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RESUMO
A partir de sua experiência prática na Justiça Federal de Guarulhos (em
que a imensa maioria dos réus presos é formada por estrangeiros envolvidos
com o tráfico internacional de drogas), os autores (um juiz federal e uma
intérprete forense) examinam a atuação dos intérpretes nas audiências
criminais. De início, aponta-se a precariedade do modelo atual, em que os
intérpretes são contratados caso a caso, sem exigência de comprovação da
competência linguística ou de formação específica, inexistindo orientação
formal sobre a atuação esperada. O artigo então destaca a importância
(sobretudo do ponto de vista jurídico-constitucional) de se compreender
corretamente qual é a função do intérprete forense, expondo as dificuldades
criadas pelos próprios juízes federais, que quase sempre ignoram as técnicas e
regras básicas da interpretação forense. Em seguida, analisam-se as três
modalidades de interpretação normalmente utilizadas no ambiente judiciário
(interpretação simultânea, interpretação consecutiva e interpretação à prima
vista). Por fim, os autores propõem a adoção de um programa oficial de
seleção e treinamento de intérpretes e de orientação para os juízes, sugerindo a
adoção de um código de ética e de padronização de conduta para os intérpretes
forenses.
PALAVRAS-CHAVE
Justiça Federal. Intérpretes. Audiências criminais. Estrangeiros.
Técnicas. Treinamento.
ABSTRACT
1
From their practical experience at the Federal Courts of Guarulhos
(where the great majority of defendants are foreigners involved in
international drug trafficking), the authors (a federal judge and a court
interpreter) analyze the role of interpreters at criminal hearings. Initially, they
address the precariousness of the current model, with interpreters being
assigned to court procedures without any prior investigation into their
linguistic expertise or specific background, completely unaware of what is
expected from their performance. Accordingly, this article highlights the
importance (primarily from the constitutional point of view) of properly
understanding what the role of the court interpreter is, bringing to light the
difficulties created by the federal judges themselves, who often ignore the
basic rules and techniques of court interpretation. Subsequently, the three
modes of interpretation commonly used in the legal environment are analyzed
(simultaneous interpreting, consecutive interpreting and sight interpreting).
Finally, the authors suggest/propose the adoption of an official screening and
training program for interpreters as well as some guidance for judges,
encouraging compliance with a proper code of ethics and professional
standards for court interpreters.
KEY WORDS
Federal Courts. Court interpreters. Criminal hearings. Foreigners.
Techniques. Training.
INTRODUÇÃO
Muito embora o uso de intérpretes como auxiliares da Justiça não seja novidade no
Brasil (sendo o tema já disciplinado pelo Código de Processo Penal, de 1941), o intenso
contato com réus estrangeiros não falantes da Língua Portuguesa era simplesmente
impensável décadas atrás, quando a flexibilização das fronteiras, o intenso fluxo migratório e
os vôos turísticos internacionais eram ainda uma realidade distante. A atuação desses
auxiliares da Justiça, assim, acontecia em número pouco significativo e incapaz de despertar
a atenção da Administração do Poder Judiciário.
Atualmente, contudo, a globalização e a disseminação da criminalidade organizada
internacional (sobretudo para o tráfico internacional de drogas) faz comparecer às salas de
audiência criminais do País centenas de estrangeiros que, não falando o idioma nacional, têm
de enfrentar o sistema de justiça criminal brasileiro, participando de atos processuais e
tomando conhecimento de decisões judiciais que só podem compreender por meio,
justamente, de um intérprete forense.
2
Nesse contexto, seria de se imaginar que, ao menos nas localidades com intensa
circulação de estrangeiros (como, por exemplo, a cidade de Guarulhos, no Estado de São
Paulo, onde se localiza o maior aeroporto internacional da América Latina), a Justiça Federal
brasileira estivesse devidamente aparelhada para o encontro com centenas de réus
estrangeiros (somente no ano de 2015, segundo dados do Setor de Distribuição da Subseção
Judiciária de Guarulhos, foram mais de 300 novos casos criminais envolvendo estrangeiros).
Todavia, não é isso o que se vê.
Com efeito, predomina na Justiça Federal brasileira (e particularmente na de
Guarulhos) o absoluto amadorismo, despreocupação e improviso na seleção, treinamento,
orientação, atuação e remuneração dos “intérpretes forenses”, que, muitas vezes, são meros
conhecedores do idioma estrangeiro sem formação específica alguma em tradução e
interpretação (alguns, estrangeiros residentes há anos no Brasil, sem nenhum estudo
lingüístico específico além do aprendizado regular da língua estrangeira materna e do
Português prático do dia a dia). O “preparo” e a “orientação” dos intérpretes, por sua vez,
ficam – de forma absolutamente pontual e assistemática – a cargo de juízes federais
mais interessados ou de intérpretes mais experientes.
É nesse cenário – pouco profissional e despreocupado da efetiva compreensão, pelos
réus estrangeiros, das decisões judiciais e dos atos processuais que lhes dizem respeito no
processo penal – que se insere o presente estudo. Focando na atuação dos intérpretes
forenses em audiências criminais, o presente trabalho aborda a realidade judiciária de
Guarulhos e procura delinear o que é, realmente, a interpretação forense, apresentando a
forma como a interpretação forense é tratada (com muito mais apuro e cuidado) em outros
países e afirmando a absoluta necessidade de profissionalização dos intérpretes da Justiça
Federal brasileira, propondo diretrizes para a instituição de um programa permanente de
treinamento a ser implementado no âmbito dos Tribunais Regionais Federais ou, ainda, em
caráter nacional, pelo Conselho da Justiça Federal ou pelo carinho Conselho Nacional de
Justiça.
Dada a amplitude e a multidisciplinaridade do tema – que bem poderia render
monografias na área do Direito, da Administração, da Psicologia e das Letras – o presente
estudo, longe de pretender esgotar o assunto, almeja, de um lado, servir como um convite à
reflexão e, de outro, contribuir, ainda que modestamente, com sugestões para a solução dos
3
problemas que afligem essa essencial atividade auxiliar da Justiça, que não vem recebendo a
atenção devida dos operadores e administradores do sistema de justiça criminal.
2 Nos Estados Unidos, por exemplo, a prática foi abandonada há 25 anos – cfr. MIKKELSON, Holly;
GONZÁLEZ, Roseann Dueñas; e VÁSQUEZ, Victoria F., in Fundamentals of Court Interpretation – theory,
policy and practive, 1991, § 1.1.6.
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Cada um desses momentos processuais envolve situações, atores e discursos diversos,
exigindo do intérprete o domínio e o uso de técnicas interpretativas também distintas, como,
por exemplo, a interpretação simultânea sussurrada, a interpretação consecutiva e a
interpretação ‘a prima vista’. Tudo isso, sem esquecer dos imperativos éticos de sua
profissão.
À vista deste breve relato da experiência prática da Justiça Federal de Guarulhos, já se
nota que a interpretação forense é atividade auxiliar da Justiça muito mais complexa e
sensível do que a pobreza de sua disciplina normativa faria supor, estando a merecer
tratamento mais cuidadoso e profissional da parte do Poder Judiciário.
7
Com efeito, não são apenas imperativos cristãos de compaixão e alteridade que
exigem que se permita ao réu estrangeiro compreender e ser compreendido durante o
processo penal. É a própria Constituição Federal e o Código de Processo Penal que impõem
que se garanta (e não apenas que se prometa) ao réu estrangeiro plena oportunidade de
contraditório e de ampla defesa no processo penal, o que somente se alcança com um
serviço de interpretação forense profissional e de qualidade.
Não constitui exagero afirmar que é pressuposto básico do contraditório e do
exercício do direito de defesa a própria compreensão do que se passa no processo, seja em
requerimentos e decisões judiciais, seja em audiências para oitiva de testemunhas ou
interrogatório do réu. Deveras, se ao réu estrangeiro não é dado compreender em sua língua o
conteúdo de requerimentos, decisões, documentos e depoimentos passados em Português, é
evidente que ele não reunirá condições mínimas de defender-se. É a Constituição Federal,
assim, que, ao exigir o devido processo legal, a oportunidade de contraditório e a garantia de
ampla defesa, impõe a necessidade de plena compreensão, pelo réu estrangeiro, do que se
passa no processo penal brasileiro.
Demais disso, o Código de Processo Penal estabelece que “quando o interrogando
não falar a língua nacional, o interrogatório será feito por meio de intérprete” (art. 193) e
que “quando a testemunha não conhecer a língua nacional, será nomeado intérprete para
traduzir as perguntas e respostas” (art. 223). Da combinação desses dois dispositivos, aliás,
pode-se deduzir uma terceira norma, implícita: nos casos em que a língua nacional seja de
conhecimento da testemunha, mas não do réu (como rotineiramente acontece em Guarulhos),
também deverá estar presente o intérprete para traduzir, para conhecimento do réu, as
perguntas e respostas do depoimento da testemunha.
A Justiça Federal norte-americana, por exemplo, reconhece que “o uso de intérpretes
forenses competentes em procedimentos envolvendo falantes de línguas diversas do idioma
nacional é fundamental para assegurar que a justiça seja verdadeiramente entregue aos réus
e outros interessados”.3 A principal função do intérprete forense, assim, é permitir que o réu
esteja presente de forma lingüística em todas as etapas do processo, tornando igualmente
possível que os demais envolvidos no processo compreendam o que é dito pelo acusado.
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pode, só por isso, ser intérprete, não menos certo é que nem todo intérprete está
preparado, com sua formação genérica, para servir como intérprete forense.
Em realidade, tantas são as habilidades mentais e processos cognitivos envolvidos no
ato de interpretar, e tantos são os desafios e surpresas à espreita numa sala de audiências, que,
guardadas as proporções dos riscos em jogo, não constitui exagero comparar o grau de
estresse profissional dos intérpretes forenses aos dos controladores de vôo, sendo
seguramente idêntico, ao menos, o permanente estado de concentração e tensão em ambas as
atividades.
4Não se está, aqui, falando de tradução ‘stricto sensu’, o que exclui, portanto, a tradução de peças processuais e
documentos, que pode dar-se em momentos processuais diversos daqueles em que ocorre a interpretação.
5Sem prejuízo do prazo para recurso, o final da audiência é a oportunidade que o defensor tem de conversar
pessoalmente com o réu preso, explicar o resultado da sentença e perguntar sobre o desejo de recorrer.
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Na interpretação simultânea, o intérprete forense, depois de começar a ouvir o
discurso que vai interpretar (na língua de partida, que pode ser o Português ou o idioma
estrangeiro, conforme o caso), precisa se preocupar, em frações de segundo, com a sintaxe e a
semântica da língua de chegada antes de se expressar nela, sem perder a atenção das frases
subseqüentes que continuam a ser ditas na língua de partida pelo locutor. E isso sem contar
que, em algumas línguas, como o alemão e o hebraico, o verbo de ação às vezes vem ao final
da frase, o que impede o intérprete de começar a interpretação antes da frase se completar e
fazer sentido.
Para se ter uma idéia da alta complexidade da interpretação forense simultânea, basta
que se tente, sendo brasileiro, repetir mentalmente mesmo em Português o que é dito por
testemunhas brasileiras numa audiência qualquer, continuando a ouvi-las. A dificuldade
hercúlea da tarefa para quem não seja da área é suficiente para dar uma idéia de quão mais
difícil é, mesmo para especialistas, a interpretação simultânea de uma língua estrangeira para
o Português e vice-versa. Em realidade, profissionais da área que dominam esse modo de
interpretação com excelência são disputadíssimos no mercado, sendo requisitados com meses
de antecedência para eventos e, não raras vezes, são contratados permanentemente por
organismos internacionais.
Numa audiência criminal, a interpretação simultânea normalmente é utilizada durante
a oitiva das testemunhas: sentado ao lado do réu estrangeiro, o intérprete forense ouve o
depoimento das testemunhas em Português e, simultaneamente, o retransmite ao acusado em
seu idioma. A dificuldade da tarefa é agravada pela sensível diferença de registros e estilos
linguísticos utilizados pelas diferentes testemunhas: há os policiais, que usam a linguagem e
os jargões próprios de sua profissão; há os técnicos e especialistas sobre determinado assunto,
que se valem de terminologia técnica específica; e há as pessoas de educação mais modesta,
que fazem uso de registros informais do Português e por vezes se expressam de forma
confusa e linguisticamente imprecisa.
