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ESCO

Filosofia
Matthew Li pma n . Qara
Cnanças
EDUCAÇÃO PARA O PENSAR
Capítulo Ulll
Provavelmente nada disso teria acontecido se, naquele dia, Ari não
tivesse ficado distraído na aula de Ciências. O professor Batista estava
falando do sistema solar e de como todos os planetas giram em torno do
sol. Ari simplesmente parou de escutar porque surgiu em sua cabeça a
imagem de um grande sol ardendo em chamas com todos os pequenos 5
planetas girando, sem parar, à sua volta.
De repente, Ari percebeu que o professor Batista estava olhando
para ele. Ari tentou livrar-se daquelas imagens para poder prestar aten-
ção na pergunta.
-O que é que tem uma cauda comprida e dá uma volta em torno 10
do sol a cada 77 anos?
Ari percebeu que não tinha a menor idéia da resposta que o profes-
sor esperava.
-Cauda comprida?
Por um momento Ari brincou com a idéia de dizer que era uma 15
estrela cachorro (ele tinha lido em algum lugar sobre a constelação do
Cão Maior) mas teve medo que o professor achasse que não era uma res-
posta lá muito engraçada. O professor Batista não gostava desse tipo de
brincadeira, mas era muito paciente.
Ari sabia que tinha alguns instantes para pensar antes de dizer al- 20
guma coisa. Ele lembrou que o professor tinha dito "Todos os plan etas
giram em volta do sol". E essa coisa com cauda, seja lá o que for, também
gir'à em torno do sol. Será que também é um planeta? Talvez valesse a
pena tentar.
-Um planeta? perguntou, m eio em dúvida. 25

Ari não esperava as risadas da classe. Se estivesse prestando aten-


ção, teria ouvido o professor dizer que aquilo a que se referia era o cometa
Halley, e que os cometas giram em torno do sol exatamente como os pla-
netas, mas não são planetas.
Felizmente tocou o sinal. 30

Mas Ari voltou para casa chateado por não ter conseguido dar a
resposta ao professor Batista. Além disso, estava intrigado. Onde ele ti-
nha errado? Procurou lembrar-s e de como tinha tentado encontrar ares-

3
posta. O professor Batista tinha dito que todos os planetas giravam em
torno do sol. Essa coisa com cauda também girava em torno do sol, só qu e
não era um planeta.
- Portanto, existem coisas que giram em torno do sol e que não são
5 planetas.
Então, Ari teve uma idéia.
-Urna frase não pode ser invertida. Se você coloca a última parte
no começo, ela não é verdadeira. Se você inverter a frase "Todas as man-
gueiras são árvores", ficará "Todas as árvores são mangueiras". E isso é
10 falso! "Todos os planetas giram em torno do sol" é uma frase verdadeira,
mas se você inverte e diz que "Todas as coisas que giram em torno do sol
são planetas" então não é mais verdadeira; é falsa!
Essa idéia deixou-o tão fascinado que decidiu tentar com outros
exemplos.
15 A primeira frase em que pensou foi "Todos os carrinhos são brinque-
dos". Parecia que aquela frase era verdadeira. Então tentou invertê-la.
Ari estava encantado! A frase, quando invertida, era falsa. "Todos
os brinquedos são carrinhos" era uma frase falsa. Resolveu tentar outra
frase: "Todos os tomates são vegetais" (Ari adorava tomates). Mas o in-
20 verso não dava certo. Todos os vegetais são tomates? É claro que não!
Ari estava vibrando com a sua descoberta. Se soubesse disso, na-
quela manhã, teria evitado aquela situação embaraçosa.· Foi então que
viu Luísa.
Luísa também estava na classe de Ari mas, por alguma razão, ach a-
25 va que ela não tinha rido dele. Ari achou que se contasse o que tinha
descoberto,
,. ela seria capaz de entender!
.
-Luísa, acabei de ter uma idéia engraçada!
Luísa sorriu esperando o resto.
-Quando você vira as frases ao contrário, elas não são mais verda-
30 deiras.
Luísa torceu o nariz.
-E o que tem isso de engraçado?
-Me dá uma frase, qualquer frase, e eu mostro pra você.
-Mas que tipo de frase? Eu não consigo inventar uma frase assim
35 do nada.

