com maior afinco ao ofício de
historiador. E não que o historiador, para ele, não pudesse tomar partido em
suas análises das sociedades do passado, em função das transformações
manifestadas em seu presente histórico, mas sim que a “imparcialidade” era
um dos caminhos para se alcançar a “objetividade”, dando um “caráter
científico” a “narrativa histórica” (ELLIS JR., 1936a, 1937, 1948, 1950).
Desse modo, tanto em suas obras históricas, quanto em seus
romances históricos, “objetividade” e “subjetividade” se mesclavam num
discurso que tomava partido nas questões relativas à história de São Paulo e
2 Carta de Alfredo Ellis Jr. a Malaman, de 16 de abril de 1948. Inventário: Alfredo Ellis Jr. Cartas
de 1 a 11. Caixa: 09; Envelope: 46. Pasta: 33. CAPH/USP.
3 Naquele momento, AEJ já era correspondente do Instituto Histórico e Geográfico
Brasileiro (IHGB), desde 1926, e sócio efetivo do Instituto Histórico e Geográfico de São
Paulo (IHGSP), além de ser membro da Academia Paulista de Letras (APL). Vinha
revisando sua produção histórica, tarefa que fazia desde os anos 1930, com relação a sua
produção dos anos 1920, e que se intensificaria a partir de 1938, quando ingressou no curso
de Geografia e História da FFCL/USP. Assim, ao lado de uma produção já significativa, que
era o resultado de uma reavaliação de suas concepções e interpretações do passado paulista,
ainda tinha lugar a produção de romances e de livros didáticos de História, da 3ª a 5ª série, e
de Geografia, da 1ª a 5ª série do ensino secundário, produzidos em meados dos anos 1930.
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do Brasil, como também pode ser facilmente aferido em: A nossa guerra
(1933) e em Confederação ou separação (1934a), ambas escritas em 1932, e cujo
conteúdo tinha mais um aspecto “panfletário”, do que uma análise histórica,
até em função dos próprios efeitos de 1932 – da tentativa de “Revolução
Constitucionalista” de São Paulo –, e, aos quais, o autor havia sentido
diretamente, por ter participado como soldado das frentes paulistas.
Não só nestas obras podemos visualizar essas questões, em Os
primeiros troncos paulistas e o cruzamento Euroamericano(de 1936), que foi a revisão
e a reescritura de Raça de gigantes (de 1926), como em O bandeirismo paulista e o
recuo do meridiano (1934b) – cuja segunda edição foi publicada em 1934, a
primeira era de 1924 – é possível perceber a mesma tentativa de construção
de um discurso histórico, com “caráter científico”, mediante o cruzamento
de análises “objetivas” e “subjetivas”, nas quais seu autor tentava demonstrar
a peculiaridade da miscigenação que se deu em São Paulo, em comparação
com a que ocorreu no resto do país. Saliente-se que durante o período em
que estava prestes a publicar esse texto, em 23 de novembro de 1923, AEJ
encaminha uma carta para Afonso de Taunay, onde lhe agradece seus
préstimos e seu apoio e lhe informa sobre o andamento da obra.4
Mesmo em seus romances: Pedras lascadas (de 1928), O tigre ruivo (de
1934), A madrugada paulista (do mesmo ano), e Jaraguá (de 1936), ao procurar
descrever a “epopeia bandeirante” (FERREIRA, 2002), AEJ tangencia entre
o “acontecido” e o “imaginado”, entre o “objetivo” e o “subjetivo”. De
modo que em sua obra ele procurou testar possibilidades, exercitando sua
escrita e suas hipóteses nos mais variados gêneros, para cotejar o modo mais
adequado de (tentar) contar a história paulista. E nesse exercício visava
cumprir, como os antepassados, a função de “novo bandeirante” nas terras
de São Paulo (ABUD, 1985, FERREIRA, 2002).
Nesse processo, o essencial para alcançar essas metas na escrita da
(sua) narrativa dos “fatos” e os “acontecimentos” pioneiros na história de
4 Carta de Alfredo Ellis Júnior a Afonso de Taunay, São Paulo, 23 de novembro de 1923. Arquivo
Permanente Museu Paulista/Fundo Museu Paulista (APMP/FMP), 1ª entrada, pasta 120.