Embora importante também nas demais modalidades de interpretação, é na
intepretação simultânea que o alinhamento entre juiz federal e intérprete se mostra essencial,
na medida em que compete ao magistrado que preside a audiência proporcionar condições
adequadas para que o intérprete forense bem desempenhe sua função.
De fato, ruídos, distrações ou mesmo a disposição da sala de audiência podem
impedir o intérprete de ouvir claramente as perguntas feitas à testemunha e as suas respostas.
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Do mesmo modo, se os locutores estiverem falando muito rápido, o intérprete pode não
conseguir acompanhá-los. Ainda, audiências muito longas podem esgotar as forças físicas e
mentais do intérprete, eliminando sua capacidade de concentração e interpretação. Em
qualquer desses casos, é dever do juiz intervir, de ofício ou a pedido do intérprete, para
eliminar a causa do desconforto e proporcionar a realização da audiência em condições
adequadas para o trabalho do intérprete.
Uma medida judicial simples capaz de evitar esses percalços é o esclarecimento
prévio, feito pelo juiz no início da audiência, em que ele explica às partes e às testemunhas as
peculiaridades de uma audiência com réu estrangeiro e as convida a colaborar com o
intérprete, falando mais lentamente, utilizando frases curtas, construções verbais simples e
diretas e não se interrompendo ou falando ao mesmo tempo.
Embora seja recomendável que os juízes tenham bom conhecimento das
particularidades da interpretação forense – para que possam, por si próprios, se antecipar às
dificuldades dos intérpretes e solucioná-las de ofício – não há vergonha alguma (antes, é
dever ético do auxiliar do juízo, como se verá abaixo) em que os próprios intérpretes
interrompam sua participação na audiência e peçam o auxílio do magistrado.
Com efeito, solicitações respeitosas (como, e.g., “Excelência, o senhor poderia pedir à
testemunha que fale mais devagar, por favor?”, ou “Excelência, seria possível fazermos um
intervalo de alguns minutos para que eu possa recompor minha concentração em nível
satisfatório para continuar a interpretação?”) não só não prejudicam o andamento da
audiência como são bem vindas, por viabilizarem o bom desempenho profissional do
intérprete e, por conseqüência - como visto acima - a plena realização do devido processo
legal previsto na Constituição.
6Cfr. MIKKELSON, Holly, in The interpreter’s edge: practical exercises in Court Interpreting, 3ª ed., Ed.
Acebo, 1995
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apreender e reproduzir com fidelidade o que acabou de ser dito. Por sua própria natureza, é
modalidade de interpretação que emprega tempo consideravelmente maior que a simultânea.7
As escolas de interpretação empregam inúmeras técnicas e exercícios para
desenvolver tanto a memória de curto prazo, quanto a forma de anotação e apreensão do
discurso a ser interpretado, havendo técnicas mnemônicas e ideogramas próprios para a
facilitação do trabalho. Não raras vezes, os intérpretes consecutivos acabam desenvolvendo
códigos de símbolos próprios para tomar notas de palavras chave do discurso e agilizar a
interpretação. Nada obstante, tal qual na interpretação simultânea, são necessários anos de
prática para que se alcance excelência (caracterizada pela absoluta fidelidade na transmissão
da mensagem) na interpretação consecutiva.
Nas audiências criminais, ela é largamente utilizada, surgindo já na entrevista prévia
do réu estrangeiro com seu defensor, passando pelas explicações preliminares do juiz no
início da audiência e reaparecendo no encerramento, para discussão com o defensor sobre
eventual apelação. É no interrogatório do acusado, porém, que a interpretação consecutiva
assume protagonismo absoluto: o intérprete vai vertendo para o idioma estrangeiro, pouco a
pouco, as perguntas do juiz, do procurador e do defensor a respeito do mérito da acusação e,
com as respostas do réu – também interpretadas consecutivamente – vai se desenhando a
versão do acusado para os fatos, com a admissão ou negação da culpa.
Não obstante sua larga utilização, muitos juízes, procuradores e advogados continuam
a atrapalhar consideravelmente o trabalho dos intérpretes durante a interpretação consecutiva,
simplesmente por ignorar o modo de funcionamento dessa específica modalidade
interpretativa.
Como já assinalado, é comum o equívoco de juízes, procuradores e defensores 8 de se
dirigirem ao intérprete (com uso do discurso indireto, na terceira pessoa do singular), ao
invés de se dirigirem diretamente ao réu (com utilização do discurso direto, na primeira
pessoa do singular). Considerando que o intérprete consecutivo tem dever de máxima
fidelidade ao discurso do locutor (impondo-se a reprodução da forma, do estilo, do tom, de
eventuais erros, hesitações, interrupções e reformulações de frases), a utilização do discurso
7 No exemplo citado acima, da ação penal envolvendo três rés tailandesas, em que foi convocada uma presa
tailandesa processada em outra ação penal para funcionar como segunda intérprete ao lado da intérprete de
Inglês, era de interpretação consecutiva que se tratava.
8Tal equívoco dificilmente ocorre da parte do réu estrangeiro, que, indagado pelo intérprete em sua língua
materna, tende a responder em primeira pessoa, por meio do discurso direto.
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indireto o obriga a empregar tempo e energia mental extras, para converter mentalmente o
discurso indireto para a forma direta antes de transmitir a mensagem ao réu no idioma
estrangeiro.
A técnica correta, simples e natural, manda que as partes e o juiz se dirijam, mesmo
em Português, diretamente ao réu, como se ele compreendesse o discurso. O intérprete
forense então transporta a mensagem tal como construída para o idioma estrangeiro e, ao
ouvir a resposta do réu, faz o mesmo, respondendo à indagação, em Português, também na
primeira pessoa do singular, como se fosse mero amplificador da voz do acusado.
Mas não é só. O abuso da terminologia jurídica, o uso de construções verbais
demasiadamente complexas ou eruditas, de frases longas e de confusas “introduções” às
perguntas (ou mesmo de “perguntas” às quais não se segue o necessário ponto de
interrogação) complicam desnecessariamente o trabalho dos intérpretes forenses.
Não se pode olvidar, no ponto, que os réus estrangeiros não dispõem de conhecimento
técnico-jurídico (e ainda que dispusessem, não seria do direito brasileiro), obrigando os
intérpretes a uma imprópria – porém indispensável, no caso – simplificação do discurso, sob
pena de absoluta incompreensão por parte do acusado, mesmo em seu idioma (tal qual sucede
com muitos réus brasileiros não esclarecidos pelos juízes).
Também aqui, a solução é fácil: a utilização, pelas partes e pelo juiz, de frases curtas
e simples e, na medida do possível, a substituição de termos técnicos ou muito específicos
por possíveis sinônimos ou breves explicações mais acessíveis em Português (a critério, note-
se, dos próprios juízes, procuradores e advogados, e não mais do intérprete, a quem não cabe
tamanha responsabilidade). Ainda, cabe ao juiz orientar as partes e o réu – e interrompê-los
momentaneamente, quando o caso – a falarem por períodos curtos de tempo, para permitir a
pronta interpretação consecutiva, fazendo os depoimentos caminharem de forma
entrecortada, passo a passo.
Há, também, pequenos deslizes de partes e juízes decorrentes de mera
desconcentração, como os que acontecem quando eles, inquiridores, também falam o idioma
estrangeiro do acusado. Por vezes, depois de ouvir e compreender a resposta do réu na língua
estrangeira, juízes, procuradores e advogados desatentos põem-se de imediato a fazer novas
perguntas, sem deixar que o intérprete traduza o que foi dito para o Português (o que é
indispensável para os registros da audiência). Muito embora se trate de irregularidade quase
inofensiva, a demora do juiz em perceber o incidente e corrigi-lo (permitindo que todas as
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respostas do réu sejam devidamente transportadas para o Português pelo intérprete) pode
acabar ensejando até mesmo a nulidade da audiência, pelo não registro do interrogatório do
acusado em Língua Portuguesa.
De outro lado – justiça seja feita – há também os intérpretes forenses que, ainda
despreparados para a função (por formação deficiente ou falta de experiência), acabam por
comprometer seu trabalho ao desrespeitar as regras técnicas básicas da interpretação
consecutiva. Deveras, a mera ignorância, pelo intérprete, de seu dever funcional de máxima
fidelidade ao discurso interpretado pode causar sérios mal entendidos e até mesmo prejudicar
ou favorecer indevidamente o estrangeiro acusado.
Como já assinalado, o intérprete consecutivo deve evitar ao máximo omitir ou
adicionar informações ao discurso interpretado, bem como deve furtar-se a embelezar o
vocabulário ou corrigir erros gramaticais ou de estilo. Se, por exemplo, o réu estrangeiro
acusado de tráfico internacional de drogas é indagado se “sabia se havia droga escondida em
sua bagagem”, eventual hesitação, falso início de frase ou resposta sem sentido devem ser
fielmente reproduzidos pelo intérprete, a quem não cabe repreender o acusado por não ter
respondido à indagação, nem muito menos “reinquiri-lo” na busca de uma resposta mais
completa.
A Justiça Federal de Guarulhos reúne verdadeiro anedotário com episódios
envolvendo intérpretes despreparados (ou momentaneamente desconcentrados) que acabaram
por prejudicar as audiências criminais de que participaram.
Certa feita, desconfiado de que um réu estrangeiro simplesmente inventara o nome de
um possível mandante do crime (para minimizar sua participação no delito), o membro do
Ministério Público continuou sua inquirição fazendo inúmeras perguntas estranhas ao
assunto, para retomar a questão minutos depois, na esperança de surpreender o acusado já
esquecido do nome que inventara. Repetindo então a indagação “qual era mesmo o nome da
pessoa que lhe deu a droga no Brasil?”, qual não foi a surpresa do procurador quando a
própria intérprete, sem sequer traduzir a pergunta, respondeu de pronto com o nome dito
inicialmente pelo réu, que ela havia anotado em seu caderno.
Aliás, mais de uma vez aconteceu de o juiz (entre outros, o co-autor deste ensaio)
indagar sobre a vida pessoal e familiar do acusado e o intérprete, inadvertidamente, também
sem sequer traduzir a pergunta, por-se a responder, posto que já obtivera tais informações do
réu durante a entrevista prévia reservada com o defensor.
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Noutro episódio, numa audiência de custódia – em que se decidia sobre a manutenção
da prisão em flagrante do estrangeiro ou a concessão de liberdade provisória – o magistrado
indagou do acusado o que ele faria se fosse posto em liberdade. Claramente enfurecido por se
sentir, segundo afirmava, enganado por um seu conhecido (que teria escondido drogas em sua
bagagem sem seu conhecimento), o estrangeiro respondeu, em Inglês, que iria procurar o
responsável e matá-lo; o intérprete, contudo, ao transportar a frase para o Português, omitiu a
parte final, dizendo apenas “vou procurar meu amigo”.
Tendo compreendido a resposta em Inglês, e surpreso com a omissão indevida do
intérprete, o juiz mandou que ele, intérprete, traduzisse fielmente o que foi dito, sobrevindo
então a frase completa, com a menção à intenção de “matar o responsável”, o que acabou por
ensejar, naquele momento, a manutenção da prisão, pelo receio quanto à real disposição do
acusado de se vingar de seu conhecido. Fosse o caso com uma língua estrangeira ignorada
pelo julgador, a má atuação do intérprete consecutivo seguramente teria passado despercebida
e poderia até mesmo ter ensejado uma tragédia.
A despeito dos casos mais folclóricos, é inegável que a forma de falar do acusado, o
estilo e o tom de seu discurso, a convicção ou hesitação em suas afirmações, os rodeios, os
falsos inícios de frase e mesmo os erros gramaticais e as frases sem sentido fornecem ao
magistrado informações importantíssimas quanto ao modo de ser e à capacidade de
compreensão do réu (circunstâncias relevantes, por exemplo, para formação do juízo quanto à
consciência e voluntariedade do acusado a respeito de todas as circunstâncias do crime de
que é acusado e também para fins de dosimetria da pena).
Se a audiência é a oportunidade do juiz de travar contato direto com o réu e assim
conhecê-lo um pouco mais, o intérprete forense que ignora as regras e técnicas da
interpretação consecutiva, omitindo ou acrescentando informações, ou substituindo o estilo
linguístico do réu estrangeiro pelo seu próprio, acaba por embaçar a imagem do acusado e
impedir o magistrado de conhecer verdadeiramente a pessoa que deve julgar (em claro
prejuízo da Justiça e do próprio réu).