,
- Uma frase com dois tipos de coisas, como cães e gatos, sorvetes e
comidas ou astronautas e gente.
Luísa pensou um pouco. E, quando ia dizer alguma coisa, balançou
a cabeça e pensou mais um pouco.
- Vamos lá! Qualquer coisa, pediu Ari. 5

Finalmente Luísa se decidiu.


- Nenhum leão é águia.
Imediatamente Ari rebateu a frase como seu gato teria feito com o
novelo de lã.
-Nenhuma águia é leão. 10

Ele ficou atordoado. A primeira frase "Nenhum leão é águia" era


verdadeira, mas "Nenhuma águia é leão" também era.
Ari não podia entender por que não tinha funcionado.
- Funcionou antes, começou a dizer, mas não pôde terminar a frase.
Luísa olhou para ele, intrigada.
Por que ela tinha dado uma fras e tão boba? pensou Ari um pouco
ressentido. Mas, então, lhe passou pela cabeça que, se realmente tiYesse
descoberto uma regra, ela também deveria funcionar com frases boba _
Portanto :rião tinha sido culpa da Luísa.
Pela segunda vez, naquele dia, Ari sentiu que, por alguma razão, 20
havia falhado . Seu único consolo era que Luísa não estava rindo dele.
- Eu pensei que tinha descoberto alguma coisa. Realm ente pensei
que tinha.
- Você experimentou para ver se funcionava? perguntou Luísa.
Seus olhos verdes estavam brilhantes e sérios. 25

- É claro. Peguei frases como "Todos os planetas giram em torno


do Sol", "Todos os carrinhos são brinquedos", "Todos os tomates são ve-
getais" e descobri que, quando colocávamos a última parte no começo, as
frases não eram mais verdadeiras.
- Mas a frase que eu dei n ão era igual às suas. Todas as suas frases 30
começavam con1 todos e a minha com eçou com nenhum.
Luísa estava certa! Mas será que aquilo fazia alguma diferença?

5
O único jeito era tentar com mais algumas frases que começassem
com nenhum.
-A frase "Nenhum submarino é canguru" é verdadeira. E "Ne-
nhum canguru é submarino" , começou Ari.
5 - Também é verdadeira. E se "Nenhum mosquito é pirulito" é ver-
dadeira, também é verdadeira a frase "Nenhum pirulito é mosquito".
- É isso! É isso! Se uma frase verdadeira começa com nenhum, en-
tão, a frase invertida também é verdadeira. Mas, se começa com todos, a
frase invertida se torna falsa, disse Ari todo agitado.
10 Ari estava tão agradecido a Luísa pela sua ajuda que não sabia o que
dizer. Ele queria agradecer mas, ao invés disso, resmungou alguma coisa
e saiu correndo para casa.
Ele foi direto para a cozinha mas, quando chegou lá encontrou sua
mãe conversando com a vizinha, dona Odete. Ari não quis atrapalhar e
15 então ficou esperando, ouvindo a conversa.
- Vou lhe contar uma coisa, dona Sílvia. Sempre vejo a dona Beti,
aquela que se mudou para a casa da esquina, entrar no bar. E você sabe
como me preocu po com essas pessoas que não conseguem parar de be-
ber. Sempre vejo essas pessoas entrando no bar. E isso me faz pensar se a
20 dona Beti ...
- Se a dona Beti é como elas? perguntou educadamente a mãe
de Ari.
Dona Odete fez que sim. De repente, deu um clique na cabeça de
Ari.
25 - Só porque a senhora diz que "todas as pessoas que n ão conse-
guem parar de beber são pessoas que vão ao bar", isso n ão quer dizer que
" todas as pessoas que vão ao bar são pessoas que não conseguem parar de
beber".
- Ari, isso não é da sua conta! E, além disso, você está interrom-
30 pendo a conversa, disse sua mãe.
Mas Ari podia adivinhar, pela expressão do seu rosto, que sua mãe
estava contente com o que ele tinha dito. ·
Ar i pegou um copo d'água e sentou, feliz como há muito tempo não
se sentia.