Agradeço a gentileza de Karina Anhezini (da UNESP/Assis) por ter me cedido as missivas
trocadas entre AEJ e Afonso de Taunay.
142 UFES – Programa de Pós-Graduação em História
6 Quanto à leitura que AEJ fez da obra de Oliveira Vianna (1883-1951), iniciada depois que
concluiu o curso de Direito, em meados dos anos 1920, vendo-a de forma muito positiva até
meados dos anos 1930 (quando então passa a criticá-la mais acentuadamente, em função da
posição deste autor perante o Estado Novo varguista), tendo em vista suas fragilidades no
trato das fontes empíricas e em suas generalizações. Como indica Giselle Martins Venâncio
(2006, p. 87-108), na extensa biblioteca de Oliveira Vianna, que chegou a agrupar 4.161
exemplares de 3.949 títulos distintos, onde se destacavam obras de Ciências Sociais (com 35
%) e Jurídicas (com 21% do total), também apareceriam 451 títulos em História do Brasil e
Literatura de Viajantes, perfazendo 11,4% do total. Nessa categoria, se apresentariam obras
de Max Fleiuss, Felisberto Freire, Afonso Celso, José Maria Bello, Alfredo Ellis Jr., Pedro
Calmon, Caio Prado Jr. e Sérgio Buarque de Holanda. Nesse grupo, haveria maior
representatividade da obra de Alfredo Ellis Jr., com um total de 12 títulos, a maioria deles
enviados pelo próprio autor. O que, para ela, corresponderia a uma ampla relação de trocas,
correspondências e comentários recíprocos. Por outro lado, veremos igualmente no próximo
capítulo como AEJ tratou a obra de Gilberto Freyre (1900-1987) e de SBH.
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pai e o avô, para justificar, aliás, sua própria ação como um “novo
bandeirante” de seu tempo.7
Foi justamente com essas ideias em mente que AEJ começou a
ministrar suas aulas nas disciplinas que passou a oferecer, a partir de 1938, na
cadeira de História da Civilização Brasileira do curso de Geografia e História da
FFCL/USP. 8.= Mas, como indicaria John Monteiro (1994, p. 82):
7 E justamente por estar imerso nesse contexto cientificista de produção, que de forma
semelhante apareceria, em seus textos, a obra de Fustel de Coulanges, ao contrário da de
LeopoldvonRanke,em função da maneira com a qual o primeiro buscou analisar a cidade-
estado Greco-romana, e concebia a escrita da história, como o produto de um trabalho
“científico” efetuado pelo historiador, e que para AEJ foi fundamental, ao buscar escrever a
história de São Paulo, nos anos 1920 e 1930.
8 E que podem ser aferidas por meio do exame de seus relatórios para a cadeira contidos nos
Anuários.
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Mello Espanha
José Quirino A memória de Martim Francisco... 1943 História Alfredo Ellis
Ribeiro Jr.
Olga Pantaleão A penetração comercial da Inglaterra na 1944 História Jean Gajé
América ...
Maria C. V. de Santos e a geografia humana do litoral paulista 1944 Geografia Pierre
Carvalho Monbeig
Dorival Teixeira Evolução do sistema monetário brasileiro 1945 Economia Paul Hugon
Vieira
Pedro Moacyr Alguns aspectos da Germânia antiga... 1945 História Eurípides S.
Campos Paula
Eduardo d’O. O poder real em Portugal e as origens do 1945 História Eurípides S.
França absolutismo Paula
Carlos Drumond Da partícula bah.a do tupi-guarani 1946 Etnografia Plinio Ayrosa
João Dias da Estudo geográfico dos contrafortes ocidentais... 1946 Geografia Pierre
Silveira Monbeig
Renato da S. Paisagens culturais da Baixada Fluminense 1948 Geografia Pierre
Mendes Gourou
José Ribeiro de A. A baixada do rio Itanhaém 1950 Geografia Aroldo de
Filho Azevedo
Gilda de Mello e A moda no século XIX 1950 Sociologia Roger Bastide
Souza
José Aderaldo A introdução do romantismo no Brasil 1950 Literatura Mário de S.