9Trata-se, como visto, de interpretação e não de tradução, atividade essencialmente diversa, em que o tradutor
dispõe inclusive de tempo e acesso a dicionários e textos de apoio para concluir seu trabalho, que será
apresentado posteriormente por escrito.
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mensagem transmitida pelo intérprete forense seja absolutamente fiel ao conteúdo da
sentença lida, levando ao conhecimento do réu condenado, em seu idioma materno, as razões
concretas de sua condenação, a extensão e os fundamentos de sua pena (com explicitação das
eventuais atenuantes e agravantes, minorantes e majorantes).
Por mais que hoje se busque a simplificação dos textos jurídicos e o descarte de
floreios linguísticos inúteis, a sentença penal condenatória, por ser peça processual
eminentemente técnica e disciplinada em lei, inescapavelmente terá de fazer uso da
terminologia própria do direito penal, valendo-se de inúmeras expressões e vocábulos
técnicos, que quase sempre terão seus equivalentes no idioma estrangeiro. Desse modo, é
absolutamente indispensável que o intérprete forense esteja não só familiarizado com a
linguagem do direito penal brasileiro como, também, com a terminologia jurídica da língua
estrangeira falada pelo réu, de modo a garantir a plena compreensão do conteúdo da
sentença pelo acusado.
O intérprete forense deve, ainda, cercar-se de cuidados para não se permitir externar
aprovação ou reprovação do desfecho da ação penal (ainda que por meio de meras
expressões faciais durante a leitura da sentença) e, em hipótese alguma (por mais difícil que
isso seja na prática), deve tentar “consolar” o réu (seja com a inofensiva lembrança da
possibilidade de apelação, seja com afirmações mais temerárias, como, por exemplo, a de que
“outros receberam penas maiores em casos semelhantes”). Embora seja da natureza humana
buscar consolar o semelhante que sofre, esse papel, no processo penal, compete ao defensor e
à família do condenado, nunca ao intérprete, que é auxiliar técnico do Poder Judiciário e deve
pautar-se por absoluta sobriedade e imparcialidade no desempenho de sua função.
É comum (e plenamente compreensível, sob o aspecto humano) que os réus
estrangeiros vejam no intérprete forense quase um amigo, pelo só fato de ser alguém com
quem conseguem se comunicar. Ademais, o contato próximo e permanente com o intérprete
durante quase todo o tempo de permanência no Fórum Federal, bem como a circunstância de
que não cabe a ele tomar qualquer decisão sobre o destino do processo, podem ensejar no réu
estrangeiro uma natural simpatia pelo auxiliar do juízo e, por vezes, até mesmo uma ilusória
sensação de intimidade.
Não custa lembrar, contudo, que o intérprete forense é auxiliar do juízo e não do réu
estrangeiro. Deve primar, assim, por dever de ofício, por uma atuação absolutamente neutra e
imparcial, objetiva e transparente, evitando criar laços emocionais com o acusado
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estrangeiro. Do contrário, o intérprete forense pode ver-se colocado em situações
extremamente delicadas, como quando o réu se sente à vontade para pedir um conselho, ou
para perguntar se o juiz de seu caso é “severo” ou “liberal”, se o procurador é “mau” ou se
seu defensor está fazendo uma “boa defesa”.
Sem dúvida nenhuma, o momento de olhar nos olhos de um réu e proferir sua
condenação (por vezes, a anos de prisão em regime fechado) não é fácil nem mesmo para os
juízes, que estão ali para cumprir sua missão jurídico-constitucional e têm a consciência
tranqüila de ser, a sua sentença condenatória, a decisão imposta pela prova dos autos e a mera
conseqüência das más escolhas do acusado. O intérprete, contudo, não tem a responsabilidade
de examinar a prova produzida no processo, tampouco a de decidir pela condenação ou
absolvição ou de dosar a pena a ser aplicada. Por isso mesmo, deve estar sempre atento e
vigilante para não se envolver emocionalmente com a desventura do estrangeiro condenado.
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irreparável à imagem e à credibilidade do Judiciário brasileiro - se o “Google Tradutor” for
utilizado, por exemplo, para tradução de um pedido de colaboração jurídica internacional.
Demais disso, admitir a utilização de uma ferramenta eletrônica absolutamente
precária e limitada – como o “Google Tradutor” – para verter para idiomas estrangeiros
sentenças proferidas em Português culto e técnico, somente pode revelar pouco apreço pelos
valores constitucionais do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório, além
de indisfarçável desprezo pela frágil situação do réu estrangeiro no processo penal
brasileiro. Certamente que a diplomacia brasileira não admitiria a utilização do “Google
Tradutor” para verter para o Inglês uma simples “carta de boas vindas” a um novo
embaixador britânico, pelo risco do ridículo e do mal entendido; tratando-se de “réus”
estrangeiros, porém, a plena compreensão do conteúdo da sentença que selará seu destino no
País é vista por alguns como mero detalhe insignificante, incapaz de despertar a busca de
soluções menos preguiçosas.
É fora de dúvida – como visto com vagar acima – que a Justiça Federal brasileira é
despreparada e enfrenta sérias dificuldades para encontrar tradutores e intérpretes forenses
capacitados e em condições de fazer frente à enorme demanda de algumas regiões (como na
cidade de Guarulhos, por exemplo). A solução, todavia, não há de ser a disseminação do uso
de uma ferramenta eletrônica absolutamente débil e insegura. Muito ao contrário, é a
implementação de um programa oficial de seleção e treinamento de intérpretes forenses – tal
como feito em muitos países do mundo – que proporcionará, gradualmente, a
profissionalização dessa atividade auxiliar e o pleno atendimento das necessidades da Justiça.
12 Precisamente por essa precariedade na seleção e contratação dos intérpretes, já por mais de uma vez o juiz
veio a descobrir, apenas no curso da audiência, a absoluta incompetência linguística do “intérprete” nomeado,
tendo de destituí-lo na hora e adiar a audiência, para que outro mais capaz fosse contratado.
13 Vide o “Manual da Conciliação da Justiça Federal da Terceira Região” - http://www.trf3.jus.br/trf3r/
index.php?id=1271.
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A experiência internacional, entretanto, demonstra que não só é necessário mudar,
como é possível fazê-lo sem grandes revoluções administrativas, bastando a firme disposição
de profissionalizar o serviço judiciário de intepretação forense e a adoção sistemática de
medidas de curto e médio prazo para que, paulatinamente, o Poder Judiciário tenha à sua
disposição um corpo de auxiliares de competência reconhecida e atuação padronizada.
Os europeus e os norte-americanos, por exemplo, desde os famosos julgamentos de
Nuremberg, ao final da Segunda Guerra Mundial, se preocupam com a formação e
treinamento de seus intérpretes forenses. E a realidade atual da União Européia, de um lado, e
o intenso fluxo migratório recebido pelos Estados Unidos, de outro, provaram a esses países
que a preocupação com a preparação competente dos intérpretes forenses é um investimento
que se paga com vantagem sobre a aparente economia do improviso e do amadorismo (no
que se inclui, como visto, a utilização do “Google Tradutor”).
14 Tal aconteceu na apresentação, durante a “3ª Conferência Internacional sobre tradução e interpretação não-
profissional” [Suíça, 2016], do trabalho da co-autora deste artigo intitulado “Ética e Diretrizes Profissionais para
intérpretes judiciais ad hoc", em que se pode testemunhar o espanto e a indignação dos alemães com a
possibilidade de atuação judicial, ainda hoje, de intérpretes não certificados pelos tribunais.
23
intérpretes estonianos falam quatro línguas em nível proficiente e freqüentemente flutuam em
duas ou mais outras línguas em nível passivo. E o Tribunal local disponibiliza em sua página
na internet uma lista com os nomes e as línguas de especialidade dos intérpretes
certificados.15
Já na justiça federal norte-americana, o serviço de interpretação forense é disciplinado
em lei (Court Intepreters Act, de 28/10/1978), sendo o objetivo da normatização “dar aos
réus não falantes do Inglês ou com deficiência de fala ou audição uma oportunidade igual
para compreender e participar nos julgamentos civis e criminais na justiça
federal” (tradução livre dos autores). Dispõe, ainda, de uma página própria dentro da página
de internet da United States Courts (http://www.uscourts.gov/services-forms/federal-court-
interpreters), em que são listadas as categorias de intérpretes e as habilidades exigidas, bem
como a forma de contratação e remuneração.
A justiça federal norte-americana disponibiliza eletronicamente, ainda, o “Manual de
Orientação e Glossário do Intérprete da Justiça Federal” (em que consta o código de ética
profissional) e o National Court Interpreter Database (NCID) Gateway (http://
www.uscourts.gov/services-forms/federal-court-interpreters/national-court-interpreter-
database-ncid-gateway) que vem a ser um cadastro nacional de todos os intérpretes forenses
certificados, com as respectivas áreas de atuação (cível, criminal, família) e os idiomas de
especialidade, para ser utilizado pelos juízes federais de localidades que não disponham de
corpo próprio de intérpretes ou que se deparem com línguas exóticas ou de baixa difusão.
15 Informações obtidas diretamente em visitas locais da co-autora do artigo, que vive há dois anos no país.
24
dos Tribunais ficam autorizadas a celebrar convênios com profissionais, empresas ou
instituições com notória experiência em avaliação e consultoria nos ramos de atividades
capazes de realizar as perícias requeridas pelos juízes”.
Considerando que, nos termos da lei, como visto, “os intérpretes são, para todos os
efeitos, equiparados aos peritos” (Código de Processo Penal, art. 281), vê-se que já está
autorizada a criação, pelos tribunais, de um “cadastro regional de intérpretes e
tradutores forenses”, em que poderão ser inscritos os intérpretes e tradutores que
demonstrem a qualificação técnico-linguística necessária. Não se trata, contudo,
simplesmente de um cadastro para fins de pagamento dos honorários devidos (como o já
existente “AJG” - Sistema da Assistência Judiciária Gratuita), mas sim de um refinamento
desse banco de dados, para atender à finalidade de certificar a proficiência linguística e a
excelência profissional dos intérpretes e tradutores nele inscritos.
Precisamente por essa razão, o aprimoramento do cadastro já existente (em que todos
os intérpretes e tradutores forenses hoje já devem se inscrever para receber o pagamento de
seus honorários) 16 demanda o estabelecimento de padrões oficiais de qualificação
técnica, de critérios científicos de avaliação e de um manual de padronização ético-
profissional. Estabelecido um cadastro regional (ou até mesmo nacional, via Conselho
Nacional de Justiça ou Conselho da Justiça Federal) nestes moldes, estaria viabilizada até
mesmo a utilização de intérpretes residentes em localidades distantes do Fórum Federal, pelo
sistema de videoconferência, sempre que a urgência do caso ou a raridade do idioma exigido
inviabilizassem a convocação dos intérpretes locais cadastrados.
No que toca especificamente à qualificação linguística, parece fora de dúvida, diante
de todo o exposto até aqui, que a mera circunstância de alguém ser bilíngue ou compreender
outras línguas além do Português não o autoriza, só por isso, a atuar como intérprete forense.
A relevância constitucional da função e os valores em jogo impedem que se permita que
pessoas despreparadas tecnicamente para o desempenho da atividade sejam admitidas ao
serviço.
É preciso, assim, que os intérpretes judiciais profissionais tenham recebido educação
formal específica (tanto linguística, em Português e nas línguas em que se propõe a atuar,
quanto em interpretação), dominando em alta performance as diferentes habilidades dos
16 Atualmente, um intérprete forense da justiça federal ganha por volta de R$200,00 por audiência de até 3 horas
realizada.
25
distintos modos de interpretar. Ademais, é indispensável que os intérpretes forenses, antes de
serem considerados aptos para a função, passem por um “estágio supervisionado” com
intérpretes mais experientes (tal como já acontece com os conciliadores e mediadores
formados pela Justiça Federal, nos termos da Resolução nº 125/2010 do CNJ).
Não se ignora a impossibilidade de se implementar um tal modelo do serviço de
interpretação forense do dia para a noite, e até mesmo sua inviabilidade no que diz respeito a
línguas mais raras ou de baixa difusão. Nada obstante, ainda que como um plano de médio
prazo, a exigência intransigente de excelência profissional é não só necessária, como
plenamente possível, ao menos para os idiomas mais comuns nas audiências criminais, como
o Inglês e o Espanhol (cujos falantes abundam no Brasil e podem perfeitamente ser treinados
para a interpretação forense).