6
Capítulo Nove
Daniel não queria que o vissem chorar, mas as lágrimas não para-
vam de correr, e os seus olhos estavam vermelhos e inchados. Estava es-
perando para falar com seu Peixoto, o diretor.
Naquela manhã, na aula de música, negara-se a cantar de pé com
5 os colegas o Hino Nacional, no ensaio para a comemoração do feriado na
semana seguinte. Daniel não estava se sentindo mal: simplesmente recu-
sara-se a fazer aquilo. E foi incapaz de explicar a razão. O professor aca-
bou mandando que ele fosse conversar com o diretor.
Já estava esperando há quase meia hora - que meia hora terrível!
10 -, quando seu Peixoto mandou que ele entrasse.
- E então, Daniel, que foi que houve? perguntou amavelmente o
diretor.
Daniel acalmou-se e enxugou os olhos com as costas das mãos e,
ainda fungando, desabafou:
15 -Eu não podia, seu Peixoto. Não podia mesmo. Meus pais disse-
ram que eu não devia.
-Seus pais? perguntou seu Peixoto, agora com alguma gravidade.
Por que eles não querem que você cante o Hino Nacional?
- É a religião deles .. . quer dizer, a nossa religião. Ontem mesmo,
20 meu pai me mostrou isso na Bíblia, no capítulo XX do Êxodo: a Bíblia
proíbe a idolatria.
- E você sabe o que quer dizer idolatria?
- Eu perguntei pro meu pai, e ele disse que idolatrar é "venerar
imagens". Aí me mostrou onde é que isso estava escrito: "Não terás ou-
25 tros deuses diante de mim".
- Mas, Daniel, disse, amável, o diretor. O Hino Nacional não é ne-
nhuma imagem. É um símbolo. Como a bandeira, o Hino é um símbolo
da Pátria. E ficar de pé ao cantar o Hino não é a mesma coisa que venerar
um deus ou a imagem de u:n deu s. É apenas um gesto de respeito por
30 aquilo que o Hino representa.
- E o que ele :-ep:-esEI ê..?

44
- Ora, Daniel, a Pátria! Você sabe muito bem.
- Bom, talvez a gente não esteja mesmo venerando o Hino em si.
Talvez tudo isso signifique que a gente está venerando a Pátria, que é
representada pelo Hino. E é a isso que os meus pais são contrários, porque
eles dizem que só devemos venerar a Deus, e nada mais! disse Daniel, 5
olhando tristemente para o chão.
Houve um momento de silêncio, que seu Peixoto logo interrompeu:
- Volte para a classe e, assim que puder, irei conversar com a sua
turma sobre isso. Todos os seus colegas viram o que aconteceu e devem
estar preocupados com você. 10

Só na última aula é que o diretor apareceu. Depois de explicar à


classe por que os pais de Daniel não queriam que ele se levantasse para
cantar o Hino, disse o que ele achava. Aquilo nada tinha a ver com reli-
gião, e explicou por que pensava assim. Então quis saber o que a turma
pensava. 15

Marcos, imediatamente, levantou a mão:


- O senhor diz que isso não tem nada a ver com religião, mas,
quando a gente recita os versos do Hino, a gente acaba dizendo "Pátria
amada, idolatrada". Pra mim, is so tem algo a ver com religião.
Seu Peixoto argumentou que não tinha inventado as palavras do 20
Hino. Em todas as escolas do país, elas eram recitadas do mesmo jeito.
Marcos quis retrucar, mas não conseguiu encontrar as palavras ade-
quadas. Apenas sacudiu a cabeça e sentou-se novamente.
Maria aproveitou e pediu para falar:
- Daniel, acho que os seus pais estão errados. É o que o seu Peixoto 25
disse: todo mundo faz isso, todo mundo fica de pé pra cantar o Hino, e
ninguém vê nada de errado nisso. Por que é que você não pode fazer a
m esma coisa?
-Não é porque a maioria das pessoas faz uma coisa de um mesmo
jeito, que essa coisa é certa! respondeu Daniel. 30

-Mas é a lei do país! insistiu Maria.


- Meus pais disseram que as leis divinas são mais importantes,
sussurrou Daniel.
- Será que gen -e grande nunca erra? questionou Beto.