Castello Lima
Mafalda Zamella O abastecimento da Capitania de Minas 1951 História Alfredo Ellis
Gerais... Jr.
Hélio S. Silva O comércio exterior do Brasil (1822-1918) 1951 Economia Paul Hugon
Fonte: Anuários da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da USP, 1939-1949, 1950, 1951, 1952.
Em SBH, esse processo foi muito mais sutil. Não há nele, como
vimos em AEJ, um conjunto sistemático de princípios que lhe serviam de
guia para direcionar suas pesquisas, aos quais seriam acrescentados “novos”,
ao longo de sua trajetória profissional. Há muito mais um movimento de
crítica e diálogo intenso com diversos autores, particularmente, alemães e
franceses, que lhe servia justamente para aprimorar procedimentos de
investigação e não para deduzir, a partir deles, um conjunto de “regras do
método” para serem seguidas (ROIZ, 2013).
Isso não quer dizer, evidentemente, que SBH deixasse de se
preocupar com os procedimentos teóricos e metodológicos em suas
pesquisas (GUSMÃO, 2012). Muito pelo contrário, chega a ser impactante
sua vontade de inquirir caminhos a serem seguidos na pesquisa, na escrita,
entre o processo de análise e interpretação das fontes, que se fazia por meio
de um amplo diálogo com outros autores, e que podia ser percebido em seus
artigos para a imprensa periódica, como em vários de seus livros
(HOLANDA, 1936, 1959, 1996, 1996b, 2004, 2011a, 2011b). Muito embora
tais apreciações fossem mais comuns em seus artigos de jornal, do que em
sua obra histórica dos anos 1940, as quais SBH estava muito mais
preocupado com a forma e a interpretação das fontes, do que na prescrição de
métodos e procedimentos. Ao observarmos as missivas que recebeu, vê-se
justamente a dificuldade de seus interlocutores em definirem o seu perfil
teórico e metodológico. Apesar de não serem poucas as tentativas de assim o
fazerem, como vemos na carta de Fernand Braudel:
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13 Note-se que, com relação à segunda edição de Raízes do Brasil, SBH enviou exemplares
para Donald Pierson, Fidelino Figueiredo, Luiz Viana Filho e Ezequiel Martinez Estrada,
como podemos ver pelas respostas que estes lhe enviaram em suas missivas,
respectivamente, de 19 de março, 22 de março, 25 de abril e 27 de setembro de 1948. Cf.
Siarq/Unicamp, Cp 83 P7, Cp 85 P7, Cp 87 P7 e Cp 92 P7.
14 Como pode ser visto na carta que SBH enviou para José Honório Rodrigues em 3 de
junho de 1962, e que lhe seria respondida em 2 de julho daquele ano (Cf. RODRIGUES,
2000, p. 282-284). Veja-se ainda sobre essa questão como SBH procedeu à criação do
IEB/USP em 1962 (Cf. CALDEIRA, 2002).
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15Carta de Afonso de Taunay para SBH, São Paulo, 23 de março de 1945. Siarq/Unicamp, Cp73
P6.
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16 Questão, aliás, que ele irá prosseguir na terceira, quarta e quinta edição do livro,
respectivamente, de 1956, 1963 e 1969 (Cf. HOLANDA, 1956, 1963, 1984).
17 Mais especificamente, o autor se pautou na edição comemorativa dos 70 anos da primeira
Por esse motivo, seu autor esperaria demais, extrairia “coisas demais
dos conceitos utilizados, incorrendo assim no que vimos chamando de
fetichismo do conceito, ilusão típica das investigações sociais de inspiração
teoricista” (GUSMÃO, 2012, p. 230). Todavia, na medida em que SBH foi se
afirmando como historiador nos anos 1940 e 1950, e, nesse processo,
passava a dar maior importância às explicações de tipo conteudístico e
ateórico, é para Gusmão onde irá surgir o grande historiador e intérprete do
país, como pode ser aferível em seus livros: Caminhos e fronteiras (de 1957),
Visão do paraíso (de 1959), e, especialmente, em Do Império à República (de
1972). Nesse caso, poderíamos muito bem inquirir: em que medida as
posições teórico-metodológicas de SBH seriam (ou não) expressas em sua
produção jornalística do período? Que tipo de relações poderia ter entre seus
livros, sua produção crítico-literária e suas missivas dos anos 1940 e 1950?