Nesse cenário, a despeito dos cursos formais – e necessários – de línguas e de
interpretação (muitas vezes oferecidos como especialização ou pós-graduação lato sensu
pelas faculdades brasileiras), os Tribunais Regionais Federais, o Conselho Nacional de
Justiça ou o Conselho da Justiça Federal poderiam oferecer cursos regulares (semestrais
ou anuais) de capacitação de intérpretes forenses (também nos moldes dos já existentes
para a formação de conciliadores e mediadores), com carga horária teórica e prática (estágio
supervisionado).
Os aprovados seriam então cadastrados pelos tribunais como intérpretes certificados.
Paralelamente, os intérpretes ainda não certificados pelo Judiciário, mas com reconhecida
competência linguística e experiência na área, poderiam inscrever-se no cadastro como
intérpretes com domínio de língua estrangeira e, no futuro, submeter-se ao curso regular de
certificação. Desse modo, preservar-se-ia o possível, sem perder de vista o ideal, plenamente
alcançável em médio prazo.
Já os falantes de línguas raras ou de baixa difusão poderiam ser cadastrados em
categoria própria, como intérpretes de idioma raro ou de baixa difusão, em relação aos
quais seria dispensada a exigência de certificação (dada a pouca freqüência de sua atuação),
bastando o conhecimento de um “código de ética e de padronização de conduta”.
17 Recentemente, a Alemanha vem enfrentando problemas com intérpretes muçulmanos xiitas, que têm
repreendido mulheres vítimas de violência doméstica por denunciarem seus maridos e utilizarem palavras como
“sexo” e “estupro” em seus depoimentos, supostamente blasfemando e ofendendo o Islã. Cf. https://
www.gatestoneinstitute.org/8391/germany-muslim-interpreters.
28
prévia, seja absolutamente distinta da oferecida perante o juiz, em audiência, o intérprete
deve abster-se de revelar qualquer inconsistência do depoimento, ainda que por trejeitos e
expressões faciais.
O dever de confidencialidade, contudo, pode ser excepcionalmente afastado pelo
intérprete, em situações limite em que se põem em risco valores constitucionalmente mais
importantes, como a vida e a integridade física de terceiros e a ordem pública (como, e.g.,
quando o réu revela em sigilo a iminência da prática de outro crime, o cativeiro de vítimas de
seqüestro, ou, ainda, quando um mau defensor orienta o acusado a fugir ou praticar violência
na sala de audiências). Em tais situações excepcionais, o intérprete tem o dever de se dirigir
ao gabinete do juiz e, antes mesmo da audiência, informar o ocorrido.
d) Dever de honestidade e transparência quanto às qualificações profissionais: o
intérprete forense deve apresentar suas credenciais técnicas ao Poder Judiciário com absoluta
fidelidade e precisão, furtando-se a aceitar a nomeação quando seu nível de treinamento e
experiência não permitirem o bom desempenho profissional de acordo com o nível de
responsabilidade exigido pela função.
e) Dever de compostura e permanente atualização profissional: o intérprete forense
deve se comportar, dentro e fora do Fórum Federal, de maneira compatível com a dignidade
da Justiça, sendo o mais discreto possível na sala de audiências, e deve buscar,
permanentemente, sua atualização profissional.
5. Considerações conclusivas
18 De fato, é surpreendente a quantidade reiterada de casos (sempre com estrangeiros) em que, encerrado o
interrogatório e dada a palavra ao réu para eventuais acréscimos finais, o acusado faz uso de um discurso quase
ensaiado, pedindo desculpas ao magistrado, ao povo e ao governo brasileiros e pedindo clemência, por vezes
deixando a cadeira e ajoelhando-se diante do juiz.
30
A realidade exposta neste ensaio aponta para a urgente necessidade de mudança da
forma como o Judiciário Federal brasileiro vem lidando com o serviço (público) de
interpretação forense. Se não por outras razões, pelo simples dever de obediência à
Constituição Federal e de implementação concreta de seus mandamentos.
É comum, em temas como o que se vem de tratar – em que outros países enfrentaram
problemas semelhantes e hoje estão a milhas de distância à nossa frente – olhar com certa
inveja e desalento para a posição em que as nações mais desenvolvidas se encontram
atualmente, desapercebendo-se de todo esforço e sacríficio que outros povos suportaram para
chegar lá. É mesmo habitual do brasileiro resignar-se com a absurda diferença de qualidade
entre os serviços públicos prestados aqui e em países mais civilizados, como se nada
houvesse a fazer. Mas há.
Além do estudo e aprofundamento das modestas sugestões lançadas neste artigo,
entende-se que parcerias e intercâmbios com órgãos judiciários internacionais (como, e.g., o
Federal Judicial Center, nos Estados Unidos, e seus congêneres na Europa e na Ásia) podem
proporcionar a força criativa capaz de acelerar a profissionalização de todos os setores do
Judiciário Federal brasileiro, em benefício último do cidadão, brasileiro ou estrangeiro, que
comparece nos fóruns Brasil afora.
Acredita-se que, se o próprio Poder Público abandonar a macunaímica preguiça
brasileira e a tolerância com a incompetência e o mal feito, passando a não aceitar a prestação
de um serviço público que não seja de excelência, naturalmente os arremedos e improvisos
no desempenho das funções públicas serão abandonados, substituídos republicanamente pelo
profissionalismo e pela competência.
6. Referências bibliográficas
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California Court Interpreters. Disponível em: <http://www.soniamelnikova.com/
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31
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32
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and Metaphor, Racial Slurs, Drug Talk, Homosexual Lingo, and Related Matters. 2. ed.
Sylmar: Jonathan David, 1981.
TANNEN, Deborah. That's Not What I Meant!. 2. ed. New York: Ballentine Books, 1991.
JAQUELINE NORDIN
1° EDIÇÃO
São Paulo
2013
33
Sala de Audiência do Fórum Federal em Guarulhos-SP
34
AGRADECIMENTOS
Agradeço primeiramente a Deus que, com sua infinita misericórdia, nos dá o que nos é
merecido. Agradeço a meu marido Andreas e a meus filhos Gustavo e Samuel pela
compreensão e paciência durante todo o período sem minha presença em casa.
Agradeço, ainda, à minha amada mãe, que nos socorreu nos dias em que precisamos, e
aos meus queridos irmãos que também contribuíram de alguma forma.
Agradeço imensamente às minhas queridas amiga Silvia Cristine Samogim e Angelica
Samogim, responsáveis pelo meu ingresso na profissão de intérprete de audiência e, por
conseguinte, corresponsáveis por este trabalho.
Agradeço aos juízes federais Fabiano Lopes Carraro, Maria Isabel do Prado, Louíse
Vilela Leite Figueiras Borer, que contribuíram para o meu crescimento linguístico, pessoal e
humano; à querida juíza federal Claudia Arruga Mantovani; ao querido defensor público
federal Andre Gustavo Bevilacqua Piccolo; e à procuradora da República Ana Flávia
Cavalcanti, pessoas que depositaram confiança e me ensinaram quando eu precisei saber,
com humildade e paciência.
35
Meu profundo agradecimento a Maina Cardilli Marani, assistente dos juízes da 6ª Vara
Federal; e a Ataíde de Souza Torrers, assistente dos juízes da 2ª Vara Federal de Guarulhos,
que, mesmo sem apoio do Sistema, conseguem impingir nos intérpretes o comprometimento
e o engajamento necessários para o desempenho da função.
Um agradecimento em especial ao juiz federal Paulo Marcos Rodrigues de Almeida por
depositar confiança em meu trabalho e aplicar as técnicas nele sugeridas em suas audiências,
transformando sua atuação já excepcional em excelência plena, principalmente no que
tange, tanto ao conhecimento profundo das habilidades linguísticas envolvidas em sua
complexidade, quanto a total discrição exigida de um intérprete forense em procedimento
judicial.
Aos meus colegas intérpretes Patrícia Isabel Rojas Gonzalez, Milena Mitkova Regregi,
Sorim Rosemberg (in memoriam), Sigrid Maria Hannes, Bernardo René Simons, Ewa Maria
Parszewaska, e muitos outros que como eu prestam serviço na Justiça Federal e Estadual,
simplesmente pelo dever moral e humano acima de tudo. Que continuemos nossa luta para
que tenhamos mais reconhecimento e sejamos devidamente respeitados pelo Sistema, assim
como são os intérpretes forenses de outros países desenvolvidos e em desenvolvimento.
RESUMO
36
ABSTRACT
This paper aims, like a manual, to inform interpreters of their professional and ethical
responsibilities, so that they can deal with the difficulties that commonly arise in matters
involving non-English speaking parties in the state or federal judicial system in Brazil. It
will also serve as a reference and springboard for discussion in conjunction with the
country’s judicial council, or at least in those courts where the foreign court proceedings are
held.
37
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO 9
2. PARTICULARIDADES DA INTERPRETAÇÃO FORENSE 11
2.1. Adições 12
2.1.1. Embelezamento 12
2.1.2. Esclarecimentos 13
2.1.3. Conversão de unidades monetárias e medidas 14
2.1.4. Omissões e edições 14
2.1.5.Referências na terceira pessoa do singular 15
2.1.6. Repetição das palavras 15
2.1.7. Redundância 16
2.1.8. Falso início de frase 16
2.1.9. Palavras de preenchimento 17
2.1.10. Mudanças no significado 17
2.1.11. Adequação 19
2.1.12. Expressões idiomáticas 19
2.1.13. Provérbios 20
2.1.14. Linguagem figurada 20
2.1.15. Nuances 21
2.1.16. Obscenidades 22
2.1.17. Declaração desconexa 22
2.1.18. Testemunho sem sentido 23
2.1.19. Testemunho incompreensível 23
2.2. Condição emocional subentendida 24
2.2.1. Emoções demonstradas pelo interrogado 24
2.2.2. Emoções demonstradas pelo intérprete 24
2.3. Comunicação não-verbal 25
2.3.1. Gestos dos interrogados 25
2.3.2. Gestos do intérprete 26
2.4. Alteração no sentido 27
2.4.1. Ambiguidades 27
38
2.4.2. Conservação ou esclarecimento das ambiguidades 27
2.4.3. Negativa dupla 28
2.4.4. Repetição da pergunta às partes 29
2.4.5. Repetição em geral 29
2.4.6. Erros 29
2.4.7. Correção dos próprios erros 30
2.4.8. Esclarecimentos de termos não familiares 30
2.4.9. Termos vinculados culturalmente 31
2.4.10. Repetição de trechos em português usados pelo interrogado 32
2.5. Perguntas do interrogado 32
2.6. Identificação das declarações do intérprete 32
3. DESAFIOS DA INTERPRETAÇÃO 34
3.1. Rapidez na fala do interrogado 34
3.2. Imparcialidade e prevenção 35
3.2.1. Conflitos de interesse 35
3.2.2. Aparência de parcialidade 35
3.2.3. Partes no caso 36
3.2.4. Prévio envolvimento no caso 37
3.2.5. Presentes e gratificações 38
3.2.6. Neutralidade 38
3.2.7. Opinião pessoal 39
3.2.8. A busca das respostas pelo advogado de defesa 39
3.2.9. Interação com os advogados constituídos ou ad hocs 40
3.2.10. Interação com os assistentes judiciários 40
3.3. A mídia e o público 41
3.3.1. Reportagens 41
3.3.2. O público 41
3.4. Confidencialidade 41
3.5. Privilégio entre acusado e advogado 42
3.6. Audiências via videoconferência 42
3.7. Material probatório 43
3.8. Tradução e/ou versão escrita de documentos 43
39
3.9. Transcrição e tradução de material probatório em áudio e vídeo (escuta telefônica)
44
3.10. Conselhos legais 45
3.11. Perguntas dos réus 45
3.12. Perguntas das testemunhas estrangeiras 46
3.13. Perguntas da família e amigos dos réus e testemunhas 46
3.14. Relações profissionais 47
3.15. Discrição 47
3.16. Educação continuada 48
3.16.1. Educação continuada e requisitos da função 48
3.17. Familiaridade com o caso 49
3.18. Terminologia técnica 49
3.19. Uso da tecnologia 50
3.20. Relacionamento com os colegas 50
3.21. Avaliar e relatar impedimentos para o desempenho 51
3.21.1. Fadiga do intérprete 51
3.21.2. Desqualificação 52
3.21.3. Interpretação em grupo 52
3.21.4. Audibilidade 52
3.22. Instruções às partes 53
3.23. Instruções que não se interpretam 53
3.24. Tradução simultânea de documentos no decorrer da audiência 54
3.25. Interpretação de áudio ou vídeos 55
3.26. Atuação cultural ou linguística 55
3.27. Dever de reportar violações éticas 56
4. PESQUISA DE CAMPO 57
5. CONCLUSÃO 59
6. REFERÊNCIAS 61
40
1. INTRODUÇÃO
O The American Heritage define ética como “the study of the general nature of morals
19 O estudo geral natural da moral e as escolhas morais específicas feitas por uma pessoa; filosofia moral
(tradução nossa).