45
-A Bíblia diz que devemos honrar pai e mãe, disse Daniel. Será
que ia estar honrando, ou seja, respeitando os meus pais, se discordasse
deles em relação ao que diz a Bíblia?
-Mas Daniel, interveio seu Peixoto, como já disse antes, será que
5 não seria apenas uma questão de interpretação da Bíblia? É claro que os
seus pais têm direito de fazer as suas próprias interpretações, mas será
que não poderiam estar enganados?
- Claro, admitiu Daniel. Mas não é porque são minoria que têm de
estar errados. Os que estão em maioria também podem estar errados.
10 Seu Peixoto fez nova tentativa:
- Como você sabe, Daniel, há pessoas que têm certeza de que sa-
bem o que a Bíblia diz. Suponhamos que os seus pais estejam entre essas
pessoas, e acreditam que a Bíblia proíbe transfusões de sangue. Agora,
imagine que você esteja muito doente e vai morrer, se não receber uma
15 transfusão. Ainda assim, você acha que os seus pais estariam certos, caso
proibissem isso?
- Ah, isso eu não sei ...
O díretor percebeu, pelo jeito de Daniel, que tinha conseguido al-
gum progresso, e concluiu:
20 -Então, diga aos seus pais que venham ·conversar comigo.
- Hoje à noite vou falar com eles, disse Daniel.
O assunto parecia encerrado, mas Toninha tinha ainda alguma coi-
sa a dizer:
,.
- Daniel, você disse que ia estar desrespeitando os se~s pais se
25 discordasse deles. Foi a Bíblia que disse isso, ou foi você que tirou sozinho
essa conclusão?
-Acho que fui eu mesmo.
-E você pode estar errado, não pode?
-Claro que posso, hesitou Daniel. Só que não sei como posso estar
30 enganado.
-Não é possível discordar de uma pessoa sem que haja desrespeito?
- Não entendi, disse Daniel.

46
-Olha o professor Batista, por exem:;>lo. Ele até gosta que a gente
discorde dele, que faça perguntas sobre o que ele está ensinando. E ele
nos respeita, mesmo que tiremos conclusões diferentes das dele.
-É isso mesmo! concordou Roberto. Lembra quando ele disse que
a gente devia competir com idéias na sala de aula do m esmo jeito que a 5
gente compete no esporte? Acho que, de alguma forma, ele se sente hon-
rado se discordamos dele.
-Vocês têm razão! entusiasmou-se seu Peixoto e dirigiu-se a Daniel.
Eu nunca o aconselharia a fazer algo contra os seus princípios religiosos
n em a discordar dos seus pais. Mas, quando falar com eles, hoje à noite, 10
tente fazê-los compreender que não seria desrespeito se você tirasse as
suas próprias conclusões.
Antes que Daniel dissesse alguma coisa, Marinho, que estava com a
mão levantada e ansioso para falar, saiu com esta:
- Seu Peixoto, isso funciona de dois modos ... 15

-O que é que funciona de dois modos? perguntou o diretor.


-Assim como os pais de Daniel deviam se sentir honrados porque
alguém discorda deles, o senhor também devia se sentir honrado quando
discordamos da sua opinião. Eu acho que a gente não está desrespeitando
ningu ém quando faz o que a gente acha que deve fazer e explica a razão 20
da atitude da gente. Mesmo que a gente faça exatamente o contrário do
que as outras pessoas fazem .
- E se o que você estiver fazendo magoar as pessoas? quis saber
Maria.
- Eu não disse que devemos m agoar as pessoas! protestou Mari- 25
nho. E n essa história do Hino NacionaL se eu realmente acho que é erra-
do ficar de pé na h ora de cantar e, assim mesmo, as pessoas querem me
forçar a fazer isso, então acho que as pessoas iam m e magoar muito m ais
do que eu a elas.
- Marinho, disse o diretor, balançando a cabeça, existem certas 30
·l coisas que se esperam de \·ocês . Se nós, na escola, n ão mostrarmos a vocês
essas coisas, não esta:-emos cumprindo o nosso dever. Tentamos torná-los
bons cidadãos porque 2 sociedade espera que vocês se torne1n bons cida-
dãos. Não é fáci~ acei::a:- :sso, eu sei. Assim corno não é fácil en golir um
remédio amargo. ~. ~ 2:. --e~a bem, se vocês tomarem o remédio amargo, a 35
saúde de yocês :::.e:_~.:: :-a . Se -_-ocês aceitarem o que dissermos a vocês, se-
rão m elhores de,;:: -=ê.::s.