Como ele estaria entendendo as “regras do método” e as praticando em suas
pesquisas e em suas avaliações de outras pesquisas históricas?
Nesse sentido, procuraremos avaliar na continuidade deste item de
que maneira SBH foi desenvolvendo seus procedimentos de pesquisa, de
modo a agrupar certas regras ao (seu) método histórico e em suas práticas de
pesquisa e análise das fontes, e como ele converteu essas experiências para
avaliar outros trabalhos de história. Como já adiantamos, apesar de
indicarmos “método histórico” seria muito mais preciso falar de “métodos”
experimentados em suas pesquisas empíricas, nas quais o uso intensivo dos
mais variados tipos de documentos, desde que questionados de modo
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19 Sobre essa questão ver também a interessante análise de: PEREIRA, SANTOS, 2010.
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20Seriatambém durante este período, que SBH aprofundaria suas leituras das obras de Ernst
R. Curtius, Benedetto Croce, Erich Auerbach e LucienFebvre, e que lhe serviriam depois na
confecção de Visão do Paraíso, nos anos iniciais da década de 1950 (Cf. NICODEMO, 2008).
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congregação, apesar de Alice ter conseguido as notas mais altas, estas não
definiam a ordem de classificação, e, por isso, acabou sendo preterida
(ARRUDA, 2011; ROIZ, 2012). Em pelo menos três artigos que temos
conhecimento, todos dos anos 1950, SBH veio a comentar a obra de Alice:
em Sobre o Colloquium, que foi publicado em 12 de novembro de 1950 no
Diário Carioca, em História econômica, publicado no mesmo jornal em 24 de
agosto de 1952, e em Portugueses na América, publicado em 9 de maio de 1959
no jornal O Estado de S. Paulo.
No primeiro deles, SBH faz menção à obra de Alice, ao compará-la
com a do historiador britânico Charles Boxer (1904-2000). Para ele, a “essa
investigação, por assim dizer, “extensiva” que nos propõe o professor Boxer,
caberia associar a investigação em profundidade sugerida por Alice P.
Canabrava da USP” (HOLANDA, 2011b, p. 55). Note-se que neste período
SBH já começava a estreitar mais suas relações com os historiadores
britânicos, portugueses e norte-americanos, chegando a convidar Boxer para
alguns projetos, como o de escrever sobre os Holandeses no Brasil, ao qual
este acabou não podendo. Ao passo que Boxer, por sua vez, fazia votos de
que pudesse reencontrá-lo no IV Colóquio Luso-Brasileiro que iria ocorrer
na Bahia21. E a comparação que fazia de sua obra, com a de Alice Canabrava
não era fortuita. Como podemos ver com maior precisão no artigo seguinte,
quando SBH dirá que só “recentemente o nome de um dos mais notáveis
pesquisadores de nossa história econômica – o de Alice Piffer Canabrava –
começou a destacar-se do círculo ainda limitado de seus colegas e
discípulos”, por que:
21Carta de Charles Boxer a SBH, 5 de novembro de 1957. Siarq/Unicamp, CP209 P9. Carta de
Charles Boxer a SBH, 2 de dezembro de 1957. Siarq/Unicamp, CP210 P9
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22 Note-se ainda que neste círculo também estava o historiador Lewis Hanke, que no início
dos anos 1960 expediu para SBH uma dissertação, sobre sua direção, pedindo-lhe a gentileza
de fazer comentários sobre o texto. Carta de Lewis Hanke a SBH, New York, 28 de dezembro de
1961. Siarq/Unicamp, CP237 P9. Mas que, desde os anos 1940, vinha estreitando relações
profissionais com SBH (Cf. NICODEMO, 2012).
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Considerações finais
Referências