20 As regras ou padrões que governam a conduta de uma pessoa ou dos membros de uma profissão
(tradução nossa).
41
denúncia ao acusado já encarcerado, tanto em audiência presencial como por
videoconferência.
Ainda segundo Pagura, a primeira escola criada propriamente para a formação desses
profissionais foi a da Universidade de Genebra, na Suíça, em 1941, a qual passou, em 1972,
a também dedicar-se à formação de tradutores.
No Brasil, a profissão de tradutor/intérprete tem crescido em importância. Algumas
instituições renomadas, como o Centro Universitário Ibero-americano (Unibero), a
Universidade Gama Filho (UGF), a Pontifícia Universidade Católica (PUC), a Universidade
Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a Associação Alumni etc. oferecem cursos de tradução e
interpretação em diversas línguas, bem como avaliação e certificação em diversas áreas
técnicas relacionadas. Nota-se, dado o exposto, que basta interesse do Sistema para o
desenvolvimento de concursos para criação dessa função, no âmbito judiciário, já que a
determinação do Ministério da Justiça nem sempre é cumprida.
Essa situação inapropriada reflete a ineficiência do Sistema; o que, muitas vezes, leva o
processo à nulidade pelo tribunal, penalizando o magistrado a fazer o mesmo trabalho duas
vezes e levando uma nação toda ao descrédito.
No Canadá, o exame de certificação para intérpretes de audiência, ou forense, é
supervisionado pelo Canadian Translators and Interpreters Council (CTTIC). Os candidatos
42
são testados em proficiência linguística, terminologia e procedimentos legais, interpretação
consecutiva e uma simulação real de audiência como teste. Moeketsi (2008) relatou que, na
África do Sul, onde é comum para os intérpretes terem algo como seis ou sete línguas
diferentes em uma mesma audiência, os candidatos recebem documentos escritos para
traduzir e verter para essas línguas, e devem responder a uma série de perguntas sobre o
sistema judiciário. Os candidatos aprovados nesses testes recebem dois dias de orientação e
treinamento, atuando em pequenas partes de uma audiência real, com cada vez menos
supervisão pelo seu mentor. Ao terem adquirido alguma experiência, eles são enviados à
Faculdade de Direito de Pretoria, onde ficam em treinamento por seis semanas em
procedimento civil e criminal, terminologia jurídica, teoria da tradução e técnicas de
interpretação. Não há efetivamente um exame para determinar se eles estão aptos a
trabalhar, tampouco uma avaliação para checagem da retenção das habilidades aprendidas
em treinamento: os indivíduos são simplesmente alocados novamente nos fóruns, onde
continuam a atuar como intérpretes.
Assim, nota-se que a seleção e a preparação dos intérpretes são cruciais. A decisão de
contratá-los não deve caber aos juízes, aos servidores públicos ou aos assistentes judiciários,
muito menos se deve abrir o exercício da função a qualquer falante de língua estrangeira,
como sugerido no site da Justiça Federal – procedimento esse adotado em muitos países
subdesenvolvidos. Países com os mais altos níveis de programas de interpretação em
audiência, ou forense, descobriram que os exames de desempenhos objetivos são a melhor
forma de identificar indivíduos com as habilidades exigidas para executar essa importante
tarefa.
Há duas razões principais para que haja intérpretes atuando nos fóruns em audiência:
permitir que o não falante da língua portuguesa esteja no mesmo nível de entendimento dos
procedimentos legais que os demais envolvidos e assegurar que a gravação oficial do
procedimento em português reflita precisamente o que foi declarado em língua estrangeira
pelo interrogado, qualquer que seja seu envolvimento com o caso.
43
É importante salientar que tanto o juiz quanto o procurador da República acreditarão
inteiramente na interpretação do testemunho para tirar conclusões sobre credibilidade do
interrogado e calcular o peso relativo de suas declarações. Da mesma forma, o advogado de
defesa tomará decisões em relação ao réu e procederá em audiência para elaborar a melhor
defesa confiando na interpretação que está sendo realizada.
Para que isso aconteça, o intérprete tem de manter cada elemento da informação contida
na mensagem original o mais próximo possível do contexto em português, ou seja, sintaxe
(estrutura da língua) e semântica (seu significado). Pela mesma razão, o não falante de
língua portuguesa deve ouvir atentamente as perguntas, sem simplificação, esclarecimento
ou omissão. Os réus que precisam de intérpretes acreditarão piamente na versão dos
procedimentos jurídicos de seu caso e se basearão no que ouvirem para assistir o seu
defensor na elaboração da defesa.
2.1. Adições
2.1.1. Embelezamento
44
2.1.2. Esclarecimentos
45
esclarecer a dúvida, ou ainda usará outros recursos para fazê-lo. Se o termo em questão for
uma parte essencial da resposta que os outros não entenderão a menos que haja explicação, e
se a comunicação puder ser prejudicada, a intervenção poderá ser feita. No entanto, se
parecer ao intérprete que o advogado de defesa ou o procurador da República serão capazes
de esclarecer a situação por meio de outras perguntas sequenciais, o intérprete deve se abster
de tomar qualquer atitude.
46
2.1.5.Referências na terceira pessoa do singular
É comum que pessoas que falam por intermédio de um intérprete iniciem suas perguntas
ou afirmações com frases como “Diga a ele...” e “Pergunte a ele se...”, em vez de dirigir-se
diretamente ao interrogado. Se eles o fizerem, não se devem editar as frases. Se alguém
repetidamente usar a terceira pessoa do singular em suas declarações, o juiz geralmente
instruirá a pessoa quanto ao procedimento correto, que é fazer sempre as perguntas
diretamente ao interrogado, sem passar pela pessoa do intérprete. Algumas vezes, o próprio
juiz falará empregando a terceira pessoa do singular, dirigindo-se ao intérprete e não ao
interrogado, embora esse procedimento não seja apropriado.
O exemplo a seguir ilustra o padrão a ser seguido:
Juiz: “Vamos iniciar o interrogatório do réu Joseph Smith, do processo número 52.456.
Em primeiro lugar, devo cientificá-lo que, de acordo com a Constituição Brasileira, o senhor
não tem obrigação de responder às minhas perguntas, nem de dizer a verdade, e o seu
silêncio não será interpretado em prejuízo de sua defesa nem significará que o senhor está
admitindo culpa. Entretanto, devo instruí-lo que o interrogatório é um instrumento de defesa
para que o senhor conte a sua versão sobre os fatos. O senhor deseja responder às minhas
perguntas?” Caso isso não ocorra, deve-se solicitar ajuda do juiz.
47
fisiológicas ou psicológicas. Nesse caso, o intérprete não deve imitar a gagueira, confiando
que tal comportamento será evidente para as partes em sala de audiência.
Ressalte-se que algumas línguas usam repetição como um modo de expressar ênfase ou
ação contínua, como em “Ela estava caminhando e caminhando”. Nesses casos, é aceitável e
pode ser idiomaticamente mais correto transmitir o significado lançando mão de um recurso
linguístico correspondente na língua-alvo, como “Ela continuou caminhando”, transmitindo
a repetição da língua de partida para a língua de chegada sem mudança no significado ou
omissão, embora a interpretação literal não caracterize erro.
Na verdade, uma interpretação literal bem intencionada pode às vezes ser uma solução
muito prudente. Deve-se assegurar que a interpretação faça sentido e mantê-la em uma
forma o mais semelhante possível à original, de modo que se evite um teor diferente no
significado.
2.1.7. Redundância
48
modo diferente. É de extrema importância que no testemunho dos réus sejam interpretadas
todas essas correções próprias na língua-alvo para que os magistrados tirem suas conclusões
sobre o grau de certeza e precisão na resposta.
Nunca se deve corrigir erro algum cometido pelo interrogado, independentemente de
quão involuntário possa parecer, nem que este aparente ter sido cometido pelo próprio
intérprete, o que pode denegrir sua reputação quanto à habilidade de interpretação. Como
exemplo, o réu diria: “Eu nunca tinha encontrado com ele antes de aceitar, quero dizer, uma
vez eu encontrei com ele antes de aceitar o serviço”.
Por outro lado, pode-se corrigir o próprio falso início ou erro de dicção, fazendo constar
nos registros ao prefaciar a fala com as palavras “Correção do intérprete”, para que não haja
confusão com as correções do interrogado.
49
(passado: lay-lain), quer dizer “estar deitado em algum lugar”, ou denota que algo está,
simplesmente, posicionado em algum lugar (esse fenômeno caracteriza, linguisticamente,
um morfema homônimo: morfemas com formas iguais e significados diferentes).
O contexto cultural também apresenta palavras com significados inesperados. A oração
“I put it in my boot”, para um americano, significa “Eu coloquei em minhas botas”; mas,
para um britânico, pode significar tanto que se colocou o objeto em seu calçado quanto no
portamalas do carro, dado que “boot” pode significar “bota” ou “porta-malas”. Nesse caso,
considerar o contexto em que a palavra está inserida é crucial para interpretação precisa. Se
houver qualquer dúvida quanto ao significado correto da palavra, jamais se deve tentar
adivinhá-lo.
Quando o esclarecimento se fizer necessário, haverá duas possibilidades: pedir
explicações ou dar os diferentes significados da palavra, sempre pedindo auxílio do juiz nos
esclarecimentos a fim de preservar sua autoridade em audiência. Poderia se dizer, por
exemplo: “Excelência, o interrogado utilizou uma palavra ‘wrapper’” – e o intérprete então
soletra a palavra para ficar registrada nos autos e esclarece que há duas traduções possíveis:
“invólucro” ou “empacotador”. O juiz, então, direcionará o intérprete nas perguntas para
descobrir o verdadeiro significado da palavra, ou deixará que o advogado de defesa ou
procurador da República o faça no decorrer da audiência. Ele poderá também pedir ao
intérprete que esclareça o significado com o interrogado. Se for esse o caso, o que for
conversado com o interrogado deve constar nos registros. Por exemplo: “Excelência, o
intérprete perguntou ao interrogado o que ele quis dizer com a palavra ‘wrapper’ em seu
discurso e o interrogado indicou que o significado correto para palavra ‘wrapper’, neste
caso, é ‘invólucro’, ou ‘cápsula’, um sinônimo dado pelo próprio interrogado”.
Se o intérprete não for capaz de depreender o significado prontamente, deve retornar à
audiência com o juiz imediatamente para evitar um diálogo longo com o interrogado.
2.1.11. Adequação
Quando interpretar uma mensagem da língua de partida para a língua de chegada, nunca
se deve alterar o registro, ou nível da linguagem, para tornar a frase de fácil entendimento
50
ou mais socialmente correta. Por exemplo: “Você observou o sujeito com a mala aberta
subsequentemente?”, não se deveria adequar e dizer na língua-alvo: “O que você o viu
fazendo depois?”. Se houver um sinônimo formal, não se deve tentar baixar o nível
linguístico da pergunta para o réu. Ademais, o intérprete não deve intervir e dizer que acha
que o interrogado pode não compreender a pergunta. Se isso acontecer, é responsabilidade
dele, ou ainda do advogado de defesa que não o preparou bem em sua defesa. Não é
trabalho do intérprete expressar opinião quanto à habilidade do interrogado em compreender
as perguntas.
É importante compreender que, quando se faz interpretação em audiência de instrução e
julgamento, o juiz e o procurador da República tirarão conclusões sobre a sofisticação,
inteligência e credibilidade do réu com base na escolha das palavras, no estilo, no tom de
voz etc. Cabe ao intérprete transmitir fielmente todos os fatos para que os magistrados
tenham a mesma impressão, como se eles pudessem entender o interrogado diretamente.
Expressões idiomáticas são frases cujo significado não é meramente o resumo das
palavras nelas contidas. Exemplos de expressões idiomáticas: “queimar a largada” (to jump
the gun); “aceitar as consequências” (to face the music); “na calada da noite” (in the dead of
night).
O intérprete deve se empenhar ao máximo para entregar a expressão idiomática
equivalente na língua-alvo. Entretanto, caso não haja certeza quanto à equivalência na
tradução, deve-se pedir o auxílio do juiz: “O intérprete solicita o auxílio de Vossa
Excelência. O interrogado utilizou uma expressão idiomática, a qual o intérprete é incapaz
de interpretar com segurança que não literalmente”.