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Ari não resistiu e fez um comentário:
-Marinho e Toninho não estavam dizendo pro senhor fazer aquilo
que é melhor pra eles, seu Peixoto. Eles estavam querendo dizer que o
senhor deve fazer o que seria melhor pra qualquer pessoa.
i
5 -Você está querendo dizer liberdade para fazer o que quiserem?
perguntou seu Peixoto, muito sério.
- Acho que o que estou querendo dizer é que as crianç·as precisam
ser mais livres pra pensar por si mesmas. Tão livres quanto os adultos e,
quem sabe, até mais livres do que eles.
10 -Bem, disse seu Peixoto, eu podia ter tentado resolver sozinho o
problema do Daniel, mas não fiz isso. Trouxe o assunto para discutir com
vocês livre e abertamente. É isso que vocês querem?
- Já é um começo, disse Ari.

,.

.~

'
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0thevv Lipman
Investigação Filosófica Capítulo Um

1. O processo de investigação

~ Com a A descoberta de Ari dos Telles, os alunos vão começar a explorar o mundo das idéias.
Ari e seus amigos não são apenas personagens de uma série de aventuras intelectuais - eles
~ investigam o mundo das idéias de uma maneira sistemática. O caráter metódico e sistemático pode
não parecer evidente na primeira leitura deste capítulo. Os personagens hesitam e esforçam-se
~ para encontrar uma base segura. O que está acontecendo não é por acaso: eles estão atravessan-
do uma série de estágios típicos de muitos processos de descobertas e invenções. Esses estágios
~ constituem o processo da investigação.
A investigação, geralmente, começa quando surgem problemas relacionados com coisas que
~ até então eram tidas como certas. Aí começa o processo de investigação, que não termina até que
uma solução melhor substitua aquela que se tornou insatisfatória.
~ Neste capítulo, o procedimento dos personagens delineia um processo de investigação. Os
estágios desse processo podem ser caracterizados como se seguem:
-~
~ A Estrutura do Processo de Investigação

..~ 1. Sentimento de dificuldade ou frustração. 5. Testar a hipótese (descobrir conseqüências


O professor pergunta: "O que é que tem uma lógicas).
-~ cauda comprida e dá ur:na volta em torno do Ari experimenta alguns exemplos:
sol a cada 77 anos?" A frase "todos os carrinhos são brinquedos"
. ~ Ari responde: "Um planeta."
(verdadeira), quando invertida, torna-se ''to-
dos os brinquedos são carrinhos" (falsa);
~ A classe ri e ele fica envergonhado. A frase ''todos os tomates são vegetais" (ver-
dadeira), quando invertida, torna-se ''todos
2. Dúvida (Onde ele tinha errado?).
~ os vegetais são tomates" (falsa).
Ar i sabia que a frase ''todos os planetas gi-
ram em torno do sol" estava certa. 6. Descoberta de uma evidência que contraria
~ a hipótese (contra-exemplo).
Portanto, ele inferiu que essa coisa com
Luísa sugere a frase "nenhuma águia é leão"
~ cauda comprida e que também gira em tor-
(verdadeira) que, quando invertida, torna-se
no do sol devia ser um planeta. Mas ele des-
cobriu que isso era falso. Por quê? "nenhum leão é águia" (também verdadeira).

3. Formulação ou definição do problema. 7. Revisão da hipótese para dar conta de uma


evidência contraditória.
"Todos os planetas giram em torno do sol, mas Luísa sugere que as frases que começam
nem tudo que gira em torno do sol é planeta." com nenhum continuam verdadeiras quando
Ari supõe que, se todos os planetas giram em invertidas. O teste continua com exemplos:
torno do sol, então tudo o que gira em torno "Nenhum submarino é canguru.
do sol deve ser planeta. Na verdade, ele su- Nenhum mosquito é pirulito."
pôs que as frases podem ser invertidas.
8. Aplicação da hipótese numa situação da vida

--- 4. Hipótese (formulando uma teoria). coüdiana (procurando conseqüências práticas).

--· "Uma frase não pode ser invertida. Se você Ari intervém na conversa entre a mãe e a
coloca a última parte no começo, ela não é vizinha, dizendo que o raciocínio da dona
mais verdadeira." Odete sobre dona Beti é incorreto.

Centro Brasileiro de Filosofia para Crianças 3


Capítulo Um A Descoberta de Ati dos Telles - Manual do Professo

Plano de discussão: O processo de investigação


1. Qual foi a primeira idéia de Ari sobre a inversão de frases?
2. Qual é a regra de inversão de frases que Ari e Luísa descobriram juntos?
3. Como Ari tem a sua primeira idéia sobre a inversão de frases?
4. Como o raciocínio de Ari o levou a sua descoberta? Escreva no quadro-negro, na seqüência
certa, cada passo dessa descoberta. Você acha que alguns desses passos poderiam ser elimi-
nados, ou todos foram necessários para a descoberta de Ari?
5. Como Ari e Luísa acabam formulando a regra de inversão de frases?
6. Como os raciocínios de Ari e Luísa os levaram as suas descobertas? Escreva no quadro-negro,
na seqüência certa, os passos da descoberta de Ari e Luísa. Você acha que alguns desses
passos poderiam ser eliminados, ou todos foram necessários para a descoberta de Ari e Luísa?
7. Agora, preste atenção às duas listas no quadro-negro e veja se consegue descobrir como se faz
uma descoberta.

Respostas
1. Uma frase não pode ser invertida. Se você coloca a última parte no começo, ela deixa de
~
ser verdadeira.
2. Se uma frase verdadeira começa com a palavra nenhum, ela continua verdadeira quan- ~
do invertida. Mas, se ela se inicia com a palavra todos, torna-se falsa quando invertida.
~
Diretrizes
1. 4., 5. e 6. -Ver a Estrutura do Processo de Investigação.
<:
2. A cada passo devemos perguntar: Se isso não tivesse acontecido, será que o Ari (ou o
Ari e a Luísa) poderia ter chegado a sua descoberta?
c
3. Tanto os sentimentos quanto os pensamentos de Ari contribuíram para que ele chegas- c
se a sua primeira idéia. E tanto os sentimentos quanto os pensamentos de Ari e Luísa
contribuíram para a descoberta da regra de inversão de frases. c
c
2. Descoberta e invenção ç
Ari descobre a regra de inversão de frases. Isso nos dá uma oportunidade para discutir com
os alunos a diferença entre descoberta e invenção. Quando a idéia de descoberta surge na sala de
c
aula, geralmente, refere-se a algo grandioso descoberto por um adufto especial. O que é incomum
e surpreende neste caso, é que o livro começa com a descoberta feita por uma criança e, além do
c
mais, não é a descoberta de um objeto, e sim de uma idéia. Isso levanta uma questão: Ari descobre
ou inventa uma idéia? Essa é uma questão que os alunos adoram discutir.
c
Quanto mais os alunos se identificarem com Ari e seus amigos, mais perceberão que tam-
~
bém são capazes de descobrir coisas novas sobre o mundo; pensar em nO'tas idéias; descobrir
novas regras e leis. E assim, estarão se envolvendo, juntamente corn Ari e seus amigos, nesta
grande e desafiadora aventura que é pensar sobre o pensar.
e,
4
c;

Capítulo Nove A Descoberta de Ari dos Telles -Manual do Professor '-


4. Você pode imaginar uma situação em que chorar não seria adequado? "'
5. É certo usar o choro como uma forma de conseguir que alguém faça algo, que de outra
maneira não faria?

O objetivo é incentivar os alunos a tentar definir, entender e avaliar o choro. É preciso ter
"
Çr
ç
cuidado para que a discussão não se torne apenas um relatório de testemunhos pessoais; é preci-
so estimulá-los a explorar o que o choro pode significar. Por exemplo, o choro pode revelar o quanto
somos sensíveis às reações dos outros em relação ao nosso comportamento.