Mesmo os intérpretes veteranos devem continuar a expandir seu domínio de expressões
idiomáticas, pesquisando-as dentro e fora da esfera judicial e lendo livros atualizados, dada
a volatilidade das expressões, e conversando com colegas de profissão.
Outros intérpretes que possivelmente estejam na mesma sala de audiência podem
oferecer ajuda nesse caso. Esse auxílio pode se dar escrevendo a palavra e mostrando-a
51
discretamente, ou ainda por leitura labial. Se, ainda assim, o intérprete não encontrar um
termo equivalente na língua-alvo, deve-se pedir permissão ao juiz para consultar um colega
ou um dicionário. Esgotadas as possibilidades de ajuda, se o intérprete não conseguir
encontrar um correspondente à expressão idiomática, deve informar ao juiz que tomará as
providências necessárias para averiguação do fato.
2.1.13. Provérbios
Os provérbios são ditos populares ou pensamentos úteis que expressam uma verdade
baseada no senso comum. Há momentos em que o intérprete se depara com a tarefa de
interpretar comentários que contenham esses ditos populares.
Todas as culturas têm uma tradição rica em provérbios, alguns dos quais sem
correspondência em outro idioma. O que em um país pode ser expresso como “Não venda a
pele antes que você tenha matado o urso” pode ser passado para outro idioma como “Não
conte seus frangos antes que estejam chocados”.
O intérprete de tentar usar um provérbio equivalente na língua-alvo sempre que
possível, mas somente se tiver certeza de que seu uso esteja correto. Se um provérbio
equivalente não existir, ou se não conseguir interpretá-lo, deve-se traduzir literalmente,
indicando que se está fazendo uma tradução literal de um ditado. O juiz poderá intervir para
resolver a situação.
52
expressão em seu dicionário ou para conversar com um colega. Bons dicionários bilíngues
contêm um número considerável dessas expressões. Contudo, se não houver um termo
equivalente, uma tradução literal pode servir.
Os ouvintes geralmente reconhecem linguagem figurada e não farão a tradução literal.
Em caso de dúvida, deve-se informar ao juízo que o interrogado usou linguagem figurada,
que não se traduz com facilidade, e perguntar se uma tradução literal deve ser feita. O juiz
ou o procurador poderão, então, perguntar ao interrogado o que de fato ele quis dizer com
aquela frase.
2.1.15. Nuances
53
liberdade para restritiva de direito, conforme recente decisão do tribunal, dependendo do
caso.
Deve haver atenção também no que tange à seleção dos termos da língua-alvo que
refletem precisa e minuciosamente a intenção do interrogado. Embora seja, muitas vezes,
somente estratégia de defesa, cabe ao intérprete apenas traduzir o discurso, sem tirar
conclusões quanto ao testemunho.
2.1.16. Obscenidades
Se o interrogado emprega linguagem de baixo calão ou diz algo que possa ser
prejudicial para o caso, não se devem editar os termos ofensivos.
Os magistrados julgarão a honestidade e a credibilidade do interrogado com base em sua
maneira de testemunhar. Por isso, eles não podem estar em desvantagem apor não
conhecerem o idioma de origem.
Por razões de ordem cultural, obscenidades são difíceis de interpretar literalmente, pois
a interpretação feita palavra por palavra pode ficar sem sentido ou soar burlesca na língua-
alvo. Em vez da interpretação literal, o intérprete deve empregar o termo ou a expressão
equivalente funcional mais próxima.
2.1.17. Declaração desconexa
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uma declaração fragmentada e desconexa para a língua-alvo de maneira semelhante à
original, sem inserir qualquer informação sobre a sua própria interpretação para esclarecer a
declaração do interrogado.
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2.2.1. Emoções demonstradas pelo interrogado
O juízo precisa, de fato, ter uma compreensão clara das emoções do interrogado, como
raiva, medo, vergonha ou excitação.
As pessoas transmitem suas emoções não apenas com palavras, mas também com
expressões faciais, postura, tom de voz e outras manifestações corporais. Esses meios não
linguísticos de expressão estão intimamente ligados à cultura e à língua e, quando as pessoas
são falantes de idiomas distintos, o conteúdo emocional da mensagem pode passar
despercebido.
O intérprete deve esforçar-se para preservar esse elemento da emoção pela modulação
de voz. Por exemplo, quando o juiz ou o procurador faz uma declaração assertiva ao
interrogado, o tom de voz deve transmitir essa assertividade e, quando o interrogado
responde às perguntas de uma forma tímida, seu tom deve transmitir essa timidez. No
entanto, deve-se evitar qualquer tipo de dramatismo. O intérprete somente poderá abster-se
na imposição do tom da voz se assim for o testemunho.
Deve-se manter a moderação, que é particularmente importante quando o interrogado se
torna muito emotivo ou agressivo. Nesses casos, deve-se aguardar até que o interrogado se
acalme e se possa atenuar a entrega do testemunho em sua fala.
Não se deve imitar o interrogado, especialmente porque assim se pode aumentar o efeito
do testemunho. O juiz e o procurador da República correlacionarão a interpretação às
próprias observações que fizeram acerca do comportamento da testemunha.
O juiz deve julgar a credibilidade do interrogado pelo seu testemunho, sem receber
informações ao observar o intérprete. É imperativo que o profissional permaneça
emocionalmente neutro, expressando apenas as reações das partes para quem está
interpretando. Algumas situações, como quando o interrogado chora muito, quando há
crianças envolvidas, quando o interrogado involuntariamente diz algo engraçado ou quando
o interrogado não é crível, dificultam que o intérprete se mantenha emocionalmente neutro.
56
Uma forma de manter a compostura é tentar obter informações sobre o caso, lendo os
registros relevantes e treinando de antemão, especialmente se a descrição de circunstâncias
perturbadoras for necessária.
Embora existam algumas exceções, os advogados de defesa e/ou os defensores públicos
federais entendem as necessidades da interpretação e normalmente se empenham em
auxiliar o intérprete. De qualquer forma, deve-se estar psicologicamente preparado para o
depoimento e gerenciar melhor as emoções na sala de audiência.
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Isto também diz respeito a gestos culturalmente vinculados, como esfregar o indicador e
o polegar para indicar dinheiro. Não se deve preencher o vazio verbal. É trabalho do
procurador da República capturar essa comunicação não verbal, podendo ele proceder da
seguinte forma: “O que você quer dizer com o gesto do ‘V’ que você acabou de fazer com o
indicador e o dedo médio da mão direita?”.
Se o procurador não percebe o gesto ou opta por ignorá-lo, o intérprete não deve
interpor ou atuar como perito, exceto como último recurso, e somente se o gesto em questão
for vital para o depoimento. Nesse caso, pode-se informar ao juiz que uma comunicação não
verbal acompanhou o depoimento, ou que o interrogado respondeu apenas com um gesto.
Não se deve dar qualquer informação ou explicação, a não ser que convidado pelo juiz ou
pelo procurador da República.
É dever do juiz e do procurador da República estar atentos. O intérprete não deve tomar
para si a responsabilidade de relatar o que não teria sido apontado se sua presença na sala de
audiência não fosse necessária.
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2.4. Alteração no sentido
2.4.1. Ambiguidades
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lembrando-se de que nenhuma pergunta, seja ela do advogado de defesa ou do procurador
da República, deve ser feita sem a autorização do juiz. Antes que se faça a interpretação da
pergunta, o intérprete deve, primeiramente, obter a autorização do juiz, que poderá ser
apenas um consentimento feito por um meneio da cabeça ou por autorização verbal.
Não se deve interferir, a não ser que o problema cause um grave obstáculo linguístico.
Intérpretes experientes sabem que uma pergunta com uma negativa dupla pode
confundir a testemunha e obter uma resposta ambígua. Por exemplo, se o advogado
pergunta: “Não é verdade que você não sabia o que estava acontecendo?”, a resposta
negativa pode significar
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2.4.4. Repetição da pergunta às partes
Se, durante o depoimento, o intérprete não entender a pergunta feita pelo advogado de
defesa, ou se esquecer de parte da questão, ele deve solicitar que a questão seja repetida pelo
advogado. O protocolo em situações como essa é cientificar o juiz do problema e obter
permissão para resolvê-lo. Por exemplo, pode-se perguntar: “Meritíssimo, o intérprete pode
pedir ao advogado que repita a pergunta?”
Às vezes, o intérprete pode não ter entendido apenas uma palavra da frase. Mesmo em
situações assim, deve-se esclarecer o que foi dito, pois não se deve nunca proceder à
interpretação sem ter certeza do que foi ouvido. Nesse caso, bastaria dizer, por exemplo: “O
intérprete gostaria de esclarecer a última parte da pergunta do advogado: foi ou não foi até a
loja?”
2.4.6. Erros
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É comum que o procurador da República, o advogado ou o juiz, preocupado com o
desenvolvimento do caso e pensando sobre a próxima série de perguntas, pronuncie
incorretamente o nome do interrogado, aborde-o chamando o nome de outra pessoa
envolvida ou indique data falsa, especialmente quando há várias datas envolvidas e vários
acusados.
Ao interpretar, nunca se deve corrigir um nome errado ou data diferente da real,
tampouco é aconselhável levar o erro à atenção de todos. O intérprete deve interpretar a
informação exatamente como dita por quem estiver falando. O erro será descoberto ao final
e o registro dos autos refletirá claramente o que causou a imprecisão.
Se estiver a par de todos os detalhes dos registros nos autos e tiver certeza de que há
uma discrepância entre o que está escrito e o que foi dito, o intérprete deve informar o juízo
imeditamente para que o problema seja solucionado.
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2.4.8. Esclarecimentos de termos não familiares
O significado de termos desconhecidos não deve ser adivinhado. O intérprete deve estar
munido de um dicionário e tê-lo disponível para consulta na mesa de audiência.
Poder-se-ia padronizar o procedimento ao adotar como protocolo a seguinte afirmação:
“Meritíssimo, para garantir a precisão, o intérprete gostaria de consultar o dicionário antes
de interpretar um termo que a testemunha usou.”.
Não se deve escolher adotar como correto o primeiro significado que o dicionário
oferecer apenas para poupar tempo. Da mesma forma, o intérprete não deve achar que
consultar uma obra de referência denota falta de habilidade profissional. Se esse tipo de
situação for um acontecimento ocasional, as partes devem ter ainda mais confiança por
causa do seu compromisso com a transparência do registro nos autos.
Os dicionários são ferramentas de referência úteis, mas não devem ser evocados com
exclusividade. Se nenhum dos termos listados parece adequado, deve-se pedir permissão ao
juizo para esclarecer com a parte que usou o termo problemático. No entanto, o intérprete
não deve envolver-se em uma conversa com o interrogado sem antes obter a permissão do
juiz. No caso de ter esclarecido alguma dúvida com o interrogado, o intérprete deve relatar
ao juiz o que perguntou e qual foi a resposta. Ao conduzir-se de forma calma e profissional,
o intérprete manterá sua credibilidade e a confiança das partes.
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termo para o qual não existe um equivalente direto. Não se deve fazer uma tradução
aproximada ou tentar dar explicações voluntárias, a não ser que seja solicitado pelo juiz.
Geralmente, o procurador da República pode pedir explicações a partir do testemunho
por meio de uma sequência de perguntas de checagem, caso o termo seja importante para o
entedimento de todos. Em muitos casos, o significado do termo pode não ser relevante o
suficiente para justificar uma explicação.
O intérprete deve estar atento ao fato de que está interpretando um testemunho que
ficará registrado nos autos e, via de regra, qualquer pessoa que ouvir a gravação dos autos
ou assistir à audiência ouvirá atentamente apenas sua voz, e não a voz do interrogado.
Portanto, mesmo que ele responda em português ou diga um nome, ainda que todos possam
entender sem qualquer necessidade de interpretação, deve-se repeti-lo para o registro nos
autos.
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Quando o intérprete faz uma declaração em audiência, é importante esclarecer que está
falando como intérprete, tornando evidente a todos que aquela declaração é de sua autoria, e
não do interrogado.
Em audiência, a prática mais comum é o intérprete referir-se si mesmo na terceira
pessoa do singular, para que fique registrado nos autos que não está interpretando um
testemunho, mas falando como profissional. Em situações menos formais, ainda que a
prática se torne natural fora de audiência (como em uma entrevista reservada entre defensor
público e réu, bem como em depoimentos da testemunha), o intérprete pode simplesmente
parar e mudar o seu tom de voz, e depois falar na primeira pessoa – talvez apontando para si
mesmo e dizendo “Eu acredito que a testemunha estava se referindo...”.