Exercício: Chorar
"'cc:.
Aponte as situações em que você julga que chorar é justificado:

1. Há seis semanas, Hilda está chorando por-


que sua barata de estimação morreu de ve-
8. "Era um filme tão triste .. :·, disse Paula. "Eu
chorei o tempo todo."
c
lhice.
9. Sandra começou a chorar quando percebeu c
2. Ontem, Mário voltou chorando para casa que não tinha um vestido novo para ir à fes-
porque foi roubado e apanhou de dois meni- ta. c
nos maiores.
3. O irmãozinho de Mário começou a chorar
1O. Eduardo começou a chorar quando leu o
boletim da escola e viu que não tinha pas- e
quando o viu machucado. sado de ano.
4. Quando foram apanhados, os meninos que 11. A família de Sônia está se mudando par_91
c
roubaram e bateram em Mário começaram
a chorar.
uma casa nova, mas ela achou tão ruim ter
que deixar a antiga que começou a chorar.
c
5. Manuel começou a chorar quando ficou sa-
bendo que não tinha sido convidado para a
12. "Eu berro o tempo todo", disse com orgulho,
"Afinal sou o maior chorão da cidade!"
c.
festa.
6. Elza ficou com os olhos cheios de lágrimas
13. "Claro que estou chorando!" disse Oscar;
"perdemos o jogo, não foi?"
c
"'
porque martelou o dedo quando tentava
14. Alice riu tanto que escorreram lágrimas dos
pendurar um quadro.
seus olhos.
7. Marisa ficou com os olhos cheios de lágri-
mas porque estava descascando cebolas.
15. Toda vez que Dorinha quer alguma coisa ela c
,. tenta conseguir chorando.
ç.
c;;
2. Discordar é faltar com.o respeito?
c;-
Alguns adultos tendem a considerar as perguntas das crianças como sinal de desrespeito. E
algumas crianças podem interpretar a relutância de um adulto em discutir determinadas crenças
como uma atitude defensiva, que proíbe a criança de ir adiante na sua investigação. Tais crianças
c
e adultos podem, ocasionalmente, entrar em conflito, e é provável que os professores se vejam no
meio desse conflito.
c
O professor não quer inibir a curiosidade natural da criança ou seu senso de questionamento,
nem deseja interferir no direito do adulto de ter as suas convicções sem ser obrigado a justificá-las.
e-
O professor tem que respeitar o direito do adulto de pensar por si mesmo, mas também tem a c;
obrigação de cultivar o potencial da criança de transformar-se nesse adulto - um adulto capaz de
ç
172 Centro Brasileiro de Filosofia para Crianças (;.-

{)
~
Investigação Filosófica Capítulo Nove

-
;;)
pensar por si mesmo. Portanto, o professor não pode deixar de dar respostas à criança que está
lutando para pensar por si mesma até sobre assuntos que a sociedade considera delicados. Lidar
com os esforços da criança para entender e investigar as razões que estão por trás de muitas
convicções requer do professor tato e compreensão. Isso inclui a responsabilidade de fazer com
que a criança perceba que o adulto também tem o direito de pensar por si mesmo a respeito de tais
~ convicções.

J Exercício: O que é respeito?

J Ordene, da mais adequada para a menos adequada, as palavras ou expressões entre parênteses:

~ 1. Quando um livro está sendo usado sem que se sujem ou se rasguem suas páginas, ele está
sendo tratado com: atenção I respeito I cuidado I interesse.
~ 2. Quando uma bandeira é retirada do seu mastro e segurada de modo a não tocar o chão
enquanto estiver sendo dobrada, ela está sendo tratada com: amor I cuidado I veneração I
:J respeito.
3. Preservar as espécies erri perigo de extinção é uma forma de demonstrar: amor I cuidado I
~ respeito I interesse I necessidade I em relaç.ão à natureza.
4. Quando um jovem chama um adulto de "senhor" ou "senhora", é um sinal de: respeito I medo
~ I admiração I amor.