Deve-se ressaltar que é função do advogado esclarecer mal-entendidos fazendo
perguntas de acompanhamento. O intérprete não deve tomar para si essa responsabilidade, a
não ser que precise fornecer uma explicação precisa e imprescindível, quando a
comunicação é interrompida ou há posições falsas sendo feitas como consequência de
desentendimentos culturais ou linguísticos. Nesses casos, o intérprete é o único que tem o
conhecimento especializado e o treinamento para perceber que um mal-entendido está
acontecendo.
Embora possa parecer mais eficiente lidar com perguntas ou comentários diretamente
com o réu, o melhor é estabelecer como regra sempre falar com o juiz, pois isso irá isolar o
intérprete da natureza contraditória do processo judicial.
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3. DESAFIOS DA INTERPRETAÇÃO
Muitas vezes, o intérprete não é a única pessoa na sala que sabe o idioma de origem e o
idioma de destino. Assim, é muito fácil para outras pessoas perceberem os erros, por não
estarem sob pressão como o intérprete está.
Às vezes, o desafio vem de um advogado que preparou muito bem o interrogado e sabe
como o depoimento deve ser; ou então pode vir de alguém que está mais familiarizado com
a terminologia específica e se considera mais capaz de ouvir ou entender a fala do orador ou
do interrogado.
Se o intérprete é questionado por alguém na sala de audiência, deve responder educada e
profissionalmente, sem considerar esse tipo de atitude uma afronta pessoal. Se concordar
com a correção, deve corrigir o registro dos autos. Contudo, se a proposta para a correção
for inaceitável, deve manter sua versão original. Sem se justificar ou racionalizar, o
intérprete pode explicar seu raciocínio, se necessário. Por exemplo, pode dizer: “Em outro
contexto, essa correção seria cabível, mas não neste caso”.
Faz parte da função do procurador da República indagar ao interrogado sobre seu
testemunho (ou a sua interpretação) para esclarecimentos gerais, pois os desafios da
interpretação fazem parte do curso normal dos eventos no tribunal, sobre os quais o juiz tem
a palavra final.
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simultânea (normalmente, a fala do intérprete acontece dois segundos depois da fala do
interrogado).
Se o juiz não se atentar a esse fato, deve-se chamar sua atenção levantando a mão. No
entanto, na maioria das vezes, o próprio juiz instrui as testemunhas com relação à rapidez da
fala.
O conflito pode existir quando o intérprete tem interesse pessoal no desfecho do caso
por ser amigo, parente ou conhecido de uma das partes. Sempre que essas condições
existirem, não se deve aceitar a atribuição. Aceitá-la pode prejudicar a reputação
profissional e macular a imagem dos demais profissionais da área.
Se o intérprete tomar ciência de que há um conflito de interesse real ou aparente
somente depois de ter aceitado uma designação, de informar imediatamente ao responsável
para os assuntos da audiência no gabinete do juiz ou ao defensor público antes mesmo de a
audiência começar, para que haja tempo suficiente para sua substituição. O juiz vai
determinar se um conflito de interesse existe e se o profissional deve, de fato, ser
substituído.
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Devem-se evitar ações como comentar o caso, dar conselhos, tocar o réu em gesto de
consolo ou se engajar em conversa na sala de audiência em uma língua que os outros não
entendam.
Quando da colheita do depoimento do réu, o intérprete pode ficar sentado ao lado dele
por várias horas, e inevitavelmente parecerá que há um vínculo entre os dois. Da mesma
forma, pode-se estar interpretando o testemunho de um determinado réu por um longo
tempo ao lado dele. Mesmo que sinta qualquer afinidade pelo interrogado, a interpretação
do depoimento pode ter menos credibilidade com o juízo ou outras partes se eles
considerarem que o intérprete está influenciando o testemunho ou interpretando de uma
forma tendenciosa. Por isso, é mandatório que se evite qualquer tipo de conversa com o réu.
Evitar essas conversas, contudo, não é fácil: os réus não são falantes da língua
portuguesa e ficam naturalmente ansiosos para falar com alguém que possa compreendê-los
– nesse caso, o intérprete. Para prevenir esses diálogos, o intérprete deve, no momento da
apresentação, explicar brevemente como a interpretação vai funcionar, mencionando que
todas as dúvidas devem ser dirigidas somente ao advogado dele.
Nos momentos em que houver uma pausa na audiência, deve-se manter distância do réu.
No caso de se estar interpretando a testemunha para o réu simultaneamente em uma
audiência por videoconferência, por telefone, o intérprete pode erguer a mão educadamente
se o réu começar a conversar, qualquer que seja o assunto. De maneira alguma se deve tratar
de aspectos legais do caso, nem permitir que qualquer um deles começe a contar sua versão
dos fatos. Essas informações podem ser obtidas em momento oportuno, por meio de
solicitação a um funcionário ou ao advogado para se ter acesso aos autos com as acusações
ou quaisquer documentos que possam estar disponíveis, a fim de que o intérprete se
familiarize com as condições gerais do processo; evitando, dessa forma, dar ao réu a
oportunidade de discutir sobre o caso.
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3.2.4. Prévio envolvimento no caso
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3.2.5. Presentes e gratificações
Nunca se devem aceitar gratificações ou doações de qualquer pessoa para quem se está
interpretando, quer em matéria judicial penal ou civil. Se um presente for oferecido, o
intérprete deve explicar educadamente que seus honorários são pagos pelo Nufi (núcleo
financeiro) ligado ao Governo Federal e que não está autorizado a aceitar presentes de
qualquer uma das partes no caso.
3.2.6. Neutralidade
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3.2.7. Opinião pessoal
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3.2.9. Interação com os advogados constituídos ou ad hocs
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3.3. A mídia e o público
3.3.1. Reportagens
Pode acontecer que o intérprete seja chamado para atuar em algum processo que atraia
muita atenção da mídia por causa da natureza do caso ou das personalidades envolvidas.
Os meios de comunicação, empenhando esforços em obter informações não disponíveis,
podem tentar entrevistar o intérprete. Ressalta-se que um intérprete não deve divulgar a
absolutamente ninguém qualquer informação sobre a conversa reservada entre advogado e
cliente, tampouco o ocorrido em sala de audiência. Nunca se pode conceder uma entrevista
ou fazer qualquer comentário aos meios de comunicação sobre um processo pendente. Em
resposta a qualquer contato da mídia, um simples “Nada a declarar” basta.
3.3.2. O público
No Brasil, os procedimentos judiciais ocorrem sob segredo de Justiça e não são abertos
ao público como nos Estados Unidos, por exemplo. Entretanto, há muita curiosidade das
pessoas em saber como acontece uma audiência com réus presos, especialmente os
estrangeiros; em quais tipos de crimes eles se envolvem e o veredito do processo. Assim,
perguntas sobre os casos são inevitáveis.
Como regra, o intérprete não deve usar os nomes dos acusados nem descrever
circunstâncias perturbadoras, mas esclarecer que, no Brasil, os estrangeiros são tratados
respeitosamente e que as leis são cumpridas consoante o Código Penal.
Pode-se falar genericamente a respeito dos tipos de crime e das penas aplicadas, mas
não se devem citar nomes de juízes nem emitir opinião pessoal sobre eles.
3.4. Confidencialidade
O intérprete deve ter em mente que qualquer informação obtida no decurso do seu
trabalho com interpretação em audiência é confidencial. Se ele participa na preparação de
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um caso, quer seja na defesa ou na acusação (tais como entrevistas com réus ou até mesmo
testemunhas estrangeiras), de maneira alguma deve revelar a natureza da comunicação
interpretada, embora o escopo de confidencialidade seja um pouco diferente para cada um
deles.
Um dos princípios básicos mantidos há muito tempo no sistema judicial é com relação
ao sigilo da conversa do acusado com seu advogado; que, na verdade, é a preparação do
acusado para a audiência. Essa é a única oportunidade de fato em que o réu tem de preparar
sua defesa com seu defensor.
Nessa conversa reservada, o réu fala a verdade ao seu advogado, que não é
necessariamente o que ele dirá em audiência. O momento da entrevista é a oportunidade que
o advogado tem para preparar a defesa do réu com base nas “brechas da lei”, direcionando-o
sempre a atingir o objetivo final, que é uma menor pena possível. É por isso que essa
conversa ter de ser mantida em sigilo absoluto pelo intérprete.
Essa obrigação se estende mesmo após o desfecho do caso por dois motivos: por causa
de uma possível apelação do réu sobre a decisão do juiz e pelo fato de que o intérprete
jamais poderá ser ouvido como testemunha contra o réu, e usar tudo o que foi dito, lido ou
ouvido pelo profissional contra o interrogado.
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Por videoconferência, as audiências são muito mais difíceis para o intérprete do que em
audiência presencial, pois, por mais avançada que seja a tecnologia, ainda assim ocorrem
atrasos chamados de delay. Por isso, o intérprete não pode lançar mão do recurso da leitura
labial, pois a imagem chega com alguns milésimos de segundo de atraso e confunde a
interpretação.
O réu não é prejudicado se a audiência se dá por videoconferência, pois o intérprete a
conduzirá com o mesmo profissionalismo que teria se ela fosse presencial. É possível que
ele tenha de solicitar ao réu, com a permissão do juiz, que repita alguma frase por ocasião de
interferência tecnológica, mas esse procedimento é comum e esperado pelas partes
envolvidas.
Os tradutores públicos juramentados são, por lei, obrigados a prestarem serviço à Justiça
do País. Entretanto, na prática, essa obrigação não é respeitada e os assistentes judiciários
precisam encontrar alternativas para que o trabalho seja feito e a justiça não seja
prejudicada.
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Atualmente, não há como testar ou certificar a capacidade de um intérprete de realizar
traduções escritas. Os intérpretes são cadastrados no site do Ministério da Justiça e podem
ou não ser qualificados para fornecer traduções e/ou versões de documentos, pois não há um
revisor de tradução no ativo da Justiça.
Dessa forma, dada a ausência de controle nessa esfera, um intérprete de audiência pode
ficar responsável pela tradução e/ou versão de documentos escritos. Deve-se respeitar o
caráter confidencial dos direitos que forem atribuídos e não se deve comentar sobre o
conteúdo do material. Esses documentos, muitas vezes, são provas materiais que ainda não
se tornaram registro público e que serão utilizados durante o processo judicial.
É costume pedir auxílio aos colegas a respeito de terminologia, mas deve-se ressaltar a
confidencialidade do assunto. Para que isso ocorra com a mesma celeridade dos países
desenvolvidos, a situação ideal seria que, primeiramente, os intérpretes tivessem uma sala
reservada no prédio onde os processos permanecessem para os trâmites legais; ficando,
assim, à disposição da Justiça, para que as traduções ou versões fossem feitas com as
inúmeras ferramentas tecnológicas de tradução e versão disponíveis no mercado atualmente.
Atitudes como essa economizam tempo e recursos financeiros e ajudariam a tornar a Justiça
brasileira mais eficiente.
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tradução, como os fios telefônicos que, eventualmente, captam conversas estranhas e sons
que interferem na audibilidade das partes.
Cada minuto de fala gravada em um CD demanda cerca de uma hora para ser transcrito;
fitas de vídeo, cerca de duas horas. O advento das gravações digitais tem feito a transcrição
consideravelmente mais fácil, mas pouco poderá ajudar se o material de origem for pobre
em qualidade.
Tal como acontece com qualquer testemunha, se o réu está sendo interrogado, deve-se
interpretar em voz alta qualquer dúvida que ele possa ter, mesmo se eles sussurrarem a
pergunta diretamente a você, para que ninguém na sala de audiência tenha a impressão de
que há algo impróprio na conversa. Se o réu fizer uma pergunta ao intérprete no meio da
audiência, a questão deve ser transmitida ao advogado.
No interrogatório da testemunha de acusação, em que o réu senta-se ao lado do
intérprete, pode-se combinar com o advogado dele um sinal ou gesto, simplesmente por
precaução, para que o réu possa se comunicar com ele. Além disso, deve-se combinar com o
juiz um gesto para alertá-lo quanto à velocidade do discurso e, assim, não perder parte do
testemunho.
Dessa forma, o juiz desacelerará o interrogatório da testemunha.
Deve haver atenção e discernimento com relação às questões colocadas para o
intérprete. Não é comprometedor, por exemplo, responder a perguntas de ordem genérica,
tais como horas de operação e localização das varas em determinado fórum. Nesses casos, o
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profissional deve se certificar de que a informação dada é precisa para não correr o risco de,
posteriormente, ser acusado de ter dado informação incorreta e outras pessoas perderem a
audiência por isso.
É fácil, entretanto, dar uma resposta inócua para oferecer aconselhamento jurídico. O
intérprete deve se prevenir para evitar transformar uma pergunta simples em
aconselhamento jurídico. Ao apresentar-se para o réu, deve-se mencionar que quaisquer
perguntas relacionadas ao seu caso devem ser dirigidas ao advogado.
O intérprete deve evitar ao máximo despender tempo com o réu e, em hipótese alguma,
prestar aconselhamento jurídico para as partes, nem recomendar advogados específicos ou
escritórios de advocacia.
Parentes ou amigos dos réus ou das testemunhas estão, com frequência, presentes no
fórum onde a audiência acontece. Eles certamente terão dúvidas sobre acusações, o
processo, consequências ou opções possíveis. Ademais, eles também podem querer fornecer
informações sobre o caso. A melhor saída é encaminhá-los para um advogado a fim de evitar
o fornecimento de informações.
É o advogado quem determina o que e o quanto de informação deve ser fornecido a
terceiros. Dessa forma, o intérprete se isolará e se isentará da responsabilidade de fornecer
informações precisas.
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3.14. Relações profissionais
Existem duas razões básicas para se ter um intérprete presente em um processo judicial:
permitir que o réu compreenda o procedimento e permitir que o juízo entenda todos os não
falantes da língua portuguesa julgados em fórum brasileiro.
O intérprete está sob as penalidades da lei e sob todas as regras de um servidor público,
sendo que, quando intimado a comparecer no fórum criminal para atuar como intérprete, o
juiz em suas atribuições legais, equipara o intérprete ao servidor público, atribuindo-lhe
direitos e deveres. Assim, por mais essencial que seja a presença do intérprete na sala de
audiência, ele é considerado um funcionário da Justiça e um participante neutro no processo.
Entretanto, todos os procedimentos judiciais, para terem validade legal, devem ser
realizados na presença de um oficial de justiça. Não há autoridade legal nenhuma atribuída
ao intérprete, embora isso não o isente de suas responsabilidades linguísticas já citadas.
3.15. Discrição
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Embora raramente aconteça, se o juízo tratar o réu ou a testemunha pelo primeiro nome
sem que este esteja antecedido pelo título correto, ou se tratar a testemunha informalmente
em algum momento durante o interrogatório, não se deve alterar a interpretação e o registro,
tornando o que foi dito em um texto formal.
É imperativo que o intérprete tenha uma base sólida de cada aspecto de suas línguas de
trabalho e, principalmente, que envide contínuos esforços para aperfeiçoar suas
competências.
Não se pode prever o que sucederá no decurso do processo judicial: podem ser gírias
incomuns, dialetos, provas forenses complexas ou referências literárias arcaicas. Por isso, os
intérpretes devem constantemente aumentar seus recursos, expandindo o vocabulário e
melhorando suas habilidades na retenção, concentração e entrega do discurso.
Ademais, o intérprete deve encontrar um padrão preciso e exato na arte da interpretação
e ser impecável quanto à ética e à conduta profissional.
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interpretação, o que totaliza 24 horas de estudo e prática. Também poderia ser de valia uma
oficina de orientação ao intérprete, como uma espécie de estágio.
Por meio de educação continuada, o intérprete deve manter e melhorar suas habilidades
de interpretação e conhecimento dos procedimentos utilizados pelos tribunais. Deve
procurar, ainda, elevar os padrões de desempenho da profissão e continuamente aperfeiçoar
as habilidade que dele se exigem durante as audiências.
Por razões de precisão, é importante tentar entender alguns fatos do caso antes do início
da audiência. Pode-se fazer isso pedindo às partes envolvidas informações básicas com a
devida cautela, ou, ainda, solicitar permissão para olhar e revisar documentos a partir dos
autos ou arquivos, como relatórios policiais e transcrições das audiências preliminares.
Para uma avaliação precisa e mais consistente, o ideal é fazer essa pesquisa com
antecedência para que se possa obter as referências técnicas adequadas, bem como
familiaridade com as circunstâncias e as partes no processo. No entanto, tendo em vista a
realidade das atividades quotidiana dos fóruns, nem sempre essa possibilidade existe.
O intérprete deve trabalhar com o pessoal do fórum em espírito de cooperação para que
eles possam compreender a necessidade de preparar-se adequadamente para exercer suas
funções.
Em situação de convocação do trabalho de intérprete por meio de citação ou e-mail de
convocação, devem-se solicitar ao servidor público informações acerca da audiência para
que haja tempo hábil para preparar-se.
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Atos reprováveis em qualquer círculo social, como caluniar e de alguma forma denegrir
a imagem de outras pessoas, também devem ser evitadas na esfera de trabalho do intérprete
de audiência. A profissão é mais bem exercida quando seus membros estão comprometidos e
demonstram o devido respeito uns pelos outros.
O intérprete deve solicitar uma pausa sempre que se sentir fadigado, pois, caso não
descanse, ficará suscetível às interferências do cansaço, o que prejudicará sua exatidão.
Nos países onde a interpretação em audiência segue padrões e protocolos, antes de
iniciada a interpretação, a instrução ao intérprete deveria ser: “Se em algum momento o
intérprete sentir-se cansado ou exausto durante o procedimento, deve informar ao juízo”.
Quando da convocação do intérprete, ele deve ser avisado quanto à natureza do trabalho,
para que ele se prepare para longas horas de procedimento judicial e para que seja solicitado
um colega de trabalho para a divisão das tarefas.
Quando o assistente direto do juiz tiver ciência de que se trata de uma grande operação
em conjunto com as polícias Civil e Federal, é imprescindível que o intérprete seja
informado.
A função do intérprete é mental e fisicamente desgastante e exige uma estrutura
psicológica adequada ao ambiente de trabalho. Um intérprete deve se esforçar para manter
as condições que garantam um desempenho satisfatório, em que a precisão torna-se
rotineira. Esse trabalho demanda alto nível de concentração e é imperativo que se
permaneça mentalmente alerta em todos os momentos. Ocasionalmente, juízes interrompem
processos para uma pausa por saberem que, para haver um registro preciso nos autos,
depende-se principalmente de ter uma equipe alerta. Contudo, frequentemente se esquecem
de que um registro preciso depende também de ter um intérprete descansado e alerta. Não se
deve chegar à exaustão para alertar o juiz sobre a necessidade de uma pausa na audiência.
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3.21.2. Desqualificação
Quando as circunstâncias permitem prever que haverá uma longa audiência e que será
necessária uma equipe interpretando o processo, a fim de evitar que apenas uma pessoa faça
a interpretação e se fadigue, bem como garantir a precisão e evitar interrupções no fluxo do
processo, pode-se alternar-se com um colega aproximadamente a cada meia hora.
O segundo intérprete também pode auxiliar de outras maneiras, ajudando a resolver os
problemas da interpretação do depoimento, consultando materiais de referência e solucionar
questões técnicas com equipamentos eletrônicos.
3.21.4. Audibilidade
Parte das boas condições de trabalho para o intérprete forense é ser capaz de ouvir bem
o que é dito dentro da sala de audiência.
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Se alguma das partes fala muito rapidamente ou em volume muito baixo; se o
interrogado está de costas para o intérprete, fazendo-se ininteligível; se as partes estão
falando uma com a outra; se há qualquer espécie de interferência constante, tais como
telefone tocando ou pessoas falando ao telefone na sala de audiência ou se há conversas
paralelas, deve-se pedir assistência do juiz para estabelecer a ordem e remediar a situação.
Mesmo que o intérprete peça repetidamente às partes para falarem mais alto ou com
mais clareza, jamais deve simplesmente ignorar as frases que não consegue ouvir por não
querer interromper o processo com muita frequência. Se houver ruídos externos, também se
deve solicitar ajuda do juiz e, se o barulho persistir, será necessário um esforço maior para
separar, entre todos os sons, o que deve ser interpretado – embora, na maioria das vezes, os
juízes são os mais interessados em restaurar o silêncio e o decoro em sala de audiência.
Se o problema for o contrário, ou seja, se o réu ou a testemunha fala muito baixo, deve-
se proceder da mesma forma: solicitar ao juiz que peça ao interrogado para falar com mais
clareza. Essa permissão sempre deve ser solicitada, uma vez que o intérprete não tem
autonomia para decidir o que fala ao interrogado.
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Tudo que for dito ao não falante da língua-alvo, em todas as fases do processo, deve ser
interpretado. Entretanto, se for solicitado que algo não seja interpretado, deve-se considerar
o fato de que apenas o juiz pode decidir até que ponto o intérprete pode se distanciar de suas
funções rotineiras e, por isso, ele deve ser informado sobre essas mudanças.
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3.25. Interpretação de áudio ou vídeos
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Mesmo que o intérprete seja consultado pelo advogado sobre questões semelhantes ou
se sente que tem opiniões valiosas e experiências para compartilhar, é aconselhável que se
abstenha de comentários, mesmo em um ambiente informal.
3.27. Dever de reportar violações éticas
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4. PESQUISA DE CAMPO
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fórum. Para reforçar essas medidas de segurança, há três detectores de metal e três máquinas
de raios X na entrada do fórum.
Segundo informações da intérprete Elizabeth, que trabalha no Hall of Justice, depois de
30 anos de empirismo, os Estados Unidos da América perceberam que, de fato, era
primordial ter intérpretes devidamente treinados e habilitados para o desempenho da função.
Assim, hoje os intérpretes ficam à disposição do juízo, e há uma sala enorme destinada aos
intérpretes; os quais, recentemente, foram contratados como funcionários do fórum.
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5. CONCLUSÃO
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6. Empregar a primeira pessoa do singular para interpretar declarações feitas
nesse tempo verbal. Por exemplo, não iniciar uma oração com “Ele disse...”.
7. Direcionar todos os questionamentos ou problemas ao juízo e não tentar
resolver por conta própria com o interrogado. Se necessário, pedir permissão para
trazer o problema ao conhecimento de todos.
8. Posicionar-se o mais próximo possível do interrogado, mas sem bloquear a
visão do juiz e do procurador da República.
9. Informar ao juízo situações de fadiga causada pela longa duração do
procedimento.
10. Quando o áudio do microfone estiver aberto, falar alto e claro o suficiente
para que a voz seja ouvida posteriormente, sem que cause dano às pregas vocais.
11. Interpretar absolutamente tudo, inclusive falas que não componham
diretamente o testemunho.
12. Se o juízo determinar que o intérprete está autorizado a ter informações em
boa-fé sobre casos confidenciais, a fim de se familiarizar com a terminologia, deverá
haver uma conversa reservada com o juiz.
13. Durante a entrevista reservada com um réu estrangeiro, dar-lhe as seguintes
instruções para quando ele estiver em depoimento:
a) Falar em volume alto e com clareza para que todas as pessoas na sala de
audiência, e não somente o intérprete, possam ouvi-lo.
b) Direcionar a resposta à pessoa que lhe fez a pergunta e manter contato visual
com ela, e não com o intérprete.
c) Encaminhar todos os questionamentos durante a audiência ao juízo e/ou ao
advogado de defesa, e não ao intérprete. O interrogado não pode pedir ajuda ao
intérprete, nem iniciar uma conversa paralela para discutir sobre as perguntas.
14. Durante a entrevista reservada com o advogado de defesa do réu, ou ainda
antes do interrogatório da testemunha, o réu deve receber as seguintes instruções: o
intérprete fará a interpretação de tudo o que o procurador da República perguntar à
testemunha; em seguida, a testemunha responderá às perguntas do advogado de defesa
do réu; depois, a testemunha responderá às perguntas do juiz, caso ele julgue
necessário esclarecer algum fato com a testemunha. Ademais, salientar que o réu, em
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hipótese alguma, pode falar ou discordar do testemunho da testemunha durante a
oitiva da testemunha, caso ele tenha algo a dizer sobre o testemunho da testemunha, o
réu terá a oportunidade de falar ao juiz na hora de seu interrogatório, momento no qual
ele será perguntado se tem algo contra a(s) testemunha(s) que testemunharam em seu
caso.
15. Chegar sempre 30 minutos antes do início da audiência.
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