;) 5. Quando os colegas, ao invés de falarem todos ao mesmo tempo, falam cada um por sua vez,
ouvindo uns aos outros, isso é sinal de que: se preocupam I se amam I se respeitam I
gostam uns dos outros.
j
Plano de Discussão: O que é respeito?
~
1. Você pode respeitar uma pessoa sem 6. Você tem mais respeito pelas pessoas que
~ gostar dela? têm mais saúde que você do que pelas
2. Você pode gostar de uma pessoa sem que têm menos?
~ respeitá-la? 7. Você tem mais respeito pelas pessoas que
fazem muitas coisas boas do que por
;J 3. Você pode dar um exemplo de algo que
aquelas que fazem poucas coisas?
você respeita mas que outras pessoas
:> não respeitam? 8. Você tem respeito por você mesmo( a)?
Nos dias em que você se respeita e está
4. Você pode dar um exemplo de algo que
:;. outras pessoas respeitam mas que você satisfeito(a) consigo mesmo(a), você
tende a gostar e respeitar mais outras
não respeita?
pessoas, ou menos?
:::J 5. Você tem mais respeito pelas pessoas que
9. Todos os seres humanos merecem
são mais fortes que você do que pelas
respeito? E quem é uma peste com todo o
~ que são mais fracas?
mundo?

:J
Plano de Discussão: Pessoas que discordam de nós
~
Toninha comenta que, na verdade, um dos seus professores se sente honrado quando os alunos
~ discordam dele.

:J
Centro Brasileiro de Filosofia para Crianças 173
~

~
Capítulo Nove A Descoberta de Ari dos Telles- Manual do Professor
c.
c.
1. Por que você acha que isso acontece? 4. Você se sentiria honrado se seu amigo dis-
2. Você se sentiria honrado se sua irmã ou seu
irmão discordasse de você? Por quê?
3. No capítulo 4, Ari se sentiu honrado quando
cordasse de você? Por quê?
5. Você se sente honrado quando discordam
de você? O que você sente nesse momen-
to? Tente descrever.
'c
Toninha discordou dele? Como ele se ~
sentiu?

Plano de Discussão: Discordar é desrespeitar?


c
1. Se você visse um motorista entrando na 8. Se seus professores dissessem que que-
c
contra-mão, numa rua, você deveria gritar
para avisá-lo?
riam que você pensasse por si mesmo, você
estaria desrespeitando-os se discordasse c
2. Se você visse alguém tomando, por enga-
no, o remédio errado, acha que seria errado
deles?
9. Existem certos assuntos sobre os quais
c
avisá-lo? seria melhor que você mesmo decidisse e
formasse um juízo próprio?
c
3. Se lhe dessem o troco errado, você protes-
taria? 10. Existem assuntos sobre os quais é melhor
deixar que as outras pessoas pensem por
c
4. Se alguém insistisse com você que a Terra
é plana, você teria receio de discordar?
você?
11. Já aconteceu de você discordar de alguém
c
5. Se os seus amigos dissessem que não se-
riam mais seus amigos se você discordas-
sem saber por que você discorda? ç
se deles, você ousaria fazê-lo? 12. Qual das quatro alternativas você prefere?
6. Se os seus professores dissessem que que-
Por quê? c
riam que você pensasse por si mesmo, isso
significaria que você poderia, em algumas
a)
b)
concordar e saber por quê;
concordar sem saber por quê;
c
coisas, ter pontos de vista diferentes dos
deles?
c) discordar e saber por quê; ~
d) discordar sem saber por quê.
7. Se os seus professores dissessem que que-
riam que você pensasse por si mesmo, você
estaria desobedecendo-lhes se tirasse suas
próprias conclusões?
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(
3. O que é símbolo? c
Seu Peixoto sugere que o Hino Nacional é um símbolo assim como a bandeira. A noção de (
símbolo é muito rica e complexa. Pode-se começar a discuti-la contrastando símbolos e sinal.
Um sinal é uma simples marca ou indicador. É uma maneira simplificada de informar ou
direcionar as pessoas. Por exemplo, o cartaz na porta do cinema com o nome de um filme é um
sinal que informa o que está passando. Um sinal de Pare leva as pessoas a se comportarem de (
determinada maneira. Sinais, em geral, são simples, explícitos e diretos.
Os símbolos, ao contrário, normalmente representam estados complexos de coisas. As pirâ-
mides simbolizam o Egito, seu povo, seu governo, sua história. O Arco do Triunfo é um símbolo da
França, de Paris e também das íaçanhas tecnológicas. O nome de Tiradentes simboliza não só a
Inconfidência Mineira, mas também patriotismo.

174 Centro Brasileiro d e Filosofia para Crianças

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